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PAGE 1 EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR 3º VICE-PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. APELAÇÃO Nº 0011015-12.2010.8.19.0001 8º Turma Recursal Criminal do Rio de Janeiro ORIGEM : processo nº 0011015-12.2010.8.19.001 1ª Vara Criminal Regional de Bangu/RJ VANDERSON EMÍLIO MEDEIROS COSTA, já qualificado nos autos da Ação Penal supra, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência e deste Egrégio Tribunal, na forma dos respectivos artigos do Código de Processo Penal, e da Lei 8038/90 , bem como com fundamento no art. 102, III, a, da Constituição da República, interpor RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Razões Recurso EXTRAORDINÁRIO Criminal - USO DROGAS DESCRIMINALIZAÇÃO INSIGNIFICANCIA ANDRE - Assinado

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EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR 3º VICE-PRESIDENTE DO

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE

JANEIRO.

APELAÇÃO Nº 0011015-12.2010.8.19.0001

8º Turma Recursal Criminal do Rio de Janeiro

ORIGEM : processo nº 0011015-12.2010.8.19.001 – 1ª Vara Criminal

Regional de Bangu/RJ

VANDERSON EMÍLIO MEDEIROS COSTA, já qualificado

nos autos da Ação Penal supra, vem, respeitosamente, à presença de

Vossa Excelência e deste Egrégio Tribunal, na forma dos respectivos

artigos do Código de Processo Penal, e da Lei 8038/90 , bem como com

fundamento no art. 102, III, a, da Constituição da República, interpor

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

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junto ao SUPERIOR TRIBUNAL FEDERAL – STF, fazendo-o amparado

nas razões que se seguem, motivo pelo qual requer seja admitida a

presente peça impugnativa, com conseqüente envio dos autos ao

Pretório Excelso, para conhecimento e decisão .

P. DEFERIMENTO,

Rio de Janeiro, 24 de NOVEMBRO de 2010.

LÉA ARRIGUI ARAUJO

Defensora Pública

Mat.179.446.0

ALDO LUDOGERIO

Estagiário DPGE

Mat.092871

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RAZÕES DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO

DO PROCESSO CRIMINAL

I. O RECORRENTE foi denunciado pela suposta prática do crime

previsto no art. 33 da Lei 11.343/06, tendo sido condenado no primeiro

grau de jurisdição nas penas do art. 28, § 4º, da Lei 11343/06, qual seja,

DEZ MESES DE PRESDTAÇÃO DE SERVIÇO A COMUNIDADE.

Ocorre que foi aplicada a pena Np Maximo legal, não havendo

fundamento razoável para medida tão drágica.

II. Contra a sentença, foi interposto recurso de apelação, conhecida pela

8ª Turma Recursal Criminal do Estado do Rio de Janeiro que, por

unanimidade de votos, deram provimento ao apelo ministerial para

condenar VANDERSON como incurso no artigo 33, CAPUT da lei

11.343/06, restando prejudicado o recurso defensivo .

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III. Data máxima vênia o entendimento da Conselho Recursal, entende a

defesa que o debate ainda não está encerrado eis que, a nosso ver, a

conduta prevista no art. 28 da nova Lei de Drogas não configura ilícito

penal. Mesmo que assim não fosse, a quantidade apreendida é

insuficiente para manejara Justiça Penal, razão pela qual se socorre do

presente recurso excepcional para buscar a absolvição do acusado, pelos

motivos abaixo elencados.

DO REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE

DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

V. Não há qualquer dúvida acerca do PREQUESTIONAMENTO como

requisito de admissibilidade recursal eis que, foi abordada na própria

sentença monocrática e, além de haver pedido expresso nas razões de

apelo, foi objeto manifestação inequívoca da Turma Recursal a respeito

da questão constitucional invocada.

VI. A decisão final da Turma Recursal do Estado do Rio de Janeiro,

encerra discussão do feito nas vias ordinárias, ante o disposto no artigo

102, III da Constituição Federal, não restando ao Acusado mais nada

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senão passar à esfera extraordinária do Poder Judiciário, estando, pois,

preenchido o requisito de CABIMENTO.

