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XIII Encontro de Pesquisa em Ensino de Física – Foz do Iguaçu – 2011 1 PROFESSORES DE FÍSICA DA REDE ESTADUAL DE ENSINO DE MINAS GERAIS E A IMPLANTAÇÃO DO NOVO CURRÍCULO PHYSICS TEACHERS FROM MINAS GERAIS PUBLIC SCHOOLS AND THE IMPLEMENTATION OF THE NEW CURRICULUM Maria Neuza A. Queiroz 1 ,Yassuko Hosoume 2 , Betty Carvalho R. G. do Prado 3 1 Instituto Federal do Norte de Minas Gerais/IFNMG, [email protected] 2 PUCMinas/Universidade São Paulo, [email protected] 3 Mestranda em Ensino de Ciências e Matemática/PUCMinas Minas/[email protected] Palavras-chave: Currículo. CBC de Física. Professor de Física. 1) Justificativa e objetivos A educação básica na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB/96 passa a ser um direito do cidadão e um dever do Estado. Dever este que deve ser concebido pelo Estado mediante oferta qualificada. (CURY, 2008). Para atender aos dispositivos legais, os governos dos estados da federação têm implementado diversas políticas públicas no campo da Educação, onde se incluem os projetos educacionais e as reformas curriculares. Inserido nesse novo contexto educacional, em 2005 iniciou-se no Estado de Minas Gerais, a implementação de uma proposta curricular que em sua versão atual se mostra inovadora. A proposta curricular de Física se divide em CBC (1º ano) e Conteúdos Complementares - CC (demais séries). A primeira parte se divide em três eixos temáticos: Energia na Terra; Transferência, Transformação e Conservação da Energia; Energia- Aplicações. A segunda parte (CC) em 4 eixos temáticos: Luz, Som e Calor; Força e Movimento; Eletricidade e Magnetismo e Física Moderna. Os professores da rede pública estadual têm se mostrado insatisfeitos com a falta de suporte pedagógico no desenvolvimento do currículo na prática, nesta perspectiva diferenciada em que foi apresentado. A pesquisa aqui relatada procurou compreender a relação do professor de Física com o CBC e as dificuldades enfrentadas por ele neste contexto de reforma curricular. 2) Marco teórico Embora um currículo escrito esteja diretamente vinculado a estruturas de poder e controle (GOODSON, 1995), a imposição da proposta curricular para todas as escolas, servindo também como forma de avaliação de desempenho dos professores utilizando os resultados das provas sistêmicas das quais os alunos são submetidos, baseadas nos conteúdos do currículo mínimo, acendeu discussões entre o meio docente. Os professores não se sentem “amparados” para executar a nova proposta curricular, uma vez que não tiveram preparação para isto, aspecto essencial para o desenvolvimento real de um currículo. (STENHOUSE, 1975, p.24- 25 apud GOODSON, 1995, p. 58; DELIZOICOV et al, 2002, p. 13). Aliado ao fato de vincular o currículo à avaliação docente está a dificuldade que os mesmos tem enfrentado em termos de materiais didáticos para a execução da nova proposta. Por ser o principal mediador/condutor na aplicação de qualquer proposta curricular, o professor é “peça” fundamental no sucesso da mesma. Dificuldades em assumir novas posturas e compreender os eixos estruturadores de um novo currículo por parte dos professores foram constatadas também com a chegada dos PCNs a partir do ano de 1999. (RICARDO; ZYLBERSZTAJN, 2002 e 2003).

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PROFESSORES DE FÍSICA DA REDE ESTADUAL DE ENSINO DE MINAS GERAIS E A IMPLANTAÇÃO DO NOVO CURRÍCULO

PHYSICS TEACHERS FROM MINAS GERAIS PUBLIC SCHOOLS AND THE IMPLEMENTATION OF THE NEW CURRICULUM

Maria Neuza A. Queiroz1,Yassuko Hosoume2, Betty Carvalho R. G. do Prado3 1Instituto Federal do Norte de Minas Gerais/IFNMG, [email protected]

2 PUCMinas/Universidade São Paulo, [email protected] 3Mestranda em Ensino de Ciências e Matemática/PUCMinas

Minas/[email protected]

Palavras-chave: Currículo. CBC de Física. Professor de Física.

