11
A Pastoral Afro paroquial estava composta por 4 membros e lutava ,dentro da paróquia, para realizar alguns eventos, entre eles, o seminário em memória do Padre Heitor Frisotti. Acredito que a imagem da estrutura do centro refletia a realidade e o estado da pastoral: um prédio sem cores, sem e l e m e n t o s q u e o identificassem, sem uma aparente força verdadeira para afirmar s u a v o c a ç ã o e a finalidade. O primeiro desafio foi encontrar um caminho, uma direção a ser tomada. Por um lado, senti a pressão, às vezes positiva e às vezes não, da província que parecia ansiar para uma retomada da experiência do padre Frisotti, talvez nos mesmos moldes e na mesma paixão que ele teve. Por outro lado, foram se revelando realidades muito complexas que tinham a ver também com o trabalho realizado pelos meu antecessores seja no campo específico da pastoral (Padre Fidel, Padre Fernando e o Ex-padre Hernest) seja no campo paroquial ( Padre Angelo e Padre Franco). Pelo que pude ver, várias foram as iniciativas tomadas para a implantação de um centro de referência Afro (o CENPAH) e da inculturação na liturgia, mas os efeitos de tal esforços no contexto paroquial foram de uma quase total rejeição da temática, coisa que me deixou no início perplexo devido a quantidade de afrodescendentes nesta periferia de Salvador. Exemplo disso o fato de que, ainda hoje, usam-se referências as escolhas e atividades realizadas pelos padres Fernando e Fidel (uso de comida na liturgia, encontros com babalorixa, etc..) como razões para atacar o trabalho realizado pela Pastoral Afro, atribuindo elas à minha pessoa. Na minha percepção, senti que realizar o trabalho da pastoral Afro requeria um esforço de desconstrução de conceitos (na verdade de preconceitos) seculares e o desafio estava, e ainda está, em como descontrui-los. Por isso, uma das primeiras parede onde foi batendo minha cabeça foi exatamente a decepção em perceber que o pessoal (inclusive os padres), mesmo depois de tanto discursos e de tantos anos da presença, pouco haviam assimilado a urgência e a necessidade de se debater a questão negra e assumi-la como eixo dentro da caminhada humana e religiosa (e que 30 anos de presença não podem substituir quase 500 anos de abusos, violência e negação). Primeiras Impressões Em 2009 tive a oportunidade de vir a fazer parte da comunidade comboniana de Salvador, onde já estava morando há 5 anos o Padre Franco Pellegrini. A razão pela qual cheguei aqui foi a retomada da Pastoral Afro. Por esse motivo, desde o início meu vinculo com trabalho pastoral paroquial era mínimo . Em relação a questão afro, admito que estava totalmente fora da temática e quando aceitei a proposta achei muito interessante o fato de, como comboniano, ter a oportunidade de entrar em contato com o mundo negro. O que não sabia e nem tinha percebido até então era o tamanho do preconceito, da negação e dos processos discriminatórios implantados dentro da cultura brasileira e, infelizmente, bem enraizado dentro das estruturas eclesiais e religiosas. Após um período inicial, em que precisei substituir na paroquia o Pe. Franco que estava de férias, passei os primeiros meses conhecendo a comunidade paroquial e a local, sobretudo os setores envolvidos nas questões negras. Comecei a fazer parte do GRENI e também acompanhei o CAAPA (Centro Articulador Arquidiocesano de Pastoral Afro). O CENPAH, centro de pastoral Afro pe. Heitor, estava funcionando como secretaria paroquial e, ao mesmo tempo, como cursinho pré-vestibular, uma iniciativa começada no período do Padre Fidel. Resumo da experiência Pastoral Afro "Tira as sandálias dos teus pés, porque o lugar em que te encontras é uma terra santa." Ex 3, 5

Primeiras Impressõesdata.over-blog-kiwi.com/0/51/25/32/201311/ob_4278fea5c...e l e m e n t o s q u e o identificassem, sem uma aparente força verdadeira para afirmar sua vocação

Embed Size (px)