VII. Não há dúvidas também acerca da ADEQUAÇÃO da presente

impugnação, eis que tem como sustentáculo a infringência de princípios

constitucionais expressos, notadamente o princípios da

RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENIGNA (art. 5؟, XL) RESERVA LEGAL

(art. 5º , XXXIX ) bem como da DIGNIDADE HUMANA (art. 1º,III ) com

sérios reflexos no DIREITO GERAL DA LIBERDADE (art. 5º, caput)

INTIMIDADE (ART. 5º, X), além dos implícitos tais como o PRINCÍPIO

DA INTERVENÇÃO MINIMA, OFENSIVIDADE e da PROPORCIONALIDADE.

VIII – Mesmo que assim não fosse, a quantidade da droga aprendida, no

caso concreto (0,5 gramas de Cloridrato de Cocaína) já

justificaria a presente impugnação, eis que a conduta estaria acobertada

pelo manto do PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA, o que indubitavelmente

retira sua tipicidade material e, portanto, não deve ser objeto de

dedicação do Direito Material Penal.

IX – No mesmo esteio, dúvidas não há sobre o novíssimo requisito da

REPERCUSSÃO GERAL, eis que a discussão jurídica acerca da conduta

de posse de drogas, para uso pessoal, traz efeitos incontestáveis no

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comportamento de toda a sociedade, que necessita de um

posicionamento definitivo da Corte Maior acerca da eventual ilicitude do

fato.

X – Por fim, preenchido também a questão da TEMPESTIVIDADE, uma

vez que o Defensor Público que adiante assina teve “vista” dos autos em

25/11/2010 (vide fls. 247-verso ), tendo a prerrogativa da

ciência pessoal e da contagem em dobro dos prazos, conforme

assegurado pelo disposto no inciso I do art.128 da Lei Complementar

nº80/94.

DO MÉRITO DO RECURSO EXCEPCIONAL

DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL.

- DA ABOLITIO CRIMINIS-

Inicialmente, sustenta o recorrente que a conduta de porte de drogas

para uso pessoal foi descriminalizada pelo tratamento jurídico contido na

Lei 11343/06.

Com efeito, a referida conduta não mais se adeqüe a categoria de crime

ou contravenção, sendo, pois, atípica, nos exatos termos do artigo 28 na

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novel lei, nos termos abaixo.

A Lei de Introdução do Código Penal (Decreto-Lei 3914/41), no seu

artigo 1º, oferece o conceito legal do que seriam as infrações penais,

dispondo :

“ art. 1º - Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou

detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de

multa; contravenção, a infração penal a que e lei comina, isoladamente, pena de

prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente. “

Por outro lado, o artigo 28 da Lei 11.343/2006, dispõe :

“Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou

trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em

desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às

seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso

educativo.”

Como se observa, a novel lei só faz previsão de SANÇÕES MERAMENTE

ADMINISTRATIVAS, de cunho educativo, destituído de qualquer

conteúdo penal.

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Assim, conclui-se que a nova legislação das drogas, de forma inexorável,

descriminalizou a conduta em exame, para dar-lhe tratamento não penal,

deixando de configurar ilícito penal.

Pedimos vênia para trazer a colação o ensinamento do mestre LUIZ

FLAVIO GOMES, que de sua cátedra nos ensina:“ ... a nova lei de

tóxicos, no art. 28, descriminalizou a conduta de posse de droga para

consumo pessoal. Retirou-lhe a etiqueta de “infração penal” porque de

modo algum permite a pena de prisão. E sem pena de prisão não se

pode admitir a existência de infração “penal” no nosso país ... “ ( in

“Nova lei de Tóxicos não prevê prisão para usuário“ , publicado no sítio

www.lgf.com.br" .

Em obediência ao artigo 2º da Lei Material Penal, necessariamente

deverá o acusado ser ABSOLVIDO, ante a flagrante ABOLITIO CRIMINIS

da conduta imputada.

Além desses argumentos, observa-se que a conduta flagrantemente

abandonou o campo penal por outros motivos, apesar de inserido no

capítulo denominado “dos crimes e das penas “, em vários dispositivos

atinentes ao tratamento do usuário – art. 28 da Lei 11343/06 - fazem

referência as expressões “medidas ou medidas educativas”, v. g. , inciso

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III , parágrafo 1º e 6º , bem como no art. 29, o que nos leva a confirmar

a impossibilidade da aplicação das sanções de caráter aflitivas.

