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Relatório de recomendações para a elaboração de uma proposta de projeto de lei promotor da paridade de género FERRAMENTAS EUROSOCIAL Nº 26/2019 MARIA HELENA SANTOS políticas de coesão social COESÃO SOCIAL O PROGRAMA PARA A COESÃO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA

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Relatório de recomendações para a elaboração de uma proposta

de projeto de lei promotor da paridade de género

FERRAMENTAS EUROSOCIAL

Nº 26/2019

MARIA HELENA SANTOS

políticas de coesão social COESÃO SOCIAL

O PROGRAMA PARA A COESÃO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA

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Nº 26/2019

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políticas de coesão social COESÃO SOCIAL

Relatório de recomendações para a elaboração de uma proposta

de projeto de lei promotor da paridade de género

FERRAMENTAS EUROSOCIAL

Nº 26/2019

MARIA HELENA SANTOS

O PROGRAMA PARA A COESÃO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA

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A presente publicação foi elaborada com assistênciada União Europeia. O conteúdo da mesma é de responsabilidade exclusivados autores, em nen hum caso debe considerar que reflete a opiniãoda União Europeia.

Edição não comercial.

Realização gráfica:Cyan, Proyectos Editoriales, S.A.

Madrid, setembro 2018

Não se permite o uso comercial da obra originalnem das possíveis obras derivadas,cujadistribuição requer licença semel hante à queregula a obra original.

Edição:Programa EUROsociALC/ Beatriz de Bobadilla, 1828040 Madrid (España)Tel.: +34 91 591 46 00www.eurosocial.eu

Com a coordenação de:

The French public agency for international technical assistance

PROGRAMA FINANCIADO PELA UNIÃO EUROPEIA

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Índice

Preâmbulo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

Breve síntese sobre medidas de ação afirmativa - as quotas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

A relevância do sistema eleitoral para um maior sucesso das quotas de gênero . . . . . . . . . 11

Breve síntese da legislação brasileira atual relativa às quotas de gênero . . . . . . . . . . . . . . . 13

Algumas recomendações para a elaboração de uma proposta de projeto de lei . . . . . . . . . 15

O Ideal - a paridade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15A caminho do ideal - o limiar mínimo de paridade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16O mínimo admitido provisoriamente - a quota de gênero de 30% . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

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Preâmbulo

Este documento é fruto da parceria entre a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres e o Programa EUROsociAL+ da União Européia, efetivada por meio da assinatura de uma Carta de Ação e Compromisso que objetivou a realização de ações com vistas ao aprimoramento do conhe-cimento da realidade complexa em que se desenvolve a busca das mulheres brasileiras por uma melhor representação no universo político nacional .

Essa é mais uma iniciativa que esta Secretaria tomou dentro do seu programa institucional denomi-nado Mais Mulheres no Poder. O primeiro passo da parceria com o Programa EUROsociAL+ foi aprofundar o conhecimento e apontar lacunas da legislação e/ou da cultura brasileira responsáveis pela baixa participação das mulheres no cenário político. Essa etapa foi realizada com a participação de consultoria altamente especializada no tema e que resultou no texto que se segue.

O texto apresenta dados, informações e análises sobre a presença das mulheres em cargos eletivos verificada nas eleições tanto nacionais quanto estaduais e municipais. As constatações apontam para a necessidade de mudanças tanto nos sistemas eleitorais quanto no próprio sistema político e partidário. Caso contrário a equidade ficará cada vez mais distante.

Disponibilizar seu conteúdo para as organizações de mulheres de todo o país e para a população em geral é mais uma contribuição que esta Secretaria oferece à luta por maior igualdade entre ho-mens e mulheres nos espaços políticos de poder e decisão .

Finalmente, ainda que esse seja um primeiro produto, pois, outros já estão sendo executados e programados, agradecemos a prestimosa parceria com o Programa EUROsociAL+.

ANDREZA WINCKLER COLATTOSecretária Nacional de Políticas para as Mulheres

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Introdução

No Relatório de Diagnóstico da Situação das Mulheres na Política Brasileira (EUROsociAL+, Exper-tise France, SPM, & Santos, 2018), realizado após uma missão de uma semana em Brasília, onde ouvimos diversas figuras relevantes da política brasileira (como, por exemplo, do Tribunal Superior Eleitoral, da ONU Mulheres Brasil, do Senado Federal e do Escritório de Advocacia Luciana Lóssio), concluimos que, nos últimos tempos, perante a persistência das desigualdades de gênero na polí-tica ao nível mundial e a consciência desta questão como um grave problema social, houve uma mudança clara de postura da parte das grandes organizações internacionais (por exemplo, da Or-ganização das Nações Unidas e da União Europeia). As mesmas têm procurado combatê-lo por diversas vias, sendo já mais de 130 os países que implementaram medidas de ação afirmativa para resolver a situação de uma forma mais rápida e eficaz.

