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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ECONOMIA Saulo Cabello Abouchedid Política cambial nos países emergentes: uma perspectiva keynesiana-estruturalista CAMPINAS 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

Saulo Cabello Abouchedid

Política cambial nos países emergentes: uma perspectiva

keynesiana-estruturalista

CAMPINAS

2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

Saulo Cabello Abouchedid

Política cambial nos países emergentes: uma perspectiva

keynesiana-estruturalista

Prof. Dr. Daniela Magalhães Prates – orientadora

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da Universidade

Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutor em Ciências Econômicas, área de concentração

Teoria Econômica.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL

DA TESE DEFENDIDA PELO ALUNO SAULO

CABELLO ABOUCHEDID E ORIENTADA PELO PROFª.

DRª. DANIELA MAGALHÃES PRATES

CAMPINAS

2018

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CAPES

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas

Biblioteca do Instituto de Economia

Mirian Clavico Alves - CRB 8/8708

Abouchedid, Saulo Cabello, 1987-

Ab76p Política cambial nos países emergentes: uma perspectiva keynesiana-

estruturalista / Saulo Cabello Abouchedid. – Campinas, SP : [s.n.], 2018.

Orientador: Daniela Magalhães Prates.

Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de

Economia.

1. Política cambial. 2. Economia keynesiana. 3. Países em

desenvolvimento - Política econômica. I. Prates, Daniela Magalhães, 1970-. II.

Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Economia. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Exchange rate policy in emerging countries: a keynesian-

structuralist perspective

Palavras-chave em inglês:

Exchange rate policy

Keynesian economics

Developing countries - Economic policy

Área de concentração: Teoria Econômica

Titulação: Doutor em Ciências Econômicas

Banca examinadora:

Daniela Magalhães Prates [Orientador]

Bruno Martarello De Conti

Pedro Linhares Rossi

André Moreira Cunha

Barbara Fritz

Data de defesa: 28-02-2018

Programa de Pós-Graduação: Ciências Econômicas

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TESE DE DOUTORADO

Saulo Cabello Abouchedid

Política cambial nos países emergentes: uma perspectiva

keynesiana-estruturalista

Defendida em 28/02/2018

COMISSÃO EXAMINADORA

Prof. Dr. Daniela Magalhães Prates - Presidente Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

Prof. Dr. Bruno Martarello De Conti Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

Prof. Dr. Pedro Linhares Rossi Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

Prof. Dr. André Moreira Cunha Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS

Prof. Dr. Barbara Fritz Universidade Livre de Berlim

Ata de Defesa, assinada pelos membros da

Comissão Examinadora, consta no processo

de vida acadêmica do aluno.

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Agradecimentos

O ponto final desta tese encerra um ciclo de doze anos. Quando, aos 18 anos, escolhi a

Unicamp em 2006, não imaginava as transformações profissionais e pessoais que viriam. Ao

longo desses anos, pude contar com o apoio de inúmeras pessoas, muitas das quais farão parte

ainda de muitos “ciclos” da minha vida.

Nada seria possível sem o apoio irrestrito dos meus pais, José Alberto e Beatriz, que

sempre estiveram ao meu lado, especialmente nos momentos de incerteza, característicos da vida

acadêmica, e das minhas irmãs, Isabela e Débora, que sempre me deram forças e torceram por

mim. Muito obrigado por tudo, amo vocês.

Desde 2009 ganhei também o apoio e a companhia da Patrícia nessa jornada. Vivemos

juntos momentos de felicidade, de angústia, de muita saudade pela distância (entre Ribeirão Preto

e Campinas ou Brasil e Alemanha) e, sobretudo, de muito companheirismo, cumplicidade e amor.

Obrigado por estar ao meu lado nos momentos mais decisivos da minha vida nesses nove anos.

Esta trajetória de muitas realizações também não seria possível sem a minha querida

orientadora e “Mestra” Daniela Prates. Desde a graduação, aulas da Dani fomentaram meu

interesse pela economia internacional e economia monetária. No mestrado, sua orientação foi

fundamental para que decidisse pela carreira acadêmica e, assim, entrasse no doutorado. Ao

longo do doutorado, o papel ativo e sempre presente da Dani como orientadora proporcionou

experiências marcantes para minha vida profissional e pessoal. Uma delas foi a oportunidade de

morar em outro país e aprofundar a discussão do tema desta tese a partir de outras abordagens e

metodologias. Muito obrigado por todos os conselhos, as palavras de apoio, as oportunidades, por

me fazer pensar criticamente e sempre expandir meu campo de visão, por acreditar no meu

trabalho. Admiro muito você como professora, orientadora e amiga.

A Professora Barbara Fritz também foi fundamental nesta caminhada, me recebendo de

maneira muito acolhedora no Instituto Latino Americano (LAI) da Universidade Livre de Berlim.

As apresentações e discussões nos seminários do LAI agregaram muito a minha tese. Muito

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obrigado por todos os seus conselhos, críticas e ensinamentos. Sua dedicação à pesquisa,

docência, bem como aos seus orientandos, é inspiradora.

Agradeço também a todos os professores que convivi ao longo da graduação e pós-

graduação, especialmente ao Bruno, um amigo para todas as horas e com conselhos sempre

precisos, à Maryse, pelas aulas e inúmeras conversas interessantes, ao Giuliano, meu orientador

da graduação e amigo (sempre com conselhos valiosos), ao Pedro Rossi – pelos conselhos e

aprendizado desde a graduação - e ao André Biancarelli.

Além dos professores, agradeço também a todos os meus amigos e colegas da pós-

graduação, em especial Nathalie – pela ajuda na pesquisa e discussões sobre a tese -, Nicholas,

Camila, Marília, Gabriel, Renato, Ana Luíza, Paulo Ricardo, Rafael, Ítalo, Flávio, Felipe,

Ricardo. Meus amigos queridos Alex e Paulo foram fundamentais nesse período. Muito obrigado

pelos momentos de descontração (no tradicional almoço na Tia da maionese) e pelos conselhos

valiosos em relação à tese.

Gostaria de agradecer também meus amigos e colegas da Freie Universität Berlin, que me

acolheram muito bem ao longo do doutorado Sanduíche, em especial Alejandro Marquez-

Velazquez e Carmen Marull, que foram meus “anjos da guarda” em toda minha estadia.

Agradeço aos professores da Facamp, que propiciam um excelente ambiente de trabalho e

crescimento profissional e intelectual, em especial José Augusto Gaspar Ruas e Rodrigo

Sabbatini – pela oportunidade e confiança no meu trabalho – e Daví Nardy. Ademais, tenho o

privilégio de poder participar de discussões e seminários, organizados pelos Professores João

Manuel Cardoso de Mello e Luiz Gonzaga Belluzzo, que contribuem para minha formação

docente. Minha gratidão também se estende aos meus alunos, que sempre me inspiraram no

aperfeiçoamento das aulas e me motivaram nesta reta final de tese.

Os funcionários do Instituto de Economia foram fundamentais em todos esses anos,

sempre eficientes e prestativos. Agradeço especialmente Fátima, Andrea, Marinete, Ricardo,

Regina (in memoriam), Eduardo, Régis. Agradeço também à Coordenação de Aperfeiçoamento

de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelas bolsas de estudos que me foram concedidas.

No campo pessoal, muitas pessoas contribuíram para que eu pudesse chegar ao ponto final

desta tese. Agradeço especialmente ao meu amigo Marcelo, pelos anos de convivência na

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graduação e pós-graduação, meu querido amigo Rafael, pelos 20 anos de amizade, e sua esposa

Lara, meus queridos amigos de Berlim – Vikki, Alan e Nico – pelo companheirismo e momentos

inesquecíveis e meu amigo-irmão querido Felipe Barone.

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Resumo

A abordagem keynesiana-estruturalista relaciona a política cambial dos países

emergentes à inserção assimétrica desses países no Sistema Monetário e Financeiro

Internacional (SMFI) contemporâneo Esta tese pretende aprofundar e sistematizar as ligações

entre essa abordagem e a política cambial nos países emergentes. Para atingir esse objetivo,

estruturou-se este trabalho em três capítulos. Os dois primeiros capítulos se debruçam na

construção – por meio de revisão bibliográfica e estatística descritiva - dos condicionantes

estruturais e domésticos, que conformam o referencial teórico supracitado. Por fim, a análise

da política cambial, conforme os condicionantes, será aplicada a quatro estudos de caso no

terceiro capítulo. Cada caso envolve uma análise qualitativa da política cambial – construída

ao longo dos dois primeiros capítulos – e uma análise quantitativa, a fim de verificar a

efetividade das intervenções que melhor responderam aos condicionantes. O resultado da

aplicação do referencial teórico nos estudos de caso permite três considerações gerais. A

primeira aponta que a redução da abertura financeira via institucionalidade do mercado de

câmbio é condição necessária para se alcançar um maior espaço de política cambial. A

segunda atesta para a dificuldade dos instrumentos market friendly em alcançar maior espaço

de política cambial, mesmo sendo efetivos na contenção da volatilidade cambial no curto

prazo. A terceira aponta para a necessidade de se pensar em combinações de políticas

cambiais com horizontes temporais diferentes.

Palavras-chave: keynesiana-estruturalista; política cambial; países emergentes

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Abstract

The Keynesian-structuralist approach relates the exchange rate policy of emerging countries

to the asymmetric insertion of these countries into the contemporary International Monetary

and Financial System (SMFI). This thesis aims to deepen and systematize the links between

this approach and the exchange rate policy in emerging countries. In order to achieve this

objective, this thesis is structured in three chapters. The chapters one and two focus on the

construction - through a bibliographical review and descriptive statistics - of the structural and

domestic constraints, which shape the aforementioned theoretical framework. Finally, the

analysis of the exchange rate policy, according to the constraints, is applied to four case

studies in the third chapter. Each case involves a qualitative analysis of the exchange rate

policy - constructed during the first two chapters - and a quantitative analysis, in order to

verify the effectiveness of the interventions that best answered the conditions. The results of

case studies allow three general conclusions. The first one points out that the reduction of

financial openness through the foreign exchange market institutions is a necessary condition

to reach a larger space of exchange policy. The second one testifies to the difficulty of

market-friendly instruments in achieving exchange policy space, even though they are

effective in curbing exchange rate volatility in the short term. The third points to the need to

think about combinations of exchange rate policies with different time horizons.

Keywords: Keynesian-Structuralist; exchange policy; emerging countries

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Índice de Figuras, Quadros, Tabelas e Gráficos

Figuras

Figura 1.1: Hierarquia de moedas no SMI contemporâneo 46

Figura 1.2: Hierarquia de moedas e taxa de juros no SMI 50

Figura 1.3: Relação entre assimetrias e política cambial 54

Figura 1.4: O Canal das expectativas 60

Figura 2.1: Impactos dos condicionantes domésticos sobre a política cambial – estrutura

geral 77

Figura 2.2: Os mercados de câmbio onshore e offshore 80

Figura 3.1: Política cambial e condicionantes 148

Figura 3.2: Posições em dólar de bancos e empresas não-financeiras 219

Quadros

Quadro 1.1: A transmissão entre taxa de juros e câmbio 27

Quadro 1.2: Segmentos do mercado de câmbio onshore e offshore 31

Quadro 1.3: Taxonomia da política cambial nos países emergentes 34

Quadro 1.4: Quadro-resumo das implicações das assimetrias monetária e financeira sobre

a política cambial 69

Quadro 2.1: Institucionalidade dos mercados à vista e de derivativos (2015) – países

selecionados 89

Quadro 2.2: Instrumentos e custos da esterilização – países selecionados 120

Quadro 2.3: Resumo da relação entre condicionantes domésticos e estrutural 134

Quadro 2.4: Relação entre condicionantes domésticos e autonomia de política cambial -

exemplos 137

Quadro 3.1: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes 167

Quadro 3.2: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes 189

Quadro 3.3: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes 210

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Quadro 3.4: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes 229

Tabelas

Tabela 1.1: Funções da moeda: dimensões pública e privada. 45

Tabela 1.2: Classificação dos Regimes de Câmbio e Monetário 2014 56

Tabela 1.3: Motivações para as intervenções no mercado de câmbio 58

Tabela 1.4: Volume das intervenções via reservas internacionais 63

Tabela 1.5: Impacto dos instrumentos de política cambial 67

Tabela 1.6: Os efeitos do boom e os instrumentos de GFC – 2009-2011 68

Tabela 2.1: Volume (estimado) dos mercados onshore e offshore de balcão – moedas

selecionadas 82

Tabela 2.2: Indicador de Solvência e reservas internacionais – anos e países selecionados 99

Tabela 2.3: Posição Internacional de Investimento (US$ milhões) – países selecionados 102

Tabela 2.4: Participação estrangeira nos mercados de títulos públicos denominados em

moeda doméstica (% total de títulos) 108

Tabela 2.5: Emissão Internacional de Títulos Privados (US$ milhões) – países

selecionados 142

Tabela 2.5: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) – países

selecionados 143

Tabela 3.1: Resultado líquido das operações de swaps cambiais e esterilização das

operações no mercado à vista 157

Tabela 3.2: Resultado Modelo GARCH (1,1) 2003-2008 196

Tabela 3.3: Resultado Modelo GARCH (1,1) 2008-2016 196

Tabela 3.4: ROC por faixa de ROM 207

Tabela 3.5: Resultados Modelo GARCH (1,1) 214

Tabela 3.6: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos

derivativos cambiais - Brasil 238

Tabela 3.7: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos

derivativos cambiais – Coréia do Sul 239

Tabela 3.9: Resultados Modelo GARCH (1,1) 241

Tabela 3.10: Resultados Modelo GARCH (1,1) 242

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Gráficos

Gráfico 1.1: Volatilidade cambial diária (desvio padrão) – períodos selecionados 64

Gráfico 1.2: Variação cambial acumulada nos períodos selecionados (em %) 64

Gráfico 2.1: Índice KAOPEN (2014) 78

Gráfico 2.2: Volume dos mercados onshore e offshore por segmento 85

Gráfico 2.3: Volume dos mercados onshore e offshore por participante 86

Gráfico 2.4: Volume dos mercados onshore por segmento (em %) 88

Gráfico 2.5: Volume dos mercados onshore por participante (em %) 88

Gráfico 2.6: Fluxos líquidos de capitais privados de não residentes - países selecionados

(em US$ milhões) 95

Gráfico 2.7: Fluxo líquido de capitais privados pré-crise (2003-2007) - média - US$

milhões 96

Gráfico 2.8: Fluxo líquido de capitais privados pós-crise (2008-2016) - média - US$

milhões 96

Gráfico 2.9: Saldo conta corrente - % PIB 97

Gráfico 2.10: Saldo Conta Corrente - % PIB 97

Gráfico 2.11: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Brasil 104

Gráfico 2.12: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - México 104

Gráfico 2.13: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Turquia 105

Gráfico 2.14: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Coréia do Sul 105

Gráfico 2.15: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) - Brasil 106

Gráfico 2.16: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) - México 106

Gráfico 2.17: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) -Turquia 107

Gráfico 2.18: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) -Coréia do

Sul 107

Gráfico 2.19: Padrão de comércio - América Latina 128

Gráfico 2.20: Padrão de comércio - Leste Europeu 128

Gráfico 2.21: Padrão de comércio - Sudeste Asiático 129

Gráfico 2.22: Padrão de comércio - Coréia do Sul 129

Gráfico 2.23: Padrão de comércio - México 129

Gráfico 2.24: Padrão de comércio - Turquia 130

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Gráfico 2.25: Índice de complexidade econômica - países selecionados 130

Gráfico 2.26: Índice de preço das commodities e taxa de câmbio real (Brasil, Chile,

Colômbia e México) 144

Gráfico 3.1: Posição líquida em cupom cambial - (US$ milhões) 152

Gráfico 3.2: Posição líquida em dólar futuro- US$ milhões 153

Gráfico 3.3:Posição em dólar mercado à vista - Bancos (US$ milhões) 153

Gráfico 3.4: Balanço de pagamentos (1999-2017) - US$ milhões 155

Gráfico 3.5: Dívida externa Curto Prazo - Bancos (Direita) e empresas não-financeiras -

US$ milhões 156

Gráfico 3.6: Intervenções no mercado à vista pós CFG (US$ milhões) 161

Gráfico 3.7: Diferencial de juros (Over Selic - Libor) - % 163

Gráfico 3.8: Posição Comprada Líquida - swaps cambiais - US$ milhões (valor nocional) 164

Gráfico 3.9: Taxa de câmbio nominal US$/R$ 166

Gráfico 3.10: Posição Vendida Líquida do Bacen - swaps cambiais - US$ milhões (Valor

nocional) 166

Gráfico 3.11: Fluxo cambial e empréstimos de CP Bancos - US$ milhões 171

Gráfico 3.12: Intervenções no mercado à vista (US$ milhões) e depreciações abruptas

(frequência - direita) 172

Gráfico 3.13: Empréstimos externos (fluxo) de curto e longo prazo - milhões US$ 174

Gráfico 3.14: Volatilidade (desv. padrão) e regulação 176

Gráfico 3.15: FRA de cupom cambial e regulação (frequência - direita) 177

Gráfico 3.16: Taxa de câmbio (esquerda; US$/R$) e regulação 178

Gráfico 3.17 - Balanço de Pagamentos (US$ milhões) 181

Gráfico 3.18: Investimentos em carteira - US$ milhões 181

Gráfico 3.19: Participação dos não-residentes no estoque de dívida pública (%) 183

Gráfico 3.20: Endividamento Externo - empresas não-financeiras (% Reservas) 183

Gráfico 3.21: Custo de esterilização (% PIB - esquerda) e diferencial de juros (% - direita) 185

Gráfico 3.22: Fluxo líquido reservas e PEMEX - US$ milhões 188

Gráfico 3.23: Taxa de câmbio nominal - peso/dólar 188

Gráfico 3.24: Volatilidade (desv. pad) e leilões de venda (direita) 194

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Gráfico 3.25: Leilões de venda (direita) e depreciações extremas (esquerda) 194

Gráfico 3.26: Dolarização (Depósito em dólar/ M2 - %) 198

Gráfico 3.27: Volume de transações mercado de câmbio 199

Gráfico 3.28: Balança Comercial (em US$ milhões) e Preços das commodities (direita -

2005=100) 200

Gráfico 3.29: Conta corrente e financeira (US$ milhões) 201

Gráfico 3.30: Dívida externa privada e pública em relação às reservas internacionais -

Curto e Longo Prazo 202

Gráfico 3.31: Passivo Externo Bruto (US$ milhões) 202

Gráfico 3.32: Corredor da taxa de juros 204

Gráfico 3.33: Intervenções mercado à vista (direita US$ milhões) e depreciações abruptas 205

Gráfico 3.34: Compra de divisas no mercado à vista (direita - US$ milhões) e volatilidade

(desvio padrão) 206

Gráfico 3.35: ROM - Volume de reservas em dólar e ouro (US$ milhões) 209

Gráfico 3.36: Limites do ROM e uso efetivo (% em relação ao total de reservas) 209

Gráfico 3.37: Taxa de câmbio nominal won/dólar 220

Gráfico 3.38: Balanço de Pagamentos - Média móvel 3 trimestres (US$ milhões) 221

Gráfico 3.39: Balança comercial - Exportações e importações (US$ milhões) 222

Gráfico 3.40: Dívida Externa (US$ milhões) e relação Dívida Externa/Reservas 223

Gráfico 3.41: Empréstimos externos - filiais dos bancos estrangeiros (em won) 223

Gráfico 3.42: Participação de investidores não-residentes nos mercados de títulos

domésticos (%) 224

Gráfico 3.43: Taxa de câmbio won/dólar e Índice de preço dos produtos importados

(direita, 2010=100) 225

Gráfico 3.44: Custo (estimado) de esterilização das reservas internacionais (em % do PIB) 225

Gráfico 3.45: Regulações e taxa de câmbio (esquerda) (2009-2017) 233

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Sumário

Introdução ..................................................................................................................... 17

1.Perspectivas teóricas da política cambial nos países emergentes .......................... 23

Introdução ............................................................................................................................. 24

1.1 Política cambial: conceitos e taxonomia .................................................................... 25

1.2 Aspectos teóricos da política cambial nos países emergentes ................................... 38

1.2.1. A credibilidade das instituições e os fundamentos macroeconômicos ......... 42

1.2.2. A preponderância dos fatores externos ......................................................... 44

1.2.3 A abordagem keynesiana-estruturalista da hierarquia de moedas ............ 46

1.2 A relação entre hierarquia de moedas e política cambial .......................................... 56

1.3.1. A escolha dos países emergentes .................................................................. 57

1.3.2. As conexões entre política cambial e assimetrias do SMFI .......................... 58

Considerações finais ............................................................................................................. 70

2.Os condicionantes domésticos da política cambial nos países emergentes ........... 73

Introdução ............................................................................................................................. 74

2.1 Abertura financeira e institucionalidade do mercado de câmbio ............................... 77

2.2 Os aspectos financeiros da vulnerabilidade externa .................................................. 94

2.3 Gestão da política monetária: a inter-relação entre as taxas de juros e de câmbio .. 110

2.4 Inserção comercial e padrões de comércio .............................................................. 122

2.5 Relação entre condicionantes estrutural e domésticos e o impacto sobre a autonomia da

política cambial ................................................................................................................... 130

Considerações Finais .......................................................................................................... 137

Anexo estatístico ................................................................................................................. 140

3. A análise da política cambial sob a ótica dos condicionantes domésticos e estrutural:

os casos de Brasil, Coréia do Sul, México e Turquia. .............................................. 144

Introdução ........................................................................................................................... 145

3.1 Brasil: o horizonte curto-prazista e o pioneirismo nas mudanças............................ 148

3.1.1 A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e

câmbio flutuante .................................................................................................... 148

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3.1.2 A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio

flutuante.................................................................................................................157

3.1.3 Resposta aos condicionantes e efetividade da política cambial ................... 168

3.2 México: a continuidade da política cambial ................................................................. 177

3.2.1 A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e de

câmbio flutuante .................................................................................................... 177

3.2.2 A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio flutuante.183

3.2.3 Resposta aos condicionantes e efetividade da política cambial ................... 189

3.3 Turquia: a simbiose da política monetária e cambial numa economia parcialmente

dolarizada ............................................................................................................................ 195

3.3.1. A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e de

câmbio flutuante .................................................................................................... 195

3.3.2A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio flutuante..202

3.3.3 A resposta aos condicionantes e a efetividade da política cambial .............. 209

3.4.1. A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e

câmbio flutuante .................................................................................................... 213

3.4.2 A gestão da política cambial no regime de câmbio flutuante e metas de inflação.223

3.4.3. A resposta aos condicionantes e a efetividade da política cambial ............. 227

Considerações Finais .......................................................................................................... 231

Anexo estatístico ................................................................................................................. 235

Apêndice ............................................................................................................................. 237

A) Análise da efetividade da política cambial - Coréia do Sul .................... 237

B) Análise da efetividade da política cambial – Brasil ............................... 238

C) Entrevista com agentes que operam no mercado de câmbio mexicano . 239

Conclusão .................................................................................................................... 242

Referências Bibliográficas ......................................................................................... 250

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17

Introdução

A inserção das economias periféricas na globalização financeira1 nos anos 1990

suscitou mudanças nos regimes macroeconômicos. Num primeiro momento, o processo de

abertura financeira se deu, em grande parte dos países, sob os regimes de câmbio

administrados (fixo ou bandas cambiais), nos quais a taxa de câmbio configurava-se como

âncora da inflação. No entanto, as crises cambiais e bancárias que atingiram os países

emergentes2 entre 1994 e 2002 revelaram a suscetibilidade desses regimes às instabilidades

dos fluxos de capitais de curto prazo (Calvo et. al., 2005; Prates, 2002). Diante deste cenário,

a maioria dos países emergentes migrou formalmente para o regime de câmbio flutuante,

caracterizado, dentre outros fatores, pela maior capacidade de absorção de choques externos.

Simultaneamente a essa mudança, diversos países também adotaram, entre 1997 e 2006, o

regime de metas de inflação, baseado no arcabouço teórico do Novo Consenso

Macroeconômico (NCM) (FMI, 2006; Arestis & Sawyer, 2008). Em linhas gerais, tal regime

defende a estabilidade de preços como principal objetivo de política monetária (e

macroeconômica) e a taxa de juros de curto prazo como âncora da inflação.

A opção de grande parte dos países emergentes pelo binômio regime de metas de

inflação–câmbio flutuante gerou novos dilemas de política econômica para os policy makers

desses países e, consequentemente, constantes revisões na literatura econômica e nas análises

dos organismos multilaterais. Esse regime macroeconômico baseia-se em dois pressupostos

principais: autonomia de política monetária e ausência de qualquer objetivo ou meta em

relação ao nível e trajetória da taxa de câmbio – ou seja, a passividade da política cambial.

Tais pressupostos estão relacionados a uma das implicações dos modelos de Mundell (1963) e

Flemming (1963), que deram origem ao modelo IS-LM-BP, a chamada “trindade impossível”

ou “trilemma”. Nesse modelo de determinação da renda numa economia aberta com livre

1 De acordo com Chesnais (1996), Aglietta & Coudert (1990) e Prates (2015), a globalização financeira refere-se

a um ambiente sem barreiras internas entre os diferentes mercados financeiros e de interpenetração entre os

mercados financeiros nacionais e internacionais. Braga (1997) e Prates (2015) ressaltam também outra

característica fundamental desse ambiente: a conexão entre mercados de diferentes temporalidades, ou seja,

mercados à vista e de derivativos (que são de liquidação diferida). 2

Aizenman (2008, p. 1), no The New Palgrave Dictionary of Economics, define países de mercados emergentes

como “countries (…) that are not well established economically and financially, but are making progress in that

direction”. Nesta tese, será utilizado o termo países (ou economias) emergentes, que se referem aos “países

periféricos (ou em desenvolvimento) que se inseriram no processo de globalização financeira a partir dos anos

1990” (Prates, 2002, p.147).

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mobilidade de capitais, os dilemas entre o equilíbrio interno e externo (existentes no modelo

keynesiano de economia aberta, desenvolvido nos anos 1950) seriam eliminados, mas os

mecanismos de ajuste dependeriam do regime de câmbio adotado. No caso da adoção de um

regime de câmbio flutuante, a política monetária seria autônoma e eficaz, mas se abdicaria das

taxas de câmbio fixas já que os desequilíbrios de balanço de pagamentos seriam resolvidos

pelas variações da taxa de câmbio (e seu impacto sobre as exportações líquidas). Assim, seria

impossível combinar três objetivos considerados desejáveis nesta perspectiva: mobilidade de

capitais, autonomia de política monetária e estabilidade cambial.

No entanto, a suposta autonomia de política monetária e a política cambial passiva

pressupostas pelos modelos de Mundell e Flemming, não se verificaram de facto nos países

que adotaram o binômio mencionado acima (Masson et. al., 1997; Ostry et. al. 2012). A taxa

de câmbio, portanto, é alvo constante dos formuladores de política econômica, configurando-

se, assim, um regime de flutuação suja em grande parte dos países emergentes.

Dessa forma, diversos autores passaram a investigar não apenas as motivações

para o uso da política cambial, mas também as razões teóricas da diferença entre o regime

macroeconômico (vigente) de jure e de facto. Em relação às motivações, as intervenções

frequentes dos bancos centrais foram relacionadas a diversos fatores, dentre eles o medo de

depreciar (fear of depreciation), em razão, principalmente, dos efeitos inflacionários3 e do

descasamento de moedas nos balanços dos agentes (Calvo & Reinhart, 1999 e 2002); e o

medo de apreciar (fear of apreciation), por conta dos impactos negativos sobre a

competitividade externa.

A expressiva acumulação de reservas internacionais nos períodos de alta do ciclo

de liquidez internacional – entre 2003 e 2007 e 2009 e 2011 - é uma manifestação dos

fenômenos acima. Conforme Aizemann & Lee (2007), essa acumulação decorre tanto da

chamada demanda precaucional – associada ao receio dos impactos adversos de reversões

súbitas dos fluxos de capitais sobre a taxa de câmbio e, consequentemente, a situação

patrimonial dos agentes – quanto do “motivo mercantilista” – relacionado à perseguição de

uma taxa de câmbio competitiva e, portanto, ao medo de apreciar. A adoção do regime de

3 Os efeitos inflacionários decorrem do maior impacto das variações cambiais sobre os preços domésticos nas

economias emergentes em relação aos países desenvolvidos. O repasse da taxa de câmbio para a inflação (pass-

through) é definido como a variação percentual nos preços domésticos devido a uma variação de 1% na taxa de

câmbio (ver Aron et. al., 2014 e Farhi, 2006).

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flutuação suja implica, portanto, a existência de uma dualidade impossível, nos termos de

Flassbeck (2001), ou de um “dilemma”, nos termos de Rey (2013) – ao invés da trindade

impossível ou do “trilemma” mencionados acima. Ou seja, num contexto de livre mobilidade

de capitais, a necessidade de intervenção – pelos motivos supracitados - restringe a autonomia

de política monetária.

BIS (2005), Moreno (2005), Mohanty & Berger (2013) e Domanski et. al. (2016)

sistematizaram tais motivações por meio de entrevistas junto aos bancos centrais dos países

emergentes. Conforme Moreno (2005), sob o regime de flutuação suja, as intervenções

refletem, em parte, o desejo das autoridades monetárias de manter a estabilidade

macroeconômica e financeira. Já Domanski et al. (2016) sugere que as motivações não

dependem apenas do regime monetário adotado, mas também da exposição dos países a

choques externos, das posições dos agentes em moeda estrangeira e de outras circunstâncias

macroeconômicas. Alguns autores, como Archer (2005), Domanski et. al. (2016) e Prates

(2007), buscaram também mapear as motivações, bem como outras categorias da política

cambial, como metas, canais de transmissão e instrumentos de intervenção.

A relevância de cada categoria da política cambial sofreu alterações ao longo do

tempo, especialmente após a Crise Financeira Global (CFG), que eclodiu em setembro de

2008, com a falência do banco de investimento Lehman Brothers. O aumento da dívida em

moeda estrangeira nas economias emergentes e do descasamento de moeda no balanço dos

agentes no período pós-crise aumentou ainda mais a preocupação das autoridades monetárias

em relação à estabilidade financeira e, consequentemente, à frequência das intervenções, em

comparação ao período pré-crise4.

Já as justificativas teóricas do uso da política cambial são heterogêneas na

literatura econômica. Em linhas gerais, a literatura mainstream5 associa o uso da política

cambial, no âmbito do binômio regime de câmbio flutuante-metas de inflação, à fragilidade

dos fundamentos macroeconômicos e à falta de credibilidade e transparência das autoridades

monetárias. Ou seja, a política cambial ativa representa uma distorção do modelo do NCM,

4

O período “pré-crise” compreende a fase de alta do ciclo de liquidez internacional, de 2003 a 2007. Já o “pós-

crise” se inicia a partir da eclosão da CFG e se estende até a data de conclusão desta tese. Para uma análise do

período pós-crise e suas fases, ver Farhi (2012). 5 Visão convencional ou “[...]mainstream economics is that which is taught in the most prestigious universities

and colleges, gets published in the most prestigious journals, receives funds from the most important research

foundations, and wins the most prestigious awards” (DEQUECH, 2007, p. 281).

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que sustenta o regime de metas de inflação. Contudo, após a eclosão da CFG, o papel da taxa

de câmbio no arcabouço teórico convencional foi repensado por alguns autores. De acordo

com Blanchard et. al. (2010) e Ostry et. al. (2012), no binômio regime de metas de inflação–

câmbio flutuante, a taxa de câmbio deveria ser um objetivo de política juntamente com a

estabilidade de preços:

“(..)benign neglect of large exchange rate movements that are

inconsistent with the multilateral medium-run equilibrium are unlikely

to be the right policy even under an IT framework. If two policy

instruments are available (the policy interest rate and foreign

exchange market intervention), then they should be used in tandem to

achieve both price-stability and exchange-rate objectives”(Ostry et.

al., 2012, p. 21)

Em contrapartida, a abordagem keynesiana-estruturalista adotada nesta tese

relaciona a política cambial dos países emergentes à inserção assimétrica desses países no

Sistema Monetário e Financeiro Internacional (SMFI) contemporâneo (Belluzzo, 1997;

Prates, 2002; Ocampo, 2001; De Conti, 2011; Andrade & Prates, 2013; Kaltenbrunner, 2016;

Paula, Fritz & Prates, 2016). De acordo com esse arcabouço teórico, o caráter ilíquido6 das

moedas periféricas neste sistema – no qual o dólar flexível, financeiro e fiduciário é a divisa-

chave – resulta numa assimetria monetária, que, somada à assimetria financeira7, torna as

taxas de câmbio (e de juros) mais vulneráveis aos movimentos do ciclo de liquidez

internacional (Belluzzo, 1997; Prates, 2002; De Conti, 2011; Andrade & Prates, 2013;

Kaltenbrunner, 2016). Consequentemente, as políticas monetária e cambial dos países

emergentes também se tornam mais suscetíveis às decisões de política monetária do país

emissor da divisa-chave, resultando, portanto, num menor grau de autonomia de política

macroeconômica – assimetria macroeconômica, nos termos de Prates (2002) e Ocampo

(2001a e 2001b).

6

O caráter ilíquido das moedas periféricas decorre do baixo prêmio de liquidez dessas moedas no plano

internacional, como será analisado no primeiro capítulo. 7 Conforme Prates (2002), a assimetria financeira possui duas dimensões: a preponderância dos fatores externos

na determinação dos fluxos de capitais para os países emergentes; e a inserção marginal desses países no volume

total dos fluxos.

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21

O grau de autonomia de política associado ao conceito de assimetria

macroeconômica está relacionado ao conceito de espaço de política (policy space), que tem

sido utilizado mais recentemente, podendo ser definido como “the scope for domestic

policies, especially in the areas of trade, investment and industrial development” (UNCTAD,

2004, p. 2). Ou, nos termos do South Centre (2005, p. 1), “freedom to choose the best mix of

policies possible for achieving sustainable and equitable economic development given their

unique and individual social, political, economic, and environmental conditions”. Ou seja,

como definido na literatura, o policy space refere-se ao conjunto das políticas econômicas e

sociais. Assim, utilizar-se-á aqui como sinônimos os termos “grau de autonomia de política”,

“grau de espaço de política” e “grau de assimetria” para se referir às políticas

macroeconômica, cambial e monetária.

Conforme a abordagem teórica supracitada, o contexto de livre mobilidade de

capitais implica, por si só, perda de autonomia de política não somente monetária (como na

hipótese da dualidade impossível apresentada acima), mas também cambial nos países

emissores de moedas ilíquidas no plano internacional. Neste contexto, a política cambial

exerce um papel crucial, já que sua interação com a abertura financeira e a institucionalidade

do mercado de câmbio, influência a autonomia das demais políticas macroeconômicas, como

se verá ao longo desta tese.

Alguns autores que compartilham essa abordagem já aplicaram o referencial

teórico das assimetrias monetária e financeira na análise da política cambial nos países

emergentes. De Conti (2011) aponta, de maneira geral, os maiores dilemas de política

monetária e cambial em comparação com os países centrais. Andrade & Prates (2013) e

Kaltenbrunner (2016) adaptaram a equação de retorno (teoria da precificação) dos ativos

apresentada por Keynes (1936, cap. 17) para analisar as especificidades da dinâmica da taxa

de câmbio desses países. Paula, Fritz & Prates (2016, p.15), por sua vez, discutem os limites

da política cambial nos países emissores de moedas periféricas também utilizando essa

equação. Já Prates (2015) e Rossi (2014) analisam a gestão do regime de câmbio flutuante no

Brasil, destacando os dilemas e desafios decorrentes da posição da moeda brasileira na

hierarquia.

A partir desses trabalhos, verificou-se a necessidade de maior detalhamento e

sistematização das conexões entre as assimetrias do SMFI e o espaço de política cambial nos

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países emergentes. Duas perguntas emergiram: de que forma o espaço de política cambial dos

países emissores de moedas periféricas é afetado pelas assimetrias do SMFI? Como a política

cambial pode responder a essas assimetrias e, consequentemente, aumentar o seu grau de

autonomia?

O objetivo desta tese, portanto, é responder a essas questões, ou seja, aprofundar e

sistematizar as inter-relações entre o referencial teórico keynesiano-estruturalista e a política

cambial nos países emergentes. Para atingi-los, ela foi estruturada em três capítulos. Os dois

primeiros capítulos se debruçam na construção – por meio de revisão bibliográfica e

estatística descritiva - dos condicionantes estrutural (as assimetrias do SMFI) e domésticos,

que conformam o referencial teórico e analítico. Assim, o capítulo I discute, inicialmente, as

definições e a taxonomia da política cambial, bem como as justificativas teóricas para o seu

uso na literatura do mainstream e na abordagem keynesiana-estruturalista. Em seguida, as

conexões entre o que se denomina aqui de condicionante estrutural e o espaço de política

cambial são estabelecidas para os países emergentes que adotam o binômio regime de metas

de inflação–câmbio flutuante. O segundo capítulo se dedica ao detalhamento dos

condicionantes domésticos – nos países emergentes que adotam o regime macroeconômico

supracitado - e suas relações com o condicionante estrutural. Por fim, a análise da política

cambial de acordo com os condicionantes será aplicada a quatro estudos de caso - Brasil,

México, Turquia e Coréia do Sul - no terceiro capítulo. Cada caso envolve dois tipos de

análises – qualitativa, a partir do referencial construído nos dois primeiros capítulos, e

quantitativa, utilizando estatística descritiva e econometria -, a fim de verificar a efetividade

das intervenções que melhor responderam aos condicionantes estrutural e domésticos.

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Capítulo 1

Perspectivas teóricas da política cambial nos países emergentes

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Introdução

O fim do período das finanças reguladas – sob o regime de Bretton Woods – na

década de 1970 marcou o começo de uma era de instabilidades nas taxas de juros e de

câmbio. Esse novo ambiente decorreu não somente do colapso das taxas de câmbio fixas nos

países centrais8, mas também de outras transformações profundas no Sistema Monetário e

Financeiro Internacional (SMFI), dentre as quais a proliferação de inovações financeiras9 e o

processo de globalização financeira. Tais transformações impactaram a partir do início dos

anos 1990 os sistemas financeiros dos países emergentes que, sob a égide do Consenso de

Washington10

, promoveram a abertura de seus mercados financeiros e, consequentemente, se

tornaram vulneráveis aos movimentos dos fluxos de capitais, especialmente dos capitais de

curto prazo. Esse processo de integração dos mercados periféricos aos mercados financeiros

internacionais, por sua vez, contribuiu para as diversas crises financeiras (cambiais e

bancárias) que atingiram os países emergentes na segunda metade da década de 1990 e início

dos anos 2000 (Belluzzo, 2009; Carvalho et. al., 2015; Prates, 2002).

Essas crises provocaram uma reação na literatura econômica convencional, que

passou a investigar os motivos pelos quais as crises financeiras tornaram-se tão frequentes nos

países emergentes. Neste contexto, novas recomendações de política surgiram, em especial na

literatura sobre escolha de regimes de câmbio. Boa parte dessa literatura passou a recomendar

as soluções polares dos regimes de câmbio, endossadas por alguns organismos multilaterais.

Ou seja, num contexto de livre mobilidade de capitais, os países deveriam aderir a regimes de

câmbio fixo ou de flutuação pura. Em consonância com essa teoria, um número crescente de

países migrou formalmente para os polos nesse período, sendo que a maioria optou pelos

regimes de flutuação pura (Reinhart & Rogoff, 2004; Levy-Yeyati e Stuzernegger, 2013).

8 Para efeitos de simplificação, países desenvolvidos, países centrais e países avançados serão considerados

sinônimos. 9 Tais inovações referem-se ao desenvolvimento de novos serviços e produtos financeiros a partir dos anos 1970

no contexto de desregulamentação dos mercados financeiros dos países centrais e aumento da importância e/ou

emergência dos investidores institucionais. Dentre as principais inovações no período, destaca-se a securitização

(emissão de títulos em mercados primários e transformação de ativos não-negociáveis em negociáveis), os

derivativos financeiros e (Carvalho et. al., 2015). 10

O termo Consenso de Washington foi cunhado por Willamson (1990) para se referir a uma pauta de reformas

exigida para a América Latina por organismos multilaterais (FMI e Banco Mundial), pelos ministros das

finanças do G7 e pelos bancos credores. Tais reformas incluíam um programa de estabilização macroeconômica

ortodoxo, desregulação dos mercados domésticos, privatização de empresas estatais, abertura comercial e

retirada das restrições ao investimento direto externo (Cintra, 1997).

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No entanto, de fato, a maioria desses países adotaram formalmente regimes de

flutuação pura, utilizando a política cambial para conter o impacto da variação da taxa de

câmbio sobre os balanços dos agentes públicos e privados (em função do descasamento de

moedas) e sobre o nível de preços (pass-through), bem como para acumular de reservas

internacionais no período de boom pré-crise (2003-2007). Assim, como já destacado na

Introdução, o medo de flutuar dos países emergentes revelou a necessidade da política

cambial, mesmo na presença formal de outra âncora nominal, no caso a taxa de juros – nos

países que adotaram o regime de metas de inflação (Calvo & Reinhart, 2002 e Aizenman &

Lee, 2007). Somente após a eclosão da crise financeira global em 2008, a política cambial

num regime de câmbio flutuante (ou seja, a flutuação suja) passou a ser recomendada pelos

organismos multilaterais, inclusive com propostas de inclusão formal dessa política no

arcabouço teórico dos regimes de metas de inflação (Ghosh et.al., 2015).

Contudo, ainda há várias controvérsias na literatura sobre o tema, inclusive em

relação ao conceito de política cambial. Assim, o primeiro objetivo do presente capítulo,

objeto da primeira seção (seção 1.1), é definir o conceito de política cambial que permeará

esta tese a partir da revisão dos conceitos disponíveis na literatura e, em seguida, desenvolver

uma taxonomia de política cambial que servirá de base para as análises posteriores. O

segundo objetivo é investigar as causas relatadas pela literatura para o uso da política cambial

nos países emergentes e apresentar a abordagem keyenesiana-estruturalista das assimetrias

monetária e financeira do SMFI como a perspectiva teórica desta tese (seção 1.2). Por fim, o

terceiro objetivo é estabelecer as conexões entre as assimetrias e política cambial, a fim de

detalhar as restrições de política cambial nos países emergentes, emissores de moedas

denominadas aqui de periféricas (seção 1.3).

1.1 Política cambial: conceitos e taxonomia

A definição de política cambial não é consenso na literatura sobre o tema e nos

discursos e relatórios dos bancos centrais responsáveis pela condução dessa política. De

maneira geral, o termo “política cambial” não é frequentemente utilizado pela literatura do

mainstream, que prefere segmentar a análise sobre o tema entre política monetária

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(especificamente, política de taxa de juros), intervenção no mercado de câmbio e instrumentos

de gestão dos fluxos de capitais, que incluem controles de capitais e regulação financeira

prudencial (ver seção 1.3). Apesar da pouca atenção dada à questão conceitual, pode se

identificar quatro definições na literatura, que se distinguem pela amplitude que se dá à

política cambial.

A definição mais restrita considera apenas as transações do Banco Central no

mercado de câmbio que são esterilizadas – ou seja, os impactos monetários são neutralizados

por meio de operações de mercado aberto11

– e que possuem como propósito influenciar a

taxa de câmbio (Edison, 1990; Dominguez, 1998; Moreno, 2005; Jurgensen, 1983). No

entanto, essa definição restrita da política cambial ignora alguns pontos importantes,

relacionados principalmente aos países emergentes (Moreno, 2005).

A primeira controvérsia refere-se às limitações das intervenções esterilizadoras

nos países emergentes. De acordo com Canales-Kriljenko (2004), somente 25% dos países

emergentes esterilizam sempre suas intervenções no mercado de câmbio. Ademais, conforme

Mohanty e Turner (2005) e Moreno (2011), a contenção do impacto monetário via operações

de mercado aberto é dificultada por diversos fatores, dentre eles a substitutibilidade imperfeita

entre os ativos denominados em moeda estrangeira e os títulos emitidos pelos bancos centrais

e/ou pelo tesouro desses países; os elevados custos que envolvem essas operações12

; e o

volume das operações de esterilização podem não ser suficientes para neutralizar a

intervenção no mercado de câmbio (Prates, 2007).

O segundo ponto desconsiderado nessa definição refere-se ao critério utilizado na

distinção entre intervenção esterilizadora e não-esterilizadora. Enquanto grande parte dos

livros-texto, que compartilham dessa visão, adota um critério quantitativo (impacto sobre a

base monetária), o critério relevante de análise é o impacto da intervenção nas taxas de juros

(tanto a taxa básica quanto as taxas de juros do mercado monetário). Dessa forma, o impacto

monetário de uma intervenção não precisa ser necessariamente neutralizado, já que outros

11

Uma definição semelhante é dada por Edison (1990, p.7): “(...) sterilized intervention is a pure change in the

relative stocks of national-currency bonds held by the public that is not accompanied by a change in the

monetary base”. 12

Esses custos estão associados, principalmente, às operações de esterilização do impacto monetário do acúmulo

de reservas internacionais, já que a taxa de juros que incide sobre essas operações (mediante seja a emissão de

títulos públicos, seja operações compromissadas) é geralmente mais elevada do que a remuneração das reservas

internacionais, aplicadas no mercado financeiro do país emissor da divisa-chave (Estados Unidos) ou de

países/regiões emissores de moedas centrais (como a área do euro).

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fatores autônomos (que impactam a demanda e oferta de moeda) podem contribuir para

manter a taxa de juros constante (Prates, 2007; Moreno, 2005).

Por fim, o terceiro ponto ignorado refere-se aos objetivos da política cambial. Os

propósitos das intervenções das autoridades monetárias nos mercados de câmbio emergentes

vão além da influência na taxa de câmbio. De acordo com as entrevistas realizadas junto a

diversos Bancos Centrais de países emergentes pelo Bank of International Settlements (BIS)

em 2005 e 2013, as intervenções no mercado de câmbio possuem diversos objetivos, dentre

eles a acumulação de reservas internacionais, a estabilidade financeira e a redução da

vulnerabilidade externa – tais objetivos serão detalhados a seguir.

As diversas limitações da definição acima apresentada são contrastadas com

visões mais amplas da política cambial. Nesse contexto, há uma segunda definição na

literatura, na qual a política cambial é vista como “any sale or purchase of foreign exchange

against domestic currency which monetary authorities undertake in the exchange market”

(Jurgensen, 1983, p. 82). As intervenções aqui são tratadas de forma mais ampla e se

estendem não somente ao mercado de câmbio à vista, mas também ao de derivativos, por

meio do uso de swaps, opções, etc.

A terceira definição considera como política cambial “qualquer transação que

altera a posição líquida em moeda estrangeira do setor público” (Prates, 2007, pp. 8; Archer,

2005). Dessa forma, além das intervenções – realizadas pelo Banco Central e pelo Tesouro –

nos mercados à vista e de derivativos mencionadas na definição anterior, essa abordagem

também engloba as operações de dívida denominadas ou indexadas em moeda estrangeira

(Archer, 2005).

Por fim, a quarta definição amplia ainda mais o horizonte da política cambial, pois

inclui as “intervenções passivas”, ou seja, operações de compra/venda de moeda estrangeira

fora do mercado de câmbio, realizadas pelo Banco Central junto a entidades públicas ou

privadas (Adam & Henderson, 1983). Um exemplo desse tipo de intervenção, que será visto

no terceiro capítulo, é a compra, pelo Banco Central do México, dos dólares gerados pela

Petróleos do México (PEMEX).

A definição de política cambial adotada por essa tese também é mais ampla,

quando comparada ao conceito restrito de intervenção esterilizadora, porém se limitará apenas

ao lócus de negociação da taxa de câmbio, ou seja, aos mercados de câmbio à vista e de

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derivativos, se aproximando, portanto, da definição adotada por Archer (2005) e Prates (2007)

– descrita acima. No entanto, vale acrescentar à discussão conceitual dois pontos.

O primeiro deles refere-se aos instrumentos que não alteram a posição líquida em

moeda estrangeira do setor público, mas são utilizados a fim de atender diretamente objetivos

de política cambial. Por exemplo, algumas regulações macroprudenciais, como a definição de

limites para posição líquida em moeda estrangeira dos bancos no mercado de derivativos,

visam conter a volatilidade cambial e/ou evitar a apreciação de uma determinada moeda e,

portanto, podem ser considerados instrumentos de política cambial. Outros exemplos incluem

também instrumentos de controle de capitais e regulações na posição dos agentes que operam

no mercado de derivativos de câmbio (Fritz & Prates, 2015). Como tais medidas fogem das

definições listadas acima, alguns autores referem-se às regulações macroprudenciais e aos

controles de capitais como instrumentos auxiliares ou políticas complementares à política

cambial (Mohanty & Berger, 2013; Prates, 2014).

O segundo diz respeito à relação entre política monetária e taxa de câmbio,

especificamente a relação entre a variação da taxa de juros básica e a variação da taxa de

câmbio nominal. O tema ganhou especial relevância após a adoção do regime de metas de

inflação por vários países emergentes. Nesse arcabouço teórico, a taxa de juros serve como

âncora nominal do nível preços de bens e serviços e do nível do produto de numa determinada

economia. Porém, de acordo com os teóricos do regime de metas de inflação, em situações

específicas, a taxa de juros pode ser utilizada com o intuito de impactar a trajetória e o nível

da taxa de câmbio, corrigindo os desvios dessa taxa em relação à suposta taxa de câmbio de

equilíbrio e servindo, portanto, como política cambial (ver Banbula et. al., 2011 e Corsetti et.

al., 2010).

Contudo, é importante ressaltar que o impacto de uma variação na taxa de juros

sobre a posição líquida em moeda estrangera dos agentes participantes do mercado de câmbio

(por meio da alteração da rentabilidade dos títulos denominados em moeda doméstica em

posse de investidores estrangeiros, por exemplo) é indireto, ou seja, os juros afetam a

remuneração dos títulos denominados numa determinada moeda doméstica que, por sua vez,

provoca mudanças na posição em moeda estrangeira dos agentes participantes do mercado de

câmbio. Ou seja, o lócus da política monetária é o mercado de reservas, onde são realizadas as

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operações de mercado aberto, sendo os efeitos sobre esse mercado transmitidos para a taxa de

câmbio (ver Quadro 1.1).

Quadro 1.1 - A transmissão entre taxa de juros e câmbio

Fonte: Elaboração Própria

Tendo em vista as duas considerações supracitadas, a política cambial vai além

das variações na posição líquida em moeda estrangeira do setor público – definição adotada

por Archer (2005) e Prates (2007) -, incluindo também qualquer ação, por parte das

autoridades monetárias, que impacta diretamente a posição líquida em moeda estrangeira dos

agentes participantes do mercado de câmbio (à vista e de derivativos). Essa ampliação

incorporaria, portanto, os instrumentos de regulação macroprudencial, de controles de capitais

e de regulação do mercado de derivativos.

A escolha dessa definição mais ampla vai ao encontro das características do

processo de globalização financeira, que, conforme mencionado, integra mercados de câmbio

de diferentes temporalidades (à vista e de derivativos). Tais mercados são marcados pela

atuação de bancos universais e globais, que possuem em seus portfólios moedas centrais e

periféricas (Hardie & Howart, 2013). O aumento da alavancagem das posições desses

investidores globais ao longo do processo de globalização financeira ressaltou sua

importância nos diferentes mercados de câmbio domésticos e, ao mesmo tempo, exigiu nos

últimos anos – especialmente no período pós-crise – uma ampliação dos instrumentos de

Variação nos juros básicos

Alteração na rentabilidade dos títulos domésticos

Mudança na posição líquida em moeda estrangeira dos agentes no mercado a vista e futuro

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30

intervenção dos Bancos Centrais, pois o aumento no volume de intervenção já não era

condição suficiente para conter os movimentos das taxas de câmbio. Dessa forma, as ações do

Banco Central no mercado de câmbio passaram a considerar como opção – ainda que auxiliar

- a gestão dos fluxos de capitais e do mercado de derivativos, a fim de lidar com a nova

configuração dos mercados de câmbio supracitada (Prates, 2015).

A definição adotada acima permite o desenvolvimento de uma taxonomia da

política cambial, que será dividida em cinco categorias de análise: objetivos

macroeconômicos, metas (objetivos específicos), indicadores monitorados, canais de

transmissão e instrumentos de intervenção13

. A análise de cada categoria é baseada tanto na

literatura empírica quanto em entrevista realizadas junto a Bancos Centrais de países

emergentes e desenvolvidos (ver, por exemplo, BIS, 2005 e 2013; Neely, 2005; Lecourt,

2006).

Ainda que motivações relacionadas à estabilidade financeira sejam explicitadas

pelas autoridades monetárias, os objetivos relacionados a mudanças na trajetória ou

manutenção de um determinado nível da taxa de câmbio dificilmente são divulgados pelos

Bancos Centrais comprometidos com algum tipo de regime de flutuação (pura ou suja). Dessa

forma, a identificação dos principais objetivos macroeconômicos se dá por meio das

entrevistas realizadas junto às autoridades monetárias e das análises das intervenções em cada

país emergente. De maneira geral, Moreno (2005), Mohanty & Berger (2013) e Prates (2007)

destacam quatro objetivos gerais: controle da inflação, equilíbrio e competitividade externa,

estabilidade financeira (prevenção de crises e desordens de mercado) e redução da

vulnerabilidade externa e melhora na classificação de risco de crédito (rating) soberano.

Neste contexto, os objetivos macroeconômicos impõem metas (ou seja, objetivos

específicos) a serem alcançadas e que se resumem, basicamente, ao controle da volatilidade e

movimentos abruptos na taxa câmbio e/ou a manutenção de um determinado nível ou

trajetória desse preço-chave. Moreno (2005) sugere que tais metas variam de acordo com o

regime de câmbio adotado por cada país. Ou seja, em países com regime de câmbio

intermediário, os objetivos macroeconômicos são alcançados principalmente por meio da

influência sobre o nível da taxa de câmbio. Já em países que possuem regimes de câmbio

13

Moreno (2005) e Prates (2007) também propuseram uma taxonomia e classificam a política cambial de acordo

com seus objetivos macroeconômicos, metas (ou objetivos específicos) e indicadores monitorados.

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flutuante, a resistência a movimentos abruptos do patamar da taxa de câmbio, a redução da

volatilidade e a acumulação de reservas internacionais são os principais objetivos específicos

das autoridades monetárias (Quadro 1.2).

Outra categoria fundamental para a análise da política cambial são os canais de

transmissão, que ganharam uma atenção especial no contexto da globalização financeira e

abertura dos mercados financeiros domésticos, principalmente ao longo da década de 1990

(Neely, 2005). A literatura relata com mais frequência dois canais pelos quais a intervenção

no mercado de câmbio opera: o canal de equilíbrio de portfólio e o canal das expectativas

(Mussa, 1981; Dominguez & Frankel, 1993; Kaminsky & Lewis, 1996; Fatum e Hutchison,

1999, Archer, 2005). Uma dada intervenção (esterilizadora) opera por meio do canal de

portfólio quando provoca mudanças na escassez relativa entre ativos domésticos e

estrangeiros, grande parte deles considerados substitutos imperfeitos pelos agentes

participantes do mercado de câmbio (Dominguez & Frankel, 1993; Archer, 2005). Já o canal

das expectativas é efetivo quando os sinais emitidos pelas autoridades monetárias via

intervenção impactam a previsão não somente da taxa de câmbio futura, mas também de

outras variáveis macroeconômicas (Kaminsky & Lewis, 1996; Fatum e Hutchison, 1999).

O suporte empírico insuficiente dos dois canais acima estimulou a pesquisa de

outros possíveis canais pelos quais a política cambial poderia operar (Reitz & Taylor, 2007).

Neste contexto, a análise das intervenções por meio dos modelos de microestrutura do

mercado de câmbio ganhou relevância nos anos 1990. De acordo com essa abordagem,

mecanismos específicos das operações (de compra e venda) no mercado de câmbio podem

afetar a taxa de câmbio (Dominguez, 1997; Lyons, 2000). As intervenções do Banco Central

operariam por meio da alteração do padrão das ordens de compra e venda dos agentes

(traders) que atuam no mercado de câmbio (Archer, 2005). Essa alteração ocorreria por meio

de dealers, ou seja, instituições financeiras utilizadas pelos Bancos Centrais para transmitir

uma determinada informação (aos demais agentes do mercado sem acesso a essa informação)

via fluxo de ordens (Reitz & Taylor, 2008). Ou seja, a assimetria de informação entre os

agentes do mercado de câmbio seria o principal mecanismo de transmissão das intervenções

do Banco Central.

Ademais, Taylor (1994, 2004, 2005), Sarno & Taylor (2001) e Reitz & Taylor

(2006) propuseram, em face de resultados não conclusivos de outros canais de transmissão, o

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canal da coordenação, no qual a intervenção do Banco Central operaria por meio da resolução

de falhas de coordenação no mercado de câmbio. Tais falhas ocorreriam, principalmente, em

momentos de predomínio das análises técnicas (ou grafistas) nas operações do mercado de

câmbio, afastando, assim, a taxa de câmbio de seus fundamentos (representados pelas análises

fundamentalistas). Ao perceber esse cenário, o Banco Central anunciaria sua intervenção,

coordenando as ações dos traders fundamentalistas, que, por sua vez, levariam a taxa de

câmbio de volta para um nível consistente com os fundamentos macroeconômicos.

No caso das intervenções não esterilizadoras, há ainda o canal da política

monetária, que transmite – de forma indireta, como visto acima - os efeitos da mudança no

diferencial entre os juros domésticos e os juros do mercado monetário internacional para a

taxa de câmbio (Archer, 2005).

Por fim, os instrumentos de política cambial são a última categoria de análise

proposta por essa taxonomia. A variedade desses instrumentos está diretamente relacionada

ao conceito de política cambial que se adota. Ou seja, quanto mais restrito o conceito de

política cambial, menor o leque de instrumentos disponíveis.

O instrumento de intervenção mais utilizado pelos Bancos Centrais é a compra ou

venda de moeda estrangeira no mercado de câmbio ou títulos (soberanos) denominados em

moeda estrangeira (Adler e Tovar, 2013; Mihailov, 2016). Conforme mencionado, esse tipo

de intervenção é acompanhada por operações de esterelização, que podem ser feitas tanto por

instrumentos convencionais – principalmente títulos emitidos pelo Banco Central ou pelo

tesouro - quanto por instrumentos não convencionais - requerimento de reservas e depósitos

governamentais principalmente (Mohanty & Berger, 2013; Gabor, 2016).

