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A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais. Pedro H. S. Pereira.
Resenha Crítica da obra de John
Locke “Segundo Tratado Sobre o
Governo Civil”
Por: Pedro H. S. Pereira (Ac. Filosofia da UFSJ e Direito do IPTAN)
São João del-Rei – MG – 2007.
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais. Pedro H. S. Pereira.
ALGUNS PONTOS DO PENSAMENTO DE LOCKE PARA SUA CORRETA HERMENÊUTICA:
CONTRATUALISMO X L IBERALISMO X EMPIR ISMO
Três movimentos dos quais Locke foi também propulsor na idade moderna. O
Contratualismo prega o surgimento do Estado a partir de um contrato no qual todos
homens consentiram na sobreposição de um poder estatal através do qual a ordem e
a paz entre si passou a ser mantida e garantida pelo referido poder.
Aristóteles atribui a origem de tal termo da Filosofia de um dos discípulos de
Górgias, Licrofon, que dizia ser a lei uma “pura convenção e garantia de direitos
mútuos.” (ABAGNANO, 1982, p.191)
O Contratualismo ressurge na Idade Moderna principalmente com Hobbes e
Locke, após reiterada ênfase à Legitimidade Divina na era Medieval reforçada pelos
Patrísticos e Escolásticos.
Sobre o Liberalismo, movimento que teve como “eixo principal o
desenvolvimento da liberdade pessoal e do progresso da sociedade”(ENCARTA
2001), Locke, como será estudado neste curso, foi um de seus grandes propulsores
na era moderna, à medida que a realização de um contrato entre todos indivíduos, dá
ensejo ao direito destes requisitarem e fiscalizarem o poder estatal.
Quanto ao Empirismo, temos suas bases em Aristóteles, que em sua obra
“Metafísica” reza que conhecemos através das experiências que temos, e que os
olhos são a principal porta de entrada das experiências: “... Nós preferimos o ver, em
certo sentido, a todas outras sensações [...] a visão nos proporciona mais
conhecimentos do que todas as outras sensações.. .”(ARISTÓTELES, 2001, 980ª).
Locke com seu Ensaio Acerca do Entendimento Humano, volta a ressaltar a
aludida assertiva, explicitando no decorrer dos capítulos, as formas e modos de
conhecimento empírico, fazendo a famosa menção à “tábula rasa”, ao sustentar que
nascemos sem conhecimento algum (inato).
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.
Pedro H. S. Pereira.
VIDA E OBRA DE JOHN LOCKE( 1632-1 704)
Nascido em 29 de agosto de 1632 (mesmo ano do nascimento de Baruch
Spinoza) na cidade de Wrington, nas proximidades de Bristol no sudoeste da
Inglaterra, e filho de burgueses comerciantes, Locke vivenciou um momento bastante
conturbado dentro da organização político – econômica de seu país, marcada pela
revolução gloriosa, ocorrida, entre 1688 e 1689 na Grã-Bretanha, na qual foi deposto
o rei Jaime II, em favor de sua filha Maria II e seu marido Guilherme III, príncipe de
Orange, responsável pela transformação da monarquia absoluta dos Stuart numa
monarquia constitucional e parlamentar, o que foi fator imprescindível na formação da
sua doutrina, haja visto a indispensável participação e influencias de Locke no
desenrolar da mesma.
Formação Acadêmica:
Estudou em Westminister School, transferindo-se em 1652 para Christ Church
College de Oxford, instituição à qual esteve ligado até fins de 1684, como associado,
e formou-se “Mas te r o f A r ts ” em 1658, após bacharelar-se em artes no ano de
1656.
Principais influências recebidas:
• John Owen (1616-1683) - importância da tolerância religiosa.
• René Descartes (1596 – 1650)- Racionalismo e antropocentrismo. Partiu para
o ramo da medicina, o qual foi muitíssimo importante para tecer de sua teia de
relações políticas.
Tornou-se medico particular de Antony Ashley Cooper (1621 – 1683), influente
Lorde articulador inglês, o que o levou a se ingressar na convivência com os grandes
círculos intelectuais e políticos de sua época, além de despertar por vez seus dotes
políticos, e filosóficos, por ter-se aliado junto ao lorde (pouco depois conde de
Shaftesbury), em defesa de interesses do parlamento, fortalecido pela ascensão
burguesa, e contrario ao absolutismo reinante através do Rei Carlos II, sucedido pelo
irmão Jaime.
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.
Pedro H. S. Pereira. Foi politicamente perseguido, e tendo que se exilar na Holanda, (1682) onde
havia liberdade de expressão, Locke pôde trabalhar bastante, questões referentes
ao seu viés liberal, através da publicação de artigos em jornais e periódicos,
retornando à Inglaterra sé em 1689 com a ascensão de Guilherme de Orange ao
trono, graças à outorga do poder dada a este pela câmara dos comuns. Após esta
data que Locke teve divulgadas e publicadas suas principais obras, passando a ter o
devido reconhecimento:
>Primeiro e segundo tratados sobre o governo civil (1690): Combate a
tese do cientista político sir. Robert Filmer, proposta na obra “O Patriarca” (1680 -
publicada após a sua morte), na qual defende de forma convicta o absolutismo, que
segundo ele, remontava suas origens e poder em Adão e Eva. Locke em
contrapartida, afirmou a origem popular e consensual dos governos: “Adão não
tinha, seja por direito natural de paternidade ou por doação positiva de Deus,
autoridade de qualquer natureza ou domínio sobre o mundo, [...] se os tivesse,
nenhum direito a eles, contudo, teriam seus herdeiros.” (LOCKE, 1978, p. 33). Em
seu segundo tratado, expõe sua teoria do Pacto Social e defende o liberalismo,
buscando derrubar de forma definitivo o inatismo absolutista de Filmer.
>Ensaio acerca do Entendimento humano (1690): Na mencionada
obra, Locke leva à tona sua teoria da razão empírica (adquirida através das
experiências), em contrapartida ao racionalismo de Descartes e Cudworth que
pregavam a existência de idéias inatas (que nascem conosco). Segundo Locke,
nosso conhecimento é formado por idéias simples (sensação e reflexão), e
complexas, que ocorrem de acordo com o desenvolvimento de nossa “percepção”.
“Aos poucos vamos ‘amarrando’ muitas impressões sensoriais e formando
conceitos“ (GAARDER, 1998, P. 283).
