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 Comissão de Cidadania e Direitos Humanos RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO PARA TRATAR SOBRE A SITUAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS NO RIO GRANDE DO SUL Porto Alegre Dezembro de 2012.

Relatório final da subcomissão para tratar sobre a situação dos povos indígenas no Rio Grande do Sul

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Porto Alegre, CDH/ALERGS, 2012.

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  • Comisso de Cidadania e Direitos Humanos

    RELATRIO FINAL DA SUBCOMISSO PARA TRATAR

    SOBRE A SITUAO DOS POVOS INDGENAS NO RIO GRANDE DO

    SUL

    Porto AlegreDezembro de 2012.

  • A Subcomisso para tratar sobre a situao dos povos indgenas no Rio Grande do Sul, no mbito da Comisso de Cidadania e Direitos Humanos, foi criada no dia 09 de maio de 2012 e funcionou at o dia 21 de setembro de 2012.

    RDI 73/2012Processo n 20410-01.00/12-6

  • Mesa Diretora 2012

    Presidente: Dep. Alexandre Postal (PMDB)

    1 Vice-Presidente: Dep. Zil Breitenbach (PSDB)

    2 Vice-Presidente: Dep. Alceu Barbosa (PDT)

    1 Secretrio: Dep. Pedro Westphalen (PP)

    2 Secretrio: Dep. Luis Lauermann (PT)

    3 Secretrio: Dep. Jos Sperotto (PTB)

    4 Secretrio: Dep. Catarina Paladini (PSB)

    Suplentes:

    lvaro Boessio (PMDB)

    Luciano Azevedo (PPS)

    Raul Carrion (PCdoB)

    Carlos Gomes (PRB)

  • Comisso de Cidadania e Direitos Humanos

    Presidente:Miki Breier PSB

    Vice-Presidente:lvaro Boessio - PMDB

    TITULARES

    Ado Villaverde - PTEdegar Pretto - PT

    Jeferson Fernandes - PTAna Affonso - PT

    Aldacir Oliboni - PTPaulo Azeredo - PDT

    Adolfo Brito - PPRonaldo Santini - PTB

    Zil Breitenbach - PSDBLuciano Azevedo - PPS

    SUPLENTES

    Alexandre Lindenmeyer - PTMarisa Formolo - PT

    Nelsinho Metalrgico - PTGiovani Feltes - PMDB

    Marco Alba - PMDBGerson Burmann - PDT

    Mano Changes - PPAlosio Classmann - PTB

    Pedro Pereira - PSDBCatarina Paladini - PSB

    Paulo Odone PPS

  • Subcomisso para tratar sobre a situao dos Povos Indgenas no Rio Grande do Sul

    Relator: Deputado Miki Breier (PSB)

    Integrantes:Deputado Edegar Pretto (PT)

    Deputado Jeferson Fernandes (PT)

  • NDICE

    Introduo.............................................................................................................................................

    Elementos Histricos da Questo Indgena........................................................................................

    Devoluo dos Territrios Indgenas Transformados em categoria jurdica de Unidade de Conservao no RS...............................................................................................................................

    Regularizao Fundiria das Terras Guarani do RS........................................................................

    O Estado Brasileiro afronta os direitos indgenas na duplicao das BRs 116 e 290.....................

    ICMS Ecolgico: Possibilidades de um novo incentivo e apoio aos Povos Indgenas....................

    Organizao do PPA/RS especfico e diferenciado para os Povos Indgenas a partir de setorial indgena.................................................................................................................................................

    Assistncia em Sade............................................................................................................................

    Normatizao Especfica para atendimento educao escolar indgena......................................

    Repasse dos terrenos (urbanos), onde esto os indgenas, para a Unio.........................................

    Reunio Inicial da Subcomisso..........................................................................................................

    Relato de Viagem a Frederico Westphalen, Ira e Carazinho..........................................................

    Concluses.............................................................................................................................................

    Anexo 1..................................................................................................................................................

    Anexo 2..................................................................................................................................................

  • INTRODUO

    A subcomisso para tratar da Questo Indgena no Rio Grande do Sul, criada em meados de

    2012, apresenta seu breve relatrio. Antes das consideraes finais e ou sugestes, estamos

    apresentando subsdios tericos capazes de orientar a atuao parlamentar dos deputados, e, acima

    de tudo, cientificar comunidade do RS sobre a situao vivida por estes grupos humanos.

    Como preliminares cabe destacar que os trabalhos no tiveram a eficincia esperada, pois a

    subcomisso foi constituda em perodo eleitoral e naquele momento os deputados no conseguiram

    se fazer presentes nas diferentes atividades propostas.

    Destacamos que duas reunies preparatrias foram realizadas na Assembleia Legislativa.

    Nelas tivemos a presena do deputado Jeferson Fernandes e assessores, assessores dos gabinetes

    dos deputados Miki Breier (presidente da CCDH) e Edegar Preto e, tambm, membros da

    Comisso de Cidadania e Direitos Humanos. Alm destas reunies, tivemos uma audincia pblica

    ocorrida em 08 de agosto de 2012 e, alm destas atividades, fomos visitar uma amostra significativa

    das comunidades indgenas do RS.

    Nestas visitas, o deputado Miki Breier coordenou uma visita cidade de Estrela e Lajeado;

    nestas duas cidades as visitas foram feitas comunidade Kaigang de Estrela (esta comunidade est

    tendo problemas com membros presos acusados de trfico de drogas) e tambm a uma

    comunidade Guarani de Lajeado.

    As comunidades do norte do RS foram visitadas pelos deputados Jeferson Fernandes e

    Edegar Preto. Nas visitas os deputados tinham em mente a questo da demarcao, da sade, da

    alimentao e dos investimentos aportados pelo governo do Estado aos indgenas.

    1 ELEMENTOS HISTRICOS DA QUESTO INDGENA1

    A histria do povo brasileiro tem sido objeto de inmeras interpretaes nas suas mltiplas

    dimenses nos ltimos anos. Com a abertura democrtica, a discusso permanente dos diferentes

    temas um aspecto positivo e isto est impulsionando o avano de vrios aspectos da existncia

    das comunidades neste imenso Rio Grande.

    A Comisso de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do RS, em

    conjunto com diferentes entidades, debateu o tema dos povos indgenas no RS, em 2011 e tambm

    ao longo de 2012 em diferentes atividades.

    Os seminrios realizados nestes dois anos representaram momentos singulares de debates e

    1Texto ancorado no seminrio realizado no Plenarinho Joo Neves da Fontoura.

  • de proposies objetivas, viveis e claras daquilo que deve ser feito para que esta parte da

    populao gacha possa se inserir no cenrio atual de desenvolvimento da civilizao conseguindo

    preservar a sua singularidade e identidade culturais.

    Neste relatrio pretendemos apresentar a realidade e fazer com que os agentes pblicos se

    apropriem dela e sejam capazes de promover aes convergentes com os interesses, necessidades e

    direitos dos povos Guarani.

    2 DEVOLUO DOS TERRITRIOS INDGENAS TRANSFORMADOS EM

    CATEGORIA JURDICA DE UNIDADE DE CONSERVAO NO RIO GRANDE DO SUL

    A ideia de estabelecimento de parques naturais desabitados, que carrega em si a noo de

    uma natureza intocada, do mundo selvagem, originada nos Estados Unidos em meados do sculo

    XIX, foi sendo imposta a outros pases e sociedades com caractersticas ecolgicas e sociais

    diferentes criando a dicotomia entre povos e parques. Esse pensamento (hostil e

    preconceituoso) teve efeito devastador sobre os povos indgenas e populaes tradicionais, pois

    fundamentou inmeros projetos de conservao ao redor do mundo visando o estabelecimento de

    reas protegidas, expulsando seus habitantes, com pouco respeito ao seu passado e futuro, em nome

    da herana global da diversidade biolgica. A criao de reas naturais protegidas em territrios

    ocupados por populaes tradicionais vista como uma usurpao do direito ocupao de seus

    territrios, o espao coletivo no qual se realiza seu modo de vida distinto do urbano industrial.

    Existe a uma viso conflitante entre o espao pblico e o espao comunitrio, segundo perspectivas

    distintas e at opostas: por um lado, a viso do Estado, representando interesses das populaes

    urbano industriais, por outro, aquela dos povos indgenas e comunidades tradicionais (babaueiros,

    caiaras, campeiros, jangadeiros, pantaneiros, pescadores artesanais, praieiros, vargeiros). Trata-se,

    na verdade, de um processo de despossesso dos conhecimentos e tcnicas patrimoniais em poder

    das populaes tradicionais e a afirmao do poder da cincia nas mos dos cientistas e dos

    administradores. O resultado dessas prticas conservacionistas tem levado, muito frequentemente, a

    uma preservao insuficiente da fauna e da flora e a um nmero elevado de refugiados da

    conservao, obrigados a abandonar seus territrios tradicionais pelas restries que sofrem em

    seu modo de vida. E no so raros os casos em que os povos autctones se defrontam com a

    interdio de seu acesso s fontes de reservas, erradamente ditas naturais, j que foram eles que,

    por sua presena multissecular, contriburam sutilmente para transformar sua ecologia. Ou seja, o

    nosso ambiente em grande parte antrpico, mesmo em regies do mundo que parecem ter

    conservado sua virgindade. A Amaznia, por exemplo, jamais foi um vazio humano antes da

    invaso europeia e os povos indgenas encontraram, ao longo destes milnios de coadaptao com

  • os ecossistemas amaznicos, solues de sustentabilidade infinitamente superiores aos processos

    truculentos e mopes de desmatamento com correntes, desfolhantes, motosserras e assim por diante.

    Em sntese, as florestas (na Amaznia ou aqui no Rio Grande do Sul) sempre foram povoadas e

    nunca foram ou no so h muitos sculos, milnios talvez, virgens a maioria das espcies teis

    das florestas proliferaram diferencialmente em funo das tcnicas indgenas de aproveitamento do

    territrio e de seus recursos.

    A relao entre os povos indgenas e seus ambientes de vida nunca foi uma adaptao

    passiva dos primeiros ao segundo (que contrastaria com a destruio ativa levada a cabo pela

    mquina produtivista ocidental), mas a de uma histria comum, onde humanos e no-humanos

    (plantas, animais) evoluram juntos. A Amaznia, por exemplo, uma regio ocupada milenarmente

    por povos autctones, e secularmente por segmentos das populaes adventcias (de origem

    europeia e africana) que se acostumaram aos ritmos e exigncias da floresta. Antes da invaso

    europeia que dizimou seus ocupantes originrios, esta era uma regio densamente povoada por

    coletivos que modificaram o ambiente tropical sem destruir suas grandes regulaes ecolgicas.

    A floresta virgem tem muito de fantasia: como hoje se sabe, boa parte da cobertura vegetal

    amaznica, sua distribuio e composio especficas, o resultado de milnios de interveno

    humana; a maioria das plantas teis da regio proliferaram diferencialmente em funo das tcnicas

    indgenas de aproveitamento do territrio; pores no desprezveis do solo amaznico (cerca de

    12% da superfcie total da regio) so antropognicas, indicando uma ocupao intensa e antiga.