Apesar de menos frequentes, os instrumentos de intervenção nos mercados de

derivativos de câmbio ganharam maior relevância após a crise financeira global de 2008,

principalmente nos países emergentes (Mohanty & Berger, 2013). Nesse mercado, há três

instrumentos frequentemente utilizados pelas autoridades monetárias: a compra ou venda de

câmbio futuro, os swaps e as opções (Adler e Tovar, 2013).

O contrato de compra ou venda de moeda estrangeira nos mercados futuro e

forward de câmbio é feito sob uma taxa de câmbio pré acordada entre as partes e pode ser

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deliverable ou non-deliverable14

. Já FX swaps envolvem a compra e venda de moedas

estrangeiras em duas datas diferentes. Ou seja, tal operação envolve a compra de moeda

estrangeira no mercado spot e a venda dessa mesma moeda no mercado a termo de câmbio,

que é liquidada à taxa spot prevalecente no final do contrato (Quadro 1.1).

As opções de câmbio, por sua vez, dão direito ao seu titular comprar ou vender

moeda estrangeira a uma taxa pré-fixada (preço de exercício) durante um determinado

período de tempo. As opções mais utilizadas pelas autoridades monetárias para intervenção

são as opções cambias de venda (put), que dão o direito ao seu portador de vender moeda

estrangeira para o Banco Central de acordo com condições pré estabelecidas. O uso desse

instrumento pelas autoridades monetárias tem como objetivo principal conter movimentos de

apreciação de uma determinada moeda ou acumular reservas internacionais (Adler e Tovar,

2008; Prates, 2014).

Quadro 1.1: Segmentos do mercado de câmbio onshore e offshore

Instrumento Definição

À Vista Transações entre duas moedas a uma taxa

acordada em contrato e entregue em D+2.

Futuro e Outright forwards

Transações entre duas moedas a uma taxa

acordada em contrato para entrega em

mais de dois dias. O BIS contabiliza nesta

rubrica o Non Deliverable Forward

(NDF), que não envolve entrega física,

mas a margem líquida da variação entre as

duas moedas.

Swap cambial (FX swaps)

Transações envolvendo a taxa de câmbio

spot entre duas moedas de um lado (short

leg) e a taxa de câmbio a termo entre as

mesmas moedas de outro (long leg).

14

Os ganhos e perdas de um instrumento non-deliverable são liquidados na moeda doméstica. Já as operações

envolvendo instrumentos deliverables são liquidadas na moeda estrangeira de denominação do contrato, em

geral dólar ou euro (Prates, 2014).

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Swap de moedas

Contratos nos quais as partes se

comprometem a trocar variações de juros

e/ou principal nas diferentes moedas

envolvidas.

Opções

Contratos de opção que oferecem o direito

de comprar ou vender uma moeda a uma

taxa de câmbio especifica durante um

determinado período. Em troca desse

direito, os investidores pagam um

determinado prêmio.

Fonte: Prates (2015) e Rossi (2014)

Já os instrumentos de Gestão dos Fluxos de Capitais (GFC) e de regulação do

mercado de derivativos, seguindo a definição mais ampla aqui adotada, constituem

instrumentos de política cambial porque impactam diretamente a posição líquida em moeda

estrangeira dos agentes participantes do mercado de câmbio na medida em que afetam o

retorno sobre uma determinada moeda (enquanto ativo financeiro), como será analisado nas

próximas seções. O crescimento do uso de tais instrumentos no período pós-crise gerou

diversas revisões na literatura acerca da definição de gestão dos fluxos de capitais15

. Partindo

da abordagem de Epstein, Gabriel & Jomo (2004) e dos aperfeiçoamentos de Fritz e Prates

(2014), a gestão dos fluxos de capitais engloba os controles de capitais e as regulações

prudenciais. Fritz & Prates (2014, p.9) definem como controles de capitais uma variedade de

instrumentos de regulação (price ou quantitative-based, residency ou currency-based)

destinados a gerir os fluxos de entrada e saída de capitais que não são intermediados pelo

sistema bancário e, portanto, não pertencem ao escopo da regulação prudencial. A regulação

prudencial, por sua vez, consiste em instrumentos regulatórios que afetam a posição de ativos

e passivos dos bancos (ou de outras instituições financeiras) residentes. Apesar de distintos,

esses dois instrumentos têm como objetivo em comum afetar os fluxos de capitais, por razões

seja prudenciais, seja macroeconômicas (Prates & Fritz, 2016).

15

Ver Prates & Fritz (2016) para uma revisão de literatura sobre o tema.

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35

No entanto os instrumentos de gestão dos fluxos de capitais possuem algumas

limitações, especialmente para países com mercados de derivativos de câmbio mais

sofisticados. No caso das regulações prudenciais, as operações “fora de balanço” não estão no

escopo desse instrumento, destinado apenas às movimentações registradas nos balanços das

instituições financeiras. Já os controles de capitais concentram seus efeitos sobre as operações

inter-fronteiriças e possuem reduzido impacto, portanto, sobre os mercados de derivativos de

câmbio locais. Ou seja, os influxos de capitais envolvidos nas operações com derivativos

derivativos de câmbio - geralmente para cumprir requerimentos de margens – são marginais

em comparação aos volumes negociados nesses mercados, caracterizados pela elevada

alavancagem. Assim, uma “terceira classe” de instrumento emerge dessas limitações, a

regulação do mercado de derivativos de câmbio (ou gestão do mercado de derivativos de

câmbio), focada na regulação das posições de residentes e não-residentes nos mercados de

derivativos de câmbio locais (Prates & Fritz, 2016).

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36

Quadro 1.3: Taxonomia da política cambial nos países emergentes

Objetivos Macro Metas Indicadores

monitorados Canais de transmissão Instrumentos

Controle da inflação Resistir a movimentos abruptos

do patamar da taxa de câmbio.

Condições de mercado

(volumes transacionados;

posições dos diferentes

participantes)

Canal de equilíbrio de

portfólio.

Compra e venda de moeda

estrangeira no mercado à vista

ou derivativo de câmbio.

Competitividade externa Redução da volatilidade Repasse cambial Canal das expectativas Swaps de moedas

Estabilidade financeira Influência sobre o nível e

trajetória da taxa de câmbio Termos de troca Canal da microestrutura do

mercado de câmbio Opções de venda

Prevenção de crises e

desordens de mercado

Amortecer o impacto da variação

dos preços das commodities Fluxos de capitais Canal da coordenação dos

agentes

Compra/Venda de títulos

públicos indexados à taxa de

câmbio

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37

Redução da vulnerabilidade

externa e melhora do rating

soberano

Transações nos mercados

de derivativos Canal da política

monetária

Gestão dos fluxos de capitais e

regulação do mercado de

derivativos

Fonte: Moreno (2005) e Prates (2007). Elaboração própria

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1.2 Aspectos teóricos da política cambial nos países emergentes

A discussão teórica acerca do uso da política cambial em países emergentes

ganhou relevância após as crises financeiras da década de 1990, com constantes revisões da

literatura. Por um lado, um número crescente de países passou a adotar formalmente o regime

de metas de inflação e de flutuação cambial, reforçando aparentemente o consenso teórico em

torno desse binômio, no qual a política cambial está ausente (Levy-Yeyati & Sturzenegger,

2007). Por outro lado, vários países emergentes continuaram com uma política cambial,

revelando, portanto, que a adoção de fato de regimes de flutuação foi menor que o registrado

formalmente (Levy-Yeyati & Sturzenegger, 2013). Essa contradição provocou reações na

literatura do mainstream, que apresentou diversas explicações para o uso frequente da política

cambial nos países emergentes. A partir de uma breve revisão da literatura sobre escolha de

regimes de câmbio, esta seção relata as principais justificativas teóricas para o uso da política

cambial em países emergentes, mesmo com a presença formal de regimes de flutuação pura.

A escolha dos regimes de câmbio foi alvo recorrente da literatura em diversos

períodos da história. Mühlich (2014) organiza essa literatura em três gerações distintas. Em

linhas gerais, a primeira possui como referência central o modelo Mundell-Fleming (Mundell,

1963; Fleming, 1962), que atesta que a escolha entre o regime de câmbio fixo e o regime de

câmbio flexível depende da natureza dos choques (nominal ou real) e do grau de abertura

financeira. Numa economia aberta, com livre mobilidade de capitais, os regimes de flutuação

seriam ideais para absorver choques reais da economia, como a queda nas exportações ou no

crescimento econômico, enquanto os regimes de câmbio fixo seriam ideais para absorver

choques nominais, como a queda na demanda por moeda (Bordo, 2003). Uma das implicações

desse modelo é a trindade impossível ou “trilemma”, que atesta a impossibilidade de os países

atingirem simultaneamente autonomia de política monetária, integração financeira (via

abertura da conta financeira16

, ou seja, liberalização dos fluxos de capitais) e estabilidade da

taxa de câmbio (via regime de câmbio fixo), sendo possível coexistir apenas duas opções das

três acima (Obstfeld & Taylor, 1998).

16

A conta financeira refere-se à antiga conta de capital, denominada assim antes da adoção dos critérios da

BMP5 do FMI.

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39

A segunda geração concentra-se na credibilidade como aspecto central na escolha

dos regimes de câmbio e surgiu no contexto de estagflação das décadas de 1970 e 1980

(Bordo, 2003). Barro e Gordon (1983) ressaltam que, em economias abertas, a credibilidade

seria alcançada por meio da escolha de regimes intermediários – como de bandas cambiais -,

que disciplinariam as políticas monetária e fiscal, evitando inconsistências temporais e

tendências inflacionárias. Alguns autores dessa geração defendem a independência do Banco

Central, que representaria uma sinalização institucional de credibilidade (Larraín e Velascos,

2001).

Por fim, a terceira geração dessa literatura surge no contexto das crises que

atingiram os mercados emergentes na segunda metade da década de 1990 e possui diversas

intersecções com os modelos de terceira geração das crises cambiais (Mühlich, 2014, Prates,

2002). A vulnerabilidade dos regimes de câmbio intermediário a ataques especulativos levou

a um novo consenso na literatura, adotado pelo FMI, conhecido como soluções de canto (ou

polares) dos regimes de câmbio. Ou seja, na presença de livre mobilidade de capital (ou seja,

integração financeira), os países deveriam escolher entre regimes de flutuação pura ou

regimes de câmbio fixo – como currency boards, dolarização ou união monetária (Frankel,

1999; Frankel, Schmuckler e Servén, 2000).

À primeira vista, as soluções polares parecem ter guiado as escolhas de regimes

de câmbio dos países emergentes. A partir do final da década de 1990, um número crescente

desses países adotou formalmente o regime de flutuação pura, sendo que muitos deles

apoiaram-se numa âncora nominal (taxa de juros) para o controle inflacionário. A escolha

dessa nova âncora implicou também, na maioria dos casos, a adoção do Regime de Metas de

Inflação (RMI), que ditou novas regras na condução da política econômica17

e contou com a

“sanção” de organismos multilaterais (FMI, 2006; Einchengreen, 2002; Muhlich, 2014; Levy-

Yeyati et. al., 2013).

No entanto, a aparente dominância das soluções polares, especialmente dos

regimes de flutuação pura, não se verificou de fato nos países emergentes. Vários países que

anunciaram a adoção desse tipo de regime continuaram intervindo no mercado de câmbio e

condicionando sua política monetária aos movimentos cambiais (Calvo e Reinhart, 2002). Tal

17

Conforme ressalta Eichengreen (2002), Brasil, Chile, Colômbia, Israel, República Tcheca e Polônia adotoram

o regime de metas de inflação na segunda metade da década de 1990.

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40

fato levou a novas classificações dos regimes de câmbio, que mostraram um crescimento mais

tímido dos regimes de flutuação pura entre os anos 1990 e 2000 (Calvo & Reinhart, 2002;

Levy-Yeyati & Sturzenegger, 2013).

Calvo e Reinhart (2002) denominaram o fenômeno acima de “medo de flutuar”

(fear of floating) dos policy makers, que temiam os efeitos perversos provocados por

variações bruscas na taxa de câmbio e, portanto, adotavam deliberadamente políticas para

estabilizá-la.

Calvo e Reinhart (1999) pontuam que as crises cambiais que atingiram os países

emergentes na década de 1990 revelaram que tais países estão sujeitos a reversões abruptas

dos fluxos de capitais ou até a paradas súbitas (sudden stops) desses fluxos. Essa

instabilidade, combinada com o regime de câmbio flutuante, teria gerado volatilidade nas

taxas de câmbio dos países emergentes, provocando efeitos deletérios em suas economias,

caracterizadas pelos elevados pass-through e grau de descasamento de moedas (currency

mismacht) - passivos denominados em moeda estrangeira e sem hedge (ou seja, com risco de

variação cambial) em contrapartida a ativos denominados em moeda doméstica - nos balanços

dos agentes participantes do mercado (Aghion et al., 2001; Mühlich, 2014). Ademais, o

acúmulo de passivos em moeda estrangeira pelos países emergentes estaria associado, em

grande medida, à incapacidade desses países realizarem empréstimos no exterior

denominados em suas respectivas moedas, fenômeno conhecido posteriormente como pecado

original (original sin) (Eichengreen, Haussman & Panizza, 2002; Biancareli, 2010).

De acordo com Eichengreen & Haussman (1999, p. 12, tradução livre) “os

descasamentos de moeda e de prazos causados pelo original sin criam um dilema para a

política cambial”. Na presença de regimes de câmbio intermediário e fixo (excluindo os casos

de união monetária e dolarização), o aumento da taxa de juros, a fim de defender a moeda

doméstica de uma possível desvalorização, poderia gerar pressões sobre o passivo dos bancos

que possuem descasamento de prazos e resultar, assim, numa crise bancária e cambial – já que

as incertezas em relação ao sistema bancário gerariam mais pressões sobre moeda doméstica.

Por outro lado, a presença de regimes de flutuação também poderia gerar fragilidades nos

balanços dos agentes com descasamento de moedas. Nesse contexto, as autoridades

monetárias seriam mais relutantes em deixar a taxa de câmbio flutuar, evidenciando o

conceito do “medo de flutuar” exposto acima.

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Em contrapartida a esta visão sobre o crescimento de fato dos regimes de

flutuação, parte da literatura – ligada ao Novo Consenso Monetário - conclui que o binômio

regime de flutuação pura e RMI lograram êxito em estabilizar as taxas de câmbio. De acordo

com o Rose (2006, p. 663), os países que optaram por tal combinação:

“(...) place few restrictions on capital mobility and allow their

exchange rates to float. The domestic focus of monetary policy in

these countries does not have any obvious international cost. Inflation

targeters have lower exchange rate volatility and less frequent

‘‘sudden stops’’ of capital flows than similar countries that do not

target inflation”

De fato, o período de boom dos fluxos de capitais pré-crise (2003-2007) implicou

a apreciação das moedas dos países emergentes, além de relativa estabilidade dessas moedas,

como se verá nas próximas seções (para os países selecionados). Coincidentemente houve um

aumento do número de países emergentes que adotaram o RMI nesse período, além de

redução gradual no pass-through. No entanto, Yeyati & Stuzeneger (2013) mostram que as

intervenções no mercado de câmbio continuaram frequentes nesses países, principalmente por

meio da acumulação de reservas, seja pelo motivo precaucional – com o intuito de constituir

um colchão de liquidez contra momentos de turbulência -, seja pelo motivo mercantilista –

que visa, além da acumulação de reservas, a manutenção de uma taxa de câmbio competitiva

(Aizenman & Lee, 2007).

Após a crise financeira de 2008, a controvérsia da literatura não se concentrou

mais na necessidade ou não do uso da política cambial. Conforme mencionado na introdução

desta tese, a volta dos fluxos de capitais no segundo trimestre de 2009 provocou movimentos

indesejados nas taxas de câmbio dos países emergentes, que reagiram por meio da adoção de

uma miríade de instrumentos de política cambial. Diante da necessidade evidente dessa

política, houve um reconhecimento, por parte da literatura do mainstream e de alguns bancos

centrais, da importância da inclusão da taxa de câmbio como objetivo de política econômica

(ver, por exemplo, Blanchard et.al., 2015 e Banbula et. al., 2011). Nesse contexto, a política

cambial coexistiria com o RMI, desobrigando, portanto, a taxa de juros de responder a

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42

desalinhamentos cambiais. Dessa forma, o regime de flutuação suja não seria incompatível

com o RMI (Ghosh et.al., 2015)

Portanto, a questão relevante passa a ser não mais a necessidade da política

cambial, mas por que tais países são acometidos por desequilíbrios, tornando o uso da política

cambial tão frequente. Em outras palavras, quais são as fontes das instabilidades e

desequilíbrios, que levam as autoridades monetárias ao uso da política cambial?

1.2.1. A credibilidade das instituições e os fundamentos macroeconômicos

Um conjunto de autores considera que os desequilíbrios presentes em grande parte

das economias emergentes derivam de variáveis reais e institucionais, como, por exemplo,

altos níveis de inflação e dívida pública e pouca credibilidade e transparência das instituições

(Calvo & Reinhart, 2002; Allen et. al., 2002; Chamon & Haussman, 2005). Tais fatores

inibem a adoção de facto de um regime de flutuação pura, ou seja, tornam a política cambial

necessária.

De acordo com Calvo & Reinhart (2002), a pequena credibilidade das autoridades

monetárias dos países emergentes seria a principal causa dos desequilíbrios estruturais

presentes nesses países, dentre eles a dolarização dos passivos e a limitada capacidade dos

bancos centrais de atuarem como emprestadores de última instância. Ademais, Eichengreen,

Haussman & Panizza (2002) pontuam que a pouca credibilidade é fruto de incertezas dos

agentes em relação ao comprometimento das autoridades monetárias e fiscais com a inflação,

inibindo a demanda por empréstimos numa moeda que pode ser manipulada pelo

emprestador. Neste cenário, os bancos centrais adotam um viés pró “volatilidade da taxa de

juros”, ou seja, ajustam a taxa de juros a fim de estabilizar a taxa de câmbio (Chamon &

Haussman, 2005).

Assim, o foco das autoridades monetárias e fiscais nos fundamentos

macroeconômicos se constituía num elemento importante para a conquista de credibilidade, e,

consequentemente, para a redução do medo de flutuar. Ou seja, países com políticas fiscais

críveis, não inflacionárias e com baixos níveis de estoque de dívida pública (em relação ao

PIB) apresentariam menores desequilíbrios, reduzindo a necessidade de intervenção por parte

das autoridades monetárias e permitindo, assim, uma taxa de câmbio mais flexível (Allen et.

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43

al., 2002; Eichengreen et. al., 2002). Dentre os diversos fundamentos macroeconômicos, o

nível de estoque de dívida é alvo recorrente da literatura. Conforme atestam Reinhart, Rogoff

e Savastano (2003), os países emergentes se caracterizariam por uma elevada intolerância à

dívida (dívida pública interna e externa) – argumento conhecido na literatura como debt

intolerance. Os autores o atribuem ao longo histórico de inadimplência das economias em

desenvolvimento que, por sua vez, se devia à imprudência na gestão das políticas econômicas

e à (fraca) institucionalidade vigente.

Ademais, a relação entre fundamentos macroeconômicos e política cambial pode

ser feita por meio da análise dos modelos de determinação da taxa de câmbio18

. De acordo

com alguns modelos do mainstream (dentre os quais se destaca o modelo da sobrereação de

Dornbush (1976)), no longo prazo a taxa de câmbio é determinada por variáveis reais,

enquanto no curto prazo ela é guiada principalmente por variáveis financeiras. Dessa forma,

diversos autores sugerem intervenções no mercado de câmbio para a proteção contra

variações bruscas da taxa de câmbio no curto prazo e para a coordenação das expectativas dos

investidores (Allen et. al., 2002; Reitz & Taylor, 2008). O uso do canal da coordenação pelos

bancos centrais (descrito na seção 1.1), por exemplo, seria uma forma de corrigir os desvios

da taxa de câmbio em relação aos fundamentos no curto prazo (Reitz & Taylor, 2008).

Portanto, a política cambial seria um importante instrumento para estabilizar a

taxa de câmbio no curto prazo, sujeita aos movimentos do mercado financeiro, e corrigir os

desvios desta última em relação aos fundamentos. No longo prazo, as políticas voltadas aos

fundamentos e a melhora na institucionalidade prevaleceriam, gerando um menor medo de

flutuar.

18

De acordo com a classificação proposta por Prates (2015), há cinco gerações de modelos de determinação da

taxa de câmbio na literatura mainstream. Em linhas gerais, a primeira geração de modelos reconhece a

importância das variáveis de estoque (monetárias e financeiras) em relação às variáveis de fluxo (comércio de

bens e serviços). Essa geração também tem o mérito de apontar a importância das variáveis financeiras no curto

prazo. Os modelos de segunda geração sugerem que os movimentos do câmbio se assemelham a um “passeio

aleatório”, baseado na hipótese de eficiência dos mercados de câmbio (que não permite lucro, portanto, na

arbitragem de juros entre duas moedas). Os modelos de terceira geração, por sua vez, incluem rigidezes no curto

prazo que impede que a taxa de câmbio caminhe segundo os fundamentos. Os modelos de quarta geração

incorporam as heterogeneidades dos agentes e os comportamentos miméticos em suas análises, por meio de dos

modelos de microestrutura dos mercados. Por fim, a quinta geração de modelos analisa o forward premium, que

deriva da não verificação empírica da paridade descoberta da taxa de juros, por meio da investigação dos tipos de

carry trade no mercado financeiro internacional.

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44

1.2.2. A preponderância dos fatores externos

O argumento da credibilidade das instituições ou dos fundamentos

macroeconômicos como fatores geradores dos desequilíbrios nos países emergentes - levando,

assim, a uma intervenção das autoridades monetárias - foi questionado por diversos autores,

dentre eles Eichengreen, Haussman & Panizza (2002). Os autores mostram que a emissão de

títulos em moeda estrangeira não é explicada estatisticamente pelos fundamentos

macroeconômicos - nível de dívida pública em relação ao PIB e nível de abertura comercial -

ou pela credibilidade das instituições. A única variável significativa que explica a

concentração do portfolio dos investidores globais em poucas moedas é o tamanho da

economia de um determinado país.

Nesse sentido, os benefícios relacionados à posse de uma moeda emitida por um

país com economia relativamente grande é maior que os custos de transações que a presença

dessa moeda nos portfólios implica. Essa lógica também valeria para moedas emitidas por

países que são centros financeiros globais, caso de Inglaterra e Suiça, por exemplo. Ou seja, a

presença de uma determinada moeda (emitida por um centro financeiro) no portfólio de um

investidor global e seu uso em transações internacionais pode provocar comportamentos

miméticos, gerando, assim, uma extensa rede de transações. Dessa forma, o pecado original

seria explicado por fatores que fogem ao controle dos países não emissores das “moedas

internacionais” (Eichengreen et. al., 2002).19

Cohen (2000) sumariza a relação entre tamanho

da economia e rede de transações:

“(..) a money must promise a broad transactional network, since

nothing enhances a currency’s acceptability more than the prospect of

acceptability by others. A large economy creates a naturally ample

constituency for a currency (…) No money has ever risen to a position

of international pre-eminence that was not initially backed by a leading

economy. The greater the volume of transactions conducted in or with a

19

Conforme (Eichengreen et. al., 2002, p.33): “the global portfolio is concentrated in a very few currencies for

reasons largely beyond the control of the excluded countries”.

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45

given country, the greater are the potential network externalities to be

derived from use of its money” (Cohen, 2000, p. 13)

Ademais, Dowd & Greenaway (1993), Mühlich (2014) e Cohen (2007) apontam

três fatores adicionais que explicariam a predominância contínua de um número reduzido de

moedas nos portfólios dos investidores globais. O primeiro fator é a histerese em relação ao

uso de uma determinada moeda, derivada principalmente do elevado custo-benefício ao se

trocar uma moeda com uma ampla rede de transações por uma moeda com baixa

externalidade de rede. O segundo fator é a aversão ao risco do investidor em relação a uma

moeda com pequena rede de transação. Por fim, o terceiro fator relaciona-se com a liquidez e

profundidade dos mercados onde são transacionadas as moedas internacionais. Ou seja, os

investidores procuram denominar seus contratos em moedas cujos mercados são amplos, com

baixos custos de transações e menos vulneráveis.

Além dos fatores econômicos listados acima, Cohen (1998, 2004, 2007, 2012,

2015) aponta também determinantes políticos – pertencentes à literatura de Economia Política

Internacional (EPI) - da posição das diferentes moedas no plano internacional, tais como a

capacidade militar e a participação em organizações multilaterais, que serão vistos com maior

profundidade na próxima subseção. Segundo o autor, a junção dos determinantes políticos e

econômicos conformam uma pirâmide monetária20

, que estabelece uma hierarquia entre as

diferentes moedas (e quase-moedas) domésticas, conforme sua influência ou domínio dentro e

fora de suas respectivas jurisdições ou, em outras palavras, conforme seu uso (como meio de

pagamento, unidade de conta e reserva de valor) nos planos doméstico e internacional.

Observa-se, portanto, certa heterogeneidade entre as abordagens acima, que se

unem na refutação dos fundamentos macroeconômicos e da credibilidade das instituições

como os principais fatores geradores de desequilíbrios nos países emergentes. No entanto, a

função da moeda enquanto reserva de valor e ativo financeiro no plano internacional e suas

20

No topo dessa pirâmide estão as Top currencies, cujo uso, em todas as funções, é disseminado ao redor do

globo; logo abaixo vêm as Patrician currencies, cujo uso também é disseminado entre as diversas regiões,

porém não exercem plenamente todas as funções da moeda em âmbito internacional; logo em seguida estão as

Elite currencies, que possuem algum grau de internacionalização, porém não exercem muita influência além de

suas fronteiras nacionais; por fim, há as Plebeian currencies, que estão praticamente circunscritas aos espaço

doméstico, com reduzida influência internacional. Após esses quatro níveis, há mais três níveis – Permeated

currencies, Quase-currencies, Pseudo-currencies -, que dizem respeito a soberania monetária de uma

determinada moeda doméstica. Para uma descrição detalhada, ver Cohen (2004, p. 14-16).

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implicações num contexto de abertura financeira não são discutidas detalhadamente nas

diferentes abordagens - apesar de Cohen (1998 e 2015) reconhecer essa função (de reserva de

valor) na construção de sua pirâmide monetária.

Essas diferentes abordagens também geram diferentes implicações de política

cambial (e macroeconômica). Conforme Eichengreen (2002), países com baixa dolarização de

seus passivos, com mercados financeiros líquidos e profundos e que ofereçam hedge para as

posições descobertas em moeda estrangeira dos agentes devem adotar o binômio metas de

inflação e regime de câmbio flutuante, com pouco uso da política cambial. Se as condições

acima não forem satisfeitas, o regime de câmbio fixo (ou a âncora cambial) é a melhor

solução de política. Já Cohen (2015) relaciona currency power (poder monetário) e autonomia

de política, indicando que esta última é fundamental para que um país exerça influência em

outros territórios por meio de sua moeda (ver Peruffo, 2016).

1.2.3 A abordagem keynesiana-estruturalista da hierarquia de moedas

As duas abordagens sintetizadas nas duas subseções anteriores reconhecem, por

diferentes razões, que as transações nos mercados financeiros são concentradas em poucas

moedas e que tal fato acaba gerando diversos desequilíbrios, dentre eles a dolarização dos

passivos dos agentes. As explicações sobre tais desequilíbrios até agora apresentadas possuem

dois elementos em comum: a visão restrita dessas análises em relação à moeda enquanto ativo

financeiro e líquido por excelência e, portanto, desejado pelos agentes, impactando suas

decisões de gasto e de alocação da riqueza; a não consideração das assimetrias existentes

entre as diferentes moedas domésticas no plano internacional e suas implicações (Keynes,

1936; Prates, 2002)21

.

O referencial keynesiano-estruturalista centra sua análise não apenas nos

determinantes e funções da moeda no plano internacional – fato também analisado por Cohen

(2004 e 2015) -, mas também na moeda enquanto um bem desejado pelos agentes,

impactando, portanto, aquelas decisões.

21

Vale ressaltar que o termo “assimetria” utilizado por Prates (2002) e Ocampo (2001a e 2001b) foi emprestado

de Prebisch (1949 e 1981), que destacou três tipos de assimetrias no âmbito da relação centro-periferia:

tecnológica/produtiva, macroeconômica e financeira. Tavares (2000, p. 131) também enfatiza “o dinheiro

internacional e não o progresso técnico” como traço preponderante da relação centro-periferia.

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47

A posição de cada moeda nacional no sistema monetário internacional depende de

sua capacidade de desempenhar suas funções em âmbito internacional - meio de pagamento,

unidade de conta e reserva de valor (Prates, 2002; De Conti, 2011). Como argumentam De

Conti, Prates e Plihon (2014), o uso da moeda no contexto internacional define sua liquidez

nesta esfera. Se se considera que “um ativo líquido [é aquele que] pode ser convertido, sem

custos e demoras, em meio de pagamento” (Plihon, 2001, p. 27), tem-se que:

“(..) as moedas que exercem as funções da moeda em âmbito

internacional são líquidas por definição, pois já são um meio de

pagamento internacional e, sendo também unidade de conta e reserva

de valor nesse mesmo âmbito, possibilitam a conversão de moeda

entesourada em poder de compra ou de liquidação de contratos sem

gerar perda alguma” (De Conti, Prates e Plihon ,2014, no prelo)

Assim, a assimetria monetária é, na verdade, uma assimetria entre os diferentes

graus de liquidez que as várias moedas nacionais exibem no plano internacional (Andrade &

Prates, 2014; Paula, Fritz, Prates, 2016).

Ao considerar as três funções da moeda no SMI, diversos autores, entre eles

Cohen (2000) e Krugman (1984), as desdobram em duas dimensões: a pública e a privada

(Quadro 2).

Tabela 1.1 – Funções da moeda: dimensões pública e privada

Funções da Moeda Dimensão Pública Dimensão Privada

Unidade de Conta Referencial (âncora) Denominação

Meio de Pagamento Intervenção Veículo

Reserva de valor Reservas dos BCs Ativos Privados

Fonte: Cohen (2000)

Como unidade de conta no âmbito público, a moeda internacional serve de âncora

às demais moedas, e, na esfera privada, exerce a função de denominar uma série de contratos.

Já como meio de pagamento, a moeda internacional realiza, na dimensão pública, o papel de

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48

instrumento de intervenção das autoridades monetárias no manejo do valor de sua própria

moeda em relação à moeda-chave. No âmbito privado, enquanto meio de pagamento, a

moeda-chave serve como veículo das várias transações que ocorrem no plano internacional.

Como reserva de valor, por sua vez, a moeda internacional é utilizada como lastro da riqueza

financeira, seja aquela mantida por entidades públicas, como o Banco Central, seja aquela

detida pelos agentes privados (Carneiro, 2008). As moedas que desempenham todas as

funções nas duas dimensões, no plano internacional – caso do dólar, do euro e do yen –,

tornam-se uma divisa22

. Já as moedas que não desempenham nenhuma de suas funções

internacionalmente ou as fazem de modo parcial são denominadas por De Conti (2011) de

“moedas periféricas”. Essa assimetria do SMI contemporâneo resulta numa hierarquia de

moedas pode ser retratada de acordo com a figura 1.123

.

Figura 1.1: Hierarquia de moedas no SMI contemporâneo

22

Conforme Aglietta (1986, p. 33, tradução livre), “(..) a moeda nacional é soberana em seu próprio espaço. Ela

o deixa de ser quando se torna uma divisa, ou seja, dívida de um banco ou de uma instituição pública nacional

circulando entre não-residentes como meio de pagamento internacional (...) a primeira qualidade das divisas é

sua conversibilidade. Contrariamente, a primeira qualidade da moeda é sua unicidade”. Essa definição, portanto,

está vinculada à conversibilidade de direito da moeda. Assim, toda moeda doméstica utilizada além das

fronteiras nacionais torna-se uma divisa. Já a definição acima, utilizada por De Conti (2011), refere-se à

conversibilidade de fato, definida em Prates (2002, p. 148) como “a sua capacidade de desempenhar em âmbito

internacional as três funções da moeda: meio de pagamento, unidade de conta e de denominação dos contratos, e

ativo de reserva”. Essa tese utilizará os termos propostos por De Conti (2011) – “moeda-periférica” e “divisa”. 23

De Conti & Prates (2016) mostram a composição atual da hierarquia de moedas nas dimensões públicas e

privadas das funções da moeda com base em diferentes bases de dados, mas sobretudo do relatório trienal do BIS

(2016). De acordo com os autores, a evolução dos indicadores e o voluntarismo político chinês –

consubstanciado na entrada do renminbi na cesta (base de cálculo) dos depósitos especiais de saque do FMI -

sugere uma maior participação da moeda chinesa no plano internacional.

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Fonte: Elaboração do autor a partir de De Conti, Prates & Plihon (2014)

Porém, o que faz uma moeda tornar-se uma divisa? De acordo com as subseções

anteriores, o uso de uma moeda nacional enquanto moeda no âmbito global é determinado, no

campo econômico, pelos fundamentos macroeconômicos e pela credibilidade das instituições;

ou pelo tamanho da economia nacional e, consequentemente, pelas externalidades em rede

que se criam em torno do padrão monetário das economias internacionalmente mais

relevantes (Eichengreen, 1996). Já no campo político, Cohen (2004 e 2015) ressalta a

participação dos Estados Nacionais nos organismos multilaterais, bem como o poderio militar

de cada país.

No entanto, conforme destacam De Conti, Prates & Plihon (2014) e Desai (2013),

não basta apenas que essa participação privilegiada exista, mas que seja exercida de modo a

promover a moeda desejada enquanto encarnação da liquidez no plano internacional. Por

exemplo, no período pós-Bretton Woods, os Estados Unidos (EUA) adotaram políticas em

prol do uso internacional do dólar, a fim de restaurar e manter a posição da sua moeda como

divisa-chave do Sistema Monetário Internacional contemporâneo. Entre as diversas ações que

o governo norte-americano adotou, é possível destacar: a política do “dólar forte”, adotada por

Paul Volcker (presidente do Federal Reserve) em 1979 como resposta aos questionamentos

acerca do papel do dólar como moeda reserva internacional ao longo dos anos 1970; o acordo

de Plaza, em 1985, que representou uma tentativa dos EUA de estimular seu setor produtivo

via desvalorização do dólar, sem ameaçar a posição de sua moeda no plano internacional; o

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acordo de Louvre em 1987, quando os ministros das Finanças do G-7 acordaram estabilizar o

dólar em torno dos níveis então vigentes, já que a moeda norte-americana se desvalorizou

rapidamente (40% em relação ao iene, por exemplo) a partir do acordo de Plaza (Tavares,

1985; Eichengreen, 1996; Desai, 2013).

Dessa forma, o papel ativo do Estado, conhecido também como “voluntarismo

político”, na internacionalização de uma moeda doméstica é um importante determinante do

seu uso além das fronteiras nacionais (De Conti, 2011; Herr, 2006;). Nesse sentido, pode-se

estabelecer um paralelo com o papel do Estado na determinação da moeda doméstica.

Conforme análise de Dequech (2013) de diferentes abordagens da moeda de inspiração

keyesiana24

, mesmo sendo um fenômeno convencional, em última instância, a moeda, para

funcionar enquanto tal, ainda necessita da sanção do Estado. Desde logo, porém, inexiste um

organismo político que faça as vezes de um Estado a nível internacional nos moldes do

existente na esfera nacional. Tampouco uma agência mundial que defina e assegure as

relações contratuais entre entidades nacionais distintas. Inexiste também um imposto global

sob a administração de um órgão mundial com a capacidade necessária para impor a unidade

de conta e o meio de pagamento do mesmo. Nesse contexto, a tensão fundamental, ao

contrário da economia nacional, não é aquela entre o Estado e os agentes privados, mas entre

Estados Nacionais nas diversas formas em que se manifestam suas relações de poder. Em

outras palavras, o reconhecimento social da divisa-chave passa pelas relações de poder entre

os Estados.

Conforme ressaltado acima, as implicações das assimetrias do SMFI para as

economias emergentes podem ser feitas a partir de uma abordagem keynesiana, na qual

prevalece uma economia monetária de produção (Keynes, 1932 e 1936). Ou seja, tanto no

plano doméstico como no plano internacional, a moeda tem influência crucial na decisão de

gastos dos agentes e de alocação da riqueza no curto e no longo prazo. De maneira

esquemática, podemos explicitar essa relação por meio da aplicação da equação da taxa de

24

Dequech (2013) reúne essas abordagens em dois grupos. A visão convencionalista enfatiza o caráter

convencional da moeda, cuja forma superior de liquidez se dá essencialmente por meio da legitimação social –

os principais expoentes dessa visão são Aglietta & Orlean (2002). Já a visão pós-keynesiana destaca o papel do

Estado na determinação do ativo selecionado como moeda por meio da imposição daquilo que servirá como

unidade de conta e meio de pagamento de contratos e impostos – os principais expoentes dessa escola são

Davidson (1994) e Wray (1998). A partir desses dois grupos, Dequech (2013) evidencia que tanto o caráter

convencional da moeda quanto sua definição como criatura do Estado não são abordagens excludentes, mas

podem ser combinadas.

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juros própria dos ativos (Keynes, 1936, cap.17) para o mercado de câmbio (Kaltenbrunner,

2015; Andrade & Prates, 2013; Prates, 2014). De acordo com a equação original:

(1) 𝑟𝑎 = 𝑎 + 𝑞 − 𝑐 + 𝑙

sendo “a” a apreciação (ou depreciação) esperada do ativo, “q” a quase-renda (ou rendimento)

esperado do ativo, “c” os custos de carregamento desse ativo e “l” seu prêmio de liquidez

(Keynes, 1936). Quando aplicamos a equação (1) ao mercado de câmbio e consideramos as

assimetrias, podemos comparar a taxa de retorno de uma determinada moeda periférica com a

taxa de retorno da divisa-chave (Kaltenbrunner, 2015; Andrade & Prates, 2013)25

. Assim:

(2) 𝑟 = 𝑎 + 𝑞 − 𝑐 + 𝑙

(3) 𝑟∗ = 𝑞∗ − 𝑐∗ + 𝑙∗

sendo que (2) representa a taxa de retorno da moeda periférica; (3) representa a taxa de

retorno da divisa-chave; 𝑎 representa a expectativa de apreciação da moeda periférica em

relação à divisa-chave. Numa condição de equilíbrio (𝑟 = 𝑟∗)

26 entre (2) e (3), temos:

(4) (𝑞 − 𝑞∗) + 𝑎 = (𝑙∗ − 𝑙) + (𝑐 − 𝑐∗)

(𝑙∗ − 𝑙) representa o diferencial do prêmio de liquidez de cada moeda no plano internacional,

ou seja, a assimetria monetária; e (𝑞∗ − 𝑞) representa o diferencial de rendimentos esperados

das respectivas moedas nesse caso a taxa de juros. Já (𝑐 − 𝑐∗) representa o diferencial entre o

custo de carregamento da moeda periférica e da divisa-chave. Conforme Dequech (2013), o

custo de carregamento de uma moeda doméstica possui estreita relação com a função reserva

de valor. Por exemplo, o processo inflacionário de uma determinada moeda evidencia uma

adição ao custo de carregamento desse ativo, desestimulando, portanto, sua detenção pelos

25

Vale ressaltar que Kaltenbrunner (2015) não considera em sua equação de retorno os custos de carregamento.

De acordo com a autora, “in line with Keynes’s assumption for the closed economy, carry costs are considered

negligible for money and short-term financial instruments” (Kaltenbrunner, 2015, p. 433). 26

De acordo com Kaltenbrunnner (2015, p.431), a condição de equilíbrio é um aspecto formal, ou seja, não

implica necessariamente igualdade das taxas de retorno. Dessa forma, a comparação entre as taxas de retorno das

moedas periféricas e divisas segue a mesma lógica das comparações estabelecidas por Keynes no capítulo 17.

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agentes (ver Davidson, 1978). No plano internacional, a volatilidade de uma determinada

moeda (em relação à divisa-chave) também estabelece um custo (econômico) de

carregamento desse ativo como reserva de valor.

Outros fatores que impactam o termo 𝑐 são os instrumentos de GFC, cuja

presença pode afetar negativamente o retorno das moedas-alvo da regulação, desestimulando

sua posse pelos agentes (Andrade & Prates, 2013). Nesse sentido, a abertura financeira e a

institucionalidade do mercado de câmbio – ou os elementos que conformam a liquidez desse

mercado27

, nos termos de De Conti (2011) – também exercem influência na equação de

retorno das moedas periféricas.

Considerando que (𝑙∗ − 𝑙) é um fenômeno estrutural e, portanto, estável no curto

e médio prazo, os fatores expectacionais, o diferencial de juros, e o diferencial dos custos de

carregamento são os principais determinantes das diferentes taxas de retorno e,

consequentemente, dos movimentos da taxa de câmbio, nesse caso entre a moeda periférica e

a divisa-chave (Kaltenbrunner, 2015; Prates, 2014).

Num contexto de abertura financeira, as moedas periféricas, que estão na base

da pirâmide, possuem um baixo prêmio de liquidez28

e, portanto, devem ajustar suas

respectivas taxas de juros acima das taxas de juros dos países cujas moedas possuem um

maior prêmio de liquidez no plano internacional (Figura 1.2), a fim de tornar a taxa de retorno

de suas moedas (ou dos ativos denominados nelas) atrativo para os investidores (Prates e

Andrade, 2013).

27

Conforme De Conti (2011, p. 171), a liquidez de mercado “(...) diz respeito às condições em que um ativo é transacionado em determinado mercado, ou seja, aos custos – monetários e temporais – envolvidos na operação”. Conforme o autor, ela é determinada por quatro fatores: instituições, tamanho e histórico de transações do mercado e agentes participantes. 28

As moedas periféricas possuem um prêmio de liquidez pequeno, porém positivo, já que desempenham, mesmo que marginalmente, alguma função da moeda em âmbito internacional; por exemplo, no boom do ciclo de liquidez que antecedeu a CFG, várias economias emergentes emitiram títulos soberanos denominados na própria moeda. Assim, o “caráter ilíquido” da moeda periférica no plano internacional, ressaltado em diversos pontos da tese, se refere a um baixo prêmio de liquidez, porém não igual a zero.

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53

Figura 1.2: Hierarquia de moedas e taxa de juros no SMI

Fonte: Palludeto & Abouchedid (2016), a partir de De Conti, Prates e Plihon (2014).

No entanto, esse ajuste não é condição suficiente para a entrada de fluxos de

capitais, pois estes são determinados por uma dinâmica exógena a esses países, como por

exemplo, mudanças na taxa de juros do país emissor da divisa-chave ou na preferência pela

liquidez dos investidores globais. Assim, nos momentos de euforia dos ciclos de liquidez

(fomentados, por exemplo, por uma queda na taxa de juros da divisa-chave), os agentes

mostram, de maneira pró-cíclica, grande apetite ao risco e baixa preferência pela liquidez, o

que resulta em busca por rendimento (search for yield), que se intensifica à medida que

(𝑞 − 𝑞∗) aumenta. Por outro lado, isso implica que nos momentos de reversão do ciclo de

liquidez, os agentes abandonam a estratégia “search for yield” e buscam a liquidez da divisa.

Tal reversão, por sua vez, gera grande impacto nos mercados emergentes, pois, embora a

participação dos ativos emitidos por esses países nos portfólios dos investidores residentes em

economias avançadas seja residual, o volume dos fluxos provindos dos investidores globais

para os países emergentes não é marginal em relação ao tamanho de seus mercados (Prates,

2002; De Conti, 2011; Paula, Fritz & Prates, 2016).

Dessa forma, com base no arcabouço teórico keynesiano-estruturalisa pode se

inferir que a assimetria monetária no SMFI contemporâneo está intrinsicamente vinculada a

uma integração assimétrica no mercado financeiro internacional, fenômeno denominado por

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Prates (2002) de assimetria financeira, que, no contexto da globalização financeira, torna-se

ainda mais proeminente. Tal assimetria possui duas dimensões, ambas ressaltadas acima. A

primeira diz respeito à dinâmica preponderantemente exógena dos fluxos de capitais

destinados aos países emissores de moedas que possuem menor prêmio de liquidez. A

segunda dimensão, por sua vez, refere-se à inserção marginal dos mercados emergentes -

especialmente os mercados de câmbio, objeto desta tese – nas carteiras dos grandes

investidores estrangeiros (Prates, 2002; Paula, Fritz & Prates, 2016).

De fato, há estudos empíricos que corroboram as duas dimensões da assimetria.

Rey (2013) e Miranda-Agripino & Rey (2015) sugerem, por meio de análise empírica, que um

dos determinantes do ciclo de liquidez global é a política monetária dos países do centro -

Países Emissores de Divisas (PED), nos termos aqui utilizados - que afeta o grau de

alavancagem do sistema financeiro, os fluxos de capitais e o ciclo de crédito do sistema

financeiro internacional. A inserção marginal dos mercados emergentes também foi

confirmada empiricamente por Haldane (2011), por meio de redes financeiras globais (global

financial network), que mensuram as inter-relações financeiras entre os mercados financeiros

dos diferentes países. De acordo com o autor, apesar de alguns avanços29

, a inserção dos

mercados emergentes – entre 1980 e 2005 – se mantém periférica nos fluxos financeiros

globais.

Consequentemente, as assimetrias monetária e financeira estão por detrás da

maior instabilidade nas taxas de câmbio e de juros dos Países Emissores de Moedas

Periféricas (PEMP), num ambiente de livre (ou elevada) mobilidade de capitais. Por meio da

equação (4), pode-se verificar que, considerando o diferencial nos prêmios de liquidez, a

variação nas expectativas, a mudança na política monetária do país emissor da divisa-chave

(ou de outros PED) e/ou a ocorrência de choques exógenos (que levam a um aumento da

preferência pela liquidez) geram movimentos constantes das taxas de retorno das diferentes

moedas e, consequentemente, das taxas de câmbio (promovendo, assim, atuações sistemáticas

29

Haldane (2011, p.3) ressalta que “(..) the gap between core and periphery has been closing. The relative contribution of intra-advanced country external portfolio asset stocks fell from around 99% to 84% between 1980 and 2005. Over the same period, the relative contribution of advanced to emerging market external portfolio asset stocks rose from virtually nothing to over 8%. That is a fairly dramatic shift in international investors’ portfolio choice”

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55

das autoridades monetárias nos mercados de câmbio) e/ou ajustes na taxa de juros (e nas taxas

de remuneração dos títulos domésticos que funcionam como quase-moeda).

A posição de uma moeda doméstica na hierarquia condiciona, portanto, a

autonomia – nos termos definidos na introdução desta tese - das políticas monetária e cambial

do respectivo país emissor. Por exemplo, o Banco Central de uma economia emergente pode

elevar sua taxa básica de juros em face de uma reversão nos fluxos de capitais (causada, por

exemplo, por uma mudança na política monetária norte-americana) mesmo em momentos de

recessão econômica – contrariando, portanto, objetivos domésticos. Neste contexto, a pró-

ciclicidade das políticas dos países emergentes é, portanto, uma manifestação da restrição de

autonomia não somente da política monetária, mas da política econômica de forma geral.

Dessa forma, “as assimetrias monetária e financeira implicam assimetria macroeconômica, a

qual diz respeito aos diferentes graus de autonomia de política dos países que integram o

sistema” (Prates, 2002, p. 150). De acordo com essa definição, a posição de uma determinada

moeda na hierarquia implica restrições não apenas em suas políticas monetária e cambial, mas

também em outras políticas macroeconômicas.

Ademais, a assimetria macroeconômica coloca em xeque a trindade impossível, já

que num ambiente de livre mobilidade de capitais, a autonomia de política monetária é

restrita, independentemente do regime cambial adotado. Assim, como destaca Flassbeck

(2001), os países que não emitem a divisa-chave se deparam com uma dualidade impossível;

ou, nos termos de Rey (2013), o trilema torna-se um dilema, já que “independent monetary

policies are possible if and only if the capital account is managed” Rey (2013, p.3). Contudo,

vale ressaltar que ao contrário da abordagem keynesiana-estrututuralista adotada nesta tese,

esses autores não levam em consideração as assimetrias entre países centrais e periféricos, que

resulta numa perda ainda maior de autonomia de política macroeconômica para esses últimos

países.

Além da política monetária, a politica cambial dos países emergentes também

sofre restrições oriundas das assimetrias monetária e financeira. Em outras palavras, a posição

da moeda de um determinado país nessa hierarquia também condiciona os objetivos, metas,

canais de transmissão e instrumentos da política cambial. Tais restrições são tema da próxima

seção.

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56

1.2 A relação entre hierarquia de moedas e política cambial

A assimetria macroeconômica destacada pela abordagem keynesiana-

estruturalista da hierarquia de moedas implica diferentes graus de autonomia de política

cambial, que varia conforme a liquidez de uma determinada moeda doméstica no plano

internacional.

Tais diferenças transparecem quando se analisa o modus operandi da política

cambial, já que cada categoria de análise pode ser afetada por fatores relacionados à

hierarquia de moedas e à assimetria financeira. Essa relação acontece de duas formas: a

primeira por meio de implicações diretas da hierarquia de moedas e da assimetria financeira

sobre cada categoria de análise, como, por exemplo, os impactos da política monetária e

cambial dos PED, a demanda precaucional por divisas, entre outros; a segunda é indireta, isto

é, por meio do impacto da volatilidade nas taxas de câmbio e de juros sobre a política cambial

(figura 1.3).

Figura 1.3: Relação entre assimetrias e política cambial

Esta seção, portanto, se dedica a analisar essas possíveis relações diretas e

indiretas. Antes, porém, é necessário estabelecer os critérios de escolha dos países emergentes

nas análises empíricas realizadas nessa seção e nos próximos capítulos desta tese.

Volatilidade das

taxas de câmbio e

juros

Assimetrias

monetária e

financeira

Política cambial

(categorias de

análise)

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57

1.3.1. A escolha dos países emergentes

Conforme relatado na introdução, esta tese adota a definição de países emergentes

proposta por Bibow (2009) e Prates (2015). O primeiro desafio em relação a este conceito é

identificar os países cujos mercados estão inseridos ao mercado financeiro internacional. Uma

das possibilidades, adotada por Ramos (2016), é utilizar os índices de retorno financeiro

calculados por grandes instituições financeiras, como, por exemplo, o MSCI (Morgan Stanley

Capital International) e o JP Morgan Government Bond-Emerging Market Index – este último

índice utilizado por Hofmann et. al. (2015). Esta tese também optou por esse critério e

utilizará o MSCI emerging marketing index por três motivos: o grande alcance desse

indicador entre os investidores; a consideração não apenas dos títulos soberanos, mas também

de outros ativos financeiros no cálculo do índice, e; a disponibilização, pela consultoria, dos

países utilizados no cálculo. Os países incluídos no Emerging Market index do MSCI são:

Brasil, Chile, Colômbia México, Peru, Reública Tcheca, Egito, Grécia, Hungria, Polônia,

Catar, Russia, África do Sul, Turquia, Emirados Árabes Unidos, China, Índia, Indonésia,

Coréia do Sul, Malásia, Filipinas, Taiwan, Tailândia.

O segundo desafio é a heterogeneidade da amostra selecionada, principalmente

em relação ao regime macroeconômico. Conforme explicitado na introdução, esta tese se

concentrará nos países que adotaram o binômio regime de câmbio flutuante (pure floating e

managing floating) – metas de inflação. Dessa forma, seguindo a última atualização do FMI

(2014, 2015) sobre os regimes monetário e cambial adotados pelos países emergentes,

chegamos à seguinte lista de países emergentes que serão utilizados nas análises empíricas:

Brasil, Chile, Colômbia, México, Peru, África do Sul, Tailândia, Filipinas, Coréia do Sul,

Indonésia, Hungria, República Tcheca, Polônia, Turquia30

.

Tabela 1.3: Classificação dos Regimes de Câmbio e Monetário 2014

Inflation Targeting

30

As análises empíricas realizadas neste e nos próximos capítulos serão baseadas nessa lista. No entanto, os

suportes empíricos das referências bibliográficas aqui utilizadas nem sempre consideram a mesma amostra de

países emergentes, o que não inviabiliza seu uso ao longo desta tese.

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Floating Brasil, Colômbia, Hungria, Indonésia, Coréia do Sul, Peru,

Filipinas, África do Sul, Tailândia, Turquia

Pure Floating Polônia, México, Chile

Fonte: FMI (2014)

1.3.2. As conexões entre política cambial e assimetrias do SMFI31

O detalhamento da relação entre política cambial e assimetrias monetária e

financeiras é pouco explorado na literatura – ver Prates (2015), para o caso brasileiro, e

Ramos (2016). Dentre as diversas formas possíveis de desenvolver tais conexões, optou-se

pela análise, à luz das assimetrias, dos fatos estilizados e dados disponíveis sobre as

intervenções das autoridades monetárias nos mercados cambiais emergentes. A análise dessas

relações visa, portanto, apontar alguns padrões de comportamento da taxa de câmbio e da

política cambial dos países da amostra e estabelecer possíveis conexões com o referencial

teórico desta tese.

Conforme relatado na seção anterior, a instabilidade nas taxas de câmbio implica

o agravamento dos desequilíbrios presentes nas economias periféricas, dentre eles o

descasamento de moedas nos balanços das instituições privadas e públicas, e compromete

outras variáveis macroeconômicas, como a inflação (principalmente no caso dos países com

altos níveis de pass-through) e a competitividade externa. Nesse cenário, a contenção da

volatilidade cambial se torna condição necessária para que outros objetivos de política

cambial sejam alcançados (Ostry, 2016). De fato, de acordo com as entrevistas junto aos

Bancos Centrais dos países emergentes realizadas pelo BIS (2013)32

, grande parte das

intervenções no mercado de câmbio desses países tem como objetivo macroeconômico a

contenção da especulação excessiva e a estabilidade monetária (Mohanty & Berger, 2013;

Tabela 1.3). Já nos países asiáticos (Índia, Coréia do Sul, Filipinas, Cingapura, Tailândia e

31

Várias questões mencionadas nesta seção serão retomadas de forma mais detalhada nos próximos dois

capítulos. 32

Os Bancos Centrais que participaram dessa entrevista são: Argélia, Argentina, Brasil, Chile, Colômbia,

República Tcheca, Hong Kong, Hungria, Índia, Indonésia, Israel, Coréia do Sul, Malásia, México, Peru,

Filipinas, Polônia, Rússia, Arábia Saudita, Cingapura, África do Sul, Tailândia, Turquia e Emirados Árabes.

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Indonésia), entre 2001 e 2009, Pontines & Rajan (2011, p. 253) sugerem a proeminência da

competitividade externa como objetivo macroeconômico, ou seja, uma maior reação da

política cambial desses países nos momentos de apreciação nominal de suas respectivas

moedas em relação aos momentos de depreciação. .

Ao comparar o resultado da tabela 1.3 com a entrevista realizada por Lecourt et.

al. (2006) junto aos Bancos Centrais dos países avançados33

, pode se verificar algumas

diferenças em relação aos objetivos mais importantes. Para 90% das autoridades monetárias

desses países, as intervenções tinham como motivação conter ou mudar uma determinada

trajetória da taxa de câmbio, fenômeno conhecido como, “lean against the wind”, enquanto

para 66% dos entrevistados as intervenções buscaram corrigir ou prevenir desalinhamentos da

taxa de câmbio dos seus fundamentos. A redução da volatilidade e das desordens de mercado

foi motivação das intervenções de apenas 33% dos entrevistados. Os resultados sugerem,

portanto, que os principais objetivos macroeconômicos da política cambial dos países

avançados entrevistados não se subordinam à contenção da volatilidade e/ou movimentos

abruptos na taxa de câmbio e, portanto, se relacionam de forma mais estreita a objetivos

domésticos, como controle inflacionário ou competitividade externa.

Considerando que as metas da política cambial são pautadas pelos seus objetivos

macroeconômicos, boa parte das intervenções dos bancos centrais dos países emergentes tem

como meta geral a redução dos impactos dos movimentos do ciclo de liquidez global sobre a

taxa de câmbio e, consequentemente, sobre os mercados financeiros domésticos (Mohanty &

Berger, 2013; Ostry, 2016). A redução da especulação excessiva no mercado de câmbio, a

acumulação de reservas internacionais e a contenção de movimentos abruptos de entrada e

saída de capitais são os principais objetivos específicos relatados pelas autoridades

monetárias, sugerindo, portanto, que os efeitos das assimetrias condicionam as metas desses

países. Dentre as metas listadas, a acumulação de reservas internacionais ganhou especial

relevância ao longo do boom de fluxos de capitais no período pré-crise (2003-2007), quando

diversos países emergentes (com exceção de alguns países da Europa Central e do Leste)

aproveitaram o momento de bonança para alavancar suas reservas em divisas (Menkehoff,

2013).

33

Os Bancos Centrais que responderam ao questionário são dos seguintes países: Austrália, Bélgica, Dinamarca,

Alemanha, Canadá. Inglaterra, Banco Central Europeu, Hungria, Irlanda, Noruega, Estados Unidos, Suíça,

Suécia.

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60

Tabela 1.3: Motivações para as intervenções no mercado de câmbio1

Importância em 2005-062

Importância em 2011-12

Alta3

Moderada4

Baixa5

Alta Moderada Baixa

Conter a especulação

excessiva 8 4 0 11 4 0

Manter a estabilidade

monetária 7 2 2 10 2 2

Impedir movimentos

bruscos dos fluxos de

capital

4 3 1 5 5 1

Acumular ou reduzir

reservas internacionais 7 0 2 6 2 2

Amortecer os impactos do

ciclo dos preços das

commodities

3 1 3 4 1 3

Competitividade externa 2 2 3 4 1 3

Atenuar problemas de

funding de bancos e

corporações

4 2 0 5 2 0

Fonte: (Mohanty & Berger, 2013).

Notas: 1

Entrevista realizada com 19 Bancos Centrais de países emergentes; 2

Escala de 1 a 7, onde 1 é mais

importante e 7 é menos importante; 3 1 ou 2;

4 3 ou 5;

5 6 ou 7.

As manifestações das assimetrias do SMFI sobre a política cambial também

transparecem nos canais de transmissão sob diversas formas. A maior participação dos

Bancos Centrais dos países emergentes no volume transacionado nos mercados de câmbio

(em comparação aos países desenvolvidos) sugere que o canal de equilíbrio de portfólio seja

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61

mais efetivo nesses países34

(Menkhoff, 2013; Canales-Kriljenko, 2004; Neely, 2005). No

entanto, essa conclusão contrasta com a opinião dos Bancos Centrais, em entrevista para o

BIS (2013), sobre o canal de transmissão mais efetivo. De acordo com as autoridades

monetárias entrevistadas, as intervenções são mais efetivas, em sua maioria, por meio do

canal das expectativas (expectativas sobre a taxa de câmbio futura e as próximas

intervenções).

