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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS SOB A ÉGIDE DA LEI Nº. 11.101/2005
CHRYSTIAN CEZAR DE BORBA
Itajaí, maio de 2007
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS SOB A ÉGIDE DA LEI 11.101/2005
CHRYSTIAN CEZAR DE BORBA
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor MSc. Adilor Danieli
Itajaí, maio de 2007
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, sem dúvida, a Deus, por ter sido um amigo fiel em todas as horas e por ter trilhado
meu caminho com muito amor.
A minha querida esposa Adeneri Nogueira de Borba e ao meu filho Carlos Cezar Borba Neto minha família amada, meu alicerce, pelo amor, compreensão e aconchego, sem os quais não
conseguiria atingir esta imensurável meta.
Ao meu pai, Carlos Cezar Borba, minha mãe Nilma Borba por todo amor e orientação em todos
os momentos da minha vida, sem os quais seria impossível subsistir.
Aos meus irmãos Cezar Leandro Borba, Angelita Borba, ao meu cunhado Juvan de Souza Neto,
meus amigos, espelho de alegria e companheirismo.
Ao professor, mestre, exemplo de Magistrado Dr. Adilor Danieli, meu Orientador, por seu
magistério, pela exortação e conhecimentos recebidos, sem o qual tal pesquisa não houvera
de se concretizar.
À todos aqueles que aqui não elenco, mas que de forma coadjuvante contribuíram para a realização
deste trabalho, meus sinceros e honestos agradecimentos.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha esposa, meu filho e meus pais por alicerçar minha vida, com toda
união e amor.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, maio de 2007.
Chrystian Cezar de Borba Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Chrystian Cezar de Borba, sob o
título A Recuperação de Empresas Sob a Égide da Lei nº. 11.101/2005, foi
submetida em 12 de junho de 2007 à Banca Examinadora composta pelos
seguintes professores: MSc. Adilor Danieli (Orientador e Presidente), Ademir
Manoel Furtado (Membro) e MSc. Antônio Augusto Lapa (Membro), aprovada
com a nota 10 (dez).
Itajaí (SC),12 de junho de 2007.
Prof. MSc. Adilor Danieli Orientador e Presidente da Banca
Prof. MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
a. ano
a.C. antes de Cristo
Ampl. ampliada
Ap. Cív. Apelação Cível
Art. Artigo
Arts. Artigos
Atual. Atualizada
BTN Bônus do Tesouro Nacional
caput Cabeça do artigo
CC Código Civil
CCB Código Civil Brasileiro
CEJURPS Centro de Ciências Jurídicas Políticas e Sociais
Cf. conforme
CF/88 Constituição Federal de 88
CLT Consolidação das Leis Trabalhistas
CPC Código de Processo Civil
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CTN Código Tributário Nacional
Dec. Decreto
Des. Desembargador
DJU Diário da Justiça da União
ed. edição
FGTS Fundo de Garantia por tempo de Serviço
inc. inciso
vii
incs. incisos
INSS Instituto Nacional da Seguridade Social
in verbis abaixo
IPTU Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbano
ITCMD Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação
LICC Lei de Introdução ao Código Civil
LFC Lei de Falências e Concordatas
LRE Lei de Recuperação de Empresas
LSA Lei das Sociedades Anônimas
nº número
NCC Novo Código Civil
omissis lacuna; hiato; vazio
Org. Organizador
ORTN Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional
p. Página
p. ex. Por exemplo
PL Projeto de Lei
QGC Quadro Geral de Credores
Rel. Relator
rev. Revisada
STF Supremo Tribunal Federal
Tir. Tiragem
TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Trad. Tradução
UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí
v. volume
viii
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Administrador judicial:
“Pessoa escolhida pelo juiz entre pessoa de sua confiança e portador de
escolaridade superior, tendo função fiscalizar e conferir as informações prestadas
pelo empresário, e, se concedida a recuperação, fiscalizar seu cumprimento”.1
Assembléia de Credores:
“É o órgão colegiado e deliberativo responsável pela manifestação do interesse
ou vontade predominante entre os que titularizam crédito, diante da empresa em
processo de falência ou recuperação judicial”.2
Ato da Falência:
“O ato da Falência é aquele que tipifica condutas que, em geral, são as de
empresários em insolvência econômica, condutas que tem por objetivo causar
prejuízo aos credores”.3
Concordata:
“A concordata é um favor legal consistente na remissão parcial ou dilação do
vencimento das obrigações devidas pelo comerciante. Somente o profissional
exercente de atividade mercantil tem acesso, na lei revogada, a este favor legal”.4
1 DANIELI, Adilor. Limite da discricionariedade judicial e dicotomia peremptória do pedido de
concordata preventiva: contribuição político-jurídica. Dissertação de Mestrado em Direito. UNIVALI/Itajaí, 2003, p. 5.
2 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à nova lei de falências e de recuperação de empresas: (Lei nº 11.101, de 9-2-2005). 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 137.
3 OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Comentários à nova lei de falências. São Paulo: IOB Thomson, 2005, p. 324.
ix
Credores Quirografários:
“Categoria de credores atingidos pela concordata e que no processo falimentar
não possuem preferência nenhuma na ordem de pagamento”.5
Desjudicialização:
“Trata-se de facultar às partes comporem seus litígios fora da esfera estatal da
jurisdição, desde que juridicamente capazes e que tenham por objeto direitos
disponíveis”6.
Desvio de Finalidade:
“Trata-se do uso indevido ou abuso do direito à recuperação”7.
Direito Comercial:
“É o ramo da ciência do Direito destinado a disciplinar as relações e os atos
jurídicos decorrentes da atividade mercantil e dos comerciantes, seja entre si
mesmos; seja entre esses e os não comerciantes”.8
Direito Falimentar:
“É o complexo de normas protetoras do crédito no caso de insolvência do
comerciante. Supõe a insolvência, ou seja, a impossibilidade de o patrimônio do
comerciante garantir seus débitos. No estado falencial, é liquidado o patrimônio
do falido para atender aos credores que se habilitarem na falência. Compõe-se de
normas asseguradoras de direitos e de preferências dos credores (direito
privado), de normas que regem o processo de falência (direito processual
falimentar) e de normas penais (direito penal falimentar). Compondo-se de
4 ARAÚJO, José Francelino de. Manual de falências e concordatas. Porto Alegre: Sagra-
Luzzatto, 1996, p. 241. 5 DANIELI, Adilor. Limite da discricionariedade judicial e dicotomia peremptória do pedido de
concordata preventiva: contribuição político-jurídica. Dissertação de Mestrado em Direito, p. 6. 6 HELENA, Eber Zoehler Santa. O fenômeno da desjudicialização . Jus Navigandi, Teresina, ano
10, n. 922, 11 jan. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7818>. Acesso em: 17 maio 2007.
7 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. 2 ed, São Paulo: Atlas, 2005, p. 138.
8 ESTRELA, Hernani. Curso de direito comercial. 5. ed. Rio de Janeiro: Konfino, 1993, p. 09.
x
normas de direito privado, de normas processuais (direito público) e de normas
penais (direito público), o direito falimentar é direito misto”.9
Empresa:
“Empresa é a organização de capital e de trabalho destinada à produção ou
mediação de bens ou serviços para o mercado”.10
Falência:
“A falência se caracteriza como um processo de execução coletiva, decretado
judicialmente, dos bens do devedor comerciante ao qual concorrem todos os
credores para o fim de arrecadar o patrimônio disponível, verificar os créditos,
liquidar o ativo, saldar o passivo, em rateio, observadas as preferências legais”. 11
Iliquidez:
“É o patrimônio não realizável de pronto: caracteriza crise econômico-financeira;
caracteriza dificuldade temporária dos negócios, é uma conjuntura em que o
devedor solvente não consegue solver com pontualidade. Tem patrimônio
suficiente para superar suas obrigações, mas não consegue realizar,
imediatamente, os valores necessários para cobrir os débitos nos respectivos
vencimentos, por razões de etiologia variada”12.
Insolvência:
“A Insolvência é um estado de fato de ordem econômica. Pode ser real ou
aparente. É real quando o ativo é menor do que o passivo. É aparente quando,
ainda que maior o ativo, o devedor não dispõe, ainda que eventualmente, de
9 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 18. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1995, p. 210-211. 10 BULGARELLI, Waldirio. Sociedades comerciais: sociedades civis e sociedades cooperativas
empresas e estabelecimento comercial. 7. ed. São Paulo: Atlas, 1998, p. 23. 11 LACERDA, J. C. Sampaio de. Manual de direito falimentar. 14. ed. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1999, p. 28. 12 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Reflexões sobre a crise econômico-financeira como pressuposto da
recuperação empresarial . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 211, 2 fev. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4787>. Acesso em: 17 maio 2007.
xi
recursos financeiros ou creditícios, para cumprir no vencimento uma obrigação
líquida assumida”.13
Impontualidade:
“É a manifestação típica, direta, o sinal flagrante, qualificado, da impossibilidade
de pagar e, consequentemente, do estado de insolvência”14.
Liquidação:
“Consiste no encerramento de uma atividade econômica, com a venda do ativo
para pagamento dos credores, no todo ou em parte”.15
Liquidez:
“Liquidez é um conceito econômico que considera a facilidade com que um ativo
pode ser convertido no meio de troca da economia. O grau de agilidade de
conversão de um investimento sem perda significativa de seu valor mede sua
liquidez. Um ativo é tanto mais liquido quanto mais fácil for de transformar em
dinheiro vivo”16.
Massa Falida:
“É o acervo ativo e o passivo de bens e interesses do falido que passa a ser
administrado e representado pelo administrador judicial. Embora seja apenas uma
universalidade de bens, e não uma pessoa jurídica, a massa falida tem
capacidade de estar em juízo como autora ou ré. A massa falida divide-se em
massa ativa e massa passiva. Forma-se no momento em que é decretada a
falência”.17
13 RAMALHO, Roberto. Curso teórico e prático de falência e concordata. 3. ed. São Paulo:
Saraiva, 1993, p. 48 14 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Lei de falências e concordata. São Paulo: Atlas, 1999, p. 27. 15 OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Comentários à nova lei de falências, p. 34. 16 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Reflexões sobre a crise econômico-financeira como pressuposto da
recuperação empresarial . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 211, 2 fev. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4788>. Acesso em: 17 maio 2007.
17 OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Comentários à nova lei de falências, p. 28.
xii
Natureza Jurídica:
“É a afinidade que um instituto jurídico tem, em diversos pontos, com uma grande
categoria jurídica, podendo nela ser incluído a título de classificação”.18
Recuperação Judicial:
“A recuperação judicial destina-se às empresas que estejam em situação de crise
econômico-financeira, com possibilidade de superação. Tal tentativa de
recuperação prende-se, ao valor social da empresa em funcionamento, que deve
ser preservado não só pelo incremento da produção, como, principalmente, pela
manutenção do emprego, elemento de paz social”19.
Síndico:
“É o representante legal e o administrador da massa falida, sob a direção e
superintendência do juiz. Entre as suas inúmeras atribuições, contam-se as
seguintes: representar a massa falida, arrecadar os bens e os livros do falido,
prestar informações aos interessados, verificar os créditos, elaborar relatórios,
organizar o quadro geral de credores, promover a liquidação, etc”.20
18 DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. v. 3. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 337. 19 BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova lei de recuperação e falências comentada: Lei
11.101, de 9 de fevereiro de 2005, comentário artigo por artigo. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 116.
20 FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Roteiro de falências e concordata. 19. ed. rev. atual. de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 3.
SUMÁRIO
SUMÁRIO........................................................................................ XIII
RESUMO..........................................................................................XV
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 3
RECUPERAÇÕES.............................................................................. 3 1.1 BREVE HISTÓRICO DO INSTITUTO DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS.3 1.1.1 CONCORDATA .............................................................................................4 1.1.2 CONCEITO DE RECUPERAÇÃO..................................................................9 1.2 PRESUNÇÃO E CERTEZA DA INSOLVÊNCIA ............................................10 1.3 RELAÇÕES ENTRE RECUPERAÇÃO E FALÊNCIA....................................13 1.4 A LEI DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS COMO TRANSFORMAÇÃO...18 1.5 AS OPÇÕES E CARACTERÍSTICAS DA LRE ..............................................20
CAPÍTULO 2 .................................................................................... 23
RECUPERAÇÃO JUDICIAL ............................................................ 23 2.1 INTRODUÇÃO................................................................................................23 2.2 OBJETIVOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL ...............................................24 2.3 NATUREZA DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL................................................27 2.4 CRISE ECONÔMICO-FINANCEIRA ..............................................................29 2.5 DAS CAUSAS SUSCETÍVEIS DE RECUPERAÇÃO.....................................32 2.6 DESVIO DE FINALIDADE..............................................................................34 2.7 VIABILIDADE DA EMPRESA ........................................................................35 2.8 EXTENSÃO DOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO ........................................36 2.9 OS MEIOS E PERSPECTIVAS DE RECUPERAÇÃO....................................39
CAPÍTULO 3 .................................................................................... 47
O PROCESSO DE RECUPERÇÃO JUDICIAL ................................ 47 3.1 FASES DA RECUPERAÇÃO E IMPEDIMENTOS .........................................47 3.1.1 IRREGULARIDADE PROFISSIONAL .....................................................................49 3.1.2 RECUPERAÇÃO JUDICIAL ANTERIOR .................................................................49 3.1.3 CONDENAÇÃO CRIMINAL..................................................................................50 3.2 O PEDIDO DE RECUPERAÇÃO....................................................................51 3.3 DESPACHO DE PROCESSAMENTO............................................................56
xiv
3.4 DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL.................................................58 3.5 DA IMPUGNAÇÃO .........................................................................................59 3.6 LAUDO ECONÔMICO – FINANCEIRO..........................................................60 3.7 ASSEMBLÉIA GERAL DE CREDORES........................................................61 3.8 DELIBERAÇÕES SOBRE O PLANO.............................................................63 3.9 ADMINISTRAÇÃO DOS BENS......................................................................64 3.10 SUBSTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA............................................................66 3.10.1 SUBSTITUIÇÃO DO EMPRESÁRIO NA ADMINISTRAÇÃO JUDICIAL ...67 3.11 ADMINISTRADOR JUDICIAL ......................................................................67 3.12 COMITÊ DE CREDORES.............................................................................68 3.13 CONVOLAÇÃO EM FALÊNCIA...................................................................70 3.14 CUMPRIMENTO DA RECUPERAÇÃO........................................................71
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 72
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 75
RESUMO
A presente monografia trata da Recuperação de Empresa, à
luz da Lei 11.101/2005. Analisando o universo da nova legislação, o aporte do
novo dispositivo no ordenamento jurídico nacional, que culminou na Recuperação
de Empresas. A monografia evidencia os aspectos legais e doutrinários que
gravitam em torno da Recuperação de Empresas principalmente no cojeto
analítico das novidades inseridas na nova lei. Para uma melhor compreensão da
matéria, a pesquisa foi dividida em três capítulos.
O primeiro capítulo tece notas introdutórias a despeito da
Recuperação de Empresas, objetivando uma melhor explicitação do tema –
traçando-se toda evolução histórica do instituto; o segundo trata de aspectos
gerais da nova Lei de Recuperação de Empresas; já o terceiro capítulo, reporta-
se ao Processo de Recuperação Judicial, todos os procedimentos e
características suscitadas na nova lei.
Para encetar a investigação foi utilizado o método indutivo, a
ser operacionalizado com as técnicas do referente, das categorias, dos conceitos
operacionais e da pesquisa de fontes documentais. Portanto, esta monografia se
direciona ao estudo do Instituto da Recuperação de Empresas, inserido na Lei
sancionada em 09 de fevereiro de 2005, demonstrando pormenorizadamente, que
esta inovação veio a contemplar os anseios da economia nacional.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto apurar a
Recuperação Judicial, tratando desde seu surgimento histórico ao processo de
recuperação, instituído pela Lei nº. 11.101/2005 e, com o objetivo institucional,
produzir uma monografia para a obtenção do grau de bacharel em Direito, pela
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
Através de pesquisa bibliográfica e utilizando o método
indutivo, buscou-se perquirir o conhecimento do tema, apresentando todo o
processo de recuperação, suas peculiaridades e seus precípuos objetivos no
contexto econômico empresarial. Para o desenvolvimento deste trabalho,
cronologicamente foi norteado pela obra do insigne Jurista Waldo Fazzio Júnior.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de forma
genérica, a despeito do instituto da Recuperação Empresarial, sua gênese, assim
como um apontamento geral no tocante a evolução histórica do instituto no
mundo e no Brasil. Outros aspectos importantes abordados neste capitulo foram
as características essenciais do estado de Recuperação Judicial, e o instituto
como transformação, frente as novas inserções.
No Capítulo 2, trata do processo de Recuperação Judicial,
aborda os aspectos gerais da nova Lei de Recuperação de Empresas, e os
objetivos que levam ao pedido. Num segundo momento, aborda-se as causas que
possam acarretar na crise e por fim os meios de recuperação e suas perspectivas
ao efetivar um pedido de recuperação judicial.
