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Universidade Federal do Rio de Janeiro Depois, o golpe: as eleições de 1962 no Clube Militar Rachel Motta Cardoso 2008

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Universidade Federal do Rio de Janeiro

Depois, o golpe: as eleições de 1962 no Clube Militar

Rachel Motta Cardoso

2008

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Universidade Federal do Rio de Janeiro Instituto de Filosofia e Ciências Sociais Programa de Pós-Graduação em História Social Orientador: Prof. Dr. Renato Luís do Couto Neto e Lemos Aluna: Rachel Motta Cardoso DRE: 106108433

Depois, o golpe: as eleições de 1962 no Clube Militar

Rachel Motta Cardoso

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em História Social, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em História Social. Orientador: Prof. Dr. Renato Luís do Couto Neto e Lemos

Rio de Janeiro Maio/2008

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Depois, o golpe: as eleições de 1962 no Clube Militar

Rachel Motta Cardoso

Prof. Dr. Renato Luís do Couto Neto e Lemos

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em

História Social, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal

do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do

título de Mestre em História Social.

Aprovada por:

_______________________________

Presidente, Prof. Dr. Renato Luís do Couto Neto e Lemos

_______________________________

Prof. Dr. Marcos Bretas

_______________________________

Prof. Dr. Paulo Rodrigues Cunha

Rio de Janeiro

Maio / 2008

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Cardoso, Rachel Motta. Depois, o golpe: as eleições de 1962 no Clube Militar/ Rachel Motta Cardoso. - Rio de Janeiro: UFRJ/ IFCS, 2008. vi, 172 f. Orientador: Renato Luís do Couto Neto e Lemos Dissertação (mestrado) – UFRJ/ IFCS/ Programa de Pós-Graduação em História Social, 2008. Referências Bibliográficas: f.168-171. 1. Partidos Militares. 2. Clube Militar. 3. Crise da Legalidade. 4 Militares e Política. I. Lemos, Renato Luís do Couto Neto e. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais / Programa de Pós-Graduação em História Social. III. Título.

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RESUMO

Depois, o golpe: as eleições de 1962 no Clube Militar

Rachel Motta Cardoso

Orientador: Prof. Dr. Renato Luís do Couto Neto e Lemos

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação

em História Social, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade Federal do

Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de

Mestre em História Social.

Trataremos aqui da questão das eleições de 1962 no Clube Militar, à luz do

conceito de “partidos militares”. Procurou-se demonstrar o aspecto fraudulento deste

pleito, traçando-se um perfil das duas chapas concorrentes. O caráter metodológico e a

aplicação do conceito elaborado por Alain Rouquié e Antonio Carlos Peixoto para o

estudo e entendimento de correntes militares no seio das Forças Armadas e como essas

se relacionavam com a vida política nacional, consideramos como um ponto inovador

no estudo da relação entre os militares e a política. Assim, procuramos ressaltar as

características de cada corrente, as disputas no meio militar e suas estratégias de ação no

campo civil. Adotamos como base para pesquisa o acervo do líder da chapa derrotada, o

General Pery Bevilaqua.

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ABSTRACT

Later, the blow: the elections of 1962 in the Military Club

Rachel Motta Cardoso

Orientador: Prof. Dr. Renato Luís do Couto Neto e Lemos

Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-

graduação em História Social, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da Universidade

Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do

título de Mestre em História Social.

We will deal here with the question of the elections of 1962 in the Military

Club, to the light of the concept of “military parties”. It was looked to demonstrate the

fraudulent aspect of this lawsuit, tracing itself a profile of two competing plates. The

methodological character and the application of the concept elaborated by Alain

Rouquié and Antonio Carlos Peixoto for the study and military chain agreement in the

center of the Armed Forces and as they are related with the life national politics,

consider as an innovative point in the study of the relation between the military and the

politics. Thus, we look for to stand out the characteristics of each chain, the disputes in

the military way and its strategies of action in the civil field. We adopt as base for

research the quantity of the leader of the defeated plate, General Pery Bevilaqua.

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Índice

1. Introdução 8

2. Capítulo 1 34

3. Capítulo 2 63

4. Capítulo 3 97

5. Capítulo 4 115

6. Conclusão 135

7. Anexos 139

7.1. Anexo 1: AO cp 59.05.14-03 140

7.2. Anexo 2: Membros da chapa União 142

7.3. Anexo 3: Membros da chapa Confraternização 146

7.4. Anexo 4: Oficiais que trabalharam pela chapa União 149

7.5 Anexo 5: Relação de postos ocupados por militares nos governos

republicanos 152

7.6 Anexo 6: Histórico de membros da chapa União 158

8. Bibliografia 168

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Introdução

Esta dissertação tem como objeto as eleições realizadas no Clube Militar

(CM) no ano de 1962. O trabalho aqui desenvolvido está relacionado com esta temática

e voltado para o período da Crise da Legalidade (agosto/setembro de 1961) e seu reflexo

no contexto político nacional. Nele, destacamos a ação de um grupo que constitui uma

das correntes candidatas à diretoria do Clube em 1962: “nacionalistas”. Para tratar isto,

trabalharemos com as eleições do Clube Militar em 1962, quando o grupo

antinacionalista, representado pela Cruzada Democrática, sai vitorioso. Este

acontecimento é entendido como aspecto de grande relevância para a criação das

condições políticas que favoreceram o golpe em 1964.

As origens deste movimento nacionalista em fins dos anos 1940 e a disputa

nas eleições do Clube Militar no mesmo período também não devem ser esquecidas, de

forma a deixar claro o confronto entre as alas nacionalista e antinacionalista1 — também

chamada de “entreguista” ou “golpista”, como sugerem Rouquié2 e Nelson Werneck

Sodré3.

O Clube Militar é definido da seguinte forma:

“Associação civil, com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro, fundada em 26 de junho de 1887. Tem como principais objetivos ‘estreitar os laços de união e solidariedade entre os oficiais das forças armadas’, ‘depois os interesses dos sócios e pugnar por medidas acauteladoras dos seus direitos’ e ‘incentivar as manifestações cívicas e patrióticas e interessar-se pelas questões que firam ou possam ferir a honra nacional e militar’.” (p.1383)4.

1 Esclareceremos a respeito do uso destes termos em trecho posterior desta introdução. 2 ROUQUIÉ, Alain (org.). Os Partidos Militares no Brasil. Rio de Janeiro: Record, s/d. 3 SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965. 4 LAMARÃO, Sérgio. “Cruzada Democrática”. In: ABREU, Alzira Alves de; et al (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. rev. e atualiz. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume II, pp. 1383-1389.

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Embora a cada arma corresponda um clube, o Clube Militar abriga oficiais do

Exército, Marinha e Aeronáutica. Além disso, conta com uma publicação mensal, a

Revista do Clube Militar, que é seu órgão oficial desde 1926 5.

Como abordaremos a atuação de grupos que têm o nacionalismo como

ideologia, trataremos do período em que o tema começa a ser debatido. Logo, o

histórico do Clube Militar se limitará a este período relacionado com o surgimento das

correntes voltadas para a discussão em torno do nacionalismo.

Quando o debate em torno da questão do petróleo se inicia, no final dos anos

1940, no Clube Militar, este começa a dar sinais da sua importância no cenário político

nacional e como local de debate de correntes políticas distintas oriundas tanto do meio

militar quanto do civil. Temos a presença destes grupos que, uns, defendem o

monopólio da extração do petróleo pelo Estado e, outros, apóiam a ajuda de recursos

financeiros externos e a atividade de empresas estrangeiras para o desenvolvimento da

extração deste recurso natural. O Clube é visto como um

“elemento privilegiado de ligação entre a sociedade política

e a instituição militar, porquanto refletiu a opinião das diferentes correntes militares sobre os problemas da atualidade política e da instituição militar. As eleições para a diretoria do Clube, por sua vez, permitiriam conhecer o estado dessa opinião e medir a influência dessas correntes.” 6

As eleições para o Clube Militar começam a apresentar as divisões presentes

no corpo das Forças Armadas (FFAA) e as disputas no meio civil. Para Peixoto,

“O Clube Militar viveu todas as vicissitudes da vida política brasileira daquela época. Sua história é igualmente a história do debate político que se desenrolou no Brasil e também dos acordos concluídos entre as correntes militares e os grupos civis.” 7

5 LAMARÃO, op. cit., cf. p. 1383. 6 PEIXOTO, Antonio Carlos. “O Clube Militar e os confrontos no seio das Forças Armadas (1945-1964)”. In: ROUQUIÉ, Alain (org.). Os Partidos Militares no Brasil. Rio de Janeiro: Record, s/d, p.78. 7 Id., p.74.

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Foi a necessidade de debate político e de uma manifestação mais livre que

impôs ao Clube Militar um novo papel, transformando-o em “centro ativo de

formulação e de discussão de opções políticas” 8.

As conferências pronunciadas no Clube Militar, entre 1947 e 1948, a respeito

do petróleo, são bem ilustrativas quanto à questão dos partidos militares. O general Júlio

Caetano Horta Barbosa defendia o monopólio estatal do petróleo, enquanto o general

Juarez Távora, uma participação da iniciativa privada, incluindo capital estrangeiro, na

indústria do ramo petrolífero. A partir de então teríamos duas correntes distintas dentro

das Forças Armadas e que passariam a disputar a direção do Clube Militar: a ala

nacionalista e o grupo, chamado pelos primeiros, de entreguista ou antinacionalista, que

deu origem à Cruzada Democrática. Em 1950, a ala nacionalista, que era liderada pelos

generais Newton Estillac Leal e Horta Barbosa, venceu as eleições do Clube Militar. A

ala “entreguista” se organizou e fundou a Cruzada Democrática que, em seu manifesto,

acusava os oficiais nacionalistas de serem colaboradores, de forma consciente ou não,

da infiltração comunista nas Forças Armadas9. Em 1952, com a vitória da Cruzada

Democrática, com 8.288 votos contra 4.489 da chapa nacionalista10, o Clube Militar

abandonou o seu comprometimento com a tese do monopólio estatal do petróleo 11.

Em 1955, a Cruzada Democrática, aliada à União Democrática Nacional

(UDN), e mais outras forças que haviam participado da derrubada de Vargas no ano

anterior, se opuseram às candidaturas de Juscelino Kubitschek e João Goulart às

eleições presidenciais que seriam realizadas em outubro do mesmo ano. O primeiro era

acusado de corrupção, e o segundo, de manter estreitas ligações com os sindicatos. Com

8 Idem. 9 LAMARÃO, op. cit., cf. p.1275. 10 SODRÉ, op. cit., cf. p. 341. 11 LAMARÃO, op. cit., cf. p. 1726.

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a vitória destes candidatos, os adversários começaram a defender a idéia de impedir a

posse de ambos, ainda que por meios extra-legais12. Mas

“eclodiu movimento militar liderado pelo general Henrique

Lott com o objetivo de deter uma conspiração em preparo no próprio governo então chefiado pelo presidente interino Carlos Luz, devido ao impedimento de Café Filho por motivo de saúde, e de garantir a posse de Juscelino e Goulart” 13.

De acordo com Sérgio Lamarão, o êxito deste movimento dos militares

nacionalistas legalistas teria provocado um esvaziamento do poder obtido pela Cruzada

Democrática na área militar. Nas eleições de 1956, a ala nacionalista, liderada pelo

general João de Segadas Viana e com o apoio de Lott, venceu as eleições para a direção

do Clube Militar.

O período chamado de Crise da Legalidade é marcado pela renúncia do

presidente Jânio Quadros em 1961. Após a renúncia, os três ministros militares14

vetaram a posse do vice-presidente, João Goulart. Os militares da ala nacionalista

legalista que integravam a Campanha da Legalidade — liderada por Leonel Brizola,

então governador do Rio Grande do Sul — defenderam os termos da Constituição e

apoiaram a posse de João Goulart. O marechal Lott escreveu um manifesto em 26 de

agosto, em que criticava a posição do ministro da Guerra, ao tentar impedir a posse de

Goulart. Além disso, em seu manifesto Lott solicitava a ajuda dos intelectuais,

estudantes, operários, enfim, do povo em geral e de seus “camaradas das Forças

Armadas que saberão portar-se à altura das tradições legalistas que marcam a sua

história no destino da Pátria” 15.

No clima de enfrentamentos políticos, que vinham desde a renúncia de Jânio

em 1961, aconteceriam as eleições de 1962 para a presidência do Clube Militar. Os

12 Idem. 13 Idem. 14 General Odylio Denys, da Guerra; brigadeiro Moss, da Aeronáutica; almirante Sílvio Heck, da Marinha. 15 SODRÉ, op. cit., p. 327.

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nacionalistas, reunidos na chapa União, eram representados pelo general Pery

Bevilaqua. A respeito de Bevilaqua,

“nasceu no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, no dia 9 de junho de 1899, filho do marechal José Bevilaqua e de Alcida Constant Bevilaqua. Neto pelo lado materno de Benjamin Constant Botelho de Magalhães, um dos articuladores da proclamação da República e ministro da Guerra e Instrução Pública no governo do presidente Deodoro da Fonseca, herdou de seu avô, propagandista do positivismo no Brasil, essa concepção filosófica e idéias constitucionalistas”16.

Pery iniciou sua carreira militar em 1917, ao ingressar na Escola Militar de

Realengo, no Rio de Janeiro. Mais tarde, em 1919, foi declarado aspirante-a-oficial de

artilharia. Apoiou o movimento tenentista e, identificado com este, ingressou em 1932

no Clube 3 de Outubro, que foi uma organização criada em maio do ano anterior para

aprofundar as reformas surgidas após a Revolução de 30. Ainda serviu como adido

militar em 1934 no Paraguai, deixando este cargo em 1936 e retornando ao Rio de

Janeiro. Em 1935 integrou a Comissão Militar Neutra, mediadora dos conflitos entre

Paraguai e Bolívia, em conflito desde 1932. Foi oficial de gabinete do general Eurico

Gaspar Dutra de 1938 a 1940, ano em que foi promovido a tenente-coronel e, em 1944,

promovido a coronel e nomeado para chefia do Estado-Maior da 7ª Região Militar (7ª

RM), com sede em Recife. Comandou ainda a 4ª RM, em Juiz de Fora em 1946, ano em

que recebeu a chefia da 2ª RM, com sede em São Paulo. Foi promovido a general-de-

brigada em 1952 e, em 1958, a general-de-divisão. Em 1961 assumiu o comando da 3ª

Divisão de Infantaria, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Estava neste cargo

quando ocorreram a renúncia de Jânio Quadros e a crise política agravada pelo veto dos

três ministros militares à posse de João Goulart17.

16 Peri Bevilaqua”. In: ABREU, Alzira Alves de et al (orgs.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Op. Cit., volume I, p. 655. 17 Ibid, cf. p. 655.

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“... o general Bevilaqua foi o primeiro oficial general a insurgir-se publicamente contra a tentativa de violação da legalidade constitucional e a defender a observância da legalidade constitucional. Nesse sentido, solidarizou-se com o general José Machado Lopes, comandante do III Exército, sediado em Porto Alegre, que apoiava o governador Leonel Brizola, do Rio Grande do Sul, líder do movimento que ficaria conhecido como Campanha da Legalidade, do qual participavam ainda os governadores Mauro Borges, de Goiás, e Nei Braga, do Paraná (...). Defensor da manutenção do presidencialismo, Bevilaqua, assim como os generais Osvino Ferreira Alves e Jair Dantas Ribeiro, manifestou-se contra tal solução [instituição do regime parlamentarista como saída para a crise], assim como os generais Osvino Ferreira Alves e Jair Dantas Ribeiro.”18

Em fins de 1961, Bevilaqua assumiu o comando da 3ª RM, sediada em Porto

Alegre e acabou detido, no ano seguinte, em sua residência, por ordem do então

Ministro da Guerra, João de Segadas Viana. Tal acontecimento se deu em razão do

envio de uma carta do general Pery ao governador Leonel Brizola, saudando-o pela

encampação da Companhia Telefônica de Porto Alegre, que era propriedade de uma

empresa norte-americana. Foi no decorrer deste período que o general rompeu sua

ligação com a Cruzada Democrática e se aproximou dos nacionalistas, lançando sua

candidatura à presidência do Clube Militar.

“Disputou em maio de 1962, como representante da corrente nacionalista, a eleição para a presidência do Clube Militar. O pleito traduziu o quadro de intensa polarização política então vivido no seio das forças armadas desde a crise provocada pela renúncia do presidente Jânio Quadros” 19.

A respeito das eleições do Clube Militar de 1962, tínhamos em disputa duas

chapas: a chapa União, representante da ala nacionalista liderada pelo general Pery

Bevilaqua, e a chapa Confraternização, representando a ala liberal e antinacionalista e

liderada pelo general Augusto da Cunha Magessi, representante da Cruzada

18 Ibid, pp. 655-656. 19 Ibid, p. 656.

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Democrática. As eleições terminaram com vitória da chapa Confraternização20. O

resultado foi considerado fraudulento e gerou uma série de ações judiciais visando a

anulação do pleito, todas, contudo, frustradas. A vitória da chapa associada à Cruzada

Democrática significou um êxito também dos setores militares e civis que conspiravam

contra o presidente João Goulart21.

Baseados nestas informações, delimitamos em dois pontos os nossos objetivos

quanto à pesquisa:

a) aprofundar o conhecimento de como as eleições do Clube Militar de 1962

expressaram a forma de disputa entre os partidos militares em torno de

diferentes perspectivas de equacionamento dos problemas nacionais;

b) entender até que ponto as mudanças na aliança entre nacionalistas de esquerda

e legalistas são significativas para a derrota do grupo nas eleições do Clube

Militar em 1962 e para a articulação dos golpistas para o golpe de 1964.

Não temos obras específicas tratando do nosso tema. O que trataremos aqui

são obras que nos remetem a assuntos relacionados com o objeto de estudo, ou seja, a

relação entre civis e militares na política, o Clube Militar e o nacionalismo.

No que diz respeito ao estudo dos militares e política, encontramos uma

vasta bibliografia que pode ser dividida de acordo com eixos interpretativos. Estes

seriam: instrumental, institucional-organizacional e moderador 22.

Nelson Werneck Sodré teria sido o maior representante da perspectiva de

análise instrumental23. Em uma de suas obras, História Militar do Brasil, Sodré, ao

dividir o Exército em cúpula (composta pelos quadros hierarquicamente superiores) e

20Ata da Assembléia Geral Eleitoral do Clube Militar de 16 de maio de 1962. De acordo com esta ata, os editais de votação foram publicados nos jornais Diário de Notícias, Jornal do Brasil, Correio da Manhã e O Globo, nas edições de 15/03 e 12/05 de 1962. 21 LAMARÃO, Sérgio, op. cit., cf. p. 1387. 22 Estas três correntes de estudos serão melhor explicadas adiante. 23 PEIXOTO, op cit., nota 4, p. 28.

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massa militar, analisa a questão da intervenção militar de acordo com um sistema de

aliança entre a primeira e os grupos civis que se relacionavam com as “forças

imperialistas”. A cúpula seria essencialmente golpista. A segunda, a massa militar, seria

a representante do caráter legalista e popular das Forças Armadas, logo, identificada

com os estratos populares. A construção destes dois grupos por Sodré deve ser

considerada ao trabalharmos com as relações entre militares e sociedade civil, conforme

ressaltam Peixoto24 e Coelho25.

Edmundo Campos Coelho classifica o trabalho de Nelson Werneck Sodré

como expressão da “versão oligárquica da concepção instrumentalista”. E a crítica feita

ao trabalho deste segundo autor se dá justamente quanto à construção destes dois grupos

(cúpula versus massa militar) e faz uma relação sobre o posicionamento dos militares

em 1961 e em 1964. Quanto à tentativa de golpe, com a renúncia de Jânio em 1961, e o

seu fracasso, para Sodré

“Nos acontecimentos militares, verificara-se, e isso estava o novo, que a massa de oficiais não se dispunha mais a acompanhar golpes de cúpula apenas pela obediência. A recusa, que começou em casos isolados , e que logo se generalizou, de comandantes de unidades, apressadamente presos ou substituídos, e de grupos inteiros de oficiais, em cumprir as ordens, evidentemente ilegais, emanadas dos três ministros subversivos, criava um fato novo, que constituía perigosíssima ameaça ao aparelho militar em uso, e sempre usado para golpes brancos, repousando na cega obediência” 26.

Edmundo Campos Coelho utiliza justamente este argumento de Sodré e o

relaciona com o desfecho de 1964. Ao tratar deste acontecimento, Nelson Werneck

Sodré o classifica como um golpe de cúpula. Ao ganhar o aparelho de comando das

Forças Armadas, o resto viria por conseqüência, já que este tipo de instituição opera

24 Id. 25 COELHO, Edmundo Campos. Em Busca de Identidade: o Exército e a Política na Sociedade Brasileira. RJ: Forense Universitária, 1976, p.23. 26 SODRÉ, op. cit., p.382.

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“por gravidade, isto é, de cima para baixo, por força da hierarquia e da disciplina” 27.

Para Coelho tal análise é inconsistente, na medida em que não torna possível o

esclarecimento do motivo pelo qual a crise de 1961 não teria demonstrado o mesmo

desfecho. Se havia este “mecanismo organizacional da operação por gravidade, como

explicar que em 61 o ‘resto’ não tenha vindo ‘como conseqüência’?” 28.

Antonio Carlos Peixoto também critica este tipo de análise, a instrumental.

Para ele “Realmente é muito difícil reduzir as Forças Armadas ao mero papel de agente

político de interesses que se encontram, por definição, fora dos quadros corporativos”

29.

Em sua obra, Em Busca de Remissão, André Moysés Gaio utiliza as

eleições de 1984 no Clube Militar e tenta provar como a vitória de um determinado

grupo estava relacionada com o projeto de estabelecimento de um regime democrático.

Ao tratar do Clube no segundo governo Vargas, Gaio demonstra a sua importância

como palco de disputa política e “que a atuação do Clube Militar e de suas correntes

internas, nos anos 50, tornou-se um modelo para a análise da sua função na política

brasileira e de suas relações com as Forças Armadas”30. Além disso, o Clube é

entendido como “estrutura de formulação e representação de demandas políticas e

institucionais dos militares”31. Por fim, ao trabalhar com o intervalo 1950-1964, período

anterior ao objeto de estudo do autor, Gaio contribui para tratarmos do nacionalismo

militar e das disputas no Clube entre correntes ideológicas presentes nas Forças

Armadas.

Ainda voltado para o trabalho com correntes ideológicas presentes no

interior da instituição, teríamos Alain Rouquié e Oliveiros S. Ferreira. Em Os Partidos

27 SODRÉ, Apud COELHO, p. 23. 28 COELHO, op.cit., p.23. 29 PEIXOTO, op. cit., p. 30. 30 GAIO, André Moysés. Em Busca da Remissão. A Mobilização Militar pela Democracia. Londrina (PR): Editora UEL, 1997, p. 23. 31 Idem.

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Militares no Brasil, Rouquié organiza diversos textos relacionados com a temática

militares−política, mas voltados para o caso do Brasil. Rouquié tem um capítulo

destinado somente à discussão deste termo e sua importância no estudo de militares. Os

textos de Peixoto, trabalhados aqui, também discutem o papel do Clube Militar no

cenário político e como as disputas no seu interior estão ligadas à lógica dos partidos

militares.

Oliveiros S. Ferreira, com Vida e Morte do Partido Fardado, dialoga com a

idéia de partido militar apresentada por Alain Rouquié. Através de uma análise mais

próxima da concepção institucional-organizacional, o autor tenta verificar o papel das

Forças Armadas e sua atuação na política, procurando classificá-la no papel de

protagonistas ou coadjuvantes. Para isso, trabalha com valores característicos da cultura

política da instituição militar, tais como: honra, patriotismo, hierarquia, disciplina e

compromisso com a ordem. Todos estes elementos são analisados em capítulos

específicos e demonstram como eles são importantes quando procuramos diferenciar a

sociedade paisana dos militares.

Nos primeiros capítulos de seu livro, Ferreira faz referência à existência de

um partido fardado e do Estabelecimento Militar. Este se encontraria voltado para a

constituição, mantendo uma postura legal. O partido fardado surge nos momentos de

crise e tem um aspecto temporal, ou seja, sua existência está diretamente relacionada

com o período de duração de uma crise ou de várias crises. É definido da seguinte forma

por Ferreira:

“A expressão Partido Fardado não designa uma facção política, no sentido em que se fala de um partido político que se constitua no mundo civil para disputar eleições. O partido político é o tipo ideal de ‘sociedade’ (...) que se opõe em tudo e por tudo à ‘corporação’. O Partido Fardado não é um grupo organizado que permanece no tempo como organização. Sua existência evidencia-se

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em momentos de tensão interna na corporação ou de desencontro dos militares com o Governo” 32.

Já o Estabelecimento Militar teria, como vimos anteriormente, um caráter

constitucional. A respeito do uso do termo e a composição deste grupo:

“A expressão Estabelecimento Militar deve ser tomada no sentido de ‘um grupo que exerce autoridade, controle ou influência e em geral procura resistir a mudanças’. Sendo assim, ele é formado por aqueles que fazem do respeito à hierarquia e da manutenção da disciplina a pedra de toque da vida e da carreira militares. [...] A imensa maioria dos que compõem o Estabelecimento Militar é encontrada nos quadros dos oficiais generais e superiores, embora haja aqueles que, em posições hierárquicas inferiores, não pretendem sacrificar a perspectiva de ascensão na carreira e se dispõem a seguir os chefes.” 33.

Um ponto crítico encontrado no texto de Ferreira está relacionado com as

seguintes questões: como se dá a aproximação entre o Estabelecimento Militar e o

partido fardado? Ora, se o partido fardado é quem efetiva o golpe34, de acordo com o

autor, mas precisa de um totem, ou seja, de um líder, que não existe, como e quem

lidera o partido fardado? E o Estabelecimento Militar? Qual o seu papel? Por que não

reage? Não há uma resposta clara para estas perguntas ao longo do trabalho de Ferreira,

o que abre novas possibilidades para pesquisa. Finalmente, poderíamos esboçar uma

resposta simples, com base no último capítulo de seu livro: o partido fardado “arrasta”

o Estabelecimento Militar para o movimento golpista.

Como o nacionalismo é um tema aqui abordado, os trabalhos de Daniel

Pécaut, Caio Navarro de Toledo e José Murilo de Carvalho tratam diretamente deste

campo temático. Os dois primeiros autores estão voltados para o estudo da construção

de uma ideologia, sobre o papel do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e

dos intelectuais identificados com o nacionalismo no interior deste instituto. Pécaut 32 FERREIRA, Oliveiros S. A Vida e Morte do Partido Fardado. São Paulo: Editora SENAC 2000, p. 43. 33 Id., pp.42-43. 34 Id., cf. p. 89.

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procura entender de que forma se deu a construção de uma ideologia e como a

intelectualidade isebiana assumiu “explicitamente a tarefa de inventar a ideologia que

iria presidir a ‘revolução brasileira’.” 35. Além do ISEB, o autor também trabalha com

outros grupos que estão, de alguma forma, envolvidos com o nacionalismo e seu

discurso.

Em seu ISEB: Fábrica de Ideologias, Caio Navarro de Toledo procura

entender como se dá a construção de uma ideologia nacionalista e como os pensadores

isebianos se colocavam diante das concepções para a formulação de uma ideologia de

conteúdo nacionalista e que visava a mudança, ou não, do quadro sócio-econômico

presente no país. O que podemos destacar de interessante no trabalho de Toledo é a

indicação da existência de várias correntes no interior do ISEB no que diz respeito à

concepção de nacionalismo e a forma de como se colocar diante da realidade vivida

depois do governo de Juscelino Kubitscheck – período em que o ISEB ganha vida, já

que foi criado ainda no governo Café Filho.

O texto de José Murilo de Carvalho, Vargas e os Militares, nos leva a um

entendimento da nacionalização da política. De acordo com o autor, isto teria se dado

em “três dimensões: a criação de atores nacionais, de uma agenda nacional e de um

centro nacional decisório forte. Eu diria que a relação entre Vargas e os militares faz

parte desse processo, sobretudo no que se refere à construção e (...) desconstrução de

atores políticos” 36. Ao longo do seu trabalho, Carvalho nos apresenta as etapas desse

processo de nacionalização da política e um amadurecimento das Forças Armadas

enquanto atores políticos. Tal processo poderia ser dividido em três momentos:

─ 1930-1937: construção mútua de dois atores políticos: Vargas e os militares;

35 PECÁUT, Daniel. Os Intelectuais e a Política no Brasil. Entre o Povo e a Nação. São Paulo: Ática, 1990 , p. 104.

36 CARVALHO, José Murilo. “Vargas e os militares”. In: PANDOLFI, Dulce (Org.). Repensando o Estado Novo. Rio de Janeiro: Editora FGV, s/d , p.341.

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─ 1937-1985: dividido em sub-períodos, tem a construção do trabalhismo como

um outro ator político (primeiros anos do Estado Novo), a multiplicação de

atores na arena política (1945-1964), e o ator militar como hegemônico a partir

do golpe em 1964;

─ 1985 até data recente: multiplicação de atores políticos sem a ação política de

segurança e com orientação independente do governo, permitindo um

esvaziamento das Forças Armadas como ator político.

A classificação das correntes militares oriundas deste processo, ao fim do

trabalho de José Murilo, facilita o entendimento das divisões e das concepções políticas

resultantes no seio da instituição.

Finalmente, temos os verbetes a respeito dos temas trabalhados e de

personagens relacionados. No Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930),

temos basicamente três textos que se enquadram nesta categoria e que são úteis na

medida em que nos fornecem dados a respeito dos personagens envolvidos nas chapas

estudadas e do Clube Militar: “Clube Militar”, “Cruzada Democrática” e “Peri

Bevilaqua”. São conjuntos de informações importantes para a elucidação de aspectos

institucionais e pessoais dos eventos políticos a serem analisados.

Referências teóricas

A temática do nacionalismo é sempre conectada a do processo de construção

e consolidação do Estado. O que devemos deixar claro é que não podemos dissociar a

tendência militar nacionalista do posicionamento e discussão dos grupos civis a respeito

do mesmo tema. Daí a importância do ISEB para os civis na construção de uma

ideologia nacionalista. É neste instituto que encontramos os grandes defensores do

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nacionalismo e, de acordo com Peixoto, um “aparelho ideológico dos grupos

nacionalistas civis e militares” 37.

Ainda quanto ao caráter das divisões no seio das Forças Armadas,

especialmente no Exército, temos uma questão importante presente. O debate em torno

do desenvolvimento econômico a ser adotado na época, ou seja, uma industrialização

com caráter intervencionista estatal ou uma outra baseada na participação do capital

estrangeiro para a exploração dos recursos naturais existentes no país. As cisões eram

ligadas a este tipo de posicionamento porque eram temas relacionados com a

organização política nacional e internacional. Estes cismas se refletiram no Clube

Militar através da formação das correntes militares38.

Além disso,

“O Estado Novo transformara o Exército em uma

instituição que participava ativamente do processo da tomada de decisão. Mas a estrutura autoritária do regime, apesar de ter politizado o Exército, impedia o desenvolvimento do debate político. E foi preciso aguardar 1945, a queda de Vargas e a redemocratização, para que as correntes militares, que se tinham criado nos últimos anos da ditadura de Vargas, pudessem se manifestar mais livremente” 39.

Para Peixoto, a corrente nacionalista militar teria sido formada durante o

Estado Novo40, conforme sugere também Carvalho, quando situa este período como o

de formação das Forças Armadas enquanto atores políticos. Esta relação entre a

formação desta corrente e o Estado Novo é vista de acordo com uma lógica de “estreita

correlação entre desenvolvimento industrial e potência militar” 41. No Estado Novo, o

Exército participava ativamente do processo de tomada de decisão, mas em função da

estrutura autoritária do regime, o debate político não era possível. O processo de

37 PEIXOTO, op.cit, p. 87. 38 PEIXOTO, A.C, op. cit, cf. p. 77. 39 Idem, p. 89. 40 Idem, p. 78. 41 Idem, pp. 78-79.

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redemocratização, que viria em 1945, com o fim do regime estadonovista, possibilitou

que as correntes militares manifestassem suas opiniões.

O nacionalismo nunca produziu uma doutrina elaborada no interior das Forças

Armadas. O nacionalismo militar foi caracterizado por Antonio Carlos Peixoto:

“O nacionalismo enquanto ideologia de um desenvolvimento de tipo nacional, não privilegiava qualquer das formas de exercício de poder político: era partidário de soluções que estimulassem a industrialização e evitassem a penetração do capital estrangeiro, mas o nacionalismo, sobretudo no interior das Forças Armadas, caracterizava-se por um forte conteúdo antiliberal, cujas origens devem ser buscadas principalmente na oposição aos grupos agroexportadores, mais do que na oposição aos fundamentos do liberalismo enquanto doutrina política” 42.

Além deste grupo, encontramos, na historiografia, referências a um grupo

nacionalista-legalista. Mas, o que são esses militares legalistas?

Para Peixoto, há uma mudança quanto ao posicionamento dos militares

nacionalistas durante as eleições de JK para presidente. Se, até aquele momento, os

nacionalistas eram conhecidos por um posicionamento mais radical,

“... os oficiais nacionalistas, em seus esforços para sustentar Kubitschek e derrotar Juarez [Távora], tiveram que reorientar sua ação: de nacionalista passaram a constitucionalistas, legalistas. A corrente nacionalista, durante todo o período de governo Kubitschek, se apresentará como defensora da Constituição; seu nacionalismo ficará mais prudente e mais moderado” 43

É importante percebermos que há uma diferença entre estes militares

nacionalistas legalistas que apóiam Lott no manifesto para a posse de Kubitschek e os

da Crise da Legalidade. A aliança entre nacionalistas e legalistas teria se dado

neste momento, ou seja, no período de crise que antecedeu a posse de Kubitschek.

Antonio Carlos Peixoto alerta para o fato de que esta “era uma aliança bastante

42 Idem, p. 73. 43 PEIXOTO, op. cit, p. 104.

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determinada por circunstâncias históricas bem definidas” 44. Peixoto acredita que os

nacionalistas-legalistas foram divididos em função das constantes alterações

hierárquicas feitas por Goulart:

“...ser legalista no tempo de Goulart significava, até certo ponto, defender o nacionalismo radical. Quando o governo Goulart começa a exigir uma revisão dos quadros constitucionais e a exercer seu poder fazendo aprovar as ‘reformas de base’, a defesa da legalidade constitucional é transferida para as mãos dos antigos ‘golpistas’, que traduzem o sentimento majoritário das Forças Armadas” 45

Isto teria provocado o isolamento da corrente nacionalista e seu afastamento

das Forças Armadas após o golpe de 1964.

O uso dos termos “nacionalistas” e “antinacionalistas” está pautado na

divisão também proposta por José Murilo de Carvalho. De acordo com o autor, no

período de 1945 e 1964, as “Forças Armadas dividiram-se em pelo menos dois grupos”

46 divididos em torno do nacionalismo e do comunismo, agrupavam-se, conforme o

autor, da seguinte maneira:

a) Nacionalista direitista ou nacionalista anticomunista: apóiam o nacionalismo,

mas tem opinião desfavorável ao comunismo;

b) Nacionalista de esquerda: quanto ao nacionalismo se identifica com o primeiro

grupo, mas, por não aderir ao anticomunismo, se afasta dos nacionalistas

direitistas;

c) Cosmopolita de direita ou anticomunista: profundamente anticomunista e não-

nacionalista;

d) Cosmopolitas liberais: apenas uma possibilidade teórica, este grupo não se

concretizou.

44 Idem, p. 109. 45 Id., p. 108. 46 CARVALHO, op. cit., p. 343.

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Na visão de José Murilo, uma aliança entre os nacionalistas anticomunistas

e os cosmopolitas anticomunistas teria se dado no segundo governo de Vargas. Eles

teriam se aliado contra o grupo nacionalista de esquerda, sendo o conflito representado

pelos partidos militares nas disputas pelas eleições do Clube Militar na década de

195047. A disputa entre estes grupos teria durado até o golpe de 1964, passando pela

vitória da ala anticomunista nas eleições do Clube em 1962 e chegando à deposição do

presidente Goulart.

Quando tratamos a questão dos militares e sua participação na política, não

podemos esquecer que as Forças Armadas devem ser vistas como uma instituição que

faz parte do aparelho de Estado. Com isso, não se encontra isolada do restante da

sociedade. Para compreendermos melhor esta conjuntura, temos algumas linhas de

estudo que nos auxiliam nas interpretações a respeito do estudo das Forças Armadas e

sua relação com o meio civil. Podemos destacar, basicamente, três linhas de estudo

principais: a análise instrumental, a institucional-organizacional e a moderada.

A primeira pode ser entendida da seguinte forma:

“A concepção instrumental busca nos interesses das classes, dos grupos, das forças políticas e das correntes de opinião os motivos condutores das manifestações militares. As forças militares agem a partir de estímulos encontrados fora das fronteiras da corporação. Elas são acionadas por grupos de interesses ou de pressão e, em última análise, o sentido final da intervenção militar favorece sempre um ou outro dos grupos que disputam o poder e o controle do aparelho de Estado” 48.

Já a visão das Forças Armadas a partir da concepção institucional-

organizacional seria:

47 Idem,. p.344. 48 PEIXOTO, Antonio Carlos. “Exército e política no Brasil. Uma crítica dos modelos de interpretação”. In: ROUQUIÉ, Alain. Os Partidos Militares no Brasil. Rio de Janeiro: Record, s/d, p. 29.

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“A concepção institucional-organizacional, por sua vez, enfatiza a autonomia da instituição militar face à sociedade global. Segundo essa abordagem, as Forças Armadas se convertem na matriz dos inputs e outputs militares; o fenômeno militar é, em última análise, auto-explicável. Os traços mais salientes da lógica organizacional-burocrática – espírito de corpo, hierarquia, centralização das decisões – são privilegiados em prejuízo das influências civis. O aparelho militar é analisado como uma estrutura monolítica, e seu output político é o resultado de processos e de decisões que se prendem à lógica e à percepção próprias da instituição e de seu funcionamento vertical.” 49.

Dentre os autores que trabalham com esta linha de estudos teríamos

Edmundo Campos Coelho50. Este autor tem como proposta de trabalho uma relação

“organização-sistema” estudada a partir de uma perspectiva “histórica”. O estado de

uma organização deve estar relacionado com aquilo que ela foi no passado51.

Antonio Carlos Peixoto também tece suas críticas quanto a este tipo de

análise. Para ele é difícil aceitarmos que haja um racha radical entre as Forças Armadas

e a sociedade. O fenômeno militar não deve ser estudado como uma manifestação

imanente. E completa sua argumentação:

“As Forças Armadas devem ser vistas como uma instituição

que faz parte de um conjunto mais vasto – o aparelho de Estado –, não se acham desvinculadas da sociedade global. E de modo algum se pode considerar a organização militar como refratária aos processos e aos mecanismos que atuam no conjunto da vida social e política” 52.

Peixoto entende que Coelho tem razão quanto à especificidade militar e à

influência das características institucionais no comportamento das Forças Armadas, mas

ressalva: “não se pode explicar tudo por meio desses traços”53.

49 Id. 50 COELHO, Edmundo. Em Busca de Identidade: o Exército e a Política na Sociedade Brasileira. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1976. 51 COELHO, op. cit., cf. p.28. 52 PEIXOTO, op. cit., pp. 30-31. 53 Id., p. 40. O trabalho de Edmundo Campos Coelho foi tomado, aqui, como expressão mais sistematizada da abordagem organizacional. Deve-se observar, contudo, que outros autores, como José Murilo de Carvalho e Alexandre Barros, partiram de abordagem semelhante – embora preferindo denominá-la “institucional” −, mas analisaram a relação das Forças Armadas e a política concedendo maior peso explicativo à sua interação com as estruturas globais da sociedade brasileira.

