Pratica de Prof de Musica

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    VANILDA LDIA FERREIRA DE MACEDO GODOY

    A PRTICA PEDAGGICO-MUSICAL DE UMA PROFESSORA DE

    MSICA NA ESCOLA PBLICA

    FLORIANPOLIS

    2009

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    UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA

    CENTRO DE ARTES

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM MSICA - MESTRADO

    VANILDA LDIA FERREIRA DE MACEDO GODOY

    A PRTICA PEDAGGICO-MUSICAL DE UMA PROFESSORA DE

    MSICA NA ESCOLA PBLICA

    Dissertao submetida ao Programa dePs-Graduao em Msica daUniversidade do Estado de SantaCatarina, como requisito parcial para aobteno do ttulo de Mestre em Msica.Sub-rea: Educao Musical.

    Orientador: Prof. Dr. Srgio Luiz Ferreirade Figueiredo

    FLORIANPOLIS2009

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    AGRADECIMENTOS

    Agradeo a todas as pessoas que de alguma forma colaboraram para a

    realizao deste trabalho, e em especial:

    - Ao meu orientador, Dr. Srgio Luiz Ferreira de Figueiredo, professor dedicado e

    amigo.

    - Aos demais professores do PPGMUS, principalmente: Accio Piedade, Maria

    Ignes (em memria), Marcos Holler, Guilherme Barros e Jusamara Souza, com os

    quais pude aprender diretamente.

    - Aos colegas da primeira turma do Mestrado em Msica da UDESC, companheiros

    nesta vitria: Alexandre Gonalves, Ana Paula S. Thiago, Guilherme Amaral,

    Rodrigo Warken, Andrey Batista, Jlio Crdoba, Roberto Rossbach, Rodrigo

    Moreira e, em especial, Luciana Goss e Mauro Cislaghi.

    - minha famlia, em especial, minha me, Vanilda Tenfen e meu esposo

    Geverson, que foram incentivo e suporte.

    - A todos os meus amigos, principalmente os que estiveram mais perto: Andria

    Veber, Simone Gutjahr, Perla Ferreira e Adriana Melo, companheiras em idias e

    sonhos.

    - Pro-Reitoria de Pesquisa e Ps-Graduao da UDESC e a CAPES, pelo apoio

    financeiro.A todos meu carinho e minha gratido!

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    RESUMO

    Esta pesquisa estuda a prtica pedaggico-musical de uma professora de msicaatuante h dez anos em duas escolas pblicas da rede municipal de ensino deFlorianpolis. O referencial terico deste trabalho Perrenoud, Tardif e Gauthier,que tratam dos estudos sobre saberes e competncias docentes. O objetivoprincipal desta pesquisa investigar o que constitui a prtica pedaggico-musicalda professora estudada. Outros objetivos so: compreender como as concepes eaes da professora foram construdas ao longo de sua trajetria e comocontribuem para a educao musical que realiza; compreender parte da realidadedo ensino de msica curricular daquele contexto; investigar o que os alunos e aequipe pedaggica escolar pensam sobre o ensino de msica realizado; ereconhecer os saberes e competncias docentes manifestados nessa prtica. Ametodologia utilizada foi o estudo de caso com abordagem qualitativa. A coleta dedados foi feita atravs de observaes, entrevistas semi-estruturadas e um

    questionrio. Os resultados apontam para a pluralidade de elementos quecompem a prtica pedaggico-musical da professora de msica estudada, em suaformao e sua experincia. As consideraes finais destacam a importncia deserem conhecidas e divulgadas as prticas pedaggico-musicais de professores demsica, o que poderia contribuir para ampliar a reflexo dos educadores musicais eestudantes de licenciatura em msica sobre as prticas pedaggico-musicais.Outras pesquisas so sugeridas de forma que seja aprofundado o estudo sobreprticas pedaggico-musicais e tambm sobre os saberes e competnciasdocentes.

    Palavras-chave: Educao Musical; Msica; Saberes; Competncias; Prticapedaggico-musical; Msica na escola pblica.

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    ABSTRACT

    This research studies the musical-pedagogical practice of a music teacher that hasbeen teaching in two public schools in Florianpolis (SC, Brazil) for ten years. Thetheoretical references used in this study were Perrenoud, Tardiff and Gauthier,whose studies deal with teaching knowledge and skills. The main object of this workis to study the factors that constitute the musical-pedagogical practice of thisteacher. This study also aims at: understanding how the conceptions and actions ofthis teacher were constructed throughout her experience and how they contribute toher classes; understanding part of the reality of music teaching in this context;studying what the students and other members of the pedagogical staff think aboutthe work developed; and recognizing the teaching knowledge and skillsdemonstrated in this practice. The methodology used was case studies with aqualitative approach. Collection of data was made through observations, semi-structured interviews and a questionnaire. The results point to the plurality of

    elements that compose the musical-pedagogical practice of this teacher, inregarding her formation and experience. The final considerations highlight theimportance of knowing and sharing the musical-pedagogical practice of musicteachers, which could contribute to broadening the reflection of music educatorsand of music students about the musical-pedagogical practice. Further research issuggested in order to enable a deeper study about musical-pedagogical practiceand also about teaching knowledge and skills.

    Key-words: Music Education; Music; Knowledge; teaching skills; musical-pedagogical practice; music teaching in public schools.

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    LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1 Exemplos de exerccios de eco para a flauta na Escola 1 ................ 86

    Figura 2 Exemplos de exerccios de eco para a flauta na Escola 2 ................ 90

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    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Datas das observaes nas escolas ................................................ 41

    Tabela 2 Datas e duraes das entrevistas .................................................... 42

    Tabela 3 Cronograma ...................................................................................... 47

    Tabela 4 Atividades musicais prticas na Escola 1 ......................................... 74

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    LISTA DE GRFICOS

    Grfico 1 Voc gosta das aulas de msica? - Respostas dos alunos das

    Escolas 1 e 2 ................................................................................................... 113

    Grfico 2 Do que voc mais gosta nas aulas de msica? Resposta dos

    alunos das Escolas 1 e 2 ................................................................................. 114

    Grfico 3 Do que voc menos gosta nas aulas de msica? Respostados alunos das Escolas 1 e 2 .......................................................................... 115

    Grfico 4 - Respostas dos alunos sobre o repertrio estudado Escolas 1 e

    2 ....................................................................................................................... 116

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    SUMRIO

    INTRODUO ....................................................................................................... 12

    1 REVISO DE LITERATURA.................................................................... 17

    1.1 DEFINIO DE PRTICAS PEDAGGICO-MUSICAIS ............................ 171.2 ESTUDOS SOBRE OS PROFESSORES DE MSICA ............................... 181.3 SABERES E COMPETNCIAS DOCENTES NO MBITO DA

    EDUCAO MUSICAL...................................................................................... 20

    2 REFERENCIAL TERICO ....................................................................... 252.1 PHILIPPE PERRENOUD .................................................................................. 252.2 MAURICE TARDIF ............................................................................................. 272.3 CLERMONT GAUTHIER ................................................................................... 302.4 RELAES ENTRE AS IDIAS DE PERRENOUD, TARDIF E

    GAUTHIER .......................................................................................................... 32

    3 METODOLOGIA DA PESQUISA ............................................................. 35

    3.1 PESQUISA QUALITATIVA................................................................................ 353.2 ESTUDO DE CASO ........................................................................................... 36

    3.2.1 Descrio do contexto ...................................................................... 373.2.2 Pesquisa de campo .......................................................................... 38

    3.3 COLETA DE DADOS ......................................................................................... 393.3.1 Observaes..................................................................................... 403.3.2 Entrevistas ........................................................................................ 413.3.3 Questionrio...................................................................................... 42

    3.4 ETAPAS DA PESQUISA ................................................................................... 433.5 ANLISE DOS DADOS ..................................................................................... 473.6 CRITRIOS TICOS ......................................................................................... 48

    3.6.1 A escolha do pseudnimo................................................................. 49

    4 NDIA: PESSOA, EDUCADORA E PROFISSIONAL ............................. 51

    4.1 A EXPERINCIA PROFISSIONAL DE NDIA .............................................. 514.1.1 A formao inicial.............................................................................. 514.1.2 O incio da profisso ......................................................................... 544.1.3 O incio do trabalho na rede.............................................................. 564.1.4 A busca por aperfeioamento........................................................... 574.1.5 A divulgao do seu trabalho............................................................ 584.1.6 A abertura para estgios e pesquisas............................................... 594.1.7 O relacionamento com os pares ....................................................... 61

    4.2 IDEAIS DE EDUCAO.................................................................................... 63

    4.3 IDEAIS DE EDUCAO MUSICAL................................................................. 68

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    5 A PRTICA PEDAGGICO-MUSICAL DE NDIA ................................. 72

    5.1 AS AULAS DE MSICA OBSERVADAS........................................................ 72

    5.2 O PLANEJAMENTO........................................................................................... 935.3 OS CONTEDOS E METODOLOGIAS ......................................................... 975.3.1 Repertrio ....................................................................................... 1035.3.2 Avaliao ........................................................................................ 104

    5.4 A QUESTO DA DISCIPLINA........................................................................ 1065.5 A PERSPECTIVA DOS ALUNOS .................................................................. 1125.6 OS ALUNOS COM NECESSIDADES ESPECIAIS..................................... 1195.7 SNTESE: OS SABERES E COMPETNCIAS NA PRTICA

    PEDAGGICO-MUSICAL DE NDIA........................................................... 121

    CONSIDERAES FINAIS ................................................................................. 133

    REFERNCIAS ................................................................................................... 137

    ANEXOS .............................................................................................................. 142

    ANEXO 1 Roteiro de observaes .................................................. 143ANEXO 2 Questionrio .................................................................... 145ANEXO 3 Autorizao ..................................................................... 148ANEXO 4 Roteiro da Entrevista 1 .................................................... 150ANEXO 5 Roteiro da conversa por telefone .................................... 152ANEXO 6 Roteiro da Entrevista 2 .................................................... 154

    ANEXO 7 Roteiro da Entrevista EP1, EP2 e EP3 ........................... 156ANEXO 8 Roteiro da Entrevista 3 .................................................... 158ANEXO 9 Apresentao da pesquisa aos participantes ................. 161ANEXO 10 Termo de consentimento .............................................. 163ANEXO 11 Partitura de Pindorama ............................................... 165ANEXO 12 Partitura de Dois por Dez ........................................... 167ANEXO 13 Partitura de Aquarela .................................................. 169ANEXO 14 Exerccio de percusso corporal ................................... 172ANEXO 15 Planejamento Anual Escola 1 ....................................... 174ANEXO 16 Planejamento Anual Escola 2 ....................................... 178ANEXO 17 Letra de Canide Ioune ................................................ 182

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    INTRODUO

    A motivao para fazer um estudo sobre a prtica pedaggico-musical de

    uma professora surgiu, primeiramente, durante a minha graduao em msica(Licenciatura) atravs da experincia dos estgios em escolas. Ali comecei a

    perceber que so muitos os fatores com que o professor de msica precisa lidar:

    organizar os contedos a serem ensinados; planejar o tempo de cada atividade;

    pensar nas estratgias metodolgicas para o ensino de msica; estar conectado

    com os objetivos educacionais, com as caractersticas organizacionais da

    instituio, com fatores scio-econmicos do contexto onde atua, com as relaes

    interpessoais entre pares, entre alunos, entre pais de alunos, entre Secretaria daEducao; e outros tantos fatores. Certamente, como estagiria, no estabeleci tal

    nvel de envolvimento, mas pude vislumbrar de perto o caminho que teria de

    percorrer.

