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Professora PDE: Ana Maria Sassala Área: Arte NRE: Curitiba Professor orientador: Luciano Parreira Buchmann IES: FAP – Faculdade de Artes do Paraná Escola de implementação: Escola Estadual Ernani Vidal Público objeto da Unidade Didática: Professores da Rede Pública de Ensino

UNIDADE DIDÁTICA

TANSTORNAR EMBALAGENS: A OBRA DE HÉLIO LEITES

INTRODUÇÃO

Você já observou que, nos materiais sobre artes visuais, de maneira

geral, encontram-se com mais frequência informações sobre determinados

artistas como, por exemplo, Pablo Picasso? Que encontramos com maior

facilidade textos, imagens, vídeos, entre outros tipos de documentação, sobre

artistas que levam à formação do gosto pela influência norte-americana e,

principalmente da arte europeia? Temos à nossa disposição materiais que

possibilitem uma visão sobre a arte brasileira do mesmo modo que a arte

europeia? Estamos realizando com nossos alunos uma reflexão sobre as

questões ideológicas dessas imagens e a formação do gosto pela arte?

No dia-a-dia da escola, nos poucos momentos que temos para pesquisar

e coletar materiais para nossas aulas acabamos por nos submeter ao material

mais disponível, principalmente nos livros didáticos, publicações de revistas e,

eventualmente coleções sobre os artistas consagrados que são vendidos em

bancas de revistas. Mesmo quando temos a oportunidade de termos um bom

livro de arte, na maioria das vezes o que encontramos são publicações sobre

artistas consagrados por instituições como museus. Também é possível

realizar pesquisas pela Internet que, apesar de este veículo divulgar o que há

de mais contemporâneo, em geral encontramos mais dados sobre os mesmos

artistas já citados nas publicações.

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Num grau um pouco menor há informações sobre a arte brasileira, mas

esta também é representada por artistas consagrados como Tarsila do Amaral

ou Cândido Portinari. Quantas vezes você não viu reproduções das obras

Primeira Missa no Brasil do Victor Meirelles, ou ainda, Os Retirantes de

Portinari ilustrando um livro didático?

Também encontramos informações sobre arte contemporânea

vinculados a assuntos que se destacam na mídia e que servem como reflexão

sobre temas atuais como questões ambientais, cultura de massa, novas

tecnologias, entre outros. Embora todo esse material traga assuntos relevantes

para o estudo da arte, percebi que reforçamos mais o conhecimento sobre

artistas que estão próximos de nós pela facilidade da informação, mas longe de

questões como a multiculturalidade e da estética do cotidiano do aluno.

A partir dessas observações senti a necessidade de desenvolver meu

projeto voltado a um artista local, tão próximo de nós e tão distante ao mesmo

tempo. Próximo de nós pelo fato de estar aqui no Paraná, em Curitiba, todos os

domingos na Feira do Largo da Ordem (ou ainda na Internet para quem não

pode vê-lo ao vivo). Distante de nós pela pouca informação que encontramos

pelo seu trabalho, apesar de aparecer algumas vezes na mídia, de ter dois

livros publicados e já ter sido motivo de tema de monografias (aquelas que

ficam nas bibliotecas das universidades e que ninguém lê). Questionando meus

colegas de área percebi que muitas pessoas desconheciam o artista por

completo.

Outro motivo que me levou a desenvolver este projeto foi o fato que o

trabalho deste artista apresenta um aspecto lúdico que aproxima e encanta as

pessoas. Suas esculturas-objetos nascem de materiais aparentemente

insignificantes, mas que se transformam por suas mãos e ganham novos

significados. Através da ludicidade o artista nos faz refletir sobre significância,

reciclagem, a própria arte, valores, entre muitas outras questões.

Também pude perceber, através dos olhos do meu orientador, professor

Luciano Buchamann, a importância deste artista na reflexão sobre questões

como a multiculturalidade, construção da identidade e a valorização da estética

do cotidiano do aluno.

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Bem, vamos então apresentar este “anarquiteto do sonho”, como

escreveu Adalice Araújo, que criou “[...] um projeto visual único, dentro do mais

inovador processo de comunicação popular.” (Araujo, 2006, p. 153).

1. Quem é Hélio Leites?

CARDUME

Quando eu desperto

desperta um outro dentro de mim

que por sua vez desperta outro

e esse a tantos outros

como se fosse um cardume

por isso eu navego assim

São tantos e tão diferentes

cantando dentro de mim.1

Assim o artista se apresenta: não um, mas muitos... Vejamos então uma

pequena biografia desta pessoa que possui tantas vertentes.

Hélio Leites (José Hélio Silveira Leite) nasceu na cidade da Lapa -

Paraná, em 21 de janeiro de 1951. Trabalhou como bancário durante 25 anos.

Morou em vários lugares: Campinas, Apucarana, Rio de Janeiro, Ubatuba, até

que se estabeleceu em Curitiba.

Acalentou o sonho de ser artista desde criança, mas só quando se

aposentou assumiu em definitivo o papel de artista/artesão. É difícil ter uma

definição precisa sobre quem é Hélio Leites no campo da Arte. Contador de

histórias, criador de esculturas/objetos feitos a partir de material descartável,

apresentador de um museu ambulante, entre tantas outras atividades, Hélio

Leites é considerado um multiartista.

