Posturas Coleta de Açaí(1)

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001

    Processo Extrativista do Aa:Contribuio da Ergonomia com Basena Anlise Postural Durante a Coleta

    dos Frutos

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001

    Universidade Federal de Santa Catarina

    Programa de Ps - graduao em Engenharia de Produo

    Processo Extrativista do Aa:Contribuio da Ergonomia com Base naAnlise Postural Durante a Coleta dos

    Frutos

    Srgio Aruana Elarrat Canto

    Dissertao apresentada ao Programa de Ps Graduaoem Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa

    Catarina como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestreem Engenharia de Produo

    Florianpolisdezembro / 2001

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 III

    Processo Extrativista do Aa:Contribuio da Ergonomia com Base na Anlise

    Postural Durante a Coleta dos Frutos

    Srgio Aruana Elarrat Canto

    Esta dissertao foi julgada e aprovada para a obteno do Ttulo deMestre em Engenharia de Produo no Programa de Ps-graduao em

    Engenharia de Produo da Universidade Federal de Santa Catarina

    Florianpolis, 11 de dezembro de 2001

    Prof. Ricardo Miranda Barcia, Ph. DCoordenador do Curso

    BANCA EXAMINADORA

    Orientadora: Prof ,Dra.Leila Amaral Gontijo

    Prof, Dra.Ana Regina de Aguiar Dutra

    Prof, Dra.Silvana Bernardes Rosa

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 IV

    DEDICATRIA

    AOS AMAZNIDAS DE TODOS OS TEMPOS E DE TODAS AS ETNIAS,

    QUE MOVIDOS PELO RESPEITO VIDA E NATUREZA, SE

    EMPENHARAM PARA LEGAR ESPERANAS S GERAES

    SEGUINTES.

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 V

    AGRADECIMENTOS

    Felizmente foram muitos os colaboradores para que este trabalho se concretizasse.

    Formaram uma verdadeira corrente da boa vontade por onde fluram muitas contribuies tcnicas

    e pessoais. Deixando muitos motivos para agradecer. Especialmente pelo ensinamento de que

    sempre possvel acrescentar mais um elo na corrente da boa vontade.

    Meus agradecimentos para:

    Sociedade brasileirapor ter me proporcionado meios de ensino pblico e gratuito, que

    espero honrar dignamente revertendo os conhecimentos em benefcios para o pas, a

    comear pela minha regio.

    UFPA - Universidade Federal do Paronde tudo comeou e se manteve sempre

    presente por meios dos setores:

    o PROPESP- Pr - reitoria de Pesquisa extenso, com agradecimentos especiais a

    Eliana e ngela.

    o Centro Tecnolgico com agradecimentos especiais aos professores Sinfrnio

    Brito e Antnio Malaquias

    o DEM - Departamento de Engenharia Mecnica

    o DEQ -Departamento de Engenharia Qumica, com agradecimentos especiais ao

    prof Dr. Herv Rogez.

    o NUMA- Ncleo de Meio Ambiente

    o POEMA - Programa de Pobreza e Meio Ambiente na Amazniao NAEA- Ncleo de Meio Ambiente

    o Academia Amaznia

    o Centro Scio Econmico

    UFSC - Universidade de Santa Catarina pela receptividade

    o Departamento de Ps-graduao em Engenharia de Produo pela dignidade no

    cumprimento do compromisso assumido

    UNAMA-

    Universidade da Amaznia

    MPEG - Museu Paraense Emlio Goeldi, especialmente ao Dr. Mrio Jardim.

    EMBRAPA - AP especialmenteaSilas Mochiutti, no estado do Amap

    Prefeitura Municipal de Belm

    o CODEM - Companhia de Desenvolvimento Metropolitano de Belm, em especial

    aos arquitetos Eurico, Nestor, Vanja e Dirce

    o SEGEP - Secretaria Municipal de Coordenao Geral do Planejamento e Gesto.

    o Posto de Sade do Combu, em especial ao agente adm. Eduardo e a Dra. Graa

    o SECON - Secretaria Munic ipal de Economia, especialmente a James Ribeiro de

    Azevedo Governo do Estado Par

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 VI

    Governo do Estado do Amap

    o SEPLAN - Secretria de Planejamento

    o IEPA - Instituto de Pesquisas Cientficas e Tecnolgicas do Estado do Amap,

    especialmente a Joo Freitas.

    Comunidade da Ilha do COMBU muito especialmente aos senhores Reinaldo e Rui

    professora Helenice Coury, pesquisadora da UFSCar.

    A minha Orientadora Leila Gont ijoque esteve muito presente na materializao da

    pesquisa. Orientando e mostrando o melhor caminho.

    Aos muitos amigos, que independente da distncia que se encontravam,

    demonstrando solidariedade e contriburam para tornar este perodo confortvel, tanto

    material como psicologicamente. E ainda reforaram o aprendizado moral. Foram muitos,

    mas estaro bem representados por Ana Cludia Cardoso, Aluzio Cardoso, Celma Chaves,

    Cleumara Kosmann, Fernando Mateus, Geovana Reis, Graciela Brocardo, Jerusa Marchi,Antnio J. Hernndez Fonseca, Joo Moraes Neto, Johnny Sena, Leonardo Lima, Sivaldo

    Brito, Srgio Barra, Suzana Barreto dentre outros.

    Aos meus pais amaznidas. Seguramente os meus amigos mais antigos e mais fiis

    A minha Dta. Que mesmo se sacrificando me ofereceu apoio e amor incondicional.

    Ao meu talentoso f ilhoarana Mrciopelo apoio recebido e por ter honrado o voto de

    confiana que recebeu.

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 VII

    A FLORESTA AMAZNICA TANTO PODE SER GENEROSA COMO CRUEL.

    DEPENDE APENAS DO TRATAMENTO QUE RECEBA.Z DUA

    UM AMAZNIDA

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 VIII

    SUMRIO

    LISTA DE FIGURAS .................................................................................................. XLISTA DE QUADROS ............................................................................................... XILISTA DE QUADROS ............................................................................................... XILISTA DE ABREVIATURAS .................................................................................... XIIABSTRACT ............................................................................................................. XIV

    CAPTULO 1 .......................................................................................... 15

    1. INTRODUO ...................................................................................................... 151.2. Objetivos ............................................................................................................ 181.2.1. Objetivo Geral ........................................................................................................................ 18

    1.2.2. Objetivo especfico ................................................................................................................. 181.3. Justificativa ......................................................................................................... 181.4. Mtodos e Tcnicas Empregados ...................................................................... 231.4.1. Pesquisas bibliogrficas ......................................................................................................... 231.4.2. Pesquisa de Campo ............................................................................................................... 241.4.3. Anlise Postural ..................................................................................................................... 241.4.1. Locais de pesquisa ................................................................................................................. 251.5 Estrutura da Pesquisa ......................................................................................... 27

    CAPTULO 2 .......................................................................................... 28

    2. AAIZEIRO - A PALMEIRA QUE CHORA .......................................................... 28

    2.1. Os Registros Histricos ...................................................................................... 292.2. Aspectos Botnicos e Ecolgicos ....................................................................... 302.2.1. Caractersticas do Aaizeiro................................................................................................... 302.2.2. Ambiente de Ocorrncia:........................................................................................................ 332.2.3. Variedades ............................................................................................................................. 352.2.4. Florao, Frutificao e Safra ................................................................................................ 362.2.5. Frutos ..................................................................................................................................... 382.3 Os Mltiplos usos ................................................................................................ 392.3.1. A Polpa do Aa e Suas Propriedades ................................................................................... 402.3.2. O Palmito ................................................................................................................................ 42

    CAPTULO 3 .......................................................................................... 45

    3. TCNICAS E ESTRATGIAS DE PRODUO .................................................. 453.1. A Organizao do Trabalho ................................................................................ 473.2. Detalhamento ..................................................................................................... 493.2.1 Manejo do aa ........................................................................................................................ 493.3. As tcnicas de Produo com Manejo de aaizais ............................................ 503.4. Colheita .............................................................................................................. 543.4.1. A Colheita dos Frutos - "A escalada". .................................................................................... 573.5. A Debulha e Seleo .......................................................................................... 593.6. O Estratgico uso das Rasas ............................................................................. 603.7. Comercializao ................................................................................................. 613.7.1 - As feiras de frutos ................................................................................................................. 61

    3.7.2. As Amassadeiras de aa ....................................................................................................... 63

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 IX

    CAPTULO 4 .......................................................................................... 66

    4. MTODOS E TCNICAS ...................................................................................... 664.1 Os procedimentos empregados .......................................................................... 664.1.1. Coleta de dados ..................................................................................................................... 664.1 Observaes do Trabalho ................................................................................... 674.2 Protocolos de Anlise Postural ............................................................................ 68

    CAPTULO 5 .......................................................................................... 76

    5. A ANLISE DO TRABALHO DA COLETA DOS FRUTOS ................................. 765.1. A Ergonomia nas atividades Agrcolas ............................................................... 765.2. A Ambincia do Trabalho ................................................................................... 775.2.1. Caractersticas Sociais ........................................................................................................... 79

    5.2.2. Anlise Epidemiolgica .......................................................................................................... 825.3. Anlise Postural da Coleta de Frutos ................................................................. 835.3.1 Perfil do Trabalhador-modelo .................................................................................................. 835.4. A Observao da Coleta do Aa ....................................................................... 845. 4.1. As Posturas Assumidas no Trabalho. ................................................................................... 855.5. Cronometragem ................................................................................................. 885.6. Aplicao dos Protocolos de Avaliaes Posturais ............................................ 905.7. Discusso dos Resultados das Avaliaes Posturais ........................................ 955.7.1. Resumo da Avaliao pelo Protocolo OWAS ........................................................................ 955.7.2. Resumo da Avaliao pelo Protocolo RULA .......................................................................... 965.7.3. Resumo da Avaliao pelo Protocolo RARME ...................................................................... 975.7.4. Comparao dos Resultados ................................................................................................. 98

