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Tony Estwood Arquivo Paulo Sampaio Vito Cedini Denir L.Camargo Gianfranco Beting Gianfranco Beting Abertura Ponte Aerea - Gianfranco.p65 8/3/2007, 15:01 2

Ponte_Aerea

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por: Gianfranco Beting

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Ao completar 70 anos, vôos regulares sem escalas entreRio de Janeiro e São Paulo fazem parte da história nacional.

O que nem todos sabem é que um dia três empresas brasileiras,ferrenhas competidoras, uniram-se e criaram um serviço inédito,

que de tão moderno, eficiente e lógico, depois viria a ser copiadoem outros países. A revista Flap presta agora uma homenagem

a uma invenção 100% brasileira: a Ponte Aérea.

Ao completar 70 anos, vôos regulares sem escalas entreRio de Janeiro e São Paulo fazem parte da história nacional.

O que nem todos sabem é que um dia três empresas brasileiras,ferrenhas competidoras, uniram-se e criaram um serviço inédito,

que de tão moderno, eficiente e lógico, depois viria a ser copiadoem outros países. A revista Flap presta agora uma homenagem

a uma invenção 100% brasileira: a Ponte Aérea.

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NASCE A LIGAÇÃO AÉREA ENTRESÃO PAULO E RIO

No dia 5 de agosto de 1936, às 8h35 damanhã, os motores BMW de dois Junkers Ju-52-3m começaram a girar. O PP-SPD, batizadode “Cidade de São Paulo”, iniciou o táxi parao campo do recém-inaugurado Aeroporto deCongonhas. A bordo, lotação completa: trêstripulantes e 17 passageiros. Ao mesmo tempo,o outro Junkers, o PP-SPE, “Cidade do Riode Janeiro”, iniciou o táxi no aeroporto doCalabouço, hoje Santos Dumont. Manetesabertas, os Junkers vagarosamente foram ga-nhando velocidade, suas fuselagens de alumíniocorrugado brilhando sob o sol, até que final-mente decolaram. Nascia naquele momentoa mais movimentada, disputada e prestigiosarota da aviação comercial brasileira: a ligaçãoaérea dos 373 quilômetros que separamSão Paulo do Rio de Janeiro.

Ao cabo de 100 minutos de vôo, tempo mé-dio de duração da jornada a bordo dos Junkers,as serras, praias e rios entre as duas cidadesdeixaram de ser obstáculos. Converteram-senum espetáculo visível através das janelinhasdos Junkers, que voando a 250 quilômetros/horaeram muito mais rápidos do que os trens, quegastavam 15 horas de viagem. Ou até dois diaspara fazer o trajeto de carro, numa precáriaestrada de terra.

A bordo desses dois vôos históricos viajavamconvidados ilustres. Em São Paulo, embarcaramo prefeito da cidade, Fábio Prado, e o aviadorEdu Chaves, entre outros. No Rio de Janeiro,o presidente da Vasp, Adalberto Bueno Netto,e José Bento Ribeiro Dantas, que se tornaria

A orgulhosa Vaspanuncia o início e,depois, o aniversáriodas ligações aéreasentre São Paulo e Rio.

Os dois Junkersque inauguraramos vôos entreas duas maiorescidades do Brasil.

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presidente da Cruzeiro do Sul e então erarepresentante comercial da Vasp no Rio.

Mas como este é mesmo um país singular,justo na inauguração desta rota algo de únicoaconteceu: os dois Junkers acidentaram-sedurante o pouso. O PP-SPD chocou-se com umapequena construção no pátio. O PP-SPE atrope-lou algumas carretas perdidas no meio docampo. Acabaram ligeiramente danificados,assim como a reputação de seus pilotos, todoseles alemães. As aeronaves só voltaram a voarem novembro daquele ano. A partir de então,vôos regulares foram inaugurados seis vezes porsemana. Em julho de 1937, a Vasp inaugurouum segundo serviço diário em cada sentido,ampliado em 1939 para três vôos de ida e voltapor dia. Em 1940, a Panair do Brasil entrou

na rota, operando diariamente com aeronavesLockheed Electra 10E com capacidade para dezpassageiros e dois tripulantes. Na mesma época,o Sindicato Condor, nacionalizado em 1942 edesde então conhecido como Serviços AéreosCruzeiro do Sul, já voava na rota.

Após o fim da Segunda Guerra, a aviaçãocomercial cresceu vertiginosamente no Brasil.Novas empresas surgiram, aproveitandoo material excedente de guerra, que colocouno mercado algumas centenas de aeronavesa preços convidativos e, principalmente, ospilotos formados para a ativa e reservada FAB. Em questão de meses, muitas ou-tras companhias passaram a disputar passa-geiros entre Rio e São Paulo: Aerovias Brasil,Linhas Aéreas Brasileiras - LAB, Linhas AéreasNatal, Linhas Aéreas Paulistas - LAP, LóideAéreo Nacional, Real e Varig. Os tipos deaeronaves utilizadas na rota eram quase tãovariados quanto suas operadoras: os conhe-cidos Douglas DC-2, DC-3/C-47, DC-4;os robustos Curtiss C-46 Commando e atéaeronaves menos conhecidas, como o Bristol170 Wayfarer.

COMPETIÇÃO É A MÃE DAINVENÇÃO

O pós-guerra e os anos 1950 de formageral foram tempos de novas oportunidades,com um número incrível de novas empresasaéreas sendo fundadas. Entre dezenas deempresas surgidas, uma detacava-se dasdemais pela rapidez estonteante de seucrescimento: a Real - Redes Estaduais AéreasLtda. Seu primeiro vôo foi realizado no dia

Cena nostálgicado Santos Dumontnos primeiros anosda ponte, no inícioda década de 1960.

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7 de fevereiro de 1946, operando entreCongonhas e Santos Dumont. Pilotava aaeronave o comandante Linneu Gomes, umdos proprietários da empresa, que temposdepois viria a ser o presidente da companhia.Nos anos seguintes, a Real, impulsionadapelo dinamismo e atrevimento de Linneu,escreveria um dos capítulos mais espetacula-res da história de nossa aviação.