Como multiartista Hélio Leites tem um extenso currículo de

participações em exposições e eventos culturais diversificados. Esteve

1 Poema escrito por Hélio Leites apresentado no livro Pequenas Grandezas: miniaturas de Hélio Leites in

Pires, Rita de Cássia Baduy. Curitiba: Artes & Textos, 2008, p.22.

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presente em salões de artes plásticas, sendo premiado por várias vezes, assim

como participou de festivais de teatro. Também desenvolve projetos de

associações, de museus alternativos e do TEMBO – Teatro Minimélista do

Botão- teatro ambulante com 17 peças em miniatura.

Hélio afirma que “não tem paciência para esperar que as pessoas vão

até ele, é ele que vai atrás das pessoas onde quer que elas se escondam...”

(PIRES, 2008, p.59). Assim sendo participa de eventos em diversos locais

como feiras, exposições, escolas, na rua, levando seus botões (pequenas

etiquetas adesivas circulares, daquelas que são utilizadas para fechar

envelopes, que o artista cria com desenhos determinados para cada ocasião.

figura 3) para “abotoar” as pessoas e envolvendo-as com suas histórias. Junto

com Efigênia Rolim, artesã do material reciclado, participou de algumas

edições do Projeto Fera com Ciência.

Aos domingos é possível ver o artista na feira do Largo da Ordem, em

Curitiba, fazendo de sua banca o palco para suas performances. Para aqueles

que não têm essa oportunidade estão disponíveis na Internet vários vídeos

sobre o artista que mostram um pouco de seu trabalho. Um desses vídeos

pode ser encontrado em http://www.oqueetristezapravoce.com.br/.

2. O artista e seu trabalho

Hélio Leites diz que sua função é quebrar com os paradigmas vigentes

e, para isso, vai com seus trabalhos onde as pessoas estão apresentando suas

miniaturas e contando suas histórias. Seu objetivo é estar perto das pessoas

levando por meio do lúdico reflexões sobre o dia a dia, resgatando a memória

de objetos que aparentemente não possuem mais significado.

Os mais diferentes materiais se transformam nas mãos do artista:

cascas de amendoim, caixas de fósforos, latas de sardinha, sapatos sem par,

seringas, conta-gotas entre outras tantas coisas. Assim como são

Qual a imagem que temos de um artista da área das artes visuais? Será

que não estabelecemos um estereótipo sobre esta figura? Onde

encontramos as obras de arte? Obras de arte são objetos sagrados, que

podem apenas ser vistos em museus? Afinal a arte é ou não é para todos?

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diversificados os materiais que utiliza, também é diversificada a forma como

desenvolve seu trabalho. Vejamos alguns deles:

2.1. Museu Casa do Botão

O artista diz que aprendeu com o amigo Humberto de Almeida que “o

homem possui um espaço inegavelmente seu: o próprio corpo.”2Assim Hélio se

utiliza do corpo para levar o Museu Casa do Botão, onde reúne peças que

recebeu de diferentes pessoas. O museu surgiu em 1984 junto com a

ASSINTÃO – Associação Internacional dos Colecionadores de Botão, com o

objetivo de “pesquisar e valorizar o papel do botão na história da humanidade.”

(Pires, 2008, p.53).

O Museu Casa do Botão é constituído de um colete onde estão

pregados diversos tipos de botões – que podem ser botões mesmo ou objetos

diversos com significado em especial. Cada botão é nomeado dependendo de

quem o doou, de onde veio ou qual é a sua função. O próprio artista descreveu

sobre o museu.

Eu não sou o Museu Casa do Botão. O Museu Casa do Botão é isto aqui. É o menor museu da América Latina, só perdendo para o Museu das Pulgas de Bucareste. Como todo museu que se preze, o nosso também esta a um palmo de nosso nariz, colado em nossa pele e no qual pegamos (tocamos) em média 37 vezes ao dia. Por estar tão próximo de nós, nada sabemos a seu respeito, muitas vezes nem quantos furinhos ele tem. Mas nos interessamos muito pelas coisas que estão longe de nós, assim como manchas solares que estão a 300 bilhões de quilômetros da Terra; rabos de cometas e esquecemos do nosso; discos voadores; vidas em outros planetas; nos preocupamos com todas essas coisas e esquecemos do que esta perto de nós. Perto de nós esta a família, que muitas vezes não conseguimos enxergar. A proposta do Museu Casa do Botão é

tentar acordar nas pessoas o real sentido da vida, esquecido pelas dificuldades enfrentadas na sobrevivência do dia a dia. Assim como o Botão junta partes de roupa, acreditamos que ele possa juntar também as pessoas e, por conseguinte, ideias. Todo mundo se abotoa igual, mas não pensa igual, por isso é que cada um tem o seu botão próprio. Em qualquer parte do mundo as pessoas colecionam botão, algumas conscientes,

2 ‘As Possibilidades Promocionais do Homem’, Humberto de Almeida, amigo de Hélio in Pires, Rita de

Cássia Baduy. Curitiba: Artes & Textos, 2008, p.74.

