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Carolina Linhares
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Carolina Linhares YY
Prazer,
PM
Trabalho de Conclusão de Curso da
Graduação em Comunicação Social
com Habilitação em Jornalismo
Escola de Comunicações e Artes
Universidade de São Paulo
2014
Carolina Linhares YY
Prazer,
PM
Reportagem: Carolina Linhares
Projeto gráfico e diagramação: Vinícius Giba
Revisão: Carolina Linhares
Orientação: Claudio Tognolli
Agradecimentos
Aos meus pais, pelo que sou e pelo que posso ser. Pelos mimos,
pela compreensão, pela honestidade, pelo compromisso, pelo
perfeccionismo, mas, principalmente, por embarcarem em todas
as minhas loucuras –a maior delas, ser jornalista;
A minha irmã, um grande orgulho e uma grande companheira;
À Nossa Senhora de Aparecida, que me livra dos perrengues;
Aos professores e jornalistas inesquecíveis, pela inspiração e
dedicação;
Ao orientador, Claudio Tognolli, por inisistir na riqueza das
orações subordinadas;
Ao Vinícius Giba, pelo projeto gráfico ousado e pelas madrugadas
a fio;
Aos policiais que me dedicaram seu tempo, sua atenção, sua
gentileza. Sem vocês, isto não se realizaria;
Aos meus familiares policiais, pela ideia e pela ajuda;
À USP e à ECA, por terem aberto a minha cabecinha. Vou sentir
muita saudade;
Ao Projeto Redigir, pelo carinho e por me ensinar que o esforço
vale a pena;
Aos incríveis colegas destes cinco anos de jornalismo, as pessoas
mais inteligentes que já conheci e com quem eu adoro conversar
–especialmente os jormats 10;
Às amigas com quem divido a mesma alma;
Às brothers, amigas de colégio ao bingo;
Ao Breno, pela agradável surpresa e pela paciência nesses tempos
de TCC;
Aos colegas de redação da Folha de São Paulo, pelo batismo
no jornalismo e por um estágio de muitas dúvidas, risadas e
aprendizagem;
E, finalmente, a todos que me incentivaram e me ajudaram no
longo caminho percorrido nesta graduação e na produção deste
livro. Por causa de vocês todos, creio que evoluí e aprendi um
tanto. Muitíssimo obrigada.
Estigma, 11
Paralelo, 12
Prazer, PM, 15
Novinho, 25
Memória, 55
Enxugando gelo, 73
Estereótipo, 105
Vingança, 129
Dentro da lei, 179
A mãe, 209
PM na mídia, 241
Bibliografia, 295
11
Estigma
Jornalista inventa, jornalista mente, só mostra o que quer mos-
trar, só fala de um lado da história, é pura manipulação, serve aos
interesses das grandes empresas, dos grandes partidos, vive de
jabá, quer mais é vender notícia violenta, notícia ruim, notícia ir-
relevante, nem precisa de diploma, é arrogante e prepotente, acha
que sabe um pouquinho de tudo, não sabe nada de nada, se mete
a contrariar especialista, viciado em café, cigarro, álcool, jornalis-
ta é um chato, um pedante, só quer fofocar, quer ver o circo pegar
fogo, gosta é de uma polêmica, jornalista emite opinião e fala que é
imparcial, é tudo comunista e ainda por cima escreve tudo errado.
*
Policial atira primeiro, pergunta depois, só aborda negro e
pobre, é tudo assassino, filhos da ditadura, chama golpe de re-
volução, prefere regime militar, é um repressor, o braço armado
do governo, dá medo, tem é que manter distância, policial é vio-
lento, vê a população como inimiga, criminaliza os movimentos
sociais, é morto de fome, não estudou, é ignorante, corrupto,
pede propina, não paga nada que compra, é um fortinho de ca-
belo raspado, um coxinha, é explorado e desconta a raiva nos ou-
tros, mal treinado, mal preparado, uma vergonha, reaça, invade
favela, vive de bico, gosta de ver sangue, gosta de dar porrada,
além de ser um pau mandado sem coração.
12
Paralelo
Depois de meter-se a ser jornalista (ou até antes para os mais
espertos), vem a amarga constatação de que se trata de uma pro-
fissão bastante problemática, estressante, desvalorizada, mal re-
munerada, cercada de estigmas, mas que é um ideal de vida.
Tive a oportunidade de ouvir mil vezes da boca de jornalis-
tas o que era o jornalismo. Dispensei as generalizações do senso
comum como aquilo que ele não é. Ou não deveria ser. Ou pelo
menos não é só isso.
Nunca, porém, ouvi de um policial o que era a polícia. Melhor:
como era ser policial. Contentei-me com o estigma.
Defini a polícia, ao longo da vida, através de duas narrativas: a
dos porta-vozes oficiais que representam a instituição Polícia Mi-
litar do Estado de São Paulo e a dos jornalistas que denunciam os
crimes daqueles que deveriam combater os criminosos.
Enquanto as vítimas da PM, mesmo sem o destaque que os
violentados pelo Estado requerem, tinham sua voz representada
pelos jornalistas, pelos ativistas, pelas redes sociais, os homens
fardados não falavam. Deixavam a corporação falar. E nunca fo-
ram, portanto, nada mais que uma farda.
Nesses tempos em que jornalistas e PMs se encontraram
mais do que nunca e se enfrentaram mais do que nunca, achei de
bom tom conhecê-los. E vi no meu último trabalho nesta gradua-
ção uma oportunidade para isso.
Resolvi perguntar a mulheres e homens de farda: afinal, o
que é ser PM?
Trata-se, veja só, de uma profissão bastante problemática, es-
tressante, desvalorizada, mal remunerada, cercada de estigmas,
mas que é um ideal de vida.
15
Prazer, PM
A Polícia Militar do Estado de São Paulo é responsável pelo
policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública.
Segundo a Constituição, é organizada como uma força auxiliar e
reserva do Exército Brasileiro. Está subordinada ao Governo do Esta-
do de São Paulo através da Secretaria Estadual de Segurança Pública.
O efetivo da PM em São Paulo é 88 mil homens (embora
o número fixado por lei seja de 93 mil), que trabalham em to-
dos os municípios do Estado.
Atualmente, o comandante-geral da PM é o coronel Be-
nedito Roberto Meira e o secretário de Segurança Pública é
Fernando Grella Vieira.
16
Já a Polícia Civil, também subordinada ao Estado de São Pau-
lo, funciona como polícia judiciária (é responsável, por exem-
plo, por encaminhar detidos pela PM à Justiça) e apura infra-
ções penais, exceto as militares.
Organização
O Comando-Geral é o órgão máximo da corporação --inclui
o Subcomandante, o Gabinete do Comandante-Geral, o Centro
de Inteligência e o Centro de Comunicação Social. Subordina-
do ao Subcomandante, está o Estado Maior, com suas seis se-
ções, e a Corregedoria.
Abaixo estão os chamados Grandes Comandos. São eles:
o Comando de Policiamento da Capital (CPC), o Comando de
Policiamento Metropolitano (CPM) e o Comando de Policia-
mento do Interior (CPI). Unidades especializadas de policia-
mento estão no mesmo nível.
Dentro dos Grandes Comandos, estão os Comandos de Po-
liciamento de Área (CPA), geralmente compostos por três ba-
talhões e, cada batalhão, é composto por três companhias.
Cada batalhão tem uma Companhia de Força Tática, que tem
armamento mais pesado e atua em ocorrências mais complexas,
regiões de mais criminalidade e controla distúrbios civis. A Ro-
cam é o policiamento da Força Tática feito em motos.
O Comando de Policiamento de Choque é responsável pelo
controle de distúrbios civis e operações especiais. O Choque
tem um regimento de Cavalaria e quatro batalhões –a Rota
(Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) é o 1º batalhão. O 2º ba-
talhão faz o policiamento em grandes eventos. O 3º batalhão
realiza controle de distúrbios civis e faz escoltas de presos de
17
alta periculosidade. O 4º batalhão é de Operações Especiais –a
1º companhia é o Coe (Comandos e Operações Especiais), a 2º companhia é o Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) e a 3º companhia é o Canil.
Gabinete do Comandante Geral
Comando
de Policiamento
do Interior:
tem 10 CPA
Comando do
Corpo de Bombeiros
Grupamento
Aéreo
Comando
de Policiamento
da Capital:
tem 8 CPA
Comando
de Policiamento
Metropolitano:
tem 4 CPA
Diretorias
Subcomandante
Comandante Geral
Comando de
Policiamento
Ambiental
Comando de
Policiamento
Rodoviário
Comando de
Policiamento
de Choque
Estado Maior Corregedoria
É a polícia da polícia, foi criada em
1948. Faz apuração de infrações penais
de militares da corporação e investiga
casos em que o policial militar é vítima.
18
Divisões (menor para maior)
Destacamento
Pelotão
Companhia (a área de policiamento da companhia coincide com a
área de um DP da Polícia Civil)
Batalhão
Comandos de Policiamento de Área
Grandes Comandos (Capital, Região Metropolitana, Interior)
Seções do Estado-Maior
A 1º Seção do Estado Maior, funciona como um RH: admi-
nistra as políticas de pessoal, os concursos, as contratações,
as transferências e o pagamento dos salários. A 2º Seção co-
leta e analisa dados de inteligência e funciona também como
polícia interna da corporação. Na 3º Seção é que são definidas
as estratégias de ensino e de operações –onde será o patrulha-
mento do policial operacional através da análise dos índices
criminais. Na 4º ficam os assuntos relativos à logística da PM,
como transporte, alimentação e fardamento. A 5º Seção é res-
ponsável por assuntos civis, cuidando das relações públicas e
da comunicação. Finalmente, à 6º Seção cabem os assuntos de
orçamento e gestão pela qualidade.
Há uma reprodução dessa estrutura, com exceção da 6º seção, nos Grandes Comandos, Comandos de Policiamento
de Área e Batalhões. São os chamados “Ps”. Nesses escalões,
portanto, existem as seções P1, P2, P3, P4 e P5, responsáveis
por cada uma dessas áreas em uma escala menor, enquanto as
Seções abrangem todo o Estado de São Paulo.
19
Hierarquia militar
PRAÇASFunção no policiamento
Aluno SoldadoAluno da Escola Superior
de Soldados por um ano
Soldado 2ª ClasseFormou-se e está em
estágio de um ano
Soldado 1ª ClassePatrulheiro
CaboPatrulheiro
3º Sargento
2º Sargento
1º Sargento
Comandante de Grupo de Patrulha –
Supervisor de Policiamento
Sub TenenteComandante de Grupo de Patrulha –
Supervisor de Policiamento
PRAÇAS ESPECIAIS
Aluno Oficial (cadete)Aluno da Academia do Barro Branco
por três anos
Aspirante a OficialFormou-se e está em estágio
de seis meses
OFICIAIS
2º Tenente
1º Tenente
Comandante de Força Patrulha –
Gerente de policiamento
CapitãoComandante de companhia ou
P1, P3 ou P5 de batalhão
MajorCoordenador Operacional ou
SubComandante de batalhão
20
Tenente-Coronel
Comandante de batalhão.
Coroneis escolhem entre os tenentes-
coroneis quais serão promovidos
Coronel
Comanda Comandos de Policiamento
de Área e Grandes Comandos.
Atualmente, há 60 coroneis.
Histórico1
Atendendo ao pedido do ministro da Justiça nomeado pela
Regência, o padre Diogo Antônio Feijó, para que as províncias
criassem forças de segurança vinculadas ao Estado, o Presi-
dente da Província de São Paulo, Brigadeiro Rafael Tobias de
Aguiar, estabelece o Corpo de Guardas Municipais Voluntá-
rios em 15 de dezembro de 1831.
Durante o Segundo Império, o órgão, que adotou o nome de
Corpo Policial Permanente, era responsável por funções mais
repressivas no policiamento na periferia da capital e em outras
cidades, enquanto outras guardas tinham função mais preventi-
va e urbana, fazendo o policiamento do centro da capital.
Na República Velha, a milícia é reorganizada e recebe novas de-
nominações, consolidando-se como Força Pública do Estado. Nes-
sa época, com a concentração do poder na esfera estadual, a força
funciona como braço armado do poder político do Estado de São
Paulo e se fortalece, tornando-se uma espécie de pequeno Exército.
1 Texto baseado em ARRUDA, Luiz Eduardo Pesce de. Polícia Militar: uma crônica.
21
A Força Pública atuou em conflitos tanto no período monárquico
como na primeira fase da República, tendo lutado, por exemplo, na
Guerra dos Farrapos, na Guerra do Paraguai e contra a Coluna Mi-
guel Costa-Prestes. Em 1926, com o afastamento da Força Pública
das áreas urbanas em função do combate à coluna, fez-se necessária
a criação da Guarda Civil para o policiamento da capital. A Guarda
Civil era auxiliar da Força Pública, mas sem caráter militar. À Guar-
da Civil, então, coube o policiamento de áreas urbanizadas e nobres
da capital, enquanto a Força Pública se concentrou no policiamento
da periferia e do interior e na realização de tarefas repressivas. Ainda
assim, a Guarda Civil também exercia tarefas repressivas por meio
da DR (Divisão de Reserva), base do atual policiamento de choque.
Em 1930, a centralização do poder com Getúlio Vargas esvazia
a esfera estadual, e o aparato bélico da Força Pública é desmante-
lado. Pela última vez, em 1932, a Força Pública funcionou como
Exército paulista, lutando na Revolução Constitucionalista, mas
vivendo momentos de incerteza após a derrota. Em 1940, a dita-
dura de Vargas, no esforço de enfraquecer o braço armado paulis-
ta, altera o nome de Força Pública para Força Policial.
Antes disso, em 1936, a lei federal 192 reorganizou as po-
lícias militares, atribuindo a elas funções policiais. No ano se-
guinte, a lei estadual 2905/37 também organiza a Força Pública
com um papel acima de tudo policial.
Em 1947 com a redemocratização, a Força Pública volta ao
seu nome original; mesmo ano em que a Guarda Civil se ex-
pande para o interior. Ainda assim, a partir daí, a Força Públi-
ca concentra-se em atividades de policiamento, com a primeira
companhia de radiopatrulha criada em 1948.
No golpe militar de 1964, a Força esteve em prontidão aguar-
dando a decisão de seu chefe, o governador do Estado, sobre se
22
São Paulo apoiaria o novo governo militar, o que aconteceu. Com
isso, a Força Pública e a Guarda Civil vivem interferências do go-
verno federal centralizador –o ensino das corporações foi reorga-
nizado e os comandantes-gerais vinham do Exército. A Força Pú-
blica foi então organizada segundo o decreto-lei nº 667 de 1969,
que regulamentou as polícias militares do Brasil.
Ao policiamento fardado coube enfrentar guerrilhas urbanas e,
para isso, em 1970, é criada a Rota. A repressão adotada às ativida-
des terroristas é igualmente utilizada contra criminosos comuns.
Buscava-se acabar com o crime pela força e, com a conivência do
governo militar, a violência foi respondida com mais violência,
criando-se um estado de guerra urbana não declarada, no qual con-
frontos armados e a morte de suspeitos eram frequentes.
O contexto favoreceu uma atuação violenta adotado por poli-
ciais, inclusive com a criação de esquadrões da morte. O desres-
peito aos direitos humanos rendeu críticas, e a Polícia Militar foi
tida como um órgão violento, imagem que persiste até hoje.
No fim da década de 1960, a Guarda Civil, com 15 mil ho-
mens, atuava na zona sul, oeste e partes do centro da capital e nas
principais cidades do interior. A Força Pública, com um efetivo
de 35 mil, agia nas zonas norte, leste, centro e em todo o interior.
Como as polícias tinham funções semelhantes –e na tentativa de
controlá-las e submetê-las à doutrina de segurança nacional vi-
gente– foram unidas na criação da Polícia Militar de São Paulo
através do decreto-lei 217 de 1970.
Com a redemocratização, policiais militares passaram a assumir
o posto de comandante-geral em vez de oficiais do Exército. A Polí-
cia Militar voltou-se ao serviço à comunidade, com o objetivo de dar
segurança ao cidadão e não mais ao Estado. Manifestações democrá-
ticas exigiam e exigem ainda hoje o policiamento comunitário.
23
A Constituição de 1988 trata da segurança publica no Capí-
tulo III, artigo 144: “A segurança pública, dever do Estado, direi-
to e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da
ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.”
O parágrafo 5º define que “às polícias militares cabem a polícia
ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bom-
beiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe
a execução de atividades de defesa civil.”
Em 1995, é criada a Ouvidoria das Polícias, regulamentada
com a lei nº 826/97, em 1997.
Nos anos 1990, o massacre do Carandiru e o caso Favela Na-
val revelaram uma polícia extremamente violenta e prejudica-
ram a imagem da corporação. A partir daí, a PM empenhou-se
de forma mais significativa no ensino de direitos humanos e no
policiamento comunitário.
Ao todo, 111 detentos foram mortos no Carandiru durante
operação da PM para conter uma rebelião em 1992. O julgamen-
to dos policiais só terminou em 2014 com 73 condenados. O co-
ronel Ubiratan Guimarães, responsável pela ação, foi condenado
a 632 anos de prisão em 2001, mas morreu em 2006, enquanto
o processo ainda corria em outras instâncias da Justiça.
O caso favela Naval foi revelado em 1997 pelo Jornal Nacional,
que exibiu imagens de policiais agredindo, extorquindo e até ati-
rando contra moradores do bairro de Diadema. Um deles foi mor-
to. O policial autor do homicídio foi condenado a 15 anos de prisão.
Atualmente, a PM adota o método Giraldi de tiros, recomen-
dado pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha, na tentativa
de diminuir o número de civis mortos em ocorrências.
25
Novinho
Você sabe qual a diferença
entre um Palio 2002 e 2003?
Oswaldo, tenente
Emergência aqui! Papa Mike (PM, policial militar)
baleado! Papa Mike baleado!
COPOM, QRX (aguarde) na rede aí, atento aí, a via-
tura está modulando.
Comando, estou tentando verificar aqui qual viatu-
ra, porém é new, está vindo só o prefixo do HT (rá-
dio transmissor).
*
Dá um QRX (aguarde) parceiro, modula com cal-
ma aí, qual é o QTH (local da ocorrência)?
Tô aqui ó... Tô aqui é...
Viatura
Comando
COPOM
COPOM
Viatura
26
COPOM, o comando pra informar é, encostando
aí, próximo a viatura aí DA025, QSL (a mensagem
foi recebida, foi entendida)?
Qual QTH (local da ocorrência), comando?
Pela rotatória aí, próximo à piscina.
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), as
viaturas vão apoiar o comando na rotatória próxi-
mo a piscina. Viatura alvejada, Mike (militar) bale-
ado no local.
Positivo, ô COPOM. É umas três viaturas, botar aí
no QTH (local da ocorrência). Deslocar com cautela,
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)?
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). As
viaturas vão ter cautela no deslocamento, vão en-
costar, vamos chegar no apoio lá do policial.
Me tira daqui, porra.
Ô, COPOM, por gentileza, aciona o resgate pro lo-
cal. Policial aqui ferido, positivo?
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida) co-
mando, tem o QSA (a intensidade do sinal) aí do
Mike (militar)? A UR (Unidade de Resgate) já está
sendo acionada.
*
Ô, COPOM, joga para os demais aí da rede, uma
moto amarela envolvida, QSL (a mensagem foi re-
cebida, foi entendida)?
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), aten-
ção a toda rede uma moto amarela. Moto amarela
apenas aí. Troca de tiro com a DA025. Mike (militar)
baleado. Todas as viaturas cautela na abordagem.
Comando
COPOM
Comando
COPOM
Comando
COPOM
Viatura
Comando
COPOM
Comando
COPOM
27
Comando tem o QTH (local da ocorrência) que se
evadiu essa moto?
*
COPOM, verifica aí qual é a situação do resgate, do
QTH (local da ocorrência).
Comando, já acionei. Tô fazendo 193 (telefone do
Corpo de Bombeiros) pra confirmar.
Verifica quanto tempo demora pra chegar até o
QTH (local da ocorrência).
Só um QRX (aguarde), já volto.
*
Comando, QAP (na escuta).
QAP (na escuta).
Positivo, teve um desabamento aí na marginal QSL
(a mensagem foi recebida, foi entendida)? Todas as
URs (Unidades de Resgate) estão empenhadas lá,
porém já fiz contato com o comando de área, estão
tentando deslocar uma viatura pro local.
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida),
COPOM positivo. Vou efetuar o socorro aqui do
Mike (militar), QSL (a mensagem foi recebida, foi
entendida)?
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), co-
mando. Qual PS (pronto-socorro)?
*
Comando, qual PS (pronto-socorro) aí vai fazer o
resgate?
*
Comando, comando, QAP (na escuta) do COPOM?
Deslocando aí com o Mike (militar).
Comando
COPOM
Comando
COPOM
COPOM
Comando
COPOM
Comando
COPOM
COPOM
COPOM
Comando
28
Qual PS (pronto-socorro), comando?
PS (pronto-socorro) do portão 2.
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). Vou
verificar uma viatura já dando início aos procedi-
mentos aí no portão 2, QSL (a mensagem foi rece-
bida, foi entendida)?
*
COPOM, 019 (viatura número 019) em acom-
panhamento a moto amarela, QSL (a mensagem
foi recebida, foi entendida)?
QTH (local da ocorrência), 19?
Ô, comando chegou pro senhor aí? 19 em acompa-
nhamento uma moto amarela. Cautela na aborda-
gem pode estar envolvido no QRU (alguma mensa-
gem, missão, ordem...) do Mike (militar).
*
COPOM, eu não copiei o último QTC (mensagem,
notícia), repita.
Chegou pra mim aí a 19 em acompanhamento a
uma moto amarela. Pode ser o QLO (local) aí do
Mike (militar), QSL (a mensagem foi recebida, foi
entendida)? Só não jogou o QTH (local da ocorrên-
cia). Não consigo mais contato.
Positivo.
*
COPOM, é a 014 (viatura número 014).
QAP (na escuta), 14.
Por gentileza uma pesquisa de emplacamento.
Prossiga.
Bravo (B), Lima (L), Lima (L), 0581.
COPOM
Comando
COPOM
Viatura 2
COPOM
COPOM
Comando
COPOM
Comando
Viatura 3
COPOM
Viatura 3
COPOM
Viatura 3
29
Ô comando, ô comando. Dá um apoio. O cidadão
aqui tentou reagir. COPOM.
Ô 19, 19 qual é o QRU (alguma mensagem, mis-
são, ordem...)?
Atenção a rede aí QRX (aguarde), troca de tiro.
Qual o QTH (local da ocorrência), 19?
Comando, copiou o QRI (transmissão) da 19 aí?
Possível troca de tiro aí com QRU (alguma mensa-
gem, missão, ordem...) da moto amarela.
Pelo PS (pronto-socorro) portão 2 estou indo no
apoio, QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)?
19, QTH (local da ocorrência) por gentileza. QTH
(local da ocorrência) aí pro apoio.
*
A vtr (viatura) do comando pra informar que junta-
mente com a 19 aí pelo QTH (local da ocorrência).
Positivo. Qual QTH (local da ocorrência) pra apoio,
comando?
*
COPOM, é o comando. Resgate aqui pro QTH (lo-
cal da ocorrência). É a rotatória aqui próxima ao
esqueleto.
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). A
UR (Unidade de Resgate) tinha acabado de chegar
no QTH (local da ocorrência) da viatura alvejada e
confirmou o óbito do outro Papa Mike (PM, poli-
cial militar), então ela já está direcionada pra esse
QTH (local da ocorrência) aí.
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida).
*
Viatura 2
COPOM
COPOM
COPOM
Comando
COPOM
Comando
COPOM
Comando
COPOM
Comando
30
COPOM, é o comando pra informar.
QAP (na escuta).
Positivo. É... durante a abordagem aí houve... o in-
divíduo reagiu aí à abordagem, fez menção de sa-
car uma arma, os policiais acabaram revidando,
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida)?
Como foi a situação aí do resgate pro QTH (local
da ocorrência)?
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida). O
resgate já está a caminho, positivo?
*
Comando, sem novidade aí com Papa Mike (PM)?
Positivo. Os policiais aí reagiram, graças a Deus
ninguém ferido.
QSL (a mensagem foi recebida, foi entendida), tem
a placa da moto aí? Verificar se é caráter geral.
COPOM, é Fox (F), Fox (F), Neutra (N), 2007.
Toda a ação, com duas ocorrências, leva cerca de nove minu-
tos. Isso porque trata-se de uma simulação dentro da área da Aca-
demia do Barro Branco. Na cidade de São Paulo, a distância entre
o QTH e o pronto-socorro não é a distância da rotatória da piscina
ao portão dois. O comando tampouco se desloca rapidamente en-
tre dois locais com trocas de tiro para dar apoio.
Ainda assim, a simulação é bem planejada. O aluno do cur-
so de formação de oficiais (que muitas vezes já é um policial
praça) entra em uma viatura e começa a circular pela acade-
mia sem saber de nada. Outros alunos estão posicionados em
seus lugares para representarem seus papeis. Na rotatória da
piscina, já está a viatura alvejada, com um policial desacorda-
Comando
COPOM
Comando
COPOM
COPOM
Comando
COPOM
Comando
31
do e outro, ferido e nervoso, que avisa da ocorrência, mas não
informa o local. Os “papas mike” baleados têm até ketchup na
farda. O aluno tem que se virar pra achar a viatura ali e, depois,
mostrando pleno domínio do código Q, usado internacional-
mente pelas forças armadas, informar sobre a ocorrência ao
COPOM, o centro de operações, que reúne no rádio as infor-
mações dos policiais em suas viaturas e das ligações ao 190. O
teatro é repetido de novo e de novo: uma vez para cada dupla
de alunos. Um é o tenente e o outro é seu motorista.
De propósito também é a demora da ambulância, obrigando
o aluno a decidir entre esperar ou socorrer o policial ferido. Para
causar mais estresse, dois outros alunos, representando soldados
que patrulhavam a pé perto da ocorrência, chegam ao local do ti-
roteio e ficam desesperados com a cena, pressionando o coman-
dante a fazer o resgate. O nervosismo dos alunos, transparente
nas mensagens de rádio, chega a deixar a situação engraçada.
Alguma viatura aí no QTH (local da ocorrência)?
Só pra jogar pro COPOM aí quantos indivíduos ba-
leados, se tem policial baleado...
COPOM, solicito apoio. Preciso de uma... um....
De um o quê, comando? Pelo amor de Deus, co-
mando!!!
Preciso de um... do apoio de uma...
Ele está desmaiado!!!! Está desmaiado...
Apoio de uma ambulância.
Não há um tempo limite pré-determinado para esperar
a ambulância, mas diante da demora por causa do “desaba-
mento na marginal”, espera-se que o comandante decida por
COPOM
Comando
Soldado
Comando
Soldado
Comando
32
socorrer ele mesmo o policial baleado, enquanto os soldados
tomam conta do policial desacordado. Em relação a civis, a
ordem é dar prioridade ao resgate por profissionais de saúde
porque um resgate mal feito pode custar a vida da vítima e a
carreira dos policiais que a socorreram.
No caminho do aluno ao “pronto-socorro do portão 2”, está
estrategicamente posicionada a viatura 19, com um casal de po-
liciais abordando um homem em uma moto amarela. A ideia é
que o comandante veja a viatura e perceba a abordagem da moto
para já saber o lugar aonde ir quando a mesma viatura disser que
o homem reagiu, já que esse local tampouco é informado pelo rá-
dio. Ali também, os alunos fazem graça.
COPOM, cidadão baleado aqui no local, COPOM.
Tentou reagir aqui. E não teve jeito, COPOM.
Os alunos dão risada. “Defina ‘não teve jeito’”, diz uma delas.
Quando o aluno chega junto à viatura, vê o corpo do suspeito
da moto amarela caído no local. Os policiais, nervosos, justificam
os tiros dizendo que o homem fez menção de sacar uma arma e,
com certeza, devia ser o “desgraçado” que baleou o outro policial.
Os alunos atores vão inclusive retirando as cápsulas de bala do lo-
cal enquanto explicam o que aconteceu.
É aqui o principal teste do futuro tenente. Mesmo depois de
todo o estresse da ocorrência anterior, com um policial ferido e
outro morto, ele tem que desconfiar daquela troca de tiros –foi
mesmo uma reação necessária ou pode ter sido uma execução? O
procedimento correto é separar os policiais para explicarem a ocor-
rência. Perguntar qual deles atirou. O local tem que ser preserva-
do. O tenente precisa verificar as cápsulas e a posição do corpo
Viatura
33
para ver se coincidem com o relato dos seus subordinados. Além
disso, deve recolher a arma do policial que atirou e do homem que
tentou reagir. A melhor parte da ocorrência é esta: o homem mor-
to não estava armado. Nem todos os alunos descobriram isso por-
que nem todos solicitaram a arma do suspeito aos policiais.
“É uma ocorrência de alto estresse. Teve uma troca de tiro.
Ninguém sabia onde, o policial não conseguia informar. Estava
todo mundo desesperado pra saber onde era o local. Quando ele
encontra o local, fica naquela né? Socorre, não socorrre, policial
baleado, o outro morto...”, explica o jovem tenente Andrade, ins-
trutor da turma e idealizador do exercício. Ele também participa
fazendo o papel do Copom. Vai acompanhando a viatura com seu
próprio carro: um Hyundai HB20 branco. Os alunos que já passa-
ram pelo teste ficam por ali, dedurando os outros.
— Olha lá, passou [para o pronto-socorro] olhando o retrovisor
nem viu a cor da moto [sendo abordada].
No fim, o tenente fala com cada aluno:
— Você viu a abordagem quando estava indo ao pronto-socorro?
— Tinha dois indivíduos sendo abordados. Eu lembro.
— Não, era só um.
— Era só um mesmo?
Os outros alunos tiram sarro: “Está vendo fantasma.” O te-
nente continua:
— A hora que você passou pela abordagem já havia lançado [no
rádio] que era uma moto amarela.
34
— Isso.
— Não passou nada pela sua cabeça?
— Era o capeta. O que provavelmente baleou o policial lá.
— E você não acha estranho o cara estar sendo abordado e depois
aparecer morto?
— Se ele reagiu...
— Com o quê?
— Com arma. Já aconteceu comigo. Eu fui abordar....
— Mas cadê a arma? Não tinha arma.
— A policial disse pra mim que ele fez menção de sacar arma.
— Então você precisava separar esses dois pra contar direito essa
história. E perguntar para o morto vendo o corpo dele. Você preci-
sa olhar se foi de baixo pra cima. Outra coisa: o local também fala.
Quem que atirou? Você não perguntou.
— Foi ela.
— Tá. Ela atirou da onde pra onde? Daqui pra lá. O que que você
precisa olhar? Se tem cápsulas pro outro lado. Tem que olhar a
arma dos dois. Perguntar quantos disparos deu. O fundamental
é separar os dois.
O sol da manhã já vai alto no céu enquanto os alunos repetem o
teatro das ocorrências. Seu dia começou horas antes com a revista
matinal no pátio da Academia de Polícia Militar do Barro Branco,
na avenida Água Fria, Tucuruvi, na zona norte. Bem ao lado do Co-
légio Objetivo, onde a Água Fria encontra a avenida Nova Cantarei-
ra, há uma ruazinha com um portal e uma cancela. É a entrada da
academia. Ali, por três anos, os alunos oficiais têm aulas teóricas e
práticas em um complexo que mais parece um clube –bastante ar-
borizado, com espaço para prática esportiva e simulações de ocor-
rência, além dos prédios com salas de aula e dormitórios.
35
A ruazinha continua no lado de dentro. Passando por um
ginásio, leva ao estacionamento em frente à entrada do prédio
principal. No saguão, ficam duas colunas no estilo greco-romano.
Uma indica “ala General Salgado”, e abaixo “hierarquia”. Na ou-
tra: “ala general Miguel Costa – disciplina”. Educação não está
escrito em lugar nenhum, mas não precisa. Ninguém passa por
um civil no corredor sem desejar bom dia. Ninguém passa por
um militar superior sem prestar continência.
O prédio e o rancho (o refeitório) estão dispostos formando um
retângulo, de maneira que, no centro, fica o amplo pátio para as ce-
rimônias e os desfiles. O teto de tijolos do rancho tem uma enorme
pintura com a bandeira do Brasil à esquerda, a bandeira de São Pau-
lo à direita, o logotipo da Polícia Militar ao centro e os dizeres de cabo
a rabo: “Escola de Comandantes”. Nas paredes de fora do rancho, há
uma sequência de placas com os nomes de todos os Estados brasilei-
ros seguindo a ordem da sua fundação e, quando há cerimônias, as
bandeiras de cada um deles também são penduradas ali. O chão do
pátio tem uma grande pintura azul com o símbolo do Barro Branco.
— Escola, sentido! – ordena um major.
Sete horas da manhã. A revista matinal começa. Todos far-
dados e em formação. Nessa cerimônia diária, os alunos cantam
as canções militares. Naquela sexta, foi a vez da Canção do Pa-
trulheiro. Para ajudar a memorizar, os alunos têm um hinário
com as letras de todas as canções. Depois, desfilam marchando
ao som da banda. Os alunos do terceiro ano é que vão à frente de
cada pelotão. Em certo momento, gritam todos:
— Barro! Branco!
36
As pernas se movimentam absolutamente juntas. O ritmo é mar-
cado pelos passos no chão. A exibição é tanto bonita quanto sur-
real. Um desfile de 7 de Setembro, mas diário. Só depois é que
os alunos são liberados para as aulas. E o tenente Andrade pode
começar sua instrução de procedimento operacional.
O tenente é responsável por um pelotão de 30 alunos do
terceiro ano. Seu braço direito é o aluno “mais antigo” –o que
está no topo da hierarquia entre policiais da mesma patente.
Como os alunos, na verdade, não podem ser comparados por
antiguidade por terem entrado juntos na academia, o aluno
mais antigo é aquele com maior nota.
Como uma espécie de comandante-chefe do grupo, o tenente
verifica se os alunos estão em ordem, passa os recados da acade-
mia e, principalmente, conta das suas experiências na rua para
criar familiaridade com a atividade de policiamento.
Mas o tenente Andrade não é um tenente como os outros. É
um tenente novinho. Aos 26, tem mais cara de Oswaldo do que
de tenente Andrade. Suas aulas têm de vídeos do Porta dos Fun-
dos sacaneando a abordagem policial violenta a causos de roubo
de bancos, passando por áudios verdadeiros de ocorrências. Pra-
ticamente recém formado na academia e no posto mais baixo do
oficialato, ele faz mais o tipo brother: é amigo dos alunos.
“O vídeo do Porta dos Fundos [“Dura”] não é pra ficar revolta-
do. É pra rir. É pra ficar revoltado que isso exista. Temos que usar
pra melhorar. É uma crítica. Se você nunca fez isso ou nunca pre-
senciou isso como civil ou policial, você tem que saber que existe.
E, se existe, vamos tentar evitar.”
Oswaldo é o filho mais velho de uma escadinha –os irmãos
têm 25 e 24. Ele tem ainda uma irmã mais velha, de 32 anos. Pro-
fessora de ioga, budista e vegetariana, mora na Alemanha. É filha
37
do primeiro relacionamento da mãe. O pai dela não quis se res-
ponsabilizar. Sumiu no mundo.
Já o pai de Oswaldo por pouco não vira padre. Sua mãe,
vó materna do tenente, largou o marido pra virar freira e to-
car um orfanato. Pela convivência próxima com religiosos, ele
quase seguiu o mesmo caminho, não fosse ter conhecido a
mãe de Oswaldo. Num fim de semana de folga do seminário,
voltou para o orfanato da mãe. “E aí quem tava lá lavando prato
que era funcionária da minha vó? Minha mãe”, conta Oswaldo.
O casamento, porém, acabou em 2010.
A atividade religiosa da avó garantiu bolsas para os netos e
para as crianças do orfanato em colégios particulares. “Graças
a Deus a gente conseguiu ter um ensino de qualidade. Foi pri-
mordial para nossa carreira.”
Oswaldo morou a vida toda na zona norte. Há cerca de um
ano, se mudou para a casa da namorada, que estuda Engenharia,
e diz que a convivência com os sogros é ótima. “Eu sou o intruso
na sociedade. Mas meu sogro foi militar também. Ele foi do Exér-
cito durante um tempo, sofreu um acidente numa instrução e per-
deu os movimentos de dois dedos. Ele ainda tem a coisa do militar
muito forte. Quando descobriu que eu era tenente, adorou.”
Criado também no orfanato da avó, Oswaldo era católico. Era.
Hoje não tem mais religião, apesar de manter a religiosidade.
“Acredito em Deus, acredito que tem alguma coisa que une todos
nós. Porque tudo é muito complexo, a natureza, a relação de to-
dos os animais, a gente... é uma coisa muito complexa pra existir
só por acaso. Acho que existe algo por trás. Agora como é chama-
do, como funciona e pra onde a gente vai, eu não sei.”
Crismado e ex-coroinha, sua prática religiosa ia além da
missa aos domingos. Participava de cursos e grupos de estu-
38
do. Aprofundando-se na parte histórica, na origem do catoli-
cismo, na origem das outras religiões e na relação de Jesus
com profetas das demais crenças, o tenente viu que os símbo-
los são os mesmos e concluiu que as religiões foram inventa-
das para obtenção de poder.
Além disso, ele já questionava a proibição da camisinha
e do aborto. A gota d’água, porém, foi a separação dos pais.
“Onde eu achava que mais ia ter apoio, foi onde menos teve:
dentro da igreja. Em vez de dar suporte pra família, começou
o zunzunzinho: ‘ah! eu sempre soube...’”
Defensor das liberdades individuais, além da legalização
do aborto, Oswaldo é a favor da legalização da maconha. “Do
ponto moral, filosófico, até que ponto o Estado pode impedir
alguém de usar algo?”, questiona.
“Em algumas sociedades não é proibido o álcool? Antigamente,
tinha sociedade que era proibido o café. Hoje eu estou aqui toman-
do um cafezinho. Se eu estivesse em outra sociedade, anos atrás,
eu estaria sendo preso. É tudo uma questão cultural.”
Fora que a legalização seria uma mão na roda para a polí-
cia, que gasta tempo, dinheiro e esforço prendendo traficantes só
para que sejam substituídos instantaneamente no que se tornou
um sistema quase empresarial e muito lucrativo.
A legalização da maconha, desde que feita com bastan-
te orientação sobre os riscos do consumo, ajudaria porque o
consumidor dessa droga mais leve, ao se aproximar do tráfico
para obtê-la, pode acabar comprando também cocaína e cra-
ck, explica Oswaldo.
“Uma vez eu prendi um menor no tráfico. Como tinha que
achar um responsável, fui até a casa dele numa favelinha aqui na
zona norte. Aí toquei lá, a mãe não estava. Só o irmão.”
39
— Puta! De novo? Meu irmão é foda.
Na viatura, o tenente aproveitou para conversar.
— Seu irmão já faz isso faz tempo?
— Ah, meu irmão é um perdido na vida. Olha, não vou poder de-
morar porque tô indo lá pro McDonald’s que eu trabalho agora.
— Você trabalha no Mc?
— Trabalho. Ganho R$ 800 por mês. Meu irmão tira isso por dia.
Na cabeça do jovem, a decisão: ganhar R$ 800 por dia ou por
mês? Aí Oswaldo separa os que têm cabeça fraca dos que, como
ele, tomam a decisão certa. “Eu tenho minha visão e eu não quero
isso para minha vida. Uma hora a casa do traficante vai cair, ele tá
fazendo uma coisa errada. É uma questão moral.”
Oswaldo não vê o criminoso como alguém obrigado a viver fora
da lei por não ter oportunidade dentro dela. É alguém que fez uma
escolha. No mundo, existem pessoas boas e más, ele diz. “Talvez eu
fosse muito inocente. Quando eu fui pra rua, eu vi um pouco mais
da maldade. Eu não tenho dó nenhuma de prender o cara. Ele fez
uma coisa errada, ele tem que pagar. Tem até aquela frase que as
pessoas criticam: antes ele do que eu. Mas é a pura verdade. Eu sou
um agente da lei, estou trabalhando, fui treinado durante quatro
anos pra fazer isso, pra me proteger, pra proteger terceiros. Agora
um ladrão? Se eu me defendi, a ocorrência é 100%.”
A opinião e o pensamento de Oswaldo sobre a polícia e a
atividade policial não divergem muito da posição adotada geral-
mente pelos homens fardados. É claro que, até por ser jovem e
ter sido formado numa polícia mais moderna e humanizada, ele
faz mais ressalvas e admite erros na corporação, mas não foge
40
de um caminho delimitado –mesmo quando defende a legaliza-
ção da maconha. É uma nova cara da velha polícia. Mas apenas
isso já é quase uma revolução.
Ele não foge à regra quando argumenta que a criminalidade
não é só problema da polícia ou da falta dela. “Compete a outros
fatores: educação, saneamento básico, emprego.”
Quando diz que a lei é muito branda. “A gente vive num Esta-
do impune. E isso acaba aumentando a violência policial. O poli-
cial vai dar uma de Superman e resolver do jeito dele.”
Quando critica o sistema carcerário. “Pra mim está falido.” De
fato, há um déficit de 220 mil vagas no sistema prisional. Enquan-
to a população cresceu 12% entre 2000 e 2010, a população car-
cerária cresceu 128%. Em 2013, cerca de 40,1% dos presos eram
provisórios, ou seja, nem tinham tido seu crime julgado ainda.
Para começar a consertar a situação, o governo federal teria que
investir R$ 11 bilhões só em criação de vagas, mas o investimento
desde 2010 foi de apenas R$ 3,6 bilhões. “O preso não é ressocia-
lizado, aprende coisa pior com quem já está lá. Também não é mo-
tivo de exemplo porque o cara que está na rua sabe que, se rodar,
vai ficar uns mesezinhos preso e logo volta.”
Quando defende a redução da maioridade penal –com ressal-
va de que, já que o sistema carcerário está falido, essa medida de
nada adiantaria. “Eu já abordei cara de 17 anos que tinha 11 pri-
sões. Ele falava que tinha um ano ainda de liberdade para conti-
nuar roubando –‘Depois eu sossego’. Falava isso na minha cara!
E o que você vai fazer?.”
Quando prefere as policias civil e militar unificadas –“com as
informações compartilhadas”– ou então separadas, mas com o
ciclo de atuação completo –“deixa a Polícia Civil livre pra investi-
gação e a PM encaminha os detidos para a prisão.”
41
Quando alfineta os jornalistas. Oswaldo, porém, não genera-
liza. “Tem pessoas que são mais tendenciosas a um ponto e tem
pessoas que são mais tendenciosas ao outro lado. É difícil passar
informação sem exprimir opinião.”
Quando reclama que o salário não compensa o risco. Um
tenente recebe R$ 6 mil brutos por mês. São descontados cerca
de R$ 2 mil. Aos 26 e sem filhos, Oswaldo acha um valor até
que bom. “Talvez não pelo risco que eu corro. Posso subir numa
favela e tomar um tiro, posso estar atrás de um carro roubado
e tomar um tiro. Eu nunca disparei, mas já dispararam contra
mim. Na hora, você fica na dúvida: vou reagir ou não vou? De-
pois, você fica pensando: podia ter morrido.”
Se um policial morre, a família pode receber até R$ 200 mil
de indenização –em 2013, o Estado dobrou o valor que antes che-
gava no máximo a R$ 100 mil. Claro que não é tão fácil. O Estado
pode demorar a liberar o seguro. Precisando pagar as contas, as
famílias passam necessidade. Quem salva, em geral, é a vaquinha
do pelotão. Um acidente na viatura, também é o PM que paga. O
policial vê um carro roubado, mas, antes de começar a persegui-
-lo, tem que parar e pensar: se eu bater a viatura, tenho dinheiro
pra pagar? “É complicado.”
“É complicado” define muita coisa na polícia. É a frase prefe-
rida de Oswaldo. Às vezes, vem acompanhada de uma risada, que
toma conta do rosto fino –sempre em evidência diante da falta de
cabelo, que é raspadinho bem rente, no estilo militar.
Há menos de dez anos, ele ficava de saco cheio com essa história
de farda bem passada, barba impecável, cabelo raspado. Já foi critica-
do pela falta de cuidado com esses itens essenciais quando era ainda
o aluno-oficial Oswaldo Andrade, que passava pelos corredores do
Barro Branco batendo continência pra todo mundo. Hoje é ele quem
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recebe continência dos alunos e anota as fardas encurrunhadas sem
pudor algum. Tudo por causa da teoria das janelas quebradas.
A lógica é a seguinte: um prédio abandonado está em perfeito
estado até que tem suas janelas quebradas. Esse descuido é inter-
pretado como descaso e as pessoas se sentem, então, livres para
cometerem pequenos crimes ali, como jogar lixo irregular, por
exemplo. É por isso que num bairro largado pelo Estado, sem ilu-
minação, sem saneamento, sem estrutura, os pequenos crimes se
proliferam, alimentando uma bola de neve. Num bairro de classe
alta, por exemplo, um pequeno crime já não passa despercebido.
Ora, no quartel a mesma coisa. Oswaldo diz que nenhum
amassado no uniforme pode passar incólume ou ele estaria ali-
mentando a bola de neve. “Eu vou criar 30 caras do meu pelotão
que vão estar nem aí. Não tá nem aí pra farda, não tá nem aí pra
tal coisa.... São vários ‘tá nem aí’ pequenos que talvez reflitam
num ‘tá nem aí’ médio. Vários ‘tá nem aí’ médios, geram um gra-
ve.” Ou seja: não deixe as janelas serem quebradas. A corporação
se preocupa primordialmente com isso. O próprio Regulamento
Disciplinar da Polícia Militar não define procedimentos no po-
liciamento, mas trata majoritariamente dos valores defendidos
pela corporação, das normas de conduta, da ética militar, das fal-
tas disciplinares e suas punições.
No Barro Branco, a função de Oswaldo é justamente conduzir
aqueles alunos e lhes relatar suas experiências como se fosse mesmo
um paizão, ele brinca. Além de anotar esses desvios do “tá nem aí”,
ele entrevista os alunos a cada bimestre, avaliando onde podem me-
lhorar e também, claro, onde a academia pode evoluir. “Se eu con-
seguir incutir um pouquinho em cada um o que eu penso e o que
a sociedade espera da policia, eles vão ensinar sargentos, soldados e
cabos, que vão transmitir isso pra população. É disso que eu gosto.”
43
Na rua, o trabalho do tenente é o mesmo: instruir. Mas, em
vez de alunos, são os praças o foco dos ensinamentos. Com um
ano de curso, o praça é formado para ser um executor. Assim
como os oficiais, tem aula de polícia comunitária, direitos hu-
manos, comunicação social, direito, mas não na mesma carga
que no Barro Branco. O soldado de São Paulo, cuja formação
é referência no Brasil, tem 1.516 horas de instrução. O oficial,
que também deve dominar a parte administrativa, além de aná-
lise criminal e desenvolvimento de planos de policiamento, tem
5.465 horas. Recentemente, o tempo de curso foi reduzido de
quatro para três anos. Os alunos oficiais recebem um salário
inicial de R$ 2.663,50. Em todo o Estado, são cerca de dois mil
soldados e 200 oficiais formados por ano.
Uma evolução da PM nesse quesito é a implantação de uma
formação mais humanitária, sem humilhação, castigos e des-
respeito aos direitos humanos no intuito de que o policial, ao
ser respeitado, respeite também o cidadão quando for para a
rua. “Isso é perceptível. Aqui dentro todo mundo fala. O treina-
mento de acordar de madrugada, soltar bomba, correr e vir aqui
ficar sem comer já não existe. São coisas que já não tem. São
diferenças de longos anos e de poucos anos. Os que entraram
agora já não tiveram o que eu tive em 2006.” Os alunos tam-
bém não ficam mais presos na academia sem direito à defesa.
Quando recebe uma punição, o aluno agora pode recorrer.
“As coisas estão evoluindo. Aos passos de tartaruga, como a
sociedade. Dá dois passos, volta um, dá dois, volta um. A PM
também é assim. Eu estou instruindo meu pelotão talvez de uma
forma que eu não fui instruído. Se dois, três, quatro ou cinco ca-
ras pensarem assim, eles vão instruir daqui a cinco ou dez anos
outros oficiais. Então vai mudando.”
44
Um dos desafios do tenente é desmistificar os direitos hu-
manos para sua tropa. “A população acha que direitos humanos
é só pra proteger bandido. A tropa tem um certo preconceito de
achar que é o ‘direito dos manos’. Mas eles existem para prote-
ger quem não é amparado pela sociedade, até os policiais po-
dem ser protegidos pelos direitos humanos”, explica Oswaldo. E
explica de novo. E de novo. E vai falando com o pelotão. Falando,
orientando, instruindo, carregando cada soldado pela mão. Até
melhorar a qualidade do policiamento.
Quando saiu do Barro Branco, Oswaldo trabalhou por dois
anos como comandante de força patrulha no 9º batalhão. Era o
oficial responsável por fiscalizar as patrulhas de policiamento,
ou seja, as viaturas que atendem o 190, de toda a área do ba-
talhão: Vila Guilherme, Santana, Casa Verde e Limão. É uma
região especial por ter zonas de favelas e bairros de classe alta,
além de abrigar o Anhembi com seus eventos –o pobre Oswaldo
trabalha em todos os desfiles de Carnaval.
“Lidar com bandido é a minoria dos casos. A gente não pren-
de gente todo dia. O maior número de atendimentos é o chamado
Charlie 4, que é a nossa desinteligência. Todo dia, todo horário
tem desinteligência. É aquele pessoal que briga, se envolve em
algum tipo de atrito e liga 190.”
Mas erram os que pensam que policiar é fácil. Um carro foi
roubado. Um Palio prata, ano 2002, duas portas. “Você sabe
qual a diferença entre um Palio 2002 e 2003? Eu também não
sabia, tive que aprender. Fui perguntando para os policiais,
vendo no Google...”
É complicado.
Oswaldo revela ainda um personagem da patrulha de todo dia:
o policial mais ou menos. O policial mais ou menos é herói? Não.
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É assassino? Não. Tampouco é corrupto. O policial mais ou menos
é só mais ou menos. Feijão com arroz. “Um carro foi roubado? Be-
leza, eu vou continuar indo pra lá pra atender minha ocorrência.
Ou: um carro foi roubado? Eu vou atender minha ocorrência, mas
vou prestando atenção nos carros. Pra gente, internamente, é o que
diferencia um policial mais ou menos de um policial bom.”
As ocorrências ficam mais graves no patrulhamento de For-
ça Tática, da qual Oswaldo também participou por dois anos. São
doze horas de patrulhamento em Blazer ou Hilux, com três ho-
mens na viatura e armamento mais potente.
A pior ocorrência da sua vida foi um estupro. De uma criança.
Que ainda chorava quando a viatura chegou. Acabara de aconte-
cer. Um parente que costumava tomar conta do menininho um
dia foi pego no flagra e fugiu. Mas a PM o encontrou. “Na hora
aquilo foi crescendo e parecia que tinha sido um parente meu. Fi-
quei com raiva, com raiva. Quando a gente pegou ele, queria ex-
travasar a raiva, mas tem que ser muito consciente. Respira, conta
até dez, algema, põe na viatura e leva.”
Outra ocorrência que muda o semblante de Oswaldo quando
vem à memória é um acidente que poderia ter acontecido com
qualquer um: uma moto avançou no sinal amarelo e bateu na sua
viatura. O condutor foi arremessado para um lado, o garupa para
o outro. A viatura rodou, o vidro estilhaçou. Veio a ambulância e
constatou que o motoqueiro tinha morrido. Sua mulher sobrevi-
veu. “Foi triste na hora ela gritando, e a gente já sabia que ele es-
tava morto. E meu motorista também estava super abalado. Foi
complicado. Eu lembro até hoje. Você fica pensando um monte
de coisa: será que não daria pra evitar?.”
“Não era um ladrão, não era uma pessoa que estava procuran-
do. Eu já cheguei em diversos tiroteios que o ladrão acabou mor-
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to. Mas é diferente, por mais que envolva morte, a gente chega lá
e vê que a pessoa procurou aquela situação. Eu tenho muito mais
sensibilidade quando é uma vitima.”
É complicado.
Em 2013 e 2014, Oswaldo viveu situações talvez ainda mais
complicadas na PM: foi escalado para participar das manifesta-
ções do Movimento Passe Livre e anti-Copa. É especialmente difí-
cil, diz o tenente, balizar os direitos das pessoas: o direito à mani-
festação e o direito de ir e vir. Além disso, tem os policiais –casos
pontuais, enfatiza– que são estourados e acabam agredindo ma-
nifestantes e jornalistas. Para uma corporação jovem, 183 anos
diante de um país de 514, Oswaldo crê que a PM aprendeu muito
com os protestos em massa.
“Houve excessos de ambos os lados. A gente tem que ficar
ouvindo e vendo coisas que são ilegais. Mas tudo bem, estou lá
para defender o direito da pessoa de protestar. Agora, quando
a pessoa já vai com a intenção de depredar e entrar em con-
fronto, não tem o que fazer. A tropa de manifestação trabalha
do meio-dia até a noite. Às vezes, trabalha doze horas. Você
já vai estafado, né? Aí o cara tá lá fumando um baseado e me
chamando de coxinha filha da puta porque eu não estudei e vi-
rei polícia. É fácil aguentar isso aí? Não é fácil... Eles não estão
ali pra protestar. Você acha que quebrando banco, queimando
lixeira, alguém está protestando alguma coisa? Pra mim, isso
não leva a lugar nenhum. O dono do banco tá rindo da cara
dele. Tudo tem seguro. E o governo está maravilhado. Porque
coloca a população contra a polícia e fica fora de foco. A maio-
ria das manifestações qual foi o resultado? Quebra-quebra e
confronto. Então fica polícia versus manifestantes e todo mun-
do esquece a real intenção da manifestação.”
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O problema do quebra-quebra é que sobra pra todo mundo. Essa
ação indiscriminada da polícia também é alvo de críticas, mesmo
fora de situação de manifestação. O contrário também é deplorável:
quando a polícia se concentra em abordar negros e pobres. Oswaldo
justifica que é necessário abordar qualquer suspeito. Qualquer.
“Um palio branco é roubado. Eu vejo um palio branco e abordo.
Mando todo mundo descer. A pessoa já desce achando um absurdo:
— Mas eu não fiz nada!
Calma, mano. Eu não sei. Eu não sei! Não está escrito na sua
testa. Até a gente conseguir ver quem é quem, tem que levantar a
mão. Deixa eu ver se está armado, se não está...”
