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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO
UNIDADE ACADÊMICA DE GARANHUNS
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS
RESENHA CRÍTICO-ARGUMENTATIVA DOS CONTOS A BALADA DE AVIGDOR
DE CÍNTIA MOSCOVITCH, E UMA GALINHA DE CLARICE LISPECTOR.
GARANHUNS, PE
2013
RESENHA CRÍTICO-ARGUMENTATIVA DOS CONTOS A BALADA DE AVIGDOR
DE CÍNTIA MOSCOVITCH, E UMA GALINHA DE CLARICE LISPECTOR.
Resenha crítico-argumentativa apresentada
ao Professor Me. Carlos Eduardo
Albuquerque, como exigência para obtenção
de parte da nota da I Verificação da
Aprendizagem, da disciplina Literatura e
Estudos de Gênero.
GARANHUNS – PE
2013
As mulheres sofreram ao longo do tempo com muitas imposições da sociedade, que
lhe atribuía sempre o dever de se mostrar frágil, sensível e que tivessem em mente que o seu
destino final é ser uma boa esposa, ter filhos e assim, ter seu espaço garantido, porém
delimitado entre a sala e a área de serviço de sua casa.
Ao fazermos uma análise reflexiva do conto “Uma Galinha” de Clarice Lispector,
percebe-se no desenrolar dos acontecimentos, a afirmação dessa condição social feminina, a
“galinha” apresentada como sendo a personagem principal do enredo, tem as características
de calma, apática e sem nenhum anseio, esta foi à forma a partir da qual a autora nos quis
apresentar a situação da mulher de acordo com a sua visão, para que possamos compreender
essa figuração, e para construirmos esse sentido é importante observar, não apenas a
superfície do texto, mas as questões que estão subjacentes a esta superfície. O encadeamento
das figuras e a escolha de um conjunto de figuras lexemáticas específicas contribuem para
essa leitura temática do conto.
Passemos então a análise do enredo. Tem-se que num domingo, a galinha escolhida
para ser comida no almoço escapa do quintal e foge pelos telhados, perseguida pelo dono da
casa. Este, afinal, alcança a galinha, levando-a de volta e colocando-a, com certa violência, no
chão da cozinha, momento em que a ela, de susto, põe um ovo e se salva, já que a menina da
casa, seguida do próprio pai, reconhece no ovo uma futura vida, único motivo para a
sobrevivência da galinha. A quebra da tranquilidade da família é representada pela fuga que a
galinha empreende da área de serviço que irá modificar o destino da galinha, e que a postura
do ovo faz com que ela seja vista com outros olhos, deixando de ser perseguida para se tornar
“mãe” e “rainha do lar”.
Na construção do texto há palavras e expressões que são aplicadas a personagem
“galinha”, seguem-se então as principais: jovem parturiente, esquentando seu filho, correr
naquele estado, rainha da casa e deu à luz, se nos focarmos na época de seu lançamento
1960, podemos facilmente ligá-lo ao contexto de opressão aos quais as mulheres estavam
relegadas. A autora fala de uma galinha/ mulher estúpida, tímida e que quando livre tem que
decidir por si mesma os caminhos a tomar sem nenhum auxílio de sua raça . A simbolização
da condição feminina na sociedade é observada mais ainda se notarmos que o ovo salvador é
como um filho prematuro e que a galinha nascida que fora para a maternidade, parecia uma
velha mãe habituada.
Ao ser recapturada, após a fuga frustrada, é impossível não ler na figura da galinha a
representação da mulher passiva e doméstica, que por vezes, ao “sair” de casa se sente
hesitante e trêmula, ao sonhar seguir outro rumo, já que até então ela só tinha como “futuro” o
que lhe era imposto pelos laços matrimoniais e a figura do seu marido. A galinha é então a
representação da mulher enquanto ser passivo e doméstico que deve atender as necessidades
do sexo oposto, tendo que lhe dar prazer e de ter uma prole que mostre que seu marido é viril
e saudável, já que como afirma Monteiro (2007:16), “o prazer feminino é negado, até mesmo
reprovado: coisa de prostitutas” vê-se ai a anulação da sexualidade como um ato prazeroso,
fazendo apenas com que a mulher seja relegada a finalidade de reprodutora.
