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Relatório de Estágio Pr
2009/2010
Nilza Carvalho Pinto
rofissionalizante em Medicina Comunitária
Abril, 2010
Relatório de Estágio ProNilza Carvalho Pinto
ofissionalizante em Medicina Comunitária
Mestrado Integrado em Medicina
Área: Medicina Comunitária
Trabalho efectuado sob a Orientação de:
Dra. Maria João Sena EstevesDra. Maria João Sena Esteves
Abril, 2010
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1
RESUMO
No presente relatório de estágio profisionalizante descrevem-se as actividades
desenvolvidas no âmbito da Unidade Curricular (UC) de Medicina Comunitária do 6º ano
do Mestrado Integrado em Medicina, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.
O interesse nos Cuidados de Saúde Primários (CSP), especificamente a prestação de
cuidados de saúde a idosos, motivou a escolha do tema do relatório.
O estágio decorreu entre 17 de Fevereiro e 12 de Março de 2010, inicialmente no Centro
de Saúde de Miranda do Douro (CSMD), Módulo Rural, e posteriormente no Centro de
Saúde São João (CSSJ), Porto, Módulo Urbano.
Os objectivos do relatório são caracterizar ambos os Centros de Saúde (CS); descrever as
actividades realizadas; avaliar o apoio domiciliário médico prestado e caracterizar a
população de utentes idosos do CSSJ que recebe apoio domiciliário de enfermagem.
Assim, em ambos os CS foram caracterizadas a população de utentes e os recursos
disponíveis, nomeadamente humanos, actividades desenvolvidas, sistemas de informação e
articulação com o exterior.
As actividades realizadas consistiram no acompanhamento do dia-a-dia de médicos de
família e de outros profissionais de saúde, elaboração de trabalhos propostos pela UC e
ainda dois estudos complementares. O primeiro acerca das visitas domiciliárias médicas
realizadas nos CS durante 2009 e o segundo sobre o grau de dependência dos idosos a
receber apoio domiciliário de enfermagem pelo CSSJ.
O estágio constitui uma excelente oportunidade formativa e de contacto aprofundado com
os CSP, permitindo a consciencialização de questões actuais, nomeadamente o
envelhecimento e a perda de autonomia.
2
ABSTRACT
The following report describes the activities performed during the internship of
Community Medicine, included in the 6th year’s Master Degree of Medicine from the
Faculty of Medicine, University of Porto.
The interest in Primary Care (PC), specifically health care provided to the elderly,
motivated the choice of this theme.
The residence took place in two Health Centers (HC), from February 17th and March 12th
2010, firstly at Centro de Saúde de Miranda do Douro (CSMD), Rural Module, and then at
Centro de Saúde São João (CSSJ), Porto, Urban Module.
The report’s goals are to characterize both HC; to describe the performed activities; to
evaluate HC’s medical home visits and to characterize CSSJ’s elderly population provided
with nursing homecare.
Therefore, at both HC the patient’s population was described as well as the available
resources, namely human resources, developed activities, information systems and referral
to other institutions.
The activities performed during the residence consisted mainly in accompanying family
physicians and other health care professional’s routine, completing internship’s
assignments and also performing two additional studies: the first about medical home visits
during 2009 in both HC and the second about the dependency degree of the elderly
receiving nursing homecare from CSSJ.
This internship was an excellent opportunity to learn and to increase the practical
knowledge about PC, enhancing my awareness about current issues, namely aging and
autonomy loss.
3
ÍNDICE
Índice ................................................................................................................................ 3
1. Introdução ................................................................................................................. 8
1.1. Enquadramento .................................................................................................. 8
1.2. Motivação e Oportunidade ................................................................................. 8
1.3. Objectivos do trabalho ....................................................................................... 9
2. Caracterização dos Centros de Saúde ......................................................................... 10
2.1. Centro de Saúde de Miranda do Douro – Caracterização Geral .......................... 10
2.2. Centro de Saúde São João – Caracterização Geral .............................................. 11
2.3. População Inscrita ................................................................................................ 13
2.3.1. Centro de Saúde de Miranda do Douro ........................................................ 13
2.3.2. Centro de Saúde São João ............................................................................ 14
2.4. Recursos dos Centros de Saúde ........................................................................... 16
3. Descrição das Actividades .......................................................................................... 21
3.1. Módulo Rural ....................................................................................................... 21
3.2. Módulo Urbano .................................................................................................... 22
3.3. Tarefas Complementares .................................................................................... 23
4. Conclusões .................................................................................................................. 24
5. Bibliografia ................................................................................................................. 25
Apêndice I – Cronograna do estágio …………………………………………………. 27
Apêndice II – Fluxograma: Suspeita de negligência em crianças e jovens …………..29
Apêndice III – História Clínica ……………………………………………………….30
4
Apêndice IV – Visita à UCCI ………………………………………………………….42
Apêndice V – Reflexão: Negligência nos idosos ………………………………………45
Apêndice VI – Panfleto: Prevenção de úlceras de pressão …………………………….51
Apêndice VII - Visita aos SAOM ……………………………………………………..53
Apêndice VIII – Estudo complementar: Visitas domiciliárias médicas no CSMD e CSSJ
durante 2009 …………………………………………………………………………. 56
Apêndice IX – Estudo complementar: Grau de dependência dos idosos a receber apoio
domiciliário de enfermagem pelo CSSJ……………………………………………….60
5
LISTA DE SIGLAS
ACES Agrupamento de Centros de Saúde
ARSN Administração Regional de Saúde do Norte
CS Centro de Saúde
CSMD Centro de Saúde de Miranda do Douro
CSP Cuidados de Saúde Primários
CSSJ Centro de Saúde de São João
DGS Direcção Geral de Saúde
ECCI Equipa de Cuidados Continuados Integrados
ECL Equipa Coordenadora Local
ECR Equipa Coordenadora Regional
FMUP Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
INEM Instituto Nacional de Emergência Médica
MAPA Monitorização Ambulatória da Pressão Arterial
MGF Medicina Geral e Familiar
PASSE 3 Programa de Alimentação Saudável e Saúde Escolar
RNCCI Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados
RSP Região de Saúde Pública
RSPN Região de Saúde Pública do Norte
SAOM Serviços de Assistência Organizações de Maria
SBV Suporte Básico de Vida
UCC Unidade de Cuidados na Comunidade
UCSP Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados
URAP Unidade Recursos Assistenciais Partilhados
USP Unidade Saúde Pública
6
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Organigrama hierárquico do CSMD. .............................................................. 11
Figura 2. Organigrama do CSSJ. .................................................................................... 13
Figura 3. Pirâmide etária do CSMD. .............................................................................. 14
Figura 4. Pirâmide etária do CSSJ. ................................................................................. 15
7
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Recursos humanos disponíveis no CSMD e no CSSJ. ................................... 17
Tabela 2. Actividades desenvolvidas pelo CSMD e CSSJ. ............................................ 18
Tabela 3. Sistemas de Informação utilizados no CSMD e no CSSJ .............................. 19
Tabela 4: Instituições com as quais o CMD e o CSSJ se articulam. .............................. 20
8
1. INTRODUÇÃO
1.1. ENQUADRAMENTO
O Estágio Profissionalizante em Medicina Comunitária – Prática Clínica decorreu entre 17
de Fevereiro e 12 de Março de 2010, estando dividido em dois módulos:
• Módulo Rural: decorrido no Centro de Saúde de Miranda do Douro (CSMD) de 17
a 27 de Fevereiro, sob a tutorização do Dr. Armando Parreira;
• Módulo Urbano: no Centro de Saúde São João (CSSJ) de 1 a 12 de Março, sob a
orientação da Dra. Maria João Sena Esteves.
1.2. MOTIVAÇÃO E OPORTUNIDADE
O reconhecimento da importância dos Cuidados de Saúde Primários (CSP) no contexto de
um Sistema de Saúde constitui matéria de importância crucial para um aluno finalista de
Medicina.
Os CSP são habitualmente o primeiro ponto de contacto do utente com o sistema de saúde.
O Médico de Família é primariamente responsável pela prestação de cuidados abrangentes
e continuados a qualquer indivíduo que o procure, independentemente da idade, sexo ou
afecção. A abordagem é centrada na pessoa e tem em conta o contexto da sua família,
comunidade e cultura. A relação terapêutica desenvolve-se em no âmbito da consulta, ao
longo do tempo, e os cuidados são prestados em continuidade, de acordo com as
necessidades específicas do utente em cada fase da sua vida. O Médico de Família
coordena os cuidados prestados aos seus pacientes por outros profissionais no contexto dos
CSP, ou de outras especialidades, ao assegurar que os pacientes recorram ao profissional
de saúde mais apropriado ao seu problema específico.1,2
9
Pelo papel abrangente e unificador dos CSP na Medicina escolhi a residência em Medicina
Comunitária como tema para o Projecto de Opção. Nesta área tão vasta, desenvolvi tarefas
complementares acerca da prestação de cuidados de saúde a idosos, no sentido de
aprofundar conhecimentos.
1.3. OBJECTIVOS DO TRABALHO
• Caracterizar os centros de saúde (CS) onde decorreu o estágio, destacando as suas
semelhanças e diferenças;
• Descrever as actividades realizadas durante o Módulo Rural e o Módulo Urbano;
• Descrever o apoio domiciliário médico prestado em ambos os CS;
• Caracterizar a população de utentes idosos do CSSJ que recebe apoio domiciliário
de enfermagem.
10
2. CARACTERIZAÇÃO DOS CENTROS DE SAÚDE
2.1. CENTRO DE SAÚDE DE MIRANDA DO DOURO – CARACTERIZAÇÃO
GERAL
O Centro de Saúde de Miranda do Douro (CSMD) localiza-se no concelho de Miranda do
Douro, distrito de Bragança. O concelho tem 8085 habitantes, distribuídos por 17
freguesias e 15 lugares. A densidade populacional é de 16,56 habitantes /Km2, uma das
mais baixas do distrito e do país (115 habitantes/km2).3
O CSMD integra-se administrativamente no Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do
Nordeste, fazendo parte da Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN).