Ultimando-se a pesquisa, no Capítulo 3, tratou-se de abordar
o processo de recuperação judicial, apresentando um apanhado pormenorizado
explicitando na esfera jurídica, todo aparato desde a petição inicial de
recuperação até o seu estrito cumprimento.
2
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a Recuperação de Empresas – que visa a reorganização econômica e
financeira do empresário que se encontre em crise financeira.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses: 1) A recuperação de empresas é tão somente uma medida econômico-
financeira de revitalização da empresa; 2) O aporte do novo instituto da
recuperação de empresa trará medidas que viabilizarão uma sociedade
empresária em crise; e 3) As inovações trazidas com o novo dispositivo, visam
salvaguardar a manutenção da fonte produtora, do emprego de seus
trabalhadores e os interesses dos credores, viabilizando, dessa forma, a
realização da função social da empresa.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
CAPÍTULO 1
RECUPERAÇÕES
1.1 BREVE HISTÓRICO DO INSTITUTO DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
No instituto da Recuperação de Empresas, muitos
doutrinadores manifestaram-se sobre a gênese deste instituto após a Primeira
Guerra Mundial (Joaquim Bisbal Mendez21, citado por Jorge LOBO, 1998, p. 175-
176). Porém, não há uma pacificação doutrinária acerca do exato surgimento da
recuperação de empresas. Outros, inclusive o próprio Jorge Lobo, manifestaram-
se sobre a sua origem a partir da Segunda Guerra Mundial, quando houve um
declínio acentuado das empresas, gerando um caos social globalmente
verificado, o que fez com que o Poder Público das nações atingidas analisasse
mais de perto tais conseqüências, auxiliando na busca de soluções para o
reerguimento das Empresas, da economia e recuperação do emprego e auto-
estima dos trabalhadores empresários22.
A gênese do instituto da Recuperação de Empresas remonta
à épocas aquém da Segunda Guerra Mundial.
Conforme se depreende na obra de Rubens Requião, este
instituto não se trata de inovação no Direito brasileiro. Trata-se, sim, de um
reavivamento de uma hipótese já há muito estudada, tendo despontado no Alvará
de 1756, outorgado no ano seguinte ao do terrível terremoto de Lisboa, o qual
causou a desorganização e ruína do comércio e da navegação da metrópole,
revisando-se, assim, no que tange à matéria, as Ordenações Filipinas. Assim, no
Alvará de 1756, na regra VIII, havia a determinação de que:
21 MENDEZ, Joaquim Bisbal. La empresa em crises y el derecho de quiebras: Uma apreciación
econômica y jurídica de los procedimientos de conservación de empresas, Zaragoza, 1986, p. 25.
22 RONCONI, Diego Richard. Falência & Recuperação de Empresas: , p. 68.
4
REQUIÃO23 :
“Os que caírem em pobreza sem culpa sua, por receberem grandes perdas no mar, ou na terra, em seus tratos e comércios lícitos, não constante de algum dolo ou malícia, não incorrerão em pena de crime algum. E neste caso serão os atos remetidos ao Prior e Cônsules do Consulado, que os procurarão consertar e compor com seus credores, conforme o seu Regimento”.
Aclibes Burgarelli, em recente estudo sobre a matéria,
diverge da opinião acima, entendendo que o instituto da Recuperação de
Empresas teve início no direito francês, encontrando-se, também, no direito
italiano24.
De tais lições, portanto, constata-se que o instituto da
Recuperação de Empresas, comparado ao da Falência, é relativamente inovador
na legislação mundial, consistindo num instituto mais vetusto do que se imagina,
cujas raízes, há que se dizer, tenha gênese no próprio Direito brasileiro25.
No ordenamento jurídico brasileiro, o instituto da
Recuperação de Empresas não é uma inovação, vez que esta idéia já se fazia
presente na legislação portuguesa que muito imperou nos primeiros tempos do
Brasil Colônia. O instituto já se fazia presente nas Ordenações Filipinas e no
Alvará de 1756, no qual havia uma previsão, denominada de regra VIII, que
garantia às empresas a segurança de não quebrarem em caso de catástrofes
provocadas pela natureza26.
1.1.1 CONCORDATA
O instituto da concordata, que antecedeu a lei de
recuperação judicial, tem sua história e origem que reporta há um passado bem
23 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito falimentar, 4 ed. São Paulo: Saraiva, 1980. 2.v. p. 263. 24 BURGARELLI, Aclibes, A venda antecipada de bens na falência, Tribuna da Magistratura.
Caderno de doutrina, pp. 74-78, set. 1996. 25 RONCONI, Diego Richard. Falência & Recuperação de Empresas: p. 69. 26 RONCONI, Diego Richard. Falência & Recuperação de Empresas: p. 68.
5
distante. Em que pese o direito romano ser considerado o berço de todos os
direitos, os doutrinadores divergem quanto a origem histórica da concordata. No
entanto, prevalece o entendimento de que o instituto da concordata não teve seu
início ou não foi contemplado pelo direito romano, apesar deste ter conhecido
procedimentos que se assemelhavam à concordata.
Discrepando acerca da origem da concordata no direito
romano, anota Araújo27:
Várias teorias procuram explicar a natureza jurídica da concordata. Conhecido o instituto em suas linhas gerais, e recordando que ele não teve origem em Roma e sim nas cidades italianas, em seus estatutos, na idade média [...]
No mesmo entendimento prescreve Alfredo Rocco28:
“A concordata não teve origem em Roma: o direito romano conheceu porém institutos, como o pactum ut minus solvatur e o induciae quinquennales conhecido pelo príncipe, análogos na estrutura externa, à nossa concordata; mas esta nasce e se desenvolve dos costumes e dos estatutos municipais das cidades italianas, onde foi pela primeira vez disciplinada legislativamente”.
Almeida29 explica que:
“Foi assim com a induciae quinquennales (induciae = pazes, trégua; quinquennales = de cinco em cinco anos, que dura cinco anos), inicialmente concedida pelo imperador e que ensejaria ao devedor o pagamento das suas dívidas em prazo que não podia ultrapassar cinco anos, possibilitando-lhe a exceptio moratória (exceptio, onis = exceção, objeção; moratória, moratorius = que demora, que dilata), contra os credores. Todavia, só na Idade
27 ARAUJO, José Francelino de. Falências e concordatas, Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1996, p.
335. 28 Apud ANDRADE, Jorge Pereira. Manual de falências e concordatas. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1982. p. 218. 29 ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e concordata. 14 ed. São Paulo: Saraiva,
1996. p. 370.
6
Média se consolidaria o instituto, surgindo inicialmente na Itália e dali se irradiando por outros países da Europa”.
Os procedimentos do direito romano que é mais verossímil
aos contemporâneos eram: a) o pactum ut minus solvatur; b) as induciae
quinquennales. Por eles, nos casos de herança excessivamente onerada, o
herdeiro recusava a herança, pois se assim não o fizesse, ficava obrigado pelas
dívidas que o autor da herança havia deixado. Com a renúncia, a herança e os
bens eram vendidos para satisfazer os débitos para com os credores. Se, por
ventura, o produto da venda não fosse suficiente para pagamentos de todas as
dívidas, a memória do defunto ficava marcada com infâmia.
O pactum ut minus solvatur, permaneceu no direito
sucessório por muito tempo, até que com o advento dos procedimentos do
inventário, introduzido por Justiniano, perdeu o seu sentido original, que tratava
mais da esfera civil do que propriamente da comercial.
O outro instituto – induciae quinquennales, era o que mais
se assemelhava ao instituto da concordata brasileira. Através dele o devedor de
boa-fé alegava que a impossibilidade de honrar os compromissos era
momentânea e que somente poderia pagar os credores se lhe fosse
proporcionado um prazo mais extenso. O benefício era concedido pelo imperador,
não poderia ser por prazo superior a cinco anos e gerava o direito de repelir a
ação dos credores.
Em relação ao instituto da induciae quinquennalis, anota
Tzirulnik30:
“O outro instituto do Direito Romano do qual são extraídas semelhanças com a concordata atual constituía-se de benefício que o imperador podia conceder a pedido de devedor infeliz e de boa-fé que alegasse que as suas dificuldades financeiras eram passageiras, e que os seus credores poderiam ser satisfeitos em breve futuro. A esse instituto denominava-se induciae
30 TZIRULNIK, Luiz. Direito falimentar. 6 ed. São Paulo: RT, 1999. p. 233.
7
quinquennalis, pois o benefício não poderia ultrapassar cinco anos, tratando-se, assim, de dilação de prazo por aquele período.
Mais tarde, esse benefício, por uma constituição de
Justiniano, passou a subordinar-se à deliberação dos credores, por maioria de
votos, tendo em vista a importância dos créditos, quirografários e hipotecários
reunidos, atendendo a que era mais vantajoso deixar o devedor à testa de seus
negócios e, nesse caso, a minoria teria que acatar a concessão do benefício pela
maioria, desde que o prazo de moratória não excedesse aos cinco anos31.
No Brasil colônia a legislação vigente era a portuguesa,
predominando os princípios do direito romano. No que se refere à falência, o
direito português reproduziu o direito estatutário italiano, com pequenas
modificações, e considerava a falência como parte do direito criminal,
submetendo o devedor a excessivo rigor legislativo.
Mesmo após a independência, o Brasil permaneceu a
regular-se por leis portuguesas. Era observada a lei da Boa Razão, de 18 de
agosto de 1769, a qual ditava que se guardassem nos negócios mercantis e
marítimos, como subsidiárias, as leis das nações européias.
Com o aporte do Código Comercial Brasileiro, em 1850, o
instituto da falência e da concordata foi introduzido no nosso sistema legislativo,
sob a denominação “Das Quebras”, no qual era conhecida somente a concordata
suspensiva (a preventiva surgiria mais tarde no direito belga e, no Brasil, em
1890, através do Decreto nº. 917).
No tocante ao início do instituto no direito brasileiro,
Lacerda32 menciona:
[...] admitia a concordata na falência, desde que o falido não fosse julgado com culpa ou fraude (art. 848) e que fosse concedida por
31 LACERDA, José Cândido Sampaio de. Manual de direito falimentar, 14 ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1999. p.233. 32 LACERDA, José Cândido Sampaio de. Manual de direito falimentar, 14 ed. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1999. p.244.
8
um número tal de credores que representasse, pelo menos, a maioria destes em número de dois terços no valor de todos os créditos, sujeitos aos efeitos da concordata.
Em seguida, coube ao Decreto nº. 2.024 de 1908, revogar a
concordata extrajudicial e acabar com os últimos resquícios da moratória,
restando na legislação nacional apenas a concordata judicial, sob as duas formas
até hoje existentes.
Com a promulgação do Decreto Lei nº. 7.661, de 21 de
junho de 1945, passamos a ter a legislação de falências e concordatas, nos
moldes atuais, com pequenas modificações introduzidas pela Lei nº. 4.983, de 18
de maio de 1966, cuja precípua modificação ocorreu na data em que deveria ser
iniciado o pagamento das prestações.
O conceito de concordata é definido de forma diversa pelos
doutrinadores. Todavia, há um consenso de que é um favor legal, concedido pelo
juiz através de decisão judicial e independentemente da vontade dos credores, à
sociedade empresária que prova em juízo preencher requisitos legais, objetivando
seu reajustamento econômico, pagando as dívidas em valor menor e em maior
prazo.
A concordata preventiva, no entanto, de modo geral, serve
para prevenir ou evitar a falência, quando verificado que a empresa está em
dificuldades financeiras, mas ainda tem lastro suficiente para sua recuperação.
Führer, define da seguinte forma:
[...] “define-se a concordata como sendo um processo que o comerciante pode mover contra seus credores quirografários, para obrigá-los a um prazo mais longo nos pagamentos, ou receber menos, a fim de permitir-lhe a reorganização econômica e evitar (concordata preventiva) ou suspender (concordata suspensiva) a falência33”.
33 FUHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Roteiro das falências e concordatas, 17 ed. São
Paulo: RT, 2000, p. 119.
9
Ramalho34, define concordata:
“Como sendo uma forma legal de prorrogação de prazo ou de redução da dívida, com o objetivo de superar o estado de pré-insolvência do devedor comerciante ou industrial, evitando ou suspendendo a sua falência”.
A concordata possui seu regramento no Decreto-lei
7.661/45, e, com o decorrer do tempo passou a exigir alterações face ao
desenvolvimento e aumento da complexidade da economia nacional. Desta
forma, elaborou-se projeto de lei que deu origem à Lei 11.101/2005, criando a Lei
de Recuperação Judicial.
1.1.2 CONCEITO DE RECUPERAÇÃO
Partindo-se dos preceitos basilares das definições,
recuperar, conforme definição do Dicionário Aurélio, consiste:
“Readquirir, reconquistar, reaver, recobrar (o perdido), recuperar novamente, reabilitar”35, a palavra traz o sentido de restauração.
A Lei de Recuperação de Empresas – LRE optou pela
denominação recuperação empresarial, no intuito de explicitar o restabelecimento
da normalidade da atividade econômica, portanto, tal nomenclatura visa eleger
conotação de procedimento indicado a restaurar a saúde econômica da
empresa36.
Vários autores, entre eles Nélson Abrão e Rubens Requião,
há muito, manejam a recuperação empresarial como forma de se dar fôlego
econômico para empresas em situações de dificuldade financeira. Estes autores
defendem a idéia de que quando verificada a ocorrência de empresa em
34 RAMALHO, Ruben. Curso teórico-prático de falência e concordatas. São Paulo: Saraiva,
1984. p.267. 35 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini aurélio século XXI: o dicionário da língua
portuguesa, 4 ed. Rev. e ampl, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000. p.688. 36 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 97.
10
dificuldades financeiras, e que for vislumbrada a possibilidade de sua
revitalização, antes mesmo da verificação da existência ou não de má-fé do
empresário37.
Fazzio Júnior38, aponta a respeito da matéria que:
“É obvio que, a exemplo da concordata, consiste em procedimento preventivo, porque tem a intenção de evitar a situação de falência. Contudo, persegue um objetivo muito mais amplo que o do instituto da concordada. Para o fim de preservar a atividade produtiva e maximizar o ativo sobre o qual incidem as pretensões dos credores, o legislador brasileiro, antes tarde do que nunca, engendrou duas alternativas tendentes a prevenir a falência, colocando no sistema jurídico as recuperações judicial e extrajudicial”.
A novidade incorporada no direito falimentar brasileiro o
devedor comerciante, que outrora poderia somente comprometer-se com o
alongamento do vencimento ou com a remissão das suas dívidas, doravante, com
o advento da nova legislação, vislumbrar novas possibilidades para solucionar os
problemas de ordem econômica, portanto, a de se recompor economicamente
sem ter a sua falência decretada, satisfazendo com muito mais eficiência o seu
passivo. A empresa em recuperação possui muito mais condições para solver os
seus débitos para com os credores, proporcionando-lhe plenas oportunidades
para quitar seus débitos e continuar em operação.
1.2 PRESUNÇÃO E CERTEZA DA INSOLVÊNCIA
Ressalvada a espécie falimentar originária de pedido
deduzido pelo próprio devedor (liquidação voluntária), a falência será sempre
presumida. Dessa forma, não se pode negar que a liquidação coletiva forçada
37 RONCONI, Diego Richard. Falência & Recuperação de Empresas: p. 69-70. 38 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 97
11
resulta de uma presunção de insolvência fundada na suspensão de pagamentos
ou nos atos indutores de insolvência39.
Fazzio Júnior40, sobre presunção disserta:
“Antes que o descumprimento de obrigações de pagar autorize a presunção de que o devedor está insolvente, a lei lhe oferece uma oportunidade de demonstrar que, simplesmente, pode sair da crise econômico-financeira em que se encontra. Isso quer dizer que ao devedor é outorgada uma chance de readquirir a capacidade de cumprir suas obrigações, de não descumpri-las. Essa oportunidade é chamada de recuperação. Recuperar é readquirir a capacidade de pagar”.
A contundente tarefa de proporcionar essa chance ao
insolvente não é incumbência do Estado, mas sim de uma de suas instituições – o
Judiciário. Todavia, apenas concede ao insolvente o direito de pedir, onde na
verdade quem tem poderes para oportunizar a recuperação são os credores.
Tem-se, pois, que a lei não concede recuperação, enseja a faculdade de pedir
recuperação. Nos termos da LRE, é a assembléia geral de credores que deve
decidir sobre sua eventual concessão41.
Acerca do pedido de recuperação, ensina Fazzio Júnior42:
“Ao formular um pedido de recuperação, o devedor está apenas dizendo: quero deixar de descumprir, quero voltar a cumprir, tenho capacidade de fazê-lo. Incumbe aos credores dar ou não o sinal verde para a recuperação. Primeiro, verificam se realmente a empresa do devedor é viável. Depois, analisam se o modo da recuperação proposta atende a suas expectativas, como credores. Se sim, concordam com o plano. Se não, podem propor plano alternativo. Se definitivamente não, rechaçam a proposta. Nas três
39 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 98. 40 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 98. 41 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 98 42 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 98-99.