O contexto de dominância do canal das expectativas, na visão das autoridades

monetárias, sugere, portanto, que a efetividade dos canais de transmissão da política cambial

nos PEMP não depende somente de fatores domésticos (especificamente institucionais) como,

por exemplo, a maior presença, em volume, do Banco Central no mercado de câmbio.

Considerando os efeitos das assimetrias monetária e financeira, o canal da expectativa nos

PEMP pode ser afetado pela sinalização das políticas cambial e monetária dos PED. De

acordo com essa hipótese, as sinalizações das autoridades monetárias dos PED ou as

expectativas dos investidores sobre os próximos passos dessas autoridades alteram a

preferência pela liquidez no plano internacional, que, por sua vez, impacta os canais de

transmissão da política cambial dos PEMP de diferentes modos. É um desdobramento,

portanto, dos trabalhos de Rey (2013) e Flassbeck (2001), mencionados na seção anterior, e

também de Aglietta (2004). Conforme esse último, no período pós-abertura financeira, as

decisões de política monetária estão mais dependentes dos canais das expectativas, ou seja, as

taxas de juros de longo prazo são cada vez mais guiadas pelas expectativas dos agentes sobre

as decisões e sinalizações dos Bancos Centrais em relação às suas respectivas taxas de juros

de curto prazo e demais variáveis macroeconômicas.

Assim, por exemplo, se as expectativas dos agentes em relação à política

monetária norte-americana apontassem para uma redução da taxa de juros de longo prazo,

haveria um aumento da liquidez internacional e, portanto, uma pressão para apreciação das

moedas periféricas. Tal pressão prevaleceria independentemente das expectativas (ex-ante)

dos agentes em relação à sinalização dos bancos centrais dos PEMP. Caberia, portanto, aos

bancos centrais desses países “ajustarem” suas sinalizações ao novo cenário. (Figura 1.4).

34

Vale ressaltar que o canal de equilíbrio de portfólio ganha relevância no caso de grandes intervenções em

volume (Menkhoff, 2013).

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62

Um exemplo concreto dessa relação é o anúncio do tapering – redução do

programa de compra de ativos de instituições financeiras, conhecido como quantitative

easing35

- pelo Federal Reserve (Fed) em maio de 2013, uma forma de intervenção (oral) que

afetou, por meio do canal das expectativas, a posição dos investidores nos mercados de

câmbio, em especial nos países emergentes36

(ver Aizenman et. al., 2014; Mishra et.al, 2014;

Farhi, 2017). Tal anúncio provocou mudanças nas posições em moedas periféricas de grande

parte dos investidores estrangeiros – da posição comprada para posição vendida -, já que estes

agentes esperavam um aumento na rentabilidade dos ativos denominados em divisas.

Consequentemente, os canais pelos quais as intervenções dos Bancos Centrais dos países

emergentes eram transmitidas foram afetados, obrigando as autoridades monetárias a reverem

não somente a transmissão de suas intervenções no mercado de câmbio, mas também os

instrumentos a serem utilizados37

.

Nesse contexto, alguns fatos estilizados sobre o uso e a intensidade dos

instrumentos de intervenção podem ser relacionados com a posição de uma determinada

moeda na hierarquia. Conforme mencionado, os PEMP interveem mais no mercado de

câmbio em comparação aos PED, principalmente por meio da compra (venda) de moeda

estrangeira no mercado à vista (Menkhoff, 2010). A atuação dos PEMP no mercado à vista

pode ser observada por meio da Tabela 1.4, que mostra a participação da variação negativa

(mensal) das reservas no total de variações mensais em quatro períodos. A divisão dos

períodos se baseou em três eventos que provocaram mudanças nas taxas de câmbio dos países

da amostra, tanto em termos de volatilidade38

quanto em termos de trajetória (ver gráficos 1.1

e 1.2). O primeiro período começa em 2003, início do período de bonança nos mercados

financeiros e se estende até agosto de 2008. A falência do banco Lehman Brothers em 15 de

setembro de 2008 marca o início do segundo período, que se estende até março de 2009. O

retorno dos fluxos de capitais para os mercados emergentes, a partir do segundo trimestre de

35

De acordo com Fawley & Neely (2013, p. 52), “QE policies are those that unusually increase the monetary

base, including asset purchases and lending programs. Programs designed to improve credit conditions—that is,

credit easing—are a special case of QE if they also increase the monetary base” 36

Para maiores detalhes sobre o impacto da política monetária norte-americana nos mercados financeiros

internacionais, ver Rey (2013). 37

Ademais, as indefinições acerca do aumento da taxa de juros norte-americana após o anúncio do tapering

comprometeram as intervenções dos Bancos Centrais dos países emergentes realizadas por meio do canal das

expectativas, dificultando, portanto, a contenção da volatilidade cambial. 38

Para efeitos de simplificação, utilizou-se a medida padrão de volatilidade, o desvio padrão. Outras formas de

mensuração, propostas por Ramos (2016), serão utilizadas no terceiro capítulo.

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2009, marca o início do terceiro período que se estende até março de 2013. Por fim, abril de

2013, quando se intensificam as especulações acerca do tapering (anunciado em maio), marca

o início do último período que se estende até 2015 no caso da taxa de câmbio e abril de 2016

no caso das reservas internacionais (últimos dados disponíveis). Para simplificação, a variação

mensal das reservas será usada como proxy da intervenção das autoridades monetárias no

mercado à vista.

No período de bonança entre 2003 e 2007, os Bancos Centrais dos PEMP atuaram

principalmente por meio da compra de expressivos volumes de divisas. Nos momentos de

baixa no ciclo de liquidez (o primeiro entre setembro de 2008 e março de 2009, e o segundo

entre abril de 2013 e abril de 2016), marcados por maior volatilidade e depreciação das

moedas periféricas (ver gráfico 1.1 e 1.2), o percentual das vendas aumentou, porém em

proporções menores quando comparados às compras nos períodos de bonança (com exceção

da Coréia do Sul no período da crise financeira global). Os dados, portanto, corroboram

Fratzscher et.al. (2015) e sugerem uma assimetria da compra e venda de moeda estrangeira no

mercado.

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Tabela 1.4: Volume das intervenções via reservas internacionais

Países Volume das variações

negativas: 2003 – 08/2008 (% em relação ao total)

Volume das variações negativas: 09/2008 –

03/2009 (% em relação ao total)

Volume das variações negativas: 04/2009 –

03/2013 (% em relação ao total)

Volume das variações negativas: 04/2013- 04/2016

(% em relação ao total)

Brasil 20 51 8 57

África do Sul 2 61 30 55

Indonésia1 n.a. 62 31 47

México 24 67 13 42

Peru1 n.a. 70 29 11

Chile 40 43 33 48

Coreia do Sul 26 89 26 24

Turquia 26 66 33 58

Polônia 23 71 27 50

República Tcheca 34 44 47 29

Hungria 36 21 44 64

Colômbia 20 44 7 7

Tailândia 17 3 31 51

Filipinas 14 31 13 48 Fonte: FMI. Elaboração própria

1: Peru e Indonésia disponibilizam dados a partir de 2006, impossibilitando a análise do primeiro período

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Gráfico 1.1: Volatilidade cambial diária (desvio padrão) – períodos selecionados

Fonte: Bloomberg. Elaboração própria

Gráfico 1.2: Variação cambial acumulada nos períodos selecionados (em %)

Fonte: Bloomberg. Elaboração própria

0,00

0,50

1,00

1,50

2,00

2,50

3,00

2003-2008 2008 2009-2012 2013-2015

(60,00)

(40,00)

(20,00)

-

20,00

40,00

60,00

2003-2008 2008 2008-2012 2013-2015

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66

Embora essa assimetria não seja exclusividade de nenhum grupo específico de

países – segundo o estudo de Fratzscher et. al. (2015) -, os motivos de sua existência tendem a

ser diferentes quando comparamos países desenvolvidos e emergentes ou, inclusive, quando

analisamos somente os países emergentes. Conforme ressaltado acima, nos países

desenvolvidos, a concentração das intervenções na ponta comprada em moeda estrangeira

sugere, na maioria dos casos, motivações domésticas, - como, por exemplo, competitividade

externa de seus produtos (Lecourt et. al., 2006).

Já nos países emergentes, essa assimetria sugere um receio por parte das

autoridades monetárias em relação às possíveis consequências da redução do estoque de

reservas internacionais sobre a estabilidade de seus respectivos mercados financeiros, como,

por exemplo, o aumento dos spreads dos títulos soberanos e da volatilidade cambial. Tal

receio seria latente em países mais suscetíveis a choques externos (e crises de liquidez), ou

seja, mais dependentes de fluxos de capitais de curto prazo e/ou das decisões de investidores

estrangeiros de alocação de portfólio nos mercados de derivativos. Ou seja, a maior

vulnerabilidade externa inibe o uso de reservas, pois este pode agravar os fatores

instabilizadores característicos da fase de baixa do ciclo. Assim, o motivo precaucional não

explicaria apenas a acumulação de reservas, mas também o receio de alguns países quanto ao

seu uso, mesmo em momentos de maior volatilidade cambial (Tabela 1.4).

A institucionalidade do mercado de câmbio também pode contribuir para o menor

uso de reservas internacionais ou evidenciar sua insuficiência. O aumento expressivo dos

volumes nos mercados de câmbio onshore e, especialmente, offshore tornou as reservas

internacionais cada vez mais insuficientes para lidar com a volatilidade e trajetória da taxa de

câmbio, independentemente do ritmo de acumulação de divisas (Fratzscher et. al., 2015). As

intervenções no mercado à vista também podem ser inócuas ou secundárias na presença de

assimetrias de liquidez e regulatória entre os diferentes segmentos do mercado de cambio em

cada país, como detalhado no segundo e terceiro capítulos.

A precaução no uso das reservas e a insuficiência das intervenções no mercado à

vista em lidar com os impactos indesejados dos movimentos das taxas de câmbio

contribuíram para o aumento do uso de outros instrumentos de política cambial. Três

instrumentos são destaques no caso da amostra selecionada: derivativos cambiais,

empréstimos em moeda estrangeira via linha de swaps cambiais e instrumentos de gestão dos

fluxos de capitais e regulação do mercado de derivativos. Em relação aos derivativos de

câmbio, Brasil (swaps cambiais), África do Sul (contratos forward), Colômbia (contratos

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futuros, forward e opções) e Indonésia (contratos forward) recorreram a derivativos ao longo

do período analisado (2003-2016)39

. Conforme ressaltado acima, os derivativos de câmbio

contribuem tanto para o manejo da liquidez dos respectivos mercados quanto para a economia

de reservas internacionais, principalmente nos contratos non-deliverables (tabela 1.5;

Domanski et. al., 2016). Busca-se, portanto, impactar a taxa de câmbio – mediante formação

de posições opostas às especulativas e oferta de hedge aos agentes – sem alterar as condições

de liquidez em moeda estrangeira – ou seja, o volume de reservas internacionais.

Após a eclosão da crise financeira internacional em 2008, as linhas de swaps entre

os Bancos Centrais dos PED e os Bancos Centrais dos PEMP se tornaram frequentes, como,

por exemplo, o acordo de US$ 30 milhões entre o Fed e as autoridades monetárias de Brasil,

Coréia do Sul, México e Cingapura. De acordo com Aizenman et al. (2011, p.15), as linhas de

swaps podem funcionar como substitutos das reservas internacionais nos PEMP, pois “they

are both international liquidity which can be called upon in case of unexpected shortages of

international liquidity”.

Os exemplos supracitados revelam a função de “emprestador de última instância”

do Fed no momento do efeito-contágio da CFG sobre os mercados emergentes. Assim,

embora tal acordo “economize” reservas internacionais, ele evidência a insuficiência desse

instrumento de política cambial nos momentos de perda relevante (ou insuficiência) dessas

reservas exatamente em função das assimetrias monetária e financeira 40

.

Por fim, os instrumentos de GFC foram amplamente utilizados no período pós-

crise, especialmente na fase de alta dos fluxos de capitais, entre 2009 e 2012. De maneira

geral, o uso de tais instrumentos foi uma reação ao tsunami monetário provocado pelo

quantitative easing adotado pelos Bancos Centrais dos PED (questão que será retomada no

terceiro capítulo). Houve, portanto, uma percepção, por alguns PEMPs, de que a acumulação

de reservas – principal instrumento utilizado no boom precedente - não era suficiente para

conter os efeitos das políticas monetárias dos PED - manifestados por meio das operações de

carry trade – sobre a taxa de câmbio e demais variáveis macroeconômicas (principalmente, a

expansão do crédito doméstico). Os instrumentos de GFC foram utilizados especialmente nos

momentos de elevados influxos de capitais de portfólio e de outros investimentos – que

39

Tais informações foram extraídas da base do FMI sobre os ativos e passivos em moeda estrangeira dos bancos

centrais – ”Data Template on International Reserves and Foreign Currency Liquidity” – por meio do link:

http://www.imf.org/external/np/sta/ir/IRProcessWeb/index.aspx. 40

No caso brasileiro, as linhas de swaps não foram utilizadas, principalmente pelo caráter non-deliverable dos

derivativos de câmbio (cujo mercado possui maior liquidez em relação ao mercado à vista), minimizando,

portanto, a perda de reservas nos momentos de crise de liquidez (Prates, 2015).

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possuem participação significativa na conta financeira dos países que recorreram a esses

instrumentos –, tendo, assim um caráter assimétrico, e também contracíclico, já que

praticamente não foram adotadas restrições sobre as saídas de capitais (Gosh, Ostry e Qureshi,

2017). Uma das possíveis razões dessa assimetria é a própria assimetria financeira que atinge

os PEMP: por não ser uma medida “market friendly”, a imposição dessas restrições nos

momentos de baixa do ciclo de liquidez internacional poderia provocar reações abruptas dos

investidores estrangeiros, impactando negativamente a volatilidade da taxa de câmbio desses

países (Tabela 1.6).

Tabela 1.5: Impacto dos instrumentos de política cambial

Instrumento

Efeitos

Exemplos Provê funding

ao mercado

de câmbio?

Economiza

reservas

internacionais?

Mercado à vista Sim Não Todos os países da

amostra

FX swap, FX repo e

forwards

Depende da

assimetria de

liquidez entre os

mercados

Sim; provisão

temporária de

liquidez

África do Sul, Hungria,

Coréia do Sul; Brasil e

Rússia (FX repo)

Swaps cambiais (non-

deliverable)

Depende da

assimetria de

liquidez entre os

mercados

Sim; não envolve

pagamentos em

moeda estrangeira

Brasil e Peru

Opções de câmbio Sim

Sim (somente as

opções exercidas

diminuem o

estoque de

reservas).

Colômbia e México

Certificado indexado à taxa

de câmbio

Depende da

assimetria de

liquidez entre os

mercados

Sim; não envolve

pagamentos em

moeda estrangeira

Peru

Fonte: Elaboração própria com base em Domanski et. al. (2016).

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Tabela 1.6: Os efeitos do boom e os instrumentos de GFC – 2009-2011

País

Fluxos de

Capitais

Líquidos (%

PIB)¹

Concentração

dos Fluxos

Líquidos

Apreciação²

(%)

Crédito

Interno4

Adotou

GFC?

Brasil 6,2 Portfólio 38,4 12,9 Sim

Indonésia 2,6 Portfólio 19,4 9,2 Sim

Coréia 1,9 Portfólio 17,5 0,4 Sim

Peru 5,9 Investimento

Direto 5,6 9,3 Sim

Tailândia 5

Outros

Fluxos de

Capital

9,3 4,3 Sim

Turquia 6,9

Outros

Fluxos de

Capital

6,5 21,4 Sim

Fonte: FMI (2011b) e Prates & Cunha (2011). Elaboração Própria.

Notas:

(1) Período: terceiro trimestre de 2009 ao segundo trimestre de 2010.

(2) Variação (%) da taxa de câmbio nominal efetiva do piso da crise até dezembro de 2010.

(3) Aumento em % do PIB, do piso da crise até dez/2010.

(4) Variação do índice de preços (em%) frente ao mesmo mês do ano anterior, média do 2º

sem/2010.

Portanto, a análise acima mapeia os principais “canais” entre, de um lado, as

assimetrias monetária e financeira e, de outro, a autonomia (ou espaço) de política cambial,

num contexto de regime de câmbio flutuante (sujo) e metas de inflação. De maneira geral, a

posição das moedas periféricas no SMFI direciona os objetivos macroeconômicos para a

estabilidade financeira e prevenção de crises por meio da redução da volatilidade cambial41

;

subordina o canal das expectativas da politica cambial ao canal das expectativas da política

monetária dos PED e implica assimetrias na adoção de instrumentos, em razão da precaução

no uso de reservas internacionais e de medidas “market unfriendly”. (Quadro 1.2). Portanto, a

busca por maior espaço de política cambial – dentro do regime macroeconômico adotado -

passa necessariamente pela contenção dos efeitos descritos acima. Porém, como atenuar os

41

Conforme exposto acima, vale ressaltar que, num regime de metas de inflação, o controle inflacionário

também exerce protagonismo como objetivo macroeconômico.

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impactos adversos das assimetrias monetária e financeira no contexto da globalização

financeira, no qual a assimetria financeira se revela ainda mais adversa para os PEMP? Se a

mudança no condicionante estrutural não é plausível no curto e médio prazo, a principal saída

é o manejo das especificidades (ou condicionantes domésticos), a fim de impactar tanto o

rendimento esperado (ou quase-rendas) da moeda periférica (em relação à divisa) quanto o

custo de carregamento desse ativo, de acordo com a equação (4).

Quadro 1.3: Quadro-resumo das implicações da hierarquia de moedas sobre a política

cambial

Fonte: Elaboração Própria

Considerações finais

O presente capítulo discutiu os aspectos conceituais e teóricos da política cambial

nos países emergentes em três seções. A primeira seção se dedicou à revisão do conceito de

política cambial e à proposição de um novo conceito e de uma taxonomia para tal política.

Dentre as diversas definições analisadas, optou-se por um conceito mais amplo, que considera

política cambial qualquer ação das autoridades monetárias que tenha como objetivo afetar a

Hierarquia de moedas

• Iliquidez da moeda doméstica no plano internacional

• Volatilidade das taxas de câmbio e de juros

• Assimetria financeira e macroeconômica

Política Cambial

•Priorização dos objetivos relacionados à estabilidade financeira e volatilidade da taxa de câmbio (exceto no caso de alguns países asiáticos)

• Canais de transmissão são afetados pela sinalização das autoridades monetárias dos países emissores de divisas.

•Assimetria de intervenção nos mercados de câmbio

•Maior variedade de instrumentos de intervenção utilizados para alcançar um determinado objetivo

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taxa de câmbio por meio do impacto na posição líquida dos agentes participantes do mercado

de câmbio. Seguindo essa definição, a análise da política cambial foi dividida em cinco

categorias: objetivos macroeconômicos, metas, canais de transmissão, instrumentos de

intervenção e indicadores monitorados.

A partir da definição e da categorização do objeto de análise desta tese, a segunda

seção se dedicou à contextualização da política cambial ao longo do período analisado. A

adoção formal, por diversos países emergentes, de regimes de câmbio flutuante e metas de

inflação após as crises da segunda metade da década de 1990, implicava, em teoria, a

passividade da política cambial nesses países. Porém, a literatura constatou que a política

cambial de fato continuava ativa, não somente em momentos de baixa no ciclo de liquidez

internacional, mas também nos períodos de boom. Dentre os diversos motivos elencados para

as intervenções, se destaca o “medo de flutuar”, principalmente em razão dos descasamentos

de moedas presentes nos balanços privados e públicos dos países emergentes e do maior pass-

through. Parte da literatura mainstream reconhece que esses desequilíbrios são causados pela

baixa ou nula participação das moedas domésticas nos mercados financeiros internacionais,

porém as explicações para tais diferenças variam conforme o approach teórico.

Esta tese parte do referencial teórico keynesiano-estruturalista das assimetrias

monetária e financeira, analisando a relação entre os balanços dos agentes e a política cambial

sob a perspectiva de uma economia monetária de produção. Assim, as características que

conformam o retorno sobre a moeda periférica – dentre elas o menor prêmio de liquidez em

relação à divisa - implica, dentre outros fatores, maior volatilidade em sua taxa de câmbio.

Em outras palavras, as assimetrias monetária e financeira geram instabilidades nas taxas de

câmbio dos PEMP, cuja dinâmica é determinada, em última instância, pela política monetária

dos PED. A configuração do SMI atual, portanto, restringe a autonomia de política cambial (e

demais políticas econômicas) dos PEMP, que atuam como policy takers no plano

internacional.

Seguindo a taxonomia de política cambial apresentada na primeira seção, as

restrições do espaço de política cambial se manifestam por meio do direcionamento dos

objetivos macroeconômicos para a estabilidade financeira e prevenção de crises mediante a

redução da volatilidade cambial; da subordinação do canal das expectativas da politica

cambial ao canal das expectativas da política monetária dos PED, e; do surgimento de

assimetrias na adoção de instrumentos, em razão da precaução no uso de reservas

internacionais e de medidas “market unfriendly”. A forma pela qual os diferentes países

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emergentes vão lidar com tais manifestações depende dos condicionantes domésticos da

política cambial, que serão analisados no próximo capítulo.

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Capítulo 2

Os condicionantes domésticos da política cambial nos países

emergentes

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Introdução

O capítulo anterior formulou as principais conexões entre uma característica

estrutural comum a todas as moedas periféricas – a posição no piso inferior da hierarquia de

moedas – e as categorias da política cambial – principalmente os objetivos macroeconômicos,

as metas, os canais de transmissão e os instrumentos. O próximo passo desta tese é investigar

as especificidades, ou seja, as características dos países da amostra que devem ser

incorporadas na análise da gestão da política cambial.

Conforme discutido no primeiro capítulo, no contexto da globalização financeira,

os impactos das assimetrias monetária e financeira sobre a taxa de câmbio restringem a

autonomia de política cambial dos países emergentes (Prates, 2002; De Conti, 2011). Essa

autonomia, por sua vez, é inversamente proporcional ao grau de abertura financeira, reflexo

da dualidade impossível (Flassbeck, 2001) – ou do dilema, nos termos de Rey (2013) – com a

qual se deparam os policy makers dos PEMP. Assim, a abertura financeira e a

institucionalidade do mercado de câmbio estão intrinsicamente vinculadas ao

condicionante estrutural e, portanto, constituem os principais condicionantes domésticos da

política cambial dos países emergentes. É sobretudo a partir da interação entre esses

condicionantes e os instrumentos de política cambial que os demais condicionantes

domésticos são afetados.

Os demais condicionantes domésticos foram definidos a partir dos desafios

impostos à política cambial dos países emergentes pela sua inserção assimétrica no SMFI

contemporâneo (Prates, 2015) e dos objetivos macroeconômicos e metas mencionados nas

entrevistas realizadas junto aos Bancos Centrais desses países e utilizadas no primeiro

capítulo (ver, por exemplo, BIS, 2013 e 2016; Mohanty & Berger, 2013; Moreno, 2005;

Domanski et. al., 2016)42

.

Um dos condicionantes é a vulnerabilidade externa, que, num ambiente de livre

mobilidade de capitais, se exacerba nos PEMP e pode gerar consequências negativas para a

42

No mesmo sentido aqui adotado, Prates (2007) também relaciona os condicionantes com os objetivos

macroeconômicos. De acordo com a autora, os objetivos e metas de política cambial dependem de dois

conjuntos de fatores (tratados aqui como condicionantes domésticos). O primeiro “(...) inclui os condicionantes

estruturais, dentre os quais o estágio de desenvolvimento econômico, as características dos mercados financeiros

domésticos e o grau de abertura financeira” (Prates, 2007, p. 9). O segundo “(...) consiste nos condicionantes

conjunturais ou macroeconômicos, que incluem, além da situação do balanço de pagamentos, o grau de pass-

through das variações cambiais aos preços e de currency-mismatch” (Prates, 2007, p. 9). Já Domanski et. al.

(2016, p.68) justificam que tais objetivos “depend not only on countries’ choice of monetary regime but also on

their exposure to external developments, their aggregate balance sheet positions and macroeconomic

circumstances”.

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volatilidade da taxa de câmbio (Prates, 2007; Domanski et. al, 2016). Portanto, a efetividade

de uma determinada política cambial que tenha como objetivo macroeconômico a estabilidade

financeira/prevenção de crises e como meta a redução da volatilidade cambial, passa

necessariamente pela redução da vulnerabilidade externa, considerada aqui um condicionante

doméstico.

Outro condicionante é a inter-relação entre taxa de juros e taxa de câmbio, que se

acentua especialmente nesses países, num ambiente de livre mobilidade de capitais e reduzida

autonomia de política econômica (Prates, 2015, p. 133). Consequentemente, a gestão da

política monetária torna-se um dos condicionantes domésticos da política cambial,

especialmente sob o regime de metas de inflação, já que o elevado repasse cambial

característico das economias emergentes torna o controle inflacionário um dos principais

objetivos macroeconômicos da política cambial (Caselli & Roitman, 2016; BIS, 2013). Outro

fator que aproxima tais políticas é a esterilização das intervenções no mercado de câmbio, já

que esta gera consequências para a operacionalização da política monetária e para o custo

financeiro da dívida mobiliária federal, como se verá a seguir.

Por fim, o último condicionante da política cambial considerado relaciona-se com

o objetivo macroeconômico da competitividade externa, listado por alguns autores – dentre

eles Bresser-Pereira (2012) e Guzman, Ocampo & Stigltiz (2014) – como a principal

motivação da política cambial (e da política econômica em geral) para se buscar o

desenvolvimento econômico (ver Gala & Libanio, 2010). Portanto, a competitividade externa

é uma das formas de ampliar autonomia da política cambial em relação aos impactos adversos

das assimetrias monetária e financeira. No entanto, ainda que os efeitos de uma taxa de

câmbio competitiva sejam positivos no médio e longo prazo para esses autores, os impactos

dessa taxa, no curto e médio prazo, podem ser heterogêneos, dependendo do padrão de

comércio de cada país – e, consequentemente, da integração da respectiva estrutura produtiva

às cadeias globais de valor (Hiratuka & Sarti, 2017). Assim, a busca por um patamar

depreciado de uma determinada moeda periférica, por exemplo, pode provocar no curto prazo

efeitos negativos sobre a balança comercial de um determinado país - dado seu padrão de

comércio – e aumentar, inclusive, sua vulnerabilidade externa43

. Os efeitos negativos podem

43

Há diversas ponderações na literatura sobre o efeito positivo da depreciação cambial sobre o saldo da balança

comercial. De acordo com a condição Marshall-Lerner, esse efeito só ocorre se a soma das elasticidades das

exportações e importações for maior que a unidade. Já Magee (1973) denominou de Curva J a resposta lenta da

balança comercial à variação da taxa de câmbio. Tal curva foi testada em diversos países – ver, por exemplo,

Lobo (2007) e Wilson (2001).

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se estender também para o controle inflacionário, no caso de um elevado repasse cambial para

os preços dos produtos importados.

De acordo com o referencial analítico proposto, os condicionantes domésticos

listados acima – abertura financeira e institucionalidade do mercado de câmbio;

vulnerabilidade externa; gestão da política monetária e padrão de comércio – se relacionam

com a política cambial conforme a figura 2.1. Assim, a interação entre, de um lado, os

instrumentos de intervenção e, de outro lado, a abertura financeira e a institucionalidade do

mercado de câmbio impacta, positiva ou negativamente, os outros três condicionantes

domésticos, que também se relacionam entre si. Dois pontos principais emergem da figura

abaixo. Primeiramente, a interação entre, de um lado, os instrumentos de política cambial e,

de outro lado, a abertura financeira e a institucionalidade do mercado de câmbio pode ocorrer

de forma ativa, isto é, alterando as regulações até então vigentes, ou acomodatícia, ou seja, se

adequando a tais regulações. Segundo, vale ressaltar que nem sempre todos os condicionantes

domésticos são afetados na condução de uma determinada política cambial. Ou seja, a escolha

de um certo instrumento, meta e objetivo pode envolver - além da abertura financeira e

institucionalidade - apenas um ou dois condicionantes dentre os três listados. Conforme os

diferentes impactos, os objetivos macroeconômicos, traçados previamente, são alcançados ou

não. Os condicionantes domésticos são tema das próximas quatro seções. Por fim, na última

seção deste capítulo, tais condicionantes são relacionados com o referencial teórico

apresentado no primeiro capítulo.

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Figura 2.1: Impactos dos condicionantes domésticos sobre a política cambial – estrutura

geral

Fonte: Elaboração própria

2.1 Abertura financeira e institucionalidade do mercado de câmbio

A relação entre abertura financeira (ou seja, a liberalização da conta financeira) e

política cambial é feita geralmente de maneira indireta pela literatura, ou seja, os diversos

trabalhos relatam o impacto da abertura sobre a taxa de câmbio e a reação, por conseguinte,

do Banco Central (Ramos, 2016; Eichengreen, 2001; Obstfeld, 2009 e 2015; Andrade &

Prates, 2013; De Conti, 2011; Calderón & Kubota, 2009). Conforme visto no primeiro

capítulo, um elevado grau de abertura financeira – que resulta numa elevada liquidez de

mercado (De Conti, 2011), potencializa os impactos das assimetrias monetária e financeira

sobre a taxa de câmbio (Prates, 2002). Consequentemente, os “mercados financeiros

globalizados” passam a exercer uma maior pressão sobre as taxas de câmbio dos países

emergentes. Neste ambiente, a eficácia da política cambial dependerá da correlação de forças

entre as autoridades monetárias e os ditos mercados (Farhi, 2006a, p. 154).. Assim, conforme

Prates (2007, p. 6) e Farhi (2006a), “o êxito das intervenções dessa autoridade no sentido de

manter a taxa de câmbio no patamar desejado e/ou de atenuar sua volatilidade será

inversamente proporcional ao grau de abertura financeira da economia”.

Abertura

financeira e

Institucionalidade

do Mercado de

câmbio

Vulnerabilidade

externa

Gestão da

Política

Monetária

Padrão de

comércio

Instrumentos

de Intervenção

Objetivos

macroeconômicos

e metas

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Em relação à categorização da abertura financeira, Akyuz (1993, p. 27) classifica

tal processo em três níveis. O primeiro nível refere-se à abertura aos influxos de capitais

(inward transactions), ou seja, os residentes podem, livremente, se endividar nos os mercados

financeiros internacionais, enquanto os não-residentes tem permissão para investir nos

mercados financeiros domésticos. O segundo nível refere-se aos fluxos de saída (outward

transactions), que permite aos residentes transferir capital e deter ativos denominados em

moeda estrangeira, e aos não residentes emitir dívidas e contrair empréstimos nos mercados

financeiros domésticos. Por fim, o terceiro nível compreende as transações domésticas em

moeda estrangeira (conversibilidade interna), que permite operações, tais como depósitos

bancários e empréstimos, entre os residentes em moeda estrangeira.

De maneira geral, dentre as diversas formas de mensuração da abertura financeira,

o indicador desenvolvido por Chinn e Ito (2008) é o mais utilizado na literatura e se baseia

nos dados do Annual Report on Exchange Arrangements and Exchange Restrictions do FMI.

De acordo com este índice, pode se identificar na amostra quatro grupos distintos em relação

ao grau de abertura financeira: países com maiores restrições sobre as transações entre

residentes e não residentes, como África do Sul e Tailândia, países com abertura moderada -

como Brasil, Turquia e Indonésia -, países com elevado grau de abertura, como México e

Coréia do Sul, e países com grau máximo de abertura, casos de República Tcheca, Hungria e

Peru44

(gráfico 2.1).

44

Vale ressaltar que o indicador kaopen considera não apenas as restrições na conta financeira, mas também

restrições na conta de transações correntes, além de tarifas comerciais e a presença de múltiplas taxas de câmbio

(Chinn e Ito, 2008).

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Fonte: http://web.pdx.edu/~ito/Chinn-Ito_website.htm

Nota: Os países foram numerados de 1 a 14 para facilitar a visualização gráfica

O grau de abertura financeira, por sua vez, se relaciona com a institucionalidade

do mercado de câmbio, que diz respeito, em linhas gerais, à liquidez e profundidade e à

regulação sobre as posições dos investidores residentes e não-residentes nesses mercados.

Essa relação, no entanto, é bidirecional, ou seja, alterações no nível de abertura financeira

podem afetar a institucionalidade do mercado de câmbio e vice-versa45

(Prates, 2015).

Porém, quais são os segmentos do mercado de câmbio mais líquidos e profundos e

como são as transmissões das posições dos agentes entre os diferentes segmentos (derivativos

e à vista; onshore e offshore)? De maneira geral, o mercado de câmbio de uma determinada

moeda é descentralizado em diversos lócus de negociação à vista e de liquidação diferida

(derivativos). As negociações entre os agentes nesses mercados ocorrem de duas formas: entre

os bancos (dealers) – ou outras instituições credenciadas pelas autoridades monetárias - e seus

clientes (traders) no mercado primário; e entre os próprios bancos (e outras instituições

financeiras) no mercado interbancário (ou interdealer46

), para que suas respectivas posições

no mercado primário de câmbio não fiquem descobertas ou excessivamente

45

Vale ressaltar que o índice Kaopen considera apenas regulações sobre a conta financeira (especificamente

controles de capitais), não incorporando, portanto, outros tipos de regulações, como a regulação macroprudencial

e dos mercados de derivativos (Chinn & Ito, 2008; Prates, 2012). Assim, por exemplo, a adoção de regulações

macroprudenciais pela Coréia do Sul após a CFG, que será analisada no próximo capítulo, não foi incorporada

no cálculo do Kaopen de 2014 apresentado no gráfico 2.1. 46

De acordo com o BIS (2016b, p.28), dealers são “financial intermediary that stands ready to buy or sell assets

with its clients”

Turquia África do Sul

Brasil Chile

Colômbia México

Peru Coréia do Sul

Filipinas Tailândia

Hungria Polônia

Indonesia Rep. Tcheca

0,00 0,20 0,40 0,60 0,80 1,00 1,20

Gráfico 2.1: Índice KAOPEN (2014)

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compradas/vendidas numa determinada moeda (Rossi, 2014). Neste contexto, os grandes

bancos atuam como market makers, formando os preços de compra e venda (bid-ask spreads)

dos diferentes pares de moedas (ver Huang e Masulis, 1999).

As operações entre os agentes podem ser realizadas em mercados de câmbio

onshore – ou seja, sujeitos à jurisdição de um determinado país47

- e/ou offshore – ou seja,

centros financeiros internacionais que não estão sujeitos a tais jurisdições48

. De acordo com

He & McCauley (2010) e Rossi (2014), a transmissão entre os mercados onshore e offshore

nos mercados emergentes ocorre por meio de agentes que operam em ambos os mercados e

possuem posições assimétricas no mercado offshore (comprada ou vendida). Tais agentes

carregam suas posições em descoberto para o mercado onshore, transmitindo a pressão

compradora ou vendedora para este mercado (ver figura 2.2) Por exemplo, um banco turco

possui uma posição comprada em dólar e vendida em lira turca no mercado de NDF (Lira

Turca/Dólar) offshore. Dessa forma, além do diferencial de juros, o banco ganha com a

depreciação da lira turca. Para fazer hedge dessa operação, o banco turco faz a operação

contrária no mercado de NDF onshore, transmitindo, portanto, a pressão vendedora do

mercado offshore.

47

Os residentes que operam nos mercados onshore estão sujeitos à jurisdição de um determinado país mesmo

fora das fronteiras nacionais. 48

Vale ressaltar que a ausência de jurisdição não impede iniciativas de regulação internacional. Por exemplo, o

mercado de NDF está migrando gradativamente a plataformas centralizadas de negociação, quem possuem

melhor estrutura de clearing (ver McCauley e Shu, 2016).

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Os mercados onshore e offshore de balcão49

são estimados e analisados

trienalmente pelo BIS desde 1995. De acordo com BIS (2016), o volume dos mercados de

câmbio nos países da amostra, especialmente dos segmentos offshore, aumentou

exponencialmente entre 1995 e 2016, especialmente entre 2004 e 2007 e 2010 e 2013 – nesse

último período o mercado offshore aumentou quase três vezes (Ehlers & Packer, 2013; Levich

& Packer, 2017). Na maioria dos países - com exceção de Chile, Coréia do Sul e Tailândia –

os mercados offshore ultrapassaram os mercados onshore em volume, indicando, portanto,

uma maior dificuldade dos Bancos Centrais na transmissão e, portanto, na efetividade de suas

intervenções (ver tabela 2.1).

Entretanto, entre 2013 e 2016 o volume desses mercados diminuiu, por conta,

principalmente da instabilidade dos fluxos de capitais direcionados aos mercados emergentes.

Vale ressaltar que essa queda se concentra nas moedas mais negociadas; moedas menos

49

De acordo com King & Mallo (2010, p. 81), os mercados organizados não são incluídos no relatório trienal do BIS, já que tais informações estão disponíveis apenas em bases de dados privadas.

Bancos

s

Inv. Institucionais

Hedge Funds

Empresas

Bancos

s

À vista

Derivativos

Interbancário

À Vista

Interbancári

o

Bancos

Derivativos

Inv.

Institucionais

Hedge Funds

Empresas

Onshore Offshore

Figura 2.2: Os mercados de câmbio onshore e offshore

Fonte: Elaboração própria

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82

“líquidas” no plano internacional - como o peso chileno e colombiano e o bath tailandês –

aumentaram o volume de seus respectivos mercados offshore.50

50

Conforme Moore et. al. (2016), o aumento do volume negociado em alguns mercados de câmbio emergentes

de balcão se deve principalmente ao mercado de derivativos (especialmente o mercado de swaps).

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83

Tabela 2.1: Volume (estimado)a dos mercados onshore e offshore de balcão – moedas selecionadas

b

Moeda 1995 1998 2001 2004 2007 2010 2013 2016

Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore

BRL - - 5.127 - 5.529 364 3.790 1.353 5.762 7.338 14.094 13.120 17.203 41.964 19.747 30.938

CLP - - 1.255 - 2.328 - 2.462 - 4.003 - 5.544 966 11.956 3.948 7.491 4.973

COP - - - - 397 - 802 - 1.860 - 2.794 1.174 3.343 2.487 3.867 4.031

CZK - - 5.128 - 2.094 203 2.383 534 5.029 2.089 5.110 2.493 4.912 14.146 3.822 10.411

HUF - - 1.448 - 587 - 2.827 881 6.858 2.088 4.196 12.959 3.854 18.837 3.305 11.992

IDR - - 1.766 - 3.875 - 2.332 - 3.039 629 3.381 2.636 5.011 4.038 4.633 5.457

KRW - - 3.557 - 9.809 152 20.529 1.547 35.236 3.189 43.824 16.432 47.520 16.675 47.814 36.028

MXN - - 8.659 - 8.593 1.662 15.270 6.134 15.314 28.250 17.019 32.917 32.112 103.241 20.223 76.833

PEN - - - - 241 - 306 - 805 - 1.425 - 2.171 1.035 1.496 2.379

PHP - - 759 - 1.064 - 678 95 2.338 1.170 5.017 1.690 3.733 4.058 2.578 4.461

PLN - - 2.664 - 5.146 454 6.535 761 9.225 16.130 7.847 24.155 7.564 30.005 9.116 26.207

THB - - 3.119 - 1.912 - 3.119 753 6.314 185 7.390 260 12.784 4.312 10.544 7.694

TRY - - - - 1.043 - 3.489 - 4.096 1.844 16.817 12.466 27.277 43.386 22.282 50.530

ZAR 5.165 - 8.933 - 9.941 1.753 9.797 4.200 13.974 16.320 14.375 14.298 20.946 38.757 21.160 28.135

Total 5.165 - 42.415 - 52.558 4.588 74.319 16.259 113.852 79.231 148.832 135.566 200.386 326.890 178.077 300.069

a. Os volumes onshore e offshore foram estimados de acordo com McCauley & Shu (2016, p. 84, gráfico 3): “onshore is defined as all trades executed in the jurisdiction

where a currency is issued on a “net-gross” basis (ie adjusted for local inter-dealer double-counting). Offshore is calculated as the difference between total for the currency on

a “net-net” basis (ie adjusted for local and cross-border inter- dealer double-counting) and onshore transactions”.

b. BRL: real; CLP: peso chileno; COP: peso colombiano; CZK: coroa tcheca; HUF: florin húngaro; IDR: rupiah; KRW: won; MXN: peso mexicano; PEN: sol peruano; PHP:

peso filipino; PLN: sloty polonês; THB: bath tailandês; TRY: lita turca; ZAR: rand sul-africano.

Fonte: BIS (2016)

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84

Neste contexto, os mercados de câmbio offshores – que cresceram em volume ao

longo dos anos 2000 – se tornaram peças importantes para a compreensão da formação da

taxa de câmbio nominal das economias emergentes e, consequentemente, das fontes de

instabilidade desse preço-chave. Assim, a identificação dos mercados mais líquidos, bem

como dos agentes com maiores posições – principalmente dos agentes que atuam em ambos

os mercados (onshore e offshore) - permite, por parte das autoridades monetárias, a escolha

dos instrumentos de política cambial mais eficazes nos mercados onshore.

Considerando a amostra selecionada, apenas sete moedas periféricas são

relevantes nos mercados offshore, BRL, MXN, KRW, PLN, HUF, ZAR, TYN, e, portanto,

incorporadas pelo BIS em sua base de dados. Para as demais moedas há apenas dados do

mercado onshore, disponibilizadas também pelo BIS.

Com base no último relatório trienal – (BIS, 2016) -, dentre as moedas periféricas

analisadas no mercado offshore, há o predomínio de três segmentos: mercado à vista, mercado

forward e o mercado de swap cambial (tabela 2.1). O MXN e ZAR se destacam em relação ao

mercado à vista, sugerindo não a maior internacionalização dessas moedas – no sentido

proposto pela hierarquia de moedas -, mas o impacto de características regulatórias internas

nos mercados offshore, já que o fato de MXN e ZAR serem totalmente “conversíveis” (ou

deliverables) no mercado doméstico viabiliza a formação de um mercado à vista offshore

líquido (ver ANZ, 2014).

Os mercados de derivativos cambiais offshore tiveram crescimento expressivo ao

longo dos anos, principalmente após a crise financeira global de 2008 (gráfico 2.2). Nesse

contexto, o mercado de swaps cambiais se destaca como o mais líquido e profundo entre as

moedas periféricas, com exceção do BRL e KRW, que se destacam no mercado de forwards,

especificamente o mercado de NDF, que, por sua vez, corresponde a 19% do total de

“forwards” negociados offshore51

. Em menor grau, os mercados de NDFs denominados em

pesos colombianos, pesos chilenos e sol peruano também se expandiram (Alvarado, Robayo

& Moreno, 2015).

A participação expressiva das moedas brasileira e sul coreana - em relação as

demais moedas periféricas - no mercado de NDF se deve basicamente a fatores relacionados à

51

Vale ressaltar a diferença entre forwards e futuros. Enquanto os contratos futuros são padronizados e

negociados em mercados organizados (bolsas de valores), os contratos forwards são instrumentos de balcão,

acordados entre agentes privados, que estabelecem os termos e condições específicos de cada contrato. Dessa

forma, contratos forwards possuem um maior risco de contraparte, pois não possuem clearing houses ou outras

instituições que garantam as transações. A fraca institucionalidade também implica a ausência de marcação a

mercado em grande parte dos contratos forwards (Farhi, 2006b).

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85

abertura financeira. No caso sul-coreano, a restrição à tomada de empréstimos em won (dos

bancos sul-coreanos) pelos investidores não-residentes limitou a participação de tais

investidores no mercado de DF onshore, e, consequentemente, impulsionou o mercado de

NDF offshore. Os próprios bancos sul-coreanos também recorreram aos mercados de NDF

para realizar operações de arbitragem com o mercado de DF onshore. Já no caso brasileiro, a

predominância do mercado futuro onshore (e organizado) – líquido, profundo e propício às

operações de carry trade (canônico e por meio de derivativos) – contribuiu para o

crescimento do mercado offshore de NDFs, principalmente por meio dos agentes que operam

em ambos os mercados onshore e offshore (Mc Cauley & Shu, 2016, p. 84-87).

O mercado de swaps offshore (de taxa de câmbio e de moedas) também

apresentou crescimento expressivo ao longo dos anos 2000 em grande parte dos países da

amostra, principalmente após 2010, sendo dominado essencialmente pelos FX swaps.

Conforme mencionado no primeiro capítulo, num contrato de FX swaps duas partes trocam

duas moedas (num montante estabelecido) à taxa de câmbio spot e se comprometem a reverter

tais posições em uma data futura e de acordo com uma taxa de câmbio pré-estabelecida. Este

instrumento equivale à combinação spot/forward nas operações de carry trade: compra de

uma determinada moeda no mercado de câmbio à vista, para ter acesso aos mercados de

títulos locais, associada a uma venda dessa mesma moeda no mercado forward. O contrato de

currency swaps (swaps de moedas) equivale ao contrato de FX swaps, porém com uma

diferença: os contratos são mais longos, enquanto os vencimentos dos FX swaps são de

curtíssimo prazo (uma semana normalmente). Assim, enquanto o mercado de FX swaps

fornece funding de curto prazo (money market funding), os currency swaps oferecem funding

com prazos superiores que um ano – capital market funding (Borio, 2017, p. 38-40; Barbku &

Ong, 2010; Moreno et. al., 2010).

Nos países da amostra, MXN, TYN, ZAR e as moedas dos países da Europa

Central e do Leste – PLN, HUF e CZK - são os protagonistas nesse segmento de mercado em

relação às demais moedas periféricas, principalmente o mercado de FX swaps, que, no caso

de TYN e ZAR (e em menor escala PLN) é o principal segmento do mercado de câmbio

offshore. Já o mercado de currency swaps (majoritariamente offshore) ainda é tímido em

comparação ao volume dos demais segmentos. Apenas o MXN e ZAR possuem um mercado

mais líquido e crescente em relação às demais moedas periféricas, porém com volumes ainda

muito distantes dos mercados de FX swaps (Upper & Valli, 2016).

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86

Assim como o mercado de currency swaps, a participação do mercado de opções,

em relação ao volume total em cada moeda é pequena, ofuscada pela evolução dos mercados

de NDF e swaps cambiais (Moore, Schrimpf & Sushko, 2016). BRL e KWR são as principais

moedas nesse mercado, em relação às demais moedas da amostra. Em alguns países, como a

Coréia do Sul, as opções de câmbio foram amplamente utilizadas nos períodos de alta do ciclo

de liquidez internacional pelas empresas não financeiras, que recorreram a tais derivativos não

apenas para hedge de suas operações, mas também para alavancar suas posições nos mercados

de câmbio (Chui, Fender & Sushko, 2014).

Em relação aos participantes do mercado de câmbio offshore, houve crescimento,

ao longo do período analisado, da rúbrica “outras instituições financeiras” - bancos que não

reportaram como dealers, investidores institucionais, hedge funds e setor público. Tais

instituições predominam em todos os mercados emergentes da amostra, em especial bancos

estrangeiros, seguidos dos dealers estrangeiros (ver Gráfico 2.3).

Fonte: BIS (2016)

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

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80%

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100%

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Brasil México Coréia doSul

Polônia Hungria Turquia África do Sul

Gráfico 2.2: Volume dos mercados onshore e offshore por segmento

Spot Forward Futuro Opções FX Swaps Currency swaps

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87

Fonte: BIS (2016)

Já os mercados de câmbio onshore são condicionados pelo grau de abertura

financeira. Assim, as características de tais mercados – por exemplo, os agentes participantes

nos mercados à vista (primário e interbancário) e de derivativos e as restrições às transações

nesses mercados – dependem, essencialmente, do grau de abertura financeira.

Atualmente, o mercado à vista é o segmento mais líquido nos países menores da

amostra (gráfico 2.4). Nesse mercado, há poucas restrições em relação à participação dos

agentes (desde que autorizadas pelas autoridades monetárias) – com exceção das Filipinas,

que exige que as operações estejam atreladas a alguma operação comercial, Tailândia e Brasil,

onde as operações exigem um contrato de câmbio. Em relação à posição de câmbio, grande

parte dos países limita tal direito aos bancos ou possui alguma restrição ao acesso de

instituições a esse tipo de operação – com exceção dos países da amostra da Europa Central e

do Leste. Alguns países – Turquia, Peru, Colômbia e México - também limitam

quantitativamente a posição de câmbio das instituições financeiras a fim de evitar

movimentos especulativos. No que tange aos dealers, apenas os mercados de câmbio mais

líquidos possuem alguma restrição à negociação direta com os Bancos Centrais. Dentre os

dealers, as instituições estrangeiras possuem grande participação em quase todos os mercados

- exceto Coréia do Sul e Brasil -, sugerindo, portanto, um maior risco de contágio do ciclo de

liquidez internacional na formação da taxa de câmbio (Quadro 2.1).

0%10%20%30%40%50%60%70%80%90%

100%

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On

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Brasil México Coréia do Sul Polônia Hungria Turquia África do Sul

Gráfico 2.3: Volume dos mercados onshore e offshore por

participante

Dealers locais Dealers estrangeiros Outras instituições Instituições não financeiras

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88

Já o mercado de derivativos de câmbio onshore se expandiu ao longo dos anos

2000 e se tornou o segmento mais líquido nas principais moedas periféricas (gráfico 2.2).

Com exceção dos países do sudeste asiático (Filipinas, Coréia do Sul e Tailândia), há poucas

ou nenhuma restrição às operações nesses mercados (de balcão), que se concentram nos

segmentos de forwards e swaps.

Os mercados forwards onshore são em grande parte non deliverables e, assim

como os mercados NDF offshore, cresceram, em volume, com o retorno dos fluxos de capitais

aos países emergentes após a crise financeira global, principalmente em mercados sul-

americanos menores, como Chile, Peru e Colômbia (gráfico 2.4). Vale destacar a

predominância do mercado futuro (mercado organizado) no caso brasileiro, que confere

singularidade à institucionalidade deste país, conforme será visto no próximo capítulo. O

crescimento desses mercados propiciou não somente hedge das operações de carry trade, mas

também movimentos especulativos via derivatives carry trade, implicando maior

instabilidade nas taxas de câmbio dos países emissores de moedas periféricas. Por exemplo,

os rumores sobre o anúncio do tappering em abril de 2013 provocaram uma mudança das

posições dos investidores nos mercados forwards emergentes para a ponta vendida nas

moedas emergentes (McCauley & SHU, 2016).

Assim como nos mercados offshore, os mercados de FX swaps onshore –

relevantes no México, Polônia, Hungria, República Tcheca, Turquia e Coréia do Sul - são

uma importante fonte de funding nos países emergentes. Tal mercado se sobressai quando os

bancos estrangeiros possuem acesso limitado ao mercado de crédito doméstico, dificultando,

portanto, o funding na moeda local. Por serem instrumentos de curtíssimo prazo, os FX swaps

estimulam as operações de carry trade, além de oferecer hedge para empresas não-financeiras

(Borio et. Al., 2017). Interrupções na rolagem dessas operações podem causar crises de

liquidez não só no mercado de swaps, mas também nos demais segmentos do mercado de

câmbio e no sistema bancário (Barkbu e Ong, 2010) (Moreno et. al., 2010).

Em relação aos agentes participantes, há o predomínio de dealers e bancos

estrangeiros no caso das moedas com participação relevante nos mercados offshore, e dos

dealers locais no caso das moedas periféricas com pouca participação internacional. A

presença majoritária, em volume, das instituições financeiras estrangeiras tanto nos mercados

onshore e offshore sugere um importante canal de transmissão das operações desse último

para o primeiro, por meio das chamadas operações espelho citadas acima (ver, por exemplo,

He & MacCauley, 2010 e Rossi, 2014 para o caso brasileiro).

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89

Fonte: BIS (2016)

Fonte: BIS (2016)

0,0%

10,0%

20,0%

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Chile Peru Indonesia Tailandia Filipinas Colômbia Rep. Tcheca

Gráfico 2.4: Volume dos mercados onshore por segmento (em %)

Spot Forward Opções FX Swaps Currency swaps

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Chile Peru Indonesia Tailandia Filipinas Colômbia Rep. Tcheca

Gráfico 2.5: Volume dos mercados onshore por participante (em %)

Dealers locais Dealers estrangeiros Outras instituições Instituições não financeiras

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90

Quadro 2.1: Institucionalidade dos mercados à vista e de derivativos (2015) – países selecionados

País/mercado Colômbia México Chile Brasil

À vista

Agentes: podem atuar nos

segmentos primário e

interbancário: bancos,

corporações financeiras

(semelhantes aos bancos de

investimento no Brasil),

corretoras, seguradoras, fundos

de pensão e agentes fiduciários

sob a supervisão da

Superintendência Financeira.

Restrição à abertura de contas

em moeda estrangeira.

Dealers: todas as instituições

financeiras

Posição de câmbio: todos os

agentes podem ter posição de

câmbio. Mas, não podem manter

posição vendida a partir da

contratação de empréstimos no

mercado interbancário

internacional (operações de

linha). Limite de posição: 20% do

Agentes: somente os bancos

(comerciais) podem atuar no

mercado primário; já o mercado

interbancário compreende bancos

(comerciais, de investimento e

múltiplos), fundos de pensão,

seguradoras e quaisquer instituições

registradas como instituições

financeiras. Não há restrição para

abertura de contas em moeda

estrangeira.

Dealers: Somente bancos

Posição de câmbio: além dos

bancos (comerciais e de

investimento), fundos de pensão,

seguradoras, corretoras e agentes

fiduciários. Mas a posição de divisas

dos bancos (comprada ou vendida) é

restrita a 15% do seu capital.

Agentes: Mercado primário de câmbio

é negociado num sistema chamado

Datatec, onde Bancos e Corretoras de

Valores operam uns com os outros de

acordo com limites preestabelecidos

entre eles. No mercado interbancário,

25 bancos podem participar, sem

qualquer intervenção do Banco Central.

Não há restrições para abertura de

contas de moeda estrangeira.

Dealers: todas as instituições

financeiras

Posição de câmbio: permitida para

bancos, corretoras, seguradoras e

sociedades de investimentos; não há

limites.

Agentes: No mercado primário, as

operações com divisas devem ser

formalizadas em contratos de câmbio

e realizadas por meio de instituições

financeiras autorizadas pelo Banco

Central. Restrição à abertura de

contas em moeda estrangeira. No

mercado interbancário, diversas

instituições financeiras (bancos e

não-bancos) podem atuar, porém

devem prestar contas de suas

operações e posições em moeda

estrangeira ao Bacen.

Dealers: Somente bancos

Posição de câmbio: permitida para

bancos. Atualmente, não há limite de

posição comprada ou vendida.

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91

capital, comprada; 5% do capital,

vendida.

Derivativos

Apenas o mercado de opções é

relevante no onshore, com grande

participação de investidores

estrangeiros

Relevante no mercado de FX swaps. Relevante no mercado forward (porém

baixa liquidez). Forte regulação sobre

as posições de câmbio.

Mercado futuro é o mais líquido

dentre todos os segmentos (incluindo

à vista).

País/mercado Indonésia Filipinas Tailândia Coréia do Sul

À vista

Agentes: Podem atuar bancos e

demais instituições financeiras

(desde que previamente aprovadas

pelas autoridades monetárias).

Transações que envolvem não

residentes são reguladas pelas

autoridades monetárias. No

mercado interbancário, 74 bancos

podem participar, sem qualquer

intervenção do Banco Central.

Residentes e não residentes podem

ter conta em moeda estrangeira no

país.

Dealers: Somente bancos

Posição de câmbio: Apenas os

bancos podem ter posição (líquida)

de câmbio

Agentes: Não há restrições em

relação às transações entre

residentes e entre residentes e não

residentes. No mercado

interbancário, os bancos nacionais e

estrangeiros negociam, sem

restrições, por meio de uma

plataforma eletrônica, na qual as

taxas de câmbio são estabelecidas.

Dealers: Qualquer instituição

financeira e não financeira

autorizada pelo Banco Central.

Posição de câmbio: Permitida para

todas as instituições financeiras.

Agentes: Qualquer agente pode

comprar e vender THB mediante

instituições financeiras autorizadas

pelo Banco Central. Não residentes são

obrigados a abrir contas em bancos

autorizados, com regulação do Banco

Central. No mercado interbancário, não

há limites e restrições para as

operações entre as instituições

autorizadas. Residentes e não

residentes podem ter contas em moeda

estrangeira no país sem restrições.

Dealers: todas as instituições

financeiras

Posição de câmbio: Permitida para

todas as instituições financeiras

autorizadas pelo Banco Central

Agentes: No mercado primário,

todas as instituições financeiras e

não financeiras podem operar. Nas

transações “delivery”, é necessário

um pedido de aprovação junto a um

banco. No mercado interbancário,

não restrições para as operações.

Bancos participantes estão sujeitos

as regras do “Comitê do Mercado de

Câmbio de Seoul”, no qual o Banco

da Coréia faz parte. Abertura de

conta em moeda estrangeira é

permitida.

Dealers e posição de câmbio:

Somente bancos.

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92

Derivativos

Relevante para os mercados

forwards e swaps. Operações são

reguladas e permitidas apenas para

hedge de algumas operações.

Relevante nos mercados forward e

swaps. Transações são reguladas e

restritas para hedge (documentos

que comprovam a posição aberta de

câmbio).

Relevante nos mercados forward e

swaps. Operações são reguladas e

permitidas apenas para hedge.

Relevante no mercado de forwards e

opções (com limites de posições para

bancos nacionais e estrangeiros e

exportadores)

País/mercad

o Polônia Hungria República Tcheca Turquia

À vista

Agentes: Qualquer instituição

financeira pode atuar no mercado

primário. A regulação foi adequada

aos padrões da União Europeia. No

mercado interbancário, não há

limites para as operações, que são

concentradas em poucos bancos

(cerca de 20 instituições). Residentes

e não-residentes podem ter conta

em moeda estrangeira.

As autoridades monetárias

removeram todas as restrições sobre

as transações no mercado de câmbio

em 2001 nos mercados primários e

interbancário. Todas as instituições

financeiras podem ter posições

abertas de câmbio. Residentes e

não-residentes podem ter conta em

moeda estrangeira.