    Dos estgios que realizei durante a graduao, uma etapa muito significativa

    foi quando acompanhei uma turma de 6 srie durante praticamente um ano letivo

    inteiro (2004), na rede municipal de ensino de Florianpolis. Primeiramente, como

    observadora da turma, e depois, lecionando duas aulas por semana. Na ocasio,tive a satisfao de conhecer a professora de msica oficial daquela turma,

    sujeito da presente pesquisa que me recebeu e me deu o suporte necessrio.

    Envolvi-me bastante com a escola e participei de apresentaes dentro e fora dela,

    num projeto interdisciplinar realizado por ns e tambm pelo professor de

    geografia.

    Dois anos depois, em 2006, quando eu j havia terminado a graduao, foi a

    mesma professora que me incentivou a ser professora (substituta/temporria) na

    rede municipal de ensino de Florianpolis, cargo para o qual eu prestei prova e

    havia sido aprovada, mas no havia decidido assumir. Com seu entusiasmo, ela

    me convenceu a lecionar algumas horas numa das escolas do municpio. Nessa

    funo, participei de reunies com professores de msica da rede, realizadas na

    Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Essas reunies faziam parte

    de uma consultoria oferecida desde 1998, continuando at hoje, por professores da

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    universidade rea de msica da rede municipal1. No mesmo ano, fui trabalhar em

    outro municpio, mais prximo minha casa, mas essa experincia em

    Florianpolis foi marcante para mim e resultou em um desejo de pensar e discutir

    sobre o ensino de msica curricular na rede pblica.

    Como professora de msica, tendo atuado em escolas pblicas e

    particulares, lecionando para turmas de maternal at 8 srie do ensino

    fundamental, tive a oportunidade de comear a traar o caminho dessa profisso.

    Ensinar msica em escolas de educao regular , sem dvida, um grande

    desafio, mas ao mesmo tempo algo fascinante. Nos primeiros passos da curta

    experincia, tive muita dificuldade em diversos aspectos, tais como osmencionados anteriormente, devido minha falta de experincia.

    A partir dessas vivncias, como estudante e como profissional, percebi o

    quanto pode ser importante conhecer o trabalho de professores de msica com

    experincia: importante para professores em formao, para a reflexo dos

    professores em ao (novatos ou veteranos), enfim, para o desenvolvimento da

    educao musical escolar atravs da pesquisa. Del Ben d suporte a essa idia

    quando fala sobre a

    necessidade de procurar conhecer e compreender o ensino de msicano a partir de definies, proposies e modelos de explicaoapriorsticos, mas, sobretudo, a partir do mundo concreto e cotidiano dasprticas pedaggico-musicais vividas na escola. (DEL BEN, 2001, p. 2)

    Del Ben no se refere especificamente ao estudo de professores

    experientes, mas d valor ao estudo das situaes reais de ensino de msica a

    partir da atuao de professores nas escolas. Por isso, saliento a importncia de

    estudos sobre professores e sua prtica pedaggica, como forma de conhecer e

    divulgar o que se tem feito em termos de educao musical curricular e tambm

    como forma de fomentar as discusses sobre a realidade encontrada pelos

    professores de msica nas escolas.

    1 Algumas aes dessa consultoria foram: cursos e oficinas; discusso de tpicos de interesse dos professores;planejamento em conjunto; formulao da proposta curricular municipal, entre outras. Atualmente, acontecem

    encontros semanais entre os professores de msica da rede e o grupo de pesquisa MusE (Msica e Educao -UDESC), onde est sendo discutido o que pesquisa e esto sendo elaborados projetos para serem realizadaspesquisas nas escolas que esses professores atuam, visando refletir e resolver problemas encontrados nasrealidades profissionais dos mesmos.

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    [...] sem conhecer e compreender o que acontece nessa realidade,

    talvez no seja possvel superar os problemas to freqentementeapontados pela literatura da rea, como a desvalorizao da msicacomo disciplina curricular, as condies precrias para a realizao doensino de msica nas escolas, sua falta de sistematizao efundamentao terica ou aqueles referentes formao dos professoresde msica. (DEL BEN, 2001, p. 1-2)

    Entendi, portanto, que a experincia da professora anteriormente

    mencionada poderia representar uma rica fonte de elementos para a reflexo sobre

    a prtica pedaggico-musical do professor de msica na escola pblica e que eu e

    outras pessoas poderamos aprender muito com a sua experincia. Por esses

    fatores, com base no referencial terico sobre saberes e competncias docentes e

    na literatura da rea de educao musical sobre prticas pedaggico-musicais, a

    questo principal que impulsiona esta pesquisa : o que constitui a prtica

    pedaggico-musical da professora de msica investigada?

    Na rede pblica municipal de Florianpolis, a msica ministrada nas sries

    finais do ensino fundamental por professores especialistas desde 1998, ou seja, h

    dez anos a msica disciplina curricular nesse municpio2. Algumas escolas tmincludo a msica nas sries iniciais, mas h poucos anos e sob a forma de

    projetos, ou seja, no de maneira estabelecida na grade curricular como ocorre nas

    sries finais. So sete professores de msica efetivos e aproximadamente 20

    professores contratados a cada ano, distribudos em 20 escolas, algumas

    organizaes no governamentais (ONGs) e outras entidades conveniadas com a

    Prefeitura Municipal de Florianpolis, havendo msica no mbito curricular e/ou

    extracurricular.A professora escolhida para a realizao desta pesquisa foi uma das

    primeiras professoras de msica a assumir como efetiva nessa modalidade de arte

    na rede municipal de Florianpolis. Ela comeou sua atuao a partir do primeiro

    concurso pblico em que houve a insero da msica no currculo escolar desse

    municpio. Nessa ocasio, a msica passou a ser ministrada por profissional

    especfico da rea de msica, no mais por um professor polivalente de artes ou

    2 Nem todas as escolas da rede possuem aula de msica. Outras modalidades de artes (Artes visuais, ArtesCnicas e Dana) tambm so oferecidas. Algumas escolas tm mais de um desses profissionais, ou seja, aorganizao curricular varia entre as unidades escolares da rede.

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    educao artstica. Ao longo desses dez anos, ela recebeu muitos estagirios e

    outras pessoas que quiseram observar seu trabalho. Ela tambm participou de

    formao continuada, enviou trabalhos para eventos, e levou muitas vezes seus

    alunos para se apresentarem publicamente. Seu trabalho tem bastante visibilidade,

    uma vez que ela bastante solicitada para tais atividades. H tambm uma

    matria sobre suas aulas numa revista de circulao nacional e outra num jornal da

    cidade. Ela manteve-se em contato com a UDESC atravs dos estagirios e

    tambm atravs da consultoria mencionada anteriormente. Entre os professores

    efetivos da rede de ensino municipal, ela uma das professoras que possui maior

    tempo de experincia nessa rede e leciona em duas escolas. Todos esses fatorescontriburam para que ela fosse escolhida para a realizao desta investigao.

    O principal objetivo deste trabalho investigar o que constitui a prtica

    pedaggico-musical da professora escolhida para a pesquisa. Outros objetivos so:

    compreender como as concepes e aes da professora foram construdas ao

    longo de sua trajetria e como contribuem para a educao musical que realiza;

    compreender parte da realidade do ensino de msica curricular daquele contexto; e

    investigar o que os alunos e a equipe pedaggica escolar pensam sobre o ensinode msica realizado nas escolas participantes.

    Este trabalho est estruturado da seguinte forma: o Captulo 1 uma reviso

    de literatura da rea de educao musical, cujos tpicos se referem definio e

    aos estudos sobre prtica pedaggico-musical, alm dos saberes e competncias

    apontados como necessrios aos professores de msica. O Captulo 2 a

    apresentao do referencial terico que fundamenta este trabalho. O Captulo 3 a

    descrio da metodologia de pesquisa empregada, contendo os pressupostos daabordagem, as tcnicas e instrumentos de coleta de dados, a descrio do

    contexto, as etapas da pesquisa, a concepo da anlise dos dados e os critrios

    ticos adotados. O Captulo 4 apresenta caractersticas pessoais e profissionais da

    professora estudada, sua formao, suas experincias profissionais, entre outros

    elementos que favorecem um olhar amplo para a prtica pedaggico-musical

    dessa professora. No Captulo 5 feita uma descrio detalhada da prtica

    pedaggico-musical em questo, onde so discutidos diversos aspectos que a

    compem. Ao final desse ltimo captulo h uma sntese da constituio da prtica

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    pedaggico-musical estudada e uma aproximao dos aspectos encontrados

    nessa prtica com os saberes e competncias apresentados no referencial. As

    consideraes finais apresentam um resumo dos aspectos discutidos no trabalho e

    dos resultados encontrados e apontam tambm para algumas contribuies desta

    pesquisa e sugestes para futuras pesquisas.