    CONCLUSES ....................................................................................................... 101REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ....................................................................... 108

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 X

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1.1 - Mapa da rede de gerao e transmisso de energia eltrica gerenciadas pela ELETRONORTE,nota - se que os sistemas no se limitam aos estados da Regio Norte ............................................. 21

    Figura 1.2- Indicaes dos locais das pesquisas de campo .............................................. ................................... 24

    Figura 2.1 - O Aaizeiro (Euterpe Olercea) ...................................................... ................................................... 31

    Figura 2.2 - Estipes do aaizeiro........................................................................................................................... 31

    Figura 2.3 - Local de ocorrncia do aaizeiro (Euterpe Olercea) no Brasil ........................................................ 34

    Figura 2.4.- Ambiente nativo dos aaizeiros ................................................................................................. ........ 34

    Figura 2.5 -A)variedade Uma, B)Preto, C)Verde, D)Espada e E)paneiros, ou rasas, com frutos dasvariedades Preto e Verde ...................................................... ........................................................ ....... 36

    Figura 2.6 -A)Detalhes da florao e da copa de um aaizeiro, B)Calho colhido com frutos maduros. ............ 37

    Figura 2.7 -A)Frutos in natura, B)Caroos despolpados, C)Caroo secionadas eD)Esquema da seco. .... 38

    Figura 2.8 - Utilizao dos aaizeiros: A)Pomar, B) Nas construes rurais, C ) Paisagismo Urbano, D)Material para artesanatos e vassouras rsticas ................................................................................... 40

    Figura 2.9. aa do tipo grosso no momento do beneficiamento .................................. ........................................ 40

    Figura 2.10 - Localizao do palmito na palmeira...................................................... ........................................... 43

    Figura 3.1 - Composio da renda familiar derivada de produtos naturais na Ilha das Onas no ano de 1986 .. 46

    Figura 3.2 - Variao na produo mensal de frutos e palmito (%) comercializados na Feira do Aa,municpio de Belm. ............................................................................................................................ 49

    Figura 3.3 - Detalhes da escalada do estipe na colheita do aa ............................................................. ............. 55

    Figura 3.4 - Vara usada no Sul do Par para colher os frutos do aaizeiro ......................................................... 55

    Figura 3.5-- A)fibra do aaizeiro usada para tecer a peconha e B)- Peconha pronta e desgastada pelo uso. .... 57

    Figura 3.6 - Cacho de aa maduro com destaque para a Boneca e o aa "tura" (maduro, com aspectoacinzentado). ............................................... ........................................................ ................................. 58

    Figura 3.7.Ae B) Debulha, C) Seleo dos frutos; D) ;transporte na rasa ( Fotos da ilha do Combu) ............... 59

    Figura 3.8 - Rasas:A) Usada para sementes de cacau, B) Com capacidade para 2 latas, ou 30kg (Par),C)Com capacidade para 1 lata, ou 15 kg (Amap), D)paneiro com capacidade para uma lata, ou15kg. .................................................................................................................................................... 61

    Figura 3.9 - Rotinas da comercializao de aa .................................................................................................. 62

    Figura 3.10 - Mquina eltrica de aa, em perspectiva, com corte parcial na carcaa ........................................ 64

    Figura 3.11 -A- Aa com os produtos que tradicionalmente acompanham o consumo, B, C- e Dpontos de

    vendas em locais diversos, com as placas indicativas, de cor vermelha ............................................. 65Figura 5.1 -A)Mapa do municpio de Belm, de 1905, que registra a ilha do Combu, dentre outras, B) atual

    diviso Administrativa do Municpio de Belm e C)Imagem de Satlite da Ilha do Combu ................. 78

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 XI

    LISTA DE QUADROSQuadro 2.1 - Usos do aa ........................................................ .................................................................... ........ 39

    Quadro 3.2 - Tcnicas empregadas no manejo de aaizeiros ................................................... ........................... 52

    Quadro 3.3 - Avaliao de procedimentos de coleta de aa .................................................... ........................... 56Quadro 4.1 - Legenda do cdigo de cores adotado nos protocolos de anlise postural ....................................... 69

    Quadro 4.2 - Caractersticas do protocolo OWAS ................................................................................................ 70

    Quadro 4.2-A- Planilha do protocolo OWAS ................................................. ........................................................ 71

    Quadro 4.3 - Caractersticas do Protocolo RULA ............................... .................................................................. 72

    Quadro 4. 3 - A - Planilha do Protocolo RULA ................................................ ...................................................... 73

    Quadro 4.4 - Caractersticas do protocolo RARME ........................... ................................................................... 74

    Quadro 4.4 - A - Planilha do Protocolo RARME.................................................................................................... 75

    -Quadro 5.2 - Mapa da Ilha do Combu ................................................................................................................. 80

    Quadro 5.3. - Imagens da Ilha do Combu ........................................................... .................................................. 81Quadro 5.4 - A acidentes e doenas mais comuns que ocorrem com o apanhador de aa ................................ 82

    Quadro 5.5 - Descrio das posturas assumidas no trabalho .............................................................................. 86

    Quadro 5.6 - Galeria das posturas selecionadas na coleta do Aa ..................................................................... 87

    Quadro 5.7 - Cronometragem de um ciclo de trabalho ................................................... ...................................... 89

    Quadro 5.8 - Resultado da Avaliao empregando o protocolo OWAS ................................................... ............. 91

    Quadro 5.9 - Resultado da Avaliao empregando o protocolo RULA ................................................... .............. 92

    Quadro 5.10 - Resultado da Avaliao pelo protocolo RARME .................................................... ........................ 93

    Quadro 5.11 - Comparao dos resultados indicados pelos protocolos ......................................................... ..... 94

    Quadro 5.12 - Resumo dos Resultados do Protocolo OWAS ..................................................... .......................... 95

    Quadro 5.13 - Resumo dos Resultados do Protocolo RULA .............................................................. .................. 96

    Quadro 5.14 - Resumo dos Resultados do Protocolo RARME ..................................................... ........................ 97

    Quadro 5.15 - Resumo dos Resultados Considerados Mais Crticos ................................................................... 98

    Quadro 5.16 - Condies Agravantes ........................................................ ......................................................... 104

    Quadro 5.17 - Condies Atenuantes ........................................................... ...................................................... 106

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 XII

    LISTA DE ABREVIATURAS

    CEASA- Central de Abastecimento S/A

    CODEM - Companhia de Desenvolvimento Metropolitano de Belm

    DORT- Distrbios steo-musculares Relacionados ao Trabalho

    EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria

    EPI- Equipamento de Proteo Individual

    IEPA - Instituto de Pesquisas Cientficas e Tecnolgicas do Estado do Amap

    LER - Leso por esforo Repetitivo

    MPEG - Museu Paraense Emlio GoeldiMOPEPA - Movimento dos Pescadores do Par

    NAEA - Ncleo de Meio Ambiente / Universidade Federal do Par

    NUMA - Ncleo de Meio Ambiente / Universidade Federal do Par

    OWAS -Ovako Working Posture Analysing System

    OIT- Organizao Internacional do Trabalho

    PDSA - Programa de Desenvolvimento Sustentvel do Amap

    POEMA - Programa de Pobreza e Meio Ambiente na AmazniaPMA - Prefeitura Municipal de Macap

    PMB - Prefeitura Municipal de Belm

    RARME -Roteiro para Avaliao de Riscos Msculo - esquelticos

    RDS- Reserva de Desenvolvimento Sustentvel

    RULA - Rapid Upper Limb Assessment

    SECON - Secretaria Municipal de economia do Municpio de Belm

    SEPLAN - Secretria de Planejamento do Estado do Amap

    UFPA - Universidade Federal do Par

    UNAMA - Universidade da Amaznia

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 XIII

    RESUMO

    O Aaizeiro (Euterpe Olercea, Mart) uma palmeira tpica da floresta amaznica

    e muito expressiva para a cultura e para a economia. Fornece muitos produtosque auxiliam na sobrevivncia da populao local, especialmente para a

    alimentao da populao ribeirinha do esturio amaznico, sendo os mais

    importantes o palmito e principalmente a bebida aa, que obtida do fruto da

    palmeira, um alimento tradicional e largamente consumido na Amaznia. Nos

    ltimos anos o consumo vem se expandindo em outras regies do pas e do

    mundo, ampliando as oportunidades de empregos e estimulando a economia

    amaznica. A explorao do aaizeiro se d atravs de tcnicas prprias de

    extrativismo, praticado intensamente por milhares de pessoas no esturio

    amaznico. Esta pesquisa analisou, na ilha do Combu - Par, os aspectos

    posturais do trabalho extrativista do aa, na fase de coleta dos frutos, para

    diagnosticar as possveis conseqncias nocivas do trabalho na sade do

    trabalhador. A pesquisa foi orientada pela metodologia da Anlise Ergonmica do

    Trabalho e empregados os protocolos OWAS, RULA e RARME.

    Palavras chaves:Aa amaznico, Extrativismo de aa, anlise postural, OWAS,

    RULA, RARME

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 XIV

    ABSTRACT

    TheAaizeiro (Euterpe Olercea, Mart)is a typical palm tree of amazon forest andvery expressive for the culture for the economy and especially for the feeding of

    the riverine population of the amazon estuary. The aa palm originates many

    products that aid in the survival of the local population. The most important of them

    is the palm heart, and theAa drink, which is obtained from the fruit of the palm

    tree and is a traditional food, broadly consumed in Amaznia. In the last years the

    consumption has expanded to other regions of the country and of the world,

    enlarging the opportunities of employments and stimulating the amazoneconomics. The exploration of the aa palm occurs by means of particular

    extracting techniques practiced intensely by thousands of people in the amazon

    estuary. The present research investigated, in the island of Combu in the State of

    Par, the postural aspects of the extracting work of the aapalm in the phase of

    recollection of the fruits using techniques of Ergonomic Analysis of the Work

    through the OWAS, RULA and RARME protocols, aiming to diagnose the possible

    noxious consequences of the work in the worker's health.