Qualquer instituição financeira e não

financeira, autorizada pelo Banco

Central, pode atuar no mercado

primário e interbancário. Grande parte

dos dealers são bancos, parte deles

estrangeiros. Residentes e não-

residentes podem ter conta em moeda

estrangeira.

Agentes: qualquer instituição

financeira e não financeira

autorizada pelas autoridades

monetárias. Grande parte dos

agentes pode ter conta em moeda

estrangeira no país (alto nível de

dolarização).

Dealers: Somente bancos

Posição de câmbio: permitida para

bancos, com regulação do Banco

Central sobre as posições vendidas

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93

Dealers: Principalmente bancos

Posição de câmbio: Não há

restrições em relação às instituições

financeiras.

em moeda estrangeira.

Derivativos

O mercado de FX swaps é líquido e

profundo (superando, em volume, o

mercado à vista em alguns períodos)

O mercado de FX swaps é líquido e

profundo (superando, em volume, o

mercado à vista em alguns

períodos).

O mercado de FX swaps é líquido e

profundo (superando, em volume, o

mercado à vista em alguns períodos)

Relevante no mercado de swaps

cambiais

País/mercado África do Sul Peru

À vista

Agentes: No mercado primário, todas as instituições financeiras autorizadas

pelo Banco Central podem operar. Abertura de contas em moeda estrangeira

é restrita e regulada pelas autoridades monetárias.

Dealers: Bancos nacionais e estrangeiros (maioria) autorizados pelo Banco

Central.

Posição de câmbio: Somente bancos.

Agentes: participam no mercado primário principalmente bancos

domésticos, fundos de pensão, não residentes e empresas não

financeiras. Participantes podem abrir contas em moeda estrangeira (alto

nível de dolarização). No mercado interbancário, todos os bancos são

autorizados a participar das operações.

Dealers: todas as instituições financeiras

Posição de câmbio: Principalmente bancos. Há limites nas posições

compradas e vendidas em dólar.

Derivativos O mercado de FX swaps é líquido e profundo (superando, em volume, o

mercado à vista em alguns períodos).

Relevante no mercado de forwards (principalmente NDF).

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94

Fonte: FMI (2015),Prates (2015), Bancos Centrais dos países emergentes selecionados.

Em suma, a evolução e o quadro institucional dos diversos segmentos do mercado

de câmbio onshore e offshore revelam alguns padrões em relação à regulação, atuação dos

agentes e liquidez desses mercados. De maneira geral, o mercado de FX swaps se destaca em

grande parte das moedas com mercado offshore relevante, com exceção de BRL e KRW. O

crescimento, em volume, dos mercados de derivativos - e sua preponderância em relação aos

demais segmentos em alguns países – estimula os bancos centrais a usarem instrumentos

derivativos em suas intervenções, conforme mencionado no capítulo anterior (Domanski et.

al., 2016). As restrições em relação à abertura financeira, por sua vez, se concentram nas

posições de câmbio (México e Turquia), na abertura de contas em moeda estrangeira (Brasil e

África do Sul) e nas transações entre residentes e não-residentes (sudeste asiático).

Em relação aos agentes participantes do mercado, há a presença preponderante de

dealers (em sua maioria bancos) e bancos estrangeiros nos mercados onshore e offshore das

moedas periféricas mais líquidas. A maior presença de instituições estrangeiras nos mercados

de câmbio pode deixar as moedas periféricas ainda mais suscetíveis às sinalizações e

mudanças da política monetária nos países de origem desses bancos – majoritariamente a

política monetária do BCE e Fed – afetando, portanto, os canais de transmissão da política

cambial nos países emergentes. Nesse cenário, as sinalizações das intervenções feitas pelos

bancos centrais dos PEMP perdem força, isto é, tais ações podem ser constantemente

confrontadas pelas operações dos grandes dealers estrangeiros nos mercados de câmbio

internacionais. Ao mesmo tempo, a capacidade da autoridade monetária de impactar os

mercados de câmbio via canal de equilíbrio de portfólio também perde força, já que a

expansão dos mercados onshore e offshore, bem como suas interações, “dilui” os efeitos das

reservas internacionais sobre esses mercados (ver Menkhoff, 2013).

2.2 Os aspectos financeiros da vulnerabilidade externa

A vulnerabilidade externa é um tema recorrente após a inserção dos países

periféricos na globalização financeira e uma das principais consequências do SMFI

hierarquizado sobre esses países. Numa definição ampla, ela evidencia a sensibilidade do

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95

ciclo doméstico aos movimentos do ciclo de liquidez global52

(Gonçalves, 1998; Rosa &

Biancarelli, 2017). Os choques provindos do ciclo global podem se transmitir de diversas

formas às economias domésticas.

A intensificação da abertura financeira das economias emergentes ao longo dos

anos 1990 e 2000 e o boom dos fluxos de capitais entre 2003 e 2007 impulsionaram, pelo lado

dos fluxos, a entrada de capitais privados nessas economias (Gráfico 2.6). De maneira geral,

os empréstimos externos se sobressaíram tanto no período pré-crise – com destaque para a

Coréia do Sul – quanto no período pós-crise em relação aos demais fluxos privados (fluxos de

portfólio e IDE). Os fluxos de IDE também possuem relevância na média dos fluxos líquidos

– destaca-se Brasil, México e Coréia do Sul -, conferindo, supostamente, maior estabilidade

aos fluxos de capitais privados, em razão da natureza menos volátil deste tipo de fluxo. No

entanto, os fluxos de IDE possuem componentes desestabilizadores, que comprometem seu

suposto caráter de longo prazo. Os fluxos direcionados a fusões e aquisições, por exemplo,

pode contribuir para o aprofundamento dos desequilíbrios causados pelos fluxos de capitais

de curto prazo. Os fluxos de IDE podem ser utilizados também como funding de operações de

curto prazo (carry trade), por meio dos empréstimos intercompanhias (Akyüz, 2017, p. 182-

183).

Em relação à conta corrente (gráficos 2.9 e 2.10), pode se observar no gráfico 2.9

os países (especialmente Brasil, Chile, Peru e Indonésia) que se beneficiaram do boom dos

preços das commodities no período pré-crise – e, portanto, chegaram a registrar superávits em

conta corrente no período – e que tiveram suas contas de transações correntes duramente

afetadas, conjuntamente com os países do gráfico 2.10, no pós-crise, com o enfraquecimento

do comércio mundial. Tal fato, portanto, pressionou ainda mais o balanço de pagamentos

desses países, principalmente Turquia e Peru, que possuem altos níveis de dolarização em

suas economias.

52

Há outras definições de vulnerabilidade externa (ver Gonçalves et al, 1998, p. 57; Painceira & Carcanholo,

2002; Gonçalves, 2005; Carcanholo, 2010).

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96

Fonte: Institute of International Finance (IIF)

Nota: 1. Todos os países da amostra exceto o Peru, que não é considerado na base de dados da IIF

Fonte: IIF

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

300.000

350.000

400.000

450.000

500.000

550.0001

99

0

19

91

19

92

19

93

19

94

19

95

19

96

19

97

19

98

19

99

20

00

20

01

20

02

20

03

20

04

20

05

20

06

20

07

20

08

20

09

20

10

20

11

20

12

20

13

20

14

20

15

e

Gráfico 2.6: Fluxos líquidos de capitais privados de não residentes -

países selecionados1 (em US$ milhões)

(5.000)

-

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

Gráfico 2.7: Fluxo líquido de capitais privados pré-crise (2003-

2007) - média - US$ milhões

IDE Portfólio Empréstimos Externos

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97

Fonte: IIF

Fonte: IIF

(10.000)

-

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

Gráfico 2.8: Fluxo líquido de capitais privados pós-crise (2008-

2016) - média - US$ milhões

IDE Portfólio Empréstimos Externos

-6

-4

-2

0

2

4

6

8

10

12

14

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Gráfico 2.9: Saldo da conta de transações conta corrente - países

selecionados - % PIB

Brasil Chile Indonésia Peru Filipinas Tailândia Coréia

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98

Fonte: IIF

Pelo lado dos estoques, a abertura contribuiu para o encurtamento de prazos do

passivo externo, a dolarização e o descasamento de moedas no balanço das instituições

financeiras e não financeiras (naqueles países que avançaram em relação à conversibilidade

de direito), e o endividamento externo dos setores privado e público. Ademais, esses

desequilíbrios foram agravados pela presença dos regimes de câmbio administrados, que

dificultava os ajustes aos choques externos. Consequentemente, tal cenário tornou as

economias emergentes mais vulneráveis aos movimentos dos ciclos de liquidez internacional,

como se verificou nas crises cambiais da segunda metade da década de 199053

(Akyüz, 2014

e 2017); (Kaltenbrunner; Painceira, 2015).

Conforme discutido no primeiro capítulo, a mudança para o regime de câmbio

flutuante em grande parte dos países emergentes após essas crises contribuiu para a absorção

de parte da volatilidade dos fluxos de capitais de curto prazo, porém, ao mesmo tempo,

aprofundou os efeitos das fases de alta e baixa do ciclo de liquidez sobre a taxa de câmbio e a

posição dos agentes em moeda estrangeira. De acordo com Akyüz (2017, p. 136-137):

To the extent that there are large currency mismatches in balance

sheets, sharp declines in the exchange rate could increase the debt

53

A primeira geração de modelos de crises cambiais relacionava as vulnerabilidades externas à deterioração dos

fundamentos econômicos domésticos (Krugman, 1979). A segunda geração chamou a atenção para a

possibilidade de trade-off entre a deterioração dos fundamentos e o regime de câmbio fixo. Para uma visão

aprofundada sobre o tema, ver Prates (2002, p. 40-57) e (Kaltenbrunner & Painceira, 2015).

-10

-8

-6

-4

-2

0

2

4

6

8

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Gráfico 2.10: Saldo da conta de transações conta corrente -

países selecionados - % PIB

Hungria Colômbia México Polônia

África do Sul Turquia Rep. Tcheca

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99

burden, thereby causing bankruptcies and reducing effective demand.

Currency mismatches in the private sector tend to be particularly

damaging. At times of capital reversals, private borrowers often

attempt to close their open positions by purchasing foreign currency

in order to avoid further losses from depreciations and this in turn

accelerates the fall of the currency

A fim de evitar tais impactos descritos acima – e a repetição das crises cambiais

da década de 1990 – os países emergentes adotaram diferentes medidas visando a melhora dos

indicadores relacionados à solvência e liquidez externa54

. A principal delas foi a acumulação

de reservas, que se intensificou ao longo do boom dos fluxos de capitais pré-crise, conforme

mencionado no capítulo anterior. A expansão do colchão de liquidez combinada com o bom

desempenho do saldo da balança comercial – em razão, principalmente, do boom dos preços

das commodities e maior dinamismo do comércio mundial, mencionados acima – foram

determinantes para a melhora dos indicadores de liquidez e solvência externa,

respectivamente55

(Tabela 2.2).

Além disso, essa melhora veio acompanhada de uma redução na dolarização dos

passivos externos em alguns países, em especial dos títulos soberanos (Akyuz, 2014). A maior

participação das emissões de títulos em moeda doméstica causa efeitos patrimoniais positivos,

já que a depreciação da moeda local provoca uma redução dos passivos externos, diminuindo

o risco de perda excessiva de reservas em momentos de crise de liquidez. Embora não haja

dados específicos sobre “desdolarização” dos passivos externos em todos os países da

amostra, o movimento da posição internacional de investimento (passivos menos ativos

externos) pode sugerir a maior/menor presença de passivos denominados em moeda

doméstica; ou seja, passivos mais concentrados em suas respectivas moedas tendem a

diminuir nos momentos de baixa no ciclo de liquidez (Akyuz, 2017; Rosa & Biancarelli,

2017). A tabela 2.3 revela uma melhora da posição internacional de investimento (passivos

menos ativos externos) nos momentos de baixa (2008) e instabilidade no ciclo de liquidez

54

Os indicadores de solvência e liquidez externa constituem medidas convencionais da vulnerabilidade externa

no médio e longo prazo e no curto prazo, respectivamente. A solvência externa representa a capacidade de um

país honrar seus compromissos externos de médio e longo prazo por meio da geração de divisas, ou seja, das

exportações. Já a liquidez externa representa a capacidade de honrar os compromissos externos de curto prazo

por meio do estoque de reservas internacionais (ver Prates, 2006). 55

De acordo com Akyüz (2017, p. 138), a principal referência até a CFG para a mensuração da vulnerabilidade

externa era a dívida externa de curto prazo. Dessa forma, a acumulação de reservas internacionais deveria ser

suficiente para cobrir a dívida externa de curto prazo em moeda estrangeira (regra de Greenspan-Guidotti).

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100

internacional (a partir de 2012) em grande parte dos países, principalmente Brasil e Coréia do

Sul56

. Já países com elevados níveis de dolarização em seus passivos externos, como o Peru,

apresentam o efeito contrário: em momentos de crise, a posição internacional de investimento

se deteriora.

Tabela 2.2: Indicador de Solvência e reservas internacionais – anos e países selecionados

Países Indicadores 1990 1995 2002 2007 2011 2015

Brasil

Dívida Externa Bruta/Exportações

403,8 326,5 314,3 133,4 163,6 282,0

Reservas 7.441 49.708 37.462 179.433 350.356 354.175

Chile

Dívida Externa Bruta/Exportações

173,5 126,9 171,1 63,7 97,8 196,0

Reservas 6.069 14.140 15.341 16.837 41.932 38.633

México

Dívida Externa Bruta/Exportações

202,2 185,5 90,0 67,1 76,2 109,6

Reservas 10.168 15.741 47.984 87.109 143.991 173.975

Colômbia

Dívida Externa Bruta/Exportações

251,3 203,1 250,2 126,9 116,8 245,9

Reservas 4.390 8.349 10.732 20.767 31.386 46.104

Hungria

Dívida Externa Bruta/Exportações

241,7 147,6 101,0 134,9 136,4 108,8

Reservas 1.069 11.968 10.359 23.970 48.677 33.019

Polônia

Dívida Externa Bruta/Exportações

238,6 142,7 142,5 129,6 135,3 132,1

Reservas 4.492 14.774 29.794 62.978 92.656 91.406

Rep, Tcheca

Dívida Externa Bruta/Exportações

85,4 58,5 56,7 57,9 69,6 78,8

Reservas 735 13.939 23.555 34.550 39.444 61.870

Turquia

Dívida Externa Bruta/Exportações

223,3 193,3 222,6 177,6 172,4 201,0

Reservas 6.050 12.442 27.069 73.384 77.756 92.926

África do Sul

Dívida Externa Bruta/Exportações

95,8 99,4 87,5 75,2 89,5 114,6

Reservas 1.008 2.820 5.904 29.589 42.588 41.510

Indonésia

Dívida Externa Bruta/Exportações

244,4 221,1 196,2 105,5 104,6 179,5

Reservas 8.367 17.504 30.494 54.974 106.529 103.270

Filipinas

Dívida Externa Bruta/Exportações

226,0 123,8 145,5 123,9 116,6 94,5

Reservas 924 6.396 13.329 30.210 67.290 73.912

56

Ver para o caso brasileiro Noije (2015).

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101

Tailândia

Dívida Externa Bruta/Exportações

95,3 135,1 70,1 39,2 39,0 46,7

Reservas 13.305 35.982 38.046 85.349 167.389 151.266

Coréia do Sul

Dívida Externa Bruta/Exportações

67,5 73,8 64,5 71,2 56,7 58,6

Reservas 14.793 32.678 121.345 262.150 304.236 363.167

Fonte: Institute of International Finance (IIF)

No entanto, a aparente diminuição da vulnerabilidade externa “clássica”,

vinculada ao balanço de pagamentos, desconsidera outras dimensões – nos termos de Akyüz

(2017) - ou novas formas de vulnerabilidade externa (New Forms of External Vulnerability)

nos termos de Kaltenbrunner & Paincera (2015), que impactam a resiliência dos países aos

choques externos (Akyüz, 2017). Dessa forma, esta tese considera cinco “novas” dimensões

da vulnerabilidade externa. A primeira dimensão é o aumento da participação dos

investimentos de portfólio e empréstimos externos, ambos de caráter curto-prazista, nos

passivos externos dos países emergentes, tornando-os mais suscetíveis às instabilidades do

ciclo de liquidez internacional. De acordo com a tabela 2.3, entre 2000 e 2007, que abrange o

período pré-crise, houve crescimento do estoque de investimento de portfólio em relação ao

PIB em todos os países da amostra e aumento da participação dos portfólios em relação aos

Investimentos Diretos Externos – com destaques, neste último caso, para Brasil e Coréia do

Sul.

Dessa forma, apesar do menor ritmo de crescimento do passivo externo - em

relação às reservas e exportações - e da redução dos estoques denominados em moeda

estrangeira, o crescimento relativo do investimento de portfólio (e de outros investimentos de

curto prazo) contribui negativamente para a chamada “vulnerabilidade estrutural”57

, nos

termos de Gonçalves (2005, cap. 5) e Gonçalves et. al. (2008), já que a possibilidade de fuga

de capitais é acentuada, especialmente nos países emissores de moedas periféricas. Assim, nos

momentos de instabilidade e crise, e, portanto, de maior preferência pela liquidez da divisa-

chave, a manutenção do financiamento externo, de curto-prazo principalmente, é

comprometida.

57

Conforme Gonçalves et. al. (2008, p. 120), a vulnerabilidade estrutural externa “está dada por el desempeño

externo relativo de determinado país comparativamente con el desempeño relativo de otros países. Compara,

entre varios países, el diferencial relativo de indicadores de inserción económica internacional en uma

perspectiva de largo plazo”.

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102

Tabela 2.3: Posição Internacional de Investimento (US$ milhões) – países selecionados

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Brasil -267.762 -282.137 -299.735 -350.436 -496.021 -243.659 -559.110 -906.164 -820.506 -806.489 -740.520 -775.411 -477.740

Indonésia -106.317 -117.129 -125.197 -137.216 -169.546 -148.123 -213.724 -291.062 -318.273 -361.224 -371.433 -383.973 -376.834

Chile -29.284 -24.271 -24.580 -7.686 4.529 -18.284 -13.352 -18.663 -21.063 -32.003 -26.061 -24.725 -32.898

Rep. Tcheca -20.560 -32.820 -30.658 -47.354 -77.341 -79.285 -93.942 -97.209 -91.412 -97.827 -85.209 -69.075 -60.927

Colômbia -29.408 -32.084 -35.643 -40.166 -47.891 -53.685 -59.532 -69.584 -78.443 -91.645 -102.663 -116.785 -128.587

Hungria -69.722 -97.289 -96.735 -119.847 -131.035 -147.182 -161.564 -141.203 -124.332 -121.951 -116.592 -96.476 -76.368

África do Sul -23.441 -37.119 -54.664 -65.885 -94.013 -17.680 -57.371 -98.828 -43.495 -55.555 -14.590 -26.216 40.992

Coréia do Sul -63.207 -60.428 -143.901 -155.217 -187.448 -69.330 -99.871 -131.104 -81.022 -94.370 -37.240 84.221 204.446

México -219.064 -261.893 -311.306 -379.565 -389.724 -346.933 -369.865 -430.672 -409.693 -524.577 -576.237 -559.325 -558.474

Polônia -93.988 -127.470 -126.857 -165.193 -240.054 -241.332 -276.036 -317.335 -286.137 -343.334 -377.137 -338.785 -287.898

Filipinas -41.614 -40.211 -39.898 -46.173 -47.260 -31.558 -29.140 -29.312 -23.054 -40.637 -35.957 -40.897 -28.297

Peru -28.415 -27.420 -26.419 -25.815 -31.308 -30.386 -34.624 -43.755 -41.530 -46.809 -53.565 -61.001 -66.221

Turquia -105.839 -128.219 -174.705 -205.620 -313.780 -199.694 -276.001 -361.336 -314.703 -423.808 -395.192 -442.968 -377.886

Tailândia -54.579 -50.966 -53.835 -55.153 -55.069 -13.417 -4.517 -41.873 -41.047 -81.072 -69.644 -97.279 -43.108

Fonte: FMI (International Finance Statistics)

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103

A segunda dimensão refere-se ao crescimento do endividamento privado externo a

um ritmo superior ao da divida externa pública, especialmente após a crise financeira global.

Esse endividamento pode ser decomposto em duas categorias principais: empréstimos

bancários e emissão de títulos nos mercados financeiros internacionais por bancos,

corporações não financeiras e governos. Em linhas gerais, o empréstimo bancário é a

modalidade mais utilizada nos países da amostra, porém, a emissão de títulos nos mercados

internacionais por corporações não financeiras é crescente desde 2007.

Em relação à emissão de títulos nos mercados internacionais, é notório o

crescimento desta modalidade de dívida privada nos anos 2000, principalmente entre 2007 e

2015, em todos os países da amostra, com destaque para México, Coréia do Sul, Brasil e

Turquia – em menor grau Indonésia e Chile. Em especial, as corporações não-financeiras

aumentaram suas emissões de títulos entre 1995 e 2015 em quase todos os países da amostra –

os países representantes da Europa Central e do Leste tiveram um desempenho mais tímido58

(ver Tabela 2.5 do anexo estatístico)

Enquanto no Brasil e Coréia do Sul (gráficos 2.11 e 2.14) a emissão de títulos

privados nos mercados internacionais se deu principalmente por meio de instituições

financeiras, no caso mexicano (gráfico 2.12), as corporações não financeiras comandaram o

processo, multiplicando quase por dez a emissão de títulos. Já no caso turco, o governo lidera

as emissões em relação aos outros setores (gráfico 2.13). Vale ressaltar que grande parte

dessas emissões é denominada em dólar, aumentando, portanto, a vulnerabilidade de

corporações, instituições financeiras e governos às reversões no funding internacional.

58

Nos Brics, tais emissões aumentaram principalmente nos mercados offshore, por meio das subsidiárias no

exterior das empresas nacionais. De acordo com (AKYÜZ, 2014), considerando apenas os residentes, as

emissões de títulos pelas corporações não-financeiras totalizaram US$ 480 bilhões entre 2010 e 2013; quando se

considera as empresas nacionais, as emissões saltam para US$ 940 bilhões no mesmo período, revelando,

portanto, a importância das emissões pelas subsidiárias.

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104

Fonte: BIS

Fonte: BIS banking statistcs

- 5.000

10.000 15.000 20.000 25.000 30.000 35.000 40.000 45.000 50.000 55.000 60.000 65.000

1995 2002 2007 2011 2013 2015

Gráfico 2.11: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Brasil

I. Não-financeiras Financeiro Público

- 10.000 20.000 30.000 40.000 50.000 60.000 70.000 80.000 90.000

100.000 110.000 120.000 130.000

1995 2002 2007 2011 2013 2015

Gráfico 2.12: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - México

I. Não-financeiras Financeiro Público

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105

Fonte: BIS banking statistcs

Fonte: BIS banking statistcs

Já a dívida externa privada proveniente de empréstimos bancários cresceu de

maneira menos expressiva ao longo do período analisado. Novamente, Brasil, México,

Coréia do Sul e Turquia se destacam, em termos de volume, nesse tipo de captação (ver

gráficos 2.15, 2.16, 2.17 e 2.18). No Brasil, bancos e especialmente “não bancos” –

investidores institucionais e bancos de investimento em geral - aumentaram seu estoque de

dívida privada, principalmente após a crise financeira global. Entre 2013 e 2015, o estoque de

empréstimos dos bancos brasileiros aumentou substancialmente, chegando ao pico de US$

-

5.000

10.000

15.000

20.000

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40.000

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50.000

55.000

60.000

65.000

1995 2002 2007 2011 2013 2015

Gráfico 2.13: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Turquia

I. Não-financeiras Financeiro Público

- 10.000 20.000 30.000 40.000 50.000 60.000 70.000 80.000 90.000

100.000 110.000 120.000

1995 2002 2007 2011 2013 2015

Gráfico 2.14: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Coréia do Sul

Público I. Não-financeiras Financeiro

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106

112 bilhões aproximadamente, em março de 2015. Tal comportamento pode refletir o impacto

do programa de swaps câmbio/juros (cross currency swaps) sobre a captação externa dos

bancos residentes (ver tabela 2.6 do anexo estatístico).

Fonte: BIS banking statistcs

Fonte: BIS banking statistcs

0

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15

Gráfico 2.15: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) - Brasil

Não Bancos Bancos Corp. Não financeiras

-

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15

Gráfico 2.16: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários

(US$ milhões) - México

Corp. Não Financeiras Não bancos Bancos

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107

Fonte: BIS banking statistcs

Fonte: BIS banking statistcs

A terceira dimensão a ser considerada é a crescente presença de não residentes nos

mercados de títulos públicos denominados em moedas periféricas. Conforme mencionado

acima, a emissão de títulos de dívida denominados (ou indexados) na divisa-chave (ou em

moedas centrais) se reduziu ao longo dos anos 2000, dando maior espaço a títulos

denominados em moedas domésticas. Além dos efeitos patrimoniais positivos apontados, a

outra face desse processo, que se intensificou após a adoção da política de afrouxamento

quantitativo (quantitative easing) norte-americana, foi a maior participação de investidores

não residentes nesses mercados. A busca por rendimentos (search for yield) num contexto de

- 10.000 20.000 30.000 40.000 50.000 60.000 70.000 80.000 90.000

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15

Gráfico 2.17: Dívida Privada Externa - Empréstimos

bancários (US$ milhões) - Turquia

Corp. não financeiras Bancos Não Bancos

-

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40.000

60.000

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100.000

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15

Gráfico 2.18: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários

(US$ milhões) - Coréia do Sul

Bancos Corp. Não Financeiras Não Bancos

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108

baixas taxas de juros, a melhora dos ratings soberanos ao longo dos anos 2000, o baixo nível

da relação dívida pública/PIB em comparação aos países desenvolvidos e a maior oferta de

hedge nos mercados de derivativos de câmbio – que se tornaram mais líquidos, conforme

visto na seção anterior - são os principais fatores de atração de uma parcela cada vez maior de

investidores não-residentes aos mercados de títulos públicos, especialmente investidores

institucionais59

(Polychronopoulos & Binstock, 2013; Kaltenbrunner & Painceira, 2014;

Banco Mundial, 2014 ).

Considerando a amostra analisada, a participação estrangeira nos mercados de

títulos públicos, por exemplo, é expressiva na Indonésia, Polônia, Peru, México e África do

Sul (Tabela 2.4; FMI, 2016; Klingebiel, 2014). No entanto, vale ressaltar que após o anúncio

do tapering em 2013, a presença de tais investidores diminuiu, especialmente nos mercados

peruanos, turcos, sul-africanos e húngaros (FMI, 2016).

A presença crescente dos investidores estrangeiros nos mercados de títulos

domésticos, especialmente no período de boom entre 2009 e 2011, está longe, porém, de

indicar qualquer avanço das moedas periféricas em relação à hierarquia de moedas por meio

da superação do original sin. A pró-ciclicidade dos fluxos de capitais e a predominância de

investidores institucionais torna o mercado de títulos, em especial o de títulos públicos,

estruturalmente vulneráveis a reversões nos ciclos de liquidez internacionais e à política

monetária norte-americana, já que as decisões do Fed podem impactar diretamente o

rendimento dos títulos públicos denominados nessas moedas. Portanto, a vulnerabilidade

gerada pelos mercados de títulos não está mais vinculada somente à dívida pública externa,

mas também ao financiamento da dívida interna (Akyüz, 2017, p. 146).

Tabela 2.4: Participação estrangeira nos mercados de títulos públicos denominados em

moeda doméstica (% total de títulos)

2004 2007 2010 2013a

Brasil 12,8 8,7 10,7 12,5

Chile 71,5 43,7 16,2 16,6

Colômbia 30,5 21,5 21,8 22,6

Indonésia 5,5 25,3 43,4 46,7

México 37,7 26,2 33,3 53,7

Peru 49,2 46,9 53,3 60,4

Filipinas 23,6 23,4 31 30,9

59

Conforme Kaltenbrunner & Paincera (2014, p. 8 apud Goldman Sachs, 2010), “(…) general DEC data show

that international institutional investors, such as pension, mutual and insurance funds have increased their asset

allocation to DECs equities from below 2% in 2000 to 6% in 2010.”

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109

África do Sul 14,4 17,9 23,5 35

Tailândia 3,8 1,1 7,4 17,9

Turquia 15,3 21,6 21 36,5

Fonte: Akyüz (2017)

A quarta dimensão está relacionada ao aumento da participação de bancos

estrangeiros nos mercados domésticos. De acordo com (Claessens & Horen, 2014, p. 318), a

participação dos bancos estrangeiros no sistema bancário dos países da amostra foi crescente

entre 1995 e 2009, com destaque para os países da Europa Central e do Leste, onde tais

bancos possuíam uma participação acima de 70% em 2009 - sendo que na Hungria tal

presença chegou a 92% no mesmo ano. A maior participação dos bancos estrangeiros resultou

numa mudança da composição dos empréstimos dessas instituições, com o crescimento,

principalmente no período pré-crise, dos empréstimos denominados em moeda local -

chegando a 45% do total de empréstimos em 2009 (Akyüz, 2014).

No entanto, a eclosão da crise financeira global e seu contágio para a zona do euro

impactou a visão até então positiva desse processo de internacionalização por parte dos

organismos multilaterais e da literatura mainstream, que relacionavam a maior presença de

bancos estrangeiros nos mercados domésticos à maior competitividade, à redução dos custos

de intermediação, aos ganhos de eficiência, etc (Fiechter et al., 2011; Akyüz, 2014). Apesar

dos supostos benefícios supracitados, a crise de 2008, em especial a crise da zona do euro e o

credit crunch dela decorrente, causou grande prejuízo ao sistema financeiro das economias da

periferia europeia, dominadas por bancos estrangeiros (Kattel, 2010). Tal cenário evidenciou

o risco sistêmico relacionado à interconectividade entre as instituições financeiras e suas

subsidiárias, que pode causar o espraiamento dos choques externos nos sistemas financeiros

domésticos de países com grande presença de subsidiárias. Como destaca Akyüz (2014, p. 45,

tradução do autor), “bancos estrangeiros nos países emergentes agem como transmissores dos

impulsos expansionistas e contracionistas dos ciclos financeiros globais”, amplificando os

impactos do ciclo de liquidez global nos países emergentes.

Por fim, o mercado de derivativos financeiros – dependendo da institucionalidade

- também pode impulsionar a vulnerabilidade externa (Kaltenbrunner & Painceira, 2015). Os

derivativos de câmbio podem atrair fluxos de capitais de curto prazo por meio de operações

de carry trade, oferendo hedge para os agentes que investem nos mercados domésticos com

funding em moeda estrangeira. Por exemplo, se um investidor não residente deseja comprar

um título denominado numa moeda periférica, ele pode buscar proteção (contra o risco de

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110

variação cambial) e funding (na moeda periférica) no mercado de FX swaps – caso típico nos

mercados financeiros sul-coreanos, que será visto no próximo capítulo. Os agentes também

podem captar recursos externos de curto prazo para operações de arbitragem - entre os

mercados à vista e de derivativos e/ou mercados onshore e offshore – como no caso dos

bancos brasileiros, que também serão estudados no próximo capítulo. Por fim, os próprios

derivativos de câmbio podem ser alvos de operações especulativas, como, por exemplo,

derivatives carry trade – que não envolvem, em muitos casos, influxos de capitais, porém

aumentam a sensibilidade dos mercados a choques externos60

. Vale ressaltar que todos os

casos descritos acima envolvem um elevado grau de alavancagem, característico dos

mercados de derivativos financeiros.

Portanto, a piora dos indicadores de solvência e liquidez após a crise financeira

global de 2008 evidenciou a fragilidade da estratégia centrada somente na acumulação de

reservas para atingir o objetivo da estabilidade financeira e chamou a atenção para outras

dimensões da vulnerabilidade externa. O crescimento da dívida privada – tanto via emissão de

títulos quanto por meio de empréstimos bancários –, a maior participação dos investidores nos

mercados de títulos domésticos e a maior presença de bancos estrangeiros tornam o ciclo

doméstico – principalmente o ciclo de crédito – mais sensível ao ciclo de liquidez

internacional. Ademais, o aumento da liquidez nos mercados de derivativos de câmbio,

apontado na primeira seção, torna as moedas periféricas alvo das operações de derivatives

carry trade e, portanto, fontes de maior vulnerabilidade externa. Este cenário evidencia a

necessidade de diversificação de metas e instrumentos de política cambial para alcançar a

estabilidade financeira. O uso da regulação macroprudencial por alguns países emergentes

durante o mini-boom de fluxos de capitais entre 2009 e 2011 e o aumento da utilização de

derivativos de câmbio como instrumentos de política cambial apontam para essa

diversificação.

2.3 Gestão da política monetária: a inter-relação entre as taxas de juros e de câmbio

O modelo teórico do Novo Consenso, que sustenta o regime de metas de inflação,

pressupõe a política monetária (mais precisamente o manejo da taxa de juros de curto prazo)

como âncora da inflação e não estabelece conexão entre taxa de juros e taxa de câmbio, que

60

Conforme Kaltenbrunner & Paincera (2015, p. 10), “derivatives markets not only allow short-term, directional

position taking on the exchange itself, they also offer the possibility to hedge any exposure in other domestic

currency–denominated assets classes which further stimulates foreign investments in these assets”.

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111

neste modelo é variável de ajuste (ver Arestis & Sawyer, 2003 e 2008). No entanto, a gestão

da política monetária de facto nos países emergentes, sob o regime de metas de inflação e

câmbio flutuante, intensificou a dependência entre política monetária e política cambial,

evidenciando a importância da relação entre as taxas de juros e câmbio. Tal fato reproduz,

portanto, os efeitos da dualidade impossível (ou dilema), discutida no primeiro capítulo: num

ambiente de livre mobilidade de capitais, se acentua a inter-relação entre as taxas de juros e de

câmbio e o impacto das decisões de portfólio dos investidores sobre tais preços-chave

(Flassbeck, 2001; Rey, 2013; Prates, 2015).

Essa relação se manifesta de diversas formas. Uma delas refere-se a conflitos de

objetivos macroeconômicos em momentos de boom dos fluxos de capitais e alta inflação,

definidos por Ryoo et. al. (2013) - do Banco Central da Coréia do Sul – como “duplo vínculo”

(double bind). Ou seja, num cenário de alta inflação e grande influxo de capitais, a elevação

da taxa de juros básica, a fim de conter o avanço inflacionário, intensificará a entrada de

capitais, fomentando ainda mais a apreciação cambial e gerando, inclusive, impactos sobre a

estabilidade financeira.

No entanto, este cenário pode ser desejável num contexto de elevado pass-through

(ou repasse cambial) da taxa de câmbio para os preços e de “fear of floating” das autoridades

monetárias (Calvo e Reinhart, 2002). Sob a ótica dos preços domésticos, o repasse pode

ocorrer por meio de dois canais: o primeiro, direto, por meio do impacto da taxa de câmbio

nos insumos importados para a produção ou nos bens finais importados61

; o segundo, indireto,

mediante o impacto da variação do preço dos bens importados (insumos e finais) sobre a

demanda por bens produzidos internamente que competem com os produtos importados

(Aron et. al., 2012).

De maneira geral, o repasse cambial nos países emergentes se reduziu ao longo

dos anos 1990 e 2000. Taylor (2000) explica esse comportamento por meio da mudança do

regime monetário durante o período conhecido como grande moderação. A adoção de regimes

transparentes e críveis, tais como o regime de metas de inflação, teria contribuído para a

redução e menor persistência da inflação nos países emergentes. Esse ambiente teria reduzido

o poder de formação de preço das firmas, impactando, portanto, a capacidade dessas empresas

61

De acordo com Aron et. al. (2012), o repasse cambial para os preços dos produtos importados podem ser

completos ou incompletos. Os repasses são completos quando os preços são rígidos na moeda do país

exportador. Assim, “variations in the exchange rate leave the exporter’s prices in their own currency

unchanged, while destination market prices vary closely with the exchange rate” (Aron et. Al. 2012, p. 102). Já

em relação aos repasses cambiais incompletos - o caso mais comum - os preços denominados na moeda do país

exportador variam conforme a taxa de câmbio, diminuindo o repasse cambial para os preços importados.

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112

repassarem custos, inclusive aqueles derivados da taxa de câmbio, para os seus preços. Num

contexto de preços rígidos, seguindo o modelo do novo-consenso, e grande concorrência

nacional e internacional, os preços só serão alterados se as alterações na taxa de câmbio forem

permanentes, ou seja, se tal taxa mudar de patamar ou trajetória.

A maioria dos modelos que identificam a tendência à queda no repasse cambial é

linear em relação à trajetória da taxa de câmbio. No entanto, pesquisas recentes investigaram

respostas assimétricas dos preços às flutuações da taxa de câmbio (Aron et. al., 2014,

Bussière, 2007; Marazzi & Sheets, 2007; Pollard & Coughlin, 2003; Caselli & Roitman,

2016). Há dois tipos de assimetrias exploradas na literatura. A primeira identifica um maior

repasse aos preços em períodos de depreciação em comparação a períodos de apreciação

cambial. Tal assimetria problematiza, portanto, a redução do repasse cambial nos anos 2000,

identificada nos modelos lineares, já que grande parte das moedas periféricas se apreciou em

relação ao dólar no período. A segunda considera que pequenas variações na taxa de câmbio

não são incorporadas nos preços (indicando rigidez nos preços) (Aron et. al., 2014).

Os resultados empíricos encontrados para os países emergentes são bastante

heterogêneos, em razão dos diversos modelos e métodos de estimação utilizados e, portanto,

de difícil comparação. De maneira geral, apesar da redução nos últimos anos, o repasse

cambial nesses países é maior em comparação aos países emissores de divisas. Em relação aos

modelos lineares, Brussière & Peltonen (2008) estimaram, para 27 países emergentes, a

elasticidade dos preços importados às variações na taxa de câmbio entre 1990 e 2006.

Considerando a amostra analisada, México, Brasil e Tailândia possuem as maiores

elasticidades (entre 60% e 70%), enquanto Coréia do Sul, República Tcheca, Polônia,

Hungria, Colômbia, Chile, Turquia, Filipinas, África do Sul, Peru possuem elasticidades

baixas e moderadas. Já Ca’Zorzi et al. (2007) analisam o repasse cambial para os preços

domésticos entre 1975 e 2004 em alguns países da amostra. México e República Tcheca

possuem os maiores repasses cambiais para os preços domésticos - entre 60% e 80% em

resposta a um choque de 1% na taxa de câmbio -; Hungria, Polônia e Chile possuem repasses

moderados (em torno de 40%), enquanto Turquia e Coréia possuem repasses cambiais

pequenos (em torno de 10%).

Nos últimos anos, seguindo os desdobramentos teóricos, os modelos empíricos se

voltaram para as assimetrias do repasse cambial entre os períodos de apreciação e

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113

depreciação. Caselli & Roitman (2016) analisam dois casos de não-linearidades62

para 28

países emergentes. O primeiro caso avalia o efeito de grandes depreciações (10% e 20%)

sobre os preços em comparação a períodos de baixas depreciações (abaixo dos limites

indicados). Nos primeiros seis meses de choque (10 e 20%), o repasse cambial para os preços

foi de 40% e 44% respectivamente, contra 10% nos períodos considerados normais. No

segundo caso, os autores comparam os repasses cambiais em períodos de depreciação e

apreciação. Os resultados indicam que há assimetrias principalmente nos oito primeiros meses

após o choque (de depreciação ou apreciação). Enquanto os episódios de depreciação são

caracterizados por um repasse cambial de 38% após doze meses, os períodos de apreciação

registram um repasse cambial em torno de 10%. Ademais, os autores ressaltam os repasses

cambiais elevados da Turquia nos momentos de depreciação, destoantes (outliers) dos demais

países analisados.

Além do caso geral, há também análises empíricas em cada país. Em todos os

casos, os modelos confirmam a hipótese de maior repasse cambial nos períodos de

depreciação. No caso brasileiro, Pimentel et. al. (2016) estimam um repasse cambial, entre

1999 e 2012, de 11,38% (em relação à variação cambial) nos momentos de depreciação e

2,84% nos casos de apreciação cambial. Forero & Veja (2016) também encontram no Peru

assimetrias entre o repasse cambial no caso de 1% de apreciação (choque de 0,2% na

inflação) e 1% de depreciação cambial (choque de 0,3% sobre a inflação). Assimetrias

também foram relatadas na Turquia (KAL et. al., 2015), Filipinas (Delloro et. al., 2017),

México, Polônia, África do Sul, Coréia do Sul (Mihaljek & Klau, 2008). Ademais, Mihaljek e

Klau (2008) também estimaram assimetrias no repasse cambial no caso de variações cambiais

acima de 5%, encontrando resultados significativos para Tailândia, México, Hungria e

Turquia. Portanto, os casos específicos corroboram o resultado geral acima: as assimetrias do

repasse cambial (nos casos de apreciação e depreciação e também nos casos de variação

cambial acima de um limite definido) são relevantes em grande parte dos países da amostra,

independentemente da redução do repasse cambial ao longo dos anos 2000 (ver Mihaljek &

Klau, 2008).

Por fim, tais assimetrias evidenciam os efeitos negativos da posição das moedas

periféricas no SMI, vistos no primeiro capítulo. A elevada volatilidade e os momentos de

grande depreciação das moedas periféricas, comuns nos períodos de maior preferência pela

62

Caselli & Roitman (2016) distinguem não-linearidades e assimetrias do repasse cambial. De acordo com os

autores, não linearidade refere-se a depreciações acima ou abaixo de um determinado parâmetro ou países sob

regime metas de inflação versus países sem tal regime macro. Já as assimetrias referem-se às diferenças dos

efeitos dos episódios de apreciação e depreciação sobre os preços.

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liquidez da divisa-chave, potencializam os efeitos da taxa de câmbio sobre a inflação. Essa

relação é especialmente problemática nos países da amostra que adotam o binômio metas de

inflação/regime de câmbio flutuante. O compromisso dos Bancos Centrais desses países com

a estabilidade de preços subordina, na maioria das ocasiões, os demais objetivos

macroeconômicos não apenas da política monetária, mas também da política cambial63

. Dessa

forma, os momentos de reversão ou instabilidade do ciclo de liquidez reforçam as políticas

monetárias restritivas e o uso de instrumentos de política cambial para conter ou reverter a

trajetória de depreciação cambial, independentemente das implicações dessas políticas para a

demanda agregada. A gestão da política monetária e a política cambial se entrelaçam,

portanto, sob o mesmo objetivo: o controle inflacionário (Paula, Fritz & Prates, 2016; Caselli

& Roitman, 2016).

As consequências dessa subordinação atingem outro ponto de entrelaçamento

entre as políticas monetária e cambial: a esterilização do impacto monetário das intervenções

das autoridades monetárias no mercado à vista de câmbio. Conforme o arcabouço teórico

convencional, essa esterilização é feita para neutralizar seu (suposto) impacto sobre a inflação

- via canal da política monetária da política cambial, visto no primeiro capítulo. No entanto,

tal operação não esgota as interseções entre as gestões das políticas cambial e monetária,

apenas as redimensionam. Os elevados diferenciais de juros, utilizados para conter a

volatilidade e as elevadas apreciações/depreciações cambiais, tornam o

enxugamento/expansão da liquidez gerada pela compra/venda de divisas muito oneroso para

os bancos centrais e/ou tesouros nacionais. As autoridades monetárias podem esterilizar os

impactos de suas operações cambiais sobre a liquidez doméstica, principalmente por meio de

três instrumentos: operações em moeda estrangeira (indexadas ou denominadas); operações

domésticas via títulos públicos; requerimentos de reserva (ou depósitos remunerados)

(Moreno, 2011).

O uso de instrumentos denominados ou indexados em moeda estrangeira – por

exemplo, dívida externa ou derivativos de câmbio, como swaps cambiais64

– podem ser

utilizados com o intuito de reduzir a posição dos bancos centrais em ativos líquidos

estrangeiros. De acordo com Moreno (2011), as posições líquidas nos mercados futuro e

forward de câmbio dos países emergentes, incluindo os países da amostra, cresceram ao longo

63

Conforme observa Santaella (2012, p.5), do Banco Central do México, “the problem of FX interventions for

inflation targeting is that the main commitment of the central bank is with price stability and not with FX

stability.” 64

Para conter os impactos da compra de divisas no mercado à vista, o Banco Central vende dólar, por exemplo,

no mercado à vista e compra a moeda americana no mercado futuro ou forward.

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dos anos 2000 (principalmente nos países asiáticos), período de grande apreciação dessas

moedas. No entanto, é difícil estabelecer uma conexão entre o aumento da posição líquida no

mercado de derivativos e a contenção dos efeitos da apreciação cambial, já que tais

instrumentos podem ser utilizados para outros fins, seja para oferecer hedge para os agentes,

seja para influenciar a liquidez desses mercados.

A operação doméstica via títulos públicos federais – tanto por meio da venda

definitiva quanto por meio de operações compromissadas - é a principal opção de

esterilização dos bancos centrais dos países emergentes da amostra (quadro 2.2). Vários

países, porém, proíbem a emissão desses títulos pelos bancos centrais por duas razões

principais. A primeira refere-se à possibilidade desses títulos impactarem a liquidez do

mercado de títulos emitidos pelos tesouros nacionais (ECB, 2006). Já a segunda considera as

consequências negativas dessas operações para o balanço do Banco Central, em razão do

elevado diferencial de juros em grande parte dos países (Moreno, 2011; quadro 2.2). Diante

dessa proibição, a maioria dos bancos centrais, principalmente dos países da Europa Central e

do Leste e da América Latina, utiliza os títulos governamentais, comprados no mercado

secundário ou negociados junto aos tesouros nacionais. A esterilização via títulos

governamentais aumentou cinco vezes entre 1999 e 2010 (de US$ 1 trilhão em 1999 para US$

5 trilhões em 2010).

Há diversas implicações derivadas do uso desse tipo de instrumento para a

esterilização. A primeira refere-se à redução da posição credora líquida, ou mudança para uma

posição devedora líquida, do Banco Central em relação ao sistema financeiro, decorrente do

uso extensivo do estoque de títulos (do tesouro) para a esterilização das intervenções,

diminuindo a capacidade do Banco Central de conduzir a política monetária. De acordo com

ECB (2006), a esterilização por meio da venda de títulos pode tornar o banco central

dependente de operações que absorvem liquidez (liquidity-absorving transactions), o que

dificulta a gestão do mercado monetário, já que este é mais facilmente gerido por meio de

operações de provisão de liquidez (liquidity-providing operations).

Ademais, a maior presença de investidores não residentes nos mercados de títulos

públicos, analisada na seção anterior, pode tornar a esterilização via operações com títulos

públicos prejudicial para a estabilidade financeira, já que estas podem fomentar ainda mais a

entrada deste tipo de investidor65

. A maturidade dos títulos de dívida pública utilizados nessas

operações pode intensificar esse processo, fomentando as operações de curto prazo. De

65

Conforme Moreno (2011), esse episódio ocorreu no Peru, obrigando as autoridades monetárias a adotar

restrições ao acesso de investidores estrangeiros aos mercados de títulos públicos domésticos.

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acordo com as estatísticas do BIS sobre os mercados de dívida pública66

, a maturidade dos

títulos públicos dos países da amostra aumentou entre 1995 e 2016 – de 2,9 anos, em média,

para 8,2 anos. No entanto, os mercados europeus (Hungria, Polônia, República Tcheca e

Turquia) e brasileiro ainda estão concentrados em títulos de menor prazo – maturidade de 4

anos nesse conjunto de países.

A maior oferta de títulos de curto prazo por meio de operações de esterilização

também pode afetar o balanço dos bancos domésticos. De acordo com Gadanecz et. al.

(2014), a esterilização via oferta de títulos de curto prazo pode inflar os balanços dos bancos

domésticos e, consequentemente, fomentar o crédito bancário ao setor privado - dependendo

da posição de capital de tais bancos e da efetividade do canal do crédito da política monetária.

Essa relação contradiz (ou relativiza) um dos objetivos da esterilização das intervenções, qual

seja, neutralizar o canal da política monetária. Todavia, tal argumento se baseia na visão

convencional (NCM), na qual os bancos dependem de reservas para conceder crédito. Numa

visão pós-keynesiana – crítica à posição supracitada – o aumento da participação dos títulos

nos ativos dos bancos pode inibir a concessão de crédito, já que, de acordo com essa

perspectiva, os bancos criam moeda conforme suas respectivas preferências pela liquidez e

estado das expectativas (Carvalho et. al., 2015).

A terceira forma de esterilização, bastante recorrente nos últimos anos, se dá pelo

ajuste dos requerimentos de reservas (compulsório) sobre os depósitos bancários. Esse

instrumento apresenta diversos aspectos positivos. O primeiro refere-se à facilidade de

implementação, pois, além de evitar boa parte dos problemas acima, não exige um mercado

de títulos líquido, sendo, portanto, acessível para a maioria dos países. Tal instrumento possui

também menos externalidades negativas sobre à política fiscal, em comparação ao uso da

política de juros, além de pode ser utilizado como medida anticíclica (Moreno, 2011). Por

exemplo, na crise financeira global de 2008, momento de reversão dos fluxos de capitais,

alguns bancos centrais que utilizam esse instrumento – como Brasil, Peru e Colômbia -

optaram pela redução dos requerimentos de reservas, com o intuito não apenas de esterilizar a

venda de divisas no mercado à vista e estimular (de maneira anticíclica) o crédito67

, mas

também de evitar a redução das taxas de juros e afetar os influxos de capitais (já que neste

período ocorre um aumento expressivo no repasse cambial) (Moreno, 2011). Do mesmo

modo, após o retorno dos fluxos de capitais aos mercados emergentes em 2009, alguns bancos

66

Ver maiores detalhes em http://www.bis.org/statistics/c2.pdf 67

Vale que ressaltar que o objetivo de estimular o crédito via redução dos compulsórios depende da efetividade

do canal do crédito da política monetária (Carvalho et. al., 2015).

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centrais aumentaram o requerimento de reserva, ao invés de aumentar a taxa de juros, para

conter a expansão do crédito doméstico, sem atrair um volume ainda maior de fluxos de

capitais (Domanski et.al., 2016).

Em contrapartida, além dos seus custos (que serão abordados a frente), a principal

desvantagem desse instrumento é a possibilidade de remuneração (quando são remunerados)

abaixo da taxa de juros do mercado monetário. Se tal fato ocorrer, há um estímulo à

arbitragem regulatória, pois os bancos buscarão outras formas de captação (nas quais não

incide o requerimento de reservas), tornando esse tipo de esterilização ineficiente ou

insuficiente para controlar os níveis de liquidez (Moreno, 2011; ECB, 2006).

Por fim, vale ressaltar uma implicação que atinge tanto a esterilização via títulos

públicos quanto via requerimentos de reservas: os custos fiscais ou para-fiscais. A

intensificação da acumulação de reservas internacionais no período de boom entre 2003 e

2007 fomentou o debate sobre os custos que envolvem tal tipo de intervenção (Rodrik, 2006).

Neste contexto, conforme destacam Adler & Mano (2016, p. 25, tradução do autor), “os

custos fiscais de uma intervenção devem ser levados em conta na condução da política

cambial”. Enquanto uma parte da literatura está focada nos “custos contábeis” que a

acumulação de divisas implica, outra parte considera o custo de oportunidade (ou o custo

econômico) não apenas da acumulação de reservas (Levy-Yeyati, 2005), mas também de

outras formas de intervenção (Adler & Mano, 2016).

Contabilmente, os custos que envolvem a esterilização são definidos como o

produto do diferencial de juros e do montante de reservas internacionais. De acordo com a

estimação feita por Moreno (2011) – quadro 2.3 -, à exceção de Hungria (1,8%) e Brasil

(1,4%), os demais países da amostra possuíam um custo de esterilização abaixo de 1% do

PIB, em torno de 0,6% e 0,8% em 2010. Embora tenham um custo de esterilização moderado,

África do Sul, Turquia, México e Indonésia possuem diferenciais de juros relativamente altos,

o que sugere um método de absorção de liquidez que não gera grandes impactos sobre a

dívida pública – como o caso mexicano, que será visto no próximo capítulo – e/ou baixa

esterilização das intervenções.

Levy-Yeyati (2008) incorpora nos custos de esterilização os efeitos positivos da

acumulação de reservas, já que estas reduzem os spreads pagos sobre o estoque de dívida

soberana, reduzindo a probabilidade de crises de liquidez. Adler & Mano (2016) utilizam o

conceito mais amplo de custos de intervenção (ou da política cambial), que envolvem não

somente a compra/venda de divisas no mercado à vista, mas a variação da posição líquida em

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moeda estrangeira do Banco Central. De acordo com os autores, esse custo é mensurado por

meio do produto entre custo marginal da intervenção e a posição líquida em moeda

estrangeira. O custo marginal de intervenção, por sua vez, é definido como o custo de

oportunidade em aumentar a posição líquida em moeda estrangeira do banco central,

determinado pelos desvios da paridade descoberta da taxa de juros. Esses custos (ou os

desvios em relação à paridade) podem ser calculados tanto ex-post, ou seja, considerando

variações cambiais em t-1, quanto ex-ante, que considera a variação cambial esperada. Dessa

forma, a mensuração dos custos ex-ante pode ser um importante instrumento na condução da

política cambial.

Partindo desse referencial teórico, Adler & Mano (2016) mensuram o custo

marginal e total ex-ante para um conjunto de países, inclusive os países da amostra, entre

2002 e 2013. Os resultados sugerem que Brasil e Turquia apresentam o maior custo marginal

ex-ante (ou os maiores desvios em relação à paridade descoberta da taxa de juros). No

entanto, quando se considera os custos totais (custo marginal vezes a posição líquida em

moeda estrangeira), Tailândia, Hungria, Filipinas e Coréia do Sul se destacam, indicando que,

embora Brasil e Turquia apresentem maiores custos marginais, a posição líquida em moeda

estrangeira dos bancos centrais desses países é menor em relação à posição líquida dos países

com menores custos marginais. Ademais, grande parte dos 73 países da amostra de Adler &

Mano (2016) apresentaram, no período mencionado, um custo total ex-ante abaixo de 1% do

PIB, assim como os custos de esterilização calculados por Moreno (2011) – quadro 2.2.

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Quadro 2.2: Instrumentos e custos da esterilização – países selecionados

Países Mercado Não-Mercado

Maturidade

média dos títulos

públicos (anos)

Diferencial de

juros (2010)

Custo da

esterilização

(2010)

Coréia do Sul

Bônus de estabilização

monetária, emitidos pelo

Banco Central

Não 5,1 2,1 0,7

Tailândia

Operações

compromissadas

(Repos), swaps cambiais

e títulos do banco central

Não 7,2 1,4 0,8

Brasil

Operações

compromissadas com

títulos do tesouro

nacional

Não 3,0 9,1 1,4

Chile Títulos do Banco Central Não 14,5 -0,1 0

México

Títulos do Banco Central

(Títulos do governo

utilizados no passado)

Depósito de longo

prazo no banco central

(remunerados a taxas

de mercado), usadas

de forma irregular.

4,4 4,6 0,5

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África do Sul Títulos do banco central

e do governo Não 10,6 5,7 0,6

Turquia

Principalmente operações

compromissadas com

títulos do governo

Não 2,4

7,1 0,8

Peru

Bônus emitido pelo

Banco Central com

duração de 18 meses

Requerimentos de

reservas remunerados,

depósitos no Tesouro

(principais

instrumentos)

9,9 2,6 0,8

Colômbia Não

Depósitos

remunerados (maioria

de curto prazo – 7 e

14 dias)

4,8

1,3 0,1

Indonésia Títulos emitidos pelo

Banco Central Não 8,1 6,1 0,8

Filipinas Títulos emitidos pelo

governo Não 6,4 3,9 1,0

Polônia Títulos emitidos pelo

Banco Central 3,3 3,2 0,7

República Tcheca Títulos emitidos pelo Não 5,0 0,5 0,1

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Banco Central

Hungria Títulos emitidos pelo

Banco Central Não 4,0 4,9 1,8

Fonte: Prates (2007) e Mohanty & Scatigna (2005)

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122

Portanto, a relação entre gestão da política monetária e política cambial em países

emergentes que adotam o RMI envolve duas questões centrais: o papel da taxa de câmbio no

controle inflacionário e as esterilizações das intervenções no mercado de câmbio. No primeiro

caso, embora a literatura sobre o tema (bancos centrais na maioria dos casos) aponte para a

redução do repasse cambial para os preços dos produtos importados e dos preços domésticos

nos últimos anos, há a identificação de assimetrias no repasse cambial na maioria dos países.

Considerando, portanto, os países da amostra, a busca pelo controle inflacionário passa

necessariamente pela política cambial, principalmente por meio do controle de depreciações

bruscas (overshooting cambial) e volatilidade da taxa de câmbio. Tal meta se estende também

para a gestão da política monetária, especificamente para o manejo da taxa de juros de curto

prazo. As esterilizações das intervenções no mercado de câmbio, por sua vez, afetam tanto o

gerenciamento de liquidez da política monetária – responsável pela absorção da liquidez

adicional e, consequentemente, pela manutenção da meta da taxa de juros de curto prazo –

quanto o custo financeiro dívida pública federal, especialmente nos casos de esterilizações via

operações compromissadas ou venda definitivas de títulos de curto prazo.

2.4 Inserção comercial e padrões de comércio

A relação entre política cambial e estrutura produtiva e, de forma mais

abrangente, crescimento de longo prazo, geralmente se estabelece na literatura por meio dos

efeitos sobre competitividade externa (Rodrik, 2008; Frenkel & Rapetti, 2012). De acordo

com Guzman, Ocampo & Stiglitz (2017), uma taxa de câmbio real competitiva e estável é

fundamental para diversificação dos setores de bens tradables, especialmente aqueles com

elevadas externalidades de aprendizado (learning spillovers) e também para a geração de

encadeamentos para a frente e para atrás dos setores já existentes.

Assim, Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014) sugerem o uso, pelas autoridades

monetárias, de um conjunto de instrumentos (portfolio of instruments) para alcançar uma taxa

de câmbio não apenas competitiva, mas também estável. Para atingir tais objetivos, a política

cambial deve atuar de forma coordenada com as outras políticas, em especial a política

industrial, desestimulando os setores com menores encadeamentos68

, e políticas que visam à

estabilidade financeira, como medidas macroprudenciais e controles de capitais.

68

Assim como Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014), Bresser-Pereira (2012) propõe, como medida de

neutralização da doença holandesa, a taxação das exportações desses setores com baixo dinamismo (ou baixas

externalidades de aprendizado).