O CSMD tem a sua sede no centro de Miranda do Douro e três extensões em Sendim,
Palaçoulo e S. Martinho de Angueira. Existe também uma unidade móvel, criada em
parceria com a Santa Casa da Misericórdia e com a Câmara Municipal, que presta cuidados
de saúde a aglomerados populacionais mais isolados.
A sede funciona em instalações modernas e funcionais de segunda a sexta-feira, das 8 às
20h. A Consulta Aberta, destinada a situações urgentes, funciona 24h por dia.4
Na Figura 1 encontra-se o organigrama hierárquico do CSMD.
11
Figura 1: Organigrama hierárquico do CSMD.
Fonte: Manual da Qualidade do CSMD.
RNCCI: Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados; ECR: Equipa Coordenadora Regional, ECL: Equipa Coordenadora Local;
RSPN: Região de Saúde Pública do Norte; RSP: Região de Saúde Pública; ECCI: Equipa de Cuidados Continuados Integrados; UCC:
Unidade de Cuidados na Comunidade; UCSP: Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados; URAP: Unidade de Recursos
Assistenciais Partilhados; USP: Unidade Saúde Pública.
2.2. CENTRO DE SAÚDE SÃO JOÃO – CARACTERIZAÇÃO GERAL
O Centro de Saúde São João, inaugurado em Julho de 1999, foi criado a partir de um
Protocolo de Acordo de Cooperação celebrado entre a ARSN e a FMUP, denominado
“Projecto Tubo de Ensaio”.5
O objectivo do acordo era iniciar a administração convencionada de um CS e deste modo:
1) assegurar a prestação de CSP a uma população de até 25 mil utentes do Serviço
Nacional de Saúde;
2) constituir um espaço de formação pré e pós-graduada destinada aos profissionais dos
CSP ;
12
3) desenvolver projectos inovadores no âmbito da Administração de Saúde, de
Administração dos Serviços de Saúde e da Prestação de Cuidados de Saúde.6
O protocolo, entretanto renovado, consagra também a investigação científica em áreas
biomédicas como um outro objectivo do projecto.5
O CSSJ localiza-se na freguesia de Cedofeita, concelho do Porto. O distrito possui uma
densidade populacional muito elevada (774 habitantes/km2), superior à média de Portugal
continental.3
O CSSJ inclui-se no ACES do Grande Porto VI – Porto Ocidental. No início não teve uma
área de influência limitada, podendo receber utentes independentemente da sua área de
residência, no entanto as novas inscrições, assim como as visitas domiciliárias, limitam-se
a utentes residentes na cidade do Porto. A maioria dos utentes (73,91%) reside no concelho
do Porto, sobretudo nas freguesias mais próximas do CSSJ, Cedofeita e Massarelos.
As instalações possuem boa acessibilidade por transportes públicos. O acesso por veículo
próprio é dificultado pelas dificuldades de aparcamento.
O atendimento decorre de segunda a sexta-feira das 8 às 20h, também com atendimento de
situações urgentes (Consulta Aberta).
Actualmente, o CSSJ está organizado segundo o organigrama funcional representado na
Figura 2.
13
Figura 2. Organigrama do CSSJ.
Fonte: Dados administrativos do CSSJ.
2.3. POPULAÇÃO INSCRITA
2.3.1. CENTRO DE SAÚDE DE MIRANDA DO DOURO
No CSMD, em Dezembro de 2009 estavam inscritos 8179 utentes.
Pela análise da pirâmide etária (Figura 3), é possível perceber que se trata de uma
população muito envelhecida, com predomínio das faixas etárias acima dos 70 anos.
Verifica-se um visível estreitamento no grupo etário dos 0 aos 14 anos, traduzindo uma
diminuição de natalidade.
14
O Índice de Envelhecimento, representando o quociente entre a população idosa (≥ 65
anos) e a população jovem (0 – 14 anos) é, como esperado, elevado, obtendo-se o valor de
300,3 %.
A distribuição de utentes por género é bastante equilibrada, sendo que a percentagem de
utentes inscritos do sexo masculino é 49,1% e do sexo feminino é 50,9%.
Figura 3. Pirâmide etária do CSMD.
Fonte: Manual da Qualidade do CSMD
2.3.2. CENTRO DE SAÚDE SÃO JOÃO
O CSSJ possuía, em Dezembro de 2009, uma população inscrita de 20034 utentes,
abrangendo um total de 200 freguesias do Norte de Portugal.
Pela análise da pirâmide etária dos utentes inscritos (Figura 4) é possível verificar a
preponderância de alguns grupos etários, nomeadamente dos 30 aos 39 anos.
107118
154183
223289
242226
201274267
254288296
344697
116 143
172 179
212 292 281 264
235 264
300 217
245 270
286 540
800 600 400 200 0 200 400 600 800
00-0405-0910-1415-1920-2425-2930-3435-3940-4445-4950-5455-5960-6465-6970-74>=75
Homens Mulheres
15
Dos utentes inscritos, 44,1% são do sexo masculino e 55,9% são do sexo feminino. O
predomínio feminino é evidenciado nos grupos etários acima dos 60 anos, reflectindo a
maior esperança de vida nas mulheres.
O Índice de Envelhecimento da população de utentes do CSSJ é de129,6%.
Figura 4. Pirâmide etária do CSSJ.
Fonte: Dados administrativos.
Pela comparação das pirâmides etárias percebe-se que, sobretudo nas faixas etárias mais
altas, há um predomínio do sexo feminino. Ambas as populações acompanham a tendência
nacional de população em envelhecimento, verificando-se um estreitamento da base, e um
alargamento do topo, mais marcado na população de utentes do CSMD.
481482
426429
613878
985917
777744
705731
782527516
1211
426 511
457 404
456 612
830 861
675 600 570 574
501 399
333 621
1.000 500 0 500 1.000 1.500
00-0405-0910-1415-1920-2425-2930-3435-3940-4445-4950-5455-5960-6465-6970-74>=75
Homens Mulheres
16
2.4. RECURSOS DOS CENTROS DE SAÚDE
O CSMD é a única unidade prestadora de cuidados de saúde em todo o concelho,
possuindo vários recursos para suprir as necessidades da população.
O CSSJ, localizado no centro do Porto, encontra-se na proximidade de várias unidades de
saúde, pelo que não possui tantas valências.
Os recursos humanos existentes nos dois CS estão representados na Tabela 1. De notar que
o CSSJ não possui um quadro próprio, sendo as relações contratuais estabelecidas com a
FMUP.
O número de utentes por médico no CSSJ é de 2003, enquanto no CSMD é de 1635.
17
Tabela 1. Recursos humanos disponíveis no CSMD e no CSSJ.
Recursos Humanos CSMD CSSJ
Médicos de família 5 Médicos 10 Médicos
Enfermeiros 15 Enfermeiros 16 Enfermeiros (em
regime de part-time)
Assistentes Técnico-
Admininistrativos
12 Administrativos 6 Administrativos
Assistentes
Operacionais
9 Assistentes 2 Assistentes
Outros 1 Psicólogo 2 Psicólogos
1 Podologista 1 Podologista
1 Médica Dentista 0
1 Médica Fisiatra 0
1 Técnica Superior
Assessora Principal de
Serviço Social
0
1 Técnico de Saúde
Ambiental
0
1 Técnico de Radiologia 0
1 Técnico de
Cardiopneumologia
0
1 Técnica de Terapia da
Fala
0
1 Fisioterapeuta 0
1 Nutricionista 0
Formação 1 Interna de MGF 7 Internos de MGF
0 1 Interno de Pediatria
Alunos do 6º ano da
FMUP
Alunos do 6º ano da
FMUP
0 Estagiários de Psicologia
Alunos de Enfermagem 0
Fonte: Manual da Qualidade do CSMD e dados administrativos do CSSJ.
18
As actividades desenvolvidas por cada um dos CS podem ser consultadas na Tabela 2.
Tabela 2. Actividades desenvolvidas pelo CSMD e CSSJ.
ACTIVIDADES CSMD CSSJ
Planeamento e Controlo Sim Sim
Sector Administrativo Sim Sim
Consulta Programada Sim Sim
Consulta Não
Programada
Sim Sim
Consulta Aberta Sim (24h por dia) Sim (das 8h às 20h)
Consulta de Psicologia Sim Sim
Consulta de Podologia Sim Sim
Visitas ao Domicílio Sim Sim (apenas área do Porto)
Enfermagem Sim (consulta e serviço de
enfermagem)
Sim (serviço de
enfermagem)
Serviço de Saúde Pública Sim (Delegado de Saúde) Sim (integrado no ACES
Grande Porto VI)
Serviço Social Sim (Técnica dependente do
ACES Nordeste)
Sim (integrado no ACES
Grande Porto VI)
Saúde Ambiental Sim Não
Fisioterapia Sim Não
Telemedicina Sim Não
Radiologia Sim Não
Saúde Oral Sim Não
Cardiopneumologia Sim Não
Nutricionismo Sim Não
Terapia da Fala Sim Não
Consulta de Cessação
Tabágica
Sim Sim
Consulta de Alcoologia Sim Não
Centro de Atendimento a
Jovens
Sim ( parceria com a
Câmara Municipal)
Não
Fonte: Manual da Qualidade do CSMD e dados administrativos do CSSJ.
19
Tanto o CSMD como o CSSJ dão resposta a todos os Programas do Plano Nacional de
Saúde e da DGS para os Cuidados de Saúde Primários (Circulares Normativas e
Orientações Técnicas). Ambos possuem Consultas Programadas no âmbito de Saúde do
Adulto, Saúde do Idoso, Saúde Materna, Saúde Infantil/Juvenil, Planeamento Familiar,
Hipertensão Arterial, Diabetes Mellitus e Vigilância Oncológica.
Os meios de registo e suporte de informação utilizados nos dois centros de saúde
encontram-se explicitados na Tabela 3.
