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Reserva Natural das Ilhas Selvagens Neste documento estão condensados uma série de artigos que foram publicados em 2011, pelo Serviço do Parque Natural da Madeira, ano em que a Reserva Natural das Ilhas Selvagens celebrou o seu 40º aniversário. Vários temas são abordados ao longo de vários artigos, dando a conhecer as particularidades e riquezas destas ilhas, desde: - Descoberta das ilhas - Cagarra ex-líbris da reserva - Exploração das plantas - Tentativas de colonização - Farol - Jaques -Soberania Portuguesa -Galardões - Geologia - Cagarra - Aves marinhas - Osga -Recuperação dos habitats terrestres da Selvagem Grande - Lenda do Ccapitão Kidd -Visitantes

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

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Neste documento estão condensados uma série de artigos que foram publicados em 2011, pelo Serviço do Parque Natural da Madeira, ano em que a Reserva Natural das Ilhas Selvagens celebrou o seu 40º aniversário.

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Page 1: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Neste documento estão condensados uma série de artigos que foram publicados em

2011, pelo Serviço do Parque Natural da Madeira, ano em que a Reserva Natural das Ilhas

Selvagens celebrou o seu 40º aniversário.

Vários temas são abordados ao longo de vários artigos, dando a conhecer as

particularidades e riquezas destas ilhas, desde:

- Descoberta das ilhas

- Cagarra – ex-líbris da reserva

- Exploração das plantas

- Tentativas de colonização

- Farol

- Jaques

-Soberania Portuguesa

-Galardões

- Geologia

- Cagarra

- Aves marinhas

- Osga

-Recuperação dos habitats terrestres da Selvagem Grande

- Lenda do Ccapitão Kidd

-Visitantes

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Reserva Natural das Ilhas Selvagens

A descoberta

Diogo Gomes foi o descobridor oficial destas ilhas, em 1438, mas segundo algumas fontes, na

Antiguidade já eram referenciadas duas Selvagens conhecidas pelos nomes de Heres e de

Antoloba e, em registos de 1345, aparecem incluídas no grupo das treze Ilhas de Canárias.

Porquê Selvagens?

Segundo Gaspar Fructuoso ( In Saudades da Terra), assim foram chamadas “por serem hermas

e desconversáveis assi de navegação como de gente, e com huns perigosos baixios, em

distância de trinta léguas entre huma e outra, as quais pode ser que sejam do número das doze

que, segundo o historiador João Barros, se dizem Canárias”.

Proprietários das Ilhas

As Selvagens foram incorporadas na Ordem de Cristo, durante o reinado de D. Manuel, tendo

sido feitas concessões das Ilhas a fidalgos e guerreiros que se distinguiam nos feitos das

conquistas e guerras na época do expansionismo português. Desde esta data passaram a

pertencer ao Estado Português, estando sob a administração territorial da Região Autónoma

da Madeira.

Presença humana…

Várias tentativas de colonização foram feitas, das quais ainda existem alguns vestígios na

Selvagem Grande - muros de pedra, uma velha cisterna e respectivos canais – mas nunca

foram colonizadas devido à inexistência de água e à inospicidade do local.

…e suas actividades

As Ilhas, desde cedo, foram exploradas para a recolha de Barrilha para ser utilizada na

produção de soda e de Urzela, um líquen usado na tinturaria, que imprimia uma cor púrpura

nos tecidos e papel, cujo comércio prosperou no século XVIII, tendo sido exportado para a

Inglaterra e Flandres.

Outras boas fontes de rendimento eram a pesca e salga do peixe, que era vendido na Ilha da

Madeira, assim como a extracção de estrume resultante da acumulação de excrementos de

Cagarra, usado na fertilização das terras agrícolas na Ilha mãe.

No século XV foram introduzidos na Selvagem Grande cabras e coelhos que serviam de

alimento às pessoas envolvidas nessas actividades. Segundo alguns relatos, de Agosto a

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Setembro, os proprietários das Ilhas exploravam a caça ao coelho, cuja carne salgavam e as

peles eram secas para exportação.

A caça da Cagarra

A actividade mais lucrativa na história das Selvagens foi a caça das cagarras, ave marinha que

nidifica nestas Ilhas. De Setembro a Outubro de cada ano, ou no fim da época de reprodução,

eram organizadas expedições a estas ilhas com o intuito de capturar o máximo possível de

juvenis. Os animais eram mortos e aproveitados para serem utilizados de várias formas:

consumo humano, fabrico de colchões com as penas e outros fins. Estas actividades foram

mantidas de uma forma controlada até se iniciar a utilização de barcos a motor, altura em que

a colónia começou a mostrar fortes indícios de regressão. A última expedição às Ilhas

Selvagens para a matança dos juvenis da cagarra, partiu do Funchal a 15 de Setembro de 1967.

Necessidade de proteger…

E foi com base na urgente necessidade de acabar com o declínio da população de cagarras e

preservar aquelas Ilhas, possuidoras de valiosíssimo e inigualável património natural que foi

criada a primeira reserva natural de Portugal!

A 29 de Outubro de 1971 é reconhecida a importância das Ilhas Selvagens e do seu Património

Natural levando-as à classificação de Reserva Natural Integral. Esta área protegida contempla

toda a parte terrestre assim como a parte marinha envolvente até à batimétrica dos 200m de

profundidade.

Trabalhos de investigação e monitorização

O estudo da flora das Ilhas Selvagens despertou o interesse de botânicos e naturalistas de todo

o Mundo, como foi o caso do capelão e botânico inglês Richard Thomas Lowe que em 1869

publicou a primeira lista sistemática conhecida das plantas das Ilhas Selvagens, que foi

actualizada e publicada, após 55 anos, por Carlos Azevedo de Menezes.

Ao nível da fauna, os trabalhos começaram em 1963 com a nidificação de aves e em 1968, o

notável naturalista Paul Alexander Zino, começou o primeiro trabalho de anilhagem de

Cagarras, que teve continuidade até à presente data.

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Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Na origem da criação desta Reserva esteve a sobrexploração daquela ave que é o seu ex –

libris: a Cagarra.

A caça da Cagarra leva à criação da Reserva Natural

A criação da Reserva Natural das Ilhas Selvagens está intimamente ligada à caça da Cagarra.

Esta foi a atividade mais lucrativa na história destas ilhas e foi a sobrexploração da população

desta ave marinha que originou os primeiros esforços para a criação da referida Reserva. No

fim dos anos 60, Paul Alexander Zino adquiriu os direitos de caça destas ilhas com a intenção

de as proteger. Foi este o primeiro passo que conduziu à criação da Reserva Natural das Ilhas

Selvagens…

Quando começou…

A caça a estas aves remonta muito provavelmente a muito antes de 1841, já que nessa data

Berthelot afirmava ter havido uma caçada anual de 30 mil aves e que era considerada uma

“boa caçada”.