Contudo, no Brasil, apesar de também se notarem alguns esforços na procura de uma maior igual-dade de gênero, com a implementação da Lei das Quotas de gênero em 1995/971 nas eleições proporcionais, na prática, não se verificam grandes melhorias neste âmbito, ficando o país para trás neste processo, como ilustram os dados da Inter-Parliamentary Union (IPU, 2018), e isso com a contribuição do sistema político e eleitoral .

De fato, embora as mulheres representem cerca de 52% do eleitorado brasileiro e participem bas-tante da atividade política, continuam a ser uma maioria invisível, ocupando atualmente pouco mais de 10% dos cargos eletivos. Esta realidade coloca o Brasil abaixo do ranking mundial de represen-tação feminina nos parlamentos nacionais, ocupando o 152º lugar, com apenas 10,7% de mulheres na Câmara dos Deputados e 14,8% no Senado Federal, ficando atrás de países conservadores no que concerne aos direitos das mulheres, como a Arábia Saudita (19,9%) e a Índia (11,8%), assim como dos países do continente americano, com exceção de Belize (9,4%) e do Haiti (2,5%). Se compararmos o Brasil com a Bolívia, o México e a Argentina (países que também têm Câmara Alta e Câmara Baixa), onde a percentagem de mulheres eleitas varia entre os 36,7% e os 53,2%, pode-mos concluir que o Brasil constitui uma espécie de “lanterna vermelha” da América Latina, onde se têm registrado avanços sem precedentes neste nível desde a década de 90 (Salgado, Guimarães, & Monte-Alto, 2015), passando uma imagem bastante retrógrada do país. É, por isso, urgente mo-dernizar a política brasileira.

Como vimos no mesmo relatório, são várias as razões para que este fenômeno ocorra, persistindo diversos obstáculos (por exemplo, de ordem sociocultural, contextual/institucional, econômica e ideológica) que dificultam uma participação mais efetiva das mulheres brasileiras na política, um mundo masculino. No presente relatório, iremos centrar nos fatores institucionais, mais especifica-mente na legislação, que tem sido ineficaz ou pouco eficiente na promoção da igualdade de gênero na política, um contexto onde ficou clara a existência de resistências, sobretudo da parte dos

1 . Lei nº 9.100, de 29 de setembro de 1995 e Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, que serão mais aprofundadas adiante.

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partidos políticos ou coligações, que ainda não interiorizaram, de todo, o “espírito da lei” em vigor, sendo isso ainda mais visível no nível do poder executivo, onde as Quotas de Gênero não se aplicam .

É mais ou menos consensual que o sistema político brasileiro necessita de uma reforma profunda a este nível para que se consolide, de fato, como instrumento da democracia, abrindo-se mais à par-ticipação de todas as pessoas (Pereira, 2014). Nos últimos anos, tem sido sugerida uma Reforma Política e apresentadas várias propostas para alterar o sistema eleitoral, tendo a investigação mos-trado que a população é favorável a essa mudança para a igualdade de gênero na política (Berthol-di, 2018; Brandino, 2018; Graça & Storni, 2018).

É de salientar o Manifesto da Sociedade Civil por uma Reforma Política, assinado por mais de 100 organizações brasileiras, que pretendia garantir a alternância de gênero nas listas preordenadas dos partidos políticos em eleições proporcionais com sistema de votação em dois turnos (Bertholdi, 2018). A proposta, tramita na Câmara dos Deputados como Projeto de Lei nº 6316, de 20132 .

Entre as propostas, há algumas originadas no âmbito da Câmara dos Deputados e outras no do Senado Federal. Na Câmara dos Deputados, veja-se, por exemplo, a Proposta de Emenda à Cons-tituição (PEC) nº 205/073 e a PEC nº 371/134 (que, atualmente, se encontra apensa à primeira) que apontam para a reserva de assentos para mulheres na representação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal através de percentuais fixos e progressivos. No Senado Federal, veja-se a PEC nº 98/20155, e a PEC nº 23/20156, ambas propostas que pretendem a paridade de gênero no nível dos vários assentos relacionados com as eleições proporcionais: da Câmara dos Deputados, da Assembleias Legislativas, da Câmara Legislativa do Distrito Federal e das Câmaras Municipais.

Este é, claramente, o momento de tentar dar mais um passo no sentido de uma democracia paritá-ria, procurando, como propõe a ONU Mulheres7, “não deixar ninguém para trás” e adotar um regime democrático mais justo e inclusivo que permita igualmente às mulheres liderar e participar de forma substantiva e igualitária da tomada de decisão.