Tabela 3. Sistemas de Informação utilizados no CSMD e no CSSJ
SISTEMA DE
INFORMAÇÃO
CSMD CSSJ
SINUS I© Sim Sim
SAM© Sim Sim
SAPE© Sim Sim
Alert P1© Sim Sim
HÍGIA© Não Sim
Diabcare Data for
Windows©
Não Sim
Arquivo em Papel A ser descontinuado Apenas para documentos
relevantes
Fonte: Manual da Qualidade do CSMD e dados administrativos do CSSJ.
O HÍGIA© é um programa utilizado no CSSJ que permite a elaboração de registos
médicos segundo o método de Weed (Registo Médico Orientado por Problemas).
Em termos de articulação com o exterior o CSMD e o CSSJ enviam e recebem utentes das
seguintes instituições enunciadas na Tabela 4.
20
Tabela 4: Instituições com as quais o CMD e o CSSJ se articulam.
CSMD CSSJ
• Centro Hospitalar do Nordeste,
Unidade Hospitalar de Bragança;
• Centro Hospitalar do Porto,
composto pelo Hospital de Santo
António , Maternidade Júlio Dinis
e o Hospital Central Especializado
de Crianças Maria Pia;
• Hospital de São João;
• Instituto Português de Oncologia
do Porto - Francisco Gentil.
• Centro Hospitalar do Porto,
composto pelo Hospital de Santo
António, Maternidade Júlio Dinis e
o Hospital Central Especializado de
Crianças Maria Pia;
• Hospital Magalhães de Lemos;
• Hospital da Prelada;
• Instituto Português de Oncologia
do Porto - Francisco Gentil;
• Hospital Joaquim Urbano.
Fonte: Manual da Qualidade do CSMD e dados administrativos do CCSJ.
A referenciação de utentes para a Consulta Externa hospitalar efectua-se, na maioria dos
casos, de modo informático através do programa Alert P1.
O CSMD dispõe de uma ambulância de Suporte Básico de Vida (SBV) do Instituto
Nacional de Emergência Médica (INEM) sediada nas suas instalações.
21
3. DESCRIÇÃO DAS ACTIVIDADES
Como complemento teórico do estágio em Medicina Comunitária tive a oportunidade de
assistir a dois seminários introdutórios.
Assisti ao primeiro destes seminários a 18 de Janeiro de 2010. A sessão foi leccionada pela
Prof. Dra. Luciana Couto e consistiu na apresentação da Unidade Curricular.
O segundo seminário decorreu no dia 1 de Março de 2010. Foi apresentado pelo Dr.
Henrique Viana e o tema foi o Envelhecimento.
O cronograma das actividades desenvolvidas durante o estágio encontra-se no Apêndice I.
3.1. MÓDULO RURAL
Durante o Módulo Rural tive oportunidade de acompanhar consultas de Medicina Geral e
Familiar, decorridas tanto na sede do CSMD, como na extensão do Palaçoulo.
Pude conduzir Consultas Programadas e Consultas Abertas de forma tutelada.
Numa das consultas pude contactar com a avó de três crianças em provável situação de
risco, o que me motivou a elaborar o fluxograma “Negligência em Crianças e Jovens”, que
se encontra no Apêndice II.
No âmbito das actividades de enfermagem pude acompanhar consultas, serviços e visitas
domiciliárias. As últimas afiguraram-se uma das experiências mais interessantes do
estágio, pois permitiram-me contactar directamente com a realidade social do concelho e
com a problemática dos idosos dependentes.
Assisti a consultas para avaliação da aptidão física e mental para a renovação da Carta de
Condução de Pesados, sob a responsabilidade do Delegado de Saúde.
22
Acompanhei o Técnico de Saúde Ambiental na recolha de amostras de água de um
fontanário público, para posterior análise química global no Laboratório de Saúde Pública
de Bragança.
Assisti a uma Consulta de Psicologia, para avaliação de suspeita de Dificuldades na
Aprendizagem numa criança de 6 anos.
Acompanhei a Técnica de Assistência Social numa consulta na Extensão de Sendim e em
domicílios. Durante este período colhi uma história clínica (Apêndice III) que me permitiu
conhecer e aplicar ferramentas de avaliação familiar.
Na escola Escola Básica do 1º Ciclo de Miranda do Douro assisti a duas sessões de
formação do PASSE 3 (Programa de Alimentação Saudável e Saúde Escolar), conduzidas
pela psicóloga e uma enfermeira do CSMD.
Por fim, pude visitar a Unidade de Cuidados Continuados Integrados de Longa Duração e
Manutenção Santa Maria Maior de Miranda do Douro. Foi uma experiência enriquecedora,
cuja descrição pode ser encontrada no Apêndice IV.
3.2. MÓDULO URBANO
A actividade predominante durante a Valência Urbana foi o acompanhamento de consultas,
tanto Programadas como Não Programadas e Abertas.
A possibilidade de realizar Consulta Aberta tutelada foi muito proveitosa, estimulando a
minha autonomia, capacidades de colheita de história clínica e execução de exame físico.
Pude discutir vários casos clínicos e sociais.
Acompanhei profissionais de enfermagem, colaborei na realização de electrocardiogramas
e na colocação de aparelhos para Monitorização Ambulatória de Pressão Arterial (MAPA).
Apliquei injectáveis e executei pensos segundo técnicas assépticas.
Desloquei-me ao domicílio de um idoso dependente, para avaliação da evolução de
pneumonia. Os cuidados de que era alvo suscitaram-me o interesse para a reflexão
23
“Negligência nos Idosos” e para o panfleto “Prevenção de Úlceras de Pressão”, que podem
ser consultados nos Apêndices V e VI respectivamente.
Pude visitar as instalações dos Serviços de Assistência Organizações de Maria (SAOM), o
que constituiu um momento muito interessante do estágio. A sua descrição pode ser
encontrada do Apêndice VII.
3.3. TAREFAS COMPLEMENTARES
De modo a enriquecer a experiência da residência em Medicina Comunitária, procedi ao
estudo das visitas domiciliárias médicas realizadas no CSMD e no CSSJ durante o ano
2009, esta actividade pode ser encontrada no Apêndice VIII.
Realizei também um estudo acerca do grau de dependência dos idosos a receber apoio
domiciliário de enfermagem pelo CSSJ, que pode ser consultado no Apêndice IX.
24
4. CONCLUSÕES
O estágio apresentou-se como uma excelente oportunidade de, pela primeira vez, contactar
mais aprofundada e informadamente com a realidade dos Cuidados de Saúde Primários e
da Medicina Geral e Familiar. Todos os objectivos propostos foram atingidos.
Foi-me proporcionada a oportunidade de aperfeiçoar aptidões técnicas e teóricas e
trabalhar a empatia e o raciocínio clínico, encarando cada utente como único em todas as
suas componentes, biológica, psicológica e social.
O contacto com as duas realidades diferentes, rural e urbana, permitiu-me tomar
consciência de algumas das questões prementes da MGF actual, nomeadamente o
envelhecimento populacional e a prestação de cuidados de qualidade a idosos dependentes.
Estes temas foram explorados nas tarefas complementares efectuadas.
25
5. BIBLIOGRAFIA
[1] Definição Europeia de Medicina Geral e Familiar (Clínica Geral/Medicina Familiar).
WONCA Europa 2002. Disponível em:
http://www.woncaeurope.org/Web%20documents/European%20Definition%20of%20fami
ly%20medicine/European%20Definition%20in%20Portuguese.pdf
[2] McWhinney, IR. Manual de Medicina Familiar. Ed. Inforsalus, Lisboa, 1994.
[3] Instituto Nacional de Estatística. Censos 2001- XIV Recenseamento Geral da
População/ IV Recenseamento Geral da Habitação. Disponível em:
http://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=censos_historia_pt_2001
[4] João A, Horta A, Parreira A, Rijo D, Sousa I, Marcos N, et al. Manual da Qualidade.
Centro de Saúde de Miranda do Douro, Janeiro 2010.
[5] Hespanhol A. Malheiro A, Pinto AS. O Projecto “Tubo de Ensaio”. Breve história do
Centro de Saúde São João. Rev Port Clin Geral 2002; 18: 171-86.
[6] Hespanhol, AP. Um novo modelo de remuneração dos Médicos em uso no Centro de
Saúde São João (Porto). Rev Port Clin Geral 2005; 21: 81-9.
.
27
APÊNDICE I
CRONOGRAMA DO ESTÁGIO
MÓDULO RURAL – CENTRO DE SAÚDE DE MIRANDA DO DOURO
Primeiro seminário: 18 de Janeiro
Data
17/02 18/02 19/02
Act
ivid
ades
Manhã
Consulta
Enfermagem Consulta
Tarde
Consulta aberta
Visita às instalações
do Centro de Saúde
Discussão de
Casos Clínicos de Radiologia
Delegação de Saúde –
Avaliação para
renovação de carta de
condução de pesados
Data
22/02 23/02 24/02 25/02 26/02
Act
ivid
ades
Manhã
Acompanhamento do
Técnico de Saúde
Ambiental
Consulta (Extensão
do Palaçoulo)
Domicílios de
Enfermagem
Acompanhamento da
Técnica de Assistência
Social (Extensão de
Sendim; domicílios)
Consulta
Tarde
Consulta
Consulta de Psicologia
Sessões do PASSE 3
(escola EB1 de Miranda do Douro)
Visita à UCCI de
Longa Duração e
Manutenção
Avaliação
28
MÓDULO URBANO – CENTRO DE SAÚDE SÃO JOÃO
Data
01/03 02/03 03/03 04/03 05/03
Act
ivid
ades
Manhã
Segundo seminário
Consulta
Visita às instalações do CSSJ
Enfermagem Consulta Consulta
Tarde
Visita aos SAOM
Data
08/03 09/03 10/03 11/03 12/03
Act
ivid
ades
Manhã
Consulta Enfermagem Consulta
Consulta Consulta
Tarde
29
APÊNDICE II
FLUXOGRAMA: SUSPEITA DE NEGLIGÊNCIA EM CRIANÇAS E JOVENS AO NÍVEL DOS CENTROS DE SAÚDE
Adaptado de: Direcção Geral da Saúde. “Maus tratos em Crianças e Jovens – Intervenção da Saúde”. Lisboa. Outubro de 2007.
