18
POPULAÇÕES TRADICIONAIS E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL NO PANTANAL SUL MATOGROSSENSE: UM DILEMA ENTRE A PROMOÇÃO DO ECODESENVOLVIMENTO OU CRIAÇÃO DE ECO-VÍTIMAS. CRISTHIANE OLIVEIRA DA GRAÇA AMÂNCIO (1) ; ROBSON AMÂNCIO (2) ; KARLA ODONE RIBEIRO (3) ; ROSICLEA CATARINA TONIAZZO (4) . 1.EMBRAPA PANTANAL, CORUMBÁ, MS, BRASIL; 2,3.UFLA, LAVRAS, MG, BRASIL; 4.UFMS, CORUMBÁ, MS, BRASIL. [email protected] APRESENTAÇÃO ORAL AGRICULTURA, MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Populações tradicionais e preservação ambiental no Pantanal Sul Matogrossense: Um dilema entre a promoção do ecodesenvolvimento ou criação de eco-vítimas. Resumo Atualmente tem ganhado força dentro do ambientalismo a noção de que a conservação do meio ambiente é muito mais uma questão política do que técnica. Sem negar a existência de uma realidade objetiva nem o poder causal independente dos fenômenos naturais, passa-se a enfatizar a incorporação, dentro da análise dos problemas ambientais, dos processos de negociação sobre como definir e enfrentar os riscos ambientais e tecnológicos. Nesse contexto, muitos estudos no campo das ciências ambientais passam a focar essa nova modalidade de conflito social: os conflitos que tem a natureza como suporte. A partir do momento que os recursos ambientais passam a ser entendidos como recursos comuns (inclusive pertencentes a gerações futuras), os conflitos sócioambientais podem ser vistos como conflitos de apropriação pública/privada dos recursos naturais e sua regulação como um problema de ação coletiva. Muitos estudos têm se debruçado sobre os dilemas da ação coletiva na gestão dos recursos naturais. Este trabalho traz uma reflexão sobre conflitos sócio- ambientais em parte do Pantanal Sul Mato-grossense, no município de Corumbá. Palavra chave: Conflitos socioambientais, pantanal, comunidades tradicionais Abstract Currently has gained force inside of the movement ambient partner the notion of that the conservation of the environment is much more a question politics of what technique. Without denying the existence of an objective reality nor the independent accidental power of the natural phenomena, transfers to emphasize it the incorporation, inside of the analysis of the ambient problems, of the negotiation processes on as to define and to face the ambient and technological risks. In this context, many studies in the field of ambient sciences start place in focus this new modality of social conflict: the conflicts that the nature has as support. From the moment that the environmental resources pass to be understood as common resources (also pertaining the future generations), the partner-ambient conflicts can be seen as conflicts

POPULAÇÕES TRADICIONAIS E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL …sober.org.br/palestra/6/1080.pdf · 2012-04-17 · meio ambiente é muito mais uma questão política do que técnica. ... exemplifique

Embed Size (px)

Citation preview

POPULAÇÕES TRADICIONAIS E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL NO PANTANAL SUL MATOGROSSENSE: UM DILEMA ENTRE A PROMOÇÃO DO ECODESENVOLVIMENTO OU CRIAÇÃO DE ECO-VÍTIMAS. CRISTHIANE OLIVEIRA DA GRAÇA AMÂNCIO (1) ; ROBSON A MÂNCIO (2) ; KARLA ODONE RIBEIRO (3) ; ROSICLEA CATARINA TONIAZZ O (4) . 1.EMBRAPA PANTANAL, CORUMBÁ, MS, BRASIL; 2,3.UFLA, LAVRAS, MG, BRASIL; 4.UFMS, CORUMBÁ, MS, BRASIL. [email protected] APRESENTAÇÃO ORAL AGRICULTURA, MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTEN TÁVEL Populações tradicionais e preservação ambiental no Pantanal Sul Matogrossense: Um dilema entre a promoção do ecodesenvolvimento ou criação de eco-vítimas. Resumo Atualmente tem ganhado força dentro do ambientalismo a noção de que a conservação do meio ambiente é muito mais uma questão política do que técnica. Sem negar a existência de uma realidade objetiva nem o poder causal independente dos fenômenos naturais, passa-se a enfatizar a incorporação, dentro da análise dos problemas ambientais, dos processos de negociação sobre como definir e enfrentar os riscos ambientais e tecnológicos. Nesse contexto, muitos estudos no campo das ciências ambientais passam a focar essa nova modalidade de conflito social: os conflitos que tem a natureza como suporte. A partir do momento que os recursos ambientais passam a ser entendidos como recursos comuns (inclusive pertencentes a gerações futuras), os conflitos sócioambientais podem ser vistos como conflitos de apropriação pública/privada dos recursos naturais e sua regulação como um problema de ação coletiva. Muitos estudos têm se debruçado sobre os dilemas da ação coletiva na gestão dos recursos naturais. Este trabalho traz uma reflexão sobre conflitos sócio-ambientais em parte do Pantanal Sul Mato-grossense, no município de Corumbá. Palavra chave: Conflitos socioambientais, pantanal, comunidades tradicionais Abstract Currently has gained force inside of the movement ambient partner the notion of that the conservation of the environment is much more a question politics of what technique. Without denying the existence of an objective reality nor the independent accidental power of the natural phenomena, transfers to emphasize it the incorporation, inside of the analysis of the ambient problems, of the negotiation processes on as to define and to face the ambient and technological risks. In this context, many studies in the field of ambient sciences start place in focus this new modality of social conflict: the conflicts that the nature has as support. From the moment that the environmental resources pass to be understood as common resources (also pertaining the future generations), the partner-ambient conflicts can be seen as conflicts

of private public appropriation/of the natural resources and its regulation as a problem of class action. Many studies if have leaned over on the quandaries of the class action in the management of the natural resources. This work brings a reflection on partner-ambient conflicts in part of the South Pantanal Weed, in the city of Corumbá. Key Words: Social-environmental conflicts, pantanal, traditional communities. Introdução Este artigo se propõe a levar o leitor a uma reflexão sobre uma situação, que apesar de parecer localizada no pantanal sul-matogrossense, é mais comum do que pode-se considerar. Além de ter manifestações em diversas regiões, também manifesta-se de diferentes formas. Diz respeito a criação de um contingente populacional que poderíamos designar, a principio, de eco-vítimas ou eco-excluídos. De certo não é uma categoria de análise nova, contudo, ainda pouco explorada dos debates sociológicos e econômicos do meio acadêmico e cientifico. Para esta reflexão procuramos apresentar um caso que exemplifica o que vem se tornando crítico na região do Pantanal Sul, especialmente em alguns municípios como Corumbá, Aquidauna e Miranda no Mato Grosso do Sul. São casos de parcela de populações tradicionais, na sua maioria dos pescadores profissionais artesanais que tem suas ações cerceadas ou limitadas por uma legislação que restringe a pesca artesanal em favor da pesca esportiva, moradores atingidos por empreendimentos minerários e siderúrgicos e além de existir também um segmento dessas populações vítimas da delimitação de grandes áreas para a preservação ambiental em forma de Parques, Reservas Particulares de Patrimônio Natural (RPPNs) entre outras. Famílias com hábitos tradicionais do Pantanal que se vêem desprovidas dos recursos naturais que ao longo de séculos se relacionaram de maneira harmônica para a sobrevivência em detrimento de interesses privados. A região pantaneira no Mato Grosso do Sul, a oeste do Estado, representa grande parte da maior planície de inundação continua do mundo, totalizando algo em torno de 11 milhões de hectares que representam cerca de 31% da superfície estadual. Esta planície aluvial é drenada pelos rios Paraguai, Cuiabá, Taquari, Negro, Miranda entre outros. Funciona como um grande reservatório, onde os fenômenos de cheia e de seca se alternam, promovendo o equilíbrio do meio ambiente e contribuindo para a reprodução da fauna e flora típica. Esta região ostenta um mosaico de ecossistemas, principalmente aquáticos e subaquáticos sendo dividida em 11 sub-regiões com diversas representações típicas de cada local. Essas sub-regiões estão divididas em 16 municípios dos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Considerando o pantanal podemos dividi-lo também em duas áreas: planície, ou pantanal propriamente dito e planalto. Por planície pantaneira compreendemos ser “toda a área contínua de planície inserida na Bacia do Alto Paraguai, no Brasil, sujeita a inundações periódicas inter e intra-anual” (Silva et al, 2001). Já por planalto pantaneiro entende-se ser “ toda a área adjacente ao pantanal pertencente a qualquer um dos 16 municípios que o compõe” (Silva et al, 2001). Figura1: Pantanal Brasileiro e suas 11 sub-regiões.