Ao ser fundada, a Real tinha uma frota dedois Douglas C-47 e logo no primeiro ano jáoperava quatro vôos de ida e volta entreSão Paulo e Rio de Janeiro. Em 1948 a empre-sa iniciou sua decolagem ao adquirir uma con-corrente, a Linhas Aéreas Wright. Dois anosdepois foi a vez da Linhas Aéreas Natal e, comessas duas adições, a frota da Real chegoua 20 Douglas DC-3/C-47. A sede de crescer deLinneu estava longe de se esgotar. Com a com-pra da Transcontinental Brasileira em 1951,da Aerovias Brasil em 1954 e da Nacional em1956, a frota da Real chegou a 117 aviões.Entre eles 86 Douglas DC-3/C-47, maior frotado mundo desses modelos, além de seisConvair 340 e 12 Convair 440 Metropolitan.

Com menos de nove anos de vida, aReal já era a maior empresa aérea do Brasil.Ocupava o sétimo lugar no ranking da IATA,a mais alta posição já ocupada por umaempresa aérea brasileira. Somente na ligaçãoentre Rio e São Paulo, a empresa operava15 vôos diários em cada sentido, líder incon-testável na rota. Ousada, a Real fazia de tudopara conquistar novos passageiros. Práticascomo pagar um “cafezinho” aos carregadoresde malas dos aeroportos que conseguissemconvencer os passageiros, no trajeto entre as

calçadas e os guichês e balcões, a trocar seusbilhetes de outras empresas por vôos na Real.

DECOLA UMA REVOLUÇÃOCorria o ano de 1959. O Brasil de Juscelino,

da bossa nova, do tergal e da calça rancheiroexperimentava ares de renovação cultural, eco-nômica e social. O futuro chegaria em cincoanos ao invés de 50, prometia o presidente JK.São Paulo já era a maior cidade do Brasil, suaimportância crescendo junto com sua industria-lização. O Rio era a capital federal e centropolítico e cultural do país. A ligação entreas duas cidades era o verdadeiro eixo ao redordo qual o país se movia.

Ações mais agressivas como as praticadaspela Real não passavam despercebidas pelasconcorrentes. Em princípio de 1959, trêsgerentes no Aeroporto de Congonhas, CarlosIvan Siqueira (Varig), Juarez Xavier de Aze-vedo (Cruzeiro do Sul) e Antônio Deléo(Vasp), começaram a se preocupar com essase outras táticas da Real. Num fim de tarde,reuniram-se numa mesa do restaurante doaeroporto, gravatas afrouxadas, discutindo aspráticas heterodoxas da Real. Concluíram queprecisavam trabalhar em conjunto para deteros avanços da empresa de Linneu.

Mas havia outro motivo para sugerir umamaior união entre essas três empresas.Em 1959 aconteceu uma cisão política. Vasp,Cruzeiro e Varig haviam se desligado do SNEA- Sindicato Nacional de Empresas Aéreas,ao passo que a Real, a Panair e o Lóidepermaneceram afiliadas.

Combinadas, Vasp, Cruzeiro e Varig ope-

Partida paraSão Paulono vôo daponte aéreadas 14h30.

Interior doConvair240: maisconfortáveldo que hoje!

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ravam mais de 25 vôos ao dia com destinoao Rio de Janeiro. O problema é que os vôosdas três empresas muitas vezes decolavampara a Cidade Maravilhosa simultaneamente,com baixa ocupação. A seguir, passavam-seaté duas ou três horas sem que outrosvôos saíssem rumo ao Rio. Não faria maissentido coordenar as decolagens evitandoa sobreposição? Melhor ainda: não seriapossível permitir aos passageiros embarcarno primeiro vôo disponível, sem necessidadede trocar ou ter de fazer reserva, fosse qualfosse a empresa? Eureca: nascia um conceitotão genial que, tempos depois, seria copiadono mundo inteiro.

Siqueira, Azevedo e Deléo perceberamque a idéia trazia várias vantagens. Parao passageiro, que teria liberdade para embar-car no primeiro lugar disponível, esperandoo mínimo de tempo no solo. E, claro, para astrês empresas aéreas, que voariam commenos lugares vazios. Assim e sem contarcom autorização prévia das respectivas dire-torias, os três gerentes de aeroporto come-çaram a agir. Retardando alguns vôos,fusionando outros, ajeitando um pouquinhoaqui e acolá, foram na prática moldandoas operações de maneira a escalonar racional-mente as freqüências. Concordaram emeliminar a necessidade de endossos entre si.Ao final do dia, as três empresas reuniam-se e“ajeitavam” a receita em caixa, casando o fatu-ramento com o número de passageiros efeti-vamente transportados por cada uma.

Da noite para o dia, os aviões das três com-panhias começaram a sair lotados. Passagei-ros que antes tinham de esperar até três,

quatro horas, passaram a embarcar em minu-tos, no primeiro vôo disponível. Essa genialidéia acabou sendo “descoberta” por umpassageiro muito especial. Ao chegar numamanhã ao aeroporto de Congonhas, foiinformado que poderia embarcar num Scandiada Vasp que sairia minutos depois, ao invésde ter de esperar mais de uma hora peloConvair da Varig onde tinha lugar marcado.Esse viajante surpreendeu-se com as explica-ções do pessoal de terra e aprovou de imedia-to a idéia. O passageiro era Ruben Berta.

NASCE A PONTE AÉREADias depois dessa surpreendente expe-

riência, Berta reuniu-se nos escritórios daCruzeiro do Sul, no Rio de Janeiro, comos presidentes da Vasp, brigadeiro OswaldoPamplona, e da própria Cruzeiro, Dr. JoséRoberto Ribeiro Dantas.