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O estudo do padrão moderador nas relações entre civis e militares foi

trabalhado por Alfred Stepan em Os Militares na Política. Para explicar o termo,

Stepan utiliza a classificação de tipos de sociedade de Samuel Huntington e classifica as

novas sociedades latino-americanas como de tipo “pretoriana”54, na medida em que

todas as instituições são altamente politizadas e as instituições políticas são fracas55.

Neste tipo de sociedade, de acordo com Stepan, “os militares também são politizados e

todos os grupos tentam cooptá-los para aumentar sua força política”.56

Daí teríamos então a definição do padrão moderador, proposta por Alfred

Stepan, em que “os militares têm uma tarefa que consiste essencialmente na atividade

conservadora de manutenção do sistema. O papel dos militares, de modo geral, se

restringe à deposição do chefe do executivo e à transferência do poder político para

grupos civis alternativos” 57. Os militares aceitariam desempenhar este papel por

acreditarem na legitimidade das formas políticas parlamentares. Além disso, teriam a

noção de que, comparados aos civis, apresentariam uma reduzida capacidade de

governar.

Destacaríamos então os principais componentes do padrão moderador:

• Militares são politizados e cooptados por protagonistas políticos;

• Militares são politicamente heterogêneos, mas procuram manter uma unidade

institucional;

• Políticos garantem certa legitimidade aos militares para agirem como

moderadores do sistema político;

• Aprovação dada pelas elites políticas para o golpe = coalizão golpista vencedora;

54 “... usaremos a expressão ‘sociedade pretoriana’ com referência a essa sociedade politizada, deixando claro que a mesma compreende não apenas a participação dos militares mas também de outras forças sociais.” (HUNTINGTON, Samuel P. Ordem Política das Sociedades em Mudança. Rio de Janeiro: Forense Universitária / São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1975, p. 207). 55 STEPAN, Alfred. Os militares na política. Rio de Janeiro: Artenova, 1975, cf. p. 49. 56 Ibid., p. 49. 57 Ibid., p. 50.

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• Negação, por parte dos civis, da legitimidade da deposição do executivo pelos

militares = impede a formação de uma coalizão golpista vencedora;

• Caráter de ilegitimidade quando militares assumem o sistema político por muito

tempo;

• Complacência dos oficiais em relação aos civis, no que diz respeito a aspectos

sociais e intelectuais, facilita a cooptação e a contínua liderança civil. 58

Hipótese

1.Principal

Nas condições em que se travava a disputa entre as correntes militares

nacionalistas e liberais pela orientação do desenvolvimento econômico, a eleição para a

diretoria do Clube Militar em 1962 antecipou o desfecho de 1964, servindo de prévia da

constituição de uma aliança golpista vitoriosa, formada, essencialmente, em torno de

temas como a associação com o capital estrangeiro e o anticomunismo.

2. Hipóteses derivadas

•••• Dado que o golpe de 1964 é o momento final de uma disputa entre grupos civil-

militares na tentativa de impor determinado modelo de desenvolvimento

econômico e político para o país, as eleições do Clube em 1962 são mais um

momento desse conflito.

•••• Dado que há uma diferença entre os militares legalistas que apoiaram Lott em

1955 e os da Crise da Legalidade, esse rompimento foi fundamental para a derrota

da chapa nacionalista, em 1962 e para o golpe, em 1964.

58 Ibid., pp. 50-51.

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•••• Dado que as eleições do Clube Militar são momentos expressivos da disputa pelo

poder no interior da corporação militar, a análise da disputa de 1962 permitirá

testar os modelos explicativos da relação militares−política.

Para testar nossas hipóteses, adotaremos a proposta analítica de Antônio

Carlos Peixoto:

“[As Forças Armadas], como instituição que faz parte de

um conjunto mais vasto – o aparelho de Estado – , não se acham desvinculadas da sociedade global. E de modo algum se pode considerar a organização militar como refratária aos processos e aos mecanismos que atuam no conjunto da vida social e política” 59.

É, portanto, na interação das Forças Armadas com os agentes sociais que

encontramos os “fundamentos do comportamento militar e os pontos-chave que

possibilitam a sua compreensão” 60. Mas como se dá esta interação?

Podemos localizá-la de acordo com cada tipo de concepção quanto ao

estudo das relações entre militares e civis. Na “concepção instrumental”, a interação “é

assegurada a partir do momento em que os grupos sociais se dirigem às Forças

Armadas, determinam e fixam os limites da ação militar.” 61. Na “abordagem

institucional-organizacional”, “a interação assume a forma de estratégias que se opõem,

ou convergem, em um mesmo plano de ação” 62. O autor destaca um problema nesta

forma de entendimento. Essas estratégias não aparecem como

“o resultado do conjunto de relações entre os agentes em

confronto. Pelo contrário, a estratégia aparece como função apenas das percepções e decisões institucionais e não se deixa influenciar por outras variáveis que não são as específicas da organização.” 63.

59 PEIXOTO, op. cit., pp. 30-31. 60 Idem, p. 31. 61 Idem. 62 Idem, pp. 31-32. 63 Idem, p. 32.

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É de acordo com esta lógica de interação que trabalharemos. Ela está

presente em todo o processo de elaboração de estratégias pelas correntes militares.

Nossa proposta é entender a interação e o jogo político. Quando temos estes dois

pontos, entendemos de que forma as correntes estabelecem estratégias e podem

modificá-las ao longo dos acontecimentos, estando a corrente ideológica em disputa

(1945-1964) ou em hegemonia (1964) 64. Segundo Peixoto:

“Essa noção também permite que o jogo político das Forças Armadas seja percebido como resultado de convergências estabelecidas entre as elites militares e as frações das elites civis. O output político das Forças Armadas não é mais reduzido a pressões puramente institucionais ou sociais. Ele será o resultado de convergências decorrentes de um certo tipo de percepções análogas e da fixação de um certo número de objetivos também semelhantes, referentes ao processo do desenvolvimento global. É em função dessas convergências que os agentes militares e civis organizam seus sistemas de alianças, que podem variar segundo as mudanças criadas pela dinâmica da vida social e afetam as percepções e objetivos.” 65.

O fenômeno da interação intervém em todos os níveis:

• Formação das características institucionais;

• Determinação das opções estratégicas;

• Origem e evolução das tensões e dos conflitos militares.

O conjunto destes três fatores dá origem a uma matriz do comportamento

militar, pois incorpora fatores macrossociais e a atuação dos agentes civis 66. Tal matriz

está na base do conceito de partidos militares:

“Essa metáfora não tem outro objetivo, em um primeiro momento, senão o de assinalar firmemente a perspectiva escolhida: as Forças Armadas podem ser forças políticas que desempenham, por outros meios as mesmas funções elementares que os partidos, e sobretudo que conhecem em seu seio – tanto quanto os partidos, mas

64 Idem, cf. p. 32. 65 Idem, pp. 32-33. 66 Idem, cf. p. 34.

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segundo outra lógica – processos de deliberação, de tomadas de decisão, e até mesmo de união e articulação sociais” 67.

Alain Rouquié detalha mais o conceito:

“De maneira bastante flexível, o conceito de partido militar enfatiza as situações em que exército e política se relacionam e as instâncias institucionais de inserção da política no aparelho militar (e vice-versa). Concretamente: os partidos militares podem ser verdadeiros partidos fundados por militares para agirem na sociedade civil ou a cristalização de tendências que lutam pelo poder no âmbito da instituição militar e em estruturas políticas próprias do exército, e inclusive na organização militar como um todo, quando certos chefes se esforçam por transformá-la em organização política unificada.” 68.

De acordo com o autor, o “partido militar” teria surgido a partir da

Revolução de 30, com a criação do Clube 3 de Outubro por tenentes e jovens oficiais

exaltados. Isto seria um embrião de um partido revolucionário69. Para José Murilo de

Carvalho, no intervalo correspondente a 30-45 se dá um processo de construção de

atores políticos. Sendo que de 1930 até o Estado Novo, teríamos a constituição de

Vargas e os militares enquanto atores políticos. Com o fim deste regime e a queda de

Vargas, teríamos um processo de democratização, tendo o intervalo 1945-1964

apresentado a multiplicação de atores na arena política. Segundo Carvalho,

“No caso das Forças Armadas, a democratização significou,

inclusive, o surgimento do que poderíamos chamar, com Alain Rouquié, de partidos políticos militares. As Forças Armadas dividiram-se em pelo menos dois grupos que lutaram sem tréguas até a vitória de um deles, em 1964.” 70.

A existência destes partidos no interior das Forças Armadas se relaciona

com as divisões também vividas no cenário político civil nacional. A disputa entre estas

67 ROUQUIÉ, Alain. Op. Cit., p. 12. 68 ROUQUIÉ, Alain. “Os processos políticos nos partidos militares do Brasil. Estratégia de pesquisa e dinâmica institucional”. In: ________. Os Partidos Militares no Brasil. Op. Cit., p. 13. 69 Id.., cf. p. 13. 70 CARVALHO, op. cit., p. 343.

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correntes começa, a partir de 1945, a ser amplamente divulgada pela imprensa, que se

posicionava a favor de uma ou outra corrente71.

Rouquié aponta o conflito existente entre o partido militar e os partidos

militares. O primeiro seria a instituição em si, enquanto o segundo representaria as

tendências existentes no Exército. Complementando tal quadro, o autor define que:

“À vontade de preservar a unidade do Exército como

indispensável ‘poder moderador’, capaz de assegurar a ‘harmonia entre a autoridade de fato e a de direito’, contrapõem-se as divergências oriundas da sociedade civil, não somente devido à cooptação ‘legítima’ dos militares por todos os atores nacionais, mas também como conseqüência da ausência de consenso nacional acerca dos problemas mais importantes do desenvolvimento e do Estado.” 72.

Por fim, quanto à importância do estudo do Clube Militar e o uso da noção de

partidos militares neste trabalho, Rouquié parece esclarecer novamente: “Em um

sistema civil com forte componente militar, como o Brasil de 1930 a 1964, as eleições

do Clube Militar eram (...) quase tão importantes para a sobrevivência dos governos

quanto as eleições nacionais” 73.

A pesquisa foi desenvolvida sobre fontes agrupáveis assim:

a) Fontes primárias: Arquivos privados (Pery Bevilaqua; militares que formavam a

Cruzada Democrática no ano de 1962); Arquivos institucionais (Arquivo DOPS-

GB); Revistas Militares (A Defesa Nacional e Revista do Clube Militar); Grande

imprensa (os mais citados por Nelson Werneck Sodré); Imprensa nacionalista (O

Semanário, do Rio de Janeiro).

b) Fontes secundárias: obras sobre militares e política no Brasil; obras sobre política

no Brasil (1945-1964).

71 ROUQUIÉ, op. cit., cf. p. 14. 72 Idem, p. 16. 73 Idem, p. 14.

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O principal corpo documental da pesquisa é o Arquivo Pery Constant

Bevilaqua, depositado no Museu Casa de Benjamin Constant (MCBC), no Rio de

Janeiro, subordinado à 6ª Superintendência Regional (6ª SR) do Instituto do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). No que se refere a este arquivo, trabalharemos

com documentos produzidos pelo candidato da chapa nacionalista (União), general Peri

Bevilaqua. Outros tipos de fontes primárias contidas nesse arquivo a serem trabalhadas

dizem respeito aos Comunicados Internos (CIs) oriundos do Ministério da Guerra e do

Ministério da Marinha; correspondência ativa e passiva do líder da chapa nacionalista;

notas para imprensa; notas de instrução oriundas do Ministério da Guerra sobre

acontecimentos relativos ao ano de 1962; artigos escritos por Bevilaqua a respeito de

questões ligadas à situação político-militar, o que nos ajuda a entender o clima político

vivido e o posicionamento do líder da chapa União; radiogramas e telegramas enviados

e recebidos por Peri Bevilaqua, etc. Além deste arquivo, as atas de reuniões realizadas

no Clube Militar durante o período da Crise da Legalidade (1961-1964).

*****

O período chamado de Crise da Legalidade, resultante da renúncia de Jânio

Quadros à presidência da República em 1961, deixa claro o quadro de divisão existente

entre os militares. A disputa entre as correntes existentes se mostra cada vez mais forte

nas eleições que seriam realizadas em 1962 no Clube Militar. Assim, como ponto

introdutório deste trabalho, teremos um capítulo voltado para uma discussão sobre este

período na visão de vários autores.

Em seguida, ao trabalharmos com o pleito no Clube Militar, nos deparamos

com a existência dos grupos e a organização destes através de chapas organizadas de

acordo com pontos de vista em comum no que diz respeito à política e à economia do

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país. Com a análise das eleições de 1962 no Clube Militar, um estudo sobre a

composição e os programas das chapas se dará neste trecho da dissertação. Definiremos

os membros das chapas concorrentes, as conexões estabelecidas entre eles (como com

os partidos políticos a que se ligavam e a participação na imprensa, por exemplo) e os

programas elaborados e defendidos por estas chapas. Por fim, a conexão dos militares

nacionalistas de esquerda com o meio civil também será verificada através do estudo do

ISEB.

Nosso terceiro capítulo trata a eleição de 1962 no Clube Militar. Este pleito é

visto como uma espécie de medidor do ambiente político resultante da Crise da

Legalidade vivida naquele momento. A organização das chapas, a trajetória dos

membros e suas conexões tanto no meio militar quanto no meio civil nos levam a um

quadro interessante de disputa dos partidos militares. Fatos ocorridos no cenário político

nacional, assim como o posicionamento dos membros das chapas concorrentes, serão

considerados nesta etapa. Aqui, pretendemos expor fatos, membros e números

correspondentes ao pleito, fazer um detalhamento dos acontecimentos ocorridos na

eleição e como os partidos militares se posicionaram na disputa pelo poder no Clube

Militar.

Finalmente o resultado da eleição de 1962, sua repercussão no cenário político

nacional e seu reflexo no meio militar. Através do quadro político presente no Clube e

do destino político dos protagonistas, verificaremos o processo delineado pelos

golpistas e algumas possíveis conexões com o golpe de 1964. Pretendemos destacar,

mais uma vez, as conexões estabelecidas tanto pelo grupo vitorioso quanto para o que

saiu derrotado, agora em momento posterior ao processo eleitoral do Clube. Isto nos

levaria a um entendimento do quadro golpista que prepararia sua ação, resultando no

governo ditatorial que seria implantado no país a partir de 1964.

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Capítulo 1 – O quadro político entre os militares após a Crise da Legalidade

A Crise da Legalidade é vista por alguns autores como um marco para o

entendimento da conjuntura política vivida na primeira metade da década de sessenta. A

divisão no interior das Forças Armadas em correntes também é verificada neste

momento e o posicionamento de determinadas alas é fundamental para o desfecho da

crise. Assim, atentaremos para os acontecimentos ao longo deste período e suas

conseqüências na política nacional e na caserna.

Chamamos de Crise da Legalidade a conjuntura situada entre a renúncia do

presidente Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961, o veto dos ministros militares para a

posse de João Goulart e a solução parlamentarista adotada pelo Congresso em 2 de

setembro daquele ano. Mas, para iniciarmos o estudo deste momento, devemos verificar

as origens da situação de divisão nas Forças Armadas.

O que chama a atenção para o quadro de crise gerado pela renúncia de Jânio é a

tentativa de impedimento de posse do vice-presidente João Goulart. Isto se deu

motivado pela divisão existente nas Forças Armadas e fortemente vinculada ao

getulismo. A “Era Vargas” teve como uma de suas características a mudança radical nas

relações entre Vargas e as Forças Armadas74. O processo de transformação dos militares

em atores políticos, para José Murilo de Carvalho, teria surgido na primeira fase da Era

Vargas, especificamente no intervalo de tempo que antecede a implantação do Estado

Novo (1937-1945). Após a Revolução de 1930, Vargas não tinha em quem se apoiar

para consolidar uma centralização nacional. As Forças Armadas apareceram como uma

saída, mas naquele momento se encontravam desorganizadas e fragmentadas. Vargas

precisou reconstruí-las para transformá-las em atores políticos, e para isso várias táticas

foram usadas, sendo uma delas os expurgos – que permitiram à facção vitoriosa em 74 CARVALHO, José Murilo de. “Vargas e os militares: aprendiz de feiticeiro”. In: D’ARAUJO, Maria Celina (org.). As Instituições Brasileiras da Era Vargas. Rio de Janeiro: Ed. UERJ / Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1999, pp. 55-81.

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1930 tornar-se dominante em seu interior. Esta facção dominante era liderada pelos

generais Góis Monteiro e Eurico Gaspar Dutra e tinha como objetivo a unificação da

instituição (Exército) do ponto de vista político e ideológico75.

José Murilo de Carvalho76 divide em fases a relação entre Getúlio Vargas e as

Forças Armadas. À primeira, chama de “namoro”, localizando-a entre a Revolução de

1930 e a implantação do Estado Novo em 1937. Esta fase teria sido marcada pelo

incentivo dado por Vargas para a transformação dos militares em atores políticos, tendo

feito deles um de seus pilares de sustentação no poder. A segunda fase diria respeito ao

Estado Novo (1937-1945) e foi chamada de “lua-de-mel”. Nela, temos quase que total

coincidência dos interesses do presidente e da corporação militar. A terceira, e última

fase, corresponderia ao período de 1945 e 1964. Neste momento temos a organização

militar alterada profundamente em sua estrutura e na sua ideologia. No poder político,

Vargas tornara-se incompatível com a quase totalidade da sua base militar, porque

tentava mobilizar um novo ator político: o operariado.

O processo de construção do outro ator político afastou Vargas dos militares.

Estes se afastariam porque haviam desenvolvido fortíssimo viés anticomunista a partir

de 1935 (Revolta da Aliança Nacional Libertadora) e os militares viam o movimento

trabalhista como, no mínimo, simpatizante do comunismo77. O processo de

aproximação entre o governo e os sindicatos só se configurou nos anos finais do Estado

Novo, através da criação da legislação sindical e social e da construção da imagem de

Vargas como “pai dos pobres”.

“Esta guinada (...) foi a causa imediata do divórcio entre Vargas e as Forças Armadas. Estas, ou melhor, a facção que as dominava, já então tomadas pelo anticomunismo e pela pretensão de guiar o Estado, não

75 CARVALHO, José Murilo de. “Vargas e os militares”. In: PANDOLFI, Dulce (org.). Repensando o Estado Novo. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1999, pp. 341-345. 76 CARVALHO, José Murilo. “Vargas e os militares: aprendiz de feiticeiro”, Op. cit.,. p. 55. 77 CARVALHO, José Murilo. “Vargas e os militares”, op. cit., cf. p. 343.

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aceitaram a busca de novo ator político que lhe era política e ideologicamente antagônico”78.

Vargas tinha membros de facções distintas das Forças Armadas contra ele.

Antigos aliados como Góis, Canrobert Pereira (simpatizantes do Eixo) e aliados pré-

Estado Novo, como Juracy Magalhães e Juarez Távora, além do brigadeiro Eduardo

Gomes – candidato à presidência em 1945. O que movia o primeiro grupo era a ofensiva

político trabalhista implementada por Vargas, associada ao “perigo comunista”. O

anticomunismo e o medo de uma política populista também estavam presentes na

conformação do segundo grupo, mas ficariam encobertos sob a luta contra a ditadura, a

defesa do liberalismo e a democratização. Poucos generais ficaram ao lado de Vargas:

Renato Paquet, Odylio Denys, Estillac Leal e o brigadeiro Nero Moura. O que movia

este grupo, além da lealdade pessoal a Vargas, era a simpatia pela política nacionalista e

social do regime79.

Deposto em 1945 por uma ação conjunta de oficiais das três armas, Vargas

planejava o seu retorno ao poder. Estillac Leal, general nacionalista, se candidatou à

presidência do Clube Militar (CM) para verificar se era possível a candidatura de

Vargas, já que o CM servia como espécie de termômetro das eleições à presidência da

República. O general saiu vitorioso nas eleições de 1950 do Clube e isto era um

indicativo de que Vargas poderia contar com o apoio de setores do oficialato80.

O segundo governo de Getúlio continuou sendo fortemente atacado por aqueles

que não simpatizavam com sua política nacionalista e sua aproximação com o

operariado. João Goulart foi seu ministro do Trabalho e a tentativa deste de aumentar

em 100% o salário mínimo provocou fortes reações na oposição, dando origem,

78 CARVALHO, op. cit., p. 73. 79 Idem, cf. pp.73-75. 80 SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do Brasil. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1965, cf, pp. 304-308; PEIXOTO, Antonio Carlos. “O Clube Militar e os confrontos no seio das Forças Armadas”. In: ROUQUIÉ, Alain. Os Partidos Militares no Brasil. RJ: Editora Record, s/d, pp. 71-113 e CARVALHO, José Murilo de. . “Vargas e os militares: aprendiz de feiticeiro”, Op. cit., p. 75.

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inclusive ao Manifesto dos Coronéis (também chamado de Memorial dos Coronéis).

Publicado em fevereiro de 1954 e assinado por 42 coronéis e 39 tenentes-coronéis e

dirigido à alta hierarquia militar, o documento enfatizou a precariedade do Exército,

mas tinha como finalidade atingir Goulart e o então ministro da Guerra, Ciro do Espírito

Santo Cardoso. Alegaram que o aumento de salário de algumas profissões poderia

elevar o custo de vida e isto agravaria a situação dos baixos vencimentos nos quadros do

Exército, tendo dificultado o recrutamento de oficiais. A carreira nas armas não seria

mais um atrativo. Por fim, reclamavam ainda sobre a influência comunista nas Forças

Armadas e no país e a forma como era tolerada pelo presidente, visando incentivar uma

ação contra Vargas81.

José Murilo de Carvalho destaca o processo de democratização e multiplicação

de atores políticos durante o período de 1945 e 1964. Nas Forças Armadas podemos

destacar a formação de partidos militares82 que estavam divididos em pelo menos dois

grupos que estariam em torno do nacionalismo e do comunismo.

“A morte de Vargas, em 1954, não pôs fim ao conflito, pois passou-se, então, a combater sua herança política, ou o seu afastamento, que se dizia encarnados em Juscelino Kubitscheck e João Goulart”83.

A candidatura de Juscelino reacendeu o “udenismo militar”. Juscelino

Kubitscheck era acusado, pelo grupo que derrubou Vargas, de ser um continuador do

varguismo. Contestando o resultado das eleições em que JK foi vencedor para a

presidência e João Goulart para vice84, exigiram a maioria absoluta dos votos para que a

vitória nas eleições presidenciais fosse válida. O grupo de militares que apoiava Vargas

81 CARVALHO, J. M., “Vargas e os militares: aprendiz de feiticeiro”, op. cit., cf. p.77 e LAMARÃO, Sérgio. “Manifesto dos Coronéis”. In: ABREU, Alzira Alves de, et al. (org.) Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume III, pp. 3536-3537. 82 Termo utilizado por Murilo, mas desenvolvido por Alain Rouquié. 83 CARVALHO, op. cit., p. 56. 84 A legislação eleitoral permitia a eleição de presidente e vice-presidente de chapas diferentes. Goulart, vice do marechal Henrique Lott, superou Milton Campos, companheiro de chapa de Jânio.

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se organizou em um Movimento Militar Constitucionalista (MMC) em defesa de

Juscelino. Em 11 de novembro de 1955, este grupo, apoiado por Odylio Denys e

Henrique Teixeira Lott, ambos militares nacionalistas, deu um golpe preventivo,

destituindo o presidente em exercício, Carlos Luz – conivente com o anti-varguismo e

ligado aos conspiradores85. Enfim, teríamos como reflexo do “11 de novembro” nas

Forças Armadas a divisão do Exército, a incompatibilidade entre Exército, Marinha e

Aeronáutica, uma vez que na Marinha quase todo o almirantado era anti-Vargas; e, na

Aeronáutica, as rebeliões armadas de Jacareacanga (1956) e Aragarças (1959)

significaram uma mobilização contra o governo de Juscelino86.

Foi entre estes problemas que surgiu Jânio Quadros. Como não era visto como

um líder anti-varguista – e muito menos como getulista – foi identificado como um tipo

que estaria além dos conflitos existentes no cenário político nacional87. Contudo, tinha

como vice-presidente João Goulart, considerado herdeiro direto de Vargas na política

nacional e fortemente identificado com o comunismo pela ala mais conservadora das

Forças Armadas, que será aquela identificada por nós como golpista88. Assim, cabe

destacar um trecho do livro de memórias de Odylio Denys, ministro da Guerra do

governo de Jânio Quadros, ao justificar o veto dos ministros militares à investidura de

João Goulart à presidência da República.

“... João Goulart, quer conduzindo o seu partido, o PTB, para a extrema-esquerda, quer admitindo infiltração de notórios comunistas nos seus quadros e no seu comando, ou, ainda, promovendo alianças partidárias com os esquerdistas de todos os matizes, desde a esquerda

85 CARVALHO, op. cit., cf. p. 78; COUTINHO, Amélia. “Henrique Teixeira Lott”. In: ABREU, Alzira Alves de, et al. (org.) Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume III, pp. 3297-3304; LAMARÃO, Sérgio. “Silvio Heck”. In: ABREU, Alzira Alves de, et al. (org.) Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume III, pp. 2741-2744; SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio Vargas a Castelo Branco (1930-1964). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982, cf. p. 194. 86 CARVALHO, op. cit., cf. p. 78. 87 SKIDMORE, cf. p.231. 88 Mais detalhes sobre a divisão das correntes, no item Divisão dos Militares em “partidos” no presente capítulo.

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moderada e democrática até a esquerda extremada e revolucionária, tornou-se presa dos seus aliados, que por certo dele se utilizariam, como o fizeram depois, como instrumento de seus planos de implantação no Brasil de um Estado estrangeiro, que sob a cobertura do comunismo na verdade exercita, vive e promove o mais reacionário dos imperialismos: o de subjugar política, econômica e culturalmente os seus ‘aliados’ para a dominação de grande parte do mundo, que esse Estado estrangeiro pretende explorar com os mais desumanos e cruéis requintes, como não o fizeram nem mesmo os Estados capitalistas de outros tempos (...).

Aliado aos comunistas, vinculado a compromissos que assumiu com eles, Goulart tornou-se tão perigoso, do ponto de vista da vivência das instituições democráticas quanto os comunistas mesmos, de tal maneira que sua investidura na Presidência da República podia, na verdade, ensejar a investidura de comunistas (...) nos altos postos do governo, visto que João Goulart seria compelido a atender a esses agentes de um Estado estrangeiro (...)”89.

Além de ter João Goulart como vice, teríamos outro ponto crítico na situação

política de Jânio Quadros: a Câmara dos Deputados e do Senado Federal. A eleição para

presidente não foi acompanhada de uma renovação destes e os partidos90 que ajudaram

a campanha de Jânio Quadros ao Executivo eram minoritários no Congresso. Em função

disto, faltaria uma base parlamentar necessária para a implementação e agilização do

seu programa de governo. Porém, “esta dificuldade poderia ser contornada por uma

paciente articulação nos bastidores do Congresso, mas Jânio jamais a tentou”91.

Quanto aos ministros militares, Jânio se apoiou na porção mais conservadora das

Forças Armadas:

� Ministério da Guerra: Odylio Denys

― Aos poucos foi se afastando da linha nacional-legalista, fortemente

identificada com do marechal Lott e se aproximando dos membros da

89 DENYS, Odylio. Ciclo revolucionário Brasileiro: memórias: 5 de julho de 1922 a 31 de março de 1964. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1993, p. 80. 90 A campanha de Jânio pela presidência foi apoiada por uma coligação da União Democrática Nacional com os partidos Republicano (PR), Democrata Cristão (PDC) e Liberal (PL). 91 LABAKI, Amir. 1961. A crise da renúncia e a solução parlamentarista. São Paulo: Editora Brasiliense S.A., 1986, pp. 30-31.

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Cruzada Democrática92. Para compor o seu gabinete como ministro da

Guerra, Denys deu preferência aos membros deste grupo 93.

� Ministério da Aeronáutica: Brigadeiro Gabriel Grün Moss

― Representante da ala ligada a Carlos Lacerda, líder da extrema-direita

da UDN, apoiou os revoltosos de Aragarças e era ligado ao Instituto

Brasileiro de Ação Democrática (IBAD)94.

� Ministério da Marinha: Almirante Sílvio Heck

― Intimamente comprometido com o esquema político-militar

antigetulista, lacerdista, comandante do cruzador Tamandaré (que, em

1955, se revoltou contra a posse de JK) e principal articulador de um

levante frustrado da esquadra, em Recife, em 1958, já em pleno

governo Juscelino. Era um ferrenho crítico do governo de Juscelino95.

Outros cargos importantes da hierarquia militar também foram ocupados por

militares diretamente ligados a esta ala conservadora das Forças Armadas e oriundos da

Escola Superior de Guerra, a ESG. Contudo, nos deteremos neste ponto posteriormente.

Com a renúncia de Jânio Quadros e a viagem de João Goulart à China, assumiu a

Presidência provisória do Brasil o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri

92 Fundada em março de 1952 por militares da ala conservadora para concorrer às eleições daquele ano no Clube Militar. 93 LABAKI, op. cit., cf. p. 31 e RAMOS, Plínio de Abreu. “Odílio Denis” (sic). In: ABREU, Alzira Alves de, et al. (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume II, pp. 1818-1826. 94 LABAKI, op. cit., cf. p. 31 e LAMARÃO, Sérgio. “Grün Moss”. In: ABREU, Alzira Alves de, et al. (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume IV, pp. 3923-3924. Para maiores informações sobre o complexo IPES-IBAD e sua importância nas Forças Armadas, ver DREIFUSS, René Armand. 1964: A conquista do Estado. Ação Política, Poder, e Golpe de Classe. Petrópolis, RJ: Vozes, 1981. 95 LABAKI, op. cit, pp. 31-32 e LAMARÃO, Sérgio. “Sílvio Heck”. In: ABREU, Alzira Alves de, et al. (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume III, pp. 2741-2744.

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Mazzili. Contudo, o poder efetivo estava nas mãos dos ministros militares. Estes

declararam estado de sítio com o objetivo de impedir demonstrações públicas de apoio a

Goulart. Quando os primeiros sinais de resistência ao golpe apareceram, a “junta

golpista” caminhou para a violência, instaurando a censura e o controle das

comunicações telefônicas e telegráficas96. Nelson Werneck Sodré vê na articulação

destes ministros militares “o dispositivo militar golpista mais perfeito que o país

conheceu”97. Do seu ponto de vista, negar os direitos do vice-presidente escolhido nas

urnas, era como rasgar a Constituição. Além disso, os ministros exigiam que o

Congresso votasse o “impedimento do novo mandatário, sob pena de dissolução;

exigiam do vice-presidente que coonestasse o golpe, com a sua renúncia”98.

Nos nove dias que se seguiram à renúncia de Jânio Quadros, deu-se uma luta

entre os ministros militares e os setores que apoiavam a legalidade. O primeiro sinal de

resistência ao golpe veio da ala nacionalista das Forças Armadas através do manifesto

de 26 de agosto do marechal Teixeira Lott. Neste, Lott declara seu repúdio à solução

“anormal e arbitrária” que se pretendia impor99. Em conseqüência, teve a sua prisão

decretada pelo ministro da Guerra, Odylio Denys. Em seguida, vários outros militares

foram detidos.

“Um grande número de oficiais do Exército, Marinha e Aeronáutica, de suas frações ‘nacionalistas’, que tinham em Lott sua principal liderança, foram detidos principalmente no Rio e em São Paulo (...). Outros, ao invés da prisão, conheceram a cassação. São exemplos o general Ladário Pereira Telles e o coronel Jaime Neiva Monteiro, ambos substituídos em suas funções sediadas no Rio de Janeiro”100

Essas prisões tinham como objetivo mostrar a coesão nas Forças Armadas, pois

era fundamental para efetivar o golpe. Os ministros militares sabiam disto e, sendo

96 SODRÉ, op. cit., cf. pp. 374-375; LABAKI, op. cit., cf. p. 57. 97 SODRÉ, op. cit., p. 373. 98 Idem. 99 Idem, cf. p. 374 e COUTINHO, op. cit., cf. p. 3304. 100 LABAKI, op. cit., p.58.

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assim, precisavam calar os opositores ao veto a Goulart. No rádio instituiu-se a “guerra

psicológica” para criar um “clima destinado a arrancar do Congresso a decisão exigida,

de impedimento do sr. João Goulart”101.

Enquanto os militares estavam divididos quanto à posse de Goulart, a opinião

pública “legalista” crescia e representava uma frente ampla. Ela incluía “forças

populares”, que eram lideradas por intelectuais, estudantes esquerdistas e líderes

trabalhistas.

“Os ‘legalistas’ consideravam que deveria ser dada a Jango a oportunidade de exercer a presidência e não deveria ser permitido a seus opositores excluí-lo sob a acusação do que ‘poderia’ ele vir a fazer no desempenho do cargo”102.

Em 28 de agosto de 1961, o presidente interino, Ranieri Mazzili, enviou ao

Congresso mensagem informando que os ministros militares consideravam a volta de

Goulart ao Brasil como inadmissível “por motivos de segurança nacional”. O Congresso

negou-se a referendar o veto, mas uma comissão parlamentar, organizada para estudar o

caso, recomendou a adoção do sistema parlamentar. Como resposta, no dia seguinte, os

ministros militares publicaram um manifesto em que colocavam suas razões para

considerar a posse de Goulart como inaceitável. Durante um discurso em sua viagem à

China, Goulart falara a respeito de sua determinação em estabelecer uma “República

Popular” no Brasil e, para que isso fosse possível, seria necessário usar as graduações

mais baixas das Forças Armadas para derrotar os oficiais, que foram caracterizados por

ele como “reacionários”. Com esta declaração, alguns militares teriam mudado de

101 SODRÉ, op. cit., p. 377. 102 SKIDMORE, op. cit., p. 259.

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opinião quanto ao “legalismo”. Os oficiais estavam divididos. Os efeitos disto seriam

medidos pelo impacto causado no Clube Militar durante as eleições de 1962103.

A importância do III Exército

Na tentativa de golpe arquitetada pelos ministros militares, o posicionamento do

III Exército na crise nos ajuda a perceber as divisões na corporação e a força do

movimento legalista104 tanto nas Forças Armadas quanto no meio civil. A decisão

tomada pelo general José Machado Lopes, comandante do III Exército, configurou um

dos mais importantes acontecimentos para o desfecho da “Crise da legalidade”

instaurada em 1961. Portanto, consideramos que o estudo da posição do III Exército se

faz necessário para percebermos como se dava a defesa do legalismo em seu interior.

Como primeira manifestação contrária à atitude dos três ministros militares

temos o manifesto do marechal Lott, demonstrando a resistência das alas nacionalista e

legalista das Forças Armadas. Destacamos aqui o manifesto de Lott:

“Aos meus camaradas das Forças Armadas e ao povo brasileiro. Tomei conhecimento, nesta data, da decisão, do Sr. Ministro da

Guerra, Marechal Odylio Denys, manifestada ao representante do governo do Rio Grande do Sul, Deputado Rui Ramos, no Palácio do Planalto, em Brasília, de não permitir que o atual presidente da República, Sr. João Goulart, entre no exercício de suas funções e, ainda, de detê-lo no momento em que pise em território nacional. Mediante ligação telefônica, tentei demover aquele eminente colega da prática de semelhante violência sem obter resultado. Embora afastado das minhas atividades militares, mantenho compromisso de honra com a minha pátria e as suas instituições democráticas e constitucionais. E, por isso, sinto-me no indeclinável dever de manifestar o meu repúdio à solução anormal e arbitrária que se pretende impor à Nação. Dentro dessa orientação, conclamo todas as

103 HAYES, Robert A. “The Military Club and National Politics in Brazil”. Henry H. Keith and Robert A. Hayes. Perspectives on Armed Politics in Brazil. Tempe: Center for Latin American Studies, Arizona State University, 1976, cf. pp. 163-164. Sobre o discurso, Hayes se refere a um artigo de Adirson de Barros intitulado “A linha dura e o Medo”, publicado no Correio da Manhã, do Rio de Janeiro, em 16 de maio de 1965. Também encontramos referências sobre o ocorrido nos verbetes do Dicionário Histórico Biográfico referentes aos ministros militares e a João Goulart. 104 Entendemos “legalismo”, neste caso, como a defesa da Constituição, ou seja, um sentimento, entre militares e civis, de que se deveria dar posse ao vice-presidente.

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forças vivas do país, as forças da produção, e do pensamento, os estudantes e os intelectuais, os operários e o povo em geral, para tomar posição decisiva e enérgica no respeito à Constituição (grifo meu), em preservação integral do regime democrático brasileiro, certo, ainda, de que meus camaradas das Forças Armadas saberão portar-se à altura das tradições legalistas (grifo meu) que marcam a sua história no destino da Pátria”105.

A atitude custou a Lott a prisão, por ordem do ministro da Guerra, Odylio Denys, sob

acusação de lançar “manifesto subversivo”106.

“27 AGO 61: 0304 – Mensagem recebida Sr. Ministro da Guerra ELEMENTOS COMUNISTAS CONGRESSO ESTÃO PERTURBANDO ENCONTRO SOLUÇÃO LEGAL CRISE DECORRENTE RENÚNCIA PRESIDENTE PT MARECHAL LOTT ENVOLVIDO POR TAIS AGITADORES LANÇOU MANIFESTO SUBVERSIVO FORÇANDO MINISTRO GUERRA DETERMINAR SUA PRISÃO PT MINISTRO PRETENDE DEFENDER INSTITUIÇÕES ET MANTER A LEI ET ORDEM EM TODO PAÍS MESMO QUE PARA ISSO TENHA QUE IMPEDIR POSSE JANGO PT CONVENIENTE CHAMAR ET RETER QUALQUER PRETEXTO CMT 3ª DI E 1ª DC PALEGRE PT”107.

Ao final da tarde de 25 de agosto, as primeiras manifestações surgiram na cidade

de Porto Alegre. Apoiado por alguns coronéis e generais distribuídos em postos-chaves

no Rio Grande do Sul, além do protesto popular, o governador do estado, Leonel de

Moura Brizola, deu início ao movimento que ficaria conhecido por Campanha da

Legalidade108. Um outro sinal de que o golpe planejado pelos ministros militares estava

se deteriorando veio de um radiograma do Rio Grande do Sul em que informava a

posição assumida pelo governador Brizola no sentido de não reconhecer o golpe militar

e declarar que resistiria a ele.

105 SODRÉ, op. cit., p. 374. 106 SKIDMORE, op. cit., cf. p. 257; SODRÉ, op. cit.,cf. pp. 373-374 107 LOPES, Marechal José Machado Lopes. O III Exército na Crise da Renúncia de Jânio Quadros. Um depoimento. Rio de Janeiro: Alhambra, 1980, p. 127. 108 FERREIRA,Jorge. “Crises da República: 1954, 1955 e 1961.”. In: ______ e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. O tempo da experiência democrática: da democratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, col. O Brasil Republicano, v.3, 2003, cf p. 327.

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“27 AGO 61: 0120 – Rádio enviado ao Sr. Ministro: GOV BRIZOLA DECLAROU-ME RESISTIRÁ CONTRA A AÇÃO IMPEÇA POSSE JG PT COORDENA AÇÃO B M NESSE SENTIDO PT TENHO PERCEBIDO GRANDE NÚMERO OFICIAIS IDÉIA SER MANTIDO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL VG INCLUSIVE CMT 3ª DI ET 1ª DC PT TODAS UNIDADES CUMPRINHO ORDENS MANUTENÇÃO ORDEM PÚBLICA PT SITUAÇÃO TENSA PORÉM CALMA”109.