Fonte: Silva; Abdon, 1998. Corumbá situa-se numa altitude média de 118 metros acima do nível do mar. Possui cerca de 95000 habitantes e uma área de 6.516.580 há, sendo considerado o maior município do Estado. Cerca de 95,4% de sua terras são baixas e encharcadas. Nestas áreas se estruturou e estabeleceu, ao longo de centenas de anos, uma forma típica de relacionamento entre o ser humano e a natureza. Dentre os 4,6% restantes que significam algo em torno de 300.000 ha encontra-se os afloramentos rochosos do Maciço de Corumbá, formado por rochas calcáres e do Maciço de Urucum, composto por minérios de ferro e manganês. A reserva de ferro é estimada em um bilhão de toneladas, enquanto a de manganês alcança cerca de 185 milhões de toneladas. (Franz, 1997) Ao redor desses morros existem e existiam a presença de populações tradicionais Esta região vem se tornando um espaço de disputas entre segmentos do movimento ambientalista, com características preservacionista e setores do empresariado ligados ao turismo de pesca além de setores mineradores e siderúrgicos.

De um lado procuram excluir os antigos moradores de áreas que, do ponto de vista da ecologia strictu sensu, consideram importantes serem preservadas, desta maneira, populações tradicionais são excluídas de seus antigos territórios em nome da ‘necessidade de preservar’ o meio ambiente. De um outro lado são impedidos de exercerem atividades típicas da região, como a pesca artesanal, em nome de reservar estoques pesqueiros sob falsa acusação de serem os responsáveis pela degradação dos recursos naturais e pesqueiros do pantanal sul, mas na realidade são restringidos para alimentar a indústria do turismo de pesca esportiva. Por um terceiro viés são retirados de suas antigas posses para que se explore o setor minerário e siderúrgico no sentido de abastecer o modo de vida consumista das populações concentradas nos grandes centros urbanos. População que consome grandes quantidades de recursos naturais e que pressiona e financia como medida compensatória a criação de áreas preservadas. Áreas onde a natureza fique intocada, protegida do homem! Disto se estabelecem conflitos, conflitos pelo uso e posse de recursos naturais. Conflitos por um modo e estilo de vida diferente e em muitos casos, com valores antagônicos. São conflitos sócio-ambientais. Em um primeiro momento será apresentado uma breve reflexão teórica sobre aspectos relacionados as diferentes manifestações de movimentos ambientalistas, evolução do pensamento, implicações e formas de ação. A seguir será apresentado um caso que exemplifique o debate apresentado ligado as populações tradicionais do pantanal.

1. AMBIENTALISMO: DO PRESERVACIONISMO AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E SOCIAMBIENTALISMO

Foi principalmente durante as quatro últimas décadas do século passado, que o

ambientalismo conquistou uma posição de destaque entre os movimentos sociais no que tange à sua produtividade histórica, ou seja, seu impacto em valores culturais e instituições da sociedade (Castells, 1999). O que a princípio parecia um movimento cujo objetivo central era, assim como os movimentos estudantis, de minorias étnicas e de gênero, afirmar suas idéias e identidade enquanto grupo diferenciado acabou por tornar-se um ator de destaque na construção de um novo projeto de sociedade, chegando hoje ao “cerne de uma reversão drástica das formas pelas quais pensamos na relação entre economia, sociedade e natureza, propiciando assim o desenvolvimento de uma nova cultura” (Castells, 1999 p.142).

Entretanto, até chegar neste cenário, muitos foram os caminhos percorridos pelo movimento ambientalista, seja em relação aos atores em cena, seja em relação às ideologias que guiavam as ações destes atores. Esse momento procura fazer uma breve retrospectiva dos principais momentos desse pensamento ecológico, tão presente na sociedade moderna. Assim, as questões ambientais nascem com uma idéia de ‘natureza intocada’ dentro de um círculo da elite científica, expandindo para uma visão integrada entre ambiente e sociedade e para a noção de que a luta pelo meio ambiente demanda profundas mudanças na sociedade. Entretanto, não se pretende deixar a impressão que as transformações ocorridas neste campo são lineares e homogêneas, pelo contrário, o que tem ocorrido no entendimento da questão ambiental é uma complexificação dos pensamentos e práticas. Muitas das concepções presentes no início do movimento permanecem até hoje, e novas ideologias surgem na articulação do pensamento ambiental com questões sociais mais amplas. O importante é deixar claro que atualmente a questão ambiental é um campo de disputas ideológicas, que está longe de ser uma área de consenso. Talvez seja justamente essa característica que a torne tão frutífera para ações transformadoras.

1.1 Origens: Preservacionistas e Conservacionistas Os primórdios do que se poderia chamar uma questão ambiental remontam ao século

XIX, quando surgem, entre as elites dos EUA e Inglaterra, duas grandes linhas conceituais: o preservacionismo e o conservacionismo. Determinados a partir de visões distintas sobre o mundo natural e a posição do homem em relação a este, estes dois modelos vão influenciar até hoje o pensamento ecológico (Diegues, 2000). O preservacionismo, cujo autor expoente é Muir, vai construir sob o ideário Romântico do fim do século XVIII sua crítica à noção de direitos ilimitados do homem sobre a natureza. A noção cartesiana de profunda separação entre cultura e natureza, não era em si questionada, mas passa-se a conferir à vida selvagem (“wilderness”), desvalorizada no pensamento dominante da época, um valor estético e espiritual, misturando elementos científicos com verdadeiros neomitos1 que remetem ao paraíso perdido.

Este pensamento marcou a primeira fase do ambientalismo, a qual Leis (1999) denominou fase estética, caracterizada principalmente pela criação dos parques nacionais, áreas especialmente delimitadas para isolar uma ‘natureza intocada’ do seu destruidor nato, o homem. Basicamente, a percepção dominante era então que o mundo natural poderia ser dividido em dois, um a ser preservado de forma intocada, para servir de inspiração e lazer, e outro que poderia ser usado sem restrições em benefício do homem.

Apesar de constituir-se como a forma dominante de perceber a relação entre homem e natureza, essa visão não era a única desta época. Os conservacionistas, cujo maior representante fora Pinchot, defendiam ser possível a exploração dos recursos naturais de forma racional, a partir de três princípios: o uso dos recursos naturais pela geração presente, a prevenção do desperdício, e o uso dos recursos naturais para benefício da maioria dos cidadãos (Diegues, 2000 p.29).

Na virada do século XX, em um contexto de insatisfação com os resultados da rápida expansão da industrialização e urbanização no mundo ocidental, o movimento ambientalista se expande. O desenvolvimento e divulgação das ciências naturais, principalmente a biologia e a ecologia, também fez com que a sociedade, notadamente seus cientistas, começasse a interessar-se pelas complexas relações entre os seres vivos e seu ecossistema. Assim, muitos acabaram aderindo ao discurso preservacionista para ver salvas algumas amostras de ecossistemas naturais que então pudessem ser melhor compreendidos pela ciência.