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Entretanto, Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014) apontam possíveis problemas, que

derivam desta opção de política. O principal deles diz respeito ao trade off entre

desvalorização cambial e salários reais. Ou seja, conforme ressaltado na seção anterior, em

razão do repasse cambial assimétrico em grande parte dos países da amostra, desvalorizações

tendem a causar fortes pressões inflacionárias, impactando negativamente os salários reais no

curto prazo. Porém, Rapetti (2013) ressalta que os baixos salários reais impulsionam, no

médio e longo prazo, o aumento da acumulação de capital no setor mais dinâmico,

impactando emprego e renda e, portanto, a demanda agregada. A solução para esse dilema, na

visão de Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014), seria política e social, isto é, convencer a

população dos benefícios da desvalorização no médio e longo prazo69

; para Frenkel & Rapetti

(2014) e Bresser-Pereira (2012) uma política fiscal responsável é fundamental para conter

possíveis pressões inflacionárias geradas pela desvalorização cambial70

.

Contudo, as duas soluções para o dilema acima não consideram uma possível

incompatibilidade entre a política cambial de longo prazo proposta e o regime

macroeconômico adotado pelos países emergentes da amostra. Conforme ressaltado na seção

anterior, o regime de metas de inflação subordina a política cambial e entrelaça ainda mais as

políticas monetária e cambial. Assim, nas fases de alta do ciclo de liquidez internacional, o

câmbio segue sua tendência cíclica de apreciação – nos termos de Bresser-Pereira (2012) -,

auxiliando a política monetária no controle da pressão inflacionária, provocada,

principalmente, pelo crescimento doméstico. Neste cenário, portanto, a independência entre

política monetária e cambial passa necessariamente pela flexibilização do binômio regime de

metas de inflação/câmbio flutuante. Em outras palavras, assumir uma política cambial

anticíclica implica não só mudança no regime de câmbio, mas também uma revisão nos

pilares do regime de metas, já que o câmbio apreciado não será mais um recurso das

autoridades monetárias para reduzir o repasse cambial.

Alguns países emergentes “ensaiaram” essa opção durante o boom de fluxos de

capitais entre 2009 e 2011 por meio do uso de instrumentos de gestão dos fluxos de capitais

(ver, por exemplo, FMI, 2011). Porém, tais instrumentos buscaram mais conter o ímpeto pró-

cíclico dos fluxos de capitais, e seus efeitos sobre a volatilidade da taxa de câmbio, do que

reverter – pelo menos oficialmente - a trajetória de apreciação em direção a uma taxa de

69

Conforme Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014, p. 10), “the implementation of competitive RER policies

requires social coordination that in many occasions is difficult to achieve—especially so when the sectors that

would lose purchasing power in the present believe that they will not share the potentially larger purchasing

power of the aggregate economy in the future”. 70

De acordo com Bresser-Pereira (2012, p. 16), “o déficit público enfraquece o Estado e causa inflação, devendo

ser evitado, a não ser em momentos de recessão”.

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124

câmbio competitiva, principalmente naqueles países que possuem fear of depreciation (ver,

por exemplo, Barbosa-Filho, 2015 e Ros, 2015)71

. No caso do Brasil, por exemplo, o uso de

instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e derivativos foi além da estabilidade financeira

(via taxa de câmbio), envolvendo também a reversão da trajetória de apreciação do real. No

entanto, após o anúncio do tappering pelo Fed em 2013, o aprofundamento da depreciação da

moeda brasileira levou o Banco Central a intervir via swaps cambiais, sugerindo não apenas

uma preocupação com a estabilidade financeira, mas também um receio em relação ao

impacto da desvalorização sobre o nível de preços (Prates, 2015).

Assim, o binômio regime de metas de inflação/câmbio flutuante fomenta em

alguns países uma constante tensão entre a busca pela competitividade externa e o controle

inflacionário como objetivo de política cambial. Essa tensão, por sua vez, dependerá, dentre

outros fatores, da gestão da política monetária – abordada na seção anterior – e da relação

entre taxa de câmbio e o padrão de comércio dos países emergentes que adotam esse regime

macroeconômico.

Ao longo dos anos 2000 e 2010 se observou importantes mudanças na estrutura

produtiva global, com destaque para o rearranjo das estratégias globais de organização da

atividade produtiva e do surgimento da China como grande fornecedora mundial de produtos

manufaturados (Hiratuka & Sarti, 2017). Neste cenário, entre 2003 e 2011 – período de

elevada queda da taxa de câmbio real (ou seja, apreciação real da moeda brasileira) –, a

participação dos insumos básicos e de menor complexidade econômica72

na pauta de

exportação dos países latino-americanos da amostra (Brasil, Chile, Colômbia e Peru)

aumentou de forma expressiva em detrimento dos outros setores, em especial, os bens

intermediários e de capitais (Gráfico 2.19 e 2.25). Os dados de comércio apenas refletem,

portanto, a especialização regressiva na estrutura produtiva desses países. Esse cenário tornou

a taxa de câmbio dos países latino-americanos ainda mais atrelada aos preços das

commodities, reforçando a posição dessas moedas como “commodity currencies”

(Kohlscheen et. al., 2016; Cashin et. al., 2004). Esse tipo de inserção, portanto, tem

implicações não apenas para a estrutura produtiva, mas também para o movimento da taxa de

câmbio. Assim, nos momentos de boom dos fluxos de capitais – entre 2003 e 2007 e 2009-

2011 – o aumento dos preços das commodities contribuiu para a apreciação intensa das

moedas periféricas (Kohlscheen et. al., 2016; De Roure, 2013; ver Gráfico 2.25 no apêndice).

71

Ver, por exemplo, Domanski et. al. (2016) e Mohanty & Berger (2013). 72

O índice de complexidade econômica mede a intensidade de conhecimento relativo de uma economia por

meio da mensuração da quantidade de conhecimento requerido na produção dos bens exportados (ver Hidalgo &

Hausmann, 2009).

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125

Nesse sentido, variações abruptas nos preços das commodities podem gerar o mesmo efeito

nas “moedas commodities”, gerando consequências, portanto, para a estabilidade financeira.

O México manteve e aprofundou seu padrão de comércio – integrado à cadeia de

valor norte-americana na ponta intensiva em trabalho - com pequeno ganho de participação do

setor de insumos básicos, especialmente petróleo, como será visto no próximo capítulo (ver

gráfico 2.19; López, 2014). Conforme Cepal (2014, p. 12), o país

“(..) se destaca pelo peso relevante que têm os produtos de tecnologia

média nas exportações de bens intermediários a seus parceiros do

Tratado de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA); não

obstante, a inserção do país na “fábrica América do Norte” se sustenta

principalmente na exportação de bens finais produzidos a partir de

insumos importados, com escassa incorporação de valor nacional”

Os países do leste europeu (Hungria, Polônia e República Tcheca) estão

integrados à cadeia de valor alemã na ponta intensiva em trabalho, exportando produtos com

elevada complexidade – em sua maioria bens de capital -, porém alto conteúdo importado73

(ver Ahmed, Appendino & Ruta, 2015; ver gráficos 2.20 e 2.25). A Turquia, por sua vez, não

está profundamente integrada à cadeia de valor alemã e possui um padrão de comércio

concentrado nas exportações de bens de consumo (de baixa complexidade), especialmente da

indústria têxtil e metais preciosos74

(Yilmaz & Karaalp-Orhan, 2016; Gráfico 2.24 e 2.25).

Tais bens exportados também possuem um alto conteúdo importado, assim como nos demais

países do leste europeu (Demiral, 2016). Porém, no caso turco, a combinação dessa

dependência com as características dos bens exportados gera efeitos deletérios relevantes

sobre a balança comercial e o saldo de transações correntes, que alcançou -8% do PIB em

2011 (gráfico 2.9).

Os países do sudeste asiático (Filipinas e Tailândia), mantiveram suas exportações

concentradas em bens de capitais e de consumo de elevada complexidade e crescente

integração à cadeia de valor chinesa, que se tornou o motor do comércio intra-regional.

Entretanto, a Indonésia destoa do padrão acima, concentrando suas exportações em insumos

73

Nos casos de República Tcheca e Hungria destaca-se a plataforma de exportação de automóveis. Ver

https://wits.worldbank.org/CountryProfile/en/Country/HUN/Year/2015/Summary e

https://wits.worldbank.org/CountryProfile/en/Country/CZE/Year/2015/Summary 74

Os dados mais desagregados em relação ao gráfico 2.19 foram consultados diretamente na base do Banco

Mundial de comércio exterior (World Integrated Trade Solution). A base turca pode ser acessada a partir do link:

https://wits.worldbank.org/CountryProfile/en/Country/TUR/Year/2015/Summary.

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126

básicos – especialmente mineração, agricultura e derivados do petróleo – e suas importações

em bens de capital e intermediários – além de ter se tornado importadora líquida de petróleo

em 2012 (Pangestu et. al., 2015; Athukorala, 2010; gráfico 2.22 e 2.25).

A Coréia do Sul não só manteve seu padrão de comércio, concentrado na

exportação de bens de capital de elevada complexidade, como o aprofundou. Conforme Sato

et. al. (2013), a apreciação do won, em 2003-2007 e 2009-2011 afetou negativamente a

competitividade das empresas exportadoras, especialmente a indústria automotiva - em

comparação à indústria automotiva japonesa. A única exceção foi a indústria de maquinaria

eletrônica, principal indústria do setor exportador e caracterizada pela elevada

competitividade – via preços – com as empresas japonesas do mesmo setor. Neste cenário, a

apreciação do won contribuiu para a redução dos preços dos produtos exportados, via queda

dos preços de produção (insumos), aumentando, assim, a competitividade dessa indústria.

Após 2011, iniciou-se um período de instabilidade do ciclo de liquidez

internacional, no qual se verificou uma reversão na trajetória de apreciação das moedas

periféricas (nominal e real). No entanto, até 2015, os efeitos dessa mudança não provocaram

alterações estruturais relevantes no padrão de comércio dos países da amostra. Na América

Latina, esse período de desvalorização não reverteu a concentração das exportações no setor

de insumos básicos –no caso brasileiro, ela se aprofundou - e aumentou o custo de produção

nos setores exportadores com grande conteúdo importado em seus produtos (ver, por

exemplo, Brussière & Peltonen, 2008; Vaz & Baer, 2014). Já os países do leste europeu e

sudeste asiático, além do México, apenas reafirmaram suas respectivas posições nas cadeias

globais de valor.

Os dados apresentados, portanto, indicam que o padrão de comércio desses países

não apresentou mudanças estruturais significativas após 2011, o que pode ser explicado, de

maneira não excludente, pelo pequeno efeito das depreciações no curto prazo, pela

insuficiência das mesmas em transformar tal padrão – e mudar a inserção dos países

emergentes nas cadeias globais de valor - e/ou pela ausência de políticas complementares em

prol da competitividade externa - como a política industrial e tecnológica.

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127

Fonte: World Integrated Trade Solution (WITS)

Fonte: World Integrated Trade Solution (WITS)

0%

10%

20%

30%

40%

50%

Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação

2003 2011 2015

em

% d

o T

ota

l 2.19: Padrão de comércio - América Latina

Bens de capital Bens de consumo Bens Intermediários Insumos básicos

0%5%

10%15%20%25%30%35%40%45%

Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação

2003 2011 2015

Em %

do

To

tal

2.20: Padrão de comércio - Leste Europeu

Bens de capital Bens de consumo Bens Intermediários Insumos básicos

0%

10%

20%

30%

40%

50%

Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação

2003 2011 2015

Em %

do

To

tal

2.21: Padrão de comércio - Sudeste Asiático

Bens de capital Bens de consumo Bens Intermediários Insumos básicos

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128

Fonte: World Integrated Trade Solution (WITS)

Fonte: World Integrated Trade Solution (WITS)

Fonte: World Integrated Trade Solution (WITS)

0

10

20

30

40

50

60

Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação

2003 2011 2015

Em %

do

To

tal

2.22: Padrão de comércio - Coréia do Sul

Bens de capital Bens de consumo Bens Intermediários Insumos básicos

0

10

20

30

40

50

Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação

2003 2011 2015

Em %

do

To

tal

2.23: Padrão de comércio - México

Bens de capital Bens de consumo Bens Intermediários Insumos básicos

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129

Fonte: World Integrated Trade Solution (WITS)

Nota: Atlas da complexidade econômica – MIT

0

10

20

30

40

50

60

Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação

2003 2011 2015

Em %

do

To

tal

2.24: Padrão de comércio - Turquia

Bens de capital Bens de consumo Bens Intermediários Insumos básicos

-1,5

-1

-0,5

0

0,5

1

1,5

2

2,5

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Gráfico 2.25: Índice de complexidade econômica - países selecionados

Brasil Chile Colombia Rep. Tcheca Hungria

Indonesia Mexico Peru Filipinas Polônia

África do Sul Coréia do Sul Tailândia Turquia

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130

2.5 Relação entre condicionantes estrutural e domésticos e o impacto sobre a autonomia

da política cambial

O quadro 2.3 apresenta um panorama geral dos condicionantes domésticos nos

países da amostra75

. Conforme descrito na introdução, a interação da política cambial com os

condicionantes domésticos permite que ela responda (ou não) aos efeitos do condicionante

estrutural, analisado no primeiro capítulo. Porém, de que maneira os condicionantes

domésticos atenuam os efeitos do condicionante estrutural sobre o espaço de política cambial?

Prates (2015, p. 44) estabelece as conexões entre a dinâmica da taxa de câmbio e os

condicionantes domésticos de acordo com o referencial teórico keynesiano-estruturalista,

representado na equação (4) do capítulo anterior:

“(...) apesar de as assimetrias monetária e financeira constituírem

fatores condicionantes dessa dinâmica nas economias emergentes em

geral (devido ao impacto sobre l e a), fatores específicos a cada uma

dessas economias funcionam como filtros, que atenuam ou reforçam

suas consequências adversas mediante sua influência nos atributos a, c

e q.”

Tais fatores específicos, chamados aqui de condicionantes domésticos, foram

sistematizados nas seções acima. O primeiro capítulo já destacou a relação entre, de um lado,

abertura financeira e institucionalidade do mercado de câmbio e, de outro lado, o custo de

carregamento das moedas periféricas em relação às divisas (c - c*) (Prates, 2015, p. 48). Essa

relação possui duas dimensões. A primeira refere-se ao fato do diferencial de custos de

carregamento (c-c*) ser inversamente proporcional ao grau de abertura financeira, dada a

institucionalidade do mercado de câmbio, como explicado abaixo. A segunda diz respeito à

elevada volatilidade das moedas periféricas, que pode elevar o custo de carregamento se a

oferta de hedge nos mercados de derivativos não for adequada. De acordo com o quadro 2.4,

as moedas peruanas e dos países da Europa Central e do Leste (Hungria, República Tcheca e

Polônia) apresentam reduzidos custos de transação e carregamento em seus respectivos

mercados financeiros (incluindo as operações no mercado de câmbio) em relação às divisas.

A vulnerabilidade externa se relaciona principalmente com os atributos (a) e (q-

q*). Assim, expectativas em relação ao movimento de uma determinada moeda periférica (a)

75

O quadro lista apenas a característica principal de cada condicionante em cada país.

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131

podem impactar a posição líquida em moeda estrangeira dos agentes e/ou a posição dos

investidores não residentes nos mercados locais. Ao mesmo tempo, países com elevado

diferencial de juros (q-q*) podem atrair um maior volume de capitais de curto prazo sob a

estratégia de search for yield, afetando negativamente a vulnerabilidade externa.

A gestão da política monetária, por sua vez, impacta principalmente o diferencial

de rendimentos entre a moeda periférica e as divisas (q-q*). Assim, um elevado pass-through

(simétrico ou assimétrico) pressionaria o diferencial de juros, que, por sua vez, impactaria

também o custo financeiro da intervenção – dependendo da maneira pela qual a esterilização é

realizada. As ações da política monetária, via diferencial de juros, e da política cambial,

objetivando o controle inflacionário, impactariam também as expectativas em relação à

depreciação da moeda periférica, afetando negativamente (a). Conforme relatado acima, todos

os países possuem um repasse cambial assimétrico, tornando a relação entre política cambial e

(q-q*) mais estreita.

Já o padrão de comércio relaciona-se principalmente com a expectativa de

apreciação/depreciação da moeda periférica, ou seja, com a redução do atributo (a). Conforme

mencionado na seção anterior, a manutenção da expectativa de depreciação, via política

cambial, pode provocar efeitos distintos, dependendo do padrão de comércio de cada país,

sobre a competitividade externa e, consequentemente, sobre a vulnerabilidade externa. Ou

seja, em alguns países, a depreciação cambial não é acompanhada de melhora na

competitividade externa, podendo gerar inclusive – dependendo do padrão de comércio - uma

piora no saldo comercial, impactando negativamente a vulnerabilidade externa.

Por fim, a relação dos condicionantes domésticos com o condicionante estrutural

gera impactos sobre a autonomia de política cambial (quadro 2.4). Conforme a figura 2.1 (da

Introdução deste capítulo), tais efeitos não são isolados, dependendo, portanto, da inter-

relação entre os condicionantes domésticos e da sua interação com a política cambial – que

será visto no próximo capítulo. No entanto, para efeitos teóricos, vale ressaltar, brevemente, o

efeito isolado de cada condicionante doméstico. Assim, ceteris paribus, um elevado grau de

abertura financeira e menor regulação, por exemplo, intensificam os impactos das assimetrias

sobre a taxa de câmbio, reduzindo, portanto, a autonomia de política cambial. O aumento da

vulnerabilidade externa, por sua vez, também reduz o espaço de política cambial – por meio

do impacto sobre a volatilidade cambial e o “medo” de usar as reservas internacionais, por

exemplo -, assim como a presença do repasse cambial assimétrico, que aproxima ainda mais

as gestões da política monetária e cambial. Já em relação ao padrão de comércio, a

concentração das exportações em produtos de menor complexidade e das importações em

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132

bens de capital e intermediários pode dificultar a busca pela competitividade externa e,

portanto, uma maior autonomia de política cambial em direção a objetivos domésticos.

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133

Quadro 2.3: Resumo da relação entre condicionantes domésticos e estrutural

Países/Condicio

nantes

Abertura

Financeira

Institucionalidade

Mercado de

Câmbio

Vulnerabilidade

Externa

Gestão da Política

Monetária Padrão de Comércio

(c*-c) (c*-c) (a)

(q-q*)

(q-q*)

(a) (a)

Brasil Moderada

- Mercado futuro (mais

líquido)

- Regulação: Mercado

à vista (mais restrito)

- Elevação da dívida

privada externa pós-crise

- Repasse cambial

assimétrico (elevado)

- Esterilização:

Compromissadas

Commodities

(Baixa complexidade)

Coréia do Sul Moderada

- Forwards e FX swaps

(mais líquido)

- Regulação: Mercado

de derivativos (mais

restrito)

- Redução da dívida

privada dos bancos pós-

crise

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização: Títulos

Banco Central

Bens de capital

(Elevada

complexidade)

Turquia Moderada FX swaps (mais

líquido)

- Dolarização

- Elevado déficit em

transações correntes

- Repasse cambial

assimétrico (elevado)

- Esterilização:

Compromissadas

Bens de consumo

(Baixa complexidade)

México Moderada FX swaps (mais

líquido)

- Elevada participação de

invest. estrangeiros no

mercado de títulos

públicos

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização: Títulos

Banco Central (DPTF)

Bens de capital

(integrados à cadeia

norte-americana)

(Complexidade

moderada)

Chile Moderada - Mercado à vista - Elevação da dívida - Repasse cambial Commodities

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134

Colômbia

(mais líquido)

- Mercado Forwards

crescente

privada externa assimétrico

- Esterilização: Títulos

Banco Central (Chile);

Depósito remunerado

(Colômbia)

(Baixa complexidade)

Peru Elevada

- Mercado à vista

(mais líquido)

- Mercado Forwards

crescente

- Dolarização

- Elevada participação de

invest. estrangeiros no

mercado de títulos

públicos

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização: Títulos

Banco Central e depósito

remunerado

Commodities

(Baixa complexidade)

Hungria

Polônia

Rep. Tcheca

Elevada FX swaps (mais

líquido)

- Elevada participação de

bancos estrangeiros

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização: Títulos

Banco Central

Bens de capital e de

consumo (integrados à

cadeia alemã)

(Elevada

complexidade)

Tailândia

Baixa

- Mercado à vista

(mais líquido)

- Regulação: mercado

de derivativos (mais

restrito)

- Reduzida vulnerabilidade

externa

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização:

Compromissadas, swaps

cambiais e títulos do Banco

Central

Bens de capital

(Elevada

complexidade)

Filipinas Moderada

- Mercado à vista

(mais líquido)

- Regulação: mercado

de derivativos (mais

- Reduzida vulnerabilidade

externa

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização:Títulos

Banco Central

Bens de capital

(Complexidade

moderada)

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135

restrito)

Indonésia Moderada

- Mercado à vista

(mais líquido)

- Regulação: mercado

de derivativos (mais

restrito)

- Elevação do passivo

externo pós-crise

- Elevada participação de

invest. estrangeiros no

mercado de títulos

públicos

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização: Títulos

Banco Central

Bens de consumo

(Baixa complexidade)

África do Sul

Baixa

FX swaps (mais

líquido)

- Participação dos fluxos

de portfólio

- Repasse cambial

assimétrico

- Esterilização: Títulos

Banco Central

Commodities

(Baixa complexidade)

Fonte: Elaboração própria

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136

Quadro 2.4: Relação entre condicionantes domésticos e autonomia de política cambial -

exemplos

Condicionantes domésticos Reduz autonomia Aumenta autonomia

Abertura

financeira/Institucionalidade

do mercado de câmbio

Maior grau de

abertura/menor regulação

Menor grau de

abertura/maior regulação

Vulnerabilidade externa Maior vulnerabilidade

externa

Menor vulnerabilidade

externa

Gestão da política monetária Repasse cambial assimétrico

Menor repasse

cambial/repasse cambial

simétrico

Padrão de comércio

Menor complexidade dos

produtos exportados

(exportações dependentes de

commodities)

Maior complexidade dos

produtos exportados

Fonte: Elaboração própria

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137

Considerações Finais

A política cambial sob o regime de metas de inflação e câmbio flutuante é um

tema recente tanto para a literatura econômica quanto para os policy makers. Os impactos da

condição periférica das moedas dos países emergentes sobre os preços-chave se impuseram

logo no início da vigência desse regime macroeconômico, revelando a importância da política

cambial. Conforme o referencial teórico desta tese, a inserção assimétrica desses países no

SMFI contemporâneo restringe a autonomia de política cambial, como detalhado no primeiro

capítulo. Partindo desse raio de ação restrito, os condicionantes domésticos podem contribuir

positiva ou negativamente para o espaço de política cambial.

O presente capítulo teve como objetivo analisar quatro tipos de condicionantes

domésticos ou especificidades que, juntamente com a condição estrutural das moedas

periféricas no SMFI, se relacionam em diferentes graus com a política cambial dos países

emergentes selecionados.

Na primeira seção, analisou-se a institucionalidade do mercado de câmbio, que

revelou um elevado grau de abertura financeira nos países da amostra, além de um aumento

na liquidez dos mercados de derivativos de câmbio antes e após a CFG e uma participação

expressiva de bancos e dealers estrangeiros nesses mercados. O aumento da liquidez no

mercado de derivativos de câmbio, por sua vez, foi acompanhado pelo maior uso dos

derivativos como instrumentos de intervenção (ver Domanski et. al., 2016).

A segunda seção se concentrou na análise dos aspectos financeiros da

vulnerabilidade externa e apontou um aumento desta última – em todas as suas dimensões –

na maioria países da amostra após a CFG. O agravamento da vulnerabilidade externa,

principalmente após o retorno dos fluxos de capitais em 2009, foi uma das motivações para a

diversificação dos instrumentos de política cambial, mediante o uso de medidas

macroprudenciais, controle de capitais e regulação de derivativos cambiais.

Já a terceira seção se debruçou sobre a gestão da política monetária, que se

relaciona com a política cambial principalmente por meio do repasse cambial assimétrico aos

preços e da esterilização das intervenções no mercado de câmbio. O maior repasse cambial

nos períodos de depreciação reforçou a preocupação da política monetária com a trajetória da

taxa de câmbio. As esterilizações das intervenções, por sua vez, geram custos financeiros,

além de impactos sobre a estabilidade financeira, podendo fomentar a entrada de investidores

estrangeiros nos mercados de títulos públicos e o ciclo de crédito doméstico.

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138

A quarta seção abordou a busca da competitividade externa como objetivo de

política cambial e a inserção comercial externa dos países por meio de seus respectivos

padrões de comércio. A busca pela taxa de câmbio competitiva no longo prazo encontra dois

obstáculos principais: a predominância do controle inflacionário como objetivo de política

cambial; e a existência de padrões de comércio que podem ser conflitantes com a depreciação

cambial, principalmente nos países emissores de moedas commodities e/ou países

dependentes da importação de insumos básicos, especialmente petróleo e seus derivados.

Por fim, a última seção relacionou os condicionantes domésticos com os termos

da equação de retorno da moeda periférica em relação à divisa-chave. Assim, dado o

diferencial entre os prêmios de liquidez, o diferencial de custos de carregamento se relaciona

diretamente com o grau de abertura financeira e a institucionalidade do mercado de câmbio; o

diferencial de juros possui conexões com a vulnerabilidade externa – por exemplo, elevados

diferenciais podem atrais influxos de capitais de curto prazo em busca de rendimentos - e

também com a gestão da política monetária; já as expectativas de apreciação da moeda

periférica se relacionam com a vulnerabilidade externa, impactando o ativo/passivo em moeda

estrangeira dos agentes, a gestão da política monetária, por meio dos efeitos sobre o repasse

cambial, e o padrão de comércio.

Ademais, a análise dos condicionantes permite quatro considerações gerais. A

primeira aponta a CFG como um ponto de inflexão importante para a política cambial dos

países emergentes da amostra por conta de mudanças em seus condicionantes. Após a CFG,

especificamente a partir do retorno dos fluxos de capitais às economias emergentes no

segundo trimestre de 2009, alguns fatores começaram a ganhar destaque, tais como: a maior

participação, em volume negociado, dos mercados de derivativos de câmbio; a apreciação

intensa das moedas periféricas, em ritmo superior ao período pré-crise em alguns casos, e suas

consequências para a vulnerabilidade externa; o maior suporte empírico para existência de um

repasse cambial assimétrico sobre os preços nos países emergentes e o aumento da

instabilidade do comércio internacional, com impactos negativos sobre o padrão de comércio.

Tais especificidades tornaram não apenas a decisão de política cambial mais complexa, mas

também sua análise.

A segunda refere-se aos dilemas gerados pelas tensões entre a política cambial e

os condicionantes domésticos. Ou seja, a interação entre os instrumentos de intervenção –

visando um objetivo e uma meta específicos – e a institucionalidade do mercado de câmbio

pode gerar impactos positivos ou negativos sobre os demais condicionantes. Assim, por

exemplo, o uso de um determinado instrumento de intervenção com o objetivo de alcançar

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139

uma maior competitividade externa pode gerar impactos negativos sobre a vulnerabilidade

externa – dependendo do padrão de comércio e dos efeitos sobre os influxos de capitais de

curto prazo – e sobre a gestão da política monetária – considerando os efeitos do repasse

cambial assimétrico que atinge todos os países da amostra.

Já a terceira refere-se à identificação de algumas especificidades (condicionantes)

regionais em relação ao comportamento dos países da amostra. Países do sudeste asiático, por

exemplo, caracterizam-se por uma maior regulação no mercado de câmbio e por um padrão de

comércio concentrado na importação de insumos básicos e exportação de bens de capitais (de

maior complexidade). No caso dos países do leste europeu, há menor regulação no mercado

de câmbio, dominância dos mercados de FX swaps, maior vulnerabilidade externa

(considerando todas as dimensões supracitadas) e padrão de comércio integrado à cadeia de

valor alemã. Já os países latino-americanos são caracterizados pelas moedas commodities,

pelos mercados de derivativos de câmbio dominados pelos contratos forwards (especialmente

non-deliverables), com exceção do Brasil, e maior vulnerabilidade externa. A presença de tais

especificidades regionais exige, portanto, diferentes respostas da política cambial em relação à

escolha de objetivos, metas instrumentos e canais de transmissão.

Por fim, a quarta consideração refere-se ao caráter estrutural de alguns

condicionantes domésticos. Conforme observado nas seções acima, o repasse cambial

assimétrico – fator importante da gestão da política monetária - e a estrutura produtiva – que

conforma o padrão de comércio – se alteram somente no longo prazo. Ademais, tais

alterações não dependem somente da política cambial e estão sujeitos, portanto, a outras

políticas econômicas, como a política industrial. Já a vulnerabilidade externa pode ser alterada

no curto prazo no que se refere à liquidez externa – mediante variação da dívida externa de

curto prazo e/ou das reservas internacionais – e, assim, nesta dimensão, é impactada pela

política cambial, principalmente pelos instrumentos que modificam a institucionalidade do

mercado de câmbio e/ou a abertura financeira. Já na sua dimensão de médio e longo prazo,

que diz respeito à solvência externa, o dinamismo das exportações também é crucial e, assim,

a iniciativas de política cambial direcionadas para o padrão de comércio (voltadas para a

sustentação ou aumento da competitividade externa) se revelam fundamentais.

Ademais, é interessante observar que as principais moedas periféricas, em termos

de volume, nos mercados internacionais – peso mexicano, won sul-coreano, real brasileiro e

lira turca – possuem ao mesmo tempo características regionais e específicas. No caso

brasileiro, o padrão de comércio é concentrado na exportação de commodities (e/ou bens de

menor complexidade), assim como os demais países sul-americanos da amostra. No entanto,

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140

as assimetrias regulatórias e de liquidez presentes no mercado de câmbio brasileiro se difere

da institucionalidade dos demais países sul-americanos analisados. O caso mexicano é ainda

mais distinto em relação aos demais países latino-americanos da amostra, já que o país possui

um mercado de câmbio offshore mais líquido em relação ao mercado onshore, além de um

padrão de comércio integrado à cadeia de valor das empresas norte-americanas. A Turquia,

por sua vez, possui elevada vulnerabilidade externa e elevado grau de abertura financeira,

como os demais países da Europa central e do leste, porém é marcada por uma elevada

dolarização dos depósitos e empréstimos. Por fim, a Coréia do Sul possui um padrão de

comércio integrado às economias asiáticas estudadas, concentrado nas indústrias intensivas

em tecnologia. Entretanto, a institucionalidade (principalmente os mercados onshore e a

maior presença de dealers locais) e a vulnerabilidade externa se diferenciam dos países

asiáticos da amostra.

A análise da política cambial a partir dos condicionantes estrutural e domésticos

se concentrará nos quatro países supracitados. A escolha de tais países se deu tanto pela

liquidez de suas respectivas moedas nos mercados internacionais de câmbio quanto pela

coexistência de fatores regionais e específicos em cada caso. Assim, a seleção dos estudos de

caso não se baseou apenas na representatividade desses países em relação aos demais da

amostra, mas na relevância de seus condicionantes, o que permitirá que sejam exploradas com

maior profundidade os denominadores comuns e singulares da política cambial nos quatro

países emergentes selecionados e como eles impactam na autonomia dessa política.

Anexo estatístico

Tabela 2.5: Emissão Internacional de Títulos (US$ milhões) – países selecionados

Países Setores 1995 2002 2007 2011 2013 2015

Brasil

Público 45.262 54.108 52.360 51.256 58.256 48.344

I. Não-financeiras 5.075 12.033 13.373 28.311 35.271 36.862

Financeiro 10.445 12.016 16.121 54.616 60.037 53.694

Total 60.782 78.157 81.854 134.183 153.564 138.900

Chile

Público 320 2.165 2.850 4.583 4.329 7.608

I. Não-financeiras 422 7.814 8.651 16.855 26.152 39.460

Financeiro - 1.470 2.110 5.776 12.167 13.376

Total 742 11.449 13.611 27.214 42.648 60.444

México

Público 39.759 50.721 42.095 46.546 54.195 62.478

I. Não-financeiras 13.359 18.183 21.695 54.041 102.970 123.977

Financeiro 6.592 3.503 3.648 11.493 15.486 22.517

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Total 59.710 72.407 67.438 112.080 172.651 208.972

Colômbia

Público 1.039 11.311 16.067 19.428 21.439 24.657

I. Não-financeiras 150 341 1.550 4.523 8.998 14.325

Financeiro 489 415 400 3.440 7.490 7.825

Total 1.678 12.067 18.017 27.391 37.927 46.807

Hungria

Público 250 4.081 21.185 25.355 28.671 23.363

I. Não-financeiras - - 1.416 2.280 2.837 1.465

Financeiro 15.642 6.349 11.827 8.667 10.207 9.460

Total 15.892 10.430 34.428 36.302 41.715 34.288

Polônia

Público 6.090 5.913 40.427 61.017 70.295 58.015

I. Não-financeiras

32 - 233 949 912

Financeiro - 110 220 395 3.572 4.043

Total 6.090 6.055 40.647 61.645 74.816 62.970

Rep. Tcheca

Público 250 362 4.586 11.620 17.248 9.976

I. Não-financeiras - 200 2.365 9.400 13.323 10.046

Financeiro 716 1.399 971 2.901 6.326 6.607

Total 966 1.961 7.922 23.921 36.897 26.629

Turquia

Público 11.488 21.296 39.922 46.850 59.257 61.821

I. Não-financeiras 35 400 368 400 4.600 7.145

Financeiro 1.027 636 1.512 7.407 26.331 41.857

Total 12.550 22.332 41.802 54.657 90.188 110.823

África do Sul

Público 1.754 6.177 8.584 10.864 11.710 12.001

I. Não-financeiras 750 1.363 8.583 12.310 12.259 11.071

Financeiro 712 442 5.156 6.301 6.544 7.133

Total 3.216 7.982 22.323 29.475 30.513 30.205

Indonésia

Público 300 400 7.000 22.572 32.822 47.922

I. Não-financeiras 887 310 1.104 4.130 10.105 13.281

Financeiro 2.574 1.185 2.110 4.309 8.450 17.153

Total 3.761 1.895 10.214 31.011 51.377 78.356

Filipinas

Público 1.759 5.084 5.830 8.293 11.236 10.564

I. Não-financeiras 6.812 21.479 32.653 40.784 45.164 47.477

Financeiro 692 3.552 3.997 4.893 5.917 8.143

Total 4.361 12.843 22.826 27.598 28.011 28.770

Tailândia

Público 1.343 2.697 1.182 386 95 100

I. Não-financeiras 2.338 3.343 4.138 3.989 6.174 6.416

Financeiro 2.990 3.249 3.153 2.208 3.063 2.890

Total 6.671 9.289 8.473 6.583 9.332 9.406

Coréia do Sul

Público 349 5.221 7.302 7.102 7.107 6.549

I. Não-financeiras 10.424 20.462 28.043 42.178 52.549 52.695

Financeiro 15.765 21.389 69.745 98.666 116.738 113.683

Total 26.538 47.072 105.090 147.946 176.394 172.927 Fonte: BIS (International Banking Statistics)

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142

Tabela 2.6: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) – países selecionados

Países Setores 1995 2002 2007 2011 2013 2015

Brasil

Bancos 30.400 28.012 54.628 94.279 86.700 90.617

Não Bancos 30.075 29.751 40.277 90.076 105.505 111.500

I. não financeiras 0 0 0 0 40.102 64.433

Chile

Bancos 4.984 4.233 12.673 22.725 20.344 18.882

Não Bancos 8.730 13.941 15.909 24.279 21.371 19.386

I. não financeiras 0 0 0 0 10.867 12.873

México

Bancos 18.932 9.623 16.079 28.390 29.702 20.651

Não Bancos 44.087 38.598 49.763 56.197 50.433 61.498

I. não financeiras 0 0 0 0 24.984 40.808

Colômbia

Bancos 2.448 2.488 4.338 7.794 11.272 10.655

Não Bancos 7.898 5.457 7.339 7.559 10.849 13.886

I. não financeiras 0 0 0 0 5.976 8.423

Hungria

Bancos 4.263 5.699 26.841 26.883 12.498 7.985

Não Bancos 2.247 4.236 17.460 16.914 17.074 11.266

I. não financeiras 0 0 0 0 7.296 7.674

Polônia

Bancos 1.652 7.494 34.716 44.475 41.606 29.540

Não Bancos 3.125 7.993 26.042 29.958 28.124 20.227

I. não financeiras 0 0 0 0 16.077 13.489

Rep. Tcheca

Bancos 5.055 6.190 16.433 11.474 12.504 10.504

Não Bancos 2.069 4.580 15.413 16.510 15.252 10.071

I. não financeiras 0 0 0 0 5.451 5.410

Turquia

Bancos 6.730 6.891 33.874 57.862 83.792 85.299

Não Bancos 12.196 26.645 79.090 71.991 70.103 73.267

I. não financeiras 0 0 0 0 30.625 42.649

África do Sul

Bancos 8.126 8.745 17.851 13.227 13.082 18.239

Não Bancos 6.158 5.797 12.214 11.737 17.082 17.160

I. não financeiras 0 0 0 0 5.899 10.780

Indonésia

Bancos 20.656 7.977 20.594 26.473 21.216 27.221

Não Bancos 26.752 19.720 20.099 30.177 47.506 59.873

I. não financeiras 0 0 0 0 8.867 22.876

Filipinas

Bancos 4.856 6.609 9.624 11.035 12.665 10.526

Não Bancos 2.197 6.367 8.072 9.396 10.878 12.477

I. não financeiras 0 0 0 0 1.931 6.973

Tailândia

Bancos 78.520 11.011 14.651 19.267 44.357 34.229

Não Bancos 11.884 4.861 5.973 11.514 17.507 16.250

I. não financeiras 0 0 0 0 1.828 3.843

Coréia do Sul

Bancos 59.965 45.603 135.823 111.414 98.545 105.800

Não Bancos 14.670 11.345 18.105 28.407 16.850 11.288

I. não financeiras 0 0 0 0 2.002 4.351

Peru

Bancos 1.893 1.096 5.477 10.330 13.036 12.050

Não Bancos 3.056 3.159 4.598 10.329 11.053 22.129

I. não financeiras 0 0 0 0 4.949 17.863 Fonte: BIS (International Banking Statistics)

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143

Fonte: IIF e FMI

50,060,070,080,090,0

100,0110,0120,0130,0140,0150,0160,0170,0180,0190,0200,0

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Gráfico 2.26: Índice de preço das commodities e taxa de câmbio

real (Brasil, Chile, Colômbia e México)

Brasil Chile Colômbia Commodity Price Index

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144

Capítulo 3

A análise da política cambial sob a ótica dos condicionantes

domésticos e estrutural: os casos de Brasil, Coréia do Sul, México

e Turquia.

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145

Introdução

A linha que separa as motivações - objetivos e metas – da política cambial com os

seus condicionantes sempre foi tênue na literatura. Grande parte dos estudos que buscaram

analisar a política cambial por meio dos seus determinantes, o fizeram mediante diversas

funções de reação ou entrevistas junto aos Bancos Centrais. Conforme verificado no primeiro

capítulo, as entrevistas – ver BIS (2005 e 2013), Moreno (2005) e Neely (2005) - se

concentraram especificamente nas motivações das intervenções no mercado de câmbio, que,

por sua vez, foram relacionadas com os condicionantes no segundo capítulo. Já as funções de

reação buscam empiricamente – por meio do uso de modelos Tobit76

– encontrar não só as

motivações de facto, mas também possíveis condicionantes.

De maneira geral, Adler; Tovar Mora (2011) estimaram uma função de reação

das intervenções dos Bancos Centrais dos países latino-americanos, na qual as intervenções

respondem a variações abruptas na taxa de câmbio; aos desvios da taxa de câmbio real em

relação a uma taxa de equilíbrio; à volatilidade cambial semanal e à velocidade na apreciação.

De acordo com os autores, entre 2004 e 2010, as intervenções nesses países responderam

preponderantemente às variações cambiais abruptas e aos desalinhamentos da taxa de câmbio

real.

Em relação aos modelos country-specific, grande parte dos trabalhos indicam a

volatilidade cambial como principal determinante das intervenções (Guimarães & Karacadag,

2004); (Lang, 2005); (Égert & Komárek, 2005). Vale ressaltar neste caso o estudo de

(Chmelarova & Schnabl, 2006), que formulam uma função de reação para as intervenções do

Banco Central croata, semelhante à equação proposta por (Adler & Tovar Mora, 2011), e a

estimam para o período entre 1991 e 2005. Os resultados apontam a relevância da volatilidade

e do nível da taxa de câmbio para a intervenção e identificam um fear of depreciation para o

caso croata. Os autores vão além das motivações e investigam também os condicionantes das

intervenções, assim como relatado no segundo capítulo, reconhecendo o menor espaço de

política monetária dos países emissores de moeda periférica, porém sem adotar a abordagem

keynesiana-estruturalista utilizada nesta tese:

While the United States as the issuer of the most important

international currency pursue an independent monetary policy

76

O modelo Tobit é um modelo estatístico proposto por Tobin (1958) para descrever a relação entre uma

variável dependente (não negativa) y e uma variável independente (ou vetor) x.

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146

focused on domestic inflation and growth, most countries (…) tend to

stabilize their exchange rates against the dollar due to high degree of

openness and underdeveloped capital markets (CHMELAROVA;

SCHNABL, 2006, p. 8)

No caso croata, os autores vinculam as motivações identificadas na função de

reação com a elevada vulnerabilidade externa do país – um dos condicionantes domésticos -,

marcada pela “eurorização” do sistema financeiro doméstico e elevada parcela da dívida

externa denominada em moeda estrangeira. Esses fatores, por sua vez, tornam o país sensível

à depreciação e movimentos abruptos da taxa de câmbio.

Porém, como analisar se, de fato, um determinado instrumento de política cambial

respondeu a esses condicionantes? Este capítulo se propõe a analisar essa resposta por meio

do approach teórico desenvolvido ao longo dos dois primeiros capítulos, ou seja, a partir dos

condicionantes domésticos - institucionalidade do mercado de câmbio e abertura financeira;

vulnerabilidade externa; gestão da política monetária e estrutura de comércio – e estrutural – o

caráter hierárquico do SMI. Busca-se, assim, analisar se a política cambial está apenas

“acomodando” ou respondendo parcialmente aos efeitos da hierarquia; ou se os instrumentos

de intervenção respondem ativamente aos efeitos dos movimentos da divisa-chave sobre a

moeda periférica, aumentando a autonomia da política cambial em direção aos objetivos

domésticos. Conforme estudado no segundo capítulo, tal resposta aos efeitos da hierarquia de

moedas passa necessariamente pelos condicionantes domésticos (ver figura 3.1). Assim, por

exemplo, se o instrumento atinge a institucionalidade do mercado de câmbio (de forma ativa

ou acomodatícia) – ele gerará impactos (positivos e/ou negativos) sobre os condicionantes

domésticos. A partir desses impactos, pode-se concluir se tal instrumento de intervenção de

fato respondeu ou não aos condicionantes domésticos envolvidos e, assim, atenuou o impacto

das assimetrias monetária e financeira sobre o espaço de política cambial.

Por fim, a partir da identificação dos instrumentos que melhor respondem ao

condicionante estrutural, este capítulo analisará empiricamente a efetividade de tais

instrumentos em relação à volatilidade cambial. Esta análise será feita por meio de modelos

de heteroscedasticidade condicional auto-regressiva - conhecidos como Generalized

Autoregressive Conditional Heteroscedasticity (GARCH) -, modelo comumente utilizado

para a estimação da volatilidade de séries financeiras proposto por Engle (1982). Nos casos de

Brasil e Coréia do Sul a análise da efetividade é secundária e, portanto, foi colocada no

apêndice deste capítulo. No caso brasileiro, a política cambial que melhor respondeu o

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147

condicionante estrutural não tinha como meta principal a contenção da volatilidade cambial;

já no caso sul coreano, os instrumentos de política cambial são de longo prazo, não

compatível, portanto, com a análise de curto prazo dos modelos GARCH.

Este capítulo está organizado em quatro seções, divididas conforme os quatro

países escolhidos para os estudos de caso – Brasil, México, Turquia e Coréia do Sul. Cada

seção, por sua vez, está organizada em três subseções, que analisam, respectivamente, os

condicionantes domésticos de cada país, a cronologia da política cambial e as relações entre a

política cambial e os condicionantes, com foco nos instrumentos de intervenção utilizados.

Figura 3.1: Política cambial e condicionantes

Condicionantes domésticos

Política

cambial

Vulnerabilidade

Externa

Gestão da

política

monetária

Padrão de

comércio

Autonomia

de política

cambial

Abertura Financeira e

Institucionalidade do

mercado de câmbio

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148

3.1 Brasil: o horizonte curto-prazista e o pioneirismo nas mudanças

O real é a terceira moeda mais negociada nos mercados de câmbio internacionais

e, conforme analisado no primeiro capítulo, uma das moedas periféricas mais voláteis da

amostra estudada. Essa instabilidade é fomentada pelo grau de abertura financeira e pela

institucionalidade do mercado de câmbio que, dentre outros fatores, condicionaram a escolha

de instrumentos específicos de intervenção e impactaram os demais condicionantes

domésticos.

3.1.1 A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e

câmbio flutuante

Como verificado no segundo capítulo, o Brasil possui algumas especificidades em

relação à institucionalidade do mercado de câmbio, que resulta principalmente na

preponderância, em volume negociado, do mercado futuro (onshore) e de NDF (offshore) em

relação aos demais segmentos (Prates, 2015; Rossi, 2014; Chamon & Garcia, 2016).

Essa assimetria de liquidez é derivada de uma assimetria regulatória entre os

segmentos à vista e de derivativos. Enquanto no mercado à vista, somente bancos autorizados

pelo Banco Central do Brasil (Bacen) podem deter posições cambiais (registradas em

contratos de câmbio), no mercado de derivativos onshore (no qual o mercado futuro é

preponderante), qualquer instituição nacional ou estrangeira – registrada por meio de uma

conta n. 2.689 no Bacen77

– pode deter posições de câmbio. Esta diferença decorre de um

fator institucional importante: a proibição da abertura de contas denominadas em moeda

estrangeira, com poucas exceções apenas (ver quadro 2.2). A manutenção dessa regra – apesar

do extenso processo de abertura financeira ao longo dos anos 1990 e 200078

- restringiu o

acesso aos mercados primário e interbancário de câmbio à vista apenas aos bancos

autorizados como dealers pelo Bacen, que estão autorizados a manter posições cambiais. Tais

bancos, por sua vez, podem acumular posições de câmbio somente por meio de operações de

linha, que, de acordo com Rossi (2014, p. 79):

77

Do ponto de vista dos condicionantes, a primeira fase se caracterizou pela ampliação do grau de abertura da

economia brasileira na gestão Armínio Fraga Neto, principalmente do mercado de derivativos por meio da

resolução 2689 (26 de janeiro de 2000), que eliminou as restrições à participação dos investidores estrangeiros

nos mercados domésticos de derivativos, visando aumentar a liquidez nesse segmento de mercado (Bacen,

2000). 78

Uma revisão do processo de abertura financeira no Brasil e dos seus impactos sobre os mercados de câmbio

pode ser vista em Prates (2015) e Prates & Farhi (2015).

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149

“(..) são canais de financiamento em dólar dos bancos domésticos com

bancos no exterior, geralmente sucursais. O saque e o pagamento

dessas linhas não envolvem conversão de recursos entre reais e

dólares e são as únicas operações de câmbio entre residentes e não

residentes que não exigem contrato de câmbio, logo não constam no

fluxo cambial”

Os recursos captados por tais linhas somente podem alterar a posição de câmbio

dos bancos quando são convertidos em reais no mercado primário de câmbio, gerando

impacto positivo no fluxo cambial e negativo na posição de câmbio. Essas vendas, por sua

vez, estão isentas de eventuais alíquotas de IOF, já que o fator gerador desse imposto é o

contrato de câmbio, ausente nessa operação (Rossi, 2014; Prates, 2015).

Por outro lado, essa restrição implica que todas as transações sejam liquidadas em

reais, inclusive as operações nos mercados de derivativos de câmbio (organizados e de

balcão), conferindo, portanto, o caráter non deliverable desses mercados. Dessa forma, tais

mercados estão fora do escopo do regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais

Internacionais e não há, portanto, nenhum limite para as posições de bancos e outros agentes

nesses mercados – desde que essas últimas estejam de acordo com as regras impostas pela

BM&FBovespa (Prates & Farhi, 2015; Prates, 2015; Rossi, 2014).

Tais fatores são decisivos na dinâmica de hedge-especulação-arbitragem79

no

mercado de câmbio e, portanto, na formação da taxa de câmbio brasileira. Conforme Ventura

& Garcia (2009), Prates (2015), Rossi (2014) e Farhi (2006), a assimetria de liquidez entre os

segmentos do mercado de câmbio faz do mercado futuro de dólar o lócus de formação da taxa

de câmbio (real/dólar). Dessa forma, a taxa de câmbio R$/US$ se forma primeiramente no

primeiro vencimento do mercado futuro e, por meio de operações de arbitragem realizadas

pelos bancos (únicos agentes que podem manter posições de câmbio no mercado à vista), é

transmitida para a cotação à vista.

79

A posição especulativa considera “as posições líquidas, compradas ou vendidas, num mercado de ativos

financeiros (à vista ou de derivativos) sem cobertura por uma posição oposta no mercado com outra

temporalidade no mesmo ativo (posição hedge), ou num ativo efetivamente correlato” (Farhi, 1999, p.104). As

operações de arbitragem, por sua vez, procuram lucrar com as diferenças (distorções) entre as taxas de câmbio

nos diferentes segmentos do mercado de câmbio ou entre as taxas de juros de diferentes moedas (Prates, 2015;

Rossi, 2014).

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150

O “termômetro” dessas operações de arbitragem entre a taxa futura e a taxa à

vista80

são as variações no cupom cambial (taxa de juros em dólar no mercado onshore), que

influenciam na posição de câmbio dos bancos no mercado à vista (Prates, 2015; Rossi, 2014).

Se o cupom cambial for maior que o custo de captação externa (ou a taxa de juros do mercado

internacional), as cotações do dólar futuro e à vista se aproximam, já que se estimula a venda

dos dólares, captados no exterior, no mercado à vista – o que gera, portanto, uma apreciação

da moeda doméstica - e a compra de dólar futuro A operação contrária também vale, no caso

do cupom cambial menor que o custo de captação externa (Rossi, 2014). Assim, um cupom

elevado estimula a posição comprada líquida nesse contrato e a apreciação da moeda

brasileira. Como revela o gráfico 3.1, os bancos são a principal contraparte dos investidores

estrangeiros nos contratos de cupom futuro, exceto no período pós-2013, quando a venda de

swaps cambiais81

pelo Bacen - visando a manutenção de um cupom elevado e, assim, a

entrada de fluxos de capitais - estimulou o direcionamento de bancos e investidores

estrangeiros para a posição comprada em cupom futuro. Por outro lado, a contraparte dessas

operações se concentrou nos investidores institucionais nacionais.

80

A taxa de câmbio futura é determinada pela sua cotação à vista capitalizada pelo diferencial entre os juros de

duas moedas no período de tempo considerado (ver Prates, 2015, p. 97, Box 1). 81

De acordo com o Bacen (2012) o contrato de swap cambial com ajuste periódico, negociado na BM&F, tem

como objeto de negociação o diferencial entre a taxa de juros efetiva e a variação cambial, definidas como: (a) a

taxa de juros efetiva de depósitos interfinanceiros (DI), definida pela acumulação das taxas médias diárias de DI

de um dia, apuradas pela Cetip para o período compreendido entre a data da operação e a data de vencimento; (b)

a variação cambial, medida pela taxa de câmbio de reais por dólar, negociada no segmento de taxas livremente

pactuadas (cotação de venda) para entrega pronta e observada entre o dia útil anterior à data de operação,

inclusive, e a data de vencimento, exclusive.

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151

Fonte: BM&F Bovespa. Elaboração própria

Os bancos são os elos não apenas entre os mercados à vista e de derivativos

onshore, mas também entre esses últimos e os mercados de câmbio offshore, especialmente o

mercado de NDFs do real, negociado em Nova York. Além das operações de arbitragem entre

esses mercados, as instituições bancárias atuam principalmente como contraparte das

operações de investidores residentes e não-residentes em suas operações de hedge e

especulação. Os investidores não-residentes, por sua vez, são os principais agentes, em

volume, nos mercados futuros, o que aumenta ainda mais a conexão entre os movimentos da

moeda-chave (dólar) e a moeda doméstica (real) (Prates, 2015; gráfico 3.2).

-600000

-400000

-200000

0

200000

400000

600000

Gráfico 3.1: Posição líquida em cupom cambial - (US$ milhões)

Bancos Invest Estrangeiro Invest. Nacional

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152

Fonte: BM&F Bovespa

Fonte: Bacen

Num ambiente de mercados financeiros liberalizados, essas conexões foram

fomentadas principalmente por dois tipos de operações (definidas no segundo capítulo): as

operações de carry trade canônico, intensificadas pelo elevado diferencial de juros, e de

derivatives carry trade, fomentadas pela especificidade do mercado futuro brasileiro. Tais

operações revelam que as possibilidades de ganho com a moeda brasileira são impulsionadas

também por outro condicionante doméstico pontuado no segundo capítulo, a gestão da

política monetária. A manutenção de elevados diferenciais de juros combinada com reduzido

-500000

-400000

-300000

-200000

-100000

0

100000

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400000

Gráfico 3.2: Posição líquida em dólar futuro- US$ milhões

Invest. Nacionais Bancos Invest. Estrangeiro

-40.000

-35.000

-30.000

-25.000

-20.000

-15.000

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10.000

15.000

jan

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11

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13

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/14

jan

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set/

15

mai

/16

jan

/17

set/

17

Gráfico 3.3:Posição em dólar mercado à vista - Bancos (US$ milhões)

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153

prazo de maturação dos títulos públicos domésticos (ver quadro 2.2, segundo capítulo)

proporciona um elevado ganho de curto prazo nas operações de especulação e arbitragem.

As diversas operações descritas acima revelam o caráter curto-prazista de grande

parte de grande parte dos influxos de capitais e das posições em derivativos, que afeta

negativamente a resiliência da economia brasileira a choques externos. Do ponto de vista dos

fluxos, a conta financeira assume um papel preponderante a partir de 2006 e 2007. Vale

observar a entrada crescente e estável de Investimento Direto Externo (IDE) – fomentado

pelos empréstimos intercompanhia - no período pós CFG e a intensa entrada de fluxos de

portfólio e de empréstimos entre 2006 e 2007, 2009-2011 e 2013-2015, período de vigência

dos swaps cambiais, que serão abordados nas subseções abaixo.

O crescimento e a estabilidade do IDE foram importantes para contrabalançar a

reversão do saldo de transações correntes após a CFG. A deterioração dessa rubrica se baseou

fundamentalmente na piora do déficit na conta de serviços e o declínio do saldo comercial.

Em relação à primeira, vale destacar o déficit na subconta de viagens internacionais – pouco

elástica em relação ao câmbio – e de aluguel de equipamentos – cujo crescimento está

vinculado à produção e exportação de plataformas da Petrobrás (Cintra, 2015; Biancarelli,

Rosa & Vergnhanini, 2016).

Já o saldo comercial tem sua dinâmica explicada principalmente pela

concentração das exportações em insumos básicos – gerando, portanto, uma maior

dependência do ciclo de preços das commodities – e pela variação do quantum importado –

em especial a importação de combustíveis, que depende do preço do petróleo nos mercados

internacionais. O desempenho do saldo comercial brasileiro ao longo do período estudado

evidencia, portanto, a intensificação da especialização regressiva – fenômeno comum dos

países sul-americanos da amostra, visto no segundo capítulo. Neste contexto, de acordo com

Biancarelli, Rosa & Vergnhanini (2016), o impacto das variações da taxa de câmbio sobre o

desempenho do comércio exterior (e, assim, do saldo da conta de transações correntes) teria

perdido um pouco de relevância, já que esse desempenho também estaria associado a

problemas estruturais da indústria brasileira, cuja superação não dependeria somente da

variação ou nível da relação real/dólar (gráfico 3.4).

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154

Fonte: Bacen

Do ponto de vista dos estoques de ativo e passivo externos, vale ressaltar a

melhora dos indicadores de liquidez e solvência externa no período de alta do ciclo de

liquidez internacional, entre 2003 e 2007, em relação ao período de baixa entre 1999 e 2002,

quando o país acumulou um estoque expressivo de dívida externa (principalmente pública). A

redução da dívida externa e o ritmo acelerado de acumulação de reservas internacionais

resultaram inclusive na posição do Brasil como credor líquido em moeda estrangeira a partir

de 2007 (Prates, 2015; Abouchedid, 2014). Outro fator que contribuiu positivamente para a

vulnerabilidade externa, assinalado no segundo capítulo, foi o aumento progressivo do

estoque de passivo externo denominado em real, que gera um “efeito preço” positivo sobre a

posição internacional de investimento nos momentos de crise e aumento da preferência pela

liquidez da divisa (Rosa & Biancarelli, 2014; Noije, 2015; Tabela 2.2, segundo capítulo).

No entanto, há outras dimensões da vulnerabilidade externa, assinaladas no

segundo capítulo, que contrabalançam o cenário acima, principalmente no que tange às

relações privadas no mercado de derivativos de câmbio. A primeira dimensão refere-se à

participação dos investidores não-residentes nos mercados futuros de dólar e de cupom

cambial, que detém protagonismo nas posições líquidas e, portanto, tornam a taxa de câmbio

mais suscetível a mudanças do ciclo de liquidez internacional. A segunda é a relação entre

empresas não financeiras e bancos no mercado futuro, que se intensificou especialmente no

período “pré-crise” (2003-2007). No contexto de apreciação do real, as empresas brasileiras

-15.000

-10.000

-5.000

-

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10.000

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/99

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01

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jan

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5

set/

16

jul/

17

Gráfico 3.4: Balanço de pagamentos (1999-2017) - US$ milhões

Transações Correntes IDE Portfólio Empréstimos

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155

assumiram elevadas posições vendidas em dólar a termo nos mercados de balcão (registrados

na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Título - CETIP), muito além da proteção

cambial correspondente às suas respectivas operações. Essas posições especulativas tinham

como contraparte os bancos, que vendiam tais produtos para as empresas com elevados

payoffs82

(ver Borghi & Farhi, 2009).

