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REFLEXÕES SOBRE A DICOTOMIA ENTRE O DIREITO PRIVADO E OS INTERESSES SOCIAIS E ECONÔMICOS NO ÂMBITO DA PROPRIEDADE INTELECTUAL Brasília, 6 de novembro de 2006 Profa. Maristela Basso, Universidade de São Paulo

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REFLEXÕES SOBRE A DICOTOMIA ENTRE O DIREITO PRIVADO E OS INTERESSES SOCIAIS E ECONÔMICOS NO ÂMBITO DA PROPRIEDADE INTELECTUALBrasília, 6 de novembro de 2006

Profa. Maristela Basso, Universidade de São Paulo

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O que abrangem os Direitos de Propriedade Intelectual ?

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Acordo ADPIC/TRIPS da OMC abrange:

1.Direito do Autor e Direitos Conexos; 2.Marcas; 3.Indicações Geográficas; 4.Desenhos Industriais; 5.Patentes; 6.Topografias de Circuitos Integrados; 7.Proteção de Informação Confidencial;

e 8.Controle de Práticas de Concorrência

Desleal em Contratos de Licenças.

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No mundo cotidiano os DPI se referem a, por exemplo:

Frutas

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Automóveis

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Design

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Medicamentos

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Entretenimento

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Obras Literárias e Artísticas

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Agricultura

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Cultivares

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Tecnologia da Informação

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Queijos e Vinhos

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Primeira observação: DPI abrangem desde o mais supérfluo ao mais sofisticado, passando por flores, moda, vinhos até medicamentos e alimentos.

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Porém, qual é o objeto de proteção dos DPI? O que há em comum em todos estes objetos de proteção referidos?

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INFORMAÇÃO:

DPI regula o combustível da Economia da

Informação

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Linha histórica da proteção dos Direitos de Propriedade Intelectual em âmbito internacional e o recrudescimento da proteção dos direitos de PI

Fase internacional da Propriedade intelectual

1883 – Convenção de Paris para proteção da propriedade industrial

1886 – Convenção de Berna para proteção de obras literárias e artísticas

1967 – Criação da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI)

1974 – OMPI torna-se uma agência especializada da Família das Nações Unidas

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Características da fase internacional:

- Sistema de proteção sem “garras e dentes” para dar observância aos patamares negociados internacionalmente;

- Respeito à discricionariedade dos países em desenvolvimento para criarem sistemas de proteção em conformidade com suas necessidades sócio-econômica. Por exemplo, até recentemente, países em desenvolvimento e, até mesmo, países industrializados, não concediam proteção patentária a produtos farmacêuticos

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FASE GLOBAL DA PI: 1986 – atualmente

- inserção do tema Propriedade Intelectual no mandato negociador da Rodada Uruguai GATT

Objetivo: tornar a participação dos países em desenvolvimento e com menor desenvolvimento relativo no comércio internacional dependente da concessão de proteção da propriedade intelectual dos países industrializados nos termos por estes fixados.

1994 – Ata de Marakesh: criação da OMC e inserção do Acordo TRIPS em seu âmbito

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Os 3 pilares da PI, segundo TRIPS:

Princípio do Tratamento Nacional Princípio da Nação Mais Favorecida OSC e o sistema de retaliação Conseqüência: o sistema de PI, a partir

de TRIPS, tornou-se um sistema desequilibrado, no qual os países em desenvolvimento são obrigados a conceder um tratamento mais favorecido aos países industrializados.

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Justificativa “diplomática” para mudança do paradigma de proteção da PI e inserção do TRIPS na OMC:

Necessidade de se estabelecer um sistema internacional de proteção da PI que fomente maiores investimentos na indústria da criatividade e inovação, com vistas a satisfação das necessidades da humanidade

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A realidade mostrou outra justificação:

DPI como instrumento de proteção da inovação empresarial E como proteção dos status quo dos grandes players da indústria de inovação e de entretenimento de massa dos países industrializados

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Análise de três casos

Caso 1: patentes de 2º uso O que são patentes de 2º uso

farmacêutico? Patentes envolvendo 2os usos

farmacêuticos se referem à descoberta de novos usos para substâncias, princípios ativos, moléculas, composições já previamente conhecidos, e muitas vezes, já em domínio público.

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Importância estratégica das patentes de 2º uso: O National Institute of Health Care Management

Research and Education Fundation (NIHCM) aponta que, entre 1989 e 2000, das 1035 novas drogas aprovadas pelo Food and Drugs Administration, apenas 35% continham um novo princípio ativo.

Infere-se disto, que o cerne dos “novos” medicamentos lançados pela indústria farmacêutica envolve versões modificadas de drogas antigas.

Onde está a inovação que deveria ser gerada pelo sistema patentário?