Figura 1 Foto Bianca Muzzillo

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outras inconscientemente. É possível encontrar na Polônia ou qualquer outro país, dentro da casa das pessoas, uma latinha, uma caixinha onde guardam seus botões e de suas vidas. Vão-se as vestes e ficam os botões, porque via de regra são confeccionados de material duradouro. Existem botões de todos os tipos e formas. Botão para Pessoa cega – quem se preocupa com as dificuldades que tem um cego para se abotoar? Esse botão deve ser enxergado através do tato, já que é macio e o cego enxerga todo através dos dedos. Esse botão não tem furos premeditados, ond passar a agulha, fura. Botão para roupa de bombeiro – próprio para ir ao fogo e voltar dele Botão para quem gosta de badalar – é botão sininho Botão- chupeta – para roupa de criança Botão de chumbo – próprio para quebrar mau-olhado e para elevar o baixo-astral. Pode ser usado em regiões afetadas pó acidentes radioativos. Botão Pássaro Anárquico de Bico Vermelho – próprio para anarquistas militantes. Botão cerebral – vejam em que situação se encontra: amarelado e envelhecido, já que hoje em dia ninguém mais usa o cérebro. Botão para roupa de pedreiro – feito de cerâmica é um tipo de botão profissional. Botão Uri Gueller – ou garfo ideal para macrobiótico comer carne. Botão fusível - para pessoa desligada. Botão para roupa de eletricista - profissional Botão antiaids – se a pessoa estiver usando, não corre risco nenhum. Botão de Pobre - a nossa moeda só serve para isso. Botão da Campanha Mundial Antitaxidermismo – evita que as pessoas tirem uma aranha de sua teia e coloquem um alfinete em suas costas apenas para “enriquecer” as coleções de cadáveres inocentes Botão de passarinhos – para quem quer ter um na gola e não ter um na gaiola. Com inúmeras vantagens, esse não faz barulho, não faz sujeira, não comi nada, e o mais importante: não atrapalha a natureza. Botão espelho – para quem não se enxerga Botão para roupa de motel – sabonete em forma de botão Botão juiz de futebol – apito Botão jogador de futebol – bola Botão para roupa de carpinteiro – botão de metro Botão de ecologista militante – botão denúncia Botão de radialista – sem esse botão não tem programa de rádio Botão chave – botão que abre portas Botão velho barreiro – pra quem gosta de viver embriagado Botão Hare Krishna – Krishna Botão para datilógrafa – feito de borracha de apagar Botão de guarda pó escolar – feito de apontador de lápis Botão de funcionário público – canequinha indispensável para cafezinho Botão de guarda chuva – não é só a gente que se abotoa Botão de rosa – próprio para homenagear as mães Botão do ecologista – folha de plástico Botão descartável – para as pessoas que são usadas e depois jogadas fora Botão para escrever – feito de lápis Mas nosso museu é aberto a receber contribuições, em botões naturalmente. Não compramos nada e não vendemos nada em nosso Museu. Nosso museu não tem sede física, não dá lucros nem prejuízos e bem dobradinho cabe dentro de uma sacola de mercado. 3

3 Texto do arquivo pessoal de Hélio Leites, não datado, sobre o Museu Casa do Botão in Pires, Rita de

Cássia Baduy. Curitiba: Artes & Textos, 2008, p.56 a 58.

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Geralmente Hélio veste o Museu Casa do

Botão e o apresenta às pessoas

declamando o texto e, ao final distribui

adesivos às pessoas para que saiam

devidamente “abotoadas” pelo artista. O

artista também utiliza do boné para

apresentar suas miniaturas.

Mas voltemos ao artista. O Museu Casa do Botão é apenas um

aspecto de sua poética. Como vimos anteriormente, o Hélio utiliza diferentes

materiais para criar suas esculturas-objetos cujas dimensões são pequenas,

mas o significado transcende.

Figura 2- Hélio Leites com o Museu Casa do Botão e um de seus bonés. Foto: Ana Maria Sassala.

As pessoas tem liberdade com seu modo de vestir ou, em sua grande

maioria, acabam por adotar modelos padronizados? O corpo é um suporte

para a arte? De que modo?

E você professor, já pensou na concepção do que é um museu? Qual

a sua finalidade? Como aproximar o aluno desse espaço considerado por

muitos como sagrado e em muitos casos, inacessível?

Figura 3 Foto: Bianca Muzzillo

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2.2. MINIATURAS

Tudo se transforma nas mãos de Hélio, ou melhor, como ele mesmo diz

seu objetivo é fazer o milagre da transtornação: transformar um palito de

sorvete em um quilo de pão. Como ele faz isso? Ao juntar um palito de sorvete

que é jogado no lixo Hélio vai transformando seu formato e sua cor até virar

uma arara vermelha que vira um brinco que a pessoa usa pra avisar quando

esta na TPM e que é pra não chegar muito perto. Este palito que não valia

nada passa a ter um valor que permite ao artista comprar um quilo de pão. Eis

o milagre da transtornação.

Uma pergunta que o artista: por que a miniatura?

“Porque a miniatura é mais fácil de carregar. Se fosse fácil carregar

coisa grande, eu faria coisas grandes.” E acrescenta: “faço miniaturas para que

não se perca a essência da proporção.” E acrescenta: “eu estava procurando

um suporte que pudesse me expressar e fosse uma coisa fácil de transportar

(...) cabe dentro de uma bolsa tranquilamente, não pesa, e eu consigo me

expressar e contar uma história dentro da caixa de fósforo.” (PIRES, 2008, p.

27).