Berta expôs o plano e sugeriu que astrês empresas adotassem oficialmente o queos três gerentes faziam em Congonhas infor-malmente. O conceito foi imediatamenteaprovado. Secundados por assessores, os trêspresidentes elaboraram a toque de caixa umplano de ação, apresentado dias depois aobrigadeiro Dario Azambuja, então diretor-geraldo DAC. As empresas fizeram um pedidoexpresso ao DAC: sigilo total. A Real nãopoderia saber nada de antemão sobre essainvenção. Depois de analisar cuidadosamenteos planos das três empresas, o DAC deu luzverde para o início da nova operação.

Nas semanas seguintes, as equipes dirigidaspor Siqueira, Azevedo e Deléo empenharam-se

O DC-6 erautilizadona ponteem vôosde trânsito.

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nos preparativos comerciais e operacionais. Emsigilo, na madrugada de 5 de julho de 1959,construíram, literalmente da noite para o dia,guichês nos saguões de Congonhas e SantosDumont. Com o dia raiando, colocaramletreiros com uma modernosa logomarca, umabossa nova aeronáutica que iria mudar opanorama da aviação brasileira. Com a deco-lagem de um Convair 240 da Varig rumo aoRio de Janeiro, nascia a ponte aérea.

Diz a lenda que o nome foi sugerido pelopróprio Berta. A inspiração teria vindo dotermo air bridge, cunhado pelos norte-ameri-canos durante a operação aérea que permitiua sobrevivência de Berlim Ocidental cercadapelos soviéticos nos anos após o término daSegunda Guerra. Assim, oficialmente, nodia 6 de julho de 1959 nasceu a ponte aérea.As três empresas começaram a ligar as duasmaiores cidades do Brasil com vôos esca-lonados alternadamente a cada 30 minutosdurante o dia, com redução pela metade dasfreqüências no período noturno e nos finsde semana. Nos horários de pico, o intervaloentre os vôos podia ser até inferior aos

30 minutos. Os equipamentos utilizados ini-cialmente foram o Convair 240 pela Varig(40 assentos), os Convair 240, 340 e 440 pelaCruzeiro (de 40 a 44 assentos) e o SaabScandia pela Vasp (32 ou 36 assentos).

Promovendo a novidade numa época emque tudo era novo, uma campanha publicitáriafoi lançada, com anúncios em jornais, revistase até comerciais na TV. Um dos filmes tinhacomo protagonistas, ou melhor, “garotos-propaganda”, um casal formado por um joveme franzino ator que contracenava com umabela moçoila: Walmor Chagas e Eva Wilma.

A Real foi pega desprevenida, mas reagiuimediatamente. Linneu contra-atacou coma Super Ponte Real, utilizando os confortáveisConvair 440 Metropolitan de 52 assentos.No melhor estilo “bateu-levou”, Linneuafirmou para a imprensa: “se essa tal de

ponte aérea colocar vôos de meia em meiahora, a Real vai fazer vôos a cada 15 minu-tos”. Bravatas à parte, deu no que deu: aSuper Ponte Real durou apenas alguns meses;a ponte aérea mais de 40 anos.

CONSOLIDAÇÃO E EVOLUÇÃOO serviço foi um sucesso imediato.

Em 1960, primeiro ano cheio de operaçãoda ponte, o total chegou a 387.735 passagei-ros. No ano seguinte, aconteceu umagrande reviravolta no mercado doméstico.A Varig absorveu a Real, transformando-se namaior empresa aérea do Brasil e efetivamenteacabando com a competição na ponteaérea. Para se ter uma idéia da importânciadessa aquisição, que mudou completamenteo cenário da aviação brasileira, basta exami-

Convair e,depois,Electra: osdois principaistipos a héliceque a Varigusou na ponte.

Os Connie daPanair não

voaram muitotempo na ponte.

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nar a divisão de mercado entre as principaisempresas aéreas brasileiras em 1960. Num sógolpe, a Varig passou a dominar metadeda aviação comercial brasileira, percentualque, com pequenas alterações, manteria atéos anos 1990.

Em 1964, outras mudanças. Duas novasparceiras entraram no pool de empresas: aPanair do Brasil e a Sadia, operando respecti-vamente com o Lockheed L-049 Constellatione o com o Handley-Page Dart Herald. Foraminaugurados também os Vôos Econômicos,oferecendo 30% de desconto, utilizandoequipamento Super C-46 Commando (Varig) eDC-4 (Vasp). Esses serviços duraram apenasalguns meses. Com a súbita “falência” daPanair em 1965, um remanejamento decapacidade foi instituído, divisão que seriainalterada até 1990: a Varig ficou com 52%,a Vasp com 22%, a Cruzeiro com 19% e aSadia, depois Transbrasil, com os 7% restantes.

ARES DE RENOVAÇÃOEstávamos em meados dos anos 1960

e os aviões a pistão já eram considerados ob-soletos. Com exceção dos L-188 Electra daVarig, os motores radiais a pistão erammaioria absoluta. As empresas operadorasda ponte perceberam que era preciso renovarsuas frotas e começar a substituir os velhosConvair e Scandia por aeronaves turboélice.A primeira a colocar um novo avião na linhafoi a Cruzeiro, que em julho de 1967 recebeuo PP-CTA, primeiro de quatro NAMC YS-11Aarrendados e depois complementados poroito aeronaves do tipo adquiridas diretamentedo fabricante. Depois foi a Varig, que enco-mendou dez Hawker Siddeley HS-748,conhecidos aqui como Avro. A pioneira optou

pelo turboélice inglês depois de testar emserviço uma aeronave (PP-VJQ) por umperíodo de dois meses, entre dezembro de1965 e janeiro de 1966. O primeiro a integrardefinitivamente a frota da Varig, matriculadoPP-VDN, foi entregue em outubro de 1967.