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Caso 2: Marca Cupuaçu Registro da marca “CUPUAÇU” pela empresa japonesa

ASAHI Foods Inc. perante o JPO, USPTO e OAMI (União Européia)

Pequenos artesãos do norte do Brasil tiveram bloqueada uma exportação de geléias de cupuaçu para a Alemanha pela ASAHI Foods, por ostentarem nas embalagens das geléias o nome “cupuaçu”.

Objetivo da empresa japonesa: bloquear a entrada de concorrentes no mercado de doces produzidos com cupuaçu.

Resultado: sociedade civil brasileira cancelou a marca no Japão

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Caso 3: acesso a material educativo no Brasil e as ações da Associação Brasileira de Direitos Reprográficos (ABDR)

Atividades da ABDR voltadas à criminalização o direito à cópia privada no Brasil.

Professores, estudantes e universitários vêem sendo considerados criminosos por infringirem “direitos autorais” das casas editoriais.

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Apesar da Lei de Direitos Autorais (LDA) ter como razão de ser a proteção de direitos públicos (direito de acesso, direito à educação, respeito à dignidade humana, auto-determinação do ser humano), a LDA brasileira super-protege direitos privados e esvazia normas cujo objetivo é a proteção dos interesses difusos e

coletivos do povo brasileiro.

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Direito à cópia privada:

LDA estabelece:

Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais: II - a reprodução, em um só exemplar de pequenos

trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro.

LDA permite a reprodução apenas:

pequenos trechos; feito pelo próprio copista (proibida a reprodução via

lojas de fotocópia e centros acadêmicos) Efeito prático: proibir o direito à cópia privada.

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O QUE O ART. 46 DA LDA OFERECE AO PÚBLICO, O ART. 107 RETIRA....

Ao mesmo tempo em que a LDA oferece ao público uma série de limitações aos direitos autorais (art. 46 e ss.), o art. 107 esvazia o disposto no art. 46.

Art. 107. (...) responderá por perdas e danos (...) quem:

I - alterar, suprimir, modificar ou inutilizar, de qualquer maneira, dispositivos técnicos introduzidos nos exemplares das obras e produções protegidas para evitar ou restringir sua cópia;

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No caso de obras disponíveis na internet ou em cds ou dvds que apresentem mecanismos tecnológicos para bloquear sua cópia pelo consumidor final, este não poderá desabilitar tais mecanismos, sob pena de ser responsabilizado civilmente.

Conseqüência: esvaziamento do art.

46 da LDA.

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2ª Obs.: DPI tornou-se um regime de proteção de

interesses eminentemente privados, afastado das necessidades genuinamente humanas e sociais

Esta realidade não é sentida apenas no Brasil e em países em desenvolvimento. O sistema de proteção dos DPI, atualmente, bloqueia inovação, criatividade e bem-estar humano, social e atividade econômicas também em países industrializados.

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Estudo do Federal Trade Commission, EUA

O Federal Trade Comission reconheceu, em 2003, após ampla e robusta pesquisa de campo que o sistema patentário norte-americano é fortemente tendencioso em favor dos interesses dos depositantes de patentes, e desfavorável à geração de inovação.

( Fonte: Federal Trade Commission, To PromoteInnovation: The Proper Balance of Competition and Patent Law

and Policy, Outubro, 2003)

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Estudos empíricos de R. Eisenberg e M. Heller publicado na revista Science, Maio de 1998 e de R. Nelson, publicado no IPQ, 2001 sobre o Bayh-Dole Act de 1980

Sistema patentário aumenta os custos de transação, desestimula inovação e bloqueia a entrada e novos competidores no mercado da inovação e criatividade, o que, em última instância, diminui o bem-estar social e econômico.

Propriedade Industrial (sistema patentário), no âmbito universitário norte-americano, gerou mais custos do que inovação.

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Exemplo concreto do potencial restritivo do bem-estar social que pode advir do sistema atual de proteção da propriedade industrial

Caso Arroz Dourado

Um grupo de cientistas suíços e alemães desenvolveu, sob os auspícios do Instituto de Tecnologia da Suíça, uma nova variedade de arroz (arroz dourado), por meio de técnicas de engenharia genética, que contém os precursores da vitamina A (beta-caroteno).

Este arroz apresenta uma importância ímpar para bilhões de pessoas que não têm acesso a uma alimentação que supra suas necessidades de vitamina A, estando sujeitas a cegueira, por exemplo.

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Mapa da Deficiência da Vit.A

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O cientista chefe do Projeto se empenhou pessoalmente que esta variedade de arroz fosse distribuída livremente pelo mundo em desenvolvimento, ou seja, onde ele realmente é necessário. Porém, a nova variedade de arroz foi desenvolvido a partir de 70 tecnologias patenteadas, detidas por 32 empresas diferentes.