    Isso que chamamos natureza parte e resultado de uma longa histria cultural e de uma aplicada

    atividade humana. Da no se segue que qualquer atividade humana ou qualquer interveno

    cultural seja compatvel com o ambiente das florestas, estamos falando de povos indgenas, que seja

    bem entendido.

    Especificamente no Rio Grande do Sul, poderamos citar diversos coletivos indgenas

    refugiados da conservao (pretritos e em iminncia), porm apresentaremos um caso de

    gravssimo impacto social causado por polticas preservacionistas, que na maioria das vezes,

    confronta com os modos de vida e ocupao dos territrios indgenas. O Parque Estadual de Itapu

    foi constitudo atravs dos seguintes Decretos Estaduais: n 22.535, de 14 de julho de 1973; n o

    25.162, de 23 de dezembro de 1976; no 33.886, de 11 de maro de 1991; e no 35.016, de 21 de

    dezembro de 1993. Atualmente trata-se uma unidade de conservao sob proteo integral, que

    abarca 5.566,50 hectares, localizados no distrito de Itapu, Viamo RS. Vejamos alguns excertos

    do Plano de Manejo do Parque Estadual de Itapu/Departamento de Recursos Naturais

    Renovveis/Secretaria da Agricultura e Abastecimento,1996:

  • A palavra Itapu de origem indgena guarani e significa ponta de pedra, ou ainda, pedra

    levantada, ou pedra redonda, com aspecto de ponta (p. 11).

    [...]. Estudos realizados pela equipe de pesquisadores do Museu Antropolgico do Rio Grande do Sul na

    rea do distrito de Itapu, indicaram a existncia de stios arqueolgicos da Tradio Tupi-guarani, [...].

    Estes stios Tupi-guarani foram localizados na Colnia de Itapu [...], a 3 km da lagoa Negra e do Guaba e

    a 6 km da laguna dos Patos; no Morro da Fortaleza (na rea do Parque, [...], a 1 km do Guaba e a 30 m

    acima do nvel do mar); na praia do Ara (no Parque Estadual de Itapu, a 50 m do Guaba); na praia das

    Pombas (a 15 m da linha d'gua do Guaba, no limite da praia com o mato). [...]. Da mesma tradio,

    foram informados outros stios na ilha das Pombas, na ilha do Junco, nas praias da Ona, da Pedreira, do

    Stio, de Fora e na Prainha, estas no Parque Estadual de Itapu (p. 25).

    Nas cercanias do parque, por sua vez, situa-se a Aldeia Guarani de Itapu (Teko Pind

    Mirim), onde antigamente localizava-se uma aldeia guarani. Verifica-se ento, que a presena guarani

    em Itapu de longa data, registrada pela perspectiva arqueolgica, bem como pelos relatos da

    vizinhana no-indgena local. Ademais aos testemunhos, foram feitos levantamento em arquivos de

    jornais da capital da dcada de 1970 (data de criao do Parque). Foram realizadas seis reportagens

    jornalsticas, entre 1973 e 1975, que descrevem as aldeias guarani de Itapu. Quatro delas so uma

    srie do Correio do Povo escrita por Nrton Corra, antroplogo que visitou uma das aldeias na

    dcada de 1970. A reportagem Itapu: nova escalada dos ndios (Zero Hora, 11 de dezembro de

    1973) menciona a presena de mais de 60 ndios, 17 famlias e 10 casas tradicionais nos morros de

    Itapu. Em relao ao comportamento dos Guarani, todas as reportagens indicam que eles no

    gostavam de ser fotografados nem entrevistados. Residentes antigos do Parque dizem que eles eram

    geralmente muito quietos, reservados e no roubavam nada. Eles se mantinham da terra e, em

    casos extremos, pediam comida.

    Alguns Guarani relataram que deixaram as aldeias por medo de ameaas que sofriam. Outros

    contam que foram expulsos pela polcia. Os ex-moradores afirmam que eles foram impelidos a sair da

    rea pelo seu estilo de vida. Eles eram caadores e, em vista da crescente visibilidade que ganharam

    com a criao do Parque e com as visitas da imprensa, sua presena no era mais desejvel.

    A situao de insegurana fundiria dos Guarani no Rio Grande do Sul alarmante e o

    conflito gerado pela criao de unidades de conservao para salvar os remanescentes da Mata

    Atlntica e a reivindicao dos Guarani pelo reconhecimento de suas terras reflexo da situao de

    ameaa em que se encontram a diversidade cultural no estado. O caso de Itapu evidencia o quo

    injusto o processo de cercamento das florestas pode ser com aqueles que dela dependem para viver.

    Os Guarani sempre estiveram certos ao afirmar a tradicionalidade daquela rea, e o quanto setores

  • influentes da sociedade no deram credibilidade s suas palavras. lamentvel que, embora o direito

    dos povos indgenas s suas terras seja reconhecido como originrio pela Constituio Federal de

    1988, ainda seja necessrio levantar tantas provas apenas para comprovar que os Guarani, habitantes

    milenares dessa terra, realmente nela habitavam at pouco tempo atrs. Embora tenhamos evidncias

    contundentes acerca da ocupao tradicional Guarani em Itapu, ainda h muitos obstculos a serem

    vencidos, sobretudo no que diz respeito ao preconceito da sociedade envolvente em relao aos povos

    indgenas e ideia preservacionista de que a natureza s pode ser conservada na ausncia do ser

    humano. Vale tambm lembrar, que a disperso dos indgenas que viviam nestes espaos, foi

    efetivada pela Brigada Militar do Estado, merecendo ainda o apagamento de qualquer registro de

    existncia viva indgena no interior do Parque. Sendo assim, o Plano de Manejo do Parque Estadual

    de Itapu conta apenas com o registro de material arqueolgico guarani.

    Sem medo de errar, afirmamos e chamamos a conscincia de todos, que onde hoje se situa o

    Parque Estadual de Itapu sempre existiu ocupao tradicional guarani, claramente registrada. de se

    perguntar se no seria justamente pela ocupao guarani na rea, desde tempos remotos, que ela

    configurou-se atraente para conservao/preservao. Ou seja, so os prprios indgenas os

    responsveis pela at ento preservao da mata e dos bichos (fauna e flora para os cientistas),

    presumindo-se, ento, que no seriam eles os possveis inimigos do lugar.

    Que os povos indgenas possam voltar a viver em paz nos espaos ambientalmente saudveis

    que sobraram de suas terras originrias. DEVOLUO IMEDIATA DOS TERRITRIOS

    INDGENAS QUE FORAM TRANSFORMADOS EM CATEGORIA JURDICA DE UNIDADE

    DE CONSERVAO NO RIO GRANDE DO SUL.

    3 REGULARIZAO FUNDIRIA DAS TERRAS GUARANI DO RIO GRANDE DO SUL

    Apresentamos as reivindicaes que as lideranas de comunidades Guarani do Rio Grande

    do Sul encaminharam para os rgos pblicos e nas quais solicitam a demarcao e a regularizao

    fundiria de suas terras. No documento, as lideranas Guarani dizem que o governo federal, em

    articulao com o governo do estado do Rio Grande do Sul, deve resolver um dos graves problemas

    e que impede a ocupao e o usufruto das terras j demarcadas: os pagamentos das indenizaes aos

    ocupantes no indgenas das terras guarani. Este um dever da Funai, pois cabe ao rgo

    indigenista buscar solues para as questes relativas aos problemas fundirios. Os Guarani

    argumentam que somente haver uma soluo para os problemas fundirios atravs de

    entendimentos entre os governos federal e estadual. Salientem que este entendimento deve ocorrer

    principalmente no que se refere ao pagamento dos no-indgenas pelas terras que no passado foram

    loteadas e tituladas pelo governo do Estado e que esto sendo demarcadas como terras indgenas.

  • Com isso, se pode acelerar os processos e diminuir os conflitos. Segue relao das terras destacadas

    pelas lideranas como as prioritrias:

    Cantagalo: O Cantagalo uma das aldeias mais antigas no estado. Os estudos j foram

    concludos, tudo j foi feito, mas os colonos ainda esto l. No aceitamos mais a demora na

    retirada dos ocupantes brancos. J se passam anos da deciso da homologao da terra, mas at

    agora a Funai no pagou as indenizaes e nem procedeu a retirada dos brancos da terra indgena.

    Alm da demora na demarcao, as cercas esto abertas e os animais dos vizinhos entram na terra e

    comem as plantaes da comunidade indgena. A comunidade est muito desanimada com a

    demora.

    Mato Preto: Solicitam que a FUNAI assegure o direito terra tradicional, garantindo a

    continuidade do procedimento demarcatrio uma vez que o relatrio de identificao da rea foi

    publicado. necessrio agilidade na anlise das contestaes apresentadas como resultado do

    direito ao contraditrio das partes interessadas. A comunidade aguarda com expectativa a

    publicao da portaria declaratria da rea.

    Irapu: Agora que finalmente saiu a publicao de identificao e delimitao da rea,

    solicitam rapidez nos demais passos do procedimento demarcatrio, principalmente para que se

    possa estruturar comunidade e construir as casas longe da beira da estrada.

    Estrela Velha: O GT do incio de 2008 e ainda no foi concludo. A TI Kaguy Poty uma

    das reas mais tranqilas para os estudos e concluso do procedimento de demarcao no estado,

    pois os no-indgenas tm vontade de sair. Por causa da demora do GT, esto comeando a mudar

    de ideia, e conflitos podem ocorrer. Exigem que os responsveis pelos estudos de identificao e

    delimitao sejam cobrados pela FUNAI para apresentar imediatamente o relatrio de forma

    definitiva.

    Capivari, Lomba do Pinheiro, Estiva e Lami: Para estas antigas terras guarani houve o

    compromisso da Funai de que o Gt seria constitudo ainda no governo passado. A Funai no

    cumpriu com seu compromisso. So situaes difceis, em funo de nas reas viverem muitas

    famlias, que aguardam com ansiedade pelos encaminhamentos da Funai. Exigem que o prometido

    seja cumprido, e essas terras sejam contempladas e demarcadas com a criao de GT`s.

    Itapu, Ponta da Formiga, Morro do Coco, Arroio do Conde, Petim e Passo Grande:

    Estas terras tiveram os estudos de identificao e delimitao realizados nos anos 2008 e 2009. O

    relatrio foi concludo e entregue para a Funai. Exigem que o rgo indigenista proceda anlise e

    publique o referido estudo. Vale ressaltar que as comunidades vivem em pequenas reas e aguardam

  • pelo efetivo reconhecimento de suas terras.

    Coxilha da Cruz: Aguardam por uma soluo para a completa regularizao do Teko

    Por,desapropriada pelo governo estadual em 2000, mas at hoje no foram pagas as indenizaes.

    O governo estadual no cumpriu com o protocolo de intenes para terminar o pagamento.