Finalmente foi a vez da Vasp. A empresa,que desde 1963 empregava na ponte osViscount 701, optou pelo mesmo tipo de aero-nave selecionado pela Cruzeiro. Em outubrode 1968 a empresa paulista recebeu o PP-SMI, seu primeiro YS-11, chamado pela Vaspde Samurai. Em 1970, um último tipo deturboélice foi incorporado pelo pool de empre-sas operando a ponte. Com a quebra daParaense em 29 de maio de 1970, o governofederal recebeu quatro Fairchild Hiller FH-227,de 44 assentos, herdados pela União damassa falida da empresa. As aeronaves foramarrendadas pelo pool ao preço (unitário) de11 mil dólares ao mês, rateados proporcional-mente à oferta entre os participantes. Pordecisão das próprias operadoras, a Varig foiencarregada de restaurar e operar as aerona-ves, que acabaram pintadas nas cores básicasda pioneira, sem contudo trazer títulos oulogomarcas. Os aviões foram operados portripulações da Varig exclusivamente na ponteaérea. E, embora fossem conhecidos pelonome de batismo criado pela extintaParaense, Hirondelle, o apelido que pegoufoi Boko Moko, um personagem famoso emcomerciais de guaraná da época.

NASCE UM SOBERANOOs anos 1970 começaram com seis tipos

de aeronaves servindo na ponte. A Vasp comos Viscount 701 e Samurai; a Cruzeirocom o YS-11; a Sadia com o Dart Herald; aVarig com os HS 748 Avro, FH-227 Hirondellee, principalmente, com uma aeronave cujahistória seria para sempre associada à ponteaérea: o Lockheed L-188 Electra.

O Scandiafoi o principalequipamentoda Vasp nosprimeiros anosdos serviços.

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Desde 1962, quando chegaram ao Brasil,os Electra da Varig já eram utilizados na ponte.Inicialmente, apenas em três ligações diáriasem cada sentido. Desde o princípio, já eram osmaiores, mais velozes e confortáveis entretodos os equipamentos em operação na rota.

Em 1973, dois acidentes fatais envolvendoos Samurai da Vasp atraíram as atenções daopinião pública e das autoridades. Logoapós os desastres, começou a ganhar corpouma nova idéia para os serviços da ponte: apadronização de equipamentos. Em 1975,a Varig começou a receber uma frota de dezjatos Boeing 737-200, substituindo nos serviços

domésticos parte de sua frota de dez Electra.O DAC juntou dois mais dois e decretouque a partir de 1º de março de 1975 todos osoperadores da ponte aérea se viam obrigadosa operar somente aeronaves turboélice equadrimotores. A Vasp poderia utilizar seusViscount V827 e a Varig, seus Electra. No casoda Sadia e da Cruzeiro, que não possuíamequipamento com essas características, umasolução se fazia necessária. Cogitou-se naépoca que as duas empresas poderiam até vira comprar Electra. No fim das contas, Sadiae Cruzeiro passaram a arrendar os Electrada Varig, que eram operados com tripulaçãotécnica da companhia gaúcha e tripulaçãode cabine das próprias empresas do pool.Em 15 de novembro de 1975, quando a Vaspdesativou o seu último Viscount V827 (PP-SRH) de 85 lugares, a ponte aérea passou aser exclusivamente servida pelos Electra,que comportavam até 90 passageiros. Justa-mente naquele ano, a marca de 1 milhão depassageiros transportados ao ano foialcançada ou, mais precisamente, 1.014.305passageiros usaram a ponte em 1975, nadamenos que 2.778 viajantes por dia.

Nesse mesmo ano, a Fundação RubenBerta, controladora da Varig, adquiriu a Cruzei-ro do Sul. Somando os percentuais de partici-pação na ponte aérea de ambas, o grupoVarig ficou com nada menos que 71% da maismovimentada e lucrativa rota nacional. Na prá-tica, era agora a ponte aérea uma operação divi-dida entre três empresas, mas a ponte seguiuoperando com os códigos das quatro compa-nhias: Cruzeiro (SC), Varig (RG), Vasp (VP) eTransbrasil (QD, depois alterado para TR).

Operação digna de respeito e de altoprestígio, diga-se. E quando há tanto prestígioenvolvido, ciúme e diferenças acabamaflorando entre os participantes. As duassobreviventes, Vasp e Transbrasil, exigiram

A ponte investiuem propagandanos primeirosanos de suasoperações –enquanto teveconcorrência.

Viscount 701,ou “Vaiquinho”,um dosveteranos naponte.

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junto à Varig que a pintura dos Electra deve-ria ser alterada para um padrão neutroou eventualmente para uma pintura própria,exclusiva da ponte aérea. Ficou acertadoentão que quatro aeronaves teriam os logo-tipos e logomarcas da Varig apagadas, semapresentar identificação de empresa alguma,apesar de ainda manterem a pintura básicada Varig. Assim, entre 1975 e 1979, quatroaeronaves (PP-VLC, VJN, VJU, VJW) voaramsem o Ícaro e a rosa-dos-ventos nas derivas.

Pode-se dizer que esta foi a época deouro da ponte. Em primeiro lugar, porque apadronização de aeronaves proporcionava

não durou muito, apesar de ser relativamentepopular. Mas competição mesmo só começa-ria dois anos depois, com o surgimento doschamados Serviços Complementares,autorizados pelo DAC. Em 11 de setembro de1989, uma então pequena mas ambiciosaempresa regional, que lembrava um poucoa Real de Linneu Gomes, entrou no disputadomercado entre Santos Dumont e Congonhas.Essa empresa era também dirigida por umambicioso presidente, a exemplo de Linneu.Uma vez concedida a autorização para ope-rar, a companhia inaugurou seu próprio ser-viço, chamado pela empresa de... Adivinhe?

maior eficiência operacional. Isso sem falar notradicional excelente serviço de bordo da Varig,no espaço pessoal inigualável a bordo dosveteranos Lockheed e, não menos importante,na segurança operacional dos inesquecíveisElectra. O sucesso era tal que, para fazerfrente à crescente demanda, em 1977 aVarig comprou mais dois Electra. Chegaramdiretamente da Colômbia o PP-VLX e PP-VLY,anteriormente operados pela Aerocondor.Em 1986, vieram os dois últimos, PP-VNJe VNK, anteriormente operados pela Tamedo Equador. Em dias de pico os 14 Electraoperavam até 66 vôos diários, 33 emcada um dos sentidos.