A polícia, muitas vezes, é respeitada por medo, lamenta o te-
nente e diz que o temor vem da ditadura. “É engraçado falar por-
que eu não vivi a ditadura, meus pais viveram. A minha geração
de policial é diferente dos coronéis que viveram a ditadura. O en-
sinamento que eles tiveram é diferente do que a gente teve e do
que a gente está dando agora.”
Ainda assim, a visão da sociedade sobre a polícia é ruim –
uma polícia truculenta e repressiva, o braço armado do gover-
no. Sem contar que a polícia sempre é chamada nas situações
de erro, de crime, de sangue e de história triste. Tudo isso cria
uma visão da corporação.
“É difícil, né? Ser policial. A gente trabalha com cercea-
mento de liberdade, restringindo os direitos da pessoa. Todo
mundo que está errado, não admite que está errado, não gosta.
A pessoa para o carro no lugar errado, aí você vai autuar, ‘é só
um minutinho’. Ou seja, pra ela pode abrir uma exceção. Mas
quando ela está vendo alguém fazendo alguma coisa errada, aí
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tem que tomar a atitude correta. A gente vive numa sociedade
um pouco hipócrita.”
Oswaldo garante que a ditadura não é assunto de aulas nem
de conversa de corredor na academia. Não é tema de velhos co-
ronéis saudosos. Até porque muitos instrutores nem viveram
direito o regime militar. Eram muito jovens. O comandante da
academia, por exemplo, tem uns 50 anos. O tenente, por sua
vez, acha que não é certo viver num governo que restringe seus
direitos, mas, ao mesmo tempo, critica o sistema atual. “A nossa
democracia talvez não seja uma ditadura fantasiada? Realmen-
te todo mundo tem direito à educação, à saúde? Até que ponto
a gente melhorou?” Novamente, sem ser diferente dos demais
homens fardados, ele diz gostar do militarismo pelos valores es-
senciais na formação de um indivíduo.
“O pessoal fala que no militarismo vamos aprender a com-
bater um inimigo, como o militar das forças armadas. Então o
policial vai ver a sociedade como inimiga. A gente não tem ne-
nhum tipo de treinamento aqui em que a gente veja a sociedade
como inimiga. É diferente. Acho que isso está mudando cada
vez mais. O que a gente consegue utilizar que é muito bom no
militarismo é a ordem, a hierarquia, a disciplina. É o cara saber
que ele tem que acordar 6h, ele tem aula 7h30, não pode atrasar,
ele tem que vim aqui, cantar o hino nacional. Acho isso essen-
cial para a nossa função. Se você vai cuidar da sociedade, você
tem que pelo menos tentar ser o exemplo.”
Alguns policiais estão bem longe de ser o exemplo. O tenen-
te diz que essas pessoas “más” vêm da sociedade má e que suas
ações acabam encobrindo as boas práticas da PM. E ele concorda
que os desvios tenham mesmo que chamar atenção. Oswaldo de-
fende ainda a justiça militar, que diz ser mais eficaz. No boletim-
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-geral publicado todos os dias na intranet, ele vê a lista de poli-
ciais expulsos da corporação por diversos motivos. “Com certeza,
posso falar que a PM tem muito mais homem bom e muito mais
coisa boa. Porém, acho que acabam tomando maior proporção as
coisas negativas. Acho que todo lugar é assim.”
Sobre a fama de violência e as comparações com o Exérci-
to, o tenente explica que a PM adota o método Giraldi de tiros,
baseado no “double tap”: são dois tiros com o objetivo de fazer
o agressor parar. Caso ele continue, mais dois tiros. Além dis-
so, a munição da polícia, ponto 40, tem “alto poder de parada”.
Ou seja, vai parar no agressor, e não passar por ele. No Exército,
onde um tiro de preferência tem que matar logo uns três, a mu-
nição é transfixante –ultrapassa o corpo atingido.
E quem cobra da polícia que o tiro acerte braço ou perna não
sabe o que diz. É impossível, explica Oswaldo, ter essa mira espe-
cífica. Só para os atiradores de elite que, em geral, não estão cor-
rendo ou dentro de um carro em movimento.
Na academia, os alunos também treinam tiro ao alvo. O som
do disparo é de doer os tímpanos. Muito mais alto que nos fil-
mes de ação. Enquanto a turma de Oswaldo se virava na ocor-
rência do “papa mike” baleado, outra turma fazia, em duplas,
uma sequência de exercícios conjuntos. Era como uma gincana:
tinham que terminar as estações no menor tempo possível. Já
saem da viatura correndo, levando uma arma de cano longo. O
primeiro desafio era conter uma pessoa alterada (por drogas ou
problemas psicológicos). A capacidade de luta corporal é avalia-
da. Depois, eles arrastam de um cone a outro um boneco de 80
quilos que representa um PM a ser socorrido. É a vez de pular
um muro –um policial tem que fazer pezinho para o outro e
depois conseguir pular sozinho. Testam o equilíbrio em uma
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trave paralela e desviam de obstáculos. Pulam um muro menor
no impulso. Uma corrida entre cones, transporte de um pneu,
um rolamento e voilà! Não acabou. A última estação é a de tiro.
Uma série de tiros ao alvo e, agora sim, podem descansar.
De segunda à quinta, as aulas vão das 7h às 17h30. Na sexta
acaba mais cedo, às 13h. A alegria dá para ouvir: dos dormitórios,
os alunos cantam música sertaneja. É sexta-feira. Vão voltar para
suas casas. Os alunos do primeiro e segundo ano passam a sema-
na na academia. Apenas o terceiro ano não é interno.
Antes disso, porém, os alunos têm que ouvir os últimos reca-
dos do tenente Andrade. Meio dia e meia, ele reúne os alunos em
formação: um atrás do outro, em fila.
— Primeira Companhia, sentido!
O pelotão bate continência.
— Companhia, dispensar!
Os alunos se posicionam com as pernas abertas e os braços
cruzados para trás.
— Companhia, à vontade.
As vozes vão se levantando, instala-se o burburinho. Os soldados
conversam entre si sem precisar manter a postura. Fica até difícil
para o tenente recuperar a palavra. Alguns soltam um “shiiiiiu”.
— Atenção, companhia!
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Oswaldo avisa que houve palavras cantadas de forma erra-
da na Canção do Expedicionário e que os alunos vão ter que
treiná-la na próxima semana. Avisa aos que vão viajar para o
interior fardados que a recomendação é usar também o colete
a prova de balas devido a informações via P2 (o serviço de in-
teligência da polícia) de atividades e movimentação do PCC.
Os aniversariantes do mês são chamados um a um para rece-
berem um cartão e uma salva de palmas. Um aluno dá ainda
um recado relacionado ao serviço administrativo que os alunos
cumprem dentro do Barro Branco: a luz da fachada tem que
ficar acesa durante a noite por ordem do coronel.
A cada recado, uma reação de comentários e gritos de piada
por parte dos alunos. No nível de zoeira, parece uma sala de
ensino médio. Ainda mais depois da intimidade de três anos
juntos. A maior sacaneada, contudo, vem de Oswaldo. Duran-
te o dia, chega a suas mãos o VR de um aluno, ainda no enve-
lope e com a senha anotada, que fora achado e devolvido por
um funcionário da limpeza.
— Quem foi aí que perdeu um cartão de alimentação?
— Ummmmm – reage o pelotão.
— Vamos abrir aqui pra ver quem é....
— Ihhhhhhh!
— Diego...
— Ihhhhh!
— Martins...
— Uhhhhh!
— Franco!
— Aeeeeeeeee! – todos batem palma.
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Diego Martins Franco nunca mais vai esquecer nada. E o te-
nente sugere ao aluno que compre uma cesta básica para recom-
pensar a honestidade do tio da limpeza.
Ainda para o fim de semana, Oswaldo pede moderação na bi-
rita. “Agora, os senhores são exemplo.”
No pátio, soa uma corneta. O pelotão grita e faz barulho.
— Pessoal, então vou liberar vocês, não vou segurar mais não.
— Paraniiiiiiinfo! –vários deles gritam, indicando o apreço pelo
tenente que chega a ser mais novo que muitos ali.
Oswaldo libera oficialmente seu pelotão. Mais gritos de eufo-
ria. Fim de semana.
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Memória
A pessoa tem o maior medo de reagir com bandido,
mas com o policial ela reage, ela não aceita.
Laercio, sargento
Desde o fenômeno das manifestações de rua massivas em
junho, as marchas para as mais diversas causas se multiplica-
ram. Muitas vezes, são palco de conflitos com a polícia. Sem-
pre, portanto, são lotadas de policiais. Quase sempre, eles tam-
bém são alvo do protesto.
No Quarto Grande Ato contra a Copa não foi diferente. Os
cantos contra o mundial se igualavam em quantidade e impor-
tância aos gritos contra a Polícia Militar. “Não acabou. Tem que
acabar. Eu quero o fim da Polícia Militar.”
Aquelas palavras, à repetição exaustiva, podiam perder o sig-
nificado para aqueles que as entoavam. Para os policiais, eram
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uma provocação. Impossível medir, porém, a importância que da-
vam àquilo. Impossível saber quanto a provocação influenciava o
comportamento de cada um dos homens e mulheres fardados.
Pode ser que os cantos fossem tomados como uma gran-
de bobagem. Algo a ser ignorado. Ainda assim, um daqueles
cantos era especialmente sensível. “Que vergonha, que vergo-
nha deve ser. Reprimir trabalhador pra ter o que comer.”
Laercio acha que os gritos contra a polícia são falta de cultu-
ra. Coisa de vandalismo. Ele diz que as pessoas não entendem
que a polícia não está ali porque quer, mas porque está fazendo
a função que lhe cabe. “É um protesto insignificante porque a
polícia sempre vai existir, faz parte da humanidade.” Pior: aque-
les que gritam contra a PM, quando precisarem, vão recorrer a
ela. “Existe um ditado que diz que na hora do perigo, a pessoa
pensa em Deus e na polícia. Passou o perigo, esquece Deus e
amaldiçoa a polícia”, diz Laercio. A mesma frase foi dita recen-
temente pelo ex-capitão da Rota, Conte Lopes, em entrevista à
TV Folha. Sobre o senso-comum de que o polícia só é polícia
porque não estudou, Laercio diz que é um preconceito.
Sem curso superior, ele estudou em escola pública. O pai
o bancou até o fim do colégio. Depois, como seus irmãos mais
velhos, teve que se virar. O caminho mais seguro, indicado pelo
próprio pai, era o serviço público. Os três se aposentaram poli-
ciais. “Ninguém fica rico, mas é uma gotinha que não para de
pingar.” Na época, Laercio prestou concurso para Sabesp, Cor-
reios, PM –que foi o primeiro a sair. Entrando aleatoriamente
aos 21 anos, logo se viu no lugar certo. “Pelo dinamismo, adre-
nalina, coleguismo. Fiz muitos amigos.”
A aparência cansada contradiz a voz calma que supõe uma
vida tranquila. Pelo visto, a vida de um PM é sempre um tanto
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mais difícil do que imaginamos. Como tantos outros, Laercio fez
operação na favela, trocou tiro, salvou reféns, perdeu colegas e vi-
veu de bicos. Como tantos outros, Laercio se sente desvalorizado.
“Existe uma rejeição da sociedade. A gente sente isso.”
Diante desse repúdio, Laercio, que foi promovido a sargen-
to ao se aposentar em 2012 após 30 anos de carreira, guar-
da como bom exemplo aquele que tentou valorizar o policial.
Coronel Camilo, comandante-geral entre 2009 e 2012, atual-
mente vereador, mudou o nome dos cursos da PM, colocando
a palavra “superior” em todos eles. A Escola de Soldados ago-
ra é Curso Superior de Polícia, o que, para Laercio, tira a ideia
do “bem-feito, quem mandou não estudar.” Camilo ia pesso-
almente às companhias e batalhões falar com a tropa, incenti-
vando o policial. Antes, Laercio conta que o comandante-geral
era um deus: soldados nunca o viam.
Para os não policiais de São Paulo, porém, a gestão de Ca-
milo foi bastante contestada. Sua saída, em abril de 2012, ocor-
reu pouco após a operação de reintegração de posse do Pinhei-
rinho, em São José dos Campos, em janeiro de 2012. Cerca de
1.700 famílias ocupavam o terreno.
Na época, o Conselho Estadual de Direitos da Pessoa Humana
fez um relatório com base em 634 depoimentos no qual os poli-
ciais foram acusados de abuso de autoridade, agressão e estupro.
O Conselho recebeu 1.876 denúncias de violações de direitos hu-
manos, incluindo 260 denúncias de ameaças e humilhações, 166
denúncias de agressão física, 71 casas saqueadas e 54 denúncias
de falta de assistência. O relatório aponta ainda que a morte do
morador Ivo Teles da Silva tem relação com a violência policial.
A Promotoria de Justiça de São José dos Campos apresentou
uma denúncia contra o coronel Manoel Messias Melo, coman-
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dante da operação. Segundo a Promotoria, foram usados dois
mil homens armados com metralhadoras, tonfas, balas de bor-
racha, bombas de gás e equipamentos de spray pimenta, além
de mais de duzentas viaturas, um carro blindado, dois helicóp-
teros águia, quarenta cães e cem cavalos. O texto diz que a rein-
tegração foi feita de maneira truculenta, com o uso de bombas
de gás e tiros de borracha, e que crianças presenciaram os pais
apanhando da polícia. A 5º Vara Criminal da Comarca de São
José dos Campos rejeitou a denúncia. O caso foi apresentado
ainda à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Or-
ganização dos Estados Americanos (OEA).
Um caso paralelo ao Pinheirinho também rendeu denúncias.
Enquanto a PM fazia a reintegração de posse, no dia 22 de janei-
ro, policiais da Rota fizeram uma ronda em outro bairro de Sâo
José dos Campos, o Campo dos Alemães. Ali praticaram abuso
sexual, tortura e agressão, segundo as vítimas. A Corregedoria in-
diciou 14 PMs pelo ocorrido.
Para Laercio, a culpa pela imagem ruim da PM é do milita-
rismo mal interpretado e da mídia, que divulga as notícias ruins
sobre a polícia atrás de audiência. “O militarismo é associado ao
governo militar. Essa associação vem de longe. É mais uma tradi-
ção. O policiamento não tem a ver com o sistema político militar.”
Quando Laercio entrou na PM, o Brasil vivia os tempos da di-
tadura militar. De 1982 a 2012, ele percebeu diversas mudanças na
polícia de São Paulo e os mecanismos que as tornaram possíveis.
Sobre a sua formação, ele diz ser incomparável com a atu-
al, por exemplo. Eram seis meses de escola militar de guerrilha,
um treinamento mais para a Força Auxiliar do Exército. A PM,
segundo a Constituição, ainda é uma Força Auxiliar do Exército,
embora suas atividades sejam diferentes atualmente: o foco é o
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policiamento. “Era mais bruto. Porque o Exército é direcionado
pra matar mesmo, pra guerra. A gente era muito mais direciona-
do para esse lado do que para o policiamento propriamente dito”,
conta. Hoje em dia, o curso na Escola Superior de Soldados tem
dois anos de duração –incluindo um ano de estágio.
De lá pra cá, Laercio viu a instituição ir de um extremo a outro
–de violência em excesso para falta de ação, segundo sua opinião.
O sargento pondera que o que era generalizado passou a consti-
tuir casos isolados, mas que, bem explorados pela mídia, fazem
com que a sociedade tome a parte pelo todo. “Criou-se o artigo
quinto, cheio de direitos [direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade]. Mudou muita coisa, mas hoje a mídia
ainda passa a imagem da PM violenta. São casos, mas quem está
dentro sabe que não é assim”, ele diz.
Houve uma época que sim, Laercio não nega, matar era a
forma mais “eficiente” de resolver um crime, mas ele divide
essa responsabilidade com a sociedade, que também pensava
assim. “Eu diria que essa mentalidade não era só da PM. E
muitos ainda a têm. Hoje em dia, eu acho que esse pensamento
existe mais na sociedade do que na própria PM, que chegava no
caso e queria resolver logo.” Talvez, a realidade da criminalida-
de atualmente, com as mesmas pessoas sendo presas e soltas
diversas vezes pelos mesmos crimes, contribua para que um
policial ainda veja o assassinato como uma opção para cortar
o mal pela raiz. A diferença é que a sociedade cada vez menos
compactua dessa ideia e a mídia está mais amadurecida e pre-
parada para denunciar os crimes policiais.
A partir do momento em que o pacto ideológico entre PM e
sociedade foi rompido, quando a democratização já não era sufi-
ciente e a população exigia também a implantação de um Estado
60
de Direito efetivo, a polícia teve que mudar –e, claro, os soldados
se viram limitados. “De acordo com as cobranças que vão surgin-
do, a PM vai mudando.” O cabo dá pistas de como a ação policial
se enquadrou nessas mudanças e de como se sentiu de mãos ata-
das, reclamando de vários aspectos práticos do seu trabalho.
“É uma dificuldade danada pra trabalhar. Os próprios ban-
didos reagem muito mais. Antigamente, era mais difícil um
bandido reagir.”
[...]
“A gente é muito restrito hoje em dia. Antes tinha mais liber-
dade de patrulhar com viatura onde a gente queria dentro do se-
tor designado. Hoje existe um roteiro já pré-estabelecido de onde
tem que parar, estacionar, as ruas certas que tem que passar, de
acordo com o índice de criminalidade. O comandante de compa-
nhia vai mudando o roteiro conforme a necessidade.”
[...]
“Hoje em dia é difícil a polícia trabalhar. Às vezes você fala
‘coloca a mão pra cima’ e o cara fala ‘não vou fazer’. Aí se tiver al-
guém filmando, já aproveita. O policial vai fazer o que? Vai atirar?
Aí não atira, mas ele está fazendo o trabalho dele e ele tem que ter
segurança pra fazer. E, para fazer com segurança, tem que fazer a
abordagem profissional. Tem muitos casos de desobediência. Às
vezes tem que abordar à força porque não pode deixar de fazer.
A pessoa tem o maior medo de reagir com bandido, mas, com o
policial, ela reage, ela não aceita.”
[...]
“Antigamente a gente fazia muita operação na favela. Hoje
em dia é raro porque tem que passar por um monte de aprova-
ção. Antes, o comandante da companhia falava: vamos fazer uma
operação em tal lugar, a criminalidade lá ta alta, tem boatos que
61
tem armas lá ou que o tráfico está muito grande. Ele pegava todo
mundo que estava trabalhando naquele dia e fazia. Hoje em dia,
ele precisa da aprovação do comandante do batalhão, do coman-
dante-geral, da Secretaria de Segurança Pública. Aí até chegar lá e
até voltar tudo... desestimula. Não tem autonomia.”
Laercio é saudoso da época em que a polícia era respeita-
da. “Antigamente, uma viatura pequena chegava num bar cheio,
todo mundo parava. Quem tava jogando parava, já ia pra parede.
Todo mundo respeitava.” O militar admite que o preço por tal res-
peito era caro. Era um respeito calcado no medo de uma polícia
violenta e despreparada, que queria resolver o crime a qualquer
preço, até mesmo se colocando em risco.
Em 1983, no ano seguinte à sua entrada na polícia, Laercio
perdeu o primeiro companheiro de trabalho. “É o que marca
mais: a gente chega e vê o colega fardado já morto em serviço...”
Era noite quando uma viatura de patrulha foi avisada que
uma loja de peças de automóveis estava sendo assaltada na
avenida Cursino. “Eles foram meio despreparados, não cha-
maram ninguém, não avisaram. Na época, tinha muito esse
negócio de produção, de chegar e pegar. Aí eles foram nessa
de pegar em flagrante e o primeiro que entrou já tomou o
tiro fatal”, conta Laercio.
Antes ainda da chegada dos companheiros, o policial já estava
morto. Nem chegou a ser socorrido. “Já tinha o sangue espalha-
do. Uma cena... Não tem explicação. Claro que pensamos ‘podia
ter sido eu’, mas não é só isso. Um sentimento de revolta. Difícil
explicar. É muito forte”, conta Laercio.
Aqueles policiais de atitude, que matam e são mortos,
ainda têm o apoio dos colegas. Ainda são considerados he-
róis, explica Laercio. Mas perderam o apoio da sociedade e da
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corporação. O sargento diz que deve haver um meio-termo
entre a polícia que mata primeiro e pergunta depois e a polí-
cia amputada pela sociedade.
“O policial acaba desestimulado a fazer o seu trabalho. A ins-
tituição desestimula. Uma ocorrência que o policial chegava e re-
solvia, hoje ele chega, não pode resolver, não pode entrar, chama
o apoio, espera o comando chegar, aí o comando avalia, conforme
for chama o Gate. Fica aquela negociação. Aí os bandidos apro-
veitam para exigir isso, exigir aquilo. Antigamente não tinha isso,
mas colocava o refém mais em risco. Acho que hoje é a maneira
mais certa, mas passamos de um extremo a outro: falta achar o
bom-senso de todos os lados, polícia e sociedade.”
Essa virada na polícia, segundo o diagnóstico de Laercio, se
deu também por causa da Constituição de 1988, mas principal-
mente devido aos episódios que abalaram a sociedade civil: o Ca-
randiru em 1992 e a Favela Naval em 1997. A partir deles, gerou-
-se a discussão de que a PM agia errado e era preciso rever isso.
Revelado pelo Jornal Nacional, o caso Favela Naval ocorreu
em março de 1997, quando policiais faziam uma espécie de
blitz na favela de Diadema e agrediam os motoristas que passa-
vam por ali. As cenas brutais, exibidas em rede nacional, mos-
tram um homem sendo espancado por oito minutos, antes de
levar um tiro. Dias depois, no mesmo local, outro vídeo mostra
os PMs cobrando propina dos motoristas e agredindo os passa-
geiros de um carro. Um dos policiais chega a atirar contra o ve-
ículo, matando uma pessoa no banco de trás.
O ex-soldado Otávio Lourenço Gambra, conhecido como
Rambo, foi condenado a 15 anos e dois meses de prisão pelo
assassinato de Mário José Josino, 30. Em 2005, ao comple-
tar um sexto da pena, Rambo passou ao regime semi-aberto.
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Nove policiais que participaram da blitz foram denunciados
pelo Ministério Público –três foram demitidos e seis expulsos
da PM. Há ainda outros dois policiais que foram punidos in-
ternamente, mas não participaram da ação, segundo a PM e,
por isso, continuam na corporação.
Laercio conta que as ocorrências de resistência, quando havia
troca de tiros ou mortes, costumavam ser elogiadas e os policiais
eram condecorados. Atualmente, a ocorrência considerada certa
é a sem violência. “Começou a ser exemplo só quando não havia
uma necessidade de trocar tiro.” Ele diz que o PM hoje “conta até
dez” antes de agir porque sabe as implicações: vai ser processado
pelo tribunal civil e militar, vai ser tirado da rua, vai passar por
acompanhamento psicológico e pode perder o bico.
“Se o psicólogo achar que o cara é perigoso, ele manda desar-
mar. Isso é humilhante pro policial. Uma coisa que você gosta
de fazer, que acredita estar fazendo certo. Claro que há exceções,
mas geralmente o policial estava fazendo do jeito certo.”
Justamente definir o “jeito certo” em uma ação policial é a di-
ficuldade. A decisão de atirar ou não é tomada em segundos. “O
momento do tiro é complicado porque às vezes a gente já vai com
adrenalina, já vai sabendo o que está acontecendo, sabendo o que
pode encontrar e às vezes encontra mesmo. É uma decisão que
tem que tomar em um décimo de segundo, não tem como expli-
car em que a gente se baseia exatamente.”
Essas ações de controle da atividade policial, como o afastamen-
to compulsório, embora sejam necessárias para tentar garantir o
cumprimento dos direitos dos cidadãos, estimulam a omissão da
polícia na visão de Laercio. “Isso inibe o policial. Ele prefere deixar
o bandido fugir. Ele podia chegar e forçar um tiroteio, mas ele pre-
fere ir devagar, chegar depois, quando o cara já fugiu.”
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E reclama: “A polícia ficou sem apoio pra trabalhar. De todos os
lados: da sociedade, do Estado, da própria instituição. Uma coisa pro-
voca outra. Conforme a sociedade cobra mais, a polícia recua mais.”
O próprio afastamento da atividade policial seria “mais pra
dar satisfação pra sociedade.” Pegou mal para o governo que as
pessoas encontrassem policiais com assassinatos na carreira pa-
trulhando por aí. O exemplo mais recente é o do soldado Henri-
que Dias Bueno de Araújo, que disparou contra Carlos Augusto
Muniz Braga, um camelô que tentou tirar da sua mão um spray
de pimenta. O spray era usado para dispersar as pessoas enquan-
to outros policiais imobilizavam outro camelô.
Carlos morreu com o tiro na cabeça. O soldado, que alegou
ter atirado acidentalmente, foi preso em flagrante por homicídio
e levado ao presídio militar Romão Gomes. Poucos dias depois,
porém, a Justiça emitiu um alvará de soltura.
O problema é que Henrique já responde a outro caso de
homicídio, por ter atirado contra um morador de rua. Segun-
do a PM, o morador de rua resistiu à abordagem e usou um
facão para ameaçar o soldado.
Exatamente para evitar que casos como esse ocorram, o poli-
cial envolvido em ocorrência com vítimas fatais costuma ser afas-
tado. Esse afastamento, acompanhado por psicólogo, é, em geral,
visto pelos policiais como uma punição –pelo estigma e por mu-
dar o horário de trabalho, afetando o bico.
O Proar (Programa de Acompanhamento a Policiais Milita-
res Envolvidos em Ocorrências de Alto Risco), criado em 1995,
previa o afastamento automático do PM envolvido em uma ação
que resultasse em morte. Em 2002, o Proar foi substituído pelo
Programa de Acompanhamento e Apoio ao Policial Militar (PA-
APM), que é mais abrangente. O policial pode ser encaminhado
65
para avaliação psicológica após ações de risco e troca de tiros mes-
mo sem vítimas. Porém, a sensação de estar sendo castigado, ape-
sar ter sido maior nos primeiros anos do Proar, persiste.
Sobre a punição real, mais necessária do que esta simbólica, La-
ercio diz que quando um policial assassino é pego, é punido judi-
cialmente. Mas, para escapar da cadeia, basta esconder bem o crime.
“A gente usa um termo que a polícia dá um tiro de canhão pra
matar mosquito. Isso vale para tudo, não só para o policial envolvido
em crime, mas para a disciplina, o próprio RD [regimento discipli-
nar] é muito rígido, militar mesmo, muita cobrança, muita pressão.”
Pode-se questionar se o tiro de canhão contra os policiais cri-
minosos realmente funciona. Mas não restam dúvidas de que a
disciplina militar é um rojão que pesa, principalmente nos sol-
dados. “Ordens são ordens. Muita pressão, muita coisa ruim,
digamos assim. Mas tem a parte bonita, a parte boa do milita-
rismo que traz união. Às vezes a vida da gente depende de um
colega ou da corporação inteira.”
As ordens vêm de escalões superiores –de oficiais que não estão
nas ruas. Por isso, o soldado de patrulha, muitas vezes, se vê con-
frontado entre a sua experiência e seu conhecimento sobre o terre-
no e uma ordem que ele, justamente por estar na linha de frente,
crê não ser efetiva. “Isso é quase uma constante praticamente. Não
existe uma pesquisa. Em tudo. O fardamento ninguém pergunta
pra gente se é confortável, simplesmente é imposto. Ninguém per-
gunta que viatura é melhor pra trabalhar. É imposto. Tudo é impos-
to. Às vezes a agente está trabalhando recolhido pra ficar em pron-
tidão. Sabemos que não vai precisar. Mas quem dá ordem não está
vendo o que está acontecendo. Ele se baseia nas informações dele e
dá uma ordem. O cara está atrás de uma mesa. A gente está na rua,
a gente sabe quando é necessário e quando não é.”
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Ainda assim, não há questionamento. As ordens e o regi-
mento disciplinar estão ali para serem cumpridos. Laercio explica
que existe uma fiscalização disciplinar, ligada à Corregedoria da
PM, que funciona como a polícia da polícia. “Eles têm um farda-
mento diferente. Sai um ostensivo fardado que aborda policial de
serviço e vê se a bota dele está limpa, se está suja, se ele está com
postura... Qualquer coisa que acharem errado, o policial é puni-
do. Ele é comunicado, depois vai pro batalhão e é punido.”
A julgar pelos desabafos de Laercio sobre os problemas mais
cotidianos de um soldado, do desestímulo à ação às ordens en-
golidas à seco, fica difícil entender como alguém que entrou por
acaso na polícia se manteve ali 30 anos. Mas essa é uma questão
difícil mesmo se explicada. Não há razão. Há apenas uma irracio-
nalidade que prende as pessoas em seus empregos chamada tam-
bém de vocação. “A parte institucional é difícil de lidar. É muito
mais difícil conviver com a parte militar do que com o trabalho
em si. O trabalho em si a gente gosta. Vai atender ocorrência, vai
atender o cidadão, é gratificante na maioria das vezes. O patru-
lheiro que gosta de rua... Tá acabando isso, né? Mas ainda deve ter
gente que vê as coisas como eu e que ainda gosta.”
Esse grande balanço do que foi e do que é a polícia é quase
tudo que o tímido Laercio tem a dizer. Humilde e prestativo, in-
terrompe o bico de segurança à paisana no supermercado Assaí
da avenida João Dias, onde trabalha há dez anos, para discorrer
sobre a própria vida durante algumas horas de uma manhã de do-
mingo. Mas não fica totalmente à vontade com isso. Um sorriso
de verdade, só com o gravador desligado.
Para o dia frio, ele veste uma calça jeans e uma camisa xa-
drez de flanela. O rádio vai pendurado na cintura, pronto para
dedurar algum movimento suspeito. O rosto bem redondo, em
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geral, está sisudo. A careca e as bolsas cansadas abaixo dos
olhos pequenos denunciam a idade.
Laercio nasceu em Itaquera em 1961 e foi criado ali. É o mais
novo de cinco irmãos. O pai era mecânico de máquinas pesadas
e trabalhou em várias construtoras. “Tive uma infância pobre, na
periferia. Não diria difícil. Pobre, mas feliz e tranquila.” O traba-
lho o levou a morar na zona sul, onde patrulhava.
Aliás, foi numa patrulha em São Judas que conheceu sua
mulher, que trabalhava em uma loja no bairro. “Na época, inven-
taram o policiamento localizado, que ficava duas horas parado no
mesmo lugar. A idéia era fazer contato com o comércio. Foi o ini-
cio do policiamento comunitário. Eram umas kombis, que fica-
vam paradas. Eu trabalhava oito horas –duas horas em cada local
que o comandante estabelecia.” Quando se casaram, em 1986,
ambos trabalhavam no Paraíso, onde alugaram uma casa.
Laercio teve um casal de filhos: Douglas, de 25 anos, e Daísa,
de 15. “Esses dez anos de diferença são os dez anos de aluguel. A
gente estava pagando aluguel e pensou: pô, ter outro filho... A gen-
te queria uma menina, porque já tinha um menino. Aí um dormi-
tório já não serve mais, teria que ter três dormitórios. Aí a gente foi
se segurando.” Há 18 anos, comprou um terreno em Guarapiranga
e construiu sua casa. E o casal pôde engravidar novamente.
Douglas e Daísa estudaram em escola pública. Hoje a famí-
lia tem dois carros e uma moto –comprada quando Laercio pre-
cisou se deslocar da zona sul para o bico em Osasco, onde ficava
o Assaí na época. Com o nascimento do primeiro filho, a mulher
teve que parar de trabalhar porque não tinha com quem deixá-lo.
Foi uma boa escolha: Douglas é um orgulho para a família. De-
pois de fazer cursinho com bolsa, ele passou nas três universida-
des públicas em São Paulo no curso de Engenharia. Escolheu a
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Poli, na USP, e teve que se mudar para o Crusp, depois de muito
madrugar e pegar ônibus lotado, dada a distância entre Guarapi-
ranga, na zona sul, e o Butantã, na zona oeste. “A gente se realiza
mais através dos filhos. O que meu pai não pôde fazer por mim,
eu tento fazer para meus filhos.”
O filho do militar foi parar justamente na USP, um reduto
anti-PM. Em 2011, uma ação da polícia para reintegração de posse
da Reitoria, invadida por alunos, provocou uma greve estudantil
que se estendeu até o ano seguinte. Toda a história começou em
maio, quando o aluno da Faculdade de Economia e Administra-
ção Felipe Ramos de Paiva foi morto no estacionamento, após
uma tentativa de assalto. Em setembro, o reitor João Grandino
Rodas assinou, então, um convênio com a PM, que passou a ter
presença mais frequente no campus.
Desde então, estudantes (especialmente negros) relataram
terem sido abordados diversas vezes e sentiram sua liberdade
restringida. O ápice foi no dia 27 de outubro, quando policiais
prenderam três estudantes que fumavam maconha no estaciona-
mento da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, ge-
rando um confronto entre alunos e policiais ali mesmo.
De imediato, começou a polarização no campus entre aqueles
a favor da PM e os contrários, sendo que a Poli, onde Douglas já
estudava, era um dos pontos de apoio à PM. A questão é que os
alunos mais exaltados resolveram ocupar a Reitoria da USP, em
um movimento com pouquíssima legitimidade na comunidade
uspiana. Até que a polícia os transformou em heróis.
Na madrugada do dia 8 de novembro, mais de 400 poli-
ciais do Choque, Cavalaria, Goe e Gate, além de um helicópte-
ro, cercaram a Reitoria e levaram presas 73 pessoas. Os alunos
relataram abusos e violência na operação. A polícia negou. Os
69
detidos foram indiciados sob suspeita de desobediência a or-
dem judicial (não cumpriram o prazo de desocupar a reitoria)
e dano ao patrimônio público.
Moradores do Crusp disseram terem sido impedidos de saí-
rem de casa durante a reintegração e que a PM usou bombas de
gás, estudantes alegaram terem sido agredidos, uma estudante
disse ter sido amordaçada, os detidos afirmaram que a própria
polícia destruiu partes da Reitoria. O Ministério Público Estadu-
al de São Paulo pediu a abertura de um inquérito para investiga-
ção da ação da PM no Crusp.
O resultado não podia ser outro: no mesmo dia uma Assem-
bleia Geral com cerca de três mil estudantes deliberou a greve. Os
alunos exigiam o fim do convênio da Reitoria com a Polícia Mili-
tar e a saída da PM do campus. Foi nesse ambiente que o filho de
Laercio levou sua graduação, mas o policial minimiza a situação.
“Pelo que eu converso com ele [Douglas], ele fala que não é a
USP. Aquele pessoal não representa a USP. Ele fala que é mais
uma parte, do pessoal de sociologia, por exemplo. Esse pessoal
sempre foi assim, não é só na USP. Mas ele não tem essa mesma
visão. Inclusive, não só ele como todo mundo achou muito erra-
do o pessoal invadir, destruir, achar que a USP era local isolado,
que você pode fazer o que quiser lá dentro, fumar maconha, fazer
tudo abertamente. Ele também não concorda com isso. Eu acho
que por eu ser PM, mas também pela própria visão dele.”
Laercio subiu ao posto de cabo por tempo de serviço e se
aposentou, portanto, como sargento. Um sargento aposentado
ganha R$ 5 mil por mês. São descontados mais ou menos R$
800. “Eles cortam alguma coisa em relação a quando você es-
tava na ativa. Existe uma briga na Justiça porque por lei isso
não pode. Militar não poderia ter esse corte. Mas o governo vai
70
dando um jeitinho, já que a mídia explora isso [o baixo salário
na ativa e o salário integral na aposentadoria] e fica mal pro
governador. Os caras vão dar um jeito de tirar dos aposentados
pra pagar os das ativa. Teve um tempo que isso aconteceu. Ti-
rava dos mais velhos para pagar o inicial.”
Para complementar o salário, os bicos, é claro. Laercio conci-
liava a escala 12x36 da PM e dos bicos. Ele trabalhava à noite na
PM, das 19h às 7h. “A gente chega e tem meia hora de preleção.
O sargento passa as ordens do dia, confere o pelotão. Depois, pe-
gamos as viaturas e saímos. Se não tiver ocorrência, temos que
seguir o roteiro de onde patrulhar.” Às 10h, pegava serviço como
segurança no Assaí, de onde saía às 22h. Descansava até às 19h
do dia seguinte, quando começava a rotina outra vez.
Rotina essa bem diferente da de policiais em filmes de ação.
A maior parte das ocorrências são brigas de família, as chamadas
ocorrências de “desinteligência”. Também atendem muitos casos
de embriaguez e “código 13 –uma pessoa meio louca”, o que a ri-
gor não seria uma função da PM.
“A gente diz que a polícia abraça tudo. Abraça ocorrência
que não é dela. O pessoal liga 190 por qualquer coisa e a po-
lícia é praticamente obrigada a ir. Aí vai lá, faz socorro, parto.
Na verdade não é função da polícia, é função de ambulância,
de resgate. Até para ocorrências de bombeiro, muitas vezes o
pessoal liga 190. Acaba faltando viatura para a atividade-fim,
que é combater o crime, manter a paz.”
Diante disso, Laercio é mais um defensor da polícia comu-
nitária, ainda que ela também esteja em outro campo que não
a atividade-fim. A função da polícia comunitária é ser mais in-
tegrada à sociedade, conhecer os problemas daquele ambiente e
prever novos problemas. O PM terminou a carreira fazendo poli-
71
ciamento comunitário em São Judas –e conheceu a mulher qua-
se da mesma forma, diga-se. “A gente cuida de outras coisas, por
exemplo, a gente faz pedido pra iluminação, porque, devido ao
local escuro, o pessoal é muito assaltado. Faz pedido pra asfalto.
Pede para a Prefeitura cercar parques porque a pessoa entra e usa
droga. A gente entra em outra áreas que não o policiamento.”
Contudo, os benefícios são sensíveis, diz Laercio, inclusive
a queda da criminalidade. “Você não vai chegar num policial
qualquer e dizer: ó, conheço um bandido ali. Mas você tendo
amizade com o policial, sendo sempre os mesmos, numa base
comunitária, você cria vinculo e pode até falar. É como se fosse
um amigo. Ele fica sabendo dos problemas daquele pedaço. Eu
acho que é o ideal. Lógico que não dá pra ter só polícia comuni-
tária, mas é o ideal, deveria ser o principal.”
Antes de voltar ao trabalho, entre os “bips” de produtos pas-
sando no caixa e o chiado do rádio, Laercio deixa ainda uma
última consideração sobre a polícia: critica a divisão entre os
policiais militares e os civis. “Fica uma briga de poderes e com-
petências. O governo, se dá uma coisa pra uma, tem que dar pra
outra para agradar também. Se ele dá um helicóptero pra PM
fazer patrulhamento, tem que dar para a Polícia Civil também.
Acaba perdendo a sociedade porque se paga duas polícias sepa-
radas para o que deveria ser a mesma coisa.”
Agora sim, depois do mergulho, certamente involuntário,
no seu passado, mas que acabou trazendo à tona muito mais –
as transformações de toda a Polícia Militar de São Paulo pós re-
democratizaçao–, Laercio pôde voltar ao bico de um domingo,
finalmente, normal. Antes, um sorriso e um aperto de mão for-
te e firme, como se todas as histórias anteriores não bastassem
para comprovar seu caráter policial.
73
Enxugando gelo
Incomoda saber que a polícia
não é o que estão falando.
Massera, capitão
“A minha casa está sempre arrumadinha.” Mesmo sem nun-
ca ter estado lá, ninguém duvida disso quando vê o capitão Mas-
sera –um sujeito arrumadinho. Está impecável de camisa pólo
listrada branca e azul da Tommy Hilfiger, calça jeans e cabelo
penteado. As entradas e os grisalhos não são páreo para a juven-
tude que, praticamente, exala. Com um sorrisão, é um homem
bem simpático e educado. Sobretudo didático e organizado nas
ideias. Voz firme e assertiva. Perfeito para exercer a função mais
difícil dentro da Polícia Militar.
Como todo oficial, se formou na Academia de Polícia Militar do
Barro Branco. Antes disso estudou a vida toda em escolha pública.
74
Na época, a concorrida seleção para o Barro Branco era feita pela
Fuvest. Hoje, igualmente concorrida, a prova é feita pela Vunesp.
O último edital, aberto no fim de 2013, convocava para 220 vagas
e teve 11.430 inscritos (quase 52 por vaga). Após avaliação médica,
exames psicotécnico e físico, Emerson Massera passou a ser um re-
cruta no ano de 1990. Fez o curso preparatório de dois anos –que
equivalia ao ensino médio– e o curso de formação de oficiais de
três anos, reconhecido pelo MEC como um curso de nível superior.
“Geralmente, o oficial quando se forma faz outra faculdade. Eu fiz
mais três”, se gaba. O capitão escolheu cursos que se relacionavam
com o seu trabalho e com cada momento da sua carreira.
A primeira foi ainda em 1994, junto com o último ano do Barro
Branco, quando estudou Processamento de Dados no Mackenzie,
o que levou três anos. A segunda foi o Direito, comum entre os ofi-
ciais, já que é uma disciplina também da carreira policial. Algumas
faculdades, como a Unicsul, onde Massera estudou, dão ao policial
o direito de eliminar matérias já cursadas no Barro Branco. O re-
sultado é que, em dois anos, Maserra concluiu o Direito e, no ano
seguinte, em 2006, entrou na USP para estudar Ciências Sociais,
graduação concluída em 2013, depois de dois anos trancados.
Massera começou seu trabalho de tenente como comandante
de força patrulha no 12º batalhão, que engloba os bairros de Moe-
ma, Campo Belo, Brookilin e Vila Mariana, na zona sul da capital.
Ele, de dentro de uma viatura, coordenava o policiamento de rua
da região de 62 km2. Essa é a função do oficial: gerenciar o poli-
ciamento feito pelos praças.
Naquela manhã de sábado, Massera tomava seu café mais
tranquilo. Estava de férias. Era fevereiro e seria bom descan-
sar antes da pauleira que viria com a Copa do Mundo. E que
já vinha sendo desde junho, quando o Brasil acordou. Estava
75
especialmente difícil ser policial desde então. Mas a confiança,
o sorriso e a serenidade de Massera não murcham. Na quinta-
-feira mesmo fora obrigado a interromper as férias e vestir sua
farda. Para um apaixonado pela profissão, um alívio na absti-
nência. Ainda mais porque a ocasião era nobre: no quartel da
PM na Washington Luis, em frente ao aeroporto de Congo-
nhas, foi receber uma medalha em homenagem ao seu traba-
lho no 12º. Resultado de uma carreira que começou da manei-
ra mais clichê possível.
Durante toda a vida, o pai de Massera foi um praça. Um sar-
gento. Chegou ao oficialato na aposentadoria, quando todos os po-
liciais sobem uma posição na rígida hierarquia militar. Pelos olhos
do filho, Jair era um líder natural, honesto, querido pelos vizinhos
e pela família, um resolvedor de problemas alheios –e com prazer.
“Lembro o dia que falei com ele que queria ser policial. Devia
ter uns 14 ou 15 anos. Ele me disse para não cometer os mesmos
erros. Que estudasse. Que ele tinha tido a oportunidade de estu-
dar e não estudou. ‘Seja oficial que você vai poder ajudar muito
mais gente do que eu.’”
“Não tem nada melhor do que, na adrenalina, você perseguir
um carro roubado e, quando você prende o ladrão, sai uma víti-
ma de dentro do porta-malas e te abraça. ‘Se não fosse você, eu já
estaria morta agora’. A sensação disso é fantástica: eu fui o dife-
rencial para a vida de alguém. Ainda que seja uma atividade tão
difícil e tão pouco reconhecida, tão discriminada. Se fala em dis-
criminação de minorias, de migrantes, de pretos, mas acho que a
classe mais discriminada que existe hoje é a classe policial. Todo
mundo olha torto pro policial, ninguém quer precisar do policial,
mas quando precisa, acaba recorrendo. É uma categoria desvalo-
rizada tanto em termos salariais como socialmente.”
76
Depois de diversas ocorrências com bastante adrenalina no
12º, Massera passou para o lado administrativo da PM. Traba-
lhou seis anos na inteligência da polícia e outros seis anos fa-
zendo análise social e criminal de São Paulo a partir do estudo
de estatísticas –foi isso o que motivou a última das gradua-
ções, em Ciências Sociais.
Foi no setor de inteligência da PM, ligado ao Comando-Geral,
que começou o trabalho de análise criminal quando ainda não
existiam ferramentas para isso. Cada delegado ou comandante de
companhia, se quisesse e como bem entendesse, separava os da-
dos criminais da sua região e a partir daí traçava uma estratégia.
Em 1998, a secretaria de Segurança Pública lança a primei-
ra ferramenta para obter dados criminais sistematizados: o info-
crim. De lá pra cá, a vida ficou mais fácil. “Hoje com um clique,
você tem tudo, inclusive BO”, diz.
Em 2002, foi chamado para fazer análise criminal para a
cidade de São Paulo, passando da inteligência do Comando-
-Geral para a inteligência do Comando da Capital, onde traba-
lhou com planejamento operacional, ou seja, identificava prio-
ridades para a ação policial na capital.
Massera conta que justamente na época do início do traba-
lho de análise na capital, os homicídios começaram a cair, mas
ressalta que não há relação de causalidade comprovada entre
os dois acontecimentos. “Seria leviano dizer que o homicídio
caiu a partir desse trabalho porque ele caiu em todo o Estado,
mas que teve uma participação teve.”
Para Massera, a redução dos homicídios está ligada ao en-
velhecimento populacional. Se em 1999, a taxa de homicídios
no Estado era de 35,27 a cada cem mil habitantes, em 2013, o
número passou a 10,5 –o segundo menor desde 2001, só per-
77
de para 2011, quando a taxa foi de 10,1. Em 2013, foram 4.444
casos de homicídios dolosos segundo a Secretaria de Seguran-
ça Pública. Nos três primeiros trimestres de 2014, foram 3.176.
Enquanto isso, as pessoas de 15 a 24 anos, que representavam
quase 19% da população em 2000, passaram a cerca de 16% em
2010. “Como a violência é sofrida e praticada por jovens, parece
coerente dizer que a diminuição da população jovem leva a di-
minuição da violência”, explica.
Mas o capitão também admite o papel do investimento so-
cial na redução da criminalidade. “A diminuição da desigualda-
de também contribui. Tinha um prefeito aí famoso que, pra in-
vestir em moradia, construía viaduto pro pobre morar embaixo.
Mas no fim da década de 1990, começou o investimento mais
forte na área social e isso contribui muito para a redução da vio-
lência. Aliás, isso é fundamental.”
Massera, então, engata um discurso com teorias dignas de um
estudante da FFLCH de esquerda, quase estranho na boca de um
policial, embora ele mesmo reaja: “já ouvi que eu não penso como
um policial, mas como o policial pensa? Você já teve contato com
policiais pra saber isso?” E segue, destoante do senso-comum:
“O pessoal fala em investir cada vez mais em policiamento,
cada vez mais em repressão, e não é isso que vai reduzir a vio-
lência. O que vai reduzir a violência é investir na área social. Na
redução dos problemas que dão causa a criminalidade. Quando
você investe no fortalecimento do aparato policial e na repressão,
você não está investindo nas causas, mas nas consequências.”
Massera estaria sugerindo um foco nas causas: um trabalho
de prevenção –quase nunca associado à PM, que acaba lidando
mais com as consequências: a repressão. Para ele, investir em re-
pressão é como o Ensaio sobre a Cegueira, do Saramago, no qual
78
a solução foi segregar. Só que chega um momento em que todo
mundo fica cego –e as prisões ficam lotadas.
“O problema é que a PM é um órgão de repressão. Embo-
ra sua função na Constituição seja de prevenção, a polícia faz
muito pouca prevenção. Isso simplesmente porque a demanda
é grande. São 1.200 viaturas na rua para 45 mil chamados do
190 por dia só na capital. Essas viaturas somem, estão sempre
em atendimento de ocorrência. Ou seja, estão sempre atrás. É
um trabalho de enxugar gelo.”
Traçar a mentalidade de Massera também é como enxugar
gelo. Ele já alerta: “você não vai sair daqui com um perfil meu
de esquerda ou de direita.” Até porque esquerda e direita hoje
não existe mais, ele prega.
Minutos depois de defender a prevenção, não com o aumento da
presença ostensiva da polícia, mas com ações para moradia, urbani-
zação, revitalização do centro e integração entre empresas e a perife-
ria, Massera fala em leis mais duras e redução da maioridade penal.
Ele conta que, na Baixada do Glicério, a Record faz flagran-
tes de bandidos quebrando vidros para roubar o interior de car-
ros. “A polícia não faz nada, acontece todo dia, a qualquer hora
que viermos, nós filmamos isso”, eles dizem. Ao que Massera
responde: “Tá vendo esse menino aí na filmagem? No último
mês, prendemos 14 vezes.”
Não, a solução, para Massera, não são leis mais brandas. A te-
oria Saramago funciona nas condições normais de temperatura
e pressão, o que não é o caso da sociedade brasileira –um orga-
nismo doente, ele explica. Em um corpo com câncer não adianta
fazer a quimioterapia sem retirar o tumor. A prevenção vai evitar
que novas pessoas optem pelo crime, mas os criminosos reinci-
dentes precisam ser combatidos. Segundo Massera, a lei dura,
79
inclusive para menores, é necessária no processo de retirada do
tumor. Uma vez curado o organismo, seria possível pensar em
penas alternativas e restabelecimento da maioridade penal aos 18.
“Dizem que colocar menor na cadeia é colocar a criança numa
escola de maldade. Mas hoje ela já está! O que precisaria é de um
sistema especial para as crianças porque o sistema não reeduca
ninguém. Aqui o preso trabalha três dias e desconta um dia na
pena, e trabalha se quiser. Há modelos na Ásia e Europa em que o
preso é obrigado a trabalhar pra pagar a estadia na cadeia e ainda
aprende uma profissão lá dentro.”
“Na PM, sou extrema esquerda. Fora da PM, sou extrema di-
reita”, diz. Além de defender investimento na área social e, fugin-
do do tema, a união civil entre pessoas do mesmo sexo, Massera
é totalmente contra a violência da polícia, que é praticada pelos
“maus policiais” –um termo que, junto com “bandido”, está na
boca dos policiais para definir quem é quem no mundo da PM.
Mocinho, empregando também um papel na narrativa, Mas-
sera nunca anda armado. Só quando transita fardado. “Sou a fa-
vor do desarmamento total e irrestrito. O fácil acesso a arma de
fogo é responsável pela violência que nós estamos vivendo hoje.
O estatuto do desarmamento foi também uma das grandes ferra-
mentas para a diminuição dos homicídios.”
Ele explica que embora a PM continue aumentando suas abor-
dagens a cada mês, a apreensão de armas vem caindo a cada ano.
“O que isso mostra? Que a quantidade de armas em circulação
no mercado é cada vez menor. E a quantidade de homicídios vem
caindo. Então tem uma relação entre a arma de fogo e homicídio.”
E continua: “Estive no Japão em 2007, tenho dados de 2006.
Foram 116 homicídios no país, quase todos por arma branca. Por-
que lá é proibido usar arma. A arma do policial está até enferruja-
80
da porque ele nunca usa. A organização criminosa lá –que é mais
romantismo do que uma organização criminosa– quando muito
tem uma pistola. Um projeto como esse tem muita reação con-
servadora, mas seria um dos caminhos.”
Em 2006, em São Paulo, foram 6.057 homicídios. Em 2013,
4.444. Mas a vida da polícia não ficou melhor, pelo contrário.
Nunca foi tão difícil ser PM como em 2013.
*
É numa salinha de móveis novos e escuros, persianas ver-
des e quatro mesas que, sentado em uma confortável cadeira
de escritório preta com encosto alto, Massera tem que lidar
com a maior crise da PM.
Ao lado do computador, em cima da mesa, jornais do dia.
Aqueles que publicam sobre Amarildos desaparecidos, Fábios
presos, Fabrícios feridos e Carlos mortos.
É maio e logo a Copa começa. A demanda por informações da
PM por parte da mídia aumenta –na verdade, já havia aumentado
em junho, com as manifestações– e o Centro de Comunicação So-
cial da Polícia Militar do Estado de São Paulo tem muito o que fazer.
Na sala adjunta, os subordinados de Massera trabalham no
esquema de plantão 24h nos sete dias da semana e têm que res-
ponder aos cerca de 50 pedidos diários de jornalistas. São quatro
nessa função, dois cuidando da intranet e o primeiro tenente Fe-
lipe, braço direito do capitão, formado em jornalismo pela Cásper
Líbero em 2010 e formado no Barro Branco em 2003.
No comando, com Massera, está o capitão Marques e a capi-
tã Cibele. São, por sua vez, chefiados pelo coronel Lopes, sub-
-chefe do Centro de Comunicação Social. O centro foi criado para
concentrar as demandas de assessoria de imprensa, comunicação
externa e interna, enquanto a 5º seção do Estado Maior, que ori-
81
ginalmente cuidaria dessa parte, mantém as diretrizes de comu-
nicação. O capitão trabalha ali desde 2008.
A vista lá fora é sempre mais agradável. A janela no primeiro
andar dá para a entrada do Quartel do Comando-Geral, na praça
Coronel Fernando Prestes, onde o sol vai encontrando brechas
entre as muitas árvores. Um prédio com um lindo vitral na facha-
da –uma homenagem aos Bandeirantes. Na frente, uma estátua
de Tobias de Aguiar, fundador da Força Pública Paulista, futura
PM, quando foi presidente da Província de São Paulo, em 1831.
O primeiro batalhão do Comando de Policiamento de Cho-
que leva o nome de Tobias Aguiar: Rondas Ostensivas Tobias
de Aguiar, a Rota. Aliás, o batalhão da Rota fica ali quase em
frente, num prédio amarelo antigo, do outro lado da avenida
Tiradentes, perto da Luz.
Mas a melhor parte da vista na sala de Massera é o jardim
japonês da entrada do quartel, com muito verde e um lagui-
nho. O prédio do Quartel do Comando-Geral abriga o Coman-
do da Capital e o da Região Metropolitana, além das seções do
Estado Maior e um prédio do Copom.
O prédio do Copom, aliás, cheira a tinta fresca. O Copom,
comando de operações, é que recebe as ligações do 190 e pas-
sa informações a todas as viaturas através da comunicação
via rádio. Com cerca de 700 policiais atendendo aproxima-
damente 150 mil ligações por dia em todo o Estado, há um
déficit no serviço de mais de 500 policiais que, por sua vez,
não podem ser retirados do policiamento de rua para traba-
lhar no Copom. A solução foi terceirizar as chamadas do 190.
Massera diz que não haverá prejuízos já que policiais conti-
nuarão supervisionando o trabalho e PMs aposentados serão
também empregados na função.