Um precário dispositivo militar e o apoio popular em Porto Alegre não eram

suficientes para garantir a posse de João Goulart. Era necessário encontrar uma forma

de mobilizar o restante do país. Assim, com o propósito de disseminar informações e

mobilizar os indivíduos para a ação, no dia 27 de agosto um grupo de choque da Guarda

Civil invadiu as instalações da rádio Guaíba, de Porto Alegre, e a colocou à disposição

da Secretaria de Segurança. Lembremos que várias rádios haviam sido fechadas pelo

Governo Federal por terem transmitido o manifesto de Brizola, contra a atitude dos três

ministros militares. A rádio foi transferida para o Palácio Piratini e seus transmissores

para a Ilha Pintada – vigiada por homens da Brigada Militar. Estava criada a Cadeia da

Legalidade110.

“A Cadeia da Legalidade foi de fundamental importância para o movimento. Ao difundir mensagens de diversas entidades políticas e grupos sociais na defesa da ordem democrática, a sociedade brasileira encontrou canais de informações que rompiam o cerco à censura. Transmitindo também em inglês, espanhol e alemão para o exterior, angariou a simpatia da opinião pública internacional. Nos microfones, Leonel Brizola desacatava os ministros militares, desmoralizando-os publicamente”111.

Através da rádio, Brizola passou a denunciar os planos golpistas do ministro da

Guerra. Além disso, denunciou a mobilização de grupamentos tanto da Marinha quanto

da Aeronáutica visando a interrupção de seu trabalho pela defesa da legalidade.

109 LOPES, op.cit., p. 127. 110 FERREIRA, op. cit., pp. 327-328. 111 Idem, p. 328.

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Enquanto a tensão aumentava no Palácio Piratini, a população parecia apoiá-lo, reunida

na Praça da Matriz. Acreditava-se que o comandante obedeceria ao ministro Denys e o

conflito armado seria inevitável. Contudo, Machado Lopes rompeu com Denys,

entendeu-se com Brizola e apoiou a posse de Jango112. Sobre sua decisão, esclarece o

general Lopes:

“A minha decisão de apoiar a Lei foi tomada após muita ponderação sobre as conseqüências de iniciar um movimento armado no Rio Grande do Sul, que se alastraria por todo o Brasil, tal o estado de politização em que se encontrava o Povo, motivado pela legitimidade de o Sr. João Goulart empossar-se como Presidente da República”113.

Para o comandante do III Exército, aceitar a ordem dos golpistas traria sérias

conseqüências para o Rio Grande do sul, como visto no trecho anterior e, agora, como

expresso no comunicado que transmitiu à população gaúcha:

“O Cmt. do III Exército, com a finalidade de evitar explorações tendenciosas da crise que atravessa a Nação, deseja tranqüilizar a população do Estado do Rio Grande do Sul, alertando-a de que o III Exército saberá manter a ordem legal e a defesa das instituições neste Estado, bem como em todo o território que está sob sua jurisdição. Conclama, igualmente, o povo em geral para que se mantenha em calma, confiante nas providências para a preservação da ordem”114.

No que diz respeito às tropas e sua relação com a população riograndense,

“... a situação da tropa (...) era de confraternização com o povo do Rio Grande do Sul, e o povo do Rio Grande do Sul acompanhava a histórica decisão de seu governador”115.

Em 27 de agosto, ou seja, dois dias após a renúncia de Jânio Quadros, Machado

Lopes informou ao ministro Denys que Brizola resistiria a qualquer tentativa de impedir

112 Idem, cf. p. 330. 113 LOPES, op. cit., p. 53. 114 Idem, p. 128. Obs.: Trata-se de uma nota publicada na imprensa do dia 28/08/1961. 115 SODRÉ, op. cit., p. 379.

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a posse de João Goulart. Ainda de acordo com ele, havia no III Exército um grande

número de oficiais que gostariam que fossem respeitados os princípios

constitucionais116.

Em 28 de agosto, Machado Lopes recebeu ordem do ministro da Guerra para

que desse um fim aos atos do governador Leonel Brizola. Se necessário, utilizasse

reforços de outras divisões e recorresse aos bombardeios. Esta declaração teria

provocado a reação do comandante e outros generais. Reunidos em 29/08 para discutir a

situação política causada pelos ministros militares e as ordens oriundas do ministro da

Guerra, o comandante do III Exército, general Machado Lopes, declarou:

1. Não acataria mais as ordens do ministro da Guerra;

2. Permaneceria no comando do III Exército;

3. Agiria por conta própria e com idéia de manter o Regime Liberal Democrático

Cristão.

A decisão foi imediatamente comunicada ao governador do Rio Grande do Sul e

aos comandantes do I, II e IV Exércitos117. Machado Lopes envia um radiograma no

mesmo dia, 28 de agosto, para o ministro da Guerra, colocando sua posição diante da

ordem dada.

“Comunico que tendo recebido ontem do Sr. Ministro, intermédio Gen GEISEL, que implicaria deflagrar uma guerra civil, declarei que não cumpriria e, a partir deste momento, enquanto Cmt III Ex, só cumpriria ordens legais dentro da Constituição vigente pt Gen MACHADO LOPES, Cmt III Ex.”118.

116 Rádio de 27/08/1961 em LOPES, op. cit., cf. p. 127 e “Machado Lopes”. In: ABREU, Alzira Alves de, et al. (org.) Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (pós-1930). 2ª ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 2001, volume III, pp. 3284-3286. 117 LOPES, op. cit., cf. pp. 47-49. 118 Rd Nº 247Ez, de 28 de agosto de 1961 em LOPES, op. cit., p. 130.

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Aderindo à causa da legalidade, o comandante do III Exército somou a

resistência militar a organizações de resistência civil.

“Constituiu-se o Comando Unificado das Forças Armadas do Sul, compreendendo o III Exército, a V Zona Aérea, a Brigada Militar e as Forças Públicas, todas sob o comando de Lopes. Além de possuir a mais poderosa artilharia e o mais completo parque de manutenção do país, o III Exército contava com os importantes regimentos de infantaria, unidades blindadas e 40.000 homens, Somados aos 13.000 da Brigada Militar, armados e entusiasmados, Machado Lopes contava com um poder de resistência que não poderia ser subestimado pelos ministros militares”119.

Em 29 de agosto, o general-de-brigada Antonio Carlos Murici, então chefe do

Estado-Maior do III Exército e favorável aos ministros militares, havia ido ao Rio para

conversar com Denys. Retornou a Porto Alegre trazendo a reafirmação das ordens que

foram dadas pelo ministro da Guerra e uma convocação para que Lopes fosse à Brasília

discutir diretamente com Denys o impasse criado120.

Machado Lopes não atendeu ao chamado do ministro, declarando que fatalmente

seria preso e dispensado de seus serviços. Além disso, só aceitaria ordens do chefe das

Forças Armadas, isto é, o presidente João Goulart. Em 30 de agosto , Lopes recebeu a

notificação do ministro da Guerra que estava demitido do comando do III Exército e que

o novo comandante seria o general-de-exército, Osvaldo Cordeiro de Faria121.

Respondeu ao ministro dizendo que se Cordeiro de farias fosse para o Rio Grande do

Sul seria preso.

Conforme observa Labaki, a 25 de agosto, dia da renúncia de Jânio, o quadro da

situação militar não era muito favorável, já que nenhum dos quatro grandes comandos

do Exército havia se expressado pelo respeito à Constituição122.

119 FERREIRA, op. cit., p. 330. 120 Rádio cifrado do Sr. Ministro da Guerra ao comandante do III Exército em LOPES, op.cit., cf p. 131 e verbete sobre “Machado Lopes, op. cit., cf. p. 3285. 121 Idem e LOPES, op. cit., cf. pp. 46-47. 122 LABAKI, op. cit., cf. p. 69.

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No III Exército, mesmo tendo seu comandante declarado que apoiaria

Brizola e a defesa da legalidade, encontramos algumas discordâncias. Comandantes de

divisões não concordaram com Machado Lopes. Temos como exemplo de uma destas o

comando do 14º Batalhão de Caçadores, sediado em Florianópolis. Contudo, vários

movimentos de apoio à legalidade surgiram no país.

“Em Belém do Pará, o comandante da base aérea local, coronel Fausto Gerp, chefiou uma sublevação contra a posição do marechal Denys e do brigadeiro Moss. Tropas do Comando Militar da Amazônia e uma flotilha da armada foram mobilizadas, conseguindo dominar a situação e prender o coronel. Em São Vicente, São Paulo, oficiais do 2º Batalhão de Caçadores se declararam solidários ao movimento legalista. Da guarnição militar de Corumbá, Mato Grosso, o general Arnaldo da Mata (...), seu comandante, assumia a mesma posição. Soldados da Vila Militar, no Rio de Janeiro, mesmo após a prisão do general Ademar de Queirós, mantinham-se em seus quartéis, não cumprindo ordens de seguir para o sul.”123.

Segundo Jorge Ferreira, em 30 de agosto a rebelião militar havia se espalhado

pelo país e uma guerra civil era iminente. Lopes recebera o apoio de inúmeros oficiais

declarando obediência à Constituição ou desembarcando em Porto Alegre e se

apresentando ao general..

Parucker destaca que “a atuação ― ainda que secundária ― dos sargentos

marcou presença no desenrolar da crise”124. Parucker, assim como Nelson Werneck

Sodré, ressalta o caráter legalista da luta dos sargentos. Os sargentos insubordinados da

base aérea de Canoas, próxima a porto Alegre, contribuíram para que não ocorresse o

conflito. Permanecendo o comandante da base aérea de Canoas fiel aos ministros

militares, a ordem, oriunda de Brasília, para decolagem dos jatos e bombardeio ao

123 LABAKI, op. cit., p. 98. Sobre outras manifestações do mesmo tipo, ver: PARUCKER, Paulo E.C. (1992). Praças em pé de guerra: o movimento político dos subalternos militares no Brasil – 1961-1964. Dissertação, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, UFF, Niterói, Rio de Janeiro, cf. pp. 52-57. 124 PARUCKER, op. cit., cf. p. 57.

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Palácio Piratini, estava mantida. A ação só não se realizou porque os sargentos

esvaziaram os pneus e desarmaram os aviões. O ato não poderia ser concluído125.

Além do caráter legalista de alguns grupos das Forças Armadas, percebemos a

articulação de diversos setores da sociedade defendendo a defesa da Constituição. A

Frente da Legalidade Democrática, liderada pelo presidente da Assembléia, deputado

Roberto de Abreu Sodré, em seu manifesto de lançamento pregou a resistência ao ato

dos ministros militares126. Paulo Parucker ressalta que desde o dia 26 de agosto

registraram-se greves de diversas categorias, “em defesa do regime”127.

“As manifestações havidas nas organizações militares sediadas nos Estados do Pará, Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Guanabara e até mesmo em Brasília, sem contar os Estados sob a jurisdição do III Exército e os inúmeros telegramas e ofícios recebidos de todas as classes sociais e Prefeituras, bem dizem do estado de politização a que havia atingido o Povo Brasileiro e como estava arraigado em seu espírito o acatamento à Lei.”128.

Skidmore coloca a posição do general Machado Lopes, comandante do Terceiro

Exército, como ponto fundamental para entender o rumo legalista que a crise tomou.

Sem a deserção de um comandante regional, a frente legalista não teria tido chance de

contrariar o veto dos ministros militares129. Ser um militar legalista, naquele momento,

era ser acusado de subversivo130.

Esta atitude tomada por Machado Lopes e o conflito gerado intracaserna podem

ser vistos como uma herança da disputa política entre facções civis e militares e seu

posicionamento diante do getulismo. A renúncia de Jânio teria pego os militares

antigetulistas de surpresa. Sendo assim, não estariam preparados para assumir o poder.

125 SODRÉ, op cit, pp. 382-385. Sobre as ações de sargentos e suas organizações, ver: MOROSINI, Liseane. Mais deveres que direitos: os sargentos e a luta pela cidadania negada – 1930-1960. RJ: UFRJ, IFCS, PPGHIS, 1998. 126 LABAKI, op. cit., cf. pp. 100-101. 127 PARUCKER, op. cit., cf. p. 51. 128 LOPES, op. cit., p. 77. 129 SKIDMORE, op. cit., cf. p. 257. 130 SODRÉ, op. cit., cf. p. 378.

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“A intervenção do Exército, para que tivesse um apoio amplo entre o corpo de oficiais, exigia um longo processo de discussão, a fim de sobrepor prima facie a dedicação à legalidade sentida pela maioria dos oficiais”131.

O ministro da Guerra teria extravasado suas bases de apoio dentro do Exército e,

de acordo com Skidmore, não teria encontrado outra solução que não o retrocesso para

uma posição de compromisso.

Enquanto os militares estavam divididos quanto à posse de Goulart, a opinião

pública “legalista” crescia e representava uma frente ampla. Ela incluía “forças

populares”, que eram lideradas por intelectuais, estudantes esquerdistas e líderes

trabalhistas132.

“ ... os legalistas consideravam que deveria ser dada a Jango a oportunidade de exercer a presidência e não deveria ser permitido a seus opositores excluíram-no sob acusação do que ‘poderia’ ele vir a fazer no desempenho do cargo”133.

No dia 30 de agosto, o Congresso Nacional rejeitou o pedido de impedimento

apresentado contra a posse do vice-presidente. Começava a discutir-se uma solução

conciliatória e que consistia na possibilidade de implantação de um regime

parlamentarista. Faltava convencer João Goulart e os ministros militares de que esta era

a melhor saída para o impasse. Segundo Labaki, “houve uma reunião no Rio de Janeiro,

de dez governadores de Estado (SP, RJ, MG, PR, SC, ES, BA, AL, RN, SE) e do

ministro da Fazenda, Clemente Mariani, com os três ministros militares. Nela, os

governadores obtiveram da “troika” golpista a garantia de respeito às decisões do

Congresso”134. Goulart aceitou a decisão do Congresso sem impor-se, causando certa

frustração principalmente na população do Rio Grande do Sul, liderada por Leonel 131 SKIDMORE, op. cit., p. 258. 132 Idem., cf. p. 259. 133 Iden, p.259. 134 LABAKI, op. cit., p. 110.

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Brizola135. O Congresso aprovou em 2 de setembro, por 253 votos contra 55, a Emenda

Constitucional nº 4 que instalava o parlamentarismo.

Os ministros militares compreenderam que não poderiam sobrepor-se à divisão

dentro das fileiras do Exército e não poderiam mais ignorar a difundida reação pública à

sua tentativa de veto136. Isolados politicamente, deveriam recorrer a uma “saída

honrosa”137. A ala legalista das Forças Armadas aceitara a posição intermediária, ou

seja, a opção pelo parlamentarismo. Brizola se posicionou contra a atitude tomada a

favor de uma saída para a crise através da implementação do parlamentarismo e

denunciou o processo. No entanto, Goulart aceitou o regime proposto e dava fim à Crise

da legalidade.

Para Peixoto, se em 1961 o golpe de Estado dirigido pelos três ministros

militares falhou, foi porque a hierarquia estava dividida. O Rio Grande do Sul, com seu

foco de resistência, atraiu os grupos de oposição dentro do Exército. Com as Forças

Armadas divididas, o país estava à beira da guerra civil.

“As intervenções vitoriosas são desde logo aquelas em que a hierarquia acompanha a opinião majoritária decorrente da ação do partido militar. Mas o partido, por si só, não é capaz de pôr em marcha a máquina militar. Sua ação deve ser coroada ou legitimada pela hierarquia, sem a qual corre o risco de malograr”138.

A respeito da crise vivida de 25 de agosto a 5 de setembro de 1961 e a defesa do

legalismo, Skidmore destaca alguns aspectos do que chama de “drama político

brasileiro”. Em primeiro lugar, seria perceber que o poder de Jânio, com a presidência,

era mais aparente que real, já que, como dito no início deste capítulo, a Câmara e o

Senado não haviam passado por qualquer renovação do seu quadro político. Em

seguida, os militares são lembrados. Teria ficado claro que em momentos em que o

135 Idem, cf. p. 119. 136 Idem, cf. p. 260. 137 FERREIRA, op. cit., p. 335. 138 PEIXOTO, “O Clube Militar e os confrontos...”, p. 112.

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processo civil é abalado, a opinião dos militares é decisiva. Além disso, o grupo que

Skidmore chama de “militares moderados” refletiria a opinião de um grande número de

civis que defendiam a Constituição.

No que diz respeito à crise de 1961, Alfred Stepan139 também faz suas

observações. Dando ênfase ao que ele chama de crise estrutural vivida nos anos de 1961

e 1964, Stepan analisa o comportamento dos militares diante do quadro político e a

mudança de comportamento deste em relação à política nacional. Baseado no

argumento de que a Instituição Militar é um subsistema que reage a mudanças do

sistema político, Stepan entende que a mudança do papel dos militares se relacionava

com alterações maiores do sistema político. Ele observa quatro importantes mudanças:

1. crescente índice de reivindicações políticas e econômicas ao governo;

2. decréscimo da capacidade extrativa decorrente do declínio do

crescimento econômico;

3. decréscimo da capacidade política de converter as reivindicações em

política concreta, devido à fragmentação do apoio;

4. crescente retração do apoio ao próprio regime político140.

Além disso, os reflexos da Revolução Cubana nas Forças Armadas latino

americanas podem ser vistas na relação destas com a política. O temor de uma revolta

comandada pela esquerda radical e, em função disto, a substituição de um exército

regular por milícias populares – como ocorrera em Cuba. Quanto à vitória de Fidel

Castro, ao relacionar tal aspecto com o governo João Goulart, os militares brasileiros

passaram a temer a atitude do presidente diante dos comunistas. Os militares

acreditavam que, ainda que não fosse comunista, Goulart poderia estabelecer uma 139 STEPAN, Alfred. Os Militares na Política. As mudanças de Padrões na Vida Brasileira. Rio de Janeiro: Editora Artenova S.A., 1975. 140 Idem, cf. pp. 101-102.

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aliança com os comunistas e dar um golpe de E. Em seguida, em função de sua fraqueza

política, não conseguiria liderar o movimento e, assim, os comunistas assumiriam o

poder do Estado. Para Stepan, este temor criou um fator novo nas relações entre civis e

militares porque estes se sentiam ameaçados por um grupo específico – os comunistas.

Stepan destaca que da crise estrutural de 1961-1964 emergiu dois sentimentos

distintos entre grupos significativos de oficiais:

1. “havia alguns atores políticos importantes, tanto civis como militares, que eram

tão corruptos ou tão simpáticos ao comunismo que se tornavam participantes

ilegítimos do sistema e tinham de ser removidos da política

semipermanentemente.”;

2. “Um sentimento muito mais fundamental era que os sistemas econômicos e

políticos estavam tão profundamente conturbados que se faziam necessárias

mudanças radicais. Estas mudanças, acreditava-se, somente poderiam ser

realizadas por um governo militar em que muitos dos privilégios constitucionais

normais fossem suspensos por um período suficientemente longo para que se

completasse a reestruturação”141.

Skidmore observa, por último, que a derrota do veto militar à posse de Jango

decorreu da correlação de forças entre os militares e não da mobilização popular:

“Jango tornou-se presidente, não em virtude da pressão da esquerda, mas, sim, graças à divisão entre os militares, combinada com uma ampla base da opinião do centro, ansiosa por garantir a obediência ao processo constitucional”142.

Portanto, ao trabalharmos com este panorama político e a questão surgida em

torno da sucessão de Jânio e posse de João Goulart, o estudo das divisões nas Forças

141 Idem, p.124. 142 SKIDMORE, op. cit, p. 262.

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Armadas é fundamental. Com isso, encontramos a forma com que os militares

participavam da política e a sua importância para a resolução de graves crises, ora

“solucionadas”, ora precipitadas por intervenções militares.

Divisão dos militares em “partidos”

No período da “Crise da legalidade”, verificamos a divisão nas Forças Armadas,

pautada na questão golpistas versus legalistas, ou seja, aqueles que eram contra a posse

de Jango e aqueles que a defendiam. É durante a tentativa de encontrar uma saída para o

quadro de crise política resultante da renúncia de Jânio Quadros e da ação dos três

ministros militares, que vemos as disputas entre o partido (instituição) e os partidos

(legalistas versus golpistas).

Quanto a esta divisão dos militares em partidos, temos dois trabalhos a serem

destacados. Um deles é o livro de Alain Rouquié, Os Partidos Militares no Brasil143,

em que o autor propõe a divisão entre PARTIDO (instituição) e PARTIDOS (correntes

existentes nas Forças Armadas). O segundo trabalho foi escrito por Oliveiros S.

Ferreira. Em Vida e Morte do Partido Fardado144, o autor propõe a seguinte divisão:

Partido Fardado versus Estabelecimento Militar. Este diria respeito aos que agem em

torno da lei, ou seja, legalistas. O primeiro – Partido Fardado – é visto como um grupo

que não designa facção política e sua existência só seria verificada em momentos de

crise. Outra diferença nestas duas correntes, propostas por Oliveiros, é que o

Estabelecimento Militar é composto basicamente por generais e superiores; ficando o

Partido Fardado com o restante do quadro. Contudo, não utilizaremos esta proposta

desenvolvida por Oliveiros por não considerarmos a existência de determinados partidos

apenas em momentos de crise. Como veremos, temos um processo de construção destas 143 ROUQUIÉ, Alain. Os Partidos Militares no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Record, s/d. 144 FERREIRA, Oliveiros S. Vida e Morte do Partido Fardado. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, (Série Livre Pensar ; volume 3), 2000.

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correntes ao longo do tempo e um processo de identificação política e ideológica que

diz respeito ao papel do Estado no desenvolvimento da sociedade.

Neste momento, trataremos da questão da crise política vivida em 1961 a partir

dos grupos militares e da noção de partido militar.

O uso do termo partido militar tem como objetivo:

“ ... enfatizar as situações em que Exército e política se relacionam e as instâncias institucionais de inserção da política no aparelho militar (e vice-versa)”145.

Assim, entendemos que a intervenção das Forças Armadas no processo político

e seu comportamento se inscrevem em uma configuração triangular, em que coexistem

três conjuntos de agentes: civis, correntes militares e estruturas do comando supremo

(elevados escalões da hierarquia militar)146.

As correntes militares, tais como se definiram entre 1945 e 1964, tiveram sua

origem no decorrer do Estado Novo. As divisões seriam fruto de seus posicionamentos

quanto ao caráter dado à política de desenvolvimento industrial desenvolvido. Enfim,

foi em torno de assuntos como desenvolvimento econômico, organização política e

política internacional que se desenvolveram as divisões político-ideológicas e que se

organizaram as correntes militares.

Visando facilitar a nossa pesquisa, destacamos basicamente duas

correntes: os nacionalistas e os antinacionalistas. As divisões existentes no interior de

cada uma dessas correntes ainda devem ser avaliadas. O trabalho de José Murilo de

145 ROUQUIÉ, Alain. “Os processos políticos nos partidos militares do Brasil. Estratégia de pesquisa e dinâmica institucional”. In.: ROUQUIÉ, op. cit., pp. 9-26. 146 PEIXOTO, Antonio Carlos. “Exército e política no Brasil. Uma crítica dos modelos de interpretação”. In: ROUQUIÉ, op. cit., pp. 27-42.

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Carvalho147 divide os grupos em torno do nacionalismo e do comunismo, dividindo

estes dois eixos de conflito em três grupos:

1. Nacionalista direitista ou nacionalista anticomunista: apóia o

nacionalismo, mas tem opinião desfavorável ao comunismo:

“... os grupos militares antinacionalistas não se opunham à industrialização: eles eram contra a política de Vargas, com toda as suas implicações. O que não aceitavam nessa política era sobretudo a mobilização e a participação crescente da classe operária, além de uma política externa que se afastava da aliança privilegiada com os Estados Unidos. Para esses grupos, industrializar significava atrair o capital estrangeiro, reforçar os laços com os Estados Unidos, enquanto se mantinha a classe operária afastada do processo político”148

2. Nacionalista de esquerda: quanto ao nacionalismo se identifica com o

primeiro grupo, mas, por não aderir ao anticomunismo, se

afasta dos nacionalistas direitistas;

3. Cosmopolita de direita ou anticomunista: profundamente anticomunista e

não-nacionalista; 149

Ao estudarmos o período da Crise da Legalidade e o histórico das ações destas

correntes, destacaríamos ainda uma outra corrente, que não é citada por José Murilo.

Trata-se dos nacionalista-legalistas. Contudo, nos deteremos no detalhamento de tal

corrente no decorrer do capítulo.

147 CARVALHO, José Murilo. “Vargas e os militares”. In: PANDOLFI, Dulce (org.). Repensando o Estado Novo. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, s/d. 148 PEIXOTO, Antonio Carlos. “O Clube Militar e os confrontos no seio das Forças Armadas (1945-1964). In: ROUQUIÉ, op. cit., pp.71-113. 149 Uma quarta corrente é sugerida pelo autor. Trata-se dos Cosmopolitas Liberais, mas ela não chega a se concretizar.

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Além do aspecto econômico e político responsável pela divisão das correntes, o

fator ideológico também deve ser lembrado. José Murilo ressalta a importância dada ao

comunismo, mas o aspecto doutrinário especificamente militar também deve ser

considerado. Assim, a importância dada à doutrina de Segurança Nacional e a forma

como agir relacionada com esta também nos serve de parâmetro para entendermos estas

correntes. Os nacionalistas vêem a segurança vinculada à possibilidade de um

desenvolvimento fruto de recursos nacionais, sustentado pela mobilização popular e

afastado dos grandes centros de decisão do capitalismo internacional. Os

antinacionalistas entendiam que a divisão de mundo estava regida pela Guerra Fria e

acreditavam na doutrina criada pela Escola Superior de Guerra (ESG). Para este grupo,

o Brasil deveria buscar alianças com o “bloco ocidental”.

“O mundo conhecia tensões que transpunham as fronteiras nacionais. A segurança nacional devia levar em conta esse inimigo interno que se manifestava através da guerra revolucionária. Para enfrentar esse gênero de ameaças, a mobilização e a coesão das elites eram indispensáveis”150.

Nesta divisão de correntes e a relação desta com a formulação de uma doutrina,

temos os o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e a Escola Superior de

Guerra (ESG). A ESG era parte do aparelho militar e criou uma doutrina que serviu de

instrumento ideológico para os militares: a doutrina de segurança nacional. O ISEB, no

entanto, era subordinado ao Ministério da Educação. É visto como um aparelho

ideológico dos grupos civis e militares e não teve a mesma influência que a ESG no

interior das Forças Armadas151.

A estrutura autoritária do Estado Novo politizara o Exército, mas impedira o

desenvolvimento do debate político. Foram necessários o fim da ditadura de Vargas e o

150 PEIXOTO, “O clube militar e os confrontos...”, pp. 86-87. 151 Idem, cf. p. 87 e TOLEDO, Caio Navarro de. ISEB: Fábrica de Ideologias. São Paulo: Editora Ática, 2ª edição, 1982.

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processo de “redemocratização” para que as correntes militares pudessem expor suas

opiniões livremente. O debate destas correntes teria no Clube Militar um canal

privilegiado de confronto.

“A necessidade sentida por tais correntes de dar a conhecer à opinião pública seus pontos de vista e, assim, influenciar o processo político e os grupos e partidos civis impôs novos papéis ao Clube Militar”152.

Com o retorno de Getúlio Vargas ao poder em 1951, retornava também uma

orientação econômica nacionalista. No que diz respeito às correntes militares, os

nacionalistas, neste momento, ocupavam postos na hierarquia e controlavam as eleições

do Clube Militar.

A política implantada por Vargas era vista pelos grupos civis como uma ameaça

a seus interesses econômicos e para as instituições democráticas. Para depor Vargas, era

preciso que a corrente nacionalista fosse derrotada e que os cargos perdidos na

hierarquia fossem reconquistados pelos antinacionalistas. Para Antonio Carlos Peixoto

esta tarefa foi facilitada pela radicalização vivida pelo Clube Militar sob a presidência

de Estillac Leal (1950-1952)153. Este processo de radicalização se expressava nas

matérias publicadas pela Revista do Clube Militar, assim como no posicionamento do

Clube em relação a tais assuntos.

A corrente antinacionalista, para isolar a corrente adversária, a acusava de

infiltração comunista. Para combatê-la e vencer as eleições do Clube Militar, numa

tentativa de recuperar cargos de importância na hierarquia militar, os antinacionalistas

formaram a Cruzada Democrática e concorreram às eleições de 1952. Saíram vitoriosos

nesta e na eleição seguinte, ficando quatro anos na diretoria do Clube (1952-1956).

Contudo, a vitória desta corrente levou a uma revisão quanto à forma de fazer política

152 PEIXOTO, “O Clube Militar e os confrontos...”, p. 89. 153 Idem, p. 93.

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dos nacionalistas, principalmente a reexaminar suas alianças civis. O objetivo era

romper o isolamento e reconquistar posições154.

Neste momento de revisão e conquista de espaço – após o suicídio de Vargas em

agosto de 1954 –, os nacionalistas, mudaram sua postura, que era identificada com um

nacionalismo radical. Buscando a vitória de Juscelino Kubitschek e o apoiando na

tentativa de golpe em novembro de 1955, este grupo passou de um nacionalismo de tipo

radical – originário da sua construção ao longo do Estado Novo e fortemente vinculado

à Vargas – para um de caráter constitucional, de respeito às leis, ou seja, legalista. Para

evitar o impedimento da posse de Juscelino, ou seja, um golpe, o Movimento 11 de

novembro de 1955, liderado pelo general Henrique Lott, marcou a aproximação dos

nacionalistas vinculados a ele e o outro grupo nacionalista que havia passado por

mudanças e era identificado, então, com a defesa da legalidade. É desta forma que esta

corrente irá se identificar – como defensora da Constituição – durante todo o governo

JK155, estabelecendo uma aliança nacionalista-legalista. No Clube Militar, essa nova

“postura” é testada nas eleições de 1956. O grupo resultante da aliança entre

nacionalistas e legalistas vence e permanece na diretoria do clube até 1962, quanto

temos Goulart como presidente e um quadro político nacional bem diferente e resultante

de uma crise política causada pela renúncia do presidente Jânio Quadros.

“A retomada do Clube Militar pelos nacionalistas legalistas traz ao centro do debate a questão da defesa da democracia e da Constituição”156.

Neste mesmo processo de identificação, a ala reconhecida como antinacionalista

agora pode ser caracterizada como golpista. No interior das Forças Armadas, sua

propaganda refletia a luta de grupos civis contra o governo de Juscelino.

154 Idem, pp. 101-102, SODRÉ, op. cit., cf. p. 305. 155 PEIXOTO, “O Clube Militar e os confrontos...”, cf. p. 104. 156 Idem, p. 105.

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Com a chegada de Jânio Quadros à presidência da República, temos mudanças

na hierarquia militar e a corrente nacionalista é mais uma vez alijada dos postos

politicamente importantes. Vale ressaltar que, neste momento, o Clube ainda se

encontrava sob a direção dos nacionalista-legalistas. Contudo, “nem o governo Quadros,

nem a hierarquia militar poderiam tolerar que o Clube se tornasse um foco de

oposição”157.

A renúncia de Quadros apontou, como vimos para mais uma crise político–

militar. Quanto à ocupação de cargos importantes na hierarquia militar, durante a Crise

da Legalidade, temos a presença de militares ligados à Escola Superior de Guerra (ESG)

em postos estratégicos. Na chefia do Estado Maior das Forças Armadas, o general

Osvaldo Cordeiro de Farias; Gabinete Militar era chefiado pelo general Pedro Geraldo

de Almeida (indicado pelo primeiro); e, finalmente, a chefia do Gabinete da Secretaria-

Geral do Conselho de Segurança Nacional era exercida pelo coronel Golbery do Couto

e Silva158.

Quando os primeiros sinais de resistência ao golpe apareceram ainda em agosto

de 1961, a “junta golpista” – na expressão de Nelson Werneck Sodré – caminhou para a

violência. Odílio Denys ordenou a prisão do marechal Henrique Teixeira Lott, como

vimos no item anterior, e vários outros militares são detidos.

“Um grande número de oficiais do Exército, Marinha e Aeronáutica, de suas frações ‘nacionalistas’ que tinham em Lott sua principal liderança foram detidos, principalmente no Rio e em São Paulo (...). Ao invés da prisão, conheceram a cassação. São exemplos o general Ladário Pereira Telles e o coronel Jaime Neiva Monteiro, ambos substituídos em suas funções sediadas no Rio de Janeiro”159.

A perseguição a estes militares mostra que a coesão nas Forças Armadas era

fundamental para efetivar o golpe. Os ministros militares sabiam disto e, sendo assim,

157 Idem, p. 107. 158 LABAKI, op. cit., cf. p.32. 159 LABAKI, op. cit., p. 58.

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calar os opositores ao veto a Goulart era necessário160. Segundo Skidmore, a renúncia

de Jânio pegou os militares antigetulistas de surpresa. Sendo assim, não estariam

preparados para assumir o poder.

Quanto aos partidos militares e a relação com os civis, de um lado a direita,

comandada por Lacerda, acusava Jango de estar comprometido com os comunistas. Do

outro, o apoio da esquerda e do centro para que houvesse um retorno ao

presidencialismo. Contudo, o apoio essencial deveria vir dos militares. Esse apoio teria

vindo em função de promoções e transferências. Jango promoveu mais generais

nacionalistas a posições-chave de comando161.

O ministro da Guerra, marechal Denys, teria extravasado suas bases de apoio

dentro do Exército e, de acordo com Skidmore, não teria encontrado outra solução que

não o retrocesso para uma posição de compromisso162.

160 Idem, cf. pp. 58-59 e SKIDMORE, op. cit., cf. p. 260.. 161 Idem, cf. pp. 270-271. 162.Idem., cf. pp. 258-259.

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Capítulo 2 – A formação das chapas

Com o fim do Estado Novo e o estabelecimento de condições mais favoráveis

à ação política aberta, o Clube Militar se apresentou no cenário político nacional como o

locus de debate entre correntes que se formaram em torno de questões que ensejaram a

formulação de projetos de âmbito nacional, exercendo forte influência na opinião

pública. Assim, estudar o processo eleitoral do Clube e os pontos defendidos pelos

programas das chapas concorrentes é fundamental para compreendermos a lógica de

funcionamento dos “partidos militares” e a sua ligação com as disputas políticas do

meio civil.

A disputa pela diretoria do Clube Militar em 1962 é resultado de uma série de

acontecimentos que marcaram a vida política nacional e o histórico de disputas entre as

correntes militares e civis. Como já vimos, pode-se localizar o delineamento das

correntes na discussão sobre a exploração do petróleo em fins dos anos 1940 e início

dos 1950. Sendo o Clube o palco de defesa de pontos de vista diferentes, as eleições

para a sua diretoria refletiriam estas divisões, que, em boa medida, permaneceriam

como elementos constitutivos das linhas divisórias entre as correntes. Portanto, as

eleições de 1962 não podem ser estudadas sem que se faça um breve histórico das

disputas eleitorais da década de 1950.

A partir das eleições de 1950, começamos a identificar nos discursos dos

candidatos à diretoria do Clube um dos pontos que estará presente até a instauração do

regime militar em 1964: a politização das Forças Armadas. A Segunda Guerra Mundial

traria como resultado para o panorama político internacional um “sistema mundial dos

Estados, fundamentado no predomínio dos Estados Unidos e da União Soviética”163. Ao

mesmo tempo, o Nacionalismo apresenta suas nuances em diferentes regiões. Enquanto

163 LEVI, Lucio. “Nacionalismo”. In.: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 12ª. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2004, p. 805.

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na Europa temos um esquecimento deste, no Terceiro Mundo do pós-guerra as lutas de

libertação demonstrariam a sua nova fase.

“[O Nacionalismo] coloca no âmago da discussão o processo de desenvolvimento do Estado nacional do Terceiro Mundo. A afirmação do princípio nacional representa uma etapa necessária da história: possibilita a libertação dos povos, coloca os Estados em suas mãos e os torna protagonistas da política internacional.

(...)

“no Terceiro Mundo, onde o Nacionalismo parece ser a

tendência dominante, estão sendo percebidos os limites dos caminhos nacionais para o desenvolvimento e a independência política”164.

No Clube, as correntes dividir-se-iam conforme tais “tendências” do pós 2ª

Guerra Mundial. Enquanto por um lado temos uma ala que vê na aliança com um dos

eixos, no caso os Estados Unidos, a saída para o desenvolvimento; outra entende que o

desenvolvimento nacional viria do entendimento destes “limites dos caminhos

nacionais”. Contudo, devemos ressaltar que, como fruto da importância das Forças

Armadas no processo político ao longo do primeiro governo Vargas, estas mesmas

correntes também se identificariam com o Getulismo. Enquanto a ala que classificamos

como “antinacionalistas” é aquela que verifica a aliança com a liderança de seu

continente como um ponto favorável para o desenvolvimento e para a política nacional;

os identificados com a ala “nacionalista” sofrem forte influência do getulismo e de um

desenvolvimentismo pautado na política de Getúlio Vargas.

Em um discurso de campanha para as eleições de 1950, o general Oswaldo

Cordeiro de Farias, ligado à corrente antinacionalista, defende a tese de que o Clube

deveria ser apolítico, limitando-se ao atendimento das reivindicações de caráter

corporativo. Devemos lembrar que, naquele ano, uma séria discussão se deu em função

da publicação de um artigo na Revista do Clube Militar a propósito do conflito militar

164 LEVI, Lucio. IBID, pp. 805-806.

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que se desenrolava na Coréia. A guerra da Coréia se iniciou em 25 de junho de 1950 e

terminou em 27 de julho de 1953. Refletia, naquele momento, um dos muitos conflitos

do século XX pautados na lógica da Guerra Fria. A Coréia encontrava-se dividida,

conforme a influência das duas potências em disputa – Estados Unidos e União das

Repúblicas Socialistas Soviéticas –, em duas partes: Coréia do Norte e Coréia do Sul.

Em 1950, as duas potências iniciam uma disputa pelos territórios de influência da

Coréia. Em 3 de julho de 1950, a Coréia do Norte ataca a capital da Coréia do Sul, Seul.

A Organização das Nações Unidas (ONU) repudia o ataque e organiza uma ofensiva.

Seria o Exército norte-coreano, sob influência da URSS e República Popular da China,

contra os soldados organizados pela ONU. Segundo Nelson Werneck Sodré, a respeito

desta guerra:

“Estava o mundo diante de caso concreto de intervenção armada dos Estados Unidos em outro país, a Coréia, onde suas forças militares combatiam, antes mesmo de colocado o problema perante a ONU, embora, depois, alegasse que combatiam em nome da ONU. Tal intervenção, um dos atos mais caracterizados de brutalidade imperialista na seqüência dos muitos da ‘guerra fria’, vinha servindo como motivo de pressão sobre os países americanos, no sentido de que enviassem tropas à Coréia. Claro que os Estados Unidos não necessitavam de esforço militar. Pretendiam utilizar o conflito para submeter à sua vontade os países de sua órbita em que surgiam resistências à ação imperialista”165.