A primeira grande organização ambientalista de âmbito internacional, a União Internacional para a Proteção da Natureza (UIPN)2, foi criada em 1958 com objetivos especificamente científicos. No Brasil, preservacionistas dominaram as entidades de conservação mais antigas como a FBCN (Fundação Brasileira para a Conservação da Biodiversidade) em 1958.

Essa herança do movimento ambientalista faz com que mesmo hoje, boa parte da sociedade identifique o ambientalismo com o preservacionismo, vendo nos ambientalistas sujeitos que estão dispostos a barrar o desenvolvimento econômico em nome da proteção de determinados ecossistemas, com valores estéticos ou científicos, ou seja, um luxo para aqueles países que ainda precisam superar necessidades básicas (Vale, 2001). O conflito entre ambientalistas e desenvolvimentistas foi forte no Brasil principalmente durante a presidência de Getúlio Vargas. Essa tensão ainda permanece para muitos setores da sociedade,

1 Diegues, citando Morin, argumenta que “a história contemporânea, dissolvendo as antigas mitologias, cria outras e regenera, de forma moderna, o pensamento simbólico/mitológico/mágico” (p.57). Esses são mitos modernos ou neomitos. Um exemplo da presença destes neomitos na sociedade moderna é explicitado no conceito de “wilderness”, desenvolvido por iniciantes do movimento conservacionista americano. 2 Esta organização foi um importante ator dentro no campo das unidades de conservação. Em 1954 ela muda seu nome para União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), segundo Brito (2000), por uma tendência de enfocar a conservação dos habitats mais que a proteção de especies específicas.

deslocando, no entanto, o foco no crescimento para o problema do desemprego, como se conservar o meio ambiente e gerar empregos fossem ações essencialmente antagônicas.

A origem do ambientalismo junto aos círculos científicos também traz, até os dias de hoje, a idéia que os problemas ambientais são ‘problemas para técnicos’. De fato, a própria delimitação dos problemas (aquecimento global, perda da biodiversidade); a forma como são tratados (taxas, índices, gráficos); e mesmo a forma de solucioná-los por meio de desenvolvimento de novas tecnologias, defendido por algumas linhas do movimento, faz com que a questão ambiental seja colocada fora do alcance comum. Embora as pessoas possam perceber a importância disso, o interesse é periférico, pois se considera este um problema acadêmico. Além disso, essa perspectiva leva à despolitização da questão ambiental na medida em que traz a crença de que tudo se resolverá independentemente da escolha individual das pessoas. Essas duas perspectivas trazidas da gênese do movimento ambientalista, ainda muito influentes na inclinação ideológica de alguns atores, gera dificuldades na tentativa de implementação da democratização da questão ambiental (Vale, 2003).

Uma das estratégias mais usadas para conservação de ambientes naturais tem sido o estabelecimento de áreas protegidas, ou unidades de conservação (UC). Inicialmente concebidas sob o ideário preservacionista, estas áreas eram consideradas verdadeiros paraísos perdidos a serem isolados da ação devastadora do homem. Também por trás deste modelo de conservação está o ideário de que todas as sociedades estariam fadadas à tragédia de destruir seus recursos naturais caso não houvesse uma força externa coercitiva, no caso, o Estado. Entretanto, na prática estes modelos acabaram sendo impostos em muitas regiões já habitadas por várias gerações, algumas mesmo mostrando sua capacidade em manter relações de uso direto dos os recursos naturais por um longo tempo de forma sustentável.

Outro recurso utilizado no Estado do Mato Grosso do Sul tem se voltado para o desenvolvimento de políticas de cotas para a pesca profissional artesanal até medidas drásticas como o decreto de Moratória a Pesca Artesanal. Tema a ser tratato em um topico mais além. Atualmente tem ganhado força dentro do ambientalismo a noção de que a conservação do meio ambiente é muito mais uma questão política do que técnica. Sem negar a existência de uma realidade objetiva nem o poder causal independente dos fenômenos naturais, passa-se a enfatizar a incorporação, dentro da análise dos problemas ambientais, dos processos de negociação sobre como definir e enfrentar os riscos ambientais e tecnológicos. Nesse contexto, muitos estudos no campo das ciências ambientais passam a focar essa nova modalidade de conflito social: os conflitos que tem a natureza como suporte.

A partir do momento que os recursos ambientais passam a ser entendidos como recursos comuns (inclusive pertencentes a gerações futuras), os conflitos sócioambientais podem ser vistos como conflitos de apropriação pública/privada dos recursos naturais e sua regulação como um problema de ação coletiva.

Apesar de o movimento ambientalista caracterizar-se, em sua história contemporânea, como um movimento multifacetado, abarcando uma grande diversidade de discursos e tipos de ação, é possível perceber uma corrente principal do movimento, pelo menos no que tange às concepções da relação homem-natureza. No início dos anos 70 dominava uma visão “ecocêntrica”, baseada no romantismo do mundo selvagem, que pregava a separação do homem da natureza para que esta pudesse permanecer intocada. Limitava-se aqui a uma oposição genérica à sociedade predatória e imediatista do século XX e ao estabelecimento de unidades de conservação onde se proibia a presença humana.

A partir de meados dos anos 80 começa a tomar força a noção que tira a conotação selvagem da natureza e a coloca em profunda interação como o homem e com a sociedade. Cuidar do meio ambiente não é mais só cuidar da natureza, mas cuidar do homem e da sua

relação com o planeta Terra. Questões sociais passam a ser vistas também como questões ambientais e questões ambientais passam a ser entendidas como tendo profundas bases sociais.

Viola (1992), analisando o movimento ambientalista brasileiro, divide-o em dois momentos. A fase “fundacional” do movimento, de 1971 a 1986, caracterizava-se por uma visão estreita do que seria a problemática ambiental restringindo suas ações, basicamente, a denuncias de atividades poluidoras e ao apoio a preservação de ecossistemas naturais. Apesar de não haver grandes ganhos concretos na desaceleração da degradação ambiental, esse foi um momento importante para colocar a questão ambiental na discussão pública.

De 1987 a 1991 o movimento ambientalista passa por uma fase de forte institucionalização, seja na profissionalização das associações que trabalhavam de forma amadora, seja no surgimento de novas organizações profissionais. Em artigo mais recente, Viola e Leis (1995) também apontam para uma multisetorização do movimento, aumentando o número de setores e atores envolvidos com a questão ambiental, saindo do Estado e das ONGs para se espalhar para mais atores da sociedade civil , como as instituições de pesquisa e as empresas que passam a comprar a idéia da sustentabilidade.

O que também diferenciou o ambientalismo brasileiro do começo dos anos 70 do ambientalismo dos anos 90 foi o modo como o movimento passou a articular as questões ambientais com questões sociais mais amplas, como a justiça social e o desenvolvimento econômico. Se até meados da década de 80 a problemática ambiental tinha pouca repercussão entre as classes mais pobres, e meio ambiente e economia eram vistos como assuntos totalmente distintos; em 1988 muitas coisas haviam mudado.

Por influência de alguns grupos ambientalistas, muitos movimentos sociais passaram a aderir à bandeira ambiental, constituindo o chamado “sócio-ambientalismo”. A influência deste, juntamente com outros fatores como a acentuação da crise econômica do país, a pressão das financeiras internacionais para uma política de conservação em consonância com questões sócio-culturais das populações locais, e a decisão do Brasil sediar a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, dentre outros (Viola, 1992 p.67); fizeram com que desenvolvimento, sobre a égide da sustentabilidade, passasse a ser a palavra de ordem do ambientalismo da década de 90.