1) Justificativa e objetivos A educação básica na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB/96 passa a ser um direito do cidadão e um dever do Estado. Dever este que deve ser concebido pelo Estado mediante oferta qualificada. (CURY, 2008). Para atender aos dispositivos legais, os governos dos estados da federação têm implementado diversas políticas públicas no campo da Educação, onde se incluem os projetos educacionais e as reformas curriculares. Inserido nesse novo contexto educacional, em 2005 iniciou-se no Estado de Minas Gerais, a implementação de uma proposta curricular que em sua versão atual se mostra inovadora.

A proposta curricular de Física se divide em CBC (1º ano) e Conteúdos Complementares - CC (demais séries). A primeira parte se divide em três eixos temáticos: Energia na Terra; Transferência, Transformação e Conservação da Energia; Energia- Aplicações. A segunda parte (CC) em 4 eixos temáticos: Luz, Som e Calor; Força e Movimento; Eletricidade e Magnetismo e Física Moderna.

Os professores da rede pública estadual têm se mostrado insatisfeitos com a falta de suporte pedagógico no desenvolvimento do currículo na prática, nesta perspectiva diferenciada em que foi apresentado.

A pesquisa aqui relatada procurou compreender a relação do professor de Física com o CBC e as dificuldades enfrentadas por ele neste contexto de reforma curricular.

2) Marco teórico Embora um currículo escrito esteja diretamente vinculado a estruturas de

poder e controle (GOODSON, 1995), a imposição da proposta curricular para todas as escolas, servindo também como forma de avaliação de desempenho dos professores utilizando os resultados das provas sistêmicas das quais os alunos são submetidos, baseadas nos conteúdos do currículo mínimo, acendeu discussões entre o meio docente. Os professores não se sentem “amparados” para executar a nova proposta curricular, uma vez que não tiveram preparação para isto, aspecto essencial para o desenvolvimento real de um currículo. (STENHOUSE, 1975, p.24-25 apud GOODSON, 1995, p. 58; DELIZOICOV et al, 2002, p. 13). Aliado ao fato de vincular o currículo à avaliação docente está a dificuldade que os mesmos tem enfrentado em termos de materiais didáticos para a execução da nova proposta. Por ser o principal mediador/condutor na aplicação de qualquer proposta curricular, o professor é “peça” fundamental no sucesso da mesma. Dificuldades em assumir novas posturas e compreender os eixos estruturadores de um novo currículo por parte dos professores foram constatadas também com a chegada dos PCNs a partir do ano de 1999. (RICARDO; ZYLBERSZTAJN, 2002 e 2003).

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Pesquisas como a de Pereira (2007) no campo do ensino de Matemática e de Souza e Martins (2009) no campo do ensino de Ciências, ambas relacionadas ao ensino fundamental, buscam identificar como a nova proposta curricular da SEE/MG está sendo implementada nas escolas estaduais mineiras. Nestes dois trabalhos as autoras se mostram preocupadas com a relação do professor com o novo currículo e encontram resultados similares. Dentre os vários pontos comuns encontrados destaca-se a questão da formação docente e segundo Souza e Martins (2009): “As políticas públicas educacionais precisam articular as reformas curriculares com mudanças na formação docente. [...]. É por meio da leitura pessoal e das experiências dos docentes que se faz, ou não, o sucesso de uma reforma educacional”. (SOUZA e MARTINS, 2009, p.10).

3) Metodologia e Análise de pesquisa A pesquisa se deu através de questionário com 14 questões discursivas de

forma a permitir uma melhor aproximação das perspectivas de nossa pesquisa de caráter analítico qualitativo que, segundo Bardin (2009) corresponde a um procedimento mais intuitivo, maleável e adaptável a resultados não previstos ou o que transcende às hipóteses levantadas inicialmente. A pesquisa ocorreu no período de dezembro de 2009 a fevereiro de 2011, com a participação de 20 professores de Física do nível médio de diversas cidades do Estado de Minas Gerais (Belo Horizonte, Coração de Jesus, Ipatinga, Juvenília, Montes Claros, Ouro Branco, Pirapora, Sabinópolis e Salinas). Destes, a maioria é licenciado (a) ou ainda está licenciando em Física, sendo apenas um bacharel em Engenharia Mecânica.

4) Conclusões Destaca-se dois aspectos fundamentais observados nas colocações dos

professores: o primeiro é a visão conteudista e utilitarista do ensino de Física que os mesmos demonstram ter. Acreditamos que isso constitui num entrave para a mudança de postura diante de uma nova proposta de currículo. Estas formas de “ver” a Física, podem ser em parte fruto da formação acadêmica. Soma-se a isso a preocupação em atender ao que é cobrado nas avaliações sistêmicas:“[...] está muito aquém do grau de dificuldade exigido dos estudantes em exames de vestibular, inclusive das avaliações externas realizadas pelo próprio estado (PAAE) etc” (P6). Tais avaliações, tendo ou não este objetivo, acabam por induzir a estandardização de um currículo prático nas escolas, voltado para o treinamento de resolução dos testes.