Professor: em sua experiência em sala de aula já teve a oportunidade de

trabalhar com objetos de pequena dimensão? Qual seria a relação/reação

entre o aluno e a miniatura?

Figura 4Foto: Bianca Muzzillo

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2.2.1. Caixas de Fósforos

As caixas de fósforos serviram de inspiração para outra forma de

apresentação do artista: o Teatro Minémalista do Botão - TEMBO. Este teatro,

assim como o Museu Casa do Botão é constituído de um colete que possui

uma cortina que se abre ao iniciar o espetáculo. Aparecem então, fixadas no

colete várias caixas, cada uma sendo a representação de uma história. O

espectador escolhe uma caixa e o “contra-regra”, no caso o artista, conta o

referido enredo da mesma. São muitos os temas que inspiram as histórias das

caixinhas: ditados populares, temas bíblicos, histórias infantis.Também são

feitas caixas que homenageiam pessoas que o artista admira como Helena

Kolody e Van Gogh. A história do fogo também foi tema de uma história que se

transformou na ”Biografia Não Autorizada do Fogo” e que foi devidamente

colocado em uma caixa de fósforos. (Pires, 2008, p.76).

Sobre este trabalho assim escreve o artista: [...] “por funcionar como

uma galeria ambulante, onde os pequenos quadrinhos, devidamente pregados

na segmenta, já tem como suporte o corpo do artista, não havendo

necessidade de delimitação de espaço físico, pois a coleção não tem paciência

de esperar que o público a procure, ela vai de encontro ao público, onde quer

que ele se esconda.”4

Cada material sofre um processo de transformação, ou melhor dizendo,

nas palavras do artista, de transtornação. Ao realizar oficinas Hélio utiliza uma

caixa para demonstrar o processo de modificações de uma caixa de fósforo.

Dentro de uma caixa de charutos

cubanos vai acontecendo uma

“transtornação”....

4 Trecho do texto Tembo- Modus Operandi de Hélio Leites in Pires, Rita de Cássia Baduy. Curitiba: Artes

& Textos, 2008, p.73.

Figura 5 Foto: Ana Maria Sassala

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... onde uma caixa de fósforos vai

passando por várias fases...

...adquirindo novo significado ao ganhar

novas cores e formas por fora...

...protegida por um anjo...

...e trazendo na parte interior Nossa Senhora

já com as velas acesas economizando energia.

Figura 9 Foto: Ana Maria Sassala

Figura 6 Foto: Ana Maria Sassala

Figura 8 Foto: Bianca Muzzillo

Figura 7 Foto: Ana Maria Sassala

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Os objetos que Hélio utiliza nos seus trabalhos são, geralmente,

encontrados ou doados por alguma pessoa. Assim sendo esses objetos trazem

uma memória, uma história. O próprio objeto sugere o tema do qual surge uma

história a ser contada pelo artista. Em outras vezes é a poesia ou os

trocadilhos com as palavras que dão origem à miniatura. Como destaca Pires:

“uma poesia torna-se objeto; um objeto torna-se poesia.” (2008, p. 113).

Outro objeto que acabou também por se tornar um local de uma

história: o boné.

2.2.2. Teatro de Boné

No boné o artista viu a possibilidade de realizar algo que as pessoas

diziam não haver no TEMBO: o cenário. A aba do boné é utilizada como palco

para a representação de diferentes histórias e na parte restante são colocados

elementos cenográficos. Também podem existir, dependendo da peça,

elementos que se movem manipulados pelo artista enquanto conta a história.

Os temas abordados são diversos: desde questões sociais como a reforma

agrária até a homenagem ao filme Central do Brasil, onde os personagens

principais são representados, junto com outros elementos da cultura brasileira

no que se refere às crenças populares.

Figura 10 Boné Central do Brasil. Foto: Bianca Muzzillo

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Hélio afirma que a estética do trabalho esta no todo, no conjunto da

palavra do objeto e do gesto. E os objetos, os mais diferentes, acabam por se

transformar em pequenas esculturas, ou como diria Adalice Araujo, em

esculturas- objetos.

2.2.3. Esculturas – objetos

A lata de lixo é o destino de coisas que não precisamos mais, mas para

o artista é a fonte de materiais para seu trabalho. Humildemente vai ao lixo e

de lá tira latas de sardinha que viram O Milagre dos Peixes ou a lata de milho

verde que vai abrigar a Galinha Otimista.

Galinha Otimista

Nesta peça, que surgiu a partir de uma lata de

milho verde, uma pequenina galinha choca um

ovo de galinha. Na tampa entreaberta o artista

escreveu:

Galinha Otimista

Todo esforço tem seu prêmio

Que a vida recompensa

Pouco importa o tamanho

Do ovo que se apresenta

Os palitos de fósforo

não são jogados fora, assim

como a caixa que os guardou:

transformam-se em esculturas

como o Pavão Apagão,

reluzente de cores...

Figura 11 Foto: Bianca Muzzillo

Figura 12 Foto Bianca Muzzillo

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que no verso se traz uma caixa

que abriga Nossa Senhora da Luz

que já vem com as velas acessas.

Figura 13 Foto Bianca Muzzillo

Neste trabalho os tamanquinhos

são feitos de cascas de

amendoim...

guardados em uma caixa de fósforos

que traz no verso uma mensagem.