Citation preview

A Pastoral Afro paroquial estava composta por 4 membros e lutava ,dentro da paróquia, para realizar alguns eventos, entre eles, o seminário em memória do Padre Heitor Frisotti. Acredito que a imagem da estrutura do centro refletia a realidade e o estado da pastoral: um

prédio sem cores, sem e l e m e n t o s q u e o ident ificassem, sem uma aparente força verdadeira para afirmar s u a v o c a ç ã o e a finalidade. O primeiro desafio foi encontrar um caminho, uma d i reção a se r tomada. Por um lado, senti a pressão, às vezes positiva e às

vezes não, da província que parecia ansiar para uma retomada da experiência do padre Frisotti, talvez nos mesmos moldes e na mesma paixão que ele teve. Por outro lado, foram se revelando realidades muito complexas que tinham a ver também com o trabalho realizado pelos meu antecessores seja no campo específico da pastoral (Padre Fidel, Padre Fernando e o Ex-padre Hernest) seja no campo paroquial ( Padre Angelo e Padre Franco). Pelo que pude ver, várias foram as iniciativas tomadas para a implantação de um centro de referência Afro (o CENPAH) e da inculturação na liturgia, mas os efeitos de tal esforços no contexto paroquial foram de uma quase total rejeição da temática, coisa que me deixou no início perplexo devido a quantidade de afrodescendentes nesta periferia de Salvador. Exemplo disso o fato de que, ainda hoje, usam-se referências as escolhas e atividades realizadas pelos padres Fernando e Fidel (uso de comida na liturgia, encontros com babalorixa, etc..) como razões para atacar o trabalho realizado pela Pastoral Afro, atribuindo elas à minha pessoa. Na minha percepção, senti que realizar o trabalho da pastoral Afro requeria um esforço de desconstrução de conceitos (na verdade de preconceitos) seculares e o desafio estava, e ainda está, em como descontrui-los. Por isso, uma das primeiras parede onde foi batendo minha cabeça foi exatamente a decepção em perceber que o pessoal (inclusive os padres), mesmo depois de tanto discursos e de tantos anos da presença, pouco haviam assimilado a urgência e a necessidade de se debater a questão negra e assumi-la como eixo dentro da caminhada humana e religiosa (e que 30 anos de presença não podem substituir quase 500 anos de abusos, violência e negação).

Primeiras Impressões

Em 2009 tive a oportunidade de vir a fazer parte da comunidade comboniana de Salvador, onde já estava morando há 5 anos o Padre Franco Pellegrini. A razão pela qual cheguei aqui foi a retomada da Pastoral Afro. Por esse motivo, desde o início meu vinculo com trabalho pastoral paroquial era mínimo . Em relação a questão afro, admito que estava totalmente fora da temática e quando aceitei a proposta achei muito interessante o fato de, como comboniano, ter a oportunidade de entrar em contato com o mundo negro. O que não sabia e nem tinha percebido até então era o tamanho do preconceito, da negação e dos processos discriminatórios implantados dentro da cultura brasileira e, infelizmente, bem enraizado dentro das estruturas eclesiais e religiosas.Após um período inicial, em que precisei substituir na paroquia o Pe. Franco que estava de férias, passei os primeiros meses conhecendo a comunidade paroquial e a local, sobretudo os setores envolvidos nas questões negras. Comecei a fazer parte do GRENI e também acompanhei o CAAPA (Centro Articulador Arquidiocesano de Pastoral Afro). O CENPAH, centro de pastoral Afro pe. Heitor, estava funcionando como secretaria paroquial e, ao mesmo tempo, como cursinho pré-vestibular, uma iniciativa começada no período do Padre Fidel.

Resumo'da'experiência'Pastoral'Afro

"Tira as sandálias dos teus pés, porque o lugar em que te encontras é uma terra santa." Ex 3, 5

