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2020 Mauro Schiavi PROVAS no PROCESSO do TRABALHO 7ª edição Revista, atualizada e ampliada

PROVAS - Editora Juspodivm · 2020. 8. 13. · Segundo José Affonso Dallegrave Neto, o dano existencial, no conceito elaborado por Amaro Almeida Neto, ... Responsabilidade civil

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2020

Mauro Schiavi

PROVAS no PROCESSO do TRABALHO

7ª ediçãoRevista, atualizadae ampliada

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IIIDO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO

PROCESSUAL DO TRABALHO

1. DO CONCEITO DE ÔNUS DA PROVA E SUA APLICABILIDADE NO PROCESSO DO TRABALHO

Não há, na doutrina, uniformidade sobre a definição de ônus da prova. Para alguns, se trata de uma obrigação processual. Já outros defendem que é um encargo da parte de demonstrar os fatos que alega em juízo.

Conforme Nelson Nery Junior1:

“Palavra do latim onus significa carga, fardo, peso, gravame. Não existe obrigação que corresponda ao descumprimento do ônus. O não atendi-mento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa. A produção probatória, o tempo e a forma prescrita em lei, é ônus da condição de parte.”

Na visão de João Batista Lopes2:

“Entende-se por ônus a subordinação de um interesse próprio a outro interesse próprio; obrigação é a subordinação de um interesse próprio a outro, alheio. Exemplos: a lei não impõe o dever ou a obrigação de arrolar testemunhas, requerer perícia ou juntar documentos, mas se a parte deixar de fazê-lo quando necessário, correrá o risco de não ver demonstradas suas alegações. Mas poderá ocorrer que os fatos venham a ser provados em razão de providências tomadas pelo adversário (v. g., o autor alega atos de turbação ou esbulho que acabam por ser demonstrados pelas testemunhas arroladas pelo réu).”

1. Op. cit., p. 614.2. LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 2. ed. São Paulo: RT, 2002. p. 38.

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O ônus da prova, no nosso sentir, é um dever processual que incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo do seu direito, e ao réu quanto aos fatos modificativos, extintos e impeditivos do direito do autor, que, uma vez não realizado, gera uma situação desfavorável à parte que detinha o ônus e favorável à parte contrária, na obtenção da pretensão posta em juízo.

A doutrina costuma classificar o ônus da prova em subjetivo e objetivo. O primeiro (subjetivo) pertine às partes, que têm o ônus de comprovar os fatos que alegam, segundo as regras de distribuição do ônus da prova. O segundo (objetivo) é dirigido ao juiz, pois se reporta ao raciocínio lógico do julgador no ato de decidir, analisando e valorando as provas.

De nossa parte, o ônus da prova no processo somente é dirigido às partes, uma vez que o julgador tem o dever constitucional de julgar e de fundamentar em compasso com os elementos dos autos. Portanto o ônus da prova somente se dirige às partes e não à figura do julgador.

Dispõe o art. 818, da CLT, em sua atual redação (Lei 13.467/17):

“O ônus da prova incumbe:

I – ao reclamante, quanto ao fato constitutivo de seu direito;

II – ao reclamado, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do reclamante.

§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos deste artigo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juízo atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.

§ 2o A decisão referida no § 1o deste artigo deverá ser proferida antes da abertura da instrução e, a requerimento da parte, implicará o adiamento da audiência e possibilitará provar os fatos por qualquer meio em direito admitido.

§ 3o A decisão referida no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.”

A Consolidação das Leis do Trabalho disciplinava a regra de distribuição do ônus no art. 818, que tinha a seguinte redação:

“A prova das alegações incumbe à parte que as fizer.”

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 119

Vários intérpretes se esforçavam para extrair o real alcance do art. 818 da CLT, mas não se chegava a um consenso sobre de quem seria a carga probatória no processo à luz da CLT. Inegavelmente, existiam alguns critérios: a) o ônus da prova no processo do trabalho é do reclamado, pois ele tem melhores condições de produzir a prova no processo; b) o ônus da prova é do reclamante, pois o autor tem a obrigatoriedade de demonstrar em juízo os fatos da inicial; c) tanto o reclamante quanto o empregado devem provar os fatos alegados, tanto na inicial quanto na defesa; d) o reclamante deve provar os fatos constitutivos do seu direito, e o reclamado, os fatos extintivos, modificativos e impeditivos do direito do autor.

A antiga redação do art. 818 da CLT não era completa, e por si só era de difícil interpretação e também aplicabilidade prática, pois, como cada parte tem de comprovar o que alegou, ambas as partes têm o encargo probatório de todos os fatos que declinaram, tanto na inicial quanto na contestação.

Além disso, o art. 818 consolidado não resolvia situações de inexistência de prova no processo, ou de conflito entre as provas produzidas pelas partes. O juiz da atualidade, diante do princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5o, XXXV, da CF), não pode furtar--se a julgar, alegando falta de prova nos autos, ou impossibilidade de saber qual foi a melhor prova. Por isso, a aplicação da regra de ônus da prova como fundamento de decisão é uma necessidade do processo contemporâneo, a prova dividida ou empatada.

A nova redação do art. 818, da CLT incorpora ao processo tra-balhista as disposições do art. 373 do CPC, tanto ao ônus estático (incisos I e II) quanto ao ônus dinâmico (§ 1o).

No Processo do Trabalho, o ônus estático da prova está discipli-nado da seguinte forma:

a) o reclamante tem o ônus de comprovar os fatos constitutivos do seu direito;

b) o reclamado, os fatos modificativos, extintivos e impeditivos do direito do autor.