    Atualmente a comunidade ocupa apenas a metade da rea desapropriada.

    Mata So Loureno e Esquina Ezequiel: A Mata So Loureno uma das poucas reas

    com matas boas na regio das Misses. A FUNAI deve encaminhar um GT, antes que essa mata seja

    devastada para dar lugar monocultura da soja. A Esquina Ezequiel, nas margens do Arroio Piratini,

    deve estar junto com o GT da Mata So Loureno, pois tambm uma rea importante para a

    formao de aldeia na regio das Misses.

    Acampamento de Santa Maria: A situao das famlias acampadas no municpio de Santa

    Maria necessita de ateno da FUNAI. Esto numa pequena faixa de terra na beira da BR 392, e

    correm riscos quando vo buscar gua e comercializar seus produtos. Aguardam por uma soluo

    para melhorar as condies de vida da comunidade. A comunidade reivindica que a Funai proceda

    aos estudos de uma rea para o assentamento das famlias.

    guas Brancas: Exige-se que a Funai conclua o procedimento de demarcao da TI guas

    Brancas, pois a portaria declaratria desta rea foi publicada h mais de uma dcada.

    Enfim, todas as comunidades tm muita preocupao por causa das incertezas quanto ao

    futuro, principalmente porque eles no tm terra para plantar e dela extrair o sustento. O modo de

    pensar e viver dos Guarani bem diferente dos Juru. Os Guarani sempre procuram o bem viver,

    viver tranquilo, plantar para o consumo das famlias. Os brancos usam a terra como mercadoria e

    no pra vida.

    Os Guarani entendem que essas reivindicaes so legtimas e cabe ao governo respeitar a

    Constituio Federal demarcando as terras tradicionais. Exigimos tambm que sejam cumpridas as

    normas e convenes internacionais, especialmente a Conveno 169 da OIT, sobre questes que os

    afetam, como tem sido os empreendimentos de duplicaes de estradas e barragens que cortam e

    inundam as terras.

    CONELHO DE ARTICULAO DO POVO GUARANI/CAPG. Documento entregue Funai, MPF e outros rgos pblicos.

    4 O ESTADO BRASILEIRO AFRONTA OS DIREITOS INDGENAS NA DUPLICAO

    DAS BR's 116 E 290.

  • Se hoje, no incio do sculo XXI, o Brasil se arvora por estar se tornando um pas gigante na

    economia mundial, nem todos segmentos da populao tm motivos para comemorar. Para os povos

    indgenas, os quinhentos e poucos anos de construo do Brasil significou sucessivas e

    intensificadas perdas, pois o desenvolvimento que ora atinge o seu auge sempre foi, e segue sendo,

    s custas da expropriao das terras indgenas e dos diversos modos de explor-las.

    Fora da regio norte, ltima fronteira da expanso colonial, a situao calamitosa. As terras

    que restaram para os ndios, em geral, so nfimas, redutos para a mera sobrevivncia fsica, quando

    muito. A situao guarani no sul e sudeste do Brasil apresenta a face perversa da colonizao nos

    dias atuais, pois os representantes daqueles que ocupavam grandes extenses territoriais no cone sul

    americano, ao longo das bacias dos formadores do Rio da Prata (rios Uruguai, Paran e Paraguai)

    so sistematicamente desprezados pelos governos dos diversos pases e pelas sociedades nacionais.

    O modo de distribuio espacial mby-guarani resultante do histrico de perdas territoriais

    ocorridas durante a longa experincia desse povo diante das agncias coloniais europeias

    (espanholas e portuguesas, nos primeiros sculos; alems, italianas, polonesas e outras, nos ltimos

    150 anos, aproximadamente). O avano progressivo sobre suas terras promoveu a disperso de

    pequenos grupos familiares que se posicionaram nos interstcios da ocupao colonial.

    Os Guarani, diante deste avano, procuraram os fragmentos de matas restantes para ali

    estabelecerem suas aldeias. O cenrio resultante da instaurao do regime de propriedade privada

    diminuiu radicalmente o volume de reas florestadas, e restringiu o acesso indgena a elas. Em

    virtude da escassez cada vez maior destas reas, uma das alternativas encontradas foi refugiarem-se

    nas beiras de estrada para a construo de suas casas, e a partir dali manejarem as pequenas matas

    que restaram na regio. o que ocorre nas BR's 116 e 290, na regio centro-sul do RS.

    No processo de licenciamento das BR's 116 e 290, os Guarani foram consultados no mbito

    dos estudos de impactos ambientais. No momento em que necessitava da licena, o DNIT,

    responsvel pelas obras, conduziu a construo de acordos com os Guarani. Contudo, aps obterem

    a licena, o DNIT simplesmente comunicou que no ir cumprir com o acordo, numa absoluta

    afronta do Estado aos direitos indgenas, expressos na Constituio Federal:

    Art. 231. So reconhecidos aos ndios sua organizao social, costumes, lnguas, crenas e

  • tradies, e os direitos originrios sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo

    Unio demarc-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. 5. vedada a remoo dos

    grupos indgenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso Nacional, em caso de

    catstrofe ou epidemia que ponha em risco sua populao, ou no interesse da soberania do Pas,

    aps deliberao do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hiptese, o retorno imediato

    logo que cesse o risco.

    O Estado brasileiro viola tambm o disposto na Conveno 169 da Organizao

    Internacional do Trabalho, da qual signatrio:

    Artigo 169.

    1. Com reserva do disposto nos pargrafos a seguir do presente Artigo, os povos interessados no

    devero ser transladados das terras que ocupam.

    2. Quando, excepcionalmente, o translado e o reassentamento desses povos sejam considerados

    necessrios, s podero ser efetuados com o consentimento dos mesmos, concedido

    livremente e com pleno conhecimento de causa. Quando no for possvel obter o seu

    consentimento, o translado e o reassentamento s podero ser realizados aps a concluso de

    procedimentos adequados estabelecidos pela legislao nacional, inclusive enquetes

    pblicas, quando for apropriado, nas quais os povos interessados tenham a possibilidade de

    estar efetivamente representados.

    3. No caso da duplicao das BR's 116 e 290, o que vemos o Estado brasileiro obter o

    consentimento dos Guarani para, imediatamente aps a obteno da licena, e quando

    deveria iniciar a execuo dos termos acordados, negar-se a cumprir com o que se

    comprometeu, num processo conduzido pelo prprio DNIT. Logo, encaminha-se aqui a

    reivindicao de que o Estado brasileiro, atravs de um de seus principais braos

    empreendedores, o DNIT, cumpra com o que foi acordado com os Guarani.

    5 ICMS ECOLGICO: POSSIBILIDADES DE UM NOVO INCENTIVO E APOIO AOS

    POVOS INDGENAS.

  • O ICMS Ecolgico foi criado para ajudar a criar um modelo de gesto ambiental

    compartilhada entre os Estados e municpios no Brasil. A partir dele se consegue trabalhar temas

    como a conservao da biodiversidade, o apoio a pequenas comunidades rurais e incentivo aos

    povos indgenas no que se refere preservao ambiental e ao apoio as produes agrcolas

    autossustentveis.

    O ICMS ecolgico se tornou possvel graas a uma brecha legal alcanada pelo artigo 158

    da Constituio Federal brasileira que permite aos Estados definir em legislao especfica, parte

    dos critrios para o repasse de recursos do Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Servios

    ICMS, que os municpios tem direito. Neste caso a denominao ICMS Ecolgico faz jus na

    utilizao de critrios que focam temas ambientais.

    Nascido para dar uma espcie de compensao financeira aos municpios que possuam

    restrio do uso do solo em seus territrios para o desenvolvimento de atividades econmicas

    clssicas, o ICMS Ecolgico tinha tudo para se transformar numa ferramenta estril, acrtica, uma

    espcie de chancelador puro e simples para o repasse dos recursos, mas felizmente foi, e est

    sendo possvel transform-lo em muito mais do que isto. O ICMS Ecolgico tem representado um

    instrumento de compensao, mas acima de tudo incentivo e em alguns casos, como

    contribuio complementar conservao ambiental.

    No Rio Grande do Sul a lei estadual, N 12.907, DE 14 DE JANEIRO DE 2008. (publicada

    no DOE n 010, de 15 de janeiro de 2008) e que altera a Lei n 11.038, de 14 de novembro de 1997,

    dispe sobre a parcela do produto da arrecadao do ICMS pertencente aos municpios. No inciso

    III ficou estabelecido 7% (sete por cento) com base na relao percentual entre a rea do municpio,

    multiplicando-se por 3 (trs) as reas de preservao ambiental, as reas de terras indgenas e

    aquelas inundadas por barragens, exceto as localizadas nos municpios sedes das usinas

    hidreltricas, e a rea calculada do Estado, no ltimo dia do ano civil a que se refere a apurao,

    informadas em quilmetros quadrados, pela Diviso de Geografia e Cartografia da Secretaria da

    Agricultura , Pecuria e Agronegcio.

    necessrio que os municpios repassem os recursos correspondentes para as comunidades

    indgenas.

  • 6 ORGANIZAO DO PPA/RS ESPECFICO E DIFERENCIADO PARA OS POVOS

    INDGENAS A PARTIR DE SETORIAL INDGENA.

    Devido s experincias anteriores sobre a participao dos indgenas nos Seminrios

    Regionais que tratava sobre o Oramento participativo, essa populao se tornava insignificante na

    disputa pelo Oramento, pois como essa participao era pequena ela no conseguia garantir suas

    propostas, frente a uma populao d massa de no indgenas.

    Nesse sentido, entendemos que se o Poder Executivo se prope a construir Polticas Pblicas

    contemplando essa parcela da populao, respeitando a sua especificidade, e, principalmente,

    atendendo a legislao, conforme o Decreto n 5.051/2004, que promulga a conveno N 169 de

    Organizao Internacional do trabalho (OIT) sobre Povos Indgenas e Tribais. Artigo 6o

    1. Ao aplicar as disposies da presente Conveno, os governos devero:

    a) consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particularmente,

    atravs de suas instituies representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou

    administrativas suscetveis de afet-los diretamente;

    b) estabelecer os meios atravs dos quais os povos interessados possam participar livremente, pelo

    menos na mesma medida que outros setores da populao e em todos os nveis, na adoo de

    decises em instituies efetivas ou organismos administrativos e de outra natureza responsveis

    pelas polticas e programas que lhes sejam concernentes;

    c) estabelecer os meios para o pleno desenvolvimento das instituies e iniciativas dos povos e,

    nos casos apropriados, fornecer os recursos necessrios para esse fim.

    2. As consultas realizadas na aplicao desta Conveno devero ser efetuadas com boa f e de

    maneira apropriada s circunstncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o

    consentimento acerca das medidas propostas.