No âmbito eclesial, não obstante o compromisso e a entrega na labor pastoral dos párocos, tive a impressão que, desde a formação da paróquia São Daniel Comboni, a postura pastoral Paroquial foi implantando uma leitura paralela ao trabalho e aos desafios da Pastoral Afro. Para resumir: uma coisa é a Igreja Católica e outra é a Pastoral Afro. As conseqüências se tornaram visíveis nas missas cada vez mais na linha das celebrações pentecostais ou na retomanda uma linha mais conservadora e tradicionalista europeia. Outro elemento que chamou minha atenção foi o histórico das relações que marcaram o caminho do centro. Como sabemos, a fundação do CENPAH se concretizou graças a intervenção do padre Fernando. Muitas ações realizadas no centro tiveram o apoio financeiro que estimulou a presença de diferentes pessoas. O resultado disso foi que muitas delas desapareceram com o fim do suporte e outras se afastaram por fatos e posturas dos responsáveis pouco coerentes com o ideal que representavam. O Cenpah que encontrei se apresentou como um animal ferido com várias questões abertas.Assim que no primeiro ano da minha presença em Sussuarana não tive escolha a não ser: ir muito devagar. Foi um período difícil numa realidade complexa e completamente diferente das que havia experimentado.A participação no Greni e no CAAPA me ajudou a perceber que o desafio era muito maior. De um lado o Greni estava reduzido a um grupo de jovem religiosos-as que, ao meu ver, discutiam a questão afro de uma forma “superficial” e que encontravam no Greni um espaço livre das estruturas formativa-religiosa. Do outro lado, o CAAPA, de qual duas pessoas tinham-se apoderado e que de forma pouco clara administravam dinheiro de projetos, chegou a me excluir das reuniões depois de alguns questionamentos meus. Além de tudo isso, dentro da comunidade comboniana de Salvador, os questionamentos da realidade negra se limitavam a um acompanhamento meramente social e não ligado à identidade do povo negro.

1 Uma das primeira decisões que tomei, sem ter claro onde isso iria, foi a criação

de um blog. Isso para dar uma visibilidade midíatica ao centro e, ao mesmo tempo, para

me alimentar das informações e das sensibilidades de quem já estava nesta caminhada há mais tempo. Sem grande

pretensões, o blog se tornou um dos nossos cartões de visitas em todo Brasil e em vários momentos foi o trampolim de leituras e de

posições diferenciadas. Admito que a participação direta com artigos próprios foi o

aspecto que mais demorou a acontecer, devido ao fato que a apropriação do conteúdo

e da perspectiva negra levou um tempo considerável para ser assimilada, sem contar a

falta de costume em colocar por escrito e de forma consistente as experiências pastorais.

Mesmo assim, em 2013 posso dizer que cheguei a colocar 5 artigos no blog, um na

revista Nigrizia, e outros trabalhos dentro da paróquia.

Hoje o cenpah está presente com uma pagina no Facebook (com 550 like -Veja um relatorio das

primeiras tres semanas de Novembro), no lInkedin, no twitter (276 seguidores) e mantém

vivo o blog através da plataforma livre do wordpress. (abaixo a tabela dos acessos)

Passos dados!

O curso continuo de portas abertas superando em dois anos o deficit de quase cinco mil reais anuais que acabava pesando nos balancetes. O pré-vestibular tem seu diferencial na preparação dos professores e nas aulas especiais de CCN (Consciência e Cidadania Negra) nas quais se provocam os alunos/as sobre as temáticas negras. O curso é um espaço privilegiado onde o debate racial pode alcançar entre 50 e 60 jovens de uma forma personalizada e mais profunda. Devido ao fato da maioria dos alunos serem trabalhadores e da seleção para o ingresso nas universidades ser através do Enem, nem sempre elas/eles conseguiram entrar nas universidades públicas, porém o curso ajudou muitos a ingressar em faculdades privadas graças a pontuação das provas que lhe permitiu usufruir de bolsas (PROUNI). Não faltam problemas organizativos: ausência injustificada dos professores, evasão dos alunos depois do primeiro semestre, dificuldades em tratar as questões negras com os alunos, a irregularidade financeira da atividade, etc... que nos deixaram todos os anos com muitas preocupações e que ainda fazem parte da iniciativa. Cada ano o desafio se propõe de forma diferente. Para ajudar economicamente o curso, o carro do CENPAH foi vendido no segundo ano da minha chegada.