Neste segundo relatório, pretendemos contribuir para esta mudança, apresentando algumas reco-mendações para a elaboração de uma proposta de Projeto de Lei capaz de contemplar toda a so-ciedade brasileira com oportunidades de disputar cargos eletivos em condições de igualdade entre homens e mulheres .

Previamente, será efetuada uma breve síntese do relatório supracitado, com um foco particular:

• nas medidas de ação afirmativa existentes ao nível mundial;• na relevância do sistema eleitoral para um maior sucesso das quotas de gênero; e• na legislação brasileira atual relativa às quotas de gênero.

2. Ver Projeto de Lei nº 6316/2013 aqui: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1129866&filename=PL+6316/20133 . Ver: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=3807544. Ver: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=6043565 . Ver: http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/1223086 . Ver: http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/120076 7 . Ver Nota sobre a democracia paritária, promovida pela ONU Mulher, aqui: http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2018/06/Nota_Democracia-Paritaria_FINAL.pdf

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Breve síntese sobre medidas de ação afirmativa - as quotas

Como vimos no Relatório de Diagnóstico (EUROsociAL+ et al., 2018), vários foram os países que já recorreram à ação afirmativa, adotando algum tipo de medida. Mona Lena Krook e colegas (por exemplo, Krook, 2009; Krook, Lovenduski, & Squires, 2009) identificaram 4 tipos de medidas imple-mentadas em mais de uma centena de países:

1 . Os lugares reservados - neste caso, são reservados lugares/assentos para as mulheres nas assembleias políticas, para os quais os homens não são elegíveis.

2. Quotas voluntárias dos partidos - estas são adotadas voluntariamente pelos partidos políti-cos, que se comprometem a assegurar um determinado número mínimo, ou percentual de mu-lheres para cargos eletivos.

3 . As quotas legislativas - adquirem força de lei, enquanto parte da lei eleitoral ou obrigação constitucional, e exigem que todos os partidos apresentem um determinado número de lugares para as mulheres; é um exemplo a “Lei da Paridade”.

4. As quotas “soft” - estas são, geralmente, designadas por “recomendações”, “diretrizes”, ou outras medidas que procurem o equilíbrio entre os sexos. São medidas que, sem o espírito e os objetivos da política de quotas formal (mesmo que concordem com estas), têm fins semelhantes.

As quotas podem ser específicas relativamente ao sexo (por exemplo, há quotas direcionadas às mulheres, como é o primeiro caso referido acima) ou podem ser neutras, em termos do sexo; gen-der-neutral (Dahlerup, Freidenvall, & International IDEA, 2008). As quotas para mulheres requerem um número ou uma percentagem mínima de mulheres, já as quotas neutras (como as que há no Brasil) estabelecem um mínimo e um máximo para ambos os sexos, em geral, não superior a 60%, nem inferior a 40% dos lugares para ambos os sexos.

A principal ideia subjacente a este sistema, nesta fase, é a de recrutar mulheres para as posições de poder e tomada de decisão política e assegurar que estas constituam, pelo menos, uma “massa crítica”, no sentido de já “terem voz” no contexto, ou assegurar o verdadeiro equilíbrio entre os se-xos de 50-50% (Dahlerup, 2006), procurando, assim, transformar as relações de gênero (Bosio-Va-lici & Zancarini-Fournel, 2001) vigentes na política.

O recurso a algum tipo de quotas eleitorais por parte destes países mudou claramente o panorama mundial . Se até a década de 80, os Países Nórdicos e a Holanda eram os únicos países que estavam no topo do ranking mundial, em termos da representação das mulheres na política (Dahlerup, 2006), atualmente, os países que se encontram no topo são bastante mais diversificados, destacando-se tam-bém países africanos e da América Latina, como é o caso do Ruanda (61,3%), de Cuba (53,2%) e da Bolívia (53,1%), que se encontram nos dois primeiros lugares do ranking, respetivamente (ver IPU, 2018).

Contudo, esta mudança não se deve apenas ao recurso a este tipo de medidas. A realidade tem mostrado que, efetivamente, muitas vezes, estas não são uma condição necessária, como se percebe

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pelos casos da Finlândia (42,0%) e da Dinamarca (37,4%), nem são uma condição suficiente, como é bastante ilustrativo o caso do Brasil (10,7%).