    Key words: Amazons aa, Aai extracting, ergonomic, postural analysis,

    OWAS, RULA, RARME

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001

    CAPTULO 1

    1. INTRODUO

    O aaizeiro, denominado cientificamente como Euterpe Olercea Mart,

    uma palmeira nativa da Amaznia e abundante nas reas de vrzeas daquela

    regio, especialmente no esturio amaznico. Para os nativos, esta palmeira

    representa uma importante fonte natural de recursos. POULLET (1998) consideraque o aa um dos produtos mais importantes da vida alimentar e cultural da

    populao amapaense. ROGEZ (2000) vai alm ao afirmar que o aaizeiro a

    palmeira mais produtiva do ecossistema que abriga a populao do delta do

    Amazonas.

    O aaizeiro pode fornecer madeira para construes rurais, palha para

    coberturas, remdios, matria-prima para artesanato, corante. Mas, como fonte

    de alimentos a sua primordial importncia. Oferece o palmito e o fruto, de onde extrado o suco do aa, tambm conhecido na Amaznia como vinho de aa.

    Seguramente um dos mais populares e tradicionais recursos nutricionais das

    populaes ribeirinhas de grande parte da Amaznia.

    A extrao do Palmito na regio se iniciou nos anos sessenta. Motivada

    pela quase extino dos palmiteiros da Mata Atlntica, o Euterpe Edulis, a

    indstria de palmito do sul e sudeste do pas instalou-se na Floresta Amaznica e

    passou a consumir vorazmente os aaizais. Sem dvida que nascia umaoportunidade de desenvolvimento econmica. Mas, atrelada aos benefcios

    estava a ameaa de extino dos aaizeiros. Preocupando os ambientalistas,

    pesquisadores, entidades civis, a imprensa e a populao. Que temiam estar

    assistindo a extino dos aaizeiros. Se esta ameaa se concretizasse as

    conseqncias seriam desastrosas ao meio ambiente, vida dos povos da

    floresta, aos ribeirinhos, e um duro golpe na cultura local.

    "Chegou ao Par, parou;

    tomou aa, ficou "

    Ditado Popular

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 16

    As preocupaes geraram aes e pesquisas cientficas realizadas por

    entidades locais como: FCAP - Faculdade de Cincias Agrrias do Par, UFPA -

    Universidade Federal do Par, MPEG - Museu Paraense Emlio Goeldi,

    EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria, SUDAM -

    Superintendncia de Desenvolvimento da Amaznia, Governos dos estados da

    Amaznia, dentre outras.

    Os resultados dos estudos foram tranqilizadores. Comprovaram que os

    risco de extino da espcie eram pequenos. A Euterpe Olercea,

    diferentemente da Euterpe Eduls, cespitosa, ou seja, cresce com vrios

    estipes, formando touceiras. Tem grande produo e germinao natural de

    sementes. Estas caractersticas garantem ao aaizeiro um grande poder de

    regenerao. Mesmo assim, necessrio que aexplorao seja feita com manejo

    adequado para garantir a sobrevivncia da espcie e a sustentabilidade da

    atividade.

    O palmito do aaizeiro transps as fronteiras amaznicas e at do Brasil,

    e passou a ser apreciado nos grandes centros criando uma nova demanda.

    Recentemente a polpa do suco de aa tambm transps as fronteiras

    amaznicas e chegou a outras regies do pas e at em outros pases.

    Rapidamente tornou-se um produto popular, principalmente por lhe serem

    atribuda caractersticas energtica. Segundo GUIMARES (1999) estima-se que

    s a CEASA do Estado do Rio de Janeiro receba 200 toneladas/ms de polpa de

    aa proveniente da regio norte do pas, principalmente do estado do Par. Ainda

    segundo o mesmo autor, este um mercado em expanso. Cita comerciantes

    cariocas que aumentaram em at 40 vezes a quantidade de polpa de aa

    vendida em um ano.

    O aumento da demanda traz novas oportunidades de negcios para a

    regio norte. Embora a comercializao seja feita por uma intrincada malha de

    atravessadores, comprovada por POULLET (1999) no Amap, GUIMARES

    (1999), no abastecimento do Rio de Janeiro e ROGEZ (2000), no Par. Ainda

    assim, o momento pode ter uma feio diferente do Ciclo da Borracha, da

    explorao madeireira e das aes mineradoras que, em muitos casos, trouxeram

    resultados destruidores ao meio ambiente. O desenvolvimento econmico foi

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 17

    passageiro e concentraram riquezas. Neste novo momento as populaes

    tradicionais locais podem se beneficiar, principalmente se estiverem organizadas

    e assistidas. Podero obter melhora no campo econmico, social, cultural e

    tecnolgico e ainda continuaro exercendo a sua vocao. Preservando os

    aaizeiros e o meio ambiente. Uma situao perfeitamente integrada s propostas

    para o trato ambiental ditadas pela ONU.

    Os ensinamentos deixados com o Ciclo da Borracha podero evitar novos

    erros. Inclusive a prpria seringueira foi pouco estudada. Felizmente j existe

    muito conhecimento acumulado sobre o aaizeiro. Com as grandes contribuies

    das pesquisas cientficas foi possvel conhecer as caractersticas botnicas, a

    ecologia do aaizeiro, sua viabilidade econmica, a organizao social das

    comunidades extrativistas e outros aspectos que envolvem o cultivo. O quadro

    favorvel mostrando que a atividade da cultura do aaizeiro est consolidada na

    regio. Existe compatibilidade com as recomendaes de preservao do meio

    ambiente. A atividade mobiliza a economia regional e garante a sobrevivncia de

    boa parte da populao ribeirinha amaznica, como tambm um recurso que

    resguarda a cultura popular. Apesar disto, a metodologia de extrao e

    beneficiamento praticamente se mantm a mesma e pouco se pesquisou sobre a

    situao ergonmica deste trabalho e os comprometimentos sade dos

    trabalhadores envolvidos no processo.

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 18

    1.2. Objetivos

    1.2.1. Objetivo Geral

    Analisar as condies gerais do trabalho no processo amaznico de

    extrativismo do aa, visando traar um diagnstico que oferea fundamentos

    para tornar o trabalho com o aa mais confortvel, seguro e produtivo, refletindo

    nas perspectivas de desenvolvimento regional.

    1.2.2. Objetivo especfico

    Caracterizar os aspectos posturais tpicos da etapa de coleta dos frutos

    que possam comprometer a sade do trabalhador.

    1.3. Just ificativa

    As posturas assumidas durante a coleta dos frutos do aaizeiro

    apresentam complexidades que motivam a pesquisa. Conhecer as implicaes

    destas posturas na sade do trabalhador-extrativista pode auxiliar nas decises

    para a melhora do longo e antigo processo do trabalho com o aa. Alm da

    visvel situao postural, pode ser observado um conjunto de situaes que

    convergem para que os resultados da pesquisa sejam bem aproveitados.

    O emprego dos princpios da ergonomia na pesquisa pode apontar

    caminhos promissores para atingir os objetivos da pesquisa. Como tambm

    contribuir para ampliar a rea de aplicao da prpria ergonomia.

    Como o extrativismo do aa um importante recurso alimentar e

    econmico da populao local, alm de ser uma prtica tradicional e afetar a

    cultura popular amaznica, estud-lo pode trazer benefcios sociais significativos.

    O conhecimento das condies de trabalho pode favorecer o implemento da

    atividade, somando esforos para aumentar as oportunidades de participao da

    populao amaznica no comrcio crescente de aa e de seus subprodutos.

    Com base nas projees de produo de NASCIMENTO (1992), s a capital do

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 19

    estado do Par consome atualmente algo em torno de 100.000 litros/dia de aa.

    Pelas projees de GUIMARES (1999) o consumo em nove capitais de outras

    regies brasileiras poder chegar de 27.600 toneladas/ano de polpa.

    Apesar deste aquecimento econmico, as estatsticas do IBGE mostram

    deficincias na condio de vida da populao da regio, mas a realidade est

    alm da simples anlise dos dados. comum a Regio Norte ser avaliada com

    parmetros de outras realidades. Dificultando o conhecimento do contexto e das

    estratgias de sobrevivncia local. Estes julgamentos precipitados desprezam

    muitos aspectos importantes no trato com a floresta, ou nem sequer os

    perceberam. Como resultado muitos empreendimentos fracassaram ou trouxeram

    prejuzos para a prpria regio.

    Pode-se traar um quadro de penria para a regio, se forem levados em

    conta puramente os dados do IBGE, de 1992, os quais do conta que a Amaznia

    uma extensa rea de floresta com 3.574.238, 95 km, onde vivem espalhados

    os seus 11.290.573 habitantes, dando uma mdia aproximada de 0,32

    habitante/km. Um julgamento precipitado sugere que h um grande isolamento

    geogrfico nocivo aos habitantes, o que pode ter um fundo de razo, mas, pode

    estar a uma estratgia de sobrevivncia. As populaes da floresta necessitam

    de grandes extenses de terra para coletar alimentos e manejar suas plantaes,

    causando o mnimo impacto negativo sobre o meio ambiente. O extrativismo do

    aa um exemplo disto e ainda influencia na organizao social e na ocupao

    do solo.

    Ainda segundo o mesmo levantamento do IBGE, a Amaznia tem a

    segunda maior taxa de analfabetismo do pas, entre pessoas maiores de 15 anos.

