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8/3/2019 Princpios estruturantes do Processo Penal Portugus (Parte II)
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Princpios estruturantes do Processo Penal Portugus1
2. Grupo: Princpios atinentes prossecuo ou marcha processual
(4 princpios)
y Princpio da investigao: este princpio significa o poder-deverque incumbe ao tribunal de esclarecer e instruir autonomamente,
isto , para alm das contribuies da acusao e da defesa, o
facto sujeito a julgamento, de modo a criar ele mesmo as bases
essenciais para a deciso (Figueiredo Dias)
o Trata-se de um princpio caracterizador da nossa estruturaprocessual, pois a mesma pode ser apresentada como
uma estrutura de base acusatria, integrada pelo
princpio da investigao judicial. Com efeito, embora o
processo penal portugus, desde 1987, e por imperativo
constitucional alis (artigo 32., n.5 CRP), passasse a ter
estrutura acusatria, a verdade que o juiz de julgamento
portugus no assume uma posio meramente arbitral,
passiva, em face de uma lide e de uma discusso
probatria que seria assunto somente da acusao e dadefesa. O juiz portugus assume um papel activo na
prpria produo de prova, tendo mesma iniciativa
probatria, isto , o poder-dever de ordenar todos os
meios de prova que se lhe afigurarem necessrios boa
deciso da causa e descoberta da verdade. E participa
ainda activamente na realizao dos diversos meios
probatrios. Trata-se de duas manifestaes deste poder-
dever resultante do princpio da investigao (artigo 340.CPP).
1Os apontamentos apresentados foram recolhidos em aulas tericas de Direito Processual Penal I,
ministradas pelo Exmo. Professor Doutor Antnio Alberto Monteiro Medina de Seia, na Faculdade deDireito da Universidade do Porto (FDUP), no ano lectivo 2011/2012.
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y Princpio da suficinciao No processo penal, so tratadas muitas questes, apesar
de haver uma questo principal (crime, agente, pena). As
outras questes esto associadas a esta e so de vria
ordem e que podem prejudicar o conhecimento da causaprincipal;
o Ao longo da marcha processual, alm da questo principalque o tribunal chamado a decidir e resolver, podem
surgir outras questes da mais diversa natureza (penais,
administrativas, cveis, etc.), cuja resoluo se mostre
necessria para a deciso da questo principal;
o Ora a questo que imediatamente se levanta prende-secom a determinao do tribunal competente para a
resoluo de tais questes e em que modos. este o
problema que tratado neste princpio, pois, por norma,
o tribunal penal suficiente, isto , o processo penal o
lugar adequado para o conhecimento de todas as
questes, cuja resoluo se mostre necessria para a
deciso final;
o Dentro destas questes mltiplas, h um grupo/categoriamuito importante as questes prejudiciais , isto , o
conjunto de questes jurdicas autnomas quanto ao
objecto e, por vezes, at mesmo quanto natureza, cujo
conhecimento prvio indispensvel para se conhecer da
questo principal, pois a boa deciso desta depende do
esclarecimento da questo principal.
Trs caractersticas fundamentais da questoprejudicial
1. Autnoma, quanto ao objecto;2. Prvia, em sentido lgico;3. Necessria para a resoluo da questo
principal.
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Por exemplo: a propsito de um eventual crime
de arrancamento de marcos (artigo 216. CP),
discute-se a propriedade de um segundo terreno,
que o ru alega ser seu. Trata-se de uma questo
cvel, relevante para discutir a questo penal.
A questo prejudicial constitui uma questoautnoma, quanto ao objecto e, por vezes, quanto
sua natureza. Como tal, tendo objecto prprio, essa
questo podia ser deduzida em processo parte,
especfico;
A questo prejudicial constitui um antecedentejurdico-concreto da deciso da questo principal, o
que impe que a primeira seja decidida antes da
segunda;
A questo prejudicial tem de ser uma questonecessria, que condicione a deciso principal.
H vrios tipos de questes prejudiciais. Podemosautonomizar trs ncleos:
1. Questes prejudiciais penais em processopenal: em princpio, no levantam
dificuldade. O tribunal da questo principal
decidir tambm da questo prejudicial,
podendo, contudo, levantar-se problemas de
competncia;
2. Questes prejudiciais penais em processono penal: como, por exemplo, numa acocvel, a pretenso do autor baseia-se num
documento (escritura pblica) e o ru alega
que aquele documento falsificado (crime de
falsificao de documento, que tem de ser
averiguado);
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3. Questes prejudiciais no penais emprocesso penal: como, por exemplo, a
questo de saber quem o dono do terreno
em face de um crime de furto.