12
hipóteses, árbitros da recuperação são os credores. O Estado-juiz homologa”.
Essa é a grande inovação da LRE em relação ao sistema da
LFC: agora há um favor creditício que o juiz oficializa. Na concordata, aos
credores era impelida uma proposta dilatória ou remissória. Se os credores
houvessem por bem embargar a proposta do devedor e fossem bem sucedidos, o
devedor iria à falência. O grande dilema da concordata era esse: o sucesso do
devedor poderia muito bem não significar sucesso dos credores43.
Fazzio Júnior ensina as peculiaridades da recuperação:
A recuperação é melhor. Nela, os credores não se restringem a concordar ou não com uma proposta. Não se resumem ao papel de enfrentar, no escuro, o dilema descrito. Podem conhecer a verdadeira situação do devedor. Podem verificar se a insolvência jurídica é só uma presunção ou traduz a insolvência econômica. Podem conceder a oportunidade, porque participarão dela. Não são conformados destinatários de um favor legal, mas sujeitos ativos da recuperação. [...] No sistema da recuperação, se os credores discordarem do plano proposto pelo devedor, o farão com plena ciência da insolvência econômica, não só da jurídica. É que estarão diante de um fato, não de uma presunção. Não discordarão pelo simples fato do descumprimento, mas pelo fato da insolvência. A recuperação desfaz o perigo da presunção jurídica. [...] Na verdade, o processo de recuperação, tanto judicial como extrajudicial, é uma intervenção dos credores na empresa do devedor, a pedido deste. O devedor deseja readquirir a capacidade de pagar o que seus credores intentam receber. Se, além disso, a empresa sobreviver, melhor, pois ganharão o mercado e a sociedade44.
Na recuperação, os credores tornam-se os árbitros da
sobrevivência ou não da empresa do devedor. Se esta perecer, não será a partir
de uma simples presunção jurídica de insolvência. É oportuna a solução, porque o
43 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 99. 44 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 99-100.
13
mercado deve ser o que os mercadores fazem dele, não simplesmente o
resultado de um processo ou de uma presunção objetiva.
1.3 RELAÇÕES ENTRE RECUPERAÇÃO E FALÊNCIA
Existem duas alternativas resolutórias das relações jurídicas
derivadas do estado de crise econômico-financeira dos agentes econômicos: a
recuperação de empresa ou a falência. Em ambas, há concurso. Na recuperação,
concurso de observação. Na falência, concurso de liquidação45.
O concurso de observação encerra, substancialmente, um
convênio entre o devedor e os credores, sob mediação judicial. É uma solução
ambulatória. Já o concurso de liquidação significa o fim da empresa e a falência
do devedor, sendo terminal46.
Assim, neste sentido, explicita Fázzio Júnior ao discorrer
sobre a recuperação judicial e extrajudicial:
“A recuperação da empresa pode ser obtida por meio de negociação extrajudicial ou mediante procedimento supervisionado pelo órgão judiciário. A diferença reside na eclosão do plano de recuperação. Na recuperação judicial, o devedor dirige-se ao juiz, que conclama os credores à concordância ou não com a proposta. Na extrajudicial, compostos o devedor e seus credores, o juiz é demandado para homologar. O controle de legalidade é sempre judicial.” 47
Modernos regimes jurídicos de insolvência envolvem
relações estruturais entre os procedimentos de recuperação judicial e o processo
de falência. Nos sistemas que compreendem procedimentos distintos, pode-se
prever a conversão entre ambos, no intuito de viabilizar a adoção da solução mais
45 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 100. 46 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresasp. 100. 47 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 100.
14
adequada, ou seja, a que atenda às peculiaridades da situação financeira do
devedor, evitando, inclusive, abusos de credores48.
Interessante seria regular a conversão da falência em
recuperação, exceto quando aquela tenha sido o resultado do fracasso desta.
Infelizmente não foi a solução da LRE. Nos dispositivos vigentes estão previstos
duas formas de recuperação: extrajudicial meramente homologada ou judicial. Se,
por ventura, o devedor entra em liquidação, é porque é inviável. A LRE não cogita
de sua revitalização49.
Sobre a conversão, ensina Maria Celeste Morais Guimarães:
“Por outro lado, de grande importância é a fixação das condições e circunstâncias determinantes da conversão da recuperação em liquidação para prevenir o exício precipitado do agente econômico, mas sem perder de vista alguns elementos, tais como a recuperação protelatória da liquidação; a inobservância das regras da recuperação, pelo devedor; a eventual minimização do ativo em recuperação; a viabilidade do plano de recuperação; e as possibilidades de o devedor cumprir o plano de recuperação. [...]No mesmo esquema – de tutela do interesse do devedor (e eventualmente dos credores), alternativamente com a conservação da empresa ou com uma liquidação que exclua a quebra e as correspondentes sanções pessoais – inspiram-se também os procedimentos de acordo preventivo (concordata) introduzidos entre as duas guerras, e, sucessivamente, retocados ou melhorados em vários países da Europa. [...] Nos procedimentos ora mencionados, assim como no da corporate reorganization do Direito norte-americano, a evolução dos fatos quase nunca permitiu que se estabelecesse com eles um resultado favorável (além do interesse do devedor – conservar a empresa ou liquidá-la sem quebra, com o consentimento dos credores – um interesse geral voltado à recuperação da empresa). Mesmo que expresso nos motivos que inspiraram os legisladores, esse fim não incidiu sobre a utilização prática dos remédios em favor da coletividade, tendo em conta especialmente a impossibilidade jurídica ou política de impedir que o benefício
48 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 100. 49 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 100.
15
favorecesse, na grande maioria dos casos, empresas já não recuperáveis e finalmente vertidas a uma liquidação”50.
O legislador brasileiro, no entanto, estipulou a possibilidade
de conversão do processo de recuperação em processo de falência e, inclusive,
previu a possibilidade da falência direta, seja voluntária, seja forçada. O legislador
poderia ter indicado um procedimento único, em que a opção por um ou outro
regime ocorreria posteriormente à abertura da insolvência, quando devidamente
apurado qual dos dois procedimentos seria o mais apropriado.51
Fázzio Júnior, disserta:
“Essa crítica não significa que o processo de recuperação é mero substituto do instituto da concordata preventiva. Não é isso. Prevenir o estado de falência, agora, não significa, singelamente, protelar pagamentos de créditos quirografários, ou propor sua quitação com abatimento de valores. A recuperação judicial não é, em princípio, nem diminutiva nem moratória. Há um fértil elenco de meios suscetíveis de proporcionar a recuperação empresarial, restando à concordata, embora não regulada, especificamente, na LRE (apenas prevista no art. 50, inciso I), a condição de um dos meios legais admitidos. [...] Na LFC, a concordata preventiva oferecia-se como expediente dilatório apto a ensejar relativo conforto ao empresário devedor, para que lograsse recompor seus ativos e manter a atividade negocial. Não se dava o devido cuidado ao exame da viabilidade do empreendimento. Este é, precisamente, o desígnio preponderante da LRE”52.
O entendimento que se exprime na LRE consiste em quanto
menor for a interferência do estado, via Administração Pública ou Poder
Judiciário, as chances de obter bons resultados serão expressivamente maiores53.
Assim, ensina Fázzio Júnior:
50 GUIMARÃES, Maria Celeste Morais. Recuperação judicial de empresas. Belo Horizonte: Del
Rey, 2001. 51 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 101. 52 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 101 53 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 102
16
“Legislação mínima, fiscalização construtiva e adoção responsável de mecanismo de mercado constituem o trinômio do sucesso na recuperação de empresas. Por isso mesmo, a LRE admite a recuperação extrajudicial. Contudo, a tendência legislativa predominante tem se orientado em destino inverso, produzindo complexo processo de aferição dos graus de insolvência e sua solução, impondo soluções divorciadas das regras de mercado e demorados processos de estimativa da viabilidade da empresa. Aqui, o que tarda falha”54.
No entanto, viabilidade não comporta uma explicação
sucinta e objetiva. A respectiva distinção entre empresas viáveis e inviáveis deve
ser forjada a partir de mecanismos de mercado. Não pode ser gerada por
abstrações normativas. O papel do Direito, aqui, deve ser de mero árbitro da
legalidade. A questão é de índole econômico-financeira. O substrato jurídico só
disciplina direitos e deveres; não viabiliza nem inviabiliza55.
Tem que se levar em consideração, inclusive, que na
interpretação das regras da LRE deve predominar aquela que privilegia a gestão
judicial de alternativas no esforço de viabilização. E viabilização é proporcionar à
empresa condições de produzir valores para os credores, de modo que sua
expectativa de percepção de haveres seja melhor que a gerada pela falência. Isso
decorre, também, do momento em que se postula a recuperação, atentando-se
que de nada adianta intentá-la quando a empresa já se encontra insolvente56.
Sobre a viabilidade, ensina Fázzio Júnior:
“Encontrar meios de realização de fluxo de caixa, proporcionando valores para os credores, é a difícil tarefa assumida pelo administrador judicial. Além dos estudos e planejamento da empresa, é claro. Por isso, não adianta o empresário buscar o amparo jurisdicional quando seu empreendimento já agoniza. Quanto maior a iliquidez da empresa, menos são as alternativas estratégicas para a sua recuperação. [...] O momento do pedido
54 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 102. 55 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 102. 56 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 101
17
de recuperação, com certeza, é decisivo. Isto porque a insolvência não é um evento repentino, mas um processo, uma cadeia de atos sucessivos na direção da impotência patrimonial. A terapêutica depende do estágio de comprometimento do organismo da empresa em seus diversos segmentos”57.
É prática comum explicitar que eventos econômicos
negativos causam crises de caixa que impulsionam a falta de liquidez, ausentes
as condições de reposição de fundos. Nesta oportunidade, o que ocorre tão
somente é a mera impontualidade resultante de desequilíbrio financeiro. Há risco
financeiro alto e pequena rentabilidade58.
A partir desse entendimento preponderante, se medidas não
forem tomadas na busca que uma reorganização empresarial – tanto interna,
quanto externa – a tendência é a descida aos abismos da insolvência plena, eis
que, nesta etapa, a liquidação se impõe. É mais profícuo a promoção da
reestruturação enquanto os elementos da empresa ainda podem gerar valores e o
ativo condiciona pequenas possibilidades de suportar o passivo. Descobrir,
portanto, o ponto crítico do processo de insolvabilidade é fundamental59.
Nesse diapasão, Fázzio Júnior explicita seu posicionamento:
“Portanto, empresa viável não é uma noção tão comum que possa ser diagnosticada superficialmente ou mediante auditorias simplificadas. Quase sempre a raiz dos problemas não é puramente financeira. A dissonância financeira é a exteriorização de uma negatividade econômica e/ou administrativa, clamando por atitudes estratégicas e operacionais tempestivas. [...] Carente de meios de pagamento, improdutiva e sem crédito, a sociedade empresária não consegue fazer frente às obrigações, onerando ativos para garantia de financiamento ou oferecendo-os em penhora para garantir dívidas executadas”60.
57 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 101-102. 58 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 103. 59 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 103. 60 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 103.
18
A questão não se centra, única e exclusivamente, em
diagnosticar simplesmente se a empresa é ou não é viável. O ponto central é,
portanto, se esta tem ou não aptidão para integrar produtivamente o mercado. Em
outros termos, viabilidade não é um dado isolado61.
1.4 A LEI DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS COMO TRANSFORMAÇÃO
Desde 1945, o sistema jurídico brasileiro convive com a
LFC, que durante a sua vigência recebeu poucas modificações. Isso não é muito
normal em se tratando de direito concursal. Setor jurídico fortemente marcado
pelo dinamismo dos fatos econômicos e suas conseqüências sociais, seria natural
que arcasse com remendos e substituições normativas que a tornassem
compatível com a realidade sobre a qual incide. Essa reestruturação, por mais
necessária e mais reclamada, não aconteceu62.
A LFC tornou-se obsoleta e se seus princípios, no tocante
aos efeitos do inadimplemento das obrigações, conservam relativa atualidade, o
contexto de seus comandos passou a regular de forma deficiente e, às vezes,
injusta, senão improdutiva, situações que demandavam um direito concursal mais
ágil, protectivo da empresa, realista e eficaz63.
A LFC, a partir de seu aporte, numa consideração que não
ultrapassa o âmbito do sistema jurídico, dividiu espaço com uma nova lei das
sociedades por ações (1976), com novas legislações sobre títulos de crédito, com
novas normações sobre contratos (franquia, faturização, leasing etc.), com novo
direito financeiro a partir de 1964, com a lei de intervenção e liquidação
extrajudicial de bancos e, enfim, com um novo Código Civil que unificou o direito
empresarial64.
61 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 103. 62 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas, 2 ed., São Paulo:
Atlas, 2005, p. 107. 63 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 107. 64 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 108.
19
Sobre o assunto, Fazzio Júnior disserta65:
“É sob essa perspectiva que, por primeiro, deve ser olhada a LRE. Não se trata de uma legislação que puramente disciplina determinada matéria. Os próprios efeitos dos processos concursais já demonstram que um regime legal de insolvência opera sobre todas as faixas da sociedade. Daí, a reforma do direito concursal nacional, conquanto as reformas concursais sejam sempre insatisfatórias, provocará respostas diversas, positivas e negativas, porque, por mais acanhada que seja, deve operar transformações que implicam comprometimento de interesses estabelecidos, sacrifícios de princípios inveterados pelo uso e a forçada adoção de novos hábitos no cotidiano das relações obrigacionais entre os agentes econômicos”.
Importante salientar, ainda, a história legislativa estrangeira
no tocante ao direito concursal, marcada por sucessivas transformações. É um
direito que envelhece prematuramente e, por isso, reclama atualização sucessiva
em curto prazo66.
A ineficácia do regime concursal decorre da lentidão, do
crescente número de falências insolúveis e concordatas fracassadas, da inegável
desconfiança que substitui o crédito e do amplo descontentamento reinante no
mercado. A transformação do direito concursal não é resultado de simples
estatística nem de artificialismo doutrinário, mas sim advém da experiência67.
Sobre regime concursal, explicita Fazzio Júnior68:
“Não fossem suficientes os motivos apontados para justificar uma nova lei concursal, arremate-se com as sensíveis transformações econômicas que se produziram no país, exteriorizadas por sucessivos pacotes econômicos e planos monetários. Não se trata, é bom lembrar, de modificação normativa da realidade. Cuida, isto sim, de um regime legal apto a interagir com a
65 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 108. 66 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 108. 67 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 108. 68 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 108.
20
realidade socioeconômica, predisposto a oferecer respostas mais efetivas, embora não ortodoxas, comportando soluções mescladas pela informalidade, dinâmicas e, sobretudo, armadas com a flexibilidade que a vida econômica exige”.
Se os novos ditames da LRE carregarão todo esse potencial
ou não, somente a convivência com suas regras poderá indicar a resposta
correta. Até que ponto justifica-se uma relativa mitigação do princípio par conditio
creditorum nos concursos de credores, também é inquirição insuscetível de
prognóstico. A LRE não é boa nem má: é uma necessidade ditada por uma
conjuntura socioeconômica à qual precisa se ajustar, com pretensão corretiva69.
A lei concursal, como qualquer corpo normativo,
iniludivelmente enfrenta as provas peculiares a todas as leis, porque as leis não
constituem elementos socialmente indiferentes na medida em que respondam às
necessidades da sociedade, se ajustem à idiossincrasia da comunidade e contam
com o auxílio das pautas e estruturas de organização social. Por isso, não se
pode prescindir de considerar as prováveis respostas sociais que serão
suscitadas70.
Todas estas considerações para exprimir que a LRE não é,
isoladamente, agente de transformações. É mecanismo legal de sintonia.
Depende de políticas econômicas, políticas sociais, labor doutrinário,
compreensão jurisprudencial e, indubitavelmente, de próximas e previsíveis
alterações para compatibilizar dois mundos em permanente distonia: o mundo
econômico em constante transformação e o mundo jurídico, necessariamente,
correndo atrás para regulamentar relações econômicas71.
1.5 AS OPÇÕES E CARACTERÍSTICAS DA LRE
A LRE disciplina as recuperações e a falência, com nítida
preferência pela primeira opção. Da leitura de seus dispositivos conclui-se que a
69 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 109. 70 IGLESIAS, José Antonio. Concursos: las reformas a la ley. Buenos Aires: Depalma, 1995, p.356. 71 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 109.
21
falência só deve ser adotada como última possibilidade de deslinde das relações
obrigacionais credores/devedor72.
No tocante as recuperações, a LRE, claramente, deixa
aberto dois caminhos para o devedor: a recuperação extrajudicial, posteriormente
homologada pelo juiz, e a recuperação judicial. Em ambas, é decisiva e
imponente a intervenção da coletividade de credores, não apenas concordando
ou discordando, mas também revendo propostas e sugerindo alternativas.