    Tambm a maior mdia de pessoas por famlia por domiclio, o que pode

    representar famlias numerosas. Cerca de 31,4% da populao tem rendimento

    entre dois e cinco salrios mnimos e 5, 1% no tem rendimento. Neste ponto

    importante notar que ainda seria significativa a diferena se o IBGE tivesse

    considerado as populaes rurais no seu levantamento. Mas ao contrrio do que

    se pode concluir precipitadamente, a baixa renda na regio no significa

    necessariamente misria e fome. A sociedade organizada de tal maneira que o

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 20

    conhecimento emprico muito valioso para explorar os recursos disponveis que

    garantem a sobrevivncia, podendo at dispensar o uso de moedas.

    MURRIETA, BRONDZIO e SIQUEIRA (1998, p.148) descrevem os

    caboclos amaznidas e sua eficincia da seguinte forma:

    Fruto da colonizao europia e da assimilao indgena, o caboclo amaznico

    desenvolveu um sistema adaptativo especfico que filtrou os elementos

    necessrios para a fixao na regio, aproveitando o conhecimento dos grupos

    nativos precedentes ao contato e aos padres europeus impostos pelo sistema

    colonial. Descendente das antigas populaes indgenas que ocupavam o

    ambiente ribeirinho das vrzeas do Amazonas foi formado, gradativamente, um

    tipo cultural especfico, de mxima importncia para o cotidiano econmico e

    cultural da regio.

    Caracterizado por um eficiente aproveitamento dos variados recursos da floresta

    tropical o sistema de subsistncia cabocla permitiu a esses grupos uma relativa

    independncia de mercados externos, mesmo quando absorvidos por atividades

    essencialmente voltadas comercializao, como aconteceu durante o grande

    "boom" da borracha no sculo XIX. A variabilidade de atividades de subsistncias

    desenvolvidas por essa populaes e seu padro organizacional permitindo - lhes

    uma certa auto-suficincia, ao contrrio de outras populaes migrantes que

    sofreram uma acirrada proletarizao, como vem acontecendo, com as famlias

    vindas do sul do pas.

    A tecnologia disponvel um dos aspectos limitantes que exigem

    estratgias para superar as deficincias. A prpria situao energtica tambm

    complexa na regio. Conforme dados do Relatrio de Sistemas da Eletronorte, dedezembro de 1998, possvel evidenciar grandes e significativos contrastes entre

    produo e distribuio.

    A Amaznia dispe de um potencial hidro-energtico invejvel, com

    importantes hidreltricas como: Tucuru, no Par, uma das maiores do mundo;

    Coaracy Nunes, no Amap; Samuel, em Rondnia; Balbina, no Amazonas, alm

    das estaes termeltricas, no entanto as linhas de transmisso so incompletas

    e deixam muitas localidades sem energia, fato que se pode constatar no mapa de

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    distribuio de energia eltrica na ELETRONORTE exibido na figura 1.1, o que

    estimula a concentrao de tecnologia e populao nas capitais resultando

    grandes contrastes entre capitais e cidades interioranas.

    Figura 1.1 - Mapa da rede de gerao e transmisso de energia eltrica gerenciadas pela ELETRONORTE,nota - se que os sistemas no se limitam aos estados da Regio Norte 1

    O trabalho nas regies de floresta concentra-se na agricultura de

    subsistncia, no extrativismo de produtos da floresta como: frutos, ervas, resinas,

    leos, essncias, frutos, madeiras, mineradoras e garimpos. Caracterizando umaestratgia de sobrevivncia que exige baixa tecnologia e aproveita os recursos

    disponveis.

    MURRIETA, BRONDZIO e SIQUEIRA (1989) denunciam que os impulsos

    desenvolvimentistas das ltimas trs dcadas prejudicaram os sistemas

    tradicionais da regio, devido implantao de grandes projetos mineradores e

    agropecurios. Assim como, a construo de rodovias e hidreltricas que

    causaram desmatamentos em grandes reas, parte dos recursos renovveis foiextinta, prejudicando o meio ambiente como um todo e as populaes nativas, no

    caso a cabocla, foram abandonando gradativamente os manejos tradicionais que

    praticavam e se dissociando do estilo de vida tradicional. Como agravante a

    Amaznia vem enfrentado o perigo da bio-pirataria. Colocando em risco a

    sobrevivncia do prprio ser amaznico. Some-se ao contexto atual a

    globalizao da economia, onde a competitividade fundamental para a

    sobrevivncia. Torna-se mais difcil encontrar solues prprias.

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 22

    De acordo com MURRIETA, BRONDZIO e SIQUEIRA (1998, p.148):

    Estudos recentes demonstraram que sistemas extrativistas tradicionais

    desenvolvidos nessas comunidades so perfeitamente viveis junto economia

    de mercado sem que sejam necessrias alteraes radicais no modo de vida, ou

    no equilbrio ecolgico. Para isso, novos estudos precisam ser iniciados com o

    objetivo de adensar o pouco que se conhece sobre a populao cabocla, suas

    estratgias de subsistncias, estrutura social e padres demogrficos.

    O extrativismo do aa pode ser considerado uma atividade sustentvel,

    enquadrando-se perfeitamente s polticas adotadas pela ONU para o meio

    ambiente, que implementou, em 1980, pela Comisso Mundial sobre MeioAmbiente e Desenvolvimento (CMMAD, ou Comisso Brundtland), o conceito de

    Desenvolvimento Sustentvel: "Desenvolvimento sustentvel aquele que atende

    s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das geraes

    futuras atenderem suas prprias necessidades".A essncia da idia alcanar

    uma economia mundial sustentvel.

    A Comisso Mundial de Meio Ambiente, de 1983, analisou vrios

    aspectos da questo Meio ambiente X Desenvolvimento e enunciou:

    A ONU acredita que o crescimento populacional ser estvel em 2110,

    com 14 bilhes, mnimo de oito bilhes e mdia de 10,5 bilhes. Sendo

    que 90 % estaro nos pases em desenvolvimento;

    A pobreza reduz a capacidade das pessoas de usar os recursos

    naturais de forma racional, levando-as a exercer maior presso sobre o

    meio ambiente. Na Conferncia de Estocolmo, em 1972, Indira Gandhi,

    primeira-ministra da ndia j alertava que a: "A maior poluio apobreza";

    25% da populao mundial consome 75 % da energia primria, 75%

    dos metais e 60 % dos alimentos produzidos;

    A escassez da gua ser um dos mais graves problemas do prximo

    sculo.

    1Fonte: Relatrio de Sistemas da Eletronorte de 12/98. Via internet www.eln.org.br

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    1.4.2. Pesquisa de Campo

    A coleta de dados foi realizada no ambiente amaznico, no esturio do

    Amazonas, onde o aa nativo e cultivado no processo extrativista. Passando

    pelo Estado do Amap, nas cidades de Macap e Santana e no Estado do Par,

    nas cidades de Belm, Abaetetuba e concentrando-se na ilha do Combu,

    mostrados na figura 1.2

    Figura 1.2- Indicaes dos locais das pesquisas de campo

    Na Avaliao Postural na etapa de coleta dos frutos foram seguidas as

    tcnicas preconizadas na Anlise Ergonmica do Trabalho na anlise do trabalho,

    o reconhecimento da tarefa e da atividade, empregando-se entrevistas no

    estruturadas e semi-estruturadas e registros do trabalho in loco,com observaes

    abertas e armadas, (empregando filmadora, mquinas fotogrfica e gravadores).

    1.4.3. Anlise Postural

    O extrativismo do aa composto de vrias etapas de trabalho,

    caracterizando um sistema de produo amplo. Entretanto, a anlise postural

    proposta foi restrita fase de coleta dos frutos, em razo das complexidades das

    posturas apresentadas que sugerem um estudo concentrado.

    Nas anlises posturais foram empregados os protocolos OWAS (OvakoWorking Posture Analysing System), RULA (Rapid Upper Limb Assessment) e

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 25

    RARME (Roteiro para Avaliao de Riscos Msculo - esquelticos) e os

    resultados foram comparados buscando-se unificar os resultados e consolidar um

    diagnstico.

    1.4.1. Locais de pesquisa

    Os estudos foram concentrados em reas viveis pesquisa de campo e

    que expressassem a realidade amaznica. Desta forma, foram escolhidas as

    capitais Belm e Macap, que esto localizadas no esturio do rio Amazonas e

    tm significativa atividade envolvendo o aa, facilidade de acesso e maior

    disponibilidade de dados bibliogrficos, gerados pelos importantes centros de

    pesquisas localizados nestas cidades.

    Na ilha do Combu, no Par, mostrada na Figura 1.2, foram realizadas as

    principais fases da pesquisa, inclusive a observao do trabalho de coleta do

    aa, devido a vrias facilidades como acesso ao volume de informaes gerado

    por instituies, como a PMB (Prefeitura Municipal de Belm), UFPA

    (Universidade Federal do Par), MPEG (Museu Paraense Emilio Goeldi), UNAMA

    (Universidade da Amaznia), que realizam muitas pesquisas no local envolvendo

    aspectos sociais, humansticos, botnicos, ecolgicos, tecnolgicos, dentre

    outros. Motivadas justamente pelas caractersticas da ilha que reproduz o tpico

    ambiente de vrzea amaznico, tornando a ilha atraente para esta pesquisa.

    A ilha rene as seguintes caractersticas:

    1- Possui caractersticas tpicas da Amaznia;

    2- A economia basicamente calcada no extrativismo do aa;3- As tcnicas utilizadas no processo extrativistas do aa so

    semelhantes as de outras microrregies;

    4- No h energia eltrica disponvel;

    5- O acesso fcil. A ilha faz parte da regio metropolitana de Belm.