30
APÊNDICE III
HISTÓRIA CLÍNICA
INTRODUÇÃO
A presente história clínica inclui-se nas actividades desenvolvidas durante no módulo rural
do estágio em Medicina Comunitária.
A sua colheita foi acompanhada pela Técnica Superior de Assistência Social do Centro de
Saúde de Miranda do Douro (CSMD) e decorreu na manhã do dia 25 de Fevereiro de 2010,
inicialmente na extensão de Sendim do CSMD e num segundo momento no domicílio da
utente.
Esta apresentou-se extremamente colaborante e orientada e foi muito receptiva à visita ao
seu domicílio.
A informação recolhida foi obtida através da entrevista clínica e da consulta do processo
clínico da utente.
IDENTIFICAÇÃO
Nome: Nazaré C. E.
Sexo: Feminino
Data de nascimento: 14/05/1954 (55 anos)
Naturalidade: Malhadas/Miranda do Douro
Residência: Sendim /Miranda do Douro
Estado Civil: “Viúva” (o seu companheiro faleceu há 2 anos)
Escolaridade: Analfabeta
Profissão: Desempregada
Etnia: Cigana
31
ANTECEDENTES PESSOAIS
DOENÇAS ANTERIORES:
Hipertensão arterial diagnosticada em 1996. Em 2004 verificou-se a etiologia renal
(Síndrome de Alport).
Gota diagnosticada há cerca de 10 anos.
Hipercolesterolemia diagnosticada há menos de 10 anos.
Vítima de violência doméstica, inicialmente relatada em 2005.
INTERNAMENTOS E CIRURGIAS ANTERIORES:
Um internamento no Centro de Saúde de Miranda do Douro em 1999 por crise
hipertensiva. Nega outros internamentos. Nega cirurgias.
TRANSFUSÕES, TRAUMATISMOS OU ACIDENTES GRAVES:
Nega transfusões. Relato de um acidente doméstico com um machado em 2003.
Traumatismos na cabeça e dorso infligidos pelo marido entre 2005 e 2007.
MEDICAÇÃO HABITUAL:
• Ramipril 5 mg;
• Alopurinol 300 mg
• Nifedipina 20 mg;
• Furosemida 40 mg;
• Sinvastatina 20 mg;
• Esomeprazole 40 mg;
• Paracetamol + Tiocolquicosido 500mg+2mg em SOS;
• Paracetamol 1g em SOS.
HÁBITOS E ESTILOS DE VIDA:
Nega hábitos tabágicos. Hábitos alcoólicos ocasionais.
32
Dieta pouco cuidada. Afirma nem sempre ter disponibilidade financeira para comprar
alimentos. Nega prática de exercício físico.
IMUNIZAÇÕES:
Não soube esclarecer se o seu Plano Nacional de Vacinação se encontrava actualizado.
HISTÓRIA GINECOLÓGICA E OBSTÉTRICA:
Sete gestações e sete partos eutócicos, não assistidos. Nega complicações durante o parto
ou complicações puerperais.
Vários episódios de vaginoses bacterianas. Acompanhamento irregular por Ginecologia no
Hospital de Bragança.
ACTIVIDADES PROFISSIONAIS E/OU OCUPACIONAIS:
Até começar a viver maritalmente com o primeiro companheiro Nazaré vivia com os pais e
trabalhava com os familiares no comércio de animais.
Após engravidar deixou de trabalhar, passando a dedicar-se exclusivamente à família.
Menciona ter frequentado juntamente com o segundo companheiro um curso de
alfabetização há mais de 10 anos atrás.
ANTECEDENTES FAMILIARES
Pai: Não sabe precisar a causa do seu falecimento.
Mãe: Faleceu por patologia renal que a utente não soube nomear.
Irmãos: Uma das irmãs (M.G.) tem patologia renal, hipercolesterolemia e hiperuricemia.
Os outros irmãos são aparentemente saudáveis.
Filhos: Uma das filhas (M.F.E.) tem patologia renal cujo nome a utente que não sabe
precisar. Nega patologias dos restantes filhos.
33
Sobrinhos: A. é transplantado renal e S. sofre de patologia renal. Desconhece outras
patologias.
GENOGRAMA
Legenda:
BIOGRAFIA:
Nazaré nasceu a 14/05/1954 em Malhadas, concelho de Miranda do Douro, filha de J.A. e
N.C.J. Refere que a relação entre os seus progenitores era bastante conflituosa. Acrescenta
que não era muito próxima dos seus pais.
JA NCJ
X Y MG D NCE P SH
ATC AE MFE
D. 2007
C
Z IAM AAEM W
M
AN SL
J
N1 N2
A
N3 N4
Casamento
Relação assumida (longo
prazo)
Relação assumida e
separaçãoIndivíduo com patologia renal
Fonte (Nazaré)
Agregado familiar
Masculino Feminino Falecimento
O
O1 O2
34
O meio de subsistência da família consistia na venda de “bestas”(sic), pelo que Nazaré
passou a sua infância e adolescência entre Portugal e Espanha. Refere boa relação com os
seus 6 irmãos.
Aos 27 anos passou a viver maritalmente com H., com o qual teve 3 filhos: A.C.T., A.E. e
M. F.E.
Terminou o relacionamento com H. aos 30/31 anos.
Iniciou seguidamente uma relação com C.A.M., seu companheiro por mais de 20 anos.
Relata que C. era “muito mau”(sic) : “batia-me muito nas costas e na cabeça(…),
insultava-me e dizia que me matava”(sic); acrescenta que C. era alcoólico.
Durante o relato da relação com C. a utente ficou visivelmente emocionada. Refere que o
marido adoeceu há cerca de 4 anos atrás (patologia que atingiu os membros inferiores, cujo
nome não sabe precisar) e que nessa altura os maus tratos se intensificaram. C. faleceu há 2
anos.
Da relação com C. teve 4 filhos. Dois deles faleceram, o primeiro filho no período neonatal
e o quarto filho na sequência de um acidente de viação aos 7 anos de idade.
O segundo filho de C., I.A.M., é actualmente com quem Nazaré mantém uma relação mais
próxima. I. vive maritalmente com A., relação da qual têm 2 filhos. I. e A. têm
desentendimentos habituais e separam-se frequentemente por breves períodos.
Actualmente I. passa muito tempo com um dos filhos em casa de Nazaré (na sequência de
recente discussão e separação da actual companheira).
O terceiro filho de C., A.A.E.M., tem uma relação muito conflituosa com Nazaré. Aliás, a
utente já apresentou queixa contra o filho na Polícia por agressões físicas. Nazaré não tem
uma boa relação com a companheira de A.A.E.M. (O.), e com os filhos desta. O motivo do
desentendimento é a escritura de uma casa que Nazaré adquiriu para I.A.M.
Em relação aos filhos do primeiro relacionamento, Nazaré descreve uma relação de
bastante proximidade. A filha A.E. Foi criada numa instituição no Mogadouro. A.E.,
M.F.E., e A.C.T. visitam Nazaré com alguma periodicidade e demonstram preocupação
com o seu bem-estar.
35
Refere que a relação com a sua irmã S. era muito boa, mas que, por motivo que não sabe
explicar, se deteriorou após a morte do seu companheiro C. pelo que actualmente não se
falam.
Nazaré afirma gostar muito dos seus netos. Mantêm uma relação de maior proximidade
com os filhos de I.
Vive habitualmente só, em casa própria, com más condições de habitabilidade. A casa é
constituída por casa de banho (contém apenas uma sanita), cozinha, quarto e arrecadação.
A habitação tem várias infiltrações e não tem isolamento
Tem saneamento básico, água da rede pública e electricidade.
Refere nem sempre ter dinheiro para a alimentação ou para comprar lenha para
aquecimento (lareira).
Tem como fonte de subsistência o Rendimento Mínimo.
BIOPATOGRAFIA:
Nazaré nasceu a 14 de Maio de 1954.
Não soube precisar doenças da infância.
Entre 1980 e 1994 teve 7 gestações e 7 partos eutócicos, não assistidos, segundo a utente
sem complicações.
Em 1996 é-lhe pela primeira vez diagnosticada Hipertensão Arterial.
Em Fevereiro de 1999 descreve crise Hipertensiva que motivou internamento de 24 horas
no Centro de Saúde de Miranda do Douro. Na sequência desse internamento ter-lhe-à sido
feito o diagnóstico de Hipertensão Renovascular. Iniciou terapêutica com nifedipina.
Pouco depois, um estudo analítico de rotina demonstrou hiperuricemia, até então
assintomática. A utente apresentava também alterações da função renal. Iniciou queixas de
36
cervicalgias, investigadas com estudo imagiológico em que se verificava existir
compressão radicular ao nível de C3-C4.
Em Maio 1999 a hiperuricemia tornou-se sintomática. Iniciou alopurinol, terapêutica que
mantém até aos dias de hoje.
Em Junho de 1999 foi encaminhada para Medicina no Hospital de Bragança na sequência
de resultado de ecografia renal com dimensão moderadamente diminuída do rim direito
compatível com nefrosclerose. Avançou-se com o diagnóstico de Hipertensão secundária a
nefrosclerose familiar.
Em Dezembro de 1999 teve a primeira crise gotosa.
Durante o ano 2000 verificou-se um agravamento da função renal e em Setembro foi
pedida declaração de invalidez para obtenção do Rendimento Mínimo Garantido.
Em Fevereiro de 2001 teve nova crise gotosa e foi pedido um relatório da Junta de
Reforma.
Em 2002 teve agudização da deterioração da função renal.
No ano de 2003 desenvolveu edemas dos membros inferiores pelo que iniciou furosemida
(que mantém até à actualidade). Refere um acidente doméstico com um machado.
Em 2004 iniciou queixas de hipoacúsia. Foi-lhe diagnosticado Síndrome de Alport.
Em Julho de 2005 referiu pela primeira vez em consulta os maus tratos infligidos pelo
marido. Apresentava várias queixas físicas de cervicalgias, lombalgias e cefaleias.