Após o desenrolar dos fatos e a galinha colocar o ovo (ser mãe), nenhum outro
acontecimento importante nos é revelado, a vida da galinha passa tranquilamente sem mais
nenhum sobressalto, até que a família decide matá-la. Após analisar um pouco mais, podemos
afirmar que a autora fez uma analogia aos ciclos da vida, nos quais lutamos para viver e
trilhar caminhos e acabamos todos, tendo o mesmo destino, a morte.
Já no conto A balada de Avigdor, há um tipo de conto de fadas moderno, no qual duas
crianças trocam o papel que seus pais imaginaram para elas. Avidgor é filho único, tem
trejeitos afeminados e evita brincar com outros meninos, o que faz com que seus pais o
matriculem em um curso de caratê, já Débora é uma menina desajeitada que passa a maioria
do tempo brincando com outros meninos, não possui os traços femininos esperados pela
sociedade, seus pais a matriculam em um curso de Balé, esperando que ela se torne uma
menina “normal” de acordo com os estereótipos sociais. Porém, o que os pais de ambos não
sabem é que Avigdor e Débora trocam os papéis quando se encontram ˗ ele a ensina a lutar
caratê, e ela o ensina a dançar balé. Os pais se afligem com essa inversão ao perceberem-na.
E o tapete persa que é mesmo tempo, segundo o sonho de cada um, palco e tatame, é a
testemunha dessa troca de conhecimentos.
Ao desprezarem os modelos dominantes do masculino e do feminino, as crianças
sugerem, porém, que algo não vai bem. Para o pai de Avigdor, o filho tinha que ser homem,
com traços bem marcados e viris, pois o menino deveria ajudá-lo em seus negócios, e não
deveria envergonhar a família.
Os pais de Avigdor, Samuel e Lube Goldamovich, são personagens que merecem um
olhar diferenciado na construção do conto, pois, Samuel, apresenta trejeitos relegados apenas
às mulheres, é afeito a lágrimas, desmaios, e depressões, não pode viver fortes emoções,
características bem femininas, o que faz que Samuel seja diferente da esposa dona Lube, que
havia percebido o comportamento estranho das crianças, mas ao descobrir que os dois
invertem os papéis quando estão trancados no quarto, esconde do marido o que vê, e
chegando a pensar que as crianças estivessem experimentando a identidade alheia para
compor a própria. Ou coisa parecida (Moscovitch, PP 48).
A mãe de Avigdor, é mais forte, não há relatos de lágrimas, ou coisa semelhante,
encara as coisas com um olhar de desconfiança, porém recorre ao conhecimento que tem, para
evitar grandes problemas em relação ao comportamento do filho. Podemos afirmar que A
Balada de Avigdor, nos mostra traços claros de estereótipos de opiniões e crenças
convencionais, que generalizam e tipificam de forma muito simplificada e de forma carente a
individualidade humana, todas as expectativas negativas são esquecidas, após o pai de
Avigdor ficar sabendo que os dois adolescentes estão namorando.
Por fim, após analisar os dois contos, podemos perceber que Clarice Lispector ao
escrever o conto Uma Galinha, quis evidenciar a situação a qual a mulher está aprisionada
desde tempos idos, ao destino de ser apenas uma réplica do que lhe é imposto pela sociedade,
se fugir desse modelo proposto, é tachada de diferente, e é alvo de criticas, mesmo nos dias
atuais, as mulheres que tem ideias e tentam fugir desses padrões são apontadas por outras
pessoas, já Cíntia Moscovitch nos trás, em sua narrativa, a desconstrução de mitos e medos
que circulam pela sociedade, pois, apesar de todas afirmativas contrárias, Avigdor e Débora
crescem e se tornam adultos “normais”, apenas com profissões diferenciada das outras
pessoas, mas que seus filhos correspondem aos tipos e estereótipos vistos no cotidiano.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
LISPECTOR, Clarice. Uma Galinha In Laços de Família. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
MOSCOVITCH, Cíntia. A balada de Avigdor. In______________. Essa coisa brilhante que
é a chuva. Record, 2012.
MONTEIRO, Rosa. A vida invisível. In_________________. História de mulheres. Trad de
Joana A. Melo. Rio de Janeiro: Agir, 2007.