>Carta acerca da tolerância (1689): Prega a liberdade religiosa e a ruptura
Estado/religião para a boa gestão estatal: “Não cabe ao magistrado civil o cuidado
com as almas (...) isso não lhe foi outorgado por Deus.” (Locke, 1978, p.5).
>Pensamentos sobre a Educação (1693): Nesta, Locke aplica sua teoria
empírica do conhecimento aos problemas do ensino, sustentando que as crianças
são totalmente maleáveis: “pode-se levar, facilmente, as almas das crianças numa ou
noutra direção, como a própria água.”
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais. Pedro H. S. Pereira.
Até a morte em outubro de 1.704, Locke exerceu cargos de comissão de
recursos e de Câmara de comércio, abandonando-os já por volta de 1.700, quando
resolveu por se “aposentar” dedicando-se a vida filosófica e contemplativa .
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais. Pedro H. S. Pereira.
RESENHA CRÍTICA DO “SEGUNDO TRATADO SOBRE O GOVERNO CIVIL”
C A P Í T U L O I
Locke volta a refutar no primeiro capítulo de seu tratado, as teses do filosofo
Sir Robert Filmer (1588 – 1653), defensor assíduo do Absolutismo, alicerçado em
bases divinas. Como havia exposto no primeiro tratado, Adão não tinha em
qualquer hipótese ou por direito, ou por doação divina, a autoridade sobre seus
filhos e sobre o mundo, e se o teve, isso é impossível de se estender e determinar
até a atualidade, o que leva Locke à busca de reiterado entendimento da
legitimidade do domínio e poder de determinados indivíduos sobre outros.
Assim, Locke define um de seus conceitos-chave, que é o de poder político,
que seria o “direito de fazer leis com pena de morte e, conseqüentemente, todas as
penalidades menores para regular e preservar a propriedade, e de empregar a força
da comunidade na execução de tais leis e na defesa da comunidade de dano
exterior; e tudo isso tão-só em prol do bem público”. (Locke, 1978, p. 34)
C A P Í T U L O I I – D O E S T A D O D E N A T U R E Z A
Para se entender o poder político e suas origens, Locke nos diz que devemos
saber como convivem os homens em seu estado de natureza, ou seja, do modo em
que se achariam naturalmente sem nenhum tipo de subordinação estatal, estado no
qual ninguém se obriga para com outro ou se subordina, havendo apenas uma
mutualidade de inter-relações, como nos explica ao citar Richard Hooker, teólogo
inglês defensor da igualdade natural dos homens: “Oferecer-lhe [ao próximo] algo
que lhe repugne ao desejo deve necessariamente afligi-lo em todos os sentidos
tanto quanto a mim; de sorte que, se pratico o mal, devo esperar por
sofrimento...”(LOCKE, 1978, p.35)
Pelas premissas de Hooker, Locke nos afirma novamente a assertiva de que
no estado de natureza todos são iguais e providos das mesmas faculdades,
subordinados apenas a Deus: . ..”nenhum deles [homens] deve prejudicar a outrem
na vida, na saúde, na liberdade ou nas posses, [...] [todos] são propriedade
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
d’Aquele que os fez, destinados a durar enquanto a ele aprouver e não uns aos
outros, e sendo todos providos de faculdades iguais [...] não há a possibilidade de
supor-se qualquer subordinação entre os homens. ( I d e m , p.36)
Dentro da perspectiva do estado de natureza, Locke reconhece o direito de
qualquer um castigar a transgressão e perturbação de sua tranqüilidade por outrem,
no intuito de cessar a violação de sua paz na medida em que esta foi infringida, o
que é direito coletivo, haja vista a inexistência de superioridade ou jurisdição de uns
sobre os outros.
Percebe-se a ligação da mencionada faculdade à lei de Talião, ou da
“infricção a uma pessoa do mesmo dano que haja causado a outrem.”(HOUSSAIS,
2001), e temos a confirmação dessa similaridade na referência de Locke ao
talionato, quando diz que “todos têm direito de castigar o ofensor, tornando-se
executores da lei da natureza.” (LOCKE,1978, p.37)
Deixando-nos alguns princípios assimilados posteriormente no direito Penal e
Civil, Locke nos ensina que além do castigo à transgressão cometida, o sujeito
passivo (vítima) tem também o direito particular de buscar a reparação dos danos
sofridos por parte de quem os causou (CC art. 402- material / 953- moral / CP- art.
91,I ), apropriando-se de seus bens (art. 942 CC) no fim de ser ressarcido e impedir
que o infrator repita o delito. Notam-se algumas das bases sobre as quais o italiano
Cesare Beccaria se sustentou em sua obra “Dos Delitos e das Penas”(1764), na
qual faz menção às faculdades acima mencionadas por Locke, ao sustentar que a
pena deve também focar-se nesse ressarcimento do dano causado, na punição e
conscientização da ilicitude do ato por parte do transgressor. (BECCARIA, 2004)
Por fim Locke critica o Absolutismo ao sustentar ser melhor viver em estado de
natureza, no qual o homem se subordina somente a si, a viver sobre o domínio de
um monarca com o poder centralizado em si e que manda nos outros da maneira
que melhor lhe aprouver, o que não concretiza um pacto no qual lhe é outorgado o
poder, pois como diz Locke: “todos os homens estão naturalmente naquele estado
[de natureza] e nele permanecem, até que, pelo próprio consentimento, se tornem
membros de alguma sociedade política.”( LOCKE, 1978, p.39.)
C A P Í T U L O I I I - D O E S T A D O D E G U E R R R A
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
Este é um estado de inimizade e destruição advindo de desentendimento de
indivíduos no estado de natureza que declaram guerra entre si, podendo contar com
o auxílio de terceiros que queiram vir se juntar à causa. Locke reconhece essa
possibilidade ao afirmar que temos o direito de declarar guerra àquele que me a
declara, como o permite a lei natural, por não se restringir a qualquer tipo de
convenção.