O TST editou as Súmulas ns. 460 e 461 no sentido da aplicabili-dade da regra de repartição do ônus da prova disciplinada pela nova redação do art. 818, da CLT, conforme segue:

Súmula n. 460: “VALE-TRANSPORTE. ÔNUS DA PROVA. É do empregador o ônus de comprovar que o empregado não satisfaz os

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PROVAS NO PROCESSO DO TRABALHO • Mauro Schiavi 120

requisitos indispensáveis para a concessão do vale-transporte ou não pretenda fazer uso do benefício”.Súmula n. 461: “FGTS. DIFERENÇAS. RECOLHIMENTO. ÔNUS DA PROVA. É do empregador o ônus da prova em relação à regularidade dos depósitos do FGTS, pois o pagamento é fato extintivo do direito do autor” (art. 373, II, do CPC de 2015).”

Os fatos constitutivos são os que geram o direito ao autor, como a prova da prestação pessoal de serviços, do horário em sobrejornada, do nexo causal entre a doença e a função3.

Os fatos impeditivos são os que obstam o direito do autor – por exemplo, tempo de função superior a dois anos na equiparação salarial.

Os fatos modificativos são os que impedem que o pedido do autor seja acolhido, em virtude de modificações ocorridas entre os negócios havidos entre autor e réu – por exemplo: transação, nova-ção, compensação, confusão. É comum, no Processo do Trabalho, o reclamado admitir a prestação pessoal de serviços do autor, mas dizer que tal prestação se deu em modalidade diversa da do contrato de emprego, como o trabalho autônomo, eventual etc.

Os fatos extintivos não tornam improcedente o pedido do au-tor, porque extinto o direito ou a pretensão postos em juízo – como exemplos: prescrição e a decadência.

O ônus da prova, na essência, é uma regra de julgamento. Desse modo, uma vez produzidas as provas, deve o Juiz do Trabalho julgar de acordo com a melhor prova, independentemente da parte que a pro-duziu (princípio da aquisição processual da prova). O juiz só utilizará a regra do ônus da prova quando não houver nos autos provas4, ou, como um critério para desempate, quando houver a chamada prova dividida ou empatada5.

3. Nesse sentido: “Data de admissão do empregado – Ônus da prova. O ônus da prova quanto à real data de admissão é do reclamante, vez que a data lançada na sua CTPS gera presunção relativa em favor do reclamado. Esse é o entendimento que se colhe das Súmulas ns. 225, do STF e 12, do TST, e dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC. Não tendo o reclamante se desincumbido do ônus de provar data diversa daquela cons-tante de sua CTPS, não há outros direitos a serem deferidos.” (TRT 3a R. – 4a T. – RO n. 1208/2005.063.03.00-5 – rel. Luiz Otavio Linhares Renault – DJ 1o.4.06 – p. 17)

4. A Doutrina costuma denominar a ausência de provas nos autos como non liquet.5. Nesse sentido, destacamos as seguintes ementas: “Prova dividida. Apresentando-se a

prova dividida, a decisão deverá pautar-se pela distribuição do ônus da prova, segundo critérios legais ditados pelos arts. 818 da CLT e 333, I e II, do CPC.” (TRT – 9a R. – 4a T. – Ac.

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Nesse sentido, destacamos as seguintes ementas:

“A regra do ônus da prova só tem pertinência como regra de juízo (= regra de decidir), que é, aos casos em que, encerrada a instrução, fique ao julgador a dúvida intransponível acerca da existência de fato constitutivo ou liberatório.” (TJSP-RT n. 706/67)LEI Nº 13.015/14. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DANO EXISTENCIAL. JORNADA DE TRABALHO EXCESSIVA. 1. A prestação de horas extras, por si só, não gera direito à reparação por dano moral existencial. 2. Segundo José Affonso Dallegrave Neto, o dano existencial, no conceito elaborado por Amaro Almeida Neto, corresponde à “violação de qualquer um dos direitos fundamentais da pessoa, tutelados pela Constituição Federal, que causa uma alte-ração danosa no modo de ser do indivíduo ou nas atividades por ele executadas com vistas ao projeto de vida pessoal, prescindido de qual-quer repercussão financeira ou econômica que do fato da lesão possa decorrer” (in: Responsabilidade civil no direito do trabalho, 6ª ed., São Paulo: Ltr, 2017). Além de inviabilizar projetos de vida idealizados pelo empregado, de forma mais concreta, pode-se dizer que o dano existencial também se caracteriza a partir da frustração da fruição dos direitos sociais mínimos, dentre eles o direito ao lazer (que contempla a desconexão do trabalho), à saúde e ao convívio familiar (artigo 6º da Constituição da República). 3. Por decorrer o dano existencial da responsabilidade civil extracontratual, a sua caracterização depende, em regra, da comprovação do preenchimento dos requisitos da culpa aquiliana, a saber: (i) conduta ilícita voluntária, (ii) dano, (iii) nexo de causalidade entre a conduta e o dano e (iv) culpa ou dolo do agente. 4. Assim, tem-se inclinado a jurisprudência desta Corte, ao examinar o pleito de indenização por dano existencial, pela exigência, como

n. 2261/98 – rela Juíza Rosemarie Pimpão – DJPR 30.1.98 – p. 165) Ônus da prova – Art. 818 da CLT e art. 333 do CPC – Violação. 1. As normas legais concernentes à distribuição do ônus da prova são “regras de julgamento”, cuja finalidade é dotar o juiz de um critério para decidir a lide nos casos em que não se produziu a prova, ou a prova revelou-se insuficiente para formar-lhe o convencimento. Destinam-se, enfim, a permitir ao juiz sair de um impasse, já que também não lhe é dado abster-se de compor o conflito de interesses. 2. Daí se segue, a contrario sensu, que é logicamente inconcebível a vulneração do art. 818 da CLT e do art. 333 do CPC sempre que o órgão jurisdicional soluciona o litígio com base nas provas efetivamente produzidas. A violação a esses preceitos legais somente se pode divisar quando, por inexistente ou insuficiente a prova, o juiz, invertendo inadvertidamente a distribuição do ônus da prova, julga a causa em desfavor da parte a quem, segundo a lei, não tocava o ônus de produzir a prova não produzida. 3. Agravo de instrumento não provido.” (TST – 1a T. – AIRR n. 51.165/2002.900.03.00-7 – rel. João Oreste Dalazen – DJ 20.5.05 – p. 883) (RDT n. 06 de Junho de 2005)