82
São 9h e, por alguma solenidade, o hino nacional ecoa do ter-
ceiro andar, onde fica o salão nobre com lustres sofisticados e sofás
de couro marrom. É ali a sala do coronel Benedito Roberto Meira,
comandante-geral da PM. Mas o primeiro andar de Massera tam-
bém é privilegiado. Como uma espécie de mezanino, tem a melhor
vista do vitral bandeirante. Massera vai sentir falta de tudo isso.
O capitão está de mudança. Da próxima semana até o dia 20
de julho, vai para o CPCopa, o Comando de Policiamento da Copa,
criado especialmente para o Mundial no Brasil. Vai trocar o uni-
forme administrativo social da PM, com camisa e sapatos, pelo
uniforme de policiamento. Sem perder a oportunidade de fazer
propaganda, Massera diz que o plano de comunicação para a Copa
está pronto há muito tempo –o Centro de Comunicação Social foi
o primeiro órgão a terminar o planejamento. O plano operacional
também está definido: serão 4265 policiais, divididos em três ba-
talhões, para cobrir os aeroportos, Fan Fest, hotéis, metrô, pontos
turísticos e, claro, o Itaquerão. Esse efetivo foi conseguido recru-
tando policiais de todo o Estado e também com os alunos da PM.
Os 1.190 formandos do curso de soldado não vão nem passar para
o policiamento de rua, vão direto da formatura para o CPCopa. O
mesmo com 1018 sargentos e 280 oficiais.
Por enquanto, Massera ainda está ali, na sala de móveis novos
e escuros. Dentro da sala adjunta, quatro TVs ligadas ao mesmo
tempo na Globo, Globo News, BBC e Record. Enquanto um PM
liga pra Massera pedindo a divulgação de uma operação bem su-
cedida de assalto a banco, chovem críticas à atuação da polícia. É
a crise de imagem mais complexa da PM, diagnostica Massera. E
é ele que tem que enxugar esse iceberg.
Mais de 70%. Essa é a porcentagem da população brasileira
que não confia na polícia.
83
O Índice de Confiança na Justiça Brasileira (ICJBrasil), re-
alizado pela Fundação Getúlio Vargas no primeiro semestre
de 2013, mostra que 70,1% da população não confia no traba-
lho das diversas polícias no Brasil –são 8,6 pontos porcentuais
acima do registrado no primeiro semestre de 2012. O mesmo
índice mostra que, em São Paulo, apenas 53% concordam que
a maioria dos policiais é honesta.
Um estudo da Anistia Internacional de maio de 2014 é ainda
mais alarmante: 80% dos brasileiros temem sofrer tortura poli-
cial. É o maior índice entre os 21 países analisados e quase o do-
bro da média mundial, de 44%.
Segundo o 8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública do
Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ao menos seis pes-
soas foram mortas por dia pelas polícias brasileiras em 2013.
Mas, assim como matam, também morrem. Em 2012, a taxa
de homicídio no Brasil foi de 24,3 por cem mil habitantes, en-
quanto a de policiais mortos em serviço e fora de serviço foi
de 72,1 por cem mil policiais.
Dados oficiais de São Paulo mostram que, no primeiro se-
mestre de 2013, foram 115 pessoas mortas por policiais de folga e
outras 150 mortas por PMs de serviço. Em janeiro de 2014, foram
76 mortos por policiais de folga ou de serviço –o maior número
desde novembro de 2012, quando 79 morreram.
Os policiais militares envolvidos nessas ocorrências com
mortes são na maioria brancos (79%), já as vítimas são na maio-
ria negras (61%) e jovens (57% tinham menos de 24 anos). A in-
formação é de um estudo da Ufscar que analisou 734 processos
com 939 vítimas entre 2009 e 2011. Apenas 1,6% dos policiais
foi indiciado, já que na maioria das vezes concluiu-se que não
houve crime ou que houve legítima defesa.
84
O número de homicídios com envolvimento de PMs de-
nunciados à Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo no
primeiro semestre caiu 29%, de 197 casos em 2012 para 140
em 2013. Queixas envolvendo corrupção passiva também di-
minuíram: de 62 reclamações para 54.
Já as denúncias de excessos cometidos por policiais durante
abordagens cresceram 106% no primeiro semestre de 2013 em
comparação com o mesmo período do ano passado. Foram 66
reclamações registradas ante 32 em 2012.
1º semestre
de 2012
1º semestre
de 2013Variação
Excessos durante
abordagem32 66 106%
Má qualidade
no atendimento329 539 64%
Ameaças 32 42 41%
Infrações
disciplinares283 343 21%
Prevaricação 73 95 30%
Homicídios 197 140 - 29%
Corrupção passiva 62 54 - 13%
Lesão corporal 16 10 - 38%
Fonte: Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo
85
A atividade-fim da polícia também não é bem avaliada. En-
tre os paulistanos, a fonte número um de insatisfação é a se-
gurança, segundo pesquisa do Datafolha de 2014. Um total de
44% está insatisfeito com a “segurança para circular nas ruas
da cidade”. Em 2012, com 14,2 mortes a cada cem mil habi-
tantes, a cidade apresentou a quinta maior taxa de homicídio
entre 35 grandes cidades do mundo avaliadas pela ONU. Em-
bora as taxas de homicídio estejam em queda, os roubos, de
2005 a 2014, aumentaram 54,2%.
Entre os policiais, o panorama não é melhor. Uma pesquisa
de 2014 feita com policiais de todo o país revelou que a maioria
diz ser a favor da desmilitarização da PM –77,2% disseram não
concordar que as polícias militares e os corpos de bombeiros mi-
litares sejam subordinados ao Exército, como forças auxiliares.
No total, 53,4% discordam que os policiais militares sejam
julgados pela Justiça Militar. E para 80,1% deles, há muito ri-
gor em questões internas e pouco rigor em assuntos que afe-
tam a segurança pública.
Além disso, um terço pensa em sair da corporação onde tra-
balha. O estudo foi realizado com 21.101 policiais militares, civis,
federais, rodoviários federais, bombeiros e peritos criminais de
todos os Estados. Os militares eram maioria: 52,9%.
Sobre as dificuldades que enfrentam na rotina de trabalho,
mais de 80% deles citou baixos salários, leis penais inadequadas,
contingente policial insuficiente, falta de uma política de segu-
rança pública e formação e treinamento insuficientes.
Como solução, 27,1% sugerem a criação de uma nova polícia
civil e 21,86% querem a unificação entre a polícia civil e militar.
Embora os números e as notícias preocupem, a confiança de
Massera na instituição não se abala. Afinal, para ele, esse infer-
86
no astral da PM é o resultado de uma campanha contra a corpo-
ração. “Incomoda saber que a polícia não é o que falam dela”,
desabafa. Conhecendo os repórteres que cobrem a polícia pelo
nome, o capitão distingue os imparciais daqueles que “deixam o
ativismo atrapalhar a isenção” ou dos que têm interesses pesso-
ais em alimentar o descrédito na PM.
“As críticas aumentaram muito mais agora. Elas se poten-
cializaram com o fenômeno das redes sociais. Hoje é lugar
comum falar mal da polícia. Você vai a uma festa e ouve: ‘ah,
mas você viu como a polícia abusa da autoridade, como a polí-
cia é violenta?’. A maior dificuldade é lidar com essas críticas.
Lidar com essas injustiças. As coisas boas que a polícia faz
acabam ficando escondidas. Que policial faz parto em viatura
ou que nós temos hoje uma quantidade de salvamentos que
polícia nenhuma do mundo tem. A PM de São Paulo mata
mais que todas as polícias dos EUA juntas, mas a PM também
morre mais do que todas as polícias dos EUA juntas. É uma
cidade violenta. E os casos de violência da polícia são tratados
como regra quando são exceção.”
Massera, como boa parte dos policiais, acredita que o jorna-
lismo escolhe mostrar o lado ruim da PM. “As pessoas só vêem
o lado mal da polícia. Dá a sensação de que a polícia só erra.
Mesmo quando faz tudo certo, mas uma vírgula sai errada, vão
focar nessa vírgula.” O clássico argumento policial de “temos
de 15 a 18 mil ocorrências bem sucedidas por dia, só os erros
são divulgados” revela uma profunda distorção do conceito de
notícia, que é justamente o inusitado, o fora do padrão. A man-
chete sempre será “homem morde cachorro”, a despeito dos
milhares de cachorros que morderam homens naquele mes-
mo dia. Só é notícia, o que foge da regra.
87
Idem para o caso da polícia. O bom trabalho do efetivo deve-
ria ser a rotina, o ordinário, o normal. Às manchetes cabem os
desvios, a irregularidade, aquilo que é extraordinário e ainda com
um agravante: a atividade policial é exercida pelo Estado, e é fun-
ção do jornalismo, principalmente, vigiar e denunciar o mau fun-
cionamento daquilo que é público. Quando um criminoso mata
uma pessoa, seus familiares buscam a justiça através do Estado.
Agora quando o Estado é que mata, onde podem se abrigar os in-
justiçados se não no jornalismo?
É claro que o resultado é um banho de propaganda ruim
pra PM nas páginas dos jornais –e pior: nas redes sociais–,
mas a “perseguição” à corporação é igual para qualquer órgão,
empresa ou figura de relevância pública e explica a máxima
popular de que “jornal só tem notícia ruim”.
O fato é que essa bomba agora está nas mãos de Massera:
como colocar a opinião pública ao lado da PM, mesmo com um
escândalo de violência atrás do outro. “O problema da PM é que a
comunicação é deixada de lado culturalmente. A corporação não
consegue mostrar seus pontos bons.” A consequência é uma po-
lícia estereotipada com policiais estigmatizados.
“Dizer que a polícia é violenta porque é militar, ou seja, é
um entulho autoritário, é uma das maiores bobagens que eu já
ouvi até hoje. Eu conheço o pensamento de quem defende isso,
mas eu conheço principalmente a PM. Estudo modelos de poli-
cia no mundo há mais de 20 anos. Já visitei países para conhe-
cer a polícia. Esse discurso é que está ligado ao ranço da dita-
dura. Procurar eleger um inimigo para unir as pessoas. Porque
esses movimentos não são unidos.”
Massera inverte o raciocínio, então, para dizer que os movi-
mentos sociais é que demonizam a PM para, em torno disso,
88
ganharem adeptos. “O Movimento Passe Livre, muito embora a
causa seja extremamente justa, como eles conseguiram adesão
maciça da população? Provocando a polícia. O movimento em si
era fraco. Provocaram a polícia e conseguiram uma reação des-
proporcional. No meu entendimento, houve excessos por parte
da PM, mas era exatamente o que eles queriam.”
Massera admite que o fatídico 13 de junho de 2013 foi espe-
cialmente violento. Dois dias antes, acontecera o Terceiro Ato
do MPL contra o aumento do preço da passagem no centro e
na Paulista. “Contra tarifa, manifestantes vandalizam centro e
Paulista”, era a capa da Folha de São Paulo descrevendo o ato.
“Foram mais de 80 feridos, os dois lados erraram. Ninguém ti-
nha ouvido falar de black bock até então. Nunca antes tinha tido
uma manifestação violenta como aquela. Mas os jornais haviam
cobrado mais ação da polícia.”
Os editoriais de Folha de São Paulo e Estado de São Paulo que
se seguiram ao terceiro ato chegavam a ser radicais. Em “Reto-
mar a Paulista”, escreveu a Folha:
“Oito policiais militares e um número desconhecido de mani-
festantes feridos, 87 ônibus danificados, R$ 100 mil de prejuízos
em estações de metrô e milhões de paulistanos reféns do trân-
sito. Eis o saldo do terceiro protesto do Movimento Passe Livre
(MPL), que se vangloria de parar São Paulo –e chega perto de-
mais de consegui-lo.
Sua reivindicação de reverter o aumento da tarifa de ônibus e
metrô de R$ 3 para R$ 3,20 –abaixo da inflação, é útil assinalar–
não passa de pretexto, e dos mais vis. São jovens predispostos à
violência por uma ideologia pseudorrevolucionária, que buscam
tirar proveito da compreensível irritação geral com o preço pago
para viajar em ônibus e trens superlotados.
89
[...]
É hora de pôr um ponto final nisso. Prefeitura e Polícia Militar
precisam fazer valer as restrições já existentes para protestos na
avenida Paulista, em cujas imediações estão sete grandes hospitais.
[...]
No que toca ao vandalismo, só há um meio de combatê-lo: a
força da lei. Cumpre investigar, identificar e processar os respon-
sáveis. Como em toda forma de criminalidade, aqui também a
impunidade é o maior incentivo à reincidência.”
No Estado, o texto era “Chegou a hora do basta”:
“No terceiro dia de protesto contra o aumento da tarifa dos
transportes coletivos, os baderneiros que o promovem ultrapas-
saram, ontem, todos os limites e, daqui para a frente, ou as au-
toridades determinam que a polícia aja com maior rigor do que
vem fazendo ou a capital paulista ficará entregue à desordem, o
que é inaceitável.
[...]
A PM agiu com moderação, ao contrário do que disseram os
manifestantes, que a acusaram de truculência para justificar os
seus atos de vandalismo. Num episódio em que isso ficou bem
claro, um PM que se afastou dos companheiros, nas proximida-
des da Praça da Sé, quase foi linchado por manifestantes que ten-
tava conter. Chegou a sacar a arma para se defender, mas feliz-
mente não atirou.
[...]
A atitude excessivamente moderada do governador já cansava
a população. Não importa se ele estava convencido de que a mo-
deração era a atitude mais adequada, ou se, por cálculo político,
evitou parecer truculento. O fato é que a população quer o fim da
baderna –e isso depende do rigor das autoridades.”
90
E foi aí que a PM mordeu a isca. No dia 13, respondeu de
forma troglodita, fazendo com que os próximos atos do MPL
fossem apoiados por milhões nas ruas no país inteiro e, princi-
palmente, tendo essa mesma mídia apontando o dedo para a ex-
cessiva violência, em especial depois que uma repórter da Folha
levou um tiro de borracha no olho.
Massera acredita ter conseguido reverter um pouco a si-
tuação desfavorável para a PM com a estratégia de comuni-
cação sobre a chamada tropa do braço –um grupo de PMs
especializado em artes marciais, que não porta arma de fogo
e que passou a agir nas manifestações para tentar controlar
os distúrbios sem violência.
A tropa do braço surgiu antes da mídia do que na rua, o que
de fato acalmou os ânimos, mas, quando finalmente apareceu
atuando, no Segundo Grande Ato contra a Copa, em 22 de fe-
vereiro, acabou jogando lenha na fogueira. Foram cerca de mil
manifestantes, e o número de policiais era equivalente ou maior.
A PM tentou fagocitar os black bloks, isolando-os dentro de um
cordão de policiais que formava um círculo. Ainda assim, a mani-
festação acabou novamente em pancadaria indiscriminada pelas
ruas do centro –foram 262 presos. Muitos jornalistas foram víti-
mas da violência e a ação foi largamente criticada.
“O MPL e os black blocks não são distintos”, diz Massera.
“Os black blocks são a tropa de choque do MPL. Eles sabiam
muito bem a estratégia. Sempre foi estratégia provocar a polí-
cia para que aja de forma violenta e, consequentemente, unir
o grupo. Que foi o que aconteceu.”
Para Massera, junho de 2013 foi apenas a repetição de um ou-
tro caso, vivido em 2011, mas agora num nível nacional. Massera
viu a história se repetir –não por farsa, mas por tragédia.
91
Em 2011, no ano em que a PM entrou no campus da USP,
prendeu usuários de maconha, causou um levante estudantil,
organizou uma reintegração de posse homérica com 73 presos –
políticos, dizem os estudantes– e, assim, tudo o que conseguiu
foi fazer um movimento antes sem respaldo interno se tornar
uma greve estudantil massiva que durou até o ano seguinte,
Massera dividia a sala de aula com aqueles que gritavam “Fora
PM” nas horas vagas. Mas o capitão não acha que a operação te-
nha sido violenta e que muito menos que tenha legitimado os
invasores da Reitoria. Justo o contrário.
“A operação [de reintegração de posse da Reitoria] foi bem
conduzida. Havia muito mais PMs que invasores. Sabíamos que
haveria um ambiente contra a PM, mas, quando há força poli-
cial em excesso, não há chance de reação. Porque se houves-
se reação, teria agressão e contra-reação. Quanto menos PMS,
maior a chance de confronto. E não houve uso de violência. A
grande lamentação daquelas pessoas foi essa. Deslegitimou o
discurso deles. Houve a menina que gritou que nem louca, mas
ninguém encostou nela. Ela se debateu. Foi mentira dela. O re-
lato dela no Jornal do Campus é igual a tortura do Vladimir Her-
zog, não tiveram nem originalidade. Na verdade, tivemos 99%
de acerto porque teve um PM que cometeu um erro e jogou
uma bomba de gás no Crusp. Ele foi punido.”
Foi nesse ninho de cobras, por assim dizer, que o capitão bus-
cou uma especialização que o ajudasse no seu trabalho de análise
social e criminal para a cidade de São Paulo. Do curso de Ciências
Sociais da USP, ele diz, absorveu muitas coisas, mas descartou
outras tantas. “Essa concepção de extrema esquerda na USP não
é a maioria, nem na própria FFLCH. É uma minoria barulhenta
que se impõe. Um discurso forte e anacrônico.” Com toda a situ-
92
ação de tensão no campus naquela época, porém, o capitão não
teve nenhum episódio problemático. Conta que começou a ser
mais ouvido, as pessoas queriam saber a opinião de um policial.
Os alunos sempre o respeitaram.
Em maio, logo após a morte de Felipe Ramos de Paiva, aluno da
Faculdade de Economia e Administração, Massera disse que houve
um clamor popular pela presença da PM e que a violência dimi-
nuiu na USP. Para responder a uma reportagem feita pelo Jornal
da Tarde “com números distorcidos de violência divulgados pelo
Sintusp”, a PM divulgou seu próprio levantamento.
A estatística considera os 80 dias anteriores à morte de Felipe
e os 80 dias posteriores, descontando julho por ser mês de férias,
e foi feita através de Boletins de Ocorrência que têm a USP como
local do crime. Entre um período e outro, o furto de veículos caiu
de 20 para dois e o roubo de veículos caiu de 13 para um. Roubos
em geral passaram de 18 para seis, lesão corporal de nove para
dois e sequestro relâmpago de oito para um.
Segundo dados da USP, porém, a presença da PM na Cida-
de Universitária não impediu o aumento de roubos entre 2012
e 2014. Massera admite que a polícia não manteve ao longo de
todo esse tempo o mesmo número de policiais que circulavam no
campus nos primeiros meses após a morte de Felipe. Em relação
a 2012, os casos de roubo deste ano aumentaram em 55%. Foram
41 casos em 2011, 60 em 2012, 72 em 2013 e 93 até setembro de
2014. O convênio com a PM assinado pelo reitor João Grandino
Rodas em 2011, que estabeleceu os trâmites para a entrada da po-
lícia no campus, vence em 2015.
Do episódio da USP aos protestos de junho, pouco mudou.
Novamente, a polícia caía na velha estratégia apontada por Mas-
sera de ser o inimigo comum que alavanca um movimento sem
93
respaldo. Mas, se é tão velha essa estratégia, por que sempre fun-
ciona? “Não é que a polícia cai, a polícia não tem alternativa. A po-
lícia é o ultimo dos remédios, apesar que muitos políticos vêem
como único. Mas é um remédio que sempre traz efeito colateral.
Quando você aplica a polícia numa manifestação em que o objeti-
vo dos manifestantes é buscar o confronto, o confronto vai existir
e a polícia não tem como controlar isso se não usar da força, da
violência teoricamente legítima.”
Se a corporação não tem alternativa, os policiais muito me-
nos. “Agora o policial é um ser humano. É difícil dosar a violên-
cia quando você precisa empregar a tropa. Porque imagine só,
o policial está ali intacto esperando ordem pra agir ou não. Vai
sendo provocado. ‘Você é um coxinha, sua mulher é uma vaga-
bunda, você é um analfabeto’. E ficam lá provocando. E o policial
engolindo aquilo. A hora que vem a ordem de agir, uma minoria
se exalta, mas eu não preciso de mais que dois ou três policiais
exaltados para provocar aquilo que eles querem. Infelizmente, é
isso.” Massera diz que por excesso de força ou por omissão, a PM
sempre será criticada. Especialmente em ocorrências de reinte-
gração de posse e manifestação.
Ainda assim, seja por sincera opinião pessoal ou porque faz
parte do seu trabalho de propaganda da PM, Massera defende
a atuação da polícia no geral naquele histórico mês de junho e
também nas manifestações contra a Copa de 2014. No caso da
repórter da Folha, Giuliana Vallone, atingida no olho, Massera
espera o resultado das investigações, mas acredita na versão, di-
ferente daquela narrada pela jornalista, de que o policial atirou
para o chão e a bala ricocheteou. No caso do estoquista, Fabrício
Proteus Chaves, baleado por um policial em uma manifestação
em janeiro, Massera é bem menos tolerante.
94
“No caso daquele rapaz... Vou usar o termo correto: aquele
bandido que foi baleado naquela manifestação dos black blocks,
o Fabrício, cabeludo, black block, que estava com um estilete.
Quem faz o treinamento de tiro entende por que o policial atirou.
Uma pessoa com arma cortante, principalmente se a pessoa tem
habilidade para isso, que era o caso dele, estoquista, ela precisa
de poucos segundos pra cortar a jugular de alguém. O policial ca-
ído, ele indo pra cima com instrumento cortante, não tinha outra
alternativa que não arma de fogo. Mas, no momento que a polícia
usa arma de fogo para o policial não morrer, Fabricio passou a ser
um menino, manifestante, jovem.”
Com base na instrução de ação da Polícia Militar, o capitão
justifica o tiro. “A lei diz: você vai usar os recursos disponíveis de
maneira proporcional. Cessada a agressão, cessa a reação. A mor-
te pode ocorrer, mas não é o desejado. Naquele momento, com o
manifestante muito perto, o único recurso disponível era a arma
de fogo. Não tinha como reagir como uma tonfa. Então, é possível
sim você usar arma de fogo contra alguém que venha com uma
faca. Se o policial estivesse em pé, podia recuar, mas ele estava
caído. Era questão de segundos para ser cortado. A orientação, se-
gundo o método Giraldi, é dar dois tiros. Se a pessoa parar, você
para. Se a pessoa continuar, mais dois tiros.”
Massera explica ainda que é impossível exigir que o policial
atire em locais do corpo específicos, como no braço ou na per-
na. Com uma pistola ponto 40 e a uma distância de quatro me-
tros, já não é possível acertar onde se quer. “O policial é condi-
cionado a atirar onde tem mais massa, que é no tronco. Não é
na cabeça, é no tórax. Tanto que os dois tiros atingiram o tórax
de Fabrício. Qual é o objetivo do tiro policial: cessar a agres-
são. E os policiais foram perfeitos nisso. Deram dois tiros, o
95
cara parou e foi socorrido depois. Se não houvesse o vídeo [que
mostra o policial caído], os policiais já estariam presos. Mas
eles agiram sim de acordo com o protocolo.”
Enquanto chefe da assessoria de imprensa da PM, Massera
repete o mantra: “A PM não tolera o mínimo de erro. Quem er-
rou, vai pagar pelo erro. A PM trata o policial que erra com mais
rigor do que o criminoso. Bandido usando farda precisa ser pu-
nido com rigor: é cadeia.” Mas, de novo, o capitão nem esquerda
nem direita também pende para o outro lado e admite: sim, há
violência policial. Sem deixar, é claro, de relativizar: “temos que
levar em consideração que o jornalista só mostra o que quer, aqui-
lo que vai vender. O que derruba a pauta, ele vai esconder. Temos
que ver até que ponto a denúncia é real.”
Se a violência da polícia não vem do resquício autoritário
da ditadura, Massera prega que a violência tampouco se cria na
PM. O caráter não pacífico do policial já existe nele desde an-
tes, a PM, porém, potencializa esse perfil agressor ao entregar
uma arma na mão dele.
“Muita gente diz que o policial vem da sociedade, a socie-
dade é violenta e, por isso, a violência na policia é uma repro-
dução da construção social. Que tem muita gente na socieda-
de que tem essa visão de que bandido bom é bandido morto é
fato, que acha que tem que ter violência contra bandido tam-
bém é fato. Vimos o episódio da Sheherazade. O policial que
pensa assim vem mesmo dessa sociedade que também pensa
assim. Mas a polícia não é só uma reprodução da configuração
social. É uma reprodução da configuração social potencializa-
da. Quem quer ser policial? É a pessoa que já associa a PM a
esses valores e a procura porque tem esses valores já incuti-
dos. Geralmente, uma pessoa que tem uma postura mais à es-
96
querda não quer a carreira policial. Quem quer a carreira poli-
cial é mais conservador, mais à direita.”
E aí entra um trabalho essencial da polícia que, quando não é
feito, sobra para Massera, que tem que enxugar o iceberg. A PM
deve, na formação daquele policial, neutralizar sua veia agressiva.
“O treinamento do PM em São Paulo é o mais longo em todo o
Brasil. O policial não sai pra rua com uma arma com menos de 13
meses de instrução. Para soldado, são dois anos de curso, sendo um
de estágio. É muita teoria pra tentar corrigir a carga que ele trouxe da
sociedade. A função da PM, ao contrario do que muita gente pensa,
é tentar depurar essa pessoa que veio da sociedade com uma carga
violenta. Esse trabalho não consegue êxito 100% e muitos policiais
acabam adotando a postura de fazer justiça com as próprias mãos.”
Ainda assim, Massera aponta que o número de policiais que
optam por agir dessa maneira caiu vertiginosamente. Na década de
1980, cerca de 1.500 pessoas morriam na mão da polícia todo ano.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, nos dois primeiros tri-
mestres de 2014, houve 317 ocorrências de resistência seguida de
morte, ou seja, aquelas nas quais houve reação contra a PM e o sus-
peito foi morto. Cabe à PM investigar quais dessas mortes foram
legítimas e quais são resultado da ação dos justiceiros fardados.
O capitão diz que a PM intensificou o controle interno a
ponto de os policiais se darem conta de que não vale a pena ma-
tar. Ele diz que a justiça militar é mais rigorosa e, para os poli-
ciais que ainda costumam vingar morte de PM matando outros
dez bandidos, existe o Romão Gomes, hoje com uma população
carcerária de 187 policiais.
“Todas as mortes provocadas pela PM são legitimas? Eu diria
que não. Eu reconheço que não. Com base em parâmetros inter-
nacionais, quase metade das mortes eu acredito que poderiam
97
ser evitadas. É aquela situação em que está só o bandido e o poli-
cial, o ladrão reage, mas o policial tem a opção de pegá-lo vivo ou
morto e escolhe pegar morto, porque não tem nenhuma testemu-
nha e nenhum juiz do mundo vai condenar isso.”
Como sempre, voltamos à sala de aula, único lugar onde o crime
praticado pelo Estado pode e deve ser combatido. “Pode assistir qual-
quer aula”, garante o capitão. “Em nenhum momento se pregam es-
ses valores, pelo contrário. Todas as instruções ensinam a usar recur-
sos menos letais. A carga de direitos humanos direta é pequena, mas
em todas as matérias tem direitos humanos. Se você assistir uma
aula, vai ver que não é essa polícia que a imprensa prega.”
Massera também dá aula na polícia, sabendo que se não for efi-
ciente ali, terá que ser depois para explicar à mídia o inexplicável.
Sua tática, ao falar com seus alunos, parece bastante convincente.
— Quando você executa um ladrão, você está fazendo trabalho
do PM (patrulhando e identificando o criminoso), da Policía Ci-
vil (fazendo um inquérito relâmpago), do promotor (acusando), do
juiz (julgando e condenando), do carrasco (executando uma pena
que nem existe no país), e, em última instância, fazendo o papel de
Deus, decidindo entre a vida e a morte das pessoas. Tirando o car-
rasco que não existe, qual é o menor salário nessa linha toda? É o
seu. Então, ao fazer justiça com as próprias mãos, você está sendo
bom pra sociedade ou está sendo um otário, usado por ela? Quem
assume o risco é você. Mesmo que fosse correto, quem assume o
risco é você. Se a sociedade quisesse que você resolvesse o proble-
ma, existiria uma lei: cabe ao PM, prender, julgar e executar. Se não
é isso que a sociedade quer, você tem que fazer seu papel.
*
Nos tempos de policiamento, Massera teve que por em práti-
ca o que prega. Nada fácil. O capitão já precisou usar a arma em
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algumas situações, mas nunca teve uma ocorrência com morte.
Em pelo menos três ocorrências, atirou contra o suspeito. Em
duas, acertou, mas provocou apenas ferimentos sem gravidade.
“Uma vez perseguindo um bandido, que já tinha atirado con-
tra mim três vezes, acabou a munição dele. Ele jogou a arma, ajo-
elhou e pôs a mão na cabeça. Não tinha testemunha, não tinha
nada. Se eu tivesse atirado nele ninguém iria me condenar por-
que ninguém ia saber a realidade. Eu algemei o ladrão e prendi.”
Massera, mesmo com toda a experiência, diz que esse tipo de
ocorrência abala o psicológico. “Eu já tenho uma tendência a tre-
mer, depois de uma ocorrência como essa, minhas pernas come-
çaram a tremer, demorei mais de 15 minutos pra voltar à calma.”
Mesmo que o policial envolvido não apresente nenhum trans-
torno evidente, ele defende o afastamento da atividade policial
depois de ocorrências violentas. Como não é todo dia que tem
ocorrência de tiroteio, são poucos policiais que são afastados para
receber apoio psicológico, o que não afeta o efetivo da tropa e
nem o policiamento. Enquanto a PM exalta essa medida de afas-
tamento, muitos policiais detestam ser retirados da rua, princi-
palmente porque têm a rotina alterada, prejudicando os bicos.
O capitão diz que não sente raiva dos bandidos e ensina os
alunos a controlar esse sentimento. A raiva atrapalha o raciocínio.
“Por mais que seja difícil, você está vendo alguém atirar num pai
de família, um estuprador –nossa! não existe nada mais terrível
do que isso–, na hora você tem que ser profissional.” Em certa
ocorrência, Massera prendeu um suspeito com uma mulher se-
questrada no porta-malas. Ao levá-lo para a delegacia, ouviu dele
algo inesperado:
— Tenente, gostei da sua postura.
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Massera achou estranho. Percebeu que se o bandido falara
aquilo, é porque algo andava errado na polícia.
— Que postura você gostou?
— Você me prendeu, me tratou dignamente, me conduziu pra de-
legacia, não me esculachou, você fez seu papel de policial e eu tiro
o chapéu pra isso. Eu faço meu papel de bandido e você de policial.
Eu tento, hoje eu me dei mal, mas você agiu de maneira nobre.
Uma das ocorrências que mais marcou o capitão foi um as-
sassinato que aconteceu bem na sua frente. De madrugada, Mas-
sera fizera um bom flagrante. “Seis motos estavam praticando
crimes em Moema. Eles roubaram um grupo de rapazes num
barzinho. As vítimas ligaram pro 190 e eu estava com uma opera-
ção na avenida Indianópolis. Eu tinha viaturas em todas as saídas.
E consegui fazer o cerco. Das seis motos, eu peguei quatro. Seis
ladrões. Foi demorado, cheguei às 3h na delegacia e sai às 17h. O
estresse da atividade burocrática é terrível.”
Voltando para entregar a viatura no quartel, já que seu tur-
no já havia acabado desde às 8h, Massera viu uma pessoa ati-
rando em outra. O capitão conseguiu prender o atirador e,
enquanto outra viatura o levava para a delegacia, Massera foi
socorrer a vítima, que perdeu massa encefálica e acabou mor-
rendo antes de chegar ao hospital.
“Me arrepio porque esse caso foi terrível. Quando eu voltei,
o filho dele estava esperando por notícias. Terrível. Acabei ten-
do que dar a notícia da morte do pai e ver o desespero daquele
menino. Devia ser um rapaz de uns 20 anos. Saiu chutando,
quase quebrou uma placa de trânsito. Acho que a pior coisa da
vida é dar uma notícia como essa.”
100
“Essa ocorrência já está fazendo 18 anos e eu lembro dela
até hoje. Lidar com a frustração é terrível. E eu me considero re-
lativamente equilibrado, mas e o policial que tem dificuldades
financeiras, problema com a família, uma profissão não reco-
nhecida, estressante, tem que fazer bico, como ele lida com es-
sas situações? Qual é a capacidade de resiliência desse policial?
Se uma situação como essa me marcou a vida inteira, imagina
uma pessoa que não tem a mesma estrutura que eu pra supor-
tar isso? Muitos sociólogos, jornalistas, filósofos, colocam o cri-
minoso como uma vítima da sociedade. E o policial que comete
esses abusos também não seria uma vítima da sociedade? Con-
viver com a violência durante todo o tempo numa carreira ex-
tremamente difícil não torna o policial mais violento? Das duas
uma: ou a violência é banal pra ela ou a pessoa acaba se tornan-
do violenta também”, diz Massera em tom de desabafo.
Massera já ficou entre a vida e a morte várias vezes. Já teve
medo de morrer. Se lembra de uma negociação durante um se-
questro. O sequestrador com a arma apontada para a cabeça do
refém. Massera e um delegado negociando. O delegado, na certe-
za de que o sequestrador iria se entregar, colocou a mão no om-
bro dele. O sequestrador levantou a arma para atirar, Massera se-
gurou o tambor e começou a lutar com ele. “Se eu perco ali, ele
me dá um tiro. Quando termina, você pensa: não sei se deveria
ter feito isso, mas pelo menos eu salvei uma pessoa e deu certo.
Será que a próxima vai dar certo?”
*
Se um dia Massera contou ao pai que queria seguir sua car-
reira militar, agora ouve a mesma coisa do filho de 17 anos. Se for
mesmo essa a vontade dele, o pai o apoiará, mas preferia que o fi-
lho fosse médico ou engenheiro. No caso de ser mesmo policial, o
101
jeito é torcer para terminar bem os 30 anos de carreira. Os dois já
conversaram bastante sobre o assunto, afinal, o capitão conhece
os dois lados dessa moeda. “É uma carreira gratificante, você não
se realiza em outra, mas tem duas coisas que ponderar: o risco
elevado e o reconhecimento social. Você vai ser frustrado e sub-
metido a um grande risco.”
Até agora na carreira, a recente cirurgia de hérnia de disco
na coluna por causa de ficar sentado muito tempo na frente do
computador foi a única sequela de Massera. Mas ele pensa no
pior: “a morte é algo muito próximo.” Separado, seu filho é o
único que ainda depende dele. O capitão já o deixou totalmente
amparado por via das dúvidas. “Mas o trauma de perder um pai
não é fácil. Eu não quero isso pra ele não. Quero morrer velhi-
nho”, diz dando risada.
Depois da separação, Massera se define como um solteirão
convicto. Sem dúvidas, parece muito feliz com a condição. Aos 42
anos, vive livre e leva sua rotina de maneira prazerosa. O capitão
gosta de correr, ir ao cinema (chega a assistir duas ou três sessões
no mesmo dia) e sair para jantar ou curtir um bar. No sábado, é
quando pode colocar a vida em ordem: leva a roupa na lavande-
ria, lava o carro, caminha, almoça na padaria, arruma a casa e sai,
geralmente, para ir ao cinema.
Massera nasceu e foi criado em São Paulo. Como o pai era PM
e policiais nunca receberam bem, o capitão diz não ter tido uma
infância muito fácil. Não passou fome, mas não tinha luxos e se
lembra bem dos três ou quatro brinquedos que teve. Nascido no
Ipiranga, foi criado em São Mateus, onde morava com os pais e
a irmã três anos mais velha em condições precárias de moradia e
saneamento. “Dos meus colegas de infância, dois ou três entra-
ram na polícia, uns 20% foram presos e o resto morreu. Essa é a
102
realidade da periferia.” Seu Jair morreu em 2001, um ano antes
da mulher. Naquele mesmo ano, Massera foi morar sozinho.
Pouco antes de entrar no Barro Branco, Massera ficou noi-
vo. O noivado durou até dois anos depois do fim do curso de
oficial, acabando em 1996. Duas semanas depois da separa-
ção, a noiva disse que estava grávida. “Não vou voltar atrás na
minha decisão: assumo meu filho, mas a minha decisão é irre-
vogável.” Assim sendo, o capitão se casou com outra mulher,
com quem se relacionou de 1996 a 2009. “O problema não
são as mulheres, sou eu”, ele brinca.
O oficialato deu a Massera a possibilidade de ascensão social.
Seu filho, por exemplo pôde estudar em escola particular e agora
faz cursinho para entrar no Barro Branco. O capitão acumula sua
função no Centro de Comunicação com a de professor no Barro
Branco e na Escola de Sargentos, embora já tenha dado aula em fa-
culdade e cursinho. Seu salário varia de acordo com as aulas, mas
geralmente recebe R$ 19 mil brutos e R$ 12 a 13 mil líquidos.
“A perspectiva que a vida me dava aos 15 anos não era tão boa
quanto a realidade de aonde eu consegui chegar hoje, graças ao
sacrifício do meu pai e ao meu esforço também. Eu sou exata-
mente aquilo que eu queria ser em termos de realização pesso-
al. Eu tenho a possibilidade de ajudar pessoas, mesmo em uma
atividade administrativa.”
Em 1990, quando entrou na PM, ser policial era um orgulho,
um status, conta Massera. Em 2014, todo mundo esconde a iden-
tificação militar –seja por medo da violência contra PM, seja pela
“campanha” contra a PM na mídia e na área acadêmica. A socie-
dade não os reconhece mais.
Para ir à padaria naquela manhã, Massera deixou a identi-
ficação em casa. Por questões de segurança, claro. Garoto pro-
103
paganda da instituição, nunca terá vergonha da sua profissão.
Justo o contrário.
“Eu continuo tendo orgulho. São poucas as categorias que
tem oportunidade de ajudar pessoas como a polícia tem. Pra
mim, a farda é um símbolo daquilo que lutei a vida toda: a jus-
tiça e o serviço à população.”
105
Estereótipo
Se eu não matar, eu que vou morrer.
Rubens, ex-soldado da Rota
— Mas o que você acha daquela Sheherazade do SBT? –pergunta
direto ao ponto, depois de ter lançado sem pudor toda sua conde-
nável filosofia de vida.
Cala-se à espera de uma resposta. A ausência da voz forte e
grave cria um silêncio constrangedor. Ele se rende:
— Eu acho que ela fala a verdade.
Rubens é desses para quem direitos humanos deveriam va-
ler só para humanos direitos. Ele materializa os estereótipos
106
do policial militar –da defesa de morte aos bandidos à cara de
mau. O incrível é que, em vez de ser escolhido o “funcionário
do mês”, acabou expulso da corporação. Ainda assim, brada sua
intolerância aos que chama de “vagabundos”. Mas é preciso dar
um desconto ao ex-soldado. Deve ser mais difícil ver criminosos
com bons olhos quando um deles atira em você pelas costas.
Ele tinha 23 anos. Foram cinco dias na UTI do HC, vinte e
oito dias no quarto andar e um mês e meio no Hospital Militar.
Baleado em agosto, ele voltou para a rua em fevereiro. “Eu tinha
que voltar pra provar que não ficou nenhuma sequela”, diz.
O ex-soldado tem boa memória. Volta como se fosse ontem ao
30 de agosto de 1982, época em que a polícia não tinha colete a
prova de bala e usava três oitão. “A gente estava na zona norte. O
Copom irradiou uma ocorrência do outro lado da norte. Era uma
segunda-feira fria. Nunca vou esquecer.”
Com quatro policiais, a viatura fazia o caminho da Cachoeirinha
para o Jardim Brasil. Em uma travessa de chão batido de uma avenida,
viram um carro suspeito com a lanterna acesa. Quando a viatura vol-
tou, o carro já estava com as portas abertas e os passageiros corriam.
“Eu, como era moleque novo, corria, saí que nem um doido na frente.”
Perto das 23h, a rua era bem escura. Rubens não viu que
“um dos elementos” tinha se escondido. Quando o policial pas-
sou correndo, ele atirou.
“Pegou nas costas, aí eu rodei. Fui trocando tiro com ele. Ele
atirando, eu atirando. Eu saí baleado, ele saiu baleado. Aí eu não
lembro mais nada. Me socorreram no pronto-socorro da Cacho-
eirinha”, Rubens conta.
“Eu senti na hora que eu tava morrendo. Você escuta as coi-
sas muito longe, sabe? É muito rápido, é muito rápido. ‘Eu vou
morrer’. Aí você fica fraco.”
107
Rubens entrou na Rota (Rondas Ostensivas Tobias de
Aguiar), o 1º batalhão da tropa de choque da PM, aos 21 anos.
Fez o curso de soldado da Polícia Militar aos 20 –na época, eram
seis meses de curso e três meses de estágio. Rubens começou
na 1º companhia da Rota, que era vespertina até que o primeiro-
-tenente Conte Lopes foi promovido a capitão e assumiu a com-
panhia. Lopes fazia questão que sua companhia fosse noturna,
e Rubens foi trabalhar durante a noite.
Conte Lopes, ex-capitão da Rota, foi, portanto, um dos seus
mentores. Lopes seguiu a carreira política, tendo sido deputado
estadual em São Paulo de 1986 a 2010. Em 2012, foi eleito ve-
reador da capital e, ao lado do ex-tenente-coronel da Rota Paulo
Telhada (PSDB) e do ex-comandante-geral da PM Álvaro Camilo
(PSD), compõe a chamada “bancada da bala”. Entre seus proje-
tos de lei, está a proposta de proibir utilização de vias públicas
para realização de bailes funk, por exemplo.
Lopes é conhecido por ser um dos policiais mais matadores
de São Paulo, com ao menos 40 mortes assumidas na carreira.
Enquanto ele alega nunca ter matado inocentes, o livro Rota 66,
de Caco Barcellos, lançado em 1992 e que investiga assassinatos
cometidos pela Rota, mostra o contrário. Em 2014, Lopes foi can-
didato a deputado federal pelo PTB, mas não se elegeu.
Ao contrário do chefe, porém, Rubens não quer saber de polí-
tica. “Eu odeio político. Odeio política, odeio o PT. Não me desce.
Muita roubalheira que a gente fica sabendo, muita coisa errada. A
polícia tinha que ser totalmente independente de política, de gover-
no, tinha que ser uma coisa separada. Durante quatro anos um go-
verno fala ‘ó, quero a polícia verde’. Aí muda, vem outro cara lá: ‘ó,
eu quero a polícia branca’. Você dança conforme a música. Não é
assim que funciona a coisa. É polícia ou ladrão, é certo ou errado.”
108
A revolta é por causa das decisões políticas que interferem
no funcionamento da polícia. “Entra um governador corrupto
lá, safado e aí? Tira os caras bons. Na época que eu estava na
Rota, tiraram o Capitão Conte que era um cara de frente, um
comandante de frente. Jogaram ele para... acho que foi pro [ba-
talhão] 19, na zona leste, depois jogaram ele pro Hospital Mi-
litar. Aí tiraram um capitão do hospital, que nunca trabalhou
na rua, pra comandar uma companhia de Rota. O cara não tem
noção nenhuma, tudo política.”
“Na época que o Montoro ganhou a eleição pra governador
[1983], ele queria acabar com a Rota e com o Dops (Departamen-
to de Ordem Política e Social). Só que fizeram uma pesquisa an-
tes com a população e 85% era favorável à Rota. O Dops ele aca-
bou, mas com a Rota não podia. O que ele fez? Se eu não posso
acabar com a Rota, então vou tirar os caras bons de lá. Tira o Ca-
pitão Conte, tira o Capitão Cora, tira o Tenente Salgado, que são
linhas de frente e que estão junto da tropa. Aí coloca uns caras
que são zero à esquerda, que trabalharam atrás de uma escriva-
ninha, que nunca trocaram tiro com vagabundo, que nunca fo-
ram pra rua”, desabafa Rubens. “A política é essa, eu não gosto
de política, acho que tudo é errado.”
Talvez, justamente por ter entrado na Rota quando essa
“limpeza” estava em curso, Rubens não tenha testemunhado
a ação dos esquadrões da morte enquanto soldado. Ele jura
que na sua época eles já não existiam, embora muita gente
falasse que sim.
O primeiro esquadrão da morte foi formado no fim dos anos
1960 e era comandado pelo delegado e chefe do Dops, Sérgio Pa-
ranhos Fleury, de forma que as mesmas técnicas violentas usadas
pela ditadura foram aplicadas também aos criminosos comuns.
109
Rubens, aliás, prefere a ditadura. “Não é essa pouca vergonha
que é hoje em dia. O cara rouba, você sabe que ele roubou e você
não consegue pôr ele na cadeia por causa da lei.”
“Que democracia é essa? Democracia na cabeça desses ca-
ras é sinônimo de baderna. Eu não entendo essa democracia,
não entendo. Democracia que nego rouba, esse Mensalão... Os
caras roubaram pra caramba. Democracia e os caras ficam na
cadeia na maior mordomia.”
Ele explica, porém, que a polícia não tem nada a ver com a di-
tadura, como as pessoas pensam. “Pensam isso por causa da farda
militar, mas não tem nada a ver. [A polícia] está na mão da Dilma,
na mão do Lula. O Lula é liso, ninguém pega esse cara. Pra mim,
ele é um tremendo de um safado. Não vale nem a água que bebe.”
O ex-soldado diz que a preferência pela ditadura é estritamen-
te pessoal e que ele nem gosta do militarismo, por exemplo. “Eu
era consciente que tinha que andar com a farda passada, minha
bota tinha que estar engraxada. Mas moleque [oficial] chega lá na
Rota, você que tem 20 anos de polícia tem que falar pra ele ‘sim,
pois não, seu tenente’ e chamar de senhor.”
Voltando aos esquadrões, Rubens garante que já não exis-
tiam na década de 1980. “Na minha época já não tinha mais.
Na época do meu pai tinha. Eu era moleque, meu pai falava. E
lá onde eu morava de vez em quando aparecia cara morto. Dizia
meu pai que deixavam os caras lá mortos, matavam e jogavam
lá. Eu era moleque, bem moleque.”
Do pai, ex-policial rodoviário, Rubens herdou o gosto pela po-
lícia e por moto. Tendo sido expulso da primeira, hoje se dedica à
segunda. Ele transporta motos, estudou em escola pública, está no
terceiro casamento, tem um filho de 27 anos e, pela primeira vez
na vida, mora em uma casa própria: um apartamento no Piqueri.
110
Rubens não tem curso superior. Tinha planos de fazer Educa-
ção Física depois que saiu da polícia, já que havia sido efetivado na
parte administrativa do cursinho Objetivo, onde trabalhava antes
como segurança, e então podia fazer cursinho sem pagar. Mas aca-
bou sendo chamado para trabalhar no Banco Digibanco, da Sharp,
onde foi promovido a chefe de contas correntes. Estava satisfeito
com o emprego, mas a Sharp faliu. Quando o banco foi comprado
pelo Banco Pontual, ainda foi trabalhar na gráfica da Sharp, que
fazia os manuais dos produtos eletrodomésticos. “Aí, infelizmen-
te, o seu Matias faleceu num acidente de helicóptero em Atlanta
em 1994. Em 2000, a Sharp pediu concordata.” Rubens abriu en-
tão uma lanchonete, depois um estacionamento, voltou a trabalhar
como segurança –para o presidente da Sony e para a dona do sho-
pping Eldorado–, até chegar ao negócio das motos.
Mesmo como segurança, teve pelo menos uma ocorrência
memorável. Enquanto a dona Maria Helena, proprietária do El-
dorado, fazia compras com os filhos em algum “shopping chi-
que”, os seguranças do estabelecimento pediram ajuda pra dois
dos seis seguranças que a acompanhavam. Homens haviam se-
questrado um rapaz e usavam seu cartão de crédito no shopping.
Rubens e Moacir prenderam os sequestradores na saída do local e
os entregaram nas mãos da polícia antissequestro. A melhor par-
te: Maria Helena nem ficou sabendo.
“Eu não sei o que é tirar 30 dias de férias acho que desde que
entrei na polícia. Nunca tirei férias 30 dias. As vezes que tirei fé-
rias na polícia foi pra fazer bico. Descansar 30 dias? Não sei o que
é isso. Não me lembro.”
A rotina de Rubens quando trabalhava na Rota era pesada. Pe-
gava serviço como segurança no cursinho Objetivo na Teodoro
Sampaio às 9h e saía entre 13h e 14h. De lá, ia para o quartel da
111
Rota, um prédio antigo e amarelo na avenida Tiradentes. Almoça-
va, descansava, fazia educação física às 16h. O expediente começa-
va às 18h. Ouvia as instruções e ia pra rua uma hora depois. Sem
ocorrências graves, estaria de volta no quartel às 3h e em casa às
4h –morava em Santana na época. Trabalhava na Rota uma noite
sim, uma não. No dia seguinte, levantava às 8h para ir para o Ob-
jetivo. Depois, até às 22h, era segurança na Companhia Atlética do
Brooklin. O terceiro bico era no restaurante Bistecão na avenida
São João, onde ficava até fechar.
Hoje, fora da PM, Rubens percebe o tamanho do desgaste.
“Você entra num sistema que você faz parte e não percebe. Hoje
eu vejo que ali no dia-a-dia é estressante.”
Os três bicos foram a forma que Rubens encontrou de se
sustentar com salário de soldado sem ser corrupto. “Polícia
corrupto é pior que ladrão”, diz. Lembrando que, pra ele, la-
drão tem que morrer. “Ó, vou te resumir, vagabundo de pre-
ferência morto. Não importa a forma que você matou, é vaga-
bundo tem que morrer. Ponto.”
Rubens acredita que os professores e os policiais tinham
que ser mais valorizados pelo Estado. Ganhar um salário bom
para, na folga, “poder curtir a família e os filhos.” O bico tira
o tempo da família. “Se você tem um bom salário, se você tem
uma folga, se você tem tempo de ficar com a sua família, eu
acho que seria bem diferente”, diz.
Além disso, Rubens conta que os PMs não tinham apoio para
estudar. “Na própria polícia tem oficial que não gosta de ver um
praça fazendo faculdade, não é interessante pra ele. Não sei se
mudou, mas, na minha época, eu lembro que tinham muitos po-
liciais que estudavam e que tinham seus horários atrapalhados só
para que se prejudicassem na faculdade.”
112
Mas, se essa vida de soldado da Rota era ingrata, Rubens
ainda estava por descobrir. De um dia para o outro, perdeu
tudo. Foi a pior parte de sua vida. Foi preso, a mulher o aban-
donou, vendeu sua moto e, por infeliz coincidência, o irmão
bateu seu carro. Tudo na mesma época.
“No fim de semana, quando eu via meu filho, ele segurava
na minha blusa e falava ‘quero meu pai, quero meu pai’. Ali aca-
bava o mundo pra mim.”
Foi em 1988. Um carro roubado. Cinco suspeitos (ou cinco
“vagabundos”). “Foram os cinco para o saco”, mas Rubens tam-
bém “rodou”. Ele e os colegas foram presos sob suspeita de exe-
cução. Enquanto muitos criticam a omissão da imprensa e a im-
punidade da polícia nesses casos, Rubens vê diferente. Para ele, a
“Rede Globo e os Direitos Humanos meteram o pau” e “a polícia
manda embora, não ta nem aí.”
A Rota patrulhava em Itaquera, quando viu um carro roubado
e foi abordá-lo. Os suspeitos saíram em fuga. Houve persegui-
ção. De dentro dos carros, suspeitos e policiais trocavam tiros. Os
suspeitos foram baleados e, numa curva de uma rua de terra, ca-
potaram o carro. “Aí socorremos os elementos. Todos morreram.
Tinha um menor, deu muita repercussão porque tinha um mole-
que no meio, 14 anos na época.”
Segundo Rubens, os bandidos morreram dos tiros e não do
acidente. Os cinco. Houve a acusação de execução. Algo lógi-
co devido às circunstâncias da ocorrência. Algo quase óbvio se
tratando de um policial que prega o assassinato contra o cri-
me. Mas Rubens nega ter matado os suspeitos. “Tanto que eu
fui absolvido depois.”
O policial admite, porém, que atira para matar. “A prefe-
rência é que ele morra. Não tenho dó não. Eu saio de casa pra
113
trabalhar, ele sai pra roubar. Atira em quem está na frente
dele e não está nem aí.”
Como de se esperar, Rubens crê que entrar no crime é uma
simples questão de escolha e, pra quem toma essa decisão, não
cabe recurso. Com ele, vagabundo não tem vez. “Eu tive chance
de fazer coisa errada na minha adolescência e nunca fiz. Eu fui
criado numa vila, um monte morreu. Um monte. Pessoal fuma-
va maconha, ladrão, falecia um monte lá. Poderia ter tomado
esse rumo, mas meu pai me ensinou. Esse negócio de falta de
oportunidade eu acho uma tremenda safadeza. Se você quer tra-
balhar você arruma emprego. Nem que seja pra varrer o chão. Eu
mesmo, quando eu saí da polícia, estava há dez anos na PM. Eu
era militar, não era mais paisana. Eu vi o mundo desabar. Mas eu
nunca desisti. Eu trabalhei, tive lanchonete, tive estacionamen-
to, fui gerente em loja no Brás, fui segurança...”
Rubens teve que reconstruir a vida depois daquela ocorrência.
“Saiu no jornal, televisão, Jornal Nacional... Só que a Rede Globo
manipula tudo. Eu não gosto da Globo. Eu acho que eles dão a
notícia que eles querem, manipulada pelo governo. Hoje ela está
mais ligada ao PT, não sei, não gosto. Aí alegaram execução e a
polícia mandou a gente embora.”
Sua cunhada era oficial da PM e também o acusou. Chamou-o
de assassino e disse que a Rota fazia lavagem cerebral. “Você é te-
nente lá no seu quartel, aqui na minha casa mando eu”, ele retru-
cou. Mas já era tarde. Sua mulher saía pela porta carregando o filho.
Rubens acha que seu caso foi político. Que ele foi usado como
bode expiatório, tanto que a acusação e a prisão foram rápidas.
Só a absolvição é que demorou. O julgamento foi em 1994. Ele,
então, moveu uma ação contra o Estado para voltar à PM, mas o
prazo para fazê-lo já havia passado. “Segundo o juiz, você pode
114
mover uma ação contra o Estado em até cinco anos. Mas antes
disso, eu não sabia se eu ia ser inocentado ou culpado”, diz.
Ele ficou no reservado (a polícia da polícia) por 18 dias. “É tor-
tura psicológica”, diz Rubens. “Você fica já numa celinha que só
tem uma janelinha. Um espaço 2 x 2 ou 2 x 3, deve ser. Aí toda
hora tem interrogatório, de madrugada, de manhã, você já não
sabe quando é dia, quando é noite, é tudo escuro. Tortura psicoló-
gica. Não provaram nada contra mim.”