    Est localizada na margem esquerda do Rio Guam.

    Aproximadamente 1,5 km de Belm (figura 1.3);

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    6- Vrias instituies como a UFPA (Universidade Federal do Par), o

    MPEG (Museu Paraense Emlio Goeldi), UNAMA (Universidade da

    Amaznia), EMBRAPA - CPATU, PMB (Prefeitura Municipal de

    Belm), dentre outras, desenvolvem pesquisas na ilha,

    disponibilizando dados com abordagem sociolgica, econmica,

    energtica e tecnolgica sobre o local.

    7- A ilha reproduz as condies ambientais tpicas da Amaznia

    semelhantes as de outras microrregies. Assim plenamente

    possvel que os resultados encontrados se apliquem a outras

    regies amaznicas, com pequena diferena.

    Figura 1.3 - Aerofoto da Ilha do Combu - Par2

    2Fonte - Cortesia CODEM - Companhia de Desenvolvimento Metropolitano de Belm

    Ilha do Combu

    Rio Guam

    Belm

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    1.5 Estrutura da Pesquisa

    Esta pesquisa foi estruturada em cinco captulos e as concluses com aseguinte forma:

    Captulo 1- Introduo: Este captulo contm os elementos de

    apresentao da pesquisa

    Captulo 2- AAIZEIRO - A Palmeira que Chora - Neste

    captulo so apresentadas as caractersticas da palmeira Aaizeiro

    (Euterpe Olercea), locais de incidncia e os usos tradicionais.

    Captulo 3- Tcnicas e Estratgias de Produo - Neste

    captulo so estudadas as tcnicas de explorao e as estratgias

    adotadas no trabalho de extrativismo, centrando na etapa de coleta

    dos frutos.

    Capitulo 4 - Mtodos e Tcnicas - O captulo expe as

    metodologias e as tcnicas empregadas para a realizao da anlise

    postural

    Captulo 5 - A Anlise do Trabalho de Coleta dos Frutos -

    Neste captulo so discutidos todos os aspectos que influenciam a

    etapa de coleta de frutos e so exibidos os resultados com as

    discusses da anlise postural proposta.

    Concluso - traz as consideraes oriundas da pesquisa e

    especialmente da anlise postural.

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001

    CAPTULO 2

    2. AAIZEIRO - A PALMEIRA QUE CHORA

    Aa uma palavra originada do vocbulo tupi yasa'i, que significa: a

    fruta que chora (LOBATO, 1981), uma denominao confirmada no dicionrio da

    Lngua Portuguesa de Aurlio Buarque de Hollanda (2001, p.21), e encontra

    respaldo na lenda que conta saga de uma tribo amaznica que passava pordificuldades devido escassez de alimentos. Para conter o agravamento da crise

    com o aumento da populao, o cacique Itaki ordenou que todas as crianas

    nascidas a partir daquele momento deveriam ser sacrificadas. E assim foi feito por

    muitas luas.

    At que Iaa, filha do cacique, deu a luz a uma criana. Logo o conselho

    tribal exigiu o sacrifcio do beb para cumprir a lei. O cacique Itaki no hesitou em

    fazer cumprir sua palavra, mesmo sua filha tendo implorado para salvar a vidadaquela criana que seria neta do prprio cacique.

    Iaa ficou muito triste, enclausurou-se e passou a rogar a tup para que

    mostrasse a Itaki uma soluo para terminar com os sacrifcios das crianas. Na

    segunda noite de clausura, Iaa ouviu o choro de criana. Aproximou-se da porta

    da maloca e viu sua filha sob uma esbelta palmeira e logo correu para abraa -la.

    No dia seguinte, seu corpo foi encontrado abraado palmeira. Estava morta,

    mas seu semblante era risonho e irradiava satisfao. Seus olhos inertesapontavam para um cacho cheio de frutinhas pretas no alto da palmeira. O chefe

    da tribo ordenou que as frutas fossem recolhidas e amassadas num grande

    alguidar de madeira. Ao final, foi obtida uma bebida avermelhada que alimentou

    toda a tribo.

    O cacique entendeu que Tup havia mostrado, atravs de Iaa, o fim da

    fome e dos sacrifcios do seu povo. Agradecido, inverteu o nome da sua filha para

    denominar o deAa - o fruto da palmeira que chora.

    " Quando se chega mais perto das espessa matas de miriti, eobserva-se com mais ateno descobre-se, em muito maior nmero,

    uma segunda palmeira, muito mais fina, mais delicada e realmentegraciosa"

    Robert Ave- Lallemant

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    Srgio Aruana Elarrat Canto- Uma Anlise Ergonmica Aplicada ao Processo Extrativista do Aaizeiro PPGEP UFSC -2001 29

    Na Amaznia comum chamar a palmeira, que recebe o nome cientfico

    de Euterpe Olercea, de Aaizeiro, quase uma unanimidade. Mas possvel

    encontrar na literatura muitas outras denominaes populares para o aaizeiro,

    que variam dependendo do local, e podem denominar variedades da espcie.

    Neste trabalho ser chamada pela denominao cientfica, de Euterpe

    Olercea, ou deAaizeiro, seguindo a denominao mais usada na Regio Norte

    brasileira.

    2.1. Os Registros Histricos

    O aaizeiro ocupa um largo espao na vida amaznica, principalmente no

    esturio do rio Amazonas. um alimento abundante, barato, de consumo dirio e

    tradicional. Tornou-se um smbolo da cultura nortista e est presente no cotidiano

    tanto do ribeirinho como do citadino, independente das posses. Esta influncia

    refletida na economia, nas paisagens, nos cartes postais, nos dizeres populares,

    nas manifestaes artsticas, nas estratgias de ocupao do solo. O registro do

    incio desta ntima relao est perdido no tempo. Mas h uma obviedade de ter

    sido um legado indgena.

    MOURO (1999) observa que ao longo do tempo e ao redor do mundo,

    muitas atividades humanas estiveram ligadas s palmeiras e JARDIM e CUNHA

    (1998 a) consideram que as palmeiras indicam a presena humana em uma

    determinada rea, em decorrncia das prticas agrcolas, de cultivo e de manejo

    para variados fins. O aaizeiro desempenha este papel para os amaznidas em

    funo das suas multi-utilidades.

    As pesquisas cientficas sobre palmeiras foram intensificadas nos ltimos

    cinco sculos. O conhecimento cientfico sobre palmeiras foi fortemente

    enriquecido a partir do sculo XIX. Surgiram estudos especializados sobre o

    assunto. Atualmente so conhecidas entre 2.500 a 3.500 espcies de 210 a 236

    gneros. Curiosamente os povos que habitavam o Brasil antes do Descobrimento

    o chamavam de Pindorama: Terra das palmeiras(MOURO, 1999).

    MOURO (1999) conta que a pesquisa etnobotnica sobre o aaizeiro

    (Euterpe Olercea Mart.) antiga, e teve inicio com Carlos Marie de La

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    Condamine, em 1743, mas s foi analisada e classificada como espcie pelo

    alemo Carl Friedrich Philipp von Martius, que realizou uma expedio de estudos

    no Brasil entre 1817 a 1920 e catalogou vrias espcies. Publicou os livros

    Viagem pelo Brasile Flora Brasiliensis, com os resultados de suas observaes.

    No sculo XIX, o aaizeiro foi incorporado Botnica. O aaizeiro continua

    despertando o interesse de muitos cientistas e instituies nacionais e

    estrangeiras de diversas reas, devido as suas peculiaridades.

    As pesquisas constataram a relevncia do aaizeiro para a regio.

    CAVALCANTE (1998) explica que na Amrica do Sul ocorrem 49 espcies do

    gnero Euterpe. Sendo que 19 delas na Colmbia, nove no Brasil, oito na

    Venezuela, trs na Bolvia e outros pases com uma ou duas cada. No seu

    julgamento, nenhuma das 49 espcies supera a Euterpe Olercea no que diz

    respeito as suas caractersticas botnicas como perfilhao de frutos, nmero de

    indivduos por rea, regenerao natural, pela importncia como fonte de alimento

    tanto para o ser humano como para a fauna e a sua inegvel importncia

    econmica. JARDIM (1996) considera o Aaizeiro uma das palmeiras mais

    promissoras das reas de vrzea do esturio amaznico, em virtude do seu

    aproveitamento por moradores ribeirinhos e nas indstrias. Para CALZAVARA

    (1972), as duas mais importantes palmeiras brasileiras, sob o ponto de vista

    comercial, so Euterpe Eduls Mart. e Euterpe Olercea Mart.

    2.2. Aspectos Botnicos e Ecolgicos

    2.2.1. Caractersticas do Aaizeiro

    O Aaizeiro (Euterpe Olercea Mart.) pertence ordem dos Arecales, ao

    gnero Euterpe da famlia Palmae. A palmeira mostrada na figura 2.1. Uma

    caracterstica importante para o aproveitamento desta palmeira ser cespitosa

    (FRIA, 1993), ou seja, emitir brotaes, ou perfilhos, que surgem na base da

    planta (NOGUEIRA et al, 1995) crescendo em touceiras, ou rebolada (na

    linguagem cabocla) como mostra a figura 2.2. Esta caracterstica d a planta uma

    grande capacidade de regenerao, facilitando a sua explorao de formasustentvel. Segundo variados autores pesquisados, uma touceira chega a ter at

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    25 plantas, em diferentes estgios de crescimento, variando em funo das

    condies ambientais. ROGEZ (2000) relata a existncia de aaizeiros com at

    45 perfilhos por touceiras.