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regra, da demonstração da efetiva frustração de um projeto de vida como consequência da conduta ilícita do empregador. 5. Apenas em situações excepcionais e de flagrante violação de direitos sociais mínimos, será possível identificar o dano existencial in re ipsa, ou seja, a partir da simples conduta ilícita do agressor. Em tais casos, em razão da gravidade e intensidade da conduta ilícita do empregador, o dano existencial resulta como mera consequência lógica do ato ilícito, autorizando, assim, a sua presunção. 6. Em relação à caracterização do dano existencial, esta Egrégia Corte tem se manifestado no sentido de que a exigência de jornada de trabalho excessiva, por si só, não caracteriza dano existencial, não sendo possível presumir, em regra, o dano existencial pela simples exigência de prestação de horas extras. 7. No caso dos autos, o Tribunal Regional, a partir das regras de distri-buição do ônus da prova, manteve a sentença que arbitrara a jornada “das 12h as 23h30min (nas 3 primeiras semanas de cada mês) e das 6h30min as 19h (na última semana de cada mês), de segundas-feiras a sábados, e neste último horário, em 2 domingos alternados por mês e em 5 feriados por ano, fruindo apenas 20 minutos de intervalo intra-jornada” (p. 1.159 do eSIJ). Consignou, na oportunidade, que a prova testemunhal produzida pelo reclamante comprovou que a jornada não era integralmente anotada nos cartões de ponto, não tendo a reclamada produzido outras provas para infirmar a jornada descrita na petição inicial. 8.Conforme adverte Mauro Schiavi, “o Juiz só utilizará a regra do ônus da prova quando não houver nos autos provas, ou, como um critério para desempate, quando houver a chamada prova dividida ou empatada” (in Manual de Direito Processual do Trabalho, 3ª ed., São Paulo: Ltr, 2010), julgando em desfavor daquele que tinha o encargo de produzir a prova, nos termos do disposto nos artigos 818 da CLT e 333, I, do CPC de 1973. 9. No caso, conquanto a regra do ônus da prova justifique a condenação da reclamada ao pagamento de horas extras (em virtude de não ter se desincumbido do encargo processual que lhe competia), o mesmo critério não se revela juridicamente apto a fundamentar a condenação da reclamada ao pagamento de indeni-zação por danos existenciais – os quais, conforme aduzido anterior-mente, pressupõem a existência de prova do efetivo dano. Assim, se a jornada arbitrada decorre de presunção, esta não pode ser utilizada como fundamento para outra presunção, relativa à existência de dano existencial. 10. Recurso de Revista conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/14. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SINDICAL. “Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte, concomitan-temente: a) estar assistida por sindicato da categoria profissional; b)

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 123

comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família”. Hipótese de incidência da Súmula n.º 219, item I, do Tribunal Superior do Traba-lho. Constatada, no presente caso, a ausência de assistência sindical, exclui-se da condenação o pagamento da parcela. Recurso de Revista conhecido e provido. TST Processo: RR – 805-03.2013.5.04.0020 Data de Julgamento: 21/02/2018, Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 02/03/2018.

2. O ÔNUS DA PROVA E O FATO NEGATIVO

Quanto ao fato negativo, prevaleceu na doutrina clássica que ele não deve ser objeto da prova.

Atualmente, a moderna doutrina sustenta que o fato negativo pode ser objeto de prova, pois não há na lei processual nada que inviabilize a prova do fato negativo. Além disso, como dizia Chiovenda, quem faz uma negação, na verdade, realiza uma afirmação. De outro lado, ainda que o ônus da prova pertença ao autor, quando o réu nega o fato constitutivo do direito, o réu poderá realizar contraprova no sentido de que o fato não existiu.

Como bem observa Carlos Henrique Bezerra Leite6:

“Na verdade, toda negação contém, implicitamente, uma afirmação, pois quando se atribui a um objeto determinado predicado, acaba-se por negar todos os predicados contrários ou diversos do mesmo objeto. Assim, por exemplo, ao alegar o empregador que não dispen-sou o empregado sem justa causa (negação do fato), estará aquele alegando, implicitamente (afirmação), que este abandonou o emprego ou se demitiu.”

A jurisprudência trabalhista tem fixado entendimento no sentido de que se o empregador nega ter dispensado o empregado, cabe a ele, diante do princípio da continuidade da relação de emprego (Súmula n. 212 do C. TST), provar que o autor tomou a iniciativa de pôr fim ao contrato de trabalho (pedido de demissão ou abandono de emprego).

De outro lado, no caso de inversão do ônus da prova, o fato negativo terá de ser demonstrado pela parte contra a qual o ônus da

6. BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. Curso de direito processual do trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 567.

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PROVAS NO PROCESSO DO TRABALHO • Mauro Schiavi 124

prova fora invertido. Por exemplo, havendo inversão do ônus da pro-va quanto à culpa pelo acidente de trabalho, a reclamada, nesse caso, deverá demonstrar que não agiu com culpa, tomando as diligências necessárias para evitar o acidente.

No aspecto, cumpre destacar a seguinte ementa:

Tanto a doutrina como a jurisprudência superaram a complexa construção do direito antigo acerca da prova dos fatos negativos, razão pela qual a afirmação dogmática de que o fato negativo nunca se prova é inexata, pois há hipóteses em que uma alegação negativa traz, inerente, uma afirmativa que pode ser provada. Desse modo, sempre que for possível provar uma afirmativa ou um fato contrário àquele deduzido pela outra parte, tem-se como superada a alegação de prova negativa, ou impossível (STJ 3. T, Resp 422. 778, Min. Nancy Andrighi, j. 16.6.2007, maioria, DJU 22.8.2007)7.

3. DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO – REQUISITOS

Segundo a regra geral de divisão do ônus da prova, o reclamante deve provar os fatos constitutivos do seu direito e o reclamado, os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor (art. 818 da CLT e 373 do CPC). No entanto há a possibilidade, em determinadas situações, de o juiz inverter esse ônus, ou seja, transferir o encargo probatório que pertencia a uma parte para a parte contrária. Desse modo, se ao autor pertence o ônus da prova do fato constitutivo do seu direito, ele se transfere ao réu, ou seja, o réu deve comprovar a inexistência do fato constitutivo do direito do autor.

A inversão do ônus da prova pode ser convencionada pelas partes ou determinada pelo juiz (art. 373, § 3o, do CPC). O Código de Defesa do Consumidor prevê a chamada inversão judicial do ônus da prova (art. 6o, VIII, da Lei n. 8.078/1990).

A inversão convencional consiste na alteração das regras de distribuição do ônus da prova a cargo das partes. Esta regra, prati-camente, não tem aplicação no Processo do Trabalho, em razão das peculiaridades do Processo do Trabalho e da dificuldade probatória que apresenta o reclamante.

7. In: NEGRÃO, Teotônio. Código de processo civil e legislação processual em vigor. 44. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 464.

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 125

Mesmo no Processo Civil, a regra da distribuição convencional do ônus da prova tem rara aplicabilidade. Como destaca Costa Ma-chado8 “a regra jurídica sob enfoque, de origem italiana, tem quase ou nenhuma aplicação prática entre nós. Trata-se de disposição que faculta às partes a prática de ato dispositivo bilateral (convenção pro-cessual) sobre distribuição do ônus da prova, mas que acabou não se incorporando à mentalidade jurídico-processual de nossos advogados”.

De outro lado, a inversão judicial do ônus da prova está prevista no art. 6o, VIII, da Lei n. 8.078/1990, que assim dispõe:

“São direitos básicos do consumidor: (...) VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordi-nárias de experiências.”

Segundo Cândido Rangel Dinamarco9 “inversão judicial do ônus da prova é a alteração do disposto em regras legais responsáveis pela distribuição deste, por decisão do juiz no momento de proferir a sentença de mérito”.

Autores há que se mostram refratários à aplicação da teoria da inversão judicial do ônus da prova disciplinada no Código de Defe-sa do Consumidor, argumentando que ela é restrita às relações de consumo e que, no processo do trabalho, a própria lei processual e a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, considerando-se as peculiaridades da relação de emprego, já estabelecem uma série de presunções favoráveis ao trabalhador.

Nesse sentido defende Marcelo Moura10:

“Não obstante o processo do trabalho também trate de tentar dimi-nuir as desigualdades processuais entre os litigantes, não vejo lugar para aplicação de regra especial que cuida de relações de consumo, como a do art. 6o, VIII, do CDC. A solução mais consentânea com a realidade trabalhista foi proposta, a nosso ver, por Cleber Lúcio de Almeida, Direito Processual, 2009, p. 583-584. O autor defende que o

8. MACHADO, Costa. Código de Processo Civil interpretado e anotado. São Paulo: Manole, 2006. p. 716.

9. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. III, p. 79.

10. Consolidação das Leis do Trabalho. 3. ed. Salvador: Juspodivm, 2013. p. 967.

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PROVAS NO PROCESSO DO TRABALHO • Mauro Schiavi 126

Juiz do Trabalho deve estabelecer presunções favoráveis ao emprega-do, fundadas nos princípios do direito do trabalho, na exigência de pré-constituição da prova e em regras de experiência; além disso, deve o juiz conceder especial valor à prova favorável ao trabalhador, que se sustenta no princípio de que basta a prova do início do fato que gera seu direito para que o juiz entenda superado o encargo probatório.”

Outros autores são plenamente favoráveis à aplicação da inversão judicial do ônus da prova ao trabalho, argumentando a similitude de situações processuais em que se encontram o consumidor e o traba-lhador, havendo plena sintonia principiológica entre o art. 6o, VIII do CDC e o processo do trabalho (art. 769, da CLT).

Nesse sentido, sustenta Carlos Henrique Bezerra Leite11:

“Ora, é exatamente o requisito da hipossuficiência (geralmente econômica) do empregado perante seu empregador que autoriza o juiz do trabalho a adotar a inversão do onus probandi. Atualmente, parece-nos não haver mais dúvida sobre o cabimento da inversão do ônus da prova nos domínios do direito processual do trabalho, não apenas pela aplicação analógica do art. 6o, VIII, do CDC, mas também pela autorização contida no art. 852-D da CLT.”

No mesmo sentido, a visão de Carlos Alberto Reis de Paula12:

“O que se extrai de relevo nessa sucinta apreciação do Código é que a inversão do ônus da prova é um dos caminhos de facilitação da defesa do consumidor, que se impõe por força da lei ante a sua situação de inferioridade em relação ao fornecedor, e que a inversão do ônus da prova dá-se quando o fornecedor dispõe da prova de forma mais fácil que o consumidor. A inversão do ônus da prova está consagrada legalmente, sendo explicitado o critério para sua aplicação. O interesse para o direito processual do trabalho está em que tem-se uma previsão legal, que pode ser invocada subsidiariamente pelo juiz, valendo a orientação seguida pelo legislador como uma referência relevante, a indicar critério para sua invocação, o que é perfeitamente factível se considerarmos, como sublinhado, a situação próxima entre o consu-midor e o trabalhador.”

11. Curso de Direito Processual do Trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 667.12. A especificidade do ônus da prova no processo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2010.

p. 129-130.

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 127

No Processo do Trabalho tem grande pertinência a regra da inver-são do ônus da prova, pois, muitas vezes, o estado de hipossuficiência do empregado reclamante o impede de produzir comprovação de suas alegações em juízo, ou esta prova se torna excessivamente onerosa, podendo inviabilizar a efetividade do próprio direito postulado.

Desse modo, aplica-se perfeitamente ao processo do trabalho a regra de inversão do ônus da prova constante do Código de Defesa do Consumidor, em razão da omissão da CLT e compatibilidade com os princípios que regem o processo do trabalho (art. 769 da CLT), máxime o princípio do acesso à justiça do trabalhador.