As cores fortes e brilhantes, presentes no artesanato brasileiro, são uma

característica dos trabalhos de Hélio, que afirma ter um compromisso com a

nossa cultura. Ele também utiliza símbolos que conhecidos como típicos da

cultura paranaense – como a gralha azul, o pinheiro e o pinhão.

Professor(a): você conhece a origem dos símbolos do Paraná? Eles

surgiram do nosso folclore? Qual a relação entre esses símbolos e o

movimento dos artistas paranaenses da década de 30 intitulado Movimento

Paranista?

Figura 14 Foto Bianca Muzzillo

Figura 15 Foto Bianca Muzzillo

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Professor(a): você conhece a origem dos símbolos do Paraná? Eles surgiram

do nosso folclore? Qual a relação entre esses símbolos e o movimento dos

artistas paranaenses da década de 30 intitulado Movimento Paranista?

2.3 Outras produções

Hélio tem como característica a multiplicidade de ações. Entre outras

atividades Hélio desenvolve a arte postal, onde tem a oportunidade de usar

toda a sua criatividade. Brincando com letras, cores e formas, o artista troca

cartas com os amigos.

Com muita irreverência e humor o artista exerce outras atividades como

secretário geral da Assintão – Associação Internacional de Colecionadores de

Botão, diretor da Ex-Cola de Samba Unidos do Botão, curador de museus

alternativos: do Óculos, da Caixa de Fósforos, do Lápis e do Minipresépio,

entre outros. (Lopes, 2010).

O jornalista Rodrigo Garcia Lopes inventou uma palavra que

descrevesse este artista. Uma amiga de Hélio acabou por presenteá-lo com um

carimbo da referida palavra:

Nesta sopa de letrinhas lemos:

Button – maker – performer – graphic- designer – multimidiaman.

Afinal, para um artista como Hélio só um cardume de letras para definir

alguém que carrega tantos dentro si.

Existem vários vídeos postados no You Tube que mostram o artista e

seu trabalho. Também é possível ver os trabalhos de Hélio e de outros artistas

no blog O BOTÃO, disponível em http://unidosdobotao.blogspot.com/.

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Para melhor entendermos a obra de Hélio Leites e sua localização no

campo da arte veremos a seguir os movimentos artísticos que antecederam o

surgimento da Arte Contemporânea.

3. Movimentos artísticos

A primeira referência que temos é o Movimento Dadaísta do início do

século XX. Um de seus representantes, Marcel Duchamp (1887- 1968), criou o

ready-made, objeto de origem industrial sem nenhuma diferença dos similares

apresentado como obra de arte. Pela intenção do artista algo que não possui

valor passa a tê-lo, como na obra Fonte de 1917, um mictório assinado R. Mutt.

No mesmo movimento se inclui a figura de Kurt Schwitters (1887-

1948) que realizou colagens com objetos descartados que foram reordenados

e colados com a técnica da assemblage. Nesta técnica há uma sobreposição

de elementos sem que os mesmos percam o aspecto individual, chamada de

“estética da acumulação.” (ITAÚ CULTURAL, 2008). Os objetos utilizados em

suas obras carregam vivências que são organizadas de forma complexa, assim

como é a vida (ARGAN, 1992). Outro aspecto importante do movimento

dadaísta foi a não distinção entre os campos das artes, pois o artista tinha a

liberdade para transitar entre as formas de expressão.

É importante lembrar também da Arte Pop, movimento em que se

utilizaram as imagens de produtos de consumo e elementos da cultura popular

presentes na televisão e em outros meios de comunicação da época. Com uma

Vimos até o momento como o artista desenvolve suas múltiplas atividades e

alguns exemplos de trabalhos executados. O que se questiona é: onde

localizar Hélio Leites no campo da arte? Quais os pressupostos históricos

que possibilitaram o questionamento dos limites da arte? Existem categorias

quando falamos em arte?

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linguagem bem humorada, o movimento criticava a massificação e o

consumismo da sociedade ocidental. (GIOIA, 2009).

Pelo uso de imagens de produtos consumidos pela sociedade em geral

a Arte Pop proporcionou a desmistificação e a aproximação da arte do grande

público, pois o objetivo do movimento era a não separação entre arte e vida,

assim como propunham os dadaístas e surrealistas. (ITAÚ CULTURAL, 2009).

Um artista de destaque do movimento foi Andy Warhol (1928 –1987).

Usando tintas acrílicas de cores fortes e brilhantes, executou reproduções em

série de diferentes personalidades da época como Elvis Presley, Marilyn

Monroe, Che Guevara, entre outros. (MARTINS e IMBROISI, 2011).

No mesmo período da Arte Pop surgiu o happening (acontecimento),

criado por Allan Kaprow (1927 – 2006): uma apresentação de teatro, onde

aparentemente o espectador também faz parte. Mais tarde surgiu a

performance, cuja diferença esta no planejamento e na não participação da

platéia. Na verdade este tipo de arte teve origem no movimento dadaísta, mas

foi entre os anos 50 e 60 do século XX que se tornou conhecida.

O século XX foi marcado pela multiplicação de movimentos artísticos e,

em especial na década de 50 surgiu um momento de ruptura decisivo que foi

chamado de pós-modernismo. (ITAÚ CULTURAL, 2009).