Ainda assim, passou mais três meses no Romão Gomes, o
presídio militar. O inferno para Rubens. “Liberdade não tem pre-
ço. Eu, um policial, sempre trabalhei corretamente, nunca peguei
uma bala de ninguém, me vejo preso por causa de vagabundo.”
No Romão Gomes, a distinção entre “policial assassino” e “poli-
cial corrupto” guiava a dinâmica social. Para Rubens, os primeiros
eram heróis e os segundos, a escória da polícia. Ele conta que tinham
direito a uma ou duas horas de sol, “de resto, todo mundo no xadrez”.
“Policial ladrão tinha mais mordomia do que policial que matou
vagabundo. Você era obrigado a ouvir nego falar assim: ‘Eu matar
vagabundo? Eu não! Não sou trouxa’. Tinha um monte de polícia
ladrão, drogado, maconheiro. Nem ficavam no nosso lado, nem vi-
nham conversar com a gente. A gente era tachado como assassino.”
Em abril deste ano, o presídio Romão Gomes completou 65 anos.
Segundo reportagem do G1 do ano passado, 184 das 225 vagas esta-
vam ocupadas. Entre os detentos, 96 foram presos por homicídio e
47 já foram excluídos da PM. A exclusão não vem necessariamente
no momento da prisão e, para alguns presos, pode nunca acontecer.
Além do homicídio, as outras violações mais comuns são crimes se-
xuais e roubos. Os presos mais recentes ficam em uma cela 22h por
dia. Depois de meses, segundo avaliação psicológica, podem se mu-
dar para um alojamento e frequentar algumas partes do presídio.
115
Quando a mãe visitou Rubens no Romão Gomes, disse que ha-
via males que vinham para o bem. Antes preso do que morto ou
numa cadeira de rodas, ela pensava. Pelo visto, a marca da bala que
o filho levara anos antes era tão nítida nela quanto nele.
Em três meses, houve a primeira audiência com o juiz e o
advogado de Rubens –pago através de uma vaquinha do pes-
soal da Rota– conseguiu suspender a prisão preventiva. O ex-
-soldado Rubens pôde responder em liberdade.
A expulsão da PM foi um golpe certeiro. Ele, que defendia a
corporação, que tinha três bicos para conseguir ser um policial
honesto, que amava a farda, estava expulso. “Você está traba-
lhando num dia, no outro, está na cadeia.” O pior: Rubens tem
absoluta certeza de não ter feito nada errado. Anos dedicados,
um trabalho impecável e, sem motivo, você está fora. Sozinho.
De um jeito ou de outro, o caso de Rubens é de injustiça. Se é
mesmo inocente como alega, sofreu preso sem motivo. Se é cul-
pado, pior ainda –acabou absolvido.
“Matei vagabundo, não matei pai de família. Não me conside-
ro um assassino. Considero que o que fiz tava certo. Tanto poda-
ram [a PM] que está essa porcaria que está hoje esse país.”
Rubens explica que não é contra a fiscalização e a punição na
PM. Desde que para o alvo correto. A Corregedoria é um “mal
necessário” que deveria ser usada para policiais corruptos e não
para “policial que matou vagabundo”.
“A polícia está cheia de corruptos”, diz Rubens e denuncia que,
para eles, a impunidade reina. Para os que matam criminosos, o
contrário: “se ferra, mandam embora”. “O mau polícia tem que ser
escrachado, tem que ser retirado da corporação. Mas o bom polícia,
o pessoal não valoriza. Para polícia que trocou tiro com vagabundo,
eles deviam contar até dez, ver direitinho [antes de punir].”
116
O Proar (Programa de Acompanhamento a Policiais Militares
Envolvidos em Ocorrências de Alto Risco), que existe justamente
para auxiliar os policiais que mataram alguém em serviço, Ru-
bens vê com maus olhos.
“Pra mim não ajuda em nada, só atrapalha o bico do polícia.
Você quer ajudar o polícia? Dê um salário correto pra ele. A fer-
ramenta do pedreiro é a colher de pedreiro. Se cai do andaime e
cai na cabeça de alguém, pode matar. A ferramenta do polícia é a
arma. Ele pensa muito rápido, é segundos. Se, por um acaso, ele
errar um tiro e pegar uma pessoa inocente, é a ferramenta de traba-
lho dele. O policial, antes de qualquer coisa, ele é um ser humano,
ele não vai querer matar um pai de família, não vai querer matar
uma pessoa inocente. Mas está arriscado a acontecer um acidente.
Só que a imprensa não vê esse lado, não valoriza o bom polícia.”
Nessa linha, ele defende a ação dos dois policiais do Rio de
Janeiro, que teriam atirado na auxiliar de serviços gerais Cláu-
dia Ferreira da Silva , em março, durante um tiroteio na peri-
feria, e a levaram ao hospital. O caso ganhou repercussão por-
que o porta-malas da viatura abriu e Cláudia foi arrastada por
350 metros. Segundo a Polícia Civil, no entanto, ela não morreu
em decorrência dos ferimentos provocados pelo atrito no asfalto
mas por disparo de arma de fogo.
Após o inquérito da Polícia Civil, os dois PMs foram indi-
ciados por homicídio culposo e mais quatro policiais que par-
ticiparam do resgate foram indiciados por fraude processual.
Assim como Rubens, o tenente Rodrigo Boaventura e o sargen-
to Zaqueu Pereira Bueno foram presos de um dia para o outro.
Os dois foram soltos em 11 de maio, quando o prazo de prisão
temporária expirou, e permanecerão em funções administrati-
vas enquanto durar o processo.
117
“Não dá, não quero acreditar que aqueles caras fizeram aqui-
lo de propósito pra mulher cair do carro. A mulher já tava morta
com o tiro, eu acho. E todo mundo já caiu de pau. Não tem um
respaldo. Você pega uma ocorrência na qual o policial está total-
mente errado e fica a semana inteira divulgando isso, principal-
mente a Rede Globo. Quando a polícia faz uma ocorrência bonita,
os caras falam um minutinho só e já esquecem.”
E continua: “Todo mundo vira as costas pra você. Ninguém
te apoia em nada não. Mas, quando precisa da polícia, corre e
chama a polícia.”
Rubens cita também o episódio do Carandiru –um marco na
história da Polícia Militar de São Paulo. Dessa vez, a semelhan-
ça com seu caso é a condenação política, usada para dar alguma
satisfação à sociedade.
“O pessoal do Carandiru foi tudo condenado. Eles cumpriram or-
dem. Onde é que está o governador, secretário da segurança? Eles tam-
bém têm que ser julgados. Alguém deu ordem. Eles não entraram lá
por eles mesmos. Ficou o dia inteiro pra fazer aquilo lá. Entra, não en-
tra, entra, não entra. A princípio foi ordem do coronel Ubiratan? Foi.
Mas o coronel recebeu ordem do secretário, e de quem veio a ordem?
Veio do governador. Por que tem que ser os polícias a serem condena-
dos? E por que 22 anos pra ser julgado? Pra quê, fala pra mim? Por que
quem morreu lá era inocente? Para com isso... tudo vagabundo”, diz.
Ao todo, 111 detentos foram mortos no chamado Massacre
do Carandiru, quando a polícia entrou no presídio para conter
uma rebelião no pavilhão 9 no dia 02 de outubro de 1992. Em
2014, foram realizados os dois últimos julgamentos de poli-
ciais: foram 73 condenados no total. Devido ao grande número
de réus e de vítimas, o julgamento do foi dividido em etapas,
conforme os andares do pavilhão 9.
118
Na primeira etapa, em 2013, foram condenados 23 PMs da
Rota a 156 anos de prisão pela morte de 13 presos. No mesmo
ano, outros 25 policiais da Rota foram condenado a 624 anos
cada um pela morte de 52 detentos. Em 2014, nove policiais
do Gate (Grupo de Ações Táticas Especiais) foram condenados
a 96 anos de prisão e um a 104 anos pela morte de oito deten-
tos. E, finalmente, 15 policiais do COE (Comando de Operações
Especiais) foram condenados a 48 anos de prisão cada um pela
morte de quatro detentos.
O comandante responsável pela operação no Carandiru, coro-
nel Ubiratan Guimarães, foi condenado a 632 anos de prisão em
2001 por 105 das 111 mortes. No entanto, Ubiratan, que chegou a
se eleger deputado estadual pelo PSD, morreu em 2006, enquan-
to o processo ainda corria em outras instâncias da Justiça.
O então secretário da Segurança Pública, Pedro Franco de
Campos, deixou o cargo após o episódio. Luiz Antonio Fleury Fi-
lho era o governador de São Paulo na época. A Casa de Detenção
do Carandiru, a maior da América Latina com mais de sete mil
presos, foi implodida dez anos depois do massacre.
Enquanto a sociedade civil comemorou os julgamentos,
Rubens não vê sentido algum em punir policiais que, afinal,
resolveram um problema: se livraram de criminosos. “Pra dar
uma resposta pra sociedade? Que resposta? Só morreu vaga-
bundo ali. Morreu pouco, deveria ter morrido mais. Você acha
que tem cabimento bandido se criando na cadeia. Esses caras
tem tudo que morrer.”
Embora sempre defenda a corporação, Rubens diz que não
voltaria para a PM como ela é hoje. Para ele, tudo mudou muito
desde o Carandiru. “A polícia está de mãos atadas, não pode fazer
nada. E não adianta, eu não vou mudar meu modo de pensar.”
119
Se, num milagre, Rubens recebesse o aviso de que poderia
voltar agora para a PM, sua resposta estaria na ponta da língua.
“Se falassem você vai voltar a trabalhar amanhã no sistema que
o governo quer, no sistema de hoje em dia. Você vai receber seus
atrasados e tudo. Eu não quero, eu não volto. Nesse esquema? Fi-
car pagando pau pra vagabundo? Não volto. Hoje é difícil traba-
lhar na rua. Você não tem respaldo de ninguém, é muita pressão,
ninguém te valoriza. Você mata um vagabundo numa quebrada
aí, à noite os caras já põem fogo em ônibus, já faz o diabo.”
Para o soldado, polícia mesmo era aquela da década de 1980.
Na Rota daquela época é que Rubens queria estar. “Na minha
época vagabundo não fazia nome não. Ele fazia nome na favela,
mas a Rota ia lá e sentava o aço, era caixão. Ia morrer. Hoje não.
Infelizmente o crime se organizou e a polícia está estacionada. E
a imprensa tem culpa. Não confio no Datena, não confio nesse
Marcelo Rezende, esses caras tem culpa, eles tem uma parcela de
culpa de estar essa vergonha... de tanto que eles ficam divulgando
aí. Os caras ficam atrás de ibope com a desgraça alheia. Esses Ci-
dade Alerta... Isso tudo pra mim é errado. Tudo errado.”
Atualmente, segundo policiais apontam, existe uma orientação
maior da corporação no sentido de evitar mortes em confrontos po-
liciais. Ao mesmo tempo, a imprensa e a sociedade não toleram a
violência policial como antes, já que a noção de direitos humanos
está mais madura no país, e exercem seu papel de controle, apon-
tando os erros policiais. Mesmo assim os mortos nas mãos de PM
continuam a ser notícia quase diária, do que se conclui que a vio-
lência sistemática da corporação está longe de ser extinta.
Um levantamento para monitorar a violência policial do Nú-
cleo de Estudos da Violência da USP, feito com base em notícias
publicadas em jornais desde 1980 até hoje, mostra o tamanho do
120
desafio. É interessante observar, porém, o papel da pressão social
sobre a polícia. O número de vítimas fatais revela claramente o
efeito Carandiru nos anos seguintes ao massacre, com queda sig-
nificativa de mortos.
Violência Policial no Estado de São Paulo (NEV)
Número de Casos de
Violência Policial
Vítimas
Fatais
Vítimas
Feridas
Vítimas
Outras
Total de
Vítimas
1980 118 123 93 116 332
1981 278 327 208 116 651
1982 137 178 78 31 287
1983 113 118 263 11 392
1984 351 372 276 294 942
1985 298 360 308 51 719
1986 179 195 180 131 506
1987 168 195 85 199 479
1988 189 214 45 6 265
1989 214 278 1462 30 1770
1990 111 140 101 16 257
1991 372 423 125 23 580
1992 97 237 27 13 277
1993 68 54 191 11 256
1994 52 41 123 2 166
1995 55 75 64 2 141
1996 94 75 96 396 567
1997 275 179 328 9 516
1998 319 251 606 468 1325
1999 358 291 379 371 1041
121
2000 428 348 469 44 861
2001 256 219 349 8 576
2002 167 180 157 7 344
2003 178 193 357 12 562
2004 167 154 224 1111 1489
2005 129 108 184 15 307
2006 235 269 357 326 952
2007 206 199 265 417 881
2008 149 126 107 19 288
2009 186 132 163 42 337
2010 86 68 50 11 129
Também por causa do Carandiru, de um modo geral a so-
ciedade paulista (e a PM) deixou de ver o homicídio como uma
ferramenta para solução de problemas, o que explica a queda
de mortes no Estado a partir dos anos 2000. Em 1999, a taxa
homicídios era de 35,27 a cada cem mil habitantes, número
que, em 2013, passou para 10,5.
Segundo a teoria da ação situacional, toda ação, inclusive a cri-
minal, é resultado das alternativas que uma pessoa percebe em
um determinado contexto. Portanto, se uma pessoa opta pelo cri-
me, é porque crê ser a melhor opção naquela circunstância.
Na década de 1960, em São Paulo, o homicídio ganha um
novo significado: passa a ser um instrumento de controle do
crime. Matar os criminosos seria, então, a melhor opção para
acabar com os crimes. Assim, os esquadrões da morte da PM
se espalham na década de 1970. Nas comunidades, por sua vez,
os civis também passam a ver o homicídio como algo eficaz, ge-
rando um mecanismo de multiplicação de homicídios. Como as
122
mortes são praticadas em nome da justiça, o contexto moral per-
mite a ascensão dos homicídios –são tolerados pela sociedade e
pelas instituições de segurança.
Entre 1920 e 1960, o Estado registra menos de cinco homicí-
dios a cada cem mil habitantes. Entre 1960 e 1975, são de 5 a dez
casos. Em 1999, já são 65 mortes em cada cem mil habitantes.
Com o passar das décadas, porém, a situação fica insustentá-
vel. As pessoas começam a matar para não morrer e o contexto
moral é modificado: há uma percepção de que o conflito deve ser
evitado. As instituições de segurança buscam, então, outras polí-
ticas de redução do crime que não o homicídio, o que explicaria,
juntamente com os trágicos episódios da Favela Naval e do Ca-
randiru, essa nova PM “de mãos amarradas” que relata Rubens.
Em 2014, contudo, vemos que resquícios desse pensamen-
to homicida podem ser ainda encontrados na população de São
Paulo –no segmento pró-Sheherazade– e também na PM –no
estereotipado Rubens.
A aversão ao homicídio que se instaura nos anos 2000 segun-
do a teoria da ação situacional faz considerar a explicação oficial
da PM para os episódios de violência: são casos isolados. Os nú-
meros, porém, deixam dúvidas se a morte justiceira cabe aos es-
tereótipos perdidos da polícia ou se é institucionalizada.
Segundo balanço do Fórum Brasileiro de Segurança Pública,
os mortos pela polícia em confrontos em São Paulo foram 397
em 2008, 543 em 2009, 495 em 2010, 437 em 2011, 564 em 2012
e 352 em 2013 –sendo que os dois primeiros números incluem
também mortos pela Polícia Civil. Nos dois primeiros trimestres
de 2014, foram 317 pessoas mortas pela PM de acordo com a Se-
cretaria de Segurança Pública.
*
123
Rubens já é conhecido na padaria. Cumprimenta todo mun-
do, usa o salão do almoço para dar entrevista e ainda pede que
desliguem a televisão –“tá gravando aqui, ó”. Sua fala é curta e
grossa. Enquanto discorre sobre a inversão de valores na socie-
dade, leva uma blusa branca com uma bicicleta desenhada. Tem
o rosto grande, assim como as orelhas e o nariz. A parte da testa
acima do nariz é mais funda, dando a impressão de estar sempre
franzindo a cara, como quem está bravo.
E não é pra menos. Além dos problemas na PM, Rubens teve
uma vida pessoal conturbada. É filho de mãe pobre com pai mui-
to rico, uma relação nunca aceita pela avó paterna. Por isso, não
conheceu o pai e acabou sendo criado pela tia (irmã da mãe) des-
de os oito meses de idade. Tio e tia passaram a ser seus pais (com
registro e tudo) e ele diz nunca ter procurado a família verdadeira.
A mãe biológica morava no Rio de Janeiro e veio visitá-lo em
apenas duas ocasiões, antes de morrer. Rubens tinha cerca de dez
anos. “Eu lembro uma vez só, eu era muito pequeno.”
“Eram seis irmãos. Era complicado. Meu pai era militar tam-
bém, uma pessoa corretíssima. Era difícil eu ganhar um presen-
te. Uma bicicleta, quando ganharmos, era pra seis. Era uma bri-
ga”, conta, mas não mostra mágoas da infância.
Ele era o mais velho –“o primeiro a apanhar”. Tinha respon-
sabilidade sobre os irmãos e começou a trabalhar aos 12 anos, en-
tregando pão em Bragança Paulista, onde moravam.
Atualmente, depois da morte dos pais, não tem contato com
nenhum dos irmãos. A mãe morreu de câncer aos 63 e o pai de
leptospirose aos 71. “Meu pai deixou a casa aqui em São Paulo e
uma chácara e aí... briga de família... eu abandonei tudo”, conta.
“Quando meu pai faleceu, acharam por bem deixar o meu ir-
mão caçula tomar conta da chácara e o dinheiro que sobrasse era
124
pra ele. Meu pai criou meu irmão caçula errado, ele passou muito
a mão na cabeça do meu irmão. Eu não concordava, mas também
não me envolvia. E meu irmão destruiu a chácara.”
O irmão do meio começou a articular uma saída:
— Acabaram com a chácara.
— Não quero saber. Vocês que deixaram o João tomando conta.
Então deixa que ele tome conta.
O irmão insistiu e Rubens cedeu.
— Eu tomo conta, mas do meu jeito, tá bom?
— Tá bom.
“Arrumei tudo. Meu irmão não pagou luz, cortaram luz,
pedi pra religar. Bomba da piscina ele deixou queimar, bom-
ba do poço. Eu fui arrumando tudo devagar, com o dinheiro
que recebia do aluguel da casa do meu pai e coloquei dinhei-
ro do meu bolso também.”
Durante quatro anos, Rubens foi o responsável pela chácara e,
nesse período, começou a se irritar quando os irmãos iam para lá
levando amigos sem ao menos lhe avisar.
“Aí meu sobrinho casou, e a mãe dele, minha cunhada, achou que
o filho tinha que morar na casa do meu pai de graça. Eu falei que o
dinheiro que se ganhava ali era o que sustentava a chácara. Começou
umas picuinhas, umas coisinhas, sabe? Aí eu achei melhor parar.”
Hoje em dia, os irmãos não ligam pra ele e ele não liga para os
irmãos. “Família é bom no retrato dentro da gaveta”, diz.
Com a primeira mulher, Irene, Rubens se casou no civil e na
igreja e teve seu filho Rafael. Com a sua prisão, se separaram em
125
1989. Quando Irene se casou novamente e foi morar na Inglater-
ra, Rafael tinha dez anos e passou a viver com Rubens até que saiu
de casa aos 22. O pai pagou a faculdade do filho na Unip, mas pa-
rou de bancá-lo depois da graduação. “Eu fui dar uma dura nele,
ele ficou bicudo e foi pra casa da tia. Eu falei pra ele ‘tá na hora de
você trabalhar, cara’. Ele chegava da faculdade e ficava com a te-
levisão ligada até uma, duas horas da manhã. Um dia eu levantei
seis horas da manhã e falei ‘vai procurar emprego’. Cheguei em
casa, ele tinha ido embora pra casa da tia.” Ainda assim, pai e filho
se dão bem. Aos 27, Rafael já mora sozinho.
De 1990 até 2002, Rubens esteve com sua segunda mu-
lher, Dalila, que conheceu quando trabalhava na Sharp. O re-
lacionamento acabou quando a sogra morreu. “Ela pirou. Ela
chegava ao ponto de, no domingo, chovendo, ela pegava balde,
rodo, e ia no cemitério lavar o túmulo da mãe dela, debaixo de
chuva. Pirou mesmo. Ela chegava em casa do serviço e ficava
no quarto da mãe dela. Ali ela fumava até não sei que horas
da madrugada e dormia e não tomava banho. Pirou, pirou. Eu
quis ajudá-la, mas ela não quis. Hoje ela está legal. A gente se
fala, ela sabe que, se precisar de mim, pode me ligar. Minha
mulher atual sabe disso.”
A atual mulher, Telma, entrou na vida de Rubens em 2002 e
não saiu mais. “Eu não tenho dívida, meu filho está criado, eu es-
tou casado, a minha esposa trabalha, tenho minha primeira casa
própria, tenho carro, tenho moto”, diz Rubens. No fim, parece
que tudo deu certo. O ex-soldado deu a volta por cima.
“Eu fui revoltado muito tempo. Depois do negócio da polícia,
fui revoltado pra caramba. Mas a vida vai te ensinando.”
A estima pela carreira policial não o deixa esquecer a me-
lhor parte do policiamento: defender o cidadão. “Eu tenho esse
126
raciocínio. Você poder ajudar as pessoas, né? Ser útil à popu-
lação.” A memória da prisão não o deixa esquecer o pior da
profissão. “Claro que ninguém te valoriza. Só vai te valorizar
quando sentir na pele mesmo. Quando ladrão entrar em casa,
barbarizar, fazer o diabo lá dentro. Fora isso, só mete o pau.”
Apesar de tudo, Rubens defende a polícia sem pestanejar.
“Gosto da polícia. Do meu lado ninguém fala mal dela que eu
não deixo. Toda profissão tem um bom e tem um mau. Não vem
querer criticar a polícia 100% que não é isso.”
E, para não ficar 100% nas ocorrências que quase acaba-
ram com sua vida, Rubens narra um episódio especialmente
emocionante que viveu.
“Eu estava saindo da base da Rota, ali na avenida Tiraden-
tes. Nós estávamos já na avenida 23 de Maio, quando passa um
cidadão com uma Brasília bege com o pisca ligado em alta velo-
cidade desesperado. Eu nem sei quem da equipe que falou pra
colar na Brasília pra ver o que tava acontecendo. Quando abor-
damos, era um pai com uma filhinha. Ela estava pronta pra ir a
um aniversário, mas esmagou os dedos na porta do carro.”
O ex-Rota nunca vai esquecer a menininha. Tinha uns três
anos. Estamos ainda nos anos 1980. Era um sábado à tardezinha.
“O pai entrou em pânico e estava levando a menina pro
HC. Ela chorava demais. Estava prontinha já, com vestidinho,
tudo cheio de sangue. Eu lembro que nós paramos a viatura
ao lado do carro e ele falou que a menina tinha se machucado,
tinha prendido a mãozinha, os dedos. Paramos a viatura, ele
parou a Brasília, eu peguei a menina no colo e ela foi no meu
colo na viatura até o HC.”
Enquanto conta a história, Rubens vai mudando o semblante.
Os olhos vão se enchendo d’água.
“Do jeito que ele estava, sozinho e com o pisca ligado, ele po-
dia causar um acidente. Ele nem brasileiro era, falava enrolado,
eu lembro disso. Ele disse ‘eu tinha uma imagem de vocês total-
mente diferente’. Eu até choro.”
Já está às lágrimas.
“E o sangue dela ficou na minha roupa ainda. Acho que foi
uma coisa boa que eu fiz pra uma criança. Criança mexia comigo,
né? Eu acho que foi diferente porque ela parecia uma bonequinha.
E pegou bem o dedo dela. Esmagou, sabe? E ela chorava muito. Ele
mandou uma carta na época agradecendo o que nós fizemos.”
Antes de ir embora da padaria com uma moto na carroceria
da caminhonete, Rubens revela uma última intimidade dos este-
reótipos: eles também choram.
129
Vingança
Os travestis são o grupo mais excluído
com que eu já trabalhei até hoje.
Arruda, coronel
No Ensino Médio, Arruda foi presidente do centro cívico
de sua escola, em Araras. Era uma espécie de centro acadê-
mico, mas com outro nome, já que centro acadêmico era coi-
sa de comunista e vigoravam as regras do governo Geisel. A
escola, a maior da cidade, tinha 3.600 alunos. Quinhentos
deles estavam reunidos em um auditório para ouvir um re-
cado do diretor:
— Atenção, todos! Amanhã tem que pagar a Associação de Pais e
Mestres. Quem não tiver carteirinha vai ser desligado da escola.
130
Arruda resolveu consultar o estatuto e leu no artigo pri-
meiro que a contribuição era voluntária. “Então eu li essa par-
te para o diretor. Maldita hora que eu fiz isso.” Os alunos co-
meçaram a bater o pé no chão gritando “Não paga, ninguém
paga.” Os pais de Arruda foram chamados na escola. Embora
sua relação com a mãe fosse boa, com o pai era diferente. E ele
chamou o filho para conversar:
— Fiquei sabendo que aconteceu esse incidente, você é o presi-
dente do centro cívico e você que liderou isso aí.
— Não é que eu liderei, eu só alertei para o que estava errado e o
pessoal se levantou.
— Disseram na escola que você é uma liderança muito perigosa e
que está a um passo do da liderança estudantil e da luta armada.
É verdade?
— Não, claro que não, pai.
— O diretor disse que se houver outro incidente, vão chamar o
Dops e enquadrar você na 477. Você sabe o que é isso? É o decreto
que dispõe sobre subversão no ensino. Sob esse decreto, o menor
de idade pode ser punido e, se você for condenado, você vai ser
desligado da escola, não pode fazer escola pública, nem estudar
na USP, nem ter diploma reconhecido pelo MEC, nem fazer pós-
-graduação, mestrado e doutorado, não vai conseguir bolsa pelo
CNPQ, Fapesp, não pode prestar concurso público, fazer serviço
militar, nem sair do país. Você tem consciência disso? Você acha
que agiu corretamente?
— Eu acho.
— Eu também acho, filho, mas, por favor, não faça mais nada.
Porque te amamos muito.
131
“Esse ato mudou a minha relação com o meu pai, foi um
divisor de águas, porque, afinal, eu percebi que ele queria
meu bem. Foi muito marcante também pra mostrar o que é
viver sob o regime autoritário. Como os covardes se escon-
dem atrás de um regime. Imagina na época quantos jovens
devem ter sido acusados e acabaram caindo na luta arma-
da, matando, morrendo sob tortura. Totalmente infundado.
O que tinha a ver o regime militar com o fato de eu ter falado
que não precisava pagar a carteirinha? Eu só falei que o dire-
tor não podia nos extorquir.”
Foi ali que Arruda teve um estalo e decidiu seu futuro.
“Vou fazer parte das Forças Armadas. Vou me vingar. Vou me
vingar desse idiota.”
*
Aos 54, Luiz Eduardo Pesce de Arruda é um coronel apo-
sentado, faz parte da reserva da PM. Sentado no auditório da
AACD, na Borges Lagoa, está disposto a narrar toda a sua carrei-
ra para uma platéia vazia. Não, não participa de nenhum evento.
Ele agora trabalha na AACD e não havia outro lugar disponível
onde pudesse contar suas aventuras.
A testa cresce cabeça adentro, roubando espaço dos grisa-
lhos. Tem uma verruga no lado esquerdo do queixo, olhos pe-
quenos e um nariz grande. Maiores, porém, são as orelhas –os
lóbulos, na verdade. Está sorrindo em boa parte do tempo. Gar-
galhadas também não são raras. Um tanto barrigudo, é um co-
roa meia-idade bastante normal.
Arruda entrou na reserva em março de 2013, um feito relati-
vamente simples na carreira militar. “É muito fácil progredir fun-
cionalmente, basta estudar e ter uma boa folha de serviço e você
chega a coronel. A PM é uma das estruturas mais democráticas
132
de acesso de público interno. Eu tenho certeza que tem mais ofi-
ciais que foram praça do que chefes que foram estagiários.”
Como coronel, Arruda recebe R$ 21 mil brutos, mas, segundo
ele, o salário líquido de um coronel é por volta de R$ 12 mil. Ele
mesmo recebe R$ 9 mil, mas porque os R$ 6 mil de pensão do filho
mais velho já são descontados no salário. Na AACD, recebe outros
R$ 9 mil e mais R$ 2.200 por dar aula de comunicação na Fapcom.
O filho mais velho nasceu em 1992, fruto do casamento com
a primeira mulher, Simone. Separaram-se em 1995, ano em que
começou a trabalhar com os Conselhos Comunitários de Segu-
rança (Consegs) e, talvez por isso, tenha se dedicado tanto a eles.
“Eu estava duro porque perdi tudo na separação. Minha proprie-
dade se resumia a uma cama, um armário e um chuveiro no
quartel, além de um fusca que meu pai tinha me dado.”
Hoje, Arruda está com sua casa quase quitada. Também pos-
sui um Corolla e um Celta 2007. O filho Rodrigo estuda Direito
no Ibmec do Rio e trabalha na Agência Nacional de Petróleo.
“Eu namorei mulheres muito interessantes depois, mas sempre
esbarrava no fato de que eu tinha uma relação próxima com minha
ex-mulher, falo com ela umas duas vezes por semana, falo sobre
meu filho. Não sou ex-pai. As mulheres de forma geral não enten-
diam isso e tinham ciúmes, mas a Márcia entendeu muito bem.”
A Márcia entendeu tão bem que chegou a hospedar Simone
doente em sua casa e cuidar dela. Arruda se casou novamente
em 2001. “Ela tem uma cabeça muito boa, uma mulher extraor-
dinária. Ela é pedagoga com ênfase em educação infantil. Ela lê a
criança, é uma coisa impressionante. Sabe quando é dor ou ma-
nha. E a despeito disso, ela não engravidou.”
O casal gastou R$ 70 mil em fertilização. Um dinheiro que,
na verdade, eles nem tinham. Na primeira tentativa, os fetos du-
133
raram três semanas. Na segunda, uma. Márcia sofria com ansie-
dade, estresse, hormônios, exames, dor e ganho de peso.
“Uma mulher quer ser mãe e não engravida... a casa fica um am-
biente de luto permanente. Menstruou, começa a choradeira. ‘Deus
está me punindo’. E eu dizia: Márcia, minha filha, Deus é amor, não
está punindo nada. O casamento vai no limite da existência.”
Márcia e Arruda resolveram, finalmente, tomar a “melhor de-
cisão da vida” deles: adotar. Queriam uma menina. O Fórum li-
gava: “Olha, apareceu uma criança como vocês querem, se a mãe
não aparecer em 15 dias, é de vocês.” Só que a mãe sempre apare-
cia. Márcia chegou a mandar jogar fora o berço e tacou tinta por
cima da decoração do quarto do bebê.
Um dia, o Fórum ligou. Tinham um menino. Um ano e meio.
Pais usuários de droga. A criança fora achada pela PM com sarna e
toda queimada depois de cinco dias sem trocar fralda. A mãe passe-
ava com o carrinho na contra-mão da via expressa da Marginal Tietê.
“Eu vi a foto e achei bonitinho. Cheguei no abrigo, ele esta-
va sentadinho, brincando com um carrinho. Bonitinho, banha-
dinho, com umas roupinhas velhinhas. O tênis escrito ‘A Sta’. O
“L” e o “R” tinham sumido. Era um dia de evento, tinham uns 20
adultos. Quando eu apareci do outro lado, ele abriu o braço, o ros-
to se iluminou, saiu correndo no meio das pessoas, me abraçou
e pediu ‘colo, colo, colo’. Peguei e ele deitou no meu ombro, e foi
uma choradeira. Eu não sou kardecista, mas, se eu fosse, eu diria
que foi um reencontro. Foi impressionante.”
Lucca, a alegria da vida do coronel, nasceu em 2007. Arruda
pretende contar que ele é adotivo quando chegar a hora certa. “A
relação tem que se basear na verdade.”
Arruda é um cara conversador. Fala com as mãos e encena, mas
essa agitação é só a expressão de um cara tranquilo, ou melhor, pa-
134
cífico. “Eu brigo por tão pouca coisa. Porque você vê que não vale
a pena. A vida é muito frágil, muito curta. Não vale a pena... o cara
briga com o irmão e fica 12 anos sem falar com ele por causa de um
pato que a mãe deixou, sabe essas coisas? Eu vi tantas vezes chegar
a hora para os outros. Uma hora vai chegar a minha, mas isso me
fez muito mais feliz porque eu aproveito melhor a vida.”
A última vez que Arruda quase morreu foi para defender um
boliviano em 2000. É 1h da manhã. O policial acaba de deixar Már-
cia em casa e passa em um posto de gasolina, na zona norte, na es-
quina da rua Zilda com a Engenheiro Caetano Alves –a rua do Es-
tadão– para abastecer. De repente, o posto é invadido por 30 jovens
correndo atrás de um boliviano. O boliviano pula para a loja de con-
veniência e todos pulam atrás. Um deles pega um martelo e bate
em alguma coisa que Arruda não consegue ver. Ali, o policial acha
que o boliviano morreu. Mas ele se levanta e corre até uma bomba
do posto. O grupo se dispersa. Arruda chama o 190 e se aproxima:
— Como você chama?
— Reinaldo.
Reinaldo estava bêbado e com o braço fraturado em várias partes.
— Reinaldo, eu sou polícia, vou te levar ao hospital.
— No quiero, no quiero –o boliviano entra em pânico.
Arruda ainda está agachado conversando com Reinaldo atrás
de uma bomba, quando percebe muitas pernas ao redor. O grupo
estava de volta, cercando a bomba.
“Eu estava à paisana, mas armado. Normalmente eu ando ar-
mado. Eu pensei ‘se eu saco a arma, vou ter que matar uns quatro
135
adolescentes classe média no posto’. No dia seguinte, vai sair ‘poli-
cial maluco matou’. Minha mãe vai dizer ‘meu filho era tão bonzi-
nho, ajudava a sustentar a família’. Vai ser aquela coisa que a gen-
te já conhece e não funciona. Mas se eu não sacar eles me matam
agora. Resolvi tentar a contenção verbal. Identifiquei o líder.”
— Você, aqui. Polícia. Cala a boca e olha pra baixo. Dois passos de
mim, não chega perto de mim.
O líder foi ficando quieto. As ameaças de “vamos matar” fo-
ram se calando.
— O que vocês estão fazendo aqui? Quem vocês vão matar aqui?
Filho da puta, vou te jogar numa casa de detenção hoje. Você vai
virar menina hoje, rapaz. Se manda que em três minutos a Força
Tática está aqui.
O grupo foi embora. “Eu pensei, ‘obrigado Senhor’. Arruma-
mos uma tala e eu entalei o braço dele. Legal, né? Eu achei que
fosse morrer esse dia.”
“Não dá muito tempo para pensar quando você acha que vai
morrer. Você só pensa ‘poxa agora chegou minha hora’. É uma
descarga de adrenalina, depois parece que você tomou uma sur-
ra. Sua perna pesa uma tonelada. E você fica ligadaço. Esse dia eu
voltei para a casa da minha noiva e dormi lá.”
Arruda nasceu e cresceu em Araras, no interior de São Paulo.
Tem três irmãos: dois trabalharam no Banco do Brasil e uma irmã
é bióloga. Família de classe média, branca, católica –a elite da cida-
de. O coronel conta que não tinha amigos negros. Judeus, muçul-
manos, evangélicos eram uma realidade tão distante quanto Marte.
136
Ele tem dois parentes militares. Um tio que era capitão, mas
largou a carreira e, no dia da formatura de Arruda como policial,
quase morreu de emoção –teve que ir ao hospital por causa de
uma desfribilação cardíaca. E um tio avô que foi sargento da cava-
laria. Tio Francisco Ferraz de Oliveira era comunista desses que
“levava mendigo pra casa”, fazia parte da Aliança Nacional Liber-
tadora e passou mais da metade da vida na cadeia. Não foi nem
por um nem por outro que Arruda escolheu a carreira militar.
“Eu queria uma missão que me permitisse servir. Queria de-
dicar minha vida ao serviço ao próximo. A primeira coisa que
pensei foi ser padre, mas não pode casar. Sou católico, mas sou
contra o celibato, acho um crime. Não tem nenhum fundamen-
to bíblico, é meramente administrativo e pode ser revogado pelo
papa. Uma grande parte dos problemas que vemos hoje na igre-
ja acontece pelo fato de ela atrair pessoas com questões sexuais
muito mal resolvidas, aí acaba dando em pedofilia.”
Arruda acabou mesmo indo fazer cursinho para prestar con-
curso para as Forças Armadas e, então, ficou sabendo da existên-
cia da Academia do Barro Branco, que formava oficiais da Polícia
Militar. “Comecei a olhar o currículo de uma e de outra, e come-
cei a me interessar mais pelo currículo da PM. Porque a PM tem
mais coisas de humanidades, e nas Forças Armadas é mais exa-
tas, e eu sou muito ruim de exatas.”
Na primeira tentativa, Arruda prestou para o Exército. Pas-
sou, mas não levou. Estava entre os 350 classificados, mas, antes
da matrícula, cortaram cem vagas por questão de orçamento e ele
ficou de fora. No ano seguinte, prestou concurso para a Força Aé-
rea e para a PM. Quando as provas das duas instituições coincidi-
ram, Arruda prestou as da PM. Mas, no teste de condicionamento
físico, caiu fora do colchão e quebrou o braço. Na terceira tentati-
137
va, passou novamente na FAB e na PM. “Minha mãe falava ‘pelo
amor de Deus, criar um filho pra ficar correndo atrás de bandido’.
Todos da família queriam a FAB. Só meu pai disse que se era a
PM que eu queria, era para a PM que eu deveria ir.”
Na tentativa de evitar o que considerava ser uma tragédia, a
mãe mobilizou o único psicólogo de Araras na época. “Um ho-
mem extraordinário, um padre chamado João Modeste. Ela pediu
pra que ele fizesse um teste vocacional comigo. Foi o melhor psi-
cotécnico que eu fiz até hoje. Foi um dia inteiro de teste direto,
entrevista, desenho, mancha de Rorschach, desenho de novo...
Quando ele terminou, disse para minha mãe: minha senhora,
eu sinto muito, mas seu filho vai ser policial mesmo. Minha mãe
chorou”, conta Arruda dando risada.
O padre lhe perguntou:
— Você já fugiu com o carro do seu pai?
— Não.
— Seu irmão tem moto, e você?
— Não, nunca tive. Nem gosto de moto.
— Como você é de matemática?
— Ruim.
“O padre disse ‘ele não gosta de matemática, mecânica, di-
rigir... O que ele vai fazer na FAB?’ E eu fui pra Academia. Sou
muito feliz com a minha carreira. Eu não podia ter escolhido ou-
tra. Fiz exatamente o que quis fazer na vida.”
A maneira mais adequada de contar a carreira de Arruda
na PM é no melhor estilo Forrest Gump –em ordem crono-
lógica dentro de um super flash back baseado quase exclusi-
vamente em sua memória e cheio de gente famosa. A sorte é
138
que sua memória não parece ser das piores: traz muitas datas
e muitos nomes, de modo que vamos ter que nos fiar nela.
Segundo a sua versão de si mesmo, Arruda é um humanista.
Quer dizer, tem o ser humano como maior preocupação e,
dentro disso, trabalha pelas minorias.
“Nós temos que desmistificar os direitos humanos. Direitos
humanos significa um conjunto mínimo de direitos que é atri-
buído para qualquer pessoa pelo simples fato de ela ser pessoa
humana. Quem discorda disso? Quem pode em sã consciência
dizer que isso está errado. Ninguém pode.”
Então vamos do começo. Depois do teste vocacional –o último
recurso de uma mãe desesperada– Arruda entrou na Academia
Militar de Polícia do Barro Branco. Foram dois anos preparatórios
(equivalentes ao ensino médio) e três anos de curso. “Eu vivi in-
tensamente a academia. Eu amei a escola todos os dias que estive
lá.” Arruda também fez teatro e shows no Barro Branco, inclusive
com Adoniran Barbosa. O coronel artista adora música e, além de
compor, escreve também peças de teatro.
Corria o ano de 1981. Da forma mais inusitada, a academia
abriu o caminho de Arruda para a publicidade. Como parte da co-
missão de formatura, ele achou o convite para a cerimônia muito
barroco e rococó –“nossa isso tá muito ruim, né?” Queria mudá-
-lo. Foi em uma gráfica e descobriu que ali só se fazia impressão.
“Falaram que tinha um troço chamado agência de propaganda.”
Arruda então pesquisou e soube da existência de Caio Luis de
Carvalho, grande nome da indústria de eventos no Brasil, além de
ter sido ministro do Esporte e do Turismo, presidente da Embratur e
presidente da SPTuris. Carvalho apareceu no Barro Branco para avi-
sar Arruda de que Roberto Duailibi, da DPZ, o esperava. “Peguei o
ônibus elétrico e levei três horas pra chegar na Cidade Jardim.”
139
Ali, ninguém menos que Washington Olivetto e Neil Ferreira
o ajudaram a melhorar o convite. “Pegaram meu convite e que-
braram no meio, põe um traço aqui, põe brilho, chama o fotó-
grafo, não sei o quê...Eles tinham um Macintosh, uma coisa que
ninguém tinha.” Nasceu outro convite. “Caramba! Como os caras
conseguiram bolar isso? Aí mosca branca me picou.”
— O que vocês estudaram?
— Publicidade.
Arruda decidiu estudar a tal publicidade após a academia. Du-
ailibi o indicou a ESPM, onde estudou de 83 a 86, o que foi essen-
cial para que “voltasse à sua geração”.
“Em cinco anos de academia, eu fiquei alienado da linguagem da
minha geração. Não sabia como ela falava, não sabia mais os dramas
da minha geração, como o desemprego, que estava forte nessa épo-
ca. Foi uma retomada ao meu papel imerso na sociedade. Eu tinha
me isolado na academia, onde você não tem tempo pra nada.”
Além da ESPM, Arruda tinha sua iniciante carreira na polícia.
Nos primeiros quatro anos após a formatura, ele foi tenente de
um pelotão do Comando de Policiamente de Choque. “Participei
de invasão em penitenciária, casa de detenção, manicômio judici-
ário –coisas gravíssimas nessa fase da minha vida.”
O episódio mais significante desses quatro anos foi uma rebe-
lião em uma casa de detenção com nove reféns. O comandante da
operação o mandou entrar com seus soldados para resgatá-los. Ar-
ruda entrou mal armado, conta. Não havia colete a prova de balas
na época. Eram sete no total. Arruda com metralhadora, o sargento
com uma espingarda calibre 12 e soldados com revólver. Entraram.
Alcançaram a divineia, o pátio de entrada do presídio. De repente,
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uma gritaria do lado de fora dos muros. Presos de três pavilhões vi-
nham em uma operação chamada “cavalo doido”. Segundo Arruda,
eram 2.500 presos correndo e gritando com pau, pedra e facão. Do
pátio, os policiais viam a poeira levantando do outro lado do muro
e logo “bum, bum, bum”. Começam a empurrar o portão. O cami-
nho para a rua passa pela divineia. Os policiais pularam para um
cercadinho de tijolo coberto. “Costas com costas. Cada um protege
as costas do outro”, dizia o comandante.
— Seguinte, eu atiro primeiro –Arruda disse aos colegas– E não
percam munição, tem que atirar certo, não pode errar. Vamos
derrubar quanto a gente conseguir aqui e vamos esperar que al-
guém resgate a gente.
“Íamos ser massacrados. E aí os soldados de repente me joga-
ram pra cima na roda e sentaram em cima de mim. Eu comecei
a dar soco: ‘sai daqui’. Eles estavam me colocando embaixo para
me proteger”, conta.
“Essa relação primitiva, pré-moderna, a gente não vê em em-
presas. O cara colocar o corpo dele pra proteger o comandante. Dar
a vida pelo comandante. Como você explica uma coisa dessa?”
O fato é que, na estrutura militar, a vida do comandante literal-
mente vale mais que a do soldado. A hierarquia é respeitada. Mes-
mo entre pessoas do mesmo posto, há hierarquia, segundo o tempo
de serviço. Mesmo entre alunos, há hierarquia, segundo as notas.
Ser sargento é ser mais que soldado. Ser tenente é mais que sar-
gento. E ponto. As pessoas não têm o mesmo valor na corporação.
Ser coronel é ser mais que todo mundo. Arruda chegou lá.
Quem sobe a coronel ocupa o cargo por cinco anos e depois entra
para a reserva –assim outros podem assumir o posto. O número de
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coronéis não varia muito. Geralmente, um só vira coronel quando
outro deixa de ser. Como, na prática, não dá pra deixar de ser coro-
nel, a solução é ir para a reserva. “Na academia, nós éramos 190.
Pouco mais de 50 fizeram o curso superior da polícia, que é o pro-
grama de doutorado da instituição, que habilita a promoção a coro-
nel. Desses, só 23 foram coronéis. É bem piramidal.”
Voltando à divineia prestes a ser invadida, Arruda e os subor-
dinados foram salvos na última hora. Os presos não conseguiram
derrubar o portão, os bombeiros entraram e os espantaram com
jato d’água. Mas Arruda tem uma segunda passagem digna de
nota no Choque: uma enorme manifestação contra os preços al-
tos em São Paulo nos dias 4 e 5 de abril de 1983.
“Um dia de saques e pânico” era a manchete da Folha de São
Paulo no dia 5. “Manifestação de desempregados em Santo Ama-
ro degenera em violência contra o comércio; muitos feridos; 70
presos.” Segundo informações de reportagens da Folha de São
Paulo publicadas no dia seguinte, os protestos, iniciados em San-
to Amaro, tomaram 40 km. No total, foram presos 566 manifes-
tantes, houve 127 feridmos e uma pessoa morreu baleada.
Em março, o governador Franco Montoro, eleito de forma de-
mocrática no ano anterior, havia tomado posse. No governo fede-
ral estava Figueiredo. Desemprego em cerca de 7% nas capitais.
Inflação em 150% ao ano. Recessão pós “milagre econômico”.
“Imagine o seguinte: as Forças Armadas querendo sair do po-
der enquanto era possível manter a dignidade e sair relativamen-
te intocadas, mas havia uma parte dela que não queria a abertura
política. Qualquer oportunidade que eles tivessem, iriam tentar o
fechamento. Havia uma grande divisão das Forças Armadas nes-
se momento. O Geisel quase foi derrubado. ‘Vocês estão venden-
do o Brasil para os comunistas, seus generais de merda’. Houve
142
atentado na ABI, explosão na banca do Estadão, atentado contra
um carro da Folha, atentado do Rio-Centro. De uma forma ou de
outra, todas foram manifestações de inconformismo da ala radi-
cal em razão da abertura política”, conta Arruda.
No dia 5, a manifestação popular chegou ao Palácio dos
Bandeirantes. As pessoas conseguiram derrubar as grades do
palácio, mas foram detidas pela PM. Naquele momento, a po-
lícia, por mais irônico que possa parecer aos críticos, “salvou”
a democracia, segundo Arruda.
“Se a invasão tivesse ocorrido, nós poderíamos ter um grave
risco na democracia. Ficaria evidente que o governo de São Paulo
não teria capacidade de manter a ordem pública e poderia ter tido
interferência federal. A partir daí, já sabemos o que ia acontecer...”
Montoro fez um pronunciamento e denunciou um plano de
desestabilização em São Paulo para permitir intervenção federal.
Depois da fala do governador, o secretário de Segurança Pública,
Manoel Pedro Pimentel, elevou o tom: “a polícia sempre foi acu-
sada de violência, mas agora vai agir sem medo de críticas.” Os
jornais noticiavam que Figueiredo deixara o Segundo Exército de
prontidão. “A violência se alastra e Montoro promete ordem”, era
a capa da Folha no dia 6. As reportagens também denunciavam a
violência na ação da PM para conter os distúrbios.
Segundo Arruda, foram cinco dias de quebra-quebra em São
Paulo. Destruição de trens e McDonald’s no melhor estilo black
block. “Fiquei praticamente cinco dias e cinco noites com o Cho-
que na rua. Meu subcomandante atendeu uma ligação do gover-
nador no orelhão na praça da República. Eu vi essa ligação.”
— Governador, não precisa ter intervenção da segurança federal,
nós temos capacidade, está tudo em ordem, vamos segurar isso aí.
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“Se o Montoro sentisse que ia fraquejar, nós teríamos uma
intervenção federal. Uma perturbação grave ao processo de-
mocrático que tava começando a se implantar. Depois disso,
o Montoro se tornou muito próximo da PM. Junto com Paulo
Egídio e com Claudio Lembo, talvez tenha sido um dos gover-
nadores que mais prestigiaram e respeitaram a polícia. Foi um
grande amigo da PM. Quando ele entrava nos quartéis, a tropa
o cercava. Quando ele entrou no governo, queria o fim da PM,
mas depois gostou da polícia.”
Os tempos de transição para a democracia estavam só come-
çando. “Um dia, em 1985, eu estou descendo a rua Jorge Miranda
e para um carrinho preto.”
— Tenente, o senhor está estudando comunicação social? –per-
guntou o major.
— Sim.
— O senhor gostaria de trabalhar comigo no quartel general onde
estamos montando uma equipe para trabalhar na abertura política?
— Major, estou feliz no Choque. E quero me concentrar nos estudos.
No dia seguinte, Arruda estava transferido para o tal quartel.
O segundo posto de Arruda na PM foi na Comunicação Social,
que tinha a missão de, após 20 anos de ditadura, reposicionar a
polícia para trabalhar no regime democrático.
Na época, a Secretaria de Transporte acabara de fazer um
projeto para que os policiais fardados pudessem usar o metrô de
graça para melhorar a segurança. Algo hoje comum, era inova-
ção na época. A primeira campanha de comunicação de Arruda
foi, então, para explicar aos PMs como agir, já que muitos che-
gavam na catraca, esperavam “dois décimos de segundo” e, se
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ninguém aparecesse para liberar a entrada, simplesmente pula-
vam. “Ele é autoridade, então pulava. Só que se uma autoridade
pula, duas mil pessoas pulam junto. E o metrô em três dias que-
ria cancelar o convênio.”
O terceiro posto na carreira foi de diretor de comunicação
social do Centro Civil da Casa Militar do governo de São Paulo.
De 1989 a 1990, trabalhou bem próximo ao governador Orestes
Quércia. Arruda já era então capitão. “Foram dois anos muito in-
teressantes pra conhecer como é o poder de perto.”
Foi nessa época que a defesa civil foi incluída nas leis orgâ-
nicas municipais de 80 municípios, sendo São Paulo um deles.
“Nós conseguimos fazer um lobby junto ao presidente da Câma-
ra, dizendo que era importante inserir a defesa civil na lei orgâni-
ca.” O presidente era Eduardo Suplicy, do PT, que prometeu de-
fender a inclusão da defesa civil, o que acabou sendo feito.
Mas aí é que começa a história. Quando o deputado Paulo
Caruso, do PMDB, ficou sabendo e falou com Arruda na ante-
-sala do governador.
— Como você, capitão, entrega algo de tamanho peso político
para alguém da oposição?
— Nós estamos fazendo isso com todas as câmaras municipais,
vereador. A defesa civil é suprapartidária, então falamos com o
presidente da Câmara não importa o partido.
— Não é assim, você deixou de dar visibilidade para o seu partido!
— Desculpe, qual é o meu partido? Não sou filiado a um partido
político.
— Pode deixar que vou falar com o governador e nós vamos tra-
var esse projeto lá na Câmara.
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“Ah, aquele dia...”, lembra Arruda sorrindo, mas como se pudes-
se sentir a mesma raiva novamente.
— Pode falar agora, porque se você não falar, meu chefe vai fa-
lar. Então, por favor, fale com o governador e eu vou falar com
o meu chefe da área militar, porque o que está sendo feito o
governador sabe.
“Ele resmungou e foi embora.”
Desse episódio, a sábia lição: “se Jesus Cristo voltar hoje
e falar que precisa de duas diárias pra ficar no Fórmula Um,
pagando R$ 180 e mais R$ 8 pro café da manhã, se for inte-
ressante politicamente, os caras põem Cristo no High; se não
for, eles falam que não tem dinheiro pro Fórmula Um. E o in-
teresse público? Onde fica?”
Se entre os políticos a coisa estava feia, a esperança do capitão
vinha de baixo –das lideranças comunitárias com quem traba-
lhou nessa época. Lideranças, por vezes, de populações miserá-
veis castigadas por calamidades.
“No natal, dia 24 de dezembro, não lembro se era de 89 ou 90,
eu recebi um pedido da Funai a respeito de índios que estavam in-
ternados na Casa do Índio na rua Apeninos, na Aclimação. Houve
uma epidemia na casa e eles tinham que tirar 40 índios de lá.”
A Casa do Índio era um local de apoio, onde os indígenas
ficavam às vezes o tempo necessário para terminar um trata-
mento. Arruda começou a ligar para hospitais e casas de re-
pouso para alojar os 40 índios.
“Eu tinha sido convidado para jantar na casa de uma famí-
lia alemã, de um colega da ESPM. Os pais do meu amigo eram
alemães, muito formais, maravilhosos, me queriam bem como a
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um filho. Eles marcaram o jantar às 19h. Quando cheguei com a
minha mulher, às 22h30, seu Frans estava na porta batendo o pé.
‘Muito bonito! Nunca vi militar atrasar assim que nem o senhor’.
Ficou muito bravo porque eu tinha atrasado, né?”
O próximo cargo foi como professor de história da PM na
Academia do Barro Branco, o que durou quatro anos. “Foi
um tempo muito feliz também.” Próximo da formação dos
oficiais da polícia, Arruda garante que em São Paulo não
existe mais aquelas aulas à la Tropa de Elite, com agressões e
humilhação. “Se houver um caso desse, o camarada está des-
ligado do corpo docente.”
O coronel reconhece, porém, que outras instituições Brasil
afora ainda agem assim e é preciso lutar contra a prática. Se um
aluno é mal tratado, entende que é isso que a polícia quer dele
e, por sua vez, age assim com a população, argumenta Arruda.
“Você tem que tratar o aluno como autoridade desde o primei-
ro dia. Tratar com respeito e com responsabilidade. Porque nós
temos uma tendência a infantilizar o aluno, pensar que o aluno
é um ser não pensante. E não é verdade. Você tem um tempo
muito curto para desvestir o homem velho e vestir o homem
novo, como dizia o Paulo Apóstolo. O jovem é fruto do ambiente
onde foi formado e dos valores familiares que recebeu. Ele vive
no meio de um senso comum que pode ser de ‘bandido bom é
bandido morto’. Você tem que desvestir aqueles valores antigos
que ele tinha e dizer que direitos humanos é pra todo mundo.