Vem crescendo corpo, na Justiça do Trabalho, o entendimento da inversão do ônus da prova em favor do trabalhador nas ações aci-dentárias em que o empregado postula reparação de danos materiais e morais, em razão da grande dificuldade de produção da prova da culpa do empregador por parte do empregado e da melhor aptidão para a produção da prova pelo empregador. Além disso, cumpre ao empregador zelar pela saúde do trabalho e pelas reduções dos riscos do meio ambiente de trabalho (art. 7o, XXII, da CF).

Neste sentido, temos o Enunciado n. 41 da 1a Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho realizada pelo TST, in verbis:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. ÔNUS DA PROVA. Cabe a inversão do ônus da prova em favor da vítima nas ações indenizatórias por acidente do trabalho.”

No mesmo diapasão, a seguinte ementa:

Indenização por dano moral – Responsabilidade do empregador – Teoria do risco. O reclamado, considerado empregador na acepção do caput do art. 2o da CLT, está inserido no contexto do capitalismo como um ente destinado à obtenção do lucro, por isso que, no âmbito do Direito do Trabalho, ele se arroga do poder diretivo, assumindo amplamente os riscos sociais de sua atividade econômica, e se investe da obrigação de garantir a segurança, bem como a integridade física e psíquica dos seus empregados, durante a prestação de serviços. Ao explorar determinado ramo de atividade econômica, o empregador é responsável pelos danos físicos sofridos pelo empregado no exercício de suas atividades laborativas. Competia ao empregador a adoção de medidas simples ou complexas que minimizassem o risco e pro-movessem melhores condições de segurança no trabalho. A falta do empregador decorre de sua omissão voluntária e sobre ela recai a culpa

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in vigilando, estabelecido o nexo causal entre o seu comportamento e o dano. Devida, portanto, a indenização por dano moral. (TRT 3a R. – 4a T. – RO n. 493/2005.048.03.00-4 – Rel. Luiz Otávio L. Renault – DJMG 4.6.05 – p. 11) (RDT n. 7 – jun. 2005).

Conforme o citado art. 6o, VIII, da Lei n. 8.078/1990, são re-quisitos para a inversão do ônus da prova no processo do trabalho: faculdade do juiz e os requisitos alternativos da hipossuficiência ou verossimilhança da alegação.

a) faculdade do juiz13: a inversão do ônus da prova é faculdade do juiz que pode ser levada a efeito de ofício, independen-temente de requerimento das partes. Segundo a melhor doutrina, só haverá a necessidade de inversão do ônus da prova se não houver provas nos autos, ou seja, as partes não se desincumbiram do encargo probatório que lhes competia (non liquet).

Como bem adverte Nelson Nery Junior14: “caso as partes tenham se desincumbido do ônus da prova, não haverá o non liquet e o juiz, portanto, julgará de acordo com as provas e o seu livre convencimento (CPC 131)”.

b) hipossuficiência do reclamante: a hipossuficiência não é ne-cessariamente a econômica, mas a dificuldade excessiva de se produzir a prova.

Neste aspecto, destaca Nelson Nery Junior15:

“A hipossuficiência respeita tanto a dificuldade econômica quanto a técnica do consumidor em poder desincumbir-se do ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito.”

13. Na doutrina autores que sustentam que, presentes os requisitos, a inversão judicial do ônus da prova, desde que presentes os requisitos legais, é direito da parte e não facul-dade do Juiz. Nesse sentido, defende Júlio César Bebber: “(...) O sistema processual, salvo por (escorregadela) do legislador, não estabelece faculdades ao juiz que, como sujeito do processo, tem por situações ativas e passivas apenas poderes e deveres. Não há, portanto, discricionariedade. Não é lícito ao juiz dizer que há verossimilhança ou que reconhece a hipossuficiência, mas que, mesmo assim, não irá inverter o ônus da prova (op. cit., p. 308)”.

14. NERY JUNIOR, Nelson et al. Código Civil comentado e legislação extravagante. São Paulo: RT, 2005. p. 957.

15. Op. cit., p. 967.

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 129

c) verossimilhança da alegação: a alegação verossímil é a que tem aparência de verdade. Na avaliação da verossimilhança, deve o juiz sopesar se há mais motivos para crer do que para não crer na veracidade da afirmação do autor. Também o juiz do Trabalho se pautará pelas regras de experiência do que or-dinariamente acontece, nos termos do art. 375 do CPC, que assim dispõe:

O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.

No aspecto, relevante destacar a seguinte ementa:

Empregado vigilante – Intervalo para refeição e descanso – Ônus da prova. O cotidiano dos pretórios trabalhistas tem demonstrado que o empregado vigilante dificilmente usufrui de intervalos regulares para refeição e descanso. E isto se dá porque, via de regra, não há outro laborista apto a substituí-lo em tais interregnos, fazendo com que a alimentação se proceda assim no próprio posto de trabalho, dada a impossibilidade de interrupção do serviço. É o que ordinariamente acontece. Consequentemente, pertence ao empregador o ônus de demonstrar a efetiva fruição do intervalo, visto que o ordinário se presume, e o extraordinário se prova. Exegese dos art. 335 do CPC e 818 da CLT. Recurso patronal desprovido. (TRT – 15a R. – 2a T. – Ac. n. 26630/97 – Rel. Manoel Carlos Toledo Filho – DJSP 15.9.97 – p. 83).

3.1. Do momento da inversão do ônus da prova no processo do trabalho

Discute-se na doutrina e jurisprudência qual o momento em que o ônus da prova deva ser invertido pelo juiz. A lei não disciplina essa questão. Entretanto, acreditamos, a fim de resguardar o contraditó-rio e a ampla defesa (art. 5o, LV, da CF), que a inversão do ônus da prova deve ser levada a efeito pelo juiz do Trabalho antes do início da audiência de instrução, em decisão fundamentada (art. 93, IX, da CF), para que a parte contra a qual o ônus da prova foi invertido não seja pega de surpresa e produza as provas que entender pertinentes, durante o momento processual oportuno.