Para o professor Agnaldo Farias (2002, p.13)

Moderno é o nome de um movimento com características particulares que nasceu na Europa, com variados desdobramentos por quase todos os países do Ocidente, e que entrou em crise a partir da década de 1950. A partir daí, foi sendo substituído por um conjunto de manifestações que, cada qual dotada de peculiaridades, foram, na falta de um nome melhor, reunidas sob a etiqueta simples e genérica de arte contemporânea.

Todos esses movimentos tiveram repercussão no Brasil na formação

de artistas. Como afirma Farias (2002, p. 17): “obteve-se a emancipação de

nossa inteligência plástica e constituiu-se um solo que, com o tempo, se

mostraria grandemente fértil”.

Na década de 80 um novo cenário nacional se formou com as

mudanças na política e a promulgação de uma nova Constituição em 1988.

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Outros fatores como o processo de globalização, o avanço no campo da

informática, o consumismo e os problemas ambientais se transformaram em

fontes de inspiração para o campo da arte.

No Estado do Paraná, em especial, o escritor Paulo Leminski

contribuiu para uma reflexão sobre a produção local e a função social da arte.

As idéias de Leminski influenciaram artistas desta geração que se

preocupavam “com a reflexão no lugar da beleza estética ou com a

comercialização de suas obras.” (BORGES, 2008, p.86).

Formam-se vários grupos de artistas no estado como Moto Contínuo,

Bicicleta, Convergência, entre outros. Além dos grupos, muitos artistas se

destacaram de forma individual como Edilson Viriato, Cesar Almeida, Rogério

Dias e, de maneira muito singular o artista Hélio Leites. (Araujo, 2006).

MATERIAL DIDÁTICO PARTE 2- revisado com Luciano 4- Hélio no contexto das Artes

Em especial, a crítica de arte Adalice Araujo apontou Hélio Leites

como o multiartista da década de 1980. Escreveu sobre ele:

[...] pode afirmar-se que pela primeira vez na História da Arte Brasileira um artista consegue propor uma Pop Art nacional e paranista, que, sem copiar os estereótipos do primeiro mundo e sem cair, tampouco, no folclore, inova com elementos do cotidiano e do imaginário imbuídos de uma síntese histórica, antropológica e psicológica do nosso dia-a-dia.

Com relação ao seu trabalho podemos observar que Hélio faz a

apropriação de objetos de origem industrial realizando assemblages com a

mesma irreverência dos artistas dadaístas, assim como o trânsito em diferentes

formas de expressão. Os objetos trazem memórias, vivências que adquirem um

significado especial em seu trabalho.

Assim como os artistas da Pop Art Leites utiliza embalagens de

produtos de consumo e simples objetos para a reflexão sobre o nosso

cotidiano. Aliando a narrativa de poemas com a apresentação de seu trabalho

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realiza performances – tipo de representação que surgiu no Dadaísmo, mas

que foi batizado por Allan Kaprow nos anos 50 - que nos levam a questionar

temas como economia, filosofia, cultura, ecologia, entre outros.

Hélio também faz uso de cores fortes e brilhantes, de símbolos que

identificam o Paraná - criados pelos artistas que participaram do Movimento

Paranista.

Mas um dos aspectos mais importantes de seu trabalho é a

miniaturização. Como diz o artista: “faço miniaturas para que não se perca a

essência da proporção.” (PIRES, 2008, p.27). Como uma brincadeira Hélio usa

a imaginação e transforma os objetos usando a escala que a embalagem lhe

proporciona.

O artista, na totalidade de seu trabalho não possui um limite entre as

linguagens artísticas, característica da arte na contemporaneidade. Para Hélio

a estética esta no todo: é o conjunto da palavra, objeto e gesto. “Uma poesia

torna-se objeto, um objeto torna-se poesia.” (PIRES, 2008, p. 34).

Estes são apenas alguns aspectos do trabalho de Hélio, cujo estudo

exige um olhar atento e crítico para descobrir suas sutilezas.

Enquanto que, para alguns o artista esta no campo da arte erudita, o

fato de ter características locais em seu trabalho, assim como o uso do

“colorido típico do artesanato brasileiro” (PIRES, 2008, p.107) aliado a sua

presença na Feira do Largo da Ordem, seu comportamento, sua visualidade e

até o uso consciente que faz ao se manter na margem – entre estes campos da

arte, o caracterizaria como um artista popular.

De um lado observa-se que Hélio possui uma formação em arte

(EMBAP-ano), que realizou diferentes cursos com artistas reconhecidos como

Fernando Calderari (1939). Participou de inúmeros eventos culturais em que foi

premiado, recebendo assim o reconhecimento oficial de seu trabalho como

artista.

Então pergunta-se: como conceituá-lo: artista ou artesão? Sua

poética ocupa um lugar no campo erudito ou popular? Ainda é possível, nos

dias de hoje, diante da diversidade da Arte Contemporânea, se falar de

categorias em arte? Isso ainda é importante?

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Por outro lado o próprio Hélio se reconhece como artesão. Na

dedicatória do livro Mínimos que autografou para a professora proponente

deste material ele diz: “esse álbum de figurinhas descarimbadas contando a

história de um artesão que pretende consertar o mundo com uma caixinha de

fósforos.” (LEITES, 2011) 5.