Podemos, assim, concluir que as quotas, por si só, têm um papel limitado (Freidenvall, Dahlerup, & Skjeie, 2006), devendo ser acompanhadas de políticas de combate a fenômenos persistentes no mundo da política, como é o caso do assédio e da violência política face às mulheres candidatas e eleitas; de conciliação da vida profissional, familiar e pessoal; de empoderamento das mulheres, entre outras. Por sua vez, para que a aplicação das quotas seja mais eficaz, deve considerar-se outros fatores, como o sistema político e eleitoral e os próprios regulamentos das quotas (por exem-plo, o precentual de mulheres nas listas eleitorais deve ser complementada com regras relativas à ordem de classificação dos sexos, como o “fecho éclair”, e com sanções legais eficazes, Dahlerup & Freidenvall, 2005; Dahlerup et al., 2008).

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A relevância do sistema eleitoral para um maior sucesso das quotas de gênero

Dahlerup et al. (2008) mostraram que a maioria dos países que superou o patamar dos 30% usa, de fato, algum tipo de quotas, mas, para além disso, também tem um sistema eleitoral de representa-ção proporcional .

Vários estudos nacionais e internacionais têm mostrado a relevância dos sistemas eleitorais propor-cionais para um melhor resultado das quotas de gênero, em particular aqueles que apresentam listas fechadas com sistema de alternância dos sexos, distritos de grande amplitude e processos centralizados de nomeação das listas partidárias (ver Araújo, 2005; Dahlerup et al., 2008; Matos, 2018; Norris, 2004; Pinheiro, 2007).

O sistema eleitoral brasileiro adota o sistema majoritário e o sistema proporcional, com listas abertas (Nicolau, 2007; Vogel, 2011). O sistema majoritário aplica-se aos cargos representativos do poder executivo e ao Senado Federal, ou seja, é utilizado nas eleições para a presidência da República, o Senado, os governos estaduais e as prefeituras. O sistema proporcional aplica-se aos cargos das/os representantes legislativas/os, sendo utilizado nas eleições para a Câmara dos Deputados, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais ou dos Vereadores. A Lei das Quotas de Gênero implementada no Brasil aplica-se apenas às eleições proporcionais.

Ora, sendo as listas abertas, o sistema está centrado nas/os candidatas/os, e não nos partidos políticos, o que torna a campanha mais cara para as/os candidatas/os. Além disso, como a política é um mundo masculino, produz efeitos mais negativos para as mulheres, que, em geral, conseguem menos recursos do que os homens (Ramos, Graça, Andrade, & Soares, 2014).

A investigação está centrada sobre o fenômeno brasileiro, procurando perceber a razão dos resul-tados negativos proporcionados pela Lei das Quotas de Gênero. Por exemplo, Miguel (citado por Pinheiro, 2007) destacou “a profissionalização e os elevados custos das campanhas de âmbito fe-deral; a ampliação das vagas [que ocorreu com a promulgação da Lei nº 9.504/97)8 e a dispersão dos votos entre as candidaturas femininas; e a falta de investimentos dos partidos políticos na for-mação e capacitação de lideranças femininas” (p.71). O mesmo autor confirmou que vários estudos têm relacionado os resultados negativos do Brasil com as características do sistema eleitoral e partidário brasileiro, mas também com a sua cultura política e algumas características da competi-ção eleitoral, em particular relativamente ao aspeto econômico e à existência de financiamento pú-blico de campanhas (Pinheiro, 2007).

8. Segundo Lóssio (2016), quando se deu o aumento dos 20 para os 30% de candidaturas de cada sexo, também se deu um aumento do percentual de candidatas/os que cada partido ou coligação poderia registar, tendo em conta o número de lugares a preencher, passando de 100% para 150%. Desta forma, foi possível incluir as mulheres nas listas, apresentando a mesma quantidade de homens (Santos & Barcelos, 2015).

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Nesta linha, Vogel (2011) concluiu que, “sem alterações no sistema eleitoral de lista aberta ou no sistema de financiamento das campanhas, a política de quotas introduzida na legislação eleitoral será incapaz de cumprir seus propósitos”, até porque num sistema eleitoral de listas abertas e com financiamento predominantemente privado das campanhas eleitorais (como ocorria naquele tempo no Brasil), “as chances de êxito eleitoral estão mais relacionadas com o capital social e político das candidatas do que com o número de concorrentes do sexo feminino numa eleição proporcional” (p.129). Ora, sendo a questão da participação das mulheres na política ainda um fenômeno em construção, elas têm, em geral, “menor acúmulo de capital político” e continuam a enfrentar con-cepções preconceituosas por parte da sociedade (Pinheiro, 2007, p.73) as quais ainda constituem grandes obstáculos à promoção de uma maior igualdade de gênero.

Entretanto, houve mudanças importantes na legislação brasileira, no sentido de uma maior igualda-de de gênero no contexto político, destacando-se as mudanças registradas em 2018 para as cam-panhas eleitorais, como veremos na secção seguinte.