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    1 REVISO DE LITERATURA

    O interesse desta pesquisa localiza-se na prtica pedaggico-musical deuma professora de msica atuante na escola regular pblica, onde msica

    disciplina curricular. importante, portanto, situar as discusses acerca de trs

    tpicos fundamentais: 1) A definio de prticas pedaggico-musicais; 2) Os

    estudos sobre os professores de msica; e 3) Os saberes e as competncias

    docentes no mbito da educao musical. A literatura visitada sustenta a

    importncia em se descrever, analisar e compreender prticas pedaggico-

    musicais, com base no estudo dos saberes e competncias docentes.A classificao apresentada em relao aos estudos sobre professores de

    msica (item 1.2) resultado de uma busca por dissertaes de mestrado e teses

    de doutorado disponveis nas bibliotecas digitais, alm de artigos publicados em

    revistas da rea a partir do ano 2000. No se trata de uma categorizao, mas de

    uma breve sntese dos temas discutidos nesses trabalhos.

    1.1 DEFINIO DE PRTICAS PEDAGGICO-MUSICAIS

    O termo prticas pedaggico-musicais bastante freqente na literatura da

    rea de educao musical. Nesta pesquisa o foco est justamente direcionado

    para este elemento e por isso necessrio definir o que entendo como prtica

    pedaggico-musical e de que forma esta expresso est sendo utilizada no

    trabalho.

    Kraemer (2000) fala sobre o conhecimento pedaggico-musical. A

    discusso proposta pelo autor sobre esse conhecimento busca construir ou refletir

    sobre a epistemologia da educao musical.

    A pedagogia da msica ocupa-se com as relaes entre as [sic]pessoa(s) e a(s) msica(s) sob os aspectos de apropriao e detransmisso. Ao seu campo de trabalho pertence toda a prtica msico-educacional que realizada em aulas escolares e no escolares, assimcomo toda cultura musical em processo de formao. (KRAEMER, 2000,p.51)

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    Kraemer discute a educao musical de forma abrangente, na medida em

    que explora as relaes entre a msica e diferentes reas do conhecimento. Para

    ele, o que resulta da juno entre pedagogia e msica faz com que a educao

    musical compartilhe seu objeto de estudo com essas reas (filosofia, pedagogia,

    sociologia, entre outras). Ou seja, a pedagogia da msica est entrelaada com

    outras disciplinas e no centro das reflexes musicais esto os problemas da

    apropriao e transmisso da msica (KRAEMER, 2000, p. 61). Mesmo

    compartilhando seu conhecimento com outras reas, a educao musical deve ser

    considerada uma disciplina autnoma, pois possui suas especificidades.

    Kraemer menciona as prticas musicais e educacionais como constituintesdesse conhecimento. O termo prticas pedaggico-musicais poderia ser utilizado

    para definir prticas, momentos, ou atividades onde sejam proporcionadas relaes

    de apropriao (aprender msica) e transmisso (ensinar msica). Nessas

    relaes no somente o conhecimento musical que est em movimento, mas as

    questes sociais, interpessoais, culturais, polticas, entre outras, tambm

    perpassam o processo, no se tratando, portanto, de uma relao linear, e sim,

    complexa.Na literatura da rea de educao musical encontramos a expresso

    prticas pedaggico-musicais sendo comumente usada para o sentido aqui

    mencionado. No mesmo sentido, encontramos tambm a expresso prticas

    educativo-musicais e possvel dizer apenas ensino de msica. Neste trabalho,

    sempre que qualquer uma dessas expresses for utilizada, elas tero esse sentido

    amplo: relaes de ensino e aprendizagem de msica, que envolvem processos

    complexos de interao pessoal, social, poltica, profissional, entre outras.

    1.2 ESTUDOS SOBRE OS PROFESSORES DE MSICA

    Nos ltimos nove anos as pesquisas em educao musical tm apresentado

    um nmero considervel de estudos sobre professores de msica ou professores

    que incluem msica nas suas atividades de ensino. Trata-se de pesquisas sobre

    formao, sobre prticas pedaggico-musicais, sobre saberes e competncias

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    docentes, sobre o pensamento do professor e pesquisas sobre histrias de vida de

    professores.

    As pesquisas sobre o pensamento do professor discutem, por exemplo, as

    concepes e aes e tambm o conhecimento prtico do professor (BEINEKE,

    2000; DEL BEN, 2001). A metodologia desses estudos comumente utiliza

    observaes da prtica e entrevistas com os professores investigados, buscando

    compreender o ensino de msica realizado a partir da perspectiva dos seus atores.

    As prticas pedaggico-musicais so observadas e analisadas, servindo como

    base para uma srie de discusses.

    Pesquisas sobre histrias de vida e/ou trajetria profissional de professoresde msica procuram descrever, compreender e analisar o percurso dos mesmos.

    Buscam conhecer o seu desenvolvimento profissional, suas escolhas e sua

    identidade e relacionar esses aspectos com os elementos pessoais, sociais,

    polticos e culturais da vida dos professores estudados (PINOTTI e JOLY, 2002;

    CAVALCANTE, 2004). Todos esses aspectos constituem os professores, e suas

    prticas so, certamente, por eles influenciadas.

    As prticas pedaggico-musicais tambm so especificamente pesquisadas(DINIZ, 2005; RUSSEL, 2005; SPANAVELLO e BELLOCHIO, 2005; BONA, 2006)

    e discutem basicamente quais so as atividades musicais, os contedos e as

    metodologias utilizadas pelos professores de msica ou professores unidocentes

    (generalistas). Tambm so investigados quais os repertrios, quais as posturas

    educacionais dos professores e quais as estratgias de ensino adotadas por eles.

    Os interesses das pesquisas sobre a formao de professores de msica

    (BELLOCHIO, 2002; CERESER, 2003; QUEIROZ e MARINHO, 2005) bem comosobre a formao musical dos professores generalistas (BELLOCHIO, 2000;

    FIGUEIREDO, 2001, 2007; DINIZ e JOLY, 2007) esto, basicamente, em discutir

    polticas de formao, a composio dos currculos e abordagens dos cursos

    superiores de msica e de pedagogia, alm de estudos sobre o estgio

    supervisionado (MATEIRO e CARDOSO, 2004-5; AZEVEDO, 2007). Nesse tipo de

    pesquisa existe uma tendncia em relacionar a formao com a prtica

    pedaggico-musical, sob a compreenso de que o desenvolvimento de uma

    interfere na outra.

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    Pesquisas sobre os saberes e as competncias docentes do professor de

    msica (REQUIO, 2002; MACHADO, 2003; BELLHOCHIO, 2003a; GALIZIA,

    2007) so tambm, em geral, pesquisas sobre a formao, mas discutem mais

    especificamente questes sobre a constituio do professor de msica, incluindo

    sua formao, sua trajetria profissional, a experincia adquirida na profisso, as

    influncias culturais, sociais e polticas presentes no seu trabalho. So pesquisas

    que procuram compreender o que os professores de msica sabem e/ou precisam

    saber para desempenhar sua funo. Pensar os tipos de saberes e competncias

    dos professores de msica implica em, quase que automaticamente, pensar na sua

    prtica pedaggico-musical, pois o interesse em compreender o que osprofessores sabem, tem grande ligao com aquilo que os professores fazem.

    As pesquisas mencionadas neste tpico, ainda que apresentem referenciais

    diferenciados, possuem semelhanas e concordncias em alguns elementos.

    Segundo seus autores, pesquisas desse tipo contribuem para: dar voz aos

    professores; sistematizar os dados de experincias pedaggico-musicais;

    solucionar problemas encontrados nas realidades educacionais; melhorar a prtica

    pedaggica; estimular a valorizao da msica na escola; fundamentar aconstruo de currculos; aprimorar a formao dos novos professores; contribuir

    para a profissionalizao docente; aproximar a universidade da realidade escolar;

    construir a epistemologia da rea de educao musical. Esta uma sntese do que

    as pesquisas visitadas tratam, em termos gerais. Evidencia-se o valor de realizar

    uma pesquisa sobre a prtica pedaggico-musical de uma professora,

    considerando que existe uma linha de pesquisas nesta direo que apontam,

    inclusive, para a necessidade de mais estudos semelhantes.

    1.3 SABERES E COMPETNCIAS DOCENTES NO MBITO DA EDUCAO

    MUSICAL

    No decorrer do trabalho utilizo os termos saberes e competncias,

    compreendendo que os mesmos envolvem os conhecimentos, as habilidades, o

    saber-fazer, o saber-ser e demais elementos constituintes do professor. Esses

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    elementos so mais amplamente apresentados no captulo do referencial terico

    (Captulo 2).

    Os estudos sobre os saberes e competncias docentes esto presentes na

    rea de educao musical, como possvel observar atravs de pesquisas, como

    as mencionadas anteriormente, alm de outras publicaes da rea (BELLOCHIO,

    2003a, 2003b; DEL BEN, 2003; MACHADO, 2004; QUEIROZ e MARINHO, 2005;

    DEL BEN et al., 2006; HENTSCHKE, AZEVEDO e ARAJO, 2006; GALIZIA,

    AZEVEDO e HENTSCHKE, 2008). Esses estudos tratam, em resumo, da formao

    do educador musical e da prtica profissional do mesmo incluindo o professor

    universitrio, o professor da educao bsica, o professor que atua em projetossociais e tambm aquele que vai para as escolas de msica. Ou seja, fazem parte

    de uma busca para compreender o que os professores de msica sabem ou

    precisam saber, quais suas habilidades, conhecimentos e competncias

    aprendidos e mobilizados ao longo de sua formao e de sua atuao profissional.

    Esse novo olhar sobre o trabalho docente fruto de uma concepo educacional

    que relaciona a qualidade da educao com a qualidade da formao docente

    (HENTSCHKE, AZEVEDO E ARAUJO, 2006, p. 50). Portanto, as discusses sediferenciam pelo enfoque dado ora aos saberes e competncias da formao e ora

    aos saberes e competncias da prtica docente. Entretanto, essa diviso muito

    tnue na medida em que pensar na formao tambm pensar nos espaos de

    atuao e profissionalizao do professor (BELLOCHIO, 2003b).