Em seu número 107, de julho de 1950, a Revista trazia, além do discurso de

posse do vencedor das eleições, o general Newton Estillac Leal, membro da corrente

nacionalista, um artigo intitulado “Considerações sobre a Guerra na Coréia”. O Clube se

colocava contrário ao envio de tropas brasileiras e à intervenção norte-americana no

conflito. O artigo é encarado pelos grupos antinacionalistas como uma forma de

intromissão dos militares na política e como uma “atitude subversiva”. Como resposta

da ala antinacionalista aos nacionalistas, afirma Nelson Werneck Sodré:

165 SODRÉ, Nelson. História Militar do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965, p. 312.

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“Como não havia o que punir, mesmo diante de qualquer regulamento militar (...), o consulado militar tomou decisão curiosa: transferiu para guarnições longínquas os oficiais que constituíam a diretoria do Clube Militar, recentemente escolhida em pleito livre e devidamente empossada, dissolvendo-a, praticamente. Essa arbitrariedade, consumada em defesa dos interesses dos monopólios norte-americanos, e quando se tratava no país a luta pela exploração petrolífera em bases nacionalistas, caracterizava claramente a posição assumida pelo governo do consulado militar. Era tarefa cometida pelo imperialismo e colocada em primeira urgência: destruir o Clube Militar como barreira nacionalista”166.

O uso do termo “Consulado Militar” por Nelson Werneck, diz respeito à alta

hierarquia do Exército, ou seja, sua cúpula. As intervenções dos militares na política

estão diretamente relacionadas com esta concepção de Sodré sobre a cúpula e a “massa

militar”, que seria o que restaria dentro da corporação. Segundo o autor, o “consulado

militar” estabelece suas alianças com “forças imperialistas”, sendo eminentemente

golpista. Enquanto isso, por representar o caráter mais “popular” das Forças Armadas, a

“massa militar” estaria identificada com as classes dominadas, representando seu caráter

de respeito às leis. Pautado nestas divisões, Nelson Werneck Sodré trabalha os conflitos

do Clube Militar de acordo com esta lógica. Contudo, sobre “a tarefa cometida pelo

imperialismo e colocada em primeira urgência: destruir o Clube Militar”, não

conseguimos encontrar, em nossas pesquisas, provas que corroborem esta afirmação de

Sodré.

Portanto, se o Clube naquele momento estava sob a direção da corrente

nacionalista, caberia aos seus adversários organizarem-se para que um resultado

vitorioso pudesse ser alcançado nas eleições seguintes. É de acordo com este tipo de

objetivo que se forma a Cruzada Democrática em março de 1952, visando as eleições

de maio daquele ano. No manifesto de sua formação, os membros fundadores deixavam

claro que a organização defendia a suspensão de “’atividades que afetem a ordem e a

166 Idem, p. 313.

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segurança internas’, bem como das ‘atividades que possam ser exploradas num sentido

político-partidário’ no interior do Clube Militar”167. Com isso, conforme a visão de seus

membros, o Clube estaria afastado das influências oriundas tanto da esquerda quanto da

direita. A Cruzada dirigiria o Clube de 1952 a 1956.

Sobre a formação da Cruzada Democrática, encontramos interessante artigo no

periódico nacionalista O Semanário:

"As forças antinacionais, frustradas em suas manobras, adotaram uma nova linha, a de dividir o Exército, cujo sentimento nacionalista conheciam. Foi assim que lançaram campanha visando confundir o nacionalismo com o comunismo, dentro dos termos da ‘guerra fria’ (...). Os objetivos eram claros: isolar e perseguir implacavelmente os militares que tivessem posição nacionalista ostensiva, acusando-os de comunistas; dividir o dispositivo militar que assegurara a posse de Vargas, lançando contra Estillac os outros generais, particularmente aqueles que pretendessem a cadeira ministerial; derrotados os nacionalistas do Clube Militar e apeado Estillac do Ministério, voltar as baterias contra Vargas e instalar o regime de força que lhes permitisse concretizar o entreguismo” 168.

Em seu Manifesto, visando as eleições de 1962 no Clube Militar, a Cruzada

Democrática negava que o Clube fosse um

“centro perturbador e agitador de reivindicações de classe e afirmando que a política nele estudada deveria incidir sobre o interesse nacional dentro de um nacionalismo racional, vigilante, em face de infiltração, manobras ou protelações de fundo capitalista e comunista”169.

De 1956 a 1960 os nacionalistas venceriam as disputas pela diretoria do Clube

Militar. Em função dos acontecimentos na política nacional, como o suicídio de Getúlio

167 LAMARÃO, Sérgio. “Cruzada Democrática”. In: ABREU, Alzira A. de e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). 2ª. ed. rev. e atualiz. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 2001, vol. II, p.1725. 168 “História Secreta da Cruzada Democrática”, O Semanário, Rio de Janeiro, 20- 26 de março de 1958. 169 PEDROSA, José Fernando de Maya. A Grande Barreira: os militares e a esquerda radical no Brasil, 1930-1968. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1998, p. 236.

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Vargas em agosto de 1954 e a “novembrada” de 1955170, liderada pelo general Henrique

Teixeira Lott, houve um enfraquecimento da corrente. Para as eleições de 1954, a chapa

nacionalista não apresentou candidato às eleições para a presidência do Clube e a

Cruzada Democrática se apresentou dividida. De um lado os que haviam articulado a

derrubada de Vargas, como os generais Canrobert Pereira e Juarez Távora, além da

oposição civil estruturada em torno da UDN. De outro, os que haviam estado ao lado de

Vargas, ou seja, os “seguidores” de Zenóbio da Costa, que fora Ministro da Guerra do

último ano de governo de Getúlio Vargas. Como não houve chapa nacionalista, duas

correntes distintas da Cruzada Democrática concorreram às eleições. Venceu grupo da

ala antivarguista que, naquele momento, era majoritário na Cruzada171.

Em 1955, a Cruzada, aliada à UDN e outras forças que participaram da

derrubada de Vargas, se opõem às candidaturas de Juscelino Kubitschek (Partido Social

Democrático, PSD) e João Goulart (Partido Trabalhista Brasileiro, PTB) às eleições

para presidente da República a serem realizadas em outubro. Juscelino era acusado de

corrupção e João Goulart de manter estreitas ligações com os sindicatos. A vitória

destes candidatos provocou reações e os adversários começaram a defender a idéia de

impedimento da posse dos dois, inclusive por meios extralegais. Em 11 de novembro de

1955, o general Lott172 liderou um movimento militar que tinha como objetivo “deter

uma conspiração em preparo no próprio governo então chefiado pelo presidente interino

Carlos Luz, devido ao impedimento de Café Filho por motivo de saúde, e de garantir a

170 TÁVORA, Juarez. “Interlúdio de decepções e desalentos”. In.: _____. Uma vida e muitas lutas. Memórias. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, Vol. 3 – Voltando à Planície, pp. 96-122. O autor se refere a “novembradas”. 171 LAMARÃO, Sérgio. op.cit. , cf. p.1726. 172 O general Henrique Batista Duffles Teixeira Lott foi indicado para o cargo de Ministro da Guerra no governo de Café Filho, logo após o suicídio de Vargas. Tal escolha se deu pelo fato deste militar ser reconhecido por “suas posições de intolerância a qualquer indisciplina militar”. Contudo, em função do quadro de crise político-militar à época, em função da posição contrária de alguns militares à posse de Juscelino, Lott, que defendia a Constituição e apoiava a posse do presidente eleito, deixou seu cargo em aberto a 10 de novembro de 1955 (“LOTT, Henrique”, verbete do Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro. Versão eletrônica). Para mais detalhes sobre o 11 de novembro, ver: CARLONI, Karla Guilherme. Forças Armadas e Democracia no Brasil: o 11 de novembro. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, 2005.

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posse de Juscelino e Goulart”173. Assim, o êxito do movimento provocou “um virtual

esvaziamento do poder”174 obtido pela Cruzada Democrática na área militar.

Nas eleições de maio de 1958, a Cruzada concorreu com uma chapa

encabeçada pelo general Humberto de Alencar Castelo Branco, mas foi derrotada pelos

generais Joaquim Justino Alves Bastos e Oromar Osório. Os periódicos ligados a uma

ou a outra ala faziam as campanhas a favor de uma ou outra chapa. Para que possamos

perceber como estes partidos militares se comportam em suas campanhas e no processo

de disputa pela diretoria do Clube, trataremos, a partir deste ponto e no decorrer deste

capítulo, como os membros de cada corrente nacionalista faziam acusações através da

imprensa nacional. O principal porta-voz dos nacionalistas é O Semanário. Durante a

campanha, o periódico apresentou artigos tratando da chapa nacionalista, da importância

das eleições e do Clube Militar, assim como a visão da Cruzada Democrática sobre a

política e a economia nacionais.

Em artigo intitulado Significado e importância do pleito de maio próximo175,

subtítulo “O que é o Clube Militar”, explica a origem do Clube, sua história e sua

importância no cenário político nacional e sua singularidade em relação aos clubes de

oficiais das demais forças:

“ao contrário dos seus congêneres, o Clube Naval e o Clube da Aeronáutica, aceita sócios de qualquer Força Armada e de qualquer procedência, bastando que comprove a situação de oficial. Isso não tem contrapartida: no Clube Naval só podem ingressar oficiais de Marinha, e assim mesmo de determinada procedência, aqueles que tenham cursado a Escola Naval. Por isso mesmo, enquanto um presidente do Clube Naval é eleito sempre com menos de mil votos (...), e no Clube da Aeronáutica as coisas são pouco mais ou menos do mesmo tipo, no Clube Militar ninguém chega à diretoria sem uma dezena de milhares de votos e os seus pleitos abalam o país.

Isso traz ao Clube Militar, que não é um Clube do Exército, mas um Clube das Forças Armadas alguns problemas, mas um aumento enorme de importância, e só isso tem permitido ao

173 LAMARÃO, op.cit., p.1726. Para mais detalhes sobre o 11 de novembro, ver: CARLONI, Karla Guilherme. Op. cit. 174 Idem. 175 O Semanário, Rio de Janeiro, 15-21 de Janeiro de 1958.

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grupo golpista apresentar, com a mobilização em massa de oficiais de Marinha e numerosa de oficiais da Aeronáutica, ligados à situação derrotada em 11 de novembro de 1955, uma porcentagem apreciável de votos. De outro lado, a expressão de uma vitória em eleições do Clube Militar tem sua importância multiplicada. Em torno do resultado do pleito, pois, gira a política nacional, nesta abertura do ano fundamentalmente político de 1958”176.

Com o objetivo de marcar, negativamente, a identidade da Cruzada

Democrática, o jornal apresenta um histórico da sua constituição:

“Nem dos primeiros documentos que difundiu a campanha em que se empenha, para retornar ao domínio do Clube Militar, a organização política conhecida como ‘Cruzada Democrática’ deu de si mesma uma definição lapidar: ‘A Cruzada Democrática foi, é e sempre será reação’. Este auto-atestado dispensaria, na sua tranqüila eloqüência confessional, qualquer explicação, e na realidade dispensa, mas apenas para os que lhe acompanharam, através do tempo, a trajetória, pontilhada de características que fornecem o conteúdo a que aquela definição tão bem corresponde. No momento em que a ‘Cruzada Democrática’ se lança à conquista de um dos objetivos preliminares de sua longa e nítida manobra. (sic) Convém recordar aquela trajetória e frisar aquelas ações, para que o público compreenda o caráter da campanha ora em curso em torno da renovação da Diretoria do Clube Militar, associação de classe em que se travaram algumas das mais expressivas lutas pela defesa do regime em que vivemos e em que ele nasceu, sob a égide de Benjamin Constant e de Deodoro da Fonseca, e também as lutas mais ásperas na defesa das soluções nacionalistas para os problemas brasileiros (...). Trata-se agora, como antes, de uma batalha entre nacionalistas e entreguistas. Estes agora disfarçados, uma vez que, com a verdadeira face, não teriam a mínima condição para se apresentarem diante de uma oficialidade hoje totalmente ganha para os princípios nacionalistas”177.

A composição da chapa da Cruzada Democrática para as eleições de 1958

indica a presença ativa de um oficial que se destacaria no processo político nacional na

década de 1960: o general Castelo Branco, primeiro presidente da República (1964-

1967), durante o regime militar. Este tipo de conexão se apresentaria também na eleição

seguinte. Em 1960 concorreria – e seria derrotado − a presidente do Clube pela Cruzada

Democrática o líder da chapa nacionalista nas eleições de 1962, general Pery Constant

176 Idem. 177 “A História Secreta da Cruzada Democrática”, O Semanário, 20-26 de março de 1958.

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Bevilaqua. A troca de campos é explicada por um dos filhos do general Bevilaqua 178,

que esteve ao seu lado em vários episódios de teor político, pelo seu envolvimento na

“Crise da Legalidade”. Nesta ocasião, Bevilaqua se opôs às atitudes dos ministros

militares, ligados à Cruzada Democrática, chegando a suspeitar que haviam tentado

prendê-lo. Data daí, ao menos publicamente, o seu surgimento como líder militar

identificado com o legalismo e nacionalismo,179 temas que se cruzariam, com

progressivo peso, na história ulterior do Clube Militar.

Nacionalismo

A questão do nacionalismo será entendida aqui como uma política a ser

adotada pelo Estado no que diz respeito ao desenvolvimento da economia brasileira, em

especial a sua relação com o capital estrangeiro. A divisão dos militares e as respectivas

identificações como “nacionalistas” e “antinacionalistas” se darão justamente em função

da defesa de uma ou outra forma de política.

O termo nacionalismo foi amplamente usado por ambas as correntes. Durante

os anos 1950, principalmente com a formação do Instituto Superior de Estudos

Brasileiros (ISEB), constrói-se uma “ideologia nacionalista” como diretriz para o

desenvolvimento do país. Os militares, por natureza institucional sensíveis aos apelos

nacionalistas, adotam o nacionalismo em seus discursos e em função dele classificam

seus rivais. Enquanto o grupo identificado pela UDN era acusado de ser

“antinacionalista” pela corrente que entendemos como nacionalista, esta era identificada

como “subversiva” e/ou xenófoba e/ou radical pelos “antinacionalistas”. É neste

momento que percebemos a construção de “nacionalismos” no meio militar. Enquanto

os oficiais ligados à Escola Superior de Guerra (ESG) se intitulavam “nacionalistas 178 Entrevista de Affonso de Escobar Bevilaqua à autora, em 16 de janeiro de 2008. 179 A respeito, ver: LEMOS, Renato. “O general juiz”. In: ____. (Org.). Justiça fardada: o general Peri Bevilaqua no Superior Tribunal Militar (1965-1969). Rio de Janeiro: Bom Texto, 2004.

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sadios”, estes acusavam os demais nacionalistas de “radicais”. Assim, no que diz

respeito ao nacionalismo e a sua relação com as correntes militares, poderíamos

percebê-las a partir do conflito de classificações recíprocas: nacionalismo radical versus

nacionalismo racional ou sadio.

Um exemplo disto pode ser visto nas eleições de 1952 para o Clube Militar. O

programa da Cruzada Democrática partiria da idéia de um “nacionalismo sadio”,

conforme os seguintes pontos:

“a. proposta de um nacionalismo sadio sem outras bandeiras repudiadas por nosso patriotismo; b. afastar o Clube das influências totalitárias da Direita e da Esquerda; c. fim de todas as atividades do Clube que afetem a segurança interna, os compromissos internacionais da nação brasileira que levem a assuntos explorados em um sentido político partidário; assuntos que provocam dissensões entre sócios”180.

Já a perspectiva nacionalista concorrente é bem exemplificada pelas idéias

veiculadas pelo periódico nacionalista O Semanário durante a campanha eleitoral de

1958. Em matéria intitulada “Contra a chapa da ‘Cruzada Democrática’ (Grupo

Eduardo - Amorim do Vale - Juarez)”181, apresenta-se a importância do pleito que

aconteceria em maio daquele ano.

“Este ano de 1958 abrirá, no Brasil, as lutas políticas decisivas. Tudo o que se digladia em nosso país, o que vai surgindo de novo e de forte, e o que vai declinando de novo e de forte, e o que vai declinando e desaparecendo, será lançado no palco, para uma decisão. Ora, se todos assistem e constatam a importância política do papel das Forças Armadas, − transcendendo a função de meras asseguradoras da ordem para se tornarem asseguradoras da orientação democrática e nacionalista que empolga nosso povo − é fácil verificar

180 TREVISAN, Leonardo. O que todo cidadão precisa saber sobre o pensamento militar brasileiro. São Paulo: Global Editora, 1985, pp.63-64. O artigo de Paul Manor, “La Cruzada Democrática. Un groupe militaire de pression de la droite libérale dans l’armée brésilienne, 1952-1962”. In.: Revue Française D’Histoire D’Outre-Mer. Tome LXVI – 1979, pp. 435-460), não nos apresenta informações diferentes das que encontramos na historiografia presente até o momento. 181 Brigadeiro Eduardo Gomes, ex-Ministro da Aeronáutica (1954-1955); Almirante-de-Esquadra (Reserva) Amorim do Vale, ex-Ministro da Marinha (1954-1955); e General Juarez Távora, ex-Chefe do Gabinete Militar da Presidência da República (1954-1955).

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a importância que assume o problema de sucessão da Diretoria do Clube Militar. A campanha para a referida sucessão começou com os primeiros dias de 1958 e se prolongará até a segunda quinzena de maio, quando as eleições da capital decidirão se aquele ponto destacado da vida política brasileira, mais do que simples associação de classe, permanecerá dominado pelas forças que defendem a ordem democrática e os princípios nacionalistas, ou passará, novamente, ao comando das forças da agitação, que fornecem a cobertura militar ao entreguismo”182.

As acusações entre estas correntes e a “disputa” pelo uso do termo

“nacionalista”, podem ser acompanhadas através das publicações de artigos deste

periódico. O pleito de 1958 foi divulgado e recebeu, inclusive, um artigo a ele

destinado: “A verdade sobre a eleição do Clube Militar. Em São Paulo, quem está

ganhando é a chapa amarela (nacionalista)” 183. A Comissão do Interior, da chapa

nacionalista (amarela), presidida pelo Cel. Breno Borges Fortes, solicitou divulgação de

nota contrária ao que fora anunciado em vespertinos anteriores a esta publicação, que

mencionavam vitória da Cruzada Democrática em São Paulo. Nesta nota, a chapa

amarela (nacionalista) foi vencedora no C.P.O.R. de SP, no 2º B.C. (Santos), no 17º

Regimento de Cavalaria (Pirassununga) e já tinha os votos da totalidade dos Oficiais da

Reserva de Caçapava (sede do 6º R.I.).

Destacamos: “Como a notícia veiculada pode ser um ardil para colher

elementos informativos, a Comissão do Interior deixa de divulgar maiores detalhes a

respeito”.

A coluna de Osvaldo da Costa, no mesmo periódico, apresentou o seguinte

título: “Do puxão de orelha de Lott na ‘Cruzada’ ao discurso do general Oromar

Osório”. Oswaldo da Costa se referia às declarações dadas por Lott, Ministro da

Guerra, a respeito das eleições do Clube Militar. Tudo isto em função de réplica ao

manifesto da corrente nacionalista. Membros da Cruzada Democrática divulgaram pela

“imprensa sadia” (escrito desta forma, inclusive com as aspas, no periódico) um

182 O Semanário, Rio de Janeiro, 15- 21 de janeiro de 1958. 183 O Semanário, Rio de Janeiro, 13- 9 de fevereiro de 1958, p.2.

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comunicado que objetivava distinguir o “verdadeiro nacionalismo” o da Cruzada

Democrática do “que anda por aí”184.

Defendendo os nacionalistas, Osvaldo da Costa afirmou que:

“A ‘Cruzada’ é uma sociedade secreta, sem existência jurídica, sem sede nem direção responsável, que só emerge da clandestinidade, que é o seu elemento, quando às eleições do Clube lhe dão asa de tentar dividir o Exército, por meio de intrigas e aleivosias (...). Um dos trechos do malévolo comunicado que o ‘Repórter Esso’ e a imprensa golpista se apressaram em divulgar de forma intensiva, diz que os companheiros de chapa do ilustre general Justino se eleitos, nada mais serão do que ‘a continuação da atual diretoria’, como se a atual diretoria, presidida por um militar de reputação ilibada como é o general Segadas Viana, fosse passível de qualquer suspeição infamante. [...]. O que, portanto, quer a ‘Cruzada’ (...) é, como sempre, dividir as Forças Armadas, quando o que todos nós, brasileiros, queremos, no fundo de nossos corações, é que elas se sobreponham ao faccionismo partidário dos grupos pontas-de-lança do golpismo entreguista, dos ‘salvadores’ fracassados se unam cada vez mais em torno da defesa intransigente dos interesses nacionais. Eduardo, Cordeirinho, Juarez e Pena Botto (...) não visam a isso, mas a conquistar posições políticas, pois de outra coisa não cuidam, um como patrono da UDN, outro líder do PDC, outro ainda como cristão novo do PSD e o quarto como ‘gauleiter’ da extrema direita reacionária”185.

Além disso, tratou da imprensa que apoiava a Cruzada Democrática e destacou

um artigo de João Neves da Fontoura em O Globo, em que exaltava a Cruzada “por seu

caráter apolítico, em nome das tradições realmente gloriosas do Clube Militar”. Osvaldo

Costa em afirmação com tom crítico à campanha “pró-Cruzada”, acusa João Neves da

Fontoura de “Comendador Marinho, teólogo da Mitra e astrólogo do Capital

Estrangeiro”, aludindo, claramente, à ligação dos membros da Cruzada e seus

defensores com o empresariado internacional. Para Osvaldo, o país já amadureceu

bastante politicamente e essas táticas utilizadas pela CD não teriam sucesso.

Sobre as caracterizações ligadas ao nacionalismo e ao antinacionalismo, o

artigo de “A História Secreta da Cruzada Democrática” identifica a origem política dos

184 Termos do comunicado e reproduzido em O Semanário. 185 O Semanário, Rio de Janeiro, 13-19 de fevereiro de 1958.

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membros deste grupo, assim como suas ligações “ideológicas”. Destacamos o seguinte

trecho:

“O golpismo que representava a frente política do entreguismo, cada vez mais audacioso, já que sua manobra ia triunfando em todos os lances, decidiu-se à conquista do Cube Militar. Ali instalado, faria o Ministro da Guerra o que lhe conviesse. Foi aí que surgiu a ‘Cruzada Democrática’. Para verificar as suas origens convém explicar que a utilização de uma cobertura militar para ações políticas, a longo ou curto prazo, foi sempre a linha natural das forças antidemocráticas que têm finalidade essencialmente antinacionais. A longa série de ditadores militares nas repúblicas latino-americanas assim se explica. No caso brasileiro, entretanto, pelas próprias peculiaridades da formação democrática do Exército, a utilização de uma cobertura militar jamais chegou a se apresentar como completa, e o seu tipo mais próximo, o General Eurico G. Dutra, não teve condições para se demonstrar um produto acabado como Trujilo ou Odria, ou Jimenez. A articulação de uma cobertura militar para fins políticos e econômicos mais ou menos clandestinos, ou pelo menos escondidos, levou, no caso brasileiro a uma divisão no seio do Exército: de um lado estaria uma cúpula, constituída em torno dos órgãos de comando, controladora das ações e fiscalizadora da organização militar; de outro lado, a massa de oficiais, distribuída pelas guarnições e em tudo dependente daquela cúpula. Tal cúpula tendeu sempre a fechar-se, para selecionar rigorosamente seus elementos, para empolgar as vantagens e para enquistar-se e perpetuar-se nas funções-chaves, de onde se distribuem promoções, transferências, condecorações, viagens ao estrangeiro, cursos, etc. Dominando a cúpula, com um mínimo numérico, ficava dominada a organização. Desde logo, no nosso caso, a cúpula denunciou, na prolongada permanência do General Eurico Gaspar Dutra no Ministério da Guerra (sete anos), articulando o golpe de 1937 e fazendo da máquina militar uma propriedade particular; na prolongada permanência do General Fiúza de Castro no Estado-Maior do Exército (seis anos), articulando o golpe de 24 de agosto e apresentando-se para ser Ministro da Guerra na tarde de 10 de novembro de 1955 (por coincidência?); na permanência de elementos especiais, como os Generais Canrobert Pereira da Costa, Juarez Távora, Oswaldo Cordeiro de Farias, Alcides Etchegoyen em funções outras da cúpula, Ministério da Guerra, Escola Superior de Guerra, etc., de onde podiam agir em segurança”186.

A divisão existente entre os militares e a ocupação de postos de importância na

estrutura do Estado e no comando do Exército refletem os papéis ocupados pelos

membros de cada partido militar. A caracterização de uma ou outra corrente como

nacionalista ou não, implica a defesa de idéias voltadas para o desenvolvimento deste

186 O Semanário, Semana de 20 a 26 de março de 1958 (Ano III – nº 101).

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Estado, entendido pela ala nacionalista como independente do capital internacional e

com princípios democráticos.

Neste mesmo artigo, a Cruzada sofre a seguinte acusação:

“... apresenta-se como nacionalista e legalista, e afirma a sua fidelidade ao regime, e define-se fugindo à oposição. Trata-se, sem dúvida, de hábil manobra destinada a iludir os últimos incautos e a explorar os sentimentos democráticos e nacionalistas da oficialidade que jamais viu um elemento da ‘Cruzada Democrática’ envolvido em qualquer ação de defesa do ponto de vista nacionalista, mas viu todos eles acirrados na perseguição aos elementos que se caracterizavam como defensores daquele ponto de vista, acusados de comunistas e levados à difamação, aos processos e às prisões por isso. E são os golpistas de 29 de outubro, de 24 de agosto e das vésperas de 11 de novembro que, agora, apresentam-se com a fantasia legalista, como se os oficiais fossem desmemoriados.”

A auto-identificação com alguma das variantes do nacionalismo era, portanto,

geral. Os membros da ESG também se intitulavam nacionalistas.

“... os adeptos da fórmula da ESG se apresentavam como nacionalistas – desenvolvimentistas. Isto é, partilhavam da idéia de que para realmente sermos independentes precisamos ser fortes; para sermos fortes, precisamos de tecnologia, de insumos, capitais. Daí o sentido do vínculo. Depois, quando desenvolvidos, seríamos realmente independentes”187. “... a Escola dispensava a visão da luta de classes e, em seu ideário liberal, definia o nacionalismo de forma menos dogmática.

(...) “A ESG, comunidade reconhecidamente nacionalista, adotou uma ideologia ocidentalista, liberal; portanto, antimarxista e empenhada na estratégia dos países ocidentais, por uma questão de alianças e opção ideológica e política”188.

Criada em 22 de outubro de 1948, a Escola Superior de Guerra era

subordinada à Presidência da República através do Estado Maior das Forças Armadas

(EMFA)189. Entre os objetivos da sua criação estava o de se “tornar a agência

187 TREVISAN, op.cit., p. 59. 188 PEDROSA, José de Maya. Op. cit., p. 250. 189 Criado em 1º de abril de 1946 como um órgão de assessoramento do Presidente da República sob o nome de Estado-Maior Geral, tendo sua instalação definitiva em 8 de novembro daquele mesmo ano. O

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socializadora das elites brasileiras, militares e civis”190. A Escola apresentou, ao longo

da sua história, quatro tipos de cursos: o curso superior de guerra, destinado a civis e

militares; o curso de comando e estado-maior, privativo aos oficiais das três forças;

curso de mobilização e curso de informações, que, de acordo com Barros e Chaves,

foram interrompidos. O que nos interessa neste ponto é o curso destinado a civis e

militares, no qual atuavam, além do corpo permanente de professores, conferencistas

externos à Escola, que proferiam palestras sobre temas ligados às suas especialidades.

Estes conferencistas eram importantes ligações dos militares com o meio civil.

Durante os anos que antecederam o golpe de 1964, a ESG teve um papel

importante. O período de 1952 a 1956 foi o que começou a concentrar, na ESG, oficiais

que teriam um papel importante nas crises político-militares do período 1961-1964, no

golpe de 1964 e nos primeiros anos do regime ditatorial a partir deste estabelecido.

Conforme Barros e Chaves, “os três principais atores militares do governo do marechal

Humberto Castelo Branco eram oriundos da ESG”191.

Se ao lado dos militares “antinacionalistas” temos a ESG e sua influência na

política nacional, os nacionalistas teriam no ISEB um papel importante no

desenvolvimento de estudos do nacionalismo. Como lembra Daniel Pécaut, os

intelectuais do ISEB visavam formular o “sentimento das massas”, assumindo a tarefa

de inventar uma ideologia que levaria à “revolução brasileira”192. Para que possamos

compreender melhor a inserção deste Instituto no cenário político nacional, devemos nome de Estado-Maior das Forças Armadas foi dado conforme Decreto-Lei 600-A, de 1948. Em abril de 1969 o EMFA encerrou suas atividades no Rio de Janeiro. Desde junho de 1970, o EMFA desfruta de “honras, direitos e prerrogativas dos ministros de Estado”. Com a criação do Ministério da Defesa, em 10 de junho de 1999, os ministérios militares foram suprimidos e o EMFA cedeu lugar ao Estado-Maior da Defesa “Estado- Maior das Forças Armadas (EMFA)” In: ABREU, Alzira A. e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Rio de Janeiro: Editora da FGV, versão eletrônica. 190 BARROS, Alexandre e CHAVES, Luís Guilherme Bacelar. “Escola Superior de Guerra (ESG)”. In: ABREU, Alzira A. e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Rio de Janeiro: Editora da FGV, versão eletrônica. 191 Sobre os três principais atores políticos de Castelo Branco: “o próprio Castelo, Golberi do Couto e Silva e Ernesto Geisel”. BARROS, Alexandre e CHAVES, Luís Guilherme Bacelar. “Escola Superior de Guerra (ESG)”. In: ABREU, Alzira A. de e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Rio de Janeiro: Editora da FGV, versão eletrônica. 192 PÉCAUT, Daniel. Os Intelectuais e a Política no Brasil. Entre o Povo e a Nação. São Paulo: Ática, 1990, p.104.

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destacar sua periodização sugerida por Caio Navarro de Toledo e Daniel Pécaut. De

acordo com estes autores, o ISEB pode ser dividido em fases, no que diz respeito à sua

produção e participação política. Uma primeira fase estaria localizada entre o ano de sua

criação, ou seja, 1955, até o ano de 1958. Esta primeira fase seria caracterizada pela

manifestação das posições ideológicas de seus diversos componentes. A segunda fase

teria início em 1958-59, quando temos uma ideologia hegemônica no interior do ISEB:

o nacional-desenvolvimentismo. Por fim, a terceira e última fase teria um caráter mais

político e de “radicalização”, já que os intelectuais que permaneceram no ISEB se

ligaram aos movimentos relacionados com as reformas de base do governo João

Goulart193.

O ISEB, até 1958, conservou-se como um centro de estudos e era considerado

por Juscelino Kubitschek uma Instituição com o objetivo de formar inteligências para o

desenvolvimento. A partir de 1958, o Instituto entra em sua segunda fase, voltado para

uma reflexão mais teórica sobre a conjuntura e visando exercer algum tipo de influência

sobre organizações nacionalistas. É neste período que temos a organização de cursos

para militares nacionalistas194. Em carta de três páginas e datada de 1959195, Roland

Corbisier, convida Oswaldo Aranha (...) para proferir uma conferência no Instituto

sobre o tema “Problemas da Política Exterior Brasileira”. Oswaldo Aranha já havia

contribuído oferecendo, em 1958, palestras em curso semelhante196. Diz Corbisier:

“Tenho o prazer de comunicar a V. Exa. que o Instituto Superior de Estudos Brasileiros está realizando, como parte de suas atividades programadas para o corrente ano, um curso extraordinário de ‘Introdução aos Problemas Brasileiros’, especialmente destinado à oficialidade de nossas Forças Armadas.

193 PÉCAUT, op. cit., cf. pp.107-113 e TOLEDO, Caio Navarro. ISEB. Fábrica de Ideologias. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2ª Edição, 1997, cf. pp.203-210. 194 PÉCAUT, op. cit., cf.pp.110-112. 195 Acervo FGV/CPDOC, Arquivo Pessoal de Oswaldo Aranha: OA cp 59.05.14. 196 Conforme a fonte obtida no site do CPDOC/FGV, o curso de 1959 estava em sua segunda edição. Infelizmente não temos mais nenhum arquivo que indique como se davam os cursos e suas respectivas datas.

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A primeira palestra dessa série de conferências, ‘Cultura e Desenvolvimento’, foi proferida pelo Diretor do ISEB e a conferência de encerramento será pronunciada por S. Exa. o Sr. Presidente da República que falará sobre ‘O Programa de Metas e o Desenvolvimento Nacional’.

Estão inscritos no referido Curso 221 militares, sendo Coronéis – 3; Tenente-Coronéis – 2; Majores – 36; Capitães – 64; 1º Tenentes – 95; e 2º Tenentes - 21.”197

Embora não tenhamos dados para avaliar a significação percentual, no

universo militar, da presença desses oficiais, os números absolutos são indicativos de

uma aproximação importante do ISEB com militares, principalmente de média e baixa

patentes. Os temas tratados neste curso podem ser considerados, aqui, como ligados a

assuntos estratégicos e de interesse nacional. Em anexo à carta enviada a Oswaldo

Aranha, Corbisier anexa a agenda do curso com os respectivos temas a serem tratados198

naquele ano. Em todas as conferências, intelectuais, do Instituto ou não, tratavam de

temas relacionados com suas especialidades. Portanto, vemos a participação de militares

na construção de um projeto de desenvolvimento nacional.

No documento, Corbisier ressalta a importância do curso e informa também a

programação das conferências, conforme o documento em anexo. Ao tratarmos a

relação do ISEB com o Estado e a sua relação com os militares, percebemos uma

ligação com os militares nacionalistas, como visto no documento destacado acima, de

autoria de Corbisier. A exposição desses temas, tratados em cursos voltados para

militares, demonstra as articulações dos militares com membros do Instituto199.

A Revista do Clube Militar (RCM) também serve como um “termômetro” do

envolvimento dos militares em assuntos estratégicos de interesse nacional. Como

destaca Lúcio Flávio de Almeida,

197 Acervo FGV/CPDOC, Arquivo Pessoal de Oswaldo Aranha: OA cp 59.05.14-1. 198 OA cp 59.05.14-3. Ver documento em anexo. 199 ALMEIDA, Lúcio Flávio Rodrigues de. Uma ilusão de desenvolvimento: nacionalismo e dominação nos anos JK. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2006, cf. p.149.

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“... sugiro especial atenção para o editorial da RCM n. 152, já em pleno governo JK, intitulado ‘Nosso Futuro’. Nele se considera de ‘vanguarda’ o papel desempenhado pelas Forças Armadas no processo de industrialização do Brasil. Além de os militares fazerem política, sabiam que o faziam, eram percebidos como atores políticos e, não poucos, reivindicavam um papel dirigente na política brasileira”200.

Quando tratamos destas instituições, ISEB e ESG, e sua relação com as

correntes, temos:

“De um lado, a Escola Superior de Guerra; de outro, o ISEB; eis duas instituições que, cada uma a seu modo, colocaram sob a responsabilidade do Estado a incumbência de fabricar uma nação, e perverteram a imagem dos intelectuais associados à elaboração se seu corpus doutrinário”201.

Em suas primeiras turmas, o ISEB teria seus alunos recrutados principalmente

entre diplomados que já exerciam atividade profissional, dentre estes, alunos militares.

Em um segundo momento é que o Instituto recrutaria seus alunos entre estudantes

universitários. Assim:

“Era, portanto, um núcleo de intelectuais dispondo de um estatuto oficial e convidados pelo próprio poder senão para intervir diretamente na gestão da política econômica, pelo menos para participar da construção da nova legitimidade, colocando-se a serviço da criação da síntese nacional-desenvolvimentista. Nesse sentido, foram chamados a completar a obra dos responsáveis pelas decisões econômicas, ressaltando-lhe o alcance político e social”202.

Cabe lembrar que o ISEB foi concebido na época como o equivalente civil da

Escola Superior de Guerra203. No que diz respeito à formação das elites, as duas

instituições rivalizavam. Enquanto a ESG tentava atrair civis para seus quadros, o ISEB

empenhava-se no recrutamento de militares. Os intelectuais da direita percebiam no

200 Idem, ibidem. 201 PÉCAUT, op.cit., p.121. 202 Idem, p.110. 203 Idem, ibidem.

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ISEB uma aproximação entre getulistas e comunistas204. Antônio Carlos Peixoto atenta

para o fato de que o ISEB, ao contrário da ESG, não fazia parte do aparelho militar e

que não teve no interior das Forças Armadas a mesma influência exercida pela ESG.

Assim:

“Os grandes teóricos do nacionalismo são encontrados fora das Forças Armadas, e o aparelho ideológico dos grupos nacionalistas civis e militares – o ISEB (...) – jamais teve no interior das Forças Armadas uma influência e um poder comparáveis aos da ESG, tanto mais porque a ESG fazia parte do aparelho militar, ao passo que o ISEB estava subordinado ao Ministério da Educação”205.

Ainda assim, os vínculos entre militares nacionalistas e o ISEB foram estreitos

o suficiente para dar forma a uma política eficaz que foi importante no processo de

desenvolvimento brasileiro ao longo dos anos de JK206. O peso do nacionalismo –

corporificado na aliança entre militares e intelectuais no âmbito do ISEB − como eixo

das disputas entre as correntes militares é a chave para a compreensão das eleições de

1962 no Clube Militar.

As chapas e seus programas207

Para as eleições de 1962 para a diretoria do Clube Militar, previstas para 16 de

maio de 1962, inscreveram-se duas chapas: “União” e “Confraternização”. A primeira

chapa tinha como candidato à presidência do Clube o general Pery Constant Bevilaqua e

204 Idem, p.111. 205 PEIXOTO, Antônio Carlos. “O Clube Militar e os confrontos no seio das Forças Armadas (1945-1964)”. In: ROUQUIÉ, Alain. Os Partidos Militares no Brasil. Rio de Janeiro: Record, s/d. 206 ALMEIDA, Lúcio Flávio Rodrigues de, op.cit., p.180. 207 Devemos ressaltar que por termos nosso trabalho voltado para o estudo de militares nacionalistas esta declaração é problemática, porque a proposta da dissertação é discutir a eleição de 1962 e sua projeção para 1964, o que faz da chapa Magessi tão importante quanto a chapa Pery. Se há tal desequilíbrio de fontes, é necessário alterar o título, ou, ao menos o subtítulo, indicando que o foco estará na chapa nacionalista. Nos basearemos, fundamentalmente, no acervo que se refere à chapa União, do general Pery Bevilaqua. A outra chapa, do general Magessi, foi trabalhada conforme a nossa disponibilidade de fontes e documentação presente no Clube Militar e no Museu Casa de Benjamin Constant.

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general Silvino Castor da Nóbrega como candidato à vice-presidência. A chapa

concorrente era encabeçada por Augusto da Cunha Magessi, candidato à presidência, e

general Armando Noronha para a vice-presidência. Entendemos aqui que os candidatos

da chapa União eram os representantes do que entendemos por nacionalistas, enquanto

Magessi e Noronha representariam a ala “antinacionalista” das Forças Armadas.

Portanto, tentaremos construir aqui o processo pelo qual se deu a conformação das

chapas e seus respectivos programas.

A questão a ser colocada aqui é que tipo de membro poderia se candidatar a

uma vaga na diretoria do Clube e montar uma chapa para candidatar-se ao pleito. O

Estatuto do Clube Militar, ao tratar das eleições em seu Art.52, estabelece que:

“Os cargos da Diretoria, do Conselho Deliberativo, do Conselho Fiscal e dos Diretores dos Serviços Especiais são providos, mediante eleição, em que só tomarão parte os sócios efetivos do Clube, em sessão ordinária da Assembléia Geral especialmente convocadas para esse fim”208.

Percebemos, então, que apenas os sócios efetivos participavam do processo

eletivo do Clube. Assim, quem poderia ser considerado um sócio deste tipo em sua

admissão ao Clube?