Desde a chegada dos padres Fidel e Fernando nasceu a vontade de manter viva a memória do Padre Heitor e de seu legado. Inspirando-se na abertura ao diálogo Inter-religioso, realizou-se todo ano, no final de agosto (período do falecimento do Pe. Heitor), seminários de debate e diálogo. Percebendo a reação adversa à temática Inter-religiosa, nestes últimos 4 anos o seminário começou a ter uma cara um pouco diferenciada, abrindo-se a temas mais amplos da negritude como: a história de resistência do negro, a mulher negra, a juventude negra, entre outros. Além disso, optou-se para adotar um tema especifico a cada ano a ser discutido nas comunidades e no centro. Estes passos ajudaram na aproximação dos paroquianos à questão negra de uma forma mais positiva e abrangente, quebrando um pouco os preconceitos veiculados, sobretudo, pelos grupos mais conservadores da paróquia. Portanto, o seminário Afro Pe. Heitor continua sendo um marco importante sobre a reflexão e a caminhada da Pastoral Afro na paroquia e na diocese, por sermos a única entidade religiosa católica na cidade que promove tais reflexões. Um aspecto a ser incluído será a contribuição do Pe. Heitor e sua mensagem dentro do seminário.

2※ Cursinho S. Bakhita

3 Seminário

4 Caminhada Consciência

NegraUm evento realizado em colaboração com vária entidades e grupos culturais da Sussuarana que acontece no domingo depois do dia 20 de Novembro (Dia da Consciência Negra e da memória do líder Zumbi). Os organizadores do eventos nos últimos anos se reduziram principalmente nas pessoas de:Pe. Arturo (pelo Cenpah), Danubia , Antonia Elita, Alex e Carla que representam o motor deste evento. A partir deste grupo deu-se inicio a uma nova atividade: a Noite da Beleza Negra, que em 2013 chegou na sua terceira edição e trouxe um público de quase 200 pessoas (coisa notável para uma iniciativa negra no bairro).

Talvez este seja o lado mais complicado da ação da pastoral. Desde o primeiro grupo que formou a pastoral, onde basicamente os motores

eram duas pessoas (Alaide Santana, Gilma Pereira), chegamos a incluir e convidar novas e velhas pessoas para que acompanhassem o

trabalho da pastoral. Neste quatros anos, posso dizer que a luta neste sentido foi muito difícil e que várias pessoas aparecerem e

desapareceram, devido a verdadeiros fatores de “sobrevivência” (trabalho, escola, família). Por isso, apostamos em ter e

convidar pessoas mais jovens para que pudessem se aproximar à temática e talvez despertar um interesse maior com a pastoral. A

consequência desta iniciativa foi positiva pela presença da juventude, porém percebe-se que a estrutura e a identificação com a causa não

chegou a ser assumida. A minha conclusão é que realmente a pastoral precisa de gente convencida e identificada com a causa negra, pelo fato

de ter que enfrentar a questão da rejeição e da discriminação, e por outro lado, pra poder realmente fazer propostas de conteúdo e de ações

mais valiosas.

6 Espaço Bakhita

Como ação social, o Cenpah oferece e mantém o curso pré-vestibular. Devido a não uso do espaço durante o dia e a necessidade de oferecer mais cursos para os jovens (sabendo dos limites financeiros e dos gastos em providenciar tais cursos), neste últimos dois anos e meio, conseguimos fechar colaborações com outras entidades que nos permitiram oferecer cursos profissionalizantes ( com o FIESBI/SENAI) e outros cursos (através do CUFA bahia). A experiência foi positiva porque de um lado criou oportunidades para os jovens, nos colocou em contato com entidades, ajudo nos custos do centro e deu a possibilidade de empregar algumas pessoas da paróquia. Por outro lado, a seleção dos alunos limitou a participação dos jovens de Sussuarana e a simples estrutura da sala (que é ótima para o período da noite) não conseguiu proporcionar um ambiente mais propício para os/as alunos/as (isso devido ao forte calor durante o dia e ao barulho da rua). Na perspectiva de proporcionar novos cursos através de parcerias, se faz necessário uma reforma da sala . A nova comunidade comboniana avaliará esta possibilidade.

Ao meu ver, um dos desafios que pode influir no processo de releitura negra da atividade pastoral consiste na apropriação do conteúdo bíblico para uma descontrução de uma religiosidade colonial e uma compreensão mais ampla da historia da salvação. Por isso, desde 2010 foi realizado um curso bíblico anual de 3 meses que teve a participação em média de 30 a 60 pessoas, com uma base de 25-30 pessoas concluindo o curso.