Se você tem a alternativa entre matar e não matar, sendo ambas
as alternativas legais, você tem que não matar.”
O quinto cargo foi na Secretaria de Segurança Pública de São
Paulo. Sua função, dessa vez, era trabalhar com os Conselhos Co-
munitários de Segurança, os incipientes Consegs.
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“Eles tinham sete anos de vida, mas eram pequenos, não ti-
nham regra, legislação, cada um fazia o que queria.” Era o ano de
1995, o mesmo em que Arruda se separou. Falido e sem família,
ele se dedicou mais do que nunca aos Consegs –um grande em-
purrão para o que seria o tema da sua vida, as minorias.
Durante a semana, Arruda participava de reuniões dos Conse-
gues de todo o Estado –se lembra em especial de uma que foi in-
vadida por uma cobra, causando confusão. Conheceu mais de 300
municípios do interior paulista. “Aprendi umas regras importantes
das comunidades, por exemplo, as pessoas aceitam uma resposta
que as desagrade, mas não gostam de ser engandas.” Assim, o di-
álogo sincero era importante e o policial dava orientações: “não dá
pra seguir esse caminho, vamos fazer assim...”
“Então criamos a legislação do Conseg, criamos sua formata-
ção atual naquele período. E fizemos 22 treinamentos com líde-
res dos Consegs em pontos diferentes do Estado.”
Segundo Arruda, o Conselho Comunitário de Segurança é
uma entidade civil vinculada por adesão a normas gerais vindas
da Secretaria de Segurança Pública. Seu objetivo é otimizar o diá-
logo entre o governo, a polícia e a sociedade civil. E, claro, Arruda
faz a propaganda. “É a mais bem sucedida experiência de partici-
pação comunitária e segurança no país. Nós temos em São Paul
mais de 600 Consegs implantados.” Foi através deles que Arruda
foi saindo do seu mundinho de Araras.
“Acabei trabalhando bastante com muçulmanos e judeus.
Aprendi um pouquinho sobre o islã, fiquei encantado, não sa-
bia nada sobre o islã. Tenho hoje grandes amigos no islã, e na
comunidade judaica também.”
Mesmo tendo acompanhado tantas reuniões de tantos Con-
segs diferentes, o policial guarda os bons personagens do pe-
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ríodo e faz questão da digressão para mencionar, por exemplo,
Maria do Carmo Espírito Santo, professora de Belo Horizonte,
que morreu neste ano.
“Ela foi para a guerrilha do Araguaia. Ela me mostrou um livro
onde estava o nome dela: ‘desaparecida em ação na guerrilha do
Araguaia’, mas era um nome falso que ela usou. Ela veio a pé do
Paraguai, de carona, caminhão, foi presa, torturada e, depois da
redemocratização, foi ser professora. Assumiu cadeira na escola,
casou e se tornou uma grande líder comunitária em Diadema.”
— Maria do Carmo, por que a senhora não entrou com pedido de
pensão? A senhora foi torturada, a senhora tem direito à reparação.
— Que reparação! Olha pra minha cara, coronel. Eu fui para lá
sabendo o que eu ia fazer. Agora é justo penalizar a sociedade por
um ato que foi de minha decisão? Não é correto.
“Em compensação, umas pessoas aí pra quem falaram ‘ó, a gar-
rafa de café que você está recebendo na redação eu vou cortar porque
você é comunista’. Aí o cara fala: ‘me ofendeu’ e pede reparação.”
Mas tudo bem. Arruda prefere ficar nos bons exemplos. É
mais do tipo de bem com a vida do que revoltado. Satisfeito,
ele segue: “conheci lideranças comunitárias maravilhosas, o que
me restaurou a fé no país. Porque a gente ouve falar de tanta pi-
caretagem... Houston, Siemens, mensalão, mensalão mineiro,
Zé Dirceu... Tanta picaretagem que a gente acha que o país intei-
ro é assim, mas não é. Tem milhões de pessoas silenciosas, anô-
nimas, que não ganham nada por isso e fazem coisas maravi-
lhosas pela comunidade, como a Maria do Carmo por exemplo.”
Os Consegs trilharam para Arruda um caminho sem vol-
ta: do trabalho com as comunidades à defesa das minorias. E
149
aí encontramos uma das melhores histórias do coronel: um
quiprócó em Campinas, onde travestis estavam atendendo em
bairros de elite. Estamos em 2004.
“Houve uma invasão de travestis em um bairro nobre de cam-
pinas –e isso é uma tragédia social no bairro. O bairro estava em
pé de guerra. Eu fiquei umas duas noites vendo como funcionava
o movimento e vi que chegavam vans de oito cidades da região. As
vans às 20h despejavam os travestis e de manhã iam buscar.”
Teatral, Arruda inventa uma simulação para dimensionar o
tamanho da encrenca.
“Você chega no seu prédio à noite e tem o travesti com o
cliente fazendo sexo na frente da garagem do seu prédio. Você
tem que esperar porque, se você buzinar, eles jogam camisi-
nha, fezes, sangue no seu carro. Obviamente, quando você su-
bir, vai subir chorando.
— Pai, aconteceu isso e isso e isso...
Obviamente, seu pai vai ficar nervoso.
— Cadê minha arma? Vou dar um tiro nesses filhos da puta.
Aí sua mãe vai falar:
— Calma! Calma! Calma! Ai meu Deus, seu pai! Segura!
Aí o morador descontente resolve se mudar. Chega um advo-
gado e fala:
— Doutor, o senhor não gostaria de alugar o seu apartamento?
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— Quero sim.
— Quanto o senhor quer de aluguel?
‘Vou pedir alto’, pensa.
— Seis mil de aluguel.
— Está bom. Eu posso pagar seis meses adiantado par ao senhor?
‘Nossa, nossa, resolvi meu problema!’
Só que aquele apartamento, eles transformam num prostibu-
lo. Imagina um prédio residencial com três prostibulos. Porque o
problema não é o ato em si, são os crimes que cercam o mercado
da prostituição: entorpecente, arma de fogo, menor, roubo, explo-
ração de pessoas, tráfico de pessoas.”
Estamos, então, na primeira reunião com a comunidade, or-
ganizada por Arruda, para resolver o problema. Havia até faixas
“fora daqui seus travestis”.
— Todas as partes estão reunidas aqui? –pergunta Arruda, agora
no cargo de major.
— Sim, tá todo mundo.
— Cadê o presidente dos travestis?
— Como?!?!?!
— Todas as partes têm que estar representadas
Nisso, um velhinho levanta e vai embora. Mais algumas pes-
soas fazem o mesmo.
— Gente, temos que resolver o problema com os principais par-
tícipes dessa história.
151
Duas travestis que faziam um trabalho de prevenção à Aids
com o grupo são levadas à reunião para representá-las.
“Foi a primeira vez na minha vida que eu falei com uma tra-
vesti. Já tinha abordado na rua, etc... Mas falar como nós estamos
falando aqui, foi a primeira vez”, lembra Arruda.
— Olha, os moradores estão aqui primeiro. Então, vocês têm que
achar um ponto seguro pra vocês trabalharem. Nós vamos colo-
car uma viatura pra vocês lá porque vocês também são vítimas
de violência. Tem que ser um ponto seguro, iluminado, onde as
pessoas possam procurar vocês. Não pode ter menor, vamos bater
duro em cima de tráfico de drogas, arma de fogo... Mas enquanto
vocês estiverem lá com os clientes adultos, não temos nada com
isso. Nós vamos, aliás, proteger vocês.
— Então vamos escolher uma praça?
— Vamos.
“Todas tinham até a sexta série de escolaridade. Por quê? Por-
que a história se repetia. Ouvi a mesma história 15 ou 20 vezes.
De Minas, Maranhão, Paraíba, interior de São Paulo, e vão todas
para a cidade grande.”
— Major, quando eu tinha doze anos, eu descobri que minha
orientação sexual era diferente do meu fenótipo, eu gostava dos
meninos, então os meninos me espancavam na escola, a profes-
sora não sabia como lidar. Tudo que era tarefa de meninos, a pro-
fessora passava para mim, zombavam de mim. Até o dia que meu
pai ficou sabendo e disse que preferia ter um filho morto a veado,
me espancou e eu saí de casa. Aí fui pro posto de gasolina...
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— Quanto você ganha por programa?
— De 50 a 150 reais. Um programa de 20 minutos. Eu tenho clientes
que são empresários, com carro bom... Se eles assumirem a condi-
ção passiva na relação e não usarmos camisinha, eles pagam o triplo.
— Qual o índice de infecção de Aids do grupo?
— 70%.
“Sua cabeça vai a mil, né? O cara se expõe a contrair Aids! É
uma patologia, é um problema patológico. Não é possível o cara
se expor dessa forma ao risco de contrair Aids e exigir que a rela-
ção seja mantida sem preservativo.”
— Bom, vocês têm que sair da rua –argumenta Arruda, disposto
a tirá-las daquela vida.
— Posso trabalhar na polícia?
— Não.
— Juiz de direito eu posso ser?
— Não.
— Posso ser médica?
— Vai ser difícil...
— Será que um consultório médico me contrata para ser secretária?
— Acho bem difícil.
— E nas lojas Marisa? Será que eu posso ser balconista?
— Não.
— E em banco?
— Não.
— Mas o senhor quer que eu trabalhe onde?
“Pra mim foi muito chocante isso. Foi o grupo mais excluído
com que eu já trabalhei até hoje. É um mundo paralelo. Para mim
153
foi tudo novo. Aí que eu fiquei sabendo que travesti é ‘ela’, o ho-
mem que se traveste é ela. Eu não sabia também.” Arruda então
entrou em contato com pessoas da Secretaria do Trabalho para
tentar achar empregos para as travestis e, depois de um estudo,
concluíram que as opções possíveis seriam de auto-emprego, já
que ninguém contrataria travestis. “Eles fizeram um programa
de renda e emprego para essas travestis. Elas iriam trabalhar em
customização de roupas. Elas modelavam lingerie para homens e
faziam roupa pra pets. Quando eu saí de lá, oito tinham saído da
rua, o que é pouco, mas são oito vidas. Eu considerei uma vitória
razoável porque se uma saísse, já estava bom.”
Em 2005, o sexto trabalho na PM: comandante do 2º batalhão,
na zona leste. “Ouso dizer que foi a unidade onde eu fui mais fe-
liz na minha vida. Fiquei três anos comandando policiamento lá.”
Arruda assumiu o posto em abril como comandante interino e
foi efetivado em agosto, quando subiu uma patente no oficialato,
tornando-se tenente-coronel.
Já no ano seguinte, Arruda enfrentaria a onda de ataques do
PCC. No dia 12 de maio, foi chamado pelo comandante da capital
e foi avisado, ainda durante a tarde, que haveria ataques na sua
região. Arruda avisou seus capitães: preparem-se! Porém, incri-
velmente, não havia uma metodologia para lidar com a situação.
“Como eu li muito material da historia da instituição, eu me ba-
seei exatamente no modo de lidar com o terrorismo. Colocamos
viaturas em pontos distintos que mantenham contato visual, mas
que formem múltiplos alvos –se for atacar, tem que atacar dois ao
mesmo tempo– e diminuímos a luminosidade. Essa norma aca-
bou se tornando uma norma padrão na polícia naquele momen-
to, mas saiu do meu batalhão. Tudo baseado na experiência dos
anos 1960, quando havia ataque dos grupos armados.”
154
Arruda deu a ordem: queria uma arma longa e uma força de
resposta (com motos e Força Tática) em cada base. Durante a noi-
te, foi vistoriando suas companhias.
— Cadê o comandante?
— Ah, o comandante não está aqui, ele ligou.
— Mas e a arma longa?
— Ah, não tem.
Irritadíssimo, o tenente-coronel reuniu seus capitães.
— Eu dei uma ordem e ela não foi cumprida como eu determinei,
os senhores não passaram nas bases e nem nas companhias, não
mandaram forças-resposta e tem companhia que não tem arma
longa. Temos notícias de ataque já chegando pelo vale do Paraíba,
Poá, Suzano. Esses ataques vão chegar aqui. Se eu vir algum ata-
que à base ou algum policial ferido e minha ordem não tiver sido
cumprida, pode preparar a escova de dentes que vocês vão dormir
no Romão Gomes.
“Aí tocou o que a gente chama de ‘barata voa’. Sabe quando
você acende a luz e a barata voa?”, riu Arruda.
São dez e meia da noite. Finalmente, as companhias es-
tão preparadas e todas as ordens foram cumpridas. Arruda já
pode ir pra casa. Quando estava na Marginal Tietê, recebe uma
ligação. Houve uma tentativa de ataque, mas, graças à força-
-resposta, não houve feridos.
“Na época, infelizmente a Sheherazade não estava na mídia,
porque ela teria falado várias coisas ricas como ela tem falado ul-
timamente, mas já tinham os cretinos falando bobagem na mí-
155
dia como sempre tem. ‘Vamos reagir vigorosamente’. Comecei a
receber as mensagens do comando-geral: ‘vamos reagir vigorosa-
mente’. E recebemos a ordem de que policiais com restrição de
rua poderiam voltar para o policiamento.”
Os policiais com restrição de trabalho na rua são, geralmente,
aqueles que se envolveram em ocorrências de morte, o que, para
Arruda, evidencia o cuidado da PM com a questão da letalidade,
que foi drasticamente reduzida desde os anos 1980. “E isso não
foi conseguido assim de graça. Isso foi muita coragem de vários
comandantes que vieram dos anos 80 pra cá batendo duro pra
não permitir, porque, se soltar, a coisa vai lá em cima.”
Quando entra no tema da letalidade, Arruda abandona a expres-
são leve do rosto. O assunto é sério. “O Estado não é vingador. Se a
lei não é suficiente, a democracia está aí pra isso. Vamos discutir e
mudar. O que não pode é ficar estimulando a polícia a matar bandi-
do, porque não é papel dela. É muito fácil você transferir pra policia
a responsabilidade que não é dela. Todo mundo se omite e, se der
algum problema, pune o cara, põe na rua. É uma irresponsabilidade
de governantes fazer uma coisa dessas, ficar estimulando esse tipo
de situação. É uma irresponsabilidade de comandantes também.
Tem comandante que fica falando ‘é faca na caveira’. Esse coman-
dante devia sentar junto nos banco dos réus depois, mas não senta.
E o governador muito menos, e o secretário de segurança também
não. A gente tem que parar de ser inocente. O político continua no
cargo dele e o idiota que faz isso é condenado. Houve nos anos 80
e 70 irresponsáveis que ocuparam secretaria de segurança que fa-
ziam premiação de policias por resistência seguida de morte. Ima-
gina você premiar um policial porque se envolveu em ocorrência de
morte. A polícia é mais do que defensora dos direitos humanos, é
promotora deles. Tem que falar: pessoal, o Estado não é vingador.”
156
Mas Arruda não deixa de também defender a corporação ao
lembrar que, na capital, são 45 mil chamadas de 190 e não acon-
tece nem 0,01% de erro, já que não há 4,5 mortes de inocentes
por dia. “0,001%, ou seja, 0,4 morte de inocente por dia pode
acontecer. Isso é um caso de erro a cada 90 mil chamadas.”
Para o coronel, o policial que faz justiça com as próprias mãos
pensa assim porque vem de uma sociedade que pensa assim –e
sua formação na polícia não o convenceu do contrário. Contudo,
Arruda vê que a valorização dos direitos humanos é um pensa-
mento crescente na PM, mas ainda não dominante.
“Se nós tivermos que pontuar fatos históricos, eu diria que uma
mudança vem desde a Favela Naval. Em São Paulo, isso foi mais
importante que o Carandiru. O Carandiru foi uma tragédia. Uma
operação mal conduzida, mal planejada, uma decisão política preva-
lecendo sobre uma decisão técnica. A tropa estava apavorada que os
detentos iam dar injeção com sangue infectado com Aids. À frente
da tropa estava um líder carismático, era o Ubiratan Guimarães. Ele
entrou na frente para acalmar a tropa. Quando ele entra, é ferido.
Um soldado sai com ele no colo e fala ‘mataram o comandante’. E aí
deu no que deu... Mas não teve a repercussão de causar vergonha no
público interno. A gente teve a consciência seguinte: quem estivesse
no Choque teria participado desse episodio do Carandiru. Amigos
meus que eu conheço profundamente, gente comprometida com di-
reito humanos estava lá. Uma loucura. Agora, a Favela Naval foi dife-
rente. Os policiais chegavam em casa e a mulher dizia ‘é assim que
você trabalha na rua? Você atira nas pessoas, você bate nas pessoas?’.
Isso levou a uma grande reflexão do público interno sobre o papel da
PM. Foi quando surgiu policiamento comunitário.”
Só que agora, diante do PCC e com as restrições de policia-
mento suspensas, esse cuidado com as taxas de letalidade parecia
157
ter desaparecido. É uma e meia da manhã. Arruda reúne em seu
gabinete seus comandantes de companhia, de Força Tática e os
sargentos de policiamento de rua.
— A mídia está pressionando pra gente sentar o dedo na ma-
landragem. Quero dizer uma coisa pra vocês: o diabo não é
inteligente, só é velho. Ele já viu acontecer isso antes. Então,
se você não quiser estar daqui a um mês sentado sozinho no
banco dos réus com essa mesma imprensa e esse mesmo po-
lítico, que estão te exaltando agora, pedindo tua cabeça, não
façam bobagem. Eu não tenho que provar pra vocês se sou ho-
mem, se sou macho, se sou bom de porrada. Eu não tenho que
provar isso. Eu sou o comandante de vocês. Minha missão é
não deixar vocês fazerem merda, então não façam bobagem. O
comandante-geral não vai segurar, nem eu, nem governador,
nem secretário, ninguém vai segurar. Quem fizer merda segu-
ra sozinho. E não deixe seu subordinado fazer merda também.
Le-ga-li-da-de. Vamos fazer de acordo com a lei. A população
e a opinião estão do nosso lado. Não vamos perder a opinião
pública. Não quero ninja, não quero atentado, não quero sair
caçando. Se vocês souberem de algum delinquente que atacou
base nossa, atacou policial nosso, matou algum inativo nosso,
vocês tragam o nome pra nossa inteligência, nós vamos levan-
tar essa pessoa e nós vamos buscar essa pessoa. Um por um.
E nós vamos trazer conforme o cliente desejar. Se ele se entre-
gar, ele vem vivo, se não se entregar, ele vem morto, mas ele
vem. A princípio vivo. Mas nós vamos agir com inteligência,
com rapidez, com planejamento, com discrição. Trazendo um
por um desses que atacaram policiais da nossa área, mas não
quero bobagem. E eu to sabendo que tem gente entrando em
158
favela e dando tiro pro alto. Eu não quero que vocês vão pertur-
bar pobre. Pobre já tem problema demais pra resolver. A favela
está do nosso lado, não vamos perder a favela. Alguma dúvida?
Não? Então, bom trabalho.
Um detalhe dessa época de ameaça do PCC é que um ativista
do movimento LGBT, diretor de uma ONG de defesa da diversi-
dade sexual, Edson Azevedo, que Arruda conheceu no trabalho
com as travestis, chegou a ligar oferecendo “uma rede de casas
seguras” para abrigar policiais e suas famílias que estivessem sob
risco. “Eu achei de uma dignidade extraordinária.”
Mas não foi pela estratégia de defesa contra o PCC traçada no
seu batalhão e adotada por toda a polícia que Arruda se tornou
celebridade na PM. Foi por outro delicadíssimo episódio em seus
anos de comando na zona leste.
Estamos em 2005. Duas alunas da USP Leste estão se acari-
ciando no campus. A policial Diana, da Ronda Escolar, resolve
abordá-las e, por sua vez, é cercada por mais de 80 alunos.
— Alguém chamou você aqui? Alguém pediu sua presença? – diziam.
— Olha, gente, a USP é lugar de família.
E Arruda dá gargalhadas contando a história. “Lugar de fa-
mília!”, ele ri. Diana acabou levando as meninas para a delega-
cia. O episódio veio a público em outubro e, segundo matéria
da Folha de São Paulo, teria ocorrido no dia 30 de setembro,
embora o coronel insista que foi em junho. O fato é que Arru-
da só ficou sabendo quando recebeu a ligação do comandante
responsável pelo policiamento na área da Cidade Universitá-
ria, o campus Butantã da USP.
159
— Ô, Arruda, você está sabendo que a congregação está reunida
aqui na Reitoria? Pra proibir o acesso da PM aos campi da USP.
— Não... mas por quê?!
— Por causa de uma merda que vocês fizeram aí na USP Leste.
— Como uma merda?
— É... vocês fizeram.
O tenente-coronel Arruda aciona seu P2, o sargento responsá-
vel pela inteligência no batalhão.
— Comandante, foi um ato obsceno e houve uma intervenção po-
licial lá. Mas foi uma coisa simples. Os policiais conduziram as
meninas, mas o termo já foi arquivado.
Arruda, então, procura o tenente, responsável por fiscalizar
as patrulhas.
— Ah, comandante, eu nem fui lá, era uma bobagem, um ato
obsceno...
Só aí ele se dá conta do “tamanho da merda”.
— Gente, isso não é ato obsceno. Isso é intolerância! O que vocês
estudaram sobre isso?
Nada...
— Eu sou velho e estou ultrapassado, então eu tenho direito a ser
preconceituoso. Mas até eu aprendi que isso se chama intolerân-
cia. E vocês que são jovens não aprenderam ainda?
160
Não...
— Hoje é quinta-feira. Domingo vai estar isso na mídia do mun-
do inteiro.
Tenente e sargento se entreolham, incrédulos. Mas não deu
outra. Domingo, 9 de outubro, enquete no Fantástico: Você achou
correta a atitude da policial militar? 56% votaram não.
Na segunda-feira, Arruda recebeu um ofício da Secretaria de
Justiça pedindo a apuração do caso e providencias em relação à
policial. As meninas foram chamadas ao batalhão e foram inter-
peladas pelo subcomandante.
— A policial foi agressiva?
— Não.
— Como vocês foram para a delegacia?
— Ela disse que poderíamos ir no nosso carro, mas preferimos
ir no dela.
— Tinha grade?
— Não, fomos no estofado mesmo.
— Vocês querem processar a policial?
— Não.
Elas e os advogados assinaram o depoimento e deu-se por
resolvido. Arruda não puniu Diana, mas a transferiu de área.
Disse que ela agiu como mãe, nordestina e evangélica, ignoran-
do as normas para o caso. Horas depois, vem uma senhora do
Jardim Keralux, um bairro pobre vizinho à USP Leste, bater na
porta de Arruda com um almaço com 250 assinaturas pedindo
a permanência de Diana.
161
— O senhor é o comandante que protege veado e sapatão?
— ?!
— Tô sabendo que o senhor e seus amiguinhos veados e sapatões
estão punindo a Diana.
Até que a senhora ouviu da própria Diana que ela não havia
sido punida, mas transferida.
— Então tá bom, mas é o seguinte: você avisa os seus amigui-
nhos lá da USP que lá dentro eles podem fazer a putaria que
eles quiserem, mas aqui fora nos somos evangélicos e somos
gente decente. Se começar a beijar menina aqui fora nós va-
mos quebrar o pau.
Parece que o problema não estava tão resolvido assim. Ar-
ruda previa que os choques entre USP e Jardim Keralux iam
sobrar pra PM e teve uma ideia. Ligou para um advogado do
movimento LGBT com quem trabalhara no quiprócó das tra-
vestis de Campinas.
— Então, cara, aquela PM do caso na USP é minha soldada.
— Puta, Arruda! Que chato...
— Não. Melhor assim. Agora a gente resolve esse problema. Eu
sou ignorante nesse assunto, um pouco menos por causa do nos-
so trabalho em Campinas. Mas meus efetivos são muito mais ig-
norantes, ninguém sabe nada desse assunto. Eu preciso preparar
eles pra lidar com diversidade. Você me ajuda?
— Claro!
— Me ajuda a montar um curso pra preparar meus policiais.
162
Arruda e mais três lideranças LGBT começaram a planejar um
curso e levantar nomes de convidados. Até um teatro do oprimi-
do nos moldes Paulo Freire foi sugerido, mas logo vetado pelo
comandante –“isso não passa na minha instituição”. Um tenen-
te que havia estudado direito homoafetivo ficou responsável por
criar situações concretas, como um casal gay que chega em um
restaurante provocando a ira dos demais clientes ou uma traves-
ti que quer usar o banheiro feminino, e os alunos debateriam
como o policial deveria agir.
Só faltava um local para as aulas, além da aprovação do co-
mando da PM, claro. Arruda foi falar com o coordenador da USP
Leste, que achou a ideia ótima e topou ceder uma sala de aula.
“Mas eu pedi um favor, disse que a PM era muito ortodoxa e que
o projeto ainda teria que ir para o comandante da ZL que iria
mandar para o comandante da capital, etc. Só quando todos apro-
vassem, poderíamos acertar a parceria com a universidade.”
Ocorre que a proposta do curso vazou e acabou veiculada
na Folha de São Paulo. Arruda se lembra o mês: dezembro. O
nome do jornalista: Ricardo Gallo. E a manchete: “PM quer
aprender com gays a lidar com gays.”
“Com auxílio de um transexual e de um bissexual, a Polícia Mi-
litar planeja para fevereiro um curso inédito, de dois dias, destina-
do a cem policiais militares da zona leste da cidade, para capacitar
os integrantes da corporação a lidar com gays, lésbicas e travestis.
O curso, que ainda depende de aprovação do comando da
PM, está em fase de articulação pelo 2º Batalhão de Policia-
mento Metropolitano da Capital. As aulas estão previstas para
ocorrer nos dias 9 e 10 de fevereiro na USP Leste, onde, em se-
tembro, duas universitárias foram levadas à delegacia por uma
PM porque se beijavam.
163
[...]
‘Sentimos que há a necessidade de um conhecimento mú-
tuo [entre polícia e entidade de defesa de minorias]. As pessoas
têm de saber o papel da polícia na sociedade democrática’, disse
o tenente-coronel Luiz Eduardo Pesce de Arruda, comandante
do 2º Batalhão da PM.”
“Quando essa matéria veiculou, o mundo caiu na minha ca-
beça. Primeiro, o comando todo ligando pra mim: ‘Arruda você
está louco? Você toma uma decisão dessa sem falar com o coman-
do? Você está expondo a instituição!’ Foi um inferno.”
— Filho, o que está acontecendo? – liga a mãe, lá de Araras.
— O quê, mãe?
— Filho, eu sou sua mãe, comigo você pode se abrir. O que está
acontecendo, filho?
— Ah... a matéria da Folha. Mãe, se a senhora quer saber se eu
sou gay, eu não sou. Eu sou heterossexual.
— Então porque você fica se metendo com essas coisas aí? Está
todo mundo na cidade dizendo que você é veado.
— Mãe, o que a senhora quer que eu faça?
“Carl Marx dizia: tudo que é humano me interessa. Se é hu-
mano, merece minha proteção como policial. Como pessoa física,
eu sou católico, sou heterossexual, tenho uma família, me casei
de novo, tenho um filho do segundo casamento, tenho uma visão
de mundo pessoal, minha. Mas como policial, todas as pessoas
merecem minha proteção. Até o delinquente.”
Arruda virou piadinha de grupo de e-mail de policiais.
“Será que vamos ter que usar batom em vez de tonfa ou anel
de diamante em vez de algema?” ou “Antes era proibido, de-
164
pois era tolerado, agora o Arruda quer tornar legal, então que-
ro morrer antes que seja obrigatório.”
O coronel reclama especialmente da crítica feita pela colunis-
ta da Folha, Barbara Gancia, que escreveu:
“O ano de 2006 já começa fervendo. Caso receba a aprovação
do comando da PM, nos dias 9 e 10 de fevereiro, o 2º Batalhão de
Policiamento Metropolitano da Capital irá realizar um curso para
ensinar cem policiais da zona leste a lidar com gays, lésbicas e
travestis. As aulas serão ministradas na USP Leste, onde, em se-
tembro, duas universitárias que trocavam beijos em público rece-
beram voz de prisão de uma policial militar.
Segundo o tentente-coronel Luiz Eduardo Pesce de Arruda, co-
mandante do 2º Batalhão, um dos benefícios do curso será dimi-
nuir, entre os policiais, a carga de preconceito contra os homosse-
xuais. Será que entendi direito? É o caso de perguntar se estamos
vivendo em outro planeta ou se, aqui na terra, os homossexuais
continuam a ser seres com uma cabeça, dois braços, duas pernas e
um coração, tal e qual os policiais que irão tentar ‘decifrá-los’.
Para evitar abusos como o da detenção indevida das duas
jovens da USP Leste, não seria suficiente que os policiais co-
nhecessem as leis que devem ajudar a impor? Se a moda pega,
daqui a pouco vamos ver a Polícia Militar oferecendo cursos
específicos para lidar com loiras, com cidadãos de olhos azuis
e com gente da terceira idade.
E já que a intenção é tentar compreender melhor o próximo, não
seria mais proveitoso começar instruindo os policiais a não tecer jul-
gamentos precipitados baseados na cor da pele ou no nível social?”
“Ela foi injusta comigo. A crítica dela foi injusta. Um dia vou
conhecê-la pessoalmente e vou falar pra ela isso. Ela disse que eu
queria tratá-los como se fossem pessoas diferentes, mas há sim
165
uma legislação diferenciada. É uma minoria, e tem aspectos im-
portantíssimos de natureza psicológica, cultural, legal que são di-
ferentes. Como idoso, também tem legislação especifica. Criança
também. Não estou dizendo que é um ser de outro planeta, estou
dizendo que merece um recorte acadêmico [da polícia] porque tem
legislação específica que trata do assunto. Adolescente, por exem-
plo, tem a psique do adolescente. Tem que tratar em específico.”
“Disseram que eu queria dar aula na USP, que eu queria ser
deputado federal, que eu era veado, enfim... Aí eu recebi três li-
gações. Um coronel que me disse ‘Arruda, fique tranquilo, o ca-
minho é esse mesmo, está certo’. Me ligou a Heloísa Fernandes,
filha do Florestan, uma socióloga maravilhosa. E recebi uma liga-
ção da Ruth Cardoso.”
— Aqui é a professora Ruth.
— Ruth?
— É, a Ruth Cardoso...
— A senhora esposa do presidente Fernando Henrique?
— Isso mesmo.
— Oi, professora, pois não...
— Olha deve estar muito difícil para o senhor, mas fique tranqui-
lo. Eu estou muito orgulhosa, o senhor é muito corajoso, quero
muito conhecê-lo pessoalmente.
Todo satisfeito, Arruda conta que se encontraram no shop-
ping e Ruth lhe deu um beijão. Foi o que ele ganhou de bom. De
resto, a PM não aprovou o curso, alegando que os direitos huma-
nos já eram tratados na formação policial e Arruda saiu mais que
queimado. “Não sei como não perdi o comando, acho que eles fi-
caram com medo de tirar e dar mais polêmica.”
166
Polêmica é o sobrenome de Arruda. Não satisfeito, resolveu
inventar outro curso: aulas preparatórias para bolivianos ingres-
sarem na PM. “Uma ação de discriminação positiva para entrar
boliviano na PM porque nós temos mais de 500 mil bolivarianos
em São Paulo e não temos nenhuma interlocução com eles. Eles
são explorados e ganham uma miséria, quando o tráfico cooptar
essa comunidade, estamos ferrados. A gente quer acelerar o pro-
cesso de inclusão desses imigrantes no Brasil. Vamos preparar
60 meninos desses pra trabalhar na PM, se 20 entrarem, desses
20, três vão ser oficiais e um vai ser juiz de direito.” A reação no-
vamente foi negativa: mas e os pobres brasileiros, você não vai
ajudar? “Mas o brasileiro já está na polícia”, argumenta.
Repentinamente dominado por um ar de aparência e desâni-
mo, desabafa. “Eu lembrava da Cecília Meireles. Há momentos
em que eu me sinto tentando explicar pro deserto e pra geleira o
significado da primavera.”
Mas a primavera não demorou. Já em 2006, um homossexual
foi agredido na Praça da República ao ponto de perder um rim. Na
época, o secretário de segurança foi questionado sobre como a PM
foi preparada para lidar com a diversidade sexual. Felizmente, uma
assessora do secretário sabia sobre a tentativa de curso na USP Leste,
o que ressuscitou a ideia. Segundo Arruda, o curso agora faz parte
das aulas curriculares na Escola de Soldados e no Barro Branco.
Avançando na carreira de Arruda, chegamos a sua promoção
como coronel. Para subir de tenente-coronel a coronel, é preciso
fazer um doutorado na PM. Depois de tentar duas vezes (na pri-
meira ainda estava queimado com a história da USP Leste), Ar-
ruda foi aceito para o doutorado com uma tese sobre segurança
pública em microcomunidades, um estudo que foi publicado pela
PwC (PricewaterhouseCoopers) como um prêmio de direitos hu-
167
manos que eles concediam. A tese fez uma pesquisa com síndicos
de prédio, pastores evangélicos e coordenadores de ponto de táxi e
descobriu que uma minoria sabia dizer o nome de um policial da
sua área. “Estão juntos na rua e não se conhecem”, disse Arruda.
“Você não pode confiar em alguém que você não conhece.”
“A vida profissional me ensinou que a pessoas não querem
um super policial. Querem alguém que seja confiável, que seja
capaz de ajudá-las a resolver problemas e que seja solidário a
elas. O policial vê tanta desgraça, gente amputada, sem cabeça,
assassinada. Aí uma senhora bate o carro dela, levando a crian-
ça pra escola. O policial diz que não foi nada, mas, para aquela
mulher, aquele episódio foi o mais grave da vida dela. O policial
não pode perder essa consciência.”
Como tantos outros fardados, o coronel acredita que o futuro
está no policiamento comunitário. “Do modo como está, está no
limite, não consegue expandir, e eu não vejo outra saída que não
seja um policiamento muito próximo da população.” A base do
pensamento é que, se um policial não conhece o bairro e atua ali
esporadicamente, esse policial tenderá a ser agressivo para im-
por sua autoridade onde não é conhecido. Além disso, um jovem
que para aquele policial é um infrator, para a comunidade é um
cara que nasceu no bairro, e as pessoas não hesitarão em ficar do
lado dele caso seja maltratado. “Aí o PM mata o moleque num
confronto lá no bairro e o que acontece com os outros moleques?
Vão para a rua e queimam pneu em protesto contra a PM. Dizem
que é o PCC. Não é o PCC nada, é uma reação espontânea. Assim
você não tem a população com você.”
“Mao Tsé-Tung, no Livro Vermelho, dizia as condições de você
se relacionar para ter a população do lado do Exército de Liber-
tação Popular. Ele dizia: ‘fale docilmente com a população e de-
168
volva tudo que pegar emprestado, pague tudo o que consumir e
não destrua propriedades nem plantações, não se envolva com as
mulheres e trate os presos com benevolência’. E o que nós vemos
muitas vezes? O policial atende bem as pessoas? Você tem a segu-
rança de chegar a um policial e ele te atender bem? Está certo ele
ir à padaria, esse hábito cultural péssimo que nós herdamos de
ficar tomando café e comendo de graça na padaria? Está errado,
você não está pagando pelo que consome.”
Já como coronel, Arruda foi chamado para dirigir o Centro
de Altos Estudos de Segurança (Caes), onde trabalhou de 2009
a 2011. O Caes, onde os policiais realizam seus mestrados e dou-
torados sem os quais não podem subir de patente, tem quatro
linhas de pesquisa, ele explica: polícia comunitária de direitos
humanos; gestão organizacional; saúde e qualidade de vida; e
prevenção e resposta a emergências e acidentes.
Nessa época, o comando-geral pediu que Arruda acompa-
nhasse um grupo de policiais em viagem à África do Sul para es-
tudar sobre a realização da Copa do Mundo. O coronel reclama
que agora as viagens de estudo foram cortadas. “O programa de
mestrado fazia uma viagem nacional, em sete unidades federati-
vas. Fizemos três vezes isso. Era uma visita muito bem estrutu-
rada, com debate, simpósio, visitas técnicas e culturais. E nada
que devia ser oculto da imprensa, tribunal de contas ou do poder
público. Jornalista podia ir junto. Eu sempre dizia para os meni-
nos ‘vocês estão lidando com dinheiro público, não tem que fazer
besteira’. Não tive um incidente.”
Mas o ex-secretário de Segurança Pública Antonio Ferreira Pinto
não achava que as viagens do Caes –nacionais e por vezes internacio-
nais– colaborassem para pensar o policiamento e suspendeu tudo.
“É deplorável quando você considera que educação não é prioridade.”
169
O oitavo cargo na polícia foi comandando a Escola Superior de
Soldados, em Pirituba, onde não perdeu a oportunidade de inven-
tar mais uma. Arruda diz que os alunos se achavam maiorais e ti-
nham vinte que lutavam MMA. O esperto coronel convidou então
seis indígenas do Xingu lutadores de Huka-Huka, “a única arte
marcial brasileira”, para uma exibição. Foram 32 lutas. O placar?
Um empate e 31 vitórias para os índios. “Isso se chama diversidade.
As pessoas são diferentes umas das outras. Vocês não são piores
nem melhores, são diferentes. Usem isso pra vida de vocês.”
Depois de passar pela Academia de Polícia Militar do Barro
Branco, que forma oficiais, e pela Escola Superior de Soldados, que
forma praças, Arruda consegue traçar um diagnóstico sobre o en-
sino na PM e aponta os temas importantes que são negligenciados.
“Nós estudamos pouco a vítima. Ela é o objeto principal da
ocorrência, não o delinquente. A PM existe para atender a víti-
ma, e não para prender o delinquente. Ela prende para atender
a vítima. Também precisamos aumentar o volume de estudo so-
bre adolescente em conflito com a lei. Biologicamente, ele está
pronto pra vida, mas não ganha um centavo, então ele não exer-
ce nenhum poder político dentro de casa. Analfabeto funcional,
muitas vezes não chega à universidade. Está condenado ao su-
bemprego e é pressionado pelo consumo. Ele tem baixíssima au-
toestima e um profundo temor de ser exposto ao ridículo pelos
amigos através do bullying. Essa combinação explosiva leva o jo-
vem a se aproximar do crime.”
O coronel diz ainda que a maioria dos policiais escolhe a carrei-
ra por vocação –e aí que mora o perigo. “Um dos papeis da escola
é transformar a ilusão em realidade. O cara acha que ser policial é
Tropa de Elite. É chegar lá e bater na cara, mas não é assim, a vida
não é assim. Muitas vezes você vai perder. Você vai prender o trafi-
170
cante e ele será libertado. E ele depois ri da sua cara. Quantas vezes
isso não acontece? É uma profissão muito estressante.”
Com seu jeito teatral, Arruda encena o exemplo mais básico
do dia a dia policial. O PM chega na periferia. É a única autorida-
de visível ali. Logo é procurado por um comerciante.
— Capitão, aquele moleque ali roubou meu estabelecimento qua-
renta vezes e está em liberdade. O senhor não vai fazer nada?
Aquele comerciante (e boa parte das pessoas) não conhece a
estrutura legal. Não sabe que a culpa pela libertação do moleque
não é do policial.
— Olha, capitão, não é pelos dez conto que ele leva todo dia. Mas
outro dia ele bateu na minha filha, né, Maria Cristina?
— Verdade, me deu uma coronhada.
Resultado: se o policial não tem estrutura para aguentar fir-
me, resolve fazer justiça com as próprias mãos. “É uma pro-
fissão muito difícil e pior: pouco valorizada pela sociedade. Eu
estou no ônibus com o crachá da AACD, todos olham e falam
‘ai que legal’. Na PM, as pessoas já olham assim do tipo ‘quem
mandou não estudar né?’”
É fato inegável que grande parte da rejeição à PM advém da
ditadura militar. Os policiais são vistos como um resquício do
governo autoritário e, aliás, ainda pensam com a mesma cabe-
ça, ou seja, ignoram os direitos humanos. Arruda argumenta
que os responsáveis pela tortura e comandantes do DOI-CODI
eram do Exército e que a polícia estava na rua. Claro que a PM
também matou, mas em confrontos. Para ele, a característica
171
militar não implica uma ideologia. O coronel faz as vezes do
professor de história da PM que já foi para explicar como a rela-
ção ditadura-polícia não se sustenta:
“A PM foi organizada militarmente nesse moldes no período
da Regência e foi assim no Segundo Império, na Primeira Repúbli-
ca, na era Vargas, durante o regime militar e na redemocratização.
Ela tem esse modelo desde 1831. Aliás, durante o regime militar ela
não foi leal ao regime militar, ela foi leal ao governo de São Paulo,
que, por sua vez, era leal ao governo militar. Tem uma coisa mui-
to significativa nisso. Naquele episódio de 1964, a PM não fechou
com o Exército, fechou com o governador Ademar de Barros. Se ele
resolvesse resistir ao golpe, a PM também teria resistido.”
A violência sistemática da polícia, porém, deixa dúvidas so-
bre se o caráter pessoal de cada policial é fator determinante
para agir fora da lei ou se há de fato um problema estrutural
–o militarismo. Pensando com a cabeça da ditadura, a polícia
veria a população como um inimigo a ser combatido. Duas leis
ainda vigentes que organizam as polícias militares em nível
nacional e estadual foram decretadas por presidente e gover-
nador “usando das atribuições que lhe confere o § 1º do artigo
2º do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968.” O de-
creto-lei nº 667 de 1969 regulamenta as polícias militares do
Brasil e o decreto-lei 217 de 1970 constitui a Polícia Militar de
São Paulo, unindo a Força Pública e a Guarda Civil do Estado.
Ambos estão fincados no AI-5.
Para Arruda, essa associação errônea entre PM e ditadura
tem outra origem. E aqui, pela primeira vez, o defensor das mi-
norias adota uma postura inesperadamente conservadora: tudo
faz parte de um plano para enfraquecer as instituições federais,
inclusive o Exército –e de lambuja a PM.
172
“Esse ataque vem por parte de segmentos ligados ao governo
federal: PSTU, PSOL... Aparentemente, alguns grupos mais radi-
cais de caráter bolivariano querem extinguir instituições que não
sejam leais ao partido. A instituição não pode ser leal a nação, deve
ser ao partido. Hoje a PM é a única instituição pública presente
24h por dia em todos os municípios paulistas e brasileiros. Pra
tudo que acontece, a PM é acionada. Essa informação é processa-
da, sai da PM, vai pro Exército, do Exército vai para a Abin e de lá
para a Presidência da República. É uma rede de informação muito
bem estruturada no país inteiro. Ao quebrar essa rede, o objetivo é
acabar com a informação. Em segundo lugar, enfraquecer o Exér-
cito. E aí a ideia é substituir a PM por uma guarda bolivariana que
não tenha nenhum compromisso com o Estado nem com a socie-
dade, mas tenha compromisso com o governo.”
Pelo humanismo, defesa dos direitos humanos e, principal-
mente, pela tolerância, Arruda estaria bem enquadrado no lado
esquerdo da política, não fosse a maneira como enxerga as mu-
danças sociais dos últimos tempos. “O país esta passando por
uma crise moral muito grande, uma crise de relativização de valo-
res, desde a família, e falta de valores religiosos também, que são
importantes qualquer que seja a denominação.” Um discurso re-
acionário para provar que a complexidade humana –e o coronel–
não pode ser encaixada em grupos definidos. Arruda, em tom de
indignação, segue com críticas ao governo federal...
“[Segmentos ligados ao governo federal] que acolhem terrorista
e deixam ele em liberdade no Brasil, caso do Cesare Battisti, que
permitem que você pague e explore mão de obra escrava de médico
–precisa ir atrás de Cuba para mandar dinheiro pra Cuba. Ou seja,
você deixa as prioridades ideológicas acima do interesse nacional.
Veja o que está sendo feito com a Petrobras, veja o que está sendo
173
feito com o Itamaraty, Banco do Brasil. As instituições estão sendo
profundamente afetadas. E a PM é a próxima, mas ela tem uma es-
trutura mais sólida.”
... e às manifestações de junho.
“Essa articulação se aproveita da insatisfação com a Copa e
com o Mensalão. O que a PM tem que evitar é uma camisa san-
grenta, um novo ícone como Edson Luis. Na última manifesta-
ção, teve muito problema com jornalista. De jornalista preso,
espancado, confusão etc. Em sã consciência, nenhum policial
vai atacar um jornalista. Por que atacou? Será que ele não iden-
tificou o jornalista claramente como jornalista? Será que o jor-
nalista tem que criar uma identidade visual mais fácil para ser
identificado? Quem tem que decidir isso? O jornalista e a polí-
cia. Tem que sentar junto e conversar.”
Mas Arruda não estende essa imunidade à agressão da PM a
todos os cidadãos –jornalistas ou não. Pelo contrário:
“De forma geral, a PM agiu bem e corretamente. Se houve
excesso, a estrutura da polícia é muito peremptória e muito dura
para punir excesso. Bom, em um movimento social quem está
no epicentro está sujeito a... Manifestação tem que ter ordem.
As pessoas tem que estar identificadas. Você não pode usar ano-
nimato, isso é contra a Constituição. Você não pode levar arma.
Coquetel molotov... Estou impressionado como isso não matou
ninguém até agora. Porque é uma arma utilizada pelos russos
na resistência contra o avanço do Exército nazista. Queima um
tanque de guerra, com a tripulação dentro, não é brincadeira
aquilo lá. Está certo uma pessoa levar isso? Qual é o objetivo
dela? Manifestação é um protesto legítimo, mas sem uso de vio-
lência. Violência é antidemocrático. Não e cabível usar a violên-
cia na democracia, em nenhuma hipótese.”
174
Segundo levantamento da Abraji, 114 jornalistas foram agre-
didos nos protestos de 2013 –71 de forma deliberada e 65 por
agentes de segurança. A BBC Brasil diz ainda que a Corregedo-
ria da PM abriu 21 inquéritos para apurar agressões entre 1º de
junho e 28 de janeiro.
Mas, se por um lado, o militarismo é responsável por essa
ponte direta entre a PM e a ditadura na cabeça das pessoas, na
cabeça dos PMs significa hierarquia e disciplina. Quando o as-
sunto é militarismo, os policiais não raramente fogem da ques-
tão da repressão e divagam sobre os benefícios e malefícios de
uma estrutura piramidal tão rígida.
“A formação básica militar do PM é muito útil porque ele
aprende honra, disciplina, respeito à hierarquia, respeito à na-
ção, ao Estado de São Paulo. A sua responsabilidade é deixar uma
instituição melhor para quem vier depois de você. Nós tivemos
31 coronéis exercendo cargo de subprefeito no governo Kassab,
quantos foram processados por corrupção? Zero. Isso estatisti-
camente tem uma significação. Por que não teve nenhum caso?
Porque são valores e o grupo cobra dele. O grupo é muito forte e
cobra a maneira como você se conduz.”
Ainda em 2011, Arruda deixou a Escola Superior de Solda-
dos para assumir o Comando de Policiamento Metropolitano, ou
seja, se tornou responsável pelo policiamento em toda a região
metropolitana de São Paulo, excluindo a capital. Depois, foi ser
diretor de Ensino e Cultura da PM em maio de 2012 e, finalmen-
te, entrou para a reserva.
Além dos dez cargos na polícia, não podemos esquecer os
cursos de formação de Arruda. Além dos já mencionados –
Academia do Barro Branco, Publicidade na ESPM, Mestrado
e Doutorado no Caes–, o coronel cursou ainda Direito, tem
175
uma especialização em Gestão do Terceiro Setor na GV e ga-
nhou uma bolsa do governo francês para uma especialização
em Liberdades Públicas e Segurança Pública na École Nationa-
le D’administration (Ena).
“Fiz outros cursos como de polícia comunitária nos EUA, vi-
sitei a polícia italiana, sul-africana, japonesa, canadense, fiz está-
gio na Legião Estrangeira. Quando eu estudei na Ena, o Sarkozy
era professor lá.”
O caminho que levou Arruda à Paris passa pelo Caribe.
Mas começou nos bombeiros. O comandante dos bombeiros
precisava de um tradutor de francês para um curso de uma
semana sobre defesa civil com franceses. Como Arruda fala
bem a língua, acabou quebrando esse galho. Um dos france-
ses era da embaixada da França e, tendo todo interesse em
manter boas relações com o Brasil, convidou Arruda para
um curso na Martinica. Eram policiais de 14 países e o curso
seria em francês, se alguns não tivessem reclamado porque
só falavam espanhol. Resultado: Arruda, pela segunda vez
na vida, traduziu um curso. Como recompensa, a escola da
Martinica o mandou para a Ena. O coronel tentou ainda fa-
zer mestrado na USP duas vezes (ECA e FFLCH), mas teve
que abandonar por causa da carreira.
Arruda está aí pra desmentir o ‘bem-feito não estudou’. Ele
estudou. E escolheu ser PM apesar dos pesares. “É uma car-
reira que envolve risco concreto de vida. Dano à saúde. Má ali-
mentação. Estresse. Risco de processo. Mas também você tem
grandes histórias de vida partilhadas, possibilidade concreta
de ajudar pessoas, de salvar a vida de pessoas. O maior desa-
fio do policial é manter a humanidade a despeito do ambiente
sórdido em que muitas vezes ele vai trabalhar.”
176
Hu-ma-ni-da-de, diz o coronel humanista. E defende todas
as minorias, os PMs inclusos.
“Hoje, portanto, eu me considero uma pessoa muito mais rica
do que eu era quando vim aquele menino de Araras. Aquele me-
nino branco, classe média, católico. Hoje eu tenho amigos ne-
gros, orientais, ciganos, judeus, muçulmanos, gente que eu te-
nho absoluta confiança. [...] Não existe uma instituição chamada
polícia militar, o que existe são milhares de pessoas que se con-
gregam em torno de uma instituição. Você não pode desumani-
zar. Existe um cara ali que também é pai de família, que tem uma
mulher esperando por ele, que tem filho ou que tem um marido,
no caso da polícia feminina, que tem mãe e pai.”
No fim, a verdade é que nem aquele estudante de Araras en-
furecido com um diretor autoritário teria conseguido imaginar
uma vingança tão bem executada.
179
Dentro da lei
Eu entrei em 1984! Não vi nada
disso, pô! Eu não faço isso!
Franciscon, major
Era para ser um ano qualquer. Como foram os outros 60 em
que levou seu comércio em Pirituba. Aos 85 anos, estava muito
bem acostumado àquela rotina. Lá pelas sete da manhã, quando o
sol amanhecia arrancando os trabalhadores da cama, ele já estava
içando a porta de aço. Ali pela rua, vinham chegando quatro rapa-
zes um tanto mal encarados. Cercaram-no dentro do bar e exigi-
ram dinheiro. Ora, como ousavam perturbar um senhor? Não ti-
nham vergonha na cara? Estavam um tanto alterados, certamente
tinham se drogado. Ele foi empurrando o grupo rebelde para fora.
Enxotando, indignado. Roubando um senhor?! E eles foram em-
bora desorientados como vieram. Mas foi outubro que deixou a ci-
180
catriz no ano de 2010. Outra manhã. Hora de abrir a venda, e ele
suspendia a porta, distraído. Foi até o balcão para ajustar os copos
lagoinha onde servia café e pinga. Quando voltou-se para a porta,
chegou a reconhecê-los. Mas teve tempo só para isso. Foram três
tiros para cair manchando o chão de sangue. Morreu ali mesmo,
sem ninguém para ver. Os rapazes já iam longe e, com a arma, sa-
be-se lá o que fizeram. Ainda assim, a fofoca no bairro era muita e
todos os dedos apontavam para eles. O tempo que ficaram presos
foi o mesmo que demoraram para executar a vingança: três meses.
Sem testemunhas, sem provas e com um advogado pago pelo mais
abastado, não poderiam mesmo ter ficado encarceirados por mais
tempo. Às sete da manhã, alheio a tudo isso, o sol foi acordando os
madrugadores nos dias que se seguiram. Mas a porta de aço não se
movia. Os copos lagoinha estão onde sempre estiveram.
*
Na televisão, o major Franciscon apareceu com o cabelo
mais curto. O corte raspado bem rente na cabeça devia ser uma
exigência do trabalho na rua, para onde o major voltava por
ocasião da Copa do Mundo.
Franciscon comandou as operações policiais na Vila Mada-
lena, na zona oeste. O bairro teve o recorde de 70 mil pessoas
no dia do jogo entre Brasil e Colômbia, pelas quartas de final.
O efetivo policial variava segundo a quantidade de torcedores,
chegando a mais de mil policiais.
A dificuldade ali era fazer a festa acabar. Os moradores pre-
cisavam dormir, as ruas precisavam ser limpas, os bares já es-
tavam fechados. Certa hora da madrugada, lá ia Franciscon e
seus soldados, varrendo metaforicamente as pessoas da rua
para que os funcionários da prefeitura viessem logo atrás var-
rendo literalmente o lixo da rua.
181
Na madrugada de quarta-feira, 2 de julho, torcedores revi-
daram com garrafas porque não queriam deixar o local. A po-
lícia respondeu com uma bomba de efeito moral e foi criticada
pelos boêmios e estrangeiros.
Na madrugada do sábado, dia 5, a PM colocou em prática
outra tática –planejada com a subprefeitura de Pinheiros, a
Guarda Civil e a CET. Major Franciscon começou a avisar por
um megafone em três línguas (português, inglês e espanhol)
que as pessoas deveriam ir embora.
“A Polícia Militar agradece a presença de todos. Devido à neces-
sidade de liberação da via para limpeza e demais providências, so-
licitamos a gentileza de encerramento das atividades festivas, para
que possamos proporcionar condições de, em breve, receber a to-
dos novamente. Desejamos um bom retorno a suas residências.”
Depois disso, lá pelas 2h30, passava o cordão de policiais, garis
e caminhões pipa lavando tudo. A tropa de choque não foi necessá-
ria. Fotos e vídeos do major e seu megafone foram parar nos jornais.
Tudo muito diferente da vida de Franciscon há alguns me-
ses, como subcomandante do 18º batalhão, em uma função
administrativa, longe da confusão da Copa do Mundo. Na rua
Chico de Paula, uma rua residencial pacata –tem até feira livre–
bem próxima à praça da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, é
que se esconde a sede do batalhão.
O batalhão cobre uma área de dois milhões de pessoas. São
600 policiais e 102 viaturas distribuídas em três companhias que
correspondem às áreas de três delegacias nos bairros Freguesia
do Ó, Brasilândia, Parada de Taipas e Jaraguá. As viaturas são
de vários tipos: Ronda Escolar, Força Tática, Rocam, 190, policia-
mento comunitário, viatura do comando (tenente), viatura do sar-
gento, viatura do comandante de companhia (capitão) etc.
182
Franciscon acha que o governo deveria investir para ampliar
o número de policiais. Mas, sem mais recursos, a decisão fica na
mão da polícia: mais policiais seria dividir uma mesma pizza em
mais pedaços. Como ninguém quer uma fatia menor, um tem
que trabalhar por dois e a qualidade do serviço é comprometida.