Na definição de DAMÁSIO DE JESUS, “a pena é uma sanção aflitiva

imposta pelo Estado, mediante ação penal ao autor de um fato delituoso,

visando diminuir um bem jurídico, tendo por finalidade principal, evitar a

prática de novo fato transgressor, e tem como característica fundamental

ser retributiva e ter finalidade preventiva, conforme disposto no art.59 da

Lei Material Penal. “ (in Direito Penal, Volume I, Saraiva – 22 ª Ed. -

1999).

Como se vê, nem o caráter retributivo isolado, nem o caráter preventivo,

de forma estanque, faz com que se justifique a aplicação da pena, não se

conseguindo depreender, das normas previstas no art. 28 da Lei

11343/06, qualquer CARATER AFLITIVO caracterizador da essência do

Direito Penal.

As medidas previstas, no preceito secundário da norma, estão direta e

unicamente voltadas a prevenção (advertência sobre os efeitos das

drogas; impositivas de comparecimento a programa ou curso educativo e

prestação de serviços à comunidade) .

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Mesmo essa última, que, em última ratio, poderia ser vista sob o ângulo

aflitivo, será cumprida em programas comunitários, entidades

educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres,

públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem,

preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de

usuários e dependentes de drogas, o que se significa método indireto de

aprendizagem.

Distanciamento do tratamento penal também se observa na hipótese de

aplicação da TRANSAÇÃO PENAL, que , não gera reincidência ou

antecedentes ou outra qualquer conseqüência relacionada ao direito

penal ( art. 48 § 5º ), nem impede novo benefício no período inferior a 5

anos (art. 28 § 4º), podendo o usuário valer-se do benefício por

incontáveis vezes, bem como, na hipótese de descumprimento, somente

ensejará a admoestação verbal ou multa (art. 28 § 6), refugindo

completamente da sistemática penal até hoje adotada, o que vem a

reforçar o caráter unicamente educativo e ressocializador dessas

medidas.

ALICE BIANCHINI, também citada pelo mesmo autor in “Lei de Drogas

Comentadas” – RT – 2ª ed. Pág. 135, afirma que,” mesmo sendo o fato

de ser decidido por JUIZ CRIMINAL não aproxima os institutos da lei ao

direito penal,” v.g., na recente lei de Violência Doméstica, as decisões

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de natureza cível não estão relacionadas com o direito repressivo,

somente podendo-se admitir um “DIREITO JUDICIAL SANCIONADOR”.

Da mesma forma, as decisões proferidas no âmbito do julgamento das

Ações por Improbidade Administrativas, que, apesar de condenatórias,

“não se trata de sentença condenatória que produza efeitos penais „ (fls.

134).

DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL.

- DA ATIPICIDADE FORMAL DA CONDUTA –

Mesmo para alguns que não esposam desse entendimento, se a posse de

droga, como vimos, dentro de nosso sistema legal deixou de ser “crime”

em que pese tenha mantido seu caráter de ilicitude, constitui, nas

palavras do mestre LUIZ FLAVIO GOMES, verdadeira INFRAÇÃO

PENAL SUI GENERIS , que, agora passa a caminhar ao lado do crime e

da contravenção, eis que a Constituição Federal não proibiu a criação

de novas modalidades de infrações penais .

De sua cátedra: “ Para nós, ao contrário, houve descriminalização formal

(acabou o caráter criminoso do fato) e, ao mesmo tempo,

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despenalização (evitou-se a pena de prisão para o usuário de droga). O

fato (posse de droga para consumo pessoal) deixou de ser crime

(formalmente) porque já não é punido com reclusão ou detenção (art. 1º

da LICP). Tampouco é uma infração administrativa (porque as sanções

cominadas devem ser aplicadas pelo juiz dos juizados criminais). Se não

se trata de um crime nem de uma contravenção penal (mesmo porque

não há cominação de qualquer pena de prisão), se não se pode admitir

tampouco uma infração administrativa, só resta concluir que estamos

diante de infração penal sui generis. “ (in Posse de drogas para

consumo pessoal: crime,infração penal "sui generis" ou infração

administrativa?