“Os parâmetros do debate ambiental brasileiro mudara em 1990: já não se fala mais em proteção ambiental independentemente do desenvolvimento econômico, sendo o eixo do debate como atingir um novo estilo de desenvolvimento que interiorize a proteção ambiental. Independentemente do fato de que alguns setores (majoritários) usam a expressão ‘desenvolvimento sustentável’ e outro (minoritários) rejeitam-na, todos concordam que o Brasil precisa de desenvolvimento econômico.” (Viola, 1992 p.69)

Com esse embricamento histórico das questões ambientais e sociais, com o deslocamento do conceito de ‘natureza’ para o de ‘meio ambiente’, a tônica da conservação dos recursos naturais sai dos aspectos técnicos específicos para a necessidade de gerir as relações sociais que vão determinar o modo de uso dos recursos naturais. Sem negar a existência de uma realidade objetiva nem o poder causal independente dos fenômenos naturais, passa-se a enfatizar a incorporação, dentro da análise dos problemas ambientais, dos processos de negociação sobre como definir e enfrentar os riscos ambientais e tecnológicos. Nesse contexto, muitos estudos no campo ambiental passam a focar essa nova modalidade de conflito social: os conflitos que tem a natureza como suporte.

São os ‘velhos’ conflitos sociais que passam a ser entendidos sob o viés ambiental, como o problema da segurança no trabalho e do saneamento básico nas cidades; e “novos” problemas, que por conta da institucionalização da questão ambiental manifestam-se em forma de conflitos, como é o caso de populações que, por conta da instalação de grandes empreendimentos, são expulsas ou passam a estar sujeitas a uma baixa qualidade de vida. Também é o caso das tensões geradas na implantação de unidades de conservação que, se não impõe a desapropriação das terras, passam a impor certas limitações de uso. Esses são o que hoje se tem convencionado chamar conflitos sócioambientais.

Indagando-se se esta não poderia ser uma estratégia de alguns movimentos sociais, dada a legitimidade que tem adquirido a bandeira ambiental; ou um desvio do enfoque original do movimento ambientalista que passa a entender como sociais os problemas ambientais, Castells (1999 p.166) coloca que o que está por trás dessa nova fase do ambientalismo é a idéia de justiça ambiental:

“o conceito de justiça ambiental, como noção ampla que reafirma o valor da vida em todas suas manifestações, contra os interesses de riqueza, poder e tecnologia, vem conquistando, gradativamente as mentes e as políticas [...] Contudo, o que vem ocorrendo com o ambientalismo vai além da questão estratégica. O enfoque ecológico à vida, à economia e às instituições da sociedade enfatiza o caráter holístico de todas as formas de matéria, bem como de todo processo de informações. Nesse sentido, quanto mais adquirimos conhecimento, tanto mais percebemos as potencialidades de nossa tecnologia, bem como o abismo gigantesco e perigoso entre nossa capacidade de produção cada vez maior e nossa organização social primitiva, inconsciente e, em última análise, destrutiva. É esse o fio que costura as relações cada vez mais estreitas entre revoltas sociais, locais e globais, defensivas e ofensivas, engajadas na luta por questões ou pro valores, surgindo em torno do movimento ambientalista.”

Uma dimensão importante colocada por essa ampliação das idéias ambientalistas é que o meio ambiente passa a ser entendido, como um bem comum:

“Compartilhados por todos, o ar, as águas e os solos podem ser entendidos como bens coletivos, cujo uso por alguns pode afetar o uso que deles é feito por outros. A qualidade do ar que cada indivíduo respira é afetada pelas emissões gasosas que todas as atividades humanas provocam. O tipo de uso que os agricultores fazem do solo afeta o lençol freático e a qualidade das águas disponíveis para o consumo humano, tanto de agricultores como de não agricultores. A destruição da cobertura florestal pode alterar o microclima de uma região, e assim por diante”.(Acselrad, 1992 p.20).

De fato, a Constituição brasileira de 1988 (artigo 225) define o meio ambiente como

de uso comum. Estes também podem ser entendidos como bens difusos, distintos dos bens públicos e privados (Fiorillo e Rodrigues, 1999 e Marques, 1999 apud Resende, 2002).

Entretanto a idéia de bens difusos se sobrepõe ao fato de que muitos recursos naturais se encontram hoje sujeitos a apropriação pública ou privada, como sintetiza Resende (2002, p.44):

Tabela 1: Uma tipologia dos direitos de propriedade referentes aos recursos naturais Recurso Tipo de propriedade de acordo com a

legislação brasileira Principais normas

Ar Livre acesso Código da Aeronáutica 7565/86 Águas Podem ser públicas, privadas ou comuns Código das Águas decreto 26.243/34 Fauna Estatal Código da Fauna lei 5.197/67 Florestas Vinculada à Terra (podendo então ser

estatal, privada ou comum) Código Florestal lei 4.775/65

Minerais Estatal Código de Mineração decreto-lei 227/67

Pesca Comum Código de pesca decreto-lei 221/67 Solos Vinculada à Terra (podendo então ser

estatal, privada ou comum) Código Civil; Lei 6225/75

Fonte: Resende (2002: 44-45) Neste sentido, os conflitos sócio-ambientais podem ser entendidos como “conflitos

que tem os elementos da natureza como objeto e que expressam relações de tensão entre interesses coletivos/ espaços públicos x interesses privados/ tentativa de apropriação de espaços públicos” (Acselarad et al, 1995 apud Bredariol, 1997 p.19). Entretanto, é preciso notar que, pela própria indefinição das leis, existe aqui uma construção sobre o que é privado e coletivo.

“A própria definição do objeto como ‘conflito’ supõe considerar a interação entre diversos grupos de agentes. Essa interação pode ser cooperativa, com formação de alianças entre agentes; geralmente, no entanto, ela é conflituosa. As disputas ocorrem em torno do controle de bens e recursos ou do poder de gerar e impor certas definições da realidade. Isto é, os conflitos se estruturam simultaneamente em torno de interesses e de valores. O próprio processo conflituoso constituiu os agentes, possibilitando a formação de novas identidades, inexistentes quando do início do processo.” (Alonso e Costa, 2001 p.125-126)

Desta forma existe uma luta de interesses (de acesso público/privado a determinados recursos), mas também uma luta simbólica sobre o que é público e o que é privado, e mesmo sobre o que é ‘ambientalmente correto’. Conflitos sócioambientais são conflitos entre interesses e entre valores tangíveis e, sobretudo intangíveis. Dessa forma torna-se um campo de disputa quase que desleal entre os avanços necessários para o desenvolvimento de uma sociedade capitalista e a conservação de um recurso fundamental para “se contar a história”: o próprio homem.

2. A PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Tem se tornado óbvio para os gestores de unidades de conservação no mundo todo e para alguns pesquisadores sobre conservação dos recursos naturais o fato de que é imprescindível ter a presença humana moradora de áreas de entorno de UC e áreas protegidas como parceiros na tanto na preservação quanto na conservação dos recursos a serem protegidos.