    Figura 2.1 - O Aaizeiro (Euterpe Olercea)

    Figura 2.2 - Estipes do aaizeiro

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    O caule, denominado de estipe, liso, de cor gris claro, (ROGEZ, 2000),

    delgado com 15 a 25 cm de dimetros, s vezes encurvado, so mltiplos

    (entouceirados), e podem atingir a altura de 20 a 30 metros. Crescendo em mdia

    1 metro por ano (JARDIM em comunicao pessoal, 2000). No pice forma um

    capitel que sustenta as folhas (FRIA, 1993). A figura 2.2 mostra uma touceira

    com quatro estipes.

    O estipe composto de material plstico, como fibras, protenas e

    polissacardeos (ALVES; DEMATT, 1987). A Madeira moderadamente pesada,

    mole, racha com facilidade, tem baixa durabilidade em ambientes externos

    (LORENZI, 1992). Estas caractersticas oferecem condies para que o

    trabalhador escale a palmeira para apanhar os frutos, entretanto, restringe o seu

    peso para evitar que o estipe quebre. Entretanto a flexibilidade grande e o

    trabalhador a emprega para atingir outros estipes, aumentando a produtividade.

    O aaizeiro tem reproduo sexuada e assexuada. Podendo ser pela

    semente ou pelas brotaes nas razes. Estas comeam a surgir a partir de um

    ano, dependendo do dossel formado pela copa das rvores adultas. A competio

    pela luminosidade diminui as brotaes, mas aumenta a altura da planta e reduz o

    dimetro do estipe.

    A germinao rpida e fcil. A germinao dura de trs a cinco

    semanas. A taxa de germinao em laboratrio de 90 %, j na natureza circula

    em torno de 50 a 60% (ROGEZ, 2000). CAVALCANTE (1998) chama a ateno

    para o fato de que uma s semente poder gerar mais de 20 perfilhos dentro de

    poucos anos. Apenas 1 kg de caroos contm em mdia de 900 a 950 sementes.

    Os aaizeiros so dominantes e quando crescem formam aaizais nativosdensos e quase homogneos (CAVALCANTE, 1998). FRIA (1993) estima que

    as reas inundveis no esturio do rio Amazonas abrangem um total de 25.000

    km e que 88% deste valor so inundadas com freqncia. O aaizeiro

    dominante nestas regies. CALZAVARA (1972) estima que o domnio se estenda

    por 10.000 kmNo esturio Amaznico encontram-se aaizais na vrzea alta com

    quase 10.000 troncos ou 2000 touceiras por hectare. So comuns 200 a 600

    touceiras por hectares em solo pobre (SHANLEY; CYMERYS e GALVO, 1998).Os plantios racionais ainda so raros. Entretanto, as perspectivas de crescimento

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    dos mercados interno e externo. Tem aumentado o interesse de agricultores e

    grupos empresariais (NOGUEIRA et al, 1995).

    2.2.2. Ambiente de Ocorrncia:

    Para NOGUEIRA et al (1995) o aaizeiro uma espcie tropical. Tpica

    da Amaznia ocorre espontaneamente nos estados do Par, Amazonas,

    Maranho e Amap. Desenvolve-se bem em condies de clima quente e mido

    e no suporta perodos de seca prolongada. Nas regies onde o aaizeiro

    nativo as chuvas so abundantes, atingindo 2.000 a 2.700 mm anuais, so bem

    distribudas durante o ano, e a umidade relativa do ar comumente ultrapassa a

    80%. A temperatura mdia gira em torno de 28 C. O aaizeiro pode desenvolver-

    se bem em regies com temperaturas mdias mensais acima de 18 C, j as

    temperaturas inferiores podem causar atrasos no desenvolvimento das plantas.

    Rogez (2000) esclarece que a Euterpe Olercea uma espcie tpica da

    Bacia Amaznica, no entanto mais comum na parte oriental mais concentrada

    no Esturio amaznico. A figura 2.3 mostra o mapa com as regies de maior

    concentrao de aaizeiros. A Figura2.4 mostra as imagens do ambientes natural

    dos aaizeiros.

    O Aaizeiro muito verstil (NOGUEIRA et al; 1995). Pode ser

    encontrado nos solos midos que margeiam cursos naturais de guas correntes,

    conhecidos na Amaznia como igaps e vrzeas, reas que so constantemente

    invadidas pelas guas dos rios em diferentes tipos de solos, desde o tipo bastante

    argiloso das vrzeas altas do esturio do Rio Amazonas at o arenoso-argiloso

    das reas da terra firme, mas neste ltimo a produtividade bem menor(JARDIM; em comunicao pessoal, 2000). O aaizeiro sobrevive nos solos

    pouco aerados, graas s razes adaptadas (LORENZI, 1992). A palmeira

    absorve os minerais necessrios devido ao grande nmero de razes que

    processam um grande volume de terra. ROGEZ (2000).

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    Figura 2.3 - Local de ocorrncia do aaizeiro (Euterpe Olercea) no Brasil 3

    .

    Figura 2.4.- Ambiente nativo dos aaizeiros

    3Fonte:MOURO, L. (1999)

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    Em resumo o trabalho se desenvolve com as seguintes caractersticas

    ambientais:

    Clima quente e mido; tpico da Amaznia; Temperaturas que circulam em torno de 28 C;

    Chuvas freqentes durante todo o ano, muito embora a safra na

    Ilha do Combu seja no perodo de menor intensidade de chuva e os

    Coletores de Aa evitam subir nos estipes molhados; mas, por outro

    lado, interrompe-se o trabalho;

    Solo alagadio em virtude das chuvas freqentes e da influncia

    das mars na regio de vrzea.

    2.2.3. Variedades

    Segundo ROGEZ (2000) comumente so comercializados dois tipos de

    frutos do aaizeiro:

    Preto - Apresenta colorao arroxeada e o mais comum e, portanto,mais empregado. mais resistente ao ataque de pragas como a broca.

    Branco - mais raro, tem colorao verde, mesmo quando maduro.

    Tem grande procura no mercado e pequena diferena de sabor

    comparado ao aa preto. ROGEZ (2000) supe tratar-se de albinismo.

    Visto que o cultivo da variedade no foi possvel pelos produtores, no

    entanto, foram constatadas diferenas botnicas entre elas.

    Os pesquisadores do Museu Paraense Emilio Goeldi j identificaram outras

    variedades, como demonstra a figura 2.5. Muitas variedades, mesmo pouco

    conhecidas, j esto ameaadas de extino.

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    Figura 2.5 -A)variedade Uma, B)Preto, C)Verde, D)Espada e E)paneiros, ou rasas, com frutos dasvariedades Preto e Verde4

    2.2.4. Florao, Frutificao e Safra

    Estudos cientficos realizados comprovaram que o aaizeiro produz

    praticamente o ano inteiro (ROGEZ, 2000). Entretanto, cada ecossistema

    apresenta condies naturais diferentes de produo de frutos no aaizeiro

    (MOURO, 1999), caracterizando safras. POULLET (1998) indica que no Estado

    do Amap a principal poca de frutificao acontece entre os meses de janeiro a

    junho, enquanto SHALEY, CYMERYS e GALVO (1998), LORENZI (1992),

    JARDIM (1996), JARDIM e STEWART (1994) e outros autores que estudaram o

    assunto nas microrregies prximas a Belm do Par, concluram que a maior

    produo ocorre nos perodo da estao menos chuvosa na regio, ou seja, entre

    julho a dezembro. JARDIM e ROMBOLD (1998) relatam a experincia nativa de

    4- Fonte ROGEZ, H. (2000)

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    manipular as inflorescncias para alterar o ciclo de frutificao e

    conseqentemente o perodo da safra.

    Os frutos comeam a surgir aps o terceiro ano do aaizeiro. Da base da

    bainha das folhas crescem as inflorescncias uma inflorescncia (Espdice)

    desenvolve-se aps a queda da folha, um pouco abaixo da regio colunar, na

    axila das folhas. medida que os frutos amadurecem a angulao da espdice

    vai mudando em relao ao tronco (FRIA, 1993). E neste estgio a Espdice

    pode ser denominada de cacho (ou vassoura, na linguagem cabocla) (ROGEZ,

    2000). A figura 2.6 apresenta as diversas componentes da copa do aaizeiro e os

    cachos maduros.

    Cada planta produz, em media de trs a oito inflorescncias. Cada uma

    dar origem a um cacho com centenas de frutos com peso mdio total de 4 kg

    (ROGEZ, 2000). Uma palmeira pode gerar at 120 kg de frutos por safra,

    dependendo do manejo realizado. Como exemplo, a ilha das Onas, prximo de

    Belm, onde os ribeirinhos manejam os aaizais com capina e poda dos perfilhos

    objetivando melhorar a produo para atender os mercados de Belm. A

    produo mdia de 1.158 kg /ha (SHANLEY; CYMERYS e GALVO, 1998).

    Figura 2.6 -A)Detalhes da florao e da copa de um aaizeiro, B)Calho colhido com frutos maduros.

    A

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    2.2.5. Frutos

    O fruto (figura-2.7) o produto mais importante do aaizeiro, tanto para o

    ecossistema como para as populaes humanas amaznidas. Da polpa dos frutos

    obtm-se o suco de aa. Um produto que consumido na regio como junto s

    refeies, comumente acompanhado de peixe, carne, camaro etc. Tambm

    consumido na forma de mingaus sorvetes, cremes, gelias e licores. O consumo

    regional de frutos para a elaborao de suco e seus derivados gira em torno de

    180 mil toneladas/ano (NOGUEIRA et al, 1995). Lembrando que a coleta

    manual, atravs da escalada do estipe, pode-se perceber a intensa atividade de

    coleta.

    Os cachos maduros so formamos por centenas de frutos que

    individualmente medem de 1 a 1,5 cm de dimetro e pesam entre 0,8 a 2,3 g. De

    cor violeta/prpura muito escuro se forem da variedade Preto ou Espada. Caso

    sejam das variedades Brancoe Tinga os frutos tero a colorao esverdeada. A

    produo de polpa varia em torno de apenas 5 a 15% do volume do fruto,

    dependendo da variedade e da maturidade do fruto.