Para esse respeitável autor, houve DESCRIMINALIZAÇÃO PENAL sem

que, contudo, houvesse legalização, ou seja, uma descriminalização

plena ou total. Havendo descriminalização somente para o âmbito penal,

há sanção, seja administrativa, seja de outra natureza, mesmo que

aplicado pelo Juizado Especial Criminal, havendo , portanto, verdadeira

“DESCRIMINALIZAÇÃO FORMAL” da conduta. (obra citada fls. 120) , que

da mesma forma conduz a absolvição do acusado.

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Apesar de termos ciência de que a tese já foi debatida no julgamento do

Recurso Extraordinário nº 430105/RJ, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence,

entendemos que a questão não foi julgada de forma definitiva, eis que

decidida em Questão de Ordem, bem como acreditamos que os

argumentos jurídicos que ora se esboçam, possam acalorar a discussão e

ajudar na mudança do entendimento deste Colendo Tribunal.

DA VIOLAÇÃO DE INÚMEROS PRECEITOS FUNDAMENTAIS (QUE

NÃO FORAM OBJETO DE APRECIAÇÃO NO RECURSO

EXTRAORDINÁRIO MENCIONADO)

Como bem asseverou diversas vezes o culto magistrado do Rio de

Janeiro – Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho – o legislador

ordinário ao criar uma norma “concretiza uma ponderação entre vários e

possíveis direitos fundamentais que podem estar em choque. “

Essa análise “ pode ser obtida mediante a constatação de uma hierarquia

interna entre essas normas de caráter essencial, ou por meio de um juízo

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de ponderação de valores fundamentais, dando-se ênfase ao princípio da

unidade da Constituição.” (Christine Oliveira Peter da Silva, in

Hermenêutica de Direitos Fundamentais. Brasília Jurídica, 2005, p. 112-

113.

Dessa forma, ao criar a novel lei de drogas, deveria o legislador

infraconstitucional cotejar o DIREITO GERAL DA LIBERDADE,

destacando-se principalmente o DIREITO À INTIMIDADE , com o

DIREITO À SAÚDE PÚBLICA , “que supostamente seria o bem jurídico

tutelado pela norma penal “ (Grandinetti).

Além de expressamente proteger o direito a liberdade, como preceito

fundamental que ocupa lugar de destaque no caput do dispositivo , a

Constituição avançou para proteger a intimidade e a vida privada com a

garantia da inviolabilidade absoluta, no Inciso X do art. 5º do Pacto

Federativo :

"Art.5º X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

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Assim, deve ser repensado se o Estado realmente tem o direito de, sob o

argumento de estar protegendo a saúde, invadir o direito à intimidade e

à vida privada, sem atropelar essas garantias fundamentais

constitucionalmente asseguradas.

Neste aspecto, nos diz Luiz Régis Prado: "O PRINCÍPIO DA

INTERVENÇÃO MÍNIMA OU DA SUBSIDIARIEDADE estabelece que o

Direito Penal só deve atuar na defesa dos bens jurídicos imprescindíveis

à coexistência pacífica dos homens e que não podem ser eficazmente

protegidos de forma menos gravosa. Desse modo, a lei penal só deverá

intervir quando for absolutamente necessário para a sobrevivência da

comunidade, como ultima ratio" (LUIZ RÉGIS PRADO, Curso de Direito

Penal Brasileiro - vol. I. 2ª Ed. RT. São Paulo/SP. 2001.)

A questão ainda mais se complica quando opta o legislador ordinário pela

invasão somente para lhe aplicar ADVERTÊNCIA DOS MALEFICIOS

DO USO DE DROGAS, e, em caso de descumprimento, as astreintes da

ADMOESTAÇÃO E A MULTA ( §6º do art. 28) .

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O PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE, corolário do princípio

constitucional da DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, consagrado no

artigo 1 º, III da Constituição Federal, impede a criação de condutas

penais que não ofendam seriamente algum bem jurídico.

O Mestre DAMÁSIO DE JESUS, novamente nos esclarece ,“ O

fundamento se encontra no princípio constitucional da ofensividade,

segundo o qual não há crime quando a ofensa ao bem jurídico é tão

ínfima que o fato merece permanecer fora do campo do Direito Penal.