2.1 A presença humana e as categorias de unidades de conservação

A demarcação de áreas naturais protegidas, ou unidades de conservação (UCs), é hoje o principal instrumento de conservação in situ da biodiversidade. O IV Congresso Mundial de Parques Nacionais e Áreas de Proteção as define como “uma área de terra ou mar especialmente dedicada à proteção e conservação da diversidade biológica e dos recursos naturais e culturais a eles associados e manejados por meios legais ou outros meios eficazes” (UICN, 1994). Segundo Maretti (2001) (apud Côrtes, 2003 p.1-2) as unidades de conservação já ocupam hoje mais de 9% da superfície terrestre, com um total de 44.000 unidades, sendo que o Brasil possui cerca de 6,2% do seu território delimitado por alguma UC. O Parque Nacional de Yellowstone, criado em 1872 nos Estados Unidos é referenciado como o marco histórico de surgimento destas áreas protegidas (Brito, 2000 e Diegues, 2000). Concebido a partir do ideário preservacionista, para o qual era preciso criar ‘ilhas’ inabitadas de remanescentes da vida selvagem para que estas pudessem servir como verdadeiros paraísos perdidos para as gerações futuras, o modelo americano de parques acabou sendo referência para criação de UCs por todo o mundo. Inicialmente selecionados pela sua beleza cênica, o conceito destas áreas protegidas foi evoluindo para questões de conservação da biodiversidade, o que fez reforçar a noção de que a presença humana nessas áreas deveria ser muito restrita (Brito, 2000 p.22). No Brasil, a primeira iniciativa aconteceu em 1876 quando da proposta de criação de parques nacionais em Sete Quedas e na Ilha do Bananal por André Rebouças, mas apenas em 1937 foi legalmente criado o primeiro parque brasileiro: o Parque Nacional do Itatiaia. Segundo Brito (2000) a grande disseminação destas áreas se deu principalmente a partir da década de 50, atingindo seu máximo na década de 70 e 80. Segundo Ghimire (1993) citado por Diegues (2000 p.17) o aumento da preocupação mundial pelas unidades de conservação pode ser apenas parcialmente explicado pela rápida devastação das florestas e perda da biodiversidade. Para esse autor, o estabelecimento de áreas protegidas transformou-se também em importante arma política das elites dominantes dos países pobres para obtenção de ajuda financeira externa. Além disso, esses países passaram a enxergar essas áreas como potenciais geradores de divisas por meio do turismo.

Foi também esse período o de maior eclosão de conflitos entre o governo e as populações cuja presença havia sido menosprezada, ou simplesmente ignorada, quando da implantação destas reservas. A questão é que a importação acrítica do modelo americano para países do terceiro mundo, não levou em consideração o fato de que, diferentemente dos países de clima temperado, as florestas remanescentes dos países em desenvolvimento foram e continuam sendo habitadas por diversas populações tradicionais. Somando-se as pressões típicas destes países (conflitos fundiários, uma noção inadequada de fiscalização, corporativismo dos administradores, expansão urbana, profunda crise econômica e divida externa), acabou-se configurando um cenário de crise das unidades de conservação (Diegues, 2000 p.37). A latência destes fatores, em um contexto de ampliação do movimento ambientalista e questionamento dos pressupostos preservacionistas, faz com que as reivindicações das populações originais de áreas protegidas ganhem visibilidade no cenário internacional da conservação. Nos discursos oficiais, dois diferentes grupos humanos passam então a figurar como merecedores do título de povos “ecologicamente corretos”: as populações indígenas, que passam a ter um “status” de conservacionistas natos, e os grupos humanos que não poderiam ser caracterizados como povos indígenas (pescadores, ribeirinhos, seringueiros, camponeses). São, em geral, populações remanescentes de grandes ciclos econômicos regionais, empobrecidos, que tiveram seu modo de vida transformado para uma ênfase de subsistência.

As transformações na tônica ambientalista nacional e internacional vão se traduzir em mudanças substantivas na política ambiental. No que tange às áreas protegidas, as transformações do discurso ambientalista vão influenciar tanto a forma de pensar essas áreas como as estratégias para sua gestão. Apesar de ainda existir um caloroso embate entre as posições originais desse debate, preservacionistas extremos de uma lado e os conservacionistas e socioambientalistas de outro, os órgãos internacionais e nacionais já passam a incorporar em seus discursos e programas a necessidade de considerar os contextos socioambientais quando da criação, implementação e gestão das UCs. O reconhecimento dos direitos destas populações e a já citada ampliação na visão da relação homem – natureza, juntamente com a experiência prática de diversos países de modelos alternativos de parques (como alguns da Europa, Canadá e Japão) também fez com que novas categorias de UCs fossem criadas.

Atualmente, no Brasil, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC- Lei nº 9.985/2000), prevê dois grupos de unidades de conservação, as unidades de proteção integral, que permitem apenas o uso indireto dos recursos (pesquisa e visitação), e as de uso sustentável (permitindo diferentes níveis de atividades humanas). O primeiro grupo é composto pelas categorias: Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural e Refúgio da Vida Silvestre. No segundo grupo estão as categorias: Área de Proteção Ambiental (APA), Área Relevante de Interesse Ecológico, Floresta Nacional, Reserva Extrativista (Resex), Reserva da Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural. Além do surgimento de novas categorias de UCs no mundo inteiro, essa conjuntura faz trazer para o campo da conservação ambiental o discurso da participação social. No Brasil esse tema ganha força principalmente a partir do fim da década de 80 e início da década de 90, com a luta pela redemocratização do Estado. Isso pode ser observado por meio dos diversos seminários que se deram com o objetivo de discutir e avaliar experiências de participação social em UCs. Hermman e Costa (2003) citam alguns destes eventos: O “workshop” “Diretrizes Políticas para as Unidades de Conservação” (1994); o seminário “Parcerias e co-gestão em Unidades de Conservação” (1996); o seminário “Unidades de Conservação no Brasil: aspectos gerais, experiências inovadoras e a nova legislação (SNUC)” (1996); publicação, pelo Ibama do “Marco conceitual das Unidades de Conservação Federais do Brasil” (1997); “Oficina sobre gestão participativa em unidades de conservação” (1998). Embora tenha havido evoluções, os eventos detectavam uma necessidade de conceitos e métodos mais claros de participação, e por meio das avaliações das experiências, ressaltou-se que o tema estava presente no discurso mas encontrava grande dificuldades na prática, principalmente pela falta de entendimento e comprometimento dos órgão gestores das unidades.

O tema da participação também teve destaque nas discussões sobre o SNUC que se deram principalmente a partir de 1995. Muitos autores destacam o processo de constituição do SNUC como uma importante arena de discussões sobre a problemática das UCs no Brasil. Santilli (2001) coloca que, nesse processo, o pensamento socioambientalista acabou por exercer uma relevante influência neste sistema que rege as unidades de conservação brasileiras. Para ela, um dos paradigmas fundamentais do socioambientalismo permeia o SNUC, na medida em que este incorpora a necessidade da articulação entre biodiversidade e sociodiversidade.

Especificamente, o SNUC trata de dois assuntos essenciais do ponto de vista socioambiental: a questão das populações tradicionais residentes em áreas delimitadas como UCs e a necessidade de participação das populações afetadas direita ou indiretamente pela existência da UC na sua criação implementação e gestão.

Em relação as populações tradicionais, Santilli (2001) acredita que mesmo tendo sido vetada a proposta de lei que permitia a reclassificação de unidades de proteção integral ocupadas por populações tradicionais, de forma a permitir sua permanência, algumas medidas voltadas para a promoção da equidade social e para a compensação social das populações tradicionais foram incluídas: o direito a serem indenizadas ou compensadas pelas benfeitorias existentes como também o direito de serem reassentadas. Também se assegurou o direito de participação nda elaboração das normas e ações destinadas a compatibilizar a sua presença, ainda que temporária, dentro das unidades de conservação. Em relação à participação da sociedade na criação, implementação e gestão das UCs, o SNUC prevê dois instrumentos de participação da sociedade: as consultas públicas e os conselhos gestores.

Em suma, essa orientação do SNUC vem tentando mudar a forma autoritária como as UCs tem sido impostas no Brasil. Entretanto, não é simples abertura destes espaços que garante a efetiva participação da sociedade. A efetivação destes espaços previstos por lei deve lidar e superar diversos fatores dentre os quais os problemas da ação coletiva como será tratado no ítem 2.3. Antes, entretanto, trata-se mais detalhadamente de uma categoria específica de UC: as Áreas de Proteção Ambiental.