No 18º, o major é o subcomandante responsável pela parte ad-
ministrativa. Há ainda outro major responsável pelo policiamen-
to e o comandante, um tenente-coronel. Franciscon recebe R$ 6
mil líquidos. Acha um valor baixo para quem tem um doutora-
do e é responsável por uma área de dois milhões de habitantes,
numa função com risco de morrer e de causar a morte.
Seu local de trabalho é uma casinha pequenina com três ban-
deiras içadas, de um lado um muro verde de um instituto de reabi-
litação de pessoas especiais, do outro uma grade verde de um órgão
da prefeitura de vigilância de saúde. As letras dispostas na fachada:
Polícia Militar 18º BPM/M. Por dentro, a casinha é até bastante es-
paçosa. Passando um hall de entrada, vem uma sala com uma esca-
da para baixo. Nas paredes, pintadas de branco na parte de cima e
de azul-turquesa na de baixo, fotos dos heróis do 18º batalhão –poli-
ciais que morreram em serviço. Pela esquerda, segue um corredor
que leva a outra salinha pequena. No corredor, as portas de acesso
para as salas do comandante e do subcomandante, o major Francis-
con. No fundo do corredor, o vestiário. Mas é descendo as escadas
que se revela a casa de quatro andares com escritórios para os po-
liciais que trabalham internamente no batalhão, um refeitório, co-
zinha e até um consultório de dentista. Na garagem, uma ou outra
viatura, assim como na rua, estacionadas em frente à casinha.
Uma delas está quebrada. O major, que costuma pegar ser-
viço às 9h30, chegou atrasado ao batalhão porque teve que re-
solver esse pepino. Ir até a viatura, trazê-la com mecânicos. Os
183
mecânicos também são policiais, têm um macacão cinza da PM.
Inclusive, segundo uma nova regra de contagem de efetivo esta-
belecida pelo governo em 2013, os mecânicos são considerados
policias de rua, de policiamento.
Além deles, atendentes do 190, assessores de imprensa, guar-
das de quartel, equipes de departamento pessoal, equipes de lo-
gística etc são considerados agora parte do efetivo de policiamen-
to. Com a mudança, o número de PMs de rua passou de 61.174
em 2012 para 73.008 em 2013, e o número do pessoal adminis-
trativo diminuiu de 23.788 para 9.444.
Franciscon não teve tempo nem de trocar de roupa antes de ir
buscar a viatura quebrada. Chegou ao batalhão ainda de camiseta e
short, o uniforme da Educação Física. O major, agora mais fora de
forma, aos 48 anos, já foi um atleta –aliás triatleta, por dez anos.
Competiu pela PM na África do Sul, na Olimpíada Mundial
dos Policiais e Bombeiros. Pedalou ainda no México, nos EUA,
e nos circuitos de São Paulo, Rio e Santa Catarina. A Olimpikus
chegou a oferecer um patrocínio, mas não deu certo. Os tempos
de glória acabaram quando o joelho se arrebentou. Franciscon fez
cirurgia e parou. Agora só um exerciciozinho básico.
Quando ainda era segundo tenente, depois de ter se forma-
do, trabalhado no 17º batalhão, em Mogi das Cruzes, e no 14º, em
Osasco, o major prestou um concurso interno para instrutor de
Educação Física. Ele, então, fez o curso de Educação Física da PM,
reconhecido pelo MEC como uma graduação. Segundo o major,
é o primeiro curso de Educação Física do Brasil, criado em 1910.
Em 1992 e 1993, o major deu aulas de Educação Física no cur-
so de formação de soldados da PM, mas acabou transferido nova-
mente para Mogi, onde trabalhava à noite na Força Tática. Com
o filho mais velho, Victor, já nascido, o major pediu para voltar a
184
São Paulo. A única vaga disponível na capital era de professor na
Academia do Barro Branco.
Franciscon, já tenente, trabalhou nove anos na academia.
Além de Educação Física, ensinava história da PM, defesa pes-
soal e ordem unida –marcha, movimento de tropa, disciplina.
“No Japão, as escolas civis dão ordem unida para os alunos por-
que no Japão o pessoal é bem disciplinado. Não é uma coisa pro-
priamente militar, é uma coisa disciplinar. Para trazer disciplina
para um conjunto de pessoas”, explica. Ele chefiava ainda a seção
de Educação Física e Esporte da academia, além de ser técnico
das equipes de judô, natação e atletismo.
Pois estava lá a viatura quebrada e o major precisava se deslocar
para ver um galpão para alugar. A sede da Força Tática do batalhão
vai ter que deixar o local onde hoje está bem instalada e é função
do major encontrar um outro lugar para realocá-la. O problema é
que houve uma redefinição da área de cada batalhão e, com isso, a
Força Tática, onde está hoje, acabou fora da nova área do 18º.Franciscon não tinha tampouco um motorista disponível na-
quele momento. Teve que dar um jeitinho. Foi conversar com os
mecânicos e pediu que um ficasse consertando a viatura enquan-
to o outro o levasse ao galpão na viatura dos próprios mecânicos –
um Gol acabadinho, meio sujo por dentro, com umas peças soltas...
Carro de mecânico. Um mecânico enquanto mecânico não é pau
pra toda obra, mas um mecânico militar é. Se o comandante quer
um motorista, um motorista ele vai ser. E com o macacão da PM.
Chegando ao galpão, Franciscon foi recebido pelo dono
do imóvel, um senhor velhinho com bastante dificuldades
de audição, e um homem mais jovem, que estava interme-
diando o negócio. Eram dois galpões vizinhos que, no fundo,
tinham espaço para uma salinha e um banheiro. No andar
185
de cima, mais alguns cômodos. Nada que impressionasse o
major, que preferia que nada daquilo fosse necessário. Até
porque os galpões estavam sujos e danificados, certamente
precisariam de reforma.
Dali, o major foi fazer uma visita à sede da Força Tática no
Bairro do Limão –passar nas companhias periodicamente tam-
bém é função dos comandantes. Cada batalhão tem uma com-
panhia de Força Tática responsável por conter distúrbios civis
ante da chegada do Choque, reforçar o policiamento de rua e
atender ocorrências graves.
No pátio, as novas viaturas Hilux e um grupo de policiais com
uniforme preto de treinamento. Na parte de dentro, uma sala am-
pla e, no fundo, pilhas e pilhas de caixas de papelão sobre um ta-
tame. Por causa daquele material ali, a aula de judô para crianças
que acontece semanalmente teve que ser cancelada.
— Oi, comandante. Olha, chegaram aqui os novos uniformes do
batalhão, estamos separando pra cada companhia vir buscar.
Eram calças, camisetas, botas... tudo encaixotado. O novo uni-
forme da PM começou a ser usado ainda antes da Copa. É muito
parecido com o anterior, mas a camiseta passou a ser cinza escu-
ra, como a calça, e não de um tom mais claro.
À direita, entramos em um corredor quadrado, que dá acesso
às salas onde trabalham os PMs administrativos e também à sala
onde guardam material –armas de todo tipo, uma com um cano
maior que a outra.
Depois de exploradas a talvez futura e a atual instalações da
Força Tática, o major vai –no Gol com o mecânico– visitar o CIC,
Centro de Integração da Cidadania, que fica na sua área, na Estra-
186
da de Taipas, no Jaraguá. Só aí temos a dimensão da área do 18º. Foi quase uma hora num trânsito levemente carregado e num sol
de quase meio-dia para finalmente poder sair da viatura já cum-
primentando os PMs na entrada do centro.
Os CICs são programas da Secretaria da Justiça e da Defesa
da Cidadania. Seis estão localizados em áreas vulneráveis da ca-
pital; há outros cinco no interior. No CIC, as pessoas têm acesso
a serviços públicos gratuitos, palestras, oficinas, orientação social
e jurídica, atividades educativas, podem emitir documentos e até
casar, no casamento civil comunitário.
A diretora daquela unidade, Edilaine Daniel, explica que
os programas são realizados em parceria com diversos ór-
gãos e, em Taipas, um deles é a PM –para o orgulho do major.
Logo na entrada, está a base da PM com praças. Vira e mexe,
estão brincando com as crianças por ali. Os próprios policiais
dão aulas de futebol e jiu jitsu para as crianças no CIC. Em
seis anos, foram 600 crianças atendidas. A importância do
trabalho está em “agir na semente”, dizem, e se gabam por-
que até filhos de traficante aparecem nas aulas. Outro pro-
grama importante é o Resgatando Marias, que presta auxí-
lio psicológico e jurídico para mulheres vítimas de violência
doméstica, inclusive oferecendo tratamento para os maridos
com problemas de drogas e álcool.
Com isso, a manhã já passou. Faz muito calor. No CIC, o am-
biente é mais agradável. Água e banheiro à disposição. Mas é pre-
ciso encarar mais uma hora de volta ao batalhão no Golzinho. O
major tem que voltar aos pepinos diários. E o mecânico-motoris-
ta-quebra-galho tem que voltar a salvar viaturas.
Numa outra manhã, anterior, o major lamentava enquanto
olhava para as fotos dos policiais que morreram em serviço, ex-
187
postas na sala da escada, logo na entrada do batalhão. Os retratos
mais antigos eram de PMs mortos na década de 1980. As mortes
mais recentes eram do início dos anos 2000. “Todos nasceram de
uma mulher e são cidadãos”, dizia Franciscon.
Ali, antes de começar uma conversa sobre a sua vida de poli-
cial, achou necessário fazer um breve alerta sobre a mídia, que
“escolhe uma parte e publica como se fosse o todo”. Ele tem re-
ceio de reportagem, diz. Não precisava nem dizer. Está na cara,
no nervosismo, no tratamento excepcionalmente educado com
aqueles que podem espalhar inverdades e, principalmente, na
tentativa de expor todos os bons programas de polícia comunitá-
ria realizados no batalhão. Dentro da sua cordialidade, deixa cla-
ro que aquela entrevista é uma exceção, concedida tão somen-
te porque havia também um laço pessoal –para uma jornalista
amiga da namorada do seu filho.
Sentado em sua mesa em “L”, em uma sala espaçosa, com até
um sofá e uma mesinha dispondo livros sobre a polícia e sobre re-
ligião, Franciscon aprofunda suas críticas à mídia, que responsabi-
liza pela construção da imagem de uma polícia violenta e corrupta.
“Os construtores de opinião pública e a mídia colocam o po-
licial militar como corrupto. Então, o jovem, que não conhece
o policial, pensa ‘ah esse cara aí não merece crédito’. É um pro-
cesso de desconstrução de valores da nossa sociedade. [...] Se for
conveniente, a pessoa vai filmar aquilo que ela quer passar. Para
tender para onde ela quer.”
“Mídia, intelectuais, personalidades, artistas e área acadêmica
investem muito nessa mensagem de que a PM é filhote da dita-
dura. Eu entrei em 1984! Não vi nada disso, pô! Eu não faço isso!
Vê o meu currículo. O que eu fiz na minha atividade? Policiamen-
to de área, ambiental, professor de Educação Física. Quem é do
188
Choque está no Choque. Mas o efetivo do Choque dá 2% da polí-
cia. Eu não me vejo como filhote da ditadura não.”
Sobre as agressões a jornalistas durante manifestações, o
major desconfia: será que eram jornalistas mesmo ou black blo-
cks se passando por jornalistas para filmar o que interessa? Es-
ses jornalistas agredidos fizeram exame de corpo delito? E tem
mais: o jornalista que cobre manifestação deve saber que, se
está na chuva, é pra se molhar.
“A tropa de choque vai partir com tonfa pra poder lutar com
o grupo que está depredando e o repórter entra exatamente no
meio disso... É como entrar na chuva e achar que um pingo não
vai cair em você. Se, em qualquer guerra, repórteres morrem por-
que vão querer filmar a linha de frente... É uma grande oportu-
nidade para o jornalista filmar e espalhar para prejudicar quem
quer que seja e vender reportagem. Essa é a única finalidade. No
sentido de vingança ou oportunismo. Mas não há compreensão.
O repórter não vai querer compreender o lado da polícia.”
E qual é o lado da polícia?
“O lado da polícia é proteger o governo e a sociedade. A gente
age tanto em ação de cão bravo na via, como com um demente,
um idoso na rua, que caiu ou teve um mal súbito. A mesma via-
tura que está atendendo isso, de repente, é chamada para desobs-
truir uma via que está interrompida por manifestantes xingando
e tacando pedra. Quem é capaz de fazer tudo isso?”
Com a conversa fluindo, porém, o major fica mais à von-
tade. Sem deixar de escolher cuidadosamente as palavras, me-
dindo cada frase, se esforçando para ser o mais claro possível
–falando devagar e pausadamente. Franciscon tem a pele bem
branquinha e um cabelo cinza claro. Os olhos verdes peque-
nininhos estão sempre apertadinhos, principalmente quando
189
sorri. E sorri bastante. Com um nariz de batata, parece um pa-
pai noel. Se vestisse toda a fantasia, ficaria quase igual ao bom
velhinho apesar de, justiça seja feita, Franciscon não estar na
terceira idade e nem aparentar isso.
Acaba cancelando todos os seus compromissos por causa da
entrevista. Teria uma reunião com o pessoal da Ronda Escolar,
mas a hora passa e o assunto não acaba. “Você se importa se a
gente seguir?” Vai remarcando tudo para o dia seguinte. É bre-
ve com a mulher ao telefone: “Estou com uma jornalista, ela
está gravando.” Mas, quando dá 12h, encerramos. O major tem
que pegar a filha na escola.
Sua filha mais nova tem 11 anos. É a filha do segundo casa-
mento. A primeira mulher, Franciscon conheceu quando ainda
estudava na Academia do Barro Branco. Casaram-se em 1990 e o
filho, Victor, nasceu em 1991. Moravam na zona norte, a não ser
no ano em que foi transferido para Mogi. Em 1995, se separaram,
e o major se mudou para Pirituba, onde mora até hoje. O segun-
do casamento veio em 2000.
A primeira mulher é médica da PM e, como todo médico da
PM, é uma civil, que passou em um concurso e foi empossada
como segundo tenente. Os médicos, então, fazem quatro meses
de curso na academia e sobem à primeiro tenente. Depois de se-
parados, Franciscon chegou a dar aula para a ex-mulher no Barro
Branco, antes que ela assumisse um cargo no hospital militar.
Numa família de classe média, o major viveu a infância em
Pirituba. Aos 13, ajudava o pai no comércio, mas tinha o incentivo
para que seguisse outra profissão. Os pais pagaram cursinho para
que ele conseguisse ser aprovado no Barro Branco.
Naquela manhã, Franciscon também chegara meio esbafori-
do ao batalhão. Estava atrasado para a entrevista porque o tenen-
190
te-coronel lhe enviou a um evento em seu lugar na última hora.
Fora entregar umas três medalhas de reconhecimento a policiais
do 18º na reunião mensal da tropa.
O major, por sua vez, recebeu duas medalhas em sua carrei-
ra. Quando ainda era tenente, a polícia recebeu uma denúncia de
que presos planejavam explodir parte de um presídio e fugir. Mas
ao explodirem a determinada cela, iriam causar a morte de outros
presos ali dentro. A denúncia veio justamente da mulher de um
detento que não queria ficar viúva. Ela avisou que a dinamite já
havia sido roubada. À paisana, Franciscon e outros policiais en-
traram em um barraco com 50 kg de dinamite e 15 pessoas “to-
mando cerveja e comemorando o que iam fazer no dia seguinte.”
Depois, a equipe fardada entrou e acabou com a festa. “Evitei a
morte de um monte de gente, embora fosse um monte de bandi-
do, mas do mesmo jeito que ia morrer, também ia fugir.”
A segunda medalha veio com uma ocorrência do carnaval de
1990. Um homem ligou para a polícia dizendo que, ao sair de um
baile com a namorada, em Osasco, foi abordado por quatro ho-
mens em um fusquinha. Roubaram seu relógio, carteira, o agre-
diram e saíram levando junto a namorada. O Copom passou a
ocorrência na rede: todos atrás de um fusquinha azul. Eram 23h.
“Quantos carros azuis tinham naquela época em Osasco no car-
naval? Um monte de carro. Aí o pessoal falava: poxa, é impossí-
vel. E eu no rádio falando ‘atenção, efetivo, não vamos cessar, va-
mos fazer as buscas em todos os carros azuis, não desanima’. Em
15 minutos, eu andando num local ermo, vi um fusquinha bem
devargazinho, quando ele viu a gente, ele apagou as luzes. Aí nós
abordamos. Eram eles. A mulher estava lá. Prendemos os quatro.
Eles estavam com revólver e faca. Não chegaram a abusar da mu-
lher, mas iam fazer isso. E aí salvamos”, conta orgulhoso.
191
As ocorrências mal sucedidas, contudo, marcam mais ou
tanto quanto as heroicas. Era noite e um senhor chorava sen-
tado na calçada. Havia sido assaltado, mas pegou o crachá de
trabalho do ladrão. A polícia localizou o endereço da pessoa e
a prendeu. Tempos depois, o major fica sabendo que o ladrão
voltou e matou o senhor. Em outra ocasião, a mesma situação:
um idoso chorava na calçada.
— Eu moro na favela, mas entraram dois rapazes lá e me expul-
saram do barraco.
— Onde que é? Só mostra onde é o barraco, mas o senhor fica longe.
Os policiais entraram no barraco e lá estavam dois homens ar-
mados e com as respectivas namoradas. Dessa vez, foram presos
e tudo acabou bem.
O major orgulha-se de nunca na carreira ter precisado atirar
(só tiro pra cima para espantar suspeitos que haviam entrado no
mato). “Nunca matei ninguém”, diz.
Franciscon escolheu a carreira militar porque brincava de sol-
dado desde criança. “Meus brinquedos eram forte apache, tanque
de guerra. Com essa brincadeira, eu me realizava e hoje eu falo
que brinco no meu trabalho. Pra mim, é uma realização, é um
prazer. Não sinto nada que possa me desmotivar. Continuo me
divertindo, mas levando a sério, claro.”
A PM, porém, é muito diferente do Exército, que era onde
queria ser cadete, na verdade. “Eu achava que a polícia era des-
prezada, né? Ainda é. Mas, na época, eu rejeitava a polícia.” Ele
chegou a passar na Marinha, mas tendo sido aprovado no Bar-
ro Branco em segundo lugar, aos 17 anos, resolveu ser polícia
mesmo. O curso de oficial na PM durou cinco anos, de 1984 a
192
1988. Foi um tempo de aprendizado sobre direito, administra-
ção pública, filosofia, sociologia. “Não aprendi nada de guerra.
só vi canhão em exposição.”
O militarismo da PM, para o major, é uma questão de estética,
eficiência, organização e disciplina. E é difícil explicar a natureza
híbrida, civil e militar, da polícia. “O PM é um catalisador de pesso-
as que colaboram tanto de outros órgãos públicos como da socie-
dade. Por isso, por estar envolvido diretamente com políticas públi-
cas, é uma atividade civil. Ele tem que ser civil. Por outro lado, para
sua administração, para facilitar o comando, o controle, preservar
os valores institucionais e facilitar o relacionamento entre superior
e comandados, a natureza militar reveste de mais autoridade a es-
trutura. Para manter a corporação menos vulnerável à tensão do
dia a dia que acaba levando a essa cultura de corrupção.”
“Nos Estados Unidos, as pessoas respeitam os vizinhos, o pro-
fessor, o juiz. As casas têm bandeira na porta, eles cultuam isso.
Claro que eles têm uma visão belicista, produzem pela mídia seus
heróis. Mas ali não precisa de um regime forte para o policial fazer
o papel dele. Porque ele já aprendeu a fazer o papel dele na famí-
lia, na escola, na comunidade. Não precisa de um regime militar
porque ele já foi regrado. Agora o brasileiro é meio assim... larga-
do. Então se você ganhar um poder e não tiver um regramento for-
te, aquele que tem o poder vai abusar porque é costume.”
O Tribunal Militar, por exemplo, é uma ferramenta de disci-
plina. O policial que comete um crime ou que simplesmente se
recusa a obedecer seu comandante pode ser preso e será julgado.
Além disso, o major aponta uma simbologia no militarismo que
ajuda no psicológico do militar: um recrutinha que vê um coronel
no fim de carreira e o toma como exemplo. As medalhas e o pa-
triotismo também estão no simbólico do militarismo.
193
“A gente não fala hoje patriotismo porque está tão... O pessoal
deixou tão de lado. Mas o civismo. O bem comum da sociedade.
Você verifica que o pessoal só canta hino nacional quando tem
jogo da seleção brasileira. Ou então nos quartéis. Então [o mili-
tarismo] acaba sendo uma reserva cultural do civismo do país.”
Quando foi promovido a capitão, Franciscon foi trabalhar na
polícia ambiental, que age em todo o Estado de São Paulo. Como
vinha de uma área de ensino, após anos no Barro Branco, o coro-
nel o designou para chefiar o treinamento da polícia ambiental.
Foram nove cursos realizados em três anos –de identificação de
madeira em parceria com o IPT, de manejo e contenção de ani-
mais com veterinários e zoológicos, de monitoramento georefe-
renciado, de policiamento de rua em torno do zoológico.
Apesar do bom trabalho, Franciscon acabou sendo transferido
de posto e foi comandar uma companhia do 49º batalhão em Pi-
rituba em 2006. O major se preocupava na época –e em toda sua
carreira– em aproximar polícia, órgãos públicos e sociedade para
tornar as ações de prevenção mais eficazes dentro de um contexto
de polícia comunitária.
“A polícia militar é uma polícia de serviços humanos. Realiza
serviço de ajuda. Se uma pessoa precisa de informação, chama o
policial. Precisa ser socorrida pro pronto-socorro, viatura leva. Par-
turiente? Viatura. Cão bravo na rua, chama o policial. Então não é só
crime, são serviços de ajuda humana. O que são serviços de ajuda
humana? Tudo. A pessoa precisa, tá lá. Não dá pra falar ‘não vou.’”
O principal problema identificado pelo major na companhia
era o fato de, todos os dias, das 19h às 23h, quase todas as via-
turas estarem empenhadas nas ocorrências chamadas de desin-
teligência, basicamente, brigas de família. O problema dessas
ocorrências é justamente o potencial para que dali surja um ho-
194
micídio. A Secretaria de Segurança Pública analisou homicídios
dolosos registrados em Boletins de Ocorrência entre janeiro e
abril de 2014 e, em 12,5% dos casos, as vítimas foram mortas
por causa de conflitos entre familiares e casais. Os mesmos nú-
meros mostram que, a cada dois dias, três pessoas são mortas
no Estado de São Paulo em brigas de família.
“Eu vi que essas famílias precisavam de auxílio e orientação
porque estavam em processo de desagregação familiar, por falta
de formação ou recursos. A gente sente a carência de uma assis-
tência social que tinha umas décadas anteriores, mas hoje não
tem no Brasil. O governo não investe muito nisso.”
O major então buscou suprir essa falta do Estado com orga-
nismos sociais (associações, igrejas, psicólogos e voluntários) que
passaram a visitar as famílias com ocorrências. Ele pegava os Bo-
letins de Ocorrência e ligava:
— Oi, Fulana, a senhora recebeu a visita da polícia tal dia?
— Foi...
— E como que está a situação agora?
— Tá tudo bem, é que aquele dia meu marido estava de cabeça
cheia.
— E vocês estão precisando de algum apoio? Orientação?
— Ah, a gente precisa muito.
— Posso fazer um contato com um agente comunitário pra visi-
tar vocês?
— Pode.
Em quatro meses, as ocorrências de desinteligência foram
praticamente zeradas e as viaturas não ficaram mais empenha-
das nisso. Segundo o major, os policiais levam em média de 40
195
minutos a três horas para resolver uma ocorrência de marido e
mulher. Isso em média. Ele conta de uma briga de filhos de vizi-
nhos que envolveu 17 pessoas e levou 11 horas. Com as viaturas
livres, as ocorrências “normais” caíram em 23%.
Pela iniciativa, o major respondeu a nove denúncias feitas por ou-
tros policiais à Corregedoria da PM. “A gente enfrenta isso quando lida
com pessoas, não consegue agradar todo mundo. Alguns policiais não
concordaram, diziam que eu estava passando ocorrência pra minha
igreja. Mas a minha igreja era em Guarulhos e eu morava em Pirituba.
O que eu tinha era um contato com várias igrejas e associações.”
Nessa época, Franciscon foi chamado para fazer o mestrado na
polícia, no Centro de Altos Estudos de Segurança (Caes), algo neces-
sário para alcançar o posto de major. Embora não seja reconhecido
pela Capes, é um mestrado profissional e tem um ano de duração.
O major fez dessa prática desenvolvida na companhia, batizada de
“Paz na Família”, a sua tese na área de Ciências Policiais e de Segu-
rança e Ordem Pública. Seu orientador foi o comandante do bata-
lhão que, na época da apresentação, era o subcomandante da PM em
São Paulo. “Na véspera da formatura, veio a última denúncia. Dei a
cópia da minha tese, e o subcomandante encaminhou para o secre-
tário de segurança. E nunca mais veio nada. Aí resolveu.”
Em 2012, já no posto de major, foi comandar o 18º, na Fregue-
sia do Ó, e ainda naquele ano, participou de uma mega operação
envolvendo cinco batalhões na serra da Cantareira, uma área de
encosta invadida, com muitas favelas, que vai desde o Jaraguá até
a rodovia Fernão Dias. Em Jaraguá e Taipas havia um índice alto
de 17 a 21 procurados da Justiça presos por mês. Detidos não em
ocorrências, mas em abordagens.
As abordagens policiais são, aliás, um dos pontos de ques-
tionamento sobre a ação da polícia. Segundo uma pesquisa di-
196
vulgada neste ano pela Ufscar, que analisou 734 processos da
Ouvidoria, de 2009 a 2011, a cada 100 mil habitantes, houve
35 negros presos contra 14 brancos, sendo que 30% da popu-
lação do Estado é negra. A tese argumenta que o racismo está,
portanto, institucionalizado na PM.
Franciscon diz que a abordagem é muito importante para re-
tirar drogas e armas, e pegar gente que está com mau propósito
para cometer o crime. “O policial está no policiamento: aquela
pessoa lá tem um jeito suspeito, vamos abordar? O cara não esta-
va fazendo nada, não tinha nada, respeitava o policial e, quando
ia ver o RG, procurado pela Justiça.”
Essa definição de jeito suspeito é que é, digamos, suspeita,
mas o major tenta explicar. “A pessoa pode ter roupa de mendigo
ou a roupa de uma pessoa chique, você não sabe, mas pode ser
um ladrão. Tem pessoa que tem rosto de médico e professor, mas
é bandido. Mas sempre tem um perfil. A maior parte dos presos
são adolescentes e jovens, entre 16 e 23 anos, homens. Cor? Hoje
não tem tanto. Hoje não tem status, rico está roubando, pobre
está roubando, porque é uma moda, é o desafio do jovem adoles-
cente de mostrar que é homem. Desafiar a autoridade e roubar.”
O major argumenta que a ação de abordagem é preventiva e qua-
lificada, ou seja, direcionada para tornar a ação eficaz. A definição do
alvo vem com pela vivência ou feeling do policial, pelo planejamento
do comando, que rastreia locais com mais incidência, e também atra-
vés de descrições de vítimas. “As abordagens recebem críticas porque
a mídia traz que a sociedade fala que a polícia está sendo autoritária
ou arbitrária fazendo a busca pessoal. O código do processo penal dá
esse poder. E é importante fazer isso para agir com prevenção.”
Voltando à ação na Cantareira, os batalhões 26º, em Mairi-
porã, o 49º, no Jaraguá, o 5º e o 9º, na zona leste, ficaram res-
197
ponsáveis por cercar a área, enquanto o 18º atuaria lá dentro.
A operação foi planejada com o coordenador operacional da
PM e a Secretaria de Segurança Pública. Participaram a Rota,
o Coe, a polícia ambiental e a polícia de trânsito –um total de
280 policiais. Dois meses antes, a PM se preparou com fotos,
mapas, Google Earth, sobrevoos na região com helicópteros,
maquete. Eram 81 pastas com informação para 81 equipes de
prevenção qualificada.
Parte da polícia entrou no local antes, às 4h, e a operação co-
meçou de fato às 6h. Em quatro horas, foram 17 presos, dinhei-
ro e armas apreendidos, três mil pés de maconha e três antenas
clandestinas encontrados, motos e veículos roubados recupera-
dos, uma vítima de sequestro liberada.
Quando a operação terminou, um grupo do Coe ainda ficou
escondido na serra. Quando os suspeitos retomaram suas posi-
ções, onde terminava a ocupação do solo e começava a vegetação,
os policiais chegaram pelo mato, surpreendendo a todos.
Lidar com a favela que cresceu ocupando a serra não é nada fá-
cil. Mas o que tira o sono do major mesmo são os bailes funk. São
um pesadelo. São o sinal de que a sociedade caminha para o abismo.
“Está havendo uma desconstrução de valores sociais. Está
havendo questionamento de quem tradicionalmente tinha au-
toridade. E estão recebendo reconhecimento aqueles que não
deviam. Por exemplo, um cara que promove um baile funk, ele
é um herói, um líder. O PCC, que faz o tráfico e promove festa
de baile funk, é o bambambã.”
Franciscon explica que o fenômeno baile funk acabou di-
minuindo as biqueiras nas favelas porque é mais fácil vender
tudo nos bailes, frequentados por jovens de várias camadas so-
ciais e regiões da cidade.
198
Como não poderia deixar de ser, em sua carreira, o major teve
um grande episódio de combate ao baile funk. Foi também no 18º, na
Freguesia do Ó, em 2013. Restaurantes tradicionais próximos à praça
da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, frequentadores da missa,
feirinha de artesanato, crianças, todos no bairro tranquilo tiveram a
rotina alterada quando o funk dominou as ruas entorno da igreja.
O major conta que um político conseguiu (mesmo sem al-
vará da Prefeitura) abrir oito bares para oito cabos eleitorais
em uma rua ali perto. Os bares fechavam a rua com mesas,
vendiam bebida alcoólica barata para menores, e o funk rolava
solto. Vinham dois mil jovens, inclusive das zonas sul e norte,
para o baile funk que acontecia sexta, sábado, domingo e até
quinta-feira à tarde. E sobrou pra PM resolver. Mas o major de-
cidiu que não ia segurar o problema sozinho.
“Houve um processo de omissão ao longo do tempo, dos po-
deres públicos e da sociedade. A Prefeitura não agiu quando ti-
nha que agir, a CET não atuou, a Polícia Civil, a Polícia Militar,
a Guarda Municipal, a igreja se omitiu, a associação do bairro...
Então foi assim até atingir esse status, essa condição.”
A solução foi marcar uma audiência pública no centro cultu-
ral do bairro. Franciscon chamou de porta em porta os bares, igre-
ja, moradores, restaurantes. Convidou o delegado, subprefeito,
CET, Psiu –“todos que tinham que dividir a pizza”. Numa quarta-
-feira à tarde, reuniu 81 pessoas. “Expusemos o problema e as
autoridades puderam falar sobre o que estavam fazendo pra re-
solver. Na verdade, não estavam fazendo nada, mas deram aquele
sambarilove.” Outra reunião foi marcada para que as os órgãos
públicos apresentassem o que haviam prometido.
A ideia era unir todos os responsáveis públicos e a sociedade
para resolução do problema. “Eu fiz a reunião para mostrar à opi-
199
nião pública e não recair só nas minhas costas. Chamei os jornais
de bairro para retratarem e um fato curioso foi que um desses ór-
gãos públicos não veio. O jornal destacou essa ausência. Aí na reu-
nião seguinte o cara veio, então funcionou.”
Com todos os órgãos atuantes, o bairro venceu o baile
funk. E Franciscon ganhou o prêmio Mário Covas, que ho-
menageia boas iniciativas desenvolvidas por servidores e fun-
cionários públicos em São Paulo.
Outra questão que marcou esse período no 18º foi uma área
de preservação em Taipas, com um manancial, que estava cerca-
da de favelas. O major conta que pessoas com intenção eleitorei-
ra estavam influenciando os sem teto a invadir a área. Em troca,
teriam assessoria de um advogado, mas precisariam assistir às
reuniões partidárias do tal partido. Quando o major foi procurar
o dono do terreno, descobriu que ele também estava no esquema:
iria doar o lote em troca de dinheiro.
“No final, o que ia acontecer? Aquelas famílias, que iam inva-
dir e multiplicar, talvez iam trazer famílias de outras áreas: zona
sul e zona leste. Aumentaria mais a ocupação do solo, ia degradar
a área ambiental, ia aumentar a quantidade de violência e crime.
Ia aumentar esgoto, ia aumentar demanda de tudo.”
A Polícia Militar então retirou as poucas famílias que já lotea-
vam o espaço. “Documentamos tudo, tudo com educação, agindo
sempre com a lei.” O major enviou o caso para a Prefeitura e para
a Promotoria, que ordenou segurança ali 24h para evitar a invasão.
Depois do sucesso contra o baile funk, Franciscon foi transfe-
rido. Foi ser chefe do planejamento operacional do comando da
zona norte e foi chamado para fazer seu doutorado na PM, o que
abre as portas para a ascensão a coronel. Com a tese concluída,
o major só espera o dia da promoção e, até que se torne coronel
200
Franciscon, voltou a trabalhar no 18º. Detalhe: a tal área ambien-
tal de Taipas foi invadida nesse meio tempo.
Foi só mais um pingo de decepção na carreira policial –cheia
de dificuldades. A maior desilusão de Franciscon é justamente a
sociedade brasileira. “Porque ela não respeita a autoridade e não
respeita as leis. O brasileiro viaja para os Estados Unidos e respei-
ta as leis lá. Até para ser chique e educado. Mas quando ele des-
ce no Brasil, continua fazendo as coisas igual ao favelado que ele
critica. Isso vai desde o pobre até o que tem formação. Ser polícia
no Brasil não é fácil que nem nos EUA ou na França, onde as pes-
soas respeitam a lei e a autoridade.”
Mas, se brasileiro não gosta da polícia, vai ter que engolir mes-
mo assim. O major diz que não há governo sem polícia porque
onde há lei, haverá gente disposta a descumpri-la. O major recla-
ma, por exemplo, da falta de respeito com os pais, professores e
até com o guardinha da CET. “Quando chega a Ronda Escolar,
tem aluno que fala assim: ‘manda aquela viatura grande que essa
pequena já não dá mais pra nós’. Falta o conteúdo de valores que
vem da família, e o policial acaba agindo como inspetor de aluno.”
No Brasil, o tal do “você pensa que é quem” reina. E contra
isso, o major rebate com um pensamento conservador que reina
igualmente, a tal da “inversão de valores”.
“Essa troca de valores é um processo que eu noto há uns
dez anos. Quando eu entrei na PM, em 1984, já era o processo
de abertura política, a polícia já estava querendo não ser vista
mais como autoritária, estava buscando uma forma de apare-
cer junto a sociedade, mas ainda tinha a rivalidade ideológi-
ca de quem era capitalista e quem era comunista. O governo
militar do lado capitalista, os intelectuais, políticos e artistas
dormiram pro lado da URSS, que era comunismo. A questão
201
ideológica era sempre presente. Mas quando eu entrei, adoles-
cente, 17 anos, aprendendo as coisas, a policia me passou coi-
sas boas, eram professores bons, eram pessoas boas, cidadãos,
assim como eu fui professor na academia também. Aqueles
pacotes que vêm prontos dos formadores de opinião para a so-
ciedade são muito perigosos. E hoje a gente vê isso continuan-
do de novo. Hoje você não tem os pólos de comunismo e capi-
talismo. Há bandeiras ideológicas fragmentando a opinião das
pessoas. Ora a pessoa é a favor disso, ora é a favor daquilo, ora
ela se radicaliza pra uma situação, ora ela tolera outra. Bandei-
ras da descriminalização das drogas, penas alternativas, ques-
tionamento da autoridade.”
É dentro desse molde conservador de pensamento que o
major analisa os protestos de junho de 2013. Para ele, não
houve excesso da polícia nas manifestações porque não se tra-
tavam propriamente de manifestações, mas de uma ação cri-
minosa dos black blocks.
“Eles não foram fazer só manifestação. Pra quem foi fazer a
manifestação e não era black block, a polícia foi dar segurança. A
ideologia dos black block é de guerra social. Pelo menos, é o que
eu vi eles mesmos postando na rede social. Então, eles têm uma
tática de ação, eles distribuem cartilha sobre como agir, eles pa-
gam adolescentes para atuar. É um sistema tático de atuação. Eles
se misturam com aqueles cidadãos que estão indo para se mani-
festar, mas não estão no mesmo espírito de manifestação civil.
Eles estão no outro espírito e acabam causando o dano ao patri-
mônio e às vidas. Então, a polícia tem que agir.”
Alegando que a medida limitaria a manifestação àqueles
com espírito de protesto civil, o Estado de São Paulo aprovou
em julho deste ano uma lei proibindo o uso de máscaras e o por-
202
te de “objetos pontiagudos, tacos, bastões, pedras, armamentos
que contenham artefatos explosivos e outros que possam lesio-
nar pessoas e danificar patrimônio público ou particular.”
Franciscon diz que os movimentos sociais são manipulados
segundo interesses eleitoreiros e de partidos. As pessoas nunca
estão na rua somente pela causa que defendem. “Isso eu apren-
di na vivência com o que eu observei. Eles pegam os humildes
e usam a necessidade deles para fazer um movimento social de
fachada para se autopromoverem como líderes sociais naquele
meio. Dá vontade de... É triste isso viu!”
Da mesma forma, os black blocks, com sua ideologia importa-
da da Europa por “quem tem dinheiro”, se aproveitaram do senti-
mento anti-Copa para ganhar o movimento. A polícia identificou
as táticas black blocks com base em estudo e análises e, embora
não negue que falta comprovação, o major afirma: “muitos jovens
deixaram de ser telemarketing e office boy pra ir pro black block.
Ganham uma cartilha de tática de ação no movimento social. Por
exemplo, cuspir na cara do polícia. ‘Ó, aquele policial ali é grande,
vai dar visibilidade. Deixa o cara nervoso, cospe, joga pedra, que
quando ele vier, ele vai bater em você, mas a gente vai filmar. Va-
mos com roupa normal e vamos falar que somos freelancer pra
depois vender pra um jornal.’”
O policial tem que estar preparado para essa tática da pro-
vocação e não responder. Cabe ao oficial, punir e retirar da ope-
ração aqueles que respondem, segundo o major. “Tem que ficar
lá ouvindo, e entrar por um ouvido e sair pelo outro. Depois de
um tempo, isso fica automático. Porque você já sabe as regras
do jogo. O repertório é sempre o mesmo. Fala que é corrupto,
que é da ditadura, da repressão, xingamentos chulos também.
Não tem muita criatividade não”.
203
Franciscon diz que os black blocks têm origem no bloco das tre-
vas, algo que surgiu com o punk depois da Segunda Guerra Mun-
dial, já nos anos 60, quando o jovem estava louco, sem esperanças
por causa das bombas atômicas. “Raspava o cabelo, numa forma de
mostrar a revolta, e pintava o olho de preto. Aí vem o dark e mais
toda aquela sequência de modismo, de comportamento jovem.”
Para o major, não há falta de preparo para lidar com a manifes-
tação. “Tem que ter uma preparação contínua. A polícia se preocupa
muito em estar preparando. Prepara a parte psicológica, a parte in-
telectual, a parte física. As pessoas não têm conhecimento do nosso
preparo. Mas é um risco de um piloto de avião. Se der uma pane, o
avião cai e todo mundo morre. O erro dele é fatal. Um cirurgião, se
errar, o erro dele é fatal. O policial, o erro dele pode ser fatal. O pilo-
to e o médico tiveram um bom preparo. Pra ser um policial, exige-
-se um bom preparo, mas é estar lidando com fatalidade.”
O problema é que a dificuldade do policial no Brasil não é só
essa inversão de valores da sociedade. Franciscon diz que é tam-
bém a falta de reconhecimento do Estado, o que se reflete nos sa-
lários dos PMs. “Na visão global abaixo da linha do Equador, quais
cidades arrecadam como São Paulo? Cingapura? Nova Déli? A ci-
dade tem esse potencial todo e como pode termos a quinta polícia
mais mal paga do país. Tinha que ser a primeira mais bem paga do
país e de outros países do sul.”
Soma-se a isso a decepção do major com os “companheiros
que não correspondem”, largamente chamados de “maus poli-
ciais”. Como em toda profissão há resiliência, diz o major, a boa
formação e o caráter militar servem para evitar a má conduta –“e
mesmo assim acontecem essas situações”.
Franciscon conta que já prendeu policiais, mas já deixou de
prender também, quando faltava evidência. Diz que não prende
204
injustamente um pai de família só por pressão de jornais. Ele só
prende no ato se constatar que realmente houve dolo, a intenção
de matar, ou quando houve corrupção.
“Uma vez eu prendi um policial que desceu da viatura, dispa-
rou a arma acidentalmente e matou uma pessoa. Ele não queria
matar a pessoa, mas esse eu tive que prender porque ele matou
um cidadão. Acabou sendo solto porque se provou que a arma
dele tinha problema. Há dez anos, eu mandei embora um cabo
que roubou linguiça. Tinha um salário baixo, faltou dinheiro para
comprar a mistura, e ele roubou para levar para a família. Foi
furto famélico. Mas quem era essa pessoa? Era um metalúrgico,
um desempregado? Era um policial. Aí muda de figura. Ele tem
um dever. A família estar passando fome não justifica. Já tinha 25
anos de carreira, foi mandado embora e preso.”
“Quem está pondo esta farda saiu da sociedade que a gente
lida. Não tem diferença nenhuma. É a mesma pessoa. Ela só recebe
o preparo técnico profissional e a doutrina de polícia para estar tra-
balhando. A polícia é um dos órgãos públicos do Estado que mais
investem recursos financeiros em treinamento de pessoal. A Jus-
tiça Militar não é uma justiça especial, privilegiada. É eficaz. Julga
apenas 120 mil pessoas (PMs na ativa e mais a reserva). O processo
é rápido e o cara vai pra rua. A Corregedoria da PM também é mui-
to forte e atuante.” Se a educação e a punição não conseguem zerar
os casos de abuso policial, é claro que Franciscon não atribui isso
à corporação, isolando os crimes cometidos por homens fardados.
“No poder público do Brasil, tem muito abuso de poder. A
região do Amazonas é uma terra sem lei. Aqui em São Paulo é
ótimo. Nossa polícia não comete abuso de poder. Há ocorrên-
cias de abuso de poder individual, de algum policial que não
conseguiu cumprir a lei, mas a instituição preza por manter o
205
cumprimento da lei. A pessoa representa toda a sua instituição,
mas não é a instituição. Ela é membro. A instituição busca mi-
nimizar sempre o acontecimento desses fatos. Mas o ser huma-
no é um ser imperfeito. Esse tipo de trabalho que eu fiz [no 18º batalhão] nada mais foi do que convidar e estimular os outros
órgãos públicos a não abusar da lei, mas a cumprir a lei.”
Nas suas teorias sobre criminalidade, ele diz que há um compo-
nente, social, claro, mas que quem pratica o crime não é só aque-
le que não teve oportunidade. “Essa resposta não é a resposta pra
tudo.” O major diz que também depende dos valores de cada pes-
soa, já que um mesmo pai pode criar dois filhos: um se torna advo-
gado, outro se torna criminoso. Mesmo pra quem tem condições de
ser alguém na vida, às vezes o crime tem melhor custo-benefício.
Além disso, o ambiente também pode ser um detonador de
crimes. Adepto da teoria das janelas quebradas, o major diz que
“um ambiente que não tem um cuidado, não tem o zelo da coleti-
vidade, vai induzir aquela coletividade a reproduzir isso, influen-
ciando o comportamento das pessoas. Uma área que está impac-
tada pode irradiar e aumentar a quantidade de ocorrências.”
Sempre na defesa do cumprimento da lei, Franciscon acha
que o discurso de “bandido bom é bandido morto” está “por fora”.
Ele não cultua isso. E não compactua também com punição co-
letiva da sociedade. Bandido amarrado no poste “é uma cultura
totalmente primitiva, é falta de regramento social”. Mas também
prova que tanto a ação como a omissão da polícia influenciam a
sociedade. “Se ela atuar bem, está influenciando bem. Se atuar
mal, ela está influenciando mal. Por isso, é um setor muito im-
portante que todos têm que valorizar, compreender, prezar pra
que seja bem aperfeiçoada ao longo do tempo.”
*
206
“Esses bandidos ainda devem estar vivos. Fazer o quê? A lei
do Brasil é assim: falha. Mas eu não organizei esquadrão da mor-
te, não mandei sair matando bandido por aí. Continuei normal.
Não precisei de psicólogo. O que me ajudou muito foi a fé, sou
evangélico. Me senti impotente como qualquer outro cidadão. Se
aconteceu isso comigo, o comandante de policiamento de Pirituba
na época, todos estão correndo o risco. Aí falam pra mim, que tive
meu pai morto, que eles viraram bandidos porque a sociedade e o
governo não deram oportunidade. Não tiveram oportunidade, né?
Mas foram lá e mataram meu pai. Isso é um discurso muito super-
ficial. Cada vida é um detalhe.”
209
A mãe
Ah, você quer brigar? Vamos brincar de tiro então.
Vamos fazer um faroeste aí no meio da rua.
Adriana, soldado
Adriana diz que é sua intuição que a leva ao lugar certo na
hora certa.
“Marta, preciso fazer uma ligação.” Na época, não havia celu-
lar. A viatura encostou perto de um orelhão (ainda do tipo casinha
de concreto) em uma rua próxima à Augusta.
“Quando eu chego no orelhão, tem uma criancinha. Re-
cém-nascida, toda embrulhadinha, tinha acabado de sair da
maternidade”, conta.
Adriana nem fez a ligação.
— Marta, olha isso aqui!
210
— Adriana, de quem é?
— Eu achei.
— Achou onde?
— Dentro do orelhão.
As roupas cor-de-rosa indicavam de qual maternidade vinha
o bebê. Acostumada a patrulhar a área da Paulista, Adriana já
tinha visto mulheres de rua dar à luz ali e ganharem a mesma
roupinha rosa para os filhos.
A soldado então acionou o Copom e o seu comandante –uma
comandante, no caso. Antes da unificação do policiamento femi-
nino e masculino, Adriana fazia parte da polícia feminina, com
um efetivo separado e com batalhões próprios (quatro na cidade),
que não cobriam uma área tão pré-determinada como os bata-
lhões regulares. Elas cuidavam de ocorrências mais leves, como
ajuda a gestantes, primeiros-socorros e casos de família. Quando,
por acaso, pegavam ocorrências mais sérias, eram orientadas a
esperar mais apoio e não tomar a dianteira do caso.
Ao levarem o bebê à maternidade, conseguiram o nome de
duas suspeitas que tinham parido há pouco. De lá, para delega-
cia. Enquanto o Boletim de Ocorrência era feito, Adriana, que fi-
cara com a criança –desde a manhã até cerca de 21h–, tinha que
levá-la de tempos em tempos ao hospital para ser amamentada.
Choviam repórteres na delegacia.
O delegado localizou uma moça, foram até a casa dela e... era
ela mesmo. O irmão e a cunhada não haviam percebido que ela
estava grávida, por medo, abandonou o bebê no orelhão.
Já era madrugada quando a situação estava esclarecida e a
criança foi entregue à mãe –não sem que quase todos os persona-
gens fossem interrogados pelos repórteres.
211
As ocorrências que ficam na memória são as que “mexem com
a gente como pessoa, mas temos que tomar atitude como policial
militar”, diz Adriana. É claro que nem sempre dá tudo certo.
“Uma que me emocionou muito e a gente teve um traba-
lho muito árduo como policial foi adentrar um prédio com dez
andares e socorrer um senhor de 300 kg que estava tendo uma
parada cardíaca”, conta.
A ocorrência caiu nas mãos da PM feminina. Adriana e sua
companheira não podiam esperar o resgate. Era preciso levá-lo ao
hospital. Mas como movê-lo?
“Ele estava no chão já. Nós fizemos respiração boca a boca.
Enquanto uma fazia isso, a outra fazia massagem. Na época não
tinha luva, não tinha nada. A gente pegou um saco plástico, fez
um buraco no saco plástico e colocamos na boca dele. Com muito
sacrifício, conseguimos colocar um cobertor debaixo dele e arras-
tamos junto com os dois zeladores do prédio. Fomos arrastando
ele até o elevador”, diz Adriana.
No térreo, o desafio era maior: colocá-lo dentro da viatura, o
que foi feito através de “muito custo, muito muito muito”.
“Saímos correndo e, infelizmente, ele chegou ao hospital
morto. Mas ele saiu vivo, ele saiu vivo do prédio. Isso foi terrível.
Mas a gente não mediu esforços pra fazer... Ele tinha 300kg.”
Em 23 anos de carreira, Adriana nunca teve ocorrência
com morte –nem de policial nem de suspeito. “Foram mui-
tas ocorrências maravilhosas.” Nenhuma em que ela tenha
tido medo de morrer –nem mesmo nos ataques do PCC, em
2006. E nem mesmo depois de perder um companheiro de
trabalho. “É triste, muito triste. A gente não consegue racioci-
nar, a gente fica imaginando: ai, já pensou se fosse eu, se eu
estivesse ali. É desolador. Mesmo porque, no outro dia, a gen-
212
te não vai ver o polícia, não vai ouvir ele falar no rádio”, conta,
já com lágrimas nos olhos.
Mas a tristeza é passageira. Adriana é moça alegre, logo se vê.
Aos 47, depois de ter passado poucas e boas, é espontânea e di-
vertida. Vai narrando uma sequência de acontecimentos incríveis
como numa conversa de bar. É uma morena alta. O cabelo liso
preto está preso num rabo-de-cavalo. Usa um piercing pequeno
no nariz, uma blusa regata amarela e um esmalte azul –desses
que chamam atenção. A soldado é absolutamente fiel à sua pro-
fissão. Não por afinidade total com a corporação, pelo contrário.
Mas porque guarda o policiamento de rua no coração.
Adriana entrou na PM em 1991, aos 23 anos. Foram oito me-
ses no curso de formação, que, segundo ela foi “ótimo”. Sua tur-
ma foi a última a ter aulas no CFAB (Centro de Formação e Aper-
feiçoamento de Bombeiros), na marginal Tietê, onde hoje fica a
Escola de Sargentos. Na época, não eram misturados os alunos
homens e mulheres. Sua turma tinha 224 meninas.
“Era todo dia treinamento, você entrava no alojamento e eram
224 meninas pra pouco chuveiro. Você tinha que tomar banho
em um ou dois minutos porque tinha que voltar pra sala de aula.
Aquele monte de menina! Tomava banho de gato, mas tinha que
estar perfeita, cabelinho arrumado, batom, a roupa impecável, sa-
pato engraxado, a saia e a camiseta muito bem passadas.”
Depois da turma de Adriana, as “PM fem” foram treinadas
nos próprios batalhões femininos –eram os GTs (Gabinete de
Treinamento).
“No GT, não tinha aula de tonfa, comando craw, era uma coi-
sa muito simples. A minha não, a minha turma foi a última que
foi pesada. Tive que passar embaixo de lama, atravessar corda e
cair no rio na água podre, subir naqueles ferros bem altos pra ver
213
se a gente não tem medo de altura, correr 20 minutos todos os
dias, abdominal... Quando faltava um mês pra terminar o curso,
eu queria desistir porque eu não aguentava correr mais. E quem
não deixou foi uma tenente que, na época, tenente ótima, lembro
até hoje, era segurança da primeira-dama e dava aula de Educação
Física. E ela não me deixou sair.”
Dali, Adriana só saiu formada para fazer o policiamento
de rua. “O sonho de todo mundo, não adianta, é sentar den-
tro de uma viatura. Não adianta falar ‘vou entrar na polícia,
vou sair do curso e trabalhar na administração’. Mentira. O
sonho de qualquer policial que faz um curso, o primeiro so-
nho dele é sentar numa viatura e modular no rádio. Eu saí,
fui trabalhar na rua.”
Trabalhou no primeiro batalhão feminino, que cobria antes a
zona leste, mas passou a cobrir a região central, reforçando o efe-
tivo de uma área policiada por três batalhões da PM masculina.
Depois de fazer um curso na Honda e na Rocam, o efetivo de
motos da tropa de choque, Adriana assumiu uma das motos que
o batalhão havia ganhado da montadora. Era algo experimental
e logo ela voltou pra rua, em uma perua de Assistência Família.
“A gente passava na serra e recolhia as crianças pra ir pro
abrigo. Ia quem queria. Aí lá eles tomavam banho, comiam.
Quando era de tarde, tava lá de novo. A gente estacionava a
Kombi. As mesmas carinhas que de manhã a gente levou, es-
tavam lá de tarde.”
— Tia, leva eu. Tia, leva eu.
Para uma apaixonada pelo policiamento, a parte de mais
orgulho na carreira foi quando participou do tático feminino,
214
o que durou de um a dois anos. “Tenho as fotos”, diz satisfeita.
Para isso, fez um curso com a Rota em Pirutuba, onde monta-
vam até simulações de favelas.
Hoje Adriana trabalha no 2º batalhão, que cobre a área de São
Miguel, Cangaíba, Penha –perto de onde mora, na zona leste.
Mas é do centro que vêm suas melhores histórias.
“Um taxista falou que tinha acabado de ser roubado e pedi-
mos a descrição da pessoa. Aí estávamos patrulhando e, de repen-
te, numa subida, eu vi um cara embrulhado no papelão.”
— Marta, está muito estranho aquele cara se cobrindo com papelão.
— Onde, Adriana?
— Ali! Pode ir em cima que é o cara.
Marta agiu sem pensar e, em vez de parar a viatura longe
como é recomendado, parou na cara do ladrão. “Ele já jogou o pa-
pelão no chão e atirou na gente. Se a gente tivesse parado longe,
quando ele fosse ter uma reação, a gente teria como reagir. Mas
não foi nem culpa dela, foi mais um ‘vamos, vamos, vamos’ pra
não deixar o cara fugir.”
Elas se abaixaram. O suspeito aproveitou para fugir descen-
do a rua. A viatura estava no sentido contrário, as PMs tiveram
quepersegui-lo a pé. “Ele desceu atirando pra cima, e a gente
descendo a pé em zigue-zague. Por que em zigue-zague? Por-
que é mais difícil do tiro acertar.”
Na troca de tiros, as policiais acreditam ter acertado o
suspeito, já que viram rastros de sangue pela rua. “Só que
ali na paralela era a avenida Nove de Julho. A gente acha que
ele entrou dentro de um ônibus e foi embora. A gente não
conseguiu pegá-lo.”