Conforme o Estatuto do Clube Militar, só poderiam ser admitidos como sócios

daquele clube:

“1) Os oficiais da ativa, da reserva de primeira classe e reformados das Forças Armadas;

2) Os aspirantes a oficial e os guarda-marinha. §2º. Serão assemelhados ao sócio efetivo os Ministros do

Superior Tribunal Militar, Auditores, representantes do Ministério Público e funcionários civis do Ministério da Guerra que possuírem honras ou graduações militares, e os oficiais da Reserva da 2ª classe das Forças Armadas, enquanto convocados;

§3º. São sócios afins as pessoas de família e as dependentes do sócio efetivo, honorário ou benemérito, por ele inscritas. As pessoas da família conservam a condição, quando falecer o sócio.

208 Estatuto do Clube Militar, aprovado pela Assembléia Geral Extraordinária de 6 de outubro de 1947. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro – Brasil. O Estatuto teria uma nova edição, com modificações, no ano de 1968.

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§4º. São sócios honorários os oficiais estrangeiros a serviço do seu país no Brasil, bem como aqueles que o Clube julgar merecedores desta homenagem.

§5º. São sócios beneméritos os que assim forem julgados pelos relevantes serviços prestados ao Clube.

§6º. O sócio efetivo que se demitir das Forças Armadas continuará como tal enquanto lhe aprouver”209.

Acima, vimos a composição do quadro de sócios do Clube e o tipo de militar

que era admitido no Clube. O que notamos é que o Clube era voltado para a

oficialidade, estando os demais militares afastados do processo decisório da política que

se fazia no Clube Militar, sendo obrigados a formarem suas próprias agremiações –

como os clubes destinados a subtenentes, sargentos e sub-oficiais das três armas. O

Estatuto dos Militares estabelece a hierarquia das três Forças (Exército, Marinha e

Aeronáutica) e, assim, para o Exército os militares classificados como praças são, em

ordem decrescente: subtenente, 1º sargento, 2º sargento, 3º sargento e cabo. Os soldados

viriam em último lugar da hierarquia. Para a Marinha, são praças graduados: sub-

oficial, sargento ajudante, 1º sargento, 2º sargento, 3º sargento. Marinheiros, soldados,

grumetes e taifeiros compõem o último grau de hierarquia. Por fim, o quadro da

Aeronáutica de praças graduados: sub-oficial, 1º sargento, 2º sargento, 3º sargento,

cabo, soldado e taifeiro graduado. Soldados de 2ª classe e taifeiros encontram-se na

“base” da hierarquia210. À sub-oficialidade não caberia espaço para colocar-se em

questões da política nacional no âmbito do Clube Militar.

No processo de composição das chapas temos a construção destas a partir da

união de membros defensores de uma forma ou outra de fazer política e, da mesma

forma, a defesa de seus programas. A escolha do General Pery Bevilaqua para a chapa

Nacionalista se deu em agosto de 1961, por defender uma política clara de não

alinhamento no quadro internacional. O Clube Militar estava, na opinião dos

nacionalistas, “nas mãos de um grupo [que parecia] “tremendamente reacionário”, após

209 Estatuto do Clube Militar, op.cit. 210 Ministério da Guerra. Estatuto dos Militares. SGMG, Rio de Janeiro: Imprensa Militar, 1946.

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Oromar e outros diretores nacionalistas pedirem demissão. Assim, segundo Sisson, Pery

deveria ser indicado para concorrer às eleições do Clube e informa na carta que o

motivo maior para escrevê-la é que ele é partidário da candidatura de Pery Constant

Bevilaqua para a presidência. Justifica:

“É isso porque é o general a única personalidade que agora nos convém. Não vai atrás nem de Washington nem de Moscou, é um nacional progressista sincero” 211.

Pery contava com o apoio da ala nacionalista, não apenas de Sisson. Isto fica

claro em “uma reunião de próceres eleitorais do Clube, nacionalistas”, em que todos

foram favoráveis ao nome do General212. Em diversos documentos trabalhados no

Museu Casa de Benjamin Constant, vimos correspondências de outros oficiais213 com o

general Pery Bevilaqua, tratando da alegria daqueles que escreviam sobre a escolha de

Pery para ser o candidato da chapa representante dos nacionalistas para a eleição do

Clube, em 1962214. Cabe destacar um rádio enviado pelo general Pery ao almirante

Paulo Mário Cunha Rodrigues :

“ACEITAREI CANDIDATURA VG DESDE QUE POSSA REPRESENTAR UNIÃO CORPO SOCIAL IDEAIS NACIONALISTAS VERDE AMARELOS E NÃO HAJA DISCRIMINAÇÃO CHAPAS AZUL E AMARELA DE OUTROS PLEITOS ANTERIORES VG CONFORME TERMOS MEU TELEGRAMA HOJE COMANDANTE SISSON PT”215.

211 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Constant Bevilaqua (PCB), Série Temas Diversos (TD), Dossiê Clube Militar (3), documento PCB/TD/3/48, 16-08-1961. Roberto Sisson era oficial de Marinha e teve ligação com o PCB em 1945. Criou, no Clube Militar, a Associação Benjamin Constant, Deodoro e Floriano (ABCDF) para promover conferências visando defender os ideais históricos destes personagens da política nacional. Mais detalhes, ver: COUTINHO, Amélia. “Roberto Sisson”. In: ABREU, Alzira A. de e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Op. cit. 212 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/50, 09-11-1961. 213 Como o Tenente-coronel Walter Almeida (PCB/TD/3/52) e o Almirante Paulo Mário da Cunha Rodrigues (PCB/TD/3/54). Não é possível um número exato de oficiais que tenham apoiado a candidatura de Pery em função de termos nosso acervo a respeito limitado exclusivamente, ao arquivo pessoal do General Pery Bevilaqua. 214 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/52, PCB/TD/3/53, PCB/TD/3/555 e PCB/TD/3/56. 215 PCB/TD/3/54. Não podemos aqui identificar o número do rádio devido à qualidade do original.

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Durante o processo de formação de chapas para o Clube Militar, estas são

identificadas por cores. Tradicionalmente, os nacionalistas foram associados à “chapa

amarela” e a Cruzada Democrática, à “chapa azul”.

Com o nome do candidato a presidente escolhido para a chapa amarela,

caberia agora indicar os nomes que iriam compor esta chapa. Para a escolha dos cargos

a serem ocupados na futura diretoria, uma Comissão Nacionalista do Clube entra em

contato com Pery, em 15 de dezembro de 1961. Este grupo viajaria para Porto Alegre a

fim de consultá-lo sobre os nomes por ele escolhidos. O nome que merecia destaque, na

visão da Comissão era para o cargo de Diretor Secretário porque se tratava, sem dúvida,

do posto de braço direito da presidência. Para isso, o candidato a este cargo deveria ser

“naturalmente bom e fiel nacionalista e democrata” 216.

Pery, como líder da chapa nacionalista, começa a se corresponder com outros

militares desta mesma corrente, visando discutir os pontos do futuro programa desta

chapa. Em carta de 16 de dezembro de 1961217, encaminhada ao almirante Paulo Mário

da Cunha, Pery trata do programa da chapa União que concorrerá às eleições do CM em

1962. A respeito do programa, destaca a necessidade de entender e buscar soluções para

os problemas nacionais. Contudo, o “sentido autenticamente nacionalista [...] deve

presidir a direção dos negócios públicos”. O programa, em seu conteúdo, apresentava

também “a condenação dos extremismos numa inequívoca profissão de fé legalista”.

Destaca o papel do Clube no cenário político nacional:

“A opinião do Clube Militar em problemas nacionais de elevada importância política será sempre um vetor moral positivo na formação de uma esclarecida opinião pública...

(...) A ‘Sã Política, Filha da Moral e da Razão’, segundo o conceito lapidar de José Bonifácio, não nos é vedada dentro do Clube Militar

216 Não encontramos referências que esclarecessem a escolha de Pery pela indicação de Montenegro no lugar de Bitencourt. 217 Museu Casa de Benjamin Constant, PDB/TD/3/61, 16-12-1961.

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― que tem uma honrosa origem política, (Abolição e República) ―, e sim a política partidária, que é, por natureza, divisionista”218.

Pery ressalta que a Abolição e a República foram os ideais que empolgaram a

geração fundadora do Clube. O Nacionalismo, naquele momento em que escreve,

“pode constituir o ideal que venha a unir os patriotas esclarecidos da geração a que pertencemos e da que de nós proveio e que sonham com a emancipação econômica do Povo Brasileiro, com o fortalecimento de suas instituições políticas ― democráticas e republicanas ― por via de evolução, dentro dos quadros legais, sem sacrifício da liberdade, portanto: o progresso como desdobramento da ordem (...)”219.

Ao tratar da construção do programa, Pery ressalta a questão nacionalismo X

comunismo. O candidato da chapa nacionalista lembra que alguns indivíduos “alugados

aos trustes petrolíferos”, procuram confundir o comunismo com o “são nacionalismo”.

Expressando o que entende-se por nacionalismo são, Pery esclarece:

“O nosso nacionalismo autenticamente brasileiro, visa exclusivamente os interesses e o bem do Brasil, sem prejuízo do nosso sentimento pan-americanista; é defensivo e não hostil ou feito para favorecer interesses outros. Os interesses do Brasil são os únicos que nos preocupam”220.

Quanto ao programa da chapa, ele afirma que visava criar um programa

construtivo, “definitivamente legalista e de unidade democrática nacionalista,

anticomunista e antifascista, isto é, anti-extremista”221. Traçando, assim, a linha de ação

para a organização da chapa:

218 Museu Casa de Benjamin Constant, PDB/TD/3/61, 16-12-1961. 219 Idem. 220 Idem. 221 Idem.

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1. Divulgação do programa da chapa;

2. Coleta de adesões de consócios residentes no Rio de Janeiro e Niterói (listas

colocadas durante duas semanas nas portarias dos Clubes Militar, Naval e da

Aeronáutica e outros locais);

3. Constituição, mediante escolha feita por Pery Bevilaqua, de uma comissão

partidária de seus sócios, dois de cada uma das três Forças, e ligados às antigas

correntes que se distinguiram pelas cores de suas chapas (Azul e Amarela),

para o fim especial de organizar a chapa União. As decisões da Comissão, por

ele presidida, seriam tomadas por maioria de votos, assegurando-se a cada um

de seus membros o direito de veto.

O programa da chapa era visto por Pery como sendo caracterizada pelo

“nacionalismo democrático”222. Em uma reunião da Associação Benjamin Constant,

Deodoro e Floriano (ABCDF), Pery ressaltou o conteúdo e os propósitos da chapa

União. Afirmou que o Estatuto do Clube seria seguido à risca e destaca o Art. 20 do

Clube Militar, que estabelece que “O Clube Militar conservar-se-á estranho à matéria de

religião e de política partidária, sendo vedada a cessão de suas dependências para

reuniões dessa natureza”223. Porém, Pery Bevilaqua atenta para o fato de que

“Esse dispositivo, entretanto, não se opõe a que o corpo social se interesse pelos problemas fundamentais do Brasil (...). É preciso não confundir problemas nacionais e política partidária. Todos os itens do novo Programa se harmonizam perfeitamente com a finalidade estatutária de nossa entidade de classe, que é uma entidade civil com responsabilidade definida em lei; não constitui anexo ou dependência de qualquer órgão da administração pública, civil ou militar”224.

222 Museu Casa de Benjamin Constant, PDB/TD/3/71 a 73, [1961]. 223 Estatuto do Clube Militar, op.cit. 224 Museu Casa de Benjamin Constant, PDB/TD/3/84, 03-02-1962. Grifo nosso.

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Quando Pery se refere aos “problemas nacionais”, afirma que este tipo de

problema deve ter soluções brasileiras, visando o “bem do povo brasileiro”, sendo

resolvidos como problemas e não como negócios que visavam o enriquecimento de

grupos nacionais, estrangeiros ou mistos. Além disso, o desenvolvimento econômico

brasileiro deveria ser inspirado nos “sãos princípios nacionalistas e democráticos”.

Cabe, aqui, destacar um trecho deste documento de Pery em que ele pontua o Estatuto

da Liga Nacionalista Brasileira225 que, como afirma ele, não é um partido político, mas

uma liga destinada a atuar em todo o território nacional visando a defesa econômica do

Povo brasileiro. Assim, destaca Pery:

“PRINCÍPIOS I. O nacionalismo brasileiro começa e acaba no Brasil; II. O interesse nacional prima sobre o de qualquer outro país e também

sobre o dos Estados e dos Municípios; III. O enriquecimento do país deve orientar-se no sentido de melhorar as

condições de vida do povo. FINALIDADES

a) Lutar pela emancipação econômica do Brasil e por seu pleno desenvolvimento industrial e agrícola.

b) Preservar a independência da nação, não permitindo que seja comprometida por acordos ou tratados que cerceiem seu futuro político ou econômico, que subordinem a direção de nossa política internacional a de qualquer outro país, ou a submeta a interesses econômicos, políticos, sociais, imperialistas ou colonizadores de qualquer outro país, ou de grupo econômico nacional ou estrangeiro;

c) Promover uma política de paz e de entendimento com todos os povos do mundo, possibilitando relações econômicas com todos;

d) Aproximação política e econômica mais estreita com os países da América, estabelecendo-se mais profunda cooperação com os países da América Latina;

(...) f) Subordinar aos interesses nacionais, exclusivamente, as fontes de

energia com que contamos ou venhamos a contar. Em conseqüência:

I. Manutenção do monopólio estatal do petróleo, ou seja, de sua pesquisa, lavra, exploração, importação, refinação e transporte, nos termos da Lei nº 2004, de 3-10-1953, e nacionalização efetiva de sua distribuição.

II. Supervisão e controle federal da pesquisa, lavra, industrialização e armazenamento de minerais raros e monopólio estatal de seu comércio.

225 Não conseguimos encontrar, em seu acervo pessoal, dados que ligassem o nome do General à lista de membros desta Liga.

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XI. Proteção à indústria nacional, através de um sistema de crédito e de

financiamento, bem como de proteção cambial e aduaneira que a ponha a salvo da concorrência estrangeira.

(...) XIII. Controle e seleção do capital estrangeiro de maneira a impossibilitar

que empresas estrangeiras dominem a economia nacional;

XIV. Vedação de entrada no país de capital estrangeiro meramente

especulativo.”226.

Conforme o trecho acima, podemos perceber como se daria a construção dos

pontos a serem defendidos pela chapa do general Pery durante as eleições do Clube

Militar. No Noticiário Eleitoral nº1, 1962227, a Chapa União apresenta um jornal

destinado aos membros do Clube e fazendo campanha em função do pleito que se

aproximava. Já no Editorial deste jornal, temos a afirmação de que naquele pleito não

apresentavam-se apenas duas chapas, mas dois programas distintos. Um expressava

“tendências e intenções adversas, se não opostas” e isso proporcionaria ao associado do

Clube uma oportunidade de definir-se de forma inequívoca, “não havendo lugar para

neutros”. O editorial continua afirmando que justamente por este motivo,

“não há como justificar o propósito de tornar a nossa associação ausente, na grande mesa da discussão serena e lúcida dos problemas nacionais e até das questões internacionais, naquilo que diz respeito à posição do Brasil como nação soberana”228.

O Clube, assim, estaria contribuindo para as soluções dos problemas nacionais,

como afirma o Programa. O Clube assumiria um caráter eminentemente político, como

conclui uma outra parte do Editorial, mas ressalta que não é uma luta político-partidária.

Este tipo de luta não teria sentido e nem lugar naquela associação, “cuja finalidade é

irmanar os quadros permanentes das Forças Armadas, acima de quaisquer divergências

226 Museu Casa de Benjamin Constant, PDB/TD/3/84, 03-02-1962. 227 Museu Casa de Benjamin Constant, PDB/TD/3/71. 228 Idem.

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de partidos”229. É de acordo com esta idéia, que o Editorial do programa da Chapa

União afirma que o Clube Militar tem um

“conteúdo inegavelmente político, no sentido mais nobre da palavra, não há como evitar que as nossas eleições e as nossas próprias atividades sociais revistam caráter político”230.

Caberia à Chapa União, então, permanecer com as “gloriosas tradições” do

Clube e não reduzindo “a uma simples sociedade recreativa”231. A Chapa União

manteria fidelidade aos dois princípios estatutários. Um deles diz respeito ao Art. 1º,

que é “Defender os interesses dos sócios” e “Incentivar as manifestações cívicas e

patrióticas”. O outro que implica que o sócio a “interessar-se pelas questões que firam

ou posam ferir a honra nacional e militar”. Para seguir estes “mandamentos”,

encontramos no Editorial a afirmação de que

“... há realmente, necessidade de atitudes que, além de desassombradas e definidas, devem ser objetiva e lucidamente patrióticas. Tais atitudes pressupõem ideologia clara e conseqüente. E essa ideologia se chama NACIONALISMO. Nacionalismo que represente a consciência do imperativo de desenvolvimento econômico do Brasil. Nacionalismo puro e simples, sem adjetivações escamoteadoras. Nacionalismo que não admite graus de exagero, porque há de ser, sem perda da indispensável compostura, tão ‘exagerado’ quanto limitado é o amor devido à Pátria e ao Povo Brasileiro.

Este é o nosso NACIONALISMO. Autêntico por definição (...)”232.

O programa da Chapa União, então, é apresentado em doze pontos. Visando

uma melhor discussão em nosso trabalho, apresentamos alguns deles233:

229 Idem. 230 Idem. 231 Idem. 232 Idem. 233 Os pontos que foram retirados de nossa citação dizem respeito a fundos de pensão e empréstimos de dinheiro para os militares, o que não se relaciona diretamente com o nosso tema de pesquisa.

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1. Contribuir para que as Forças Armadas se mantenham alheias às lutas de

políticas partidárias e estejam em condições de assegurar a permanência do

regime democrático no Brasil.

2. Manter o Clube Militar na linha traçada por seus fundadores, de interesse pelos

problemas fundamentais do Brasil e de intérprete dos anseios das Forças

Armadas.

4. Contribuir para que as Forças Armadas se mantenham em condições de

respeito á disciplina, às leis do país e aos poderes da República.

8. Estudar os problemas que afetam a profissão militar e o nível de vida de seus

elementos, propondo aos órgãos competentes às medidas assecuratórias deste

ou de desenvolvimento de cada um na carreira.

9. Promover o máximo congraçamento com o meio civil.

10. Manter a orientação nacionalista que trouxe ao Clube Militar a glória de

conquistas hoje incorporadas à legislação do país.

De acordo com os trechos destacados acima, podemos perceber a preocupação

dos seus membros com a continuação de uma postura nacionalista por parte do Clube

Militar. Além disso, a defesa do nacionalismo, conforme apontado no item 10, deixa

claro o posicionamento destes militares no cenário político nacional. Os problemas

relativos aos militares também são lembrados, mas, novamente, cabe ressaltar aqui a

preocupação com os problemas políticos brasileiros. Dos doze pontos apresentados pelo

programa, dentre os quais destacamos seis, cinco estão relacionados com a política

nacional e o papel dos militares nela. Palavras como “respeito à disciplina, leis e

poderes da República”, como visto no item 4, demonstram a preocupação dos

nacionalistas com a manutenção das instituições e a função dos militares no cenário

político nacional.

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No programa da chapa adversária − Chapa Confraternização −, a preocupação

está voltada para a administração do Clube. Seu programa tem como página de

apresentação dois pontos: dinamização administrativa e congraçamento dos sócios.

Mas, o que devemos ressaltar aqui é o título: “UM CLUBE MILITAR sem paixões

políticas”. Um nítido contraste, portanto, com o programa da chapa concorrente. Uma,

defendendo o caráter político – embora não partidário − do Clube; a outra, afirmando a

necessidade de distanciamento do Clube Militar em relação à política.

As metas de trabalho da chapa Confraternização são apresentadas em sete

pontos. Em nenhum deles temos algum destaque para a importância do Clube para a

discussão de problemas voltados para o desenvolvimento nacional. Os pontos se

referem a: obras no Clube; dinamização da Carteira Hipotecária para a compra da casa

própria; defesa dos interesses dos associados pela Diretoria; Banco Cooperativo para

favorecer crédito bancário para o associado; incremento de atividades sociais, culturais

e recreativas; intercâmbio com sócios do interior; e, finalmente, a atualização dos

Estatutos. É o próprio candidato a presidente quem sintetiza o espírito do programa:

“Lidero um grupo de oficiais que deseja trabalhar comigo pelo CLUBE MILITAR. São idealistas e não trazem objetivos políticos.

Nossa intenção mestra é acelerar o andamento das grandes obras de nossa Agremiação e mantê-la afastada das agitações políticas. Nossas opiniões partidárias ficarão fora do Clube, nele realizaremos essencialmente metas culturais, sociais e recreativas”234.

A Chapa União, em seu ponto 7, também faz referência às obras da

agremiação. Se propõe a construir um “Hotel de Trânsito”, assim como uma sede de

campo e uma sede de férias em Cabo Frio (RJ). O que ressaltamos, porém, é a defesa de

um caráter “apolítico” defendido pela chapa Confraternização. Como os membros da

chapa União ressaltaram, o Clube Militar foi criado com tradições políticas e voltadas

para a discussão dos problemas nacionais. Retirar sua importância política, naquele

234 Museu Casa de Benjamin Constant, PDB/TD/3/71.

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momento, significava enfraquecer a corrente nacionalista e acabar com o locus de

discussão política dos militares. Entendemos aqui que havia uma preocupação destes

militares, os antinacionalistas encabeçados por Magessi, de acabar com o caráter

político do Clube para que as divisões nas Forças Armadas fossem amenizadas. Isto se

daria em função do fim do espaço de discussões: o Clube Militar. Retirar a discussão de

pontos de vista diferentes e os projetos dos partidos militares era fazer prevalecer o

partido sobre os partidos.

Um aspecto comum na exposição dos programas de ambas as chapas é a

preocupação com o fato das Forças Armadas manterem-se alheias à política. O que

diferencia, contudo, estes pontos é a forma com que os seus membros entendem o

“fazer” política. Enquanto a chapa União coloca em seu primeiro ponto do programa:

“Contribuir para que as Forças Armadas se mantenham alheias às lutas de políticas

partidárias e estejam em condições de assegurar a permanência do regime democrático

no Brasil”; a chapa Confraternização dispõe como título de seu caderno apresentando o

programa a frase: “Um CLUBE sem paixões políticas!”. O que entendemos aqui é que

para a ala nacionalista o que deveria manter-se afastado do Clube era a luta de políticas

partidárias, ou seja, aquela ligada diretamente aos partidos. Para a ala “golpista” ou

“antinacionalista”, qualquer tipo de política deveria manter distância do Clube, daí a sua

preocupação com o caráter desportivo das sedes a serem criadas pelo Clube Militar. Por

que esta distinção sobre “política” para as correntes?

Os membros da Cruzada Democrática eram influenciados pelos preceitos

defendidos pela Escola Superior de Guerra (ESG). Um dos pontos relacionados diz

respeito ao caráter profissional das Forças Armadas, trabalhado pela ESG e baseado na

literatura produzida até aquele momento235: O Soldado e o Estado, de Samuel

235 Não aprofundaremos, aqui, uma discussão a respeito da influência das produções voltadas para o estudo da sociedade na Escola, pois estaríamos fugindo dos limites de nosso trabalho.

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Huntington. Nesta obra, Huntington trata a questão do profissionalismo militar e a sua

relação direta com a sociedade.

“As instituições militares de qualquer sociedade são moldadas por duas forças: um imperativo funcional, que se origina das ameaças à segurança da sociedade, e um imperativo societário, proveniente das forças sociais, das ideologias e das instituições dominantes dentro dessa mesma sociedade. Instituições militares que só refletem valores sociais podem ser incapazes de desempenhar com eficiência sua função específica. Por outro lado, poderá ser impossível conter dentro de uma sociedade instituições militares moldadas exclusivamente por imperativos funcionais. É na interação dessas duas forças que está o nó do problema das relações entre civis e militares. O grau em que elas entram em conflito depende da intensidade das exigências de segurança e da natureza e força do padrão de valores da sociedade”236.

O desenvolvimento de sua função, sem deter-se em questões políticas, para o

funcionamento “harmônico” da sociedade é o objetivo desta busca pelo

profissionalismo. Segundo Huntington, o termo “profissional” pressupõe respeito diante

da sociedade237. Este profissionalismo é caracterizado conforme três pontos:

especialização, responsabilidade e corporatividade. Quanto à primeira característica,

Huntington esclarece que “só por educação e experiência prolongadas é que se adquire

especialização. Ela é a base de padrões objetivos de competência profissional, que

separa profissionais de leigos e que mede a relativa capacidade de membros de uma

profissão”238. A responsabilidade pressupõe prestar de forma adequada seus serviços

quando a sociedade o exigir239. Por fim, a corporatividade diz respeito à “sensação de

unidade orgânica e de autoconsciência como um grupo que difere dos leigos”240.

236 HUNTINGTON, Samuel P. O Soldado e o Estado. Teoria Política e das Relações entre Civis e Militares. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 1996, pp. 20-21. 237 HUNTINGTON, Samuel P. O Soldado e o Estado. Teoria Política e das Relações entre Civis e Militares. Op. cit., cf. p. 26. Idem. Ibidem. 239 Idem, cf. p. 27. 240 Idem, p. 28.

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De acordo com esta lógica de profissionalismo, não há espaço para política no

interior das Forças Armadas, já que “a profissão militar é técnica e limitada”241 . A

relação entre os militares e o Estado se delimita à mesma lógica do tecnicismo, ou seja,

cada quadro, cada instituição agindo conforme a profissionalização de seus técnicos.

Assim, na relação entre o militar e o Estado, o mesmo princípio deveria ser aplicado e a

lógica de uma “divisão natural do trabalho” prevalece. Para Huntington,

“A essência desse relacionamento [dos militares com o Estado] implica no relativo alcance de competência do profissional militar e do político profissional, ou seja, o estadista. Antes da profissionalização da ciência militar no século XIX a mesma pessoa podia ser simultaneamente qualificada em ambos os campos. Hoje isso é impossível.

(...) “A política se situa além do escopo da competência militar

e a participação dos militares na política enfraquece-lhes o profissionalismo, reduz a competência profissional, divide a profissão contra si mesma e substitui valores profissionais por valores estranhos. Politicamente, o militar tem é que permanecer neutro” 242.

Se a ala “golpista” é influenciada por este tipo de pensamento, então podemos

deduzir que a aplicação de tal pensamento se daria na criação do programa e,

posteriormente, na postura a ser adotada pelo Clube Militar em assuntos diretamente

relacionados com a política nacional. Ainda assim, lembremos que, em seu Estatuto, o

Clube Militar define, no Artigo 2º, que “O Clube conservar-se-á estranho à matéria de

religião e de política partidária, sendo vedada a cessão de suas dependências para

reuniões dessa natureza.”243. Quando a chapa União afirma que manter-se-á alheia às

políticas partidárias, ela confirma o que está estabelecido no Estatuto, demonstrando

assim, a sua preocupação com o caráter legal de seu programa. Como vimos até o

momento, os membros da ala nacionalista estavam preocupados com assuntos relativos

à política nacional. Isto se daria em função de uma preocupação destes com o rumo que 241 Idem, p. 88. 242 Idem, pp. 88-89. 243 Estatuto do Clube Militar, aprovado pela Assembléia Geral Extraordinária de 6 de outubro de 1947. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro – Brasil.

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tomaria o desenvolvimento nacional caso algum assunto não fosse discutido de forma

clara por setores diversos da sociedade, principalmente a classe militar. Contudo, por

não definir o que se entende como “paixões políticas” em seu programa, entendemos

que, para os membros da chapa de Magessi, política de qualquer espécie seria possível

no interior do Clube.

Contudo, mais um elemento pode elucidar a análise desta questão e isto diz

respeito aos ativistas militares pró ou contra o governo. Segundo Alfred Stepan:

“Os ativistas militares pró ou contra o governo constituem sempre uma minoria. Se um grupo militar deseja derrubar o governo, precisa convencer a grande maioria de oficiais que são ou legalistas estritos ou simplesmente não-ativistas. Os ativistas não querem arriscar derramamento de sangue ou cisões militares, de forma que esperam até que se tenha conseguido um consenso” 244.

Discutir política no Clube é posicionar-se diretamente a favor ou contra o

governo instituído. Consideramos que dentre o corpo que participa efetivamente das

discussões políticas, podemos classificar como minorias que defendem ou não o

governo. Todavia, o Clube Militar reflete o pensamento da oficialidade e estabelece um

diálogo entre grupos rivais. Se até aquele momento prevalecia o ponto de vista dos

nacionalistas nas discussões a respeito da política nacional, dever-se-ia controlar seu

principal palco de discussões: o Clube Militar. Ao focar suas atividades para assuntos

não relacionados com a política nacional, os militares pertencentes ao grupo de Magessi

estariam buscando uma outra forma de mobilizar sua classe: estabelecendo ligações

com os militares da cúpula fora de um ambiente “democrático” de discussões políticas.

244 STEPAN, Alfred. Os Militares na Política. Rio de Janeiro: Artenova, 1975, p. 74.

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Capítulo 3 – A Eleição

Com seus programas e componentes definidos, as chapas concorrentes à

Presidência do Clube Militar se prepararam para as eleições que ocorreriam em maio de

1962. De um lado, a chapa União, liderada pelo general Pery Constant Bevilaqua. Do

outro, a chapa Confraternização, cujo candidato à presidência era o general Augusto da

Cunha Magessi Pereira. Em seguida, trataremos do processo eleitoral do Clube desde a

sua campanha na imprensa nacional até o resultado do pleito daquele ano.

Como se dava o processo eleitoral do Clube Militar?

A respeito do seu funcionamento, destacamos um artigo do Estatuto em vigor

para as eleições,

“Os cargos da Diretoria, do Conselho Deliberativo, do Conselho Fiscal e dos Diretores dos Serviços Especiais são providos, mediante eleição, em que só tomarão parte os sócios efetivos do Clube, em sessão ordinária da Assembléia Geral especialmente convocadas para esse fim”245.

Para que a eleição fosse realizada, o presidente do Clube e os diretores da

Assistência e da Caixa Mutuaria designariam os membros para a Comissão

Escrutinadora, com, no mínimo, dez dias de antecedência. A Comissão Escrutinadora

deveria ser composta de dez sócios, residentes no Rio de Janeiro ou Niterói, cabendo ao

seu presidente informar o resultado das eleições. Os sócios residentes no Rio de Janeiro

ou Niterói deveriam comparecer no dia da eleição, lançando sua assinatura no livro de

presença. Em seguida, receberiam uma cédula para registrar seu voto, depositando-o,

por fim, na urna. Os sócios que não fossem residentes destas cidades tinham suas

cédulas enviadas ao Clube, contendo a assinatura do oficial votante, reconhecida pelo

comandante da Unidade, chefe de Serviço ou Tabelião. Estes votos poderiam ser

245 Estatuto do Clube Militar, aprovado pela Assembléia Geral Extraordinária de 6 de outubro de 1947. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro – Brasil, Artigo 52º.

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enviados ao secretário do Clube, no intervalo compreendido entre a convocação da

Assembléia Geral eleitoral e a abertura dos seus trabalhos, e ao presidente da Comissão

Escrutinadora, entre as 14 e as 21 horas do dia da eleição. Contudo, chama atenção o

último artigo que diz respeito às eleições do Clube: mesmo se tratando de uma

associação civil, em caso de igualdade de votos entre os candidatos, em qualquer

apuração, os mais graduados seriam eleitos246.

Uma forma de entendermos como estava o “clima” das eleições é trabalharmos

com as publicações da grande imprensa da época. A chapa União era apoiada pelo

jornal O Semanário, enquanto a chapa Confraternização tinha como principal aliado, O

Globo. A análise deste tipo de documentação é fundamental para entendermos a forma

com que os partidos militares desenvolviam suas disputas no campo civil, ou seja, fora

da caserna, e como o processo eleitoral do Clube Militar era abordado pelos

simpatizantes de cada ala, representados em suas respectivas publicações. Porém, ainda

que abordando estas fontes para compreendermos a relação entre militares e civis,

lembremos que:

“Os grupos e correntes militares falam em nome da instituição considerada em sua globalidade. Os acordos que possam ser feitos ou o apoio que eles possam dar a grupos e partidos políticos civis não os transformam, portanto, em simples representantes de correntes civis. Os mecanismos de formação das cisões e do estabelecimento do consenso não são forçosamente os mesmos que se acham em ação na vida civil”247.

A partir deste ponto de vista analisaremos os “partidos militares” no processo

eleitoral para o biênio 1962-64 do Clube Militar.

246 Estatuto do Clube Militar, aprovado pela Assembléia Geral Extraordinária de 6 de outubro de 1947. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro – Brasil, Capítulo III. Das eleições. Artigos 52º a 58º. 247 PEIXOTO, Antonio Carlos Peixoto. “O Clube Militar e os confrontos no seio das Forças Armadas (1945-1964)”. In: ROUQUIÉ, Alain (coordenador). Os Partidos Militares no Brasil. Rio de Janeiro: Record, s/d, p.72.

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Com relação ao mecanismo de funcionamento do processo eleitoral do Clube

Militar, o artigo 52 de seu Estatuto, vigente desde 1947, estipula que “Os cargos da

Diretoria, do Conselho Deliberativo, do Conselho Fiscal e dos Diretores dos Serviços

Especiais são providos mediante eleição, em que só tomarão parte os sócios efetivos do

Clube, em sessão ordinária da Assembléia Geral especialmente convocada para esse

fim”. Essa Assembléia deveria ser divulgada em três jornais de grande circulação da

capital e com, no mínimo, três meses de antecedência. O sócio do Clube que

concorresse às eleições e fosse eleito, só poderia assumir seu cargo por dois períodos

consecutivos248.

Aproximando-se da eleição, a chapa Confraternização tentou uma manobra no

Clube Militar: a instituição do voto secreto. O jornal Diário de Notícias divulgava nota

sobre a proposta, sob o título de “Cruzada [Democrática] Convoca Assembléia e Facção

de Peri Protesta”, destacando uma carta enviada por Roberto Sisson em que este

ressaltava a má fé com que a Assembléia teria sido convocada. Os nacionalistas

responderam da seguinte forma:

“... a corrente nacionalista do Clube Militar (facção Peri Bevilaqua) torna pública uma nota, referindo-se à que a Cruzada divulgou, de convocação de assembléia, explicando que, a) não se opõe à instituição do voto secreto, porque está convencida de ser esta uma medida que virá beneficiar a sua causa; b) opõe-se à instituição da cédula única oficial, porque a sua adoção implicaria, incontestavelmente, na formação de verdadeiros partidos políticos dentro do Clube, desvirtuando-lhe as elevadas finalidades; c) opõe-se ao prazo de carência para o exercício de direito do novo sócio, porque isto seria um fator de limitação do crescimento do quadro social; d) julga inoportuna, inexplicável, tendenciosa e inconveniente a pretendida convocação da Assembléia Parcial agora. E isto porque já se está a apenas uma semana do prazo mínimo para a convocação da Assembléia-Geral eleitoral e porque a eleição já está praticamente iniciada, com a remessa de ambas as chapas para o interior do país

Conclui a nota declarando que ‘a despeito de tudo, a corrente nacionalista não participará da Assembléia com o propósito de

248 Estatuto do Clube Militar, aprovado pela Assembléia Geral Extraordinária de 6 de outubro de 1947. Departamento de Imprensa Nacional, Rio de Janeiro – Brasil, artigos 53 e 54. Para as eleições de 1962, a Assembléia foi convocada conforme os Editais publicados nos Jornais: Diário de Notícias, Jornal do Brasil, Correio da Manhã e O Globo, nas edições de 15 de março e 12 de maio de 1962.

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defender seus pontos de vista’, conclamando, entretanto, aos seus correligionários a que compareçam, unidos, à dita Assembléia”249.

A “manobra do voto secreto” ocorreu em uma Assembléia Parcial Extraordinária

em 13 de março de 1962250, sob a presidência do general Paulo Torres, a partir de

convocação resultante de documento lido pelo almirante Pedro Mario da Cunha

Rodrigues. O presidente da Assembléia, na ata da mesma, determinou que se colocasse

em votação a proposição do almirante, que instituiria o voto secreto para as eleições de

1964, “mas que se aprovado deixaria instituído para o Clube essa salutar medida de

verdadeira demonstração democrática” e que tal medida constituía o desejo de ambas as

correntes. Em nome da chapa União, pronunciou-se o general Lauro Rabelo Ferreira da

Silva, para quem não era possível concordar com a adoção do voto secreto para a

eleição de 1962/64, “pois que eles da chapa Pery, já tinham em seu poder, nesta data,

toda a votação do interior, de modo a assegurar-lhes a vitória, qualquer que fosse o

resultado da Guanabara” 251. Conforme o documento252, a chapa União era a única que

apoiava o voto secreto apenas para 1964. Em votação nominal, o resultado apontou 342

votos a favor e 308 contra a instituição do voto secreto para a eleição de 1964.

A questão do voto secreto continuou a ser utilizada em parte da imprensa até as

vésperas da eleição. Cabe destacar o conteúdo de uma nota de Correio do Povo a

respeito do assunto:

“... instituto moderno, em lugar do obsoleto e arcaico voto a descoberto, assinado pelo eleitor e com a firma reconhecida, pelo comandante da corporação (ou por tabelião). É óbvio dizer ou imaginar as coações daí decorrentes, a partir do aspirante a oficial (isso dos dois lados).

Com grande surpresa nossa ‘a corrente Pery’ não quis concordar com a instituição do voto secreto, tumultuando aquela assembléia por mais de 4 horas. Aliás, tinha sido o nosso grande patrono e lutador, o sr. Gen. Pery Bevilaqua, em 1959 e 1960, quando

249 Diário de Notícias, 09/03/1962. 250 Atas de Reunião do Clube Militar (1961-1963), pp. 108-110. 251 Idem, p109. 252 Idem, pp. 108-110.

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a chapa azul (hoje dissolvida), cujo candidato seria ele, pleiteou com grande veemência a sua instituição, a ponto de ser resolvido que só concorreríamos se o voto secreto fosse adotado, o que deu lugar a 3 ações em juízo no antigo Distrito Federal, e cuja solução não se processou em tempo hábil. Em conseqüência, só concorreu uma chapa. Repetiu-se a antiga ‘chapa amarela’ (hoje também dissolvida), do General Justino Alves Bastos, que obteve 9.000 votos. Houve uma abstenção de 13.000 eleitores”253.

É em torno do discurso pautado na legalidade e no nacionalismo que esta nota

critica o general Pery. Seu discurso não estaria de acordo com sua atitude, uma vez que

era contra a instituição do voto secreto, naquele momento, nas eleições do Clube. Para

Cassal Brum, nesta nota, a chapa adversária não defenderia o voto secreto “porque o

voto secreto expressaria a vontade livre dos eleitores, sem qualquer vislumbre de

dúvida”.

Enquanto as correntes defendiam seus programas através do envio de noticiários

eleitorais e panfletos de campanha às diversas regiões militares, os periódicos da grande

imprensa publicavam suas matérias expondo pontos de uma ou outra corrente e atuando,

até mesmo, em defesa aberta de um ou outro grupo. No capítulo anterior, discutimos

alguns destes artigos, que tratavam das eleições do Clube nos anos 1950. Conforme

Alain Rouquié e Antonio Carlos Peixoto, a análise das publicações da grande imprensa

nacional nos ajuda a perceber as disputas entre os partidos. Portanto, veremos, a partir

deste momento, alguns trechos de jornais da época tratando de temas relacionados com

as eleições de 1962.