UM POUCO DE COMPETIÇÃOEm abril de 1987, a ponte aérea iniciou

uma nova ligação, entre Congonhas eGaleão, utilizando Boeing 737-300 da Vasp.A “pontinha”, como foi chamada na época,

A Sadiaentrou nopool com oturboéliceDart Herald.

O Corujão”foi um dosprimeirosserviços daSadia na linha.

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Super Ponte TAM. Só faltou batizar um dosdois F.27 Mk. 600 dedicados ao serviço (PT-LAJ e PT-LAK) de comandante Linneu Gomes...O fato é que seu presidente, o comandanteRolim Adolfo Amaro, sabia que seus F.27 nãoeram páreo para os Electra. Tratou então dediferenciar seu serviço. Pela primeira vez,colocou os comandantes na porta dos aviões,recebendo os passageiros, literalmente, comtapetes vermelhos estendidos. A bordo, uísqueescocês, vinhos e tábuas de queijos, pãese frios, pois as galleys dos Fokker não tinhamfornos. O fato é que, com seis vôos diários emcada sentido, pela primeira vez a TAM se feznotar perante o público mais qualificado avoar no céu brasileiro.

A Rio-Sul também entrou na rota,em janeiro de 1990, escrevendo uma páginaespecial: foi a primeira (e até hoje única)empresa aérea brasileira a operar comum equipamento nacional na linha. Inicial-mente, utilizou os EMB-120 Brasilia nasligações, batizadas pomposamente de TopService Rio-Sul Nova Geração. Nos folhetose anúncios promovendo o novo serviço, aempresa não especificava o modelo utilizado.Dizia apenas que as viagens eram feitas em“modernas aeronaves turboélices”.

A Rio-Sul ainda escreveria uma outra páginabonita da história das ligações entre São Pauloe Rio. No dia 6 de abril de 2002, precisamenteàs 7h42, com a decolagem do Embraer ERJ-145 de matrícula PT-SPO de Congonhas paraSantos Dumont, a empresa do grupo Varig

Os saudososAvro da Varigsubstituíramos Convair 240na ponte.

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inaugurou os primeiros serviços a jato operadospor aeronaves brasileiras na ponte. Lotado, ovôo SL 9579 pousou em Santos Dumont às8h18, cumprindo a etapa em 35 minutos de vôo.Ao mesmo tempo que o PT-SPO decolava deCongonhas, o PT-SPJ operava no sentidoinverso, completando o vôo Rio-Sul 9560 às9h28, após 40 minutos de vôo.

CREPÚSCULO DOS ANOSDOURADOS

Nada é eterno, nem mesmo os Electra.A manutenção dos Electra ficava cada vezmais cara e freqüente. Uma alternativa preci-sava ser buscada para substituir os venerandosquadrimotores. A Boeing queria vender seusjatos 737-300 e não economizou esforços paraprovar que o jato poderia operar em seguran-ça no Santos Dumont. Em setembro de 1984,já havia realizado vôos de demonstraçãocom o 737-300 de prefixo N309P, nas coresda empresa norte-americana Piedmont.Na ocasião, o 737 realizou uma série de vôosentre Congonhas e Santos Dumont, transpor-tando jornalistas e executivos das empresasaéreas brasileiras. Em 1986 tanto a Vaspcomo a Transbrasil receberam seus primeiros737-300 e imediatamente começaram apressionar o DAC para que autorizasse

a operação dos jatos na ponte. Junto com osjatos, as empresas pleiteavam maior participa-ção na divisão dos resultados da ponte.

A Varig, que começou a receber seuspróprios 737-300 em 1987, tratou de buscaruma opinião isenta para definir se seriamseguras ou não as operações dos 737-300 naponte. Contratou a Flight Safety Foundation(FSF) para que esta estudasse tecnicamenteo assunto e desse um parecer isento, definitivo.Ao cabo de meses, tendo, inclusive, deslocadoum 737-300 para vôos de teste, a FSF deu seuparecer: com pista seca, as operações no SantosDumont eram “marginais”. Com pista molhada,a FSF concluiu que as condições de segurançaeram “questionáveis”. Ou seja: com pistamolhada, a FSF não recomendava a utilizaçãodos 737 com o tipo de asfalto com baixo poderde fricção usado nas pistas de SDU na época.

Mas o crescimento projetado de tráfego,cedo ou tarde, decretaria a necessidade deevolução. Estudos feitos pela Varig na épocademonstravam que, mantidas as taxas decrescimento do tráfego de então, por voltade 1995 seriam necessárias decolagens comintervalos de 15 minutos no máximo, umaimpossibilidade de ordem prática. O fimdo Electra foi definido quando em 1990 aspistas do Santos Dumont e de Congonhasreceberam uma nova cobertura asfáltica, dealta porosidade e capacidade de escoamentode água, além de maior capacidade de fricção,características capazes de diminuir sensivel-mente as corridas de pouso das aeronaves.Os presidentes Wagner Canhedo, da Vasp,e Omar Fontana, da Transbrasil, fecharam ocerco ao DAC, pressionando para colocaros Boeing na rota. Essa pressão política, oasfalto novo e o crescimento no número depassageiros fizeram com que a inevitáveldecisão fosse tomada: sai Electra, entra jato.