    Os referenciais para esses estudos vm da rea de educao a qual tem

    desenvolvido nos ltimos anos muitas pesquisas sobre os professores. Hentschke,

    Azevedo e Arajo (2006) destacam as abordagens desenvolvidas por Shulman,Gauthier, Pimenta e Tardif3 como principais linhas tericas que fundamentam os

    trabalhos sobre esse tpico. Em publicaes da rea de educao musical

    encontramos muitas referncias tambm a Perrenoud (1999) e Morin (2005), os

    quais abordam as questes sobre os saberes e as competncias.

    Estudar as competncias e saberes de professores no significa elencar um

    rol de elementos para serem desenvolvidos na formao e reproduzidos pela

    atuao dos novos professores. Significa compreender a importncia do

    3 As autoras esto se referindo s obras Shulman (1987), Gauthier et al. (1998), Pimenta (1999) e Tardif(2002).

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    conhecimento construdo na formao e na experincia prtica, refletir e discutir

    sobre esse conhecimento para que os resultados possam ser compreendidos,

    assimilados e, se for o caso, transpostos de maneira contextualizada para a

    realidade de outros professores.

    Segundo Hentschke, Azevedo e Arajo (2006) h a necessidade de

    sistematizao e explicitao dos saberes da profisso docente que se tem

    pretendido alcanar a partir de pesquisas inseridas nos contextos escolares sob a

    atuao dos professores. Essa sistematizao poderia favorecer um

    compartilhamento das experincias profissionais, indicar caminhos para a

    formao e gerar uma maior profissionalizao docente.A pesquisa sobre a profisso do professor e seus saberes, na rea de

    educao musical, um tema que merece ateno (BELLOCHIO, 2003b). Del Ben

    e colaboradoras (2006, p. 657) sugerem que relevante investigar como se

    configuram os saberes pedaggicos em diferentes situaes de ensino e

    aprendizagem de msica, partindo de prticas reais e diversificadas para que se

    possam entender melhor os saberes necessrios docncia de msica. Bellochio

    (2003b) prope que, na educao musical, sejam mais definidos e delimitadosquais saberes profissionais so necessrios para responder s exigncias

    especficas das situaes concretas de ensino de msica. Queiroz e Marinho

    sustentam que

    h competncias que, de maneira geral, so imprescindveis a todoprofissional da rea de educao musical. Competncias essas quepermitam somar os contedos especficos da msica com acompreenso e a capacitao metodolgicas, fundamentais para odesenvolvimento de atividades docentes significativas e contextualizadascom as situaes de ensino musical existentes na contemporaneidade.(QUEIROZ E MARINHO, 2005, p. 84)

    Os autores apresentados indicam que o estudo e a sistematizao dos

    saberes e das competncias docentes so importantes para a profissionalizao

    docente do educador musical. Diante das discusses proporcionadas dentro dessa

    temtica, possvel constatar uma preocupao em questionar: quais seriam,

    ento, os saberes e competncias que so imprescindveis aos professores de

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    msica? O que o professor de msica precisa saber? O que deve constituir a sua

    formao?

    Queiroz e Marinho (2005) apontam para o oferecimento de uma preparao

    ampla, composta pela formao musical, pedaggica, cultural, tica e humanstica.

    Esta perspectiva demonstra que h uma tendncia nas reformas curriculares dos

    cursos superiores de msica a procurarem adotar formaes mais diversificadas e

    voltadas para as necessidades profissionais. Oliveira (2006), de maneira

    semelhante,entende que os cursos de licenciatura em msica devem constituir-se

    de uma base filosfica, pedaggica, musical e multidisciplinar, articuladora e

    investigativa. Alm disso, o licenciado deve possuir as competncias para lidar coma diversidade social e artstica dos vrios contextos. Para Penna (2006) preciso

    ter cuidado para que o saber musical no fique isolado, ou seja, para que a

    formao no se constitua s por contedos musicais. Ela sugere a

    interdisciplinaridade e o contato com outras artes, com a pedagogia, as cincias

    sociais, a filosofia, a histria, a psicologia, alm do dilogo com a realidade. Penna

    (2007) defende que no basta tocar para ser professor, nem basta saber

    pedagogia para ensinar msica: estes dois componentes se complementam.Somado a isto, ela prope como parte da constituio do professor de msica o

    compromisso social, humano e cultural para atuar em diferentes contextos

    educativos, buscar conhecer as necessidades dos alunos e acolher as diferentes

    msicas e diferentes funes que ela possa ter. Del Ben (2007) considera que no

    h como abrir mo dos contedos especficos da msica, mas alerta que onde h

    msica h pessoas se relacionando com msica e, portanto, o educador musical

    no pode estar alheio s necessidades das pessoas e das diferentes funes quea msica pode assumir. Ela sugere que importante estabelecer um dilogo com a

    pedagogia para melhor entender as finalidades da educao bsica. Numa

    perspectiva semelhante, Bellochio diz que o campo dos saberes dos professores

    de msica

    carrega especificidades de conhecimento musical e de conhecimentopedaggico, sem, no entanto, delimitar, prescries de como agir nasituao educacional, que carregada de situaes especficas da

    prtica. Para ensinar preciso que se compreenda a educao e esta emseus constituintes psicolgicos, filosficos, antropolgicos, sociolgicos,

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    2 REFERENCIAL TERICO

    Esta pesquisa tem como referencial terico: a) as competncias docentes,da forma como so discutidas por Perrenoud (1999); b) os saberes docentes

    estudados por Tardif (2007) e tambm por Gauthier e colaboradores (1998).

    Embora no tratem especificamente do professor de msica, essas discusses

    podem ser transpostas para se pensar as questes referentes prtica

    pedaggico-musical. Neste captulo, apresento de maneira resumida algumas

    idias de cada autor, especificamente relacionadas com as prticas pedaggicas

    de professores. Ao final, sintetizo a complementaridade encontrada entre eles etambm as relaes existentes entre as suas idias.

    2.1 PHILIPPE PERRENOUD

    Perrenoud defende a abordagem por competncias na educao. Ele faz a

    diferenciao entre a definio de competncias e de conhecimentos. Os

    conhecimentos so representaes da realidade, que construmos e

    armazenamos ao sabor de nossa experincia e de nossa formao

    (PERRENOUD, 1999, p. 7), ou seja, os contedos, as informaes, as matrias. J

    as competncias constituem-se como a capacidade de agir eficazmente em um

    determinado tipo de situao, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a

    eles (PERRENOUD, 1999, p. 7), quer dizer, a tomada de decises, frente a um

    problema, o agir, valendo-se dos conhecimentos adquiridos ou buscando novos

    conhecimentos necessrios. A relao entre conhecimentos e competncias tal

    que as competncias mobilizam conhecimentos (PERRENOUD, 1999, p. 7) e

    importante equilibrar estes dois elementos na formao, pois eles so

    complementares. A presena de um ou de outro elemento nos currculos, portanto,

    no pode ser vista de forma excludente.

    O dilema da educao, dentro de uma discusso sobre a abordagem das

    competncias, seria se a escola deve desenvolver competncias oufornecer conhecimento. Cada um destes elementos demanda umagrande poro de tempo, sendo que a preferncia por um ou outro

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    depende da prioridade que o sistema educacional tem em relao a eles.No entanto, no se pode perder de vista que conhecimentos ecompetncias so complementares, pois as competncias precisam de

    conhecimentos a ser mobilizados. (PERRENOUD, 1999, p.7)

    Trata-se, portanto, de uma questo de organizao e prioridades. Segundo

    Perrenoud, durante muito tempo a educao tem priorizado a transmisso de

    conhecimentos, sem que eles, necessariamente, faam sentido para os

    aprendizes. A abordagem por competncias apresenta uma nova perspectiva, na

    medida em que no se fixa rigorosamente nos contedos, mas favorece situaes

    de aprofundamento significativo de experincias de aprendizagem (PERRENOUD,

    1999). Ele prope que o professor comprometido em agir dentro de uma

    abordagem por competncias precisa:

    considerar os conhecimentos como recursos a serem mobilizados; trabalhar regularmente por problemas; criar ou utilizar outros meios de ensino; negociar e conduzir projetos com seus alunos; adotar um planejamento flexvel e indicativo e improvisar; implementar e explicitar um novo contrato didtico; praticar uma avaliao formadora em situao de trabalho; dirigir-se para uma menor compartimentao disciplinar.(PERRENOUD, 1999, p. 53)

    Considerar que a aquisio de conhecimentos no tem um fim em si

    mesma, mas apenas uma base para que a pessoa desenvolva suas

    competncias um primeiro e tambm um grande passo, de acordo com esse

    autor. Perrenoud chama isto de revoluo cultural, visto que muda a lgica de

    ensino praticada h muito tempo e que, para a sua verdadeira consolidao,necessita do envolvimento no s do professor, isoladamente, mas de muitos

    outros envolvidos no processo de educao escolar: demais professores, diretores,

    coordenaes pedaggicas, pais, comunidade, ministrio da educao e editores

    de materiais didticos.

    Professores envolvidos com a abordagem por competncias necessitariam

    estar dispostos a: aceitar a desordem e a incompletude dos conhecimentos

    mobilizados, uma vez que o fim no o conhecimento, mas as competncias queele providencia; desistir do domnio da organizao dos conhecimentos na mente

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    do aluno (PERRENOUD, 1999, p. 56), pois cada aluno vai aprender segundo suas

    prprias relaes e interaes com o conhecimento acionado, se este fizer sentido

    para ele; compreender que em um trabalho norteado pelas competncias o

    problema que organiza os conhecimentos e no o discurso, ou seja, a necessidade

    de resolver o problema gera caminhos para se chegar s solues; e procurar ter

    uma prtica pessoal do uso dos conhecimentos na ao, ou seja, o professor no

    vai apenas ensinar por competncias, mas vai agir atravs delas. A formao

    precisaria ser coerente com a proposta e colaborar assim para a vivncia da

    mesma; no mais ensinar, mas fazer aprender; recuar em relao ao

    planejamento quando necessrio; por em prtica sua capacidade de anlise dassituaes e tambm de ver outro ponto de vista.