Em Fevereiro de 2007 relatou outra desavença familiar.
Em Julho de 2007 apresentou-se com dorsalgias violentas na sequência de maus tratos pelo
marido.
No final de 2007 o marido faleceu consequência da doença prolongada que lhe afectava os
membros inferiores.
Em 2009, por queixas dispépticas, iniciou esomeprazole.
37
Durante os últimos 10 anos queixas frequentes e repetidas de poliartralgias, infecções do
trato urinário, otites, infecções ginecológicas, infecções respiratórias altas, conjuntivites e
cervicalgias.
Figura 1. Linha Temporal
MÉTODOS DE AVALIAÇÃO FAMILIAR:
HABITAÇÃO:
Refere-se descontente com a sua habitação.
PSICOFIGURA DE MITCHEL:
Não aplicável por Nazaré viver sozinha.
IAM
A
AAEM
CICLO DE VIDA FAMILI
A utente encontra-se na fase VII
Nesta fase é importante para Nazaré
isolamento no seu domicílio
APGAR FAMILIAR DE SM
Como Nazaré vive só foram considerados para a determinação
elementos da família com quem mantém laços afectivos mais intensos.
Nazaré deixou transparecer que não está propriamente satisfeita
a sua situação familiar. A soma de todos os itens resultou num Apgar de 5, isto é, família
com disfunção moderada.
CÍRCULO FAMILIAR DE
O Círculo Familiar descreve a perspectiva de N
periférica em relação ao centro, juntamente com o seu filho I.
relação de grande cumplicidade. Os filhos A.
IAM Nazaré
MFE
ATC
AE
CICLO DE VIDA FAMILIAR DE DUVALL:
Figura 2. Ciclo de Vida Familiar de Duvall
I – Familia sem filhos; II – Familia com filhos pequenos; III
idade escolar; IV – Familia com filhos adolescentes;VI –
jovens; VII – Familia na meia-idade; VIII – Familia idosa
e na fase VII, isto é, a fase de “ninho vazio” até à idade da reforma.
Nesta fase é importante para Nazaré encontrar novas actividades, de modo a evitar o
lio.
APGAR FAMILIAR DE SMILKSTEIN
Como Nazaré vive só foram considerados para a determinação do Apgar Familiar os
da família com quem mantém laços afectivos mais intensos.
Nazaré deixou transparecer que não está propriamente satisfeita, mas sim conformada com
a sua situação familiar. A soma de todos os itens resultou num Apgar de 5, isto é, família
CÍRCULO FAMILIAR DE THROWER
Figura 3. Círculo Familiar de Thrower.
amiliar descreve a perspectiva de Nazaré. A utente coloca-se numa posição
periférica em relação ao centro, juntamente com o seu filho I.A.M. com quem tem uma
relação de grande cumplicidade. Os filhos A.E., M.F.E, e A.T.C. embora
38
Ciclo de Vida Familiar de Duvall
Familia com filhos pequenos; III – Familia com filhos em
– Familia com filhos adultos
Familia idosa
a fase de “ninho vazio” até à idade da reforma.
novas actividades, de modo a evitar o
do Apgar Familiar os
mas sim conformada com
a sua situação familiar. A soma de todos os itens resultou num Apgar de 5, isto é, família
Círculo Familiar de Thrower.
se numa posição
com quem tem uma
embora relativamente
39
presentes não são tão próximos de Nazaré. Por fim o filho A.A.E.M. foi colocado fora do
círculo, reflectindo o teor conflituoso da relação.
EXAME SUBJECTIVO:
A utente recorreu à extensão do Centro de Saúde para pedido de receituário. Seguidamente
solicitou consulta de Assistência Social para confirmar uma dúvida acerca de
documentação enviada pela Segurança Social. Afirmou sentir-se bem.
EXAME OBJECTIVO:
A utente encontrava-se consciente, orientada e colaborante, embora demonstrasse alguma
dificuldade em organizar os eventos cronologicamente.
Bom estado geral. Obesa. Não foi possível determinar o peso e a altura.
Pele e mucosas coradas, hidratadas e anictéricas.
Nota: O exame físico foi realizado no domicílio da utente.
SINAIS VITAIS:
Frequência cardíaca: 72 bpm.
Frequência respiratória: 16 cpm.
AUSCULTAÇÃO CARDÍACA:
S1 e S2 audíveis, de intensidade normal. Sem sons acessórios, sopros, galopes ou atrito
AUSCULTAÇÃO PULMONAR:
Sons respiratórios presentes, simétricos, audíveis bilateralmente e de intensidade normal ao
longo de toda a área pulmonar. Ausência de ruídos adventícios ou de atrito pleural.
40
ABDÓMEN:
Inspecção: Panícula adiposa proeminente. Estriação longitudinal. Sem hérnias.
Palpação: Abdómen mole e depressível. Empastamento no hipogastro e fossas ilíacas
acompanhado de dor à palpação profunda. Sem sinais de irritação peritoneal. Fígado e
baço não palpáveis.
Percussão:Timpanismo difuso.
Nota: No contexto da dor abdominal a doente foi questionada acerca de queixas urinárias.
Refere disúria, ardor e odor intenso da urina. Nega alteração da frequência miccional.
Nega alterações na coloração da urina. Refere ter frequentemente sintomas urinários mas
que geralmente os desvaloriza não recorrendo ao seu médico assistente.
MEMBROS E DORSO:
Dor à palpação das apófises espinhosas cervicais. Edema dos membros inferiores.
LISTA DE PROBLEMAS:
ACTIVOS:
• Insuficiência renal crónica (Síndrome de Alport).
• Hipertensão arterial (consequência da patologia renal).
• Hipoacúsia.
• Hipercolesterolemia.
• Hiperuricemia.
• Infecções do trato urinário inferior de repetição.
• Conflitos familiares.
• Ausência de rendimentos.
• Más condições habitacionais.
41
PASSIVOS:
• Gota.
PLANO:
• Controlo apertado da Hipertensão Arterial.
• Considerar profilaxia de infecções do trato urinário.
• Incentivo à resolução dos conflitos familiares.
• Integração no mercado de trabalho.
• Apoio monetário e social.
42
APÊNDICE IV
VISITA À UNIDADE DE CONTINUADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
DESCRIÇÃO E REFLEXÃO
No passado dia 24 de Fevereiro de 2010, no âmbito do estágio na Valência Rural de
Medicina Comunitária no Centro de Saúde de Miranda do Douro, foi-me facultada a
oportunidade de pela primeira vez contactar com a realidade dos Cuidados Continuados,
através da visita à Unidade de Cuidados Continuados Integrados (UCCI) de Longa
Duração e Manutenção Santa Maria Maior de Miranda do Douro.
A visita inseriu-se numa Visita de Acompanhamento da Equipa de Coordenação Local
(ECL) dos Cuidados Continuados e foi conduzida pelo Dr. Valentin Posado e a Enf.
Teresinha Parreira, ambos elementos da ECL.
Em primeiro lugar importa perceber o que são Cuidados Continuados e qual o seu papel no
contexto dos Cuidados de Saúde Primários.
Por Cuidados Continuados Integrados entende-se o conjunto de intervenções sequenciais
integradas de saúde e apoio social, decorrente de avaliação conjunta, visando a
recuperação global da pessoa entendida como o processo terapêutico e de apoio social,
activo e contínuo, que visa promover a autonomia melhorando a funcionalidade da pessoa
em situação de dependência, através da sua reabilitação, readaptação e reinserção
familiar e social.i
Os serviços no âmbito da Rede Nacional dos Cuidados Continuados Integrados (RNCCI)
são prestados tanto por entidades públicas como privadas, que prestam cuidados
continuados ao abrigo de protocolos celebrados com o Estado.i Pelo que nos foi explicado,
a UCCI de Miranda do Douro nasceu de um protocolo entre o Centro de Saúde de
Miranda do Douro, a Segurança Social e a Santa Casa da Misericórdia de Miranda do
Douro.
A UCCI de Miranda do Douro é uma Unidade de Longa Duração e Manutenção e esta é
apenas uma vertente das várias respostas dadas pela RNCCI, que apresenta várias
43
tipologias de Cuidados Continuados, a saber: Unidades de Convalescença; Unidades de
Média Duração e Reabilitação; Unidades de Cuidados Paliativos; Unidades de Dia e de
Promoção da Autonomia e Equipas Domiciliárias.i
Esta UCCI foi inaugurada em 2 de Dezembro de 2008 e através de uma equipa
multidisciplinar que inclui médicos, enfermeiros, fisioterapeuta, assistentes sociais,
psicóloga, animador social, auxiliares de acção médica entre outros, pretende prestar
cuidados multidimensionais. Promove-se a qualidade de vida, a reabilitação e a autonomia
integrando o utente e a família em todo o processo.
Os cidadãos-alvo desta unidade de longa duração e manutenção são: os que se encontram
em situação de dependência funcional prolongada; dependência funcional transitória;
idosos com critérios de fragilidade; incapacidade grave com forte impacto psicossocial;
cuidados paliativos em indivíduos com doença severa ou crónica em fase avançada ou
terminal e descanso do cuidador.
O edifício da UCCI já albergou outrora o Centro de Saúde de Miranda do Douro e localiza-
se no centro histórico de Miranda, cidade com uma taxa de envelhecimento muito elevada,
tornando ainda mais premente a necessidade deste tipo de equipamentos. No entanto, a
UCCI disponibiliza 21 camas que podem ser ocupadas por qualquer cidadão que necessite
deste tipo de cuidado, não só proveniente de Miranda do Douro mas de qualquer ponto do
país.
A 24 de Fevereiro a taxa de ocupação da unidade era de 100%.
Durante a visita pude entrar nos quartos dos utentes (com a sua autorização), sala de
fisioterapia, consultório médico, instalações sanitárias, cozinha, sala de convívio entre
outros.
Para além da visita propriamente dita um dos momentos mais interessantes da tarde foi a
reunião de avaliação da ECL com alguns dos profissionais que trabalham na UCCI.