Desta forma Locke afirma que a tentativa de dominação ou escravização é
algo que dá ensejo ao estado de guerra, uma vez que no estado de natureza todos
são livres: “aquele que tenta colocar a outrem sob poder absoluto põe-se em estado
de guerra com ele...” (LOCKE, 1978,p.40)
Em seguida Locke faz a diferenciação entre estado de natureza e estado de
guerra (algo inexistente na concepção hobbesiana, na qual os dois são
praticamente os mesmos). O primeiro ocorre quando os homens vivem entre si em
gozo de suas liberdades sem maiores problemas: “quando os homens vivem juntos
conforme a razão, sem um superior na Terra que possua autoridade para julgar
entre eles, verifica-se propriamente o estado de natureza.” (LOCKE, 1978, p.41)
Logo, o ato de se infringir as mencionadas prerrogativas quando em vivência
no estado natural, àquele que teve seu patrimônio dilapidado, cabe o direito de
declarar guerra a seu agressor, devido à inexistência de quaisquer órgãos
reguladores das atipicidades cometidas, o que não ocorre quando da existência de
um pacto social que garanta a resolução do conflito de modo equânime, e isso que
deve ser buscado pelos indivíduos para que o estado de guerra pereça de forma
definitiva.
CAPÍTULO IV - DA ESCRAVIDÃO
Para Locke, “a liberdade natural do homem consiste em estar livre de
qualquer poder superior na Terra ,e não sob a vontade ou autoridade legislativa do
homem, tendo somente a lei da natureza como regra”. (LOCKE, 1978, p.43)
Assim,´podemos dizer que também no estado social, o homem deve se subordinar
somente àquele poder cujo consensualmente anuiu, estando livre para fazer tudo o
que não é defeso por tal poder, princípio de nosso Direito Constitucional “Ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (CR,
art. 5º II)
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais. Pedro H. S. Pereira.
Em relação à escravidão, é mais do que clara a repulsa de Locke a tal modo
de domínio, gerador de infinitos conflitos e ninharias. Para ele, só existe uma
possibilidade do mencionado modus v ivend i : os casos em que a pessoa perde o
seu direito à vida. Podemos ter o exemplo de um cidadão que cometeu alguma falta
gravíssima passível de pena de morte, casos em que Locke, reconhece a
possibilidade de escravização: “aquele a quem a entregou [a vida] pode, quando o
tem entre as mãos, demorar em tomá-la, empregando-o em seu próprio
serviço”...(LOCKE, 1978,p.43)
C A P Í T U L O V – D A P R O P R I E D A D E
Locke considera em seguimento ao Gênesis, que Deus deu a Terra aos
homens em comum, para que estes se utilizassem desta para a subsistência e
conveniência. “Embora a terra e todas as criaturas inferiores sejam comuns a todos
os homens, cada homem tem uma propriedade em sua própria pessoa; a esta
ninguém tem qualquer direito senão ele mesmo.” (LOCKE, 1978, p.45) Note-se que
Maquiavel anteriormente a Locke nos deixou ensinamentos neste sentido, ao dizer
no cap. XIX de sua obra “O Príncipe” que para que não seja odiado por seus
súditos, o Príncipe jamais deve usurpar os bens e patrimônio destes: “quando os
súditos têm seu patrimônio e honra respeitados, vivem geralmente satisfeitos”.
(MAQU IAVE L, 2004,p. 110)
Em continuidade, Locke nos diz que aquele espaço ao qual o indivíduo
incorporou para si através do trabalho é de sua propriedade exclusiva e não lhe
pode ser contestada (salvo problemas de escassez), pois se necessitássemos do
consentimento de todos para apropriarmo-nos de uma macieira, por exemplo,
morreríamos de fome “É a tomada de qualquer parte do que é comum com a
remoção para fora do estado em que a natureza o deixou que dá início à
propriedade.” (LOCKE, 1978, p.46)
Assim o é também com a terra: “a extensão de terra que um homem lavra,
planta, melhora, cultiva, cujos produtos usa, constitui sua propriedade.” (LOCKE,
1978, p.47)
Locke ressalta a importância do trabalho nesse sentido, ou seja, de
incorporação de maior propriedade, algo que foi demasiado crucial no âmbito do
protestantismo, que incorpora tal conduta à preceitualização divina: “ aquele que
em obediência a esta ordem de Deus, dominou, lavrou e semeou parte da terra,
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
anexou-lhe por este meio algo que lhe pertença.. . ” ( I d e m ) Note-se que Max Weber
(1864-1920), em sua obra “A Ética protestante e o espírito do Capitalismo” fez uma
abordagem muito importante nesse sentido, ao afirmar que a mencionada conduta
(do trabalho como importante para a dignificação do homem), foi muito importante
no âmbito do desenvolvimento do Capitalismo, à medida em que concorreu para o
desenvolvimento econômico-social por ter o trabalho como base importante em sua
doutrina. (WEBER, 2004)
Quanto aos problemas relativos à escassez das terras, Locke considera
impossível tal contestação, pois o espaço dado por Deus a cada um dos homens
para usufruto é mais do que suficiente para sua satisfação, e no caso de desacordo
com qualquer outro homem, é passível de modificação, podendo aquele que teve
sua propriedade disposta a terceiro, trocá-la por outra tão quão produtiva quanto a
anterior.
Retornando à questão do trabalho, Locke nos chama a atenção não só para o
acúmulo de propriedade, mas também para a sua valorização: “. . .considere
qualquer um a diferença que existe entre um acre de terra plantado [...] e um acre
da mesma terra em comum sem qualquer cultura e verificará que o melhoramento
devido ao trabalho constitui a maior parte do valor respectivo.” ( I d e m , p.50) “A
grande arte do governo consiste no aumento de terras e no uso acertado
delas”(I d e m , p.51)
Ao longo do tempo, com o crescimento populacional, a escassez passou a
ser iminente, o que culminou em pactos e leis fixando os limites dos respectivos
territórios, dando ênfase à legitimidade de sua posse.
Em seguida Locke nos explica o surgimento do dinheiro, advindo da
necessidade de se acumular bens sem o problema da fungibilidade, ou seja, sem o
perecimento de seus bens com o tempo. (Note-se que o processo se iniciou com a
permuta ou troca, que aos poucos foi sendo substituída pela moeda – “as moedas
fabricadas com uma liga de ouro e prata apareceram pela primeira vez no século VI
a.C. Tanto os monarcas como os aristocratas, as cidades e as instituições
começaram a cunhar moedas com seu sinete de identificação para garantir a
autenticidade do valor metálico da moeda.” (ENCARTA 2001)
José Afonso da Silva em seu “Curso de Direito Constitucional Positivo”,considera a
propriedade como direito individual indispensável (p.180), ao
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
lado da vida, igualdade, liberdade e segurança, todos elencados no art. 5º de nossa
Carta Magna, relativo aos direitos e deveres individuais e coletivos, que assim define
em seu Inciso XXIII: “ a propriedade atenderá a sua função social”, e em seu inciso XI
que “a casa é asilo inviolável.”