    A abordagem por competncias leva a fazer menos coisas, a dedicar-sea um pequeno nmero de situaes fortes e fecundas, que produzemaprendizados e giram em torno de importantes conhecimentos. Issoobriga a abrir mo de boa parte dos contedos tidos, ainda hoje, comoindispensveis. (PERRENOUD, 1999, p. 64)

    O professor dever ainda: ter a capacidade de mediao e de estimulao

    de debates com seus alunos; ter tranqilidade e liberdade para com os contedos,

    sabendo extrair o essencial de cada tema abordado; abrir mo do uso da avaliao

    como meio de presso e barganha, envolvendo seus alunos na avaliao de suas

    prprias competncias; perceber a transversalidade entre as disciplinas; valorizar

    os processos em detrimento dos resultados; atacar problemas reais da vida; ser

    sensvel s diferenas entre os alunos (PERRENOUD, 1999). Diversas so,

    portanto, as competncias a serem desenvolvidas pelos professores e para queestes, por sua vez, desenvolvam-nas com seus alunos.

    2.2 MAURICE TARDIF

    Tardif (2007) prope que os saberes docentes so sociais e ao mesmo

    tempo trazem caractersticas individuais, que so saberes plurais, temporais,

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    humanos e no podem ser vistos ou estudados de maneira distanciada do trabalho

    em sala de aula.

    Noutras palavras, embora os professores utilizem diferentes saberes,essa utilizao se d em funo do seu trabalho e das situaes,condicionamentos e recursos ligados a esse trabalho. [...] Isso significaque as relaes dos professores com os saberes nunca so relaesestritamente cognitivas: so relaes mediadas pelo trabalho que lhesfornece princpios para enfrentar e solucionar situaes cotidianas.(Tardif, 2007, p. 17)

    Segundo Tardif, os saberes dos professores so compostos por diversos

    elementos, de forma heterognea e dificilmente mensurvel ou passvel de uma

    categorizao de um repertrio definido. O autor, porm, elenca quatro tipos de

    saberes que constituem o conjunto dos saberes docentes. Pode-se definir o saber

    docente como um saber plural, formado pelo amlgama, mais ou menos coerente,

    de saberes oriundos da formao profissional e de saberes disciplinares,

    curriculares e experienciais (TARDIF, 2007, p. 36). Os saberes da formao

    profissional so transmitidos pelas instituies de formao e se destinam ao

    desenvolvimento cientfico dos professores. Correspondem aos conhecimentos das

    cincias da educao e das ideologias pedaggicas. Os saberes disciplinares

    tambm so transmitidos nas instituies de formao e se referem s disciplinas

    consideradas importantes para o conhecimento dos professores, dentre os

    diversos campos do conhecimento. Comumente esses saberes so abordados de

    forma independente da formao pedaggica. Os saberes curriculares

    correspondem aos discursos, objetivos, contedos e mtodos a partir dos quais a

    instituio escolar categoriza e apresenta os saberes [...] por ela selecionados

    (TARDIF, 2007, p. 38). Tratam-se dos programas escolares com os quais os

    professores precisam aprender a lidar. Os saberes experienciais so aqueles

    desenvolvidos no exerccio da profisso, na experincia, na prtica, no contato com

    os alunos.

    O professor ideal algum que deve conhecer a sua matria, sua

    disciplina e seu programa, alm de possuir certos conhecimentosrelativos s cincias da educao e pedagogia e desenvolver um saber

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    prtico baseado em sua experincia cotidiana com os alunos. (TARDIF,2007, p. 39)

    Tardif enfatiza a importncia de se conhecer e discutir os saberes

    experienciais. Ainda que todos esses saberes se manifestem na prtica profissional

    dos professores, em maior ou menor grau, os saberes experienciais so

    produzidos pelos professores no contato direto com a realidade. Esses saberes

    no esto sistematizados ou teorizados e formam um conjunto de representaes

    a partir das quais os professores interpretam, compreendem e orientam sua

    profisso e sua prtica cotidiana em todas as suas dimenses (TARDIF, 2007, p.

    49).

    Os saberes experienciais possuem as seguintes caractersticas, segundo

    Tardif:

    - so mobilizados, modelados e adquiridos no desenrolar das funes dos

    professores;

    - so prticos e dependem das situaes condicionantes do trabalho;

    - so interativos entre os professores e outros atores educativos;

    - so sincrticos e plurais e no repousam sobre um repertrio de

    conhecimentos unificado;

    - so heterogneos, pois dependem das caractersticas pessoais da

    trajetria dos professores;

    - so complexos, so personalizados, existenciais, temporais, evolutivos e

    dinmicos;

    - so pouco formalizados;

    - so sociais.A partir das caractersticas apresentadas por Tardif em relao aos saberes

    experienciais, ficam evidenciadas a diversidade e a complexidade dos saberes

    docentes. Justifica-se, portanto, a necessidade de estud-los para melhor

    compreend-los.

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    2.3 CLERMONT GAUTHIER

    Gauthier e colaboradores (1998) tambm falam sobre os saberes docentes.

    Eles apresentam a idia de repertrio de conhecimentos, os quais envolvem os

    saberes que subjazem o ato de ensinar que, por sua vez, so os conhecimentos,

    competncias e habilidades que do base prtica do magistrio e que podem

    fazer parte da formao dos professores.

    Embora ensinar seja um oficio exercido em quase todas as partes domundo, e sem interrupo, desde a Antiguidade, ainda se sabe muitopouco a respeito dos fenmenos que lhe so inerentes. [...] oconhecimento desses elementos do saber profissional docente fundamental e pode permitir que os professores exeram o seu ofciocom muito mais competncia. (GAUTHIER et al., 1998, p. 17)

    Isso demonstra a preocupao de Gauthier e demais autores com o

    conhecimento dos saberes profissionais docentes na medida em que eles podem

    contribuir para a formao dos novos professores e tambm para o

    reconhecimento e a qualificao da profisso docente. Para ele, necessrio que

    as pesquisas das cincias da educao levem em considerao as condies

    concretas do exerccio da docncia, ou seja, estudem situaes reais de

    professores ensinando a alunos em sala de aula. Assim, poder conhecer-se o que

    esse repertrio de conhecimentos e formaliz-lo, para melhorar o

    desenvolvimento da profisso.

    Uma das condies essenciais a toda profisso a formalizao dossaberes necessrios execuo das tarefas que lhe so prprias. Aocontrrio de vrios outros ofcios que desenvolveram um corpus desaberes, o ensino tarda a refletir sobre si mesmo. Confinado ao segredoda sala de aula, ele resiste sua prpria conceitualizao e malconsegue se expressar. (GAUTHIER et al., 1998, p. 20)

    Gauthier e colaboradores examinam, com base nos estudos de Tardif,

    Lessard e Lahaye (1991 apud GAUTHIER et al., 1998), seis tipos de saberes

    necessrios ao ensino, a fim de perceber melhor em que sentido e de que maneira

    o professor mobiliza esses saberes (GAUTHIER et al., 1998, p. 29). A saber:

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    - Saberes disciplinares: referentes s diferentes matrias de estudo, saberes

    estes produzidos pelos cientistas nas suas especialidades;

    - Saberes curriculares: referentes organizao dos saberes produzidos

    pelas cincias e sua traduo, por meio das instituies responsveis, para os

    programas escolares;

    - Saberes das cincias da educao: so saberes institucionalizados

    referentes ao ofcio da docncia, em geral, teorias e informaes que os

    professores recebem atravs da formao, mas que no dependem da sua ao

    pedaggica.

    - Saberes da tradio pedaggica: referentes queles saberes que no seensinam, mas que constituem uma representao da escola que cada um j traz

    consigo, independente da formao universitria.

    - Saberes experienciais: so os saberes produzidos pelos professores no

    exerccio de seu ofcio, os quais vo se consolidando e fazendo parte da sua

    rotina. Esses saberes so contextuais e restritos sala de aula.

    - Saberes da ao pedaggica: o saber experiencial dos professores a

    partir do momento em que se torna pblico e que testado atravs das pesquisasrealizadas em sala de aula (GAUTHIER et al., 1998, p. 33). So saberes

    produzidos por professores, verificados atravs de pesquisas e que podem, assim,

    vir a ser validados, fazer parte do conhecimento formal e constituir a ao de

    outros professores.

    Os saberes da ao pedaggica so postos em maior relevncia por

    Gauthier e colaboradores, na medida em que os resultados de pesquisas sobre

    esses saberes poderiam contribuir enormemente para o aperfeioamento daprtica docente (GAUTHIER et al., 1998, p. 34) e ainda seria o tipo de saber

    menos desenvolvido e mais necessrio profissionalizao do ensino. No

    poder haver profissionalizao do ensino enquanto esse tipo de saber no for

    mais explicitado, visto que os saberes da ao pedaggica constituem um dos

    fundamentos da identidade profissional do professor (GAUTHIER et al., 1998, p.

    34). O objetivo do autor , portanto, fomentar essa busca por revelar os saberes da

    ao pedaggica que tambm esto presentes no reservatrio dos conhecimentos

    do professor.

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    Dentro do repertrio de conhecimentos apresentado por Gauthier e

    colaboradores resultado da sntese de pesquisas sobre saberes docentes

    destacam-se duas grandes funes pedaggicas: a gesto da matria e a gesto

    de classe. Essas duas funes se manifestam na forma de planejamento, na

    interao com os alunos e na avaliao. A gesto da matria envolve, entre outros

    elementos, a organizao e apresentao dos contedos, a seqncia de

    atividades, as explicaes, a recapitulao, a prtica dos alunos, a gerncia do

    tempo e a diviso dos assuntos. A gesto de classe envolve medidas disciplinares,

    regras, atitudes e a superviso ativa do trabalho realizado. A gesto da matria e a

    gesto de classe so complementares, uma vez que uma no se desenvolve sema presena da outra.

    2.4 RELAES ENTRE AS IDIAS DE PERRENOUD, TARDIF E GAUTHIER

    As idias dos trs autores apresentados neste referencial possuem

    semelhanas, embora possam no concordar completamente uns com os outros

    em alguma questo. Neste trabalho, considero que os trabalhos mencionados so

    complementares entre si, em relao aos conceitos apresentados. Eles fornecem

    as bases conceituais para a compreenso sobre os saberes, competncias,

    conhecimentos e habilidades docentes, os quais podem ser utilizados tambm para

    o estudo sobre a constituio da prtica pedaggico-musical dos professores de

    msica.