    E ainda, a LEI N 12.004/2003, que Dispe sobre a criao do Conselho Estadual dos Povos

    Indgenas CEPI - Art. 3 - Ser de competncia do Conselho Estadual dos Povos Indgenas:

    I - propor diretrizes para a poltica indigenista estadual, com objetivo de incentivar a

    continuidade cultural das comunidades indgenas, garantindo-lhes os direitos que lhe so

  • constitucionalmente assegurados;

    II - elaborar projetos que visem implementao, por parte do Estado, de aes nas reas

    da sade, educao, cultura, saneamento, habitao, agricultura, pecuria e outras atividades de

    sustentao e meio ambiente, considerando as especificidades de cada comunidade indgena;

    III - acompanhar a elaborao da proposta oramentria dos rgos de governo,

    nas questes relacionadas s comunidades indgenas, propondo prioridades e alteraes; faz-se

    necessrio que o estado proponha outra metodologia de participao do povo indgena no

    Oramento do Estado; tendo em vista que essa populao esteve, praticamente, nos ltimos anos a

    margem do processo de Desenvolvimento.

    7 ASSITNCIA EM SADE

    No que se refere assistncia em sade, urgente o cumprimento das normas legais

    estabelecidas pela Lei Arouca (Lei 9836/99), bem como as decises judiciais que determinam o

    atendimento imediato, por parte da SESAI, a todas as comunidades indgenas, independentemente

    de onde elas esto localizadas. A poltica de sade e saneamento deve ser estendida aos indgenas

    que se encontram em seus territrios tradicionais ou naqueles no demarcados/homologados,

    tambm denominados como acampamentos.

    8 NORMATIZAO ESPECFICA PARA ATENDIMENTO EDUCAO ESCOLAR

    INDGENA

    O Estado precisa criar o Conselho Estadual Escolar Indgena como rgo que ir tratar

    especificamente sobre a Educao Indgena. necessrio criar um Sistema prprio de Educao. A

    legislao nacional muito ampla e os estados precisam, em conjunto com os indgena,s construir

    suas prpria norma legal. Conforme Resoluo do CNE/ CEB n 03/99 do Conselho Nacional de

    Educao/ Cmara de Educao Bsica. Compete aos estados: Artigo 9, II letra a)

    responsabilizar-se pela oferta e pela execuo da Educao Escolar Indgena; letra b)

    regulamentar administrativamente as escolas indgenas, nos respectivos estados, integrando-as

    como unidades prprias, autnomas e especificas no sistema estadual; Letra c) prover as escolas

    indgenas de recursos humanos, materiais e financeiros para o seu pleno funcionamento. Art. 2

    Constituiro elementos bsicos para a organizao, a estrutura e o funcionamento da escola

    indgena: II ensino ministrado nas lnguas maternas das comunidades atendidas, como uma das

  • formas de preservao da realidade sociolingustica de cada povo.

    9 REPASSE DOS TERRENOS (URBANOS), ONDE ESTO OS INDGENAS, PARA A

    UNIO

    A FUNAI dever construir uma Poltica de atendimento aos indgenas no meio urbano, ou

    seja, regularizar os terrenos que hoje pertencem aos municpios e estados onde esto acampados os

    indgenas Guarani, Caingangue e Charrua para que a Unio, por ter competncia privativa de

    legislar sobre os indgenas, dar um atendimento diferenciado, conforme a legislao vigente. Alm

    do mais uma reivindicao antiga dos indgenas, pois muitas vezes, a no aplicao de recursos

    pblicos da unio nessas reas fica restrita, seja na sade, educao.

    10 REUNIO INICIAL DA SUBCOMISSO

    Aos vinte e cinco dias do ms de junho de dois mil e doze estiveram reunidos os caciques

    representantes dos povos indgenas Guarani e Kaigang; membros dos gabinetes dos deputados

    Edegar Pretto, Jeferson Fernandes e Miki Breier; o assessor especial da CCDH, professor

    Trombetta, e representantes das secretarias do estado que lidam com esta temtica, bem como os

    representantes das entidades ( CIMI, CAPG, UNEGRO e COMIN) que acompanham as questes

    relacionadas a este tema em nvel estadual. Para comear a reunio o coordenador Trombetta deu as

    boas vindas aos presentes e reafirmou a importncia deste grupo na elaborao de um cronograma

    de trabalhos propositivos a partir do seminrio realizado em 2011 e da audincia pblica realizada

    em 2012, ambos por ocasio s celebraes do Dia do ndio (abril de cada ano). Em seguida o

    deputado Jeferson Fernandes deu as boas vindas a todos e reforou a importncia desta subcomisso

    e, acima de tudo, o compromisso que esta casa tem em relao aos povos indgenas. A primeira

    interveno feita foi a do senhor Ederson Silva, representante da SDR, que destacou o trabalho feito

    pela secretaria e, como surpresa, destacou situaes nas quais acampamentos indgenas enfrentam

    dificuldades para conseguirem alimentaes via cestas bsicas destacou que so distribudas

    somente oito cestas bsicas e com isto quatro meses as comunidades no recebem nada. Alm disso

    destacou todo o trabalho feito durante o primeiro ano no qual as preocupaes fundamentais

    estiveram voltadas s questes da terra, ou, em outras palavras, dos que resistem s demarcaes- os

    proprietrios. Neste contexto o senhor Ederson justificou e explicou que os que perderam foram os

    indgenas. Outros pontos destacados por Ederson nesta interveno reforaram a ideia da

    demarcao, das polticas pblicas e da necessidade das comunidades indgenas serem inseridas

    neste debate e no planejamento das aes. Na sequncia passamos a palavra ao senhor Rodrigo,

  • representante da secretaria da Educao do RS, que enfatizou a ideia de que os maiores problemas

    esto relacionados questo das rodovias, estaduais e federais, e que neste contexto o DNIT e a

    FUNAI, rgos federais, devem ser chamados responsabilidade. Em sintonia com as falas do

    senhor Ederson, o Rodrigo corroborou a ideia de que se faz necessrio um Plano para o

    Desenvolvimento das comunidades Indgenas. A concluso, quase que inevitvel, segundo esta

    interveno passa pelo tema terra e os avanos que devem se concretizar a partir de 2012. A

    irregularidade na entrega das cestas bsicas foi o tema recorrente nesta duas intervenes e isso

    culmina, segundo os dois debatedores iniciais, com a reforma das habitaes s margens das

    rodovias que atualmente enfrentam uma morosidade incompreensvel. Houve, em 2011, segundo

    Ederson, um investimento de R$ 250.000,00 com os povos indgenas e que para 2012 a previso

    de um investimento de R$ 500.000,00. Neste momento da reunio o senhor Rodrigo sugeriu que se

    inclusse na pauta a questo do etnodesenvolvimento a partir de polticas pblicas dirigidas aos

    indgenas (este tema foi reforado pelo senhor Incio). Dando continuidade a reunio o coordenador

    Trombetta passou a palavra ao cacique Santiago Franco que descreveu o sofrimento dos povos

    indgenas e reiterou a necessidade desta comisso realizar este trabalho de diagnstico e, acima de

    tudo, de proposies objetivas capazes de resolver os problemas vivenciados por todas as

    comunidades. O cacique destacou que, de fato, o sofrimento dos indgenas muito grande. A

    senhora Evanir Kich, representante do COMIN, reforou as ideias debatidas at ento e enfatizou a

    urgncia destas aes idealizadas por esta subcomisso. Em sintonia com estas colocaes est a

    interveno da senhora Maria Ione Pilger, membro do COMIN, que destacou os contatos feitos at

    ento pela CCDH e as reunies prvias tidas com os caciques Charrua. Em sua fala destacou a

    necessidade de um cronograma de trabalho e o envolvimento e comprometimento dos

    parlamentares. Em sequncia aos debates preparatrios aos trabalhos da subcomisso falou a

    senhora Rabeca Peres da Silva (CIMI) que diz ser esta uma iniciativa muito importante e que o

    senhor Roberto falaria pelo Conselho. O senhor Roberto Antonio Liebgott, membro do CIMI, em

    suas colocaes enfatizou a necessidade de compreendermos as atribuies dos poderes Legislativo

    e Executivo e disse que, de fato, a realizao de um diagnstico srio fundamental a esta

    empreitada e que, segundo sua compreenso, a execuo dos projetos o segundo passo. Esta

    hiptese reforada a partir das experincias que o mesmo teve a frente do CIMI. Destacou que os

    rgos federais devem ser chamados ao compromisso e que no podem fugir aos seus deveres.

    Disse tambm que existe um sofrimento histrico dos povos indgenas, principalmente os que

    vivem s margens das rodovias estaduais e federais. O sofrimento, segundo Roberto, se manifesta

    atravs da fome, das doenas e no descaso dos branco e dos governos em relao aos

    acampamentos nos ltimos anos. Em seguida se manifestou o cacique Kaigang Antnio dos Santos;

    em sua fala houve um clamor humano por justia, pois, segundo colocaes deste, os indgenas

  • ajudaram a construir o Brasil e que os brancos tm responsabilidades sobre os atos que cometem. O

    sofrimento decorrente da falta de ateno dos governos resulta nas pssimas condies de vida dos

    diferentes povos indgenas. O cacique fez um apelo: No se desliguem de ns! Olhem para ns!

    Somos Gente! Seguindo as colocaes anteriores o cacique Valdomiro Vergueiro disse que em So

    Leopoldo residem 35 famlias sobre 2,5 hectares de terra e que nos ltimos cinco anos nasceram

    doze crianas e destas morreram cinco. Enfatizou que este espao de terra no suficiente para

    todos os habitantes e que o artesanato o nico meio de trabalho capaz de lhes proporcionar

    condies de vida mnima. Depois da primeira rodada de intervenes o coordenador Professor

    Trombetta passou a palavra ao deputado Jeferson Fernandes que props uma pauta com os

    seguintes pontos: a) organizao de um roteiro de visitas em todas as comunidades indgenas do

    RS; b) elaborao e um diagnstico sobre a realidade de cada um dos acampamentos; c) realizao

    de uma audincia pblica (marcada para 08 de agosto de 2012 no Plenarinho: sala Joo Neves da

    Fontoura) com o intuito de debater a questo da demarcao das terras indgenas (nesta audincia o

    grupo deliberou que os seguintes rgos e pessoas sero convidados: FUNAI, DNIT, Ministrio

    Pblico Federal, o antroplogo Joo Pacheco de Oliveira, as comisses de Direitos Humanos da

    Cmara e do Senado Federal, o senhor Antnio Alves da SESAI, a doutora Dbora do Pr da Sexta

    Cmara de Braslia. Nesta audincia pblica o tema a ser discutido girar em torno da demarcao

    das terras indgenas. Ainda nesta reunio, e isto ficou em aberto, foi pautada a questo da

    infraestrutura mnima necessria realizao da audincia pblica: transporte dos indgenas e

    alimentao (estes pontos no foram fechados, pois nenhum dos presentes soube apresentar uma

    sada concreta). Na sequncia da reunio outras interferncias foram feitas pelos participantes, mas

    todas elas com o sentido de garantir a pauta de trabalho nestes prximos cento e vinte dias sempre

    tendo presente o diagnstico e as sugestes para sanar os grandes problemas enfrentados pelos

    indgenas. Como sugesto prtica e pedaggica o senhor Rodrigo props a elaborao de um vdeo

    de aproximadamente cinco minutos para ser usado como subsdio aos trabalhos de deputados,

    educadores e demais interessados. A ideia foi acatada e a CCDH ver as condies para a

    concretizao da mesma. Na reunio, alm do temas de pauta: demarcao das terras, sade nas

    aldeias, educao e discriminao dos estudantes ndios na UFRGS, acampamentos indgenas nas

    rodovias 116, 101, 040, 386, a priso dos indgenas em celas comuns, tambm houve a proposta de

    um grande seminrio no ms de outubro para tratar de proposies e sugestes capazes de melhorar

    a qualidade de vida dos indgenas. Neste contexto o senhor Gomes, coordenador da bancada do PT,

    afirmou este ato teria carter nacional (com a presena de ministros e responsveis por estas pastas).