Tais desígnios são pertinentes da primeira leva de direitos a serem
assegurados aos indivíduos ainda na idade Moderna (os quais J. J. Canotilho define
como “Direitos de Defasa do cidadão perante o Estado,” considerando Locke o pai do
individualismo possessivo, p.384; Moraes chama-os de “Direitos da primeira Geração
ou negativos”, sucedidos pelos sociais, econômicos e culturais (2ª), e pelos de
solidariedade ou fraternidade (3ª) p.27;) com a declaração dos direitos do homem e
cidadão pouco após o término da Revolução Francesa, com a declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão, que deveriam ser dispostas em quaisquer
constituições que viessem a existir, sendo substituída a pos ter ior i , pela “Declaração
Universal dos Direitos Humanos” em 1948 pela assembléia das Nações Unidas.
C A P Í T U L O V I – D O P Á T R I O P O D E R
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
Locke critica a mencionada expressão, nos dizendo que pode nos conduzir ao
erro, pois parece atribuir totalmente ao pai o poder sobre os filhos, quando na
verdade sabemos o quão é imprescindível o poder exercido pelas mães: “seria
preferível chamar esse direito de ‘poder dos pais’, para qualquer obrigação que a
natureza e o direito de geração impõem aos filhos, subordinando-os com toda
certeza por igual a ambas causas nela concorrentes.”(LOCKE,1978, p.55)
Em continuidade, Locke nos fala de algo que faz algum diferencial mesmo
quando em estado de natureza: a experiência, que segundo ele, através da idade
ou a virtude (v i r tú em Maquiavel – Príncipe cap. XXV), pode atribuir ao homem
maior domínio sobre os demais, e isso é de nossa natureza (inclusive da dos
animais).
Os únicos passíveis de jurisdição, porém temporária, são os filhos, que até
atingirem a maturidade, são dependentes dos pais, assim como foram Caim e Abel
de Adão e Eva, sucessivamente: “. . .o poder que os pais têm sobre os filhos resulta
do dever que lhes incumbe – cuidar da progênie durante o estado imperfeito da
infância.”(LOCKE, 1978, p.56)
É só na maturidade (hoje a “maioridade” ocorre para nós aos 18 anos
conforme o art. 5º de nosso CC: “A menoridade civil cessa aos dezoito anos
completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.”
Porém quando a maturidade chega, é uma incógnita...), um estado no qual o jovem já
dispõe do devido discernimento, que ele pode passar a gozar de todas suas
liberdades (Locke considerava ser nos aproximados 21 anos), e não depende mais
de seus pais ou tutores.
Em seguida Locke faz menção aos loucos e defeituosos que não atingem o
grau de razão em que teriam o necessário discernimento, ensinando que estes
jamais se libertam do governo dos pais, regra levada a cabo por nosso Código Civil,
que assim define em seu art. 3º II: “são absolutamente incapazes de exercer
pessoalmente os atos da vida civil, os que por enfermidade ou doença mental, não
tiveram o necessário discernimento para a prática desses atos.”
Após a maioridade, quando perde a jurisdição dos pais, o filho deve manter
sempre a honra e o respeito por ambos: “não há estado ou liberdade que possa
dispensá-los desta obrigação.” (LOCKE, 1978, p.59) Porém há de se lembrar que
jamais os pais poderão continuar a exigir de sua prole eterna obediência e absoluta
submissão.
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
Temos assim duas vertentes distintas: a primeira, a obediência, diz respeito
ao dever dos filhos de respeitarem seus pais quando ainda incapazes, e
reciprocamente, o dever dos pais de contribuírem para a formação do filho até o
ápice de sua maturidade. A segunda vertente abordada por Locke, a veneração, é
referente ao respeito e atenção dos filhos para com os pais após o escopo de sua
maturidade, haja vista a importância destes em sua formação anterior, apesar de
não exercerem mais a total jurisdição sobre eles.
Em abordagem a outra forma de exercício do poder, Locke nos fala da
faculdade de se doar a herança: os pais tendo em vista o temperamento e
veneração dos filhos após a maioridade, doa a herança da maneira que melhor lhes
aprouver, o que de certo modo deixa os filhos co-obrigados a obedecer-lhos mesmo
após a maioridade, visando sempre o recebimento da herança, o que faz com que o
pai ainda tenha sobre eles um certo “reinado”, o que leva Locke a compara-los com
monarcas políticos, que estabelecem sua sucessão após a morte.
CAP. V I I – DA S OC I E DA D E POL ÍT ICA OU C IV IL
Como ensina o Gênesis, Deus fez o homem no intuito de que este
convivesse em sociedade, dando-o a razão e o discernimento necessários para seu
relacionamento com os demais, o que inicia-se pela sociedade conjugal, que tem
como fim a procriação e o cuidado para com a prole até sua maturidade, sendo
essa a principal razão da continuidade dos laços entre homem e mulher, e um dos
motivadores do desenvolvimento do trabalho, de acordo com Locke.
Considerando diferentes a sociedade conjugal e a política, o autor resolve por
focar-se na segunda, após breve explanação sobre a primeira. Ela nasce a partir do
momento em que os indivíduos resolvem por abrir mão de seu direito natural
(Estado de natureza – cap II), passando-o às mãos da comunidade, da forma que a
lei estabelecer: “. . .excluindo-se todo julgamento privado de qualquer cidadão
particular, a comunidade torna-se árbitro em virtude das regras fixas
estabelecidas...” (Locke, 1978, p. 67)
Assim, aqueles que unem-se nesse intuito de estabelecer entre si um modus
v ivend i , com órgãos responsáveis pela resolução de controvérsias e punição dos
infratores, encontram-se numa sociedade política ou civil: “...por essa maneira a
comunidade consegue, por meio de um poder julgador estabelecer que castigo
cabe às varias transgressões, (...) bem como possui o poder de castigar qualquer
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
dano praticado contra qualquer dos membros, (...) e tudo isso para a preservação
da propriedade de todos os membros dessa sociedade... “( Idem). Note-se a partir da
citação, a criação dos poderes Legislativo e executivo, aos quais Locke delega o a
faculdade da criação e execução das leis, sistema posteriormente aprimorado pelo
francês Montesquieu (1689 -1755) em sua obra “O espírito das Leis”, na qual trás a
tona o sistema de pesos e contrapesos (checks and balances) .