Isso ocorre nas hipóteses em que o dano ao objeto material é

insignificante, ensejando a aplicação da teoria da insignificância do

resultado jurídico e da pequena lesividade causada ao objeto material

(in Direito Penal, Volume I, Saraiva – 22 ª Ed. - 1999).

Se a resposta penal pode consistir em ADVERTÊNCIA, e, em caso de

descumprimento, somente a ADMOESTAÇÃO E MULTA, o próprio

legislador reconheceu a falta de ofensividade jurídico-penal, sendo a

norma pois, de forma reflexa, contrária aos alicerces constitucionais.

Mesmo que assim não fosse, também estaria violado o PRINCÍPIO DA

PROPORCIONALIDADE, com abrigo indireto em sede constitucional.

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A diferenciação entre o conceito de crime e de contravenção não assenta

simplesmente numa questão puramente formal. A impossibilidade de

aplicação de pena privativa de liberdade induz ser ainda a conduta de

usar drogas de categoria inferior ou de menos expressão, no âmbito

penal, não se podendo admitir que conduta menos valorada pelo

preceito secundário da norma, possa ter efeitos maiores que as

contravenções penais que, em tese, admite prisão simples.

Se admitirmos constituir a conduta prevista no artigo 28 como criminosa,

na hipótese de haver a prática de outro crime, haverá a REINCIDÊNCIA.

Enquanto que, a prática de contravenção, seguida de um crime, não tem

o condão de configurar esse instituto que tantos efeitos provocam no

mundo jurídico penal e processual, principalmente na DOSIMETRIA DA

PENA (ART 59 do CP), AFERIÇÃO DE REQUISITOS DE LIBERDADE

PROVISÓRIA (art. 312 do CPP), CONCESSÃO SURSIS (art. 77 e segs. Do

CP), SUSPENSÃO DO PROCESSO (art. 89 da Lei 9099/95) entre outros.

Como se vê, não se mostra PROPORCIONAL a concepção do uso de

drogas como crime, já que, na prática, trará efeitos mais gravosos que as

contravenções, mesmo que se consideradas em tese.

LUIZ FLAVIO GOMES, mais uma vez ao falar da atipicidade formal, nos

leciona: “ O conteúdo da sanção (prisão) , por força do PRINCÍPIO DA

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PROPORCIONALIDADE, nos conduz obrigatoriamente a sustentar

mais exigências para configuração de um crime. Hoje isso se resolve

pela tipicidade material que, como novo requisito do fato típico, requer

reprovação da conduta (Roxin-Frish) resultado jurídico desvalioso

(Zaffaroni L. F. Gomes etc.) e imputação objetiva do resultado (Roxin)...

Em outras palavras, a gradualidade do injusto penal (Palero) tem

total correspondência com a gradualidade da sanção penal.”

(g.n.- obra citada, pág. 133 e 134)

DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Mesmo para aqueles que, em tese, entendem continuar a conduta de

posse/uso de entorpecentes ocupando espaço no direito penal, forçoso é

reconhecer que, no caso concreto, a droga apreendida não justifica a

dedicação da Justiça Criminal ante o PRINCÍPIO DA

INSIGNIFICÂNCIA.

A ínfima quantidade da droga na hipótese não fere ao bem jurídico

tutelado pela norma, nem oferece qualquer capacidade ofensiva, não

havendo, pois, que se e falar em infração penal já que, in casu, não há

conduta penalmente relevante.

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Nunca é demais as palavras do Ministro Celso de Mello que, de sua

cátedra nos ensina: “O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima

circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do

indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à

própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos

que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os

valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial,

impregnado de significativa lesividade. O direito penal não se deve

ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor - por não

importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não

represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem

jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. (ao relatar o

HC 84.412/SP perante o STF)

Aliás, a tese vem sendo largamente admitida pelo Egrégio Supremo

Tribunal Federal, que em recentíssimos acórdãos, adotaram-na na

hipótese de apreensão de droga estabelecimento militar (art. 290 do

Código Penal Militar), não havendo motivos que exclua a aplicação do

princípio para os fatos ocorridos fora da caserna, ante a nova dicção da

Lei 11343/06.