    Figura 2.7 -A)Frutos in natura, B)Caroos despolpados, C)Caroo secionadas eD)Esquema da seco.

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    2.3 Os Mltiplos usos

    Como j foi comentado, os frutos e o palmito constituem os principais

    produtos do aaizeiro, entretanto, a palmeira tem aproveitamento praticamente

    total, justificando a sua importncia regional. MATTOS et al (1999) CALZAVARA,

    LOPES e SOUZA (1982), RGO (1993), NOGUEIRA (1997), MOURO (1999) e

    outros autores constataram a multiutilidade do aaizeiro. Parte dessas

    constataes so apresentadas no quadro 2.1, onde podem ser observados

    alguns dos diferentes produtos e sub produtos com a indicao da origem do

    componente do aaizeiro que serviu de matria-prima. A figura 2. 8 apresenta as

    imagens da ampla utilizao dos aaizeiros.

    Quadro 2.1 - Usos do aaComponentes Produtos e sub - produtos

    Gema Apical Palmito para alimentao humana e rao animal

    Folhas

    Cobertura de casas, parede, cesto, tapetes, chapu, esteira,

    adorno caseiro, celulose, rao animal, adubo orgnico,

    cobertura morta e sombreamento de sementeiras e peonhas.

    Frutos

    PolpaAlimento, suco, creme, sorvete, licor, gelia, mingau, pudim,

    produo de lcool, pigmento para tintas

    Caroo adubo orgnico, carburante, aterro

    Cacho

    (inflorescncia)Vassoura, artesanato, adubo orgnico.

    Estipe (caule)Construo civil, construes rurais, lenha, adubo orgnico,

    celulose e isolamento trmico, pequenas armadilhas.

    Razes Vermfugo

    A p lanta Paisagismo

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    Figura 2.8 - Utilizao dos aaizeiros: A)Pomar, B) Nas construes rurais, C ) Paisagismo Urbano, D)Material para artesanatos e vassouras rsticas

    2.3.1. A Polpa do Aa e Suas Propriedades

    O suco de aa certamente o produto mais popular do aaizeiro. o

    lquido de cor violcea (Figura 2.9). Durante o processo a gua adicionada para

    variar a diluio e agregar valor. Comumente so comercializados com as

    classificaes: grosso, mdio ou fino e com diferentes preos, quando mais

    concentrado maior o preo.

    Figura 2.9. aa do tipo grosso no momento do beneficiamento

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    Segundo ROGEZ (comunicao pessoal, 2000) os antigos colonizadores

    acharam a cor do aa semelhante ao vinho e o chamaram de vinho de aa. Uma

    denominao ainda empregada por parte da populao, at mesmo para

    diferenciar o fruto da bebida, mas o corriqueiro a bebida ser chamada

    simplesmente de "aa".

    Tanto os frutos como a polpa so comercializados. Os frutos so

    vendidos como matria prima do suco nas feiras que se tornaram especializadas

    em aa, geralmente pela proximidade com portos fluviais e a polpa, nos locais de

    beneficiamento conhecidos como amassadeiras de aa.

    Por geraes, o aa integra a alimentao bsica dos amaznidas. Ao

    longo dos anos, foi transmitida a crena popular de que o aa apresenta valores

    nutricionais elevados e foram cultivados os aspectos culturais e empricos,

    fortalecidos pela literatura. Para ROGEZ (2000) a crena popular pode ter

    interferido nos resultados de muitas destas publicaes que, em muitos casos, se

    tornaram contraditrias.

    Com a popularizao da bebida surgiram muitas informaes sobre o aa.

    Sendo fcil obt-las at nas pginas eletrnicas da internet. Possivelmente, comoreflexo do interesse da populao de outras regies do pas, que passaram a

    consumir o aa por lhe ser atribudo caractersticas energticas e criadas novas

    formas de consumo com a adio de ingredientes muito diferente daqueles que

    tradicionalmente so usados na Amaznia. Inovaes que causam estranheza

    nos nortistas (ROGEZ, 2000).

    Em suas recentes pesquisas sobre o aa ROGEZ (2000) obteve as

    seguintes concluses:

    A qualidade dos frutos produzida varivel e pode depender de fatores

    como o solo, variedade, luminosidade, umidade, temperatura, exposio ao

    sol dentre outros;

    Muitos dos testes conhecidos foram feitos h mais de 30 anos;

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    A quantidade de ferro no grande quanto se supunha e no apresenta

    um perfil ideal para ser absorvido pelo organismo;

    Foram encontradas caractersticas antioxidantes;

    O aa tem alto valor calrico devido a grande quantidade de material

    graxo;

    O valor energtico comparvel ao leite integral de vaca;

    Os lipdios representam 90% das calorias contidas na bebida;

    Devido ao processo de filtragem a bebida tem mais lipdios do que a

    polpa;

    O valor protico elevado, porem ainda pouco para as necessidades

    dirias humanas;

    Grande quantidade de fibras satisfaz praticamente 90% as necessidades

    humanas;

    2.3.2. O Palmito

    Devido ao grande interesse econmico, o palmito o segundo produto

    mais importante extrado do aaizeiro. Conhecido botanicamente como "gema

    apical" Consiste na parte cilndrica que est envolvida pela bainha das folhas

    localizada na base da copa da palmeira, como indicado na figura 2.10. No

    processo de extrao preciso abater a rvore.

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    Figura 2.10 - Localizao do palmito na palmeira

    At os anos sessenta, o palmito consumido no mercado brasileiro

    provinha, quase que exclusivamente, dos palmitais nativos da Mata Atlntica, de

    uma palmeira monocaule, a Euterpe Eduls. Mas com o esgotamento das

    reservas desta palmeira as empresas palmiteiras deslocaram-se para a regio

    amaznica procura do palmito do aa, no to bom quanto o produzido pela

    Euterpe Edulis, mas abundante, com a vantagem de produzir perfilhos e rpido

    processo de regenerao. O aaizeiro tornou-se uma das principais fontes desse

    produto, sendo responsvel por cerca de 95% de todo o palmito produzido no

    Brasil. O Estado do Par destaca-se como principal produtor nacional

    (NOGUEIRA et al, 1995). Mas devido falta de costume de consumo regional,

    quase toda a produo desta espcie destinada aos mercados externos.

    Embora MOURO (1999) tenha o registro de que ndios amaznicos se

    alimentavam de palmitos assados.

    As fbricas proliferaram no esturio Amaznico. Em 1988, MATTOS et al

    (1990) encontraram 117 registros de fbricas no IBAMA e observaram que as

    pequenas fbricas caseiras no so obrigadas a ter registro, devido baixa

    produo, eram muito mais numerosas e juntas promoveram uma explorao

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    voraz fazendo presso nos aaizais nativos. E apesar de ter sido uma atividade

    introduzida na regio que poderia criar empregos e aquecer a economia, gerou

    muita discusso e preocupao por parte da populao e com o destino do aa.

    Estas iniciativas beneficiaram a atividade com o surgimento de leis de proteo

    que reduziu a explorao selvagem e o estimulo as pesquisas que ampliaram o

    conhecimento sobre a palmeira e o desenvolvimento de novas tcnicas de

    manejo que favoreceram o aumento da produtividade de frutos.

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    "...Tens o dom de seres muito. Onde muitos no tem nada .

    Uns te chamam aaizeiro, outros te chamam Jussara..."

    Nilson Chaves e Joo Gomes

    CAPTULO 3

    3. TCNICAS E ESTRATGIAS DE PRODUO

    A comunidade ribeirinha do esturio amaznico tem o extrativismo como

    atividade cotidiana que garante a subsistncia econmica e alimentar. Sendo esta

    por vezes a nica fonte de renda da populao. Segundo o IBGE, em 1980, as

    atividades extrativistas contabilizaram 1.720.000 pessoas envolvidas com 344.000

    trabalhadores diretos no setor extrativismo vegetal amaznico. Apesar destes

    nmeros, o extrativismo no recebe a ateno merecida pela importncia

    econmica, social e ecolgica que desempenha. As condies de trabalho pouco

    evoluram. Os produtos extrados esto se tornando cada vez mais

    autoconsumidos ou comercializados regionalmente. Enquanto que os produtos

    no perecveis so exportados (JARDIM, 1996).

    As prticas extrativistas na Amaznia so muito antigas. Por sculos as

    relaes comerciais esto fortemente baseadas em produtos extrativistas.

    Historicamente a Amaznia tratada como fonte de recursos naturais, desde os

    tempos do Brasil colonial. A histria da Amaznia registra que as exploraes de

    muitos produtos estabeleceram ciclos produtivos, como foi o caso do caf, das

    ervas do serto, do cacau, da borracha, da castanha-do-par, da madeira, dos

    minrios, dentre outros. No entanto, poucas foram as melhorias sensveis na

    qualidade de vida da populao. ROGEZ (2000) evidencia que durante estes

    momentos ocorreu o aumento da concentrao de riquezas.

    Durante muito tempo o extrativismo foi visto como uma atividade menor,

    primitiva, sem mritos para estudos que pudessem torn-la rentvel (MOURO,

    1999). JARDIM (1996) alerta que esta tendncia motivou a prtica de uma forma

    extrativista no sustentvel ecolgica e nem economicamente. Os investimentos

    na regio foram escassos, ou equivocados, formando um cenrio configurado por

    aes empresariais com fins exploratrios e, muitas vezes, predatrios. Grande

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    parte da populao ficou mal assistida. ROGEZ (2000) observa que a regio de

    vrzea da Amaznia (Amaznia tradicional) foi pouco atingida pelas medidas

    governamentais de desenvolvimento e pouco mudou. J na regio de terra firme

    (Amaznia de Fronteira) que tem melhor acesso, houve maior ocupao e

    expanso motivadas pelo governo.