Logo, só da forma retro-mencionada que se torna possível a existência de
uma sociedade civil, coexistindo nos demais casos o estado de natureza; assim
Locke considera a monarquia, que não é constituída através de uma outorga
consensual entre seus membros: “. . .onde quer que existam pessoas que não
tenham semelhante autoridade a que recorrerem, (...) estarão tais pessoas no
estado de natureza; e assim se encontra qualquer príncipe absoluto em relação aos
que estão sob seu domínio.” (Locke, 1978, p.68).
Para que haja a modificação desses estados monárquicos, há a
necessidade de um juiz imparcial, que decide de forma justa e sem inclinações (o
que não aconteceu nas monarquias) os conflitos existentes. Locke nos diz ainda
que a monarquia é pior do que o estado de natureza ordinário, porque há alguém
com um poder superior ao meu que se acha senhor de tudo.
Ninguém em seu estado de natureza pode ser expulso de sua propriedade
ou ser submetido ao poder político de outrem sem dar consentimento, pois como já
explicitado por Locke, todos são livres, iguais e independentes, e só através de um
pacto civil visando maior tutela destas liberdades que ocorre o fim do tão estudado
Estado, e a formação de um corpo político que representa a maioria (LOCKE x
ROUSSEAU). “Todo homem, concordando com outros em formar um corpo político
sendo um governo, assume a obrigação para com todos os membros dessa
sociedade de submeter-se à redução da maioria conforme a assuntar. . .”(Locke,
1978, p. 71)
Locke logo após se depara com duas objeções: Quando ocorreu de homens
se reunirem e formarem um pacto da forma mencionada? Como pode ter ocorrido
se todos nós nascemos sob um governo qualquer?
Em resposta, Locke nos explica que o governo precede à historia, e só após
sua formação é que se iniciam relatos a seu respeito.
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
Como o modo de se justificar, Locke se utiliza das palavras do jesuíta
Espanhol José de Acosta (1539 – 1600), que em quando da exploração da América
relatou a inexistência de quaisquer governos. “[No Peru] não tiveram, durante muito
tempo, reis nem comunidades, vivendo em bandos, como o fazem até hoje na
Flórida os Cheriquanas, os do Brasil e de muitas outras nações que não tem reis
certos, mas quando se oferece a ocasião, na paz ou na guerra, escolhem os chefes
conforme lhes convém...“ (ACOSTA CITADO EM LOCKE, 1978, p. 73). Como
explicita Locke, tais sociedades iniciaram-se com a união voluntária e acordo mútuo
entre os homens que agiam livremente.
Explicando o porquê do surgimento das monarquias, Locke baseia-se na
figura do Pai, que como até a atualidade costuma ser consenso, é o responsável
pelo sustento e gerencia dos filhos, e o seu castigo quando da transgressão das leis
entre si impostas, o que foi se transferindo de tempos em tempos, culminando nas
monarquias, mas ele considera que tal poder exercido pelos pais era legitimo, pois
o era feito de forma natural:...”não pode haver dúvida que faziam o uso da liberdade
natural para instalar aquele que julgavam o mais apropriado a bem governar.”
(Locke, 1978, p. 74); porém comete-se um enorme engano ao se considerar que o
governo monárquico surgiu por natureza, vez que surgiu como ensinou Locke, pelo
consentimento tácito, pois já acostumados com a autoridade paterna, os indivíduos
verificaram-na como a melhor e mais segura.
O surgimento das monarquias de forma mais concisa como o era na época
de Locke, se deu segundo ele, pela superioridade de determinados indivíduos na
chefia de guerras e conflitos, nos quais destacaram-se por sua maior capacidade e
agilidade a frente do povo, o que trouxe confiança dos demais por ele, algo que
passou a vigorar em primeiro plano sem malícia, dando origem às cruéis
monarquias, sustentadas por argumentos esdrúxulos como os de Sir. Robert Filmer.
Em resposta à questão de nosso atrelamento a formas de governo
precedentes ao nosso nascimento, Locke volta a mencionar que somos livres, e por
isso podemos criar nossa própria forma de governo, desde que longe daquela, pois
se não houvesse tal possibilidade, o mundo continuaria gerido por uma única
monarquia: ”. . .quem quer que nasça sobre o domínio de outrem pode ser
igualmente livre e pode tornar-se governante ou súdito de governo separado ou
distinto (...) todos teriam de ser uma única monarquia universal se os homens não
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
tivessem tido a liberdade de se separarem das famílias e dos governos (...) indo
formar comunidades distintas e outros governos...” (Locke, 1978 p. 78)
Finalizando a questão relativa às formas de governo e sua aceitação, Locke
nos fala que nos casos de esta ser expressa, o individuo coobriga-se como membro
de tal governo, porém o problema centra-se no consentimento tácito, que para
Locke dá-se quando o individuo não manifesta sua vontade e interesse para com a
manutenção da jurisdição, o que o vincula até que não queria mais manter-se sobre
determinado poder, tendo a faculdade de retirar-se da comunidade, o que não ocorre
com aquele que a aceitam de forma expressa.
CAP IX . DOS FINS DA SOCIEDADE POLÍTICA E DO GOVERNO Locke nos fala que apesar dos homens terem total liberdade sobre suas
posses, e não terem qualquer obrigação com qualquer outro no estado de natureza,
estão expostos a inúmeros perigos que podem culminar na perda de sua propriedade
e tranqüilidade para terceiros, pois são vulneráveis: “... a punição da propriedade
que possui nesse estado é muito insegura, muito arriscada.” (Locke, 1978, p.82).
Mais do que óbvio, o surgimento das sociedades civis tem como escopo, a
preservação da propriedade, o que não se demonstra tão firme no estado de
natureza: “O objetivo grande e principal, (...) é a preservação da propriedade. Para
este objetivo, muitas condições faltam no estado de natureza” (Idem). Locke
enumera várias condições inexistentes no estado de natureza:
1 – Uma lei firmada e reconhecida por todos, pela qual devem se pautar.
2 – Um juiz imparcial para a resolução de conflitos de acordo com a lei.
3 – Algo que assegure a devida execução da sentença imposta.