5 Equipe P. Afro

7 Curso Bíblico

No esforço de ampliar e promover um debate de uma forma mais cativante, inspirados pela atuação do SARAU BEM BLACK que acontece no Pelourinho, o centro começo a aproximadamente dois anos a experiência de ter um sarau no bairro. Começando as atividades no salão

Bakhita, o sarau adotou o nome de “Sarau da Onça” e depois de um apoio firme do CENPAH, através a colaboração de um membro da juventude Negra pela Paz, o Sandro Santos, e outro paroquiano, o Evanilson Alves, surgiram dentro desta iniciativa o grupo Ágape e o Sarau da Laje que envolve a participação de crianças. A experiência do Sarau (Sarau da Onça e grupo Ágape) não se limitou ao espaço físico da Sussuarana, mas levou a mensagem e o debate da questão negra em vários lugares da cidade: escolas, eventos estaduais, Câmara municipal, Assembleia Legislativa, Bienal do livro da Bahia, entre outros...Hoje, como pode-se ver no artigo do jornal "correio da Bahia" (ver artigo), o Sarau da Onça é reconhecido na cidade como um dos saraus de referência e até o sarau da Laje aparece como iniciativa importante. Um aspecto muito positivo é a independência do sarau, que acontece com pleno apoio do CENPAH, e que abre sua portas para debates e expressões culturais negras da cidade e fora dela. O que se espera do futuro para o Sarau??? Talvez seja cedo para ter uma resposta clara. Uma certeza é a de poder ganhar espaço nos editais culturais para apoiar economicamente novas e mais impactantes ações dentro e fora do bairro. Outro desafio, é fazer com que novos membros entrem nestes grupos e que talvez nasçam outros. Quem sabe, além de uma conscientização, os grupos assumam lutas mais concretas que transformem suas denuncias em mudanças sociais relevantes para a comunidade.

“Os saraus agregam diversos dados relacionadas à arte. Eles ampliam os horizontes com perspectivas diferentes de construção e desconstrução de informações. Enquanto poeta, essa situação muito me acrescenta”, aponta Sidney Rocha, 45 anos, músico e poeta.

8 Sarau da Onça

Diferencial em SalvadorEm Salvador, a maioria desses pontos de cultura existem com um diferencial: são voltados a pensar e disseminar a cultura afrodescendente. Escritores, músicos e personalidades negras são lembrados e exaltados em encontros temáticos. Prova disso é o Sarau Bem Black, idealizado pelo ativista social Nelson Maca, do Coletivo Blacktude. O sarau acontece às quartas-feiras, no Sankofa African Bar, Pelourinho. A principal proposta é adaptar a ideia das tradicionais rodas poéticas para um formato que agrega resistência da cultura negra e propagação da arte oriunda das periferias.

Inspirado no Bem Black, o Sarau da Onça, em Sussuarana, já batizou o local que acontece as intervenções artísticas como nome do político, poeta, artista plástico e escritor, Abdias do Nascimento. Uma imagem dele ocupa, de ponta a ponta, uma das paredes e se mescla com as cores verde, vermelho e amarelo - predominantes em bandeiras  de países africanos.   

                                                                           

Por lá, fica claro que temas relacionados à negritude têm espaço, vez e ecoam com muitas vozes, mas não só naquele local. De  acordo com um dos organizadores, Sandro Santos, 25 anos, o sarau é uma forma de despertar o interesse da população afrodescendente – maioria do bairro – para as obras criadas por negros.

“Procuramos mostrar quem foi Abdias, Martin Luther King, Dandara entre outros negões e negonas que colaboram de forma significativa para sociedade, assim os que estão presentes se transformam em agentes disseminadores das histórias de personalidades negras”, diz. Do outro lado da cidade, no Santo Antônio, o Sarau da Chacará não deixa o visitante sair sem antes levar gratuitamente um livreto sobre o ex-escravo, jornalista e escritor Luiz Gama

Apesar da maioria dos saraus serem para enaltecer pensadores negros, o público também pode encontrar espaços que dão dicas aos jovens escritores de como se lançar no mercado, como o Sarau Fala Escritor, no Caminho das Árvores, e que têm até uma boa dose de erotismo, como o Sarau Erótico, que acontece no Pelourinho.