Estabelece-se com isso um processo dialético, sempre iniciado pelo devedor, mas
que, em face de planos alternativos propostos pelos credores, se vê na
contingência de acolher ou não tais propostas73.
Esse conjunto de reciprocidade de propostas e respostas,
autêntico contraditório, pode levar à anelada composição para a recuperação, a
tentativas judiciais de conciliação ou, em último caso, à decretação da falência74.
Sobre o assunto, anota Fazzio Júnior75:
“As duas espécies de recuperação aventadas pela LRE têm por finalidade não o mero prolongamento de dívidas, mas a remoção das causas da crise econômico-financeira da empresa, para que possa resolver satisfatoriamente seus débitos, sem que isso implique sua desaparição. Numa visão superficial, as recuperações não se limitam ao desenvolvimento singelo de um expediente para repactuação de dívidas. Envolvem necessariamente um diagnóstico da situação financeira e administrativa da empresa. É certo que as recuperações não deixam de perseguir a apuração do passivo e seu pagamento. Fundam-se na viabilidade das empresas e na salvaguarda de seus elementos constitutivos, bem como de sua relevância socioeconômica para a comunidade”.
72 CARVALHO, Dora Martins de. O anteprojeto legislativo da lei de concordatas e falências.
RDM 88/88. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, p. 92. 73 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 113. 74 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 113. 75 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 113.
22
Na LRE, no entanto, decidiu-se por regime alternativo
preventivo da falência; o procedimento judicial e o procedimento negocial. Em
outras palavras: a concordata foi substituída pela recuperação judicial, enquanto,
concomitantemente, foi restaurada a chamada “concordata branca” ou
“concordata amigável”, ou seja, a recuperação extrajudicial76.
O sistema introduzido pela LRE é marcado pelas seguintes
características77:
� Flexibilização dos procedimentos preventivos; � Ampliação da participação dos credores; � Maior amplitude nas possibilidades de acordo entre credores e
devedor; � Manutenção do privilégio dos créditos trabalhistas e acidentários; � Mitigação da função jurisdicional; � Adoção de novos mecanismos para superação das crises
empresariais; � Simplificação dos procedimentos; e � Reformulação da função administrativa.
Após delinear o breve histórico da recuperação de
empresas, passando pelo histórico da concordata, conceito de recuperação e as
primeiras considerações acerca da LRE, inserido na nova Lei de Falências,
passa-se agora ao enfoque do capítulo seguinte, no qual serão enfocados os
objetivos da Recuperação Judicial, particularizando, pormenorizadamente, os
propósitos deste novo instituto.
76 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 113. 77 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 113.
CAPÍTULO 2
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
2.1 INTRODUÇÃO
A crítica mais freqüente e condizente que sempre se
perpetuou no tocante à concordata preventiva focalizava o particularismo daquela
solução preventiva da falência. A concordata só interessava aos credores
quirografários e ao devedor. O âmbito da concordata era extremamente restrito e
relegava a um plano secundário o verdadeiro significado da empresa, pois se
tratava de uma garantia dos credores78.
A recuperação judicial não se restringe somente à satisfação
dos credores, nem tampouco ao simples saneamento da crise econômico-
financeira em que se encontra a empresa destinatária. Abastece a pretensão de
conservar a fonte produtora e resguarda o emprego, objetivando a realização da
função social da empresa, dês que, consiste em precípuo mandamento
constitucional79.
Por oposição ao caráter liquidatório da falência e, inclusive,
como prevenção desse remédio extremo, a recuperação judicial é uma tentativa
de solução construtiva para a crise econômico-financeira do agente econômico80.
A LRE revela uma disciplina normativa básica da
recuperação judicial: espécies de planos de recuperação, momento da
apresentação da proposta, legitimação para dedução do pleito de reorganização,
conteúdo do plano, parâmetros aferidores da viabilidade da empresa,
78 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 125. 79 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 125. 80 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 125.
24
administração e seus órgãos, e as condições e efeitos da sua efetivação positiva
e negativa81.
2.2 OBJETIVOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
A primeira observação compulsória diz respeito à
generalidade do regramento da recuperação judicial na LRE. O diploma legal
apresenta, tão somente uma normação essencial, deixando imensos espaços e
até autorizando soluções inortodoxas82.
Há, entretanto, determinados mínimos legais que têm por
finalidade impedir determinada categoria de créditos de monopolizar os recursos
do devedor, em detrimento de outras. Também há preocupação em garantir graus
razoáveis de publicidade, proporcionalidade e segurança para os credores. Enfim,
há uma clara preocupação com a eficiência e a celeridade no cumprimento do
plano de recuperação acordado83.
Nesse diapasão, anota Fazzio Júnior84:
“De um lado isso é bom, porque a casuística exterioriza uma gama imensurável de possibilidades de concordância entre credores e devedor. De outro, isso é perigoso, porque as amplas lacunas do texto legal podem oportunizar a eclosão de inúmeras questões sobre a validade e a adequação, ou até mesmo sobre a legalidade de determinados mecanismo de recuperação. Na parte relativa á recuperação judicial, a LRE não é um sistema fechado”.
Ainda, anota Treillard85:
“O objetivo da recuperação passa, é natural, pela maximização das possibilidades dos credores ou, pelo menos, evidencia
81 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 125. 82 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 126. 83 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 126. 84 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 126. 85 TREILLARD, Jacques. Lês procedures colletives de liquidation ou de renflouement dês
entreprises em droit compare. Paris: Econômica, 1976, p. 200.
25
sensível esforço no sentido de que tais rendimentos sejam superiores aos que, eventualmente, aqueles credores receberiam numa falência do devedor. Também inegável horizonte legal à viabilização da empresa devedora, não para proteger seus sócios ou administradores, mas com o fito de conservar os empregos que oferece e continuar produtiva no mercado”.
Indubitavelmente, sempre existirá uma generosa variedade
de concepções acerca da maneira mais efetiva de se obter a recuperação da
empresa devedora. A começar pela iniciativa do processo, pela estimação da
crise que o determina, pelos critérios determinativos do que seja uma empresa
viável e pelo meio mais adequado para a consecução da reestruturação
desejada86.
Há que se deixar claro que os planos de recuperação,
quaisquer que sejam as vias de resgate eleitas, devem ser flexíveis, ou seja,
devem ser mantidas as compatibilidades com as condições do mercado sem
relegar os interesses econômicos que imediatamente incidem sobre a empresa
devedora. A busca da eqüidade entre os interesses dos credores e o atendimento
do interesse público e social é que vai evidenciar o acerto ou desacerto de
determinado plano de recuperação87.
A despeito, ensina Fazzio Júnior88:
(...) por mais que se preconize a especial atenção que se deve conceder à função social da empresa, o fato é que a LRE, contextualmente, prioriza os interesses dos credores. Não se faz e nada se conclui sem a manifestação da assembléia geral de credores. Tudo quanto a lei disponibiliza ao devedor para reestruturação da empresa está afetado por essa preocupação fundamental com a futura solução do passivo. A preservação do crédito não deixa de se alinhar entre as principais metas desse esquema jurídico preventivo da liquidação.
86 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 126. 87 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 127. 88 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 127.
26
A regulamentação legal do plano de recuperação deve ser
vislumbrada sob a ótica de dois aspectos: o macro, das finalidades gerais; o
micro, das metas setoriais e específicas. Sob uma perspectiva geral, a
recuperação judicial tem os precípuos intuitos:
� Reorganizar a empresa em crise financeira; � Preservar as oportunidades de emprego; � Implementar a valorização da massa próxima de insolvência; � Dilatar as possibilidades de negociação para solução de passivo; � Envolver a maior parcela possível de credores e empregados do
devedor; � Fixar os efeitos da desaprovação ou descumprimento do plano; � Regular a conversão da recuperação em falência; � Especificar o conteúdo mínimo e a justificativa do plano; � Fixar mecanismos de alteração do plano; � Estabelecer os limites da supervisão judicial da execução do plano;
e � Regulamentar o elenco de atribuições dos órgãos administrativos
do plano.
Detalhando esses pontos, a LRE disciplina:
� Forma de distribuição dos fundos; � Solução para execução parcial ou integral dos contratos; � Venda dos bens gravados; � Procedimentos de deliberação; � Expedientes de divulgação; � Soluções para créditos impugnados; � Alternativas para resolução das questões pertinentes ao pessoal
da empresa; � Funções executivas reservadas ao administrador judicial; � Condições da constituição do Comitê; � Liquidação dos créditos; � Eventual incidência de juros; � Modificações estruturais para viabilização da empresa; � Hipóteses de suspensão do plano; � Extensão do período de extensão do plano; e
27
� Afetação do plano por normas tributárias, previdenciárias, trabalhistas etc.
2.3 NATUREZA DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Na forma da nova lei, a recuperação judicial é uma ação de
conhecimento da espécie constitutiva, pois consiste na dicção legal, e tem por fim
sanear a situação gerada pela crise econômico-financeira da empresa devedora,
não é mera solução de dívida e encargos, tem em conta a concretização da
função socioeconômica da empresa em todos os seus aspectos89.
Como em toda ação, o autor postula do órgão judiciário o
deferimento de uma pretensão. Aqui, é a de pôr em prática um plano de
reorganização da empresa. Busca em favor legal que a lei atribui ao Poder
Judiciário o poder de concessão. Como existe a previsão legal de uma
recuperação extrajudicial, pode parecer, à primeira vista, que o devedor deveria
trilhar, primeiro, este caminho, para só depois, resistida sua pretensão,
evidenciar-se o interesse de agir na esfera judicial90.
Todavia, não é assim. A lei não reclama do devedor uma
pretensão efetivamente resistida para justificar seu apelo ao Poder Judiciário.
Coloca à sua disposição os dois caminhos, sem necessidade de exaustão do
primeiro para adoção do segundo91.
Neste sentido, disserta Fazzio Júnior92:
“Na verdade, o que o devedor postula, na recuperação judicial, é um tratamento especial, justificável, para remover a crise econômico-financeira de que padece. É bom observar que se trata de uma solução anormal, anômala de obrigações, permitida pelo sistema jurídico, para uma situação também anormal. Nesse
89 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 128. 90 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 128 91 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 128. 92 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 129.
28
ponto, a LRE não se afastou do mecanismo preventivo da revogada lei de falências. Também é um favor legal concedido pela via judiciária, ou no mínimo que tem como condição de validade um provimento jurisdicional. (...)
Insista-se que a ação constitutiva de recuperação judicial na é apenas uma via de saneamento da empresa. Fosse somente um artifício de recuperação do devedor e nenhuma novidade traria ao sistema jurídico. O saneamento ou debelação da crise em questão deve preservar a empresa. Não se cuida de proteger a empresa pagadora, mas conceder-lhe sobrevida como unidade econômica”.
Na ação de recuperação judicial o objeto mediato é a
salvação da atividade empresarial em risco e o objeto imediato é a satisfação,
ainda que impontual, dos credores, dos empregados, do Poder Público e,
também, dos consumidores. Não é mera declaração de reconhecimento de uma
situação de crise que o Direito considera relevante93.
Acerca da viabilidade, ensina Wanderlei Pintos de
Medeiros94:
Para melhor compreensão da matéria, cumpre examinar o que se deve entender por crise econômico-financeira e, em seguida, o diagnóstico de viabilidade da empresa que se pretende recuperar. Essas são as duas colunas da recuperação judicial: crise econômico-financeira da empresa e viabilidade. Juntando-as, tem-se que, simplesmente, a ação constitutiva do estado de recuperação judicial tem por finalidade debelar uma crise econômico-financeira que coloca em risco uma empresa viável.
Há que ser manifestado, no entanto, que a ação de
recuperação judicial é medida de prevenção. Não tem, portanto, o escopo de
93 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 129. 94 MEDEIROS, Wanderlei Pinto de. A insolvência das empresas brasileiras e o papel dos bancos
de. RDM 72/48. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988.
29
ressurreição. Dirige-se a empresas viáveis, por isso mesmo, a LRE não
contempla modalidade de recuperação suspensiva da falência95.
2.4 CRISE ECONÔMICO-FINANCEIRA
O regime jurídico de insolvência, apresentado pela LRE,
assenta-se na crise econômico-financeira da empresa. É um sistema concursal
cuja estrutura revela um complexo de normas protectivas da higidez empresarial e
um conjunto de regras regulamentadoras de sua extinção quando inviável96.
A LRE, entretanto, não define o que chama de crise
econômico-financeira. E faz muito bem, pois não cabe à legislação atribuir
expressões de definição. Declina seus elementos e, nesse esforço, desperta
algumas objeções práticas e conceituais. Mistura aleatoriamente noções diversas
ou pelo menos estágios diversos de uma determinada conjuntura patrimonial
negativa97.
Assim, explica Fazzio Júnior98:
“Isso nos leva à necessidade de abordar duas questões: a identificação ou não da crise econômico-financeira como um estado de insolvência e a eventual distinção entre crise econômica e crise financeira. Há autores que fazem distinção entre crise econômico-financeira e insolvência. Aludem à primeira como percalços econômicos e financeiros de caráter geral. Referem-se à insolvência como sinônima de suspensão de pagamentos. Para essa corrente, a distinção entre os conceitos apontados reside na maior gravidade da insolvência. Esta, com efeito, revela uma impotência patrimonial. Já as dificuldades econômico-financeiras são episódicas e, frequentemente, removíveis. A diferença, portanto, se revelaria pela insuperabilidade da insolvência”.
95 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 129. 96 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 130. 97 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 131. 98 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 131.
30
A situação de desordem orgânica, que expõe em risco a
empresa, também é objeto de distinção muito sutil a partir de suas causas
“endógenas e exógenas”. Há, entretanto, o pensamento de que a crise
econômico-financeira seria um estágio antecedente à insolvência.
De outro norte de compreensão, não se vislumbram
diferenças entre as duas noções e também se entende que a questão é
desprovida de relevância prática. Assim, ensinando que tanto uma como outra
significam a mesma coisa, acabam concluindo que a empresa em dificuldades
econômico-financeiras, cujos sintomas se materializam no descumprimento de
seus encargos, internos e externos, dificilmente mantém seus pagamentos em
dia99.
A lei incumbe a recuperação judicial ao saneamento da
situação de crise econômico-financeira do devedor. Depois reputa devedor em
estado de crise econômico-financeira “aquele sujeito a dificuldades temporárias
do seu negócio, com iliquidez, insolvência ou em situação patrimonial a merecer
readequação planejada de sua atividade” 100.
Nas palavras, Fazzio Júnior explica que101:
É claro que há situações transitórias, situações de iliquidez, conjuntura patrimonial negativa e situação patrimonial justificadora de reestruturação da atividade. Dependendo do momento em que se enfoca a empresa, poderão ser apanhados esses diversos estágios. Para os efeitos legais, em qualquer dessas fases, o devedor poderá intentar o soerguimento da empresa, sempre carecendo da participação ou, pelo menos, da anuência de seus credores.
A própria LRE utiliza a expressão crise econômico-
financeira, certa de que, na maioria dos casos, o econômico e o financeiro
declinam em conjunto. As diferenças entre situação econômica e situação
99 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 133. 100 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 133. 101 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 133.
31
financeira são muito frágeis e de interesse técnico particular da empresa. São,
entretanto, modalidades de crise econômico-financeira102:
� Iliquidez; � Insolvência; e � Situação patrimonial dependente de readequação.
O risco de liquidez é um aspecto normal concernente à
gestão empresarial. Faz parte de seu cotidiano. Empresa é risco iminente. A
iliquidez, portanto, surge de causas identificadas com o passivo e o ativo da
empresa. E ocorre geralmente, quando as dívidas da empresa são de
exigibilidade imediata, ou seja, quando os titulares dos passivos intentam a
recepção pronta de seus haveres. A premência de satisfazer ao passivo força o
devedor a fazer caixa, seja captando fundos, seja liquidando ativos103.
Anota Fazzio Júnior104:
A insolvência em sentido estrito ultrapassa o âmbito meramente financeiro; é patrimonial. Representa estágio negativo mais grave, quando os ativos do devedor são insuficientes para solucionar seus passivos. É a situação de inferioridade do patrimônio líquido, exteriorizando saldo negativo, em vez de saldo positivo. Ilíquido, portanto, é o patrimônio não realizável de pronto: caracteriza crise econômico-financeira; caracteriza dificuldade temporária dos negócios. Insolvente é o patrimônio insuficiente em relação aos débitos que deve enfrentar: é patrimônio negativo, irrecuperável, falido.
Numa recuperação, a falta de planejamento da liquidez é o
que se denota. Esse é um elemento necessário para prever e prover questões de
liquidez. Impele ao administrador adotar medidas oportunas para a captação de
recursos, bem antes da pauta de vencimentos de seu passivo. A iliquidez insere-
se, no universo jurídico obrigacional, pelo seu efeito: a impontualidade, atestada
102 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 134. 103 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 134. 104 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 135.
32
ou não por protesto de títulos, alude a chamada “crise de caixa”, pois é uma
conjuntura em que o devedor solvente não consegue solver com pontualidade.