Um grande motivador da saída dos indivíduos de seu estado de natureza,
levando a se associarem aos demais, é a incerteza sobre o resultado de suas
ações quando em estado de natureza: “Os inconvenientes a que estão expostos
pelo exercício irregular e incerto do poder que todo homem tem de castigar as
transgressões dos outros obrigam-nos a se refugiarem sob as leis estabelecidas de
governo e nele procurarem a preservação da propriedade. (Idem, p.83)
Tendo em vista uma maior proteção à sua propriedade e bens, apesar de
perder alguns de seus direitos exclusivos do estado de natureza (principalmente a
autotutela), o homem tem lucros ao resolver por ligar-se a uma sociedade política,
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
pois ao contrario, fica a mercê da vulnerabilidade. A concepção de Locke é bastante
diferente da hobbesiana, que vê o Estado como um “mal necessário”.(HOBBES,
2004)
CAP. X – DAS FORMAS DE UMA COMUNIDADE
Locke aborda as diversas formas de governo que se tornam possíveis
quando há a criação das sociedades civis.
Se há a nomeação de pessoas de tempos em tempos para a elaboração das
leis, deparamo-nos com uma democracia, segundo ele. Nos casos de dar-se tal
faculdade nas mãos de alguns homens escolhidos, e a seus herdeiros e
sucessores, deparamos-nos com uma oligarquia, podendo haver também as
monarquias, que podem ser hereditárias (Locke já nos falou do problema que pode
causar a hereditariedade), ou eletivas.
Por fim Locke nos dá a definição de Comunidade, que deve ser interpretada
segundo ele com o significado de “c iv i tas”, correspondente à forma de associação
por ele mencionada, na qual vários indivíduos unem-se em torno de um mesmo
objetivo, visando o bem comum.
CAP XI – DA EXTENSÃO DO PODER LEGISLATIVO Locke nos diz que a primeira e fundamental lei positiva que for instruída
dentro de uma nova sociedade, deve estabelecer junto a si o poder legislativo,
poder supremo e sagrado dentro de uma comunidade, sem o qual jamais poderá
haver a possibilidade de se legislar sem o consentimento dos seus representantes:
“[não] pode qualquer edito de quem quer que seja, (...) ter a força e a obrigação da lei
se não tiver a sanção do legislativo escolhido e nomeado pelo público”... (Locke,
1978, p.86).
Fazendo algumas ressalvas ao poder legislativo, que pode ser exercido por
um ou mais cidadãos, Locke nos diz que:
1- Ele não pode ser mais do que aquilo que as pessoas lhe outorgaram:
“...não poderá ser mais do que essas pessoas tinham no estado de natureza antes de
entrarem em sociedade e o cederam à comunidade, porque ninguém pode transferir
a outrem mais poder do que possui.” (Locke, 1978 p. 87)
Seu objetivo é a preservação dos direitos dos súditos, e nada mais.
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.
Pedro H. S. Pereira.
2 – Ele jamais pode chamar a si o poder de governar por meio de decretos
extemporâneos e arbitrários, (AI 5...) somente deve o fazer por leis a partir das
quais os magistrados o efetivarão, para que não caia na autoridade, o que é um dos
motivos que levam o individuo a celebrar o pacto, visando seu fim: “o poder que tem
o mando deve governar mediante leis declaradas e recebidas, e não por
prescrições extra temporais e resoluções indeterminadas”. (Locke, 1978, p. 88)
3 – Tal poder não pode jamais retirar dos indivíduos a sua propriedade (o que
é um dos principais motivos de sua criação), ou lançar impostos sobre esta sem seu
consentimento. É errôneo pensar que o poder legislativo pode fazer o que quiser,
mas isso pode ser possível naquelas comunidades em que o legislativo esta
alicerçado só sob um único individuo permanentemente, pois nos casos de
assembléias variáveis, os legisladores não o fazem por saber que voltarão estar
submissos como os demais.
4 – o poder legislativo não pode transferir seu poder de elaboração de leis a
terceiros, pois só o povo que tem legitimidade para o fazer.
CAP. XII DOS PODERES LEGISLATIVO, EXECUTIVO E FEDERATIVO DA COMUNIDADE
Coma já mencionado por Locke, o poder legislativo é aquele que Tem o
direito de saber como se deverá utilizar a força da comunidade no sentido da
preservação dela própria e dos seus membros, mas apesar desta tarefa, ele não
trabalha permanentemente, e seus membros devem voltar à normalidade para que
também sujeitem-se às leis que fizeram, e aproximem-se mais do bem geral, o que
contrariamente os poderia levar a agir de forma arbitrária, ou visando interesses
exclusivos.
Na fiscalização do cumprimento das leis, ficará o poder executivo,
responsável por acompanhar sua execução e eficácia, que ficará bastante separado
do legislativo, por este se reunir poucas vezes.
Por último Locke menciona o poder federativo, responsável pela segurança e
defesa dos interesses da comunidade fora dela, o qual deve ser também regido
pelo executor, pois segundo ele: “... é quase impraticável colocar-se a força do
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.
Pedro H. S. Pereira. Estado em mãos distintas e não subordinadas, ou os poderes executivo e federativo
em pessoas que possam agir separadamente, em virtude do que a força
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CAP XIV – DA PRERROGATIVA
Pedro H. S. Pereira.
do público ficaria sob comandos diferentes, o que poderia ocasionar, em qualquer
ocasião, desordem e ruína.” (Locke, 1978 p. 92)
CAP. XIII-DA SUBORDINAÇÃO DOS PODERES DA COMUNIDADE
Locke nos ensina que como o poder legislativo age de acordo com os
interesses da comunidade visando sua preservação e salvaguarda, jamais pode ir
contra esta, casos nos quais a mesma pode alterá-lo, outorgando-lhe a outros
indivíduos, pois é sempre o poder supremo nos casos de falhas ou corrupção no
poder legislativo, o que não ocorre nos casos de boa gestão, em que o legislativo
goze de tal prerrogativa:”... enquanto subsiste o governo,o legislativo é o poder
supremo; o que deve dar leis a outrem deve necessariamente ser-lhe superior...”
(Locke, 1978, p.93)
Nos casos de vacância temporal do legislativo (cap XII) momento em que
não está atuante, a referida guarda e supremacia advém do executivo que apesar
de irresponsável pela continua fiscalização das leis; esta pessoa única também
pode chamar-se suprema, em sentido mais tolerável, “não que tenha em si todo o
poder supremo, que é o de fazer leis, mas porque possui em si a suprema
execução...” (idem)
Retomando o poder legislativo, Locke nos fala sobre o modo e freqüência de
suas reuniões, nos ensinando que podem ser reguladas constitucionalmente, com a
precisão de reuniões durante intervalos de tempo, ou quando as exigências ou
ocasiões trouxerem tal necessidade, devendo em ambos casos o executivo agir no
sentido de possibilitar de forma precisa as mencionadas reuniões.