    Estas condies contriburam para que o extrativismo se tornasse uma

    estratgia de sobrevivncia importante na regio. ROGEZ (2000) mostra, pela

    figura-3.1, a importncia das atividades extrativistas no cotidiano da populao

    ribeirinha do esturio amaznico, com destaque para a coleta dos frutos do

    aaizeiro, que chega a representar 63,0% da renda mensal familiar na ilha das

    Onas - PA, o ano de 1986. As pesquisas realizadas em outros anos no Amap,

    pelo IEPA5, revelaram um percentual muito aproximado a este para a explorao

    do aa.

    Figura 3.1 - Composio da renda familiar derivada de produtos naturais na Ilha das Onas no ano de 19866

    5Instituto de Pesquisas Cientficas e Tecnolgicas do Estado do Amap6Fonte - ROGEZ (2000)

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    3.1. A Organizao do Trabalho

    IIDA (2000) observou que a estrutura do trabalho agrcola mais difcil deperceber do que na indstria, devido falta de uma estrutura definida. O

    trabalhador realiza vrias tarefas, usa vrios instrumentos, em diferentes

    condies ambientais, tem grande mobilidade, dificultando que o pesquisador

    delimite com preciso as fronteiras de um posto de trabalho. Uma situao

    ratificada por TURNES (1994) que v nas atividades rurais uma srie de

    especificidades onde ocorrem situaes de trabalho que no esto bem definidas

    e as distingue daquelas desenvolvidas de outros setores, como a indstria. Oextrativismo do aa tem situao semelhante. O trabalho no se limita apenas

    a uma atividade, podendo desenvolve um ciclo do trabalho longo. A mo de obra

    emprega prioritariamente familiar. Em segundo caso, podem ser contratados os

    apanhadores de aa, de maneira informal com o pagamento uma parte da

    produo. Os trabalhadores podem ter desvantagens no sistema de "meia"

    (MOURO, 1999). Esta informalidade dificulta a obteno de dados oficiais sobre

    estes sistemas de trabalho.O quadro 3.1 demonstra esquematicamente as etapas gerais do trabalho

    de extrativismo e beneficiamento do aa. No esquema esto demarcadas as

    fronteiras dos sistemas envolvidos, inclusive o que ocorre na ilha do Combu.

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    Beneficiar sub produtos

    Tecer as rasas

    Extrair a polpa para consumo prprio

    Manejar o Aaizal

    Extrair o palmito

    Coletar os frutos

    Selecionar e embalar os frutos

    Transportar a produo para a feira

    Quadro 3.1- Diagrama da Organizao do trabalho do extrativismo ebeneficiamento do aa.

    Comercializar os frutos Extrair a polpa dos frutos

    Comercializar a polpa

    Comercializar o palmito

    Industrializar o palmito

    Comercializar o palmitoindustrializado

    Comercializar as rasas

    LegendaPrtica comum do trabalhador extrativista, inclusive no CombuPrtica do trabalhador extrativista ou de terceiros. Tarefa praticada na Ilha do Combu.Prtica de outros seguimentos do sistema

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    3.2. Detalhamento

    3.2.1 Manejo do aa

    Devido ao ciclo produtivo do aa, a produo e a economia intercalam

    perodos de pico e depresso, criando uma irregularidade na renda das famlias

    ribeirinhas (ROGEZ, 2000). A atividade tambm enfrenta restries como as

    condies ambientais, as longas distncias entre produtores e consumidores, a

    grande perecibilidade do aa, as motivaes econmicas do palmito. Embora no

    sejam problemas to recentes e muitas pesquisas cientficos tenham sido

    desenvolvidas, as solues ainda esto sendo procuradas, inspirando novas

    pesquisas especficas, que proporcione a expanso dos conhecimentos tcito e

    cientfico e fundamentem a prtica do trabalho extrativista. Conseqentemente

    surgiram estratgias para superar estas dificuldades.

    Estudos mostram que nas regies prximas a Belm (Ilha das Onas,

    Barcarena e Ilha do Combu) o processo extrativista de frutos e palmito se

    alternam obedecendo safra. Refletindo no quadro scio-econmico regional.

    Nota-se atividades distintas em duas pocas do ano: A extrao de palmito e a

    coleta de frutos (JARDIM, 1996). A figura 3.2 mostra acomercializao anual de

    frutos e palmito. Observa-se uma alternncia da produo dos dois produtos.

    Ressalta-se que o trabalho de extrao do palmito e a coleta de frutos so

    realizados pelo mesmo trabalhador em perodos distintos do ano.

    Figura 3.2 - Variao na produo mensal de frutos e palmito (%) comercializados na Feira do Aa,municpio de Belm. 7

    7Fonte: JARDIM, M. (1996)

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    Para realizar esta estratgia de produo os aaizais so cultivados com

    trs finalidades principais:

    Somente a extrao de palmito

    Somente a coleta de aa

    Extrao de palmito e coleta de aa conjuntamente

    Autores que estudaram regies dos Estados do Par e Amap como

    CALZAVARA (1972), MATTOS et al (1990), SANTOS (1993), JARDIM e

    KAGEYAMA (1994), JARDIM e STEWART (1994), CUNHA E JARDIM (1995),

    ALMEIDA, SILVA e ROSA (1995) NOGUEIRA et al (1995), NOGUEIRA (1997),

    JARDIM e CUNHA (1998a), JARDIM e CUNHA (1998b), MOURO (1999),

    ROGEZ (2000), MOCHIUTTI et al (2000), encontram vrias condies

    determinantes nas preferncias dos ribeirinhos pelo tipo de explorao extrativista

    que realiza. Para os moradores de comunidades prximas aos centros

    consumidores existe a preferncia pela extrao dos frutos. J para comunidades

    mais distantes dos centros consumidores, a opo a explorao do palmito,

    mesmo com menor remunerao, devido caracterstica perecvel do aa. E

    para aquele que realizam o manejo do aaizal prefervel extrao dos dois

    produtos garantindo a produo e a receita mais estvel. Este o caso estudado

    na ilha do Combu, sendo que a produo de frutos bem mais intensa.

    3.3. As tcnicas de Produo com Manejo de aaizais

    CALZAVARA (1972) define o manejo do aaizeiro como um extrativismoracionalizado das espcies, com normas exploratrias de acordo com as

    condies locais e o uso de tcnicas que visam a explorao econmica da

    espcie com carter permanente. MATTOS et al (1990) reforam que o manejo

    dos aaizais nativos necessrio para garantir a produo constante de fruto e

    palmito. Muito embora, POULLET (1998) acredite no ser possvel praticar um

    manejo de silvicultura para a produo otimizada simultnea dos palmitos e dos

    frutos. Entretanto, MOURO (1999) aponta indcios de que os aaizais nativos

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    foram formados com interaes humanas, e que o manejo bem mais antiga do

    que se conhece na literatura.

    A introduo da indstria do palmito na regio, que a princpio mostrou-se

    ameaadora, acabou beneficiando indiretamente a cultura do aa. Principalmente

    atravs da legislao, criada para disciplinar a explorao de palmito e dar

    proteo s espcies como a Euterpe Eduls, quase extinta, e especialmente a

    Euterpe Olercea. Mesmo REBLO (1992) considerando a legislao frgil, pode-

    se reconhecer que acabou motivando o desenvolvimento de tcnicas de manejo.

    Muitas delas se tornaram prticas comuns e foram incorporadas pelos prprios

    moradores ribeirinhos. Conseqentemente, auxiliaram na preservao dos

    aaizeiros, no aumento da produo e fortalecimento da cultura.

    A regulamentao mais importante para a extrao do palmito concentra-

    se nas portarias do IBAMA, que alm das exigncias administrativas, impem

    condies tcnicas para a extrao do palmito. Por conta deste cenrio muitos

    pesquisadores se debruaram nos estudos para conhecer a ecologia do aaizeiro,

    associar o conhecimento dos ribeirinhos e desenvolver tcnicas de manejo de

    acordo com a finalidade da cultura.

    O manejo pode ser realizado tanto em aaizais nativos como nos

    plantados. Na ilha do Combu o aaizal nativo, mas devido ao manejo, as sua

    caractersticas foram sendo alteradas pelo uso das tcnicas de cultivo dos

    aaizais, que estabelecem entre outras coisas o espaamento entre ps, nmero

    ideal de perfilhos por touceiras, periodicidade para a extrao do palmito. Afinal o

    manejo no deixa de ser uma interferncia no sistema, portanto, ao mesmo tempo

    em que tais tcnicas trazem benefcios para o extrativismo do aa, alterar e

    podem at prejudicar o ecossistema como concluram QUEIROZ e MOCHIUTTI

    (2000a). NOGUEIRA (1997), que concentrou seus estudos no estado do Par, e

    ainda denuncia que no foram elaborados planos nem estratgias polticas para

    que a atividade seja desenvolvida com maior racionalidade possvel. Sugere

    tambm que a explorao respeite a capacidade de regenerao natural dos

    aaizeiros com a devida reposio florestal. QUEIROZ e MOCHIUTTI (2000b) e

    MOCHIUTTI e QUEIROZ (2000) sugerem que seja adotada a explorao

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    consorciada com outras espcies frutferas e florestais e a proteo de outras

    espcies num Sistema Agroflorestal (SAF).

    Muitas pesquisas encontraram diferentes formas de manejo empregadas

    pelos ribeirinhos de vrias microrregies. Desenvolvidas em razo dos fatores

    ambientais, do acesso a informao de fatores culturais e outros. O quadro 3.2

    rene as tcnicas mais comuns empregadas no manejo dos aaizais, inclusive na

    ilha do Combu, geradas das obse