Já a terceira dimensão consiste na escalada da dívida externa privada de curto

prazo, principalmente a parcela correspondente aos empréstimos externos contraídos pelos

bancos (equivalente à quase totalidade da dívida) e, em menor medida, pelas empresas não

financeiras após a CFG (gráfico 3.5). O comportamento do estoque de dívida externa privada

foi influenciado principalmente pelo boom dos fluxos de capitais entre 2009 e 2011 e pelo

impacto das intervenções via swaps cambiais, entre 2013 e 2015, sobre as operações dos

bancos. Nesse último caso, conforme mencionado acima, a manutenção do cupom cambial

elevado estimulou a captação de empréstimos em moeda estrangeira pelos bancos (Garcia &

Volpon, 2014).

Fonte: Bacen

Conforme mencionado, a gestão da política monetária também é um

condicionante importante neste puzzle. Sob o regime de metas de inflação brasileiro, a

principal conexão entre a gestão da política monetária (que tem na estabilidade monetária seu

82

Payoff refere-se à diferença entre o valor do ativo subjacente estabelecido no contrato e o valor observado na

data de liquidação (Farhi, 2006).

0

1.000

2.000

3.000

4.000

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0

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20

02

T1

20

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T4

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T1

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20

14

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20

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20

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T2

20

17

T1

Gráfico 3.5: Dívida externa Curto Prazo - Bancos (Direita) e

empresas não-financeiras - US$ milhões

Bancos Empresas não-financeiras

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156

objetivo único) e a política cambial é o repasse cambial, discutido ao longo do segundo

capítulo. O elevado repasse cambial nos momentos de depreciação – cerca de 11% da

variação cambial confome Pimentel, Luporini & Modenesi (2016) – torna a taxa de câmbio

um importante canal de transmissão da política monetária e o controle inflacionário um

importante objetivo macroeconômico da política cambial.

Outra conexão entre a gestão da política monetária e a política cambial abordada

no capítulo anterior é a esterilização das reservas internacionais. No caso brasileiro, o elevado

diferencial de juros, em comparação aos demais países emergentes da amostra, implica

elevados custos na esterilização da compra de divisas nos mercados à vista. Além dos custos

provindos da acumulação de reservas, há também os custos ou ganhos envolvidos nas

operações de swaps cambiais (abordados na próxima seção), realizados pelo Bacen e

liquidados em reais, que são contabilizados, juntamente com o resultado líquido da

acumulação de reservas, na conta única do Tesouro. Dessa forma, a liquidação em reais desse

instrumento de intervenção, fruto da institucionalidade do mercado de câmbio brasileiro,

também gera custos fiscais e problemas adicionais de coordenação entre as políticas

monetária, cambial e fiscal (Tabela 3.1).

Tabela 3.1: Resultado líquido das operações de swaps cambiais e esterilização das

operações no mercado à vista

Swaps Cambiais

Reservas

Internacionais Total

2008 5 328 121 290 126 618

2009 2 281 -150 000 -147 719

2010 - -48 530 -48 530

2011 694 43 346 44 041

2012 1 124 21 185 22 309

2013 -2 382 34 068 31 685

2014 -10 681 24 630 13 950

2015 -102 628 259 973 157 345

2016 83 804 -324 123 -240 319

Fonte: Bacen

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157

3.1.2 A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio flutuante

Após a adoção do regime de câmbio flutuante e do regime de metas de inflação –

em janeiro e junho de 1999 respectivamente -, o Bacen continuou atuante no mercado de

câmbio. Do ponto de vista da resposta aos condicionantes – tema da próxima subseção - o

retorno dos fluxos de capitais após a CFG (tsunami monetário) se mostrou um ponto de

inflexão para a política cambial, porém apenas num curto espaço de tempo. A continuidade

(ou continuísmo), portanto, moldou a relação entre intervenção e condicionantes no caso

brasileiro.

No período pré-crise (1999-2007), a política cambial do Bacen se concentrou na

busca pela estabilidade financeira, prevenções de crise e desordens no mercado e,

implicitamente, pelo controle inflacionário. Entre 1999 e 2002, a autoridade monetária atuou

esporadicamente no mercado à vista (sempre na ponta vendedora de dólar), e no mercado de

derivativos de câmbio, com o objetivo de prevenir crises de funding em moeda estrangeira e

evitar depreciações abruptas do real – danosas não apenas para a estabilidade financeira, mas

também para o controle inflacionário (Farhi, 2006).83

Neste período, o Bacen possuía um

reduzido raio de manobra na condução da política cambial. Essa restrição da autoridade

monetária na escolha dos instrumentos de intervenção decorria de três fatores, conforme

Prates (2015, p.84-85):

“(...) da impossibilidade do BCB intervir no mercado futuro de

câmbio devido à proibição imposta pelo FMI no âmbito do acordo de

1999; do reduzido volume de reservas internacionais que poderia ser

utilizado nas intervenções no mercado de câmbio à vista – inferior ao

total disponível no ativo do BCB devido aos limites impostos pelo

acordo do FMI, num primeiro momento sobre as intervenções e, a

partir de agosto, sobre as reservas líquidas ajustadas; e do volume já

muito elevado do estoque da dívida mobiliária interna indexada à taxa

de câmbio”

O ápice da atuação da autoridade monetária brasileira no mercado de câmbio

nesse período ocorreu em 2002, num cenário de elevada preferência pela liquidez da divisa e

83

No inicio da vigência do novo regime de câmbio, entre janeiro e abril de 1999, o Bacen utilizou uma

quantidade expressiva de dólares das reservas internacionais – mais de US$ 12 bilhões, cerca de 30% do total –

na tentativa frustrada de evitar a flutuação do real (por meio de posições em derivativos assumidas antes de

15/01/99) (Prates, 2015).

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158

de conjuntura política conturbada84

, que gerou um ataque especulativo contra a moeda

brasileira (Prates, 2015). Ademais, esse ataque especulativo teve uma dimensão mais ampla,

pois os agentes não se limitaram apenas à venda da moeda doméstica e dos ativos nela

denominados, começando também à manifestar uma preocupação crescente com a solvência

da dívida pública interna e externa. Diante desse cenário, o Bacen obteve autorização do FMI

para lançar swaps cambiais85

. Contrariamente ao observado no mercado internacional, onde o

swap cambial envolve troca de moedas no vencimento, esta operação envolve apenas troca

dos diferenciais em reais no Brasil, já que não é permitido entrega física em dólar no país.

Dessa forma, o Bacen assume uma posição ativa em taxa de juros (taxa DI) e passiva em

variação cambial.

Ao longo da fase de boom dos fluxos de capitais, entre 2003 e 2007, o Bacen

continuou respondendo aos mesmos condicionantes do período anterior por meio do objetivo

explícito de diminuição da vulnerabilidade externa e implícito de controle inflacionário. De

acordo com Prates (2015), a atuação da autoridade monetária pode ser dividida em dois

períodos: o primeiro, de janeiro de 2003 a novembro de 2004; e o segundo, de dezembro de

2004 a junho de 2007. No primeiro período, o Bacen quase não interveio no mercado de

câmbio à vista, já que a bonança nos fluxos de capitais permitiu a “correção” da depreciação

excessiva de 2002 e, consequentemente, a redução dos impactos da taxa de câmbio sobre a

inflação.86

Já o segundo período caracterizou-se pelo retorno do Bacen ao mercado de câmbio,

mas agora na ponta compradora (em dólar) dos seus dois segmentos, à vista e de derivativos.

No âmbito do mercado à vista, a partir de outubro de 2005, o Bacen manteve presença quase

constante, com o objetivo explícito de acumular reservas, porém sem impor piso nem

84

O “efeito Lula” – termo utilizado para expressar o temor dos investidores com uma eventual vitória do

presidente Lula e seu impacto sobre a política econômica – contribuiu para deterioração das expectativas dos

agentes residentes e não residentes (ver Toledo, 2002). 85

Vale ressaltar que o FMI permitiu o lançamento desse instrumento, com a condição que este estivesse

vinculado às Letras Financeiras do Tesouro (LFT), títulos públicos pré-fixados de curto prazo. Tal

condicionalidade acabou se revelando um erro e provocando reações em cadeia no mercado secundário. Os

agentes buscavam a proteção contra a variação cambial e não estavam interessados em manter títulos pré-fixados

em carteira, num contexto de instabilidade financeira. Dessa forma, as vendas de LFTs no mercado secundário

levaram a fortes quedas de seus preços e, portanto, uma elevação na taxa de juros, contaminando a estrutura de

preços dos títulos públicos. Tal fato levou o BCB, no final de maio de 2002, a antecipar a marcação a mercado

das carteiras das instituições financeiras e dos fundos mútuos, diante do risco de resgate em massa de

investidores institucionais e corporativos mais bem informados. Essa medida, por sua vez, provocou uma

desvalorização patrimonial abrupta dos fundos de DI e renda fixa, com uma volatilidade significativa nos

retornos diários e uma crise de confiança, que levou ao resgate de R$ 54,5 milhões nos três meses após a

mudança de regra. Grande parte desses repasses foram direcionados para a compra de dólar, intensificando a

desvalorização do real (Prates, 2015). 86

Esse período foi marcado também pelo dos títulos cambiais pelo Tesouro Nacional – tanto os emitidos no

mercado nacional quanto no mercado internacional -, que persistiu no período posterior. Ademais, o Tesouro

passou a intervir no mercado de câmbio à vista com o intuito de pré-financiar compromissos externos,

adquirindo US$ 7,3 bilhões em 2004, segundo estimativa (Prates, 2015).

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159

tendência à flutuação cambial. Nesse contexto, a forma de atuação do Bacen no mercado de

câmbio à vista caracterizava sua intenção de não influenciar o patamar da taxa de câmbio: a

autoridade atuava – de maneira previamente anunciada aos bancos intermediários – no

mercado interbancário de câmbio no final do dia, antes do fechamento, absorvendo as sobras

de dólares aos preços vigentes no momento, sem procurar influenciar as cotações (Prates,

2014, Gráfico 3.6).

No mercado de derivativos, a partir de fevereiro de 2005, o Bacen decidiu

oferecer os chamados swaps reversos, que equivalem à compra de dólar no futuro e à venda

de contratos de DI, ou seja, exatamente o reverso dos swaps ofertados nos momentos de

depreciação do real. Nesse novo instrumento o Bacen assumia posição ativa em variação

cambial (comprada em dólar futuro) e passiva em DI (vendida em juros futuros). O objetivo

da autoridade monetária era atenuar a pressão de queda do preço do dólar futuro e evitar a

distorção na curva de juros provocada pela concentração dos investidores estrangeiros na

ponta comprada dos contratos futuros de juros. No entanto, a intervenção via swaps reversos

apenas reduziu a velocidade de apreciação do real, que persistiu na medida em que as

expectativas de apreciação de real se perpetuavam (Prates, 2015).

Após a CFG, a ação do Bacen se assemelhou aos dos demais bancos centrais dos

países emergentes. Ou seja, diante da paralização do funding em moeda estrangeira, a

autoridade monetária brasileira proveu liquidez aos principais segmentos do mercado de

câmbio. No mercado à vista, o Bacen realizou vendas tradicionais de divisas e uma nova

modalidade de leilão de dólar com compromisso de recompra no último trimestre de 2008.No

mercado de derivativos de balcão, os leilões de swaps cambiais retornaram, na tentativa de

segurar a depreciação abrupta do real. No entanto, tais ações não foram capazes de conter a

depreciação do real de 27,25% entre 15 de setembro de 31 de dezembro de 2008 (a quinta

maior numa amostra de 30 moedas periféricas) (Prates, 2014; gráfico 3.6).

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160

Fonte: Bacen

O retorno dos fluxos de capitais aos países emergentes, que se iniciou a partir do

segundo trimestre de 2009, e a recuperação dos preços das commodities a partir de janeiro do

mesmo ano representaram um ponto de inflexão da política cambial sob o ponto de vista dos

condicionantes. Os efeitos do “tsunami monetário”, provocado pelo quantitative easing, sobre

a taxa de câmbio nominal – mesmo com a atuação do Bacen no mercado à vista por meio do

acúmulo de reservas – geraram preocupações da autoridade monetária em relação aos efeitos

desse boom sobre a estabilidade financeira e sobre a trajetória de apreciação do real87

. Em

resposta a esses temores, a autoridade monetária decidiu pelo uso progressivo de instrumentos

que alteraram diretamente à institucionalidade do mercado de câmbio.

Num primeiro momento, em outubro de 2009, o Bacen decidiu pela aplicação de

uma alíquota de 2% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre influxos de

portfólio (ações e renda fixa). Essa alíquota subiu progressivamente, atingindo 6% outubro de

2010. No entanto, nesse mesmo mês, o governo foi além do aumento do IOF sobre influxos

de portfólio e instituiu a primeira técnica de gestão de derivativos cambiais da história: a

elevação do IOF, de 0,38% para 6%, sobre as margens de garantia dos contratos futuros de

câmbio, bem como o fechamento de algumas brechas que se intensificaram após o aumento

do imposto, como o depósito de margem via de títulos ou de fiança bancária (Fritz & Prates,

2014).

87

Ver Valor Econômico (2011a e 2011b).

- 6 000

- 4 000

- 2 000

-

2 000

4 000

6 000

set/08 set/09 set/10 set/11 set/12 set/13 set/14 set/15 set/16 set/17

Gráfico 3.6: Intervenções no mercado à vista pós CFG (US$

milhões)

Pronto A termo Empréstimos Linha com recompra

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161

Entretanto, tais instrumentos não foram capazes de conter o movimento de

apreciação do real, já que o elevado diferencial de juros e a abundância de liquidez

internacional estimulavam os investidores residentes e não-residentes a encontrarem

alternativas para burlar as regulações. Por exemplo, após a aplicação do IOF sobre os

investimentos de portfólio, entre 2009 e 2010, a ampliação das posições vendidas no mercado

à vista se tornou o principal canal dos bancos para a realização de operações de carry trade e

arbitragem entre os mercados à vista e futuro (ver gráfico 3.3 da subseção anterior) (Prates,

2015; FMI 2012; Rossi, 2012).

Para evitar as arbitragens regulatórias descritas acima, o Bacen impôs, em janeiro

de 2011, um requerimento de reserva não remunerado (regulação financeira prudencial) de

60% das posições vendidas em câmbio assumidas pelos bancos (Quadro 3.1). No entanto, os

bancos e empresas residentes ainda conseguiram encontrar outras brechas e passaram a

financiar suas posições por meio de títulos e empréstimos estrangeiros de maior prazo,

inclusive empréstimos intercompanhias. Em resposta, o governo impôs, em março e abril de

2011, um IOF de 6% sobre esses empréstimos externos com prazo de até 1 ano e 2 anos

respectivamente. (ver tabela 3.5 no Anexo; Fritz & Prates, 2014).

Assim, as diversas técnicas de gestão dos fluxos de capitais e derivativos

cambiais88

contribuíram para reduzir o ritmo de queda da taxa de câmbio do real no primeiro

semestre de 2011, mas não foram suficientes para deter a trajetória de apreciação cambial

(Prates, 2015). Além dos movimentos de arbitragem regulatória, o aumento do diferencial de

juros (fomentando as expectativas de manutenção dessa trajetória) contribuiu para que o real

apreciasse 7,9% entre outubro de 2010 e julho de 2011 e que as reservas crescessem 25% no

período (ver gráfico 3.7; Fundap, 2014). Somente após julho de 2011, a trajetória de

apreciação cambial foi não somente interrompida, mas também revertida, com contribuição

fundamental de uma segunda técnica de gestão de derivativos cambiais: imposição de IOF de

1% sobre o valor nocional das operações que resultassem em aumento da exposição líquida

vendida de um agente (Fritz & Prates, 2014; Rossi, 2015)89

.

88

Nesta tese, “técnicas de gestão dos fluxos de capitais e derivativos cambiais” e “instrumentos de gestão dos

fluxos de capitais e regulação de derivativos de câmbio” serão utilizados como sinônimos. 89

De acordo com Rossi (2014), os impostos sobre os derivativos são transmitidos ao mercado offshore pela

própria dinâmica do mercado. Nesse mercado, os bancos assumem a ponta contrária da aposta realizada pelo

investidor. Para fazer hedge dessa operação, os bancos recorrem ao mercado onshore, impactando, portanto, as

posições em tal mercado. Assim, ao se deparar com um imposto para tal operação no onshore, é natural que o

banco repasse o custo para o seu cliente no mercado offshore, impactando-o.

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162

Fonte: Bacen

Vale ressaltar que, conjuntamente às medidas descritas acima, o Bacen utilizou

também dois instrumentos de intervenção tradicionais: a compra de divisas no mercado à vista

e a oferta de swaps reversos, a fim de contrair a liquidez no mercado futuro de dólar (Prates,

2014; gráfico 3.8). Além disso, os instrumentos de política cambial foram acompanhados pela

redução sistemática da taxa básica de juros a partir de julho de 2011, que atingiu o menor

patamar da série histórica preparada pela autoridade monetária, a fim de desestimular as

operações de carry trade.

6,00

7,00

8,00

9,00

10,00

11,00

12,00

13,00

14,00

15,00

Gráfico 3.7: Diferencial de juros (Over Selic - Libor) - %

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163

Fonte: Bacen

Dessa forma, a depreciação cambial iniciou-se em agosto de 2011, quando a taxa

de câmbio registrou R$ 1,59/US$, e chegou a R$ 1,88/US$ em dezembro. Porém, a

interrupção dessa trajetória de depreciação em janeiro e fevereiro de 2012 e a continuidade da

arbitragem regulatória90

fez o governo apertar novamente os controles de capitais por meio da

imposição do IOF de 6% para empréstimos em moeda estrangeiras com prazo mínimo de três

anos (Quadro 3.1). Após esses meses de exceção, a moeda brasileira voltou a se depreciar ao

longo de 2012, principalmente entre fevereiro e maio, quando a desvalorização cambial

atingiu 17,6% (Fritz & Prates, 2014; Gráfico 3.14).

A partir do segundo semestre de 2012, os mercados financeiros registraram um

aumento da aversão ao risco, em decorrência, principalmente, do agravamento da crise do

euro, das fragilidades na recuperação da economia dos EUA e da desaceleração maior que

prevista na China. Esse ambiente de volatilidade e incerteza se agravou em 2013,

especificamente após maio, quando o Fed anunciou, pela primeira vez, que pretendia iniciar a

normalização de sua política monetária (tapering), por meio da redução gradual das compras

de ativos - que até então eram de US$ 85 bilhões mensais. Tal cenário intensificou a

volatilidade nos fluxos de capitais, obrigando o Bacen a flexibilizar todos os instrumentos de

regulação, como a redução a zero da alíquota do IOF sobre o ingresso de capital estrangeiro

em aplicações de renda fixa e sobre a ampliação da posição líquida vendida no mercado de

90 De acordo com Fundap (2013, p. 9), a apreciação do real em janeiro e fevereiro de 2012 foi determinada, em

grande medida, pela injeção de 1 trilhão de euros pelo Banco Central Europeu a juros de 1% ao ano. Grande

parte dessa quantia foi direcionada para a compra de títulos e ações nos mercados emergentes, inclusive o Brasil.

-15.000

-10.000

-5.000

-

5.000

10.000

15.000

jan

/11

Feb

-20

11

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Ap

r-2

01

1

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11

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1

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11

no

v/1

1

De

c-2

01

1

jan

/12

Feb

-20

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/12

Ap

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01

2

May

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jun

/12

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12

Au

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2

Sep

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12

Oct

-20

12

no

v/1

2

De

c-2

01

2

jan

/13

Gráfico 3.8: Posição Comprada Líquida - swaps cambiais -

US$ milhões (valor nocional)

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164

derivativos cambiais em junho de 2013 e retirada da alíquota de 60% de depósito compulsório

sobre a posição vendida de câmbio das instituições financeiras em julho de 2013. (Bacen,

2013; Eichengreen & Gupta, 2014; Prates, 2014).

Este quadro adverso em relação ao ciclo de liquidez internacional levou o Bacen a

mudar a política cambial, retornando aos swaps cambiais tradicionais. Em outras palavras, os

impactos da hierarquia de moedas (via mudança de sinalização da política monetária norte-

americana) sobre a taxa de câmbio real/dólar provocou uma alteração dos objetivos e

instrumentos de política cambial. Essa mudança, por sua vez, respondeu não apenas ao

cenário de baixa do ciclo de liquidez global, mas também, implicitamente, aos possíveis

impactos da depreciação do real sobre a inflação e, consequentemente, sobre gestão da

política monetária (Farhi & Prates, 2015).

Assim, o Bacen reiniciou os leilões de swaps cambiais em junho de 2013, que

passaram a ser diários a partir de agosto do mesmo ano (por meio do comunicado nº 24.370

de 22 de agosto). O programa diário introduziu leilões de swaps todas as segundas, terças,

quarta e quintas-feiras, com oferta inicialmente de US$ 500 milhões por dia. Tais ofertas

diárias foram reduzidas a partir da renovação dos programas de swaps em 2014 e 2015 – para

US$ 200 milhões e US$ 100 milhões respectivamente. O estoque nocional desse instrumento

teve seu pico em 2015, quando atingiu US$ 114 bilhões (ver gráfico 3.9). Ademais, o Bacen

também retornou, também a partir de agosto de 2013, com leilões de venda de moeda com

compromisso de recompra às sextas-feiras, com oferta de US$ 1 bilhão por semana (Bacen,

2013, 2014 e 2015). Nesse período (entre agosto de 2013 e agosto de 2014), a taxa de câmbio

se manteve estável – numa faixa entre R$/US$ 2,00 e R$/US$ 2,50 –, se depreciando

fortemente em 2015, com a piora da oferta de liquidez internacional e do cenário político

(Bacen, 2015).

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165

Fonte: Bacen

O programa de swaps se encerrou em março de 2015, quando o Bacen anunciou

que não renovaria os estoques vincendos a partir de maio do mesmo ano (Bacen, 2015). O

desmonte do programa, no entanto, foi gradual, para não gerar impactos significativos e

abruptos nas posições dos agentes e, consequentemente, na liquidez do mercado futuro de

dólar (Gráfico 3.10).

Fonte: Bacen

1,50

2,00

2,50

3,00

3,50

4,00

4,50

Gráfico 3.9: Taxa de câmbio nominal US$/R$

-

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

Gráfico 3.10: Posição Vendida Líquida do Bacen - swaps cambiais

- US$ milhões (Valor nocional)

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166

Quadro 3.1: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes

Instrumentos Período Objetivo Macro Metas Condicionantes

relacionados

Respondem aos

condicionantes

domésticos?

Respondem aos

efeitos do

condicionante

estrutural?

Compra e Venda de

divisas no mercado à

vista

2003-2008 (Compra)

2009-2011 (Compra)

2008-2009 (Venda)

2013-2015 (Venda com

compromisso de

recompra)

Estabilidade

financeira;

Controle

Inflacionário

(implícito)

Acumulação de

reservas;

Conter volatilidade e

nível

Institucionalidade do

Mercado de câmbio

Gestão da Política

Monetária

Vulnerabilidade

Extena

Parcialmente Parcialmente

Instrumentos de gestão

dos fluxos de capitais e

regulação derivativos de

câmbio

Novembro 2009-

Abril/2012

Estabilidade

Financeira

Competitividade

Externa

Nível da taxa de

câmbio

Institucionalidade do

mercado de câmbio

Vulnerabilidade

externa

Estrutura de comércio

exterior

Sim Sim

Swaps cambiais

(tradicionais e reversos)

2005-2007

2011

2013-2015

Estabilidade

Financeira

Controle

Nível e volatilidade

da taxa de câmbio

Institucionalidade do

Mercado de câmbio

Parcialmente Parcialmente

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167

Fonte: Elaboração Própria

Inflacionário

(Implícito)

Gestão da Política

Monetária

Vulnerabilidade

Extena

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168

3.1.3 Resposta aos condicionantes e efetividade da política cambial

A política cambial brasileira transitou, em grande parte do período no qual vigora

o regime macroeconômico atual, entre dois condicionantes domésticos: vulnerabilidade

externa e gestão da política monetária. Ou seja, os objetivos macroeconômicos da política

cambial se concentraram na estabilidade financeira e prevenção de crises e desordens no

mercado e no controle inflacionário (de maneira implícita). Os instrumentos utilizados, no

entanto, nem sempre responderam a outro condicionante doméstico, a institucionalidade do

mercado de câmbio. Conforme analisado na subseção acima, o Bacen utilizou

sistematicamente (antes e após a crise) dois tipos de intervenção no mercado de câmbio: as

intervenções no mercado à vista – que inclui as operações definitivas, com compromisso de

recompra/revenda e empréstimos em moeda estrangeira – e as operações de swaps cambiais –

tradicionais e reversos.

Os swaps cambiais são coerentes com as características da abertura financeira e

do mercado de câmbio brasileiro. É um instrumento non-deliverable, assim como os demais

contratos do mercado de derivativos de câmbio, em consequência da restrição em relação aos

depósitos em moeda estrangeira no sistema monetário e financeiro brasileiro (Prates, 2015).

Ademais, ainda que sejam derivativos cambiais de balcão, os swaps (conforme definição

acima) impactam indiretamente o mercado futuro - espaço de formação da taxa de câmbio -

alterando as condições de arbitragem entre esse mercado e o mercado à vista via cupom

cambial (Rossi, 2014). Em outras palavras, tal instrumento atua de forma coerente em relação

às assimetrias regulatória e de liquidez, ou seja, busca impactar o segmento menos líquido (e

mais restrito) do mercado de câmbio por meio da atuação no segmento mais líquido.

No entanto, essa operação também responde negativamente a alguns

condicionantes. Em relação à própria institucionalidade do mercado de câmbio, os swaps

cambiais representam uma postura passiva por parte do Bacen em relação às posições dos

agentes, já que a autoridade monetária busca apenas contrabalançar indiretamente os

movimentos unidirecionais no mercado de dólar futuro, sem afetar as condições de hedge,

especulação e arbitragem (Prates, 2015; Rossi, 2015). Ou seja, os swaps cambiais não

rompem, apenas suavizam a transmissão dos efeitos da hierarquia de moedas para a taxa de

câmbio.

No caso das intervenções via swaps tradicionais, há também os impactos

negativos sobre a vulnerabilidade externa. Esse efeito foi mais latente no período pós CFG,

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169

entre 2013 e 2015, quando o crescente estoque de swaps cambais conviveu com um crescente

estoque de dívida externa de curto prazo contraída pelos bancos. Conforme ressaltado acima,

o nível relativamente elevado do cupom cambial (em relação ao custo de captação externo)

estimulou a contração de empréstimos de curto prazo pelos bancos para as operações de

arbitragem. Tais operações, por sua vez, foram importantes para compensar o saldo negativo

do movimento de câmbio contratado no período e, assim, evitar a intensificação da

depreciação do real (Rossi, 2015; Garcia, 2014; gráfico 3.11). No entanto, as bases para a

contenção da volatilidade e aumento da taxa de câmbio são frágeis e contraditórias, já que

pioram, ao mesmo tempo, o perfil do passivo externo, com a maior presença de empréstimos

de curto prazo. Vale ressaltar que a gestão da política monetária nesse arcabouço se vincula

ainda mais com a política cambial, já que a necessidade de manutenção do cupom cambial

elevado e das condições de carry trade podem pressionar a taxa básica de juros para cima.

Por fim, as intervenções via swaps foram efetivas na oferta de hedge aos

participantes do mercado de derivativos de câmbio, principalmente empresas não-financeiras

e bancos estrangeiros, e na estabilidade do nível da taxa de câmbio. No entanto, os efeitos

sobre a volatilidade entre 2013 e 2015 – período de vigência do programa de swaps cambiais -

não são conclusivos (Araujo, 2016; Janot & Macedo, 2016).

Fonte: Bacen

-6.000

-4.000

-2.000

0

2.000

4.000

6.000

8.000

10.000

abr/

09

set/

09

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10

jul/

10

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ago

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/13

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no

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3

abr/

14

set/

14

fev/

15

jul/

15

dez

/15

mai

/16

ou

t/1

6

mar

/17

ago

/17

Gráfico 3.11: Fluxo cambial e empréstimos de CP Bancos -

US$ milhões

Fluxo cambial Empréstimos CP Bancos

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170

Já as intervenções no mercado à vista não respondem diretamente à

institucionalidade do mercado de câmbio brasileiro. Conforme ressaltado nas subseções

anteriores, a irrigação ou contração do fluxo cambial por meio da compra ou venda de divisas

não guarda necessariamente relação com a taxa de câmbio, cuja formação está vinculada à

posição dos investidores nacionais e estrangeiros no mercado de dólar futuro e às

possibilidades de arbitragem entre os mercados à vista e futuro pelos bancos. Assim, fluxos

cambiais positivos – derivados, por exemplo, da venda de divisas no mercado à vista pelo

Bacen - podem conviver com depreciações do real, caso os bancos mantenham uma posição

comprada elevada, em razão, por exemplo, de uma queda no cupom cambial (Prates, 2014;

Rossi, 2015). Dessa forma, a institucionalidade do mercado de câmbio brasileiro limita o

impacto das intervenções no mercado à vista sobre a volatilidade e nível da taxa de câmbio.

Dado o escopo reduzido, tal instrumento se torna relevante apenas para a constituição de

reservas internacionais e melhora dos indicadores de liquidez externa, nos momentos de

euforia; ou para irrigação dos mercados à vista nos momentos de dificuldades de funding na

divisa-chave.

No entanto, a importância da acumulação de reservas para a redução da

vulnerabilidade externa deve ser ponderada. De fato, um volume significativo de reservas

internacionais contribui para a redução dos indicadores de liquidez e do risco-país. No

entanto, conforme visto nas subseções acima, paralelamente ao aumento das reservas

internacionais no Brasil, houve, especialmente após a CFG, uma elevação – num ritmo

superior à compra de divisas pelo Bacen – da dívida externa privada e da posição

comprada/vendida em dólar no mercado futuro, fomentada, dentre outros fatores, pela

institucionalidade do mercado de câmbio brasileiro, que não é alterada pela compra/venda de

divisas no mercado à vista. Neste contexto, independentemente do nível de reservas

internacionais, a expansão do lócus de formação da taxa de câmbio implica que os impactos

de um aumento da preferência pela liquidez da divisa-chave sobre a volatilidade e a trajetória

da taxa de câmbio são amplificados, exigindo maior frequência e volume de intervenção por

parte das autoridades monetárias.

No entanto, mesmo nos momentos de crise, o uso das reservas internacionais não

é recorrente. Nos dois principais períodos de reversão do ciclo de liquidez internacional

estudados, último trimestre de 2008 e primeiro trimestre de 2009 e entre 2013 e 2016,

somente o período de eclosão da CFG envolveu vendas definitivas de divisas no mercado à

vista (Gráfico 3.6, subseção 1.1.2). Após 2013, as vendas se concentraram na linha com

recompra, geralmente utilizada nos finais de ano. Essa assimetria no uso das reservas

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171

internacionais evidencia não somente o caráter de última instância desse instrumento no

Brasil – utilizado somente em momentos de crise de liquidez no mercado à vista -, mas

também o receio, por parte da autoridade monetária, dos impactos negativos decorrentes da

redução das reservas internacionais, como, por exemplo, a redução do rating soberano e a

piora dos indicadores de liquidez externa (Gráfico 3.12).

Fonte: Bacen

Portanto, as intervenções no mercado à vista ou via swaps cambiais são

insuficientes para aumentar a autonomia de política cambial, já que não respondem

completamente aos condicionantes domésticos – correspondentes aos objetivos e metas

traçados - e, portanto, não são capazes de conter totalmente os impactos do condicionante

estrutural sobre a taxa de câmbio – tanto no curto como no longo prazo.

A insuficiência desses instrumentos também foi percebida pelo Bacen e pela

equipe econômica após o retorno dos fluxos de capitais em 2009. A guerra cambial91

provocou a reação do Bacen (e da equipe econômica) via instrumentos de gestão dos fluxos

de capitais e regulação do mercado de derivativos de câmbio. Tais instrumentos responderam

ativamente à institucionalidade do mercado de câmbio e buscaram a diminuição das posições

vendidas em dólar futuro e das possibilidades de arbitragem por parte dos bancos. Conforme

analisado acima, a adoção de diversas medidas de regulação (mais de 13 contabilizadas, ver

91

Em uma entrevista ao jornal britânico Financial Times em 28 de setembro de 2010, Guido Mantega, então

Ministro da Fazenda do Brasil, declarou que o mundo vive atualmente sob uma “guerra das moedas” (“currency

war”) ou guerra cambial.

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

-4.000

-3.000

-2.000

-1.000

0

1.000

2.000

3.000

4.000

5.000

6.000

Gráfico 3.12: Interveções no mercado à vista (US$ milhões) e

depreciações abruptas (frequência - direita)

Acima de 2% Acima de 4% Acima de 6% A vista

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172

tabela 3.5 do Anexo) evidenciaram a dificuldade do Bacen em lidar com todas as

possibilidades de ganho a partir do investimento na moeda brasileira. Um dos exemplos de

arbitragem regulatória é o comportamento do spread entre a taxa de juros em dólar onshore

(cupom cambial) e o custo de captação offshore, medido pelo Foreign Rate Agreement (FRA)

do cupom cambial. Mesmo após o Bacen implementar o IOF sobre os investimentos em renda

fixa e o recolhimento compulsório sobre a posição em dólar dos bancos, entre outubro de

2010 e janeiro de 2011, o spread entre o cupom cambial e o custo de captação externa

aumentou, estimulando os bancos a buscarem inclusive empréstimos de médio e longo prazo

para as operações de arbitragem (Gráfico 3.15).

Consequentemente, tais instrumentos também responderam à vulnerabilidade

externa, diminuindo os empréstimos de curto prazo – concomitantemente à acumulação de

reservas internacionais – e, portanto, a sensibilidade da taxa de câmbio a choques externos

(gráfico 3.13 e 3.14). De acordo Chamon & Garcia (2016, p. 172), a dívida externa (fluxo) de

menor prazo diminuiu drasticamente conforme o IOF sobre empréstimos externos

incorporava maturidades maiores. As operações de carry trade (canônico e derivativos)

também foram desestimuladas tanto pelas medidas acima quanto pela mudança de outro

condicionante, a gestão da política monetária. A redução da taxa de juros básica a partir do

segundo semestre de 2011 – e a consequente diminuição dos diferenciais de juros –

contribuíram para a redução da vulnerabilidade externa pela ótica dos fluxos (Prates, 2014).

Fonte: Bacen

-4000

-2000

0

2000

4000

6000

8000

10000

Gráfico 3.13: Empréstimos externos (fluxo) de curto e longo prazo -

milhões US$

Curto Prazo Longo Prazo

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173

Assim, ao responder ativamente aos condicionantes domésticos, as autoridades

monetárias buscaram impactar as conexões entre, de um lado, a condução da política

monetária dos países emissores de divisas e as expectativas dos investidores globais e, de

outro lado, a taxa de câmbio. Havia neste caso, portanto, a busca por maior autonomia de

política cambial, especialmente em relação ao nível da taxa de câmbio, que pode ser

verificada de duas formas: nos discursos da equipe econômica da época, em defesa de um real

menos valorizado e, portanto, mais favorável ao comércio exterior e, em última instância, aos

interesses domésticos – especificamente da indústria brasileira (Valor, 2011a; 2011b); e no

caráter assimétrico das regulações sobre os fluxos e o mercado de derivativos, que focaram

apenas nos influxos de capitais e nas posições vendidas no mercado futuro de dólar. Dessa

forma, tais instrumentos possuíam um objetivo doméstico específico: reverter a trajetória de

apreciação do real. Neste contexto, a contenção da volatilidade cambial não era o foco de tais

regulações, já que essas não atuavam sobre as posições compradas em dólar no mercado

futuro e, portanto, não respondiam aos impactos de uma reversão do ciclo de liquidez

internacional sobre a taxa de câmbio. No entanto, tal fato não impediu que os instrumentos de

gestão dos fluxos de capitais e regulação do mercado de derivativos convivessem com baixos

níveis de volatilidade cambial (desvio padrão) – como de fato conviveram entre 2010 e julho

de 2011 (Gráfico 3.14).

Diversos trabalhos analisaram a efetividade dessas medidas sobre o nível da taxa

de câmbio, por meio de estatísticas descritivas ou modelos econométricos (Prates, 2014;

Chamon & Garcia, 2012 e 2016). Chamon & Garcia (2016) atestaram para a efetividade dos

instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação de derivativos, introduzidos entre

2009 e 2011 (tabela 3.2 no anexo), em alterar a trajetória da taxa de câmbio. Os autores

observam que as quatro últimas medidas, em especial o IOF sobre as posições vendidas no

mercado futuro de câmbio e sobre os empréstimos externos de maior prazo contraídos pelos

bancos, foram fundamentais para que o conjunto de instrumentos fosse estatisticamente

significante. Tal resultado evidencia que as nove primeiras medidas eram necessárias, porém

não suficientes para conter a arbitragem regulatória. De fato, a importância das últimas

medidas, em especial a taxação das posições vendidas no mercado de dólar futuro, pode ser

visualizada graficamente (3.16; Prates, 2014).

Em relação à volatilidade, no entanto, os impactos das regulações – estimados no

modelo GARCH (1,1) apresentado no apêndice - são positivos no curto prazo, ou seja, tal

intervenção gerou um aumento na volatilidade cambial entre outubro de 2009 e março de

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174

2012. Este resultado é compreensível quando se considera as tentativas de arbitragem

regulatória dos agentes, já que estas podem impactar as variações na taxa de câmbio. Um dos

aspectos positivos do modelo testado é a efetividade dos swaps e intervenções no mercado à

vista em conter a volatilidade, mostrando que o uso conjunto dos três instrumentos de política

cambial foi efetivo em conter o nível e volatilidade da taxa de câmbio no período supracitado.

Por fim, a assimetria de intervenção e o objetivo específico de reversão da

trajetória de apreciação do real conferiram um horizonte de curto prazo - e caráter conjuntural

- aos instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação de derivativos de câmbio.

Pode-se argumentar que a eliminação dos controles e regulações, à medida que a preferência

pela liquidez na divisa se eleva, é condizente com o objetivo doméstico do real depreciado - e,

portanto, mais competitivo. No entanto, nos termos desta tese, quando a política cambial não

responde mais aos condicionantes domésticos, a taxa de câmbio se torna novamente alheia

aos movimentos da divisa. Assim, o cenário do real depreciado, porém sem a política cambial

apropriada, está sujeito a reversões e variações abruptas.

Dessa forma, a simetria das regulações, bem como a constituição de um horizonte

de longo prazo – como o caso sul-coreano, analisado nas próximas páginas – é a forma mais

adequada para se alcançar maior autonomia da política cambial de maneira perene. Tal fato

não significa que as regulações não possam variar conforme a fase do ciclo de liquidez

internacional. Por exemplo, o déficit em transações correntes e a maior dependência brasileira

aos fluxos de portfólio obrigariam o IOF sobre investimento em renda fixa a ser mais sensível

aos movimentos da liquidez internacional. No entanto, tais medidas mais sensíveis aos ciclos

deveriam conviver com outras de caráter estrutural, como o IOF sobre posições vendidas e

compradas em dólar futuro.

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Fonte: Bacen

Fonte: Bacen

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Gráfico 3.14: Volatilidade (desv. padrão) e regulação

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Gráfico 3.15: FRA de cupom cambial e regulação (frequência -

direita)

IOF sobre

empréstimos

em moeda

estrangeira

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3.16: Taxa de câmbio (esquerda; US$/R$) e regulação

IOF renda

fixa

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sobre

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sobre pos.

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renda fixa

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externos

IOF sobre

empréstimos

externos

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177

3.2 México: a continuidade da política cambial

O peso mexicano é a moeda periférica mais negociada nos mercados de câmbio

offshore (ver tabela 2.1), sendo utilizada como proxy para operações de hedge, especulação e

arbitragem nos mercados emergentes. A liquidez e profundidade dos mercados de câmbio

offshore e, em menor medida, onshore, é fruto de um amplo processo de abertura financeira,

que tornou a economia mexicana e a taxa de câmbio peso/dólar, mais sensível a choques

externos. Essa sensibilidade se reduziu no período pré-crise, com a acumulação de reservas

internacionais, porém se agravou após a CFG, com a mudança na composição dos influxos de

capitais em favor dos fluxos de portfólio e o surgimento de outras dimensões da

vulnerabilidade externa. A mudança dos condicionantes domésticos, por sua vez, exigiu uma

resposta da política cambial.

3.2.1 A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e de

câmbio flutuante

A abertura financeira mexicana se iniciou a partir da segunda metade dos anos

1980, se estendendo até o início dos anos 1990 (entre 1987 e 1991), e foi marcada pelos

elevados investimentos de portfólio, especialmente em títulos públicos de curtíssimo prazo

indexados ao dólar (que culminaram na crise em 1994), e pela elevada presença de capital

estrangeiro no sistema bancário (especialmente após a crise de 1994). A adoção do regime de

câmbio flutuante após a crise mexicana, num ambiente de intensa liberalização financeira,

aprofundou a liquidez do mercado de câmbio peso/dólar (ver Freitas & Prates, 2000; Martínez

et. al., 2015).

Conforme ressaltado no segundo capítulo, o mercado de câmbio mexicano é

concentrado nos mercados à vista e de FX swaps tanto nas esferas onshore quanto offshore

(gráfico 2.2). Tanto o volume quanto as transmissões entre esses mercados são estimulados

por fatores institucionais, dentre eles, a reduzida restrição para a abertura de contas e

transações em moeda estrangeira por residentes e não-residentes92

, a ausência de contratos de

92

De acordo com FMI (2015, p. 2071-2072), “Commercial banks may hold foreign exchange demand deposits

payable in Mexico, provided the account holders are (1) individuals located in the 20-kilometer strip parallel to

the northern international boundary line of Mexico or in the states of Baja California or Baja California Sur; (2)

legal entities residing in Mexico; or (3) official representatives of foreign governments, international

organizations, and analogous institutions. Foreign employees of such offices, organizations, or acting as foreign correspondents must be accredited by Mexico through the appropriate authority. Commercial banks may hold

foreign exchange time deposits of firms established in Mexico and payable abroad.”

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178

câmbio nas operações de compra e venda de moeda estrangeira e a ausência de dealers nos

mercados à vista e interbancário. Tais características permitem o transito livre das instituições

financeiras, em especial bancos múltiplos e de desenvolvimento, nos diversos segmentos do

mercado de câmbio. (ver entrevista no apêndice C; FMI, 2015). Concomitantemente à

institucionalidade, a estrutura de comércio exterior mexicana (ver segundo capítulo, item 2.4)

- concentrada na exportação de manufaturados para os Estados Unidos - estimula ainda mais

as operações do par peso/dólar93

. A combinação desses diferentes condicionantes, por sua vez,

torna o peso uma das moedas periféricas de maior liquidez no mercado (offshore) de câmbio,

sendo utilizada, inclusive, como proxy nos mercados emergentes.

No entanto, as características dos condicionantes descritos acima impactam

negativamente outro condicionante considerado nesta tese: a vulnerabilidade externa. Sob o

ponto de vista dos fluxos, após a crise que atingiu o sistema financeiro mexicano em 1994, os

IDE’s assumiram o protagonismo na conta financeira em razão, principalmente, da entrada

das empresas americanas. Conforme Martínez et. al. (2015), entre 1999 e 2009, os

investimentos das empresas norte-americanas representaram 54% do IDE (líquido) total. A

integração comercial mexicana com o mercado norte-americano, por sua vez, tornou o país

latino-americano dependente das flutuações da economia dos Estados Unidos, e, portanto,

estruturalmente vulnerável a possíveis choques no país vizinho. A partir de 2009, os

investimentos em carteira assumiram o protagonismo dos influxos de capitais (gráfico 3.17),

principalmente no mercado de títulos de dívida pública (gráfico 3.18), que registrou grande

entrada de investidores não-residentes, principalmente entre 2009 e 2012.

93

Conforme o (então) presidente do BM, Agustín Carstens, "for at least two decades now we have had this

commitment to be a very open economy in Latin America – trade is a very important part of our activity and the

integration with the US makes it inevitable to have a well-designed and well-established FX market. We have a

very good settlement process, the peso is [traded] 24 hours a day (…) so we have pretty much ensured that

people who want to take or reduce peso positions can do it in a very agile way." (Euromoney, 2013)

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179

Fonte: BM

Fonte: BM

A participação dos investidores não residentes no mercado de títulos públicos

também pode ser analisada sob o ponto de vista dos estoques. De fato, após a crise de 1994,

houve aumento relativo do financiamento via emissão de dívida pública interna, e

consequente diminuição do estoque de dívida pública externa, e um alargamento dos

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Gráfico 3.17 - Balanço de Pagamentos (US$ milhões)

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Gráfico 3.18: Investimentos em carteira - US$ milhões

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privados no exterior

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180

vencimentos dos títulos públicos indexados ao peso (Borio et. al, 2005; quadro 2.2, segundo

capítulo). Os investidores estrangeiros, que haviam abandonado os mercados de títulos

públicos na segunda metade da década de 1990, retornaram principalmente a partir dos anos

2000 e após a CFG voltaram a dominar tais mercados, cujos títulos agora estão denominados

em moeda doméstica, minorando, portanto, os efeitos de choques externos. De acordo com o

gráfico 3.19, o mercado de Bonos (títulos de maior prazo de vencimento) é o principal destino

dos investidores não residentes, que quintuplicaram o volume investido em tais títulos entre

2009 e 2017. No entanto, esse cenário pode agravar a vulnerabilidade dos mercados

financeiros mexicanos a choques externos. Conforme o FMI (2017, p.12):

“The high foreign holdings of domestic assets expose Mexico to shifts

in global risk aversion. Moreover, Mexico’s FX and bond markets are

among the most liquid in the emerging market universe, which could

make it vulnerable to greater outflows during stress periods”

Ademais, como mencionado no capítulo anterior, o endividamento externo

privado das empresas não financeiras apresentou crescimento expressivo após a CFG (gráfico

3.20). No entanto, tais empréstimos se concentravam, principalmente, no longo prazo,

atenuando - assim como a entrada de investidores estrangeiros nos mercados de títulos,

descrita acima – possíveis pressões sobre a vulnerabilidade externa. Em relação à posição

internacional de investimento, cujos dados foram apresentados no segundo capítulo, o

aumento da acumulação das reservas internacionais atenuou o protagonismo do investimento

em carteira, exercido principalmente após 2009.

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Fonte: BM

Fonte: BM

No que tange à gestão da política monetária, Baharumshah et. al. (2017) e Chávez

(2017) concluem, mediante análise empírica, pela assimetria do repasse cambial no caso

mexicano – fato estruturalmente apontado para os países emergentes da amostra no segundo

capítulo. Conjuntamente a essas evidências, Rodríguez & Hernández (2011) apontam que as

intervenções do BM no mercado à vista são cruciais para o alcance da estabilidade de preços,

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Gráfico 3.19: Participação dos não-residentes no estoque de

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Gráfico 3.20: Endividamento Externo - empresas não-

financeiras (% Reservas)

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182

objetivo final da política monetária mexicana, sugerindo, portanto, a centralidade do controle

inflacionário como objetivo macroeconômico da política cambial.

Já esterilização das intervenções – outra “conexão” entre gestão da política

monetária e política cambial – é feita, desde 2010, principalmente por meio dos chamados

Depósitos de Regulação Monetária com Títulos Públicos Federais (DTPF)94

. Conforme Prates

& Blikstad (2017, p. 13), nessa operação “(..) o setor bancário substitui a posse de reservas

bancárias por títulos públicos federais que estavam em posse do Banxico; os depósitos, no

mesmo montante e prazo dos títulos, ficam bloqueados até o vencimento em nome do

Tesouro”. A grande vantagem desse instrumento é a não contabilização dos custos envolvidos

nas operações de DTPF na dívida pública bruta do governo federal, delimitando os custos das

políticas monetárias e fiscais e promovendo, assim, maior coordenação entre as três políticas

macroeconômicas. Ainda sim, o BM também manifestou, na condução da sua política

cambial, preocupação com o custo envolvido na acumulação de reservas – principalmente

entre 2003 e 2007, como será visto na próxima seção. A estimativa do custo de esterilização95

,

indicada no gráfico 3.21, acompanha a trajetória da taxa básica de juros e o programa de

leilões de vendas de dólares no período pré-crise (analisado nas próximas seções), que

objetivava, dentre outros fatores, reduzir o custo de esterilização.

94

O BM também absorve liquidez por meio de instrumentos convencionais de política monetária, utilizados em

outros países emergentes: depósitos compulsórios de bancos comerciais e de desenvolvimento; e vendas

definitivas de títulos emitidos pelo BM (Prates & Blikstad, 2017). 95

Seguindo Domanski et. al. (2016), a estimativa do custo de esterilização para México, Turquia e Coréia do Sul

se deu a partir do produto entre diferencial de juros e variação das reservas, excluindo a variação cambial. Para

efeitos de simplificação, considerou-se que as reservas eram compostas somente por ativos denominados em

dólar.

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183

Fonte: BM

3.2.2 A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio flutuante

Após as crises cambial e bancária de 1994-1995, houve duas mudanças

importantes em relação ao regime macroeconômico mexicano: a adoção do regime de câmbio

flutuante e a substituição da âncora cambial pela âncora monetária no controle da inflação96

(Prates & Blikstad, 2017). A partir de 1996, o BM passou a intervir frequentemente no

mercado de câmbio, principalmente por meio de leilões de venda de dólares no mercado à

vista e venda de opção de venda de dólares (dos agentes para o Banco Central). As

intervenções são, em sua maioria, ruled-based, ou seja, incluídas em programas pré-

anunciados (Rodríguez & Hernández, 2012, p. 19).

Entre 1996 e 2001, o BM concentrou suas operações no acúmulo de reservas

internacionais por meio das por meio da venda de opção de venda (put) de dólares dos

investidores, a fim de se recompor da fuga de capitais em 1994. Entre 2003 e 2008,

contrariamente à grande parte dos países emergentes, o BM promoveu uma diminuição do

ritmo de acumulação de reservas por meio de vendas anunciadas de dólares no mercado à

96

Entre 1995 e 2003, o BM adotou uma meta operacional quantitativa para a política monetária, baseada nos

saldos acumulados dos bancos em suas respectivas contas de reservas no banco central. O regime de metas de

inflação entrou em vigor oficialmente em 2001 e a instituição da taxa de juros de curto prazo como meta

operacional ocorreu apenas entre 2004 e 2005 (ver Carrasco & Ferreiro, 2013 e Prates & Blikstad, 2017).

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0

Ab

r-Ju

n 1

90

0

Gráfico 3.21: Custo de esterilização (% PIB - esquerda) e diferencial

de juros (% - direita)

Diferencial de juros Custo de esterilização

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184

vista – uma medida pró-cíclica. De acordo com BM (2003, p.1), “dado o nível que se

alcançou as reservas internacionais e seu ritmo de acumulação (...), é possível concluir que os

benefícios líquidos dos custos (de acumulação) mencionados seriam cada vez menos

significativos”. Assim, o BM se dispôs a vender trimestralmente 50% do total de ativos, em

dólares, acumulados no trimestre imediatamente anterior.

Tal programa se encerrou em agosto de 2008, porém o leilão de dólares logo foi

retomado em outubro de 2008, com a eclosão da CFG, de maneira discricionária e não

discricionária – por meio dos programas de leilões extraordinários e leilão de dólares com e

sem preço mínimo. Vale ressaltar que os leilões com preço mínimo, instrumento utilizado

após a CFG, foram desenhados para outorgar liquidez nos momentos de depreciação (diária)

do peso mexicano acima de 2%. Havia, portanto, um temor (não explicitado) das autoridades

monetárias mexicanas em relação às depreciações excessivas de sua moeda após a crise, fato

também identificado por outros estudos de caso – por exemplo (Chmelarova; Schnabl, 2006)

– e que pode ser caracterizado como “fear of depreciation”.

Entre abril de 2009 e novembro de 2011, período de boom nos fluxos de capitais,

o BM fez uso de outros instrumentos de política cambial, além dos leilões de dólares

mencionados acima, buscando estabilidade financeira. O primeiro refere-se a créditos em

dólar para as instituições financeiras, ancorados na linha de swaps estabelecida entre BM e

Fed, que se deu entre abril de 2009 e fevereiro de 2010. O segundo instrumento, utilizado

entre fevereiro de 2010 e novembro de 2011, foi a venda de opções de venda de dólares para

os agentes, com o intuito de acumular reservas internacionais (Quadro 3.2)

Após 2011, o Banco Central continuou atuando apenas por meio dos leilões (pré-

anunciados) de dólares, especialmente nos momentos de maior volatilidade da taxa de câmbio

em 2014 e 2015 (gráfico 3.20). Recentemente - a partir de fevereiro de 2017 - o BM passou a

adotar um novo instrumento de política cambial: leilões de NDFs – num montante máximo de

US$ 20 bilhões – liquidados em pesos mexicanos. A meta da autoridade monetária é oferecer

hedge para os participantes do mercado de câmbio sem afetar o volume de reservas

internacionais (BM, 2017). Tal mudança reforça a tendência, apontada por Domanski et. al.

(2016) e discutida no primeiro capítulo, de utilização de instrumentos liquidados em moedas

domésticas por bancos centrais de países emergentes após a CFG, fator positivo para a

autonomia da política cambial – sem considerar o impacto sobre os demais condicionantes

(Quadro 3.2).

Percebe-se, portanto, que as intervenções do BM no mercado de câmbio são

concentradas nas vendas de dólares nos mercados à vista, mesmo em momentos de bonança

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185

dos fluxos de capitais – diferentemente, portanto, de grande parte dos países emergentes, que

compraram divisas nesses períodos. Conforme apontado na subseção anterior, a acumulação

de reservas se deu diretamente por meio da PEMEX (Gráfico 3.22)97

e, portanto, fora do

mercado de câmbio. Assim, o preço do petróleo (e o quantum exportado) possui influência

significativa não só na estabilidade financeira, mas também na tendência de apreciação do

peso (Rodriguez & Hernandez, 2012).

Ademais, nos períodos de boom, 2003-2007 e 2009-2011, a venda de divisas

aprofundou essa tendência, sugerindo uma menor preocupação do BM com o nível da taxa de

câmbio nos momentos de apreciação. Contrariamente, nos períodos de reversão ou

instabilidade no ciclo de liquidez, o BM atuou não apenas com o intuito de prover liquidez da

divisa, mas também de limitar a depreciação do peso mexicano, revelando, portanto, uma

assimetria em relação à trajetória da taxa de câmbio. Essa assimetria se revelou também na

atuação do BM: as intervenções (líquidas) no mercado à vista no período de compra de

divisas (1996-2001) totalizaram US$ 10 bilhões, enquanto no período dominado pelas vendas

de divisas (2008-2017) as operações chegaram à US$ 55 bilhões aproximadamente.

Fonte: BM

97

De acordo com o comunicado de imprensa do dia 22/02/2010, “la fuente más importante de acumulación de

reservas proviene de las compras de dólares que el Banco de México hace directamente a Petróleos

Mexicanos…” (BM 2010).

-6.000

-5.000

-4.000

-3.000

-2.000

-1.000

0

1.000

2.000

3.000

4.000

jan

-02

set-

02

mai

-03

jan

-04

set-

04

mai

-05

jan

-06

set-

06

mai

-07

jan

-08

set-

08

mai

-09

jan

-10

set-

10

mai

-11

jan

-12

set-

12

mai

-13

jan

-14

set-

14

mai

-15

jan

-16

set-

16

mai

-17

Gráfico 3.22: Fluxo líquido reservas e PEMEX - US$ milhões

Fluxo líquido reservas internacionais Fluxo líquido PEMEX

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186

Fonte: BM

9,00

10,50

12,00

13,50

15,00

16,50

18,00

19,50

21,00

22,50

Gráfico 3.23: Taxa de câmbio nominal - peso/dólar

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187

Quadro 3.2: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes

Instrumentos Período Objetivo

Macro Metas

Condicionantes

relacionados

Respondem aos

condicionantes

domésticos?

Respondem aos efeitos

do condicionante

estrutural?

Venda de opções de

venda de dólares

1997-2001; Fev.

2010 – Nov.2011

Estabilidade

Financeira

Acumulação de

Reservas

Vulnerabilidade

Externa Parcialmente Parcialmente

Venda de dólares no

mercado à vista 2003-2008

Estabilidade

financeira

Controle

inflacionário

Redução do custo

de intervenção

Vulnerabilidade

externa

Gestão da política

monetária

Parcialmente Parcialmente

Venda de dólares no

mercado à vista Outubro 2008

Prevenção de

crises e desordens

no mercado

Resistir a

movimentos

abruptos do

patamar da taxa

de câmbio.

Vulnerabilidade

externa

Gestão da política

monetária

Parcialmente Parcialmente

Venda de dólares no

mercado à vista com e

sem preço mínimo

- Out/2008 – Abr/

2010;

- Mar-Set/2009;

- Abr/2009-

Fev/2010;

- Nov/2011-

Abr/2013;

- Mar-Nov/2015;

Estabilidade

Financeira

Reduzir

volatilidade

cambial

Influência sobre o

nível e trajetória

da taxa de câmbio

Vulnerabilidade

Externa

Gestão da Política

Monetária

Parcialmente Parcialmente

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188

-Dez/2014 –

fev/2016

Fonte: Elaboração Própria

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189

3.2.3 Resposta aos condicionantes e efetividade da política cambial

A abertura financeira e a integração comercial à economia norte-americana

moldaram a institucionalidade do mercado de câmbio mexicano, caracterizado pela elevada

liquidez nos segmentos à vista e de FX swaps (funding) onshore e offshore e pela assimetria

de liquidez em favor do mercado de câmbio offshore. Em outras palavras, o condicionante

institucional é parte fundamental do modelo de crescimento mexicano, ancorado na estrutura

de comércio com os Estados Unidos. Por esta razão, ao longo do período estudado, a

institucionalidade não foi alterada de maneira significativa pela política cambial,

independentemente dos objetivos macroeconômicos de cada intervenção. O presidente do

BM, Agustín Carstens, resume a relação entre a inserção comercial e financeira e o mercado

de câmbio:

“For at least two decades now we have had this commitment to be a

very open economy in Latin America – trade is a very important part

of our activity and the integration with the US makes it inevitable to

have a well-designed and well-established FX market. We have a very

good settlement process, the peso is [traded] 24 hours a day, it is

Euroclearable; so we have pretty much ensured that people who want

to take or reduce peso positions can do it in a very agile

way”(Euromoney, 2011)

A partir dessa constatação, pode-se inferir que, ao não interferir diretamente nas

condições pelas quais a moeda-chave (moeda no plano internacional) é transacionada pela

moeda periférica, a política cambial mexicana não questionou o espaço de política cambial

conferido pela posição de sua moeda no Sistema Monetária Internacional. Essa aceitação

decorre principalmente de fatores relacionados à economia política da política cambial, ou

seja, do referencial analítico e teórico dos policy makers em relação à regulação do mercado

de câmbio. Novamente para Carstens,

“oftentimes capital controls or macro-prudential policies can

themselves introduce distortions to the market and subtract from

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190

clarity and I think it has worked for us to have a stand-off approach”

(Euromoney, 2011)

Neste contexto, a política cambial praticamente não se alterou, entre o período

“pré-crise” e “pós-crise”, em relação aos condicionantes (ver tabela 3.2). Em linhas gerais, os

instrumentos de intervenção - concentrados nos leilões de venda de dólares no mercado à

vista – responderam de maneira incompleta aos efeitos das assimetrias monetária e financeira

sobre a volatilidade cambial. Isso ocorreu por meio da resposta à vulnerabilidade externa,

conferindo funding aos agentes participantes do mercado de câmbio e diminuindo os

indicadores de vulnerabilidade por meio da acumulação líquida de reservas, via PEMEX.