Tem para todos os gostos

Na “linha tradicional” de saraus, há aqueles que prestam homenagens e realizam leituras de escritores que se destacaram com suas obras. Um exemplo é o Sarau Viva Poesia Viva, que há 10 anos estimula o conhecimento sobre o trabalho literário de autores renomados como Afonso Mata, Luis  Antônio Cajazeiras Ramos, Lidia Natália. Como conta Douglas de Almeida, 57 anos,  um dos fundadores, tudo é regado a vinho e frutas. E ao final de cada encontro, os presentes fazem um brinde a mais um dia de que a poesia vive.

Enquanto tantos saraus tentam sobreviver, outros nascem com plena disposição para dar vez a poetas anônimos. No Bairro da Paz , por exemplo, está nascendo um  sarau.  Já existe um espaço, Avançar, no final de linha do bairro. No espaço, agora há cadeiras. Nas cadeiras, há baleiros, pedreiros, donas de casa, músicos, pessoas muitas pessoas. Nas pessoas, ideias várias. Nas ideias várias, poesia!Por: Aline Damazio

*Colaborou Edvan Lessa

Tudo isso despertou o meu olhar à necessidade de usar a cultura e as expressões culturais como meio privilegiado para a discussão da temática negra, não somente com os jovens, mas também com pessoas adultas. Depois de mais de um ano de reflexão e discussão dentro da comunidade comboniana e a aprovação pela província, foi construído um pequeno anfiteatro cujo nome foi dedicado a um dos mais importante militante negro brasileiro: Abdias do Nascimento. A criação deste espaço deu um salto qualitativo às atividades culturais organizadas dentro do centro e desde sua inauguração, em julho de 2013. Foram realizadas diversas ações:-peças teatrais;- saraus;- debates diversificados;- noite da beleza negra;- seminários (afro e outro com os APN´s). A expectativa é que o espaço seja de fato um lugar de promoção e discussão da questão negra.

Espaço Abdias do Nascimento

No âmbito paroquial, entre os três eixos fundamentais ( Ceb´s,Social, Negritude) foi incluída a questão da Negritude como aspecto a ser trabalhado e questionado ao longo dos anos. Por isso, depois de um certo período de apatia, começou-se a questionar o simbolismo católico europeu adotado nas representações religiosas e pela Igreja Brasileira sem nenhum questionamento critico. Os efeitos ainda são lentos, mas foi positiva a resposta em certas pastorais, como o batismo, a pastoral da Criança e alguns grupos de catequese, que começaram a usar imagens de afrodescendetes nas atividades deles. Nessa mesma linha, a Igreja Matriz estará recebendo um mosaico mais inculturado e que representará a historia da comunidade de fé de Sussuarana, como pode ser visto nos desenhos.

9 Paróquia

O que ficou pendente:

1) Dialogo Inter-religioso mais sistemático. Aconteceram momentos de encontros e diálogos, mas de uma forma esporádica. Acredito que o diálogo precisa ser alimentado por aprofundamentos e por uma clareza que só o tempo e os contatos ajudam a adquirir. Não querendo usar como desculpa, mas depois da morte do Padre Franco, minha presença em Sussuarana se ligou muito à esfera Paroquial, com a conseqüência de limitar meu tempo para esta questão.

2) No âmbito paroquial continua o desafio de dialogar com posições extremistas e perigosamente reacionária que a igreja Brasileira, dependendo do Bispo responsável, apoia de forma acrítica.

3) Não deu certo a tentativa, através de um membro da Pastoral Afro que é pedagoga e professora em duas escolas do bairro, de aprofundar a temática da lei 10.639, devido ao sobrecarregamento e a problemas familiares que limitaram a ação contemplada. De qualquer forma, esta se pensando em levar como tema para o ano 2014 justamente a implementação da lei 10.639 a ser discutida no centro, na paroquia e nas escolas do bairro.

4) Legalização do espaço: o CENPAH só existe como nome. Por causa disso, o cursinho Bakhita, do ponto de vista financeiro, funciona de forma irregular, muitas iniciativas e editais não puderam serem realizados por não sermos uma identidade jurídica.