    Depois de duas horas de debate o coordenador passou a palavra ao deputado Jeferson Fernandes

    que concluiu entusiasticamente os trabalhos.

  • 11 RELATO DE VIAGEM A FREDERICO WESTPHALEN, IRA E CARAZINHO

    Entre os dias vinte e nove de junho e primeiro de julho, Luis Carlos Trombetta e Santiago

    Franco (cacique Guarani), representando a CCDH,LA, estiveram realizando uma diligncia nos

    municpios de Frederico Westphalen, Ira e Carazinho com o intuito de verificar a realidade dos

    povos indgenas e tambm do Conselho Missionrio Indigenista. A caminhada comeou as sete

    horas da manh de sexta e encerrou-se as 17 horas do domingo. O primeiro encontro formal foi

    realizado na Cria Metropolitana da Diocese de Frederico Westphaln; neste encontro

    compareceram: Mrio Rodrigues de Oliveira, membro do CIMI de Ira; Moiss Cargnen, membro

    do CIMI de Taquaruu do Sul; Monsenhor Luis Dalacosta, representante da diocese; cacique

    Santiago Franco (representante indgena Guarani) e Luis Carlos Trombetta, coordenador da

    CCDH,AL. A reunio comeou as quatorze horas, presidida por Luis Carlos Trombetta, este

    destacou as finalidades e objetivos da subcomisso que tratar as questes indgenas. Em seguida, o

    coordenador passou a palavra ao senhor Moiss que passou a relatar o que segue: a sede do CIMI na

    cidade de Ira bastante modesta e tem uma pequena sala que comporta em torno de sete pessoas,

    tem telefone convencional conectado a Internet, mquina de fotocpia ou xerox, mesa e algumas

    cadeiras. Destacou que no tem nenhum funcionrio remunerado e ou fixo para atender as

    demandas e que so os prprios funcionrios do CIMI que fazem a manuteno bsica: limpeza e

    eventuais trocas de equipamentos. Tanto o senhor Moiss quanto o senhor Mrio destacaram que

    toda a regio norte do RS atendida por eles e que o espao territorial muito abrangente. Nas

    colocaes feitas por estes dois conselheiros do CIMI transpareceu que este um trabalho

    voluntrio e que as suas iniciativas que possibilitam um atendimento mnimo a estas

    comunidades. Os dois no so liberados para trabalhar com as questes indgenas. Na sequncia das

    exposies o senhor Mrio destacou que em 2012 no houve um planejamento de mdio prazo

    como ocorrera em 2011, pois os recursos para isto so mnimos. O que os dois colaboradores

    destacaram que acontecem planejamentos semanais, principalmente a partir das demandas

    surgidas durante a semana anterior.

    As exposies continuaram e os conselheiros explicitaram que a prioridade o atendimento

    dos 11 acampamentos da regio e que, muitas vezes, no ocorre um atendimento a contento

    devido a falta de recursos do Conselho. Um fato singular que ambos destacaram a parceria e ou

    apoio da Diocese de Frederico Westphalen e a Arquidiocese de Passo Fundo. Em consonncia com

    estas colocaes o senhor Mrio disse que entre seis e oito de julho de 2012 acontecer um

    planejamento no estado do Paran no qual o intuito principal ser o de definir questes financeiras

    do conselho. At o presente momento o CIMI disponibiliza um automvel Gol/modelo 2012 ao

  • trabalho de ambos. Mas o que problemtico, segundo os conselheiros, conseguir recursos para a

    formao e para concretizar as lutas em favor de terra e sade.

    Em seguida, moderado pelo coordenador, os conselheiros passaram a relatar a dura realidade

    deles no Norte do RS. O primeiro cenrio descrito envolve a realidade de Vicente Dutra. Neste

    municpio existe um conflito explcito entre os agricultores e os indgenas. Ambos colocaram que

    nesta cidade j tem o processo de DESINTRUSO dos agricultores e que falta agora o Estado

    indenizar os agricultores e, logo em seguida, retir-los das terras indgenas.

    Uma segunda situao relatada foi o caso de Mato Preto em Erebando. Neste contexto,

    segundo os conselheiros, j existe o levantamento fundirio, mas falta a Portaria Declaratria; a

    partir deste ato que se encaminha a indenizao dos agricultores. s depois disto que os ndios

    podero ocupar as terras. Neste contexto todo o entrave esbarra no Ministro da Justia, pois este

    precisa deferir a liminar. Os relatos demonstram que em Erebango existem onze famlias. A rea

    total a ser demarcada gira em torno de 4.230 acres de terra. O que intriga os conselheiros neste

    processo todo a demora da deciso ante a existncia do relatrio antropolgico circunstanciado

    que j foi publicado h mais de um ano e que o ministro no delibera. Diante da questo terra os

    senhores Mrcio e Moiss relataram a seguinte lista que consta as reas das terras indgenas do

    norte do estado do RS que necessita de decises objetivas e imediatas: 1) So Roque (kaingang) -

    Erexim; 2) Xingu/Chg'gu (kaingang) Constantina; 3) Campo do Meio (kaingang) Gentil; 4)

    Carazinho (kaingang) Carazinho; 5) Lajeado do Bugre (Kaingang) Lajeado do Bugre; 6) Mato

    Castelhano (kaingang) Mato Castelhano; 7) Mato Preto (Guarani Nhandeva) Erebango; 8) Passo

    Grande da Forquilha (kaingang) Cacique Doble; 9) Rio dos ndios (kaingang) Vicente Dutra;

    10) Votouro/Kandoia (kaingang) Faxinalzinho; 11) Faxinal (Kaingang) gua Santa; 12)

    Borboleta (kaingang) Salto do Jacu; 13) Cacique Doble (kaingang) Cacique Doble; 14)

    Carreteiro (kaingang) gua Santa; 15) Guarita (kaingang e Guarani) Redentora; 16) Inhacor

    (kaingang) So Silvrio; 17) Kaingang de Ira (kaingang) Ira; 18) Ligeiro (Kaingang)

    Charrua; 19) Monte Caseros (kaingang) Caseiros e Gentil; 20) Rio da Vrzea (kaingang)

    Liberato Salzano; 21) Serrinha (kaingang) Ronda Alta, Trs Palmeiras e Constantina; 22) Ventarra

    (kaingang) Erebango; 23) Votouro (kaingang) Benjamim Constante do Sul; 24) Votouro Guarani

    (Guarani Nhandeva) Benjamim Constante do Sul; 25) Nonoai (kaingang) Nonoai, Rio dos

    ndios, Gramado dos Loureiros e Planalto; 26) Salto do Jacu (guarani) - Salto do Jacu; 27)

    Inhacapetum (guarani) So Miguel das Misses.

    A questo da Demarcao das Terras Indgenas, conforme combinao prvia, ser debatia

    em Audincia Pblica no Plenarinho da AL, em 08 de agosto de 2012 e tambm em Frederico

    Westphalen, ou em 13 ou 20 de agosto prximo. Neste debate os protagonistas devem ser os

    indgenas, atingidos pela falta de poltica objetiva a eles. Neste cenrio a questo do transporte dos

  • indgenas s audincias pblicas apareceu com um dado prioritrio.

    Um segundo tema trabalhado na Cria foi o que se relaciona a infraestrutura. Neste aspecto

    o senhor Mrio destacou que a luta do CIMI e das prprias comunidades est ligada a questo da

    autossustentao, pois isto gera mais dignidade. O conselheiro acrescentou temos que lutar para

    que a terra seja garantida a todas as comunidades, pois ela pr-requisito da dignidade dos povos

    indgenas. A Cesta Bsica o primeiro passo, mas no o fundamental. O que interessa, de fato, o

    apoio aos projetos e s polticas agrrias para a viabilizao das comunidades indgenas. Neste

    contexto a questo do maquinrio, das sementes, da adubao, etc. vem como um complemento

    significativo. O grande problema enfrentado pelas comunidades, segundo colocaes, a omisso

    do Estado e do governo Tarso em no assumir a Desintruso dos agricultores.

    A angstia dos conselheiros e do cacique Santiago se manifestou em vrias intervenes.

    Eles, corroborando este clima, afirmaram categoricamente, que em Vicente Dutra ningum assume

    este compromisso. Tambm ratificaram que em Xingo, Mato Preto, Forquilha, Candia e em outras

    comunidades todos lavam as mos diante deste fato.

    Um fato que chama a ateno de todos a negativa do secretrio Ivar Pavan em aceitar

    certas reas como de direito indgena. Afirmaram que o secretrio assinou um documento no qual

    o Estado do RS no reconhece nenhuma destas novas reas indgenas (com exceo das dez

    primeiras da citao acima). Isto acontece mesmo j existindo o Estudo Antropolgico e

    Socioambiental destas comunidades. Neste cenrio destacam que de suma importncia a

    convocao do Secretrio Ivar Pavan s Audincias Pblicas.

    Neste instante da reunio o grupo estabeleceu, como prioridade, a organizao da Audincia

    Pblica na cidade de Frederico Westphalen na qual se deve estudar a possibilidade de transporte dos

    indgenas de Carazinho, Vicente Dutra e outras cidades ao local do evento. Uma segunda Audincia

    Pblica que deve ser realizada na cidade de Passo Fundo. Nesta as comunidades do entorno sero

    chamadas: Mato Castelhano, Campo do Meio, Mato Preto e demais comunidades no entorno (como

    Passo Grande, Candia, etc.).

    Quando chegamos no tema sade a reclamao subiu o tom. Afirmaram que na passagem da

    FUNASA para SESAI as coisas pioraram. Tudo ficou mais difcil: menos funcionrios, menos

    medicamentos, falta d'gua, filas para o atendimento via SUS, falta de medicamentos e de

    transportes aos doentes. O deslocamento dos doentes a longas distncias nas situaes que envolve

    o atendimento sade.

    Os conselheiros destacaram que, por incrvel que parea, a educao o setor que mais

    funciona entre as comunidades indgenas na regio. O que acontece a falta de documentao e

    educao diferenciada aos povos indgenas. Como sugesto de trabalho apontaram os nomes de

    Sandro Lukmann do COMIN e do Manoel (Manolo Boliviano) para trabalharem a questo da

  • educao e da auto sustentao destas comunidade do Alto Uruguai, norte do RS.