Questes prejudiciais no penais em processopenal: para resolver este problema, vrios caminhos
se mostram viveis ou possveis:
1. Em primeiro lugar, surge a teoria doconhecimento obrigatrio, isto , o tribunal
penal tem competncia obrigatria para
conhecer da questo prejudicial. Assim, aqui,
valeria, em termos absolutos, o princpio da
suficincia. Quando muito, havia o limite da
litispendncia (por exemplo, a questo
prejudicial j estava a ser julgada no tribunal
cvel) e do caso julgado.
o Fundamentos para esta tese: baseia-sena descoberta da verdade material, to
cara ao processo penal, bem como nas
ideias de celeridade, continuidade e
concentrao;
o Inconvenientes desta soluo: assim,no h a especializao da questo,
que no entregue ao tribunal
especializado.
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2. Tese contrria a da devoluo obrigatria,isto , surgindo uma questo principal no
penal, o tribunal penal deve remet-la para o
tribunal materialmente competente,
suspendendo-se o processo penal.o Fundamentos para esta tese:
adequao funcional de cada processo
ao seu objecto prprio;
o Inconvenientes desta tese:interrupes permanentes no processo.
3. A nossa lei adopta uma soluo ecltica,intermdia, consagrada no artigo 7. CPP,
que combinar as vantagens de cada um dos
modelos supra explanados. Assim, o artigo
7., n.1 CPP consagra o princpio da
suficincia, reconhecendo ao tribunal penal
uma certa primazia na resoluo das questes
prejudiciais. Contudo, a lei tem excepes,
no tendo consagrado o princpio em termos
absolutos, admitindo hipteses de devoluo
facultativa. Temos assim um modelo de
suficincia discricionria ou de devoluo
facultativa.
Requisitos para a devoluo:
1. A questo prejudicial tem de ternatureza no penal;
2. A resoluo da questo prejudicial temde ser necessria para se conhecer da
existncia de um crime;
3. Exige-se ainda a questo prejudicialno possa ser convenientemente
resolvida no processo penal (utilizao
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de clusula geral, que vai atender
complexidade e especializao da
matria).
Neste caso, e verificados tais requisitos, o
tribunal pode devolver a questo para o
tribunal materialmente competente. Claro
que este poder no inteiramente
desvinculado e, como tal, este despacho pelo
qual o tribunal penal devolve ou no a
questo prejudicial susceptvel de recurso.
A lei, no artigo 7. CPP, estabeleceu ainda
limites formais para a devoluo:
1. Por um lado, estabelecem-se limitestemporais (artigo 7., n.3 CPP) que
determinam at quando pode ser
decidida ou requerida a devoluo e
quem tem a competncia ou
legitimidade para a requerer;
2. Por outro lado, a lei estabeleceu aindametas de celeridade, isto , limites
temporais para a devoluo. Durante
esse prazo, o processo penal est
suspenso (artigo 7., n.4 CPP). Assim,
o prazo da suspenso no pode
exceder 1 ano. J a aco da questo
prejudicial tem de ser proposta no
prazo mximo de 1 ms. Se tal no severificar, o tribunal penal resolve a
questo prejudicial.
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y Princpio da concentraoo Em sentido amplo, este princpio requer que o processo
penal decorra o mais possvel de forma continuada e
unitria, tanto no tempo como no espao. A tramitao
processual deveria, pois, desenvolver-se no mesmo local esem quaisquer interrupes;
o Ainda que seja um princpio com incidncia em toda amarcha processual, o seu maior relevo verifica-se na fase
de julgamento, mais concretamente no momento da
audincia de julgamento. O ideal seria que a abertura da
audincia e a leitura da sentena penal ocorreriam no
mesmo local e no mesmo dia, sob a direco do mesmo
juiz;
o O princpio da concentrao encontra-se ligado a outrosimportantes princpios processuais, como sejam os
princpios da oralidade, da imediao e da livre convico.