Como isso depende de uma decisão da província comboniana e de seu planejamento, em termos de rotação e pessoal, a questão fica pendente. Não faltaram iniciativas do tipo: apoio da ASA (Ação social Arquidiocesana) que não se concretizou, tentativa de ter uma associação independente,etc...Mas tudo isso não levou a nada de concreto.

5) Não houve uma integração mais profunda com a diocese devido ao quadro geral e as mudanças que tardaram em acontecer. Por isso, agora que tem sinais de mudanças, o Padre Oscar já esta participando com assiduidade nos encontros do CAAPA.

6) A equipe provincial de Pastoral Afro composta pelo padre James, eu o irmão Policarpo não chegou a funcionar. Os motivos podem ser encontrados na difícil compreensão da temática por parte de alguns membros, na distância geográfica e nas crises pessoais vivenciadas dentro do grupo. Talvez seja mais pratico fortalecer uma equipe local que possa animar com formas e propostas diferentes a província.

7)Admito que a Biblioteca nunca foi a minha prioridade por motivos já apresentados. Os textos do padre Heitor já foram digitalizados, porém depois que o trabalho terminou, percebeu-se que a digitalização não se deu na forma correta (ex. paginas de livros ou documentos não estão interligadas). O material será enviado de qualquer forma à pastoral Afro Comboniana Latino Americana.

8) Coordenação Latino Americana da Pastoral Afro: as distâncias representam um certo limite, sem falar da experiência diferenciada da questão negra do Brasil. Houve um bom diálogo na coordenação, mesmo assim as atividades e as responsabilidades dos membros muitas vezes nos impediram de ter mais encontros, até virtuais, e trocas de experiências .

.

O desafio da Pastoral Afro é sem dúvida muito grande. Tenho a impressão que na província comboniana brasileira ainda o conceito e a necessidade da luta ao lado do povo negro seja considerada somente uma opção de alguns (pastoral específica ) e não de todos nós que vivemos e trabalhamos no meio dos negro/as. Existem de fato dimensões sociais e culturais que pela precariedade e pela diversidade cultural foram definidos como pastorais especificas. O titulo é interessante e em si indica que o desafio missionário pede um esforço físico-cultural radical, como pode ser: viver no meio da Amazônia, ou nas alturas dos andes, no meio das florestas com os pigmeus,nas favelas do mundo, sem os recursos e os costumes mais próximo às culturas ocidentais. Nesse sentido, concordo com a ideia que nem todo mundo é capaz de viver esse jeito de missão. Ora, quando falamos de afrodescendentes acredito que estes elementos "extremos" não estão presentes no Brasil. A cultura, a língua, a presença dos negros está por toda parte (fora a mídia). Portanto, acredito que a não escolha oficial da questão negra como grupo é um problema mais profundo de compreensão da missão e, no caso especifico dos Combonianos, de uma negação de um dos pilares da identidade do instituto: a questão dos Negros/as, das Áfricas de hoje que não se limitam somente ao espaço geográfico africano. Como é possível que em um grupo de quase 80 combonianos no Brasil seja difícil, para não dizer impossível, encontrar pessoas que trabalhem a temática negra de forma séria e consistente, e que se fique sempre a espera de alguém que “assuma a pastoral Afro”??? Ao meu ver, a maioria do grupo não consegue se desfazer da leitura oficial e racista¹ do país, que é fruto histórico do Brasil, e da herança da missão colonizadora que impôs à igreja a tarefa de reproduzir o sistema europeu religioso, como forma de consolidar a superioridade cultural do ocidente, e a assunção do papel sócio-assistencial que tanto agrada aos que procuram satisfazer seu ego paternalista, com tanto que suas atitudes e seus privilégios não sejam questionados e tirados deles. Como província de missionários combonianos, podemos continuar defendendo a idéia que a questão afro é só uma questão de escolha pessoal??? Ao meu ver, afirmar que a Pastoral Afro é uma escolha para poucos é como dizer ao Salesianos que as escolas são uma escolha pessoal, ou aos camilianos que os hospitais não são para todos assumirem. Ou, para dar outro exemplo, como ir na República Democrática do Congo, ou na Nigéria, ou no Sudão e simplesmente desconsiderar a maioria da população que lá vive por que não nos sentimos confortáveis em assumir o lado deles???