Em 1901, o padre Ernest Shmitz referia que eram caçadas 20 a 22 mil aves por ano mas que o

seu número não diminuía comprovando a elevada densidade da população e, em 1921, já

havia quem afirmasse existir uma população de 60 mil aves!

Expedição e sua preparação…

De Setembro a Outubro de cada ano, ou no fim da época de reprodução, eram organizadas

expedições a estas ilhas com o intuito de capturar o máximo possível de juvenis.

Os preparativos para as expedições eram um processo moroso e longo, em que era necessário

angariar e escolher o pessoal que iria caçar, os mantimentos para uma estadia que demoraria

cerca de um mês e meio a dois meses, barris para guardar as aves, sal para a sua conservação,

cestos, embalagens, etc.

O grupo de pessoas que compunha a expedição era cerca de 15 a 20 homens, que provinham

especialmente da Freguesia de São Gonçalo e Caniço, perto do Funchal.

A viagem até à Selvagem Grande levava cerca de 2 a 4 dias, com a navegação à vela,

dependendo do favorecimento dos ventos e o navio após deixá-los em terra, voltava ao

Funchal.

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A caça

Depois eram organizados em grupos de 8 orientados por um “assistente”. A estratégia

baseava-se em se colocarem em linha e passarem pelos ninhos, onde iam retirando os juvenis

dos ninhos e matando-os.

O aproveitamento…

Os animais depois de mortos eram aproveitados para serem utilizados de várias formas:

consumo humano inclusive os pescoços que eram considerados uma iguaria, a gordura que era

posta ao sol e derretida transformando-se em óleo, fabrico de colchões com as penas que

também eram usadas para confecionarem flores artificiais, e outros fins, tal como o engodo.

A carne da Cagarra era vendida nos concelhos do Funchal, Santa Cruz e Machico e consisti num

importante suplemento no consumo alimentar das populações menos favorecidas.

Duração

A expedição durava cerca de 3 semanas, de manhã à noite, até ao navio voltar e levar de volta

os homens para a Madeira.

No entanto, a população de Cagarras mantinha-se estável pois o número de juvenis que

escapavam era suficiente para repor o equilíbrio na população.

Fim da atividade

Estas atividades foram mantidas de uma forma controlada até se iniciar a utilização de barcos

a motor, altura em que a colónia começou a mostrar fortes indícios de regressão, pois as

Cagarras eram indiscriminadamente caçadas furtivamente à revelia dos proprietários das ilhas,

caçando juvenis e adultos!

A última expedição às Ilhas Selvagens para a matança dos juvenis da Cagarra, partiu do Funchal

a 15 de Setembro de 1967, a bordo do barco “Milano”.

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Reserva Natural das Ilhas Selvagens

No passado explorou-se nestas ilhas tudo o que era possível ser fonte de rendimento, como

foi o caso das plantas naturais!

A exploração de plantas naturais

Logo após a descoberta, os homens tentaram rentabilizar todos os recursos disponíveis nas

Ilhas Selvagens. Como exemplo temos a recolha de plantas naturais para utilização na indústria

da tinturaria e dos curtumes, como sejam a urzela, o pastel e o sumagre.

A Urzela…

As Ilhas Selvagens foram exploradas para a recolha de urzela, um líquen que cresce

espontaneamente nas escarpas.

O seu comércio tornou-se muito próspero no século XVIII e os proprietários das ilhas

celebraram contratos temporários para esse fim. A urzela era muito usada na tinturaria,

imprimindo uma cor púrpura nos tecidos e papel, e era exportada por caravelas para a

Inglaterra e Flandres.

Utilização da Urzela…o seu incremento e declínio…

Segundo o autor das “Ilhas de Zargo”, a aplicação deste líquen à tinturaria fazia-se depois de

«convenientemente preparado com adicionamento de urina para o curtimento, (uma vez)

libertada do amoníaco pela ação da cal, e reduzida a uma pasta de consistência sólida, tendo a

coloração violeta avermelhada».

Continuando o mesmo autor, «tomou tanto incremento o comércio de urzela no arquipélago

madeirense que suscitou uma legislação especial, constituiu monopólio do Estado, foi empresa

de contratadores e traficância de contrabandistas quando, por proteção à urzela de Cabo

Verde, se desacreditou intencionalmente a da Madeira, depois de aceita e preferida em toda a

Europa como a melhor no mercado; e proibiu-se a sua exportação com grande prejuízo dos

Municípios». (…). «Nem a qualidade do produto, nem as providências dos Governadores

resolveram o problema, porque o trabalho dos negros em Cabo Verde e a Descoberta das

anilinas na Europa deram o golpe de morte na urzela da Madeira retirando a importância

comercial da também colhida nas Selvagens».

Page 7: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

O Pastel

Um outro produto natural de igual riqueza comercial na Europa, que valorizou as ilhas

Selvagens a partir do século XV, foi o pastel, planta glauca, de cujas folhas se extraía um líquido

azul empregado na coloração de panos comerciais. Segundo relatos: «Teve o pastel muito

emprego no continente europeu desde João Gonçalves Zarco. Exportava-se, já seco ao sol ou

amassado em bolas depois de sua fermentação».

O Sumagre

O sumagre foi muito explorado nestas ilhas, pois empregava-se esta planta no curtimento de

couros e peles destinados à indústria de calçado, muito usado pelo povo da época. O curtume

era feito com as folhas e casca da referida planta que era muito consumida na Europa.

A Barrilha

Outras plantas eram igualmente exploradas nestas ilhas, mais conhecidas por Barrilha,

colhidas para serem utilizadas no fabrico de sabão. Extraía-se a soda destas plantas, pondo-as

a secar ao sol e queimando-as depois dentro de covas feitas no terreno. Depois de queimados

os corpos que entram na composição da barrilha, ficava pelo arrefecimento uma substancia

dura e alcalina denominada soda bruta, e a que os madeirenses chamavam pedra de barrilha

ou pedra de fazer sabão. A soda bruta era descarbonatada pela cal.

Note-se que existem registos da existência de um forno de soda na Selvagem Grande, tal era a

exploração destas plantas e que todas as atividades referidas constituíam excelentes fontes de

rendimento.

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Reserva Natural das Ilhas Selvagens

As ilhas foram alvo de várias tentativas de colonização mas, devido à inospicidade e,

principalmente, falta de água, nunca passaram disso mesmo: de tentativas!

As tentativas de colonização…

Desde a sua descoberta no século XV, que as Ilhas Selvagens foram várias vezes alvo de

tentativas de colonização mas tal não aconteceu devido à falta de água e por serem um local

inóspito.

Desses períodos, na Selvagem Grande, ficaram alguns vestígios, tais como: muros de pedra

que serviam de suporte à proteção das culturas, construídos pelos colonos originários do

Minho e do Algarve, uma velha cisterna e respetivos canais.

A falta de água…

Já no séc. XVI aparecem registos relativos a uma fonte de água, atualmente designada por

Furna da Água. Esta nascente não é mais do que uma pequena gruta, onde saem do teto

aproximadamente dois pingos de água doce de sete em sete segundos. Segundo Frutuoso

(1968), “…uma fonte, que enche somente, cada dia, três ou quatro jarras de três canadas de

água doce nas botijas, chamadas meias arrobas…”.

Tudo leva a crer que houve tentativas de armazenamento e transporte testemunhado pelos

vários fragmentos de cerâmica que foram encontrados nas proximidades desta fonte.

Os proprietários das ilhas

Desde o século XVI, como território de privados, as Ilhas Selvagens foram mudando de posse

por herança. Ficou na família do banqueiro Luís da Rocha Machado de 1904 até ao início dos

anos 70 e na tentativa de controlar as visitas às ilhas, deu-se o direito de coutada aos seus

proprietários.

Paul Alexander Zino

Este direito de coutada foi vendido a Paul Alexander Zino, em 1967, cuja intenção foi a de pôr

fim ao abate anual de aves. Neste mesmo ano, conseguiu também uma licença para construir

uma casa.

Criação da Reserva

Em 1971, as Ilhas Selvagens ficam sob a administração territorial da Região Autónoma da

Madeira e são classificadas como Reserva. Desta forma as Selvagens passaram a ser uma

Page 9: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva, "essencialmente ornitológica", como uma das mais importantes áreas de nidificação

de aves marinhas de todo o Atlântico Norte.

1976…período “conturbado”

No período de mudança de regime político em Portugal (1974/75), as Selvagens foram

também “alvo desta época revolucionária” da história do País, não sendo imunes aos

"excessos" próprios deste período. Assim, em 1976, populares "conhecedores das ilhas" em

embarcações de pesca desembarcaram na Selvagem Grande e destruíram as casas existentes.

Estes, alegando chavões políticos relacionados com o direito à propriedade, exigiam a

liberdade da apanha das cagarras, não licenciada nem autorizada por força da lei da Reserva

Natural, tendo sido impedidos pela acção de Paul Alexander Zino e dos guardas que este tinha

contratado na altura.

Necessidade de vigilância…os guardas das Ilhas

Consequentemente, desde 1976, a Selvagem Grande tem vigilância permanente, tendo sido

construída uma casa de abrigo para os guardas da Ilha na altura.

Nestes homens, destaca-se um, Fernando Almada, pela forma contínua que efetivou constante

vigilância nas Ilhas. Vários foram os seus parceiros, mas estes acabariam sempre por desistir,

pois não estava só em causa o isolamento mas as condições de estada que eram parcas ou

mesmo inexistentes.

Depois de várias tentativas para arranjar um companheiro para formar equipa com Almada,

surge então Jacques da Mata e o próprio filho de Almada, Filipe Almada (hoje, ambos

Vigilantes da Natureza!) que dariam seguimento ao projeto de proteção e a ligação com os

futuros Vigilantes da Natureza.

Corpo de Vigilantes da Natureza

Posteriormente, em 1982, o Parque Natural da Madeira foi criado, dando início à gestão da

Reserva Natural das Ilhas Selvagens apenas em 1991. Desde então, os guardas das ilhas

passam a incorporar o Corpo de Vigilantes da Natureza, os quais hoje em dia continuam a

desempenhar um papel fundamental nas demais ações de conservação como sejam, a

fiscalização e vigilância da Reserva, a manutenção do estado de conservação da

biodiversidade, a divulgação dos programas de investigação desenvolvidos nesta área

protegida bem como a receção, explicação e transmissão de valores aos visitantes.

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Reserva Natural das Ilhas Selvagens

A construção do farol e a presença dos faroleiros constitui uma etapa importante na história

desta Reserva!

Quando surgiu a ideia…

Segundo reza a história, foi em 1881 que surgiu a ideia da construção de um farol nas

Selvagens. É relatado que a iniciativa de construção de um farol nas ilhas Selvagens partiu de

Espanha, propondo que Portugal repartisse as despesas, numa altura em que já discutiam se a

soberania das ilhas pertenciam a Espanha ou Portugal. Devido à falta de entendimento, a

construção do Farol ficou suspensa.

Soberania das ilhas….

Posteriormente, em 1938, a Comissão Permanente de Direito Marítimo Internacional

certificou a soberania das ilhas para Portugal e foi colocado no planalto da Selvagem Grande,

um marco Astronómico pela Missão Hidrográfica das Ilhas Adjacentes, neste mesmo ano.

Necessidade de um farol

As ilhas Selvagens foram testemunhas de vários naufrágios ao longo dos tempos, pois a

existência de baixios e a falta de um farol, em nada ajudaram os navios que ali passavam. Nos

anos 70, o petroleiro Cerno, de bandeira norueguesa, ao desviar-se para ilegalmente lavar os

seus tanques, encalhou na Selvagem Pequena e passados três meses, outro petroleiro,

Morning Breeze, afunda-se próximo da Selvagem Grande. A responsabilidade de Portugal pela

segurança marítima nas Ilhas Selvagens foi posta em causa, dado que estes naufrágios

aconteceram por falta de farolagem nestas ilhas.

Primeiro farol

A 6 de Junho de 1977 foi instalado um farol na Selvagem Grande - no Pico da Atalaia, e a 17 do

mesmo mês, um farol na Selvagem Pequena - no Pico do Veado. A instalação foi efetuada pela

Direção de Faróis da Marinha, que presentemente é um organismo da Direcção-Geral da

Autoridade Marítima, integrado no Ministério da Defesa Nacional.

Modernização do farol…

Em Portugal, as Ilhas Selvagens foram as primeiras a utilizarem células fotovoltaicas nos seus

faróis, recorrendo desta forma a energias limpas. Isto aconteceu em 1981!

Page 11: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Curiosidade…

Integrado na equipa de montagem do Farol foi Jaques da Mata. Na altura gostou tanto da

Selvagem Grande que informou o Sr. Fernando Almada, o primeiro Guarda da Ilha, designação

dada na altura, que se por acaso algum dia precisassem de alguém para vir trabalhar para a

Selvagem Grande, o contactassem. No ano seguinte, Jaques é contactado e desde então que

contribui para a preservação do importante património natural existente nas Ilhas Selvagens,

sendo já uma figura emblemática destas Ilhas, pois é Vigilante da Natureza ao serviço do

Parque Natural da Madeira.

Page 12: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

A história de Jaques, um homem que há mais de 30 anos trabalha naquelas ilhas não deve

passar despercebida…

Como começou…

No fim dos anos 70, Jaques trabalhava no Porto Novo, nas bananeiras, mas tinha um amigo

faroleiro, de nome Eduardo que o convidou a ir até ao Ilhéu Chão, uma das Ilhas Desertas, para

transportar oxigénio para o farol que lá existe. Era uma manutenção que exigia carregar

garrafas de oxigénio de 100 e 120 kg, às costas…

Certo dia, o referido amigo convidou Jaques para ajudá-lo no farol da Selvagem Grande, isto

em 1981. E lá foi Jaques, todo entusiasmado, para estas ilhas distantes…e foi assim, a primeira

de muitas viagens, mal sabia ele, que fez até ao extremo Sul de Portugal.

Viagem à Selvagem Grande…

Partiu no Schultz Xavier com 2 companheiros, João Quintal e o Freitas, e permaneceram 20

dias na Selvagem Grande. Na altura, o dinheiro que o Sr. Jasmins pagava por este trabalho era

bastante aliciante para Jaques…

Foi na Selvagem Grande que encontrou o Sr. Fernando Almada com o seu genro. Foi a

Fernando Almada que manifestou o desejo de voltar e trabalhar naquela ilha, e pouco tempo

depois, foi contactado por este, já na Madeira, para a possibilidade de lá ir trabalhar.

Jaques nem hesitou…agarrou logo a oportunidade e lá partiu para as Selvagens, começando

uma nova atividade: ser Vigia das Ilhas!

Trabalho de Vigia das ilhas

Passados 15 dias, entra Filipe Almada, filho de Fernando Almada que apesar de na altura ter 17

anos, já muitas vezes tinha ido aquelas ilhas a bordo de atuneiros. Jaques lembra que até foi

necessário o pai Almada assinar um documento para que o filho pudesse também participar e

ser Vigia. Ambos integraram então, a equipa de Vigias que na altura era constituída por 3

pessoas, e realizavam estadias de 40 dias cada um, ficando sempre 2 Vigias nas Selvagens!

Tempos difíceis…Aventuras…

Os tempos eram difíceis, pois, as estadias eram longas e não tinham muitas comodidades! O

frigorífico era pequeno e funcionava a petróleo e por isso recorriam ao que a natureza lhes

dava, peixe e coelho, mas Jaques lembra que chegou a ficar 76 dias na Selvagem Grande…

Quando o tempo não permitia, ou havia avarias nos navios, a rendição prolongava-se. Não viu

Page 13: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

o nascimento do filho! Quando chegou à Madeira, o primogénito já ia a caminho dos 2 meses

de idade…

Lembra que por 3 ou 4 vezes, o aviocar largou comida no topo da Selvagem Grande, pois

devido ao mau tempo, as rendições foram adiadas! Para tal, marcavam com um lençol branco,

no topo da ilha, a zona onde poderiam atirar os mantimentos do avião, que correspondia à

área onde não nidificavam os Calcamares….

Conta que quando o mar estava mau para o desembarque faziam-no na Baía das Pardelas, o

que implicava carregar os mantimentos todos às costas, encosta acima, atravessar o planalto

da ilha e descer do outro lado, até às instalações…

A rir, relata que quase faltou ao casamento! Quando foi para as Selvagens tinha 26 anos e aos

28 iria casar…Mas, a data da rendição foi alterada e Jaques avisou a noiva, via rádio, que corria

o risco de não chegar a tempo ao casamento! Sorte foi que pediu boleia a uma embarcação de

pesca, “Baía de Machico”, e chegou 2 dias antes do casamento!

Também conta que num almoço de Natal, Fernando Almada cozeu milho e como não tinha

couve, picou salsa…e lá comeram, mas com muita saudade e tristeza no coração…

Outro momento complicado foi quando não choveu durante 1 ano e tiveram que recorrer à

Furna da água (cai uma pinga de água de 6 em 6 segundos) para terem água para beber e

cozinhar.

Tempos bons…e a vontade de sempre voltar

Mas as condições melhoraram muito! Jaques relembra que desde que entrou no Serviço do

Parque Natural da Madeira, tal como Filipe, ambos atuais Vigilantes da Natureza, as condições

da casa foram melhoradas! Afirma que com a erradicação dos murganhos, que eram na ordem

dos milhares, através do projeto de recuperação dos habitats terrestres da Selvagem Grande

em 2000, é um privilégio ir e trabalhar naquelas ilhas. É uma alegria ver o coberto vegetal

recuperar, a natureza a repor o seu equilíbrio….

Para este homem, que não enjoa no mar, e faz viagens de 12 horas ou mais, a sensação de

estar numas ilhas cheias de vida, afastadas e isoladas de tudo, é razão de viver!

Afirma ainda que se lhe tirassem as Selvagens ficaria doente…

E aqui fica um curto apontamento, uma breve entrevista, a um homem humilde e simpático,

de grande coração, cheio de satisfação e orgulho naquilo que faz e que abraça todos os dias,

com a mesma intensidade de há 30 anos atrás…

Page 14: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Estas ilhas sempre foram um marco importante na soberania portuguesa!

As Selvagens e a ZEE…

As Ilhas Selvagens, pela sua localização, assumem particular importância no contexto político

português, tendo já sido visitada por anteriores presidentes da República.

Este conjunto de ilhas tem um valor indiscutível relativamente à ZEE portuguesa. A ZEE é uma

faixa que se inicia a partir da linha base de costa com 370400 km (200 milhas marítimas). Em

termos práticos, nesta faixa é permitido prospetar, explorar, conservar e gerir todos os

recursos naturais vivos e não vivos, do fundo do mar, do seu subsolo, e das águas

sobrejacentes. São ainda permitidas todas as outras atividades que tenham por fim o estudo e

a exploração económica da zona, tais como a produção de energia a partir da água das

correntes e do vento, tanto na plataforma continental como na ZEE.

Portugal e a ZEE…

Desta forma, Portugal (com todos os seus arquipélagos) fica num lugar de destaque e de

responsabilidade no “domínio” do Atlântico Nordeste. Portugal detém a mais extensa ZEE da

União Europeia, ou seja, cerca de 1,6 milhões de km2

, qualquer coisa como 18 vezes a área

continental.

Soberania portuguesa…

Assinalar a soberania portuguesa nas Ilhas Selvagens é garantir a tutela sobre esta ZEE e pelas

respetivas águas territoriais. O arquipélago é pequeno, mas permite um aumento significativo

da ZEE portuguesa e, assim, acréscimo das possibilidades de exploração de recursos.

A soberania sobre as Ilhas Selvagens é uma também uma forma de salvaguardar os interesses

de Portugal. A questão deste grupo insular e da sua soberania ganham destaque quando são

conhecidas as pretensões espanholas e todo o tipo de estratagemas para reverter uma parte

substancial da ZEE portuguesa para parte espanhola.

Espanha…

Dado que não é já possível reclamar soberania espanhola, a Espanha procurou alterar o

estatuto das Selvagens para rochedos, em vez de ilhas. Os rochedos não têm ZEE pelo que a

mediana da ZEE passaria a ser traçada entre as Canárias e a Madeira, ficando as Selvagens

Page 15: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

completamente dentro da ZEE espanhola (apenas as águas territoriais em torno de cada

rochedo seriam portuguesas).

A afirmação portuguesa…

Em 1996, foi feita uma declaração em que se aludiu às ilhas Selvagens como rochedos, devido

a uma forte pressão espanhola mas o Ministério da Defesa logo inverteu esta situação e evitou

que a ratificação da Convenção sobre os direitos do mar mergulhasse as ilhas na posse

espanhola.

Neste aspeto, a constituição portuguesa e o estatuto político-administrativo da região

Autónoma da Madeira, são bastante conclusivos.

A verdade é que as ilhas Selvagens são um importante, e raro local de riqueza biológica, tal

como um ponto estratégico de enorme valor!

Page 16: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Por possuírem um fantástico património biológico já foram consagradas com diversos

galardões!

A riqueza destas ilhas….

A ostentação da diversidade biológica torna as Ilhas Selvagens um local genuíno, que “exige”

ser protegida.

A singularidade de algumas espécies, tem suscitado a atenção de biólogos e ornitólogos

nacionais e estrangeiros que, desde há algumas décadas, têm vindo a realizar estudos sobre a

biologia de algumas espécies, sustentando um rigoroso esquema de monitorização das

diversas populações.

Reserva…

Todos estes fatores suportaram a criação de uma Reserva, constituindo uma das mais

importantes áreas de nidificação de aves marinhas de todo o Atlântico Norte. Foi a primeira

Reserva de Portugal!

Diploma Europeu do Conselho da Europa…

A Reserva Natural das Ilhas Selvagens foi criada em 1971, e atualmente é a única galardoada

com o Diploma Europeu para Áreas Protegidas do Conselho da Europa, como reconhecimento

do grande interesse do seu Património Natural, bem como do trabalho desenvolvido em prol

da Conservação.

Rede Natura 2000…ZPE…ZEC…

Integram a Rede Natura 2000, como Zona de Proteção Especial (ZPE) e Zona Especial de

Conservação (ZEC).

Esta rede considera um compromisso europeu em que cada país (ou região) identifica os Sítios

de Importância Comunitária, numa ótica de conservação da Natureza, protegendo os

ecossistemas, os habitats e as espécies selvagens que estão ameaçados ou que são

característicos de determinadas regiões.

As Ilhas Selvagens contêm ecossistemas representativos e importantes para a conservação in

situ da biodiversidade, em particular de espécies mundialmente vulneráveis. Compreendem

vários tipos de habitats, alguns dos quais estão classificados em cinco categorias de habitats

contempladas na Rede Natura 2000, de acordo com a Diretiva Habitats: bancos de areia

permanentemente cobertos por água do mar pouco profunda; lodaçais e areais a descoberto

Page 17: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

na maré baixa; enseadas e baías pouco profundas; falésias com flora endémica das costas

macaronésias e formações baixas de euforbiáceas junto a falésias.

IBA…

As Ilhas Selvagens estão ainda classificadas como Zona Importante para as Aves (IBA –

Importante Bird Area), ou seja, constituem um sítio com significado internacional para a

conservação das aves à escala global.

Todo este reconhecimento deve-se ao facto das Ilhas Selvagens combinarem uma variedade

de fatores, nomeadamente: localização geográfica, isolamento e condições de colonização

muito difíceis. Assim sendo, estas Ilhas apresentam habitats e espécies que são

representativos e importantes para a conservação in situ da biodiversidade, particularmente

dos que são vulneráveis, a nível Mundial.

Page 18: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Os aspetos geológicos destas ilhas são de grande valor e, provavelmente, foram as primeiras

ilhas do arquipélago a se formar!

Origem….

As Ilhas Selvagens são um grupo de ilhas oceânicas de origem vulcânica. A sua história

geológica está relacionada com a abertura e expansão do Oceano Atlântico, processo que teve

início há cerca de 200 milhões de anos e que continua nos nossos dias.

Instaladas na rampa continental africana, sem nunca terem estado em contacto com o

Continente Africano, estas ilhas não são mais que afloramentos rochosos que constituem a

parte imergida de um único edifício vulcânico que nasceu há cerca de 27 milhões de anos das

profundezas do Oceano Atlântico. Por assim ser, compreendem um património geológico de

grande valor e tudo indica que estas detêm o título de primeiras ilhas da Região Autónoma da

Madeira a se formarem.

Selvagem Grande….

A ilha maior, Selvagem Grande, é caracterizada pelo relevo bastante acentuado e por uma

extensa zona de planalto que cai abruptamente sobre o mar em agrestes falésias vulcânicas

resultantes da erosão e eleva-se a cerca de 100 metros acima do nível do mar. É constituída

por escórias vulcânicas porosas que dão origem a um solo de superfície vitrificada e estrutura

nicrolítica.

Na base visível da Selvagem Grande observam-se estratos fenoliticos e nefeneliticos no topo

dos quais se depositou uma espessa camada de areia calcária amarela durante o Mioceno,

período em que a ilha esteve submersa. Esta areia infiltrou-se nas fraturas causadas pelas

explosões vulcânicas dando origem a diques calcários. Mais tarde formaram-se depósitos de

cinzas, areias vulcânicas e lapilli sob imersão. Finalmente as últimas erupções cobriram a maior

parte da ilha com uma camada de lava basáltica.

Nesta ilha existe uma extensa galeria subterrânea, que terá provavelmente resultado de um

canal de lava vulcânico, onde se podem encontrar depósitos de sulfato de cal de cristalização

sacaróide. Há também outros depósitos conquilíferos de diferentes eras geológicas, desde o

Mioceno até tempos mais recentes.

Page 19: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Selvagem Pequena e Ilhéu de Fora…

A Selvagem Pequena apresenta forma muito irregular, perfil baixo e achatado, sendo quase

totalmente coberta por areias calcárias, onde existem deposições de areias marinhas

formando baías originadas por erosão. É circundada por numerosos recifes que tornam o

desembarque difícil. Nas marés baixas existem baixios planos extensos que ficam emersos

duplicando a superfície da Ilha. O Ilhéu de Fora é ainda mais baixo e também coberto por areia

calcária.

Particularidade…Chão dos Caramujos

A Selvagem Grande, a Selvagem Pequena e o Ilhéu de Fora representam o que resta de picos

vulcânicos submarinos.

Estas ilhas estão sujeitas a um clima do tipo subtropical marítimo. Tal como a Madeira, as Ilhas

Selvagens estão sob a influência dos ventos dominantes que sopram de Nordeste, os ventos

alísios, carregados de humidade, mas as baixas altitudes não favorecem a condensação e

consequente precipitação, que é muito inferior à verificada na Ilha da Madeira. No entanto, no

passado, estas Ilhas deverão ter tido um grau de humidade mais elevado do que o atual. Isto

justificaria a presença de elevado número de conchas sub-fósseis de caracóis terrestres

existentes no planalto da Selvagem Grande, mais propriamente no Chão dos Caramujos.

Para além da paisagem e todo o património natural, estas ilhas encerram um património

geológico muito rico e de elevado interesse. É mais uma razão para tentar conhecer melhor

esta Reserva que celebra 40 anos!

Page 20: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

O símbolo desta Reserva é a cagarra, ave marinha que ocorre em grande número e que

motivou a criação desta área protegida.

Avifauna…

A fauna vertebrada das Ilhas Selvagens é caracterizada pelo largo domínio das aves marinhas

nidificantes e pela ausência de mamíferos nativos.

Estas ilhas são um santuário de nidificação de aves marinhas, possuindo condições singulares e

únicas em todo o Mundo. Da avifauna nidificante conhecem-se nove espécies, entre as quais: a

cagarra, o calcamar, a alma negra, o roque de castro e o pintainho.

A cagarra…

A cagarra nidifica em pequenas ilhas, ilhéus e falésias costeiras. O ninho pode ser construído

em cavidades existentes nas rochas e por baixo de grandes pedras. Nas Ilhas Selvagens, pela

inexistência de perturbação e de predadores, a cagarra nidifica no solo entre a vegetação

rasteira, pelo que qualquer visitante, principalmente na altura de Verão, se apercebe durante

a visita guiada da expressão que esta espécie tem na biodiversidade das Selvagens, tanto pela

observação de vários ninhos como pelo som que estas aves emitem. Ou não existisse ali a

maior colónia mundial desta ave!

O regresso ao ninho…

Nestas ilhas, as aves regressam aos ninhos sempre ao fim da tarde… É um espetáculo único ver

tamanho número de cagarras, em pleno dia… uma vez que os casais que ali nidificam são cerca

de 30000 casais!

Não há mais sítio nenhum no mundo que as cagarras venham a terra durante o dia.

Trabalho de monitorização…

Como têm uma taxa de sobrevivência elevada, a maior parte das aves já foi anilhada. Há aves

cuja idade é superior a 30 anos.

Descobriu-se, através de recetores GPS nas costas das cagarras, que estas aves das Ilhas

Selvagens vão alimentar-se muito longe durante a nidificação. A maior parte vai à costa de

Marrocos, a 400 quilómetros.

No Inverno, as cagarras das Ilhas Selvagens vão até ao largo de África do Sul, mas podem ir até

Moçambique e Madagáscar. Algumas, porém, ficam no Atlântico Noroeste, entre os Açores e

os EUA. Além do Atlântico Noroeste, dirigem-se ao meio do Atlântico Sul e às correntes de

Page 21: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Agulhas, de Benguela, do Brasil e das Canárias. Há registo de um dos juvenis ter explorado

todas estas áreas em 2 anos, pelo que voou mais de 30 mil quilómetros por ano.

Sabia que…

... todos os anos as cagarras regressam à mesma ilha e ao mesmo ninho onde se

reproduziram pela primeira vez e o seu parceiro é quase sempre o mesmo? As crias nascem

em Julho e a partir de Outubro/Novembro abandonam os ninhos rumo ao mar. Os adultos

regressam no ano seguinte, mas os juvenis ficam no mar alto e só regressam a terra ao fim

de 3 ou 4 anos. Só nidificam em média aos 9 anos.

Um dado curioso é que os cantos das fêmeas são mais graves do que o dos machos!

Page 22: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Dando continuidade ao último artigo publicado, e dado as Selvagens serem um paraíso para as

aves marinhas, abordaremos novamente o referido grupo.

As aves marinhas…

No artigo anterior foi destacada a ave marinha mais emblemática desta Reserva, a cagarra,

que esteve na origem da criação deste espaço protegido. Ao longo deste artigo serão referidas

outras aves, igualmente importantes, que nidificam nestas ilhas.

O calcamar…

Se observarem uma ave marinha a sobrevoar rente à água ou a andar aos saltos estarão

provavelmente na presença de um calcamar!

Esta ave migratória impulsiona as longas patas na superfície para ganhar altitude, e por ter

patas grandes, praticamente não consegue andar nas colónias, andando por isso aos saltinhos.

O calcamar forma a colónia mais numerosa das Ilhas Selvagens, com cerca de 40 mil casais

reprodutores, sendo que, é na Selvagem Pequena que existe o maior número de ninhos. As

ilhas Selvagens albergam a quase totalidade da população mundial da subespécie de calcamar.

Estas aves só emitem vocalizações dentro dos ninhos!

Alma-negra

Esta ave não emite vocalizações durante a aproximação às colónias, nem durante o tempo que

passa a alimentar-se no mar, só se ouvindo os seus tons graves, vindos dos ninhos e que em

muito se parecem com o ladrar de um cão.

Estas aves são todas escuras, daí o seu nome, com asas longas e estreitas e têm uma cauda

comprida.

Nas ilhas Selvagens, entre Abril e Setembro, nidificam mais de 4 mil casais, que só regressam

aos ninhos depois de anoitecer.

Roque-de-castro

Outra ave que se ouve aos milhares é o roque-de-castro. É necessário ter atenção para o

sentido da audição porque dificilmente se consegue seguir o voo desta ave… A maior parte das

vezes faz voltas muito apertadas, algumas quase de noventa graus, e voa sempre em

ziguezagues.

A colónia nas Selvagens ultrapassa os 4 mil casais mas existe uma particularidade: ocorrem

duas populações de roque-de-castro nestas ilhas, os que nidificam de Inverno e os que

Page 23: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

nidificam de Verão! É possível que as duas populações sejam espécies distintas mas até agora

não existem estudos conclusivos, pelo que se assume as duas populações como sendo da

mesma espécie. As de Inverno chegam em Agosto e ficam até finais de Março do ano seguinte.

As de Verão têm o seu período nupcial entre os meses de Abril a Outubro. Ou seja, nas Ilhas

Selvagens encontram-se roques-de-castro durante todo o ano.

Sabia que…

- o Corre-caminhos é uma ave residente que pode ser encontrada durante todo o ano nas Ilhas

Selvagens, sendo um passariforme cuja subespécie é a mesma que se encontra nas Ilhas

Canárias mas diferente da subespécie que ocorre nas restantes ilhas do Arquipélago da

Madeira?

- Por vezes são observadas outras aves que, ocasionalmente ou acidentalmente visitam as

Ilhas Selvagens, sobretudo no Outono e na Primavera. São aves que se perdem das rotas

migratórias e que encontram aqui, no meio do Atlântico, o sítio ideal para descansar e

recuperar forças, para o prosseguir da viagem.

Page 24: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Na riquíssima biodiversidade, uma das espécies de fauna que se destaca pela sua beleza e

singularidade é a endémica Osga das selvagens.

Répteis da Reserva…

Qualquer visitante, por pouco tempo que se encontre nas Ilhas Selvagens, logo se depara com

um dos répteis terrestres que habitam nestas ilhas e que por aqui se passeia em

abundância…trata-se de uma subespécie endémica… a Lagartixa.

Mas não é o único! A Osga das Selvagens também ocorre exclusivamente nas Ilhas Selvagens.

A Osga das Selvagens…

A Osga das Selvagens ocorre em três subpopulações isoladas, as quais correspondem às três

ilhas que constituem o arquipélago das Selvagens: Selvagem Grande, Selvagem Pequena e

Ilhéu de Fora. Esta osga faz parte de um grupo de espécies, presente não só no arquipélago

das Selvagens como também em duas ilhas do arquipélago das Canárias – Gran Canaria e El

Hierro - o qual se situa a sul das Selvagens, na continuação das correntes marítimas principais.

Ancestrais…

Este grupo é aparentado com um grupo de espécies próximas da osga-comum, provenientes

do Norte de África, do qual se terá separado há cerca de 17,5 milhões de anos, como resultado

de uma invasão antiga da Macaronésia. A estimativa de tempo de colonização é mais antiga

para as ilhas Selvagens do que para qualquer uma das ilhas Canárias, sugerindo as Ilhas

Selvagens como o local de ocorrência das primeiras formas desta osga.

Descrição…

A Osga das Selvagens, tal como as outras espécies deste género, é crepuscular e noturna. Na

Selvagem Grande encontra-se desde o nível do mar e ao longo das escarpas, onde é pouco

abundante, até ao planalto central, onde atinge as maiores abundâncias. É frequente em zonas

onde ocorre a planta Barrilha e alimenta-se de insetos. A sua época de reprodução ocorre na

Primavera, entre Abril e Julho, podendo por vezes encontrar-se ainda algumas fêmeas grávidas

em Agosto.

Estatuto de conservação…

A Osga das Selvagens está atualmente classificada como Vulnerável no Livro Vermelho dos

Vertebrados de Portugal devido a possuir uma distribuição muito restrita e a estar

Page 25: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

concentrada em apenas três populações, duas delas em ilhas muito baixas, vulneráveis à

subida do nível do mar (Selvagem Pequena e Ilhéu de Fora). Apesar desta vulnerabilidade, toda

a área de distribuição da espécie está incluída numa Reserva Natural onde o acesso é

condicionado.

Efetivo populacional…

Na Selvagem Grande, alguns autores apontam ainda para uma população com um efectivo

populacional de cerca de 10.000 indivíduos, ocupando esta espécie, com densidades distintas,

cerca de 70% da área desta ilha. Após a total erradicação do coelho e do murganho, a

população de osgas da Selvagem Grande tem evidenciado uma tendência populacional

crescente a partir dos cerca de 10.000 indivíduos previamente estimados. Este aumento

populacional poderá estar então relacionado com uma combinação da redução da pressão

predatória dos murganhos sobre os recém-eclodidos e juvenis e/ou com o aumento da

disponibilidade de insetos.

Page 26: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Em 2000, teve início o Projeto de Recuperação dos Habitats Terrestres da Selvagem Grande.

Anos passados, verifica-se que o projeto foi um sucesso, com resultados visíveis aos olhos de

quem visita aquela ilha…

Problema da introdução de espécies…

A introdução de animais e plantas em ecossistemas insulares oceânicos é um dos grandes

problemas de conservação dos nossos dias. Este panorama começou a desenhar-se quando o

Homem passou a ter capacidade para “continentalizar” estas pequenas porções de terra,

isoladas desde o dia em que surgiram.

Nas Selvagens…

Tal como aconteceu um pouco por todo o Mundo, em tempos históricos a Selvagem Grande

foi alvo da introdução de pelo menos quatro espécies que se revelaram lesivas para o

equilíbrio dos seus habitats; estamos a falar de três vertebrados: a cabra, o coelho e o

murganho e de uma planta, a tabaqueira.

Se a introdução dos murganhos acontece normalmente de forma involuntária, o mesmo não

se passa relativamente às outras espécies, sendo sobejamente sabido que os navegadores

faziam-se tradicionalmente acompanhar pelos seus animais domésticos, os quais iam soltando

à medida que novas terras eram encontradas.

Este procedimento não só garantia a existência de alimentos num eventual regresso a estas

paragens, como também servia para testar a sua prestabilidade para uma eventual posterior

colonização.

O problema surge porque as espécies oriundas de outras áreas apresentam uma

extraordinária capacidade de competir com as indígenas, algumas vezes levando-as à extinção,

mas sempre alterando a dinâmica dos ecossistemas insulares.

Projeto de Recuperação dos Habitats Terrestres da Selvagem Grande

Em 2000, e por se verificar que a degradação existente na Selvagem Grande apresentava ainda

um carácter de reversibilidade, foi iniciado o projeto de Recuperação dos habitats terrestres

da Selvagem Grande. O objetivo desta iniciativa passou pela criação das condições que

permitissem a recuperação das espécies nativas e endémicas e respetivos habitats através da

erradicação e controlo dos animais e plantas introduzidos.

Page 27: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Espécies alvo

Se o trabalho relativamente ao coelho e à tabaqueira era difícil, a erradicação do murganho

apresentou-se como um desafio adicional, por tratar-se de uma ação pioneira em ilhas com

esta dimensão e características. Com os murganhos, histórias de sucesso só haviam sido

conseguidas em pequenas porções de terra insulares no Pacífico; no Atlântico nunca tinha sido

sequer tentada.

Em traços gerais, as razões para estas dificuldades prenderam-se com a pesada logística,

humana e material, que obrigatoriamente estas ações envolveram, a qual, no caso das

Selvagens era amplamente potenciada pela distância e inospitalidade destas ilhas.

Espécies não alvo

Um projeto desta natureza só tinha viabilidade se no processo não fossem afetadas

irremediavelmente espécies indígenas ou endémicas. Sendo assim, os trabalhos só avançaram

quando existiram garantias absolutas que a sobrevivência das populações de aves marinhas,

de corre-caminhos e de osgas, estava assegurada.

Monitorização

Todo este esforço tem sido acompanhado ao longo dos anos, por um sólido programa de

monitorização, que permite um acompanhamento dos processos regenerativos que os

ecossistemas já apresentam. De uma forma geral, e passado pouco tempo sobre a eliminação

dos herbívoros e da tabaqueira, a Selvagem Grande já era uma ilha mais rica e diversa, onde se

verificou a explosão de endemismos macaronésicos como a Lobularia canariensis. O aumento

da população de corre-caminhos é outro indicador dos impactos positivos que se verificaram.

Estes pequenos passeriformes, por nidificarem junto ao solo, eram alvo da pressão de

predação imposta pelos murganhos, e da perturbação provocada pelo grande número de

coelhos que aqui existiam.

Em suma foram criadas as condições para que os habitats da Selvagem Grande evoluam em

direção a uma situação de equilíbrio, tal como se encontra a Selvagem Pequena e Ilhéu de

Fora, que nunca foram alvo de introduções.