Implicitamente, conforme visto na seção acima, tais intervenções, ao atuarem de maneira pró-

cíclica (vendendo dólares nos momentos de boom) responderam também à gestão da política

monetária, auxiliando no controle inflacionário, porém afetando negativamente a

competitividade externa dos produtos exportados e ligados à cadeia de valor norte-americana.

Apenas no momento de eclosão da CFG, o BM recorreu a linhas de swap de moedas junto ao

Fed para conferir liquidez ao mercado interbancário de câmbio. Neste caso, o Banco Central

norte-americano atuou – não apenas junto ao BM, mas aos Bancos Centrais dos seus

principais parceiros comerciais como a Coreia do Sul, analisada abaixo – como “emprestador

de última instância”, garantindo a liquidez na moeda-chave do SMI.

Após o retorno dos fluxos de capitais no segundo trimestre de 2009, a

continuidade do modelo de intervenções pré-anunciadas, com o intuito de conter possíveis

pressões sobre a taxa de câmbio, ocorreu paralelamente a mudanças significativas da

vulnerabilidade externa mexicana, principalmente ao aumento da dívida externa privada e das

posições dos investidores não-residentes no mercado doméstico de títulos públicos. O

surgimento de novas dimensões da vulnerabilidade externa, no entanto, não foi visto pelos

policy makers como algo negativo ou que potencializasse os efeitos da hierarquia de moedas

sobre a volatilidade da taxa de câmbio. No caso do mercado de dívida pública, o salto da

participação dos investidores estrangeiros em relação aos domésticos foi visto, inclusive,

como uma sinalização positiva em relação ao condicionante estrutural:

“A novel feature of this episode of capital inflows to EMEs has been

the fact that a large portion of them have taken place as purchases of

government bonds denominated in the domestic currency by non-

resident investors. This is an important feature, since it eliminates the

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191

“Original Sin Syndrome” that haunted EMEs for several

decades.(Carstens, 2015, p.4)”

De fato, conforme analisado no capítulo anterior, a denominação dos títulos de

dívida em moeda doméstica pelos países emergentes transferiu o risco de variação cambial

para o investidor não-residente, minorando o problema do original sin. No entanto, a maior

participação estrangeira em relação aos investidores domésticos nesses mercados torna a

curva de juros e a taxa de câmbio do peso mais sensível à curva de juros e, consequentemente

à política monetária dos países emissores de divisas - em especial a normalização da política

monetária norte-americana (Akyuz, 2017; IMF, 2013; Jaramillo & Weber, 2013). Seguindo o

referencial keynesiano (Keynes, 1936, cap. 15), a demanda por divisa pelo motivo

especulação – isto é, relacionada à incerteza em relação à taxa de juros futura da divisa - se

torna mais instável, impactando a relação entre divisa e moeda periférica. Dessa forma, há

uma perda de autonomia de política monetária e cambial, “ since (...) bond prices and

exchange rates are now intrisically linked” (Akyüz, 2017, p. 147). O aprofundamento da

relação entre a hierarquia de moedas e o movimento das taxas de câmbio, gerado pela

mudança na vulnerabilidade externa no pós-crise, confere, portanto, novos dilemas para a

política cambial mexicana, que não foram incorporados (ou respondidos) pelo BM.

Assim, após a CFG, a resposta do BM ao aumento da volatilidade cambial –

medida tanto por meio do desvio padrão quanto via depreciações extremas, conforme sugere

Ramos (2016) – não foi direcionada aos canais de transmissão dos choques externos à taxa de

câmbio, em especial os mercados de títulos públicos, lócus de boa parte dos investimentos em

carteira pós CFG, e aos empréstimos em moeda estrangeira contraídos por não-residentes. A

atuação da autoridade monetária mexicana se concentrou apenas no monitoramento das

condições de funding do mercado interbancário de câmbio.

Dessa forma, a única mudança de fato da política cambial pós-crise foi o aumento

expressivo da venda de dólares nos leilões, principalmente nos dias de elevada depreciação do

peso, quando o BM vendia, de maneira discricionária, um volume superior ao programado no

leilão. No entanto, o fato mais relevante observado nos gráficos 3.24 e 3.25 é a ausência do

BM nos momentos de pico da volatilidade ou de extrema depreciação do peso (maior que 2%

e 4%). Este comportamento da autoridade monetária pode impactar negativamente a

efetividade desse tipo de intervenção (pré-anunciadas e com baixo grau de discricionariedade)

em conter a volatilidade da taxa de câmbio num período de instabilidade do ciclo de liquidez

internacional.

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192

Fonte: BM

Fonte: BM

A fim de verificar a efetividade dos leilões de venda de dólares em conter a

volatilidade no caso mexicano, estimou-se um modelo TARCH (Threshold Autoregressive

Conditional Heterocedasticity), que, em linhas gerais, é capaz de estimar o impacto das

intervenções sobre a média e a variância condicional dos retornos da taxa de câmbio

(Guimarães & Karacadag, 2004).

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

Milh

õe

s d

e U

S$

De

svio

pad

rão

Gráfico 3.24: Volatilidade (desv. pad) e leilões de venda (direita)

Volatilidade Vendas de dólares (com e sem preço mínimo)

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

500

0,0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1,0

Milh

õe

s d

e U

S$

Fre

qu

ên

cia

Gráfico 3.25:Leilões de venda (direita) e depreciações extremas

(esquerda)

Depr. > 2% Deprec.> 4% Leilões de venda (com ou sem preço mínimo)

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193

Diversos autores utilizaram modelos ARCH para analisar a relação entre

intervenções e retornos sobre o câmbio. Rodriguez & Hernandez (2011) estimam o impacto

das intervenções diárias acima de US$ 200 milhões sobre a trajetória do peso para o período

entre 1996 e 2010, e concluem que as vendas de dólares no mercado à vista provocaram uma

apreciação do peso mexicano de 0,5%. Já Guimarães & Karacadag (2004) e Domaç e

Mendoza (2004) concluem que as intervenções não são efetivas para controlar o tipo de

câmbio. O modelo utilizado neste caso se baseou na seguinte forma:

𝑟𝑒𝑡 = 𝐶 + 𝛽1𝐼 + 𝛽2𝐷𝐼𝐹 + 𝛽3𝑉𝐼𝑋 + 𝛽4𝑃𝐸𝑇 + 𝜀𝑡

𝜀𝑡~ 𝑁 (0, ℎ𝑡)

ℎ𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1𝜀𝑡−1 + 𝛾𝜀𝑡−1 + 𝛼2ℎ𝑡−1 + 𝛼3𝐷𝐼𝐹𝑡 + 𝛼4𝐼𝑡 + 𝛼5𝑃𝐸𝑇𝑡 + 𝛼6𝑉𝐼𝑋𝑡

Onde ret é o retorno sobre a taxa de câmbio (taxa oficial FIX, calculada no

mercado interbancário), I refere-se aos leilões de venda de dólares com e sem preço mínimo e

às vendas discricionárias, DIF é o diferencial entre a taxa básica de juros e o fed fund rate,

VIX (Volatility Index) é um índice mensurado pelo Chicago Board Options Exchange

(CBOE) e utilizado aqui como uma proxy da preferência pela liquidez da divisa; PET é o

preço do petróleo em dólares (tipo West Texas Intermediate), utilizado por Rodriguez e

Hernandez (2011) e que possui influência na taxa de câmbio, já que o BM compra os saldos

em dólares da PEMEX; e 𝜀𝑡é o termo de distúrbio.

A fim de verificar os impactos pré e pós-crise do instrumento de intervenção, esta

tese estimou a equação acima para dois períodos distintos: entre maio de 2003 e julho de

2008, período do programa de vendas de dólares no mercado à vista; entre agosto de 2008 e

fevereiro de 2016, que compreende vendas discricionárias e programas de vendas de

dólares98,99

. De maneira geral, vale ressaltar que nos dois modelos estimados, o componente

assimétrico da volatilidade condicional (𝛾) é estatisticamente significante, ou seja, a

volatilidade cambial se acentua em momentos de depreciação do peso mexicano. Tal relação é

evidenciada, por exemplo, na trajetória de depreciação do peso mexicano após 2015, já que

esta é acompanhada por uma elevação da volatilidade cambial (gráfico 3.25).

De acordo com a Tabela 3.2, entre maio 2003 e julho de 2008, as intervenções do

BM foram efetivas e impactaram negativamente a volatilidade da taxa de câmbio. Vale

98

As séries utilizadas nos modelos foram submetidas a testes de raiz unitária (Augmented Dickey Fuller), que

confirmaram suas respectivas estacionariedades. 99

Todos os modelos foram estimados por meio do software Eviews.

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194

ressaltar a relação negativa entre VIX e volatilidade da taxa de câmbio, contrariamente ao

esperado. Uma das possíveis explicações para esse comportamento é o baixíssimo nível do

VIX no período pré-crise; a variação de tal índice, portanto, pouco refletia o comportamento

dos fluxos de capitais e da taxa de câmbio.

Já entre agosto de 2008 e fevereiro de 2016 (Tabela 3.3) o coeficiente de

intervenção não é significativo, sugerindo que as vendas de dólares no mercado à vista não

foram efetivas no controle da volatilidade. Além do diferencial de juros, a única variável

significativa nesse período é o VIX, que possui a relação positiva esperada com o retorno

sobre a taxa de câmbio. O resultado indica, portanto, que, dado o diferencial de juros, o

movimento do peso em relação ao dólar é explicado fundamentalmente pelo ciclo de liquidez

internacional.

Tabela 3.2: Resultado Modelo GARCH (1,1) 2003-2008

Variável Coeficiente Prob.

C 2.10E-07 0.0020***

I -3.21E-09 0.0026***

DIF 6.22E-09 0.0981*

VIX -1.52E-08 0.0000***

PET 2.22E-09 0.0000***

𝜸 -0.026234 0.0039***

Fonte: Eviews

Nota: *** estatisticamente significante à 1%; ** estatisticamente significante à 5%;

*estatisticamente significante à 10%

Tabela 3.3: Resultado Modelo GARCH (1,1) 2008-2016

Variável Coeficiente Prob.

C 9.13E-07 0.0664*

I 9.42E-09 0.1684

DIF 8.64E-07 0.0011***

VIX 1.11E-07 0.0225**

PET -1.44E-08 0.1923

𝜸 -0.163731 0.0039***

Fonte: Eviews

Nota: *** estatisticamente significante à 1%; ** estatisticamente significante à 5%;

*estatisticamente significante à 10%

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195

3.3 Turquia: a simbiose da política monetária e cambial numa economia parcialmente

dolarizada

A lira turca é a segunda moeda mais negociada no mercado de câmbio onshore e

offshore. O caso turco é marcado, principalmente, pela dolarização de parte dos depósitos e

empréstimos domésticos, assim como o Peru, e, consequentemente, pela elevada

vulnerabilidade externa. A adoção do binômio câmbio flutuante-metas de inflação explicitou

tais problemas, principalmente após a CFG, aproximando ainda mais a gestão das políticas

monetária e cambial.

3.3.1. A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e de

câmbio flutuante

A Turquia migrou para o regime de câmbio flutuante em 2001 e adotou,

formalmente, o regime de metas de inflação em 2002100

. Ao longo dos anos 1990 e começo

dos anos 2000, o país conviveu com crises econômicas frequentes e inflação elevada (média

de 75% entre 1990 e 2000). Uma das causas dessa instabilidade é a abertura precoce e intensa

dos seus mercados financeiros a partir do final dos anos 1980 nos três níveis mencionados no

capítulo anterior. Dentre as medidas de liberalização, a principal delas foi a permissão para

abertura de contas em moeda estrangeira, em 1983, e a eliminação de barreiras sobre

transações em moeda estrangeira entre bancos (Yilmaz, 2006; Nettekoven, 2016).

A combinação de abertura financeira e crise monetária gerou um intenso processo

de dolarização na economia turca, comprometendo a soberania da lira101

e, portanto, a

autonomia de política monetária no espaço nacional. Esse processo chegou ao seu ápice em

2001, quando a relação entre depósitos em moeda estrangeira e oferta de liquidez M2 (meios

de pagamento ampliados) – indicador padrão de dolarização – se aproximou de 60% (Ylmaz,

2006). Após 2001, o boom dos fluxos de capitais pré-crise, sob o regime de câmbio flutuante

e metas de inflação, contribuiu para redução da inflação abaixo dos dois dígitos e diminuição

dos índices de dolarização (Caglayan & Talavera, 2016, gráfico 3.26). No entanto, a aparente

100

Em janeiro de 2006, o BRCT adotou explicitamente (de facto) o regime de metas de inflação, com bandas de

2% para baixo ou para cima da meta estipulada. Qualquer resultado acima dessa banda obriga o BRCT a se

justificar publicamente (Nettekoven, 2016). 101

Considera-se nesta tese a visão pós-keynesiana da soberania monetária proposta por Prates (2017) que possui

três pilares básicos: o Estado possui a soberania política para definir a moeda nacional enquanto unidade de

conta e meio de pagamento; a moeda pode ser criada endogenamente; e o banco central e o tesouro são

instituições diferentes, mas estreitamente vinculadas. De acordo com Dequech (2013), nesta escola de

pensamento, a moeda pode ser vista, conjuntamente, como criatura do Estado e como uma convenção.

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196

confiança na moeda doméstica se revelou mais uma consequência da diminuição da

preferência pela liquidez da divisa do que um movimento em direção à soberania monetária.

Conforme o gráfico 3.26, a participação dos depósitos denominados em moeda estrangeira na

oferta de liquidez M2 aumentou de maneira consistente após 2012 e atingiu níveis acima

daqueles registrados nos anos pré-crise. Os empréstimos em moeda estrangeira também

seguiram a mesma trajetória e alcançaram 30% dos empréstimos totais em 2016 (Caglayan &

Talavera, 2016)

Fonte: BRCT

A abertura financeira, portanto, moldou a institucionalidade do mercado de

câmbio no país. A concentração do volume transacionado no mercado de FX swaps sugere a

importância do funding em moeda estrangeira para o sistema bancário turco em suas

operações (gráfico 3.27). A necessidade de liquidez diária em moeda estrangeira levou o

Banco Central da República da Turquia (BRCT) a atuar no gerenciamento diário de liquidez,

tanto por meio do mercado de depósitos em moeda estrangeira, regulando empréstimos em

moeda estrangeira (a uma taxa de juros pré-definida) entre bancos, quanto por meio de

requerimento de reservas – remunerados em grande parte do período estudado - em moeda

estrangeira102

. Vale ressaltar a postura acomodatícia do BRCT em tais mercados, ou seja, tais

102

As alíquotas dos requerimentos de reservas em moeda estrangeira incidem sobre os depósitos bancários e

fundos de participação estrangeiros e outros passivos em moeda estrangeira. As alíquotas variam conforme a

maturidade de cada passivo. Para maiores detalhes ver:

24%

29%

34%

39%

44%

49%

Gráfico 3.26: Dolarização (Depósito em dólar/ M2 - %)

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197

ações não impelem a entrada ou saída de alguma modalidade de fluxo de capital ou sinalizam

alguma trajetória para taxa de câmbio. Ademais, no período pré-crise, o BRCT tentou

diminuir essa postura acomodatícia, tanto por meio da retirada do seu papel de intermediador

do mercado de depósito em moeda estrangeira, entre 2002 e 2008, quanto mediante a extinção

da remuneração dos depósitos compulsórios em moeda estrangeira (BRCT, 2008 e 2010).103

Fonte: BCRT

Dessa forma, a abertura financeira e institucionalidade do mercado de câmbio

fomentam a maior sensibilidade a choques externos (uma das maiores dentre os países da

amostra, conforme visto no segundo capítulo), tanto do ponto de vista dos fluxos de capitais

quanto dos estoques de passivo externo. Conforme o capítulo anterior, o país é importador

líquido de petróleo (principal produto de sua pauta de exportação) e outros insumos básicos e

concentra sua pauta de exportação em bens de consumo duráveis (principalmente para a

Alemanha), cuja produção está vinculada a cadeia de valor das empresas europeias. Tal

estrutura de comércio exterior gera déficits persistentes na balança comercial e em transações

http://www.tcmb.gov.tr/wps/wcm/connect/TCMB+EN/TCMB+EN/Main+Menu/MONETARY+POLICY/Reser

ve+Requirement+Ratios 103

O BRCT costuma atuar, desde 1988, como intermediário ou ativamente (por meio de transações) nos

mercados interbancários de câmbio e de depósitos em moeda estrangeira (uma espécie de mercado de reservas

bancárias em dólar). Após a adoção do regime de câmbio flutuante, a autoridade monetária se retirou

gradativamente, entre 2002 e 2008, desses mercados, porém logo retornou após a eclosão da CFG e o aumento

da instabilidade nos mercados interbancários.

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Gráfico 3.27: Volume de transações mercado de câmbio

Forward à vista swaps

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198

correntes, que variam, principalmente, conforme o preço das commodities (ver gráfico 3.28;

Kayalar et. al. 2016).

Fonte: BCRT

A conta financeira, por sua vez, é dominada, desde 2009, por fluxos de portfólio,

especialmente títulos de renda fixa e outros investimentos, em detrimento dos fluxos de IDE

(gráfico 3.29). Tais fluxos de portfólio tiveram um comportamento volátil ao longo do

período, especialmente após a CFG, comprometendo, em alguns momentos, o financiamento

da conta corrente deficitária. Os títulos de renda fixa são emitidos no mercado local, em

grande parte pelo governo turco e por bancos, que concentram suas emissões no curto prazo

(gráfico 3.29).

Em relação aos estoques, houve melhora nos indicadores de solvência e liquidez

no período pré-crise (2003-2007) e no período de boom pós-crise (2009-2011) – ver tabela 2.1

no segundo capítulo – graças ao aumento expressivo do volume de reservas e das exportações.

No entanto, após 2011, há uma piora desses indicadores – principalmente os indicadores de

liquidez - e deterioração da posição internacional de investimento, em razão, principalmente,

da escalada do passivo externo bruto - em especial títulos de dívida pública e privada e

empréstimos externos contraídos pelos bancos - e redução do nível de reservas internacionais

(Tabela 2.2). A dívida externa, em especial, aumentou tanto nos setores privados

(especialmente no curto prazo, chegando a quase 100% do volume de reservas em 2014)

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Gráfico 3.28: Balança Comercial (em US$ milhões) e Preços das commodities (direita - 2005=100)

Exportação Importação Global Price Index Commodities

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199

quanto nos segmentos do setor público – embora o montante esteja concentrado no longo

prazo (Gráfico 3.30).

Portanto, a magnitude do déficit em transações correntes – que reforça a

dependência dos fluxos financeiros de curto prazo – combinada com a magnitude e

composição dos estoques em moeda estrangeira tornam a economia turca suscetível a uma

crise de liquidez, já que, num cenário de reversão (ou parada súbita) dos fluxos de capitais, o

volume de reservas não é capaz de cobrir o déficit no balanço de pagamentos e cumprir os

compromissos de curto prazo.

As outras dimensões da vulnerabilidade externa também evidenciam a exposição

da taxa de câmbio aos choques provindos dos países emissores de divisa. Conforme a tabela

2.3 e Akyuz (2017), a participação de não-residentes nos mercados de títulos públicos em

relação aos investidores residentes é elevada (42,7% contra 48% de bancos domésticos) , em

comparação com os outros países da amostra estudados.

Fonte: BCRT

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Gráfico 3.29: Conta corrente e financeira (US$ milhões)

IDE Portfólio Renda fixa Transações correntes (lado direito)

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200

Fonte: BCRT

Fonte: BCRT

A gestão da política monetária, por sua vez, é coerente com a posição vulnerável

da economia turca aos impactos das assimetrias monetária e financeira e da institucionalidade

dos mercados de câmbio e financeiro, na qual os agentes detêm posições em moeda doméstica

e estrangeira. Sob a égide do regime de metas de inflação – e o compromisso, por lei, com a

estabilidade de preços -, o repasse cambial assimétrico elevado, em relação aos países da

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Gráfico 3.30: Dívida externa privada e pública em relação às reservas

internacionais - Curto e Longo Prazo

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Gráfico 3.31: Passivo Externo Bruto (US$ milhões)

IDE Portfólio Outros Investimentos

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201

amostra discutidos no segundo capítulo, e a dependência de fluxos de portfólio ou

empréstimos em moeda estrangeira contribuem para um patamar elevado das taxas de juros e

para o foco no controle inflacionário como objetivo de política cambial (Yilmaz, 2017;

gráfico 3.32; ver Nettekoven, 2016).

O BRCT adota o corredor da taxa de juros para o controle de liquidez, que

estabelece um teto, ou uma taxa de empréstimo de reservas (lending rate) e um piso, ou uma

taxa de depósito (ou borrowing rate), para a taxa de juros de curto prazo. Convencionalmente,

o BRCT mantém uma faixa (ou corredor) estreita e simétrica entre essas taxas, a fim de

assegurar, no mercado monetário, uma taxa de juros próxima à taxa de juros básica. Entre

2001 e 2010, o BRCT manteve o corredor simétrico e adotou a taxa de juros de depósito

(borrowing rate) como meta operacional da política monetária, já que após a crise de 2001,

grande parte do sistema bancário era superavitário em reservas, tornando a taxa de

empréstimo (lending rate) inefetiva (Yilmaz, 2017).

No entanto, a autoridade monetária pode utilizar esse corredor de forma

assimétrica, como instrumento de gestão dos fluxos dos capitais. Nesse sentido, o Banco

Central diminuiria a taxa de depósito relativamente ao teto da taxa de juros, nos momentos de

alta no ciclo de liquidez internacional, e induziria uma diminuição do yield de curto prazo,

tornando as operações de carry trade menos atraentes e desestimulando a entrada abundante

de capitais de curto prazo. Da mesma forma, o Banco Central pode aumentar o teto da taxa de

juros relativamente ao seu piso e tornar o empréstimo de reservas para os bancos mais caro,

impactando as operações de crédito do setor bancário (Aysan et. al., 2014; Yilmaz, 2017).

O BCRT fez uso desse instrumento a partir de 2010, durante o período de boom,

diminuindo as taxas de depósito (borrowing rate), a fim de conter o boom dos influxos de

capitais de curto prazo (gráfico). Com o agravamento da crise da zona do euro a partir do final

de 2011, o BCRT voltou a aumentar a taxa de depósito, a fim de impedir a reversão nos

fluxos de capitais (Aysan et. al., 2014).

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202

Fonte: BCRT

3.3.2 A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio flutuante

Após a adoção do regime de câmbio flutuante em 2001, o BRCT buscou se retirar

gradativamente do mercado de câmbio e de depósitos em moeda estrangeira e estimular as

operações em moeda estrangeira entre os agentes privados participantes desse mercado. No

entanto, a saída do BCRT do mercado de câmbio afetou profundamente a liquidez e os

instrumentos de hedge desse mercado, motivando diversas intervenções do próprio BCRT no

mercado à vista em 2001, por meio de leilões de venda de dólares, pré-anunciados ou

discricionários, logo após a mudança do regime de câmbio (Gráfico 3.33).

O boom dos fluxos de capitais a partir de 2003 não apenas conferiu maior liquidez

a esses mercados, mas também permitiu ao BCRT a acumulação de reservas internacionais,

por meio da compra de divisas no mercado à vista, via leilões pré-anunciados e operações

discricionárias – especialmente em 2007 - com mínimo efeito sobre o nível da taxa de câmbio

(gráfico 3.29). A única exceção nesse período é a atuação da autoridade monetária em meados

de 2006, a fim de evitar depreciações abruptas da lira.

Após a eclosão da CFG, o BCRT atuou pontualmente na venda de divisas nos

mercados à vista, nos mesmos padrões elencados acima, principalmente nos períodos de

maior incerteza em relação ao comportamento das divisas, ou seja, no último trimestre de

2008 e primeiro trimestre de 2009 (gráfico 3.34). Além da tradicional intervenção no mercado

à vista, a escassez de liquidez nos mercados de câmbio e de depósito em moeda estrangeira

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Gráfico 3.32: Corredor da taxa de juros

Piso (Borrowing rate) Teto (lending rate)

maior risco para o investimento em moeda estrangeira

Maior risco para

o financiamento

em lira

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203

levou o BCRT a retomar, em outubro de 2008, seu papel – suspenso desde 2002, após a

adoção do regime de câmbio flutuante - de intermediação no mercado de depósito em moeda

estrangeira, onde os bancos compensam suas posições descobertas por meio de empréstimo

em moeda estrangeira junto a outros bancos ou ao Banco Central104,105

.

O retorno dos fluxos de capitais para os países emergentes a partir do segundo

trimestre de 2009 impactou profundamente a oferta de liquidez em moeda estrangeira e o

nível da taxa de câmbio lira/dólar (rápida e intensa apreciação), levando o BCRT a retomar,

de maneira mais intensa, entre 2009 e 2011, a acumulação de reservas internacionais106

.

Fonte: BRCT

104

Conforme BRCT (2008, p. 3) “The main objective of resuming the operations of this market is to prevent the

decline in the flow of foreign exchange liquidity in Interbank Foreign Exchange Market due to the current

uncertainty in the global money markets. Therefore, Foreign Exchange Deposit Market will operate until the

global uncertainties and their implications on our markets fade out and it is intended to function as a “market of

last resort””. 105

Onder & Villamizar-Villegas (2015), por exemplo, apontam, por meio de uma função de reação, que, no caso

turco, os desvios da inflação em relação à meta são significativos no caso das intervenções discricionárias,

sugerindo, portanto, que a atuação do BRCT para conter depreciações abruptas da lira visa também conter o

efeito assimétrico do repasse cambial sobre os preços. 106

A partir de 2010, o BCRT alterou as regras dos leilões de compra de dólar, acelerando a acumulação de

reservas internacionais (BCRT, 2010).

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Gráfico 3.33: Intervenções mercado à vista (direita US$

milhões) e depreciações abruptas

Deprec. > 2% Deprec.>4% Venda

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204

Fonte: BRCT

No entanto, os possíveis efeitos perversos desse tsunami monetário provocaram

reações – não apenas do BCRT, mas também de outros Bancos Centrais de países emergentes

– para além dos instrumentos clássicos de política cambial (mencionados no primeiro

capítulo). Nesse contexto, o BCRT adotou, no final de 2011, um instrumento de regulação

macroprudencial inovador: o Reserve Option Mechanism (ROM). Conforme Degerli &

Fendoglu (2013), esse instrumento permite que os bancos possam depositar voluntariamente

uma parcela de suas reservas (ou encaixes) em dólar americano. O banco central determina

um limite das reservas bancárias que podem ser denominadas em dólar ou em outra moeda

estrangeira. De acordo com cada limite estipulado pela autoridade monetária, há um

coeficiente de conversão das reservas em lira ou em dólar, denominado Reserve Option

Coeficient (ROC). Por exemplo, conforme a tabela 3.3, se um determinado banco é obrigado a

depositar 100 liras em reservas no BRCT e decide que 30%, ou 30 liras, dessas reservas

(primeira faixa do ROM) serão depositadas em dólar, o total depositado em moeda estrangeira

será equivalente, portanto, à 30 x 1 (ROC) = 30 liras, conforme à taxa de câmbio no período.

Porém, se o banco decide depositar 35% de suas reservas (100 liras) em dólar, o total

depositado deverá ser equivalente a 35 x 1,4 = 49 liras.

Dessa forma, quanto maior o ROC maior o custo de oportunidade em migrar da

lira para o dólar na composição das reservas. Os bancos podem escolher a composição de suas

reservas – e consequentemente o ROC - de acordo com os custos de funding em cada moeda

(tabela 3.4). Assim, se, por exemplo, a taxa de juros do dólar é igual a 3% e a taxa de juros da

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Gráfico 3.34: Compra de divisas no mercado à vista (direita - US$

milhões) e volatilidade (desvio padrão)

Compra Volatilidade

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205

lira é 6% (embutidos nesta taxa a expectativa de depreciação da lira e o prêmio pela iliquidez

da lira no plano internacional), o banco depositará, no máximo, um percentual de reservas em

dólar equivalente a um ROC igual a 2. Ou seja, acima desse coeficiente, o banco será

indiferente entre depositar suas reservas em dólares ou em lira e, assim, o ROM perderá

eficácia (ver Alper at. al., 2013). No entanto, a identificação desse “teto” para o ROC é

complexa devido à incerteza em relação ao comportamento da taxa de câmbio lira/dólar no

futuro. A função do BRCT, portanto, é calibrar as faixas do ROM, e o ROC correspondente a

cada uma, de modo a responder à “demanda” por depósitos de reservas em moeda estrangeira

e evitar variações bruscas no uso dessa opção pelo sistema bancário.

Tabela 3.4: ROC por faixa de ROM

FX Facility Ratios (%) Reserve Option Coeficient

0-30 1.0

30-35 1.4

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40-45 2.1

45-50 2.5

50-55 2.9

55-56 3.7

56-57 3.9

57-58 4.1

58-59 4.3

59-60 4.5 Fonte: BRCT

Nas fases de alta do ciclo de liquidez internacional e/ou nos momentos de maior

diferencial de juros, o funding em dólar é mais barato que o funding em lira turca,

impulsionando a parcela em dólar das reservas bancárias. Essa decisão, por sua vez, freia a

pressão pela apreciação da moeda turca. Na fase de baixa, o movimento é contrário: a

composição das reservas bancárias se concentra na moeda local, reduzindo também pressões

pela depreciação da lira. Percebe-se, portanto, que o ROM atua como estabilizador

automático, com o objetivo de conter a volatilidade da taxa de câmbio e os efeitos do ciclo de

fluxos de capitais sobre a vulnerabilidade externa do país. Conforme as análises empíricas de

Odunco et. al. (2013) e Degerli & Fendoglu (2013) 107

, esse mecanismo cumpre seu objetivo

107

Ambos os autores consideram a data de inicio de suas análises outubro de 2010, após a remoção da

remuneração dos requerimentos de reservas em moeda estrangeira. De acordo com Degerli & Fendoglu (2013, p.

10), a ausência de remuneração das reservas (compulsórias) é considerado um pré-requisito para a utilização dos

requerimentos de reservas como um instrumento de política cambial.

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206

acima, reduzindo a volatilidade cambial e as expectativas dos agentes em relação ao

movimento da taxa de câmbio108

.

Ademais, o uso do ROM pelo sistema bancário é complementar à adoção do

corredor assimétrico da taxa de juros, abordado na seção acima, na tentativa de conter os

impactos dos fluxos de capitais de curto prazo sobre a taxa de câmbio. Por exemplo, na fase

de euforia do ciclo de liquidez, a escolha das maiores faixas do ROM provoca um aumento da

liquidez em lira que, se não esterilizado, pode reduzir as taxas de juros do mercado monetário

e, assim, desestimular novas entradas de fluxos de curto prazo (Alper et. al., 2013).

De acordo com o gráfico 3.36, os limites e o uso efetivo do ROM aumentaram

de forma acelerada até 2012, se estabilizando com a intensificação da crise do euro em 2012 e

o anúncio do tapering em 2013. Entre 2014 e 2016, a maior dificuldade de funding em dólar –

evidenciada, inclusive, pela depreciação da lira – diminui o uso efetivo dessa opção e levou os

bancos a gastarem grande parte de suas reservas em moeda estrangeira. Nesse período, a

utilização do ROM como estabilizador automático não foi suficiente para compensar as

pressões sobre a volatilidade e depreciação da lira, levando o BRCT a vender um volume

expressivo de divisas nos mercados à vista e diminuir as taxas de juros das linhas de liquidez

em moeda estrangeira nos mercados de depósito109

(Gráfico 3.34 e 3.32).

Fonte: BRCT

108

Degerli & Fendoglu (2013) estimam o impacto do ROM sobre as expectativas em relação à volatilidade

cambial e a movimentos abruptos da taxa de câmbio. Os autores utilizam como proxy das expectativas as opções

de compra e venda de dólar. 109

A autoridade monetária também promoveu um aumento dos limites de transação em moeda estrangeira nos

mercados de depósito (ver BRCT, 2015).

0

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

16/09/2011 16/09/2012 16/09/2013 16/09/2014 16/09/2015 16/09/2016 16/09/2017

Gráfico 3.35: ROM - Volume de reservas em dólar e ouro

(US$ milhões)

Moeda estrangeira Ouro

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207

Fonte:BRCT

0

10

20

30

40

50

60

70

Em %

Gráfico 3.36: Limites do ROM e uso efetivo (% em relação ao

total de reservas)

Limites do ROM Uso efetivo

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208

Quadro 3.3: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes

Instrumentos Período Objetivo Macro Metas Condicionantes

relacionados

Respondem aos

condicionantes

domésticos?

Respondem aos

efeitos do

condicionante

estrutural?

Compra e Venda de

divisas no mercado à

vista

2002-2008 (Compra)

2009-2011 (Compra)

2006 (Venda)

2009 (Venda)

2011-2015 (Venda)

Estabilidade

financeira;

Controle

Inflacionário

(implícito)

Acumulação de

reservas;

Conter volatilidade e

nível

Institucionalidade do

Mercado de câmbio

Gestão da Política

Monetária

Vulnerabilidade

Extena

Parcialmente Parcialmente

Reserve Option

Mechanism (ROM) –

Regulação

macroprudencial

Novembro 2011 -

Estabilidade

Financeira

Controle

Inflacionário

Conter volatilidade

cambial

Institucionalidade do

Mercado de câmbio

Gestão da Política

Monetária

Vulnerabilidade

Extena

Parcialmente Parcialmente

Fonte: Elaboração própria

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209

3.3.3 A resposta aos condicionantes e a efetividade da política cambial

De maneira geral, a maior presença do BRCT na concessão de funding em moeda

estrangeira responde às características dos condicionantes domésticos e estruturais, que

conferem maior centralidade à política cambial. A ampla abertura financeira, combinada com

a desvalorização da lira turca em relação ao dólar, promoveu elevada dolarização (e

“eurorização”) dos balanços dos agentes e tornou a economia turca estruturalmente vulnerável

aos movimentos da política monetária dos países emissores de divisas. Nesse cenário, o SMI

hierarquizado provocou uma perda de autonomia de política monetária ainda maior,

comprometendo a relação entre instrumentos (de política monetária), canais de transmissão e

objetivos finais.

Dessa forma, a concessão de funding em moeda estrangeira representa não apenas

um instrumento de política cambial, mas também de política monetária, já que, por meio dos

canais de transmissão convencionais desta última (canal dos ativos, canal do crédito, canal da

taxa de câmbio), esse instrumento busca conter os efeitos deletérios da instabilidade dos

fluxos de capitais e dos movimentos da taxa de câmbio sobre a economia real e a inflação.

Portanto, num ambiente de incerteza em relação à soberania monetária, as gestões da política

monetária e cambial se confundem no caso turco (e nas demais economias parcialmente

dolarizadas), já que compartilham de objetivos, instrumentos e canais de transmissão

similares.

Num primeiro momento - o período de boom pré-crise - a forte apreciação da lira

– que chegou próxima a paridade com o dólar - e o boom dos fluxos de capitais contribuíram

para a redução do nível de preços (abaixo da meta de inflação até 2005) e crescimento

econômico. O fortalecimento da lira, por sua vez, permitiu a redução e estabilização do nível

de dolarização e do ritmo de endividamento em moeda estrangeira. O bom desempenho dos

condicionantes domésticos – dada a institucionalidade do mercado de câmbio e a menor

preferência pela liquidez da divisa-chave - promoveu um distanciamento do BRCT no

gerenciamento da liquidez em moeda estrangeira no mercado de depósitos em moeda

estrangeira (BRCT, 2002 e 2008). Na perspectiva teórica aqui adotada, a estabilização da

relação lira/divisa e o aumento da liquidez do mercado de câmbio – a liquidez de mercado nos

termos de De Conti (2011) – não promoveu entre os bancos um funding, em divisas, de médio

e longo prazo capaz de substituir as intervenções do BRCT destinadas a conter possíveis

crises de liquidez e impactos sobre a volatilidade cambial. Assim, após a CFG, a rápida ação

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210

do BRCT nos mercados à vista e de depósito, derivada da maior preferência pela liquidez da

divisa-chave, evidenciou a autonomia reduzida de política cambial, sujeita a paradas súbitas e

instabilidade nos fluxos de capitais, independentemente do maior volume de reservas

internacionais (e, portanto, da maior capacidade de intervenção).

O uso de instrumentos de política monetária não-convencionais após o retorno dos

fluxos de capitais no segundo trimestre de 2009 – principalmente o ROM e o corredor

assimétrico da taxa de juros – revelou uma postura mais ativa (ante uma postura até então

acomodatícia) do BRCT em relação aos efeitos da fase de alta do ciclo de liquidez

internacional sobre a taxa de câmbio e o crédito em moeda estrangeira e lira turca. Conforme

Nettekoven (2016, p. 159),

“(…) the Turkish central bank has realized that a simple inflation

targeting strategy is not functional for a peripheral economy like

Turkey, which has large foreign currency indebtedness and is subject

to the destructive effects of the unanchored cross-border capital

flows”.

Tais medidas responderam ao condicionante estrutural por meio da “obstrução” de

um dos principais canais de ligação entre a hierarquia de moedas e o movimento da taxa de

câmbio: a expansão do carry trade no momento de euforia e de search for yield; e o contágio

do funding de curto prazo dos bancos, por meio de empréstimos de curto prazo em moeda

estrangeira, para a taxa de câmbio.

De fato, diversos autores – Asyan (2014), Degerli & Fendoglu (2013), Alper et.

al. (2013) – analisaram empiricamente a efetividade do uso do ROM para conter a

volatilidade da taxa de câmbio lira/dólar. Degerli & Fendoglu (2013) consideram o ROM uma

variável binária (onde 1 representa a data de início da adoção desse instrumento) e analisam o

impacto desse instrumento sobre a expectativa da taxa de câmbio em relação à expectativa das

demais moedas periféricas. De acordo com os autores, o ROM foi efetivo, entre 2011 e 2012,

na redução da volatilidade das expectativas da taxa de câmbio lira/dólar em relação às moedas

periféricas consideradas. Oduncun et al. (2013), por sua vez, analisam o papel desse

instrumento, por meio de um GARCH (1,1), na redução da volatilidade da lira em relação a

uma cesta de moedas (composta pelo dólar e euro, com peso de 50% para cada divisa) e

concluem pela efetividade do ROM na redução dos retornos.

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211

Com base em Oduncun et. al. (2013), esta tese também analisará, por meio de um

GARCH110

, o impacto do ROM sobre a volatilidade da lira em relação ao dólar entre

15/09/2011 (data do primeiro registro de reservas pelo ROM no BRCT) e 27/07/2017, num

total de 1472 observações. Diferentemente dos trabalhos supracitados, este modelo se baseará

na taxa de câmbio em relação ao dólar e no montante em dólar de reservas depositado por

meio do ROM111

. Para controlar o efeito de outras variáveis sobre a taxa de câmbio, será

considerado o diferencial entre a taxa básica de juros norte-americana (fed fund rate) e a

borrowing rate, taxa de juros de depósito, que serve de referência para os influxos de capitais

e, portanto, é alvo principal na implementação do corredor assimétrico da taxa de juros; as

intervenções pré-anunciadas e discricionárias do BRCT (durante o período de análise, o

BRCT não realizou leilões de compra de dólares); e o VIX, utilizado no caso mexicano acima

como uma proxy da aversão ao risco sistêmico As equações abaixo descrevem o modelo a ser

estimado:

𝑅𝐸𝑇𝑡 = 𝛽0 + 𝛽1𝑅𝐸𝑇𝑡−1 + 𝛽2𝐷𝐼𝐹𝑡 + 𝛽3𝐼𝑡 + 𝛽4𝐼𝐷𝑡 + 𝛽5𝑉𝐼𝑋𝑡 + 𝛽6𝑅𝑂𝑀𝑡 + 𝜀𝑡

𝜀𝑡~ 𝑁 (0, ℎ𝑡)

ℎ𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1𝜀𝑡−1 + 𝛼2ℎ𝑡−1 + 𝛼3𝐷𝐼𝐹𝑡 + 𝛼4𝐼𝑡 + 𝛼5𝐼𝐷𝑡 + 𝛼6𝑉𝐼𝑋𝑡 + 𝛼7𝑅𝑂𝑀𝑡

Onde RET é o retorno da taxa de câmbio (calculado por meio da diferença do logaritmo do

câmbio em t e t-1); DIF é o diferencial de juros; I refere-se aos leilões de venda de dólar no

mercado à vista; ID refere-se às vendas discricionárias de dólar no período; VIX refere-se ao

Volatility Index; ROM (Reserve Option Mechanism) é o montante em dólar depositado por

meio desse mecanismo e 𝜀𝑡é o termo de erro (com distribuição normal e média igual a zero).

Ademais, todas as séries foram submetidas ao teste de raiz unitária ADF (Augmented Dickey

Fuller), que atestou a estacionariedade das mesmas.

Conforme a tabela 3.5, a variável 𝑅𝑂𝑀𝑡 é significativa e possui sinal negativo, ou

seja, quando maior o volume depositado por meio do ROM, menor a volatilidade da taxa de

câmbio, resultado que corrobora a importância desse instrumento em suavizar os efeitos da

hierarquia sobre a taxa de câmbio. As vendas de dólar também são estatisticamente

significantes, porém o sinal dessa variável é positivo, ou seja, quanto maior a intervenção,

110

O modelo GARCH foi desenvolvido por Bollerslev (1986) a partir do modelo ARCH (Autoregressive

Conditional Heteroscedastic) elaborado por Engle (1982). De acordo com Oduncun et. al. (2013, p.10), “One of

the most appealing features of the GARCH framework, which explains why this model is so widely used in the

literature, is that it captures one of the well-known empirical regularities of the returns, the volatility clustering”. 111

Divulgados no site do BCRT (http://www.tcmb.gov.tr/wps/wcm/connect/tcmb+en/tcmb+en).

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212

maior a volatilidade cambial. Uma das possíveis razões para esse resultado é a insuficiência

do montante vendido para lidar com o aumento da volatilidade e depreciação da lira após

2014. Outro fator que pode influenciar nesse resultado é o “lag” de um dia de reação do

BRCT aos picos de volatilidade, afetando a relação entre intervenção e retorno (Aysan, 2014).

Tabela 3.5: Resultados Modelo GARCH (1,1)

Variável Coeficiente Prob.

DIF. 9.13E-07 0.0000***

I 6.51E-08 0.0002***

ID 2.15E-08 0.4544

VIX -1.61E-08 0.8627

ROM -1.29E-10 0.0039***

Fonte: Eviews

Nota: *** estatisticamente significante à 1%; ** estatisticamente significante à 5%;

*estatisticamente significante à 10%

Apesar de ser efetivo na redução dos impactos dos fluxos de capitais de curto

prazo sobre a volatilidade da taxa de câmbio, o ROM não representou maior autonomia de

política cambial. Assim como as operações via swaps cambiais, analisadas no caso brasileiro,

as ações do BRCT por meio do ROM e do corredor assimétrico da taxa de juros buscaram

apenas conter (ou suavizar) a transmissão dos efeitos da hierarquia à taxa de câmbio, sem, no

entanto, ir de encontro aos impactos do condicionante estrutural por meio de mudanças nos

condicionantes domésticos. Conforme ressalta Aysan (2014) e Nettekoven (2016), tais

medidas são market-friendly, ou seja, não mudam a institucionalidade do mercado de câmbio

e a composição dos fluxos de capitais; apenas alteram a rentabilidade das diferentes moedas –

conforme o retorno dos ativos estudados no primeiro capítulo – em direção a um objetivo de

política cambial (estabilidade financeira), sem alterar, no entanto, a rentabilidade do sistema

bancário e financeiro.

Assim, mesmo com a efetividade do ROM, houve o crescimento da dolarização

do sistema financeiro e o agravamento da vulnerabilidade externa, vistos acima. Essa

contraposição gera, portanto, uma contradição: a suavização da volatilidade cambial no curto

prazo ocorre ao mesmo do aumento do risco e incerteza em relação aos movimentos da taxa

de câmbio no longo prazo e seus efeitos sobre a posição dos agentes em moeda estrangeira.

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213

3.4 Coréia do Sul: resposta de longo prazo aos condicionantes domésticos e estrutural

O won é a moeda periférica mais líquida no mercado de câmbio onshore, ao longo

do período estudado. A volatilidade da moeda sul-coreana, especialmente no momento de

eclosão da CFG, reforça a inserção assimétrica do país no SMFI, apesar do seu

desenvolvimento produtivo e tecnológico. No entanto, as mudanças na institucionalidade do

mercado de câmbio promovidas pela política cambial após a CFG podem mudar esse cenário.

3.4.1. A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e

câmbio flutuante

Após a crise asiática em 1997, o governo sul-coreano adotou o regime de câmbio

flutuante e intensificou a abertura dos seus mercados financeiros. Seguindo as recomendações

do FMI, o país promoveu a abertura completa de seu mercado de capitais, permitindo livre

acesso dos não-residentes aos títulos negociados nos mercados sul coreanos. A nova

orientação de política também promoveu a liberalização progressiva das transações no

mercado de câmbio à vista e de derivativos e impulsionou as instituições (financeiras e não-

financeiras) autorizadas a participar desses mercados (Kim & Young Yang, 2010).

Consequentemente, houve um aumento no volume negociado nos mercados de câmbio,

principalmente mercados à vista, forwards e FX swaps, apresentados no segundo capítulo,

especialmente nos momentos de alta do ciclo de liquidez internacional.

Os mercados de FX swaps, onshore e offshore, são utilizados principalmente para

o funding em dólar (de curto-prazo), propiciados pelas filiais dos bancos estrangeiros - que

possuem acesso privilegiado ao mercado monetário internacional e, portanto, estão na ponta

vendida de dólar – e demandados especialmente por bancos domésticos e, em menor grau,

pelas próprias filiais dos bancos estrangeiros, que se encontram na ponta comprada. Conforme

BdC (2013), cerca de 70% do volume dos mercados de swaps são realizados entre bancos,

majoritariamente no mercado de balcão, tornando o sistema bancário extremamente

interconectado. Já os mercados de forwards (e, em menor volume, os mercados de opções)

são utilizados para as operações de hedge e especulação das empresas exportadoras, que

assumem a posição vendida em dólar, e possuem como contraparte os bancos domésticos e as

filiais dos bancos estrangeiros.

As filiais dos bancos estrangeiros possuem uma posição central do mercado de

câmbio sul coreano, transmitindo as fases de alta e baixa do ciclo de liquidez internacional.

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214

No período pré-crise, especialmente entre 2005 e 2007, tais filiais intensificaram suas

operações de especulação e arbitragem e incorreram em elevados descasamento de prazos em

suas posições em dólar. Esse comportamento dos bancos estrangeiros, por sua vez, deu

suporte para posições mais arriscadas dos bancos domésticos e empresas não financeiras (em

especial empresas exportadoras) (Prates & Fritz, 2016).

Essas últimas se protegiam de duas formas contra a apreciação do won ao longo

do período de boom pré-crise: por meio da venda de dólares nos mercados forwards ou por

meio da compra, junto aos bancos domésticos e estrangeiros, de opções de venda de dólares, a

fim de se protegerem da forte apreciação do won no período.

O último instrumento – conhecido como knock-in knock-out (KIKO) – oferecia

payoffs positivos para as empresas se o won apreciasse moderadamente em relação ao dólar.

Por outro lado, as empresas teriam payoffs negativos se a moeda coreana depreciasse

significativamente (Prates & Fritz, 2016; Khil & Suh, 2010). Assim, as opções KIKO não são

propriamente um instrumento de hedge, pois, diferentemente das opções comuns, oferecem

proteção apenas nos períodos de apreciação moderada, se tornando um instrumento de alto

risco nos momentos de depreciação. Ademais, as posições assumidas pelas empresas em

opções KIKO iam, geralmente, muito além de suas operações, evidenciando ainda mais o uso

desse instrumento para a especulação (Khil & Suh, 2010).

Para cobrir as posições assumidas junto aos seus clientes (e também para

especular e arbitrar em relação à moeda sul coreana) nos mercados de opções e forwards, os

bancos realizavam operações nos mercados de swaps e à vista. Os bancos estrangeiros

contraiam empréstimos de curto prazo em divisas junto as suas respectivas matrizes, vendiam

os montantes no mercado à vista e compravam títulos públicos sul-coreanos. Além disso, tais

instituições ofereciam funding para os bancos domésticos nos mercados de FX swaps112

. Já os

bancos domésticos compensavam a maior dificuldade no acesso aos empréstimos em moeda

estrangeira com o funding de curto prazo, propiciados pelas filiais dos bancos estrangeiros,

nos mercados de FX swaps (e também nos mercados de swaps de moeda), vendendo o

montante em divisa nos mercados à vista.

A “alimentação” de toda essa engrenagem vinha, portanto, dos empréstimos de

curto prazo contraídos pelas filiais dos bancos estrangeiros, que serviam de funding

diretamente para tais instituições e indiretamente para os bancos domésticos por meio dos FX

112

A regulação frouxa sobre as instituições estrangeiras – que exigia somente gerenciamento do risco de capital,

sem o monitoramento, portanto, do risco de liquidez - em relação aos bancos domésticos impulsionava ainda

mais as operações descritas acima (Baba & Kokenyne, 2011).

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215

swaps. Percebe-se, portanto, que tais operações geravam um expressivo descasamento de

prazo, especialmente nas filiais de bancos estrangeiros, que cobriam suas posições compradas

de longo prazo (no mercado de forwards) com os empréstimos de curto-prazo. Por fim, a

atuação dos bancos estrangeiros e domésticos contribuía para a apreciação do won, já que os

dólares emprestados eram vendidos nos mercados à vista (Figura 3.2).

Figura 3.2: Posições em dólar de bancos e empresas não-financeiras

FX swaps

Empresas Exportadoras e

outros clientes

Bancos Domésticos

Mercado à vista

Filiais de Bancos

estrangeiros

1. Contratos Forwards

2.Opções KIKO

3. Posição vendida em dólar

Dólar

Won

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216

Fonte: Kim & Young Yang, 2010 e Khil & Suh (2010)

A eclosão da CFG em 2008 impactou todas as conexões listadas nas figuras 3.2. A

parada súbita nos mercados monetários internacionais impactou o funding das posições dos

mercados forwards e de opções das filiais dos bancos estrangeiros e dos bancos domésticos,

provocando uma reversão abrupta na trajetória de apreciação do won. Essa última, por sua

vez, afetou profundamente as empresas exportadoras detentoras de opções KIKO também

foram profundamente afetadas, com perdas estimadas em US$ 2 bilhões (ver gráfico 3.37;

Prates & Fritz, 2016).

Posição comprada

em dólar

(forwards ou

opções)

Posição vendida em dólar

Filiais dos

bancos

estrangeiro

s

Mercado à

vista

Matriz

Clientes

(empresas

exportadoras)

Mercado

de títulos

públicos

Empréstimo de

curto prazo

Won

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217

Fonte: BdC

A abertura financeira e a institucionalidade do mercado de câmbio, portanto,

explicam, especialmente no período pré-crise, uma contradição aparente da economia sul-

coreana: a geração de superávits estruturais na conta de transações correntes e, ao mesmo

tempo, a maior sensibilidade a choques externos. Essa característica contraditória pode ser

vista tanto por meio da análise dos fluxos quanto dos estoques em moeda estrangeira. Do

ponto de vista dos fluxos, os constantes superávits em transações correntes caracterizaram

praticamente todo o período de vigência do regime macroeconômico, guardando pouca

relação, portanto, com trajetória da taxa de câmbio (nominal e real).

Conforme ressaltado no segundo capítulo, a exportações sul-coreanas são

concentradas em bens de elevada intensidade tecnológica, enquanto suas importações são

concentradas em commodities, especialmente petróleo, e insumos básicos. Dessa forma,

enquanto as importações dependem em grande parte do ciclo de preço das commodities, as

exportações estão intrinsicamente ligadas ao mercado chinês - destino de boa parte dos bens

de alta intensidade tecnológica sul-coreanos (em especial bens de capital) - e norte-americano

(gráfico 3.39). O comportamento do padrão de comércio ao longo período estudado –

especialmente da complexidade das exportações sul coreanas mostradas no capítulo anterior -

sugere que os movimentos da taxa de câmbio, nos períodos pré e pós crise, não impactaram o

padrão de comércio sul-coreano. Os únicos efeitos da taxa de câmbio relatados na literatura

800

900

1.000

1.100

1.200

1.300

1.400

1.500

1.600

Gráfico 3.37: Taxa de câmbio nominal won/dólar

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218

são sobre o desempenho das exportações. Arize et. al. (2017), apontam para efeitos positivos

das depreciações do won sobre o saldo da balança comercial – entre 1980 e 2013. Já Kim

(2017, p. 102) indica uma relação negativa entre volatilidade da taxa de câmbio e volume

exportado.

Independentemente da situação confortável da conta de transações correntes no

período pré-crise, a conta financeira também registrou saldos positivos e especialmente

elevados entre 2005 e 2007. Tal resultado, porém, se concentrou nos fluxos de empréstimos

de curto prazo e nos títulos em renda fixa (especialmente o mercado de títulos públicos,

denominados em won), em razão das operações entre bancos domésticos, filiais de bancos

estrangeiros e empresas exportadoras, elencadas acima (ver Gráfico 3.38).

Fonte: BdC

-15000

-5000

5000

15000

25000

35000

19

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3

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00

4

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03

4

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2

20

06

1

20

06

4

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3

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2

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09

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12

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13

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14

2

20

15

1

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15

4

20

16

3

20

17

2

Gráfico 3.38: Balanço de Pagamentos - Média móvel 3 trimestres (US$ milhões)

IDE Conta Corrente Renda Fixa Outros Investimentos

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219

Fonte: BdC

A análise dos estoques, por sua vez, corrobora a contradição identificada nos

fluxos. A escalada da dívida externa privada de curto prazo, em especial dos bancos

estrangeiros, superou a acumulação expressiva de reservas no período pré-crise e provocou,

portanto, deterioração dos índices de liquidez (gráfico 3.40). Após a CFG, a diminuição dos

estoques de dívidas dos bancos e dos empréstimos em moeda estrangeira das filiais dos

bancos estrangeiros – mesmo nos períodos de boom entre 2009 e 2011 – provocou uma

redução da relação dívida de curto prazo/reservas, que se tornou ainda menor por conta da

aceleração a acumulação de reservas após a crise. Tal cenário se torna mais evidente quando

se olha para a Posição Internacional de Investimento (tabela 2.1, segundo capítulo). Após a

CFG, diferentemente de grande parte dos países da amostra, a Coréia do Sul não se aproxima

dos valores da PII no período pré-crise, em razão, principalmente, da diminuição do passivo

externo bruto e aumento do volume de reservas, e, após 2013, se torna o único com PII

positiva, revelando, portanto, uma situação confortável em relação à vulnerabilidade externa.

Essa reversão da vulnerabilidade externa após a CFG também se verifica nas

outras dimensões pontuadas no segundo capítulo. A principal delas, a participação dos

investidores não-residentes nos mercados de títulos públicos, se elevou de forma expressiva

por meio das operações de carry trade, conduzidas em grande parte pelas filiais dos bancos

estrangeiros. Após a imposição de um imposto sobre a compra dos títulos públicos por não

residentes, em janeiro de 2011, a participação dos mesmos se estabiliza, neutralizando uma

importante fonte de instabilidade dos fluxos de capitais (Gráfico 3.40)

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Gráfico 3.39: Balança comercial - Exportações e importações

(US$ milhões)

Importações Exportações

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220

Fonte: BdC

Fonte: BdC

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Gráfico 3.40: Dívida Externa (US$ milhões) e relação Dívida Externa/Reservas

Dívida CP Dívida CP Bancos Dívida CP/Reservas

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Gráfico 3.41: Empréstimos externos - filiais dos bancos estrangeiros

(em won)

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221

Fonte: BdC

O repasse cambial e a esterilização, principais elementos de conexão entre a

gestão da política monetária e a política cambial, não sofreram mudanças estruturais com a

crise. O caráter assimétrico do repasse cambial nas economias emergentes, ressaltado no

segundo capítulo, também se aplica à economia sul-coreana, conforme Ahn & Park (2014),

principalmente para as firmas dependentes, em certo grau, de insumos importados113

. O

gráfico 3.43 sugere uma relação, ainda que reduzida, entre o preços dos produtos importados e

o movimento da taxa de câmbio, fato corroborado por Aguerre et. al. (2016). Os impactos dos

insumos importados sobre os preços dos produtos domésticos, por sua vez, são mensurados

por Ahn et. al. (2016), que estimam um repasse de 23% e 63% do custo dos insumos

importados para o preço final no curto e longo prazo respectivamente114

.

O custo de esterilização das operações do BDC no mercado à vista representa,

historicamente, uma parcela reduzida do PIB, em comparação aos demais países emergentes

da amostra (ver gráfico 3.43 e quadro 2.3), por conta principalmente do reduzido diferencial

de juros. Além do baixo impacto dos custos sobre o PIB, Kim & Yong Yang (2008) apontam

para a parcialidade das esterilizações entre 1998 e 2007, já que a oferta monetária (M2)

113

A análise de Ahn & Park (2013) se baseou numa pesquisa de preços entre firmas sul-coreanas realizada em

2012. Para maiores detalhes sobre a pesquisa ver Park & Sungju (2013). 114

Conforme Ahn et. al. (2016) esse repasse é menor que o repasse estimado para países centrais, como França,

Alemanha e Holanda – países que disponibilizam os dados para a estimação do modelo.

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Gráfico 3.42: Participação de investidores não-residentes nos mercados de títulos domésticos (%)

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222

aumenta expressivamente no período. Tal fato indica, portanto, a pertinência do canal da

política monetária nas intervenções do BDC no mercado à vista.