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No mesmo sentido é a visão de César P. S. Machado Jr.16:

“A colheita das provas trabalhistas é feita na audiência e este é o local e momento ideal para o juiz verificar a existência de qualquer circuns-tância que leva à inversão do ônus probatório, razão pela qual deverá manifestar-se a respeito nesta oportunidade, de forma expressa, na forma do art. 93, IX, da CF.”

Destacamos, no aspecto, a seguinte ementa:

Considerando que as partes não podem ser surpreendidas, ao final, com um provimento desfavorável decorrente da inexistência ou da insuficiência da prova que, por força da inversão determinada na sentença, estaria a seu cargo, parece mais justa e condizente com as garantias do devido processo legal a orientação segundo a qual o juiz deve, ao avaliar a necessidade de provas e deferir a produção daquelas que entenda pertinentes, explicar quais serão objeto de inversão. (TJSP, 6a Câm. Ag 108602-4/0-SP, rel. Des. Antonio Carlos Marcato, v. u., j. 18.3.1999, Bol AASP n. 2.123/225-e).

Não obstante, como o ônus da prova, além de ser regra de instru-ção processual, é uma regra de julgamento, é possível o juiz inverter o ônus da prova na própria sentença, ou até mesmo o Tribunal fazê-lo segundo o seu livre convencimento, mas tanto numa hipótese como na outra, sempre em decisão devidamente fundamentada.

Neste sentido é a visão de Cândido Rangel Dinamarco17:

“O momento adequado à inversão do ônus da prova é aquele em que o juiz decide a causa (Barbosa Moreira). Antes, sequer ele sabe se a prova será suficiente ou se será necessário valer-se das regras ordinárias sobre esse ônus, que para ele só são relevantes em caso de insuficiência probatória.”

De outro lado, no nosso sentir, não é possível inverter o ônus e não propiciar à parte a quem este foi invertido o direito de pro-duzir a prova. Por isso, devem as partes estar atentas à produção de suas provas. Se o juiz indeferir a produção de alguma prova

16. MACHADO JR., César P. S. O ônus da prova no processo do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 156.

17. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001. v. III, p. 81. No mesmo sentido, João Batista Lopes (Op. cit., p. 51).

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 131

por entender que o ônus seria da parte contrária, deve a parte re-querer que o juiz consigne seus protestos em ata a fim de evitar a preclusão. Sob outro enfoque, se o juiz do Trabalho, ao instruir o processo, não estiver convencido da distribuição do ônus da prova, deve propiciar às partes igualdade de oportunidades na produção da prova, deixando a fixação da regra de distribuição do ônus da prova para a decisão final.

O atual Código de Processo Civil e a CLT, recentemente alterada, seguindo posição majoritária da doutrina e da jurisprudência, nos arts. 373, § 1o, e 818 § 2o asseguram à parte contra quem o ônus da prova fora fixado de forma diversa do convencional, o direito de desincum-bir do ônus que lhe foi atribuído. Desse modo, a tendência será no sentido de que a inversão do ônus da prova seja realizada antes da instrução processual.

Nesse sentido, destaca-se a opinião de João Humberto Cesário18:

“Não há como negar que a distribuição do ônus da prova possui dúplice escopo. Ao mesmo tempo em que é uma regra de instrução, sendo, pois um indicativo aos litigantes quanto às provas que devam produzir, é também um sistema de julgamento, servindo como ferramenta para que o magistrado decida, principalmente naqueles contextos em que não houve prova convincente. Mas a grande questão a ser respondida, como já enfatizado, é a do momento processual em que o juiz deverá se pronunciar sobre o tema. O CPC/73 não obrigava o julgador a orientar previamente os litigantes quanto às provas que pesavam sobre os seus ombros. Tanto é assim, que o art. 451 do CPC/73 se limitava a dizer que, ao iniciar a instrução, o magistrado, ouvidas as partes, deveria apenas fixar os pontos controvertidos sobre os quais a prova incidiria. Tal assertiva, natu-ralmente, se devia ao fato de que o CPC/1973 somente trabalhava com a perspectiva distribuição estática do ônus da prova, sendo de se esperar que a parte assistida por advogado soubesse da prova que por imposição legal estava obrigada a dar. Mesmo àquele tempo, a questão no nosso ponto de vista já era um tanto mais complexa, merecendo assim tratamento cuidadoso, vez que não é de hoje que a distribuição dinâmica vem se sobrepondo à repartição estática do encargo probatório. Já pensávamos desde então, que principalmente quando o juiz tomasse a iniciativa de inverter o ônus da prova, de-veria alertar as parte no ato da audiência, inclusive fundamentando,

18. Provas no Processo do Trabalho: de acordo com o novo Código de Processo Civil. Cuiabá: Instituto JHC, 2015. p. 148-149.

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ainda que de modo conciso, o seu ponto de vista (art. 93, IX, da CRFB), de modo a eticamente prestigiar o mais amplo direito de defesa dos contendores”.

Caso o Juiz do Trabalho inverta o ônus da prova por ocasião do julgamento, e a parte contra quem o ônus fora invertido não tiver produzido a prova, deverá converter o julgamento em diligência para que a parte tenha possa produzir a prova.

Diante do exposto, conclui-se:a) a inversão do ônus da prova é uma regra de julgamento;b) a inversão do ônus da prova deve ser realizada, preferencial-

mente, antes da audiência de instrução e julgamento, mas também poderá ser realizada, excepcionalmente, no momento da sentença.

4. A MODERNA TEORIA DA CARGA DINÂMICA DO ÔNUS DA PROVA NO PROCESSO DO TRABALHO

Diante da necessidade de se dar efetividade ao acesso à ordem jurídica justa e não inviabilizar a tutela do direito à parte que tem razão, mas não apresentar condições favoráveis de produzir a prova do fato constitutivo do seu direito, é possível ao juiz do Trabalho atribuir o encargo probatório à parte que tem melhores condições de produzir a prova. É o que a doutrina tem denominado de carga dinâmica na produção do ônus da prova.