Se o executivo não concorre para a possibilitação das reuniões, e utiliza-se
da força para impedi-las, Locke nos diz que o povo tem o direito de utilizar-se da
força, pois seu emprego sem o consentimento do povo por parte do executivo,
coloca-o num estado de guerra para com a sociedade. Seu poder de convocar o
legislativo, não o trás ou dá supremacia, é apenas um encargo, uma obrigação em
prol do bem publico e da continua manutenção das leis.
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.
Pedro H. S. Pereira.
Locke nos fala neste presente capitulo dos casos em que o poder legislativo
nada deliberou sobre determinado assunto, ou simplesmente não o regular de
forma amplamente necessária, momentos em que cabe ao executivo buscar utilizar-
se do meio mais eguaz possível, visando o bem da comunidade: ...o executor das
leis, tendo o poder nas mãos, possui o direito de (...) fazer o uso dele para o bem da
sociedade, em muitos casos em que a lei municipal não estabeleceu qualquer
direção, ate que o legislativo,(...) pondere a respeito.” ( I d e m , p.96) Na atualidade,
claro que pouco adversamente, nosso poder executivo tem através de nossa Magna
Carta prerrogativa similar, possível devido às medidas provisórias, (reguladas no
art. 62) que dão a faculdade ao chefe do executivo, de editar medidas provisórias
nos casos de relevância e extrema necessidade, suprindo a vacância do poder
legislativo, que pouco após é chamado a deliberar no intuito de aprovar ou não a
medida, possível de ser convertida em lei.
Quando age em favor do bem público em casos em que não há previsão
legal ou que há a necessidade de vir contra esta, o executivo utiliza-se do instituto
chamado prerrogativa, devendo ir sempre a favor do povo. Exemplo simples desta
utilização, é o caso em que há a necessidade de demolição de uma casa próxima
de outra que está pegando logo, para que este não mais se alastre. Como é
bastante visível, há a necessidade do mencionado ato, que se tido em momento
posterior, culminara na destruição de propriedade; porém, visando o interesse
coletivo, o executivo jamais poderá deixar de se utilizar desta hermenêutica nestes
casos mais extremos.
Locke nos diz que as primeiras sociedades tinham a prerrogativa como
principal base de seus governos, pois poucos eram as leis positivas, que foram
paulatinamente germinando das necessidades modernas, e substituindo a
arbitrariedade dos reis, trazendo cada vez mais de forma concreta, segurança para a
sociedade, o que jamais pode ser considerado uma “usurpação do poder”, como
Locke nos ensinou: “sendo o objetivo do governo o bem da comunidade, quaisquer
alterações que se introduzam nele visando a um objetivo não podem representar
usurpação contra quem quer que seja (...) a prerrogativa só pode ser a permissão
do povo aos governantes para praticar alguns atos de livre escolha onde a lei
C A P . X V I I – D A U S U R P A Ç Ã O
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
silencie, e por vezes, vá também, diretamente contra a letra da lei, a favor do bem
público”... (Locke, 1978, p. 99)
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais. Pedro H. S. Pereira.
Por fim, Locke nos pergunta o que pode-se fazer se esta prerrogativa se
tornar arbitrária por parte do poder executivo, e referindo-se a divindade nos diz que
a única coisa que se pode ser feita, é apelar para esta: “... quando o corpo do povo
(...) está submetido a um poder sem direito, contra o qual não exista apelação na
terra, ficam então na liberdade de apelar para o céu”... (Id e m , p.101)
C A P . X V I D A C O N Q U I S T A
Locke nos diz que tal forma de poder é algo muito comum em guerras, e que
não é uma forma legitima de manifestação do poder político, pois “sem o
consentimento do povo, não é possível nunca fundar-se nova sociedade”. (Locke,
1978, p. 104). Ele compara a mencionada conquista através de guerras, à conquista
que um ladrão tem de meu patrimônio: sob ameaça de uma arma, seria legitima a
entrega de minha propriedade a outrem? Jamais aquele que conquista em guerra
injusta pode ter qualquer direito à submissão e obediência por parte do
conquistado.
Para Locke, o poder que o conquistador pode ter do conquistado é
puramente despótico, sendo aceitável somente sobre a vida dos que participaram
desta e perderam seus direitos (cap. IV- escravidão), o que não abrange aqueles
que não tomaram parte na batalha, salvo o expresso consentimento dos mesmos:
“quem tem direito sobre a pessoa de um individuo para destruí-lo conforme quiser,
nem por isso tem direito sobre o que lhe pertence para possuí-lo e desfrutá-lo. (...)
o direito de conquista se estende somente à vida dos que tomaram parte na guerra
e não às suas propriedades”... (Locke, 1978, p. 107). Como parte da propriedade
dos indivíduos temos a família, e Locke reconhece que esta jamais deve responder
por nada nos casos de escravização do patriarca: ”Salvos prejuízos e danos obtidos
com a guerra, não podemos prejudicar a família.” (Id e m ) Quanto aos filhos, a
recíproca se repete, pois como já explicitado, estes são livres de sujeição a
qualquer governo (se sujeitam somente ao poder dos pais até a maioridade cap.VI),
e são os legitimados à herança dos pais.
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.
Pedro H. S. Pereira.
Locke diferencia ao inicio a conquista (chamada por ele de usurpação
estrangeira) da usurpação, que para ele é uma conquista interna, na qual tal
conquistador jamais pode ter o direito a seu favor, por estar este direito na posse de
um terceiro legitimado.
Como visto no capítulo anterior, o conquistador passa a ter o direito sobre
aqueles com quem guerreou e venceu, algo não reconhecido nas formas e regras
de governo por parte do usurpador, vez que esta jamais será legitima, pois “...quem
quer que adquira o exercício de qualquer parte do poder por meios diferentes do
que as leis da comunidade prescreveram, não tem direito a ser obedecido...”
(Locke, 1978, p. 112). Assim, só a sociedade, e de forma que a lei estabelecer, é a
legitimidade para a escolha de seus dirigentes, não tornando-se jamais submissa a
qualquer forma de poder arbitrário como a advinda da usurpação.