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Breve síntese da legislação brasileira atual relativa às quotas de gênero

No relatório supracitado (EUROsociAL+ et al., 2018) também vimos que a legislação eleitoral e par-tidária brasileira tem estimulado a participação das mulheres na política, particularmente nos últimos tempos, através dos seguintes meios:

• Determina que cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo nos cargos de Vereador/a, Deputada/o Federal e Deputada/o Esta-dual (Lei 9.504, designada Lei das Eleições, de 1997, artigo 10, § 3º, com redação dada pela Lei nº 12.034/2009)9 .

• Impõe a aplicação de, no mínimo, 5% dos recursos do Fundo Partidário na criação e manuten-ção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres (artigo 44, inciso V, da Lei 9.096, de 1995, com redação dada pela Lei 12.034/2009), prevendo sanções para os partidos infratores10, que a Reforma Eleitoral, resultante da Lei nº 13.165, de 29 de setembro de 2015, veio fortalecer, passando a multa de 2,5% para 12,5%11 .

• Prevê, com a Lei nº 12.891, de 11 de dezembro de 2013, e a introdução do artigo 93-A3 na Lei das Eleições, que, nos anos eleitorais, o TSE poderá promover propaganda institucional, no rá-dio e na televisão, entre 1 de março e 30 de junho, para incentivar a igualdade de gênero e a participação política das mulheres. Com a Reforma Eleitoral, resultante da Lei nº 13.165/2015, este artigo é alterado, ficando mais clara a obrigação de o TSE promover a participação das mulheres na política .

• Na sequência de várias ações recentes (STF: ADI nº 5617, julgada em 15 de março de 201812 e TSE: Consulta nº 0600252-18, julgada em 22 de maio de 2018)13, no sentido de garantir também que, pelo menos, 30% do Fundo Eleitoral fosse destinado às mulheres candidatas e que os partidos fossem obrigados a reservar o mesmo percentual de tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão para elas, o TSE respondeu favoravelmente, sendo, atualmente, indicado que os critérios a serem fixados pela direção executiva nacional do partido devem prever a obri-gação de aplicação mínima de 30% do total recebido do novo Fundo Especial de Financiamen-to de Campanha (FEFC) destinado ao financiamento da campanha eleitoral das candidatas

9 . Ver Lei nº 12.034, de 29 de setembro de 2009: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12034.htm#art310. “§ 5º O partido que não cumprir o disposto no inciso V do caput deste artigo deverá, no ano subsequente, acrescer o percen-tual de 2,5% (dois inteiros e cinco décimos por cento) do Fundo Partidário para essa destinação, ficando impedido de utilizá-lo para finalidade diversa” (Lei nº 12.034/2009).11 . “§ 5º O partido político que não cumprir o disposto no inciso V do caput deverá transferir o saldo para conta específica, sendo vedada sua aplicação para finalidade diversa, de modo que o saldo remanescente deverá ser aplicado dentro do exercício financeiro subsequente, sob pena de acréscimo de 12,5% (doze inteiros e cinco décimos por cento) do valor previsto no inciso V do caput, a ser aplicado na mesma finalidade” (Lei nº 13.165/2015).12. Ver o voto do Ministro Edson Fachin no julgamento da ADI nº 5617: https://www.conjur.com.br/dl/voto-relator-ministro-fachin-fundo .pdf13 . Ver Consulta aqui: https://www.conjur.com.br/dl/voto-rosa-weber-consulta-publica.pdf

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(Resolução nº 23.568 de 24 de maio de 2018, artigo 6, § 1º, publicada no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do TSE no dia 29 de maio de 2018)14 .

• Relativamente à distribuição do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão, apesar de o TSE ter respondido à Consulta Pública no sentido da obrigatoriedade de se atribuir 30% da propaganda gratuita às candidaturas de mulheres, este ainda não editou, a nosso co-nhecimento, nenhuma norma sobre esta questão.

Embora estas mudanças não sejam as ideais, uma vez que não foram além dos 30%, se as normas e leis forem devidamente implementadas e fiscalizadas, representarão, indubitavelmente, passos importantes na procura de uma maior igualdade de gênero no contexto da política e os resultados das eleições de outubro de 2018 irão permitir tirar algumas conclusões.

