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Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... i
PETRUS MOURA DE ANDRADE LIMA
Ressecção hepática com acesso glissoniano
intra-hepático: modelo suíno para treinamento
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Cirurgia do Centro de
Ciências da Saúde da Universidade
Federal de Pernambuco para a Obtenção
do Título de Mestre
Orientador Interno: Prof. Dr. Álvaro Antônio Bandeira Ferraz
Orientador Externo: Dr. Antonio Cavalcanti Martins
Recife - 2010
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... ii
Universidade Federal de Pernambuco
REITOR
Prof. Amaro Henrique Pessoa Lins
VICE-REITOR
Prof. Gilson Edmar Gonçalves e Silva
PRÓ-REITOR PARA ASSUNTOS DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
Prof. Anísio Brasileiro de Freitas Dourado
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
DIRETOR
Prof. José Thadeu Pinheiro
HOSPITAL DAS CLÍNICAS
DIRETOR SUPERINTENDENTE
Prof. George da Silva Telles
DEPARTAMENTO DE CIRURGIA
CHEFE
Prof. Salvador Vilar Correia Lima
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIRURGIA
NÍVEL MESTRADO E DOUTORADO
COORDENADOR
Prof. Carlos Teixeira Brandt
VICE-COORDENADOR
Prof. Álvaro Antônio Bandeira Ferraz
CORPO DOCENTE
Prof. Álvaro Antônio Bandeira Ferraz
Prof. Carlos Teixeira Brandt
Prof. Cláudio Moura Lacerda de Melo
Prof. Edmundo Machado Ferraz
Prof. Fernando Ribeiro de Moraes Neto
Prof. José Lamartine de Andrade Aguiar
Prof. Salvador Vilar Correia Lima
Prof. Sílvio Caldas Neto
Lima, Petrus Moura de Andrade
Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno para treinamento / Petrus Moura de Andrade Lima. – Recife: O Autor, 2011.
xiii + 38 folhas: il., fig.; 30 cm.
Orientador: Álvaro Antônio Bandeira Ferraz Dissertação (mestrado) – Universidade Federal
de Pernambuco. CCS. Cirurgia, 2010.
Inclui bibliografia, apêndice e anexo.
1. Cirurgia. 2. Treinamento. 3. Suínos. 4. Fígado. 5. Técnica glissoniana intra-hepática. I. Ferraz, Álvaro Antônio Bandeira. II.Título.
UFPE 617 CDD (20.ed.) CCS2011-220
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... iii
NORMATIZAÇÃO ADOTADA
Esta dissertação está de acordo com:
Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals: Writing and Editing
for Biomedical Publication. International Committee of Medical Journals Editors (Vancouver),
Updated October 2008. Disponível no endereço eletrônico http://www.icmj.org.
Referências e Abreviaturas dos títulos dos periódicos adaptadas pela List of Journals
Indexed in Index Medicus.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... iv
DEDICATÓRIA
Para Aline, minha
esposa, com quem divido
alegrias e que sempre
apoia meus sonhos.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... v
AGRADECIMENTOS
Ao orientador Álvaro Ferraz, pela liberdade na preparação e execução dessa
dissertação.
Ao orientador Antônio Cavalcanti, pelas idéias e apoio na elaboração desse
projeto.
Aos meus pais Jairo e Valdecira, pelo amor e apoio incondicional, pelo
exemplo de vida profissional e pessoal.
Aos meus irmãos Pablo, Paloma e Tibério, melhores amigos na vida e
companheiros de profissão.
Aos meus amigos e colegas de trabalho, César Lyra, Cristiano Souza Leão,
Euclides Martins Filho, Flávio Kreimer, Roberto Lustosa e todos os que fazem o
serviço de Cirurgia Geral do IMIP e do HMA, pela ajuda diária que permitiu a
conclusão dessa dissertação.
Aos residentes de Cirurgia Geral do IMIP, Gilney, Jonathan e Rodolfo, pelo
auxílio cirúrgico na execução dos experimentos.