    Neste momento os conselheiros assumiram o compromisso de elaborarem um roteiro para a

    visitao e disponibilizarem aos deputados desta subcomisso e de seus colaboradores. Tambm

    conversaram sobre a realidade das pessoas das comunidades desta regio. O cronograma dever ser

    organizado e executado entre os meses de julho e outubro. Depois de diversas participaes a

    reunio foi concluda e o Cacique Santiago e o coordenador Trombetta partiram para a cidade de

    Ira para verificarem a situao existencial dos Kaigangs.

    Na comunidade de Ira acompanharam a exposio do artesanato na festa das laranjas; logo

    em seguida foram ao encontro do cacique Jadir Jacinto, em sua prpria aldeia (antigo aeroporto

    municipal). O cacique destacou que a grande luta dos Kaigangs na aldeia gira em torno da terra

    (garantir a posse). Na cidade de Ira a principal atividade dos Kaigangs o artesanato. No dia

    estavam expondo seus produtos na Festa da Laranja que aconteceu no centro da cidade de Ira, RS.

    Tambm, nesta diligncia, evidenciou-se a falta de atendimento sade dos indgenas (demora de

    mais de um ano para procedimentos mais complicados). O cacique destacou que a educao est

    bem: so mais de 350 estudantes frequentando aula atualmente. Constatou-se a existncia de uma

    escola dentro da reserva dos Kaigangs. Em consonncia com este debate o cacique destacou que os

    284 acres de terra so insuficientes para as cento e sessenta famlias que a residem. Na comunidade

    so muitas crianas brincando e sem muitas ocupaes.

    A terceira atividade aconteceu em Carazinho em outra comunidade Kaigang. Nesta, o

    cacique que nos atendeu foi o Ivo Galles. Nesta comunidade o cacique destacou que so onze

    famlias que fazem artesanato s margens da BR 386. No acampamento existem quarenta crianas.

    As condies so difceis: sem gua, sem casa, sem condies mnimas de sobrevivncia. O cacique

    Ivo Galles destacou que mais famlias chegaro ao acampamento nos prximos dias. Nos dois

    casos constatou-se a desconfiana dos indgenas em relao ao Judicirio, poder que, segundo eles,

    processas ndios em caso de manifestaes estradas trancadas.

    Em todas as conversas foi destacada a preocupao dos deputados em relao as condies

    de vida dos indgenas. Depois destas conversa nos deslocamos para Porto Alegre (domingo tarde).

  • CONCLUSES

    A partir das atividades realizadas razovel afirmar:

    1) A regularizao das terras indgenas, por meio da demarcao, de fundamental importncia para a sobrevivncia fsica e cultural dos vrios povos indgenas que vivem no RS e no Brasil;

    2) As terras indgenas, alm de inalienveis e indisponveis, no podem ser objeto de utilizao de qualquer espcie por outros que no os prprios ndios;

    3) A temtica da terra, segundo diferentes depoimentos, uma das mais importantes quando se trata da questo indgena no Rio Grande do Sul. Neste item salutar destacar que muitas terras indgenas necessitam ser demarcadas no Estado;

    4) A regularizao das terras em territrios indgenas um importante passo para se construir uma poltica pblica verdadeira e eficiente aos povos indgenas, garantindo acesso sade, educao e a atividades produtivas que permitam a subsistncia com dignidade;

    5) No RS, a populao indgena vive em pelo menos 77 reas, em diferentes estgios de demarcao e regularizao;

    6) Os investimentos governamentais do RS so insuficientes (R$ 250.000,00 em 2011 e uma estimativa de R$ 500.000,00 em 2012);

    7) A estrutura de atendimento sade das comunidades indgenas insuficiente e deixa muito a desejar (tanto pelos rgos estaduais quanto pelos federais);

    8) Os acampamentos s margens de rodovias estaduais e federais so fenmenos que preocupam as entidades indigenistas;

    9) Os conflitos antropolgicos e sociais que acontecem nos diferentes municpios do estado preocupam os administradores locais e podem fomentar uma onda de violncia incomensurvel se no forem solucionadas as questes da demarcao;

    10) As mortes de crianas nos acampamentos indgenas urbanos devem ser monitoradas com mais ateno pelos diferentes rgos governamentais;

    11) O respeito s comunidades indgenas e os investimentos em polticas de desenvolvimento so condies indispensveis ao futuro dos mesmos.

    Como concluso final interessante ressaltar que a falta de polticas pblicas claras sade, educao, habitao e ao desenvolvimento rural das comunidades indgenas no interior do RS est fazendo com que muitas famlias migrem para as margens de rodovias e cidades e isto, de fato, gera a perda de cultura, tradio e espiritualidade dos povos indgenas que habitam as terras gachas.

    Porto Alegre, 13 de dezembro de 2012.

    Deputado MIKI BREIER,Relator.

  • ANEXO 1

    OS DIREITOS HUMANOS DOS POVOS INDGENAS

    OS POVOS GUARANI, KAINGANG E CHARRUA E A CONTNUA LUTA PELA GARANTIA DE SEUS DIREITOS!

    Roberto Antonio LiebgottVice-Presidente do Cimi

    1. IntroduoPara discutir os direitos humanos dos povos indgenas importante levar em conta um

    conceito defendido por especialistas em matria de direito e pelo que vem sendo debatido e refletido em fruns, seminrios e outros espaos que tratam do tema: Direitos humanos so aqueles direitos inerentes pessoa para assegurar a sua integridade fsica, psquica, social e cultural. So valores caracterizados como constitutivos dos seres humanos. Portanto, no so concesses de Estados ou de sociedades. Ao contrrio, so conquistas que dizem respeito a todos e o poder pblico tem o dever de nortear suas aes a partir de tais direitos.

    H que se ter em conta, na anlise deste tema, que a nossa Constituio Federal, especialmente o Captulo VIII, artigos 231 e 232, fixa como garantias essenciais dos povos indgenas os direitos terra e diferena. Portanto, no que tange ao conceito acima referido e naquilo que reza a nossa Lei Maior, pode-se concluir que os povos indgenas receberam a ateno devida do legislador e o consequente amparo aos direitos individuais e coletivos. Contudo, ao olhar para povos indgenas, e, particularmente, para aqueles que habitam no Rio Grande do Sul, se evidenciam as graves questes que os afetam. So dezenas de comunidades que vivem em pores nfimas de suas terras tradicionais ou acampadas nas margens de rodovias espera de providncias do poder pblico. Conclui-se que, na prtica, o Estado e seus governantes no levam em conta os direitos humanos inscritos em leis, normas e tratados internacionais.

    Nesta abordagem sobre os direitos humanos dos povos indgenas farei uma breve memria acerca das garantias estabelecidas pela Constituio Federal a estes povos. Na sequncia apresento um relato histrico e contemporneo sobre os trs povos (Guarani, Kaingang e Charrua) que habitam tradicionalmente no Rio Grande do Sul, explicitando que as violaes aos seus direitos humanos so histricas. Tambm especifico como esto estruturadas as polticas pblicas para estes povos e, atravs de um quadro demonstrativo, aponto os dados sobre a situao fundiria das terras no estado.

    Entre os temas abordados se consegue perceber algumas importantes conquistas quanto aos direitos inscritos nas leis e a sua aplicao prtica no cotidiano. Saliento, no entanto, que estas se devem essencialmente organizao e mobilizao dos povos e s alianas firmadas com diferentes seguimentos sociais, populares, igrejas, instituies e entidades no Brasil e no exterior.

    2. Os Direitos Constitucionais Com a promulgao da Constituio Federal no ano de 1988 se rompeu com a perspectiva

    poltica estatal da incorporao indgena comunho nacional, assegurando com isso o direito diferena e consolidando garantias individuais e coletivas de todos os povos, base essencial de qualquer direito humano. A nossa Constituio passou a reconhecer os povos indgenas como portadores de organizaes sociais prprias, com usos, costumes, crenas, tradies, lnguas maternas e processos prprios de aprendizagem, os quais deveriam receber ateno respeitosa da sociedade e a proteo do Estado brasileiro.

  • O captulo VIII, Dos ndios, composto pelos artigos 231 e 232. Eles explicitam bem o reconhecimento identidade cultural prpria e diferenciada dos povos indgenas (organizao social, costumes, lnguas, crenas e tradies), bem como os seus direitos originrios sobre as terras que tradicionalmente ocupam. De acordo com este artigo: So terras tradicionalmente ocupadas pelos ndios as por eles habitadas em carter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindveis preservao dos recursos ambientais necessrios ao seu bem-estar, e as necessrias sua reproduo fsica cultural, segundo seus usos, costumes e tradies (art. 231, pargrafo 1).

    A partir deste marco constitucional se entende definitivamente que o Estado deve proteger as terras indgenas e demarc-las sob duas formas de direitos territoriais: o primeiro, por meio do reconhecimento de direitos originrios e imprescritveis posse permanente e ao usufruto exclusivo das riquezas naturais existentes no solo, nos rios e lagos das terras de ocupao tradicional; e o segundo que, compete Unio, o dever de demarcar as terras conforme os limites tradicionalmente ocupados, ou seja, de acordo com seus usos, costumes e tradies.

    Esse reconhecimento do direito originrio sobre as terras representa, em sntese, a garantia de continuidade da existncia dos povos indgenas. O Estado brasileiro torna-se obrigado a reconhecer o carter pluritnico de sua populao e ao mesmo tempo deve assegurar o direito terra. De acordo com a Constituio Federal o conceito posse indgena no se confunde com o conceito civil. Tanto assim que o artigo 22, XIV afirma que compete Unio legislar sobre populaes indgenas.

    necessrio fazer referncia tambm ao que estabelece o artigo 20, XI da Constituio. Nele fica estabelecido que as terras tradicionais indgenas so bens da Unio, portanto a propriedade no indgena. Essa norma explicita que no somente a ocupao fsica da terra o objeto de proteo, mas assegura o direito ocupao tradicional. Esta concepo mais adiante tomar corpo enfatizando que o uso tradicional da terra visa assegurar o desenvolvimento de atividades religiosas, a proteo das reas sagradas, dos espaos culturais, tendo como referncia o futuro do povo.

    O direito posse da terra, explicitado como direito originrio e, portanto, que no depende de titulao, constitui-se num direito que precede sobre os demais direitos (Art. 231, caput). Do mesmo modo, o pargrafo 2 deste artigo estabelece que as terras tradicionalmente ocupadas pelos ndios se destinam sua posse permanente e ao usufruto exclusivo das riquezas dos solos, rios e lagos. As terras so patrimnio da Unio. Os recursos hdricos nela existentes e as pesquisas de lavra mineral somente podem ser desenvolvidas mediante autorizao do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, que tero participao assegurada nos resultados da lavra, na forma da lei. Vale ressaltar, no entanto, que a possibilidade de ocupao e explorao dos recursos naturais em caso de relevante interesse pblico da Unio depende de lei complementar. Em relao a ocupaes de boa f, o mesmo artigo estabelece que a Unio indenizar as benfeitorias.