ADEUS VELHO GUERREIROChegou o dia 11 de novembro de 1991,

uma segunda-feira. A bordo do 737-300 deprefixo PP-SOL, comandado por Adilson Dias eJoão Flávio Guião Leite, embarcaram convida-dos ilustres como o Rei Pelé e Malu Mader.Às 6h33, o vôo Vasp 601 iniciou o push-backno pátio de Congonhas. Às 6h39, o Boeingdecolou da pista 17 e, exatamente 37 minu-tos depois, às 7h16, suas rodas tocavam apista 02R no Santos Dumont. A era do jatohavia chegado definitivamente à ponte aérea.No aeroporto carioca, a primeira decolagemfoi da Varig. O 737 de prefixo PP-VOT,pilotado pelos comandantes Braga e Mattos,decolou pontualmente às 7h00 e, 43 minu-tos depois, tocava em solo paulistano.Ao final daquele dia, foram operados 16 vôoscom Boeing 737, oito serviços em cadasentido. Juntos, esses dois Boeing decretaramo início da aposentadoria dos Electra no Brasil.

Gradativamente, os Electra foram sendoretirados de serviço e levados aos hangares da

“Vaicão”, o V827da Vasp, foio derradeiromodelo operadopela empresano pool.

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Varig em Porto Alegre e Congonhas. O primei-ro a sair de operação foi o PP-VLA, em 17 denovembro. Depois, o PP-VJV e o PP-VLY. Em 26de novembro, a Transbrasil colocou o PT-TEHna ponte aérea, no lugar de mais um Electra.

Os estudos da época previam que os14 Electra utilizados na ponte (oito voando,um de reserva em cada ponta e mais quatrono solo, em manutenção ou rodízio operacio-nal) teriam de ser substituídos por dez Boeing737-300, sendo cinco da Varig, três da Vaspe dois da Transbrasil. O número de aeronavesde cada empresa também representariaa nova partilha no faturamento dos vôos daponte: Varig com 50%, Vasp com 30% eTransbrasil com os 20% restantes, refletindoaproximadamente a participação de cada em-presa no mercado doméstico brasileiro naque-le período. Mas, como na prática a teoria éoutra, os Boeing mostraram-se mais capazes erobustos do que o esperado, digníssimos suces-sores dos Electra. Por exemplo: se no papel

acreditava-se que seriam necessários pelo menos40 minutos de solo entre os vôos, tempo parao resfriamento dos freios, exigidos ao limite nascurtas pistas, os Boeing 737 mostraram-semelhores que a encomenda, capazes deexecutar turn-arounds em menos de 30 minu-tos. Ao final, as três operadoras descobriramque os 14 Electra podiam ser substituídos porapenas seis Boeing 737, sendo três da Varig,dois da Vasp e um da Transbrasil.

UMA PONTE ENTRE AS PESSOASEm relação à ponte aérea, o que nunca

faltou foram opiniões apaixonadas. Como rotamais importante e de maior movimento dopaís, sempre foi natural encontrar personalida-des, esportistas, empresários e celebridadesa bordo. E embora todos esses disputassemo título de viajante mais freqüente, quemlevou esse troféu para casa foi um humildefuncionário do jornal O Globo da sucursal de

Os SamuraiYS-11substituíramos cansadosScandia.

Taí o Boko Moko –Fairchild HillerFH-227, herançada falência daParaense.

Os clássicosDC-6 daempresa,herdados doLóide, voaramna ponte.

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São Paulo. Oswaldo Alves dos Santos voavaduas vezes ao dia, sábados, domingos e feria-dos, levando fotolitos do jornal para o Rio.No total, quando da aposentadoria dos Electra,“Seu” Oswaldo, como era conhecido por todos,tinha a invejável marca de 12 mil vôos naponte. “Foi com este avião que eu criei quatrofilhos, dois deles já na faculdade”, resumiade forma simplória “Seu” Oswaldo.

São incontáveis as histórias de amor, intri-ga e até traição que tiveram a ponte aéreacomo pano de fundo. Como aquela da socialitepaulistana que foi ao Rio para dar uma escapa-dinha do maridão. Deixou para voltar no último

vôo, mas não conseguiu lugar. Saiu aos prantospelo saguão, implorando para “comprar” umboarding pass dos passageiros já checados.Ela dizia que tinha que voltar de qualquer mo-do para São Paulo. E não escondia seu plano:para seu incauto maridinho, ela tinha apenassaído com “umas amigas”…

O publicitário Mauro Salles era umapaixonado pelo Electra, para quem cadaavião tinha características tão únicas queformavam até uma certa personalidade.O humorista José de Vasconcellos anotavatodos os dados de cada vôo numa caderneti-nha: comandante, horários de pouso e decola-

gem, o que foi servido, assento ocupado, etc.Eu mesmo tenho uma inesquecível: esta-

va paquerando uma moça que jogava difícil.Uma noite, saímos para jantar. Estacioneiem Congonhas e ela perguntou: “Ué? Nãovamos jantar?”. Eu respondi: “Claro que sim.Só que vamos jantar em Ipanema”. Poucomais de 50 minutos depois, as portas doPP-VJU se abriram para a quente noite cario-ca. Na manhã seguinte, a tempo de pegarfirme no batente, o mesmo VJU nos trouxe devolta. Com a missão cumprida.

Mas não apenas os passageiros tinhamhistórias para contar. Aeroviários e aeronautasnão esquecem os anos da ponte aérea.Eram 52 tripulações dedicadas, 260 profissio-nais que não trocavam o ir e voltar entre Rio eSão Paulo nos Electra por nada. Ao todo, aponte empregava mais de 800 pessoas direta-mente, sendo 110 nos aeroportos, outro tan-to de pilotos e nada menos que 400 profissio-nais de manutenção, operação e treinamento.

Ponte nosanos 1970:mais ágil ecômoda doque nos diasde hoje!

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há competição – salutar para o público,acirrada para as empresas, que deixaram deobter lucros fáceis nos serviços. Embora osvôos da Gol, Varig e TAM sejam numerosos,são ligações freqüentes, mas não formammais uma verdadeira ponte aérea: bilhetespodem até ser endossados, mas não sãoautomaticamente aceitos.