No entanto, atendendo a todo o histórico da política no país, brevemente resumido no Relatório de Diagnóstico da Situação das Mulheres na Política Brasileira (EUROsociAL et al., 2018), concorda-mos com Eliana Graça e Irina Storni (2018), quando referem que “mudanças institucionais eficazes só ocorrerão com uma ampla e profunda reforma do sistema político e eleitoral brasileiro” (p.7). De fato, este relatório tornou claro que, se não houver uma intervenção mais efetiva, não irão ocorrer mudanças significativas, ou demorarão séculos a ocorrer, uma vez que se trata de um problema estrutural. A política é um mundo masculino, com tudo o que isso implica (por exemplo, persistência de preconceitos, de discriminação e de estereótipos de gênero), e, como vimos, o “clube dos rapa-zes” não cede o poder sem fortes resistências.

Sendo os partidos políticos as instituições mais resistentes à entrada das mulheres na política (veja-se, por exemplo, o fenômeno generalizado no Brasil das mulheres, “candidatas laranja”, “fantasmas” ou “fictícias” que não tiveram nenhum voto, permitindo perceber que elas só foram registradas pelos partidos para preencher a quota dos 30% requerida pela Lei nº 9.504/97), será necessária mais vi-gilância, prestação de contas e consequências mais pesadas para os partidos ou coligações que não cumprirem a lei, no sentido de, por um lado, combater mais fortemente estas resistências e, por outro, promover a justiça social e a democracia plena.

14. Ver Resolução nº 23.568 relativa ao FEFC: http://www.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2018/RES235682018.html

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Algumas recomendações para a elaboração de uma proposta de projeto de lei

Considerando o que foi exposto, sugerimos que seja elaborado um projeto de lei integral, capaz de contemplar toda a sociedade brasileira com oportunidades de disputar cargos eletivos em condi-ções de igualdade entre homens e mulheres, deixando algumas recomendações, agrupadas em três planos distintos:

• o ideal - a paridade;• a caminho do ideal - o limiar mínimo de paridade; e• o mínimo admitido provisoriamente - a quota de gênero de 30%.

O Ideal - a paridade

Em relação ao primeiro ponto, e considerando que é um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (artigo 3º, nº IV), sendo destacado no capítulo 1, artigo 5º, nº 1, relativo aos direitos e garantias fundamentais, que “homens e mulheres são iguais em direi-tos e obrigações” nos termos da Constituição da República Federativa de 198815, recomendamos que o Brasil promova a paridade de gênero total, por via da adoção uma lei de quotas paritária, da melhoria do sistema eleitoral e de outras medidas promotoras da igualdade de gênero na política já existentes no país, ou seja, da:

1) Promulgação de uma lei de quotas legislativas que:

a) assegure a paridade entre homens e mulheres nas listas de candidaturas para a Câmara dos Deputados, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais/Vereadores (i.e., a Lei da Paridade, entendendo-se por “paridade” a representação mínima de 50% de cada um dos sexos);

b) estabeleça regras relativas à ordem de classificação, por forma a garantir a alternân-cia de homens e mulheres nas listas (como o “fecho éclair” ou sistema “zebra”, não poden-do ser colocada mais do que uma pessoa candidata do mesmo sexo, consecutivamente, na ordenação dos lugares da lista);

c) integre regras relativas à substituição no mandato (por exemplo, garantindo que a substituição seja feita por uma pessoa do mesmo sexo);

15 . Ver a Constituição aqui: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

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d) considere sanções legais mais rígidas perante o descumprimento dos partidos ou coli-gações (por exemplo, rejeição de todas as listas de candidaturas de partidos ou coligações que não cumpram a lei); e

e) contemple a realização de uma avaliação periódica da lei (por exemplo, a cada 4 ou 5 anos), devendo o Governo apresentar à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal um relatório sobre a sua implementação e o seu impacte na promoção da paridade de gênero e, além disso, sugestões para o seu aperfeiçoamento, caso se revele necessário.

2) Para que a lei atinja o seu potencial máximo, sugerimos que sejam realizadas reformas adicio-nais, através da:

a) Adoção de um sistema eleitoral de representação proporcional com listas fecha-das a ser aplicado nas eleições para a Câmara dos Deputados, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais/Vereadores. Desta forma, as/os eleitoras/es poderão votar nos partidos e não nas pessoas candidatas e estas poderão ser colocadas nas listas (fechadas), por forma a garantir a ordem de classificação dos sexos estipulada pela lei das quotas.

b) Garantia da aplicação de 20% dos recursos do Fundo Partidário na criação e manu-tenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, consi-derando sanções para os partidos incumpridores superiores aos 12,5% que a Lei nº 13.165/2015 estabeleceu (e.g., os mesmos 20%).