3. CARACTERIZAÇÃO DA PESCA PROFISSIONAL ARTESANAL NO MATO GROSSO DO SUL E SUAS RURAL LIVELIHOODS: O CASO DA SUB-REGIÃO DO PARAGUAI NO PANTANAL

Na região mais ao Norte no Rio Paraguai, cerca de 180 km do município de Corumbá,

esta se estabelecendo uma área de exclusão de parte das populações tradicionais. Para os movimentos ambientalistas preservacionistas esta região tem se tornado uma referência. Nela foi criado o Parque Nacional do Pantanal com uma área de 135000 ha que tem como uma das principais características a preservação de forma quase que intacta de parte do ecossistema pantaneiro. É uma região caracterizada por existência de uma topografia plana com forte ondulação com morros chegando até 900 metros de altitude. Esta localizada as margens do Rio Paraguai.

Cerca de 20 km abaixo, no sentido Sul localiza-se a RPPN Acurizal e Penha, pertencentes a Fundação Ecotrópica. Tem uma área estimada em cerca de 27000 ha e foi formada em 1995 a partir da compra das antigas fazendas Acurizal e Penha. Está área também é considerada por diversos estudiosos modelo de preservação. É uma RPPN que se justifica por reservar parte significativa do ecossistema pantaneiro para estudo. O local dispõe de um espaço apropriado para receber pesquisadores do mundo todo.

As Reservas Acurizal e Penha estão situadas em uma faixa de terra entre o Rio Paraguai e a Serra do Amolar, na borda sudoeste do Parque Nacional do Pantanal Mato-grossense, terminando abruptamente, na parte norte, junto à Lagoa Gaíva.

A área se compõe de vários tipos vegetacionais, cuja distribuição é regida não apenas pelo sistema pluvial, mas também pela topografia irregular, que varia desde o planalto baixo, numa altitude de 100 metros acima do nível do mar, até 900 metros, no topo de alguns morros.

Na própria descrição da região apresentada no sítio de internet da Fundação Ecotrópica é possível notar a magnitude desta RPPN e também ter uma primeira percepção de como é a percepção ambiental deste tipo de ação.

“Todas as ações de conservação da natureza são igualmente importantes. O conjunto delas é que definirá o mundo de amanhã. A implantação de áreas de preservação permanente

garante intocados os ciclos bio-geo-químicos responsáveis pela manutenção da biodiversidade ali protegida e, por conseguinte, o equilíbrio ambiental.” (Ecotrópica, 2007)

E continua: “A RPPN ACURIZAL não deve ser vista apenas como um ponto turístico mas sim como uma Unidade de Conservação (UC) que, apesar de estar trabalhando em prol da proteção da natureza, permite que as pessoas interessadas possam desfrutar do contato com o Pantanal e suas belezas naturais. A disponibilização desta Reserva à visitação tem como objetivo mostrar a finalidade que uma RPPN tem no contexto da proteção da biodiversidade, mostrar a beleza cênica, a fauna e a flora da região e, obviamente, garantir a manutenção e sua sustentabilidade através do ecoturismo.” (Ecotrópica, 2007)

Cerca de 30 km Rio abaixo, na região conhecida por Amolar, em função dos morros que tem formação rochosa que possibilita a retirada de uma pedra que se amolam lâminas, também está se estabelecendo mais uma RPPN na antiga fazenda Novos Dourados com cerca de 21000 ha. Esta área pertence ao empresário Eike Batista. A referida RPPN se justifica como uma área reservada ao estudo e preservação de ecossistemas típicos do pantanal e contará com uma área para compensação ambiental para os empreendimentos minerários e siderúrgicos do grupo MMX tanto em Corumbá quanto em outros locais onde o grupo atua.

Esta região, não só restrita a fazenda Novos Dourados, foi habitada pelos povos Paiaguás, Guaikuru, Bororos e Guatós entre outras etnias indígenas. Em harmonia com o meio ambiente desde os primeiros contatos com o povo Ibérico os povos indígenas têm sofrido muito com a chegada do homem branco. Doenças e novos costumes acompanharam as rodovias e a estrada de ferro e trouxeram desespero a muitos povos da região. Grande parte delas foi extinta e/ou expulsa pelos colonizadores europeus, contudo um remanescente destas antigas populações originadas ali mesmo continua resistindo e habitando a região onde seus antepassados viveram. Tanto que próximo a RPPN da MMX e as da Ecotrópica encontramos a Reserva indígena Guató. Nesta reserva ainda existem 120 famílias. Também é marcante na população local traços indígenas nos seus costumes quanto na própria fisionomia. Hábitos alimentares, de habitação e convívio com a natureza lembram muito os hábitos das populações indígenas locais. Este é um fator que ajuda a caracterizar parte desta população como tradicional.

Estes povos têm hábitos alimentares ligados a caça e pesca. Também são coletores de frutos e costumam cultivar pequenas roças de mandioca, arroz, feijão entre outros vegetais. Com a chegada dos europeus passaram, também, a criar animais, principalmente bovinos para subsistência, não para comercialização.

Mais abaixo temos também uma grande quantidade de terras (61.000 ha) recém adquiridas também para fins de preservação: a fazenda Santa Tereza. Apesar dos proprietários tanto da fazenda Santa Tereza quanto o grupo MMX estarem atentos a novas formas de manejo de áreas protegidas considerando como importante fator o envolvimento das comunidades do entorno, seja para uso direto ou indireto dos recursos naturais, antes de uso comum e agora pertencem a propriedade privada.

Dentro deste contexto observamos que vem sendo aplicado o conceito ecológico de constituição de “corredores ecológicos para conservação da biodiversidade” que saem do PARNA Pantanal e descem até a região conhecida com baía do Castelo onde está localizada a fazenda Santa Tereza. Serão assim, ao todo, 5 UC ou áreas protegidas ocupando mais de 700 km de extensão ao longo da margem do Rio Paraguai restringido de alguma forma o uso por parte dessas comunidades tradicionais.

3.1 Pescador profissional artesanal (PPA) parceiro na preservação do Pantanal ou

Ecovítima? A pesca no pantanal sul remota desde os primórdios da ocupação humana a pelo menos 2.000 anos. No estado do Mato Grosso do Sul essa atividade desempenha relevante papel para economia e para o desenvolvimento do Estado, em se considerando o município de Corumbá e de outros municípios da Bacia do Alto Paraguai podemos dizer que disputa espaço no ranking de principais fontes de receita junto com o turismo de pesca, a mineração e a pecuária. Desde a década de 80 acompanha-se no Estado um embate político ordenador de políticas públicas que vem tentando restringir a pesca profissional artesanal com o discurso de que essas populações viventes nas margens dos rios são responsáveis pela degradação ambiental e pela pressão excessiva nos estoques pesqueiros. Essas resoluções foram sendo colocadas em prática na forma de decretos gradativamente reduzindo o poder de trabalho dessas comunidades tradicionais reconhecidas nacionalmente pelo decreto federal do palácio do planalto nº 6040 de 07 de fevereiro de 2007. Até 1984 a pesca profissional era responsável pela captura de 3⁄4 do pescado registrado no Estado com o aumento da demanda por programas turísticos no pantanal no começo da década de 80 houveram medidas políticas que começaram a restringir a atividade da pesca profissional isso pode ser sentido principalmente com a restrição do uso de tarrafas e redes em suas pescarias (CATELLA, 2004 p.14) essa proibição veio com a portaria da Sudepe/MS nº 25/1983 e decretos estaduais nº 5643/1990 e 7362/1993. a partir daí só é possível o uso de azol. Com essa proibição percebe-se drasticamente o declínio do poder de atuação dos pescadores profissionais artesanais. A partir daí o percebe-se que o a inversão da situação observada até 18984. A maior parte do pescado capturado passou a ser da pesca esportiva. Todos esses dados a partir de 1994 foram monitorados mês a mês m toda bacia do alto paraguai pelo Sistema de Controle da Pesca do Mato Grosso do Sul (SCPesca/MS) (CATELLA, 2004) Com a diminuição da produtividade do setor, muitos pescadores profissionais artesanais passaram a trabalhar de alguma forma para o setor do turismo de pesca esportiva, no entanto por serem na sua maioria analfabetos ou semi-analfabetos as posições ocupadas na cadeia produtiva os deixavam na condição da informalidade. A sua maioria foi trabalhar de guia para pescadores, “piloteiro” de barco para turista, mecânico, faxineiro ou cozinheiro.essa migração de atividades é importante ressaltar, pois trouxe o morador das margens do rio para o centro urbano de Corumbá. Houve em um dado momento uma intensa migração rural-urbano o que acarretou um inchaço nas periferias de Corumbá e grande ociosidade de mão-de-obra desempregada, já que essas pessoas não dispõem de qualificação profissional que não seja a pesca artesanal. Ressalta-se que quem acaba por assumir esse ônus é o Estado já que aumentam as filas pro programas assistenciais, vagas em escolas públicas, hospitais, creches e segurança pública em casos extremos. Com esse movimento migratório podemos observar um intenso choque cultural. Na “barranca do rio” ou nos “portos”, conforme eles denominam onde moram, não há água encanada, banheiro, luz elétrica, e gás natural. Todas as estratégias de sobrevivência são buscadas em interação com os recursos naturais disponíveis na região, portanto, não se propõe a degradação do ambiente, pois isso significa degenerar suas condições de subsistência. Ao chegar na cidade a renda obtida antes para sobreviver na beira do rio e vir a cidade somente quando necessário passou a ser insuficiente além de aumentar as necessidades de consumo a qual estamos expostos constantemente pela mídia. Sendo assim, com a proibição do uso de redes e tarrafas ficou insustentável para muitas famílias continuar na beira do rio. Segundo Catella (2001) entre 1979 e 1983 o rendimento