215
A intuição (ou sorte pra quem não acredita) também estava
lá quando, perto do Hospital Pérola Byington, na Brigadeiro Luís
Antônio, no centro, uma velhinha “toda senhorinha” abordou a
viatura dizendo que haviam levado sua carteira.
— Como que o rapaz estava?
— Ai, não sei.
— Ele usava boné?
— Não sei...
“Ela não sabia nada. Velhinha, né?”, lembra Adriana.
— Olha, a senhora vai entrar aqui na viatura e nós vamos dar uma
volta bem devagarzinho pra ver se a senhora vê alguém. Caso a
senhora não localizar ninguém, a gente vai levar a senhora na de-
legacia e fazemos o boletim de ocorrência.
A cada rapaz avistado, seguia-se a negativa da senhorinha. Eis
que, quando a viatura ia subindo a rua Augusta, vêm descendo
dois rapazes do outro lado. Um ainda criança. Quando a viatura
passou, eles olharam para trás.
— Marta, volta com essa viatura agora no meio da rua. É aquele rapaz.
— Onde, Adriana?
— Volta aqui no meio da rua agora!
Enquanto a viatura virava, a criança, de uns oito anos, saiu
correndo. O maior, porém, foi abordado.
— Mão na cabeça.
216
Adriana apalpou a carteira que estava dentro da calça, na parte
da frente. Segurando-a, perguntou:
— O que é isso aqui?
— Nada, senhora.
— Isso aqui é uma carteira. É sua?
— É minha.
Ela tirou a carteira de dentro da calça e levou pra senhorinha,
que aguardava na viatura. “Não expus ela, fui até a viatura e ela
confirmou que era sua carteira.” Adriana levou o rapaz, já maior
de idade, preso.
“Era o maldito que tinha roubado a senhorinha. Aí a gente co-
meça a falar umas coisas:”
— Você não tem dó? Outro dia pode ser sua mãe!
Dois ou três anos depois, Adriana e Marta foram depor sobre
o caso. No fórum, o rapaz apareceu usando a mesma camisa do
dia da prisão. Depois de serem ouvidos os advogados, Adriana é
interrogada. A juíza lê um trecho do processo e pede que a sol-
dado descreva o resto. Depois, o advogado de defesa lhe faz uma
pergunta. Adriana responde à juíza, que diz:
— Perfeito! Não preciso nem ouvir sua parceira mais. Está encerrado.
Na saída, Marta a esperava.
— Marta, nem vai te ouvir.
— Por que, Adriana?
217
— O advogado perguntou qual era a camisa que o cara tava no dia
e eu falei que era essa mesma de hoje.
O caso marcou Adriana. “Era um rapaz novo: a partir do mo-
mento que a gente também tem problema na família, a gente toma
as atitudes de policial militar, mas fica um pouco ferida, sabe? A
gente se põe no lugar da família. Podia ser meu irmão aqui.”
*
Adriana nasceu e cresceu em Artur Alvim, na zona leste, sem
que nada lhe faltasse graças à mãe, como faz questão de ressaltar.
Em uma entrevista sobre a PM, a palavra “polícia”, mencionada
cerca de 60 vezes, perdeu para o “mãe”, já que Adriana falou da
dona Almira pelo menos 80 vezes.
São vizinhas, moram na mesma rua. A casa de Adriana,
na periferia, bem próxima à estação de metrô Artur Alvim, é a
mais bonita da rua. Pintada de laranja por fora e absolutamen-
te limpa e organizada por dentro. Ao entrar, o primeiro cômo-
do é a sala de TV e logo, atravessando-a, chegamos à cozinha,
ampla, branca e com uma mesa no centro –tudo bem equipado
com eletrodomésticos.
“Sempre tive uma vida maravilhosa. Estudei em colégio par-
ticular, colégio de freira, toda minha vida. Fiz inglês. Eu e meus
irmãos sempre tivemos de tudo por parte da minha mãe, não por
parte do meu pai. Não sou rica, não sou classe média, mas não
posso falar que tive uma infância má”, conta.
Houve até um momento em que sua família chegou a passar
fome, quando a mãe estava desempregada. Ela tinha oito ou nove
anos. “A gente comeu pão seco, minha mãe teve que pedir pra vi-
zinha.” Mas, ainda assim, Adriana não reclama e é profundamen-
te grata à mãe, que claramente é a base de sua família.
218
Entre os irmãos, só Adriana fez faculdade. O irmão mais
novo, Alexandre, nunca trabalhou. O mais velho, Almir, 56,
casou novo e até pouco tempo era gerente do shopping Santa
Úrsula, em Ribeirão Preto. O do meio, Anselmo, 49, vive com
a mãe, pois tem uma deficiência.
O pai, Armelindo, fresador, trabalhando um pouco em uma
empresa, um pouco em outra, era mais desempregado que qual-
quer outra coisa. A mãe trabalhou em fábricas, como na Sousa
Cruz, que antigamente ficava no Carrão, mas se aposentou como
secretária de um juiz, com um bom salário.
“E se eu falar pra você que somente de três anos pra cá
que andei comprando o meu carro? E eu tenho 47 anos (ri-
sos). Ela paga minhas contas, ela faz tudo. Ela vai, compra
uma panela pra ela e compra uma pra mim. Às vezes, compra
só pra mim. Meu filho me pede alguma coisa, aí no outro dia
ela sai. ‘Onde você vai mãe?’. Ela vai lá e compra o que meu
filho pediu. Ela é maravilhosa.”
A mãe, inclusive, foi a responsável pela entrada na PM. Adria-
na trabalhava em um instituto de idiomas para estrangeiros no
Morumbi, que havia sido aberto para ensinar português e inglês
para funcionários da Volkswagen, da Ford e da Autolatina.
“Aí um dia eu passei mal, fui ao médico e passei no fórum
onde minha mãe trabalhava, na João Mendes. Desci no Anhan-
gabaú para pegar o metrô pra vir embora e pensei ‘vou passar
na minha mãe.’”
— Adriana, abriu inscrição pra Polícia Militar. Vai lá se inscrever.
— Mãe, tô doente, não vou lá não.
— Vai lá, Adriana, é aqui na Cruzeiro do Sul, no metrô Armênia.
219
Adriana foi porque “tudo que minha mãe pede, eu faço”. Ao
pagar a taxa e fazer a inscrição, ela recebe o aviso de que já tem
um teste naquele dia mesmo. “Não era um teste só, eu fiz cinco
testes escritos. Eu e muita gente que estava lá.”
No dia seguinte, Adriana deveria voltar para continuar o pro-
cesso de seleção, mas tinha que trabalhar. Ali, ela tomou um dos
dois rumos: faltou quase a semana toda no trabalho para fazer
testes para a polícia. Até que um motorista da empresa foi até sua
casa lhe entregar uma carta dizendo que deveria se apresentar
lá. O motivo era o mesmo já aventado por uma de suas vizinhas:
— Adriana, vieram uns policiais aqui perguntar de você.
Esse procedimento, chamado de “investigação social”, faz
parte da seleção. Policiais à paisana perguntam a conhecidos
como é o comportamento daquele que está prestes a entrar para
a corporação. Após a visita dos policiais na empresa, seu chefe
já lhe deu sua demissão.
Veio o teste físico da PM. “Passei em tudo, não fui reprovada
em nada.” Finalmente, chegou o dia de ver a lista de aprovados,
mas seu nome não estava lá. E pior: ela estava desempregada.
Uma semana depois, ela recebe uma cartinha. “Dizia que hou-
ve erro no computador e que ele havia ‘comido’ muitos nomes com
a letra A. Eu tinha que entregar a documentação rapidinho porque
as outras já tinham feito isso. Entreguei. Deu tudo certo.”
Desde os 18, Adriana já morava sozinha –para ter uma vida
mais independente e mais livre dos irmãos. “Mas eu sempre cuidei
da casa e do meu irmão mais novo: dava comida, levava pra escola.”
Para o irmão Alexandre, cerca de vinte anos mais novo, a
mãe também conseguiu vaga com bolsa em escola privada,
220
pagou curso de inglês e deu uma moto, o que não o impediu
de acabar no tráfico.
“Aí ele se envolveu com os meninos aqui, as amizades, as
amizades, as amizades... Começou a traficar. Dinheiro fácil.
Tive muitos problemas com ele. Porque era uma policial militar
irmã de um traficante, né?”
Adriana, como muitos policiais, acha que a entrada no cri-
me depende da cabeça de cada um. Não é só uma questão so-
cial, já que “o que a gente vê de ricos entrando no mundo do
crime... empresários esses dias aí estavam roubando carga, e
têm dinheiro, têm carrão, têm tudo!”
“Cada um tem sua cabeça, sua personalidade. A gente
não era rico, mas minha mãe dava de tudo. Por que meu ou-
tro irmão não entrou pro crime então? Não é verdade? Eu
acho que é o caráter e a cabeça de cada um. Não é porque um
tem e o outro não tem.”
De toda forma, era um traficante irmão de uma policial. Dona
Almira chorava:
— Adriana, não aguento mais, não aguento mais. É a noite in-
teirinha, Adriana, gente chamando aqui. Eu não aguento, eu
não durmo.
E, para Adriana, a mãe é sagrada.
— Alexandre, o que é isso? A mãe não dorme a noite inteira, você
tá pensando o quê? E a vergonha da mãe? A mãe não sai mais no
portão. A mãe nasceu aqui, se criou aqui. A mãe não sai no por-
tão porque está morrendo de vergonha da vizinhança. Alexandre,
você está acabando com ela.
221
E Adriana é impulsiva.
Um dia, visitando a mãe, abriu o guarda-roupa do irmão e
achou pedras de crack.
“Sabe o que eu fiz? Errado, claro que errado, mas o desespero
de ver minha mãe naquela situação foi muito grande. Eu sabia
que eu ia comprar uma briga com meu irmão. Peguei aquelas pe-
dras, joguei na privada e dei descarga.”
Quando Alexandre chegou, Adriana já estava preparada. Os
dois armados.
— Cadê as pedras?
Alexandre partiu pra cima de Adriana e começou a briga. Até
que ele foi para a rua e ela aceitou a provocação.
— Ah, você quer brigar? Vamos brincar de tiro então. Vamos fa-
zer um faroeste aí no meio da rua. Você de um lado, eu do outro,
vamos ver quem atira e quem acerta.
As pessoas começaram a apartar a briga. Ele ficou na rua,
Adriana foi pra casa. Até que ele pulou o muro para o lado de
dentro, segundo Adriana, para matá-la.
Adriana tomou a atitude mais óbvia, o que qualquer um faria,
principalmente ela: chamou uma viatura, alegando que o irmão es-
tava armado e não tinha porte. Por incrível que pareça, Adriana se
decepcionou com a ineficiência da polícia, que apreendeu a arma,
mas soltou Alexandre depois de dar uma volta com ele na viatura.
“Eu fiquei muito revoltada, muito muito muito revoltada. Fi-
quei chocadésima. Chocada, porque eles sabiam que eu era poli-
cial. Ou tomasse a atitude correta ou não tomasse, não é verdade?”
222
Adriana esperava que o irmão fosse preso por porte ilegal de
arma para “criar vergonha na cara”.
— Mãe, ele vai ficar lá pra aprender. Deixa ele lá.
— Adriana, mas ele vai sair de lá e vai te matar.
— A gente resolve. Deixa ele lá.
Ela não sabe explicar por que os colegas soltaram o irmão. Os
PMs tampouco deram justificativa alguma. Adriana acredita que
o irmão “cativou” os policiais.
“Meu irmão era muito educado. Como se diz, ‘não tem cara
de bandido’”, explica. Alexandre chegou a ser preso depois e, em
vez de ir para um presídio, ficou um ano na delegacia. “Uma in-
vestigadora se apaixonou por ele e o delegado gostou tanto dele
que não o mandou para casa de detenção.”
Depois do passeio com a polícia, Alexandre voltou em fúria
para casa, mas Adriana já não estava lá. Ele havia perdido além
da droga, sua arma. E, no tráfico, é preciso prestar conta de tudo.
As brigas perduraram. A mãe chorou por muito mais tempo.
Um dia, Adriana estava na rua e (intuitivamente) precisou fa-
zer uma ligação.
— Marta, tem que ser agora.
Acharam um orelhão num local um pouco perigoso. Era o
que tinha. Ligou para a mãe. Naquele exato momento, a casa dela
estava sendo metralhada. Mãe e irmão jogados no chão. Alexan-
dre tinha fugido pelo fundo. Era uma emboscada.
— Adriana, me socorre – dizia a mãe do outro lado.
223
“Você vê que alguma coisa me tocou pra eu ligar. Fui para
o batalhão. Era o batalhão feminino. Falei com a coronel Luzia,
uma mulher maravilhosa.”
— Vamos ajudar você sim. Você é uma excelente policial.
Luzia pediu apoio de duas viaturas da Rota. Dentro de uma
delas, as policiais conversavam.
— Adriana, agora eu quero que você me conte tudo. E a verdade.
Ela contou tudo. E a verdade. Disse que o irmão era traficante.
Uma das viaturas encostou na porta de Adriana. A outra esta-
cionou na esquina, de modo a não ser vista. Ela juntou as coisas
da mãe e pôs na viatura. O telefone tocava.
— A senhora vai pra minha casa. A senhora, o Anselmo e o Alef.
Alef é o filho de Alexandre, criado praticamente pela avó, já
que a mãe não quis ficar com ele e o pai era traficante.
O telefone continuava tocando. Quando a polícia atendia, Ale-
xandre desligava. Os policiais revistaram o armário dele. Não ti-
nha drogas. Olharam a papelada da moto. Tudo em dia, era a mãe
que pagava. “Eles fizeram igual fazem na casa de tudo mundo,
jogaram as roupas no chão, jogaram tudo, não tinha nada. Nada.”
Depois desse episódio, Alexandre pediu ajuda à mãe. Pediu
que se mudassem. Foram para Campinas. Todos, inclusive Adria-
na, que trabalhava na Rocam lá. No início, ela ia e voltava todos os
dias, até que saiu a sua transferência. “Tive que mudar totalmen-
te a minha rotina de vida pra ajudar esse meu irmão.”
224
“Nós temos parentes lá, eles arrumaram uma casa na rua
deles, a gente se mudou de um dia pro outro. Eu vendi minhas
coisas e fui morar com a minha mãe”, diz a policial. Elas fi-
caram na cidade pouco mais de um ano. Mas pouco adiantou.
Alexandre ficava mais em São Paulo do que em Campinas du-
rante esse tempo. Em uma madrugada, o telefone trouxe a no-
tícia da sua morte.
“Ele era um traficante pequeno. Vendia, pegava o dinhei-
rinho dele, se mantinha em roupa. Coisa que não precisava,
nunca precisou, minha mãe sempre deu tudo. Mas ele caiu.
Tinha muitas mulheres, era mulher que chovia, era todo dia
cesta de café, faixa na rua pra ele. Então assim... Caiu no mun-
do porque quis”, conta a irmã.
Sua morte foi mais um acerto de contas no mundo do tráfico.
Segundo Adriana, ele estava em frente a um bar, na rua, quando
chegou uma van com 15 homens. Fizeram um círculo em volta
dele e atiraram. Alexandre morreu de hemorragia aos 25 anos.
“O pé ficou caído porque ele levou um tiro de calibre 12.”
Como se não bastasse, para a revolta de Adriana, naquele dia,
os próprios amigos de Alexandre aproveitaram para roubar sua
carteira com cinco mil reais dentro. Não havia um documento
com o corpo para facilitar o enterro. “Minha mãe sofre até hoje.”
Ela reconheceu o corpo do irmão pelas tatuagens. “Eram
tatuagem artísticas, nenhuma de bandido. Tinha uma índia no
peito e o nome do filho dele.”
Alef nasceu do casamento de Alexandre, mas a mãe do meni-
no não quis criá-lo. Eles “se pegavam, se matavam, se batiam”, até
que Alexandre voltou para a casa de sua mãe com o Alef. Quando
ele morreu, a mãe do menino o pegou de volta –para a tristeza da
avó. Mas acabou desistindo dele outra vez.
225
“Ele sabe toda a vida do pai, a gente não esconde. Então tudo
que a gente vê, a gente fala ‘tá vendo, o seu pai passou por isso.’”
Hoje, Alef tem 18 anos e é criado pela avó que, como fez
com o filho, dá de tudo para o neto. Ainda assim, ele “é uma
criança muito revoltada.” Compreensível. Abandonado pela
mãe. O pai morreu baleado. “A vida dele agora é só ficar for-
te. Só faz musculação, é suplemento que não para. Ele está
ficando neurótico. É isso.”
Alef já se formou e não pensa em faculdade. Estudou em es-
cola pública porque a mãe não deixou, na época, que ele fosse
morar com a avó para estudar no Colégio Militar junto com o fi-
lho de Adriana. “Ele ia entrar como meu dependente, ia pagar o
mesmo valor que pago para o meu filho”, explica Adriana sobre o
desconto que os PMs têm no colégio.
Adriana usa o exemplo de Alef para acalmar as angústias do
próprio filho, Fernando, que, aos 16 anos, sofre a ausência do pai.
— Filho, vamos se pôr no lugar do Alef. Ele não tem pai, a mãe
não liga pra ele. Ele que tem que ser revoltado e, ainda assim, não
muito, porque a vó dá de tudo pra ele. A vó só falta tirar a cabeça
dela pra vender pra dar as coisas pro Alef.
Adriana conheceu o pai de seu filho antes mesmo de entrar
na PM. Ele já era policial, entrou na corporação três anos antes
dela. Quando ela entrou na PM, tiveram um relacionamento.
“Saímos, e nessa saída aconteceu. Eu estava na polícia há seis
anos, tinha 30 anos.”
No início, o pai não quis aceitar a criança porque já tinha outra
mulher. Escondeu dela o filho Fernando. No fim, se separou, casou
com outra, com quem teve dois filhos. Mas Fernando, ele abandonou.
226
“Até hoje não vê o menino. Na época, eu era motorista de uma
coronel e ele também. A gente trabalhava no mesmo prédio. Eu
cheguei a levar meu filho várias vezes pra trabalhar comigo. Eu
deixava ele lá com as meninas quando eu tinha que sair com a co-
ronel. Era quando ele via o menino.”
A atual mulher também não sabe da existência de Fernando.
Às vezes, Adriana liga pra ele cobrando visitas ao filho. Adriana
recebia a pensão pela assistência social da PM, ou seja, o dinhei-
ro saía do salário dele e caía no dela. Com o fim desse serviço, foi
necessário fazer o processo judicial, com exame de DNA e tudo.
Ele acompanhou o pré-natal de Adriana, paga a pensão e o do-
cumento de Fernando leva seu nome –aliás, os dois se parecem
muito. Mas praticamente é tudo.
“Todo mês de agosto, ele queria que meu ex-namorado fos-
se no Dia dos Pais na escola. E meu ex-namorado nunca ia e ele
chorava: ‘todo mundo tem pai, só eu que não tenho’. Teve um
Dia dos Pais que meu namorado jurou que ia. Eu cheguei lá e ele
falou de longe ‘cadê o Carlos?’. ‘O Carlos não veio’. Aí ele já co-
meçou a chorar. Quando era a hora dos pais se aproximarem, eu
que fui e ele chorou. Então o pai do amiguinho dele falou: ‘não,
Fernando, eu sou seu pai. Hoje eu sou seu pai. Vem cá, vem, fi-
lho’. Aí abraçou ele, beijou ele. Aí ele falou ‘ó, nós estamos indo
no McDonald’s. Vamos juntos?’. E fomos todos juntos.”
Adriana elogia bastante o comportamento do filho e do sobri-
nho diante das circunstâncias. “Eles se dão muito bem. São umas
crianças que não dão problema. E tudo que vai fazer tem que pe-
dir, não faz sem nossa autorização, não vai pra bailinho, não fica
na casa dos vizinhos. A gente não deixa.”
Para o orgulho de toda mãe, Fernando gosta de estudar. “Só
tira 9 ou 10. A única vez que tirou 8 chegou em casa chorando.”
227
Há uns cinco meses, começou a ir pra academia. Além disso,
com o trabalho, a rotina ficou pesada: sai às 6h20 pra escola e
volta só às 23h. “Está trabalhando... mas não porque precise. Tra-
balha numa casa de cereais, dessas que vendem coisas de aca-
demia”, diz Adriana. A vantagem é que ele pode comprar suple-
mentos pela metade do preço. Dos R$ 650 que ganha, recebe
entre R$ 100 e 200. O resto vai nos suplementos.
Fernando nunca falou em ser policial. Quer prestar mecatrôni-
ca. Adriana acha bom. “Não quero que ele passe o que eu já passei.”
*
Dois ou três anos após a entrada na polícia, Adriana ganhou
passagens para férias em Miami e Orlando. A mãe fez uma surpre-
sa e lhe deu os bilhetes sem saber o tormento que viria por causa
do visto americano. Segundo Adriana, ela teve dificuldades espe-
cialmente por ser policial. Buscando orientações de como ir à en-
trevista, recebeu a opinião de que deveria ir fardada por ser militar.
Foi com o uniforme social da PM –“aquela sainha com aquele cha-
peuzinho”. Na época, ela conta que o visto era difícil de conseguir.
“Chegando lá, já me viram fardada. Eu entrei com a docu-
mentação. Cheguei na salinha e sentei. Do lado de fora, fica um
militar do Exército armado com metralhadora. Eu fui no banhei-
ro. Quando eu saí, me senti muito constrangida. O militar foi na
hora até a porta do banheiro, ele deu um pontapé na porta e olhou
todinho, vistoriou o banheiro pra ver se eu não tinha largado uma
bomba. Foi super constrangedor.”
Na entrevista, perguntaram a ela qual era a garantia de que
voltaria ao Brasil.
— A garantia que eu dou pra voltar é a minha profissão, po-
licial militar.
228
— Isso não é garantia. E como você vai sobreviver lá?
— Eu estou levando o dinheiro para comer lá esses dias.
— Também não é o suficiente. O seu salário não é o suficiente.
“Nossa, aquilo acabou comigo como policial militar. Uma que
o militar já tinha dado aquele pontapé na porta achando que eu
tinha jogado uma bomba lá dentro e outra que não me autoriza-
ram por ser policial militar.”
Adriana resolveu então passar pela entrevista vestida como
civil. Teve o visto negado novamente. Voltou para casa arrasa-
da, chorando.
“Foi assim uma decepção muito grande. Hoje já está bem
mais fácil. Mas pra mim foi a pior coisa da minha vida. Pelo fato
de ser policial militar, a gente não tinha condições de fazer uma
viagem. O salário naquela época era muito baixo. Aí já começa-
ram os constrangimentos, as tristezas.”
A mãe, na época, já era secretária de um juiz, que veio a ser
desembargador, e se queixou com ele sobre o episódio do visto.
— Nossa, dona Almira, por que a senhora já não falou comigo?
Me traz as passagens dela.
Almira tirou xérox de toda a documentação do juiz, do RG ao
registro da OAB. Ele fez uma carta dizendo que estava cedendo as
passagens à Adriana e mais um valor para que ela se mantivesse
nos Estados Unidos por trinta dias.
“Ele empacotou tudo, pôs num envelope, lacrou e disse:
‘manda boa viagem pra sua filha.’” Adriana levou o pacote.
Nem passou pela entrevista. Foi chamada já para pegar o pas-
saporte com o visto.
229
“Foi a primeira vez que precisei da Polícia Militar, porque eu
fui fardada. Eu joguei a minha profissão lá e falei: a minha garan-
tia é a minha profissão. Se eu não voltasse, ia ficar como procura-
da. E ele disse que não era garantia. Eu não sei porque ele achou
isso. Como não é garantia? Eu vou me ausentar do país, mas eu
sou uma policial militar. Ele quis dizer que pra ele aquilo não era
nada. Pra mim, era muito.”
Como disse Adriana, começaram as tristezas. A soldado
percebeu ali as dificuldades que teria dentro e fora da corpora-
ção durante sua carreira. Na sociedade, a rejeição de costume.
“A polícia é tão banalizada, né? Tudo é a polícia. Eles nunca es-
tão satisfeitos com a atitude da polícia. Se faz, é ‘por que fez?’;
se não faz, é ‘por que não fez?’. Então você acaba sem saber o
que fazer, não é verdade?”
Com a polícia em evidência na mídia por causa das manifes-
tações, o assunto repercute até dentro de casa.
— Ai, Adriana por que os polícias não fizeram isso?
— Mãe, eu não aguento a senhora. Se faz, questiona por que
fez. Aí deixa de fazer, questiona também. A senhora é igual
ao resto da população. Se a gente faz, tá errado, se a gente não
faz, tá errado.
Em tempos de protestos, gás e balas de borracha, a soldado
defende a polícia. “Eu acho que todas as atitudes que a polícia está
tomando são corretas. Na minha forma de ver, se não joga uma
bomba, eles não se afastam e aí quem se machuca somos nós. E
antes de ir pra rua, a gente tem preleção, tem orientações. A gen-
te não vai aleatoriamente. Somos orientados sobre o que a gente
deve fazer, o que não deve. Pra não se exceder.”
230
Adriana conta que a pressão não vem só através da mídia.
Há ocasiões em que a própria população pede a ação da polícia
em casos que ela não pode agir, como, por exemplo, num res-
gate, que deve ser feito pelos profissionais de saúde. Se a víti-
ma morre, a culpa é da polícia que não socorreu. Se a polícia
socorre de forma errada, é pior ainda.
“A gente não tem valor nenhum, ainda mais na época que
nós estamos. Se meu filho quiser ser policial, só aceito se ele
entrar na academia, que já sai comandando. O salário é bom e
a humilhação é menor.”
Ainda assim, Adriana diz nunca ter sido desrespeitada nes-
ses 23 anos. Nem pelo fato de ser mulher. Mas isso é porque
ela faz concessões.
“Eu procuro relevar porque eu me ponho no lugar da pessoa.
Por exemplo, você vê um marinheiro todo bonitão ali. Você vai
olhar. Vai falar ‘nossa, como você é bonito, né?’. Se eu estou ali
fardada, por exemplo, com a roupa da Rocam, que é diferente,
uma calça justa, uma bota, cabelo solto... Em vista das meninas
da viatura que é um coque, é um fardamento diferente, então
chama atenção. Uma mulher em uma motona dessa. Surge co-
mentário ‘nossa, com essa farda fica mais bonita’ ou ‘que da
hora, como você consegue dirigir essa moto?’. Então, você pro-
cura não ouvir e relevar. Se você trata com respeito, você vai ter
respeito. Agora, se a pessoa não te der o respeito, aí você age na
legalidade. Eu ajo na legalidade.”
“Enquanto estiverem comigo e eu for encarregada, os meus
parceiros não vão relar a mão em ninguém. Ninguém vai fazer
mal a ninguém. Por mais que o cara seja bandido. Se ele me res-
peitar, se ele me tratar de ‘senhora’, me falar todos os dados, ele
vai ter meu respeito. Se ele não me respeitar, é algema, viatura e
231
delegacia. Bater jamais. Sabe por que eu te digo isso? Porque a
gente tem família e eu sei o que eu já passei com o meu irmão. E
outra: a gente aprendeu a agir assim na escola, então tem que pôr
em prática o que a gente aprendeu”, diz.
Esses comentários aqui e ali são para a soldado apenas uma
das características do trabalho na rua, que ela ama. “Você rece-
be o carinho da população também, sabe, por ser mulher. Todo
mundo te olha, te admira, você recebe muitos elogios na rua.
Quando tem um bloqueio de moto que tem uma mulher, os mo-
toqueiros não ficam tão apreensivos.”
Porém, na estrutura militar, Adriana reclama de discrimina-
ção contra a mulher, baseada no clássico “isso é coisa de homem”.
Há uma generalização das mulheres, até que sejam reconhecidas
pelo bom trabalho. “Eu vou trabalhar com essa menina na rua?
Deus me livre”, exemplifica.
“Eu sou novata na companhia em que trabalho hoje, mas lá
também tem umas pessoas que eu conheço há vinte anos. Aí os
policiais falam ‘nossa, que mulherão, bonita’. Isso eu estou sa-
bendo já da boca dos outros, né? ‘Nossa, que mulherão, mas ela
é toda delicadinha, deve ser maior burguesinha, olha o carrão
dela.’” Logo, os policiais que a conhecem retrucam:
— Meu, você não conhece essa menina na rua. Burguesinha? Ela
é a maior bilona.
Bilona é quem trabalha bem, explica Adriana. “Melhor que
mil homens por aí.”
Adriana gosta do respeito que o militarismo impõe, o “sim,
senhora, não senhora”. Mesmo o filho, no colégio militar, segue a
rígida disciplina. “Isso pra mim é essencial. Meu filho não chama
232
ninguém de você. Eu acho isso bonito em qualquer lugar. Den-
tro da polícia, eu acho muito bonito.” Mas as rígidas regras já lhe
causaram problemas.
“Às vezes eu sou meio assim, sabe? Ó, você pode ver meu es-
malte (risos), você vê a cor do meu esmalte, meu piercing e tal...”
Esmalte azul e piercing no nariz não são permitidos. Para as mu-
lheres, apenas coque, brinco pequeno e esmalte claro. E Adriana
ainda vai trabalhar naquele dia. O certo seria tirar o esmalte... Seria.
“O piercing eu tampo com aqueles adesivinhos. A gente não
pode adentrar o quartel com vestido branco, calça branca, bermu-
da, chinelo. O esmalte é clarinho. Camiseta de alcinha a gente
não pode, não pode entrar com decote.” Ainda assim ela garante:
“o regulamento é muito válido”.
Às vezes ela foge um pouquinho?
“Ah, sei lá, às vezes o calor, né gente... Mas está tudo no re-
gulamento. ‘Vou usar esse vestidinho’. Não. Quando você entrou
aqui você já sabia que não podia. Lê o regulamento. ‘Ah, esse pier-
cing aqui não dá nem pra ver’. Dá! Lê o regulamento. Você quan-
do entrou aqui não viu o regulamento? Você viu o regulamento,
então não adianta se queixar. Não adianta você brigar que você vai
ficar presa.”
E Adriana já ficou presa. Culpa de ser “meio bocuda”, como diz.
“Foi um processo administrativo e eu tenho muita mágoa da
Polícia Militar quanto a isso porque eu fui injustiçada. Eu fui in-
justiçada.” E tudo começou, imagine só, com os ataques do PCC,
em 2006. Adriana estava trabalhando em um trailer da PM em
Sapopemba. De vez em quando, alguém passava e alertava:
— Vão atacar o trailer.
233
“Só que eles não paravam pra conversar com a gente, eles
passavam andando e falavam ‘vão atacar o trailer’. Passava uma
senhora e falava ‘ai moça, você não fica sozinha aí.’”
Os avisos duraram o dia inteiro e deixaram a soldado em pânico.
“Aquela pressão psicológica foi atacando a minha cabeça. O
medo foi corroendo, mas era um medo que assim... você não que-
ria ficar sozinha mesmo. Você não queria. Mas você tava ali, cum-
prindo seu horário de serviço, você tava ali de segurança, você
tava todo perfeitinho ali. Você tava ali. Mas aquilo era o dia intei-
ro. Aquilo foi dominando minha consciência, minha cabeça, foi
dominando. E você passando pro comando.”
— Comando, todo mundo está falando isso. Comando...
Mas a resposta dos comandantes era como se nada estivesse
acontecendo. Adriana não sabia se eles não acreditavam ou se es-
tavam adotando uma postura de não recuar. Não queriam man-
dar reforço. De fato, não mandaram mais policiais para o trailer,
mas pelo menos reforçaram a patrulha de viaturas na área.
O trailer foi atacado de dia. O local era uma praça movimenta-
da, com muitas pessoas fazendo corrida. Entre elas, os bandidos,
misturados ali, correndo armados.
“Chegou uma determinada hora que fecharam todas as ruas
paralelas e o trailer ficou cercado no meio. Tinha um carro, uma
Fiorino, eles desceram com um tripé com uma metralhadora. Já
estava montada dentro da Fiorino. Eles só pegaram o tripé, des-
ceram pela calçada e metralharam. Foi uma coisa de louco, louco.
Eu fiquei doidinha, fiquei ruim da cabeça.”
Havia bastante policiais porque era troca de turno –mais de
dez, segundo lembra Adriana. Os policiais responderam com
234
tiros. Um policial foi baleado. Pessoas foram baleadas dentro
da igreja e dentro de um ônibus que passava.
“Eu acho uma desvalorização muito grande porque a gente
deu a o aviso sobre o ataque. Então a decisão do comando deve-
ria ter sido de apoiar os policiais, pôr bastante viatura. Ou então
vamos tirar. Não recuar. Vamos tirar desse local e por em outro.
Sei lá... Porque olha... A gente foi atacado num dia, no dia se-
guinte, com o trailer todo metralhado, nós estávamos no mes-
mo lugar. Como se nada tivesse acontecido.”
Mas havia acontecido. E Adriana não esqueceu. “Uns dias de-
pois, eu comecei a desmaiar na viatura, de repente. Ia na compa-
nhia, desmaiava. Outro dia fiquei desmaiada duas horas dentro do
alojamento e ninguém me achava. ‘Cadê Adriana? Cadê Adriana?’”
Um dia o capitão cansou de socorrê-la no pronto-socorro e a
levou para o Hospital Militar. “Fiquei lá quinze dias internada to-
mando soro. Diazepan na veia. Era uma tontura que não tinha fim.
Mas foi um abalo psicológico muito grande. Aí comecei a ter aque-
les problemas, aqueles problemas... Quando você tem esses proble-
mas, você é encaminhado direto pra psiquiatria. Aí fui pra psiquia-
tria. Fiquei oito meses afastada da Polícia Militar, fiquei em casa. O
salário lá embaixo, cai tudo. E você querendo pagar suas dívidas.”
Quando voltou ao trabalho, Adriana recomeçou aos poucos. Ela
podia voltar, mas “com restrições”. Restrições de farda e arma, ou
seja, não podia estar fardada e nem armada. Ela passou a realizar
atividades administrativas por um período. Ainda assim, seu co-
mandante pediu a todos que vestissem um uniforme da polícia, o
chamado “agasalho”. “O agasalho é um uniforme, é considerado
uniforme. Só que a PM não paga. A gente que compra”, ela explica.
“O comando queria que eu usasse o agasalho. Mas eu usava um
tênis branco, e o regulamento diz que é um tênis preto. É o regula-
235
mento. Só que, até então, eu não tinha o tênis preto, tinha o branco.
Eu tinha a intenção de cumprir a ordem. Pra começar, era pra eu
estar à paisana, mas o coronel queria o agasalho e eu fui cumprir a
ordem com o que eu tinha: o agasalho, a camiseta e o tênis branco.”
Um tenente a comunicou por causa do tênis branco. Ao que
ela respondeu que tinha restrição ao uso de uniforme e não de-
veria, portanto, estar nem de agasalho. Não colou. Teve que res-
ponder um processo administrativo. No outro dia, chega outro
comunicado de outra pessoa. E mais outro ainda. “Eu respondi
três processos administrativos. Todos iguais sobre o tênis bran-
co. Aquilo perdurou dois anos, eu fui até o Tribunal de Justiça
Militar [a última instância].” Como prova, Adriana apresentou
uma foto do pelotão: todos com tênis vermelho, azul, roxo, mas
só ela foi comunicada. (Ela tirou a cabeça das pessoas na foto
para que não fossem identificadas). “E você não acredita! Eu
perdi. Fiquei seis dias presa no quartel.”
“Durante o processo, foram dois anos de total sofrimento.
Eu emagreci, eu fiquei enterrada na Fluoxetina, Diazepam. Foi
um sofrimento terrível, terrível. Eu pagando advogado, o ad-
vogado entrou com mandado de segurança. Aí tinha mês que
vinha um papel ‘ó, Adriana, você vai ter que cumprir cadeia
sábado’. Aí eu falava ‘imagina, estou com mandado de segu-
rança’. Aí tinha que ligar pro advogado, o advogado tinha que
ir lá. Olha, foram dois anos de total sofrimento. Eu entrei em
depressão. Foi uma coisa de louco.”
Depois do episódio, Adriana pediu transferência, mas só con-
seguiu a mudança para o 2º batalhão há cerca de um ano.
“Eu estava com tudo pra ganhar esse processo. Porque o aga-
salho é considerado um uniforme, está no regulamento. E no
processo estava lá provado que o pelotão inteiro estava com o tê-
236
nis diferenciado, não era só eu. Então me senti totalmente injus-
tiçada. Totalmente, totalmente.”
Talvez um civil não tenha a dimensão da humilhação, já que
ninguém costuma ficar preso no trabalho. Um desgosto enorme
para Adriana, para quem um elogio e um puxão de orelha são,
respectivamente, o melhor e o pior da polícia.
“Você pegar uma ocorrência e ser prestigiado é a melhor coisa. O
seu chefe e a sua companhia virem que você está trabalhando. Você
ter o devido valor. Porque aqui a gente não tem, por mais que faça
bem feito. E esse é o meu desgosto. O chefe falar ‘a Adriana? A gen-
te precisa dela, ela está aqui. A gente não precisa mandar ela fazer
nada! Adriana é sempre impecável, é excelente. Na rua, sempre edu-
cada’. Agora, se você cometeu alguma gafe, se você for comunicada,
eles deveriam falar ‘nossa, não, eu vou ajudar ela. Ela não vai ficar
presa porque ela é uma excelente policial, a gente vai ajudar ela’. Mas
isso não existe. Por mais boa policial que você seja, no dia que você
escorregar, você fica presa, você responde a processo administrativo,
ninguém te ajuda. Então isso desgosta muito. Cadê a valorização?”
Talvez justamente pela não obediência incondicional do regula-
mento ter lhe causado um dos episódios mais tristes na PM, Adria-
na previne o filho de passar pelo mesmo. Ela diz que costuma tes-
tar seu comprometimento com o regulamento do colégio militar.
“Quando chega a época de férias, ele põe aquele piercing aqui
no nariz e faz mechas no cabelo. Mas, na volta às aulas, o regula-
mento não permite.”
— Vai com esse cabelo mesmo, filho.
— Não, mãe, não pode.
— Não, filho. Vai assim mesmo.
— Não pode, mãe. A senhora é louca?
237
“Eu falo para ver até onde ele vai”, conta Adriana. O interes-
sante é que, se o regulamento incomoda, sem ele “o negócio fica
feio”. A questão para ela não é, sem dúvida, a existência de exi-
gentes regras militares. O problema é que tais regras serviram
para mostrar que, no fim das contas, ela estava sozinha.
*
A reintegração de posse que Adriana tinha naquela manhã
foi cancelada.
“A juíza cancelou, não sabemos o motivo, só o capitão. Mas
ele chegou tão nervoso que a gente procurou nem saber. Ficamos
até mais tarde ontem esperando o capitão chegar do fórum para
dar essa notícia pra gente.”
Ela conta que já participou de várias reintegrações no centro,
todas tranquilas. Mas seria sua primeira na zona leste. Adriana
explica que há um planejamento: assistentes sociais visitam a
ocupação antes, procuram ver para onde vão as pessoas, ofere-
cem verba para aqueles de outras cidades voltarem para casa.
Os policiais recebem as orientações, inclusive “é pra derrubar
tudo, não é pra deixar pedaços de madeira pra depois fazerem
tudo de novo”. Uns moradores retiram suas coisas. Outros en-
frentam. “Querem fazer bagunça, auê, mas o capitão aqui é mui-
to dócil, sabe conversar. Acho que seria tranquilo. Mas é um tra-
balho árduo. Um trabalho bem grande. E mexe com muita gente:
Prefeitura, Eletropaulo, Sabesp, assistente social.”
Por esses árduos trabalhos, a soldado recebe R$ 4.900 no fim
do mês. Com os descontos, são R$ 3.500. Adriana será em breve
promovida a cabo por tempo de serviço, o que aumentará seu sa-
lário em R$ 300. Quando se aposentar, receberá o salário de sar-
gento, mas sem alguns benefícios de quem está na ativa, como a
diária alimentação, por exemplo.
238
Adriana chegou a concluir uma faculdade de Psicologia an-
tes de entrar para a PM, o que, junto com os mais de dez anos de
carreira, a tornava apta a prestar um curso chamado Chacal, que
leva ao oficialato em poucos meses, após um curso. “Serve pra
quem tem dez anos de polícia e nível universitário, além de bom
comportamento. Você paga uma taxa e presta esse concurso. E sai
oficial, pode ser cabo, soldado, o que for. Você sai oficial. Prestei
duas vezes e não consegui. É muito concorrido.”
Adriana pouco se abalou por não ter conseguido o oficiala-
to. Na polícia, ela já faz o que quer fazer e isso basta. Ela, in-
clusive, esconde da polícia o nível superior para manter-se em
sua função de policiamento de rua. Em sua ficha, consta ape-
nas segundo grau completo.
“Todo mundo tem o sonho de, quando sair do curso de polí-
cia, entrar numa viatura, falar no rádio, sair na rua, todo mundo
ver você, entendeu? E existe um setor de psicologia em todos os
lugares da Polícia Militar. De repente, por ser psicóloga, quando
precisassem de uma, iam me tirar da rua e colocar num setor in-
terno. É uma coisa que eu não queria. Eu amo trabalhar na rua.
Então pra mim não ia servir, eu ia ficar muito revoltada. E uma
vez que você recebe uma determinação, você tem que cumprir. E
pra você sair é muito difícil. Por isso, lá nos meus dados não tem
que eu tenho faculdade.”
O porquê da psicologia, assim como o porquê da PM, não
existe ao certo. A aleatoriedade costuma dar certo para alguém
cuja intuição funciona. “É tudo assim aleatório, entrei na polícia
casualmente. Fiz Psicologia porque achei que era uma coisa mais
fácil. Odeio estudar (risos).”
O fato é que os passos do acaso deram certo. Pela segunda
vez, os olhos mareiam ao dizer que ama trabalhar na rua e ajudar
a população. “A minha perspectiva de vida é essa mesmo: ser pro-
movida por antiguidade e me reformar sargento. Minha perspec-
tiva de vida aqui é essa.” Se depender da mãe – e da sua intuição–
é bem capaz que Adriana chegue lá.
241
PM na mídia
Esta coleção de manifestações midiáticas sobre a polícia não
tem caráter científico. Trata-se apenas de uma reunião do que eu
li e do que chegou até mim sobre a PM via jornais e redes sociais.
A imensa maioria das informações é sobre a Polícia Militar
de São Paulo, embora tenham sido incluídas reportagens sobre
a Polícia Civil e a polícia de outros Estados –principalmente do
Rio de Janeiro– quando julguei relevante para todo o processo
de entendimento da polícia.
As publicações focam no período de 2014 e excluem as mani-
festações de junho de 2013 no país. Algumas notícias anteriores
a 2014, porém, foram incluídas –novamente quando as julguei
necessárias para a compreensão geral da polícia.
Os dados encontrados nestas reportagens foram pertinentemen-
te abordados nos perfis deste livro. Informações específicas usadas
em cada perfil foram indicadas em bibliografia separada abaixo.
30 de dezembro de 2005 – UOL
Todos os policiais do caso favela Naval estão soltos nove anos depois
http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/27214/todos+os+policiais+do+caso+fav
ela+naval+estao+soltos+nove+anos+depois.shtml
6 de fevereiro de 2013 – UOL
Medo de transferência para prisão comum mantêm disciplina em presídio
para PMs em SP
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/02/06/medo-de-transferencia-
-para-penitenciaria-comum-ajuda-a-manter-disciplina-em-presidio-de-pms-em-sp.htm
242
3 de março de 2013 – Veja
O dia a dia no Presídio Militar Romão Gomes
http://veja.abril.com.br/multimidia/galeria-fotos/o-presidio-militar-romao-gomes-pmrg-2013
22 de abril de 2013 – G1
Conheça o interior do presídio Romão Gomes
http://g1.globo.com/sao-paulo/fotos/2013/04/conheca-o-interior-do-presidio-romao-go-
mes.html
18 de julho de 2013 – Estadão
Contra chacinas, Anistia Internacional pede mudança na PM
http://politica.estadao.com.br/blogs/roldao-arruda/contra-chacinas-anistia-internacional-pe-
de-mudanca-na-pm/
24 de julho de 2013 – R7
Treze PMs da Rota são indiciados por estupro e tortura durante reintegra-
ção de posse no Pinheirinho
http://noticias.r7.com/sao-paulo/treze-pms-da-rota-sao-indiciados-por-estupro-e-tortura-
-durante-reintegracao-de-posse-no-pinheirinho-25072013
17 de agosto de 2013 - IG
Mortes por PMs de folga crescem 53% e se aproximam de homicídios em serviço
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-08-17/mortes-por-pms-de-folga-crescem-53-
-e-se-aproximam-de-homicidios-em-servico.html
21 agosto de 2013 – Estado
PM é afastado após usar gás contra jornalistas
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,pm-e-afastado-apos-usar-gas-contra-jornalis-
tas-imp-,1066206
243
4 de setembro de 2013 – Folha
Terceirização do 190 deve sair em até 90 dias, diz Alckmin
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/09/1336772-terceirizacao-do-190-deve-sair-
-em-ate-90-dias-diz-alckmin.shtml
04 de outubro de 2013 – Folha em Espanhol
Antes y después de Amarildo
http://brasilcomn.blogfolha.uol.com.br/2013/10/04/antes-y-despues-de-amarildo/
8 de outubro de 2013 – Folha
Vídeo flagra policiais [civis] espancando jovens em delegacia de São Paulo
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/10/1353207-video-flagra-policiais-espancan-
do-jovens-em-delegacia-de-sao-paulo.shtml
29 de outubro de 2013– Comunique-se
Polícia é responsável por 75% das agressões a jornalistas, revela levanta-
mento da Abraji
http://portal.comunique-se.com.br/index.php/comunicacao/73121-policia-e-responsavel-
-por-75-das-agressoes-a-jornalistas-revela-levantamento-da-abraji
30 de outubro de 2013 – Leonardo Sakamoto
Violência policial: Salve, São Paulo! Os que vão morrer te saúdam!
http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/10/30/violencia-policial-salve-sao-paulo-
-os-que-vao-morrer-te-saudam/
1º de novembro de 2013 – UOL
Denúncias de excessos da PM em abordagens crescem 106% em SP
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/01/denuncias-de-excessos-da-
-pm-em-abordagens-crescem-106-em-sp.htm
244
05 de novembro de 2013 – UOL
Pesquisa aponta que 70% dos brasileiros não confiam na polícia
http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2013/11/05/confianca-na-policia-
-cai-proxima-a-de-partidos-no-pais.htm
5 de novembro de 2013 – UOL
Polícias brasileiras matam quatro vezes mais que a dos EUA , diz estudo
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/05/policias-brasileiras-mata-
ram-126-vezes-mais-que-a-do-reino-unido-em-2012-diz-estudo.htm
12 de novembro de 2013 – Folha
Taxas de homicídio são epidêmicas em 11 países da América Latina, diz ONU
http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/11/1370335-taxas-de-homicidio-sao-epidemicas-
-em-11-paises-da-america-latina-diz-onu.shtml
13 de novembro de 2013 – Folha
Suécia fecha quatro prisões porque população carcerária despenca
http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/11/1370700-suecia-fecha-quatro-prisoes-porque-
-populacao-carceraria-despenca.shtml
1º dezembro de 2013 – El País Brasil
Apesar de avanço social, Brasil não reduz índices criminais
http://brasil.elpais.com/brasil/2013/11/23/actualidad/1385234850_199533.html
28 de dezembro de 2013 – Folha
É preciso desmilitarizar a polícia? Sim
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/12/1390874-e-preciso-desmilitarizar-a-policia-
-militar-sim.shtml
245
28 de dezembro de 2013 – Folha
É preciso desmilitarizar a polícia? Não
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/12/1390875-e-preciso-desmilitarizar-a-policia-
-militar-nao.shtml
29 de dezembro de 2013 – Folha
Intocada, previdência dos militares gasta mais do que o Bolsa Família
http://dinheiropublico.blogfolha.uol.com.br/2013/12/29/intocada-previdencia-dos-militares-
-gasta-mais-do-que-o-bolsa-familia/
13 de janeiro – Folha
Número de roubos de veículos em São Paulo é o maior em 12 anos
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1396826-numero-de-roubos-de-veiculos-
-em-sao-paulo-e-o-maior-em-12-anos.shtml
22 de janeiro – Folha
Mortes provocadas por PMs de folga aumentam 50% no Estado de SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1401043-mortes-provocadas-por-pms-de-
-folga-aumentam-50-no-estado.shtml
26 de janeiro - Folha
PM encurrala manifestantes em hotel durante protesto contra a Copa; veja
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1403137-pm-encurrala-manifestantes-em-
-hotel-durante-protesto-contra-a-copa-veja.shtml
26 de janeiro – Estadão
‘Polícia chegou batendo em todo mundo’, conta estudante Vinícius Duarte
(protesto contra Copa)
http://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,policia-chegou-batendo-em-todo-mundo-
-conta-estudante-vinicius-duarte,1123219
246
27 de janeiro - Folha
Manifestante é baleado pela Polícia Militar em protesto contra a Copa (caso
Fabrício Proteus, baleado por PM)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149603-manifestante-e-baleado-pela-policia-mi-
litar-em-protesto-contra-a-copa.shtml
27 de janeiro - Folha
Vídeo mostra PMs atirando dentro de hotel (protesto contra Copa)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149594-video-mostra-pms-atirando-dentro-de-
-hotel.shtml
27 de janeiro – Folha
Maioria dos detidos é jovem e da periferia, mas perfil é variado (protesto
contra Copa)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149596-maioria-dos-detidos-e-jovem-e-da-peri-
feria-mas-perfil-e-variado.shtml
27 de janeiro – Folha
‘TV Folha’ flagra policiais sem identificação (protesto contra Copa)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149597-tv-folha-flagra-policiais-sem-identificacao.shtml
27 de janeiro – Folha
Polícia evitou uma tragédia, diz Alckmin (protesto contra Copa)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149600-policia-evitou-uma-tragedia-diz-alck-
min.shtml
27 de janeiro – Revista Fórum
Inquérito revela tortura dentro da PM do Rio na formação de policiais
http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/01/inquerito-revela-tortura-dentro-da-pm-na-
-formacao-de-policiais/
247
27 de janeiro – Folha
São Paulo bate recorde de roubo de veículos em 13 anos
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/149604-sao-paulo-bate-recorde-de-roubo-de-vei-
culos-em-13-anos.shtml
28 de janeiro – Folha
Homicídios caem e roubos crescem em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/01/1403836-homicidios-caem-e-roubos-cres-
cem-em-sp.shtml
28 de janeiro – Estado
Editorial: O que o sábado mostrou (crítica à ação da PM em ato contra Copa)
http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,o-que-o-sabado-mostrou-imp-,1123747
28 de janeiro – J.Press
Depoimento de um estudante da USP sobre a ação da Polícia Militar du-
rante manifestações
http://jpress.jornalismojunior.com.br/2014/01/dia-descobri-luta-coletivo/
29 de janeiro – Estado
Imagem mostra PM agredindo fotógrafo em manifestação
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,imagem-mostra-pm-agredindo-fotografo-em-
-manifestacao,1124572
4 de fevereiro – Folha
Justiça do Rio declara morte presumida do pedreiro Amarildo
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1407426-justica-do-rio-declara-morte-pre-
sumida-do-pedreiro-amarildo.shtml
248
4 de fevereiro – Folha
Marcos Augusto Gonçalves: Por uma nova polícia
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcosaugustogoncalves/2014/02/1407108-por-
-uma-nova-policia.shtml
5 de fevereiro – Folha
Marginal Tietê é liberada após protesto [pró-PM]; via tem
9,4 km de filas
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1407904-marginal-tiete-e-liberada-apos-
-protesto-via-tem-94-km-de-filas.shtml
7 de fevereiro – Carta Capital
“Perto de quem realmente manda, esses moleques estendidos no chão
[mortos pela PM do Rio] são tão perigosos quanto o Patati e Patatá.”
http://negrobelchior.cartacapital.com.br/2014/02/07/perto-de-quem-realmente-manda-es-
ses-moleques-estendidos-no-chao-sao-tao-perigosos-quanto-o-patati-e-patata/
8 de fevereiro - Folha
Rojão que feriu cinegrafista no Rio era de manifestante, afirma polícia
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/151323-rojao-que-feriu-cinegrafista-no-rio-era-
-de-manifestante-afirma-policia.shtml
10 de fevereiro – Folha
Família de Fábio Porchat pede ajuda ao Congresso após ameaças na web
[por vídeo de crítica à PM do Porta dos Fundos]
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/02/1410220-familia-de-fabio-porchat-pede-
-ajuda-ao-congresso-apos-ameacas-na-web.shtml
249
10 de fevereiro – Estadão
Bruno Paes Manso: Os assassinos que desafiaram o Governo de SP (ação
violenta da PM em Sapopemba)
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/os-assassinos-que-desafiaram-o-governo-de-sp/
12 de fevereiro – G1
Tenente desabafa após bombeiros serem assaltados: ‘Nojo deste país’
http://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/2014/02/tenente-desabafa-apos-bombeiros-se-
rem-assaltados-nojo-desse-pais.html
13 de fevereiro – Folha
Polícia Militar vai usar ‘tropa do braço’ em protestos em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1411475-policia-militar-vai-usar-tropa-
-do-braco-em-protestos-em-sp.shtml
14 de fevereiro – Folha
Alunos acusam policiais militares de agressão em escola de São Simão (SP)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/ribeiraopreto/2014/02/1412335-alunos-depredam-esco-
la-estadual-em-sao-simao-sp-e-prefeitura-contrata-seguranca.shtml
17 de fevereiro – Folha
Defesa de PMs diz que não há como culpá-los por mortes no Carandiru
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1413334-defesa-de-pms-diz-que-nao-ha-co-
mo-culpa-los-por-mortes-no-carandiru.shtml
21 de fevereiro – Folha
Adolescente amarrado a poste é detido em novo assalto em Copacabana
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1415662-adolescente-amarrado-a-poste-e-
-preso-por-assalto-em-copacabana.shtml
250
17 de fevereiro – Estadão
Erro de PM vira meme e recebe apoio de 75% dos comentaristas (caso de
José Guilherme da Silva, que morreu dentro de viatura)
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/violencia-vira-meme-apoiado-por-70-dos-comentaristas/
21 de fevereiro – El País Brasil
Polícia de São Paulo tenta esvaziar manifestação contra a Copa
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/21/politica/1392939683_466934.html
22 de fevereiro – Folha
Protesto contra a Copa reúne mil pessoas no centro de SP (primeiro ato
com tropa do braço)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416485-protesto-anti-copa-reune-400-
-pessoas-no-centro-de-sp.shtml
22 de fevereiro - Folha
Ato contra Copa em SP termina em confronto, vandalismo e 230 detidos
(primeiro ato com tropa do braço)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416525-ato-contra-copa-em-sp-termina-
-em-confronto-e-vandalismo.shtml
22 de fevereiro – Estado
Megaoperação da PM usa pelotão ninja, isola black blocs e prende 230 (pri-
meiro ato com tropa do braço)
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,megaoperacao-da-pm-usa-pelotao-ninja-isola-
-black-blocs-e-prende-230,1133414
251
22 de fevereiro – Folha
Vídeo mostra cerco policial a manifestantes e jornalista em SP (primeiro
ato com tropa do braço)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416559-video-mostra-cerco-policial-a-ma-
nifestantes-e-jornalista-em-sp.shtml
23 de fevereiro – Folha
Todos os 262 manifestantes detidos em ato anti-Copa foram soltos, diz SSP
(primeiro ato com tropa do braço)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416621-todos-os-230-manifestantes-deti-
dos-em-ato-anti-copa-foram-soltos-diz-ssp.shtml
23 de fevereiro – Folha
Repórter da Folha é agredido por PMs em protesto; assista ao relato (pri-
meiro ato com tropa do braço)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416729-reporter-da-folha-e-agredido-por-
-pms-em-protesto-assista-ao-relato.shtml
23 de fevereiro – Folha
Reduzir depredação em protesto foi sucesso, afirma PM
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416746-reduzir-depredacao-em-protesto-
-foi-sucesso-afirma-pm.shtml
23 de fevereiro - UOL
PM deteve manifestantes sem acusação formal e impediu trabalho de advo-
gados (primeiro ato com tropa do braço)
http://copadomundo.uol.com.br/noticias/redacao/2014/02/23/pm-deteve-manifestantes-
-sem-acusacao-formal-e-impediu-trabalho-de-advogados.htm#fotoNav=9
252
23 de fevereiro – El País Brasil
Um protesto com mais policiais que manifestantes (primeiro ato com tro-
pa do braço)
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/23/politica/1393111858_875595.html
23 de fevereiro – El País Brasil
Ativistas denunciam brutalidade policial durante o ato contra a Copa de São
Paulo (primeiro ato com tropa do braço)
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/23/politica/1393194512_885141.html
23 de fevereiro – El País Brasil
“Estávamos todos apavorados”, diz professor da USP detido (primeiro ato
com tropa do braço)
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/23/politica/1393192949_387701.html
23 de fevereiro – Brasil Post
Vídeo mostra truculência policial contra jornalistas (primeiro ato com
tropa do braço)
http://www.brasilpost.com.br/2014/02/23/video-policia-jornalistas_n_4842809.html
23 de fevereiro – Brasil Post
[Relato de jornalista] Protesto em SP: pelo direito de fazer o meu trabalho
(primeiro ato com tropa do braço)
http://www.brasilpost.com.br/amanda-previdelli/protesto-em-sp-pelo-direi_b_4842874.
html?fb_action_ids=10201442973066778&fb_action_types=og.likes&fb_source=other_
multiline&action_object_map=%5B528604807254693%5D&action_type_map=%5B%22og.
likes%22%5D&action_ref_map=%5B%5D
253
23 de fevereiro – Facebook Plínio comenta
h t t p s : / / w w w. f a c e b o o k . c o m / P l i n i o Co m e n t a / p h o t o s / p b . 4 6 3 3 0 8 3 1 3 6 9 1 5 5 3 .