A todos os funcionários do Núcleo de Cirurgia Experimental – UFPE, pela
ajuda imprescindível à realização desse estudo.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... vi
SUMÁRIO
Lista de Figuras......................................................................................... viii
Resumo...................................................................................................... x
Abstract...................................................................................................... xii
1. Introdução............................................................................................. 01
1.1. A moderna cirurgia hepática........................................................... 02
1.2. O treinamento cirúrgico............................................................... 04
1.3. O uso de modelos animais em treinamento.................................. 05
1.4. Objetivos do estudo........................................................................ 06
1.4.1 Objetivo geral.............................................................................. 06
1.4.2 Objetivos específicos.................................................................. 06
2. Material e Métodos................................................................................. 07
2.1. Tipo de estudo.............................................................................. 08
2.2. Local de estudo............................................................................ 08
2.3. Animais......................................................................................... 09
2.4. Anestesia........................................................................................ 09
2.5. Procedimento cirúrgico................................................................... 09
2.6. Eutanásia....................................................................................... 10
2.7. Procedimentos éticos.................................................................... 10
3. Resultados............................................................................................ 11
3.1. Estudo da anatomia........................................................................ 12
3.2. Técnica de isolamento do pedículo glissoniano.......................... 15
3.3. Técnica de ressecção hepática...................................................... 16
3.4. Segmento 1................................................................................. 17
3.5. Segmento 2.................................................................................. 18
3.6. Segmento 3................................................................................... 19
3.7. Segmento 4.................................................................................. 19
3.8. Segmento 5................................................................................... 20
3.9. Segmento 6................................................................................... 21
3.10. Segmento 7................................................................................. 21
3.11. Segmento 8................................................................................. 22
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... vii
4. Discussão............................................................................................... 23
5. Conclusão............................................................................................... 29
Referências Bibliográficas....................................................................... 31
Anexo...................................................................................................... 37
Anexo 1. Aprovação do Comitê de Ética em Experimentação Animal..... 38
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... viii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Sala de Cirurgia do Núcleo de Cirurgia Experimental da
UFPE.......................................................................................
08
Figura 2 Na figura A, identifica-se o animal em posição para o
procedimento operatório. Na figura, após a incisão, vê-se a
disposição visceral..................................................................
10
Figura 3 Fígado porcino, com a respectiva representação dos oito
segmentos hepáticos. Na figura A, vê-se a face visceral; Na
figura B, vê-se a face diafragmática.........................................
12
Figura 4 Disposição dos ramos portais segmentares. Na figura B, vê-
se diagrama explicativo...........................................................
13
Figura 5 Disposição dos ramos venosos hepáticos e sua relação com
a veia cava. Na figura B, identifica-se diagrama explicativo da
relação com os segmentos.....................................................
14
Figura 6 Na figura A, o círculo amarelo evidencia o pedículo
glissoniano e o círculo vermelho a veia hepática. Na figura B,
percebe-se como a pinça atravessa entre as estruturas com
pouca distância entre as mesmas..........................................
15
Figura 7 Técnica usada no isolamento do pedículo. A e B: abertura da
cápsula de Glisson com eletrocautério em torno do pedículo.
C: Isolamento do pedículo com pinça de Mixter. D: Ligadura
do pedículo para confirmação da área isquêmica....................
16
Figura 8 A: a adelimitação da área a ser ressecada. B: a ligadura de
pontos através do parênquima. C: a ressecção do
parênquima com fio de algodão. D e E: a área ressecada,
evidenciando mínimo sangramento. F: o segmento
ressecado..............................................................................
17
Figura 9 A figura A evidencia o Segmento 1 e sua relação com a veia
cava. Na figura B, a veia cava aberta exibindo seu trajeto no
interior do segmento................................................................
18
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... ix
Figura 10 Na figura A, os pedículos glissonianos dos segmentos 2 e 3,
com a seta exibindo o local de isolamento do pedículo 2. Na
figura B, vê-se o segmento 2 isquêmico após a ligadura de
seu pedículo............................................................................
18
Figura 11 Na figura A, os pedículos glissonianos dos segmentos 2 e 3,
com a seta ressaltando o local de isolamento do pedículo 3.
Na figura B, percebe-se o segmento 3 isquêmico, após a
ligadura de seu pedículo.........................................................
19
Figura 12 Na figura A, vê-se a ligadura do pedículo do segmento 4. Na
figura B, percebe-se o segmento correspondente isquêmico..
20
Figura 13 Na figura A, vê-se o pedículo do segmento 5 ligado. Na figura
B, percebe-se a isquemia no segmento correspondente........
20
Figura 14 Na figura A, vê-se a seta indicando o local para o isolamento
dos pedículos. Na figura B, o segmento 6 após ligadura do
pedículo correspondente...........................................................
21
Figura 15 Na figura A, vê-se a seta localizando o ponto para o
isolamento do pedículo 7. Na figura B, o segmento 7 após
ligadura do pedículo correspondente.......................................
22
Figura 16 Na figura A, a ligadura proximal do pedículo do segmento 5 e
8. Na figura B, todo o lóbo isquêmico, principalmente sua
porção superior (círculo amarelo).............................................
22
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... x
RESUMO
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... xi
Lima, P.M.A. Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático:
Modelo porcino para treinamento. Recife, 2010. Tese Mestrado – Faculdade de
Medicina. Universidade Federal de Pernambuco, Recife.
As ressecções hepáticas são consideradas o único tratamento potencialmente
curativo para tumores hepáticos primários e metastáticos, o que gerou um aumento
no número de indicações de ressecções hepáticas. Assim, há a necessidade de
técnicas que propiciem uma maior preservação de parênquima hepático, bem como
maior segurança na realização dessas cirurgias. O acesso glissoniano intra-hepático
destaca-se como uma técnica de abordagem aos pedículos intra-hepáticos que
cumpre tais objetivos. A realização bem sucedida da técnica glissoniana intra-
hepática, demanda uma compreensão tridimensional da anatomia hepática, aliada a
um nível de destreza motora cuja obtenção só é conseguida através de treinamento.
O treinamento de cirurgiões está ligado à melhoria de resultados em vários
procedimentos cirúrgicos, incluindo as ressecções hepáticas. Programas de
treinamento habituais são insuficientes para a formação do cirurgião hepático.
Assim, a melhor saída para atingir o volume de procedimentos necessário, bem
como desenvolver as habilidades motoras específicas, é a utilização de modelos
experimentais em laboratórios de cirurgias. O presente estudo visa desenvolver um
modelo animal de treinamento de ressecções hepáticas com acesso glissoniano
intra-hepático. Foi inicialmente realizada dissecção de fígados separados de porco
para revisão da anatomia segmentar. Após o conhecimento anatômico procedeu-se
ao isolamento dos segmentos hepáticos pelo acesso glissoniano intra-hepático em
oito animais anestesiados, associado à ressecção segmentar. O isolamento dos
segmentos 2, 3, 4, 5 e 6 foi possível em todos os animais. O segmento 1 não foi
isolado em nenhum animal. Houve impossibilidade do isolamento individual do
segmento 8. Houve ainda falha no isolamento do segmento 7 em dois
animais.Conclui-se que o acesso glissoniano intra-hepático em porcos é técnica
simples e reprodutível, o que o torna um modelo animal viável para treinamento de
ressecções hepáticas com esse acesso.
Palavras- chave: Cirurgia; Treinamento; Suínos; Fígado; Técnica Glissoniana Intra-
Hepática.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... xii
ABSTRACT
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... xiii
Lima, P.M.A. Intrahepatic Glissonian Approach for Liver Resection: A porcine
Training Model. Recife, 2010. Tese Mestrado – Faculdade de Medicina.
Universidade Federal de Pernambuco, Recife.
Liver resections are considered the only potentially curative treatment for primary and
metastatic liver tumors, which led to an increase in the number of indications for this
procedure. Thus, there is a need for techniques that give a greater preservation of
hepatic parenchyma, as well as greater safety in performing these surgeries. The
intrahepatic glissonian approach stands out as a technical approach to intrahepatic
pedicles that meets those goals. The successful completion of the intrahepatic
glissonian approach requires a three-dimensional understanding of hepatic anatomy,
combined with a level of dexterity which is achieved only by training. The training of
surgeons is linked to improved outcomes in several surgical procedures, including
liver resections. Regular training programs are insufficient for the formation of liver
surgeon. So the best solution to achieve the necessary volume of procedures, as
well as develop specific motor skills is the use of experimental models in laboratory
operations. This study aims to develop an animal model of training intrahepatic
glissonian approach liver resection. The study started with separated pig livers
dissection to review the anatomy target. After the anatomical knowledge,the isolation
of liver segments was performed by intrahepatic glissonian approach in eight
anesthetized animals, associated with segmental resection. The isolation of
segments 2, 3, 4, 5 and 6 was achieved in all animals. The segment 1 was not
isolated in any animal. It was impossible the isolation of the individual segment 8.
There was also failure in the isolation segment 7 in two animals. It is concluded that
the intrahepatic glissonian approach in pigs is simple and reproducible technique,
which makes it a viable animal model for training in liver resections with such access.
Keywords: Surgery; Training, Pigs; Liver; Glissonian intra-hepatic approach
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 1
1. INTRODUÇÃO
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 2
1.1. A moderna cirurgia hepática
Todo cirurgião entende a importância do conhecimento anatômico para a
prática do ato operatório. Na cirurgia hepática, esse conhecimento é mandatório. As
descrições de Cantlie1, Hjortsjö2, Glisson3, e Couinaud4, permitiram o entendimento
da anatomia segmentar e lobar do fígado baseada na distribuição dos pedículos
vasculares, e assim, possibilitaram o adequado controle hemorrágico do órgão. A
ressecção hepática anatômica verdadeira, realizada em 1952 por Lotart-Jacob e
Robert5, é o início da era moderna da cirurgia hepática.