O Correio do Povo, do Rio Grande do Sul, apresentava artigos que se referiam

às duas correntes, demonstrando algum grau de imparcialidade254. A matéria intitulada

“Legalismo e nacionalismo no programa de Bevilaqua” destacava o comparecimento do

general Pery, no dia 15 de fevereiro de 1962, na agência do Clube Militar. Neste

encontro, vários associados apresentaram suas reivindicações. Todas elas relacionadas

253 Correio do Povo, 10 de maio de 1962. 254 Não verificada em O Semanário, por exemplo.

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com temas voltados para o cotidiano administrativo do Clube. Os pontos destacados

pelo general em sua visita a esta Agência foram: o legalismo e o nacionalismo, as “vigas

mestras” de seu programa. Assim, Bevilaqua estabelecia uma analogia entre estes dois

pontos e a realidade da sociedade e dos sócios do Clube:

“A primeira – o legalismo – que sintetiza em promover entre os associados a consciência da imprescindibilidade do mais absoluto respeito às leis emanadas dos poderes constituídos. As leis (...) não são optativas, obrigam os governantes e governados, além do mais, não nos é lícito deixar ao prudente arbítrio de cada cidadão uma escolha indiscriminada, o que resultaria em respeitar algumas e negar cumprimento a tantas outras

Devemos, igualmente, condenar os extremismos da direita ou da esquerda. Ambos são execráveis, porque ambos são liberticidas. Os extremismos, na feliz expressão de Jacques Maritain, ‘são chifres da cabeça de um mesmo demônio, e não desejamos ser ‘acariciados por nenhum deles’.”255.

O trecho acima tem uma relação direta com os acontecimentos de

agosto/setembro de 1961, durante a Crise da Legalidade, a partir da qual o general Pery

Bevilaqua passou a ser reconhecido como um líder legalista, tanto no meio militar como

no civil, em decorrência do seu posicionamento a favor do cumprimento estrito da

Constituição e contra a tentativa de golpe perpetrada pelo ministros militares. Assim,

cabe ressaltar um fragmento de texto de Pery Constant Bevilaqua sobre atuação das

Forças Armadas em que se ressalta a importância do caráter legalista destas:

“É oportuno recordar (...) as seguintes palavras de Benjamin Constant a Deodoro no eloqüente apelo que lhe dirigiu a 11 de novembro de 1889, e de transcendente importância histórica:

‘O Exército não pode intervir na política interna da Nação senão em caso excepcionalmente extremo quando ele é chamado a defender a liberdade ameaçada pelo pode público despótico, e quando o povo não encontra nos meios regulares da opinião, os recursos de sua defesa política e social’”256.

255 Correio do Povo, Porto Alegre, 18 de fevereiro de 1962. 256 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Documentos Diversos, PCB/TD/1/29, s/d.

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Com relação ao nacionalismo, com afirma Pery, ele deveria ser “autêntico, verde

e amarelo, como convém ao Brasil e aos brasileiros”, a serviço do qual se comprometia

a promover palestras e conferências aos associados, conforme autorizado pelo Estatuto

do Clube257.

A eleição para a Presidência do Clube costumava acontecer tradicionalmente no

mês de maio, e a de 1962 estava marcada para o dia 16. A disputa por votos se dava

nestes artigos encontrados na grande imprensa e a publicação de manifestos dos

generais – em periódicos e através de panfletos destinados aos sócios do Clube – líderes

das correntes adversárias.

O jornal Última Hora, de 11 de abril de 1962, apresentou um manifesto do

general Magessi. Nele, Magessi pedia para que seus companheiros de armas atentassem

para as eleições do Clube Militar e expunha alguns pontos do programa de sua chapa.

Destacamos:

“À inconsciência totalitária que por vezes se insinua contra a consciência civilizada, oporei a barragem do direito positivo, os preceitos da razão democrática, estabelecidos pela Constituição.

Em suma, o culto da moral e da disciplina, da franqueza e da cortesia em todas as situações, da verdade e do dever das realizações assistenciais e das diversões tão necessárias ao espírito, o esforço intelectual de atualização indispensável no mundo em que vivemos e a uma perfeita compreensão da sadia evolução das Forças Armadas e do Brasil, serão compromissos primordiais a cumprir e fatores do mais alto grau para a crescente projeção do Clube Militar”258.

Neste fragmento, podemos ver uma das metas de trabalho da chapa

Confraternização: o incremento das atividades sociais, culturais e recreativas. Este é um

dos principais pontos em disputa pelas correntes existentes no Clube naquele momento.

Enquanto os nacionalistas continuavam a defender uma participação dos militares nas

decisões da vida política nacional, os membros da ala “antinacionalista” desejavam

257 Correio do Povo, 18 de fevereiro de 1962. 258 Última Hora, 11/04/1962, p.4.

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“Um Clube Militar sem paixões políticas”, conforme o título do material da chapa259.

Tal diferença também pode ser notada na correspondência de general Bevilaqua com o

deputado Francisco Julião260. Nela, o general agradecia os elogios recebidos na carta

recebida em 28 de abril daquele ano e, ao falar da chapa União e sua proposta, escreveu

o que pensava a respeito do nacionalismo e a importância deste para o país. Nesta carta,

argumenta Pery:

“Entendemos que o Nacionalismo deve ser nossa principal bandeira. Por Nacionalismo, ou melhor dito Brasilismo, entendemos uma atitude permanente e incansável vigília cívica em defesa da nossa emancipação econômica, fundamento da Democracia e da liberdade política do nosso povo. Os problemas nacionais deverão, à luz dos ideais brasilistas, ser equacionados e solucionados como problemas do povo e não como negócios para o enriquecimento de grupos nacionais ou estrangeiros.

O desenvolvimento econômico não deverá, assim, constituir um fim, em si mesmo, mas o meio para atingir a felicidade do homem brasileiro. Assim entendemos o nacionalismo verde e amarelo.

[...] Fiéis à posição assumida na última crise político-militar de

1961, incorporamos ao nosso programa o que chamamos Legalismo, cujo significado é a consciência da necessidade do mais absoluto respeito às leis da nossa Pátria. Respeito, não apenas, àlgumas leis, com descumprimento de outras261. Elas não são optativas, são obrigatórias, compelem a governantes e governados. Certamente que não nos conformamos com o status quo institucional brasileiro, mas entendemos que novas modificações só devem ser levadas a efeito a partir de nossas atuais conquistas democráticas, e rigorosamente dentro dos quadros constitucionais vigentes.

[...] A par de um extenso programa administrativo, traçamos estas

coordenadas de posição política, que nos deverão orientar na promoção de palestras e conferências que pretendemos realizar, para o corpo social, consoante o que preceituam os estatutos da instituição, e segundo a sua honrosa tradição. Isto não vale por afirmar que pretendemos transformar o Clube Militar em conciliábulo de política partidária, mas em local de estudo de relevantes problemas nacionais. Afinal, a opinião pública é o primeiro elo na cadeia do processo democrático e sem dúvida a opinião dos militares é parte integrante, preciosa e esclarecida desse todo. É mister portanto que a entidade

259 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/91, 14-04-1962, p.1. 260 Francisco Julião, advogado reconhecido por sua ligação com as Ligas Camponesas e defesa dos direitos dos trabalhadores rurais. Em outubro daquele ano, seria eleito deputado federal pelo estado de Pernambuco, pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). (KELLER, Vilma. “Francisco Julião”. In: ABREU, Alzira A. e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro Pós-1930. Rio de Janeiro: Editora da FGV, versão eletrônica). 261 Frase truncada, em destaque, no original.

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civil que agremia oficiais da ativa, da reserva e reformados das Forças Armadas faça alguma coisa no sentido de bem orientar esta opinião parcial dos brasileiros. A esse trabalho nos propomos.”262.

Defender o nacionalismo era defender o desenvolvimento da economia nacional

a partir de uma perspectiva centrada nas ações e decisões do Estado nacional, sem a

influência dos interesses estrangeiros – estranhos ao princípio “brasilistas” – e

entendido como um meio para alcançar um estágio em que o bem-estar de nossa

sociedade se estabelecesse de forma plena. Contudo, para que isto fosse possível, o

respeito às leis era fundamental. Por isso, a relação estabelecida entre a Crise da

Legalidade – em que o general esteve ao lado dos que defendiam os direitos de posse do

vice-presidente João Goulart – e os princípios defendidos pela sua corrente. O

“legalismo” e a defesa da democracia, segundo o líder da chapa União, deveriam

constituir o objetivo máximo das Forças Armadas naquele momento da vida política

nacional.

Além da publicação de manifestos, como o do general Magessi citado acima, a

disputa entre os jornais se fazia por meio de informes sobre o processo eleitoral que

adiantavam alguns resultados parciais, indicando a vitória de uma ou outra chapa. O

jornal Última Hora trazia, na edição de 16 de abril de 1962, a seguinte manchete: “Pery

Bevilaqua vence as eleições no III Exército”. Aproximadamente 1.500 oficiais do III

Exército já teriam votado na chapa União. Votos de oficiais do II e IV Exércitos

também estariam consagrando o nome do general Bevilaqua, contribuindo para a sua

vitória. O problema parecia residir no estado da Guanabara, sede do I Exército e onde

votavam, em maior número, os oficiais da Aeronáutica e da Marinha. Segundo Última

Hora, encontrava-se aí a “sede dos partidários do General Magessi”263.

262 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/96, 11-05-1962. 263 Última Hora, 16 de abril de 1962.

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Visando mudar o quadro que parecia favorável à chapa União, o general Cassal

Martins Brum, da Comissão Regional pró-chapa Confraternização, distribuiu

circulares264 aos associados do Clube Militar instando os que houvessem votado na

chapa do general Bevilaqua a alterarem seu voto. O general distribuía, com as

circulares, um modelo de “carta de retratação” para aqueles que, “inadvertidamente, de

surpresa etc.”, tivessem votado na “outra chapa” 265. A proposta de retratação foi

considerada ofensiva por muitos militares, por sugerir que pudessem ter votado de

maneira irresponsável266.

Além disso, o conteúdo publicado por Última Hora resultou em uma carta do

general Brum, destinada ao diretor do periódico. Alegando que seu objetivo era “prestar

esclarecimentos ao jornal e aos distintos companheiros sócios do Clube”, Cassal Brum

fez duras críticas aos nacionalistas. Sobre a questão de fazer manobras eleitorais,

defendia-se:

“Se houve manobra foi por parte da tal Chapa ‘Única’267 (que pelo que se vê, quer é desunião, porque parece que união não lhes serve). Isso começou quando ‘eles’ deram um golpe, ‘torpedeando’ – agitadamente – por espaço de mais de 4 horas no dia 15 de março transato, durante a realização de uma Assembléia do Clube Militar, no Rio, contra a instituição do voto secreto, que teria sido adotado para estas eleições, se não fosse tal ‘manobra’ capciosa... para ganhar tempo! Continuamos assim com o arcaico, com o obsoleto voto a descoberto e assinado pelo eleitor. Por que ‘eles preferiram o processo antigo? Porque já tinham usado a ‘velha manobra’ de fazer muitos sócios assinar a cédula, inadvertidamente, votando com grande antecedência. Isso muito antes de ser marcada a eleição, e quando ainda não estava de fato lançada, a candidatura do General Magessi – o segundo candidato”268.

264 Última Hora, 16 de abril de 1962. 265 Idem. 266 Idem. 267 Acreditamos que se trata de um erro de grafia, já que a chapa do grupo nacionalista era a chapa União. 268 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/92, 15-04-1962, p.1. Acreditamos haver um erro de classificação no Acervo de Pery Bevilaqua quanto à data correta desta carta do general Cassal Brum ao jornal Última Hora. A edição a que ele se refere é a de 16 de abril de 1962, mas no Acervo de Pery, a carta recebe a classificação datada de 15 de abril de 1962. Nos baseamos nas referências da carta de Brum, que não estava datada, para localizarmos o periódico criticado, ou seja, Última Hora de 16 de abril de 1962.

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Cassal Brum não aceitou o que foi publicado, afirmando que duvidava de uma

vitória da chapa nacionalista. Tratava-se de uma “manobra mascarada”, já que a chapa

Confraternização tinha como certa a vitória em locais como: Bagé, Santa Cruz, Cruz

Alta, São Borja, Santiago, Uruguaiana, dentre outros. Segundo dados apresentados por

este general, “O Clube tem mais de 20.000269 sócios, e no Rio Grande andam pela casa

de 2.000 a 2.500. Aqui eles ganham, mas no resto somos nós”270. As “provocações”

contidas no artigo são respondidas por Cassal Brum:

“Por outro lado não queremos travar polêmica, apesar de provocados. Estamos aqui apenas para dizer a verdade pura, esclarecendo a opinião pública sobre as fúteis distorções que eles tentaram fazer. A par disso nos sentimos muito felizes e bastante confortados, com essa ‘guerrinha de manobra venenosa’ – inventada pelos nossos prezados adversários, pois – sem querer, lançamos o pânico nas hostes inimigas. O alarme foi como uma carga de cavalaria – a moda antiga – apesar do inimigo ter ‘suas’ táticas modernas especiais...”271.

Mesmo com o voto aberto e com a chapa União tendo lançado sua candidatura

anteriormente à chapa Confraternização, Cassal afirmou que esta última estaria

vencendo com boa margem de votos em “Pelotas (30 x 9), Bagé (40 x 6), Cruz Alta (47

x 7), S. Cruz (12 x 1), Santo Ângelo (47 x 9), além de Alegrete, Santiago e São Borja –

estes últimos sem números. Assim, um dos motivos para esse indicativo, ainda que

parcial, viria da desistência de muitos sócios em relação ao seu voto dado à chapa de

Pery. Tudo indicava, como ressalta Brum, que o general Magessi contava ainda com a

preferência do II Exército, através dos estados de São Paulo, Mato Grosso e Goiás; e no

IV Exército, onde “a situação é considerada melhor ainda, é ótima”. Este tipo de quadro

foi possível porque

269 Conforme o Relatório da Presidência (1961/1962), do Clube Militar, havia 25.773 sócios: 25.100 efetivos, 540 remidos e 133 assemelhados. Conforme o Artigo 52 do Estatuto do Clube em vigor à época, apenas os sócios efetivos poderiam tomar parte nas eleições. 270 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/92, 15-04-1962, p.1. 271 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/92, 15-04-1962, p.1.

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“Muitos sócios, só após conhecerem o manifesto e o

programa do General Magessi, de par com sua firme intenção de evitar política apaixonada (ou partidária em certas ocasiões, como houve anteriormente), resolveram votar na segunda chapa”272.

O final desta nota demonstra a tendência daquela facção no que diz respeito à

relação entre o Exército e a política. Para o partido golpista, ou seja, a chapa de

Magessi, “um Clube Militar sem paixões políticas”273 era a linha mestra da chapa

Confraternização, cabendo a todos os sócios e não a este ou aquele grupo. De fato, esta

será a mentalidade que prevalecerá no “partido” Exército, durante a ditadura implantada

no país em 1964.

A campanha para a presidência do Clube continuava e os resultados parciais aos

poucos eram divulgados. Encontramos estes resultados em notas nos periódicos da

grande imprensa e, também, em correspondências trocadas entre o general Pery e

comandantes de diferentes regiões militares – como a do capitão Paulo Brasil Matos

indicando vitória de Pery em Fortaleza com cinqüenta e cinco por cento dos votos

naquela região.

A situação também parecia favorável na guarnição de Jaguarão, Rio Grande do

Sul. O capitão Lippolis informou, em 22 de março de 1962, que naquela guarnição,

havia terminado a votação para as eleições do Clube Militar, com o seguinte resultado:

general Pery, 18 votos; general Magessi, 5 votos; total de eleitores, 27; Total dos que

não votaram, 4. Além deste resultado parcial, Lippolis afirmou que a contagem dos

votos referentes ao interior do país já tinham começado e que, embora não tivesse

certeza disso, Pery estaria levando grande vantagem. Por essa razão, solicitou informes

posteriores sobre os resultados274.

Em resposta a Lippolis, Pery ressaltou que

272 Correio do Povo, 10 de maio de 1962. 273 O trecho em negrito, destacado em nosso texto, encontra-se da mesma forma no original. 274 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/89, 22-03-1962.

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“Eleições, ganham-se com trabalho, continuado e árduo pela sua própria natureza. Felizmente elementos com características que os capacitem para a tarefa não nos tem faltado. Temos recebido as melhores informações: Brasília, Santa Maria, Porto Alegre, Vacaria, Uruguaiana, Cachoeira, Fortaleza, Natal etc. e muitas outras que nos autorizam a esperar uma vitória, com razoável otimismo”275.

Mais resultados parciais chegavam às mãos do líder da chapa nacionalista.

Faltando um mês para a votação, Pery recebeu um rádio do capitão Paulo Brasil. A

chapa União obtivera sucesso na 10ª Região Militar, em Fortaleza. Mesmo com os

adversários utilizando o velho chavão “comunista” para tentar enfraquecer a chapa e

Pery, o grupo nacionalista obteve duzentos e vinte votos276.

Faltando menos de uma semana para as eleições acontecerem no Clube, O

Semanário publicou uma matéria com o seguinte título: “Os Nacionalistas e as

Eleições”. O objetivo do artigo era definir o que se entendia por nacionalismo e ressaltar

que não se tratava de um movimento de esquerda ou socialista, “mas um movimento

antiimperialista, anticolonialista, patriótico”277. Porém, encontramos acusações de

membros da chapa concorrente, em que os nacionalistas seriam vistos como comunistas.

Segundo o capitão Paulo Brasil de Matos, em carta ao general Pery Bevilaqua, datada

de 15 de março de 1962, os cabos eleitorais da chapa Confraternização em campanha na

10ª Região – Fortaleza acusavam os adversários nacionalistas, membros daquela chapa,

de comunistas, esquerdistas e brizolistas.

A associação do nacionalismo ao comunismo foi feita até mesmo no interior da

chapa União. Um sobrinho do próprio general Pery Bevilaqua, Capitão Inaldo S. de

Noronha, justificou seu desligamento da chapa alegando a existência de uma influência

275 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/90, 28-03-1962. 276 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/94, [04-1962]. 277 O Semanário, 10 de maio de 1962.

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comunista entre seus membros. Como evidência, citava um discurso de Roberto

Sisson278 em que este dizia “nós, os comunistas”:

“Vejo que semelhantes elementos como o sr. cmt. Sisson, arrastam em torno de si outros tantos cujo pensamento a mim causa repulsa (...). De modo leal procuro afastar-me de sua chapa, por não estar de acordo com os princípios ali apontados (...). Sinto urgência na união de todos os militares, pois a desagregação que ‘alguns’ aspiram, formando dois partidos ou mais, é um dos escopos da trama comunista279.

[...] Estimo que ‘estes’ elementos que lhe (sic) aplaudem e

que a meu ver não inspiram garantia com colaboradores leais, amigos e sinceros não venham em futuro trair sua confiança. Vejo que dentro dos princípios de coerência e sinceridade, dificilmente poderia colaborar ao lado de elementos que julgo não serem afins com o meu modo de agir.

[...] Creio, no entanto, apoiado por semelhante grupo faccioso

dificilmente poderá conseguir seu objetivo.”280.

A carta de Inaldo Noronha nos ajuda a perceber uma das formas de disputa entre

os partidos e a importância dada à unidade do partido militar, ou seja, a instituição. Nos

trechos destacados, há a afirmação de que a divisão dos militares é uma das formas de

atuação da “trama comunista”. Creio que este comentário exemplifica como o conflito

entre o “partido” e “os partidos” se dava no cotidiano do militar. Podemos supor que o

sobrinho de Pery decidiu sair da chapa porque simplesmente não queria ser classificado

como comunista, o que poderia resultar em possíveis perseguições na caserna. Portanto,

o “caso Inaldo” é apenas uma das formas de expressão do conflito, demonstrando que a

disputa eleitoral e a identificação de um partido com determinado grupo poderiam trazer

resultados indesejados para a carreira do militar. Este episódio não trouxe problemas

278 Fundador da Associação Benjamin Constant, Deodoro e Floriano (ABCDEF), de caráter nacionalista. Sisson foi oficial de Marinha, reformado como inválido por decreto em julho de 1931. Era amigo pessoal de Luís Carlos Prestes e ingressou no Partido Comunista Brasileiro (PCB) em 1945, quando o partido foi legalizado, deixando-o em 1948 por discordar das resoluções tomadas pela conferência nacional do partido. Maiores detalhes, ver: COUTINHO, Amélia. “Roberto Sisson”. In: ABREU, Alzira A. de e BELLOCH, Israel (organizadores). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Rio de Janeiro: Editora FGV, versão eletrônica. 279 Grifo meu. 280 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/85, 05-02-1962.

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para a composição da chapa União281. Contudo, a ligação de Pery com a Cruzada

Democrática foi lembrada em um periódico. Sobre este assunto, supomos que seu

desligamento deste grupo ocorreu após a intervenção dos ministros militares no período

da Crise da legalidade. Os ministros Gabriel Grün Moss (Aeronáutica), Odylio Denys

(Exército) e Sílvio Heck (Marinha) teriam desrespeitado os limites da legalidade ao

impedir a posse do vice-presidente por direito: João Goulart. Em entrevista que nos foi

concedida, o filho de Pery Bevilaqua, Affonso Bevilaqua, confirma nossa hipótese. Ao

ser questionado pelo motivo que havia levado seu pai a um rompimento com a Cruzada

Democrática, afirma: “Mas pelo comportamento deles!”. Dando seqüência ao nosso

pensamento e questionado sobre a relação direta entre: a) rompimento com a Cruzada

Democrática, b) Crise da Legalidade, c) Candidato da chapa Nacionalista para as

eleições do Clube Militar de 1962, Affonso Bevilaqua conclui:

“Não! Direta não, mas indireta sim. Ele, o país, estava muito esgarçado em autoridade. Depois da Crise da Legalidade... Aliás, houve a Crise da Legalidade por problemas de autoridade. O Jânio Quadros foi um que, inclusive, contribuiu enormemente para isto. Ele dá um golpe! E confessa antes de morrer, lucidamente”282.

Envolvido no clima das eleições que já aconteceriam imediatamente, “Uma

trincheira nacionalista” era construída283. O terreno já começava a ser preparado para os

nacionalistas e a vitória da chapa União era algo tido como certo, segundo o jornal

nacionalista. A identificação das chapas com seus líderes é um ponto oportuno para

atacar os adversários e defender os que compartilhavam seus pontos de vista. Enquanto

Pery é enaltecido em função de seu caráter e postura política, o seu concorrente é

identificado como um personagem sem iniciativa e moldado pela “cúpula golpista”,

conforme trecho abaixo:

281 Ver membros das chapas no Anexos 2 e 3. 282 Entrevista dada pelo entrevistado à autora e datada de 16 de janeiro de 2008. 283 Título de artigo presente na coluna de “Retrato sem retoque” (Última Hora, 15 de maio de 1962).

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“... o Clube Militar voltará à sua posição de radar captando a opinião pública para colocar-se em defesa dos assuntos nacionais, abrindo-se como bandeira democrática à frente dos acontecimentos brasileiros de grande importância. A chapa de oposição parece haver desmaiado em vista da preferência da maioria dos eleitores pela personalidade do General Peri, militar dos mais dignos, conscientes e respeitados. O seu opositor, General Magessi, modelado pela cúpula golpista, que prefere fofocar em vez de tomar os assuntos sérios, com seriedade, foi largado a si mesmo; sem orientação ou conselhos razoáveis....

(...)

“A diferença de atitudes, de caráter, de atos públicos, de sentimentos nacionalistas do general Peri, principalmente seu comportamento e sua coragem cívica demonstrados a favor da legalidade em agosto do ano passado, quando da renúncia de Jânio o colocaram numa escala muito acima do General Magessi e isto é o que fundamenta sua escolha para o pleito do Clube Militar a realizar-se amanhã” 284.

Identificar Magessi com a cúpula era comprometer sua imagem diante daqueles

que acompanhavam as publicações nacionalistas. Se um candidato que fosse orientado

por aqueles que seguiam uma política diferente daquela defendida pelos legalistas

assumisse o Clube Militar, então isto implicaria em uma mudança no relacionamento do

Clube com o cenário político nacional. Para que este quadro não se concretizasse, a

preocupação em deixar claro o que se entende por essa “cúpula golpista” e seu

contraponto com os “princípios” dos nacionalistas ficava evidente.

“A política de cúpula, até há pouco tempo, nitidamente golpista e oportunista, percebendo que o Clube Militar se transformara em trincheira democrática, em bandeira nacionalista, providenciou para que seus salões não mais fossem ocupados para conferências de esclarecimentos sobre problemas nacionais e que sua revista divulgadora de ensinamentos preciosos para a vida política do Brasil, não mais fosse editada. Como essas providências, outras foram tomadas para acabar com o intuito de esvaziar o Clube Militar de seus nobres propósitos, anulando a força e o prestígio que tinha o Clube Militar no conceito do povo. E daí, sob tantas pressões golpistas organizadas pela ala que lançou agora Magessi, haver chegado o Clube Militar a uma quase total omissão nos acontecimentos nacionais. Com a eleição e vitória do General Peri Bevilaqua para o Clube Militar voltará às posições e atuações marcantes nos

284 Última Hora, 15 de maio de 1962.

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acontecimentos da vida brasileira, e o Clube Militar retomará o seu significado na trincheira nacionalista”.

Consideramos importante a publicação de tal matéria no dia anterior à eleição,

justamente por fazer comparações entre os candidatos. Colocar-se a favor de uma ou

outra chapa implica algum tipo de ligação, seja ela ideológica ou política, com uma ou

outra corrente existente nas Forças Armadas.

Com alguns dos resultados parciais temos o início da eleição para a Presidência

do Clube Militar em sua sede no Rio de Janeiro. No dia da eleição, 16 de maio de 1962,

Pery recebeu um rádio do coronel Creso, relatando a vitória da chapa União, com

sessenta e três votos, na guarnição de São Vicente, São Paulo285.

Para a Comissão Escrutinadora, entendida aqui como grupo fundamental para

certificar credibilidade ao processo eleitoral, foram escolhidos os seguintes sócios:

marechal Nilo Horácio de Oliveira Sucupira (Presidente); tenente-coronel Confúcio

Pamplona (Secretário); tenente-coronel Amadeu Martins; tenente-coronel João Batista

de Oliveira Figueiredo286; tenente-coronel Euclydes de Oliveira Figueiredo Filho287;

tenente-coronel Colombo Teles de Siqueira; major Hugo da Gama Rosa Sucupira;

major Fernando Guimarães de Figueira Lima; capitão Marcio Pinto Coelho; capitão

Orlando dos Santos Reis. 285 Museu Casa de Benjamin Constant, Acervo Pery Bevilaqua, Dossiê Clube Militar, PCB/TD/3/97, 16-05-1962. 286 No momento das eleições, João Batista de Oliveira Figueiredo, era instrutor da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). A ECEME logo se transformaria em um dos principais pontos de apoio à conspiração contra o governo de João Goulart. Chefiou o Serviço Nacional de Informações (SNI) do Rio de Janeiro durante os primeiros anos de regime militar. Chefiou o Gabinete Militar da presidência de Emílio Garrastazu Médici. No governo do general Ernesto Geisel, chefiou o SNI. Integrou o núcleo de decisões governamentais no processo de “distensão”. Foi presidente da República entre 1979 e 1985 (RAMOS, Plínio de Abreu e COSTA, Marcelo. “João Batista Figueiredo”. In: ABREU, Alzira A. e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Rio de Janeiro: Editora da FGV, versão eletrônica). 287 Euclydes de Oliveira Figueiredo Filho, irmão do tenente-coronel João Batista Figueiredo, também encontrava-se como instrutor da ECEME, mas na seção de cavalaria e blindados. No governo militar, foi secretário da Comissão Sumária do Exército, “responsável pela identificação de pessoas potencialmente subversivas ao regime”. Além disso, foi subchefe do Gabinete Militar do presidente Emílio Garrastazu Médici (1969-1974). Foi transferido para a reserva em dezembro de 1985. Sobre as eleições presidenciais, em 1989, fez a seguinte declaração: “se houver baderna no país, a eleição poderá não ocorrer e sim o golpe”, demonstrando suas tendências políticas (ARIOZA, Moisés e ARAGÃO, Mirian. “Euclides Figueiredo Filho”. In.: ABREU, Alzira A. e outros (org.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Rio de Janeiro: Editora da FGV, versão eletrônica).

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Os sócios se reuniram às 10h de 16 de maio de 1962, na Sede Social do Clube,

dando início à votação. Às 21h – conforme artigo 52, nº2 e Instruções Reguladoras da

Assembléia – foi suspenso o lançamento de assinaturas na lista de presença, sendo o

processo eleitoral cumprido dentro do regimento estatutário. Às 14:30 h a Comissão

começou a apuração da votação do interior, com os votos da chapa União, e às 17 horas,

com os da chapa Confraternização. Quando a votação foi terminada, as urnas foram

abertas pela Comissão Escrutinadora e a contagem de votos, iniciada. À zero hora do

dia seguinte, foram interrompidos os trabalhos,

“que prosseguiram diariamente, nos dias úteis, das 9h às 19h

até o dia 31 de maio, quando às 21h houve a reunião definitiva da

Comissão Escrutinadora, com a presença do candidato de uma das

correntes, General Augusto da Cunha Magessi Pereira, e o Fiscal

Chefe de sua chapa, o Exmº Sr. Marechal Manuel de Azambuja

Brilhante. Deixaram de comparecer na última reunião o outro

candidato e seu representante”288.

A conclusão dos trabalhos de apuração se deu no dia 1º de junho às 2h, com o

seguinte resultado: Chapa Confraternização, 5349 votos válidos e 971 nulos; Chapa

União, 4790 votos válidos e 1562 nulos. Foi grande a discrepância entre o resultado e as

previsões da chapa encabeçada pelo general Peri Bevilaqua. Por isso, a chapa

nacionalista contestaria o resultado na Justiça, prolongando a disputa entre os “partidos

militares”.

288 Atas de Reunião do Clube Militar (1961-1963), p.112.

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Capítulo 4 – O quadro político pós-eleição e o destino político dos protagonistas

Terminada a apuração dos votos, e constatada a vitória da chapa

Confraternização, membros da chapa União levantaram suspeita de fraude. Alguns

documentos foram elaborados e distribuídos aos sócios do Clube pelos membros desta

chapa ao longo do ano de 1962, como um Manifesto da Comissão Eleitoral

responsável pela campanha dos nacionalistas e panfletos explicativos sobre o

processo eleitoral. O general Pery Bevilaqua recebeu vários documentos de

comandantes de regiões distintas do país contestando o resultado e afirmando que não

haviam votado na chapa adversária, ao contrário do que constava nas atas de votação.

Uma das primeiras correspondências com este sentido foi a declaração de Pedro de

Alcântara Rodrigues de Araujo informando que votara na sua chapa, e não na de

Magessi289. Imediatamente, o líder da chapa nacionalista enviou uma carta ao presidente

do Clube Militar, general Paulo Torres, solicitando que as cédulas não fossem

incineradas, pois havia “fortes indícios de falsificação de votos” 290. A movimentação

contra os golpistas291 começou antes mesmo do resultado final da apuração dos votos –

concluída em 1º de junho como indica a Ata da Assembléia Geral Eleitoral. O

comandante Roberto Sisson, em uma carta ao marechal Epaminondas dos Santos, Vice-

Presidente do Clube Militar, já demonstrava sua preocupação, afirmando que não fora

“consultado sobre a constituição e critério de ação da Comissão de Fiscais do pleito em

fase final de apuração, não tendo assim sequer opinado no assunto” 292. Assim, sugeriu

que:

289 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/100, 22-05-1962. 290 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/101 e 102, 22-05-1962. 291 A ala, que até o momento nós classificamos como “antinacionalista”, será denominada de “golpista” por dois motivos: indícios de fraudes nas eleições do Clube e o fato de grande parte de seus componentes estarem diretamente ligados aos acontecimentos que levariam ao golpe de abril de 1964. 292 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/103, 29-05-1962.

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a) “Impugne a eleição do gal. Magessi por ser ele inelegível (Art. 52 do Estatuto).

b) Impugne a validade das decisões da Comissão de Escrutinadores nomeada pelo Presidente em exercício do C.M. por não ser ela constituída paritariamente.

c) Impugne qualquer contagem final dos votos que não tenha sido precedida pela publicação dos nomes dos autores dos votos em duplicata, a fim de que se distingam os autênticos dos falseados, levando-se aqueles em conta.

d) Responsabilize a Diretoria do Clube pela não incineração dos votos após a proclamação do resultado final das eleições, devendo ficar guardados em lugar, seguro, sob guarda neutra, aguardando o pronunciamento da justiça que será por mim invocado, com as finalidades explícitas nesses três primeiros itens.”.

O Artigo 52 do Estatuto do Clube, citado acima, afirma que

“Os cargos da Diretoria, do Conselho Deliberativo, do Conselho Fiscal e dos Diretores dos Serviços Especiais são providos mediante eleição, em que só tomarão parte os sócios efetivos do Clube, em sessão ordinária da Assembléia Geral especialmente convocadas para esse fim” 293.

A chapa nacionalista alegava que não houve uma eleição em que somente os

sócios efetivos do Clube tomaram parte. Veremos adiante que o maior problema

verificado na contagem e confirmação dos nomes com assinaturas dos votantes foi

justamente a existência de cédulas com o nome de oficiais que já haviam falecido na

data da eleição.

Além disso, o Artigo 55 do Estatuto determinava que:

“Com antecedência mínima de dez dias, o Presidente do Clube e os Diretores da Assistência e da Caixa Mutuaria designarão Comissões Escrutinadoras, compostas de dez membros, sócios residentes na Capital, ou em Niterói, havendo um presidente e um secretário para cada Comissão”294.

293 Estatuto do Clube Militar. Rio de Janeiro: Departamento de Imprensa Nacional, 1947. 294 Idem.

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Em nossa pesquisa, nenhuma ata referente a este tipo de ação, ou seja, de

nomeação de membros para compor a Comissão Escrutinadora, foi encontrada no

acervo do Clube Militar, comprovando, assim, a denúncia da chapa derrotada. O

primeiro e único contato que tivemos com esta lista, a relação nominal dos nomes que

formariam a Comissão, foi na Ata da Eleição para a Presidência do Clube295.

A derrota da chapa nacionalista repercutiu na imprensa. No dia 1º de junho de

1962, o general Pery Bevilaqua concedeu uma entrevista à Rádio Gaúcha. Ao ser

perguntado sobre a sua reação ao resultado, Pery respondeu: “desagradavelmente

surpreendido por saber que foram anulados injustificadamente votos autênticos de

centenas de sócios do interior” 296.

“Lamentavelmente não tenho a menor dúvida de que houve fraude na votação. Não acredito em fraude na apuração e sim em erro de julgamento, proveniente de ignorância ou confusão de ‘causas de nulidade insanáveis’, com irregularidades e ‘nulidades sanáveis’, havendo imperado um critério faccioso e injusto por parte da Comissão Escrutinadora, que foi composta integralmente de elementos favoráveis à chapa contrária”297.

Enquanto nesta entrevista, o general tentava defender seu ponto de vista

quanto à derrota nas eleições do Clube, no mesmo dia o periódico carioca O Globo

publicava uma matéria com a “Recordem o banho de sangue de 1935”. Como

apontamos anteriormente, este periódico publicava, de forma corriqueira, material a

favor da chapa Magessi. Se os termos “golpismo” e “entreguismo” eram os mais

comumente associados à conduta dos militares ligados à chapa Confraternização, fosse

através da imprensa ou das correspondências trocadas entre Pery Bevilaqua e outros

nacionalistas, estes, por sua vez, eram taxados pelos adversários de “comunistas” e

295 Esta Comissão era composta pelos seguintes membros: Marechal Nilo Horácio de Oliveira Sucupira (Presidente); Tenente-Coronel Confúcio Pamplona (Secretário); Ten. Cel. Amadeu Martins; Ten. Cel. João Batista de Oliveira Figueiredo; Ten. Cel. Euclydes de Oliveira Figueiredo Filho; Ten. Cel. Colombo Teles de Siqueira; Major Hugo da Gama Rosa Sucupira; Major Fernando Guimarães de Figueira Lima; Capitão Marcio Pinto Coelho; Capitão Orlando dos Santos Reis. 296 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/117, 1º-06-1962. 297 Idem.

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responsáveis pela politização dos militares através do Clube Militar. O artigo de O

Globo transcrito abaixo, veicula esta mensagem. Ainda que Pery Bevilaqua seja, na

introdução, tratado com respeito, o general Magessi é apontado como “um oficial

ilustre, acatado nos meios civis e militares” 298.

“Mas essa apaixonada disputa entre as duas chapas não constitui razão bastante para os verdadeiros destampatórios a que se está entregando o honrado General Bevilaqua, quando, a propósito da oposição à sua candidatura, voltou a recordar sem nenhuma pertinência ‘os generais rebeldes que queriam rasgar a Constituição para negar posse ao Presidente da República’ e a sustentar sem a mais longínqua verossimilhança que há um ‘golpismo em hibernação’ usando ‘desmoralizado chavão do perigo comunista’ para prejudicar a referida candidatura.

Um pleito eleitoral, seja para o que for, constitui sempre um atrito entre doutrinas e personalidades, um confronto acerca da soma de predicados dos que nele se empenham, de modo que seu desfecho não importa demérito ou desonra para o vencido.

Infelizmente nem todos sabem perder, e quase sempre os que não logram o êxito desejado passam a dar por paus e pedras. Eis o que acontece com o General Peri Bevilaqua, acusando meio mundo por seu insucesso. Até os que nada tem com ele.

O General Bevilaqua assevera que ‘tendo vencido com enorme vantagem no interior, fiquei em desvantagem aqui, em conseqüência da deturpação sistemática dos nossos propósitos’.

Mas, desde logo, deveria o digno militar admitir que cada qual vota como entende, como lhe parece melhor. Portanto, se nesta cidade S. Ex.ª ficou ‘em desvantagem’, não lhe cabe pesquisar a causa determinante dos que sufragaram seu contendor, da mesma maneira que a este não compete investigar por que o General Bevilaqua o sobrepujou nas guarnições de fora.

A liberdade de escolha dispensa motivação.”299.

A questão da legalidade, no momento em que o artigo afirma que “[Pery]

voltou a recordar sem nenhuma pertinência ‘os generais rebeldes que queriam rasgar a

Constituição para negar posse ao Presidente da República’”, é colocada pelo periódico

como algo que não correspondia ao momento político vivido. Lembremos que em junho

de 1962 ainda vigorava a fase parlamentarista do governo de João Goulart, que, após a

renúncia de Jânio Quadros, deveria ter assumido por direito a Presidência, como

assegurava a Constituição, com todos os seus direitos garantidos na condição de vice-

298 O Globo, 1º de junho de 1962. 299 Idem.

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presidente eleito. O período parlamentarista representou justamente esse desrespeito à

Constituição tratado por Pery Bevilaqua no trecho em destaque no início deste

parágrafo. A acusação de comunista era recorrente aos membros da chapa nacionalista,

inclusive durante a campanha eleitoral à presidência do Clube, como visto no capítulo

anterior. O general reconhecido como legalista, ou seja, seguidor das leis, deveria,

assim, seguir o que foi determinado pelo resultado das eleições de 1962. Se o líder da

chapa nacionalista foi derrotado nas eleições, conforme explica o artigo de O Globo, foi

porque “a grande massa da oficialidade da Guanabara” não desejava que o Clube

voltasse a se transformar

“em agitado foro para o debate de temas políticos e não de interesse estritamente militar, como sucedeu no período da administração do General Newton Estillac Leal. (...) Muitos atos do governo foram calorosamente discutidos na sede da agremiação de forma incompatível com as finalidades da Casa.”300.