Durante a reunião discutiram-se alguns problemas logísticos e de funcionamento da
unidade assim como se avaliaram os casos de todos os utentes internados.
Em cada caso discutiu-se o estado de saúde do utente, o seu prognóstico, a satisfação do
utente com os cuidados prestados, a satisfação da família, a preparação da família para a
44
alta ou para o luto, respostas sociais para casos mais complicados e possíveis transferências
para outras unidades ou instituições
Basicamente numa só mesa pude assistir à discussão de cada utente como um todo, o que
certamente contribui para a qualidade e humanização dos cuidados prestados.
Esta foi sem dúvida uma experiência enriquecedora não só ao nível académico mas
também pessoal.
Fonte consultada: i http://www.rncci.min-saude.pt
45
APÊNDICE V
REFLEXÃO: NEGLIGÊNCIA NOS IDOSOS
O tema desta reflexão, “Negligência nos Idosos”, surgiu após o contacto durante a
residência em Medicina Comunitária, com duas realidades de cuidados a idosos
diametralmente opostas.
No decorrer da Valência Urbana tive a oportunidade de visitar o domicílio do Sr. C.,
idoso de 81 anos, acamado e a recuperar de uma pneumonia. Ao chegar à sua habitação
(um apartamento T1) fomos extremamente bem recebidas pela esposa, a Dona O., também
idosa e com múltiplas patologias crónicas. O apartamento em que vivem está plenamente
adaptado e a Dona O. mantém a sua extensa farmácia caseira impecavelmente
organizada, fazendo questão de cumprir religiosamente a medicação.
Deslocámo-nos ao quarto do Sr. C. Apesar de fisicamente debilitado é evidente que é
muito bem cuidado (estava limpo, bem arranjado e bem posicionado na sua cama
articulada). O quarto possui muita luz natural e a cama da Dona O. está localizada ao
lado da do Sr.C.
Assim que nos vê, o Sr. C. interage e, apesar de um pouco desorientado, cumprimenta e
esboça um sorriso. Assim que Dona O. se aproxima o Sr. C. aperta as suas mãos e Dona
O. responde ao gesto.
O Sr. C. tem 3 filhos, muito presentes afectivamente e também ao nível dos cuidados.
Recebe apoio domiciliário de enfermagem e fisioterapia. Mais do que tratado o Sr. C. é
cuidado e muito acarinhado pela sua família.
No diâmetro oposto da esfera de cuidados encontramos a Dona A., idosa de 101 anos,
visitada durante a Valência Rural em Miranda do Douro no âmbito de uma visita
domiciliária de enfermagem.
46
A Dona A. vive em casa de uma filha, numa das aldeias de Miranda do Douro. A casa é
bastante espaçosa e à primeira vista com todas as comodidades. A filha e o genro contam
que estiveram várias décadas emigrados na Alemanha e que voltaram a Portugal
propositadamente para cuidar da familiar, já que os outros filhos nunca se teriam
mostrado muito presentes ou interessados.
A filha conta que a Dona A. sempre foi uma pessoa muito activa até há cerca de 13 anos,
altura em que terá perdido capacidades visuais. Desde então tornou-se incapaz de viver
sozinha, o que a terá deixado agitada e frustrada. A filha e o genro elogiam
constantemente Dona A., contando que era uma mulher muito activa e forte e que até há
13 anos nunca teria visitado um médico. Mostram um CD de música regional cantado pela
Dona A.
Entretanto guiam-nos em direcção ao “quarto” de Dona A. Longe dos olhares, o quarto
situava-se na cave da casa. O espaço tinha pouca luz natural e estava impregnado com
odor a urina. A temperatura ambiente era muito baixa e o aquecimento estava desligado.
A Dona A. estava acamada, completamente imóvel, arreactiva e com as extremidades
arroxeadas. As articulações das mãos encontravam-se anquilosadas.
Segundo a filha, Dona A. é “muito bem tratada porque as meninas da Santa Casa vêm
cá(…), elas abrem a porta, fazem tudo sozinhas e vão embora(…) nem as vejo!”(sic). A
Santa Casa presta apoio domiciliário 3 vezes por dia, fornecendo a refeições e cuidando
da higiene pessoal de Dona A., mas apenas estes cuidados parecem ser insuficientes para
o seu grau de dependência. Na altura da visita eram 11 horas da manhã e Dona A. estava
ainda sem comer e sem ter a fralda mudada desde a noite anterior. A filha frisa que nunca
mudou a fralda à mãe e que esse tipo de cuidados lhe “fazem impressão”(sic). Também
afirma não lhe prepara comida para além fornecida pela Santa Casa.
Quando lhe perguntamos acerca da medicação habitual da mãe conta que como não tem
outros problemas de saúde, apenas lhe dá umas “gotinhas para estar mais
sossegada”(sic). Pedimos para observar a embalagem do medicamento e verificamos que
Dona A. está medicada com haloperidol desde que se mudou para casa da filha, há 13
anos atrás.
47
Na minha opinião, o primeiro caso constitui um exemplo de bons cuidados a idosos,
enquanto o segundo retrata a realidade de uma idosa negligenciada. O caso da Dona A.
chocou-me pessoalmente e de certo modo alertou-me para o risco de, dado o
envelhecimento da população portuguesa, existirem muitas “Donas A.” escondidas pelo
país.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística o Índice de Envelhecimento (I.E.) prevê que se
possam atingir os 395 idosos por cada 100 jovens em 2050, ou seja, um valor que quase
quadruplica face a 2000 (102,2).i
Assim sendo, a temática da qualidade dos cuidados prestados a idosos dependentes é muito
premente, constituindo um problema Social e de Saúde Pública.
Actualmente o estatuto de pessoa idosa mudou. Existe a tendência para não respeitar o
idoso enquanto pessoa com experiência de vida e fonte de conhecimento mas antes encará-
lo como entidade obsoleta, sem utilidade e fonte de encargos.
A mudança das estruturas sociais e familiares, dos valores, dos princípios e as dificuldades
económicas exigem aos cuidadores de idosos um cada vez maior investimento pessoal e
financeiro para a prestação de cuidados adequados.
Todos estes factores concorrem para a ocorrência de fenómenos de negligência.
Negligência pode ser definida como a não satisfação de necessidades básicas,
nomeadamente a negação de alimentos, de cuidados de higiene, de condições de habitação,
de segurança e de tratamentos médicos.ii
A negligência pode ser descrita como activa ou passiva.iii
Negligência activa refere-se a um comportamento intencionado, isto é, o cuidador
intencionalmente priva o idoso de cuidados ou da satisfação das suas necessidades
básicas.iii
Por outro lado, negligência passiva refere-se a situações em que o cuidador é incapaz de
cumprir as suas responsabilidades, quer por doença, incapacidade física, stress, ignorância,
imaturidade ou ausência de recursos. iii
48
Podem também ocorrer casos de auto-negligência, que resultam da recusa por parte do
idoso em receber cuidados.iii
Os autores de actos de negligência podem ser familiares, cuidadores contratados pela
família ou funcionários de instituições a quem falta o treino adequado, as capacidades, o
tempo ou a energia para cuidar. Cuidadores com problemas psiquiátricos ou de abuso de
álcool ou drogas são mais propícios a serem negligentes.iii
No que a Portugal diz respeito, não foi possível encontrar números oficiais acerca da
negligência no grupo etário dos idosos. É muito provável que este fenómeno seja sub-
diagnosticado e sub-notificado, até porque a maioria dos casos de maus-tratos e
negligência contra idosos ocorrem nos seus lares e são inflingidos por familiares.ii
As vítimas sofrem muitas vezes em silêncio, quer por incapacidade de se expressarem,
quer por receio de represálias, da perda de autonomia e da mudança do local que habitam.
A não apresentação de queixa, sobretudo quando o autor é um familiar, surge do medo de
quebrar laços familiares e oculta frequentemente sentimentos de culpa, vergonha e baixa
auto-estima.ii
O reconhecimento de situações de negligência nos idosos é potenciado pelo conhecimento
dos factores de risco. É importante estar particularmente atento no caso de idosos com
elevado grau de dependência; nos casos de demência; nos casos de stress do cuidador; nos
cuidadores portadores de psicopatologia; nos casos de habitação desadequada; nas famílias
com história de violência familiar ou disfuncionais; e ainda famílias com preconceitos
culturais acerca da procura de apoio externo para cuidar de um familiar dependente.iv
Assim que a situação de negligência se torna efectiva existem vários indicadores que
podem alertar o profissional de saúde. Estes indicadores podem ser de ordem ambiental,
física e comportamental (comportamentos do cuidador e/ou do idoso).
Alguns dos indicadores ambientais são: alimentos, água ou aquecimento insuficientes ou
desadequados; falta de espaço, ventilação ou de utensílios de apoio adequados; infestações
por animais ou insectos; casa pouco segura; falta de limpeza e existência barreiras
arquitectónicas. iii
49
Em relação a indicadores físicos, é importante atentar à presença de: má higiene pessoal;
infestação por piolhos; odores intensos; fezes ou urina; vestuário mal lavado e
desadequado à temperatura ambiente; úlceras de pressão; irritação cutânea; sinais de
desidratação (débito urinário baixo, pele seca e frágil, boca seca, apatia, confusão mental);
problemas médicos não tratados; ausência de aparelhos necessários (óculos, próteses
dentárias, próteses auditivas, canadianas, cadeira de rodas); exacerbação de patologia
crónica (apesar de existir um plano de tratamento) e agravamento da demência. iii
Em termos de comportamentais procurar no idoso: perturbações emocionais como choro,
depressão, desespero; terrores nocturnos, dificuldades em adormecer; perda súbita de
apetite (não explicável por causa médica); confusão e desorientação (podem ser resultantes
de má nutrição); apatia, regressão, medo e comportamento auto-destrutivo. iii
Nos comportamentos do cuidador atentar a: expressão de sentimentos de raiva, frustração
ou exaustão; tentativas de isolamento do idoso; incapacidade para cuidar; atitude crítica em
relação aos prestadores de cuidados de saúde; recusa de ajuda externa.iii
Os cuidadores com um nível de encargo mais alto estão em maior risco de se tornarem
autores de abuso ou negligência. O termo encargo do cuidador descreve a carga física,
emocional e financeira associadas ao cuidado a terceiros (pode ser avaliado, utilizando, por
exemplo a Zarit Burden Interview).v
De facto, a tarefa de cuidador não é de todo fácil. Os cuidadores são muitas vezes
obrigados a adaptar radicalmente a sua vida, frequentemente com dificuldades e falta de
apoio, o que acarreta custos materiais, desgaste físico, stress e carga emocional elevada.