c) Garantia de que o FEFC será igualmente distribuído por homens e mulheres candi-datos/as de cada partido político ou coligação (50/50) e que os partidos reservem o mes-mo percentual de tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão para eles e para elas. Recomendamos que sejam consideradas sanções mais efetivas para os par-tidos incumpridores (e.g., caso os partidos não apresentem os documentos comprovativos da distribuição dos 50% do FEFC para homens e mulheres candidatas, deverão obrigato-riamente devolver o valor remanescente). Embora com o sistema de listas fechadas, as campanhas já devam passar a concentrar-se mais nos partidos políticos, em geral, e não tanto nas/os candidatas/os, como a política é um mundo marcadamente masculino onde as mulheres continuam a ser vistas como “estranhas”, recomendamos que esta última me-dida se mantenha, pelo menos, provisoriamente, no sentido de promover uma melhor inte-gração das mulheres neste mundo nos próximos anos.

d) Adoção de uma regra relativa ao sistema eleitoral majoritário, aplicada às eleições para o Senado Federal. Uma vez que todos os estados e o Distrito Federal têm uma re-presentação igual no Senado (ou seja, elegem 3 senadoras/es), com mandatos de 8 anos, recomendamos que seja adotado o princípio de que, entre essas 3 pessoas, não poderá haver mais do que 2 do mesmo sexo.

e) Adoção de medidas promotoras da igualdade de gênero adicionais, entre as quais destaca-mos as medidas centradas na prevenção e punição do grave problema social, que é o as-sédio e a violência política que existe face às mulheres candidatas e eleitas, na linha da Lei N° 243 Contra o Assédio e Violência Política face às Mulheres promulgada na Bolívia em 2012 e do Observatório da Paridade Democrática criado mais recentemente.

A caminho do ideal - o limiar mínimo de paridade

Na impossibilidade de efetuar a reforma eleitoral e política ideal, consideramos uma segunda hipó-tese, menos assertiva, de um projeto de lei promotor de um limiar mínimo de paridade entre homens e mulheres, muito perto da percentagem considerada na Lei das Quotas já existente no Brasil (Lei nº 9.504/1997), com o objetivo de assegurar que estas constituam, pelo menos, uma massa crítica, ou seja, que já tenham voz no mundo da política. Assim, recomendamos:

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RELATÓRIO DE RECOMENDAÇÕES PARA A ELABORAÇÃO DE UMA PROPOSTA DE PROJETO DE LEI PROMOTOR DA PARIDADE DE GÉNERO

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1) A promulgação de uma lei de quotas de gênero que:

a) garanta que as listas de candidaturas para a Câmara dos Deputados, as Assembleias Le-gislativas e as Câmaras Municipais/Vereadores sejam compostas por forma a assegurar a representação mínima de 40% de cada um dos sexos;

b) estabeleça regras relativas à substituição no mandato (e.g., garantindo que a substitui-ção seja feita por uma pessoa do mesmo sexo);

c) considere sanções legais mais rígidas perante o descumprimento dos partidos ou coligações (e.g., rejeição de toda a lista de candidatura do partido ou coligação que não cumpra a lei); e

d) contemple a realização de uma avaliação periódica da lei promotora de uma maior igualdade de gênero na política (por exemplo, a cada 6 anos, depois das eleições gerais e locais), devendo o Governo apresentar à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal um relatório sobre a sua implementação e o seu impacte na promoção da paridade de gênero, bem como sugestões para o seu aperfeiçoamento, caso se revele necessário.

2) Também neste caso, para que a lei das quotas atinja o seu potencial máximo, sugerimos que sejam realizadas reformas adicionais, entre as quais destacamos:

a) A garantia da aplicação de 10% dos recursos do Fundo Partidário na criação e manuten-ção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, conside-rando sanções para os partidos, ou coligações, descumpridores (por exemplo, os mes-mos 10%).

b) A garantia de que 40% do FEFC seja destinado às mulheres candidatas e que os partidos ou coligações sejam obrigados a reservar os mesmos 40% de tempo de propaganda gra-tuita no rádio e na televisão para elas, considerando sanções efetivas para os partidos in-cumpridores (por exemplo, os partidos que não apresentem os documentos comprovativos da reserva dos 40% do FEFC para as mulheres candidatas, deverão devolver o valor rema-nescente).

c) Adoção da mesma medida sugerida no ponto anterior, relativa ao sistema eleitoral majoritá-rio, aplicada às eleições para o Senado Federal. Considerando que todos os estados têm uma representação igual no Senado (ou seja, 3 senadoras/es), recomendamos que seja adotado o princípio de que entre essas 3 pessoas, não pode haver mais do que 2 do mes-mo sexo .