médio da atividade foi de 121 kg/pescador/dia para em 11,5 kg/pescador/dia entre 1994 e 1999. Em 2005 houve a tentativa do governo estadual em decretar a moratória da pesca profissional artesanal embasada na justificativa de que haviam muito pescadores iregulares e sem licença previa para exercer a função. Fato esse que muito mais desrespeita a fiscalização do que ao setor produtivo. A moratória não foi implementada devido a um grande movimento dos pescadores profissionais artesanais e da comunidade científica do Estado. Em 2006 mantem-se cota de 400kg mês por pescador. O pescador profissional artesanal é cadastrado na colônia do seu município e tem vínculo direto com a Secretaria de Aqüicultura e Pesca do Governo Federal além de ter que possuir outro documento profissional do Estado do MS. Somente com a carteira expedida pelo órgão ambiental do Estado é possível comercializar o pescado. Atualmente a cada kg de peixe comercializado hoje dentro do Estado paga-se o referente a 1,70 reais em impostos. Caso esse peixe seja comercializado pra fora do Estado o valor é reduzido para 1,20 reais/kg. Ao desembarcar o pescador é obrigado a informar a polícia ambiental que está desembarcando peixe e o mesmo é vistoriado gratuitamente. Em caso da pesca ser de “isca viva” o comércio é feito por unidade e muitas vezes dependem do atravessador e o maior comprador é o setor turístico pesqueiro. Para se pescar isca viva são necessários incursões em baías formadas pelo pulso de inundação do pantanal, ou seja, não se pesca isca na beira do rio, é necessário estar dentro do pantanal, sendo assim, morar na cidade torna-se inviável para o “isqueiro” (forma como são reconhecidos e diferenciados dos outros tipos de pescadores profissionais artesanais). Dessa forma ao criar UC e àreas protegidas que restringem o uso por populações secularmente viventes na região tem acarretado um ônus ao Estado e a sociedade ainda não mensurado, porém visível. O pescador fica sem ter onde trabalhar e como lidar com conceitos de propriedade aos quais ainda não teve contato além de não ter como se integrar ao sistema complexo de empregabilidade e formal existente nas cidades. Cria-se então o processo de eco-exclusão. No caso aqui relatado a instalação das RPPN’s Acurizal e Penha levou ao desalojamento de cerca de 13 famílias que habitavam as terras compradas pela Ecotrópica para constituir as áreas de reserva. As famílias foram deslocadas para uma ilha próxima e ali constituíram uma vila que é conhecida por Barra do São Lourenço, em alusão ao nome geográfico do local. A vila fica no lado esquerdo do Rio em frente a área da RPPN. Eles argumentam que moravam em uma enseada muito próspera para eles. A história deles no antigo local remonta mais de 100 anos. Para comprovar relembram histórias de seus antepassados. Lembram que quando da compra das áreas pela Ecotrópica eles não foram consultados e nem procurados para uma negociação. Foram expulsos do local, com lembra uma das moradoras em entrevistas “nos colocaram em cima de nossas canoas e nem quiseram saber como faríamos para sobreviver... saiu gente amontoado em cima de canoa que parecia até que ia afundar...”. Este episódio é lembrado por diversos moradores com muita tristeza e causa um certo sentimento de rancor. Muitas vezes fomos questionados “se eles não eram parte da natureza também, pois viviam por ali a muitos anos e não eram eles que causavam danos ao ambiente, como por exemplo, as queimadas”. Fazendo a alusão de que eram eles quem iam combater as queimadas provocadas pelos pecuaristas. Após o deslocamento passaram a enfrentar novas dificuldades de relacionamento com os propósitos das RRPNs da Ecotrópica. Foram, p.ex. proibidos de pescar nas águas que sempre pescaram, inclusive na área em frente a vila que agora moram. Também foram proibidos de coletar nas antigas áreas onde moravam. Estes episódios são emblemáticos de conflitos que se configuram por serem disputas pelo uso de recursos naturais. Até o momento eles têm

restrições de uso ou mesmo são proibidos de se aproximar destas áreas, de acordo com relatos obtidos em entrevistas com os moradores da Barra do São Lourenço. O interessante neste caso, e que infelizmente é comum, é que os ambientalistas que idealizaram estas RPPNs desconsideraram que este habitantes são tradicionais na região. Que conviviam com aquele ecossistema a mais de um século e desenvolveram habilidades para se relacionar com harmonia com aqueles recursos naturais, como p.ex. a pesca, coleta e mesmo caça. Ao desconsiderar esta situação se separa o ser humano da natureza, deixamos, portanto de sermos naturais. Os moradores desta sub-região do Pantanal, o Paraguai, alertam também para o fato de que não só tem restrições para pescar nas proximidades de sua vila, como também na área rio Paraguai acima pois é um espaço reservado pelo parque. Desta maneira ficam ‘ilhados’ em um espaço de pesca muito pequeno e quando tem dificuldades de obter o pescado por ai deparam-se com uma imensa dificuldade para conseguir o peixe, pois tem que se deslocar por um trecho muito longo para chegar em uma outra área que lhes é permitido pescar. Realçam que o problema se agrava, pois possuem barcos pequenos, de madeira e sem motorização e desta forma tem que remar muito tempo. Podemos caracterizar essa comunidade dessa sub-região, em geral como sendo pessoas que vivem essencialmente da pesca, possuem um baixo índice de escolaridade, com uma média de cinco filhos por família. Moram em casas de madeira, sem nenhum conforto aparente, infraestrutura praticamente nenhuma, sem falar na ausência quase que total de ajuda do poder público. Diante deste quadro o óbvio a se pensar é que os mesmos sonham com uma vida melhor em outro local, com mais conforto e oportunidades. Contudo, o quadro que se depara é justamente ao contrário, quando questionados de que com as condições atuais onde prefeririam viver e trabalhar, a resposta foi unânime na beira do rio. Fonte: dados de pesquisa, novembro 2006. Tem relações de amizade e parentesco com outros moradores da região, como os moradores do Amolar, Porto São Pedro, Mangueira entre outros. Mostram-se muito preocupados e ansiosos com a possibilidade de criação de novas áreas de preservação e/ou conservação na região. Estas áreas, se criadas seguindo o modelo da que existe perto deles, será uma imensa restrição a vida tradicional que eles experimentam e levaria a extinção uma espécie importante, o homem pantaneiro. Surge então uma questão a ser pensada: Como estamos (a sociedade) vendo a questão ambiental? A necessidade de isolamento de uma área para que esta seja preservada, revela