O segundo aspecto observado é a dependência do livro didático como principal recurso mediador no processo de ensino-aprendizagem. Os professores demonstram acreditar que o LD deve estar moldado ao currículo. Todos os pesquisados mencionaram a questão da falta de material didático compatível com a proposta e o fato de os livros adotados pelas escolas não está de acordo com o novo currículo. Um professor coloca: “[...] não conheço nenhum material didático de apoio que tenha sido reestruturado em consonância com o CBC”(P6).

Sobre essa dependência do livro didático como recurso de ensino Wuo (2003), coloca que o livro didático tornou-se um instrumento muito importante na conversão do saber científico, por interligar currículo e didática de forma que o professor o prioriza como fonte de orientação para organização da disciplina e no desenvolvimento das atividades. A interpretação que resulta no uso do livro didático como orientação na separação dos conteúdos do CBC por série, foi constatada por Pereira (2008) bem como por Souza e Martins (2009) em suas pesquisas com os professores, evidenciando a dependência em relação ao LD.

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Os resultados da pesquisa possibilitaram perceber que as opiniões em relação ao CBC são bem divergentes e às vezes contraditórias. No entanto, entende-se, a partir de uma análise geral das respostas, que a maioria dos professores não vê o CBC como uma proposta ruim. O que os afligem é a falta de suporte pedagógico que perdura nas escolas para a execução do CBC. Enquanto uns se mostram dispostos a tentar a implementação do novo currículo, apesar das dificuldades, outros se posicionam de forma indignada e desconfiada, demonstrando acreditar que a proposta poderá não “vingar”.

“Muito funcional no papel, mas a grade curricular dificulta o trabalho no dia a dia, pois não dispõe de material apropriado, didático, laboratorial, acredito que não podemos fazer milagre com esta proposta com os recursos oferecidos pela pratica e execução do mesmo, o próprio governo mencionou a aquisição de kits que iria viabilizar a aulas mais dinâmicas e praticas e ate hoje nada, [...]”. (P14).

A figura do professor é aspecto de extremo valor na implementação de uma proposta curricular. (DELIZOICOV et al, 2002). Essa premissa confere maior necessidade de rever as políticas de investimento em formação continuada para viabilização do CBC em todas as disciplinas com maior circunscrição, não restringindo a formação e informação a poucos.

5) Referências BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Ed. 70, 1995. CURY, Carlos Roberto Jamil. A educação básica como direito. Cadernos de Pesquisa, v. 38, n. 134, p. 293-303, maio/ago. 2008. DELIZOICOV, Demétrio; ANGOTTI, José André; PERNAMBUCO, Marta Maria. Ensino de Ciências: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2002. GOODSON, Evor F. Currículo: teoria e história, Petrópolis, RJ, Vozes, 1995. MINAS GERAIS. Proposta curricular de Física. Educação Básica – 2007, Ensino Médio. Belo Horizonte, 2007. PEREIRA, M. C. . Currículo nas Escolas-Referência de Minas Gerais: como a matemática chega à sala de aula. 2008. Dissertação de mestrado apresentada a UFJF. Disponível em : http://www.bdtd.ufjf.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=189. Acesso em 23 de dez 2009. RICARDO, Elio C.; ZYLBERSZTAJN, Arden. O Ensino das Ciências no Nível Médio: um estudo sobre as dificuldades na implementação dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, v.19, n.3, p.351-370, dez. 2002. ____________. A Reforma Educacional e as Ciências do Ensino Médio: dificuldades de implementação e conceitos fundamentais. IV Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências. Atas. Bauru – SP, de 25 a 29 de novembro de 2003. SOUZA, Vanúbia Emanuelle de; MARTINS, Carmen Maria De Caro. A PROPOSTA CURRICULAR DE CIÊNCIAS EM MINAS GERAIS E AS PRÁTICAS DOCENTES: UMA PRIMEIRA ANÁLISE. In: VII Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciência. Florianóplis,2009. WUO, Wagner. O ensino de física na perspectiva do livro didático. In: Marcus Aurélio Taborda de Oliveira, Serlei Maria Fischer Ranzi. (Org.). História das disciplinas escolares no Brasil. Bragança Paulista: Editora da Universidade de São Francisco, 2003.