    As terras indgenas so inalienveis e indisponveis e os direitos indgenas sobre elas so imprescritveis, destacando-se o fato de que os povos indgenas no podem ser removidos de suas terras a no ser em casos de catstrofe, epidemia, ou em casos de interesse da soberania do pas, com o referendo do Congresso Nacional, garantindo, em qualquer dos casos supracitados, o retorno imediato da populao indgena, to logo cesse o risco.

    J no artigo 232 afirma-se que os ndios, suas comunidades e organizaes so partes legtimas para ingressar em juzo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministrio Pblico Federal em todos os atos do processo. Tal dispositivo configura-se em importante ferramenta de luta para os povos indgenas, uma vez que suas comunidades passam a ser consideradas entes com personalidade jurdica (no necessitando para isso de registros e estatutos especficos), dispensando inclusive a intermediao (tutela) de rgos indigenistas em aes ajuizadas.

    Faz-se necessrio salientar que nas Disposies Transitrias (Artigo 67) foi estabelecido um prazo de cinco anos, a partir da promulgao da Constituio, para a demarcao de todas as terras indgenas. Esse prazo esgotou-se em 5 de outubro de 1993 e os governos no cumpriram com esta

  • determinao. Ainda hoje, no Brasil, existem mais de 600 terras indgenas a serem demarcadas.

    3. Os Povos Guarani, Kaingang e CharruaApresento, de forma sucinta, alguns elementos acerca das culturas e das realidades dos

    povos Guarani, Kaingang e Charrua que habitam o Rio Grande do Sul, suas formas de ver o mundo, de se relacionarem com a natureza e a luta pela demarcao e garantia de suas terras como sendo espaos sagrados para o futuro.

    3.1. O Povo GuaraniDe acordo com muitos relatos histricos, o povo Guarani chegou a ser constitudo por mais

    de quatro milhes de pessoas e ocupava especialmente a regio de mata mida dos rios da Bacia Platina, tendo chegado at a Bacia Amaznica. Tambm denominado Aw (termo que, em portugus, significa gente) parte do grande tronco lingustico Tupi e pertence famlia Guarani. Hoje, a populao Guarani superior a 280 mil pessoas em toda a Amrica do Sul.

    Os Guarani subdividem-se em grupos (parcialidades), assim definidos: Kaiow (tambm referidos na literatura acadmica como Kaiov, Kayov ou Pa-Tavyter), Nhandeva (referidos ainda como Xirip e Ava Katu Ete), os Mby e ainda Guaraios (Bolvia). As comunidades esto distribudas em mais de 400 aldeias em quatro pases da Amrica do Sul. No Rio Grande do Sul so mais de duas mil pessoas vivendo em pequenas reas de terra ou em acampamentos de beira de estrada.

    Por ser um povo extremamente religioso, se relaciona com a terra como sendo espao sagrado onde se estabelecem as relaes com o mundo religioso, mtico e onde se estabelecem relaes familiares, comunitrias e se desenvolvem os valores da reciprocidade. Em consequncia disso, so avessos aos conflitos.

    Na terra, espao fsico e simblico, os Guarani cultivam uma grande variedade de plantas medicinais, frutferas e para o alimento dirio. Suas aldeias sempre foram construdas em lugares cobertos de mata e com muitas nascentes de gua. Os Guarani denominam esses lugares de tekoha. O tekoha o lugar fsico terra, mato, campo, guas, animais, plantas, remdios etc. onde se realiza o teko, o modo de ser, o jeito de viver Guarani. Esse lugar tem que permitir que se realizem os rituais, as relaes sociais, as ligaes recprocas entre as famlias e as atividades produtivas. A terra necessita ter gua e mata, recursos de grande importncia na vida, que asseguram as relaes com o mundo espiritual dos Guarani. Indispensveis so as reas para plantio da roa familiar ou coletiva e a construo de suas habitaes e lugares para atividades religiosas. Muitas das terras reservadas pelo Estado aos Guarani so pequenas, insuficientes, e no atendem aos critrios culturais, tnicos, religiosos e de subsistncia.

    Um aspecto importante da vida do povo Guarani diz respeito palavra, que para eles um importante elemento de constituio da pessoa e de elaborao contnua de seu modo de viver. Estudiosos como Curt Nimuendaj e Bartomeu Meli afirmam que os Guarani so o povo da palavra, e a prtica de escutar e de falar configura sua organizao social, poltica, religiosa. Graciela Chamorro afirma ainda que a espiritualidade Guarani uma experincia da palavra ancorada em uma complexa teologia que s se pode observar frente a um estudo profundo e prolongado.

    pela palavra que a pessoa guarani vai sendo constituda, e essa produo se inicia antes mesmo do nascimento de um novo ser, ou de sua concepo propriamente dita. Para eles a vida se inicia quando um componente divino enviado e se coloca a caminho, at chegar e fazer morada em um corpo Guarani. Essa poro divina enviada em forma de palavra-alma e se torna pessoa medida que vai sendo pronunciada, lida, inventada, atravs de palavras que so proferidas pelos pais, pelos lderes religiosos, pela comunidade, em diferentes momentos cotidianos e rituais. Observa-se, assim, que a palavra um componente central no dia a dia dos Guarani e ela se converte em conselhos e ensinamentos (dos pais para os filhos, dos ancios kara para os jovens, e assim por diante).

    Na atualidade, os Guarani lutam para manter suas formas tradicionais de vida , mesmo com

  • a intensa fragmentao de seu territrio e, em muitos casos, com a condio de habitantes de acampamentos, em barrancos e beiras de estradas. Brighenti (2010) discute, na obra Estrangeiros na prpria terra, a forma como este povo restabelece sua identidade e suas vinculaes com o territrio, frente s polticas estabelecidas pelos Estados brasileiro, argentino e paraguaio, que os trata como estrangeiros e recusa-se em demarcar territrios condizentes com as expectativas deste povo. A questo central que marca os conflitos atuais vividos pelos Guarani a falta de espaos para viverem suas culturas e a necessidade crescente de estabelecerem dilogo com os Estados Nacionais que, na prtica, no admitem a especificidade de suas formas de ocupao territorial e seu direito de acesso e usufruto deste territrio. Tal questo coloca para o povo Guarani a necessidade de atualizao de seus discursos religiosos, no sentido de incorporarem neles a dimenso da luta poltica, conforme avalia o autor.

    3.2. O Povo KaingangO nome Kaingang foi introduzido no final do sculo XIX por Telmaco Borba. Antes disso,

    eles recebiam vrias denominaes. Embora sejam conhecidos pelo nome Kaingang, eles tambm se autodenominam Kanhgg. Falam a lngua Kaingang, pertencente famlia lingustica Macro-J, e o portugus.

    Quanto cultura dos Kaingang, Ricardo Cid Fernandes, na sua tese de doutorado Poltica e Parentesco entre os Kaingang: uma anlise etnolgica, aborda o dualismo da organizao social deste povo. Uma organizao dualista , de acordo com o autor, um tipo de classificao dos membros de uma sociedade em metades complementares. No caso dos Kaingang, as duas metades complementares so denominadas de Kam e Kairu, sendo a metade Kam composta pelas subdivises Kam e Wonhetky e a metade Kairu composta pelas subdivises Kairu e Votor (FERNANDES, 2003). O dualismo Kaingang assenta-se na mitologia (descrita pela primeira vez por Telmaco Borba), que narra a histria de dois irmos Kam e Kairu que, aps um grande dilvio, saram do interior da terra. A partir de ento Os irmos mitolgicos Kam e Kairu no apenas criaram os seres da natureza, mas tambm as regras de conduta para os homens, definindo a frmula de recrutamento s metades (patrilinearidade) e estabelecendo a forma como as metades deveriam se relacionar (exogamia) (FERNANDES, 2003, p. 38).

    A populao Kaingang no Rio Grande do Sul de aproximadamente 30 mil pessoas. Mas h dezenas de reas e comunidades deste povo em So Paulo, Paran, e Santa Catarina. Kimiye Tommasino (1998) afirma que os Kaingang formam um dos povos indgenas de maior contingente no Brasil. A pesquisadora avalia que os conflitos decorrentes da ocupao ocidental sobre as terras deste povo, engendraram transformaes profundas no modo de vida Kaingang, especialmente porque destruiu as bases materiais de produo econmica, alterou os padres tradicionais de abastecimento e, consequentemente, toda a organizao social Kaingang.

    Os Kaingang so tradicionalmente caadores e coletores, mas a agricultura (em pequena escala) tambm era praticada no espao entre a aldeia e as matas pertencentes a estes povos e nas encostas de morros - plantavam em especial milho pururuca, abbora, amendoim e feijo vara. Os acampamentos fixos dos Kaingang eram, em geral, fixados na regio de campos, e estes eram chamadas de em (oujem). Havia tambm acampamentos provisrios (wre) nas florestas e beiras de rio para se abrigarem nos meses em que caavam ou pescavam (TOMMASINO, 1998).

    A forma de ocupao do territrio se dava de modo contnuo pelos grupos familiares e foi mantida at que as terras foram sendo colonizadas e expropriadas. Vale ressaltar que at os anos de 1940 e 1950, os Kaingang praticaram esses deslocamentos no interior de seus vastos territrios, quando ainda dispunham dos recursos florestais mais abundantes. Contudo, na atualidade a maioria deles vive em aldeamentos ou em periferias urbanas. Tommasino (2000) afirma que o processo de atrao e de pacificao dos Kaingang teve por base as promessas de bem-estar e proteo, frente a um processo colonial em franca expanso. Alm disso, eram oferecidos aos ndios, para convenc-los a habitar somente os aldeamentos estabelecidos oficialmente, produtos que eles desconheciam: roupas, cobertores, miangas, espelhos, instrumentos de ferro como machado, faca, serrote, objetos que os deixaram impressionados. A pesquisadora afirma que durante mais de um sculo os

  • Kaingang receberam esses "presentes" e acreditaram que os chefes brancos fossem generosos, tal como preconiza o modelo de chefia indgena. importante enfatizar a eficcia dessa estratgia - a distribuio de presentes e promessa de proteo - porque na cultura Kaingang a generosidade o valor mais elevado e era esta qualidade que conferia prestgio poltico aos caciques ou Pai-bang (TOMMASINO, 1998, p. 68).

    Na atualidade, uma das alternativas econmicas para os Kaingang tem sido a produo do artesanato para comercializao em feiras, em praas, e outros espaos alternativos nas cidades em que habitam.

    3.3. O Povo CharruaAntes da colonizao os Charrua eram milhares e habitavam a regio pampeana, que

    compreendia parte do estado do Rio Grande do Sul e tambm da Argentina e Uruguai. Aps o contato com os exploradores espanhis e portugueses (que chegaram ao territrio Charrua atravs do Rio da Prata, em 1513), o que se sucedeu foi um grande extermnio. Referindo-se aos Charrua e Minuano da antiga Banda Oriental do Uruguai, tala Becker (1982, p. 93) escreve: os colonizadores tornam-se cada vez mais donos dos animais e das terras, em pouco tempo, deixam os indgenas quase sem nenhum espao para continuarem sobrevivendo e tendo suas vidas independentes.