CAP. XVI I I – DA T IRANIA
Se a usurpação é o exercício do poder ao qual outrem tem o direito, a tirania é
segundo Locke, o exercício do poder alem do direito que lhe fora outorgado, algo que
não pode caber a ninguém. Ela consiste em fazer o uso do poder tido em mãos, não
para a vontade daqueles ao qual estão sujeitos, mas em vantagem própria e
privada, algo já combatido anteriormente pelo rei Jaime Stuart, que rezava que: “... o
rei justo e virtuoso, (...) reconhece ter sido criado para promover a riqueza e a
propriedade de seu povo”. (Locke,1978, p. 113)
Segundo Locke, não só as monarquias podem ser sujeitas a tal
arbitrariedade, pois em quaisquer formas de governo nos quais o poder de um
legitimado se aplicar para fins serão os de interesse de seu povo, tal governo
encontrar-se-á em uma tirania. Para Locke, o ato de se possuir mais poder ou
posses do que os demais, não me dá o direito de exorbitar as faculdades a mim
atribuídas: “. . .possuir com pleno direito grande poder e riquezas, (...) esta tão longe
de valer como desculpa e muito menor como razão, para a rapinagem e opinião”...
(Locke, 1978, p. 115).
Nos explicando o porquê de não se poder opor às ordens de um príncipe
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.
Pedro H. S. Pereira. quando estas são legítimas, (o que pode gerar baderna) Locke enumera quatro
fatores que dão ensejo à condição de quem o faz:
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
1 – O príncipe não responde por quaisquer atos não considerados ilegais em
seu governo, o que o livra de qualquer tipo de censura ou condenação judicial.
2 – Tal faculdade não impede o questionamento de sua regularidade, mas se o
príncipe ou rei o for, a arbitrariedade dos responsáveis pelo constrangimento e
desrespeito às leis deve ser julgada.
3 – Nos casos de não haver a faculdade acima mencionada, deve haver a
existência de mecanismos satisfatórios para a resolução dos conflitos e
desentendimentos existentes quando do exercício do poder pelo legitimado,
capazes de garantir boa relação e o destrinchar de quaisquer conflitos.
4 - Mesmo com a eminência de atos ilegais por parte do governo, e com a
obstrução das formas legais de se proceder, os indivíduos têm o direito de resistir a
tal manifesto, buscando de melhor maneira o modo de resolução do problema de
forma pacífica.
C A P . X I X – D A D I S S O L U Ç Ã O D O G O V E R N O
Locke busca ao inicio a distinção de dois termos: a dissolução da sociedade, e
a dissolução do governo. A da sociedade pode ocorrer pela invasão de força
estranha, o que culmina não só na dissolução do governo, mas também na
dissolução da sociedade, vez que esta perde a capacidade de autogestão: ”. . .não
sendo capaz de manter-se e sustentar-se como corpo inteiro e independente, a
união que lhe cabia e a formava tem necessariamente de cessar”... (LOCKE, 1978, p.
118) Há também segundo Locke, a possibilidade de dissolução dos governos por
motivos internos:
10 – Quando se altera o poder legislativo sem o prévio consentimento da
sociedade, o que ocorre “se um homem ou mais de um chamarem a si a elaboração
leis sem autoridade, a que o povo, em conseqüência, não está obrigado a obedecer”.
(idem, p. 119)
Nestes casos o mesmo tem a liberdade de escolher novos legisladores, e
conforme a conveniência, nova forma de governo.
20 Quando o legislativo ou o príncipe agem contrariamente ao encargo que
receberam, ou seja, a preservação da propriedade fator responsável por sua
criação. Ao agir desta forma, apoderando-se ou entregando a terceiros a
propriedade alheia, o legislativo perde o poder que lhe fora outorgado pelo povo,
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais.Pedro H. S. Pereira.
que passa a ter o direito de retomar sua liberdade originária, ou eleger novos
governantes ou modos de governo.
Em seguida Locke nos diz que fora dos casos supracitados, o povo, apesar
de alguns problemas decorrentes das contínuas modificações ocorridas nas
sociedades de menor repercussão, consegue conviver em paz ... “até que o
malefício se torne geral e os maus desígnios dos governantes visíveis, ou que a
maior parte perceba as tentativas que fazem, o povo, (...) não será capaz de mexer-
se”. (idem, p. 124).
Lembrando-nos de preceitos já estudados nos capítulos anteriores ( cf. cap.II e
III), Locke lembra que nos casos de exorbitância das faculdades outorgados por
parte do legislador, o povo em decorrência da lesão sofrida, pode em determinados
casos retornar ao estado de guerra: “ Quem quer que use força sem direito, como o
faz toda aquele que deixa de lado a lei, coloca-se em estado de guerra com aqueles
contra os quais assim a emprega”.. (idem, p. 125). E Locke considera justa uma
penalização mais severa ao legislador, nos casos em que vai em desrespeito à lei
imposta (algo que deveria ser levado à cabo em nosso país): “[a ofensa deles é
maior] não só por serem ingratos pela maior pela maior parte que tem pela lei, mas
também por desrespeitarem o encargo em que seus irmãos lhes colocaram nas
mãos”. (idem).
Desta forma Locke refuta as palavras do jurista Willian Bar Clay que não
aceita de forma alguma penas mais severas ao monarca, pois vê que “o inferior não
pode castigar o superior” (idem, p. 126), pode apenas “suportar” sua tirania, o que
Locke revida, ao sustentar que nestes casos os indivíduos retornam ao estado de
guerra, sem exceção, tendo direito de se opor a quem quer que seja. Como toda
regra tem sua exceção, o grandioso jurista crê que nos casos em que o rei procura
derrubar o governo e coloca o povo em guerra, ou quando se forma dependente de
outro reino e perde sua autonomia, o povo encontra-se livre e entregue à própria
vontade, o que não foge do foco de pensamento Lockeano.
Ao fim Locke volta a afirmar que o grande legitimado para julgar tanto o
príncipe quanto o legislativo quando estes agem contrariamente as leis, é sempre o
povo: ”. . .quem poderá julgar se o depositário ou o deputado age bem e de acordo
com o encargo a ele confiado serão aquele que o nomeiam, devendo por tê-lo
nomeado, ter ainda poder para afastá-lo quando não agir conforme seu dever”
(Id e m , p. 130).
A leitura deste texto jamais suprirá a importância da análise integral dos originais. Pedro H. S. Pereira.
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