O mínimo admitido provisoriamente - a quota de gênero de 30%

Em alternativa, e na impossibilidade de melhorar a lei das quotas e as restantes medidas, sugerimos que, na linha das propostas de emenda à Constituição mencionadas na introdução (PEC 205/2007; PEC 371/2013; PEC nº 98/2015; e PEC nº 23/2015), seja promulgado o primeiro tipo de quotas referido por Mona Lena Krook e colegas, ou seja:

1) Reserva de vagas/lugares/assentos para as mulheres na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, nas Assembleias Legislativas Estaduais, na Câmara Legislativa do Distrito Federal e nas Câmaras Municipais, iniciando com a mesma percentagem da Lei das Quotas de Gênero em vigor (ou seja, 30%), com o objetivo de, gradualmente, alcançar a paridade (ou seja, 50%). Portanto, recomendamos que seja adotada esta medida mais assertiva, que, em vez de visar as listas de candidaturas dos partidos ou coligações, se centra já nos lugares que serão efetivamente ocupados pelas mulheres no legislativo dos três níveis federativos. No entanto, atendendo ao contexto crítico que o país está a atravessar neste momento, poderá ser,

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provisoriamente, adotado o percentual mínimo admitido (30%), com o compromisso de ir au-mentando essa percentagem ao longo dos próximos anos até alcançar os justos 50%;

a) Tal como nos casos anteriores, recomendamos que sejam consideradas sanções legais mais rígidas perante o descumprimento dos partidos, ou coligações (por exemplo, a rejei-ção das candidaturas do partido ou coligação que não cumpra a lei).

2) Além disso, é imperativo que o Fundo Partidário e o FEFC continuem a existir, mas que os partidos, ou coligações, sejam, de fato, obrigados a destinar os 30% destes fundos às mulheres candidatas .

Em suma, as recomendações salientadas pretendem contribuir para a elaboração de uma proposta de projeto de lei mais inclusiva, centrada na promoção da paridade de gênero na representatividade política do Brasil, contribuindo para, através de vias mais ao menos rápidas e de reformas mais ao menos profundas, fortalecer o Poder Legislativo e aperfeiçoar a democracia brasileira, sendo certo que a democracia só será plena se for igualitária.

Por fim, resta-nos referir que, inicialmente, estavam previstas consultas e a divulgação da informa-ção incluída nos 2 relatórios por nós realizados, através de oficinas regionais, organizadas em cola-boração com a SPM, em três estados ainda a definir, nas regiões do Nordeste, Norte e Centro Este. No entanto, por motivos ligados ao contexto político brasileiro atual, estas foram adiadas para um trabalho posterior com a seguinte administração.

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Todas las actividades se han llevado a cabo en el marco del programa EUROsociAL+ de la Unión Europea, por ello quere-mos expresar nuestro agradecimiento a la Unión Europea que ha estado representada en sus diferentes fases por la Delegación de la Unión Europea en Colombia, particularmente a Tito Contreras, oficial de Cooperación y punto focal de género de la Delegación.

Igualmente al equipo técnico del programa EUROsociAL+ que ha estado a cargo de la coordinación de toda la acción, a través de la Unidad Técnica de Gobernanza Democrática, representada por Sonia González Fuentes (coordinadora), María Luisa Domínguez Suárez (técnica sénior), y Rebeka Berruti y Sergio Ortiz (técnicos de apoyo); y con la estrecha co-laboración de la Unidad Técnica de Políticas de Género, representada por Marie-Dominique De Suremain (coordinadora), Jackeline Rojas (técnica sénior), Ana Pérez (técnica sénior) y Natalia Franco (técnica de apoyo).

Por último, hemos de agradecer especialmente a las expertas del programa EUROsociAL+, Carmen Miguel Juan y Norma Villareal, por su excelente trabajo y su incansable dedicación a mejorar el acceso a la justicia en materia de derechos y conflictos referidos al uso y tenencia de la tierra de las mujeres rurales en Colombia.

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O EUROSOCIAL é um programa financiado pela União Eu-ropeia que, ao longo dos seus 10 anos de trajetória, tem vin-do a oferecer um espaço para a aprendizagem entre pares, bem como o intercâmbio de experiências entre instituições homólogas da Europa e da América Latina. O EUROSOCIAL tem por finalidade contribuir para melhorar a coesão social nos países latino-americanos, através da transferência do conhecimento das melhores práticas, que contribua para o fortalecimento institucional e para a implementação de políticas públicas. A sua ação parte da convicção de que a coesão social deve ser considerada como um fim em si mesma e, simultaneamente, como um meio para a redução das clivagens, porque a desigualdade (económica, territo-rial, social, de género) constitui um travão à consecução de qualquer Objetivo de Desenvolvimento Sustentável. O EUROSOCIAL conta com uma metodologia inovadora para implementar a cooperação internacional, partindo de um diálogo institucional horizontal, flexível, complementar e recíproco, focalizando a sua ação nas áreas de políticas sociais, governação democrática e igualdade de género.

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