A maioria da população brasileira se declara negra (52% no censo de 2010), valor a ser considerado maior se pensarmos nas pessoas que ainda não assumem de fato sua identidade e todas as estatísticas demonstram e indicam que os afrodescendentes estão na base e nos porões da Sociedade Brasileira. Neste contexto não temos combonianos assumindo a pastoral Afro! Se nós que temos como fundador o defensor dos Negros/as, o profeta da Africa, somos os primeiros a taparmos os olhos diante desta realidade que é gritante, a não questionar a Igreja local sobre este tema, a não nos abrirmos como grupo à realidade da diáspora africana no Brasil, será que somos fieis ao carisma Comboniano? Talvez deveríamos ter a coragem de questionar a nossa identidade, nossa trajetória no Brasil e deixarmos questionar pelas pessoas que olham para nós como aqueles que assumem a causa da Africa. Acredito que o tema deve ser colocado na mesa como NECESSIDADE e ESCOLHA IDENTITáRIA dos COMBONIANOS DO BRASIL e pararmos de apontar a Pastoral Afro como uma “pastoral especifica”, para chama-la o que pra nós é: uma pastoral “essencial e especial”, sem deixar de lado as outras opções.

Conclusões

1 Racismo à brasileira: se baseia na negação da existência dos mecanismos de discriminação e exclusão de um povo (seja ele afrodescendente ou indígena) e na reprodução e imposição de estereótipos eurocêntricos como únicos valores a serem reproduzidos dentro da sociedade e das Igrejas.2 ou “missão civilizadora” onde os moldes das culturas ocidentais (roupa, melodias, gestos) foram assumidos como elementos fundamentais da fé cristã a serem adotados em detrimento dos valores e expressões locais da fé.

²

"�������������������çã��������������������á����� ��������������������������������������������������������������������ç������������������������������������á�������ã������ í���������������ê������������� ��������������������é�����������ç�����������������������������������" Ex 3, 7-8

No contexto atual da caminhada do Brasil, com a formação de uma só província, recoloco as perspectivas já apresentadas com um documento na assembléia que marcou a unificação das duas províncias.1. Beber da fonte da história, da religiosidade e das identidades dos afrodescendentes

brasileiros (através de estudos, elaboração de subsídios e de re-leituras em chave “negra” de momentos significativo da nossa caminhada como congregação e como Igreja no Brasil) COMO: Meios de comunicação, livrinhos, palestras, vídeos, etc...

2. Fazer uma RE-LEITURA da nossa postura pastoral nas periferias que dê espaço à promoção e valorização da (s) cultura(s) negra(s) a partir de uma re-leitura bíblica e do superação da ideologia de embranquecimento imposta dentro e fora da Igreja.COMO: Promover encontros de formação e análise das posturas pastorais nas paróquias combonianas sobre a temática afro com assessoria de uma possível “equipe” de Pastoral Afro Provincial

3. Promover, em nível provincial, discussões específicas sobre esta temática, a Pastoral Afro, e outras (indígenas, pastoral Urbana, etc..) em cada ano.

4. Discutir e assumir na formação dos candidatos combonianos nas Américas as temáticas da pastoral Afro e das outras “pastorais especificas”.

5. Garantir uma equipe de pelo menos duas pessoas liberadas para assumir os desafios da Pastoral Afro.

PASSOSA. Fortalecer a ação e a compreensão da dimensão afro LIBERANDO (desvinculados

de outras obrigações pastorais e com um auxílio econômico a ser definido) pelo menos DUAS pessoas para o acompanhamento e o aprofundamento da temática, sem vínculos obrigatórios com um trabalho paroquial.

B. Manter uma comunidade em específico (Salvador) que trabalhe a temática Afro na prática pastoral e suas consequências e que possa acompanhar as comunidades combonianas com forte presença negra em desenvolver planos de ação e reflexão ligado a questão afro.

Pe. Arturo Bonandi

Perspectivas

“Desejo fazer causa comum com cada um de vós. O vosso bem será o meu e as vossas dores serão também as minhas.”São Daniel Comboni, Sudão 1871: