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Câmara aprova projeto que regulamenta terceirização; entenda Luís Guilherme Barrucho* - @luisbarruchoDa BBC Brasil em São Paulo 8 abril 2015 P ontos mais polêmicos do projeto ainda serão votados, na semana que vem Criticado por centrais sindicais, mas apoiado por grande parte do empresariado nacional, o projeto de lei que regulamenta a terceirização dos contratos de trabalho foi aprovado na noite desta quarta-feira pela Câmara dos Deputados, cercado de polêmicas. A principal delas é a permissão de que empresas terceirizem não só atividades-meio (funções de apoio ao negócio central da empresa, como limpeza e vigilância), mas também as atividades-fim (por exemplo, a fabricação de carros, no caso de uma montadora). O Plenário da Câmara aprovou o texto-base do projeto de lei por 324 votos a 137, mas alterações no texto-base e pontos mais controversos da proposta só serão votados na terça-feira que vem pelos deputados. O projeto ainda tem de passar também pelo Senado. Para os críticos, o projeto de lei é prejudicial aos trabalhadores pois coloca em risco direitos trabalhistas e ganhos salariais, além de poder levar a uma substituição em larga escala da mão de obra contratada pela terceirizada.

Projeto de Lei 4330_2004 Que Regulamenta a Terceirização Das Atividades-fim (2015_01)

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PL 4330

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Cmara aprova projeto que regulamenta terceirizao; entenda

Lus Guilherme Barrucho* - @luisbarruchoDa BBC Brasil em So Paulo

8 abril 2015

Criticado por centrais sindicais, mas apoiado por grande parte do empresariado nacional, o projeto de lei que regulamenta a terceirizao dos contratos de trabalho foi aprovado na noite desta quarta-feira pela Cmara dos Deputados, cercado de polmicas.

A principal delas a permisso de que empresas terceirizem no s atividades-meio (funes de apoio ao negcio central da empresa, como limpeza e vigilncia), mas tambm as atividades-fim (por exemplo, a fabricao de carros, no caso de uma montadora).

O Plenrio da Cmara aprovou o texto-base do projeto de lei por 324 votos a 137, mas alteraes no texto-base e pontos mais controversos da proposta s sero votados na tera-feira que vem pelos deputados.

O projeto ainda tem de passar tambm pelo Senado.

Para os crticos, o projeto de lei prejudicial aos trabalhadores pois coloca em risco direitos trabalhistas e ganhos salariais, alm de poder levar a uma substituio em larga escala da mo de obra contratada pela terceirizada.

J os defensores da proposta acreditam que ela acaba com a insegurana jurdica, aumenta a produtividade e gera mais empregos.

Projeto criticado por centrais sindicais, mas apoiado por empresriosAt agora, por causa da ausncia de parmetros definidos para a terceirizao, o tema vinha sendo regulado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), por meio da chamada Smula 331, que probe a contratao de trabalhadores por meio de empresas interpostas, exceto os trabalhadores temporrios (como aqueles que trabalham em poca de Natal e Pscoa). De acordo com o dispositivo, a terceirizao somente legal quando se refere atividade-meio da empresa, e no atividade-fim.

No ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu entrar na polmica, ao declarar o tema de repercusso geral, em meio multiplicao de aes civis pblicas ajuizadas pelo MPT (Ministrio Pblico do Trabalho) envolvendo indenizaes milionrias. O julgamento no ocorreu e est previsto para acontecer em 2015.

Centrais, sindicatos e movimentos sociais realizaram manifestaes na tera-feira pelo pas em oposio votao do projeto de lei.

"Vamos fazer uma campanha massiva contra todos os deputados que votarem a favor dessa proposta", afirmou BBC Brasil Graa Costa, secretria das Relaes de Trabalho da CUT (Central nica dos Trabalhadores).

Os 3 pontos polmicos do PL 4330/04

1. Terceirizao das atividades-fim

2. Responsabilidade da empresa contratante sobre obrigaes trabalhistas

3. Garantia dos direitos trabalhistas aos terceirizados (em especial representao sindical)

A BBC Brasil listou trs pontos polmicos do projeto de lei e ouviu opinies contra e a favor sobre ele.

1. Terceirizao de toda e qualquer atividadeA possibilidade de que as empresas passem a terceirizar no s a atividade-meio (aquelas que no so inerentes ao objetivo principal da empresa, ou seja, servios necessrios, mas no essenciais), mas tambm a atividade-fim (aquela que caracteriza o objetivo principal da empresa) um dos itens mais controversos do projeto de lei que regulamenta a prestao de servios por terceiros.

No caso de um banco, por exemplo, a mudana permitiria que bancrios de operadores de caixa a gerentes, ou seja, aqueles que desempenham atividade-fim nessas instituies - passem a ser terceirizados. Atualmente, nessas empresas, apenas trabalhadores como seguranas ou faxineiros podem ter esse tipo de contrato, pois exercem atividade-meio, j que a atividade principal de um banco no fazer segurana tampouco faxina.

Os crticos dizem, no entanto, que a flexibilizao dos contratos "precariza as relaes de trabalho". Eles tambm argumentam que, ao serem empregados como terceirizados, os trabalhadores perdem os benefcios conquistados pela categoria, como, por exemplo, piso salarial maior, plano de sade, vale-alimentao, participao nos lucros, entre outros.

Leia mais: Governo 'dribla' STF e cria nova lista do trabalho escravoLeia mais: Para que serve a 'lista suja' do trabalho escravo?"Esse projeto de lei precariza as condies de trabalho no pas. Dizem que mais empregos sero gerados, mas com que padro? Padro chins?", critica o juiz Germano Silveira, vice-presidente da Anamatra (Associao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho), em referncia s ms condies de trabalho em fbricas na China.

"Os terceirizados ganham salrios mais baixos, at metade do que ganha um contratado direto, e sofrem acidentes de trabalho com mais frequncia, pois as empresas que prestam o servio terceirizado economizam nos itens de segurana para cortar custos", acrescenta. "Os deputados (a favor do projeto de lei) querem transformar essa diferena de salrio em lucro para os empresrios".

Graa Costa, secretria das Relaes de Trabalho da CUT (Central nica dos Trabalhadores) concorda. Segundo ela, o projeto, se aprovado, vai provocar uma substituio em massa de trabalhadores contratados por terceirizados.

Permisso para que toda e qualquer atividade seja terceirizada desagrada lideranas sindicais"H hoje no Brasil quase 13 milhes de trabalhadores terceirizados, contra 35 milhes de trabalhadores contratados. Essa situao vai se inverter com a aprovao desse projeto de lei. O objetivo das empresas unicamente reduzir custos. A relao de trabalho, que hoje bilateral, ou seja, entre trabalhador e empregador, vai deixar de s-lo, abrindo espao para subcontrataes a torto e direito. Ser quebrada a coluna vertebral do direito do trabalho no Brasil", avalia.

Segundo Costa, estimativas apontam que, alm de terem salrios menores, os terceirizados trabalham mais e correm mais riscos de sofrer acidentes, inclusive fatais. Ela acrescenta ainda que, dos dez maiores grupos de trabalhadores em condies anlogas escravido resgatados entre 2010 e 2014, 90% eram de mo de obra terceirizada.

2. Responsabilidade das empresas contratantes sobre obrigaes trabalhistasPela atual verso do PL 4.330/2004, a empresa contratante (tomadora de servios) deve fiscalizar se a empresa terceirizadora (fornecedora de servios) est fazendo os pagamentos trabalhistas e garantindo os benefcios legais, como frias remuneradas.

Apenas se no comprovar ter feito a fiscalizao, ela poder ser punida no caso de alguma irregularidade. O projeto de lei determina que a empresa contratada comprove por meio de documentao mensal que est cumprindo com suas obrigaes.

As centrais sindicais, no entanto, defendem que a responsabilidade do tomador de servio no seja "subsidiria", mas "solidria". No linguajar jurdico, a chamada "responsabilidade subsidiria" significa que a empresa contratante (tomadora de servios) somente pagar se o devedor principal deixar de pagar.

Isso leva o trabalhador a demorar mais tempo para receber seu dinheiro, no caso de uma demisso sem justa causa, por exemplo porque ele precisa esgotar primeiro todas as possibilidades para receber do devedor solidrio, ou seja, da empresa contratada.

Como muitas vezes essas terceirizadoras tm capital social muito baixo, com poucos bens no nome da empresa ou dos scios, o trabalhador acaba enfrentando um longo priplo na Justia para reaver seus direitos, dizem os representantes dos sindicatos.

Leia mais: Os segredos para manter seu emprego"Essa foi uma soluo intermediria (para o impasse), mas apenas uma fiscalizao formal", critica Silveira.

Para Costa, da CUT, a proposta prejudica o trabalhador porque tira do Estado o poder de fiscalizao".

Quanto a encargos previdencirios e Imposto de Renda dos terceirizados, a responsabilidade da empresa contratante (que antes apenas fiscalizava o pagamento), e no mais da terceirizada.

"Se a empresa terceirizada no cumprir com os direitos dos trabalhadores e a empresa contratante provar que se responsabilizou, o prejudicado ser o trabalhador. No faz sentido deixar na mo do empresrio, que tem interesses financeiros nesse sistema, a tarefa de fiscalizao, que deveria caber ao Estado", argumenta.

Costa lembra que o escndalo de desvio de verbas na Petrobras criou, recentemente, um impasse sobre obrigaes trabalhistas.

"Mais de 20 mil trabalhadores terceirizados foram demitidos recentemente de empresas que prestavam servios Petrobras e no sabem a quem recorrer".

Leia mais: Sem salrios, trabalhadores do RJ vo acampar no Planalto aps impasse com Petrobras3. Garantias dos direitos trabalhistas aos terceirizadosA garantia dos direitos trabalhistas aos terceirizados, especialmente como deve ficar a representao sindical, outro ponto de atrito entre crticos e apoiadores do projeto de lei que regulamenta a terceirizao da mo de obra.

O texto no assegura a filiao dos terceirizados no sindicato de atividade preponderante da empresa, o que, segundo as lideranas sindicais, fragiliza a organizao dos trabalhadores terceirizados.

De acordo com os sindicatos, comum que terceirizados que trabalhem em um mesmo local tenham diferentes patres e sejam representados por setores distintos. Negociaes com o patronato acabam, assim, prejudicadas, apontam.

"Flexibilizar as relaes trabalhistas um erro, sobretudo no momento de crise. Precisamos de um mercado de trabalho forte, uma massa de trabalhadores com bons salrios e com boas condies para que eles possam ser consumidores. O governo vai deixar de arrecadar", conclui Costa.

Outro lado

Na viso dos que apoiam o projeto de lei, a regulamentao dos contratos de prestao de servios de terceiros beneficia os trabalhadores.

Segundo o deputado Arthur Maia (SD-BA), autor do substitutivo da Comisso de Constituio e Justia e de Cidadania para o PL 4.330/04, havia uma "discriminao contra o trabalhador terceirizado".

"No temos uma legislao que discipline a matria. Nosso objetivo regulamentar as relaes de trabalho nesse campo criando uma srie de exigncias para que uma empresa possa funcionar como terceirizada. Isso beneficia o trabalhador pois lhe d a segurana que hoje ele no tem", diz Maia.

O deputado argumenta que os sindicatos so contra a proposta por temer uma "reduo da arrecadao".

"Quando acontecer a legalizao, haver um fracionamento maior da contribuio sindical entre mais sindicatos. A crtica legtima. Temos de reconhecer, porm, que no justo que haja um prejuzo do trabalhador face arrecadao sindical".

Em artigo publicado no jornalFolha de S. Paulo, Paulo Skaf, presidente da Fiesp (Federao das Indstrias do Estado de So Paulo), afirmou que "com a regulamentao do trabalho terceirizado, o Brasil ir se alinhar s mais modernas prticas trabalhistas do mundo".

"Depois de muitos anos de debate, a terceirizao poder, enfim, ser regulamentada no Brasil. Isso acabar com a insegurana jurdica, aumentar a competitividade e certamente vai gerar mais empregos".

Para a CNC (Confederao Nacional do Comrcio de Bens, Servios e Turismo), a regulamentao da terceirizao "condio imprescindvel para que as empresas possam colocar seus produtos no mercado a preo competitivo e, com isso, ajudar o Brasil a sair desta crise indita e de tamanho imprevisvel".

*Colaborou Mariana Schreiber, da BBC Brasil em Braslia