2.5 DAS CAUSAS SUSCETÍVEIS DE RECUPERAÇÃO
Recuperar a empresa para não liquidá-la: este é o primeiro
intuito. Só se deve liquidar a empresa insuscetível de recuperação. A
impontualidade e a cessação do adimplemento obrigacional não estão na
etiologia do problema. São, portanto, a exteriorização. Na doutrina jurídica
empresarial, não são poucos os autores que alinham diversas causas explicativas
das dificuldades empresariais que podem conduzir à recuperação ou à liquidação,
quais sejam105:
� A diminuição da oferta de crédito bancário ou a elevação do preço para sua obtenção;
� A liberação ou a facilitação de importações que concorrem com os produtos nativos;
� As transformações repentinas das políticas econômicas e governamentais nos setores cambial, fiscal e creditício;
� A geração de novos encargos tributários ou a implementação de cargas maiores;
� A retratação dos recursos monetários no mercado; � A crescente eclosão de novos produtos no mercado internacional; � A queda das cotações de produtos no mercado internacional; � A elevação das taxas de juros; � A desvalorização monetária corretiva; � A insolvabilidade dos devedores; � A inadimplência dos diversos níveis da administração pública; � As crises político-institucionais e sociais; � Corrupção; � Desenvolvimento tecnológico; � Elevada incidência de despesas trabalhistas e sociais; � Insolvência de clientes e fornecedores; � Desapropriações;
105 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 137.
33
� Quebra unilateral de contratos; � Concorrência de produtos importados com preços inferiores; � Fechamento de mercado; e � Elevação da competitividade na globalização.
No tocante as causas adstritas às próprias condições da
empresa, importante colacionar:
� A insuficiência de capital; � A redução da produtividade; � A estimação equivocada das aptidões do mercado; � A falta de mão de obra qualificada; � A inaptidão administrativa; � As dissensões internas; � As operações ruinosas; � A idade da empresa; � As deficiências de estruturação jurídica; � O caráter familiar da empresa; � A prática de ilícitos pelos administradores de empresas; e � A realização de investimentos de retorno mediato.
A negativização da empresa oferece diversas etapas. A
recuperação judicial é a medida que visa curar empresas em estágios tais
chamados sem retorno. É a medida processual indicada para um marco em que o
empresário devedor ainda tem tempo para solucionar suas dificuldades
financeiras. O inadimplemento dos pagamentos pela própria impossibilidade de
quitação, de natureza patrimonial e não apenas financeira, é causa de falência. A
iminência dessa situação, se a empresa for viável, é causa de recuperação106.
106 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 138.
34
2.6 DESVIO DE FINALIDADE
O desvio de finalidade, como inúmeras outras práticas
evasivas, já aconteceu bastante, quando vigorava o sistema de concordatas.
Consiste, portanto, no uso indevido ou abuso do direito à recuperação.
Fazzio Júnior107 ensina pormenorizadamente esta prática:
“(...) Pode suceder que o empresário peça a abertura do processo de recuperação, sem que esteja, realmente, em face de dificuldades financeiras que justifiquem essa medida extrema. Seria a utilização da ação de recuperação, com o fim de reorganizar a atividade empresarial, descartando algumas obrigações onerosas que demandam impontualidade ou, até mesmo, com o intuito de esquivar-se do pronto atendimento de obrigações trabalhistas. Não é impossível que isso aconteça. A maior ou menor possibilidade de risco de que um empresário subverta o instituto da recuperação judicial dependerá, mais do que expressas previsões legais, dos critérios utilizados pelo órgão judiciário ou pela assembléia de credores no exame dos pressupostos e condições da ação de recuperação. A análise cuidadosa do interesse de agir é um bom caminho para contornar esse tipo de abuso”.
Evitar a subversão da recuperação judicial envolve uma
análise acautelada do plano de recuperação, das margens de controle sobre os
negócios que incumbirão ao devedor e da correta imposição de sanções para as
tentativas abusivas. Não se pode postergar a própria responsabilização do
devedor por plano de recuperação rejeitado, se por ventura, evidenciar-se a má-fé
da propositura108.
Esse e diversos outros problemas de ocorrência natural pela
incipiência do instituto de recuperação, no sistema brasileiro, podem ser
107 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 138. 108 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 138.
35
enfrentados sob a ótica de um preciso diagnóstico da viabilidade da empresa e
seu paralelo com os fins sociais da empresa109.
Em todas as modalidades autorizadoras da recuperação,
tanto as corretivas como as preventivas, há que ser plenamente demonstrada a
viabilidade do empreendimento, pois tal medida veste-se na constatação de que a
empresa está mal, mas tem plenas condições de ficar bem; que disfunciona ou
mal funciona, mas, se for replanejada e devidamente reestruturada, poderá vir a
funcionar adequadamente110.
2.7 VIABILIDADE DA EMPRESA
Existem particularidades objetivas para aquilatar-se a
viabilidade de recuperação empresarial. Consistem nos verdadeiros
pressupostos, embora não declarados expressamente, da ação de recuperação
judicial, fatores que precisam estar presentes para que a recuperação seja
recomendável111:
� Importância social e econômica da atividade do devedor no contexto local, regional ou nacional;
� Mão-de-obra e tecnologia empregadas; � Volume do ativo e do passivo; � Tempo de constituição e funcionamento do negócio; e � Faturamento anual e nível de endividamento da empresa.
O aludido rol, não é simplesmente enumerativo, seus
elementos se integram. Exemplificando: de nada adianta demonstrar a relevância
socioeconômica regional da atividade do devedor, se a desarmonia entre ativo e
109 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 138-139. 110 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 139. 111 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 139.
36
passivo, bem como o ínfimo faturamento anual, inviabilizam o funcionamento da
empresa112.
Nesse diapasão, tem pertinência colocar em destaque o
ensinamento de Paulo Salvador Frontini113, quando diz que:
“(....) é justamente a expressão sócio-econômica de certas empresas que, imprimindo-lhes verdadeiro caráter público ou de interesse público, justifica a continuação de sua atividade. Chega-se, por via desse raciocínio, ao cerne da moderna teoria da empresa, que reconhece suas responsabilidades e deveres perante a coletividade e como que a emancipa de seus proprietários, dissociando a empresa do empresário”.
Outro ponto a se levar em conta, diz respeito ao maior grau
de intensidade de alguns daqueles pressupostos, isto é, do volume do ativo e do
passivo, e da relação entre faturamento anual e nível de endividamento. Sendo
que os demais fatores são exatamente determinativos das verdadeiras condições
da empresa. Para se constatar se um empresário ou sociedade empresária é
viável, é suscetível de recuperação, não é suficiente a satisfação isolada de
antecedentes meramente formais114.
2.8 EXTENSÃO DOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO
Pela redação do texto do art. 49, submetem-se aos efeitos
da recuperação judicial todos os credores anteriores ao pedido, senão vejamos:
“Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos”.
No plano judicial de recuperação da empresa, o pedido é
dirigido ao juiz e sua adoção ou não, depende, em última análise, do provimento
judiciário.
112 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 139. 113 FRONTINI, Paulo Salvador. O caso da falência de Sanderson e as tendências atuais do Direito
Falimentar. RDM 15/247. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974. 114 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 140.
37
Todavia, a legislação oportuniza a negociação do plano, por
meio do expediente da impugnação e posterior conciliação dos interesses em
litígio. Todas as possibilidades de aprovação do plano de recuperação verificam-
se sob a supervisão jurisdicional.
Acerca da desjudicialização, leciona Fazzio Júnior115:
O sistema acolhido, no Brasil, é o judicial. O princípio constitucional do controle judiciário tem plena incidência. Basta dizer que até mesmo a recuperação extrajudicial é suscetível de homologação em juízo. Por isso, de nada adianta alardear uma onírica desjudicialização. A aprovação judicial, normalmente, está condicionada a que se cumpram requisitos legais de natureza formal e material. É importante que o juízo fique seguro da legalidade e da conveniência das medidas propostas, ou seja, que possa vislumbrar uma perspectiva de resultados positivos, para todos os envolvidos, com base nos dados ofertados pelo devedor, verificados pelos credores e, se for o caso, periciados. O mínimo que se espera de um plano de recuperação judicial é que, conservando a empresa em atividade, assegure aos credores a recepção de valores, no mínimo, equivalentes ao que receberiam em caso de falência do devedor.
No § 1º, do art. 49, é assegurado aos credores a
conservação de seus direitos em relação aos coobrigados, fiadores e obrigados
de regresso. Significa que os credores não se encontram, pelo fato da
recuperação, impossibilitados de promover a execução de seus créditos contra
avalistas, endossantes e fiadores do devedor116.
Nos casos de vencimento antecipado, é salutar destacar: a
obrigação não se torna exigível de pronto daqueles devedores subsidiários ou
acessórios, somente em face ao devedor, cuja recuperação se processa.
No caso no § 2º, é explícita a regra que autoriza a incidência
de encargos sobre os débitos objetivados no plano de recuperação. Recairão
115 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 140-141. 116 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 141.
38
sobre o valor nominal de cada prestação, devendo, por óbvio, estar contemplados
no plano e serão contados a partir do ajuizamento da ação de recuperação
judicial.
O § 3º do art. 49 prevê situações anômalas relativas aos
seguintes credores:
� Proprietário-fiduciário; � Arrendador mercantil; � Proprietário de fração ideal de imóvel com cláusula de
irrevogabilidade ou irretratabilidade; e � Compromissário comprador de fração ideal de imóvel com aquelas
cláusulas.
Em todos os casos, prevalecerão os direitos procedentes de
tais condições, portanto, os direitos de propriedade sobre a coisa. Claro que o
plano de recuperação judicial poderá prever outras condições para o cumprimento
dos respectivos contratos117.
No tocante a alienação fiduciária, proposta a recuperação
judicial ou decretada a falência, não será mais possível propor ação de depósito,
porque o administrador da empresa falida perdeu o poder de dispor dos bens
sociais, arrecadados pelo administrador judicial que também não pode ser
compelido sob pena de prisão. A ação de depósito é incompatível com o regime
falimentar. Em se tratando de recuperação judicial, prevalecem as condições
contratuais de origem, solução esta que não dever ser afastada, para substituir a
busca e apreensão da coisa, é o pedido de restituição118.
Em referência às multas contratuais e às penas pecuniárias
por infração às leis penais e administrativas, importante frisar que não se tornam
inexigíveis. A recuperação judicial não é um veículo de isenção de
responsabilidades pela inobservância de contratos ou da legislação. Intenta,
portanto, recuperar a empresa, todavia não consiste em instrumento para
117 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 141. 118 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 142.
39
inadimplemento obrigacional ou lesionamento de credores de boa-fé. O plano de
recuperação pode, é claro, prever a exclusão das multas, mas sua aprovação
está vinculada à deliberação da assembléia geral de credores119.
2.9 OS MEIOS E PERSPECTIVAS DE RECUPERAÇÃO
No regime jurídico de insolvência do Decreto-lei nº. 7.661/45,
ao empresário só se dava a opção da concordata preventiva, ou seja, só havia
duas possibilidades: obter o perdão parcial de encargos ou dilatar prazos de
pagamento. Agora, a LRE alinha várias possibilidades de recuperação judicial da
empresa120.
Antes de adentrar no mérito, não se pode olvidar que as
modalidades de recuperação alvitradas não são excludentes umas das outras. A
relação entre elas é de interação, na medida em que podem ser combinadas duas
ou mais modalidades, conforme o caso e desde que compatíveis121.
O Artigo 50 é extremamente generoso. Congrega
reformulações administrativas, sucedâneos da concordata preventiva, contratos,
formas de solução obrigacional, modificações societárias estruturais, alienação do
ativo, usufruto empresarial, administração compartilhada, emissão de valores
mobiliários e outros, deixando bem clara a intenção de permitir a credores e
devedores que utilizem sua liberdade de contratar, embora sob parâmetros
técnicos e jurisdicionais122.
Cada um dos meios de recuperação relacionados no
dispositivo em epígrafe é bastante para justificar um livro a esse respeito. Com
efeito, as soluções de resgate empresarial postas na LRE são objetos de análise
em quase todos os compêndios de Direito Comercial. Por isso, nos delgados
119 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 142. 120 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 142. 121 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 142. 122 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 142.
40
limites deste trabalho, voltado para o estudo do regime de insolvência, não cabem
considerações verticais sobre esses institutos123.
São meios legais de recuperação judicial124:
� Concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;
� Cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de quotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;
� Alteração do controle societário; � Substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou
modificação de seus órgãos administrativos; � Concessão aos credores de direito de eleição separadamente de
administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;
� Aumento de capital social; � Trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à
sociedade constituída pelos próprios empregados; � Redução salarial, compensação de horários e redução da jornada,
mediante acordo ou convenção coletiva; � Dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou
sem constituição de garantia própria ou de terceiro; � Constituição de sociedade de credores; � Venda parcial dos bens; � Equalização de encargos financeiros relativos a débitos de
qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;
� Usufruto da empresa; � Administração compartilhada; � Emissão de valores mobiliários; e � Constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar,
em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.
123 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 143. 124 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 143.
41
A primeira forma de recuperação empresarial e, certamente,
a mais comum, refere-se à concessão de prazos e condições especiais para a
solução de débitos vencidos. Trata-se de alternativa que traduz concordata, com
a diferença de não estipular valores e prazos mínimos. O legislador optou
abandonar os rígidos parâmetros de pagamento parcelado, estipulados na antiga
concordata. Em cada caso, observadas as peculiaridades da empresa, de sua
conjuntura econômica e da natureza dos créditos, ao juiz assistirá deferir ou não a
concessão de prazos e valores que, ensejando a efetiva recuperação do devedor,
não maculem os direitos dos credores concorrentes, mais do que seriam
prejudicados, em caso de liquidação125.
Nada obsta que se realize um acordo extrajudicial, mediante
negociação entre o devedor e os credores, limitando-se o juiz à homologação
daquilo que os interessados pactuaram. E como a LRE não estatui o número e o
valor dos pagamentos, bem como nenhum vencimento para as parcelas, o
devedor e os credores podem ajustar-se, livremente, desde que de acordo com a
lei, não existem, portanto, mais as algemas dos prazos fatais da concordata
preventiva126.
Acerca do plano de recuperação, ensina Fazzio Júnior127:
“Requerido ao juiz o deferimento de plano de recuperação consistente em singela dilação de pagamentos, certamente os credores terão aptidão para impugnar o que afrontar seus interesses ou, mesmo, a lei. No mesmo dispositivo, a LRE contempla a possibilidade de moratória para débitos que se vencerem antecipadamente, por força do pedido de recuperação judicial. É que, uma vez deferido o pedido de processamento da recuperação judicial, consideram-se vencidos os débitos do empresário postulante. O parcelamento de seu passivo, é óbvio, pretenderá envolver, também, tais compromissos. Quanto ás
125 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 144. 126 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 144. 127 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 144.
42
modificações societárias de estrutura, a LRE prevê a concentração e a desconcentração de empresas, como opção de recuperação. Compreende os contratos intersocietários conhecidos como incorporação, fusão e cisão, que podem envolver sociedades empresárias de tipos iguais ou diferentes”.
Evidentemente que tais possibilidades dependem sempre de
pré-aprovação pelas sociedades participantes da operação. O procedimento
deliberativo interno de cada uma deve observar as normas contratuais pertinentes
à alteração dos estatutos ou dos contratos, conforme se trate de sociedades por
ações ou não. Em outras palavras, a formatação das modificações estruturais das
sociedades partícipes pressupõe procedimentos formais prévios128.
As três modalidades cogitadas observarão as seguintes
normas gerais129:
� Nas operações em que houver criação de sociedade, serão observadas as normas sobre a constituição do tipo societário eleito;
� Não poderão se concretizar se os valores patrimoniais líquidos a serem vertidos para a formação do capital social forem inferiores ao montante do capital a realizar (art. 226 da LSA);
� As operações de incorporação, fusão e cisão serão submetidas à deliberação da assembléia geral das companhias interessadas; e
� Sempre será garantido ao acionista dissidente o direito de recesso, mediante o reembolso do valor atualizado de suas ações, nos termos do art. 137 da LSA.
Todas as condições da operação escolhida como solução
recuperatória, deverão integrar o protocolo, projeto de contrato firmado entre as
sociedades envolvidas130:
128 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 144. 129 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 145. 130 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 145.
43
� Número, espécie e classe das ações que serão atribuídas, em substituição aos direitos dos sócios, que se extinguirão, bem como os critérios utilizados para determinar as relações de substituição;
� Os elementos ativos e passivos que formarão cada parcela do patrimônio, no caso de cisão;
� Os critérios de avaliação do patrimônio líquido; � A data a que será referida a avaliação; � O tratamento das variações patrimoniais posteriores; � A solução para as ações ou quotas do capital de uma das
sociedades possuídas por outra; � O valor do capital das sociedades a serem criadas ou do aumento
ou redução do capital das sociedades que forem parte na operação;
� O projeto ou projetos de estatuto, ou de alterações estatutárias, que deverão ser aprovados para efetivar a operação; e
� Todas as demais condições a que estiver sujeita a operação.