Fonte: BdC

Fonte: BdC

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Gráfico 3.43: Taxa de câmbio won/dólar e Índice de preço dos

produtos importados (direita, 2010=100)

Taxa de câmbio trimestral Índices de Preços Importados

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Gráfico 3.44: Custo (estimado) de esterilização das reservas

internacionais (em % do PIB)

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223

3.4.2 A gestão da política cambial no regime de câmbio flutuante e metas de inflação

A análise dos condicionantes acima aponta para a construção de uma posição mais

vulnerável, após a intensificação da abertura financeira no final dos anos 1990, das

instituições participantes do sistema financeiro sul coreano. O Banco da Coréia (BdC), por

sua vez, foi pouco sensível, no período que antecedeu a CFG, a tais transformações,

intervindo apenas por meio da compra de dólares no mercado à vista, com a meta explícita de

acumulação de reservas internacionais e sob o objetivo macroeconômico da estabilidade

financeira.

“For several years after the currency crisis of 1997, the accumulation

of foreign exchange reserves was one of the objectives of intervention.

A strong stock of FX reserves helps to minimise external vulnerability

and to increase confidence in the economy” (Ryoo, Kwon & Lee,

2013, p. 208).

No entanto, como se viu acima, a acumulação de reservas internacionais não

impediu o desenvolvimento de outras fontes de vulnerabilidade externa. A relação alavancada

entre bancos e empresas exportadoras no mercado de opções, o avanço na abertura financeira

e a frouxa regulação do sistema financeiro doméstico tornou a economia sul coreana mais

sensível a choques externos, mesmo com o aumento das reservas em moeda estrangeira

(Baumann & Gallagher, 2013; Prates & Fritz, 2016). O simples olhar sobre os condicionantes

e a política cambial no período pré-crise, portanto, evidencia a falta de sintonia entre a

atuação do BdC e os condicionantes domésticos – neste caso as transformações institucionais

e as diferentes fontes de vulnerabilidade externa. Esse desarranjo, por sua vez, minimiza o

aumento do policy space – definido no primeiro capítulo – causado pela acumulação de

reservas internacionais.

Os efeitos da expressiva depreciação do won provocada pela eclosão da CFG e o

rápido retorno dos fluxos de capitais a partir do segundo trimestre de 2009 representaram um

ponto de inflexão da política cambial sul coreana. O programa de liberalização financeira, que

seria finalizado em 2009, foi substituído por uma presença ativa do BDC no mercado de

câmbio - e no sistema financeiro como um todo (Baumann & Gallagher, 2013; Prates & Fritz,

2016).

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224

Num primeiro momento, logo após o colapso da crise em setembro de 2008, o

BDC atuou por meio de leilões de FX swaps, utilizando suas reservas internacionais115

, e de

empréstimos em moeda estrangeira, ancorados nas linhas de swaps acordadas junto ao Fed –

que totalizavam US$ 30 bilhões. Além desses dois instrumentos, o BdC também impediu a

paralização das linhas de crédito em moeda estrangeira entre bancos e pequenas e médias

empresas (grande parte delas exportadoras). Tais intervenções concentravam-se no

fornecimento de liquidez imediata para bancos e empresas exportadoras, principais afetados

pela reversão súbita do funding em moeda estrangeira nos mercados internacionais (Ryoo et.

al, 2013; ver Quadro 3.3) 116,117

.

No entanto, a maior presença no mercado de câmbio não representou uma

mudança do BdC em direção aos condicionantes, mas apenas uma reação – semelhante à

resposta dos demais bancos centrais emergentes – da autoridade monetária aos efeitos

abruptos da crise sobre a liquidez internacional e, consequentemente, sobre a relação

won/dólar. Nos termos desta tese, as ações do BdC responderam temporariamente aos

impactos do condicionante estrutural, a hierarquia de moedas, não apenas sobre a volatilidade

da taxa de câmbio, mas também sobre o espaço da política cambial, já que sem os acordos de

linha de swaps com o Fed e outros bancos centrais, o volume de reservas internacionais

poderia ser drasticamente reduzido.

O volume das intervenções diretas no mercado de câmbio após a eclosão da CFG

levou o BdC a pensar em medidas estruturais após a volta dos fluxos de capitais em 2009, a

fim de evitar o desenvolvimento de novas fontes de vulnerabilidade externa e reduzir a

volatilidade da taxa de câmbio (Ryoo et. al., 2013). Assim, a partir de novembro de 2009, o

BDC adotou diversas medidas macroprudenciais e de controles de capitais. A primeira delas

refere-se à imposição de limites aos contratos entre bancos e empresas exportadoras nos

mercados forwards, evitando posições alavancadas em relação à operação objeto do hedge e

posições descobertas (em relação ao funding em moeda estrangeira). Outros instrumentos que

buscaram limitar a alavancagem da posição dos bancos envolveram a fixação de um teto,

115

De acordo com FMI (2011, p. 71), ao longo do ápice da CFG (último trimestre de 2008), o nível de reservas

caiu US$ 64 bilhões e o índice do mercado de ações coreano despencou 70%. 116

Nesse período, o BDC também atuou por meio de intervenções verbais. De acordo com Ryoo, Kwon & Lee

(2013, p. 2010), o BDC “(…) also use verbal intervention to give speculative forces warning by conveying the

authorities’ concerns and intentions related to foreign exchange market developments. Verbal intervention must

be used limitedly, as its effects on the market will lessen if it is used frequently”. 117

O BdC também realizou acordos de swaps de moedas junto ao Banco Central Japonês (equivalente a US$ 30

bilhões) e ao Banco Popular da China (1,8 bilhão de yuans). Para maiores detalhes sobre todos os instrumentos

utilizados pelo BDC para conter a crise de liquidez no mercado de câmbio após a CFG ver

http://www.bok.or.kr/broadcast.action?menuNaviId=1920.

Page 225: Política cambial nos países emergentes: uma perspectiva …repositorio.unicamp.br/jspui/bitstream/REPOSIP/331567/1/... · 2018. 9. 3. · emergentes à inserção assimétrica desses

225

proporcional ao capital, para as posições dos bancos nos mercados de derivativos; a

instituição de um imposto sobre as posições em opções de câmbio e a regulamentação de uma

cobertura (funding) para os empréstimos de curto prazo em moeda estrangeira conferidos

pelos bancos domésticos. Por fim, conforme mencionado, o BDC reintroduziu um imposto

sobre a compra de títulos domésticos pelos investidores não-residentes, a fim de desestimular

as operações de carry trade (ver tabela 3.7 no Anexo estatístico; Prates & Fritz, 2016;

Baumann & Gallager, 2016; IMF 2015).

Tais medidas, diferentemente do caso brasileiro, se mantiveram após o anúncio do

tapering, sugerindo não apenas a efetividade desse instrumento de política, mas também um

horizonte de longo prazo para a política cambial. Em outras palavras, mesmo com a reversão

da trajetória da taxa de câmbio, o foco do BDC manteve-se na contenção da volatilidade

cambial e seus impactos sobre os balanços das instituições financeiras e não-financeiras, ou

seja, na estabilidade financeira.

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226

Quadro 3.4: Categorias da política cambial e a resposta aos condicionantes

Instrumentos Período Objetivo Macro Metas Condicionantes

domésticos relacionados

Respondem aos

condicionantes

domésticos?

Respondem aos

efeitos do

condicionante

estrutural

Compra e venda de dólar

no mercado à vista

1997-2008;

Outubro 2008

Estabilidade

financeira

Acumulação de

reservas;

prevenção de

crises.

Vulnerabilidade Externa;

Institucionalidade do

mercado de câmbio.

Parcialmente Parcialmente

Linha de Swaps de

moedas acordada com

EUA, Japão e China

Outubro 2008 Estabilidade

financeira

Prevenção de

crises

Vulnerabilidade Externa;

Institucionalidade do

mercado de câmbio

Parcialmente Parcialmente

Intervenção verbal:

investigação sobre as

posições em derivativos

de câmbio

Outubro/2010

e abril/2011

Estabilidade

financeira

Conter

volatilidade

cambial

Institucionalidade do

mercado de câmbio Parcialmente Parcialmente

Instrumentos de gestão

dos fluxos de capitais e

regulação derivativos de

câmbio (Tabela 3..)

Novembro/2009 à

Janeiro/2013

Estabilidade

financeira

Conter

Volatilidade

cambial

Institucionalidade do

mercado de câmbio

Vulnerabilidade externa

Sim Sim

Fonte: Elaboração Própria

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227

3.4.3. A resposta aos condicionantes e a efetividade da política cambial

Assim como os demais países estudados neste capítulo, a Coréia do Sul interviu

de maneira assimétrica no mercado à vista de câmbio, acumulando reservas internacionais nos

períodos de boom dos fluxos de capitais e, portanto, baixa preferência pela liquidez da divisa

(FMI, 2013). No entanto, o uso de tal instrumento não foi suficiente para conter os efeitos da

hierarquia sobre a volatilidade da taxa de câmbio, pois não respondia completamente aos

condicionantes domésticos. Ou seja, a institucionalidade do mercado de câmbio (combinada

com as características da abertura financeira) possibilitou a formação de posições em moeda

estrangeira alavancadas e descobertas concomitantemente, e em ritmo superior, à acumulação

de reservas internacionais. Dessa forma, além de não impactar a formação das operações

descritas na subseção acima, a compra de divisas não se mostrou suficiente para conter a

deterioração dos índices de liquidez dos agentes privados. Tal constatação se cristalizou na

eclosão da CFG, quando os Bancos Centrais norte americano, japonês e chinês aturam como

emprestadores de última instância por meio de swaps de moedas.

Portanto, qualquer mudança estrutural na sensibilidade da taxa de câmbio e da

economia sul coreana a choques externos passaria necessariamente pela limitação das

operações das filiais dos bancos estrangeiros e bancos domésticos nos mercados de câmbio.

Após a CFG, essa constatação também foi compartilhada pelo BdC, que, por meio das

medidas macroprudenciais, respondeu diretamente a dois condicionantes intrinsicamente

conectados: a institucionalidade do mercado de câmbio e a vulnerabilidade externa

(Choongsoo, 2010). A inclusão formal da estabilidade financeira como um dos objetivos de

política no estatuto do BdC conferiu um caráter estrutural às medidas macroprudenciais, que

buscavam a redução da volatilidade (e da expectativa de volatilidade) da taxa de câmbio no

longo prazo. A resposta do BdC aos condicionantes domésticos, portanto, manifesta uma

intenção de ampliar a autonomia da política cambial aos efeitos conjunturais da política

monetária dos países emissores de divisas ou às manifestações da hierarquia de moedas. Nas

palavras do então presidente do BdC, Choongsoo Kim:

For countries like Korea, meanwhile, whose currencies are not key

currencies and have not yet been sufficiently internationalized,

measures for responding to policies such as the quantitative easing by

key currency countries cannot be found in economic textbooks written

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228

in the past. A new task for us, therefore, is to find alternative measures

appropriate to our domestic circumstances by ourselves, through our

own research (Choongoo, 2013.

Porém, tal política cambial de longo prazo - condizente com os condicionantes

domésticos e, portanto, com o condicionante estrutural – conseguiu lograr êxito na redução da

volatilidade cambial? Conforme Ryoo, Kwon & Lee (2013) e Ree et.al., (2013), a volatilidade

do won em relação ao dólar se reduziu após a CFG, mesmo com os desdobramentos da crise

da zona do euro e os efeitos do anúncio do tappering. Tal conclusão também é compartilhada

por Baumman & Gallagher (2013), que estimam um modelo GARCH para avaliar o impacto

de tais medidas sobre o nível e a volatilidade da taxa de câmbio won/dólar entre 2009 e 2012.

De acordo com os autores, os instrumentos de política cambial pós-crise tiveram um impacto

estaticamente significante sobre a volatilidade cambial, contrariamente ao impacto sobre o

nível da taxa de câmbio, que não se mostrou estatisticamente significante.

A análise da efetividade dos instrumentos macroprudenciais por meio de modelos

GARCH (ou derivações de modelos ARCH) possui dois problemas principais no caso sul-

coreano: o número de intervenções é muito pequeno quando comparado ao total de

observações e o efeito dos instrumentos sobre a volatilidade não é imediato ou de curto-prazo.

Tais fatores podem comprometer o resultado do modelo, tornando o impacto desses

instrumentos sobre a volatilidade cambial estatisticamente não significante. De fato, quando

se reproduz o modelo estimado por Baumman & Gallagher (2013) para um período maior (até

2017), as medidas macroprudenciais não são efetivas em conter a volatilidade da taxa de

câmbio (Ver apêndice A, tabela 3.9).

Tal fato se cristaliza por meio da análise gráfica. Conforme o gráfico 3.38, ao

longo do período que concentra grande parte das medidas macroprudenciais – entre novembro

de 2009 e agosto de 2011 – a volatilidade cambial (medida pelo desvio padrão) apresentou

alguns picos, impossibilitando uma relação precisa (positiva ou negativa) entre os

instrumentos e a volatilidade. Entretanto, entre 2011 e 2015 – que engloba o anúncio do

tapering pelo Fed no primeiro semestre de 2013 - os picos se reduzem, sugerindo um período

de menor variação abrupta da taxa de câmbio. Conforme análise das variações diárias, a

frequência das variações (depreciação e apreciação) acima de 2, 4 e 6% cai de dez casos entre

novembro de 2009 e agosto de 2011 para cinco casos no período restante (setembro de 2011 a

julho de 2017).

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229

Ademais, conforme Ree et. al. (2013), Baumann & Gallagher (2013) e os gráficos

3.45 e 3.46, os instrumentos utilizados pelo BdC contribuíram para redução das posições

descobertas (em moeda estrangeira) dos bancos – tanto por meio da diminuição do

endividamento externo de curto prazo quanto por meio da limitação e taxação das posições

nos mercados forwards e de opções. Tais fatos, por sua vez, tornaram os mercados de câmbio

mais resilientes a choques externos118

.

Portanto, apesar de alguns resultados conflitantes, pode-se afirmar que o uso de

instrumentos condizentes com os condicionantes domésticos e estruturais – que aumentam a

autonomia de política cambial – foram efetivos em reduzir a volatilidade cambial,

principalmente as variações bruscas na taxa de câmbio. Tal fato permite que o BdC não só

intervenha menos nos momentos de maior preferência pela liquidez da divisa, mas também

atue em resposta a diferentes objetivos domésticos, ligados à competitividade externa dos

produtos exportados, controle inflacionário e/ou estabilidade financeira119

. Nas palavras do

BdC:

“Even though this is hard to measure, we think that the regulations

adopted have played a role in improving the banks’ external funding

profiles, and thus affected the exchange rate volatility. For now,

therefore, it can be said that these macro-prudential measures have

helped to reduce the need for direct intervention” (Ryoo, Kwon &

Lee (2013, p.212).

118

Conforme o teste de stress realizado por Ree et. al. (2013), que simulou o mesmo pico do VIX registrado na

CFG para as crises da Grécia em 2011 e o tapering em 2013, a taxa de câmbio won/dólar se tornou mais

resiliente nos períodos de maior aversão ao risco. 119

Por exemplo, após a CFG, o BdC atuou na ponta comprada em dólar no mercado à vista, visando não apenas

a redução da vulnerabilidade externa, mas também a estabilidade do nível da taxa de câmbio won/dólar (FMI,

2013)

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230

Fonte: BdC

Fonte: BdC

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

1.000,00

1.050,00

1.100,00

1.150,00

1.200,00

1.250,00

1.300,00

Gráfico 3.45: Regulações e taxa de câmbio (esquerda) (2009-2017)

Intervenções Taxa de câmbio

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

Gráfico 3.46: Regulações e volatilidade (desv. padrão, esquerda)

Intervenções Volatilidade (desv. Padrão)

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231

Considerações Finais

Após a CFG os países emissores de moedas periféricas perderam suas “bússolas

tradicionais” em relação à política cambial – termo utilizado por Aglietta (2004) para referir-

se à política monetária dos países centrais pós-liberalização financeira. Até então, acreditava-

se que, sob o regime de câmbio flutuante, a acumulação de reservas internacionais era a

melhor (se não a única) solução para o enfrentamento de períodos de instabilidades nas taxas

de câmbio. No entanto, o impacto da crise sistêmica explicitou a insuficiência desse

instrumento clássico de política cambial em conter (ou prevenir) os efeitos da hierarquia de

moedas sobre a volatilidade e nível da taxa de câmbio (ver Prates & Cintra, 2009, p. 16).

Soma-se a isso o receio, por parte dos policy makers dos países emissores de moedas

periféricas, em usar o colchão de liquidez, já que tal uso poderia gerar uma elevação dos

prêmios de risco e dos indicadores de vulnerabilidade externa (Domanski et. al, 2016). Esse

dilema em relação à condução da política cambial, num regime de câmbio flutuante e metas

de inflação, se intensificou após o retorno dos fluxos de capitais em 2009, quando diversos

países buscaram outros instrumentos para lidar com as fases de alta e baixa do ciclo de

liquidez internacional.

O presente capítulo se propôs a analisar tais dilemas de política cambial por meio

da aplicação do referencial teórico, construído nos dois primeiros capítulos, nos quatro países

emergentes que possuem os mercados de câmbio mais relevantes: Coréia do Sul, México,

Brasil e Turquia.

No caso brasileiro, o período de análise foi caracterizado pela adoção frequente de

leilões de swaps cambiais e intervenções no mercado à vista – de maneira anunciada ou

discricionária -, que respondem apenas parcialmente os condicionantes domésticos e

estrutural. De fato, os leilões de swaps se aproximam mais dos condicionantes domésticos,

pois respondem à institucionalidade do mercado de câmbio brasileiro, ao atuar indiretamente

na expansão ou contração da oferta de dólar futuro. Porém, sua postura acomodatícia apenas

suaviza as conexões entre os movimentos da divisa-chave e as posições dos agentes no

mercado de câmbio. Assim, o programa de swaps tradicionais adotado em 2013 após o

“tapering talk”, por exemplo, não objetivava reverter a posição comprada em dólar dos

investidores não-residentes, mas apenas suavizar a trajetória de depreciação do real. Ademais,

este tipo de intervenção (principalmente, os swaps tradicionais) gera externalidades negativas

para a vulnerabilidade externa, já que acentua os empréstimos externos de curto prazo, e para

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232

a gestão da política monetária, pois reforça ainda mais a relação entre política monetária e

cambial. Tais impactos negativos contribuem para acentuar os efeitos da hierarquia de moedas

sobre a taxa de câmbio nos momentos de reversão do ciclo de liquidez, fortalecendo a

dependência da política cambial brasileira frente à política monetária dos países emissores de

divisas e à preferência pela liquidez dos investidores globais.

A reação brasileira aos dilemas de política cambial pós-crise, por meio da adoção

de instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação de derivativos de câmbio,

propiciou a resposta mais adequada aos condicionantes domésticos e estrutural. Tais

regulações atingiram boa parte das possibilidades de ganho de especulação e arbitragem com

a moeda brasileira– contrariamente à postura acomodatícia da intervenção via swaps

cambiais. A vulnerabilidade externa também foi impactada positivamente, por meio,

principalmente, da redução dos empréstimos de curto prazo denominados moeda estrangeira,

atenuando as possibilidades de choques oriundos de movimentos das divisas. Houve também

uma breve dissociação entre a gestão da política monetária e os objetivos de política cambial,

que se concentraram na reversão da trajetória de câmbio em direção a um patamar mais

competitivo. Ao atingir positivamente os condicionantes domésticos listados, as regulações

responderam ativamente à hierarquia de moedas, reduzindo a subordinação da política

cambial à política monetária dos países emissores de divisas.

Embora a análise por meio do referencial teórico ateste para a adequação dos

instrumentos de gestão dos fluxos de capitais aos condicionantes, o estudo empírico sobre a

efetividade de tais instrumentos na contenção da volatilidade apontou para o efeito reverso do

esperado. Tal resultado, no entanto, é condizente com as constantes arbitragens regulatórias

que geraram volatilidade no cupom cambial e impediram a contenção da volatilidade cambial

no curto prazo.

Já o México se diferencia substancialmente do caso brasileiro, pois o BM atua

fundamentalmente por meio da venda de divisas no mercado de câmbio. A continuidade da

política cambial mexicana, antes e depois da CFG, contrasta com mudanças significativas nos

condicionantes domésticos. Em relação à vulnerabilidade externa, o aumento da participação

dos investidores não-residentes nos mercados de títulos públicos domésticos e a elevação do

estoque de dívida externa das empresas não-financeiras contribuiu para tornar a taxa de

câmbio (e as demais variáveis macroeconômicas) mais sensível a choques externos. A

“indiferença” da política cambial em relação aos condicionantes domésticos e estrutural

impactou a efetividade das intervenções no mercado à vista. Tais instrumentos não se

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233

mostraram estatisticamente significativos para conter a volatilidade da taxa de câmbio

peso/dólar após a CFG.

A Turquia, por sua vez, é caracterizada por uma economia relativamente

dolarizada e, portanto, profundamente dependente da política monetária dos países emissores

de divisas. Após a adoção do regime de câmbio flutuante em 2001, o BCRT buscou se retirar

dos mercados interbancários de câmbio e depósito em moeda estrangeira, atuando somente

por meio de intervenções no mercado à vista ao longo do período pré-crise. No entanto, os

efeitos da CFG sobre a lira trouxeram novamente o BRCT aos mercados interbancários, além

de provocar ações anticíclicas por parte da autoridade monetária. O uso do ROM –

conjuntamente à adoção do corredor assimétrico da taxa de juros – respondeu à

institucionalidade, ao impactar o custo de oportunidade da retenção de divisas (dólar ou euro),

e à vulnerabilidade externa, ao desestimular o carry trade. Ademais, tal medida foi efetiva em

reduzir a volatilidade da lira em relação ao dólar. Entretanto, o caráter market friendly do

ROM revela sua postura acomodatícia – assim como os swaps no caso brasileiro -, visando,

portanto, suavizar a demanda por divisas, e os impactos da hierarquia, sem reduzir de fato a

dolarização dos depósitos e empréstimos.

Por fim, a Coréia do Sul é o caso de maior mudança estrutural na política cambial.

A postura pró abertura entre a crise de 1997 e a CFG permitiu a convivência de bons

indicadores de liquidez e solvência externa com posições à descoberto de filiais de bancos

estrangeiros, principalmente nos mercados de câmbio. O impacto da CFG sobre o won

provocou alterações disruptivas na política cambial, simbolicamente representada na inclusão

da estabilidade financeira no estatuto do BdC. As regulações responderam ativamente aos

condicionantes domésticos e estrutural e, portanto, buscaram de fato aumentar autonomia da

política cambial. O efeito sobre a volatilidade cambial, no entanto, não é perceptível,

empiricamente, no curto prazo, indicando, portanto, o caráter de longo prazo das mudanças na

institucionalidade. Ou seja, as regulações são importantes na redução da amplitude (ou dos

picos) da variação cambial nos momentos de maior preferência pela liquidez da divisa,

diminuindo a necessidade de intervenções diretas e pontuais.

Assim, os principais resultados dos quatro casos acima permitem algumas

conclusões gerais sobre a análise da política cambial sob a ótica dos condicionantes.

Primeiramente, assim como a política monetária, deve-se diferenciar a postura acomodatícia

(ou de gerenciamento da liquidez) da resposta em relação ao condicionante institucional da

política cambial. Ainda que a primeira postura seja capaz de suavizar os efeitos do ciclo de

liquidez internacional sobre a volatilidade cambial, ela não gera restrições sobre as operações

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234

de especulação e arbitragem dos agentes, além de não impedir a geração de externalidades

negativas sobre os demais condicionantes domésticos. Dessa forma, a resposta incompleta da

postura acomodatícia aos condicionantes inviabiliza uma maior autonomia da política cambial

aos efeitos futuros provocados pelo movimento das divisas. Esse é o caso, por exemplo, das

intervenções via swaps no Brasil e o uso do ROM na Turquia, medidas market friendly, que

não alteram estruturalmente o grau de dependência da política cambial desses países à política

monetária dos países emissores de divisas. Por outro lado, a resposta à institucionalidade

reflete uma postura ativa da política cambial em relação a esse condicionante, que pode gerar

externalidades positivas para os outros condicionantes domésticos e, assim, atingir o

condicionante estrutural. Esse é o caso, por exemplo, dos instrumentos de gestão dos fluxos

de capitais no Brasil e na Coréia do Sul.

Segundo, a resposta da política cambial aos condicionantes depende também da

da visão de cada central banker acerca da política cambial. Em relação aos estudos de caso

acima, há dois comportamentos diferentes após a CFG. O primeiro, representado por Brasil

(entre 2010 e 2011) e Coréia do Sul, conduz a política cambial como um instrumento de

emancipação dos efeitos deletérios da política monetária dos países emissores de divisas sobre

a estabilidade financeira – e no caso brasileiro sobre a competitividade externa de suas

exportações. O segundo comportamento, representado sobretudo pelo México, caracterizou-se

pela manutenção da política cambial, independentemente das mudanças nos condicionantes

domésticos, e pela condenação do uso de controles de capitais. No caso turco, a inovação do

ROM vai além dessa visão restrita – estimulada por conta dos efeitos da dolarização sobre a

taxa de câmbio -, porém não na direção de uma maior autonomia de política cambial.

Por fim, os instrumentos que efetivamente responderam aos condicionantes

estrutural e domésticos envolvidos possuem efeitos de curto-prazo contraditórios sobre a

volatilidade cambial. Conforme visto nos casos de Coréia do Sul e Brasil, as regulações não

são efetivas em conter a volatilidade cambial no curto prazo. Tal resultado implica o

direcionamento da análise da política cambial desses países para o médio e longo prazo. No

Brasil, esse direcionamento não foi possível, devido ao caráter curto-prazista (e assimétrico)

das intervenções, que foram suprimidas após a reversão da fase de euforia do ciclo de liquidez

internacional. Na Coréia do Sul, por sua vez, o horizonte de longo prazo dos instrumentos de

gestão dos fluxos de capitais permite analisar, em próximos trabalhos, se este desenho de

política cambial tornou o won efetivamente mais resiliente aos movimentos da divisa-chave.

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235

Anexo estatístico

Tabela 3.6: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos

derivativos cambiais - Brasil

Data Tipo de medida Medida

19/10/2009 Controle de capital IOF de 2% sobre influxos de portfólio (ações e renda fixa)

18/11/2009 Controle de capital IOF de 1,5% sobre emissão de Deposit Receipts (DR)

4/10/2010 Controle de capital Aumento da alíquota de IOF de 2% para 4% sobre a

aplicação de estrangeiros em fundos de renda fixa e títulos

do Tesouro. A alíquota de IOF sobre aplicações em ações,

em vigor desde outubro de 2008, foi mantida em 2%.

7/10/2010 Controle de capital A migração, por investidores não residentes, de aplicações

em renda variável e ações para aplicações em renda fixa

está sujeita ao fechamento de novo contrato de câmbio

(câmbio simultâneo), impedindo que os investidores

deixem de pagar a nova alíquota de IOF para renda fixa.

18/10/2010 Controle de capital Nova elevação da alíquota de IOF, agora de 4% para 6%,

para aplicações em renda fixa, por investidores não

residentes.

18/10/2010 Regulação de derivativos

cambiais

Elevação da alíquota de IOF sobre margens de garantia

dos contratos futuros de câmbio de 0,38% para 6% e

proibição de cumprimento dessas margens mediante

empréstimos de títulos públicos e garantia bancárias.

30/12/2010 Controle de capital IOF de 1,5% sobre cancelamento de DRs

6/1/2011 Regulamentação prudencial Recolhimento de depósito compulsório (em reais) de 60%

do valor das posições vendidas em câmbio, assumidas

pelos bancos, que exceder o menor dos seguintes valores:

US$ 3 bilhões ou o patrimônio de referência (Nível I). A

medida entrou em vigor em 4/4/2011. Objetivo: trazer a

posição vendida dos bancos no mercado à vista para US$

10 bilhões.

29/3/2011 Controle de capital Imposição de IOF de 6% sobre as captações externas de

até 360 dias (as captações externas com prazo inferior a

90 dias já eram tributadas com alíquota de IOF de 5,38%).

4/4/2011 Controle de capital Renovações de empréstimos externos devem realizar

câmbio simultâneo (devem contabilizar os fluxos

cambiais “fictícios” referentes ao pagamento da dívida,

sujeito a IOF de 0,38%, e à nova captação, sujeita a IOF

de 6%). Bloqueia-se, assim, um instrumento de evasão da

medida precedente.

6/4/2011 Controle de capital IOF de 6% passa a incidir também sobre empréstimos

externos com prazo de até dois anos, sobre repactuação e

assunção de dívidas, e sobre empréstimos

intercompanhias sob o mesmo prazo.

8/7/2011 Regulação prudencial Mudança nas regras de recolhimento compulsório (em

reais) sobre posições vendidas em câmbio. Percentual de

60% passa a incidir sobre o montante que exceder o

menor dos seguintes valores: US$ 1 bilhão ou o

patrimônio de referência (Nível I).

26/07/2011 Regulação de derivativos

cambiais

IOF de 1% sobre posições vendidas em derivativos acima

de U$ 10 mil.

2/8/2011 Controle de capital Em Ato Declaratório publicado no Diário Oficial, a

Receita esclareceu que a alíquota de 6% do IOF incidente

sobre os empréstimos com prazo médio de até 720 dias

incide sobre as operações de empréstimos

intercompanhias.

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236

1/12/2011 Controle de capital Alíquota de IOF sobre investimentos estrangeiros de

portfólio ações (2% desde outubro de 2009) volta ao

patamar de 0%. Também foi zerada a alíquota de IOF (até

então de 6%) sobre aplicações por não residentes em

títulos privados de longo prazo com duração acima de

quatro anos.

29/02/2012 Regulação prudencial IOF de 6% passa a incidir também sobre empréstimos

externos com prazo de até três anos

09/03/2012 Regulação prudencial IOF de 6% passa a incidir também sobre empréstimos

externos com prazo de até cinco anos

15/03/2012 Regulação de derivativos

cambiais

Exportadores isentos de IOF de 1% sobre posições

vendidas em derivativos (até 1,2 valor das exportações)

14/06/2012 Controle de capital

(afrouxamento)

IOF voltou a incidir somente sobre operações com prazo

de até 2 anos a partir de junho

05/12/2012 Controle de capital IOF de 6% voltou a incidir somente sobre captações

externas com prazo mínimo de 1 ano (como vigente até

março de 2011)

04/12/2012 Controle de capital Prazo mínimo das operações de pagamento antecipado de

exportações foi ampliado de um para cinco anos.

18/12/2012 Regulação prudencial

(afrouxamento)

Requerimento compulsório sobre posição de câmbio dos

bancos no mercado à vista passa a incidir somente para o

montante que exceder US$ 3 bilhões

04/06/2013 Controle de Capital

(afrouxamento) IOF sobre renda fixa zerado

12/06/2013 Regulação de derivativos

cambiais (afrouxamento) IOF sobre as posições vendidas em derivativos zerado

25/06/2013 Regulação prudencial

(afrouxamento)

Eliminação do requerimento compulsório sobre as

posições de câmbio dos bancos no mercado à vista

24/12/2013 Controle de Capital

(afrouxamento)

Eliminação do IOF sobre emissão de DRs

04/06/2014 Controle de Capital

(afrouxamento)

IOF de 6% sobre empréstimos externos passa incidir

somente para maturidades abaixo de seis meses.

Fonte: Prates (2015); Chamon & Garcia (2016)

Tabela 3.7: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos

derivativos cambiais – Coréia do Sul

Data Efetiva Tipo de medida Medida

19/11/2009 Regulação Prudencial

Limites nas posições dos contratos firmados entre

exportadores e bancos nos mercado de forwards

(125% das receitas de exportação) ; requerimento de

capital sobre a posição de investidores estrangeiros

em títulos públicos.

14/06/2010 Regulação Derivativos

- Limites nas posições em derivativos de câmbio

(50% dos capital para os bancos domésticos e 250%

do capital dos bancos estrangeiros);

- Aumento dos limites dos contratos entre bancos e

empresas exportadoras nos mercados forwards

(100% da receita de exportação)

01/07/2010 Controle de capitais Limites sobre empréstimos em moeda estrangeira

contraídos por residentes

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19/10/2010 Regulação Derivativos Limites nas posições em derivativos de câmbio

01/01/2011 Controle de capitais

Imposto de 14% sobre posições de investidores não-

residentes em títulos públicos; imposto sobre

passivos em moeda estrangeira

01/08/2011 Controle de capitais Limites sobre passivos em moeda estrangeira

01/06/2011 Regulação prudencial Aperto dos limites às posições dos bancos nos

mercados de derivativos de câmbio

01/11/2012 Regulação derivativos Teto sobre as posições no mercado forward

01/01/2013 Regulação prudencial Aperto dos limites às posições dos bancos nos

mercados de derivativos de câmbio

Fonte: Fritz & Prates (2016); Baumann & Gallagher (2013)

Apêndice

A) Análise da efetividade da política cambial - Coréia do Sul

Seguindo a metodologia proposta por Baumman & Gallagher (2013), estimou-se

um modelo GARCH (1,1) a fim de analisar os impactos das regulações sobre a volatilidade da

taxa de câmbio. O modelo considerou as seguintes variáveis:

𝑅𝐸𝑇𝑡 = 𝛽0 + 𝛽1𝑅𝐸𝑇𝑡−1 + 𝛽2𝐷𝐼𝐹𝑡 + 𝛽3𝐼𝑡 + 𝛽4𝑉𝐼𝑋𝑡 + 𝜀𝑡

𝜀𝑡~ 𝑁 (0, ℎ𝑡)

ℎ𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1𝜀𝑡−1 + 𝛼2ℎ𝑡−1 + 𝛼3𝐷𝐼𝐹𝑡 + 𝛼4𝐼𝑡 + 𝛼5𝑉𝐼𝑋𝑡

Onde RET é o retorno sobre a taxa de câmbio won/dólar; DIF é o diferencial entre a taxa

básica de juros sul-coreana e a taxa básica de juros norte-americana (fed fund rate); I é uma

variável binária, na qual 1 representa os instrumentos de gestão dos fluxos de capitais (data de

anúncio); VIX é a proxy utilizada para a variação da preferência pela liquidez da divisa e e

𝜀𝑡é o termo de erro (com distribuição normal e média igual a zero). Ademais, todas as séries

foram submetidas ao teste de raiz unitária ADF (Augmented Dickey Fuller), que atestou a

estacionariedade das mesmas.

Os resultados da estimação desse modelo, apresentados pela tabela abaixo,

contrariam as relações esperadas. Os efeitos das regulações sobre a volatilidade cambial não

são estatisticamente significantes e a relação entre o diferencial de juros e o retorno sobre o

câmbio é negativa. O único resultado esperado que se confirma é a relação positiva entre o

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VIX e a volatilidade cambial, embora, de acordo com Ree et. al. (2013), após os instrumentos

de gestão dos fluxos de capitais, a reação da taxa de câmbio a variações no VIX foi suavizada.

Tabela 3.8: Resultados Modelo GARCH (1,1)

Variável Coeficiente Prob.

DIF. -8.69E-07 0.0003***

I 1.60E-06 0.7707

VIX 2.01E-07 0.0000***

Fonte: Eviews

Nota: *** estatisticamente significante à 1%; ** estatisticamente significante à 5%;

*estatisticamente significante à 10%

B) Análise da efetividade da política cambial – Brasil

A análise dos impactos dos instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e

regulação dos derivativos se centrou especificamente nos efeitos sobre o nível da taxa de

câmbio. O modelo abaixo se volta para a análise do impacto de tais regulações sobre a

volatilidade cambial, em comparação com outras intervenções adotadas contemporaneamente

no período entre outubro de 2009 e março de 2012. Seguindo a metodologia aplicada nos

demais estudos de caso, estimou-se um modelo GARCH (1,1) com as especificações abaixo:

𝑅𝐸𝑇𝑡 = 𝛽0 + 𝛽1𝑅𝐸𝑇𝑡−1 + 𝛽2𝐷𝐷𝐼𝐹𝑡 + 𝛽3𝐼𝑡 + 𝛽4𝑆𝑊𝐴𝑃𝑆𝑡 + 𝛽5𝑉𝐼𝑋𝑡 + 𝛽6𝐺𝐹𝐶𝐷𝑡 + 𝜀𝑡

𝜀𝑡~ 𝑁 (0, ℎ𝑡)

ℎ𝑡 = 𝛼0 + 𝛼1𝜀𝑡−1 + 𝛼2ℎ𝑡−1 + 𝛼3𝐷𝐷𝐼𝐹𝑡 + 𝛼4𝐼𝑡 + 𝛼5𝑆𝑊𝐴𝑃𝑆𝑡 + 𝛼6𝑉𝐼𝑋𝑡 + 𝛼7𝐺𝐹𝐶𝐷𝑡

Onde RET representa o retorno sobre a taxa de câmbio real/dólar; DDIF representa o

diferencial entre a taxa básica de juros (Over Selic) e a taxa livre de risco (LIBOR); I refere-se

às intervenções no mercado à vista; SWAPS é uma variável binária, na qual 1 corresponde às

datas de anúncio dos leilões de swaps reversos; GFCD é uma variável binária,onde 1

corresponde às datas de anúncio dos instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação

de derivativo e 𝜀𝑡é o termo de erro (com distribuição normal e média igual a zero). Ademais,

todas as séries foram submetidas a um teste de raíz unitária (Augmented Dickey Fuller), que

apontou não-estacionariedade apenas para a série DDIF – série integrada de ordem 1.

Assim como o caso sul-coreano, alguns resultados, apresentados na tabela 3.9

abaixo, contrariam as relações esperadas. Os instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e

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239

regulação de derivativos de câmbio possuem uma relação positiva com a volatilidade cambial,

enquanto as intervenções no mercado à vista e os swaps reversos são efetivos na contenção da

volatilidade (possuem uma relação negativa). Conforme ressaltado acima, o caráter não

efetivo das regulações no curto-prazo é compreensível, uma vez que tais medidas não são

acomodatícias, gerando, assim, mudanças bruscas nas posições dos agentes em moeda

estrangeira.

Tabela 3.9: Resultados Modelo GARCH (1,1)

Variável Coeficiente Prob.

DDIF. -1.22E-05 0.3759

I -8.09E-09 0.0000***

VIX 5.69E-07 0.0437**

SWAPS -1.28E-05 0.0003***

GFCD 3.62E-05 0.0120**

Fonte: Eviews

Nota: *** estatisticamente significante à 1%; ** estatisticamente significante à 5%;

*estatisticamente significante à 10%

C) Entrevista com agentes que operam no mercado de câmbio mexicano120

1. Além das dos bancos múltiplos, quais são as instituições autorizadas a receber

depósitos em dólares?

Resposta: Bancos de desenvolvimento.

2. De acordo com a Circular 3/2012, as pessoas jurídicas residentes no México e alguns

indivíduos podem manter uma conta em moeda estrangeira, mas a circular não trata

dos valores permitidos. Existe algum limite para o montante denominado em moeda

estrangeira?

Resposta: No México, apenas as pessoas jurídicas com domicílio no México podem ter contas

em dólares e pessoas físicas que se encontram na região de fronteira do norte (Estados Unidos

da América) e estados da Baja California e Baja California Sur. São depósitos em dinheiro

120

As respostas foram escritas em espanhol e traduzidas livremente pelo autor.

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240

com ou nenhum talão de cheques à vista. Não se regula os valores. Não há limites para os

depósitos.

3. As instituições de crédito e as casas de corretagem só estão autorizadas a manter um

risco de câmbio (posição descoberta) equivalente a 15% do capital básico, enquanto

que para as câmaras cambiais, o risco cambial não pode exceder seu capital

regulatório. Existe um limite também para outras instituições financeiras e não

financeiras?

Resposta: Bancos de desenvolvimento

4. Todas as instituições financeiras estão autorizadas a participar do mercado de câmbio

interbancário? As empresas não financeiras também estão autorizadas a participar?

Resposta: Somente as instituições de crédito (bancos múltiplos e de desenvolvimento) podem

participar. Para participar, eles devem solicitar que o Banco de México seja incluído na

determinação da taxa de câmbio.

5. Conforme os dados de 2016 do BIS, é possível estimar que o mercado peso / dólar é

grande nos mercados offshore. Para o que essa demanda externa pode ser atribuída

pela moeda mexicana? E quais são os principais canais de transmissão entre os

mercados onshore e offshore?

Resposta: O peso mexicanos é uma das poucas moedas conversíveis de mercados emergentes

e uma das mais liquidas do mundo. Por este motivo é usada como uma proxy para mercados

emergentes em geral, sendo utilizada para fins especulativos e para hedge.

6. Para realizar operações com derivativos, o Banco de México solicita que as

instituições cumpram 31 requisitos definidos na lei, que incluem, por exemplo, um

sistema de gerenciamento de riscos. Isso permite que todas as instituições financeiras

acessem o mercado de derivativos? Existe um limite para a posição de risco cambial

com esses instrumentos?

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Resposta: A existência do sistema de gerenciamento de riscos, que inclui os manuais de

operação e suporte, refere-se apenas ao cumprimento dos requisitos do Banco de México. Só

podem participar de operações com derivativos, de acordo com as regras do Banco do

México, instituições de crédito, casas de corretagem, instituições financeiras, fundos de

investimento, depósitos de depósito em geral e Sofoms regulados (com link de patrimônio do

banco). Quando os derivativos envolvem a taxa de câmbio, o mesmo limite de risco de

câmbio se aplica apenas às instituições de crédito e corretoras. Os outros tipos de entidades,

que estão em outros tipos de autorizações ou atividades, não precisam disso.

7. Quais são as principais diferenças (relacionadas aos objetivos da política cambial)

entre os leilões de dólares com e sem preço mínimo?

Resposta: Eles são praticamente iguais, com a diferença de que nos leilões com preço

mínimo, o preço (mínimo) é equivalente ao resultado da multiplicação da Taxa de Câmbio

(TC) publicada no dia útil anterior ao leilão pelos fatores determinados pelo comissão de

câmbio e previamente divulgados pelo Banxico. Enquanto os leilões sem preço mínimo, os

preços são determinados na chamada e não poderão exceder esse valor.

8. Existe alguma complementaridade entre a acumulação de reservas através de opções e

os fluxos de moeda da PEMEX? Por que a compra de divisas no mercado à vista não é

uma opção usada pelo Banco do México?

Resposta Não entendi o que se quer dizer por opciones no caso da Pemex. Se for referente aos

derivativos no balanco da companhia tendo como contraparte o Banxico, trata-se de

instrumentos de hedge de passivos e ativos em moeda estrangeira com diferentes prazos de

vencimento. Por isso estes instrumentos são mais recomendados que o spot, para casar fluxos

de caixa. O Banxico compra spot diretamente da Pemex em suas atividades de exportacão, e

de outras instituicões financeiras que operam no mercado de cambio como intermediaros de

empresas privadas e individuos. O Banco não costuma comprar ou vender spot diretamente do

mercado com o fim de acumular ou vender reservas ou influenciar a cotação do mercado de

cambio, sendo um agente mais passivo em relacão à oferta e demanda das instituições

privadas e da Pemex.

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242

Conclusão

Esta tese procurou avançar na análise da política cambial dos países emergentes,

no contexto dos regimes de metas de inflação e câmbio flutuante, a partir do referencial

teórico keynesiano-estruturalista, que enfatiza as assimetrias existentes entre as diferentes

moedas domésticas no SMFI contemporâneo e suas implicações. Para tanto, o primeiro

capítulo se dedicou inicialmente à revisão dos principais conceitos de política cambial,

sugerindo uma definição mais ampla, que considera todas as ações da autoridade monetária

que impactam a posição líquida em moeda estrangeira dos agentes participantes do mercado

de câmbio, incluindo, assim, os instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação do

mercado de derivativos de câmbio. A partir da definição e da taxonomia da política cambial, a

segunda parte do capítulo se dedicou à revisão bibliográfica acerca das origens dos

desequilíbrios externos que levam ao uso da política cambial neste regime macroeconômico

predominante.

As implicações das assimetrias foram analisadas por meio da aplicação da

equação do retorno dos ativos de Keynes para o mercado de câmbio, proposta por Andrade &

Prates (2013) e Kaltenbrunner (2015). De acordo com essa equação – equação (4) do primeiro

capítulo -, a diferença estrutural – e, portanto, estável no curto e médio prazos - entre os

prêmios de liquidez da divisa-chave e das diferentes moedas periféricas implica que a equação

de retorno das moedas periféricas está sujeita às variações dos diferenciais de custo de

carregamento (c-c*) – não considerados por Kaltenbrunner (2015) - e de rentabilidade (q-q*),

e das expectativas de apreciação das moedas periféricas (a). Tais variáveis, por sua vez, estão

sujeitas aos efeitos das assimetrias monetária e financeira , que podem impulsionar a

volatilidade do retorno das moedas periféricas e, portanto, suas respectivas taxas de câmbio.

Antes, porém, de aprofundar e especificar a interação entre a política cambial e (c-

c*), (q-q*) e (a), buscou-se, na terceira parte do primeiro capítulo, detalhar quais possíveis

restrições o diferencial do prêmio de liquidez (l-l*) impõe à política cambial dos países

emergentes. Dentre as diversas características da política cambial nesses países relatadas pela

literatura – ver Menkhoff (2013) e BIS (2013) –, algumas podem ser interpretadas como

implicações das assimetrias, tais como a maior frequência de intervenção, a assimetria no uso

das reservas internacionais – em razão do possível impacto da diminuição das reservas sobre a

vulnerabilidade externa – e a importância fundamental das metas (ou motivações) de política

cambial relacionadas ao objetivo da estabilidade financeira.

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243

O segundo capítulo investigou os condicionantes domésticos da política cambial

dos países da amostra. A escolha desses condicionantes se baseou nos termos que impactam a

equação de retorno – (c-c*), (q-q*) e (a) – e nas próprias entrevistas realizadas junto aos

Bancos Centrais pelo BIS (2005 e 2013). Os primeiros condicionantes são a abertura

financeira e a institucionalidade do mercado de câmbio, que impactam diretamente (c-c*) e

indiretamente os outros condicionantes – dependendo dos objetivos e metas da política

cambial -, a partir da interação com os instrumentos de intervenção. De maneira geral, os

países da amostra possuem um elevado ou moderado grau de abertura financeira e poucas

restrições nos mercados de câmbio. Alguns países, dentre os quais o Brasil, possuem

restrições nas operações nos mercados à vista e na abertura de contas em moeda estrangeira

(conversibilidade interna). Já alguns países asiáticos – Tailândia, Indonésia e Filipinas –

possuem restrições nas negociações nos mercados de derivativos de câmbio. Em relação à

liquidez, os mercados de derivativos de câmbio, especialmente os mercados forwards e de FX

swaps, aumentaram sua participação no volume total negociado nos mercados de câmbio

entre 1995 e 2016, especialmente nas praças offshore. Em alguns casos – como México,

Turquia e os países da Europa Central e do Leste – há uma assimetria de liquidez em favor

dos FX swaps, que fornecem funding de curtíssimo prazo em moeda estrangeira, fomentando

ainda mais as conexões dos mercados emergentes com os mercados financeiros globais.

A vulnerabilidade externa dos mercados emergentes, outro condicionante

escolhido, está vinculada à volatilidade da taxa de câmbio e seu impacto sobre a estabilidade

financeira. A melhora dos indicadores de solvência e liquidez externa dos países da amostra

no período de boom dos fluxos de capitais e preços das commodities pré-crise – por conta,

principalmente, da acumulação de reservas internacionais, da redução da dívida externa e da

expansão do comércio mundial – foi revertida na maioria dos países estudados após a CFG –

com exceção de Coréia do Sul e Filipinas. A deterioração desses indicadores se deu,

principalmente, pela escalada da dívida externa privada e dos investimentos de portfólio,

impulsionados pela baixa taxa de juros nos países centrais. Soma-se a esses fatores a

existência e/ou agravamento de outras dimensões da vulnerabilidade externa, tais como a

presença maciça de bancos estrangeiros nos sistemas financeiros domésticos – especialmente

nos países da Europa Central e do Leste – e a participação de investidores não-residentes nos

mercados de títulos públicos.

Já a relação entre a gestão da política monetária, outra especificidade escolhida,e a

política cambial é estreita no regime macroeconômico considerado. Essa conexão se

manifesta principalmente por meio do repasse cambial (pass-through) aos preços e da

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esterilização das intervenções dos bancos centrais nos mercados à vista. No que tange ao

repasse cambial, todos os países da amostra apresentam pass-through assimétrico, ou seja,

nos momentos de depreciação o repasse cambial aos preços se eleva. Tal fato pode limitar a

queda no diferencial de juros (q-q*) nos momentos de baixa do ciclo de liquidez

internacional, dependendo da política monetária nos países centrais, ou condicionar a escolha

do controle inflacionário como objetivo macroeconômico. Já em relação às esterilizações,

Brasil e Turquia absorvem a liquidez gerada pela compra de divisas no mercado de câmbio

por meio de operações compromissadas de curto prazo, utilizando títulos do tesouro federal,

enquanto a maioria dos demais países esteriliza suas intervenções por meio da venda

definitiva de títulos do Banco Central.

Por fim, o último condicionante doméstico considerado é o padrão de comércio,

que remete à relação entre taxa de câmbio e competitividade externa. Ou seja, ceteris paribus,

o efeito da taxa de câmbio sobre o fluxo de comércio dependerá da configuração do padrão de

comércio em cada país e sua integração às cadeias globais de valor. Países exportadores de

commodities e com baixa complexidade em suas exportações – caso de Brasil, Chile, Peru e

Colômbia – aprofundaram seu padrão de comércio em razão da apreciação de suas respectivas

moedas entre 2003 e 2008 e 2009 e 2011 combinada com a ascensão chinesa. Já o padrão de

comércio mexicano e dos países da Europa Central e do Leste - caracterizado pela integração

às cadeias de valor das empresas norte-americanas e alemãs, respectivamente, e pelo elevado

conteúdo importado de suas exportações - continuou dependente da dinâmica econômica dos

países aos quais estão integrados e do repasse cambial sobre os preços dos insumos

importados. No caso dos países asiáticos, a ascensão chinesa mudou a configuração do

comércio intra-regional, absorvendo grande parte de suas exportações, enquanto suas

importações possuem maior dependência – em relação aos demais países estudados – de

insumos básicos.

O detalhamento dos condicionantes domésticos, juntamente com o estudo do

condicionante estrutural no primeiro capítulo, conforma o referencial teórico e analítico da

tese. Assim, a análise da política cambial a partir dos quatro condicionantes supracitados

permitiu verificar, qualitativamente, se tal política atenuou os impactos do diferencial de

prêmio de liquidez sobre a taxa de câmbio, ou seja, seus diferentes impactos sobre (c-c*), (q-

q*) e (a), diminuindo ou não seu grau de autonomia em relação aos efeitos de (l-l*).

A aplicação do referencial teórico e analítico foi feita no terceiro capítulo por

meio dos estudos de caso, escolhidos de acordo com a relevância, em volume, dos seus

mercados onshore e offshore. Os casos brasileiro e sul coreano são marcados pela mudança na

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interação entre os instrumentos de política cambial e a institucionalidade do mercado câmbio

após a CFG. No caso brasileiro, a autoridade monetária interviu frequentemente, ao longo do

período estudado, por meio da compra/venda de dólar no mercado à vista e de leilões de

swaps cambiais (tradicionais ou reversos). O uso frequente de swaps cambiais pelo Bacen

respondeu às assimetrias regulatórias e de liquidez no mercado de câmbio, porém não

impediu as operações de especulação e arbitragem nesse mercado, além de estimular (no caso

dos swaps tradicionais) a entrada de fluxos de capitais de curto prazo. Após a CFG, o Bacen

lançou mão, entre 2009 e 2011, de instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e de

regulação do mercado de derivativos de câmbio, que impactaram diretamente as principais

operações de especulação e arbitragem, contribuindo, ao mesmo tempo, para a redução dos

fluxos de curto prazo. No entanto, o caráter assimétrico das regulações (concentradas nas

posições vendidas em dólar no mercado de derivativos) refletia o foco da autoridade

monetária na trajetória da taxa de câmbio. De fato, a análise empírica sobre a efetividade das

intervenções sugere que as regulações foram significativas na reversão da trajetória da taxa de

câmbio (especialmente as três últimas medidas) e não significativas na contenção da

volatilidade – contrariamente às intervenções via swaps, que foram efetivas na contenção da

volatilidade no período em análise. Dessa forma, a maior autonomia de política cambial,

alcançada pelos instrumentos de regulação, foi restrita apenas ao período de alta do ciclo de

liquidez internacional, já que a inexistência de regulação para as posições compradas nas

fases de baixa do ciclo impacta negativamente outros condicionantes, como a vulnerabilidade

externa.

A Coréia do Sul, por sua vez, alterou estruturalmente a condução de sua política

cambial após a crise, por conta dos efeitos deletérios das operações nos mercados de

derivativos de câmbio (envolvendo bancos domésticos, filiais de bancos estrangeiros e

empresas de exportação) sobre a estabilidade financeira no contexto do efeito-contágio da

CFG. As regulações sobre a posição dos bancos nos mercados de derivativos de câmbio

alteraram a institucionalidade do mercado de câmbio e diminuíram o grau de abertura

financeira e, consequentemente, contribuíram para a redução da volatilidade do won entre

2011 e 2015. Ademais, tais instrumentos foram determinantes para a redução tanto dos

indicadores de liquidez e solvência externa quanto do estoque de dívida externa privada,

reduzindo a vulnerabilidade externa e, portanto, alcançando o objetivo macroeconômico da

estabilidade financeira. Assim, ao responder ativamente aos condicionantes, a política cambial

sul-coreana ampliou sua autonomia para atuar em favor de objetivos domésticos.

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Já a Turquia não alterou estruturalmente a interação entre a política cambial e os

condicionantes, porém promoveu mudanças nos instrumentos utilizados após a CFG, em

razão da escalada da vulnerabilidade externa, provocada, principalmente, pelo aumento da

dolarização dos depósitos e empréstimos e pela deterioração da conta de transações correntes.

Dessa forma, a adoção do ROM e do corredor assimétrico da taxa de juros buscou lidar com

os impactos da fase de alta do ciclo de liquidez internacional sobre a taxa de câmbio e,

consequentemente, sobre os passivos parcialmente dolarizados dos agentes. De fato, a análise

empírica sugere a efetividade do ROM em conter a volatilidade da taxa de câmbio e as

pressões para a apreciação excessiva da lira. No entanto, tal instrumento é market friendly, ou

seja, não restringe as operações de especulação e arbitragem e não reduz de maneira perene a

dolarização. Portanto, o espaço de atuação do BRCT no mercado de câmbio pouco se alterou,

já que a manutenção da elevada vulnerabilidade externa - combinada com a relação estreita

entre política monetária e política cambial – confere pouca autonomia para a política cambial

buscar objetivos domésticos.

Diferentemente dos outros três países, o caso mexicano é caracterizado pela

continuidade na condução da política cambial, independentemente do comportamento dos

condicionantes. Assim, as intervenções se concentraram nos leilões de venda dólares no

mercado à vista, com o objetivo explícito de diminuição do custo de manutenção das reservas

internacionais e implícito de atenuar os efeitos do repasse cambial sobre os preços

domésticos. Tais instrumentos, portanto, não responderam ao aumento da participação dos

investidores não-residentes nos mercados de títulos públicos e à mudança na composição da

conta financeira em favor dos fluxos de portfólio. Um dos possíveis reflexos dessa

continuidade é a não efetividade das intervenções (leilões de venda de dólares no mercado à

vista) em conter a volatilidade do peso após a CFG.

Três considerações gerais emergem da aplicação do referencial analítico nos

estudos de caso. A primeira aponta que a redução da abertura financeira via institucionalidade

do mercado de câmbio é condição necessária para se alcançar um maior espaço de política

cambial. Tal conclusão torna pertinente, portanto, a ampliação do conceito de política cambial

proposto no início do primeiro capítulo. Ou seja, os instrumentos de gestão dos fluxos de

capitais e regulação do mercado de derivativos de câmbio são parte fundamental de uma

política cambial que visa não apenas atenuar os efeitos das assimetrias do SMFI sobre a

volatilidade da taxa de câmbio, mas também buscar maior autonomia na definição de seus

objetivos macroeconômicos.

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A segunda atesta para a dificuldade dos instrumentos market friendly em alcançar

maior espaço de política cambial, mesmo sendo efetivos na contenção da volatilidade cambial

no curto prazo. Isso ocorre pois tais instrumentos - como os swaps cambiais e o ROM,

utilizados no Brasil e na Turquia respectivamente – não limitam a construção de posições

especulativas em moeda estrangeira e, portanto, não diminuem a suscetibilidade desses países

– e suas respectivas políticas cambiais - ao contágio dos movimentos do ciclo de liquidez

internacional.

A terceira aponta para a relação entre a política cambial que responde ativamente

aos condicionantes e sua efetividade no curto prazo. Ou seja, nem sempre a política cambial

mais adequada será efetiva em conter os efeitos da volatilidade cambial no curto prazo, como

mostram os casos de Brasil e Coréia do Sul. Uma possível interpretação para esse resultado é

a volatilidade de curto prazo nas posições em moeda estrangeira dos agentes gerada pelo

constrangimento das operações de especulação e arbitragem. Tais resultados revelam a

necessidade de se pensar em combinações de instrumentos de políticas cambiais com

horizontes temporais diferentes, como fez a Coréia do Sul, na adoção, ao mesmo tempo, de

instrumentos de regulação e acumulação expressiva de reservas internacionais, e o Brasil, na

utilização de instrumentos de regulação e swaps cambiais entre 2010 e 2011.

Esta tese avançou, portanto, na construção de um referencial analítico para

política cambial a partir da perspectiva keynesiana-estruturalista. O detalhamento e

sistematização desse referencial contribuíram não apenas para a readequação do conceito de

política cambial – que se mostrou pertinente nos estudos de caso -, mas também para a

constatação do papel central que essa política assume numa situação de “dualidade

impossível”. Isto porque, a busca de um maior grau de autonomia de política cambial é

condição necessária para obtenção de um maior grau de autonomia de política monetária. Por

fim, as contribuições supracitadas não esgotam a agenda de pesquisa keynesiana-

estruturalista, que pode ser explorada a partir da aplicação do referencial proposto em estudos

de caso dos demais países da amostra e no desenvolvimento de um referencial analítico

também para a política monetária dos países emergentes sob essa mesma perspectiva teórica.

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