-2207520000.1415395335./707227559299626/?type=3&theater
24 de fevereiro – Folha
PM não pune policiais que agridem manifestantes
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416800-pm-nao-pune-policiais-que-agri-
dem-manifestantes.shtml
24 de fevereiro – Folha
Maior número de homicídios em SP é ponto fora da curva, diz secretário
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1416957-alta-de-homicidios-em-sp-e-pon-
to-fora-da-curva-diz-secretario.shtml
24 de fevereiro – Folha
Juiz do caso Carandiru multa advogado que abandonou plenário
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1417271-juiz-do-carandiru-multa-advoga-
do-que-abandonou-plenario.shtml
254
24 de fevereiro – Folha – Charge Benett
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/22485-charges-fevereiro#foto-366195
25 de fevereiro – Nota de Rodapé
Relato do repórter fotográfico Victor Moriyama, detido pela PM no Ato con-
tra a Copa do Mundo
http://www.notaderodape.com.br/2014/02/relato-do-reporter-fotografico-victor.html
25 de fevereiro – Folha
Ministro diz que vai avaliar uso da ‘tropa do braço’ pelo país
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/153809-ministro-diz-que-vai-avaliar-uso-da-tro-
pa-do-braco-pelo-pais.shtml
25 de fevereiro – Folha
Polêmica, nova tática da PM já foi adotada em protestos na Europa e nos
EUA (sobre tropa do braço)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/153811-polemica-nova-tatica-da-pm-ja-foi-adota-
da-em-protestos-na-europa-e-nos-eua.shtml
255
25 de fevereiro - Folha
Roubos têm 8º alta seguida e sobem 32,5% no Estado
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/153807-roubos-tem-8-alta-seguida-e-sobem-325-
-no-estado.shtml
26 de fevereiro – Folha
Policiais que balearam estudante em protesto não tinham armas não letais
(caso Fabrício Proteus, baleado por PM)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/02/1418041-policiais-que-balearam-estudante-
-em-protesto-nao-tinham-armas-nao-letais.shtml
27 de fevereiro – Estado
De tocaia, elite da PM está à espera do bando (Operação do COE contra
PCC em Presidente Venceslau)
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,de-tocaia-elite-da-pm-esta-a-espera-do-ban-
do,1135057
27 de fevereiro – Estado
Alckmin confirma plano de resgate de líderes do PCC
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,alckmin-confirma-plano-de-resgate-de-lide-
res-do-pcc,1135391
27 de fevereiro – El país Brasil
“Bandido que mexe com polícia acaba assim” (caso de José Guilherme da
Silva, que morreu dentro de viatura)
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/27/politica/1393533978_778738.html
27 de fevereiro de 2014 – El País Brasil
Polícia brasileira mata cinco pessoas a cada dia
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/27/politica/1393533362_626474.html
256
28 de fevereiro – Folha
Cláudia Collucci: As cadeias são os novos manicômios, diz psiquiatra
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/claudiacollucci/2014/02/1419355-as-cadeia-sao-os-no-
vos-manicomios-diz-psiquiatra.shtml
1º de março – Facebook Ruth Sheherazade
https://www.facebook.com/RuthSheherazade/photos/a.456318524469703.1073741828.4562
69034474652/462922430475979/?type=3&theater
257
4 de março – Estadão
Policial tem casa atingida por ataque com coquetel molotov em Promissão
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,policial-tem-casa-atingida-por-ataque-com-co-
quetel-molotov-em-promissao,1137217
7 de março de 2014 – Youtube
Marcelo Freixo comenta a morte do PM Rodrigo Paes Leme e de outros
PMs em UPPs do Rio
https://www.youtube.com/watch?v=W363ls3noo4#t=92
7 de março – Revista Fórum
O culto à violência policial no Facebook
http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/03/o-culto-violencia-policial-facebook/
10 de março – UOL
Em meio a tensão com PCC, agentes penitenciários de SP entram em greve
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/03/10/em-meio-a-tensao-com-
-pcc-agentes-penitenciarios-de-sp-entram-em-greve.htm
10 de março - Folha
Mortes causadas por policiais militares voltam a crescer em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1423082-mortes-causadas-por-policiais-
-militares-voltam-a-crescer-em-sp.shtml
11 de março – El País Brasil
Facção [PCC] fatura 6 milhões de reais com tráfico e outros crimes
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/03/12/politica/1394584966_908556.html
258
12 de março – Estado
Entidades e advogados tentam barrar prisão por averiguação e surras da
PM em manifestação [contra a Copa]
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/os-70-black-blocs-que-ainda-causam-nas-ruas-de-sp/
12 de março – Carta Capital
PM contraria jornalistas e insiste em distribuir coletes à imprensa para co-
bertura de protestos
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/pm-contraria-jornalistas-e-insiste-em-distribuir-
-coletes-a-imprensa-para-cobertura-de-protestos-6340.html
13 de março – Folha
Justiça mantém ação da ‘tropa do braço’ em protesto em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1424897-justica-mantem-acao-da-tropa-
-do-braco-em-protesto-em-sp.shtml
13 de março – Folha
Em ano eleitoral, Congresso tem fila de projetos contra manifestante violento
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1424810-em-ano-eleitoral-governo-tem-fi-
la-de-projetos-contra-manifestante-violento.shtml
13 de março – Folha
Vanessa Barbara: Diferentes conceitos de êxito (sobre tropa do braço)
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/vanessabarbara/2014/03/1425382-diferentes-concei-
tos-de-exito.shtml
13 de março – Folha
PM simula ação em conflitos antes de protesto em SP; veja vídeo
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1425176-pm-simula-acao-em-conflitos-an-
tes-de-protesto-em-sp-veja-video.shtml
259
14 de março – Folha
Protesto tem mais PMs que manifestantes
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/156359-protesto-tem-mais-pms-que-manifestan-
tes.shtml
14 de março – Agência Pública
Pedidos feitos pela Lei de Acesso à Informação para a Polícia de São Paulo
não têm resposta, em descumprimento da lei
http://apublica.org/2014/03/pergunte-a-pm/
14 de março – Folha
Cabral diz que PM ‘vai pegar covardes’ que mataram subcomandante [no Rio]
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1425558-cabral-diz-que-pm-vai-pegar-co-
vardes-que-mataram-subcomandante.shtml
16 de março – Folha
Organizadores da nova “Marcha da Família” pedem retorno dos militares
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/03/1426175-organizadores-da-nova-marcha-pela-
-familia-pedem-retorno-dos-militares.shtml
16 de março – Folha
Ferreira Gullart: Paga o justo pelo baderneiro
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ferreiragullar/2014/03/1425537-paga-o-justo-pelo-ba-
derneiro.shtml
17 de março – Extra
Viatura da PM arrasta mulher por rua da Zona Norte do Rio. Veja o vídeo
(caso Claúdia)
http://extra.globo.com/casos-de-policia/viatura-da-pm-arrasta-mulher-por-rua-da-zona-norte-
-do-rio-veja-video-11896179.html
260
17 de março – Extra
Viúvo de mulher morta em operação da PM em Madureira desabafa: ‘Ar-
rastaram o corpo dela como se fosse um saco’ (caso Claúdia)
http://extra.globo.com/casos-de-policia/viuvo-de-mulher-morta-em-operacao-da-pm-em-ma-
dureira-desabafa-arrastaram-corpo-dela-como-se-fosse-um-saco-11893573.html
17 de março – Folha
PMs são presos após arrastar vítima de bala perdida na rua (caso Claúdia
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1426571-pms-sao-presos-apos-porta-malas-
-abrir-e-mulher-ser-arrastada-por-250-metros.shtml
17 de março – Folha
Famílias dos presos deveriam processar Estado, diz advogado do Carandiru
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1426582-advogado-de-pms-do-carandiru-
-pede-que-estado-seja-processado-pelo-caso.shtml
17 de março – Facebook Mtst Trabalhadores Sem Teto
https://www.facebook.com/mtstbrasil/photosw
/a.466755456696124.100595.464790330225970/704047659633568/
261
18 de março – Folha
Mulher arrastada por carro da PM foi morta por tiro, aponta laudo (caso Claúdia)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1427471-mulher-arrastada-por-carro-da-
-pm-foi-morta-por-tiro-aponta-laudo.shtml
18 de março – Facebook Ruth Sheherazade
https://www.facebook.com/RuthSheherazade/photos/a.456318524469703.1073741828.4562
69034474652/468563409911881/?type=3&theater
20 de março – Folha
PM diz que colocou mulher em porta-malas porque carro foi cercado (caso
Claúdia)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1428110-policial-diz-que-mulher-foi-colo-
cada-em-porta-malas-porque-carro-estava-cercado-por-moradores.shtml
262
20 de março – Estadão
Bruno Paes Manso: Quando PMs arrastaram uma mãe morta pela rua, tira-
ram o chão que ainda nos mantém em pé (caso Claúdia)
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/quando-a-pm-arrastou-uma-mae-pela-corda-arran-
cou-o-chao-sob-os-nossos-pes/?fb_action_ids=10152343895984913&fb_action_types=og.re-
commends
20 de março – Folha
Editorial: Novela policial (sobre caso Claúdia)
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/03/1428029-novela-policial.shtml
20 de março – El País Brasil
Cartazes de homenagem a mulher arrastada pela PM (caso Claúdia)
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/03/21/album/1395358181_827395.html#1395358181_827
395_1395360025
20 de março – Folha em Espanhol
Las UPPs no se tornarán una política pública sostenible y universalizada si no
son acompañadas de una revolución radical en las policías
http://brasilcomn.blogfolha.uol.com.br/2014/03/20/las-upps-no-se-tornaran-una-politica-publi-
ca-sostenible-y-universalizada-si-no-son-acompanadas-de-una-revolucion-radical-en-las-policias/
20 de março – UOL
“Descarreguei a arma”, confessa suspeito de matar PM em SP
http://tvuol.uol.com.br/video/descarreguei-a-arma-confessa-suspeito-de-matar-pm-em-sp-
-04020C193566D8C94326/
21 de março – BBC Brasil
Governos buscam ‘investimento social’ para financiar recuperação de presos
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/03/140312_titulos_sociais_presidios_pai.shtml
263
25 de março – Pragmatismo Político
Vídeo: Pichador tem a cara pichada por PM
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/03/video-pichador-tem-cara-pichada-por-
-pms.html
25 de março – Folha
Policiais envolvidos em mortes em SP são na maioria brancos, diz pesquisa
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2014/03/1430270-policiais-envolvi-
dos-em-mortes-em-sp-sao-na-maioria-brancos-diz-pesquisa.shtml
25 de março – Folha
Copa terá comando específico da PM a partir de maio em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1430553-copa-tera-comando-especifico-da-
-pm-a-partir-de-maio-em-sp.shtml
25 de março – Folha
Homicídios voltam a reduzir no Estado; roubo cresce 47% na capital
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1430593-homicidios-voltam-a-reduzir-no-
-estado-roubo-cresce-47-na-capital.shtml
26 de março – G1
Taxa de negros mortos pela polícia de SP é 3 vezes a de brancos, diz estudo
http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/03/taxa-de-negros-mortos-pela-policia-de-sp-e-3-
-vezes-de-brancos-diz-estudo.html
26 de março – Folha
Vídeo mostra policiais atirando em rapaz; PM vai analisar imagens
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1431185-video-mostra-policiais-atirando-
-em-rapaz-pm-vai-analisar-imagens.shtml
264
27 de março – Folha
Editorial: Roubos sem explicação
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/03/1431462-editorial-roubos-sem-explicacao.shtml
27 de março – Folha
Manifestantes fecham pista da av. Paulista em novo ato anti-Copa
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1432027-manifestantes-fechar-pista-da-av-
-paulista-em-novo-ato-anti-copa.shtml
27 de março – Folha
Pacífico, 4º ato anti-Copa reúne mil pessoas na região central de SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/03/1432151-pacifico-4-ato-anti-copa-reune-
-mil-pessoas-na-regiao-central-de-sp.shtml
27 de março – BBC Brasil
Como policiais acusados de crimes continuam nas ruas?
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/03/140326_policias_jp_lk.shtml
28 de março – Estadão
Jovem que participava de arrastão é morto por PMs de folga na zona leste
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,jovem-que-participava-de-arrastao-e-morto-
-por-pms-de-folga-na-zona-leste,1146236
28 de março – IG
Violência policial é herança da ditadura: ‘Pau-de-arara está onde sempre esteve’
http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2014-03-28/violencia-policial-e-heranca-da-ditadu-
ra-pau-de-arara-esta-onde-sempre-esteve.html
265
2 de abril – Última Instância UOL
Estudo sobre violência policial revela “racismo institucional” na PM de SP;
assista ao vídeo
http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/70082/estudo+sobre+violencia+policial+reve
la+racismo+institucional+na+pm+de+sp+assista+ao+video.shtml
2 de abril – Última Instância UOL
Polícia Militar de SP nega informações de pesquisa divulgada pela UFScar
(pesquisa racial)
http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/70110/policia+militar+de+sp+nega+inf
ormacoes+de+pesquisa+divulgada+pela+ufscar.shtml?fb_action_ids=812594622102619&fb_
action_types=og.likes&fb_source=aggregation&fb_aggregation_id=288381481237582
3 de abril – El País Brasil
“A morte de inocentes, como Amarildo, é o resquício da ditadura” [diz Mar-
celo Rubes Paiva]
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/04/03/politica/1396562225_091459.html
3 de abril – Folha
Caderno Especial Carandiru
http://www1.folha.uol.com.br/especial/2013/massacredocarandiru/
21 anos depois 73 PMs condenados
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159604-21-anos-depois-73-pms-condenados.
shtml
Advogado diz que vai pedir anulação do júri
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159605-advogado-diz-que-vai-pedir-anulacao-
-do-juri.shtml
266
Sobrevivente diz que não acredita em prisão de PMs
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159606-sobrevivente-diz-que-nao-acredita-em-
-prisao-de-pms.shtml
‘Os presos se mataram por causa de drogas’
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/159607-os-presos-se-mataram-por-causa-de-dro-
gas.shtml
3 de abril – Fecebook Advogados Ativistas
https://www.facebook.com/AdvogadosAtivistas/photos/pb.495852747151291.
-2207520000.1415396221./611870075549557/?type=3&theater
4 de abril – Folha
Gestão Alckmin conta até enfermaria e infla vagas em presídios
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1435620-gestao-alckmin-conta-ate-enfer-
maria-e-infla-vagas-em-presidios.shtml
267
4 de abril – Folha
Editorial: Justiça tardia (sobre julgamento do Carandiru)
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/04/1435571-editorial-justica-tardia.shtml
4 de abril – Folha – Charge Angeli
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/24074-charges-abril#foto-380413
5 de abril – Facebook Jornal A Nova Democracia
http://www.anovademocracia.com.br/no-128/5290-50-anos-do-golpe-militar-cadeia-para-
-os-torturadores
268
6 de abril – Folha
Crimes crescem em SP, mas efetivo das polícias encolhe
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/160034-crimes-crescem-em-sp-mas-efetivo-das-
-policias-encolhe.shtml
6 de abril – Folha
Secretário diz que Estado vai contratar mais policiais
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/160035-secretario-diz-que-estado-vai-contratar-
-mais-policiais.shtml
9 de abril – Folha
País teve 136 agressões a jornalistas no ano passado: Cobertura de protestos
motivou alta de 232%
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/160577-pais-teve-136-agressoes-a-jornalistas-no-
-ano-passado.shtml
9 de abril – Carta Capital
A PM-SP revela sua ideologia em nota oficial: Para suprimir o debate sobre
a desmilitarização, Polícia Militar adota discurso radical e insinua que crí-
ticos são comunistas
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/a-pm-sp-revela-sua-ideologia-3626.html
10 de abril – Folha
1 em cada 5 foi vítima de violência no país de um ano para cá
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1438478-1-em-cada-5-foi-vitima-de-violen-
cia-no-pais-de-um-ano-para-ca.shtml
269
10 de abril – Folha
Governo Alckmin conta mecânico e telefonista como policial de rua
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1438475-governo-alckmin-conta-mecani-
co-e-telefonista-como-policial-de-rua.shtml
10 de abril – Folha
Interpretação para classificar policiamento estava errada, diz PM
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1438476-interpretacao-para-classificar-
-policiamento-estava-errada-diz-pm.shtml
10 de abril – Estadão
Bruno Paes Manso: Em nota ao UOL, a PM chamou a sociedade para o de-
bate. Eu, humildemente, aceito o desafio
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/em-nota-ao-uol-a-pm-chamou-a-sociedade-ao-debate-eu-hu-
mildemente-aceito-o-desafio/?fb_action_ids=10152210030904822&fb_action_types=og.recommends
12 de abril – Folha
SP tem a quinta maior taxa de homicídios entre 35 grandes cidades
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1439591-sp-tem-a-5-maior-taxa-de-homici-
dios-do-mundo.shtml
12 de abril – Folha
PM quer usar aposentados para reforçar efetivo em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1439841-pm-quer-usar-aposentados-para-
-reforcar-efetivo-em-sp.shtml
13 de abril - Folha
Onda de roubo de celular impulsiona estatística do crime em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1439948-onda-de-roubo-de-celulares-im-
pulsiona-estatisticas-do-crime.shtml
270
15 de abril – Folha
Vídeo mostra homens baleados pela PM agonizando em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1441047-video-mostra-homens-baleados-
-pela-pm-agonizando-em-sp.shtml
15 de abril – Folha
SP tem 3 tiroteios em 24 h; mulher morre com bebê no colo
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161493-sp-tem-3-tiroteios-em-24-h-mulher-mor-
re-com-bebe-no-colo.shtml
15 de abril – Vaidapé
PM mata 76 em janeiro e Telhada afirma: ‘foi pouco. Bandido tem que ir
para o saco’
http://revistavaidape.com.br/blog/2014/04/pm-mata-76-em-janeiro-e-telhada-afirma-foi-
-pouco-bandido-tem-que-ir-para-o-saco/
16 de abril -Folha
Ato [contra Copa] acaba em vandalismo e causa pânico no metrô
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161697-ato-acaba-em-vandalismo-e-causa-pani-
co-no-metro.shtml
17 de abril – Folha
3 são mortos pela PM após invadir casa de cantor do Trio Los Angeles
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161835-3-sao-mortos-pela-pm-apos-invadir-casa-
-de-cantor-do-trio-los-angeles.shtml
17 de abril - Folha
Câmeras da PM darão alerta automático sobre crimes
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/161839-cameras-da-pm-darao-alerta-automatico-
-sobre-crimes.shtml
271
21 de abril – Folha
Paramilitares americanos treinam policiais brasileiros para a Copa
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1443261-paramilitares-americanos-trei-
nam-policiais-brasileiros-para-a-copa.shtml
22 de abril – Folha
Alckmin vai retirar mil policiais do serviço 190
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/162465-alckmin-vai-retirar-mil-policiais-do-ser-
vico-190.shtml
22 de abril – Folha
PM conta policial da central [190] como efetivo de rua
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/162466-pm-conta-policial-da-central-como-efe-
tivo-de-rua.shtml
23 de abril – Folha
PM é baleado em tentativa de assalto na região dos Jardins, em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1444622-pm-e-baleado-em-tentativa-de-as-
salto-na-regiao-dos-jardins-em-sp.shtml
24 de abril – UOL
Polícia erra e mata refém de sequestro relâmpago, em São Paulo
http://tvuol.uol.com.br/video/policia-erra-e-mata-refem-de-sequestro-relampago-em-sao-
-paulo-04024C98306EC0815326
272
24 de abril – Facebook perfil pessoal
25 de abril – BuzzFeed
26 frases do programa Polícia 24 Horas que você poderia usar na vida real
http://www.buzzfeed.com/manuelabarem/26-frases-do-programa-policia-24-horas-que-vo-
ce-poderia-usar
28 de abril – Folha
Médico morre após levar tiro dentro de delegacia
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/163464-medico-morre-apos-levar-tiro-dentro-
-de-delegacia.shtml
30 de abril –Folha
Protesto de sem-teto acaba em confronto
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/163758-protesto-de-sem-teto-acaba-em-confron-
to.shtml
30 de abril – Folha
Ruy Castro: Pessoas dentro da farda (em defesa dos policiais)
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ruycastro/2014/04/1447437-pessoas-dentro-da-
-farda.shtml
273
1º de maio – Veja São Paulo
Os advogados especializados em defender PMs
http://vejasp.abril.com.br/materia/advogados-que-fazem-defesa-de-pms-tribunal-militar
2 de maio – Folha
Leitores comentam coluna [de Ruy Castro] sobre mortes de policiais em
serviço
http://www1.folha.uol.com.br/paineldoleitor/2014/05/1448445-leitores-comentam-coluna-
-sobre-mortes-de-policiais-em-servico.shtml
4 de maio – Folha
‘Bancada da bala’ na Câmara de SP prega morte de bandido
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/05/1449170-bancada-da-bala-na-camara-de-
-sp-prega-morte-de-bandido.shtml
7 de maio
Ruy Castro: “Protesto” de teatro (em defesa dos policiais)
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ruycastro/2014/05/1450419-protesto-de-teatro.shtml
10 de maio – Estado
Contra latrocínio, guia da polícia diz para estrangeiro ‘não reagir’ na Copa
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,contra-latrocinio-guia-da-policia-diz-para-es-
trangeiro-nao-reagir-na-copa,1164966
11 de maio – Folha
‘Datenas’ do Facebook têm 20 milhões de seguidores
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/05/1452690-datenas-do-facebook-tem-20-mi-
lhoes-de-seguidores.shtml
274
12 de maio – Folha
SP não paga indenização a família de PM assassinado
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165506-sp-nao-paga-indenizacao-a-familia-de-
-pm-assassinado.shtml
12 de maio – Folha
Eventuais falhas [de pagamento de indenização] serão corrigidas, diz governo
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165508-eventuais-falhas-serao-corrigidas-diz-go-
verno.shtml
12 de maio – Folha
‘Torturam muito ele’, diz mulher de policial morto
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165510-torturam-muito-ele-diz-mulher-de-poli-
cial-morto.shtml
12 de maio – G1
Polícia conclui inquérito sobre morte de mulher arrastada no Rio (caso
Cláudia)
http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2014/05/policia-termina-inquerito-que-investiga-
-morte-de-mulher-arrastada-no-rio.html
12 de maio - Estadão
Polícia procura suspeitos de matar capitão da PM em Guarulhos
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,policia-procura-suspeitos-de-matar-capitao-
-da-pm-em-guarulhos,1165638
12 de maio – BBC Brasil
Brasil lidera ranking de medo de tortura policial
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/05/140512_brasil_tortura_vale_rb.shtml
275
17 de maio - Folha
Para Planalto, protestos não vão crescer
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/05/1455855-para-planalto-protestos-nao-vao-cres-
cer.shtml
13 de maio – Folha
Família de PM morto em janeiro ainda não recebeu indenização
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/165698-familia-de-pm-morto-em-janeiro-ainda-
-nao-recebeu-indenizacao.shtml
17 de maio – Folha
PM troca nome por código em tarja que identifica policiais
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/05/1455865-pm-troca-nome-por-codigo-em-tarja-
-que-identifica-policiais.shtml
20 de maio – G1
Policiamento da Copa começa a atuar em São Paulo nesta terça, diz PM
http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/05/policiamento-da-copa-comeca-atuar-em-sao-
-paulo-nesta-terca-diz-pm.html
21 de maio – Estadão
Bruno Paes Manso: EXCLUSIVO: PM invade apartamento de madrugada
para deter inocente. Justiça mantém adolescente preso
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/bruno-paes-manso-e-andre-caramante/
23 de maio – Folha
Roubos têm 11º alta consecutiva e crescem 29% no Estado de SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/05/1458998-roubos-tem-11-alta-consecutiva-e-
-crescem-33-no-estado-de-sp-diz-ssp.shtml
276
26 de maio – Folha
Coronel justifica nova tarja de identificação de policiais militares
http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/videocasts/2014/05/1459844-coronel-justifica-no-
va-tarja-de-identificacao-de-policiais-militares.shtml
26 de maio – Agência Efe
Polícia de São Paulo recebe treinamento do FBI para controlar distúrbios
http://www.efe.com/efe/noticias/brasil/brasil/policia-paulo-recebe-treinamento-fbi-para-
-controlar-disturbios/3/16/2328388
27 de maio – SBT
Conexão Repórter mostra cenas de crimes contra a Polícia Militar
http://www.sbt.com.br/conexaoreporter/noticias/14320/Conexao-Reporter-mostra-cenas-de-
-crimes-contra-a-Policia-Militar-.html#.VFVC7yLF8yL
28 de maio – Folha
Rapaz de 17 anos é apreendido pela polícia pela 19º vez em SP
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/168099-rapaz-de-17-anos-e-apreendido-pela-po-
licia-pela-19-vez-em-sp.shtml
31 de maio - Folha
PM vai investigar se homem foi morto por policiais sem reagir
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/168709-pm-vai-investigar-se-homem-foi-morto-
-por-policiais-sem-reagir.shtml
31 de maio – Ponte
Arma furtada na sede da Rota (PM-SP) é usada para matar soldado
http://ponte.org/arma-furtada-na-sede-da-rota-tropa-de-elite-da-pm-de-sp-e-usada-para-ma-
tar-soldado-da-corporacao/
277
1º de junho – Folha
Filme ‘Junho’ leva ao cinema os protestos de 2013 no país
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/06/1462506-filme-junho-leva-ao-cinema-os-
-protestos-de-2013-no-pais.shtml
7 de junho – Pirikart
http://www.pirikart.com.br/image/88106137680
13 de junho – Folha
A cada dois dias, três são mortos em briga de família em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1469542-a-cada-dois-dias-tres-sao-mortos-
-em-briga-de-familia-em-sp.shtml
13 de junho – UOL
Defensoria vê ato da polícia de SP [em abertura da Copa] como despro-
porcional
http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2014/06/13/defensoria-ve-ato-da-
-policia-de-sp-como-desproporcional.htm
278
13 de junho – Estadão
Bruno Paes Manso: “Is it always like this in Brazil? Always so violent demos-
trations?” (CNN) “Sabía que iba a haber tensión pero esto…Brutal” (El Mundo)
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/is-it-always-like-this-in-brazil-always-so-violent-demostra-
tions-cnn-sabia-que-iba-a-haber-tension-pero-esto-brutal-el-mundo/
13 de junho – Pirikart
http://www.pirikart.com.br/image/88673202640
13 de junho – Folha – Charge Angeli
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/25777-charges-junho-2014#foto-404428
279
14 de junho – Folha – Charge João Montanaro
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/25777-charges-junho-2014#foto-405062
17 de junho – Estadão
Bruno Paes Manso: Jornalismo não deve erguer muros, mas criar pontes.
Os desafios depois de junho de 2013 (sobre a criação da Ponte Jornalismo)
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/jornalismo-nao-deve-erguer-muros-jornalismo-deve-
-criar-pontes/
19 de junho – Folha – Charge Angeli
http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/25777-charges-junho-2014#foto-407396
280
20 de junho – Folha
PM faz reintegração de posse na Unesp Araraquara e leva 15 alunos à de-
legacia
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/ribeiraopreto/2014/06/1473441-pm-faz-reintegra-
cao-de-posse-na-unesp-araraquara-e-leva-15-alunos-a-delegacia.shtml
23 de junho – Folha
Polícia Civil só investiga 1 a cada 10 roubos em SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1474720-policia-civil-so-investiga-1-a-
-cada-10-roubos-em-sp.shtml
23 de junho – Folha
Boletim de ocorrência não basta para abrir inquérito, afirma secretaria
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1474725-boletim-de-ocorrencia-nao-basta-
-para-abrir-inquerito-afirma-secretaria.shtml
23 de junho – Folha
Para especialistas, falta de investigação alimenta violência
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/172488-para-especialistas-falta-de-investigacao-
-alimenta-violencia.shtml
24 de junho – Folha
PMs de folga vão reforçar segurança na porta das escolas de SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1475423-pms-de-folga-vao-reforcar-segu-
ranca-na-porta-das-escolas-de-sp.shtml
25 de junho – Folha
Painel do Leitor: críticas à gestão da PM e à atuação da Polícia Civil
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/172781-painel-do-leitor.shtml
281
26 de junho – Folha
Roubos aumentam 42% na capital; homicídios saem de faixa epidêmica
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/173050-roubos-aumentam-42-na-capital-homi-
cidios-saem-de-faixa-epidemica.shtml
27 de junho – Folha
Ex-comandante da Rota, vereador lança revista em quadrinhos ‘para fãs da PM’
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/06/1477305-ex-comandante-da-rota-vereador-
-lanca-revista-em-quadrinhos-para-fas-da-pm.shtml
28 de junho – Folha
Eliane Brum: o PM e o militante
Steevan Oliveira: Não vim de Marte. Sou PM em uma sociedade desigual
Luiz Fernando Vasconcelos: PM mantém uma ordem que é desordem
http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/06/1477892-eliane-brum-o-pm-e-
-o-militante.shtml
02 de julho – Folha
Polícia usa bomba de efeito moral para dispersar torcedores na Vila Madalena
http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/07/1479685-policia-usa-bombas-
-de-efeito-moral-para-dispersar-argentinos-em-sp.shtml
02 de julho – Estadão
Bruno Paes Manso: A ‘Ideologia Telhada’ é hoje o maior veneno para as po-
lícias e para a população de SP
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/em-40-anos-de-servico-publico-coronel-telhada-ain-
da-nao-aprendeu-que-dispensamos-esses-herois/
282
02 de julho – Carta Capital
“Aqui não tem mídia, agora você vai morrer”: Preso nesta terça-feira ao pe-
dir a identificação de uma policial militar, o advogado Daniel Biral conta
que foi agredido e ameaçado por PMs
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/201caqui-nao-tem-midia-agora-voce-vai-mor-
rer201d-765.html
03 de julho – IG
Inquérito da PM ‘absolve’ oficial da morte do pedreiro Amarildo
http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-07-03/ipm-absolve-oficial-da-morte-do-pe-
dreiro-amarildo.html
05 de julho – Ponte
São Paulo proíbe máscaras e bombas em protesto
http://ponte.org/sao-paulo-proibe-mascaras-e-bombas-em-protesto/
06 de julho – Folha
Capital puxa ‘epidemia’ de roubos; Estado bate recorde
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1481647-capital-puxa-epidemia-de-roubos-
-estado-bate-recorde.shtml
06 de julho – Folha
Haverá ‘total empenho’ para combater crimes, diz Grella
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1481654-havera-total-empenho-para-com-
bater-crimes-diz-grella.shtml
06 de julho – Folha
Infográfico: Roubos em alta
http://www1.folha.uol.com.br/infograficos/2014/07/84900-roubos-em-alta.shtml
283
12 de julho – Folha
Após alta de roubos, Alckmin troca 4 chefes da PM na capital
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/175649-apos-alta-de-roubos-alckmin-troca-4-
-chefes-da-pm-na-capital.shtml
12 de julho – Folha
Condenado 1º PM por revide a ataques de facção (PCC, 2006)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/175648-condenado-1-pm-por-revide-a-ataques-
-de-faccao.shtml
12 de julho – Folha
Datafolha traça ranking da insatisfação dos paulistanos (segurança aparece
em 1º lugar)
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1484957-datafolha-traca-ranking-da-insa-
tisfacao-dos-paulistanos.shtml
14 de julho – Folha
Roubos esclarecidos caem 42% em SP nos últimos dez anos
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1485528-roubos-esclarecidos-caem-42-em-
-sp-nos-ultimos-dez-anos.shtml
14 de julho – Folha
Delegado-geral diz que houve mudança em 2013 (em investigações de roubos)
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/175899-delegado-geral-diz-que-houve-mudanca-
-em-2013.shtml
14 de julho – Folha
Investigação em SP põe 30 policiais sob suspeita de elo com PCC
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1485479-investigacao-em-sp-poe-30-poli-
ciais-sob-suspeita-de-elo-com-pcc.shtml
284
15 de julho – Terra
Quatro policiais detidos por agressão durante protestos contra Copa
http://noticias.terra.com.br/brasil/politica/quatro-policiais-detidos-por-agressao-durante-pro-
testos-contra-copa,7d51935b78c37410VgnCLD200000b2bf46d0RCRD.html
17 de julho – Folha
Governo quer tornar permanentes os centros de segurança da Copa
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1487110-governo-quer-tornar-permanen-
tes-os-centros-de-seguranca-da-copa.shtml
20 de julho - Folha
Série nacional explora lado psicológico de policiais
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/07/1488016-serie-nacional-explora-lado-psi-
cologico-de-policiais.shtml
24 de julho – Estadão
PMs que atuaram em ação paralela ao Pinheirinho são indiciados por tor-
tura e abuso sexual
http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,pms-que-atuaram-em-acao-paralela-ao-pinheiri-
nho-sao-indiciados-por-tortura-e-abuso-sexual,1056911
25 de julho – Folha
Roubos têm aumento de 21% na capital paulista; homicídios caem
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1491196-mesmo-com-aumento-de-policia-
mento-para-a-copa-roubos-aumentam-em-sp.shtml
26 de julho – Folha
Com Copa, roubos dobram na região da Vila Madalena
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/07/1491563-com-copa-do-mundo-casos-de-
-roubo-dobram-na-regiao-da-vila-madalena.shtml
285
29 de julho – El País Brasil
Os policiais brasileiros querem desmilitarizar a instituição
http://brasil.elpais.com/brasil/2014/07/30/politica/1406679075_861116.html
29 de julho – Jornal Nacional
Pesquisa mostra insatisfação dos policiais com o próprio trabalho
http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2014/07/pesquisa-mostra-insatisfacao-dos-poli-
ciais-com-o-proprio-trabalho.html
30 de julho – UOL
Pesquisa diz que 77,2% dos policiais são a favor da desmilitarização da PM
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/07/30/um-terco-dos-policiais-
-brasileiros-pensa-em-deixar-corporacao-diz-pesquisa.html
2 de agosto – Folha
Dois pichadores são mortos por PMs dentro de prédio
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/178784-dois-pichadores-sao-mortos-por-pms-
-dentro-de-predio.shtml
6 de agosto – Folha
Para delegado, laudo enfraquece só uma acusação contra presos em ato
caso Fábio Hideki e Rafael Lusvarghi
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1496347-para-delegado-laudo-enfraquece-
-so-uma-acusacao-contra-presos-em-ato.shtml
10 de agosto – Agência Efe
Brasil discute soluções para superlotação em presídios
http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/efe/2014/08/10/brasil-discute-solucoes-para-su-
perlotacao-em-presidios.htm
286
11 de agosto - Folha
PM é presa em SP após atirar em idoso durante abordagem policial
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1498612-pm-e-presa-em-sp-apos-atirar-
-em-idoso-durante-abordagem-policial.shtml
20 de agosto – Ponte
Comissão de Segurança Pública da Câmara prioriza punição ao crime: Rela-
tório do Instituto Sou da Paz avalia que deputados federais preferem atuar no
julgamento e punição ao invés de tratar das causas da violência. Resposta ao
crime é ineficaz, aponta o estudo
http://ponte.org/comissao-de-seguranca-publica-da-camara-nao-prioriza-prevencao-ao-crime/
21 de agosto – Vice
Quem É o Juiz que Manda os PMs pra cadeia
http://www.vice.com/pt_br/read/quem-e-o-juiz-que-manda-os-pms-pra-cadeia?utm_
source=vicefacebr
25 de agosto – Folha
Comerciante é detido [no Paraná] após criticar ação de PMs nas redes sociais
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1505593-comerciante-e-detido-apos-criti-
car-acao-de-pms-nas-redes-sociais.shtml?cmpid=%22facefolha%22
28 de agosto - Folha
Prefeitura terá olheiro em bairro violento
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/182806-prefeitura-tera-olheiro-em-bairro-violento.shtml
28 de agosto – Folha
Assaltantes de ônibus são mortos [por PMs] em SP e no Rio
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidiano/182813-assaltantes-de-onibus-sao-mortos-em-sp-
-e-no-rio.shtml
287
28 de agosto – G1
Tribunal Militar dá liberdade a PMs suspeitos de matar pichadores
http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/08/tribunal-militar-da-liberdade-pms-suspeitos-
-de-matar-pichadores.html
28 de agosto – Folha
Gestão Haddad quer criar grupo que receberá denúncia contra policiais
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1506978-gestao-haddad-quer-criar-grupo-
-que-recebera-denuncia-contra-policiais.shtml
8 de setembro- Folha
Ação policial e eleição esvaziam protestos pelo país
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1512551-acao-policial-e-eleicao-esvaziam-
-protestos-pelo-pais.shtml
9 de setembro - Folha
Governo de SP altera regras e facilita o pagamento de bônus a policiais [que
cumpram metas]
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1513136-governo-de-sp-altera-regras-e-fa-
cilita-o-pagamento-de-bonus-a-policiais.shtml
10 de setembro – Folha
Com mudança em programa, SP vai pagar bônus a 18,8 mil policiais [que
cumpriram meta]
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1513646-com-mudanca-em-programa-es-
tado-sp-pagara-bonus-a-188-mil-policiais.shtml
288
15 de setembro – BBC Brasil
Medo de perder ‘voto conservador’ afasta violência policial de campanhas
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140912_salasocial_eleicoes2014_candi-
datos_policia_seguranca_cc.shtml
16 de setembro – BBC Brasil
Para cada quatro mortos pela polícia no Brasil, um policial é assassinado
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140914_salasocial_eleicoes2014_vio-
lencia_policia_numeros_lk_jp.shtml
18 de setembro – BBC Brasil
‘Na faculdade, deixei minha profissão camuflada; somos discriminados’,
diz PM
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140917_depoimento_pm_kawa_salaso-
cial_eleicoes2014_rw
18 de setembro – BBC Brasil
Por que é tão difícil investigar abusos por policiais? Conheça 5 razões
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140914_investigacao_crimes_salaso-
cial_eleicoes_lk
18 de setembro – Folha
PM é preso após morte de camelô durante operação na zona oeste de SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1518328-pm-e-preso-apos-morte-de-came-
lo-durante-operacao-na-zona-oeste-de-sp.shtml
19 de setembro – UOL
PM preso por matar camelô responde por outra morte
http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2014/09/19/pm-preso-por-ma-
tar-camelo-responde-por-outra-morte.html
289
19 de setembro – BBC Brasil
‘Morte sem pena’: Perfis nas redes fazem apologia à violência policial
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140917_salasocial_eleicoes2014_vio-
lencia_rs.shtml
19 de setembro – BBC Brasil
Tragédia une mães de mortos por policiais: ‘Eles acham que a gente não
tem voz’
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140919_depoimentos_maes_vitimas_
salasocial_eleicoes2014_rw.shtml
19 de setembro – BBC Brasil
Truculência e barbárie não são soluções para a segurança, diz sociólogo
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140919_entrevista_ignacio_cano_jeff_
salasocial_eleicoes2014_rw.shtml
19 de setembro – BBC Brasil
Para analista, desmilitarização não resolve problemas da polícia
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140916_salasocial_eleicoes2014_jose_
vicente_lk.shtml
20 de setembro – Folha
Editorial: Homicídio policial (sobre camelô morto)
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/09/1519075-editorial-homicidio-policial.shtml
23 de setembro – Folha
Vídeos levam juíza a soltar PM que matou camelô horas após mandar
prender
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/09/1521138-videos-levam-juiza-a-soltar-pm-
-que-matou-camelo-horas-apos-mandar-prender.shtml
290
25 de setembro – Folha
Análise: Bico e salário baixo contribuem para ação de PMs na folga
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/09/1346984-analise-militarizacao-bicos-e-sa-
larios-baixos-contribuem-para-as-ocorrencias.shtml
25 de setembro – Folha
Com críticas a PSDB e PT, ‘bancada da bala’ quer alçar voos maiores; assista
http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/videocasts/2014/09/1522231-com-criticas-a-psdb-
-e-pt-bancada-da-bala-quer-alcar-voos-maiores-assista.shtml
2 de outubro – Folha
Com presença da PM, roubos e furtos dentro do campus da USP sobem 55%
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/10/1525771-com-presenca-da-pm-roubos-e-fur-
tos-dentro-do-campus-da-usp-sobem-55.shtml
17 de outubro – Estadão
Bruno Paes Manso: Pelo fim da pena de morte aos adolescentes. O caso
São Remo
http://blogs.estadao.com.br/sp-no-diva/pelo-fim-da-pena-de-morte-aos-adolescentes-o-caso-
-sao-remo/
19 de outubro – Folha
PM é morto com tiro na cabeça na zona sul de SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/10/1534846-pm-e-morto-com-tiro-na-cabeca-
-na-zona-sul-de-sp.shtml?cmpid=%22facefolha%22
29 de outubro – G1
Justiça proíbe PM de usar balas de borracha durante protestos em SP
http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/10/justica-proibe-uso-de-balas-de-borracha-por-
-pm-em-protestos-de-sp.html
291
29 de outubro – Ponte
Documento secreto: PM viola normas de uso para bala de borracha
http://ponte.org/pm-bala-de-borracha-documento-secreto/
3 de novembro – Folha
Ligação com tráfico e milícia é 1º causa de expulsão de PMs no Rio
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1542378-ligacao-com-trafico-e-milicia-e-1-
-causa-de-expulsao-de-pms-no-rio.shtml
4 de novembro – Folha
Fornecedora banca viagem de cúpula da polícia paulista a Orlando, nos
EUA
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1542856-fornecedora-banca-viagem-de-cu-
pula-da-policia-paulista-a-orlando-nos-eua.shtml
5 de novembro – Folha
Sete pessoas são mortas em Belém (PA) após assassinato de PM
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1543495-belem-registra-oito-mortes-apos-
-assassinato-de-policial-militar.shtml
6 de novembro – Folha
TJ suspende proibição de uso de bala de borracha pela Polícia Militar de SP
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1544218-tj-suspende-proibicao-de-uso-de-
-bala-de-borracha-pela-policia-militar-de-sp.shtml
10 de novembro – Folha
Em 5 anos, polícia brasileira matou em média 6 pessoas por dia, diz estudo
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/11/1545847-em-5-anos-policia-brasileira-ma-
tou-em-media-6-pessoas-por-dia-diz-estudo.shtml
292
Sem data – Estadão
No fio da navalha: ‘Problema maior da polícia brasileira é a mentalidade
militar de reagir à violência com violência’, diz estudioso americano
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,no-fio-da-navalha,1125620
Sem data – Tumblr Minha PM
Registros de violência policial em fotos
http://minhapm.tumblr.com/
Sem data – Tumblr Alckmin em Choque
Sátira de como o governador responde a tudo com policiamento
http://alckminemchoque.tumblr.com/
Sem data – Vídeo Coletivo Tatu Morto
Polícia Militar: Organização Terrorista.
http://vimeo.com/88219030
Sem data – Jornal Nacional
O Caso Favela Naval
http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/telejornais/jornal-nacional/favela-
-naval.htm
http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/coberturas/favela-naval.htm
293
Sem data – Foto de manifestação anti-Copa
295
Bibliografia dos perfis
Novinho - Tenente Oswaldo
Dura - Porta dos Fundos
https://www.youtube.com/watch?v=DyPb15CHdew
15 de abril de 2013 - Secretaria de Segurança Pública
Assembleia aprova projeto que dobra seguro de policiais
http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=30989
30 de abril de 2014 - Secretaria de Segurança Pública
São Paulo ganha 1.190 soldados para o policiamento nas ruas
http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=34021
17 de maio de 2014 - Secretaria de Segurança Pública
PM entrega espadins a 228 cadetes em formação
http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=34118
Memória - Sargento Laercio
6 de julho de 2012 - R7
Agentes reclamam de programa de apoio psicológico da Polícia Militar
http://noticias.r7.com/sao-paulo/noticias/agentes-reclamam-de-programa-de-apoio-psicolo-
gico-da-policia-militar-20120706.html
296
25 de maio de 2013 - IG
Programa para PM que passa por situação de risco vira “castigo” para agentes
http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-05-25/programa-para-pm-que-passa-por-situ-
acao-de-risco-vira-castigo-para-agentes.html
Enxugando gelo - Capitão Massera
29 de outubro de 2011 - Estadão
Crimes no câmpus caem até 92% após convênio
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,crimes-no-campus-caem-ate-92-apos-conve-
nio-imp-,791981
13 de junho de 2014 - Folha
Editorial: Retomar a Paulista
http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2013/06/1294185-editorial-retomar-a-paulista.shtml
13 de junho de 2014 - Estadão
Editorial: Chegou a hora do basta
http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,chegou-a-hora-do-basta-imp-,1041814
2 de outubro de 2014 – Folha
Com presença da PM, roubos e furtos dentro do campus da USP sobem 55%
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/10/1525771-com-presenca-da-pm-roubos-e-fur-
tos-dentro-do-campus-da-usp-sobem-55.shtml
Vingança - Coronel Arruda
5 de abril de 1983 - Folha
Um dia de saques e pânico
http://acervo.folha.com.br/fsp/1983/04/05/2/
297
6 de abril de 1983 - Folha
A violência se alastra e Montoro promete ordem
http://acervo.folha.com.br/fsp/1983/04/06/2/
7 de outubro de 2005 - Folha
Namoro de garotas vira caso de polícia
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0710200501.htm
7 de outubro de 2005 - Folha
Para diretor de Escola da EACH, não houve “ação obscena”
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0710200502.htm
30 de dezembro de 2005 - Folha
PM quer aprender com gays a lidar com gays
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff3012200501.htm
30 de dezembro de 2005 - Folha
Policial que abordou jovens foi inocentada
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff3012200502.htm
23 de janeiro de 2006 - UOL
Testemunhas indicadas por meninas da USP não foram ouvidas em sin-
dicância
http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/27021/testemunhas+indicadas+por+m
eninas+da+usp+nao+foram+ouvidas+em+sindicancia.shtml
12 de março de 2006 - Folha
Comando da PM desiste de curso com gays
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1203200614.htm
298
12 de março de 2006 - Folha
“Não esperava outra atitude”, diz associação LGBT
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1203200615.htm
18 de setembro de 2011 - Estadão
O coronel que trouxe uma luta indígena à PM
http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,o-coronel-que-trouxe-uma-luta-indigena-a-
-pm-imp-,774030
13 de janeiro de 2014 - Estadão
Formação de PMs deve ser humanizada, defende coronel [Arruda]
http://politica.estadao.com.br/blogs/roldao-arruda/coronel-da-reserva-defende-mudanca-na-
-formacao-de-policiais-militares/
Dentro da Lei - Major Franciscon
2 de julho de 2014 – Folha
Polícia usa bomba de efeito moral para dispersar torcedores na Vila Madalena
http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/07/1479685-policia-usa-bombas-
-de-efeito-moral-para-dispersar-argentinos-em-sp.shtml
5 de julho de 2014 - Folha
Mesmo com hora para acabar, torcedores não desanimam e fazem festa na
Vila Madalena
http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/07/1481608-mesmo-com-hora-pa-
ra-acabar-torcedores-nao-desanimam-e-fazem-festa-na-vila-madalena.shtml
299
10 de julho de 2014 - G1
PM circula em festa na Vila Madalena após registro de venda livre de droga
http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/07/pm-circula-em-festa-na-vila-madalena-apos-
-registro-de-venda-livre-de-droga.html
10 de julho de 2014 - SPTV
Major da PM fala em três idiomas para dispersar multidão na Vila Madalena
http://globotv.globo.com/globocom/g1/v/major-da-pm-fala-em-tres-idiomas-para-dispersar-
-multidao-na-vila-madalena/3487513/
301
Artigos e trabalhos acadêmicos
ARRUDA, Luiz Eduardo Pesce de. Polícia Militar: uma crônica.
Publicado na revista “A Força Policial” n.º 13 - Polícia Mili-
tar do Estado de São Paulo. 1997.
MANSO, Bruno Paes. Crescimento e queda dos homicídios em
SP entre 1960 e 2010. Tese (Doutorado) apresentada ao
programa de pós-graduação em ciência política da Univer-
sidade de São Paulo. 2012. Disponível em: <http://www.
teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-12122012-
105928/pt-br.php>. Acesso: 2 de nov. 2014.
PINC, Tânia Maria. O uso da força não letal pela polícia nos en-
contros com o público. Tese (Mestrado) apresentada ao
programa de pós-graduação em ciência política da Univer-
sidade de São Paulo. 2006. Disponível em: <http://www.
teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-28052007-
151500/pt-br.php>. Acesso: 2 de nov. 2014.
Leis
BRASIL. Lei nº 192, de 17 de janeiro de 1936. Reorganiza, pelos
Estados e pela União, as Policias Militares sendo conside-
radas reservas do Exercito. Rio de Janeiro, Disponível em:
<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1930-1939/
lei-192-17-janeiro-1936-501765-publicacaooriginal-1-pl.
html>. Acesso: 2 de nov. 2014.
302
______. Decreto-lei nº 667, de 2 de julho de 1969. Reorganiza as
Polícias Militares e os Corpos de Bombeiros Militares dos
Estados, dos Território e do Distrito Federal, e dá outras
providências. Brasília, Disponível em: <http://www.pla-
nalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0667.htm>. Acesso:
2 de nov. 2014.
______. Decreto-lei nº 217/70, de 8 de abril de 1970. Dispõe so-
bre a constituição da Polícia Militar do Estado de São Pau-
lo, integrada por elementos da Força Pública do Estado e
da Guarda Civil de São Paulo. São Paulo, Disponível em:
<http://governo-sp.jusbrasil.com.br/legislacao/223589/
decreto-lei-217-70>. Acesso: 2 de nov. 2014.
______. Lei Complementar nº 826, de 20 de junho de 1997.
Cria, na Secretaria da Segurança Pública, a Ouvidoria da
Polícia do Estado de São Paulo e dá outras providências
correlatas. São Paulo, Disponível em: <http://www.al.sp.
gov.br/repositorio/legislacao/lei.complementar/1997/lei.
complementar-826-20.06.1997.html>. Acesso: 2 de nov.
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______. Lei Complementar nº 893, de 9 de março de 2001. Regula-
mento Disciplinar da Polícia Militar. São Paulo, Disponível
em: <http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei.
complementar/2001/lei.complementar-893-09.03.2001.
html>. Acesso: 2 de nov. 2014.
303
Pesquisas e estatísticas
FÓRUM Brasileiro de Segurança Pública. 7° Anuário Brasileiro
de Segurança Pública. 2013. Disponível em: <http://www.foru-
mseguranca.org.br/produtos/anuario-brasileiro-de-seguranca-
-publica/7a-edicao>. Acesso em: 2 nov. 2014.
FÓRUM Brasileiro de Segurança Pública. 8° Anuário Brasileiro
de Segurança Pública. 2014. Disponível em: <http://www.forum-
seguranca.org.br/storage/download//8o_anuario_brasileiro_de_
seguranca_publica.pdf>. Acesso em: 14 nov. 2014.
MAPA DA VIOLÊNCIA. Homicídios e Juventude no Brasil. Atuali-
zação 15 a 29 anos. 2014. Disponível em: <http://www.mapadaviolen-
cia.org.br/mapa2014_atualiza15a29.php>. Acesso em: 2 nov. 2014.
NEV - Núcleo de Estudos da Violência da USP. Violência Poli-
cia. Disponível em <http://www.nevusp.org/portugues/index.
php?option=com_content&task=view&id=743&Itemid=80>.
Acesso em: 2 nov. 2014.
SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. SP
Demográfico. 2012. Disponível em <http://produtos.seade.gov.
br/produtos/spdemog/out2012/spdemog_out2012.pdf>. Acesso
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