Como nos traz Luiz Eduardo Boaventura Pacífico19:

“O grande mérito do pioneiro estudo sobre o ônus dinâmico das provas, dos juristas argentinos Jorge W. Peryrano e Julio O. Chiappini, no ano de 1976, foi o de revelar essa orientação jurisprudencial e sintetizar o princípio que acaba sendo rotineiramente utilizado em tais proce-dentes: o ônus da prova deve recair sobre a parte que se encontre em melhores condições profissionais, técnicas ou fáticas para produzir a prova do fato controvertido.”

No processo do trabalho, diante da necessidade de se dar efetividade ao acesso à ordem jurídica justa e não inviabilizar a tutela do direito à parte que tem razão, mas não apresentar condições favoráveis de

19. O ônus da prova. 2. ed. São Paulo: RT, 2011. p. 222-223.

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 133

produzir a prova do fato constitutivo do seu direito, é possível ao juiz do Trabalho atribuir o encargo probatório à parte que tem melhores condições de produzir a prova, aplicando a teoria do ônus dinâmico da prova. O juiz do Trabalho, como reitor do processo (art. 765 da CLT), deve ter a sensibilidade, à luz das circunstâncias do caso concreto, de atribuir o encargo probatório ao litigante que possa desempenhá-lo com maior facilidade.

Parte da doutrina e jurisprudência são refratárias à admissão da presente teoria ao processo civil brasileiro, argumentando que ela ma-jora de forma excessiva os poderes do juiz na condução do processo, surpreende as partes no processo, causando insegurança jurídica e dificultando o contraditório.

Não obstante as ponderações acima, pensamos em sentido diverso, uma vez que, conforme já mencionado, a tendência do processo civil contemporâneo sinaliza na majoração dos poderes do juiz na instrução do processo. De outro lado, diante dos princípios de cooperação e boa-fé objetiva das partes, estas devem produzir as provas necessárias à descoberta da verdade. Além disso, os referidos princípios constitu-cionais da isonomia real, da livre convicção do magistrado e do acesso real à justiça impõem ao magistrado posturas destinadas a assegurar o equilíbrio do processo, bem como na produção da prova.

No mesmo sentido, Luiz Guilherme Marinoni20:

“Se o juiz não tem apenas a função de resolver litígios, porém a de zelar pela idoneidade da prestação jurisdicional, sem poder re-signar-se a aplicar a técnica processual que possa conduzir a uma tutela jurisdicional inefetiva, é certo dizer que o seu dever não se resume a uma mera resposta jurisdicional, pois exige a prestação de uma tutela jurisdicional efetiva. Ou seja, o dever do juiz, assim como o do legislador ao instituir a técnica processual adequada, está ligado ao direito fundamental à efetividade da tutela jurisdicional, compreendido como um direito necessário para que se dê proteção a todos os outros direitos. (...) O jurisdicionado não é obrigado a se contentar com um procedimento inidôneo à tutela jurisdicional efetiva, pois o seu direito não se resume à possibilidade de acesso ao procedimento legalmente instituído. Com efeito, o direito à tutela jurisdicional não pode restar limitado ao direito de igual acesso ao procedimento estabelecido, ou ao conteúdo tradicional de direito de acesso à justiça. Não importa apenas dizer que todos

20. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. 3. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 145.

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devem ter iguais oportunidades de acesso aos procedimentos e aos advogados, e, assim, à efetiva possibilidade de argumentação e produção de prova.”

De outro lado, a moderna doutrina tem sustentado que o ônus da prova, além de ser regra de julgamento, é também uma regra de instrução processual, devendo o juiz, antes de realizar os atos instru-tórios, analisar as teses da inicial e da defesa, bem como os fatos e as circunstâncias do processo, e fixar o ônus da prova à parte que esteja em melhores condições de produzi-la.

Nesse sentido, destaca Daniel Mitidiero21:

“(...) ao lado da caracterização clássica do ônus da prova como regra de julgamento, cujo objetivo central está no evitar-se o arbítrio no processo, tem ganhado renovado fôlego a caracterização do ônus da prova como regra de instrução, o que se leva a efeito com o fito declarado de forrar-se o processo com todos os elementos necessários à formação da convicção judicial. Dupla função, portanto, que se acomete ao ônus da prova no processo civil cooperativo. Partindo-se dessa última perspectiva, e com o fito de bem atender-se a deter-minadas situações da vida no processo, a doutrina tem aludido à possibilidade de dinamizar o ônus da prova, fundamentando a partir do caso concreto a repartição do encargo probatório. Esse expediente, embora perigosíssimo quando manejado de maneira inadequada, encontra-se em total consonância com a ideia de processo civil pau-tado em colaboração, pressuposto para sua aplicação um modelo de processo civil cooperativo. Seu fundamento está na necessidade de velar-se por uma efetiva igualdade entre as partes no processo e por uma escorreita observação dos deveres de cooperação nos domínios do direito processual civil, notadamente do dever de auxílio do órgão jurisdicional para com as partes.”

Trata-se de faculdade conferida ao juiz do Trabalho que deve ser exercida com equilíbrio, ponderação e razoabilidade, considerando-se as peculiaridades do caso concreto, o princípio do acesso real ou substancial à justiça, bem como a efetividade da prova no processo do trabalho.

21. Colaboração no Processo Civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos. 2. ed. São Paulo: RT, 2011. p. 140-142.

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 135

Trata-se, inegavelmente, de uma tendência mundial do processo de majoração dos poderes do juiz na direção do processo, a fim de que os litigantes sejam tratados com isonomia real e a justiça seja implementada com maior efetividade. Não se trata de arbítrio do juiz, pois este terá que justificar, com argumentos jurídicos, sob crivo do contraditório, diante das circunstâncias do caso concreto, a aplicação da carga dinâmica da produção da prova.