Deve ser apresentada à assembléia geral a devida
justificação, pela administração, pois se trata da exposição de motivos da
operação e evidenciará o interesse da companhia na sua materialização, bem
como ações a que farão jus os acionistas preferenciais e as razões para a
eventual modificação de seus estatutos. Idem quanto à composição do capital das
companhias que vão emitir ações substitutivas das que se extinguirão, segundo
classes e espécies de ações, e o valor pelo qual serão reembolsados os
acionistas dissidentes que exercerem o recesso131.
Protocolo e justificação são essenciais para a apreciação
judicial do pedido de recuperação consistente em contrato intersocietário. Algo
deve ser dito em relação a cada uma das modalidades previstas no inciso. A
incorporação, portanto, significa a operação pela qual a sociedade é absorvida
por outra, que lhe sucede em todos os direitos e obrigações. Implica a dissolução
da sociedade empresária absorvida e, em conseqüência, o aumento de capital da
sociedade incorporadora. Caracteriza-se, pois132:
131 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 145. 132 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 146.
44
� Pela versão global do patrimônio (todos os direitos e obrigações); � Pela participação dos acionistas ou sócios das incorporadas na
sociedade incorporadora; e � Pela extinção da sociedade incorporada absorvida pela
incorporadora.
Acerca da fusão e cisão, ensina Fazzio Júnior133:
“A fusão é a união de duas ou mais sociedades que se extinguem, dando lugar à criação de uma nova, que as sucede em todos os direitos e obrigações. É, simultaneamente, modo de extinção e forma de constituição, porque as sociedades participantes da operação desaparecem, nascendo outra. É o que a doutrina em geral costuma a denominar “efeito extintivo-associativo” resultante da fusão. Já, sob a epígrafe cisão, designa-se a desconcentração empresarial, ou seja, tanto a cisão propriamente dita (desdobramento de sociedade existente em outras que lhe sucedem) como a cisão parcial, isto é, a transferência de parte do patrimônio de uma sociedade a outra ou outras já existentes”.
Sob á ótica de perspectivas, na LRE não é possível prever
com absoluta segurança que a recuperação judicial será muito mais positiva que
a concordata preventiva bem proposta e bem conduzida. No entanto, não é
apenas uma nova lei, plena de boas intenções e cercada de todas as cautelas,
que proporcionará o antídoto para as crises econômico-financeiras que colocam
em xeque o mercado e, por extensão, a sociedade134.
Existem diversos outros elementos de índole variada a
serem considerados, dos quais ressaltam e merecem menção compulsória a
mentalidade empresarial ancorada ao imediatismo de soluções proveitosas e a
inexperiência de magistrados, promotores de justiça e advogados em relação às
diversas alternativas sugeridas pelo novo instituto. Cumpre, ainda, citar que
inexistem cursos de formação de administradores judiciais e são igualmente nulas
as experiências de assembléias de credores, classificados pela índole dos
133 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 146. 134 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 151.
45
respectivos créditos, como autênticos árbitros da concessão ou não da
providência recuperatória135.
A ausência desses pressupostos materiais e humanos,
capazes de sustentar procedimentos complexos, onde a divergência de
interesses deve ser substituída pela convergência de objetivos centrados no
soerguimento da empresa, colocam inafastáveis interrogações sobre as
possibilidades de recuperações judiciais que performizem quadros mais propícios
à manutenção de um mercado regular assentado sobre a base da estabilidade
creditícia136.
Indubitavelmente, os processos de recuperação judicial
devem atender às necessidades do mercado e às expectativas da comunidade
empresarial, no sentido de assegurar certeza, previsibilidade, estabilidade
mercantil, eficiente solução dos negócios da empresa em crise e tratamento
eqüitativo dos credores – tudo isso sem perder de vista a transparência
procedimental e a proteção do segmento laboral137.
A busca de efetividade não deve se circunscrever aos
interesses econômicos envolvidos no regime concursal mas, sobretudo, ensejar
condições seguras de negocial de créditos, proporcionar estrutura protectiva tanto
para o devedor como para os credores públicos e privados, assegurar um mínimo
de garantia contra abusos e manipulações. Salvo melhor juízo, as expectativas
otimistas só se justificam se animadas pelo construtivismo empresarial, pelo
aprimoramento da estrutura jurisdicional e pela interpretação da jurisprudência
flexível do novo aparato legislativo que ingressa na ordem jurídica nacional138.
Dessa forma, encerra-se o segundo capítulo desta
monografia que enfocou, basicamente, a Recuperação Judicial, linhas gerais,
causas, meios, viabilidades, crises que ensejarão a recuperação. No terceiro e
último capítulo procederemos analisar todo o processo de Recuperação Judicial.
135 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 151. 136 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 151. 137 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas. p. 152. 138 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas., p. 152
46
Finalmente, será explicitada a prática do novo procedimento, as nuances e
peculiaridades que envolvem este novo instituto incluído na LRE.
CAPÍTULO 3
O PROCESSO DE RECUPERÇÃO JUDICIAL
3.1 FASES DA RECUPERAÇÃO E IMPEDIMENTOS
O processo de recuperação judicial se desenvolve em duas
etapas:
� fase de processamento; e � fase de execução do plano.
O marco divisório entre as duas fases é a decisão
interlocutória que defere o pedido.
A ação constitutiva de recuperação judicial nasce da
iniciativa do devedor. A LRE só prevê a abertura do processo de recuperação
judicial por iniciativa do devedor. Portanto, segue a mesma sistemática que era
adotada na LFC, onde a concordata era um favor legal adquirido pelo devedor.
A LRE não relaciona, expressamente, impedimentos para
obtenção da recuperação judicial. Todavia, a falta de qualquer requisito exigido no
art. 48 impede a concessão da recuperação judicial ao devedor. São fatores que
podem impedir a concessão do benefício:
� falta de inscrição no registro competente; � falta de registro a mais de 2 (dois) anos; � falência sem extinção das obrigações; � recuperação judicial anterior a menos de 5 (cinco) anos; e � condenação criminal.
No caso da microempresa e de empresa de pequeno porte,
o impedimento relativo à obtenção da recuperação judicial em relação a pleito
anterior alcança 8 (oito) anos, quando realizada mediante plano especial, (Art. 48,
48
III). Os favores legais são sempre condicionados ao aperfeiçoamento de
requisitos. Se a recuperação judicial se enquadra nessa categoria, como situação
adventícia de uma prestação jurisdicional, não é qualquer empresário em crise
econômica – financeira que pode dela usufruir. A outorga do favor legal é,
expressamente, vinculada à inexistência de circunstâncias obstativas139.
Fazzio Júnior, sobre os impedimentos, explicita seus
apontamentos:
“(....) Pondere-se que o órgão judiciário, ao examinar o pedido de recuperação judicial, deve considerar que, se o devedor não esta em curso em nenhum dos casos de impedimento e, tratando-se de plano exeqüível para a empresa viável, o deferimento do favor legal deve ser a regra. Até porque, o postulante pode ser apenas vitima de uma conjuntura desfavorável, sem qualquer eiva de má-fé na sua postulação. O empresário irregular, ou seja, sem inscrição no registro empresarial, não pode obter recuperação extrajudicial. Também assim,o falido cujas obrigações não estejam extintas. A recuperação judicial é favor legal e, como tal, não pode homenagear a irregularidade. Os mesmos impedimentos fixados na LRE para a recuperação judicial aplicam-se à recuperação extrajudicial. Afinal de contas, o plano de recuperação extrajudicial deve ser homologado pelo órgão judiciário. Judicializa-se. Não tem o menor sentindo permitir-se que o agente econômico impedido de obter recuperação judicial possa contornar o óbice legal, fazendo-o pela via extrajudicial e, posteriormente, obtendo o reconhecimento jurisdicional da homologação. entendimento diverso leva, praticamente, à inocuidade os impedimentos do art. 48 da LRE”.
A recuperação é um instituto único, que admite, no entanto,
duas variantes na fase de formulação do plano de recuperação, mas que
convergem e oficializam-se mediante sentença judicial, os dispositivos da LRE
139 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 155.
49
pertinentes à recuperação não podem ser lidos isoladamente, senão fecha-se
uma porta, mas deixa-se aberta a porta dos fundos140.
3.1.1 Irregularidade profissional
Se, para os credores, pouco importa se o devedor é
empresa regular ou não, porque o que lhes interessa é a recepção de seus
créditos, para o direito não é assim. Na medida em que se anuncia a recuperação
judicial como uma espécie de privilegio da lei, é natural que seja reservada
somente para os que se conduzem conforme a lei141.
Por isso, só o “empresário de direito pode obter recuperação
personificada faz jus ao beneficio. É fato que para a definição do destinatário da
falência, a qualidade de agente econômico resulta da mera prática profissional.
Tal não ocorre com a recuperação judicial. A demonstração do exercício regular é
essencial. Só poderá desfrutar da recuperação judicial o agente econômico
personalizado, quer dizer, devidamente inscrito no registro oficial competente, há
mais de 2 (dois) anos142.
A prova do exercício regular da atividade econômica há mais
de 2 (dois) anos de ser feita por meio de certidão da Junta Comercial do Estado
onde se situa a empresa.
3.1.2 Recuperação judicial anterior
Se o devedor obteve recuperação judicial, há menos de
cinco anos, está legalmente impedido de reiterar a medida.
Acerca do interstício legal, explicita Fazzio Júnior143:
140 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 156. 141 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 156. 142 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 156. 143 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 157.
50
“Numa figura vulgar, o agente econômico só pode ficar “doente” uma vez; se adoecer, novamente, está condenado à morte empresarial, ou seja, à falência. Com toda vênia, não é justo submeter os credores ao martírio incerto da falência, somente porque o devedor já obteve e cumpriu a recuperação judicial anterior ao qüinqüênio, seja um direito do agente econômico, seja um favor legal, o fato de ter cumprido a anterior proposta de recuperação não o recomenda, em vez de estigmatizá-lo? Conquanto o fito legal seja o de impedir que os agentes econômicos sobrevivam às expensas de sucessivas recuperações, não há como negar que aquele que já cumpriu, com exação, proposta anterior, no lapso qüinqüenal, além de ter evidenciado sua honestidade, não estando livre de ser, novamente, premido por conjuntura financeira desfavorável que nem sempre poderá ser debitada à sua eventual má gestão da empresa”.
O descumprimento de recuperação judicial anterior, a
qualquer tempo, incompatibiliza o agente econômico com nova proposta de
recuperação judicial, salvo se, tendo falido, logrou cumprir suas obrigações e não
se encontra inabilitado. O que poderia ser um obstáculo para a recuperação
judicial seria a inabilitação falimentar derivada do descumprimento de
recuperação judicial anterior144.
3.1.3 Condenação criminal
O último impedimento contemplado no art. 48 é a
condenação criminal por crime falimentar. Obviamente a lei não está se referindo
à sociedade empresaria, já que esta, como pessoa jurídica, não pratica crimes
falimentares. O legislador alude ao empresário individual, ao administrador ou ao
sócio controlador de empresa145.
Segundo a lei, só a condenação por crime falimentar (crimes
previstos nesta lei) inabilita o agente econômico para a obtenção de recuperação
judicial. No entanto, crimes patrimoniais (estelionato, apropriação indébita etc)
144 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 157. 145 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 158.
51
contra fé pública (falsidade ideológica etc), contra administração (contrabando,
descaminho etc), contra a ordem econômica, contra a propriedade industrial,
contra a lei de licitações, não impedem o empresário devedor de obter
recuperação judicial. Parece incrível, mas estelionatários, falsificadores,
peculatários e contrabandistas, por exemplo, podem ser agraciados com a
recuperação judicial se suas empresas ou empresas que dirigem entrarem em
crise econômico – financeira146.
O art. 64 da LRE, é taxativo ao não permitir que a condução
da atividade empresarial, durante o procedimento de recuperação judicial, fique
em mãos do devedor ou seus administradores que houverem sido autores de
crimes falimentares, contra o patrimônio, a economia popular ou a ordem
econômica. Assim promove clara distinção entre empresa e o devedor ou seus
administradores. De qualquer forma, ainda que não venham a ser os gestores da
empresa durante o procedimento de recuperação, esta poderá ocorrer, mesmo
que tenham sido condenados por aqueles delitos147.
Extinta a punibilidade do crime falimentar, o impedimento
para a obtenção da recuperação judicial desaparece. Para deixar claro, o devedor
condenado por crime falimentar, enquanto não extinta sua punibilidade, não pode
propor a recuperação judicial de sua empresa. Se condenado pelos delitos
previstos no art. 64, inciso I da LRE, pode obter a recuperação, mas tanto o
devedor como seus administradores serão desalojados da direção da empresa148.
3.2 O PEDIDO DE RECUPERAÇÃO
A recuperação judicial é de iniciativa exclusiva do devedor,
não comportando sua deflagração a pedido de qualquer credor. Em princípio,
considerando que os interessados imediatos na recuperação do devedor são seus
146 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 158. 147 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 158. 148 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 158.
52
credores, o êxito de um esquema de reorganização empresarial seria mais
provável se deles emanasse o processo149.
De fato, o legislador poderia abreviar a etapa inicial de
discussão sobre o melhor plano de recuperação ou o mais adequado no caso
concreto, entretanto, isso não seria tão simples. O plano de recuperação ideal
alvitrado por um determinado credor poderia não corresponder às expectativas
dos demais credores. Poderia não haver consenso a respeito e, assim, a
definição do melhor plano acabaria demandando as mesmas dificuldades
encontradas na ação proposta pelo devedor150.
Se a ação de recuperação judicial pudesse, no entanto, ser
proposta por um conjunto significativo de credores, conhecedores da conjuntura
financeira e estrutural da empresa do devedor, as chances de definição rápida do
melhor plano seriam muito maiores. Às vésperas da aprovação do projeto de lei
que resultou na LRE, na Câmara dos Deputados foi retirada do texto a
possibilidade de credor requerer a recuperação judicial da empresa. Levou-se em
conta que a recuperação não poderia ser imposta pelos credores ao devedor.
Significaria pedido de falência indireto. A recuperação deve ser requerida pelo
devedor, não sendo raros os casos em que sua preferência recaia na falência151.
Em resumo, a inauguração da recuperação judicial por
instância do credor, na verdade, seria mera instigação do devedor omisso, em
notória crise financeira, para que trouxesse a juízo os elementos necessários a
sua recuperação, vale dizer, para que se definisse entre a recuperação e a
eventual falência152.
Depois, seria impossível ao credor cumprir as exigências do
art. 51 da LRE, ou seja, oferecer demonstrações contábeis da situação do
devedor, relação completa de seus credores, relação integral de seus
149 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 159. 150 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 160. 151 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 160. 152 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 160.
53
empregados, documentação contábil e inventario de bens particulares de sócios.
Pior. Não teria como propor um plano de recuperação judicial, isto é, um meio de
reestruturação, nem a estimativa de um prazo para seu cumprimento153.
Sobre os requisitos da inicial, ensina Fazzio Júnior154:
“Além do agente econômico devedor, também podem requerer a recuperação da empresa do empresário individual falecido, seu cônjuge, herdeiros e o inventariante do espólio. O parágrafo único do art. 48 igualmente confere legitimação ativa para o sócio remanescente. Trata-se de sociedade que, por qualquer motivo, perdeu o consócio. Cuidando especificamente da petição inicial, o art. 51 cataloga os requisitos instrutórios específicos para a deflagração do processo de recuperação judicial, os gerais são os do art. 282 do CPC. Logo, no inciso I, o art. 51 reclama do peticionário uma exposição “das causas concretas da situação patrimonial” e as “razões da crise econômico-financeira”. O legislador, querendo dizer muito, foi redundante. as causas da situação patrimonial deficitária e as razões da crise econômico-financeira a empresa, certamente significam a mesma coisa. A lei não exige que a exposição do inciso I, art. 51, seja um relato técnico, mas é conveniente que o seja. Afinal de contas, é a causa de pedir da ação de recuperação judicial. deve, pois, conter dados e fatos e suas conseqüências que justifiquem o pedido de recuperação. A exposição deve ser acompanhada de diversos elementos relativos À situação patrimonial da empresa e de sua regularidade. Não custa lembrar que, nos termos do art. 48, o peticionário da recuperação deve ser inscrito, há mais de 2 (dois) anos, no registro da empresa. Daí, por que o inciso V determina que o devedor junte a certidão de sua regularidade no registro de suas empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores”.
Visando demonstrar a situação patrimonial autorizadora da
recuperação, o inciso II reclama demonstrações financeiras, conforme as normas
de contabilidade, relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais. Reclama,
também, a instrução da inicial com demonstrações contábeis levantadas
153 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 160. 154 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 160.
54
especificamente para este fim. Quer dizer, não basta a juntada de demonstrações
financeiras dos exercícios anteriores, é necessário que se apresente outra
especialmente para justificar o pedido de recuperação155.