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Pedimos vênia para citar :

“HABEAS CORPUS. PENAL MILITAR. USO DE SUBSTÂNCIA

ENTORPECENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICAÇÃO NO

ÂMBITO DA JUSTIÇA MILITAR. ART. 1º, III DA CONSTITUIÇÃO DO

BRASIL. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 1. Paciente,

militar, preso em flagrante dentro da unidade militar, quando fumava um

cigarro de maconha e tinha consigo outros três. 2. Condenação por posse e

uso de entorpecentes. Não-aplicação do princípio da insignificância, em prol da

saúde, disciplina e hierarquia militares. 3. A mínima ofensividade da conduta, a

ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade

do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica constituem os

requisitos de ordem objetiva autorizadores da aplicação do princípio da

insignificância. 4. A Lei n. 11.343/2006 --- nova Lei de Drogas --- veda a prisão

do usuário. Prevê, contra ele, apenas a lavratura de termo circunstanciado.

Preocupação, do Estado, em mudar a visão que se tem em relação aos

usuários de drogas. 5. Punição severa e exemplar deve ser reservada aos

traficantes, não alcançando os usuários. A estes devem ser oferecidas políticas

sociais eficientes para recuperá-los do vício. 6. O Superior Tribunal Militar não

cogitou da aplicação da Lei n. 11.343/2006. Não obstante, cabe a esta Corte

fazê-lo, incumbindo-lhe confrontar o princípio da especialidade da lei penal

militar, óbice à aplicação da nova Lei de Drogas, com o princípio da dignidade

humana, arrolado na Constituição do Brasil de modo destacado, incisivo,

vigoroso, como princípio fundamental (art. 1º, III). 7. Paciente jovem, sem

antecedentes criminais, com futuro comprometido por condenação penal

militar quando há lei que, em vez de apenar --- Lei n. 11.343/2006 ---

possibilita a recuperação do civil que praticou a mesma conduta. 8. Exclusão

das fileiras do Exército: punição suficiente para que restem preservadas a

disciplina e hierarquia militares, indispensáveis ao regular funcionamento de

qualquer instituição militar. 9. A aplicação do princípio da insignificância no

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caso se impõe, a uma, porque presentes seus requisitos, de natureza objetiva;

a duas, em virtude da dignidade da pessoa humana. Ordem concedida. ( STF -

Segunda Turma - HC 92961/ SP - Relator(a): Min. EROS GRAU -

DJ 22-02-2008 - EMENT VOL-02308-05 PP-00925)

No mesmo sentido, a Suprema Corte também assim se posicionou na

apreciação do HC 93822/ SP, bem como nas decisão monocráticas

proferidas nas Medidas Cautelares em Habeas Corpus números 94085-

4/SP e 94808/RS, todos relatados pelo Ministro Celso de Mello e ainda

HC 87478/PA, da relatoria do Min. Eros Grau e HC 92634/PE e RHC

89624/RS relatados pela Ministra Carmem Lucia.

Mesmo antes da novel lei, a jurisprudência, ainda que de forma tímida já

vinha reconhecendo a atipicidade da conduta do uso, na hipótese de

pequena quantidade. Pedimos vênia para citar os julgados da 5ª TURMA

DO STJ (RHC 7205/RJ – Relator Ministro José Dantas – j. em

07/04/1998), 6ª Turma do STJ (RESP nº 164.861/SP – DJ de 17.12.99,

pág. 171 e RESP 154.840/PR, DJ de 06.04.98, pág. 175 , ambos

relatados pelos Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro ) , a SETIMA CAMARA

CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO (- APELACAO

CRIMINAL nº 2003.050.00129 DES. CARMINE A SAVINO FILHO -

Julgamento: 12/08/2003), entre muitos outros.

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DO PEDIDO

Sendo inconteste o direito do RECORRENTE e tendo a decisão

contrariado a Constituição Federal requer que seja conhecido e provido

integralmente o presente Recurso Extraordinário para reconhecer-se a

atipicidade da conduta atribuída ao recorrente (seja em tese ou ante a

quantidade), absolvendo-o da acusação formuladas pelo órgão

ministerial, por ser medida de JUSTIÇA !!!!

Termos que

Pede deferimento.

Rio de Janeiro, 24 de novembro de 2010.

LÉA ARRIGUI ARAUJO

Defensora Pública

Mat.179.446.0

ALDO LUDOGERIO

Estagiário DPGE

Mat.092871