Como bem destacou João Humberto Cesário22:

“É fundamental saber que relativamente à distribuição do ônus da prova a legislação de regência traça tão somente diretrizes gerais para a orientação básica dos atores processuais. Assim é que a atenuação dessas diretivas, fundada no princípio da aptidão para a prova, tem a cada dia ganhado destaque no foro trabalhista. Dito de outro modo, enquanto os art. 818 da CLT e 333 do CPC disciplinam a distribuição estática do encargo probatório, a práxis forense preconiza a repartição dinâmica do encargo probatório, para que por via dela se evitem julga-mentos injustos, nos quais uma parte, não obstante possuir razão em uma contenda, veja inviabilizada a obtenção do bem da vida perseguido judicialmente, em virtude da impossibilidade de produzir uma prova para ela difícil, improvável ou mesmo impossível (probatio diabolica), enquanto a contraprova do seu adversário seria de tranquila veiculação.”

A presente teoria não se confunde com a inversão do ônus da prova, embora com ela tenha contatos, pois a inversão pressupõe a presença dos critérios previstos em lei, enquanto a carga dinâmica pressupõe circunstâncias e peculiaridades do caso concreto. De outro lado, a carga dinâmica se assenta no princípio da aptidão para a prova, não necessitando da presença de verossimilhança da alegação do autor.

Como destacou Eduardo Cambi23:

“(...) não há na distribuição dinâmica do ônus da prova uma inver-são nos moldes previstos no art. 6o, inc. VIII do CDC, porque só se poderia falar em inversão caso o ônus fosse estabelecido prévia e abstratamente. Não é o que acontece com a técnica de distribuição dinâmica, quando o magistrado, avaliando as peculiaridades do caso concreto, com base em máximas de experiência (art. 335 do CPC), irá determinar quais fatos devem ser provados pelo demandante e pelo demandado.”

22. Provas e recursos no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2010. p. 46-47.23. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: RT, 2006. p. 341.

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PROVAS NO PROCESSO DO TRABALHO • Mauro Schiavi 136

A Lei n. 13.467/17 deu nova redação ao art. 818, da CLT, discipli-nado o ônus dinâmico da prova, à semelhança do Código de Processo Civil24. Com efeito, dispõe o referido dispositivo legal:

“O ônus da prova incumbe: (...) § 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos deste artigo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juízo atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. § 2o A decisão referida no § 1o deste artigo deverá ser proferida antes da abertura da instrução e, a requerimento da parte, implicará o adia-mento da audiência e possibilitará provar os fatos por qualquer meio em direito admitido. § 3o A decisão referida no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.” (NR)

Diante do referido dispositivo legal, o ônus dinâmico da prova (ou teoria da carga dinâmica), pode ser aplicada quando:

a) nos casos previstos em lei;b) impossibilidade da produção da prova pela parte que detém

o ônus, ou;c) excessiva dificuldade probatória da parte que detém o ônus

da prova; oud) maior facilidade de produção da prova pela parte que não

detém o ônus da prova.Alguns autores entendem que, embora o texto legal tenha destacado

quatro hipóteses alternativas para fixação do ônus dinâmico probatório, na verdade, exceto quando previsto em lei, a melhor interpretação sinaliza no sentido de os requisitos serem cumulativos. Desse modo,

24. O atual Código de Processo Civil consagra a regra do ônus dinâmico da prova no art. 373, §§ 1o e 2o, in verbis: “§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encar-go nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. § 2o A decisão prevista no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessi-vamente difícil.”

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Cap. III • DO ÔNUS DA PROVA NO DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO 137

o juiz somente poderia aplicar o presente dispositivo quando: houver impossibilidade ou excessiva dificuldade probatória da parte que detém o ônus da prova, e a maior facilidade de produção da prova pela parte que não detém o ônus da prova.

De nossa parte, o texto legal faculta a aplicação da teoria dinâmica do ônus da prova nas quatro hipóteses alternativas que a lei destaca, mas o Juiz deve analisar com muita cautela e ponderar a situação con-creta, para não onerar em demasia uma das partes e evitar que a parte a quem o ônus fora atribuído ficar em situação de impossibilidade ou excessiva dificuldade de produzir a prova.

No processo do trabalho, o Juiz, ao sanear o processo na própria audiência, ou em outro momento processual, deve fundamentar a aplicação do ônus dinâmico da prova. Ao avaliar a aplicação do ônus dinâmico da prova, o magistrado deve analisar detidamente a inicial, a defesa, e as provas que já constam dos autos, bem como os indícios já existentes nos autos em favor da parte que pretende a aplicação (prova prima facie).

Caso entenda pela aplicação do ônus dinâmico da prova, deverá o magistrado proferir a decisão antes da abertura da instrução proces-sual e, a requerimento da parte, implicará o adiamento da audiência e possibilitará provar os fatos por qualquer meio em direito admitido, visando assegurar o contraditório e ampla defesa. Não obstante, ao avaliar o adiamento, deverá o magistrado valorar sua necessidade no caso concreto.

Como bem advertem Jorge Luiz Souto Maior e Valdete Severo25:

“Do mesmo modo, o § 2o desse dispositivo deve ser aplicado em consonância com o poder geral de condução do processo pelo juiz, que, portanto, definirá a necessidade de adiamento da audiência e, ao possibilitar a prova dos fatos terá que atentar para o que for admitido pelo direito. Se o direito impede a prova por meio de testemunhas (art. 443 do CPC), não poderá o juiz admiti-la. Tem-se, portanto, uma chance importante para o cancelamento da imprópria Súmula n. 338 do TST e, enfim, o reconhecimento da importância dos deveres de prova que gravam a figura jurídica do empregador”.

25. O acesso à justiça sob a mira da reforma trabalhista – ou como garantir o acesso à justiça diante da reforma trabalhista. Disponível em: <http://www.jorgesoutomaior.com/blog>. Acesso em: 28 jul. 2017.

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