Para que o arroz pudesse ser introduzido nos campos e no mercado, era imprescindível a negociação de licenças com os titulares destas 70 patentes, o que inviabiliza qualquer inovação.

Felizmente, a publicação da Revista TIME teve um efeito positivo que permitiu a obtenção das licenças necessárias para colocar o produto no mercado, sem o pagamento de taxas (desde que o agricultor não tenha renda maior que US$ 10.000,00/ano).

MAS E QUANTO AOS CASOS EM QUE NÃO HÁ

PUBLICIDADE? O QUE SERIA DO ARROZ DOURADO SEM A “TIME”?

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A propriedade Intelelectual tornou-se um sistema desequilibrado que privilegia interesses privados em detrimento dos sociais-humanos e econômicos locais.

Os DPI são vistos, interpretados e aplicados atualmente da seguinte maneira:

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Mas DEVEM ser interpretados e aplicados da seguinte maneira:

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“Direitos de Propriedade Intelectual são ilhas de exclusividade em um mar de liberdade” (Vorhoof)

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Ou seja:

Direitos de Propriedade Intelectual são direitos de exclusivo limitados pelos interesses humanos, sociais e tecnológicos brasileiros (art. 5º, XXVII da CF), bem como pelos princípios gerais da ordem econômica (art. 170 da CF), dentre eles o princípio da função social da propriedade, a proteção do consumidor, a livre concorrência, e a redução das desigualdades sociais e regionais. Garantias fundamentais e direitos sociais NÃO são meros princípios programáticos, mas balizas aos DPI.

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O Brasil e as iniciativas internacionais para o redimensionamento dos DPI

No âmbito da OMPI, em 2004, o Brasil e Argentina, apoiado pelos países que formam o grupo “amigos do desenvolvimento” propuseram a chamada “Agenda do Desenvolvimento”.

A Agenda do Desenvolvimento visa a fomentar a transferência de tecnologia aos países em desenvolvimento, difundir trabalhos literários, artísticos, educacionais a preços mais acessíveis, fomentar acesso a medicamentos essenciais, enfim, criar um sistema de proteção da PI que privilegie o ser humano. Afinal, DPI não são um fim em si mesmo.

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Enquanto isso, o Poder Judiciário e Ministério Público devem aguardar os resultados das negociações internacionais e continuarem a aplicar a propriedade intelectual de forma puramente privatista e afastada de seus fins sociais e humanos?

Não! O Acordo TRIPS, a Constituição Federal Brasil apresentam balizas e salvaguardas técnicas que podem auxiliar o Poder Judiciário e o MP a empregarem o sistema de maneira conducente ao desenvolvimento social BRASILEIRO.

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No âmbito do acordo TRIPS, o artigo 7 deve ser adotado como baliza

interpretativa:

A proteção e a aplicação de normas de proteção dos direitos de propriedade intelectual devem contribuir para a promoção da inovação tecnológica e para a transferência e difusão de tecnologia, em benefício mútuo de produtores e usuários de conhecimento tecnológico e de uma forma conducente ao bem-estar social econômico e a um equilíbrio entre direitos e obrigações.

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Os DPI não podem ser interpretados de forma isolada de seus objetivos, nem distanciado dos Princípios que regem a ordem econômica brasileira (art. 170 da CF) nem das garantias individuais e sociais (art. 5º e 6º da CF), sob pena de aplicação inconstitucional de suas normas e falência do sistema.

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Tomemos alguns casos concretos e potenciais....

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I. - Direito de Marca e o Princípio da Liberdade de Expressão

Societè Esso v. Association Greenpeace France: a famosa Organização Não Governamental ambientalista substituiu os SS da marca ESSO por $$, em campanha contra as políticas internas da companhia petrolífera contrárias ao interesse público geral a um meio ambiente limpo.

Danone v. Réseau Voltaire et al.: uma associação civil registrou o nome de domínio “jeboycottedanone.com” e no referido website a marca “DANONE” era sobreposta com uma linha com os dizeres “jeboycottedanone”, como forma de criticar as políticas internas da empresa de alimentos.

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Em primeira instância, os titulares das marcas comerciais foram vencedores, fundamentando-se, basicamente, em infração a direitos de marca, porém, em segunda instância, as decisões foram favoráveis às associações da sociedade civil.

Os argumentos dos acórdãos são praticamente idênticos: sustentam que o princípio constitucional de liberdade de expressão implica que essas associações, dentro dos limites e prerrogativas previstas nos seus estatutos, podem denunciar, pelos meios que considerarem apropriados, danos ao meio ambiente, aos interesses humanos e sociais decorrentes de atividades industriais/comerciais.

Outra conclusão do Poder Judiciário francês importante é que direitos de marca não podem ser usados para infringir direitos fundamentais humanos, como a liberdade de expressão.