Deste modo, identificar os cuidadores em risco através da avaliação do grau de encargo
pode dar oportunidade ao médico de família para ajudar a lidar com os desafios de cuidar.
Para ter noção do problema, cuidar de um idoso demenciado está associado a níveis mais
elevados de stress do que cuidar de alguém com incapacidade funcional derivada de outro
tipo de doença e, por exemplo, cuidar de um doente com Alzheimer exige 70 horas
semanais de cuidados. O apoio familiar, especificamente as visitas frequentes por outros
membros da família e a presença de uma forte rede de suporte social ajudam a diminuir os
níveis de encargo do cuidador.
50
Os cuidadores podem ser considerados “doentes escondidos” pelo que há que ter atenção
ao surgimento de sinais de depressão e ansiedade e ensinar estratégias de coping,
auxiliando, por exemplo, na busca de apoio domiciliário.v
Os profissionais ao nível dos Cuidados de Saúde Primários estão em posição privilegiada
para detectar estes problemas, podendo ser os únicos indivíduos externos à família ou aos
prestadores de cuidados que contactam regularmente com o idoso. vi
O clínico deve estar atento a sinais de negligência e de desgaste do cuidador, mantendo
uma atitude vigilante em relação aos idosos dependentes e seus agregados familiares, no
sentido de contribuir para a prevenção e detecção de situações de risco.
i INE. Projecções de População Residente em Portugal: 2000-2050, informação à comunicação social; 2003;Junho. Disponível em: http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_destaques&DESTAQUESdest_boui=72193&DESTAQUESmodo=2
ii Gonçalves, CA. Idosos: abuso e violência. Rev Port Clin Geral 2006; 22 :739-45
iii National Committee for the Prevention of Elder Abuse. Neglect and Self-Neglect. 2008. Disponível em: http://www.preventelderabuse.org/elderabuse/neglect.html
iv Sadovsky, R.; Tips from other journals: Recognition and Management of Elder Mistreatment. Am Fam Physician 1999; December1
v Parks, SM; Novielli, KD; A Practical Guide to Caring for Caregivers. Am Fam Physician 2000; December 15
vi Swagerty DL; Takahashi PY; Evans JM; Elder Mistreatment. Am Fam Physician 1999; May 15
53
APÊNDICE VII
VISITA AOS SAOM
DESCRIÇÃO E REFLEXÃO
No dia 4 de Março de 2010, no âmbito do Módulo Urbano da residência em Medicina
Comunitária do 6º ano, decorreu uma visita aos SAOM (Serviços de Assistência
Organizações de Maria), com sede na Rua das Virtudes, Porto.
A visita foi conduzida pela Dra. Maria José, Técnica de Serviço Social responsável pela
coordenação da instituição.
Os SAOM foram fundados em 1984 e desde então apoiam em diferentes vertentes a
comunidade em que se inserem. Prestam Apoio Domiciliário a todos os indivíduos que,
por motivos de saúde física ou psicológica necessitem de receber cuidados no seu
domicílio. Neste âmbito oferecem: acompanhamento em casa (permitindo aos cuidadores
descansar); serviços de limpeza; serviços de higiene pessoal; preparação de refeições;
serviços domésticos; apoio psicológico e estimulação motora.
Actualmente são apoiados 75 idosos durante a semana e 35 idosos ao fim-de-semana. Este
serviço está disponível 365 dias por ano.
Os SAOM estão mais directamente envolvidos com a Unidade de Saúde Familiar da
Carvalhosa. No apoio domiciliário funcionam como “os olhos dos médicos” pois sinalizam
várias situações ao Centro de Saúde. Trabalham na instituição duas enfermeiras.
Dispõem também de um serviço de Lavandaria aberta à comunidade, para todos os que não
tenham condições habitacionais para a tarefa ou capacidade para o seu desempenho.
Desde 2006 desenvolvem o projecto “Dar Sentido à Vida” cujos destinatários são todos os
indivíduos em risco de exclusão social. Prestam apoio de enfermagem, psicológico, social
e jurídico e estimulam a formação profissional. Disponibilizam cursos de ajudante de
54
cozinha e de empregado de mesa, acompanhando a integração dos indivíduos no mercado
de trabalho até à sua autonomização.
Existe também uma “Equipa de Rua” que trabalha no terreno 365 dias por ano, tentando
suprir necessidades básicas a indivíduos que vivem na rua (sobretudo consumidores de
substâncias), facilitando o acesso a alimentação, cuidados de saúde, apoio psicológico e
apoio social.
Em 2008 foi criado o projecto “Cata-vidas” que trabalha na reinserção de indivíduos com
problemas de abuso de substâncias. Desenvolvem um projecto de prevenção da
toxicodependência subsidiado pelo Instituto das Drogas e Toxicodependência. Para o
futuro pretendem desenvolver mais um projecto de formação; um centro de convívio e um
Centro de Acolhimento Temporário.
A Dra. Maria José descreve a equipa de profissionais dos SAOM como multidisciplinar e
muito dinâmica. Lamenta o facto de a sua acção estar limitada pelas condições físicas do
edifício de que dispõem. De facto, o edifício é bastante antigo e encontra-se degradado
pela falta de obras de manutenção, obrigando até à interdição de algumas salas.
O trabalho dos SAOM não envolve apenas um grupo específico de pessoas: abrange idosos
(sobretudo de classe económica baixa e sem retaguarda familiar); consumidores de
substâncias de abuso e pessoas em risco de exclusão social.
Todas estas pessoas à partida tão diferentes acabam por criar laços de afecto, conquistando
estabilidade psicológica e emocional. A Dra. Maria José dá o exemplo de uma sem-abrigo
que frequentava os SAOM e que saiu da rua para viver em casa de uma idosa dependente
que vivia só, cuidando dela. No fundo ambas beneficiaram com a situação e criaram laços
afectivos fortes.
A visita terminou no Centro de Dia, uma das vertentes mais importantes e visíveis do
trabalho dos SAOM.
55
Ao descer as escadas para o salão do piso inferior onde funciona o Centro cruzamo-nos
com um grupo de senhoras que iam para o seu ensaio de coro e dança. No salão várias
gerações conviviam, entre conversas, jogos de dominó e trabalhos manuais dinamizados
por estagiárias de animação social. Numa das paredes um utente retratava a Ribeira do
Porto. Pouco depois da nossa chegada uma das utentes declamou um poema, logo seguida
por outra que pôs todo o salão a cantar o fado. Transparecia um ambiente muito familiar e
acolhedor.
No futuro os SAOM pretendem criar um novo Centro de Dia para responder às
necessidades da nova geração de idosos.
Esta visita foi muito interessante e enriquecedora a nível pessoal. Foi possível conhecer o
espectro de trabalho dos SAOM e constatar a sua importância. É de sublinhar a dedicação
da equipa de profissionais, que apesar das limitações ao nível do espaço tem desenvolvido
excelentes projectos de dinamização, formação, apoio e integração dos utentes.
Fonte consultada: www.saom.pt
56
APÊNDICE VIII
ESTUDO COMPLEMENTAR
VISITAS DOMICILIÁRIAS MÉDICAS NO CSMD E CSSJ DURANTE 2009
INTRODUÇÃO
A transferência dos cuidados de saúde do âmbito hospitalar para o comunitário,
exemplificada pela diminuição dos dias de internamento em unidades hospitalares, implica
um maior número de doentes a necessitar de cuidados no seio da sua comunidade e no seu
domicílio.i
Por outro lado, o envelhecimento da população e consequente aumento do número de
pessoas em situação de dependência, associado às mudanças actuais das redes familiar e
social de apoio, condiciona um aumento da necessidade de prestação de cuidados
domiciliários.
As visitas domiciliárias médicas apresentam várias vantagens: diminuem o número de
recursos desnecessários ao Serviço de Urgência, diminuem a necessidade de
institucionalização pós-cirurgia e são fonte de apoio aos cuidadores.i Deste modo, a ARS
Norte propôs como objectivo de eficiência para 2009 para os CS o aumento da taxa de
visitas domiciliárias médicas para 21‰ dos utentes inscritos. ii
Consoante o motivo, as visitas domiciliárias médicas podem ser classificadas em quatro
tipos:
• Doença (emergência, doença aguda ou doença crónica);
• Morte (cuidados terminais, verificação do óbito, apoio no processo de luto);
• Avaliação (polimedicação e/ou polipatologia, uso excessivo de serviços de saúde,
imobilização, isolamento social, suspeita de abuso/negligência, avaliação das
necessidades de cuidados, diagnóstico recente de problema de saúde grave);
• Seguimento pós-hospitalização (doença aguda, traumatismo, cirurgia, pós-parto).iii
57
Com vista ao aprofundamento de conhecimentos e reflexão acerca desta matéria efectuou-se um pequeno estudo acerca do apoio domiciliário médico prestado em 2009 no CSMD e no CSSJ.
MATERIAL E MÉTODOS:
Recorrendo a dados do SINUS©, obtiveram-se listagens do número de domicílios médicos
efectuados em 2009 no CSMD e no CSSJ.
Os dados obtidos foram tratados utilizando o software Microsoft Excel 2007©.
RESULTADOS
O universo de utentes inscritos no CSMD em Dezembro de 2009 era de 8179.
No CSMD foram realizadas um total de 299 visitas domiciliárias médicas no ano 2009. A
Taxa de Domicílios Médicos em 2009 foi de 36,6 ‰.