Com efeito, uma vez que impossvel o juiz conhecer, por
experincia prpria, os factos que constituem o objecto do
processo, ele tem de reconstituir os processos da vida,
atravs de provas representativas, produzidas ou
adquiridas para o processo. O princpio da imediao
define o como da recolha dos elementos probatrios,
impondo que o julgador h-de ter uma percepo directa
e pessoal das fontes de prova, um contacto imediato com
as fontes probatrias. Esta imediao requer, por seu
turno, o vector da oralidade. Pois bem: a imediao e a
oralidade pressupem tanto a tendencial imutabilidade
do juiz como a prontido, a continuidade temporal e a
concentrao espacial da actividade judicativa. Todos
estes princpios esto tambm ligados ao princpio da livreconvico. S a percepo prpria dos meios de prova,
realizada atravs de uma valorao imediata, oral e
concentrada, permite uma efectiva livre apreciao;
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o Trata-se de um princpio pouco praticado entre ns e temdois vectores
Concentrao espacial: princpio de localizao,segundo o qual a audincia deve decorrer, por
inteiro, no mesmo local, adequado ao julgamento epara onde devem ser levados todos os
participantes;
Concentrao temporal: prescreve que a audincia,uma vez iniciada, deve decorrer sem interrupes
at ao fim.
o isto que diz o artigo 328., n.1 CPP. Contudo, sabemosque esta continuidade absoluta invivel, na esmagadora
maioria dos processos, e so mltiplas as razes que
justificam interrupes e adiamentos, desde aquelas que
se prendem com o descanso e alimentao dos
intervenientes no processo, at razes mais complexas,
como a falta de algum interveniente importante a ttulo
probatrio ou a realizao de uma percia. Tudo isto pode
conduzir a interrupes e adiamentos da audincia.
Assim, o CPP consagrou situaes de corte no desenrolar
da audincia:
Interrupes: destinam-se a proporcionar o tempoestritamente necessrio para o repouso e
alimentao dos participantes. Sempre que a
audincia no possa acontecer, na sua plenitude, no
mesmo dia, retomada no primeiro dia til
posterior;
Adiamentos: intervalos de maior durao, estandoprevistos no artigo 328., n.3 CPP. Uma audincia
que foi adiada retomada a partir do ltimo acto
processual praticado. Porm, o adiamento no pode
exceder 30 dias, sob pena de a prova produzida
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perder a sua eficcia (artigo 328., n.6 CPP). Tal
soluo justifica-se pelo facto de o juiz ter perdido o
contacto com a produo de prova que ter, assim,
de ser realizada de novo. Contudo, na verdade, nos
mega-julgamentos, acaba-se por perder sempre acontinuidade.
y Princpio da contraditoriedade e audincia prviao Constitui uma garantia fundamental do processo criminal
e um elemento constitutivo de uma estrutura acusatria,
como alis a Constituio consagra no seu artigo 32., n.5CRP;
o O contraditrio , pois, por um lado, uma garantia dedefesa do arguido (dimenso subjectiva), mas tambm um
mtodo de conhecimento, de obteno de informao
(dimenso objectiva);
o Tem uma longa tradio histrica, pois j o processoromano antigo consagrava que o acusado tinha direito de
ser ouvido e de contradizer a acusao. Assim, ningumpode ser condenado sem ser previamente ouvido e sem
que possa contradizer;
o Deste modo, o princpio da contraditoriedade impe aojulgador o dever de ouvir as razes apresentadas quer pela
acusao, quer pela defesa, antes de formar a sua
convico;
o O contraditrio visto, hoje, como a expresso de umefectivo e consistente direito prova, significando que
nenhum meio probatrio pode ser tomado em
considerao sem antes se ter concedido parte afectada
por ele a possibilidade de o contrariar, infirmar;
o A incidncia do contraditrio no a mesma em toda asfases processuais. Vale plenamente na fase de julgamento,
como decorre do artigo 327. CPP e reflexamente do
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artigo 321., n.3 CPP, do artigo 355., n.2 CPP e do artigo
360., nmeros 1 e 2 CPP. Tambm vale no debate
instrutrio (artigo 298. CPP). Na fase de inqurito, a sua
incidncia limitada, pois parte da sua tramitao
tendencialmente secreta e no contraditria. Mesmoassim, no totalmente excludo, uma vez que o artigo
61., n.1, alneas a), b) e c) CPP reconhece ao arguido o
direito de estar presente nos actos que o afectem
directamente e o ser direito a ser ouvido e a intervir no
processo, oferecendo prova e realizando diligncias, em
qualquer fase do processo.