O conceito original da ponte aérea ficouna saudade, assim como os Scandia, Convair,Viscount e Electra. Ficaram na memóriatambém a Real, Cruzeiro, Vasp e Transbrasil,

tragadas pelo tempo, como o ruído dosmotores radiais e turboélices. Hoje, ligam asduas cidades eficientes mas impessoaisAirbus e Boeing. Foi-se a época da conve-niência de chegar ao aeroporto e embarcar.Pode parecer incrível, mas computando aespera habitual em solo nos dias de hoje, osconstantes congestionamentos nos pátios deSDU e CGH, chega-se à conclusão de queo tempo total de viagem atualmente nosjatos é quase sempre maior do que no tempodos turboélices Electra!

Um 737-300 daTransbrasil eradedicado à ponte:no começo, em1991/1992, eramo PT-TEF, PT-TEGou PT-TEH,por possuíremmotores maispotentes.

A TAM colocou,assim que pôde,seus novíssimose confortáveisA319 entre Rioe São Paulo.

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GRAND FINALEEu daria tudo para voltar no tempo,

digamos, para 1967 e, por uma última vez,ver os vôos da ponte aérea chegando e saindo,ouvir a música produzida pelos Convair, Herald,Avro, Samurai, Viscount e Electra. E por falarem música, o momento mais mágico da ponteaérea aconteceu em 1991, durante um showde Tom Jobim no Aterro do Flamengo. Nossomúsico maior, sabidamente apaixonado portudo que voava, iniciava os primeiros acordesde Samba do Avião (Minha alma canta, vejoo Rio de Janeiro, estou morrendo de saudade,Rio seu mar, praias sem fim, Rio você que foifeito pra mim), quando um Electra, emaproximação para o Santos Dumont, passou

baixinho, sobrevoando o show. Tom parou uminstante, olhou para cima e, nessa hora, comopor magia, o comandante do L-188 piscouas luzes de pouso, saudando o maestro e seupúblico. Foi o adeus de Jobim e do Brasil aosElectra da ponte aérea. Mais: foi o adeus a umaera muito mais elegante, humana. Temposque não voltam mais. Os anos da ponte aérea,a maior invenção da aviação comercial brasilei-ra de todos os tempos.

O autor gostaria de agradecer a colabo-ração de dois homens que escreveram belís-simas páginas de nossa aviação comercial:Harro Fouquet e Cleómenes Mengatti,que prestaram contribuições inestimáveis napreparação desta matéria.

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Gente como os comandantes Tadeu Buchriesere Sérgio Lott, que, pilotando os últimos vôosdos Electra em 1992, pensaram seriamenteem se aposentar juntamente com os aviões.Tanto os passageiros como os profissionais daponte formavam uma grande família, aspessoas se conheciam. Os habitués járeconheciam os pilotos ao formar a fila paraembarque na escadinha e comentavam: “Ah,nosso piloto vai ser o comandante MarioRosses… Esse sempre pousa macio”. Maisque uma grande família, a ponte aérea erauma instituição nacional.

SERVIÇO DE BORDOCom quase 40 anos de serviços ininter-

ruptos, fica impossível definir um padrão únicode catering na ponte aérea. Seu primeiroregulamento, em 1959, limitava o serviço debordo a apenas “água e cafezinho”, proibin-do as três operadoras de distribuir simplessanduíches aos passageiros. Na prática, essaregra logo caiu e refeições ligeiras passaram aembarcar e ocupar as galleys. O padrão deserviço variava muito de horário para horá-rio, de equipamento para equipamentoe, evidente, entre as empresas. “Variavatambém de acordo com as condições econô-micas do país”, assinala Harro Fouquet, ex-diretor da Varig e lenda viva da aviaçãocomercial brasileira. Fouquet lembra que,

durante o reinado do Electra, cafés da manhã,lanches, almoços frios, chás da tarde, happy-hours e jantares alternavam-se de acordocom o relógio. No fim do dia, executivos to-mavam o primeiro uisquinho pós-expedientenas asas da ponte.

O ótimo padrão de catering da Varig,dona de quase 3/4 dos vôos, ditava o elevadonível dos serviços prestados. Nos vôos opera-dos pela Sadia/Transbrasil e Vasp, o cateringera providenciado por cada empresa. Copos,bandejas e talheres, decorados com as marcasde cada operadora, marcavam as diferenças.No geral, pode-se dizer que o serviço era nomínimo satisfatório. Na verdade, se compara-do à pobreza dos dias de hoje, era mesmonotável. Bebidas alcoólicas como campari,gim, uísque, vinho e cerveja, sobretudo noshorários do almoço e a partir das 17h00, eramoferecidas junto com as refeições. Aliadas aomaior espaço interno dos Electra, um nível deconforto pessoal até hoje inigualado, quemvoou naquela época sente saudade. E como

Electra, soberanoabsoluto entre1975 e 1992:que saudade!

O lounge era olugar maisdisputado a bordodos Electra.

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tudo que é bom um dia acaba, no início de1992 essa era estava com seus dias contados.

CAI O PANOUm período maravilhoso chegava ao fim.

O veterano Lockheed era o último remanes-cente dos anos de ouro, a era romântica daaviação, como diziam alguns. A troca, porém,não foi unanimidade. O humorista Jô Soaresdefiniu assim a situação: “de que adiantaganhar 15 minutos a menos de vôo seeu vou perder 15 centímetros de espaço napoltrona?”. No domingo, 5 de janeiro de1992, somente três Electra operaram: PP-VNJ,PP-VLX e o PP-VJN. Este último, cumprindo ovôo VP651, transportou os derradeiros passa-geiros pagantes em aeronaves Electra noBrasil. Após decolar do Rio às 11h42, pousouem Congonhas às 12h35. Uma era brilhanteacabou no momento em que o último dosquatro Allison parou de girar. No dia seguinte,aconteceu uma grande e merecida festa de

despedida. A Varig convidou passageirosfreqüentes e personalidades para os últimosvôos de despedida, que foram cumpridos peloPP-VJO e PP-VJN. As redes de TV marcaram adata, jornais dedicaram páginas inteiras aoadeus. Ao final da manhã, o PP-VJN fezalgumas passagens rasantes após o último vôodos convidados. Pousou e foi taxiando paraos hangares da Varig em Congonhas. Comsuas hélices quase parando, deixou para trásuma época que não volta mais. Tempo debossa nova. Tempo em que se voava comelegância e conforto. Tempo de admirar,através da janela de um Electra, o espetáculode sobrevoar baixinho a restinga daMarambaia, o Corcovado, o Pão de Açúcar.Tempo de conversas e paqueras no lounge, asimpática salinha de seis lugares, localizadano fundo da fuselagem. Tempo que não volta,como não voltam mais os Electra.