A questão da divisão no campo da Arte vem sendo discutida ao longo

de décadas, desde o momento em que se pergunta o que é Arte. No artigo

intitulado, Sobre Valores e Arte (Raiz, 2006), Jesus de Paula Assis6 aborda o

tema sob vários ângulos levando em conta que a divisão entre arte erudita e

popular pode ser analisada pelo método, pelo conteúdo, pela história e pela

técnica. “Talvez ela se defina apenas por „arte é o que o artista diz que é arte‟,

diria Duchamp ao criar o redymade, comenta Assis (2006, p.39). Também

surgem discussões a respeito das novas mídias, como videogames, por

exemplo, serem vistas como produto de arte. (ASSIS, 2006, p. 39).

Em se tratando de conceituação, a definição de arte erudita esta ligada a

elite social, econômica, política e cultural e seu conhecimento ser proveniente do pensamento científico, dos livros, das pesquisas universitárias ou do estudo em geral (erudito significa que tem instrução vasta e variada adquirida sobretudo pela leitura). A arte erudita e de vanguarda é produzida visando museus, críticos de arte, propostas revolucionárias ou grandes exposições, público e divulgação. (CAMPOS, 2002).

A arte popular seria definida como aquela que

esta associada ao povo, às classes excluídas socialmente, às classes dominadas. A cultura popular não está ligada ao conhecimento científico, pelo contrário, ela diz a respeito ao conhecimento vulgar ou espontâneo, ao senso comum. (CAMPOS, 2002).

5 A dedicatória esta em: LOPES, Adélia (apres.) Hélio Leites: mínimos. Curitiba, PR: Cultural Office, 2010.

6 Jesus de Paula Assis: graduação em Física pelo IF-USP (1982), mestrado em Ciências Sociais (sociologia

da ciência) pela FFLCH-USP (1991), doutorado em Ciências Sociais (sociologia da ciência) pela FFLCH-USP (1995) e pós-doutorado em Artes Plásticas (arte e tecnologia) pela ECA-USP (2006).

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Esses tipos de definições – arte erudita e arte popular - continuam a

fazer parte do pensamento ocidental preocupado em nomear, classificar e

separar sujeitos e objetos numa tentativa de controle sobre a natureza dos

fatos e, dentro do sistema capitalista, uma valoração dos mesmos. Apesar da

polêmica iniciada por Duchamp, o que é ou não arte, a grande maioria das

pessoas ainda se prende a classificações e preconceitos.

Em relação às categorias da arte, a antropóloga Ângela Macelani (apud

RIVITTI, 2006, p.31) comenta: “o bom mesmo seria se a arte popular fosse

chamada apenas de arte, pois o recorte popular é um recorte socioeconômico.”

Quando observamos a trajetória da vida e da obra deste artista pode-se

observar que Hélio transita pelo erudito e popular, tornando-se um mediador

entre as duas áreas, quebrando o paradigma de divisão no campo da Arte.

Trabalhando com o artista, o amigo Humberto de Almeida (apud PIRES, 2008,

p.141) afirmou que juntos elaboraram “a tese nada nova, mas muito sincera, de

que o melhor suporte para a arte não era o papel, mas a vida.”

A ideia presente na frase dos parceiros de criação artística, Hélio e

Humberto, também faz parte do repertório da professora doutora na

Universidade Federal de Santa Maria, Ivone Richter (2003, p.50): “[...] o ensino

da arte esta potencialmente conectado com a vida, desmanchando-se as

fronteiras entre a arte e o contexto cultural mais amplo ao qual ela pertence.” O

trabalho de Hélio Leites permite uma reflexão sobre este conceito.

Como vimos anteriormente, os professores tem, em geral, um acesso

maior a informações e imagens de artistas que trazem referências aos valores

da classe dominante. Acabamos então, por reproduzir não apenas questões

referentes ao campo das artes, mas valores que são consideradas universais,

em detrimento de culturas minoritárias e marginalizadas. Uma idéia que não é

E na área da educação, qual a contribuição do artista para o ensino da arte?

Quais os paradigmas no estudo da arte a serem superados para um ensino

que traga a interculturalidade para a sala de aula? EISNER?

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nossa, mas a qual acabamos servindo. Isto é a força de uma ideologia

(BUCHMANN,2007)

Desta questão surgiram estudos de vários autores(Freire, Efland,

Chalmers, Giroux, MacLaren, Richter, entre outros) que chamam a atenção

para uma educação que tenha realmente um caráter democrático e que traga

para dentro do ambiente escolar o tema da diversidade cultural. E é justamente

neste enfoque que a pesquisa de Ivone Richter nos favorece por focar a

questão da cultura como “um código simbólico, que possui dinâmica e

coerência internas”, que traz as contradições de um grupo social. (Richter,

2003, p.17). Como é o caso de nossas salas de aula, caldeirões de

ascendências diversas.

Nas relações entre as culturas surge, naturalmente, “relações de poder,

desigualdades, contradições, e de que todas as modalidades de transmissão

de cultura implicam, portanto, algum poder de dominação.” (Richter, 2003, p.

17).

A escola não esta indiferente a este processo. Mas é justamente neste

espaço que se tornam mais evidentes. Como destaca Barbosa (2003, p.21):

“na escola pública, se inter-relacionam indivíduos de diferentes grupos culturais

que terão sempre que lidar com outros indivíduos também de diferentes

culturas e subculturas.”

Neste sentido é importante que o espaço escolar oportunize uma

educação intercultural, em especial na área de artes, a fim de “estabelecer a

inter-relação entre os códigos culturais de diferentes grupos sociais.” (Richter,

2003, p. 19).