    Saberes, competncias, conhecimentos e habilidades so palavras com

    significados semelhantes e utilizadas, no dia-a-dia, quase como sinnimos. Os

    termos apresentados por cada autor (saberes, competncias, conhecimentos...)

    tm uma razo de ser, caso contrrio, eles utilizariam as mesmas palavras. Mas,

    de maneira geral, todos deixam a entender que existe um conjunto de elementos,

    cada qual com sua funo, que compe aquilo que os professores sabem,

    conhecem, so capazes. Os prprios autores, para explicar seus conceitos,

    utilizam diferentes outros termos complementares. Perrenoud diz que as

    competncias so a mobilizao de conhecimentos, um conjunto de habilidades e

    o saber-fazer dos professores; Tardif diz que os saberes so o conjunto dos

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    conhecimentos, competncias e habilidades que servem de alicerce prtica

    docente; e Gauthier e colaboradores, por sua vez, tambm dizem que as

    competncias, conhecimentos e habilidades compem os saberes.

    Posso concluir que a linha que separa os conceitos no to rigorosamente

    definida e que eles so complementares, no sentido que pretendo utilizar para o

    estudo da prtica pedaggico-musical da professora estudada. As idias dos

    autores no so excludentes, mas esto contidas umas nas outras. A maneira

    como os conceitos so utilizados por cada autor so diferentes, mas

    correspondem, neste trabalho, a um mesmo assunto. Por isso, vou utilizar apenas

    as palavras saberes e competncias, representando todo o conjunto.Saberes e competncias so adquiridos pelos professores em diferentes

    etapas de sua vida (pessoal e profissional), em instituies oficiais (formao

    inicial, formao continuada, cursos, escola) e no oficiais (experincias de vida,

    cultura, sociedade, exerccio da profisso). H um conjunto de saberes e

    competncias construdos e armazenados pelos professores no decorrer de sua

    formao. Estes saberes so produzidos, em grande parte, pelas instituies, mas

    fazem parte da constituio dos professores na medida em que so assimilados eapropriados por eles. De outro lado, encontra-se o conjunto de saberes e

    competncias construdos pelos professores em sua ao profissional, mobilizados

    de acordo com as necessidades reais da profisso. Deveria haver uma

    retroalimentao tal entre saberes e competncias de formao e de profisso, de

    forma que sua transposio e utilizao fossem proporcionadas em ambas as

    instncias. Ou seja, saberes e competncias experienciais no surgem

    isoladamente, mas carregam na sua composio toda uma srie de elementosadquiridos ao longo de sua formao (oficial ou no). Na medida em que os

    saberes e competncias experienciais so gerados, eles vo compor, de certa

    forma, o rol de conhecimentos adquiridos, e ficam registrados, ainda que apenas

    na memria dos professores, para uso futuro. A possibilidade de estud-los,

    compreend-los e organiz-los atravs de pesquisas cientficas transformando-os

    em novos conhecimentos que poderiam ser aproveitados por outros professores,

    ao fazerem parte da formao dos mesmos , fecharia o ciclo entre os diferentes

    tipos de saberes. Os saberes institucionalizados seriam atualizados a partir das

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    realidades estudadas, sem deixar de serem fundamentos tericos para a reflexo

    dos professores em sua formao e sua prtica pedaggica.

    A partir desse referencial que olho para a prtica pedaggico-musical da

    professora escolhida para esta pesquisa, no de forma prescritiva, mas como

    perspectiva terica que proporcione reconhecer quais as competncias e os

    saberes que a constituem, de onde eles vm e como so mobilizados.

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    3 METODOLOGIA DA PESQUISA

    3.1 PESQUISA QUALITATIVA

    As questes e objetivos delineados nesta pesquisa, bem como o universo

    em que ela se insere (pesquisa sobre educao) levaram-me a compreender que a

    pesquisa qualitativa seria a abordagem mais adequada. Pesquisa qualitativa

    aquela que estuda o fenmeno dentro do seu contexto e a partir da perspectiva dos

    seus participantes, cujos resultados no priorizam nmeros nem generalizaes,

    mas a compreenso aprofundada e a nfase nas especificidades de um fenmeno

    em termos de sua origem e de sua razo de ser (HAGUETTE, 1987, p. 63).

    Na pesquisa qualitativa os investigadores freqentam o local de estudo

    porque se preocupam com o contexto. Entendem que as aes podem ser mais

    bem compreendidas quando so observadas no seu ambiente habitual de

    ocorrncia (BOGDAN E BIKLEN, 1994, p. 48). Desta forma possvel aproximar-

    se da compreenso dos significados que as pessoas atribuem a determinados

    eventos e objetos (LUDWIG, 2003, p. 256).

    A pesquisa qualitativa, segundo Bogdan e Biklen (1994) apresenta

    caractersticas como: os dados so normalmente na forma de palavras e imagens

    e no de nmeros; o interesse est mais no processo do que nos resultados; no

    h o objetivo de confirmar hipteses, mas as idias so construdas na medida em

    que os dados vo sendo recolhidos e a teoria se constri depois da coleta e anlise

    dos dados. Ludwig (2003) tambm indica que a pesquisa qualitativa caracteriza-se

    por: ser a investigao de ambientes sociais; coletar os dados de formas

    diversificadas; ser a descrio dos fenmenos; receber uma anlise indutiva;

    constituir as concluses a partir dos dados coletados. Essas caractersticas

    correspondem s necessidades desta investigao, visto que a inteno foi

    conhecer profundamente o desenvolvimento da educao musical que ocorre a

    partir da atuao da professora investigada, naquele sistema educacional, a partir

    do contato direto com o ambiente onde ocorre tal fenmeno e das concepes dos

    prprios agentes do processo. Em outras palavras, busquei conhecer comprofundidade o desenvolvimento da prtica pedaggico-musical da professora de

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    msica investigada, estando diretamente em contato com o ambiente escolar e

    com a sala de aula. Recolhi as informaes a partir das perspectivas das pessoas

    envolvidas (professora de msica, alunos e equipes pedaggicas). Houve uma

    insero no campo (as duas escolas onde atua a professora investigada) com o

    objetivo de observar de perto e compreender aspectos que fazem parte daqueles

    contextos. No houve pretenso de comparar o trabalho da professora com outros

    profissionais, nem generalizar a educao musical do municpio em questo a

    partir desse nico exemplo. Muito menos houve o intuito de gerar dados

    estatsticos sobre qualquer aspecto que envolva tal fenmeno, embora dados

    numricos tenham sido utilizados, porm, com olhar qualitativo, o que perfeitamente possvel em uma abordagem qualitativa (MOREIRA e CALEFFE,

    2006; FREIRE e CAVAZOTTI, 2007).

    A pesquisa qualitativa serviu, ento, como abordagem deste trabalho, tendo

    como metodologia o estudo de caso. Os instrumentos de coleta de dados foram

    observaes, entrevistas e um questionrio, cujas caractersticas e aplicaes

    nesta pesquisa sero explicadas em seguida.

    3.2 ESTUDO DE CASO

    Os estudos de caso, dentro de uma abordagem qualitativa, favorecem uma

    observao detalhada de um nico contexto, e buscam perceber a relao da parte

    estudada com o todo, mas sempre delimitando o foco (BOGDAN e BIKLEN, 1994).

    A principal caracterstica do estudo de caso o olhar aprofundado sobre um

    fenmeno, conforme afirma Gil (1999, p. 72): o estudo de caso caracterizado

    pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a

    permitir o seu conhecimento amplo e detalhado.

    O estudo de caso orientou o olhar que posicionei sobre o trabalho realizado

    pela professora em questo sem perder de vista que ela est inserida em um

    contexto maior (escola, sistema educacional do municpio, educao musical,

    educao). Dessa forma, o fenmeno no visto como algo isolado, mas uma

    unidade dentro de um sistema mais amplo (LUDKE e ANDR, 1986, p. 17).

    Observa-se, portanto, aquilo que h de nico no fenmeno que o destaca de

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    alguma forma, mas no esquecendo o seu relacionamento com outros casos. O

    caso sempre bem delimitado, devendo ter seus contornos claramente definidos

    no desenrolar do estudo. O caso pode ser similar a outros, mas ao mesmo tempo

    distinto, pois ele tem um interesse prprio, singular (LUDKE e ANDR, 1986, p.

    17).

    Para conseguir realizar uma investigao detalhada, o estudo de caso utiliza

    diferentes tcnicas de pesquisa com o objetivo de apreender a totalidade de uma

    situao e descrever a complexidade de um caso concreto (GOLDENBERG, 2004,

    p. 33). Dessa forma possvel que o pesquisador revele a multiplicidade de

    dimenses existentes em relao ao fenmeno como um todo (LUDKE e ANDR,1986). importante, ento, coletar informaes de diferentes participantes para

    obter pontos de vistas diferenciados. Estas caractersticas estiveram presentes

    durante a realizao desta pesquisa, uma vez que foram utilizados diferentes

    instrumentos de coleta de dados e participaram pessoas com funes diferentes,

    sempre com o foco voltado para a professora em questo. Houve tambm uma

    constante construo dos caminhos reflexivos, sendo repensados a cada momento

    quais seriam os aspectos mais relevantes para a discusso e qual o referencialmais apropriado. O prprio projeto inicial foi sendo modificando ao longo da

    investigao. Esse processo de construo representou um amadurecimento para

    a pesquisa, justamente por causa da flexibilidade caracterstica do estudo de caso

    qualitativo, que me fez prestar ateno a elementos que [podiam] emergir como

    importantes durante o estudo, aspectos no previstos, dimenses no

    estabelecidas (ANDR, 1984, p. 52).