Um período de ouro servido por umaaeronave espetacular. Durante sua vida na

21/12/1991:meu vôo dedespedida naponte, a bordodo PP-VLY.

A Rio-Sul tevea primazia deoperar a primeiraaeronave brasileirana ponte: oEMB-120 Brasilia.

Em 2002, aRio-Sul colocouos ERJ-145 paravoar na ponteVarig/Rio-Sul.

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Varig, que começou em 2 de setembro de1962, quando os comandantes Moscosoe Heinz Plato aterrissaram com o PP-VJM noBrasil, os 15 L-188 Electra que a Varig operoununca estiveram envolvidos num único aciden-te. Somente um, o PP-VJP, foi perdido:foi durante um vôo de treino, ao fazer umpouso duro demais em Porto Alegre. Suafuselagem sofreu avarias estruturais queresultaram em sua aposentadoria forçada.Nenhum dos Electra, em tantos anos deoperação, machucou um dedinho sequer depassageiros e tripulantes.

Os números de sua operação no Brasilforam tão magníficos como seu recordede segurança. De 1962 a 1992, fizeram emmédia 36 mil viagens na ponte cada um,totalizando somente na ponte mais de500 mil vôos. Foram 217 milhões de quilôme-tros voados, 2,4 milhões de passageirostranspostados por cada um dos 14 exempla-res. Foram 777.140 horas no ar ou 88,7 anosininterruptos, o suficiente para 540 viagensde ida e volta à Lua. Consumiram 952 mi-lhões de litros de combustível.

Depois de aposentados, os Electra foramcolocados à venda. Esperando compradores,

O primeiro jatona ponte foi o737-300 daVasp, que uniaCongonhasao Galeão.

Dezesseis tipos diferentes voaram na ponte aérea.

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ficaram em Porto Alegre o PP-VLA, VLB, VLY,VJV e VNK. Entre 1992 e 1993, foram vendidospara a Blue Airlines, New ACS e Filair, todasna República Democrática do Congo. Sem qual-quer tipo de manutenção, voaram até ondeconseguiram ou se envolveram em acidentes,alguns fatais. Um deles protagonizou umatragédia impressionante: mais de 140 passagei-ros, muito acima do máximo permitido de90 ocupantes, pereceram quando o ex-PP-VLAcaiu após decolar de Kinshasa. De todos osElectra da Varig, apenas dois sobreviveme somente um opera regularmente: o ex-PP-VNK, que voa no Canadá como aeronave-bombeiro. O PP-VJM, primeiro a chegar

A TAM entroucom o Fokker100 paracompetir paravaler.

Fimdo pool: a Varig parte para vôosolo, em conjunto com a Rio-Sul

Sampa, um dosdois 737-300dedicados pelaVasp aos serviçosda ponte.

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ao Brasil, hoje descansa eternamente no museudo Campo dos Afonsos, único exemplar queresta no Brasil. Dos 169 Electra construídos,menos de dez ainda operam regularmente,sobretudo em vôos de combate a incêndiosou no transporte de carga.

FIM DA PONTEAté a substituição dos Electra, nenhuma

grande novidade aconteceu na ponte desde1975. Isso começou a mudar em 1990,quando a TAM finalmente entrou na era dojato com o Fokker 100: a empresa logotratou de empregá-lo na Super Ponte TAM.Depois de décadas, efetivamente haviacompetição à altura da ponte aérea tradicional.

Em 13 de fevereiro de 1998, a ponteaérea, pela primeira vez desde sua fundação,teve de deixar o Santos Dumont. Naquele dia,um incêndio destruiu boa parte do velhoterminal do aeroporto, deixando suas instala-ções impróprias para o uso público. A soluçãofoi transferir às pressas os serviços para oGaleão, que acomodou sem maiores proble-mas os serviços, pois tinha – e ainda tem –capacidade ociosa. O terminal de SDUfoi reformado às pressas, mas mesmo assima ponte só voltou a operar no aeroporto em

15 de agosto de 1998. Nessa mesma data, aVarig desligou-se oficialmente da ponte aéreae, separadamente, começou a operar a ponteVarig/Rio-Sul. A Vasp e a Transbrasil operarampor algum tempo em pool, mas essa colabora-ção não durou muito, até porque ambas jáenfrentavam seus próprios problemas internos.Foi assim, tão na surdina quanto começou,que a ponte aérea acabou sendo oficialmenteextinta em 1999 e substituída por um sistemade ligações freqüentes.

Em março de 1999 a TAM colocou osA319-100 em operação, entrando em competi-ção com os 737-300 e 737-500 da Varig eRio-Sul. A Transbrasil, refletindo sua delicadasituação, foi reduzindo seus serviços até que,em 4 de dezembro de 2001, parou de voar.A Vasp também começou a enfrentarproblemas e por vezes se viu sem aeronavespara cumprir os vôos. Em alguns períodos, usouaté os 737-200 (pousando no Aeroporto TomJobim) ou então simplesmente abandonoutemporariamente os serviços.

Em 2002, a Gol foi autorizada a entrarnas ligações SDU-CGH com seus modernos737-700 Next Generation e logo depois iniciouserviços na rota. Portanto, hoje não há mais oesquema original de ponte aérea, um poolde empresas operando na rota. Em seu lugar

No fim,Varig e TAMenfrentavam-seferrenhamentena maisdisputada rotabrasileira.

Sai Electra, entrajato: foto feita nodia 11/11/1991,início dasoperações do737-300 na ponte.

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