No CSSJ o universo estudado, referente aos utentes inscritos em Dezembro de 2009,
contabilizava 20034.
No CSSJ registaram-se 416 visitas domiciliárias médicas durante o ano 2009. A Taxa de
Domicílios Médicos em 2009 foi de 20,7 ‰.
A distribuição dos domicílios médicos realizados por mês está representada na Figura 1.
58
Figura 1. Distribuição das visitas domiciliárias médicas ao longo de 2009 no CSMD e
CSSJ.
Fonte: SINUS
Total de utentes inscritos no CSMD em Dezembro de 2009: 8179; Total de utentes inscritos no CSSJ em Dezembro de 2009: 20034.
DISCUSSÃO/CONCLUSÕES:
Comparando os dados apresentados com o Objectivo de Eficiência da ARS Norte para
2009 (aumentar a taxa de visitas domiciliárias médicas para 21 por mil utentes inscritos
nos CS ii), verificamos que o CSMD conseguiu superar essa meta (36,6‰) e que o CSSJ se
posicionou muito próximo do valor proposto (20,7‰).
A diferença nos resultados obtidos poderá ser explicada por vários factores.
Por um lado, a população de utentes do CSMD é mais envelhecida, o que à partida exigirá
maior número de visitas domiciliárias médicas.
0
10
20
30
40
50
60
CSMD
CSSJ
59
Adicionalmente, o concelho de Miranda do Douro dispõe de um escasso leque de entidades
prestadoras de cuidados de saúde, no sector público ou privado.
No CSSJ a população terá maior disponibilidade de acesso a redes privadas de prestação de
cuidados de saúde (entre os quais consultas domiciliárias) assim como a cuidados de saúde
secundários, nomeadamente Serviços de Urgência.
i Pereless L. Home Visits – An access to care issue for the 21st century. Can Fam Physician.2000; 46:2044-2048
ii Administração Regional de Saúde do Norte, IP. Quadro de Avaliação e Responsabilização, 2009. Disponível da World Wide Web: http://portal.arsnorte.min-saude.pt/portal/page/portal/ARSNorte/A%20ARS%20Norte/QUAR/QUAR%202009.pdf
iii Unwin B, Jerant A. The home visit, Am Fam Physician. 1999 October, Pratical therapeutics.
60
APÊNDICE IX
ESTUDO DO GRAU DE DEPENDÊNCIA DOS IDOSOS A RECEBER APOIO
DOMICILIÁRIO DE ENFERMAGEM PELO CSSJ
INTRODUÇÃO
O envelhecimento da população, associado a modificações da estrutura familiar e social,
determina novas necessidades em saúde e obriga a adequar a prestação de cuidados a
idosos de forma a manter a sua funcionalidade e autonomia. O Plano Nacional de Saúde
2004-2010 reforça a importância do grupo etário com mais de 65 anos, que está a crescer
no nosso país devido à melhoria dos cuidados de saúde e das condições de vida, e é o
maior consumidor de recursos na saúde.i
Actualmente muitas famílias se deparam com a necessidade de se tornarem cuidadoras de
idosos dependentes nos seus domicílios. O desempenho desta tarefa requer frequentemente
apoio especializado por profissionais de enfermagem.
Na tentativa de perceber as várias necessidades dos idosos a receber apoio domiciliário,
efectuou-se o presente estudo, de modo caracterizar o grau de dependência de um grupo de
idosos a receber apoio domiciliário de enfermagem pelo CSSJ.
Para a avaliação do grau de dependência utilizou-se o Índice de Barthel (IB), um
instrumento que avalia o nível de dependência do indivíduo para a realização de dez
actividades básicas da vida diária: comer, higiene pessoal, uso dos sanitários, tomar banho,
vestir e despir, controlo de esfíncteres, deambular, transferência da cadeira para a cama,
subir e descer escadas.
O inquérito aplicado para determinação do IB encontra-se na Tabela I.
61
Tabela I: Escala de Barthel.
Actividades da Vida Diária Classificação Pontuação
Evacuar Incontinente (ou precisa que lhe façam um enema)
0
Acidente ocasional (uma vez por semana)
1
Continente 2
Urinar Incontinente ou cateterizado e incapacitado para o fazer
0
Acidente ocasional (máximo uma vez em 24 horas)
1
Continente (por mais de 7 dias) 2
Higiene pessoal Necessita de ajuda com o cuidado pessoal
0
Independente no barbear, dentes, rosto e cabelo (utensílios fornecidos)
1
Ir à casa de banho Dependente 0
Precisa de ajuda mas consegue fazer algumas coisas sozinho
1
Independente 2
Alimentar-se Incapaz 0
Precisa de ajuda para cortar, etc. 1
Independente 2
62
Deslocações Incapaz (não tem equilíbrio ao sentar-se) 0
Grande ajuda física (uma ou duas pessoas), mas consegue sentar-se
1
Pequena ajuda (verbal ou física) 2
Independente 3
Mobilidade Imobilizado 0
Independente na cadeira de rodas incluindo cantos, etc
1
Anda com ajuda (verbal ou física) 2
Independente (também com ajuda de uma bengala)
3
Vestir-se Dependente 0
Precisa de ajuda, mas faz cerca de metade sem ajuda.
1
Independente (incluindo botões, fechos e atacadores)
2
Escadas
Incapaz 0
Precisa de ajuda (verbal, física…) 1
Independente para subir e edescer 2
Tomar banho Dependente 0
Independente 1
Fontes: Collins, C., Wade, D. T., Davies, S., & Horne, V. (1988). The Barthel ADL Index: a reliability study. International Disability Studies, 10, 61-63 SAM©: Sistema de Apoio ao Médico
63
De acordo com a pontuação obtida o indivíduo pode ser classificado em 5 categorias, que
se encontram explicitadas na Tabela II.
Tabela II: Graus de dependência segundo a pontuação da Escala de Barthel.
Grau de dependência Pontuação
Dependência total/ muito grave 0-04
Dependência grave 05-09
Dependência moderada 10-14
Dependência ligeira 15-19
Independente 20
Fontes: Collins, C., Wade, D. T., Davies, S., & Horne, V. (1988). The Barthel ADL Index: a reliability study. International Disability Studies, 10, 61-63 SAM©: Sistema de Apoio ao Médico
Em termos clínicos o IB fornece informação importante não só a partir da pontuação total
mas também a partir das pontuações parciais para cada actividade avaliada, permitindo
tomar conhecimento das incapacidades específicas do utente e assim adequar os cuidados a
proporcionar às necessidades do utente.
O IB é amplamente utilizado, vários autores consideram-no até o instrumento mais
adequado para avaliar a incapacidade para a realização das actividades da vida diária. Este
índice apresenta várias vantagens, nomeadamente a fácil aplicação e interpretação, o baixo
custo de aplicação, o poder ser repetido periodicamente (permitindo monitorizações
longitudinais) e o consumo de pouco tempo para o seu preenchimento.ii O IB é utilizado
pela aplicação informática SAM©.
64
MATERIAL E MÉTODOS
Foi consultado o dossier dos domicílios utilizado pelos enfermeiros do CSSJ. A escolha
desta listagem para selecção da amostra a estudar deveu-se à facilidade de acesso aos
dados.
Obtiveram-se os dados identificativos dos utentes que se encontravam a receber apoio
domiciliário de enfermagem a 5 de Março de 2010. Não foi possível obter dados relativos a
um período de tempo mais alargado por estes não estarem disponíveis de modo
organizado.
Nessa amostra de utentes seleccionaram-se os de idade igual ou superior a 65 anos.
Seguidamente, recorrendo ao enfermeiro responsável pelos domicílios, aos médicos de
família de cada idoso ou ao contacto telefónico a familiares aplicou-se o IB, tendo-se
obtido as pontuações respectivas ao grau de dependência de cada idoso.
Os dados recolhidos foram tratados utilizando o software Microsoft Excel 2007©.
RESULTADOS
Foram contabilizados um total de 24 idosos a receber apoio domiciliário de enfermagem.
Na Figura 1 está representada a proporção de idosos e grandes idosos na população
estudada. Foram considerados grandes idosos os indivíduos com idade igual ou superior a
75 anos.iii
Figur
Na fi
Figur
A dis
deter
ra 1: Distrib
igura 2 enco
ra 2: Distrib
stribuição d
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o domiciliár
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M
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Muito grave37%
S
S
pendência.
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Sexo feminino
Sexo masculin
dosos a receb
miciliário.
o
no
66
ber
67
DISCUSSÃO/CONCLUSÕES
A amostra obtida é muito reduzida pelo que as conclusões deste estudo são evidentemente
muito limitadas.
Pela análise dos dados percebemos que a amostra da população de utentes a receber apoio
domiciliário de enfermagem no CSSJ é predominantemente constituída por grandes idosos
do sexo feminino com graus de dependência grave ou muito grave, o que reflecte a
tendência nacional de envelhecimento da população, assim como a maior longevidade do
sexo feminino.
Para um estudo futuro seria interessante avaliar uma amostra maior ou até, se possível,
todos os idosos que durante um ano tivessem usufruído de apoio domiciliário de
enfermagem.
Seria também mais vantajoso estudar os resultados parcelares para cada actividade da vida
diária, de modo a perceber quais são incapacidades que mais frequentemente diminuem a
autonomia dos idosos. Assim sendo, poder-se-iam retirar conclusões de maior utilidade,
com vista a uma melhor adequação dos cuidados prestados e orientação dos recursos
disponibilizados pelo Centro de Saúde.
i Ministério da Saúde. Direcção-Geral da Saúde. Plano Nacional de Saúde 2004-2010: mais saúde para todos. - Lisboa: Direcção-Geral da Saúde, 2004. - 2 v. - Vol. I - Prioridades, 88 p. - Vol. II - Orientações estratégicas, 216 p.)
ii Araujo F, Ribeiro JL, Oliveira A, Pinto C. Validação do Índice de Barthel numa amostra de idosos não institucionalizados. Revista Portuguesa de Saúde Pública 2007; 25(2): 59-66.
iii Instituto Nacional de Estatística