Graeme Chalmers (2003, p.15) indica que, numa sociedade que

apresenta expressões múltiplas culturais, é “necessário que os jovens tenham

o conhecimento, atitudes e habilidades de pesquisa e interpretação que lhes

permitam de forma eficiente encontrar seu próprio caminho em meio a tanta

diversidade.”

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A proposta de trazer Hélio Leites e sua obra como tema de estudo não

se trata apenas de comentar sobre um artista paranaense, mas a possibilidade

de discussão sobre conceitos em arte – existem categorias em arte?, a

interculturalidade , relações de poder e a estética do cotidiano.

Com relação à estética do cotidiano, Richter (2003, p. 20) comenta:

a estética do cotidiano subentende, além dos objetos ou atividades presentes na vida comum, considerados como possuindo valor estético aquela cultura, também e principalmente a subjetividade dos sujeitos que compõem e cuja estética se organiza a partir de múltiplas facetas do seu processo de vida e de transformação.

Para a mesma autora (2003, p.24) “trabalhar com a estética do

cotidiano no ensino das artes visuais supõe ampliar o conceito de arte, de um

sentido mais restrito e excludente, para um sentido mais amplo, de experiência

estética.”

Cabe ao professor trazer o conhecimento universal sobre a arte como

também oportunizar situações em que o aluno expresse sua história, sua

herança cultural, seus sentimentos e desejos e possa identificar-se na cultura.

E que estas expressões individuais possam ser compartilhadas e valorizadas.

Como afirma Barbosa(2003, p.22): “o que precisamos é manter uma atmosfera

investigadora na sala de aula acerca das culturas compartilhadas pelos alunos,

tendo em vista que cada um de nós participa no exercício da vida cotidiana de

mais de um grupo cultural.”

Como nos lembra Efland, et al. (2003, p.161): “cada um pode ser

tomado como a fonte se sua própria legitimidade.”

Mais do que refletir sobre a arte, o professor deve proporcionar ao aluno

a apropriação do conhecimento universal e particular, para que desse modo

tenha a oportunidade de uma expressão mais consciente que possibilite

mudanças pessoais e ao seu redor. O conhecimento em qualquer campo não

deve ser um fim em si, mas um meio que promova a transformação do ser

humano através de uma consciência mais crítica.

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Também é importante lembrar as palavras de Eisner:

[...]as diferentes formas de pensar, precisas para criar trabalhos manuais artísticos, não são apenas relevantes para o que os estudantes fazem. Eles são virtualmente relevantes para todos os aspectos que fazemos, desde o projecto do currículo, à prática de ensinar, às características em que os estudantes e os professores vivem.

Afinal, em nossa prática diária podemos dizer que o caminho da

aprendizagem não é só para o aluno, mas uma trilha constante na qual se

constrói a vida do professor comprometido com uma educação realmente

democrática.

Hélio Leites from Cesar Nery on Vimeo.

http://blog.elo7.com.br/2011/03/documentario-com-o-artista-helio-leites.html

acesso em 31-07-11

"Quando a gente vai procurar o que fazer dentro da gente, acontece uma coisa

incrível, a gente sempre acaba fazendo o que a gente gosta. E fazer o que a gente

não gosta é o pior desemprego do mundo. E se pegar esse aparelho aqui, ó, que

pisca, que ri, que chora, e botar ele pra trabalhar numa coisa que ele não gosta, é um

desserviço para o espírito." Hélio Leites

REFERÊNCIAS: (VERIFICAR PRESENTES OU NÃO NO MD)

ARAUJO, Adalice Maria de. Dicionário de artes plásticas do Paraná. Curitiba: Edição do autor, 2006.

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<http://www.historiadaarte.com.br>Pop Art. Acesso em 3-05-11.

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PIRES, Rita de Cássia Baduy. Pequenas grandezas: miniaturas de Hélio Leites. Curitiba: Artes & Textos, 2008.

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Acessos de vídeos do YouTube

Eu sou HL

http://www.youtube.com/watch?v=rabKzqkES1M

HL Contador de Histórias

http://www.youtube.com/watch?v=U-UgddpapeE&feature=related

HL O que é tristeza pra você

http://www.youtube.com/watch?v=3NUEXX_yOL0

Hl Pelo Telefone

http://www.youtube.com/watch?v=dePGYfTxpFo&feature=related

Hl e o Milagre dos Peixes

http://www.youtube.com/watch?v=Yox8R9izekM&feature=related

Crônica comHL

http://www.youtube.com/watch?v=07pFgq3UV0o&NR=1

Arte de HL

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http://www.youtube.com/watch?v=5ZdaiB1-8_Y&feature=related

(In)utensílios 1 HL

http://www.youtube.com/watch?v=C6nU-X2MFmM&feature=related

(In)utensilios 2 HL

http://www.youtube.com/watch?v=7JPKvR9KtZs&feature=related

Caixinha de Natal e HL

http://www.youtube.com/watch?v=2WBYpeC7r8k

HL e Santa Helena Kolody

http://www.youtube.com/watch?v=YJrgpOnRpMo

Homenagem a Santa Helena Kolody

http://www.youtube.com/watch?v=-BYjl6I-muc

Romeu e Julieta por Hélio Leites

http://vimeo.com/24609863