Os ataques ao general continuam e acusam Pery de atribuir sua desvantagem

“à deturpação de seus propósitos”, ou seja, a caracterização da chapa nacionalista como

defesa de princípios do comunismo. Ao grifar o termo perigo comunista, como afirma o

periódico301. O general teria esquecido o levante de 1935 e, com isso, a luta dos oficiais

que lutaram em defesa de um regime constitucional. Aqui encontramos o

posicionamento político do jornal e a forma como este se colocava no cenário político

nacional e internacional. Em O Globo notamos o que representava o medo do avanço do

comunismo e a importância das Forças Armadas livre do “perigo vermelho”. Sobre o

comunismo, afirma o artigo:

“Esse perigo volta atualmente mais grave do que antes,

quando as portas do Brasil estão sendo abertas a quantos agentes de Moscou queiram aqui penetrar com imunidades diplomáticas ou

300 Idem. 301 A carta ao que o jornal O Globo se refere não foi localizada no acervo do general e nem nas edições anteriores do periódico.

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como colaboradores da Exposição Soviética302. Exposição que é uma arma de propaganda.

Desgraçadamente o perigo comunista não afeta apenas o nosso país, mas o mundo inteiro diante da concepção imperialista da URSS. Vamos mais longe, e constatamos que nunca uma nação preparou mais poderosamente a conquista das outras como ocorre com o comunismo internacional, cuja cabeça política e militar se acha no Kremlin” 303.

A preocupação com a expansão do comunismo era evidente. Para demonstrar

que as acusações feitas ao general não eram infundadas, uma comparação entre o

nacionalismo e o comunismo foi feita. Se Pery Bevilaqua considerava que era apenas

um nacionalista e “ousa grifar a expressão perigo comunista, como se fora uma calúnia

dos seus adversários para vedar-lhe a presidência do Clube Militar!”, O Globo procura

demonstrar que a posição do general estava equivocada:

“O General se considera somente um nacionalista, e repele a confusão desse ponto de vista com o de marxista.

Em teoria S.Ex.ª está certo: um católico praticante pode ser nacionalista. Nem nacionalismo é um defeito. Todos os que amam a sua pátria são nacionalistas. Mas a palavra internacionalmente deturpada pelos sovietes, que, professando uma doutrina universalista, se mascaram nacionalistas (no caso ‘nacionalistas’ entre aspas) para se infiltrarem nos povos subdesenvolvidos, dentro deles provocando as revoltas que brotam da miséria e do desespero. A miséria e o desespero constituem caldo de cultura para a revolução vermelha, para a fomentação do ódio ao Ocidente, notadamente os Estados Unidos

[...]

A verdade é que o nacionalismo, tal como aqui se exibe, não passa em geral de uma linha auxiliar do Partido Comunista. Daí, a suspeição com que é recebido pela Nação este ‘nacionalismo’, por seu caráter sectário. E veja bem o nobre General que todas as suas suscetibilidades do nosso ‘nacionalismo’ só se voltam contra os Estados Unidos. Jamais contra a URSS. Só isso bastaria para caracterizá-lo. Caracterizá-lo ou descaracterizá-lo, como preferirem.”304.

Encontramos, assim, uma aproximação das idéias contidas aqui neste

periódico com as acusações feitas pelos membros da chapa Magessi aos componentes

302 Exposição organizada pela embaixada soviética no ano de 1961 (Fonte: http://pt.wikipedia.org.wiki/Grupo_Secreto). 303 O Globo, 1º de junho de 1962. 304 Idem.

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da chapa adversária. Se no programa da chapa Confraternização notamos a defesa de

um Clube Militar de caráter recreativo e apolítico, demonstrando, assim, o

profissionalismo militar quando não interfere na política305, O Globo defende a mesma

postura dos militares. Bevilaqua é associado à posição contrária:

“Segundo as declarações do General, o que convém ao Clube Militar é intrometer-se nas discussões dos problemas políticos ou da administração do país. Não é o que deseja a grande maioria dos sócios.

O Clube é uma associação civil, é certo, mas seus componentes são militares. No dia em que se lhes reconhecer o direito de decidir as questões afetas ao Governo, teremos implantado a indisciplina no seio das Classes Armadas e criado um perigoso foco de divergências. Para este debate existem o parlamento e a imprensa, ambos funcionando livremente. Sobretudo hoje, com o rádio e a televisão que comunicam a crítica a imensos auditórios e que chegam a todos os pontos do território” 306.

O trecho em destaque acima nos remete à idéia de sociedade pretoriana tal

como teorizada por Samuel Huntington. Uma sociedade constituída por “instituições

fortes”, não tem, segundo o autor, espaço para a participação política de grupos

destinados a outro tipo de função, como os militares. Uma das saídas para este quadro

de politização das Forças Armadas é justamente uma maior profissionalização dos

oficiais, que reduziria as possibilidades da sua intervenção na política nacional307.

Enquanto um oficial legalista e profissional, caberia ao general Pery acatar o resultado

da eleição no Clube Militar, e não provocar divergências que pudessem enfraquecer as

Forças Armadas. Portanto,

“Ao General Bevilaqua assiste o direito de não simpatizar com a orientação dos Estados Unidos no plano internacional ou interamericano, assim como se solidarizar-se com o Sr. Leonel

305 Para mais detalhes sobre uma interpretação quanto à relação entre os aspectos de profissionalização e politização dos militares, ver: HUNTINGTON, Samuel P. Ordem Política nas Sociedades em Mudança. Rio de Janeiro: Forense-Universitária / SP: Editora da Universidade de São Paulo, 1975 e HUNTINGTON, Samuel P. O Soldado e o Estado. Teoria Política e das Relações entre Civis e Militares. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 1996 306 O Globo, 1º de junho de 1962. 307 HUNTINGTON, Samuel P. Ordem Política nas Sociedades em Mudança. Op. cit.

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Brizola na linha de conduta política adotada pelo Governador do Rio Grande do Sul.

O inadmissível é que tão destacado chefe militar possa considerar o perigo comunista como uma invenção dos adversários de sua candidatura à presidência do Clube. A não ser que S. Exª, em vez de um perigo, considere o comunismo como uma vantagem para o Brasil e para o mundo. Não lhe negamos o direito de escolha” 308.

Na mesma edição, O Globo apresentou ainda uma matéria intitulada “Exército,

Marinha e Aeronáutica Revelarão o Perigo Que Pesa Sobre a Nação”, reforçando a

percepção da ameaça comunista. Nela, o comandante da 8ª Região Militar, general

Estevam Taurino de Resende, referia-se à elaboração de um documento sobre as “as

atividades comunistas numa área de 5 milhões de quilômetros quadrados”.

Em defesa do grupo de Bevilaqua, O Semanário309, publicou, em junho de

1962, a íntegra de uma carta do almirante Paulo Mário da Cunha Rodrigues, presidente

da Comissão Pró-Chapa União. Neste documento o almirante apresenta o ponto de vista

da chapa derrotada, através da demonstração de Uma “série de processos estranhos à

ética militar postos em prática” pela chapa vitoriosa é denunciada pelo almirante. O

primeiro passo para a vitória da chapa Magessi teria sido a nomeação de uma Comissão

Escrutinadora “totalmente constituída de elementos da Cruzada Democrática”.

Entendia, portanto, que o processo eleitoral já teria tido um caráter duvidoso, na medida

em que a Comissão Escrutinadora não deveria ser parcial,. Como havia indícios de

falsificação, os votos não deveriam ser incinerados.

A chapa nacionalista recorreria na justiça. Assim, Carlos de Hess Mello,

Anderson Mascarenhas e Roberto Henrique Faller Sisson moveram na 13ª Vara

Cível310, em junho daquele ano, uma Ação Ordinária para promover a anulação das

308 O Globo, 1º de junho de 1962. 309 O Semanário, 21 de junho de 1962. 310 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/124, 18-06-1962. Não trabalharemos o processo em seus mínimos detalhes por considerarmos que tal método se perderia no contexto de nossa pesquisa e objetivos. Contudo, atentaremos para informações consideradas importantes para o entendimento das ações e disputas entre os líderes das chapas. Assim, os pontos que trataremos sobre os acontecimentos na eleição, deste trecho em diante, foram retirados desta Ação Ordinária, movida por Carlos de Hess Mello,

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eleições de 1962. Por ordem judicial, as cédulas não poderiam ser incineradas até o final

do processo. Pery Bevilaqua tentou negociar com Magessi sobre o processo eleitoral e a

questão da incineração das cédulas, como se percebe na correspondência trocada pelos

dois.

“GEN MAGESSI 1ª DI – Vila Militar – Rio Rádio nº 24 de 7-6-62 – CORREIO POVO AQUI

PUBLICA NOTÍCIA INCINERAÇÃO CÉDULAS ELEIÇÕES CLUBE MILITAR E DIZ HAVER V EXCIA DIRIGIDO CARTA PRESIDENTE CLUBE OPINANDO FAVORAVELMENTE INCINERAÇÃO PT ANTE DESTRUIÇÃO PROVAS CRIME FALSIFICAÇÃO PERGUNTO VOSSÊNCIA VG HIPÓTESE SER VERDADEIRA TAL NOTÍCIA VG A QUE FICARIA REDUZIDO PACTO HONRA ASSUMIDO VOSSÊNCIA COMIGO ESCLARECER DELITOS FRAUDE E PUNIR CULPADOS PT ESPERO ANSIOSO DESMENTIDO VOSSÊNCIA AQUELA CONDUTA PT EXAME PERICIAL GRAFOTÉCNICO TERIA INCIDIR MIL TREZENTOS VOTOS CHAPA CONFRATERNIZAÇÃO APRESENTADOS DIA ELEIÇÃO COMO VINDOS INTERIOR TODOS POREM FIRMA RECONHECIDAS TABELIÃO RIO PT TODOS SUSPEITOS FALSIFICAÇÃO CONSTATADA DEZENAS OUTROS PT QUEM PODE ASSEGURAR VOTOS FALSOS SOMENTE COMPREENDIDOS QUINHENTOS E OITO VOTOS DUPLOS ENCONTRADOS PT INTERROG ATS SDS PT GEN PERY BEVILAQUA – CMT 3ª RM”311

Em resposta ao pedido feito por Pery, respondeu Magessi:

“GEN DIV PERY CONSTANT BEVILAQUA Cmt 3ª RM – P ALEGRE S/Nº de 120662 PT – RERA 24 DE 070662 LABORA V EXCIA LAMENTAVEL ENGANO

PORQUE MAL INFORMADO PT NÃO HOUVE PACTO ALGUM ET SE PACTO HOUVESSE NÃO INVALIDARIA INSTRUÇÕES EM VIGOR QUE DETERMINAM INCINERAÇÃO TODOS VOTOS APÓS PRONUNCIAMENTO COMISSÃO ESCRUTINADORA PT LEMBRO NOSSO ENCONTRO CORDIAL SALA PRESIDÊNCIA SEM NENHUM COMPROMISSO POIS INCLUSIVE NÃO LIH NEM AS (...?...) DOCUMENTO V EXCIA TINHA EM MÃOS PT ENTENDEMO-NOS SIM ADMITINDO HIPÓTESE DEPOIS VERIFICADA PELA CITADA COMISSÃO ESCRUTINADORA COM CENTO

Anderson Mascarenhas e Roberto Henrique Faller Sisson, representado pelo advogado Heitor Rocha Faria. 311 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB / TD / 3 / 119, 04-06-1962.

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SESSENTA ET CINCO CEDULAS ANULADAS POR SUSPEITA CULPABILIDADE SEUS SIGNATÁRIOS PT A UMA SITUAÇÃO INÉDITA DEVE CORRESPONDER UMA APLICAÇÃO INÉDITA PRINCÍPIOS PT VG EXEMPLO PT PT VOTOS VINDOS DE FATO INTERIOR CHAPA BRANCA VC EM NÚMERO CENTO E DEZOITO E NÃO MIL TREZENTOS COMO DIZ VEXCIA VG RECONHECIDOS TABELIAO RIO SÃO ABSOLUTAMENTE LEGAIS PT PELO CONTRÁRIO VG NULOS DEVERIAM SER MAIS DE MIL VOTOS INTERIOR CHAPA UNIÃO CUJOS ENVELOPES TINHAM ESCRITOS A MÁQUINA O NOME DO VOTANTE ET A CARIMBO O DA ELEIÇÃO ET VG TAMBÉM VG VOTOS VINDOS INTERIOR ET TOMADOS ANTES INÍCIO PERÍODO ELEITORAL COMO FOI CONFINADO ET CONSTA ATA ASSEMBLÉIA PARCIAL DE 13 DE MARÇO DESTE ANO PT ENTRETANTO SOBRE AUTENTICIDADE VOTOS JAMAIS LEVANTEI SUSPEITAS CONFIEI SEMPRE ET RESPEITEI ATUAÇÃO SEGURA MINUCIOSA IMPARCIAL FISCAIS ET COMISSÃO ESCRUTINADORA PT NÃO TRATAREI MAIS DESTE ASSUNTO PT ATENCIOSAS SAUDAÇÕES PT – GEN DIV AUGUSTO MAGESSI CMT 1ª DI” 312.

Pery havia solicitado ao presidente do Clube, general Paulo Torres, que as

cédulas não fossem incineradas devido aos motivos expostos nesta correspondência

entre ele e Magessi. Contudo, ainda que sob ordem judicial, o pedido não foi atendido,

como informa o almirante Paulo Mário da Cunha Rodrigues:

“Depois de proclamarem um resultado que dá a ‘vitória’ ao Gen.Magessi, mesmo sabendo das ações que correm em juízo e fugindo dos compromissos que haviam assumido, os responsáveis pela apuração fizeram incinerar as cédulas do pleito para destruírem o corpo de delito. Numa tentativa de coonestar suas ações, deixaram 168 (cento e sessenta e oito) votos para serem vistoriados pela Justiça, aos quais atribuíram a condição ‘duvidosas’.”313.

Um Manifesto aos sócios do Clube Militar, datado de 21 de junho de 1962, foi

escrito pela Comissão Eleitoral da chapa “União” e assinado por Geraldo Porto de

Mendonça (Coronel R/1), Nadir Toledo Cabral (Tenente-Coronel R/1 e advogado), José

Portela Machado (Capitão-de-Fragata e médico) e Arulce Oliveira Lima (Capitão R/1).

O documento declarava o resultado como inaceitável, denunciando cinco fatos:

312 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB / TD / 3 / 119, 04-06-1962. 313 O Semanário, 21 de junho de 1962.

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1. Propagandistas da chapa Magessi, durante o período destinado à

propaganda, acusaram os componentes da chapa União de comunistas.

2. Responsáveis pela chapa Magessi, “mancomunados com os remanescentes

da conhecida CRUZADA DEMOCRÁTICA e mesmo com a atual Diretoria

do Clube Militar” impuseram Comissão Escrutinadora que, de acordo com

este documento, era constituída por membros adeptos de Magessi.

3. “A solércia foi iniciada com a introdução, dez minutos antes do

encerramento das eleições, de cerca de 1.300 votos, falsificados ou

irregularmente assinados, já que muitos traziam o nome de oficiais

falecidos. Escolheram nome de sócios ou ex-sócios (falecidos), vinculados

às guarnições do interior, entre os quais se identificaram os votos de oficiais

pertencentes à 7ª Região Militar, os quais haviam votado no Exmo. sr.

General Pery Bevilaqua. Agravando e ampliando as irregularidades, as

firmas falsas se achavam reconhecidas no Cartório Borgette, do Estado da

Guanabara”314.

4. “Anularam centenas de cédulas, oriundas da 2ª, 3ª e 7ª Regiões Militares,

sob o argumento pueril de que os chefes das Pagadorias de Inativos não

podiam reconhecer as firmas, pois as suas repartições não possuíam

autonomia administrativa.”.

5. Incineração dos votos, em descumprimento a uma notificação judicial.

O resultado da eleição foi contestado, também, por meio da análise

quantitativa, feita em cartas que foram enviadas por Bevilaqua ao presidente e ao vice-

presidente do Clube Militar.

314 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB / TD / 3 / 125, 21-06-1962.

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Resumo de votos 315

Diferenças entre votos das chapas (Chapa União – Chapa Confraternização)316

Conforme a Ata das eleições318, a chapa de Pery obteve 4790 votos válidos e

1562 nulos. A chapa Magessi obteve 5349 votos válidos e 971 nulos. Se

considerássemos válidos os votos nulos de ambas as chapas, os nacionalistas

totalizariam 6352 votos; contra 6310 dos adversários. Esta diferença de votos provocou

a reação nacionalista e a confecção das tabelas acima. Com elas, Pery tentava

demonstrar que, se os votos que não haviam sido invalidados fossem contados, sua

chapa seria a vencedora. Um dos argumentos defendidos pelos sócios que abriram a

ação na Justiça Civil contra o resultado da eleição estava justamente relacionado com a

confirmação dos votos e a manipulação do resultado por membros ligados à chapa de

315 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/102, 22-05-1962. 316 Idem. 317 Os valores de 957 e 33 dizem respeito a uma divisão dos 990 votos, resultando nas diferenças apresentadas na votação do Rio de Janeiro e da União. Isto serviria para comprovar fraude da chapa Magessi no processo eleitoral no Rio, onde Magessi obteve a votação mais expressiva. Por falta de dados, não conseguimos confirmar se a referência ao “Rio” está ligada ao estado ou à cidade. 318 Atas de Reunião do Clube Militar (1961-1963), pp.111-116.

Votos Chapa União (Pery) Chapa Confraternização

(Magessi) Computados 2.325 1.968 Deverão valer 1.587 940 Soma 3.912 2.908 Duvidosos 60 74 Soma 3.972 2.982 Nulos 284 295 Soma 4.256 3.277 Duplos 508 508 Total 4.764 3.785

Computados (2.325 – 1.968=) 357 Mais “deverão valer” (1587 – 940+357=) 1.004 Mais “duvidosos” (60 – 74 + 1.004=) 990 Dif. Rio 957317 Dif. “União” 33

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Magessi. Os pontos apresentados no “Manifesto ao Clube” são os mesmos que foram

destacados na Ação Ordinária, contra o resultado das eleições. O aspecto mais discutido

neste processo, e que levaria à não incineração dos votos, era a duplicação dos nomes.

Eram considerados duplos aqueles votos destinados a ambas as chapas. O que se

alegava na Ação era que as assinaturas destes sócios diferiam uma da outra, deixando

claro tratar-se de falsificação em detrimento da chapa de Peri, que, presumia-se,

receberia a maior parte dos votos vindos de outras regiões. Enquanto os votos eram

classificados como duplos e retiravam, aos poucos, a vantagem da chapa nacionalista,

outros surgiam favorecendo Magessi. Parte destes votos, principalmente classificados

como oriundos do Rio, eram votos de sócios falecidos, como os tenentes Leopoldo

Araújo e Manoel Rogaciano de Freitas, falecidos, respectivamente, em setembro de

1961 e março de 1960. A questão a ser verificada estava justamente nestes votos e os

representantes da chapa União solicitaram que os votos tidos como duplicatas não

fossem incinerados. A maior parte destes votos era oriunda da cidade do Rio de Janeiro

e do estado da Guanabara, por isso Peri considerava a “Diferença Rio” e a “Diferença

‘União’” na tabela acima. O artigo de O Globo, “Recordem o banho de sangue de

1935”, se refere à vantagem de Magessi na Guanabara, argumentando que “a liberdade

de escolha dispensa motivação”319. Pery havia declarado, em momento anterior à

publicação deste artigo, que ele havia ficado em desvantagem em função da deturpação,

de forma sistemática, de seus propósitos – sendo esta declaração utilizada pelo próprio

O Globo. Como comprovar que os votos foram duplicados?

“Os fiscais da chapa União suspeitaram das assinaturas de muitos votos duplos e comunicaram-se com alguns sócios do interior, vindo a descobrir que não haviam votado no candidato de Magessi. Muitos desses eleitores enviaram declarações, as quais estão em poder do Presidente da Comissão Pró-Chapa UNIÃO, Almirante PAULO MÁRIO DA CUNHA RODRIGUES, e somam muitas dezenas.

319 O Globo, 1º/06/1962.

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“Todas essas fraudes foram denunciadas à Nação pelo manifesto de 11 de junho e, ao que consta, ninguém até agora ousou contestá-lo”320.

A questão das eleições de 1962 foi levada à Câmara dos Deputados em junho

de 1962. O deputado Faria Brenner demonstrou sua preocupação quanto ao caráter dos

militares que agora lideravam o Clube em função da vitória destes sob a suspeita de um

processo fraudulento nas eleições do Clube Militar.

“A Comissão apuradora, setor representante da chapa encabeçada pelo General Augusto Magessi, cometeu os maiores atos de felonia, de desavergonhamento e de falta de moral que seja possível imaginar-se, por se julgar erroneamente que a utilização de símbolos de autoridade de altas patentes por alguns desses componentes, possa dar-lhes a moral e a vergonha que seria desejável.

“As demonstrações de fraqueza, pusilaminidade e de conluio dadas pelo atual Presidente em exercício naquele clube, é algo de estarrecer. A bandalheira foi tão grande e tão desmoralizante, Srs. Deputados, que os seus executores preferiram, quando se sentiram desmascarados, não darem cumprimento a uma ordem judicial que proibia a incineração das cédulas, preferindo as sanções da Lei ao amargor da prova da falcatrua

E, Srs. Deputados, isso foi feito em um ambiente que conta com 70% da oficialidade das Forças Armadas Brasileiras. É certo, eu sei, que não é somente nas Forças Armadas que reside a segurança da realização de eleições livres e democráticas no nosso país. Mas, se neste clube que é de caráter eminentemente civil, composto exclusivamente de militares da ativa, da reserva ou reformados, acontecem coisas enxovalhantes como esta o que poderá supor-se das garantias prometidas ao Povo Brasileiro por esta corrente que dessa maneira julga ter vencido as eleições para o Clube Militar?”321.

Indeferida a ação proposta pela chapa derrotada, o general Augusto Magessi

assumiu a presidência do Clube Militar tranquilamente. Iniciou-se, aí, o processo de

despolitização do Clube, que fez com que a eleição de 1962 ficasse como a última

disputada em clima de polarização ideológica. Segundo Nelson Werneck Sodré, militar

e historiador de formação marxista:

320 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/124, 18-06-1962. 321 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB / TD / 3 / 147, [1962].

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“Está a diretoria atual cumprindo com esmero o seu programa de liquidar o Clube Militar, de mantê-lo como local em que se reúnem elementos da reserva e reformados para jogar bilhar e gamão”322.

Enquanto no Clube Militar o que predominava era o aspecto recreativo, no

cenário político nacional verificamos outra realidade. Terminado o ano de 1962,

teríamos início a fase presidencialista do governo de João Goulart, decidido através de

plebiscito nacional, realizado em janeiro de 1963. O Gabinete Militar de Goulart

manteria o oficial da fase parlamentarista, general Albino Silva323, que seria substituído

posteriormente pelo general Argemiro de Assis Brasil. Nos ministérios militares, houve

algumas mudanças ao longo do seu governo. Contudo, os ministros nomeados por João

Goulart eram reconhecidamente ligados ao grupo nacionalista. Esta preocupação com o

Gabinete era algo recorrente entre as correspondências analisadas no acervo do general

Pery. Nelson Werneck Sodré, no documento destacado acima, trata da mudança do

Gabinete324, ainda na fase parlamentarista:

“Nesse episódio ficou claro que havia duas linhas, que por vezes se confundiam: uma delas era a das forças nacionalistas, que se batiam por um ministério nacionalista e democrático (nacionalista para resolver realmente os graves problemas nacionais, agravados agora com a carestia e a sonegação de gêneros) (democrático para resolver o problema do golpismo militar, novamente em ascensão, e do terrorismo, em expansão, quando se sabe quem são os terroristas, onde se reúnem e quem os financia); outra linha era a do Presidente Goulart, que visava aumentar os seus poderes, reduzidos pelo Ato Adicional. No resultado verificou-se que o Presidente conseguiu sucesso na sua manobra, apoiando-se nas forças nacionalistas e democráticas, mas estas foram enganadas, pois o ministério conserva nos postos chaves, políticos contrários às soluções nacionalistas e democráticas.”325.

322 Carta para Peri Constant Bevilaqua. Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/136, 20-07-1962. 323 O general-de-brigada Albino Silva chefiou o Gabinete Militar de João Goulart de 18.09.1962 a 18.10.1963. Para mais informações sobre o quadro de Ministros e Chefes Militares, ver o Anexo 5. 324 Mudança do Gabinete Tancredo Neves (08.09.1961 a 12.07.1962) para o Gabinete Brochado da Rocha (12.07.1962 a 18.09.1962). 325 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB / TD / 3 / 136, 20-07-1962.

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Neste ambiente golpista que teremos os protagonistas do episódio de abril de

1964, instaurando a ditadura no país. A corrente nacionalista não foi poupada e boa

parte de seu quadro foi cassada com os Atos Institucionais. Oficiais que pertenceram,

em sua maior parte, aos quadros de suporte do presidente João Goulart, foram cassados

no primeiro ano de governo militar, como podemos ver nas tabelas em anexo326.

Portanto, se o processo eleitoral no qual saiu vitorioso o grupo Magessi já apresentava

indícios de fraude e um passo para o golpismo, como vários militares e políticos vinham

alertando, então a tomada da cúpula militar e a perseguição àqueles que não

simpatizavam ideologicamente foi a saída para “limpar” as Forças Amadas de qualquer

tipo de ameaça já presente em 1962.

A disputa entre os partidos militares pós-1962

As várias acusações feitas pelos sócios simpatizantes da chapa nacionalista

não resultaram em vitória na Justiça Civil para estes. Se a Ação dos membros da chapa

União não conseguiu reverter o quadro supostamente fraudulento da eleição para a

presidência do Clube para os anos de 1962-1964, logo as conseqüências mais

preocupantes viriam no novo regime que se instauraria no país.

Os nacionalistas foram afastados da direção do Clube Militar e, de certo modo,

dos quadros políticos nacionais. Durante a fase parlamentarista do Governo de João

Goulart327, tivemos 7 ministros (sendo 1 interino) para os três Ministérios militares –

Guerra, Marinha e Aeronáutica –, 3 chefes do Gabinete Militar e 2 chefes do Estado-

Maior das Forças Armadas. Neste período, o General-de-Divisão, Amaury Kruel foi

chefe do Gabinete Militar (08.09.1961 a 12.07.1962) e Ministro da Guerra (18.09.1962

a 24.01.1963). Temos um quadro equilibrado de militares neste momento. Destes 11

oficiais, 3 tinham ligação direta com a Cruzada Democrática: Amaury Kruel, Oswaldo

326 Ver Anexos 4 e 5. 327 Situada entre 08.09.1961 e 24.01.1963.

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Cordeiro de Farias (Chefe do EMFA de 08.09.1961 a 16.10.1961) e Nélson de Mello

(Ministro da Guerra de 13.07.1962 a 18.09.1962); 3 eram reconhecidamente

nacionalistas: Reynaldo Joaquim Ribeiro de Carvalho Filho (Ministro da Aeronáutica de

13.07.1962 a 18.09.1962), Albino Silva (Chefe do Gabinete Militar de 18.08.1962 a

24.01.1963) e Pedro Paulo de Araújo Suzano (Ministro da Marinha de 13.07.1962 a

18.09.1962). Quanto aos demais, não conseguimos estabelecer uma classificação mais

clara328.

Em sua fase presidencialista329, temos doze oficiais (um interino) em quadros

militares do governo. Destes oficiais, cinco também figuravam na fase anterior: Pedro

Paulo de Araújo Suzano, Amaury Kruel, Albino Silva e Oswaldo de Araújo Motta. Este

momento de João Goulart é visto através da historiografia como o de maior

“radicalização”. Jango precisava de apoio para as suas reformas de base e tanto a classe

operária quanto os militares nacionalistas eram necessários para consolidar a sua base

necessária para mudanças nos diversos aspectos da economia e da política nacionais.

Seu Ministério refletiria tal empreitada. Diferentemente da fase parlamentarista, os

nacionalistas predominavam em sua composição.

Enquanto na política nacional o quadro era de participação popular e

necessidade de mudanças – representadas pelas Reformas de Base de João Goulart – no

meio militar o andamento não era o mesmo. Nelson Werneck Sodré destacou que o

Clube Militar era, agora, “como [um] local em que se reúnem elementos da reserva e

reformados para jogar bilhar e gamão”. O Clube não apresentava mais as discussões em

torno de problemas relacionados com a política nacional. Seu caráter recreativo deveria

prevalecer! O grupo derrotado nas eleições de 1962 tinha seu papel no governo de

Jango. Contudo, isto mudaria com a chegada da ditadura.

328 Ver Anexo 4. Tais afirmações estão baseadas em verbetes do Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, da FGV, e de literatura referente ao Regime Militar. 329 Situada entre 24.01.1963 a 1º.04.1964.

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Com o golpe de 1964 e a instauração do Governo Militar, o processo de

“limpeza” da caserna tem seu início. Militares nacionalistas ou com alguma ligação,

foram os que mais forneceram quadros nas listas de cassações dos Atos Institucionais. O

processo eleitoral, aqui analisado, demonstra uma parte deste processo. Sem nos

determos nos membros da chapa União e seus destinos políticos ou na caserna,

destacamos uma outra fonte: em uma das listas presentes no Acervo de Pery

Bevilaqua330, encontramos 27 nomes de oficiais que confirmaram terem trabalhado pela

chapa União. Destes, 6 oficiais foram cassados durante os primeiros anos do Governo

Militar331. Portanto, ainda que representando um número baixo se comparado com o

total de oficiais presentes naquele documento, notamos uma tendência a punir aqueles

militares que não estariam identificados com o novo Regime.

Antes de nos determos nos detalhes a respeito dos membros da chapa União,

faremos um breve resumo dos tipos de punições presentes no “Estatuto dos Militares”332

vigente para aquele ano, ou seja, o do ano de 1946. Além dele, teremos também o

“Regulamento Disciplinar do Exército” (RDE)333.

Esses dois regulamentos apresentam os conceitos de hierarquia e disciplina.

Ao RDE estão sujeitos os militares do Exército, não compreendendo os magistrados da

Justiça Militar, pois estão sujeitos às leis especiais e disciplinares próprias334. O

Estatuto “regula os direitos, prerrogativas, deveres, responsabilidades, casamento e

herança militar dos oficiais e praças do Exército, da Marinha e da Aeronáutica”335.

330 Museu Casa de Benjamin Constant, PCB/TD/3/139, 18-10-1962. 331 Ver Anexo 5. 332 Ministério da Guerra. Estatuto dos Militares. Rio de Janeiro: Imprensa Militar, 1946, 1ª ed. 333 Estado Maior do Exército. Regulamento Disciplinar do Exército. s/d, 1969, 3ª ed. Utilizaremos a edição de 1969 por ser a que contém as alterações feitas no RDE até aquele ano. Desde 1942, o Regulamento passou por modificações nos anos de: 1947, 1959, 1961, 1963 e 1965. Ressaltamos, além disso, ressaltamos que optamos por nos pautarmos no Regulamento Disciplinar do Exército em função do número de associados e membros do Clube serem oriundos desta Força. 334 Estado Maior do Exército. Regulamento Disciplinar do Exército. s/d, 1969, 3ª ed, Art. 10, Parágrafo Único. 335 Ministério da Guerra. Ibid, Art. 1º.

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Durante a carreira, o militar pode encontrar-se em uma destas três situações: ativa,

reserva ou reformado. O Art.5º do Estatuto assim define cada uma delas:

“§1º. Militar da ativa é o que, ingressando na carreira, faz dela profissão, até ser transferido para a reserva dos quadros da ativa, licenciado ou reformado.

“§2º. Militar da reserva é o que, tendo prestado serviço na ativa, passa à situação de inatividade permanente, remunerada ou não. A expressão – militar da reserva – compreende, também, os oficiais oriundos dos órgãos de preparação de oficiais da reserva.

§ 3º. Reformado é o militar desobrigado, definitivamente, do serviço militar e considerado pensionista, ou não, do Estado”.

É pautado nesse vocábulo que nos deteremos agora para entendermos a

trajetória dos membros da chapa União, indicada na tabela abaixo.

Militares cassados durante o Governo Militar

Conforme o quadro acima, dos 71 militares que compunham a chapa de Pery,

65 estavam na ativa e, portanto, passíveis de receberem “punições”. Assim,

encontramos dezessete cassados entre eles. Da chapa de Magessi, de um grupo de 42

militares da ativa, apenas um foi cassado: João Sarmento336. Poder-se-ia argumentar que

o número de militares “simpatizantes” do novo regime, ex-membros da chapa Magessi,

na ativa não chegaria a 2/3 (aproximadamente 44 indivíduos) do número de militares na 336 O Coronel João Sarmento estava ligado ao Ministério do Exército e foi reformado, segundo o Diário Oficial (D.O.): 05-08-1964, p.6492. Contudo não conseguimos obter maiores informações sobre este oficial em nossa documentação analisada.

Nº. de membros Chapa União Chapa

Confraternização

Total 71 50

Ativa (até 1964) 65/71 42/50

Cassados 17/71 1/50

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mesma condição da chapa nacionalista. Devemos lembrar, ainda, outros militares

igualmente punidos e que estavam na listagem de oficiais que trabalharam pela chapa

União337. Neste documento, em anexo a este trabalho, consta uma pequena lista dos

votantes da chapa Magessi e nenhum militar foi punido. Ao estendermos este

pensamento ao quadro de ministros e chefes militares das duas fases do governo de João

Goulart, o resultado não é tão diferente. Dos onze oficiais que compunham os quadros

militares na fase parlamentarista, dez estavam na ativa e apenas um foi cassado: Pedro

Paulo de Araújo Suzano – que permaneceria como ministro da Marinha na fase

presidencialista. No segundo momento de Jango no poder, dos doze oficiais de seu

quadro militar, todos estavam na ativa em 1964 e sete foram cassados: Albino Silva,

Anysio Botelho, Argemiro de Assis Brasil, Jair Dantas Ribeiro, Pedro Paulo de Araújo

Suzano, Peri Constant Bevilaqua e Sylvio Borges de Souza Motta. Destes, Bevilaqua

não foi cassado nos primeiros anos da ditadura e por poder representar um “perigo” aos

militares vencedores em 1964338.

Ao analisarmos conjuntamente estes dois quadros, vemos que o processo de

perseguição aos oficiais nacionalistas que participaram das eleições de 1962 serviu,

também, como instrumento de “limpeza” do meio militar, expurgando-o de militares

ligados à orientação nacionalista predominante no cenário governamental brasileiro até

aquele momento. Em outras palavras, a eleição de 1962 para a presidência do Clube

Militar funcionou como um “ensaio” para a ala golpista que assumiria o poder em 1964.

337 Ver anexo 4. 338 Para mais detalhes sobre a carreira do General Pery, consultar o Anexo VI deste trabalho.

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Conclusão

O período conhecido como Crise da Legalidade, que ocorreu em

agosto/setembro de 1961, foi importante para a configuração das correntes que

disputariam as eleições de 1962 no Clube Militar. A defesa do legalismo e a luta pelo

desenvolvimento nacional pautado em um Estado presente na economia ou a articulação

golpista para impedir a posse de um vice-presidente eleito e a associação com o capital

estrangeiro são pontos que nos ajudam a diferenciar as principais correntes presentes

nas Forças Armadas, assim como suas disputas na lógica de “partidos”. Entendendo que

a origem destes “partidos” se dá em momento anterior ao do quadro de crise política dos

anos 1960, podemos apontar para uma fase embrionária durante os anos do primeiro

governo de Getúlio Vargas – principalmente aqueles concentrados durante o Estado

Novo (1937-1945).

Com a abertura política pós-ditadura varguista, um processo de

democratização começa a ser percebido na sociedade e os militares não estariam fora

deste quadro. Os grupos organizados em torno da figura de Getúlio, agora disputam

seus espaços através das discussões em torno dos problemas nacionais que ocorriam no

Clube Militar de fins dos anos 1940 e início dos 1950. A questão da nacionalização do

petróleo é considerada por muitos como o primeiro processo de divisão aparente das

correntes militares e a sua conformação em “partidos”. Góes Monteiro já havia

percebido o perigo representado pelas divisões existentes no seio das Forças Armadas,

preconizando: “É preciso fazer a política do Exército e não a política no Exército”.

Consideramos que este pensamento reflete o que Alain Rouquié e Antonio Carlos

Peixoto entendem pela lógica de disputas entre os “partidos” e a relação destes com ”o

Partido”. Enquanto os “partidos” demonstram as divisões no interior das Forças

Armadas, “o partido” identifica a instituição, ou seja, o Exército. No decorrer de seus

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confrontos, uma corrente pode prevalecer sobre as demais, perseguir os militares que

não são identificados com a corrente majoritária e, até mesmo, influenciar em um

processo de mudança do pensamento majoritário da instituição. Contudo, o que deverá

sempre prevalecer é a unidade entre os militares, ou seja, a manutenção d’o Partido, do

Exército.

A crise de 1961 ilustra a lógica dos “partidos” em conformidade com “o

Partido”. O Exército encontrava-se dividido naquele momento e o seu maior

contingente, o III Exército, assumiu uma postura de defesa da Constituição, garantindo

a posse do vice-presidente eleito, João Goulart. Se os ministros militares

permanecessem infringindo as determinações legais, uma guerra civil poderia ocorrer.

Então, visando a unidade do Exército e prevalecendo “o Partido”, uma saída é

encontrada. Ainda que não estando de acordo com o que os grupos naquele momento

desejavam – a posse de João Goulart com plenos poderes ou a convocação de novas

eleições – uma saída foi encontrada visando a satisfação das correntes em disputa e,

principalmente, a unidade do Exército.

As eleições de 1962 foram influenciadas pelo clima do “legalismo”, presente

na Crise da Legalidade, e repercutiam, ainda, o histórico daqueles grupos que

disputavam a presidência do Clube a partir de uma lógica em defesa ou não do

nacionalismo, fortemente presente nos anos 1950. Em 1952, nós tivemos a formação da

Cruzada Democrática, o “braço armado” da União Democrática Nacional (UDN),

visando a vitória no pleito daquele ano, já que os nacionalistas possuíam um grau de

organização melhor e conseguiam desenvolver suas campanhas de forma mais

“atrativa”, como afirmam seus principais estudiosos. A Cruzada venceu as eleições de

1952, mas deixou o poder em 1958, derrotada pelos nacionalistas. O ano de 1962, uma

década após a formação da Cruzada, marcaria o retorno da mesma à direção do Clube

Militar. Já que o Clube era visto como um termômetro da política nacional, nada melhor

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do que vencer o pleito e demonstrar que a corrente ligada aos militares “golpistas” de

1961, identificados por nós como “antinacionalistas”, era maioria nas Forças Armadas.

O grupo derrotado, representado por um dos líderes nacionalistas de 1961, o general

Pery Bevilaqua, não aceitou a derrota e alegou que o processo de apuração dos votos foi

fraudulento. Uma ação foi movida na Justiça Civil, mas em nada resultou. Provas,

dados, números... Nada conseguiu afastar o grupo da Cruzada Democrática da direção

do Clube. O grupo de Magessi preocupou-se em retirar do Clube seu caráter político e

de lócus de discussão das opiniões dos grupos militares. As atividades do Clube

estariam voltadas, agora, exclusivamente para jogos e encontros sociais entre seus

sócios. As Assembléias, palestras e outros tipos de manifestações em prol das

discussões políticas voltadas para o desenvolvimento do país não eram mais prioridade

na nova gestão. Preocupavam-se agora com a criação de sedes desportivas e em manter

longe dos espaços do Clube Militar a política “daninha” para o profissional militar.