Consideração final

É importante reforçar o facto de que a erradicação dos murganhos põe-nos perante um caso

pioneiro e único no panorama mundial, e que com certeza será mais uma afirmação da

qualidade do trabalho desenvolvido na Região em prol da biodiversidade mundial

Page 28: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Estas ilhas estão envoltas em lendas e mistérios…de onde se destaca a famosa lenda do

temível Capitão Kidd!

Segundo uma velha lenda, na Selvagem Grande existe um tesouro escondido ...

Diz-se, que no séc. XVIII, o capitão Kidd, comandante de um navio pirata assaltou um galeão

que transportava ouro, jóias e outras riquezas, tesouro resultante de um saque efetuado à

catedral de Lima, Perú. O navio pirata naufragou perto das Selvagens depois de esconder

numa ilha desabitada “às vistas de Tenerife” o tesouro. Esta informação revelada por um

sobrevivente da tragédia foi passada através dos séculos, motivando a curiosidade e cobiça de

muitos.

Expedições ao tesouro…

Ao longo do tempo, várias expedições foram feitas, como é o caso de uns ingleses que

estiveram à procura durante 4 anos, em meados do Séc.XIX. Percorreram toda a ilha,

escavaram a terra, levantaram rochas, exploraram grutas mas o tesouro não apareceu.

Gastaram uma soma considerável de dinheiro e dado o fracasso do trabalho, dedicaram-se a

cultivar umas plantas – barrilhas.

No entanto, apesar de o tempo ir passando houve sempre pessoas interessadas na descoberta

do tesouro. No início dos anos 20, o explorador irlandês Sir. Ernest Shackletor afirmava ter

encontrado certos documentos que faziam referência ao local onde estava escondido o

tesouro. Chegou a um acordo com o proprietário da ilha, mas quando regressava de uma

expedição ao Polo Sul, morreu durante a viagem (1922) e nunca mais se soube nada sobre

esses documentos.

A Gruta do Capitão Kidd…

A última expedição à procura deste lendário tesouro foi nos anos 40, mas em Canárias e na

Madeira, sempre existiram pessoas convencidas da veracidade desta história, até aos dias de

hoje. A ilha foi revolvida de lés a lés, em particular uma gruta conhecida por “Gruta do Capitão

Kidd” ou “Furna do Tesouro”. A gruta abre-se numa enseada batida pelas vagas, a Enseada das

Pardelas, escondida pelas rochas e, no seu interior, chegou a ser cavado um largo e profundo

fosso, até ao nível do mar. No teto da gruta as lanternas descobrem um brilho estranho: são

cristais de sulfato de cálcio.

Page 29: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Referência em Ilhas de Zargo…

O pirata Kidd, conhecido como o Temerário, é referido na obra Ilhas de Zargo. Relata o

naufrágio do navio e a passagem da informação secreta entre várias personagens: “O único

sobrevivente expirou nas Canárias, revelando à hora da morte, a um marinheiro inglês, o

segredo de que fora testemunha e também agente. O inglês, como bom patriota, não se

conteve, ao regressar a Londres, de comunicar o facto ao Departamento da Marinha. Desde

então sucederam-se as pesquisas nas Selvagens que foram cavadas e revolvidas pelos

Morgados, seus primitivos donos, e por inúmeros argonautas e aventureiros”

A título de curiosidade refere as várias tentativas que diversas expedições realizaram com o

intuito de encontrar o tão afamado tesouro: “A. Mellersh, comandante da corveta inglesa

“Rattler”, por exemplo, esteve quatro vezes nas Selvagens, nos anos de 1848 a 1851, à procura

do velo de ouro tão cobiçado, em cuja empresa gastou umas 3.000 libras esterlinas. O próprio

Almirantado inglês participou nesta tentativa, mandando a corveta “Myrmidow” fornecer água

aos exploradores. O insucesso levou Mellersh a escrever ao cônsul britânico no Funchal, a 22

de Novembro de 1851, que ‘têm sido feitas escavações em ambas as Ilhas, e acho poucas

probabilidades de encontrar o tesouro, não obstante crer bem que ele esteja aqui enterrado.”

O tesouro das Selvagens…

Até ao dia de hoje, o tesouro da capitão Kidd nunca foi encontrado mas…

Provavelmente o verdadeiro “tesouro” que o Homem encontrara nestas ilhas fora

outro…prendia-se mais com os verdadeiros valores naturais da área…

Page 30: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Reserva Natural das Ilhas Selvagens

Na Selvagem Grande, os visitantes poderão adquirir alguma informação e material divulgativo

no Centro de receção.

Os visitantes…

As Ilhas Selvagens são visitadas ao longo de todo o ano por centenas de pessoas que

ali se deslocam através de embarcações privadas, marítimo-turísticas e, pontualmente,

pequenos cruzeiros de turismo. Muitas destas embarcações estão a realizar viagens de longo

curso, entre o continente europeu e americano pelo que aproveitam para conhecer esta

Reserva, visita esta muitas vezes recomendada por outros velejadores.

Dado a investigação ser um instrumento fundamental à Conservação da Natureza,

muitos também são os investigadores que por lá passam, neste caso com o apoio do SPNM e

da Marinha Portuguesa, quando em missão de rendição das equipas de vigilantes de natureza

que estão nesta Reserva em exercício de funções.

A visita…

As visitas necessitam de autorização do SPNM e consistem, na sua maioria, no

desembarque na Selvagem Grande, seguido de um percurso interpretativo. Contudo, a

procura destas Ilhas para a atividade de observação de aves tem sido cada vez mais frequente.

O Centro de Receção…

No Centro de Receção, os visitantes podem adquirir material divulgativo alusivo à

Reserva, assim como enviar um postal, levando assim uma recordação do lugar e

simultaneamente estão a contribuir para as inúmeras ações de conservação da Natureza

desenvolvidas nesta área protegida. Existe um marco de correio na Selvagem Grande, o posto

de correio mais a Sul de Portugal!

Para descansar, existe uma área de lazer com mesas de apoio e uma baía linda para

nadar.

Conhecer para preservar…

Continuamos a acreditar que dar a conhecer o património natural da Região e das

ações de conservação desenvolvidas, constitui um aspeto determinante para que sejam

tomadas medidas adequadas, com vista à salvaguarda do meio ambiente e à melhoria da

qualidade de vida da população. Uma das ferramentas que está ao dispor de quem tem por

missão fazer a gestão de áreas protegidas, são as ações de sensibilização ambiental,

Page 31: Reserva Natural das Ilhas Selvagens

permitindo desta forma aproximar cada vez mais as reservas das populações. A abertura

destes espaços conduz a um melhor e mais atrativo usufruto dos mesmos pela população,

tendo como retorno uma maior valorização e maior empenho na sua preservação.

A realidade é que a atividade de ecoturismo está em ascensão, sendo as áreas

protegidas uma parte integrante deste desenvolvimento, com grandes benefícios em termos

de promoção do Arquipélago da Madeira como destino de ecoturismo nos próximos anos.

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