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II. - Importação Paralela e medicamentos mais acessíveis no Brasil

O setor privado brasileiro comumente sustenta que a LPI bloqueia a importação paralela de bens genuínos protegidos por marcas e patentes. E o Poder Judiciário aceita tal interpretação da LPI.

Porém, a LPI é inconclusa sobre a adoção (ou não ) do princípio da exaustão internacional dos direitos de Propriedade Industrial.

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Tendo em vista que :

(I) objetivos primordiais do sistema TRIPS/OMC são o fomento do livre comércio internacional e a supressão de novas distorções comerciais;

(II) a obrigação da propriedade intelectual cumprir com sua função social;

(III) o princípio constitucional da livre concorrência e da defesa do consumidor permear o sistema econômico brasileiro;

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A interpretação, pelo Poder Judiciário brasileiro, de que a importação paralela é proibida pela LPI é inconstitucional, ao infringir os princípios da ordem econômica brasileiro, restringindo a livre concorrência, e ainda infringe direitos fundamentais como o direito de acesso à saúde, por exemplo, ao restringir a importação de produtos genuínos patenteados e que ostentem marcas registradas no Brasil.

O Poder Judiciário deve ter em conta, ao aplicar a LPI, não apenas as próprias normas da LPI, mas também o sistema legal brasileiro como um todo, notadamente, a CF/88.

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III. - O direito de cópia privada no Brasil

Interpretar o artigo 46, II e art. 107 da LDA em consonância com os direitos sociais e garantias fundamentais humanas: direito à educação, direito de acesso à informação.

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Enfim, uma aplicação da LDA que

leve em consideração: Pessoas de 10 ou mais

anos de idade, ocupadas, por classe de rendimento de trabalho

Até 1/2 salário mínimo 10,1%

Mais de 1/2 a 1 salário mínimo 20,4%

Mais de 1 a 2 saláriomínimos 28,6%

Mais de 2 a 3 salários mínimos 10,0%

Mais de 3 a 5 salários mínimos 9,4%

Mais de 5 a 10 salários mínimos 5,9%

Mais de 10 a 20 salários mínimos 2,2%

Mais de 20 salários mínimos 0,8%

Sem rendimento 11,5%

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento,

Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2005.

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Caso a LDA seja aplicada de forma a favorecer tão-somente os interesses privados, teremos a perpetuação da miserabilidade brasileira, já que quase 59% da população brasileira ganha ATÉ 2 salários mínimos, e 11% da população não tem rendimentos.

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Embora estas situações de fato e os direitos fundamentais e sociais devam ser levados em conta quando da aplicação de qualquer norma, dentre elas a LDA, nem sempre isso ocorre.

Caso IDCID versus ABDR: Ação Civil Pública com pedido de liminar proposta em São Paulo.

O Juiz da causa e o TJSP consideraram que a ABDR não praticou qualquer abuso contra professores e estudantes brasileiros.

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Há espaços para o Ministério Público atuar no campo dos DPI em favor da população brasileira?

Caso State of New York versus GlaxoSmithKline

O Ministério Público de Nova Iorque ajuizou ações contra algumas indústrias farmacêuticas locais que, fraudulentamente, inflaram os preços de medicamentos para tratamento do câncer. E tais abusos foram possíveis em decorrência da existência de patentes sobre tais medicamentos.

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Solução para os desequilíbrios atuais:

Criação de varas especializadas de

PI e capacitação de alto nível para Juízes, Desembargadores e membros do Ministério Público em DPI.

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Entretanto, não é qualquer capacitação que trará os benefícios sociais e econômicos desejados e perseguidos

pelo Brasil: Devemos nos afastar dos programas de

capacitação organizados ou patrocinados por órgãos/empresas privadas e estimular programas que explorem a interface PI/direitos humanos e PI/livre concorrência.

Obs.: Exemplo da história da PI nos EUA e o papel do Judiciário voltado às necessidades deste país.

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Observações Finais :

O sistema de PI atualmente é desequilibrado e tendencioso, podendo gerar uma ruptura no tecido social do Brasil, ao inviabilizar o acesso amplo a medicamentos, a materiais educativos, entretenimento, enfim, aos instrumentos de desenvolvimento material e intelectual humano.

Porém, tanto o Poder Judiciário quanto o Ministério Público brasileiros podem e devem atuar, conjuntamente ou em separado, de forma a redimensionar os DPI.

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E isto deve ser feito com o objetivo de alcançarmos a “Igualdade” defendida por Rui Barbosa”:

“ A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. (...) Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real.

Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se eqüivalessem.

Esta blasfêmia contra a razão e a fé, contra a civilização e a humanidade, é a filosofia da miséria, proclamada em nome dos direitos do trabalho; e, executada, não faria senão inaugurar, em vez da supremacia do trabalho, a organização da miséria.”

(trecho da Oração aos Moços, Rui Barbosa)

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