Os militares nacionalistas perderam as eleições, mas ganharam espaço nos

quadros políticos do governo João Goulart. Naquele momento, o Clube Militar não

apresentaria o “termômetro da vida política” como afirma Rouquié? Acreditamos que

sim, mas não nos moldes dos anos 1950. Consideramos que este espaço entre 1962 e

1964, justamente o que corresponde à presidência de Magessi no Clube, serviu para

consolidar um determinado tipo de pensamento no meio militar, resultando, assim, no

golpe militar de 1964. É claro que não podemos descartar outras variáveis explicativas,

mas a vitória da ala “golpista” e o “esvaziamento político” do Clube são fundamentais

para entendermos o jogo entre os partidos. Um Clube isento de paixões políticas e

voltado para os assuntos das armas era o que defendia o novo presidente. Era uma das

fases do processo que culminaria na instituição de governo ditatorial em abril de 1964 e

na perseguição àqueles militares identificados com a chapa nacionalista, derrotada em

1962.

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Quando um militar é transferido para Reserva ou reformado, perde o seu

campo de atuação na caserna. Afastando aqueles que não compartilham os mesmos

princípios e não seguem a mesma “corrente” de pensamento, o partido militar se

estabelece no poder e consolida a sua posição. Essas foram as punições mais comuns

para aqueles que compunham o quadro da chapa União. Frustrado em sua intenção

golpista durante a Crise da Legalidade, o grupo vitorioso na eleição de 1962, ao chegar

ao poder em 1964, fez da perseguição a militares da corrente nacionalista um importante

recurso de fixação das bases do novo regime político.

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Anexos

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Anexo 1

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OA cp 59.05.14-03

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Anexo 2

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CLUBE MILITAR

CHAPA UNIÃO

ELEIÇÃO PARA O BIÊNIO 1962/1964

DIRETORIA

Presidente: Gen. Pery Constant Bevilaqua

1º Vice-Presidente: Gen. Silvino Castor da Nobrega

2º Vice-Presidente: Gen. R1 Reginaldo de Menezes Hunter

Diretor-Secretário: Tenente Coronel Joaquim Augusto Montenegro

Major Aluísio Carneiro da Rocha

Diretor-Tesoureiro: Major IE Eduardo Nóbrega

Cap. IE Nelson Gomes Nogueira

Cap. IE Murilo de Oliveira

Diretor do Departamento Cultural: Cel. Prof. Umberto Peregrino

Diretor do Departamento Recreativo: Capitão Ivan Cavalcanti Proença

Capitão Frag. Marcio de Albuquerque Suzano

Capitão Av. Ubiratan Cavaleiro Oliveira

Diretor do Departamento do Interior: Gen. R1 Carlos Hess de Melo

Diretor do Departamento Cooperativo: Gen. R1 Ciro Hollanda

Diretor do Departamento Desportivo: Major Gabriel Amaral Alves

Capitão Fernando de Albuquerque Menezes

Diretor do da Caixa Mutuaria: Cel. Candido Flayrs da Cruz

Diretor de C.H.I. – Cel. Euclides Pontes

CONSELHO FISCAL

Efetivos

Gen. Augusto Fragoso

Gen. José Publio Ribeiro

Cel. Av. Ademar Scaffa de Az. Falcão

Ten. Cel. Domingos Ventura Pinto Jr.

Maj. Sizenando Leite de Mendonça

Maj. Alberto Gomes Ramagem

Cap. Luiz Augusto da Silva Tavares

Cap. Laércio Monteiro da Rocha

Cap. Esp. Ae. Serra Costa

Ten. Cel. João Evangelista M. Da

Rocha

Suplentes

Gen. Alberto Ribeiro Paz

Gen. R1 Saturnino Gilberto Alvim

Cel. Méd. Felício Sacchi

Cel. Euryale de Jesus Zerbine

Maj. Aluízio Gonçalves Bogado

Ten. Cel. Elsino Ferreira Machado

Maj. Av. Odair Fernandes Aguiar

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Maj. Antonio Augusto Nogueira

Cap. Pedro Paulo de Albuquerque

Suzano

Ten. Oto de Oliveira Bastos Vieira

CONSELHO DELIBERATIVO

Efetivos

Brig. Helio do Rosário Ribeiro

Almte. Cândido da Costa Aragão

Cel. Luiz Tavares da Cunha Melo

Cap. M. Gr. Washington Frazão Braga

Ten. Cel. Av. Ruy Moreira Lima

Cap. Frg. Vanius de Miranda Nogueira

Maj. João Carelli

Cel. Otomar Soares de Lima

Cel. Crezo Moutinho da Costa

Ten. Cel. Joemi Lana Quinn Lopes

Suplentes

Gen R1 Ebenezer Cabral de Mello

Cel. Luiz Abner de Souza Moreira

Cap. Frag. Pedro Ferreira Moreira

Ten. Cel. Ene Garcez dos Reis

Cel. Otavio Gurgel do Amaral

Cap. Lacordaire Mosqueira Gomes

Neto

Ten. QOE Messias Machado da Silva

Gen. R1 Arthur Guaraná de Barros

Gen. R1 Pery Guedes de Carvalho

Ten. Cel. Leônidas Sales Freires

CARTEIRA HIPOTECÁRIA E IMOBILIÁRIA

Diretor: Cel. Cyro Martins Nunes

Secretário: Ten. Cel. Cario Stucky de Alencar

Maj. Manoel Henrique Siqueira

Tem. Cel. Cid Mascarenhas Façanha

Tesoureiro: Cap. Armando Soares Guimarães

Cap. Jorge Kelabi

Cap. Nelson Gomes Nogueira

ASSISTÊNCIA DO CLUBE MILITAR

Diretor: Gen. R1 Walter Masson

Secretário: Ten. Cel. Archimedes Ferret

Tesoureiro: Maj. Victor Torquato de Souza

CAIXA MUTUÁRIA

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Diretor: Gen. R1 Tharsis Cabral de Mello

Secretário: Maj. R1 Waldemar Martins Torres

Tesoureiro: Maj. IE Nazir Nasser

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Anexo 3

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CLUBE MILITAR

CHAPA CONFRATERNIZAÇÃO

ELEIÇÃO PARA O BIÊNIO 1962/1964

DIRETORIA

Presidente: Gen. Div. Augusto da Cunha Magessi Pereira

1º Vice-Presidente: Gen. Bda. Armando Noronha

2º Vice-Presidente: Gen. Átila José Theyenard Barroso

Diretor-Secretário: Major Américo Gomes de Barros Filho

Diretor-Tesoureiro: Capitão Armando Soares Guimarães

Diretor do Departamento Cultural: Gen. Jaime Ribeiro Graça

Diretor do Departamento Recreativo: Capitão Luiz Gonzaga Regino

Diretor do Departamento do Interior: Cel. João Lindolfo da Costa

Diretor do Departamento Cooperativo: Gen. Renato Augusto Moniz Aragão

Diretor do Departamento Desportivo: 1º Tenente José Carlos de Siqueira Amazonas

Diretor do da Caixa Mutuaria: Cel. Candido Flayrs da Cruz

Diretor de C.H.I. – Cel. Euclides Pontes

CONSELHO FISCAL

Gen. José Tinoco da S. Machado

Cel. Antonio Barros Moreira

Cel. Newton Barra

Cel. Aldo Pereira

Cel.Anfrisio da Rocha Lima

Cel.Edson Arantes Dias da Silva

Maj. João Severiano da F. Hermes Neto

Maj. Joaquim Pessoa Igrejas Lopes

Cap. Antonio de Pontes Benício

Cap. Jorge Correa

SUPLENTES DO CONSELHO FISCAL

C.C. Mario Augusto dos Reis

Maj. José Magalhães Silveira

Maj. Fay de Mello Mattos

Cap. Aloysio Augusto de Miranda

Cap. Lourival de Souza Moreira Filho

Cap. Tem. Waldes Antonio de Cunha

1º Ten. José Tarouco Corrêa

1º Ten. Gilberto C. de A. Araujo

1º Ten. Jorge Kameneff Bivar

1º Ten. Waldemar Christo F. de

Mendonça

CONSELHO DELIBERATIVO

Alm. Ernesto de Mello Baptista

Gen. Hugo Affonso de Carvalho

Gen. Carlos Sudá de Andrade

Brig. Renato Augusto Rodrigues

Gen. Aurélio Pitanga Seixas

Cel. André Fernandes de Souza

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Cel. João Augusto Montarroyos

Cel. Pedro Luiz de Azevedo Taulois

Cel. Luiz Abner de Souza Moreira

Cel. João Sarmento

SUPLENTES

Gen. Iodargio Martins de Oliveira

Cel. Antônio de Sá Barreto Lemos Filho

Cel. Fernando dos Santos Ferreira Coelho

Cel. Carlos José Proença Gomes

Ten. Cel. Orlando Pires da Fonseca

Maj. Roberto da Gama e Abreu

Cap. Norton Giraffa Sereno

Cap. Moisés de Figueiredo

2º Ten. Ruy Palazzo de Castro

Asp. Of. Theo Espíndola Bastos

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Anexo 4

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PCB / TD / 3 / 139 18-10-1962

1 – OFICIAIS QUE TRABALHARAM PELA CHAPA ‘UNIÃO’ QG/II EX - Cel. Zerbine EURYALE DE JESUS ZERBINE Promovido a general-de-brigada (posto imediatamente posterior ao de Coronel), foi cassado, transferido para reserva conforme D.O.: 11.04.1964, p.3258339. QG/2ª DI – Ten. Cel. Puertas

Maj. Paulo Maj. Lauro Carneiro Maj. Gustavo

QG/2ª RM – Maj. Queiroz (atualmente em Niterói) INTENDÊNCIA – Ten. Cel. Picanço

Maj. Santa Maj. Oswaldo Melo

SANTOS – Cel. Crespo

Maj. Salvador Barros Maj. Aranha

SOROCABA – Cap. Plínio Deus Fernandes (transf. Curitiba) CPOR / SP – Maj. Carnaúba RAUL DE ARAUJO ALVES CARNAÚBA. Promovido a tenente-coronel (posto imediatamente posterior ao de Major), foi cassado, tendo sido transferido para reserva conforme D.O.: 14.04.1964, p.3313. EPC – Ten. Cel. Alexandre

Maj. Monte Serrat Maj. Theodoro THEODORO HILDEBRANDO GARCIA, Major QME, teve seus direitos políticos cassados conforme D.O.: 14.04.1964, p.3313.

LORENA – Maj. Meinicke

Cap. Paulo Aquino PIQUETE – Ten. Cel. Heitor

Maj. Bibe 4º G CAN 40 – Maj. Guedes PAULO EUGÊNO PINTO GUEDES, promovido a tenente-coronel (posto imediatamente posterior ao de Major), foi transferido para Reserva, conforme D.O.: 11.04.1964, p.3259. 339 EURYALE DE JESUS ZERBINE, promovido a General-de-Brigada a 25 de julho de 1962, conforme Almanaque do Exército para o ano de 1963.

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4º RI – Maj. Oyama 2ª CIA DEP ARMT – Cap. Ramalho 2ª CIA L MNT – Ten. Jonas JONAS PEREIRA LOPES. Promovido a 1º Tenente (posto imediatamente posterior ao de 2º Tenente), foi Reformado, conforme D.O.: 16.09.1964, p. 8262.

Ten. Caldas BARUERI – Maj. Rivaldo (trasnf. Vacaria). RIVALDO DIAS DE SOUZA E SILVA, Major – Ministério do Exército, foi reformado, conforme D.O.: 07.10.1964.

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Anexo 5

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Relação de Postos Ocupados por Militares em Governos Republicanos

(Jânio Quadros a Humberto de Alencar Castello Branco)

Governo

(Período) Ministério da Marinha Ministério da Guerra Ministério da Aeronáutica Gabinete Militar

Estado-Maior das Forças

Armadas (EMFA)

Jânio Quadros

(31.01.1961 a

25.08.1961)

Nome, patente Período Nome, patente Período Nome, patente Período Nome, patente Período Nome, patente Período

Sylvio Heck,

Vice-

Almirante

31.01.1961 a

25.08.1961

Odylio Denys,

Marechal

31.01.1961 a

25.08.1961

Gabriel Grün

Moss,

Brigadeiro-do-

Ar

31.01.1961 a

25.08.1961

Pedro de

Geraldo

Almeida,

General-de-

Brigada

31.01.1961 a

25.08.1961

João Carlos

Barreto,

General-de-

Exército

31.01.1961 a

10.02.1961

Oswaldo

Cordeiro de

Farias,

General-de-

Exército

10.02.1961 a

25.08.1961

Paschoal

Ranieri Mazzilli

(Governo

Provisório:

25.08.1961 a

08.09.1961)

Idem

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154

Governo

(Período) Ministério da Marinha Ministério da Guerra Ministério da Aeronáutica Gabinete Militar

Estado-Maior das Forças

Armadas (EMFA)

João Belchior

Marques

Goulart

(Fase

Parlamentarista:

08.09.1961 a

24.01.1963)

Gabinete Tancredo Neves (08.09.1961 a 12.07.1962)

Ângelo

Nolasco de

Almeida,

Contra-

Almirante

08.09.1961 a

12.07.1962

João de

Segadas

Vianna,

General-de-

Brigada

08.09.1961 a

12.07.1962

Clóvis

Monteiro

Travassos,

Major-

Brigadeiro

08.09.1961 a

12.07.1962

Amaury Kruel,

General-de-

Divisão

08.09.1961 a

12.07.1962

Oswaldo

Cordeiro de

Farias,

General-de-

Exército

08.09.1961 a

16.10.1961

*Aurélio de

Lyra Tavares,

General-de-

Divisão

Ministro

Interino (não

consta data)

Oswaldo de

Araújo Motta,

General-de-

Exército

16.10.1961 a

12.07.1962

Gabinete Brochado da Rocha (12.07.1962 a 18.09.1962)

Pedro Paulo de

Araújo

Suzano,

Almirante-de-

Esquadra

13.07.1962 a

18.09.1962

Nélson de

Mello,

General-de-

Exército

13.07.1962 a

18.09.1962

Reynaldo

Joaquim

Ribeiro de

Carvalho

Filho, Major-

Brigadeiro

13.07.1962 a

18.09.1962

Amaury Kruel,

General-de-

Divisão

13.07.1962 a

18.09.1962

Oswaldo de

Araújo Motta,

General-de-

Exército

13.07.1962 a

18.09.1962

Gabinete Hermes Lima (18.09.1962 a 24.01.1963)

Idem

Amaury Kruel,

General-de-

Divisão

18.09.1962 a

24.01.1963 Idem

Albino Silva,

General-de-

Brigada

18.09.1962 a

24.01.1963 Idem

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155

Governo

(Período) Ministério da Marinha Ministério da Guerra Ministério da Aeronáutica Gabinete Militar

Estado-Maior das Forças

Armadas (EMFA)

João Belchior

Marques

Goulart

(Fase

Presidencialista:

24.01.1963 a

1º.04.1964)

Pedro Paulo de

Araújo

Suzano,

Almirante-de-

Esquadra

24.01.1963 a

14.06.1963

Amaury Kruel,

General-de-

Divisão

24.01.1963 a

15.06.1963

Reynaldo

Joaquim

Ribeiro de

Carvalho

Filho, Major-

Brigadeiro

24.01.1963 a

15.06.1963

Albino Silva,

General-de-

Brigada. 24.01.1963 a

18.10.1963

Oswaldo de

Araújo Motta,

General-de-

Exército

24.01.1963 a

10.12.1963 Interino: Aurélio

de Lyra Tavares,

General-de-

Divisão

Sylvio Borges

de Souza

Motta,

Almirante-de-

Esquadra

15.06.1963 a

27.03.1964 Jair Dantas

Ribeiro,

General-de-

Divisão

15.06.1963 a

31.03.1964

Anysio

Botelho,

Major-

Brigadeiro

15.06.1963 a

31.03.1964

Argemiro de

Assis Brasil,

General-de-

Brigada

18.03.1963 a

31.03.1964

Pery Constant

Bevilaqua,

General-de-

Divisão

10.12.1963 a

31.03.1964

Paulo Mário

da Cunha

Rodrigues

27.03.1964 a

31.03.1964

Paschoal

Ranieri Mazzilli

(Governo

Provisório:

02.04.1964 a

15.04.1964

Augusto

Hamann

Rademaker

Grünewald,

Vice-

Almirante

04.04.1964 a

15.04.1964

Arthur da

Costa e Silva,

General-de-

Exército

04.04.1964 a

15.04.1964

Francisco de

Assis Corrêa

de Mello,

Tenente-

Brigadeiro-do-

Ar

04.04.1964 a

15.04.1964

André Fernandes

de Souza,

General-de-

Brigada

(interinamente)

04.04.1964 a

15.04.1964

Pery Constant

Bevilaqua,

General-de-

Divisão

04.04.1964 a

15.04.1964

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156

*Tabela baseada em: Governos da República: 15.11.1889 a 15.03.1996. Presidência da República, Casa Civil, 3ª ed. ver. atual – Brasília, 1996. Obs: Os nomes destacados em vermelho estão relacionados com militares cassados durante o regime militar.

Governo

(Período) Ministério da Marinha Ministério da Guerra Ministério da Aeronáutica Gabinete Militar

Estado-Maior das Forças

Armadas (EMFA)

Humberto de

Alencar

Castello Branco

(15.04.1964 a

15.03.1967)

Ernesto de

Mello

Baptista, Vice-

Almirante

20.04.1964 a

18.01.1965

Arthur da

Costa e Silva,

General-de-

Exército

15.04.1964 a

30.06.1966

Nélson Freire

Lavanére-

Wanderley,

Major-

Brigadeiro

20.04.1964 a

15.12.1964

Ernesto Geisel,

General-de-

Brigada

15.04.1964 a

15.03.1967

Pery Constant

Bevilaqua,

General-de-

Exército

15.04.1964 a

15.02.1965

Paulo Bosísio,

Almirante

18.01.1965 a

20.12.1965

Décio

Palmeiro de

Escobar,

General-de-

Exército

(Interino)

Márcio de

Souza e Mello,

Major-

Brigadeiro

15.12.1964 a

11.01.1965

Luiz Teixeira

Martini,

Almirante-de-

Esquadra

15.03.1965 a

1º.04.1966

Arnoldo

Toscano, Vice-

Almirante

(Interino)

Eduardo

Gomes,

Marechal-do-

Ar

11.01.1965 a

15.03.1967

Nélson Freire

Lavanére-

Wanderley,

Tenente-

Brigadeiro.

1º.04.1966 a

15.03.1967 Zilmar

Campos de

Araripe

Macedo,

Almirante-de-

Esquadra

20.12.1965 a

15.03.1967

Aldemar de

Queiroz,

Marechal

1º.07.1966 a

15.03.1967

Clóvis

Monteiro

Travassos,

Tenente-

Brigadeiro

(Interino)

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157

Abaixo, temos os nomes dos Ministros cassados e suas respectivas punições: Albino Silva. Transferência para a Reserva. D.O.: 11-04-1964, p.3258. Anysio Botelho. Transferência para a Reserva. D.O.: 14-04-1964, p.3313. Argemiro de Assis Brasil. Transferência para a Reserva. D.O.: 11-04-1964, p.3258. Jair Dantas Ribeiro. Suspensão de direitos políticos. D.O.: 13-06-1964, p.5050. Pedro Paulo de Araújo Suzano. Transferência para a Reserva. D.O.: 11-04-1964, p.3259. Pery Constant Bevilaqua. Aposentadoria. D.O.: 17-01-1969, p. 555. Sylvio Borges de Souza Motta. Transferência para a Reserva. D.O.: 13-06-1964, p.5051.

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158

Anexo 6

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159

Histórico de Membros da "Chapa União"*

Nome Cargo para eleição no CM**

Posto até 1962 Último posto 1961-1963 1964 e conseqüências

Alberto Ribeiro Paz Conselho Fiscal (Suplente)

General General-de-

Exército

Exerceu funções como Comandante da 3ª Divisão de Cavalaria (III Exército), chefe de Estado-Maior (II Exército), Chefe e Agente Diretor do Gabinete do Ministro da Guerra, comandante da 7ª Região Militar (7ª RM) e 7ª Divisão de Infantaria (7ª DI), chefe do Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra

Chefe do Departamento de Estudos da ESG durante o ano de 1964. Foi transferido para Reserva de 1ª classe como General-de-Exército (Decreto de 14 de março de 1968). Chefe do Comissão Superior de Economia e Finanças (COSEF).

Aluízio Carneiro da Rocha Diretor-Secretário Major Tenente-Coronel

Não consta informação sobre este período.

Promovido, por antiguidade, ao posto de Tentente-Coronel (N.E. nº 1733, de 25/08/1964). Sanção: Reforma a 23 de novembro, confome decreto de 15 de setembro 1964, no mesmo posto.

Antonio Augusto Nogueira Conselho Fiscal (Suplente)

Major Coronel R/1 Nenhum acontecimento significativo.

Assumiu a função de chefe da S/3 da Subdiretoria da Reserva. PROMOÇÃO: ao posto de Tenente-Coronel, por antiguidade (N.E. 1.733, de 25 agosto 1964). Em agosto de 1965 é promovido ao posto de Coronel e transferido para RESERVA DE 1ª CLASSE (D.O. 16-04-1964, p. 8262) .

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160

Augusto Fragoso Conselho Fiscal (Efetivo)

General General-de-

Exército

Esteve em função como comandante do 1º Grupamento de Engenharia e da Guarnição de João Pessoa, Diretor de Assistência Social do QG/Gpt e Representante do EMFA no Conselho Deliberativo da SUDENE. Durante o ano de 1962, em função como Subdiretor da Reserva. nomeado Diretor de Instrução do Exército, ligado ao Ministério da Guerra - Estado-Maior do Exército - Diretoria de Instrução do Exército - Rio de Janeiro.

Permaneceu em funções vinculadas ao Estado-Maior. Promoções: General-de-Divisão (D.O. de 30 de março de 1964), General-de-Exército (Decr. de 25 de novembro de 1966, transcrito no N.E. nº 2.880, de 30 de novembro de 1966). Em 1971 foi convodado para exercer o cargo de MINISTRO DO SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR. A 31/05/1971 foi desligado para efeito de vencimentos e alterações.

Cândido da Costa Aragão Conselho Deliberativo (Efetivo)

Almirante Vice-

Almirante Não consta informação sobre este período.

Vice-Almirante: D.O. 11-04-1964, p.3259 (Transferência para reserva); Almirante: D.O. 14-04-1964, p.3313 (suspensão de direitos politicos).

Carlos Hess de Melo Diretor do Departamento do Interior

General R/1 General-de-

Brigada Reserva a pedido do mesmo (Decreto de 30 de novembro de 1960)

Cyro Holanda Diretor do Departamento Cooperativo

General R/1 General-de-

Brigada Reserva a pedido do mesmo (Decreto de 8 de novembro de 1960)

Ebenezer Cabral de Mello Cargo Deliberativo (Suplente)

General-de-Brigada R/1

General-de-Brigada R/1

Reserva a pedido do mesmo (D.O. 25-04-1959)

Eduardo Nóbrega Diretor-Tesoureiro Major

Intendente Coronel Nenhum acontecimento significativo.

PROMOÇÃO: Tenente-Coronel, por merecimento, conforme decreto de 25-04-1964. Recebeu outra promoção, D.O. 29 de outubro de 1970, para o posto de Coronel.

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161

Elsino Ferreira Machado Conselho Fiscal (Suplente)

Tenente-Coronel

Coronel Nenhum acontecimento significativo.

PROMOÇÃO: Ao posto de Coronel, conforme Decreto de 25/12/1966. RESERVA: Transferido para reserva de 1ª classe em 1969 .

Ene Garcez dos Reis Conselho

Deliberativo (Suplente)

Tenente-Coronel

General-de-Brigada

Em 1961 esteve em função, até abril, na Diretoria do Pessoal da Ativa. A partir de 14/04 esteve em função como comandante do 1º Batalhão de infantaria, no Regimento e infantaria, I Exército. O ano de 1962 não apresentou alterações nas funções deste militar. EM 1963, esteve como adido à Diretoria do Pessoal da Ativa e à disposição do Conselho de Segurança Nacional. PROMOÇÃO: Ao posto de Coronel, a contar de 25/12/1963 (Decreto de 24 de dezembro de 1963).

Adido ao mesmo departamento do ano anterior, entrando para reserva de 1ª classe no posto de General-de-Divisão em 25/11/1964. PROMOÇÃO: Ao posto de General-de-Brigada, conforme Decreto de 26 de outubro de 1964. RESERVA: Transferido para a reserva de 1ª classe no posto de General-de-Brigada (mesmo decreto de promoção).

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162

Euryale de Jesus Zerbine Conselho Fiscal (Suplente)

Coronel General-de-Brigada R/1

Em 1961, oriundo da 4ª RI, em Quitaúna, SP, esteve em função no QG do II Exército - Guarnição São Paulo - com posto de chefia. ESG: Estagiário do Curso Superior de Guerra (CSG) de 06/03 a 07/06 e como adjunto da Divisão de Assuntos Militares e cursando o CSG de 08 até sua diplomação, em 19/12. Retornou ao QG do II Exército em janeiro de 1962. Em seguida, esteve em função como Chefe da Secretaria de Planejamento e Cooperação, saindo deste grupamento em 24/07/62 e seguindo para o Gabinete do Ministro. Permaneceu em função como Sub-chefe do Gabinete do Ministro da Guerra de 24/07 a 23/08, data em que foi transferido para o Comando da Artilharia de Costa e Antiaérea da 2ª Região Militar (D.O. nº 152 de 10 de agosto de 1962). A 11 de setembro de 1962 retornava ao QG do II Exército, Guarnição SP, como Chefe do Estado-Maior do II Exército. Promovido a General-de-Brigada (Decreto de 30 de julho de 1962). O ano de 1963 não apresentou alterações em suas funções. PROMOÇÃO: 30 julho 1962 (General-de-Brigada)

Em 09/01/64 entrou para o II Exército Divisão de Infantaria e esteve em função como Comandante da Infantaria Divisionária/2 e Guarnição Caçapava (SP) até 1º/04/1964. PUNIÇÃO: transferência para Reserva (D.O.: 11-04-1964, p. 3258).

Felício Sacchi Conselho Fiscal (Suplente)

Coronel General-de-Divisão R/1

No ano de 1961 esteve em função como Chefe de Clínica Médica, na Policlínica Central do Exército - Guarnição do Estado da Guanabara. A 03/12 deixou a Clínica Médica e foi transferido para o Hospital Geral da Vila militar, como diretor deste. No período, foi promovido ao Posto de Coronel, por merecimento (Decreto de 25 de agosto de 1961, D.O. de mesma data). Entre 1962 e 1963, não houve modificações quanto ao seu posto e função.

Permaneceu o mesmo local dos anos anteriores, isto é, Hospital Geral da Vila Militar, e com a mesma função, a de diretor deste. Foi promovido ao posto de General-de-Brigada (Decreto de 30 de Junho de 1966, publicado no D.O. da mesma data).

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163

Ivan Cavalcanti Proença Diretor do Depto. Recreativo

Capitão Capitão de Cavalaria

(Reformado)

Ao longo de 1961, esteve em função no 1º Regimento de Cavalaria de Guardas, Guarnição Rio de Janeiro, como Chefe do Serviço Social, Instrutor de Equitação dos Sargentos e Of. Regimental de Educação Física. Em 1962, foi afastado das funções para cursar a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO), tendo início em 19/02. No ano seguinte, permaneceu em função no mesmo regimento de 1961 (1º RC), como comandante do 2º Esquadrão de Fuzileiros durante o primeiro semestre; como comandante do 2º Esquadrão de Fuzileiros e chefe da Secção de Hipismo, Chefe de Serviço Social, Instrutor de Equitação e Of. Regimental de Educação Física dos sargentos, no segundo semestre.

D.O. 09-10-1964, p. 9202 (Reforma).

João Carelli

Conselho Deliberativo (Efetivo)

Major Tenente-Coronel

Não consta informação sobre este período. D.O. 06-10-1964, p.9017 (Reforma).

João Evangelista Mendes da Rocha

Conselho Fiscal (Efetivo)

Tenente-Coronel

Tenente-Coronel

Não consta informação sobre este período. D.O. 11-04-1964, p. 3259 (Transferência para reserva)

Joaquim Augusto Montenegro Diretor-Secretário Tenente-Coronel

Coronel

No ano de 1962, apresentou-se ao Estado Maior das Forças Armadas (EMFA) e ESG, pois teve aprovada sua indicação para matrícula no CEMCFA, tendo concluído curso nesta a 26/12. Em 1963, foi designado para exercer funções na Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional (SG/CSN), conforme Diário Oficial (D.O. 08-03-1963).

Permaneceu em função de 1º/01 a 1º/04 como Coordenador Geral da Assessoria Técnica da Presidência da República. Foi dispensado de suas funções de Coordenador da Assessoria Técnica (D.O. 06-04-1964). Promovido ao posto de Coronel (Decreto de 25/08/1965).

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164

José Publio Ribeiro Conselho Fiscal (Efetivo)

General General-de-

Exército

Em função, desde 1959, no Quartel General do III Exército, Guarnição em Porto Alegre. De 1º/01 a 15/02 como chefe do Estado-Maior do III Exército. De 16 a 18/02 como adido ao mesmo QG para passagens de encargos. Deixou o QG de Porto Alegre em 18/02/1961 para a Escola Superior de Guerra, onde ficou como estagiário do Curso Superior de Guerra (CSG) de 27/02 a 21/12. Além disso, ficou em função de 19/09 a 31/12 como Chefe do EM / I Exército. Em 1962, permaneceu como Chefe do EM / I Exército até 29/08, quando entrou no Grupamento de Unidades Escola (GUEs) - Guarnição do Estado da Guanbabara, na função de comando deste Grupamento. No ano seguinte, deixou o Grupamento de Unidades Escola em 03/07e ficou adido à Secretaria do Mninstério da Guerra (SMG) de 03 a 08/07. Transferido para reserva de 1ª classe no posto de General-de-Exército (Decreto de 24 de junho de 1963, publicado em D.O. de 25 de Junho de 1963).

Militar encontrava-se na Reserva.

Luiz Abner de Souza Moreira Conselho Deliberativo (Suplente)

Coronel Coronel R/1

Em 1961, servia no Batalhão de Caçadores (10ª RM),guarnição de Fortaleza. Nos anos de 1962 e 1963, não encontramos informações sobre mudanças quanto a posto e função.

Transferido para o Quadro de Estado Maior (QEMA). Ao longo dos anos de 1964-68, participou de vários eventos ligados ao novo Regime. Foi transferido para reserva de 1ª classe em 1º/08/ 1969, com proventos de General-de-Divisão (D.O. 1º de agosto de 1969).

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165

Luiz Tavares da Cunha Mello Conselho Deliberativo (Efetivo)

Coronel General-de-

Brigada

Esteve em função de 8 a 10 abril de 1961 como comandante da Guarnição de São Leopoldo e do 19º Regimento de Infantaria (19ºRI). Em seguida, ficou em função como Adjunto da Iª Seção no Ministério da Guerra. Em 11/09/1961 foi transferido para o QG do II Exército e de 26/09 a 31/12 esteve em função como chefe da 2ª seção do EM/ IEx. No ano de 1962, permaneceu em função no I Exército, saindo em abril. A 2 de abril, entrou na Divisão Blindada (DB), do I Exército e desempenhou função, de 02/04 a 30/06, no comando da DB e como Agente Diretor. Em Decreto de 10/08 foi nomeado Chefe do Estado-Maior do I Exército (D.O. 10-08-1962). De 20/08 a 31/12, como Chefe do EM/IEx. Foi promovido ao posto de General-de-Brigada (Decreto de 30/07/1962 e publicado em D.O. da mesma data). A 29/08/1963 foi nomeado comandante da Infantaria Divisionária/Um (ID/1) e Guarnição de Niterói e São Gonçalo; ficando sob esta função até o final do ano de 1963.

D.O. 11-04-1964, p. 3258 (Transf. p/ reserva); D.O. 11-04-1964, p. 3313 (Suspensão de direitos políticos); D.O. 28-09-1964, p. 8679 (Reforma).

Marcio de Albuquerque Suzano Diretor do Departamento Recreativo

Capitão-de-Fragata

Capitão-de-Fragata

Intendente Não consta informação sobre este período.

D.O. 11-04-1964, p.3259 (Transferência para reserva).

Nelson Gomes Nogueira Diretor Tesoureiro Capitão Capitão A 10 de junho de 1963, foi incluído no estado efetivo da Escola de Artilharia de Costa.

Foi preso "para averiguações", na Fortaleza de São João, em 17/06, a disposição do Coronel Carlos Alvares Noll, sendo libertado a 17/07. A 18/08 estava relacionado para matrícula na ESAO (2º turno) e deveria apresentar-se naquela escola entre 19 e 24 de agosto. Foi demitido do Exército em 16 de setembro, conforme artigo 7º, §1 do Ato Institucional de 9 de abril de 1964 (D.O. 14-09-1964, p.

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166

8146). Decreto 53.897 de 27/04/1964 (investigações sumárias).

Odair Fernandes Aguiar Conselho Fiscal (Suplente)

Major-Aviador Tenente-Coronel-Aviador

Não consta informação sobre este período.

D.O. 11-04-1964, p. 3259 (transferência para reserva); D.O. 06-10-1964, p. 9028 (Reforma)

Otavio Gurgel do Amaral Conselho Deliberativo (Suplente)

Coronel General-de-Brigada R/1

Em 1961, exerceu cargo de chefia na Diretoria do Serviço Militar. Promovido ao posto de Coronel, por antiguidade (NE nº1.090, de 27-12-1961). O ano de 1962 não apresentou mudanças significativas. Esteve em função de 1º a 18-02/1963, como Chefe da S1 Subdir. Res. Saiu em 19/02 para a reserva de 1ª classe. Promovido ao posto de General-de-Brigada e transferido para reserva de 1ª classe nesse posto.

Reserva de 1ª classe.

Oto de Oliveira Bastos Vieira Conselho Fiscal (Suplente)

Tenente General-de-Brigada

Aluno do Instituto Militar de Engenharia (IME).

Militar permaneceu na ativa até 1997, quando foi transferido para a reserva de 1ª classe. Não há nenhum ponto crítico a ser ressaltado em sua carreira. Foi professor do IME durante grande parte de sua trajetória.

Ottomar Soares de Lima Conselho Deliberativo (Efetivo)

Coronel General-de-

Brigada Não consta informação sobre este período.

D.O. 11-04-1964, p. 3259 (transferência para reserva); D.O. 28-09-1964, p. 8679 (Reforma).

Pedro Paulo de Albuquerque Suzano

Conselho Fiscal (Suplente)

Capitão Capitão Não consta informação sobre este período. D.O. 11-04-1964, p.3259 (transferência para reserva); D.O. 28-09-1964, p. 8683

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(Reforma).

Pery Constant Bevilacqua General General-de-

Exército

De 22/03/1961 a 10/10/1961 na função de comandante da 3ª DI. Em 10 de outubro foi exonerado do comando da 3ª DI (Decreto de 21 setembro 1961; D.O. 21-09-1961), passando tal posição ao General-de-Brigada Olympio Mourão Filho. Em 19 de outubro de 1961 foi nomeado para o comando da 3ª R.M., em Porto Alegre, RS. No ano de 1962, permaneceu na mesma função e na mesma guarnição até 10/09/1962, por ter sido nomeado comandante do II Exército. PRISÃO: Em 17/04 pelo General-de-Exército João de Segadas Vianna, por ter escrito carta de caráter confidencial e esta ter sido publicada em vários jornais do país, "contendo apreciações de repercussão na política intenacional". Em 1963, permaneceu no comando do II Exército, deixando este em 07/12/1963 para o Estado Maior das Forças Armadas, na função de chefe deste.

Bevilaqua permaneceu na chefia do EMFA até março de 1965, quando foi empossado Ministro do Superior Tribunal Militar (STM). Neste cargo, manifestou-se contra os Inquéritos policial-militares (IPM), favorecendo pedidos de habeas-corpus no STM***. Sanção: Aposentadoria (D.O.: 17-01-1969, p. 555).

Reginaldo de Menezes Hunter 2º Vice-Presidente General R/1 General-de-

Brigada Reserva remunerada ( D.O. de 03 de dezembro de 1959)

Ruy Barbosa Moreira Lima Conselho Deliberativo (Efetivo)

Tenente-Coronel-Aviador

Coronel-Aviador R/R

Não consta informação sobre este período. D.O. 25-09-1964, p. 8637 (Reforma)

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Silvino Castor da Nobrega 1º Vice-Presidente General General-de-

Divisão

Entrada na ESG em 27/02. Esteve em função de 27/02 a 21/12/1961, como estagiário do Curso Superior de Guerra (CSG). Sai da ESG em 21/12 por conclusão do Curso. Foi nomeado comandante da Divisão Blindada, a 13 de outubro. Em 1962, permaneceu como comandante da Divisão Blindada até 03/08, quando assumiu as funções de Agente Diretor do QG/DB. No ano seguinte 1963, foi promovido, a 05/08, ao posto de General-de-Divisão. A 23/08 foi nomeado, pelo Presidente da República (Decreto de 05.08.1963 e D.O. de 06-08-1963), Comandante da Divisão Blincada (DB). Assume o comando da 5ª R.M. e 5ª D.I. em 13/09.

Em função como comandante da 5ª Região Militar (5ª R.M.) e 5ª Divisão de Infantaria (5ª R.I.), de 1º/01 a 1º/04/1964, tendo sua saída em 02/04 e exonerado do comando da 5ª RM e 5ª DI conforme rádio nº 911 E-1 de 5 de abril de 1964. D.O. 08-10-1964, p. 9137 (Reforma).

Vanius de Miranda Nogueira Conselho Deliberativo (Efetivo)

Capitão-de-Fragata

Capitão-de-Mar-e-Guerra

Não consta informação sobre este período. D.O. 11-04-1964, p.3259 (Transferência para reserva).

Washington Frazão Braga Conselho Deliberativo (Efetivo)

Capitão-de-Mar-e-Guerra

Contra-Almirante FN

Não consta informação sobre este período.

D.O. 11-04-1964, p.3259 (Transferência para reserva); Almirante FN: D.O. 14-04-1964, p. 3313 (Suspensão de direitos políticos).

* Dos 71 membros componentes da "Chapa União", trabalhamos apenas com aqueles que compunham os quadros de: Diretoria, Conselho Fiscal e Conselho Deliberativo; totalizando 59 nomes levantados.

**CM= Clube Militar

*** Peri Bevilaqua”. In: ABREU, Alzira Alves de et al (orgs.). Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro (Pós-1930). Versão eletrônica.

Militares punidos pós-1964.

Fontes:

1. Os dados aqui presentes foram coletados em números diversos de "Noticiário do Exército" entre os anos de 1961 e 1964.

2. Diários Oficiais entre os anos de 1961 e 1964.

3. OLIVEIRA, Paulo Martins de. Atos institucionais: sanções políticas. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2000.

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nacionalismo e dominação nos anos JK. Florianópolis: Ed. da UFSC, 2006.

• CARVALHO, José Murilo. “Vargas e os militares”. In: PANDOLFI, Dulce (Org.).

Repensando o Estado Novo. Rio de Janeiro: Editora FGV, s/d.

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Maria Celina (org.). As Instituições Brasileiras da Era Vargas. Rio de Janeiro:

Editora FGV; EdUERJ, 1999.

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