    3.2.1 Descrio do contexto

    A rede municipal de Florianpolis possui na grade curricular de 5 a 8 srie

    (atual 6 ao 9 ano) a aula de msica como possibilidade dentro da disciplina de

    Artes. Ou seja, atendendo a disciplina de artes, h professores de Artes Visuais,

    Artes Cnicas, Msica e Dana. Cada escola tem um ou mais professores de cada

    modalidade. As orientaes curriculares de cada modalidade so feitas atravs de

    cursos de formao continuada, denominados de capacitao. No caso das artes,

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    h uma coordenao junto Secretaria Municipal de Educao. Atravs dessa

    coordenao e de uma parceria com a UDESC, desde 1998, h uma consultoria

    que realiza diversas aes, como: reunir os professores, providenciar cursos e

    favorecer discusses coletivas para a resoluo de problemas e necessidades da

    rea.

    A Secretaria Municipal de Educao de Florianpolis vem trabalhandocom consultorias nas vrias reas de conhecimento escolar. Taisconsultorias atuaram diretamente com os professores da rede municipalde ensino e com tcnicos da Secretaria de Educao, e hoje estodirigidas tambm para a elaborao de documento por rea, alm da

    capacitao permanente de professores. Neste contexto, as Artes estotratadas dentro de suas especificidades e h consultores para as reasde Msica, Teatro e Artes Plsticas. (FIGUEIREDO, 2000, CD-ROM)

    O texto acima citado relata um dos resultados dessa parceria entre a

    Secretaria de Educao Municipal e a universidade, que foi a elaborao da

    Proposta Curricular de Msica para o Municpio de Florianpolis (FIGUEIREDO,

    2000). Esse foi o primeiro documento, publicado em 1999. Em 2008 foi lanado um

    novo documento, dentro da Proposta Curricular da Rede Municipal de Florianpolis(FLORIANPOLIS, 2008), contendo, inclusive, relatos de experincia de

    professores de msica, sendo que a construo do texto tambm resultado da

    parceria mencionada.

    3.2.2 Pesquisa de campo

    A pesquisa de campo aconteceu nas duas escolas onde atua a professora.Chamo de Escola 1 aquela onde a professora trabalha no perodo matutino e

    Escola 2 a do perodo vespertino. Porm, quando a discusso tratar de questes

    que possam identificar participantes, no direi a qual escola estarei me referindo,

    indicando-as de maneira geral (Ex: numa das escolas as respostas foram...).

    Durante o perodo das observaes, a Escola 1 possua um espao

    relativamente pequeno e havia partes do ptio interditadas por causa da

    construo de uma nova parte, h muito tempo em obras. No havia quadra deesportes e a rea de convivncia dos alunos nos intervalos era pequena. Havia

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    biblioteca e sala informatizada. No havia sala de msica. A professora que se

    deslocava de uma turma para a outra no momento da aula. Os instrumentos

    musicais ficavam guardados na sala dos professores. Quando os utilizava, a

    professora elegia uma equipe da turma para ir busc-los e depois guard-los. A

    sala de aula onde ocorreram as observaes era organizada na forma tradicional:

    carteiras individuais enfileiradas, mesa do professor frente. Havia quadro negro,

    giz e armrios ao fundo da sala.

    A Escola 2 era maior, com uma rea ampla de ptio, ginsio de esportes,

    biblioteca, sala informatizada, laboratrios, e sala de msica. Os instrumentos

    ficavam guardados na sala de msica, nos armrios do fundo. A organizao dascarteiras era igual a da outra escola. No perodo matutino, a sala era ocupada por

    uma turma fixa.

    Uma turma de cada escola foi escolhida para a realizao da pesquisa,

    sendo duas quintas sries. A turma da Escola 1 tinha 27 alunos no incio do ano.

    Em geral, era uma turma calma e participativa: dois ou trs alunos apenas

    demonstravam ser mais agitados. A turma da Escola 2 era maior, com 36 alunos e

    era um pouco mais agitada, provavelmente por causa do nmero elevado decrianas. Havia dois alunos com necessidades especiais (portadores de

    deficincias psicomotoras) e, por conseqncia, participavam das aulas duas

    auxiliares de sala. Essa turma demonstrava ser mais entusiasmada e participativa,

    de maneira geral.

    3.3 COLETA DE DADOS

    As tcnicas utilizadas foram observaes (em sala de aula e ambiente

    escolar), questionrio (com os alunos) e entrevistas semi-estruturadas (professora

    e pessoas das equipes pedaggicas). A principal participante da pesquisa foi a

    professora investigada, com quem estive em contato constante durante o perodo

    da coleta de dados. Conversamos nas escolas, nos intervalos, no almoo e no

    trajeto de uma escola para outra. Eu e a professora nos encontrvamos tambm

    durante as reunies do grupo de pesquisa, onde combinvamos alguns assuntos e

    tambm eu podia observ-la fora do contexto escolar. Alguns contatos tambm

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    foram realizados atravs de telefonemas e trocas de e-mails. Esse amplo contato

    gerou informaes complementares aos dados obtidos atravs das entrevistas e

    observaes. Portanto, foi um perodo de imerso intensa em relao ao campo e

    ao contato com o sujeito da pesquisa.

    Optei tambm por ouvir alunos e pessoas das equipes pedaggicas, no

    intuito de obter informaes de diferentes indivduos envolvidos no processo, o que

    se configurou como uma possibilidade de orientar minhas interpretaes e evitar

    concluses fundamentadas num nico ponto de vista.

    3.3.1 Observaes

    Como uma das tcnicas para conhecer a prtica pedaggico-musical da

    professora, optei pela observao. Essa tcnica, de acordo com Gil (1999), pode

    favorecer a percepo direta dos fatos, evitando o excesso de subjetividade no

    processo de investigao. A observao permite estar em contato direto com o

    fenmeno estudado, captar a perspectiva dos sujeitos, e descobrir aspectos novos

    no previstos antes da investigao (LUDKE e ANDR, 1986). Para a realizaodas observaes adotei certo grau de sistematizao, sendo determinados alguns

    pontos a serem observados. Ao mesmo tempo, no houve rigidez, mas uma

    abertura para seguir novos acontecimentos no antes planejados de acordo com

    sua relevncia para a investigao. A idia principal era estar atenta prtica

    pedaggica da professora ao ensinar msica, sua postura enquanto educadora,

    s manifestaes musicais da aula, e s relaes entre a professora e os alunos

    (ver roteiro no ANEXO 1).Foram realizadas observaes regulares e intensas durante o primeiro

    bimestre de aula do ano de 2008 (fevereiro, maro e abril), em sala de aula das

    duas turmas, abrangendo todas as aulas ministradas pela professora naquele

    perodo, para aquelas turmas (trs aulas semanais para cada turma), conforme a

    Tabela 1.

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    Tabela 1 Datas das observaes nas escolas.

    Escola 1:Data

    Dia da

    semanaNmero de aulas

    20/02/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    26/02/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    27/02/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    04/03/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    05/03/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    11/03/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    12/03/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.19/03/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    08/04/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    09/04/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    15/04/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    16/04/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    22/04/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    29/04/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    30/04/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    Total 15 visitas; 23 aulas.

    Escola 2:Data

    Dia da

    semanaNmero de aulas

    19/02/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    20/02/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    26/02/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    27/02/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    04/03/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    11/03/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    12/03/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.19/03/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    08/04/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    09/04/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    15/04/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    16/04/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    29/04/08 Tera-feira 1 aula = 45 minutos.

    30/04/08 Quarta-feira 2 aulas = 90 minutos.

    Total 14 visitas; 21 aulas.

    Algumas observaes tambm foram feitas em outros espaos do ambiente

    escolar em dias de aula de msica. O objetivo foi perceber a movimentao

    musical espontnea dos alunos na escola, fora da sala de aula, de forma

    complementar.

    3.3.2 Entrevistas

    Optei pelas entrevistas como tcnica de coleta de dados, pois, segundo Gil

    (1999), elas buscam captar o que as pessoas sabem, pensam, sentem e esperam,

    buscando obter dados aprofundados do comportamento humano. H uma

    interao entre entrevistador e entrevistado que possibilita a captao imediata ecorrente da informao desejada. Esta tcnica de coleta de dados favorece o

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    aprofundamento de pontos levantados por outras tcnicas de coleta de dados,

    alm de correes, esclarecimentos e adaptaes para clarear a obteno das

    informaes desejadas (LUDKE e ANDR, 1986; GIL, 1999).

    Foi adotada para esta pesquisa a entrevista semi-estruturada, para que no

    houvesse fuga do foco, sem limitar, porm, a possibilidade de surgirem novas

    questes importantes. Foram entrevistados: a professora (trs entrevistas) e trs

    pessoas das equipes pedaggicas (um diretor e um orientador de uma das

    escolas, e um supervisor educacional da outra escola). A identificao dessas trs

    pessoas nas citaes ser feita atravs do cdigo EP1, EP2 e EP3, no

    respectivamente. A identificao da professora investigada, nas citaes, ser pelopseudnimo adotado durante o trabalho que ser anunciado mais adiante.

    A Tabela 2 apresenta as datas das entrevistas realizadas e suas respectivas

    duraes.

    Tabela 2 Datas e duraes das entrevistas.

    Data Entrevistado Durao aproximada15/01/08 Professora 40 minutos11/03/08 Professora 50 minutos12/03/08 EP 2 20 minutos22/04/08 EP 1 10 minutos22/04/08 EP 3 10 minutos04/08/08 Professora 1 hora e 35 minutos

    3.3.3 Questionrio

    A utilizao de questionrios recomendada quando se pretende conhecer

    as opinies das pessoas envolvidas na pesquisa, com a vantagem de se abranger

    maior nmero de pessoas dentro de um espao de tempo limitado (GIL, 1999).

    Para esta pesquisa, optei pelo questionrio porque queria saber o ponto de vista

    dos alunos das turmas que eu estava observando considerando aspectos

    relevantes em relao prtica pedaggico-musical observada e relatada. Esses

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    dados representam uma contribuio importante para que se possa entender o

    processo de ensino de msica nas escolas onde atua a professora investigada.

    Foi realizado um questionrio com quase todos os alunos das turmas

    observadas, buscando atingir o maior nmero de respostas possvel, no para

    gerar estatsticas, mas para obter uma noo geral do que os alunos pensam sobre

    a aula de msica que recebem. A data da aplicao do questionrio foi 29 de abril

    de 2008. Do total de 60 alunos que pertenciam s turmas na poca da aplicao do

    questionrio, 55 estavam presentes no dia da aplicao, e 44 devolveram o

    questionrio respondido e autorizado pelos pais ou responsveis, representando

    73,3% dos alunos, o que considerei satisfatrio para ser utilizado como fonte dedados para esta pesquisa. As questes aplicadas aos alunos (ANEXO 2)

    envolveram tpicos relacionados ao seu envolvimento com a aula de msica, sua

    aceitao quanto ao repertrio e a metodologia utilizada pela professora, alm de

    questes sobre o que eles pensam sobre a msica ser uma das disciplinas

    escolares.