Gráfico 1: Respostas a pergunta "Com as condições atuais, onde preferiria viver e

trabalhar?". Dados por família

1 2 3 4 5 6 7

na beira do riona cidade

uma visão de incapacidade do ser humano de interagir com a natureza sem destruí-la. O pensamento, o direcionamento deveria vir em sentido contrário, o de busca de iniciativas que visem uma sustentabilidade das famílias envolvidas, uma relação extrativista sim,mas comprovadamente sustentável, caso o contrário essas famílias não perdurariam na região por mais de 2 séculos. Para refletir As disputas por espaços ambientalmente preservados têm crescido levando grupos de pessoas e empreendedores de diversos tipos a procurar a posse privada de áreas ambientalmente preservadas. Este fenômeno esta criando uma condição de atrito com as populações dos locais agora pleiteados. São, geralmente, grupos populacionais que estavam nestes espaços por um período de tempo relativamente grande. Muitos deles descendentes dos primeiros habitantes do local. Uma visão restrita de ambiente tem impedido e/ou restringido, sem nenhuma negociação prévia, as antigas populações tradicionais de acessarem estes espaços. São tratados de forma marginal e quando não, desconsiderados. Justificam pela necessidade de preservar parte da natureza que ainda resta em condições razoáveis. Contudo desconsideram que quem esta estragando, contaminando, exaurindo os ambientes são pessoas que vivem um modo de vida ‘consumista’. Para manter este tipo de vida usam em demasia os recursos naturais, degradam ambientes. Ao adotar uma postura como esta, propõe que povos que tem um outro estilo de vida sejam privados dela para que criemos uma ‘natureza intocada’. Como são portadores de recursos físicos, financeiros e informacionais mais poderosos que os povos tradicionais, geralmente, conseguem efetivar seus propósitos e acabam por excluir parte significativa destas populações tradicionais. Contudo, a partir da luta e resistência destes povos, das denuncias em veículos de comunicação expressivos e do afinamento em termos de pesquisa e envolvimento de segmentos importantes da sociedade civil, como universidades, centros de pesquisas, ong’s com outras premissas, sindicatos, cooperativas, empreendedores social e ambientalmente responsáveis entre outras entidades tem sido criadas algumas alternativas negociadas. Reservar espaços para que estes povos continuem existindo e mantendo suas tradições passou a ser mais um item na pauta da luta por um planeta ambientalmente justo, economicamente viável e socialmente eqüitativo, princípios reais do ecodesenvolvimento em sua essência e prática. Concluindo, qual a finalidade de “conscientizar” a respeito das questões ambientais, se somente alguns escolhidos poderão ter contato direto com a natureza, estamos privatizando o pantanal, área que por ironia é considerada Patrimônio da Humanidade. Até então estamos observando uma pequena inclusão daqueles que detém poder econômico para financiar um passeio no pantanal em detrimento da eco-exclusão de populações tradiconais. Bibliografia ACSELRAD, Henri. Cidadania e Meio Ambiente In:_Acselrad, H. (org.) Meio Ambiente e Democracia. Rio de Janeiro: IBASE, 1992. ALONSO, Angela e COSTA, Valeriano. Por uma sociologia dos conflitos ambientais. Encontro do grupo Meio Ambiente e Desenvolvimento da CLACSO, 2001 Disponível no site www.centrodametropole.br. CATELLA, A. C. A Pesca no Pantanal de mato Grosso do Sul, Brasil: descrição, nível de exploração e manejo (1994 – 1999). 351p. Tese de Doutorado (Instituto nacional de Pesquisas na Amazônia – INPA; Universidade do Amazonas). Manaus, 2001.

CATELLA, A. C. A pesca no Pantanal Sul: situação atual e perspectivas. Série Documentos n°48. Corumbá: Embrapa Pantanal, 2004. 43p

BREDARIOL, Celso Simões. Conflitos Sócio-Ambientais Urbanos Casos na cidade do Rio de Janeiro In:_ SCOTTO, Gabriela e LIMONCIC, Flávio (orgs.) Conflitos Sócio-Ambientais no Brasil VolII: O caso do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: IBASE, 1997 BRITO, M. C. W. de. Unidades de Conservação: intenções e resultados. São Paulo: AnnaBlume: FAPESP, 2000. CASTELLS, M. A era da informação: economia, sociedade e cultura Vol 2: O poder da identidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.

CÔRTES, M. R. Colegiado Gestor em Áreas de Proteção Ambiental: Análise de três experiências no Estado de São Paulo: Murro em ponta de faca?. 2003 Dissertação (Doutorado em Ciências da Engenharia Ambiental) Escola de Engenharia de São Carlos, São Carlos. DIEGUES, A. C. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo: Hucitec, 2000. ECOTRÓPICA Áreas Protegidas. Disponível em: http://www.ecotropica.org.br/areas.htm . Acesso em: 30 mar. 2007 FRANZ, Paulo R. Ferreira. Caracterização da agropecuária do Estado de Mato Grosso do Sul (MS). Ministério da Agricultura/SDR/PNFC, 1997. HERMMAN, G.; COSTA, C. Programa de Gestão Participativa no Parque Nacional do Itatiaia. Cadernos FBDS. Disponível em: <http/www.fbds.org.br/IMG/pdf/doc.32.pdf> Acesso em: maio/2003.

IBAMA. Relatório Técnico: Assunto: Conselho Consultivo Reunião de 30 de setembro de 2003 Clube Social Recreativo Itamontense Itamonte / MG (mimeo).2003 LEIS, H. R. A Modernidade Insuportável: as críticas do ambientalismo à sociedade contemporânea. Petrópolis: Vozes, Santa Catarina: UFSC, 1999. LEIS, H. R.; VIOLA, E. J. A evolução das políticas ambientais no Brasil, 1971-1991: do bissetorialismo preservacionista para o multisetorialismo orientado para o desenvolvimento sustentável. In: HOGAN, D. J.; VIEIRA, P. F. (org) Dilemas sócio-ambientais e desenvolvimento sustentável. Campinas : Unicamp, 1995 RESENDE, Roberto Ulisses. As regras do jogo... São Paulo: AnnaBlume: Fapesp, 2002. Ribeiro, Karla Odonne. Ação coletiva, conselho consultivo e gestão: um estudo na área de proteção ambiental da Serra da Mantiqueira. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Lavras, 2005 SANTILLI, J. A distribuição socialmente injusta dos ônus gerados pelas políticas de criação e implantação de unidades de conservação ambiental em áreas ocupadas por populações tradicionais. A visão crítica do socioambientalismo e as tentativas de superação de tais discriminações sociais através de mecanismos jurídicos criados pela Lei do SNUC. In: II Encontro ANPASS. Indaiatuba: Hotel Vitória, 2004. Disponível em: <http://www.anppas.org.br/encontro/segundo/Papers/GT/GT17/gt17_juliana_santilli.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2005 SILVA et Al, Sugestões para uso e manejo de vertissolos nos Projetos de Assentamento da Região não inundável de Corumbá – MS. CPAP EMBRAPA, Corumbá, MS. 1995 VIOLA, E. J. O movimento ambientalista no Brasil (1971-1991): da denúncia e conscientização pública para a institucionalização e o desenvolvimento sustentável In: GOLDENBERG, M. (coord.). Ecologia, Ciência e Política: participação social, interesses em jogo e luta de idéias no movimento ecológico. Rio de Janeiro: Revan, 1992.