Tais demonstrações financeiras compreendem o balanço
patrimonial, a demonstração de resultados acumulados, a demonstração do
resultado desde o último exercício social e o relatório gerencial de fluxo de caixa,
bem como de sua projeção. O balanço patrimonial serve para expressar a real
situação da empresa. O de resultado econômico oferece o cotejo de créditos e
débitos, exprimindo os resultados da empresa156.
O § 1º do art. 51 exige a apresentação da escrituração
contábil, qualquer que seja a sua forma. É claro que a contabilidade deve estar
regular e atualizada. Os documentos pertinentes permanecerão à disposição do
juízo e do administrador judicial, mas qualquer interessado poderá consultá-los,
mediante autorização judicial. O juiz pode, inclusive, determinar que esses
documentos sejam depositados em cartório. Tratando-se de microempresa ou
empresa de pequeno porte, os livros e a escrituração contábil são
simplificados157.
O livro Diário ou equivalente (balancetes diários e balanços)
deve trazer os registros em ordem cronológica, a identificação das contas
debitadas e creditadas e, também, o histórico e o valor dos eventos contábeis.
aplica-se aqui, o que determinam os arts. 1.184 e 1.185 do CC. Se o devedor é
empresário que adota o regime de vendas com prazo superior a 30 (trinta) dias,
deve apresentar o registro de duplicatas ou equivalente mecanizado, nos termos
do art. 19 da Lei nº 5.474/68. Além dos mencionados livros, há outros, de
natureza fiscal exigíveis conforme a índole da atividade econômica158.
155 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 161. 156 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 161. 157 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 161. 158 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 162.
55
Importante acrescentar que, consoante preceitua o art. 226
do CC, os documentos contábeis das sociedades fazem prova contra elas e, em
seu favor, quando escriturados sem vícios, confirmados por outro subsídio.
Quatro relações devem acompanhar o pedido:
� de credores; � de empregados; � de bens particulares dos sócios; e � de ações judiciais.
O inciso III do art. 51, exige a relação nominal completa dos
credores. Não precisaria, portanto, acrescentar a locução “inclusive aqueles por
obrigação de fazer ou de dar”, se pede relação completa. A relação dos credores
deve conter a indicação do endereço do credor, bem como a natureza, a
classificação, a origem, o valor atualizado e respectivos vencimentos dos créditos.
Deve trazer, também, o registro contábil das transações pendentes159.
O dispositivo confirma orientação da revogada LFC, no
sentido de que a origem dos créditos deva ser declarada. Não se aplica, pois, em
relação aos créditos da recuperação, o principio da abstração dos títulos. Pelo
inciso IV do art. 51, a petição inicial deve ser instruída com uma relação integral
dos empregados da empresa cuja recuperação é postulada. Nessa relação deve
constar o respectivo enquadramento sindical e função, os salários, indenizações
e outras parcelas salariais devidas e o correspondente mês de competência.
Também devem ser discriminados os encargos decorrentes de relações
trabalhistas que se encontrem pendentes de pagamento160.
No que pertine à relação dos bens particulares, o inciso VI
refere-se aos controladores e administradores, seja empresa uma sociedade
limitada ou uma sociedade por ações. Certamente aí estão incluídos os sócios da
sociedade em nome do coletivo, uma vez que, por força do art. 190 da LRE, os
sócios ilimitadamente responsáveis são atingidos pela recuperação como se
159 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 163. 160 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 163.
56
fossem devedores. A quarta relação refere-se a todas as ações judiciais em que
o devedor figure como parte, devendo trazer a estimativa dos valores
demandados. Com certeza, a palavra parte , significa aqui, autor, réu ou
litisconsorte (inciso IX)161.
O inciso VII reclama a oferta de extratos atualizados das
contas bancarias e aplicações financeiras, inclusive em fundos de investimentos
ou em Bolsa de Valores, devendo tais documentos ser os emitidos pelas
respectivas instituições financeiras. Embora a lei não o diga, parece que também
devem ser juntados extratos pertinentes aos controladores, administradores e
sócios ilimitadamente responsáveis162.
Pelo inciso VIII, a LRE pede que sejam anexadas ao pedido
certidões completas dos cartórios de protestos situados no domicilio da sede da
empresa e naqueles onde possuir filiais. Não é demasia anotar que o devedor
pode ter títulos protestados em outros cartórios, situados em outros locais. Só
para exemplificar, os títulos de credito devem ser protestados na respectiva praça
de pagamento, que conforme o caso, pode não ser a da sede da empresa ou de
suas filiais. Nesse interín, pondere-se que o juiz, no exame da documentação
instrutória do pedido de recuperação não precisa se ater ao exacerbado
formalismo. De importância nuclear é que resulte do pedido e da documentação
que o acompanha a necessidade da tutela jurisdicional de recuperação, a
regularidade da empresa e a viabilidade da medida163.
3.3 DESPACHO DE PROCESSAMENTO
Determinar o processamento da recuperação não significa
deferimento do pedido. É o marco inicial do exame do pedido de recuperação
judicial ofertado pelo devedor. Em outras palavras, o despacho de processamento
inaugura o procedimento para verificação da viabilidade da proposta para que se
161 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 164. 162 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 164. 163 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 164.
57
conclua sobre sua aprovação, como foi formulada ou modificada, ou sua rejeição
e conseqüente falência do devedor164.
O despacho de processamento contém medidas
administrativas e medidas judiciais propriamente ditas. Entre as providências de
caráter administrativo, destaca-se a nomeação do administrador judicial, a
Constituição do Comitê que pode ser requerida pela assembléia de credores,
após deferido o processamento da recuperação165.
A despeito dos procedimentos, ensina Fazzio Júnior166:
“A lei (art. 52, II) diz que o juiz deve determinar a dispensa de apresentação de qualquer certidão negativa para que o devedor exerça suas atividades, mas (art. 69) em todos os atos, contratos e documentos firmados, o devedor recuperando deverá acrescentar após a firma ou denominação, a expressão “em recuperação judicial”. A dispensa não inclui as certidões para contratar com o Poder Público ou para auferir benefícios e incentivos. Outra determinação importante contida no despacho de processamento é a suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, ressalvadas as ações que demandarem quantia ilíquida e as ações de natureza trabalhista (art. 6, §§1º e 2º) e execuções fiscais (art. 6º, § 7º). Essa suspensão não poderá exceder o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contados do deferimento do processamento da recuperação. após o decurso desse prazo restabelece-se o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial”.
Consoante o inciso IV do art. 52, no ato de deferimento do
processamento da recuperação judicial, o juiz deve impor ao postulante a
apresentação mensal de contas demonstrativas, enquanto perdurara recuperação
judicial, sob pena de destituição de seus administradores. Deverá o magistrado,
164 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 165. 165 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 165. 166 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 165.
58
de igual, determinar a expedição de edital para a publicação no órgão oficial, cujo
teor deverá conter167:
� resumo do devedor; � relação dos credores apresentada pelo devedor; � resumo do despacho no processamento; � abertura do prazo de 15 (quinze) dias para a impugnação ou
inclusão de créditos.
Nada impede que o juiz convoque a assembléia ex officio, a
qual deliberará sobre a concessão do benefício e, aprovado este, sobre a
constituição do Comitê de credores. Convém, ainda, consignar que as Fazendas
Públicas serão cientificadas por carta e o representante do Ministério Público será
intimado pessoalmente para acompanhar o processamento do pedido. Deferido o
processamento da recuperação, o devedor dela não poderá mais desistir, salvo
com a anuência da assembléia geral de credores168.
3.4 DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL
No prazo peremptório de 60 dias, da decisão que autoriza o
processamento da recuperação judicial, o devedor tem que apresentar em juízo o
plano de recuperação. A sanção para o descumprimento desse dever é a
convolação da recuperação judicial em falência, o plano de recuperação judicial
deve conter169:
� detalhamento dos meios de recuperação e seu resumo; � demonstração da viabilidade econômica; � laudo econômico – financeiro e de avaliação do ativo do devedor.
167 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 165. 168 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 165. 169 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 166.
59
Esse plano sofre alguns condicionamentos ligados ao
interesse social, dessa forma, não poderá estipular prazo superior a 1 (um) ano
para pagamento dos créditos trabalhistas e acidentários vencidos até a data do
pedido de recuperação. Também não poderá fixar prazo superior a 30 (trinta) dias
para o pagamento dos créditos estritamente salariais vencidos nos 3 (três) meses
anteriores ao pedido, o limite desse pagamento é de 5 (cinco) salários mínimos
por trabalhador170.
O plano será publicado por edital, com fixação do prazo de
30 (trinta) dias para eventuais impugnações. O termo a quo desse prazo é a
publicação da relação de credores oferecida pelo devedor. Se essa publicação for
anterior ao edital contendo aviso sobre a recepção do plano, este aviso é que
definirá o início do prazo171.
3.5 DA IMPUGNAÇÃO
A impugnação é ato do credor. Consiste, portanto, na
resposta contrária ao pedido, uma vez que para referendá-lo basta que o credor
permaneça em silêncio. Certamente, os credores que impugnarem o plano
apresentado têm o ônus de demonstrar que sua materialização lhes causaria
mais perdas que a outros credores, ou mesmo a outras categorias de credores172.
De outro vértice, é possível que a fundamentação da
inconformidade de alguns credores tenha raízes em eventual fraude no
mecanismo de aprovação do plano, do que é exemplo a prestação de
informações falsas ou a ocultação de dados essenciais relativos à empresa em
recuperação, igualmente, também é possível que a base de discordância advenha
de irregularidades no processo de aprovação173.
170 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 167. 171 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 167. 172 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 167 173 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 167.
60
A assembléia de credores será convocada pelo juiz, sendo
que esta poderá requerer a realização de laudo econômico-financeiro, propor
plano alternativo de recuperação judicial e indicar, eventualmente, os membros do
Comitê de recuperação judicial. Também poderá referendar o plano, emendá-lo
ou rejeitá-lo.
3.6 LAUDO ECONÔMICO – FINANCEIRO
Em todas as situações em que reclama do órgão
jurisdicional a declaração simples ou acrescida de modificação de uma relação
jurídica, impõe-se a formação da certeza. Essa certeza, também conhecida como
certeza legal, obedece a parâmetros traçados na norma. Pode comportar maior
ou menor parcela de liberdade de apreciação por parte do juiz, certo é que se
trata de um estado subjetivo delimitado por circunstancias advindas da realidade
objetiva174.
Tanto o juiz como a assembléia geral de credores pode
determinar exame verticalizado do laudo oferecido pelo devedor. O silêncio legal
sobre essa circunstância não significa que o juiz possa fazê-lo175.
O art. 130 do CPC, norma subsidiária da LRE, deixa claro
que o juiz pode determinar, de oficio, a realização de provas que reputar
importantes para a solução do pedido. Pode e deve. Se não quiser o risco de
repetir os equívocos que sempre assinalaram as famigeradas concordatas
preventivas, cujos maiores pecados sempre resultaram da falta ou insuficiência de
análise técnica dos pedidos, a realização de laudo econômico-financeiro não pode
ser tida como resultado de mera postulação dos credores interessados. O
interesse é público, representado pelo juiz, o Estado-juiz176.
Importante deixar claro que a valorização do poder
instrutório do juiz não excepciona o princípio dispositivo. Os credores podem
requerer a realização de análise do laudo econômico-financeiro ofertado pelo
174 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 168. 175 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 169. 176 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 169.
61
devedor; o juiz deve, se entender necessário, determiná-lo, com ou sem reclamo
dos particulares interessados. Por mais prática e objetiva que seja, ou pretenda
ser, a LRE não pode transformar o magistrado em mero espectador da cena
processual ou singelo homologador da vontade das partes. Tem o juiz o dever de
zelar pela legalidade processual, pela eficiência inerente ao dever da boa
jurisdição e pela certeza177.
3.7 ASSEMBLÉIA GERAL DE CREDORES
É necessário esclarecer que a assembléia geral de credores,
convocada pelo juiz, é um colegiado representativo dos credores trabalhistas,
privilegiados, garantidos por direitos reais e quirografários (com privilégios
subordinados). A aprovação do plano de recuperação passa por um crivo de sua
viabilidade empresarial e, subseqüentemente, pelo filtro de legalidade formal e
material do Poder Judiciário. Nesse sentido, a LRE prevê a apreciação e votação
do plano pela assembléia geral de credores, que pode referendá-lo, rejeitá-lo ou
alterá-lo, neste caso, com anuência do devedor178.
A assembléia pode aprovar o plano e indicar os membros do
Comitê de Credores, alterar o plano com a anuência do devedor-proponente ou
rejeitar o plano. Na última hipótese, o juiz decretará a falência do devedor, uma
vez que a insolvência está confessada179.
Não há necessidade da presença real do credor. Pode ser
representado por mandatário ou representante legal. A representação deve ser
formalizada em até 24 (vinte e quatro) horas antes. Essa formalização
compreende a entrega de procuração ou outro documento hábil comprobatório da
outorga de poderes. A lei admite também a indicação das folhas dos autos onde
a prova da representação se encontra. A assembléia geral será constituída pelas
seguintes classes de credores180:
177 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 169. 178 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 169. 179 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 170. 180 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 171.
62
� Classe I: titulares de créditos trabalhistas ou acidentários; � Classe II: titulares de créditos com garantia real; e � Classe III: titulares de créditos quirografários, com privilégios ou
subordinados.
Aprovação do plano de recuperação judicial deve ocorrer em
todas as classes de credores (art. 45). Quer dizer181:
� nas classes II e III, o plano deverá ser aprovado pela maioria simples de credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes e, também, pela maioria simples dos credores presentes;
� na classe I, o plano deverá ser aprovado pela maioria simples dos credores presentes, independentemente do valor de seu crédito.
A LRE faculta ao juiz uma alternativa para a aprovação do
plano de recuperação judicial que não obteve aprovação na forma antes descrita.
Trata-se de um critério subsidiário que depende da cumulação das seguintes
condições182:
� aprovação do plano por credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembléia, independentemente de classes; e
� aprovação do plano por duas classes de credores ou, caso haja somente duas classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos uma delas; e
� na classe que rejeitou o plano, este tenha obtido o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores.
O § 2º do art. 58 adverte que a recuperação judicial somente
poderá ser concedida, com base nesse critério subsidiário, se o plano não
181 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 171. 182 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 171.
63
implicar favorecimento a credores da classe que o rejeitou. O art. 43 permite que
participem da assembléia, embora sem direito a voto, outras pessoas. Assim
poderão fazê-los sócios ou acionista do devedor; sociedades coligadas
controladoras, controladas; cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim, colateral
até o segundo grau, ascendente ou descendente do devedor, ou de qualquer
partícipe da empresa devedora (parente de administrador, de controlador, de
conselheiro)183.
3.8 DELIBERAÇÕES SOBRE O PLANO
O plano de recuperação judicial proposto pelo devedor
poderá ser aprovado ou rejeitado pelos credores, que também poderão propor
plano alternativo. Se o plano for aprovado pela assembléia, esta deliberará sobre
a necessidade de formação do Comitê de credores e indicará seus membros.
Uma vez referendado o plano pela assembléia geral de credores, sob qualquer
um dos critérios legais, o juiz homologará a decisão, constituindo-se referida
decisão em titulo executivo judicial. Dessa decisão cabe recurso de agravo de
instrumento.
Ao decidir, o juiz determinará a intimação do Ministério
Público e a comunicação das Fazendas Públicas. Como a lei legitima o Ministério
Público a recorrer da decisão judicial, a falta dessa intimação constitui nulidade.
Primordial esclarecer, que em caso de decretação de
falência, os créditos decorrentes de obrigações contraídas durante a recuperação
judicial, mesmo aqueles de fornecedores de bens ou serviços e contratos de
mutuo, serão considerados extraconcursais para fins classificatórios na quebra.
Os créditos quirografários sujeitos a recuperação, de fornecedores de bens ou
serviços que continuarem a provê-los nessa fase, terão privilegio geral, em caso
de falência até o limite do valor dos bens ou serviços fornecidos ao devedor
durante a recuperação judicial184.
183 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 171. 184 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 173.
64
O art. 68 da LRE proporciona às Fazendas Públicas e ao
INSS parcelar seus créditos nos termos do Código Tributário Nacional. Como
decorrência lógica da recuperação judicial, o devedor nesse estado deverá
mencionar, após o nome ou razão social, a expressão em Recuperação Judicial,
nos atos, contratos e demais documentos que firmar. Por determinação judicial, a
anotação da recuperação judicial constará do Registro de Empresas185.
3.9 ADMINISTRAÇÃO DOS BENS
A recuperação judicial, via de regra, não implica o
desapossamento nem perda da gestão empresarial, o regime pressupõe
administração custodiada. Durante o processo de recuperação judicial, o devedor
ou seus administradores poderão ser mantidos na administração da empresa,
exercendo normalmente suas atividades, continuando com seu negócio,
oferecendo demonstrativos mensais de contas, enfim, praticando os atos de
gestão empresarial, sendo, no entanto, fiscalizados pelo administrador judicial e,
se for o caso, pelo Comitê de recuperação judicial186.