    Durante este trabalho, quando forem expostas falas das pessoas

    entrevistadas, falas retiradas das observaes e tambm as opinies dos alunos, otexto aparecer em itlico, alm do destaque padro dado s citaes literais.

    3.4 ETAPAS DA PESQUISA

    Aps delimitar o tema e escolher a professora com a qual gostaria de

    realizar a pesquisa, entrei em contato com a mesma pessoalmente, aproveitando

    a ocasio de uma reunio do grupo de pesquisa do qual fazemos parte para

    saber da sua disponibilidade e aceitao. Como a resposta foi positiva, tratei de

    conseguir a documentao necessria junto Secretaria de Educao para que a

    minha presena fosse autorizada nas escolas (ANEXO 3).

    A primeira entrevista com a professora foi realizada em 15 de janeiro de

    2008. Nessa entrevista conversamos sobre vrios assuntos, como por exemplo,

    sua formao inicial e cursos que fez, sobre o incio de sua profisso, sobre o seu

    ingresso na rede municipal, sobre o seu planejamento e sobre a previso de

    estagirios para o ano. O roteiro da primeira entrevista se encontra no ANEXO 4.

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    As aulas iniciaram antes do dia que eu havia sido avisada. Em conversa

    com a professora, por telefone, no dia 16 de fevereiro de 2008, data estabelecida

    para conversarmos sobre a questo do planejamento (roteiro no ANEXO 5), fiquei

    sabendo do fato e preparei-me para ir at a escola no prximo dia de aula das

    turmas previstas para observao. O critrio de escolha das turmas j que eram

    todas turmas de iniciantes na msica foi a possibilidade de observ-las no

    mesmo dia, aproveitando a viagem de carro, uma vez que a cada visita eu me

    deslocava 45 Km desde a minha casa at as escolas.

    No primeiro dia de visita, fui recebida em cada escola por seu diretor ou

    diretora, que j sabiam da minha vinda (atravs da professora) e me acolherammuito bem. Eles pediram a autorizao da Secretaria da Educao para a

    pesquisa. Eu entreguei uma cpia para cada um e solicitei-lhes que mais adiante

    respondessem entrevista. As visitas que se seguiram foram muito agradveis.

    Quando no estava assistindo s aulas, eu caminhava pelo ptio de cada escola

    para observar os alunos, perceber a presena da msica, entre outras coisas. Mas

    ficava a maior parte do tempo na sala dos professores.

    As observaes iniciaram dia 19 de fevereiro de 2008, na segunda semanade aula dos alunos (as aulas iniciaram na quinta feira da semana anterior 14 de

    fevereiro de 2008). Das turmas selecionadas para a pesquisa eu assisti a todas as

    aulas de msica do primeiro bimestre de 2008 (exceto a primeira aula da turma da

    manh). As aulas de msica dessas turmas eram nas teras-feiras e quartas-feiras,

    totalizando trs aulas de msica por semana para cada turma. Num dia eles tinham

    uma aula de 45 minutos apenas e no outro a aula era de 90 minutos (aula-faixa,

    como comum dizer nas escolas). Eu entrava na sala de aula junto com aprofessora e tomava lugar ao fundo para fazer minhas anotaes. Na primeira vez

    que entrei em cada turma fui apresentada aos alunos pela professora. Eu expliquei

    para eles o que estava fazendo ali e anunciei que logo iria precisar da participao

    deles para responder algumas questes.

    A segunda entrevista com a professora foi realizada aps 20 dias de

    observao, no dia 11 de maro de 2008. Nessa entrevista, perguntei sobre outros

    tpicos da sua formao inicial, sobre os primeiros anos de trabalho na rede

    municipal, sobre a questo da disciplina (comportamento) dos alunos, sobre a sua

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    postura como professora e sobre alguns aspectos observados nas aulas, dos quais

    eu quis saber um pouco mais (roteiro no ANEXO 6).

    As entrevistas com as pessoas das equipes pedaggicas foram feitas nas

    escolas, em horrios previamente marcados. As datas foram as seguintes: EP1

    22 de abril de 2008; EP2 12 de maro de 2008; EP3 22 de abril de 2008. As

    perguntas que foram feitas a essas pessoas tiveram o objetivo de saber a sua

    concepo sobre a disciplina de msica, os efeitos percebidos no cotidiano da

    escola e o seu depoimento sobre a atuao profissional da professora de msica

    (roteiro no ANEXO 7).

    Em relao aos questionrios, dias antes da aplicao oficial dos mesmos,foi realizado um piloto, com outra turma no investigada de uma das escolas. O

    objetivo desse piloto foi testar se as questes formuladas eram capazes de

    fornecer os dados necessrios para a pesquisa. As respostas fornecidas por esses

    alunos no contam como dados nesta pesquisa. Aps o piloto, algumas questes

    foram aperfeioadas. Os questionrios oficiais foram realizados em sala de aula no

    final do segundo ms de observao, no dia 29 de abril de 2008 (aula 19). A

    professora de msica cedeu um horrio de cada turma para que os alunospudessem responder as questes e assim eu pudesse garantir maior retorno de

    respostas. Os alunos demoraram em mdia 30 minutos para responder as

    questes todas. Eu estive presente durante a aplicao e pude tirar as dvidas dos

    alunos quanto ao preenchimento. Depois de pronto, eles levaram para casa o

    questionrio e a solicitao de autorizao aos pais. Os alunos foram orientados

    para chegar em casa e j mostrarem o documento para os pais e em seguida

    colocar novamente na pasta escolar, para trazer de volta no dia seguinte. Por contadessa ida para casa, alguns questionrios no voltaram. Cabe dizer que no dia da

    aplicao no estavam presentes todos os alunos de cada turma, o que gerou a

    diminuio do nmero de participantes. Aqueles que esqueceram de trazer o

    questionrio autorizado, puderam trazer nos dias seguintes. A professora de

    msica os recolheu e os entregou num outro dia para mim.

    Na turma da Escola 2, comearam a atuar duas estagirias num dos dias de

    aula de msica (tera-feira, aula de 45 minutos), a partir do dia 22 de abril. Como a

    turma era muito grande (36 alunos), e havia mais as auxiliares de ensino, a

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    professora e as duas estagirias, percebi que o espao no comportaria mais a

    minha presena. Como o foco no era observar o trabalho das estagirias, achei

    melhor no entrar mais na sala quando as estagirias estavam trabalhando. As

    observaes encerraram-se no dia 30 de abril de 2008, com a coleta dos

    questionrios respondidos pelos alunos.

    A terceira entrevista com a professora aconteceu no dia 04 de agosto de

    2008. Fiz perguntas sobre os planos de aulas e as anotaes feitas no final das

    aulas no dirio de classe, sobre alguns elementos vistos nas aulas cujos

    significados eu gostaria de saber, sobre a evoluo das turmas no perodo em que

    no fui mais observar, sobre os alunos com necessidades especiais, entre outrosassuntos (roteiro no ANEXO 8). Nessa conversa a professora revelou que havia

    mudanas nas turmas. Alguns fatos aconteceram que fizeram com que as turmas

    modificassem seu comportamento e, de acordo com a professora, os

    planejamentos das duas turmas variaram entre si. A partir dos elementos

    levantados nessa ltima entrevista, senti necessidade de voltar s escolas e

    observar mais cada turma para tentar captar de que forma essas mudanas

    apontadas pela professora estariam se manifestando e se esse fato poderia trazernovos elementos para a pesquisa. Essa observao aconteceu no dia 27 de agosto

    de 2008, mas eu no pude constatar grandes mudanas nas turmas nem na

    configurao das aulas de msica. Percebi, entretanto, que as turmas haviam

    avanado nos contedos, que j estavam tocando melodias de canes na flauta,

    que j sabiam algo sobre teoria musical e notao. Para uma percepo mais

    detalhada de mudanas talvez fossem necessrios mais dias de observao, o que

    no considerei necessrio nem conveniente naquela altura do andamento dapesquisa.

    A reviso de literatura e a busca pelo referencial terico ocorreram durante

    todo o processo (desde a escolha do tema at a redao da dissertao), conforme

    o cronograma mostrado na Tabela 3. Nesse cronograma tambm est exposto

    sinteticamente todo o processo relatado. O perodo total de realizao da pesquisa

    foi de 18 meses.

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    Tabela 3 Cronograma.

    3.5 ANLISE DOS DADOS

    Os dados foram organizados em categorias e analisados luz da literatura e

    do referencial desde o momento em que foram coletados e transcritos. Fiz o

    cruzamento das informaes obtidas pelos diferentes instrumentos de coleta dosdados, e realizei a anlise com base na anlise qualitativa de contedo (LAVILLE e

    DIONNE, 1999). Neste tipo de anlise so os dados que direcionam o ponto de

    vista terico e no o contrrio, que seria a prescrio de uma teoria para ser

    verificada.

    O processo e interpretao aqui fundamentalmente iterativo, pois opesquisador elabora pouco a pouco uma explicao lgica do fenmeno

    ou da situao estudados, examinando as unidades de sentido, as inter-relaes entre essas unidades e entre as categorias em que elas seencontram reunidas. (LAVILLE e DIONNE, 1999, p. 227)

    ANO/MS

    2007 2008 2009ETAPAS DA PESQUISA10 11 12 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 01 02 03

    Reviso de literatura ereferencial terico X X X X X X X X X X X X X X X X

    Apresentao do Projeto X

    Observaes X X X

    Questionrios X

    Entrevistas com aprofessora X X X

    Entrevistas com outraspessoas

    X X

    Organizao dos dados X X X X X X X X X X X

    Anlise dos dados X X X X X X X X X X X X

    Exame de Qualificao X

    Redao da dissertao X X X X X X X X X X

    Entrega para a banca X