    A mesma autora observa que, com relao terra, entre os Charrua, parecia no haver uma delimitao individual e sim um usufruto coletivo do espao ocupado pelo grupo. A tradio de uso coletivo dos recursos tornava desnecessria a apropriao e delimitao da terra por famlia ou ncleo familiar extenso. Assim, a prtica da propriedade privada era totalmente estranha a este grupo, tal como aos demais povos amerndios.

    O povo Charrua foi particularmente vitimado pelas guerras e massacres, e os homens eram os alvos principais. Becker (1982) afirma, neste sentido, que em perodos de massacres se via muito comumente mulheres e crianas de menos de 12 anos poupadas do extermnio, espalharem-se entre vilas, povoados, estncias e fazendas. Talvez por isso, na atualidade, os Charrua sejam um grupo to disperso, com famlias que vivem em distintas regies do Sul do Brasil, Argentina e Uruguai.

    Vale ressaltar que os Charrua so citados em diferentes textos, particularmente naqueles associados imagem e s tradies gauchescas. Para exemplificar, destaca-se, da literatura mtica de Jorge Salis Goulart (1978, p. 55), a seguinte afirmao: "estes exmios cavaleiros, estes laadores, boleadores, magnficos tropeiros e lanceiros invencveis, no campo de batalha, tinham a impetuosidade de um raio". Descritos como fortes, impetuosos e livres, esses ndios tornaram-se smbolos de uma suposta raiz constituidora do povo gacho.

    Conforme Lopes Neto (citado por DUTRA, 2011), a palavra charrua na lngua Quchua quer dizer ribeirinho. Contudo, assim como as tradies so reinventadas, tambm o significado ou o conceito dos nomes de povos so variveis e continuamente ressignificados. Neste sentido a Cacique da comunidade Charrua de Porto Alegre Aquab, nos depoimentos e discursos proferidos em reunies e audincias pblicas faz questo de afirmar que a palavra Charrua quer dizer "ch abenoado por Deus, o pai Tup". Ela tambm destaca que o povo se autodenomina Chonik, "os donos da terra". Essa denominao correspondia a uma das divises internas dos Charrua tradicionais.

    A comunidade Charrua de Porto Alegre tem uma populao de 40 pessoas e ocupam nove hectares de uma terra cedida pela prefeitura, no bairro Lomba do Pinheiro. Nesta rea h fonte de gua, algum resqucio de mata e de rvores frutferas. Ali procuram viver reorganizando o modo de ser e refazendo os rituais dos ancestrais, como o Ketame (Dana da Lua), que celebra o nascimento das crianas. A comunidade est desenvolvendo estudos para recuperar partes de sua estrutura lingustica.

    As famlias Charrua, antes de receberem a pequena rea de terra, viveram no Morro da Cruz, em Porto Alegre, e l permaneceram por cerca de 40 anos. Andavam longas distncias para conseguir gua, e subsistiam dos empregos provisrios, reciclagem do lixo e venda de artesanato.

    Foram reconhecidos como descendentes do povo Charrua pela Fundao Nacional do ndio

  • (Funai) no ano de 2007 (apesar de no haver necessidade de reconhecimento oficial, bastando a auto-afirmaro tnica, conforme a Conveno 169 da OIT). Esse reconhecimento se deu em funo de um intenso processo de mobilizao da comunidade ao longo dos ltimos anos.

    4. As terras indgenas no Rio Grande do Sul e a situao fundiriaComo se viu acima, a colonizao se imps violentamente contra os povos indgenas e os

    expulsou de suas terras, sendo divididas e loteadas pelo Estado, pelas oligarquias e pelas empresas de colonizao. Expulsos das terras passaram a andar de um local para outro, sempre nas proximidades das reas reivindicadas, tendo em vista a garantia da vida. Neste processo, as terras foram degradadas pela colonizao. Pouco restou, no Sul do pas, do que eram os territrios: reas com matas, com animais para caar, com rios e lagos. As terras, redutos sagrados, foram transformadas em fonte de renda, em capital especulativo atravs do plantio de gros (soja, milho, trigo), atravs da implantao de grandes latifndios (criao de gado e de grandes granjas da monocultura) e para a expanso imobiliria. E, nas ltimas dcadas, reas que no serviam para a agricultura e nem para a criao do gado de corte e sobre as quais restavam recursos ambientais significativos ou, em muitos casos, em processo de extino por causa da explorao indiscriminada da madeira, foram transformadas em reservas ou parques de preservao.

    importante referir que h 500 anos viviam no Brasil mais de 900 povos diferentes, com uma populao de milhes de pessoas. Hoje so em torno de 240, com uma populao, segundo o Censo do IBGE de 2010, de 817 mil pessoas. Do total de mais de 1.000 terras atualmente reivindicadas, em diferentes fases do procedimento demarcatrio (reconhecimento oficial), estes povos ocupam um pouco mais de 50% dos territrios reivindicados.

    Cabe aqui enfatizar que habitavam no espao territorial do que hoje o Rio Grande do Sul pelo menos 23 povos diferentes. Havia uma populao de centenas de milhares de pessoas, sendo que atualmente de pouco mais de 36 mil indgenas das etnias Guarani, Kaingang e Charrua.

    O relacionamento desses povos com a natureza e com a terra sempre foi de profundo respeito. Diferente das prticas da sociedade eurocntrica que invadiu rapidamente as suas terras para consumir e destruir. Na concepo da maioria dos povos, a terra me e como tal precisa ser cuidada e protegida. Os Kaingang, por exemplo, cultuam a terra porque dela que se faz toda a existncia e sobre ela residem todas as coisas inclusive as espirituais. No caso dos Guarani a vida entendida como um contnuo caminhar e esse caminhar se desenvolve num extenso territrio, ocupado ancestralmente. As famlias transitam de uma aldeia outra.

    Tradicionais ocupantes das terras litorneas, os Guarani sentem-se impedidos de habitar a regio e muito menos extrair o seu sustento. Os Kaingang que residem nos centros urbanos ou no seu entorno no conseguem coletar a taquara e o cip para a confeco do artesanato e das cestarias, fonte de renda para a sua subsistncia. Por essa razo circulam nestas reas, acampando nas proximidades, movimentando-se sempre no entorno, ensaiando o regresso. Essa a maneira de estabelecerem relaes contnuas com seus lugares sagrados e com o mundo dos espritos ancestrais.

    Nas ltimas dcadas os povos indgenas, atravs de suas lutas, vm obtendo importantes conquistas, no entanto, em sua grande maioria, as terras indgenas no foram demarcadas e/ou regularizadas. Algumas terras que hoje esto com os procedimentos demarcatrios concludos ou em andamento situam-se no norte do Estado e nelas vivem mais de 85% dos indgenas Kaingang, especialmente nas reas de Nonoai, Serrinha, Vontouro, Guarita, Ventarra, Cacique Doble entre outras. Em contraste, a grande maioria das comunidades Guarani vive em pequenas reas de terras ou acampamentos na beira das estradas no centro do estado, no litoral e na regio metropolitana de Porto Alegre.

    4.1. Tabela das terras e da populao indgena no Rio Grande do SulA tabela a seguir, foi elaborada a partir de dados oficiais divulgados pela Funai, bem como

    atravs de informaes do Cepi/RS (Conselho Estadual dos Povos Indgenas), do CAPG (Conselho de Articulao do Povo Guarani do Rio Grande do Sul) e a partir de dados organizados pelo

  • Conselho Indigenista Missionrio, Regional Sul. A tabela apresenta as terras demarcadas, aquelas que esto com os procedimentos

    demarcatrios em curso e as terras sobre as quais o Governo Federal no tomou nenhuma providncia, bem como os nmeros que dispomos sobre a populao que ocupa tais reas.

    Cimi Regional Sul - Populao Indgena no Estado do Rio Grande do Sul 2 N Terra e Povo Municpio Tamanho Situao Populao

    POVO GUARANI: 43 terras

    1. Ilha Grande (Guarani Mby) Palmares do Sul (Lagoa dos Patos) ? Reivindicam o direito posse. 15

    2. Irapu (Guarani Mby) Caapava do Sul 222

    Acampamento na BR 290. Relatrio Circunstanciado foi publicado em 26/01/2011

    (Funai). Passou pela fase da contestao. Aguardando procedimentos.

    80

    3. Kaamirindy/gua Grande (Guarani Mby) Camaqu 165,34

    rea adquirida pelo governo do Estado do Rio Grande do Sul. Dec. Estadual 40.482 de

    29/11/2000Aguardando pela criao do GT

    45

    4. Ygua Por/Pacheca (Guarani Mby) Camaqu 1.852

    Criao do GT 1993.Declarada em 17/05/1996. Homologada em

    01/08/2000. Registrada CRI 19/09/2000 e SPU 15/01/2001 (Funai).

    62

    5. Jataity/Cantagalo (Guarani Mby)Viamo / Porto

    Alegre 286

    Vivem em 47 hectares.GT de identificao em 1999.

    Portaria do Relatrio Circunstanciado 31/05/2000. DOU 02/06/2000.

    Portaria do MJ demarcao fsica em 27/11/2003 (Funai).

    Foi homologada, atravs do Decreto de 11/10/2007. DOU 15/10/2007. Registrada CRI

    11-out-07 (Funai).Funai tem que indenizar famlias de no-

    indgenas.

    159

    6. Teko Por/Coxilha da Cruz (Guarani Mby) Barra do Ribeiro 202Vivem em 101 ha. rea adquirida pelo governo do Estado do RS. Aguardam desapropriao e

    indenizao aos ocupantes no-indgenas.130

    7. Passo da Estncia (Guarani Mby) Barra do Ribeiro ?Acampamento nas margens da BR 116. Impactada pela duplicao da BR 116. 30

    8. Nhundy/Estiva (Guarani Mby) Viamo 07

    rea sem documentao. De propriedade da Prefeitura que cedeu para a ocupao em substituio ao acampamento da Pimenta.

    Aguardando criao de GT.

    170

    9. Lami (Guarani Mby) Porto Alegre ? Acampamento na margem da rodovia no Bairro Lami-POA. Aguardando criao de GT. 48

    10. Pori/Capivari (Guarani Mby) Capivari do Sul ? Acampamento RS 040. Aguardando criao do GT.- 68

    11. Anhetegu/Lomba do Pinheiro (Guarani Mby) Porto Alegre 10rea particular do projeto Guarani PMG-Ong (extinta)rea doada aos Guarani. Aguardando

    criao do GT.

    12. Granja Vargas (Guarani Mby) Palmares do Sul 43,32

    Criao do GT em 1993. Portaria do MJ em 13/08/1999. Homologada, atravs do decr