Na recuperação judicial, não existe critério geral que
determine se o devedor deve necessariamente continuar ou não à frente da
empresa. Tampouco existe regra absoluta sobre os papéis que poderá ou deverá
cumprir, durante a execução do plano de recuperação. A melhor orientação só
será obtida no exame de caso concreto, levando em conta múltiplos fatores
ligados às qualidades pessoais do devedor ou de seu administrador, o tipo de
sociedade empresária, o objeto social explorado, etc. Igualmente pesa o maior ou
menor conhecimento do devedor sobre a empresa ou sobre seu ramo de
atividade187.
Não é pelo fato de ter contribuído para o insucesso da
empresa que deverá ser razão preponderante para o eventual afastamento do
devedor. As possibilidades de sucesso na execução do plano de recuperação
185 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 173. 186 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 174. 187 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 174.
65
parece ser a bússola que conduzirá à melhor diretriz a respeito. Mesmo naquelas
hipóteses legais de afastamento do devedor, não é de se desprezar a
possibilidade de que desempenhe algumas funções, colaborando com o
administrador judicial para a condução correta dos negócios da empresa188.
De outro vértice, sendo permitido ao devedor que durante a
recuperação continue exprimindo os negócios da empresa, certamente o fará
debaixo de medidas vigilantes e com a participação efetiva do administrador
judicial, para que não se comprometa a confiança dos credores no cumprimento
do plano189.
A LRE traz implícita a distinção entre o exercício dos
negócios no curso ordinário da atividade empresarial e atos dispositivos
excepcionais. Quando a alienação pretendida não é inerente ao curso ordinário
dos negócios, a aprovação jurisdicional é indispensável. A lei não distingue entre
bens moveis e imóveis, dispensando proteção a ambos, visando á conservação
do ativo da empresa190.
É correto que o devedor sofre algumas restrições
decorrentes do estado de recuperação, não possuindo a plenitude de domínio
sobre os bens da empresa. Não é integral sua aptidão de gerir os negócios.
Nesse sentido, o devedor não poderá alienar nem onerar bens e direitos de seu
ativo permanente, salvo no caso de evidente utilidade ou daqueles bens
previamente relacionados no plano. Eventual alienação ou oneração será sempre
antecedida de parecer do Comitê191.
A sanção para a inobservância da restrição é a ineficácia do
ato, sendo rescindida a recuperação judicial, que se converterá em falência. Com
a eclosão da falência, a alienação efetuada contra expressa disposição legal do
art. 66 torna-se ineficaz, ainda que de boa-fé os adquirentes.
188 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 174. 189 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 174. 190 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 175 191 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 175.
66
3.10 SUBSTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA
A LRE dissocia o destino da empresa e o de seus
administradores, se as causas da crise econômico-financeira da empresa
resultam de administração negligente ou ruinosa, pode haver a substituição da
direção da empresa192.
O devedor ou seu administrador não será mantido à frente
da gestão da empresa se o plano de recuperação judicial estipular seu
afastamento, e também nas hipóteses catalogadas nos incisos e alíneas do art.
64 da LRE193:
� condenação anterior transitada em julgado por crime falimentar, contra o patrimônio, contra a economia popular ou contra a ordem econômica;
� indícios veementes da prática de crime; � dolo, simulação ou fraude contra os interesses dos credores; � gastos pessoais manifestamente excessivos em relação ao
cabedal da empresa; � despesas empresariais injustificáveis em relação ao capital, gênero
do negócio ou movimento das operações; � descapitalização da empresa; � operações prejudiciais ao funcionamento regular da empresa; � simulação ou omissão de créditos, injustificáveis, na relação de
credores; � retardamento ou omissão no cumprimento do plano de
recuperação; e � recusa de prestação de informações.
O primeiro efeito lógico do afastamento do devedor é a
assunção do administrador judicial, que passará à condição de administrador-
gestor, respondendo interinamente pela gestão dos negócios da empresa,
192 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 176. 193 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 176.
67
enquanto a assembléia geral não deliberar sobre a escolha de um gestor
judicial194.
3.10.1 SUBSTITUIÇÃO DO EMPRESÁRIO NA ADMINISTRAÇÃO JUDICIAL
O inciso II do art. 64 coloca como óbice a permanência do
empresário ou administrador, dirigindo a empresa, durante a recuperação judicial,
havendo a existência de indícios veementes de crimes contemplados nos arts.
168 até 178 da LRE. A causa de afastamento, aqui referida, se aperfeiçoa apenas
pela existência de indícios de, pelo menos, um daqueles crimes. Assim sendo, a
existência de indícios de autoria e materialidade de qualquer dos crimes que ela
prevê é, no mínimo, motivo para a instauração de inquérito policial ou, até
mesmo, da imediata propositura de ação penal. Claro que a presença ou não
desses indícios é matéria de apreciação judiciária, sem prejuízo de precavida
manifestação do Ministério Público195.
Os crimes previstos na LRE são de ação pública
incondicionada e comportam, se não oferecida a denúncia, a queixa subsidiária
por qualquer credor habilitado ou pelo administrador judicial. A LRE faria melhor
se, em vez de mencionar apenas a existência de indícios veementes, matéria de
alto grau de subjetividade, reclamasse a existência de, pelo menos, persecução
penal em curso contra o empresário ou administrador196.
3.11 ADMINISTRADOR JUDICIAL
A fiscalização dos negócios da empresa em recuperação
judicial compete, em regra, ao administrador judicial, nomeado no despacho que
defere o processamento da recuperação. O administrador judicial fiscaliza sob a
supervisão do juiz. Não se trata de administração controlada, mas fiscalizada. O
administrador judicial não tem poderes gerenciais. Isso não significa, entretanto,
que sua participação seja meramente passiva. Com efeito, se constatar a
194 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 177. 195 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 179. 196 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 179.
68
ocorrência de fatos prejudiciais ao cumprimento da recuperação, deverá
comunicá-lo ao órgão judiciário para as providencias cabíveis. Trata-se de auxiliar
fiscal do juízo, com responsabilidade idêntica à do administrador falimentar, mas
com atividade diversa. Pode ser representado civil e criminalmente se perpetrar
atos ilícitos, seja em prejuízo dos credores, seja contra o devedor em
recuperação197.
A nomeação do administrador judicial deverá recair sobre
profissional idôneo de nível superior formado preferencialmente em Direito,
Economia, administração de Empresas ou contabilidade. Deve ser pessoa de
confiança do juiz. Também pode ser pessoa jurídica especializada, caso em que
deverá ser declarado no termo de compromisso o nome do profissional
responsável198.
Como já existe bastante difundida a mentalidade liquidatória
das empresas em estado de iliquidez, a administração judicial proveitosa de uma
empresa em recuperação reclama, antes de tudo, uma visão progressista da
empresa e conhecimento atualizado das condições de mercado. A remuneração
desse administrador será fixada pelo juiz com base na qualidade e na
complexidade do trabalho desempenhado e, ainda, conforme os valores vigentes
no mercado para o pagamento de atividades semelhantes. O administrador
judicial será pago simultaneamente ao pagamento realizado aos credores. Nunca
poderá exceder 5% (cinco por cento) do valor a ser pago aos credores199.
3.12 COMITÊ DE CREDORES
A constituição do Comitê é facultativa, dependente de livre
deliberação de qualquer das classes de credores, na assembléia geral de
credores, convocada pelo juiz. A constituição do Comitê deve ser fundamentada
na necessidade, ditada pela complexidade do procedimento ou pelo porte
197 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 181. 198 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 181. 199 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 182.
69
econômico-financeiro da empresa. O Comitê é composto de 3 (três) membros,
cada um com dois suplentes200:
• representantes dos empregados;
• representante dos credores com direitos reais de garantia e privilégios
especiais; e
• representante dos credores quirografários e com privilégios gerais.
A presidência do Comitê incumbe àquele indicado pelos
seus próprios membros. Estão impedidas de integrar o Comitê ou de exercer as
funções de administrador gestor as pessoas que nos últimos 5 (cinco) anos, tendo
administrado ou integrado o Comitê, em empresa sujeita ao regime de
insolvência, foram destituídas, tiveram sua prestação de contas rejeitada ou
deixaram de prestá-la tempestivamente201.
Os membros do comitê, após a assinatura dos respectivos
termos de compromisso, têm as seguintes atribuições202:
• fiscalizar a administração do plano de recuperação judicial;
• apurar reclamações de interessados;
• emitir parecer sobre alienação ou oneração de bens e direitos;
• representar ao juiz em caso de violação de direitos dos credores;
• requerer ao juiz a convocação de assembléia geral.
No âmbito do comitê, as decisões obedecerão à vontade da
maioria. Serão insertas em livros de atas, rubricados pelo juiz, que poderão ser
livremente examinados pelos credores e pelo devedor. Se esta não for possível, o
impasse será solucionado pelo administrador judicial ou, na incompatibilidade
deste, pelo juiz203.
200 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 183. 201 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 183. 202 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 184. 203 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 184.
70
Os membros do Comitê de credores não serão
remunerados, sendo apenas ressarcidos por eventuais despesas que realizarem
para o exercício de suas funções.
3.13 CONVOLAÇÃO EM FALÊNCIA
A recuperação tem caráter preventivo, visa evitar a
falência. Todavia, isso nem sempre é possível e o plano de recuperação pode
resultar inexitoso, seja na fase de processamento, seja na fase executiva. Então
ocorre a convolação da recuperação em falência (art. 73 e incisos), o que pode
resultar de diversas causas204.
Primeiramente, no curso do processo de recuperação, a
assembléia geral de credores, constatando a inviabilidade da empresa ou do
plano proposto, poderá deliberar no sentido de sua liquidação, ensejando o juiz a
decretação da falência do devedor. Produz o mesmo resultado a rejeição do plano
de recuperação, sua não-apresentação tempestiva ou a inobservância do dever
imposto ao empresário de apresentar certidão negativa e de débitos tributários205.
Enfim, se ocorrer o descumprimento do plano de
recuperação acordado, qualquer credor poderá requerer a convolação em
falência. Em caso de incerteza, quanto ao estado da empresa em crise, o juiz
sempre terá a faculdade de designar audiência, com a presença dos credores e
do devedor. Havendo matéria técnica a ser dirimida, o pretor poderá convocar
profissional especializado para auxiliá-lo206.
A decisão que determina a falência ou a indefere sujeita-se
ao recurso de agravo de instrumento. A rescisão da recuperação e a conseqüente
decretação da falência não invalidam os atos de administração, endividamento,
oneração ou alienação de bens, praticados durante o período de recuperação. A
validade de tais atos é presumida, desde que praticados conforme a lei. As
204 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 185. 205 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 185. 206 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 185.
71
obrigações provenientes de tais atos são extraconcursais, devem ser pagas tão
logo haja disponibilidade de dinheiro207.
A rescisão do regime de recuperação judicial significa o
reconhecimento jurisdicional do não-cumprimento do respectivo plano. A situação
de crise econômico-financeira do devedor já está caracterizada pelo próprio fato
da recuperação. Isso significa que o pressuposto para a decretação da falência
está embutido em todos os processos de recuperação judicial assentados, não na
mera iliquidez ou em situação de dificuldade transitória, mas no estado
patrimonial da insolvência208.
3.14 CUMPRIMENTO DA RECUPERAÇÃO
O pagamento dos credores e a satisfação de todas as
obrigações assumidas no plano de recuperação judicial autorizam o devedor a
requerer ao órgão judiciário a sentença de encerramento da recuperação judicial.
A sentença de cumprimento de recuperação judicial não é declaratória de
extinção das obrigações do devedor. Não alcança os débitos renegociados no
plano de recuperação. Na verdade, declara que o plano foi cumprido, ou seja, que
as obrigações assumidas pelo devedor foram resolvidas pela execução do
plano209.
207 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 185. 208 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 185. 209 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.p. 186.
72
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo investigar a
Recuperação Judicial de Empresas à luz da nova legislação e da doutrina,
abordando-se desde o escopo histórico da Recuperação de Empresas ao
processo propriamente dito.
O interesse pelo tema abordado deu-se em razão da medida
inovadora, substitutiva da concordata e consideravelmente promissora da nova
incorporação no ordenamento falimentar, qual seja, a Recuperação de Empresas.
A revogada lei de falências e concordatas estava
completamente desatualizada necessitava de uma reforma sistemática, em razão
da nova concepção que a empresa apresenta nos dias atuais.
Inicialmente tratou-se no primeiro capítulo um apanhado da
evolução histórica das recuperações, evidenciando o quanto a sociedade se
desenvolveu e se tornou complexa, exigindo por conseqüência, a evolução da
legislação que rege o comportamento do ser humano e seus atos.
O fundamento da pesquisa consistiu na abordagem da
recuperação de empresas, à luz da Lei 11.101/2005 – a lei que regula a
recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade
empresária.
No decorrer da pesquisa foi possível observar que o aporte
da figura da recuperação judicial da empresa, adveio pretendendo criar condições
saneadoras, de modo a contornar a crise financeira existente e dar oportunidade
mais racional para seu retorno à normalidade empresarial.
A interpretação do dispositivo, no entanto, conforme
manifestação enaltecida do autor pesquisado mais preponderante no trabalho,
Waldo Fazzio Júnior, explicita que deve ser adaptado ainda mais à realidade
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econômica, pois mantém a decretação da falência se não preencher os requisitos
ou não acolhido pelos credores o plano de recuperação judicial.
Por sua vez, a recuperação judicial é a ação judicial
destinada a salvar a situação de crise econômico-financeira do devedor,
saneando suas finanças, salvaguardando a manutenção da fonte produtora, do
emprego de seus trabalhadores e os interesses dos credores, viabilizando, dessa
forma, a realização da função social da empresa.
Imperiosa e urgente foi a necessidade de uma profunda
reforma na antiga lei de falências. Um projeto em tramitação há mais de uma
década que veio a contemplar propostas inovadoras, avançadas e corajosas. A
Lei de Recuperação de Empresas é um avanço no enfrentamento de alguns
problemas seculares, no tocante às crises economico-financeiras e no
desempenho suscetível e profícuo da função social da sociedade empresarial.
Deve ser destacado que, nesse contexto, não se pode
preterir e reconhecer na empresa uma instituição que ao lado do Estado é um
ente que desempenha relevantemente uma função social, muito embora em
escala mais reduzida que o poder maior.
Essa concepção não é inovadora, reporta há mais de cinco
décadas, parece ganhar maior fôlego na doutrina, exigindo do legislador um maior
comprometimento com mudanças que devem se manifestar através da reforma
de diplomas legais ultrapassados, cujos ditames, doravante, começam a remontar
uma nova conjuntura, através da nova Lei de Recuperação de Empresas.
De outro vértice, no entanto, não é de se acreditar no
sucesso de algumas modificações, principalmente na anuência dos credores para
o deferimento da recuperação judicial.
No que se refere a permissão dos credores, a nova
legislação estabelece que o plano de recuperação econômica apresentado em
juízo pelo devedor, deve ser submetido a aprovação prévia da assembléia de
credores, sem o que, no entanto, o magistrado não poderá acolher o pedido de
recuperação judicial , salvo raras exceções.
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Condicionar à aprovação da recuperação judicial a prévia
aprovação dos credores é utopia, pois dificilmente os credores vão concordar em
receber seus créditos em prazo bem mais longo daquele que inicialmente
convencionaram com o empresário devedor.
Todas as hipóteses ventiladas no preâmbulo introdutório,
restaram devidamente comprovadas, a primeira e a segunda, Fazzio Júnior
explicita no segundo capitulo, nos objetivos da recuperação, que o instituto da
recuperação de empresas ademais de medida econômico-financeira de
revitalização da empresa, visa a busca da equidade entre os interesses dos
credores e o atendimento do interesse público e social, sendo que as medidas
trazidas com a nova lei contemplará efetivamente os anseios da sociedade
empresária em crise.
A terceira hipótese, por sua vez, perquire se as inovações
trazidas com o novo dispositivo, visam salvaguardar a manutenção da fonte
produtora, do emprego de seus trabalhadores e os interesses dos credores,
viabilizando, dessa forma, a realização da função social da empresa.
Indubitavelmente, o teor precípuo institucional do novo dispositivo é taxativo, em
inúmeros pontos da monografia, abastece a idéia da pretensão de conservar a
fonte produtora, no intuito de resguardar o emprego e o mandamento
constitucional da função social da empresa.
De modo geral, o aporte da Lei de Recuperação de
Empresas veio a contemplar uma nova realidade para a economia nacional,
novas empresas e novos investimentos estão sendo promovidos nos mais
diversos pontos do território nacional. Nesse diapasão, é natural que as leis que
não foram editadas para os tempos modernos devem se adequar a essas novas
realidades. A Lei 11.101/2005, sobretudo, veio para impulsionar estas mudanças
alicerçando, sobremaneira, o desenvolvimento sustentado das empresas e do
país.
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