As ressecções hepáticas têm sido consideradas, com frequência progressiva,
o único tratamento potencialmente curativo para tumores hepáticos primários e
metastáticos. Especialmente nas últimas duas décadas, houve um aumento no
número de indicações de ressecções hepáticas e da necessidade de técnicas que
propiciem uma maior preservação de parênquima hepático, bem como maior
segurança na realização dessas cirurgias6.
As ressecções hepáticas podem ser regradas ou não regradas. As regradas
obedecem ao controle do influxo vascular, seguido do controle da drenagem
vascular e posteriormente secção do parênquima, motivo pelo qual é conhecida
como ressecção anatômica. As ressecções não regradas dispensam o rigor na
realização dessas etapas. A ressecção anatômica é preferida para o tratamento de
lesões oncológicas graças ao melhor prognóstico tardio7,8 .
A divisão das estruturas vasculares hepáticas durante a ressecção pode ser
realizada no hilo (extra-glissoniano) ou na intimidade do parênquima hepático. A
divisão intra-hepática é mais segura que a extra-hepática em termos de necessidade
de hemotransfusões, morbidade e mortalidade. A técnica extra-hepática está mais
associada a lesões e fístulas biliares9.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 3
As diversas técnicas de secção do parênquima hepático, tais como a
digitoclasia, a fratura do parênquima com o cabo do bisturi ou o uso do aspirador
ultra-sônico são formas do cirurgião identificar a anatomia topográfica intra-hepática,
sendo assim, formas rudimentares de abordagem intra-hepática dos pedículos
vasculares segmentar do fígado10,11.
Ressecções hepáticas simples passaram a ser realizadas com o uso de
hepatotomias limitadas e controle intra-hepático e glissoniano da tríade portal. Tais
técnicas foram descritas a partir das publicações de Couinaud12 (1985) e Galperin &
Karagiulian13 (1989) com padronização por Launois e Jamieson14 (1992). Passou-se
a denominar a essa técnica de acesso glissoniano intra-hepático.
O fundamento básico que garante uma ressecção hepática segura através da
técnica glissoniana intra-hepática é anatômico: enquanto o método clássico de
abordagem das estruturas do pedículo hepático prevê o isolamento da veia porta,
artéria hepática e via biliar fora da substância hepática, na técnica glissoniana intra-
hepática, o parênquima é incisado junto à fissura hepática principal e o isolamento
das estruturas do pedículo (veia porta, artéria hepática e ducto biliar) é feito dentro
do fígado onde essas estruturas são envelopadas por uma bainha derivada da
cápsula de Glisson11.
A realização bem sucedida da técnica glissoniana intra-hepática, demanda
uma compreensão tridimensional da anatomia hepática, aliada a um nível de
destreza motora cuja obtenção só é conseguida através de treinamento11.
A cirurgia videolaparoscópica hepática tem saído da esfera do diagnóstico e
encaminhado para as ressecções complexas do fígado15. Tais procedimentos
cirúrgicos requerem ainda mais habilidade psicomotora16. Devido a essa
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 4
complexidade, a ressecção hepático por vídeolaparoscopia requer um programa de
treinamento em modelos animais, antes de iniciar sua aplicação clínica17.
1.2. O treinamento cirúrgico
Durante muitos anos o treinamento cirúrgico foi baseado na filosofia de
William Halsted: “veja um, faça um e ensine um”. Tal filosofia de ensino cirúrgico não
é mais possível nos dias atuais, haja visto a necessidade de obtenção de melhores
resultados, com redução de mortalidade e complicações18.
O treinamento do cirurgião está implicado em melhores resultados em várias
áreas da cirurgia, notadamente no câncer colo-retal e de mama8, na endarterectomia
carotídea e no tratamento de aneurisma de aorta abdominal19. Com as ressecções
hepáticas não é diferente8.
A mortalidade após hepatectomias reduziu bastante nos últimos anos,
chegando a cerca de 5%. Os fatores implicados em tal redução soa a mudança na
escolha dos pacientes, a melhoria dos cuidados perioperatórios e anestésicos, o
melhor entendimento da anatomia hepática, a criação da especialidade do cirurgião
heptobiliopancreático e os centros hospitalares com alto volume de cirurgias19,20.
Programas de treinamento no qual se realiza grande variedade de cirurgias
com ressecções hepáticas ocasionais não são suficientes para a formação do
cirurgião hepático, já que o mesmo deve realizar entre vinte e cinco21 a trinta8
ressecções hepáticas durante a sua curva de aprendizado. Cirurgiões inexperientes
podem causar maior tempo de isquemia hepática durante a secção do
parênquima21, que é conhecido fator de risco para complicações pós-operatórias22.
A questão principal é, então, o antagonismo da redução de oportunidade de
treinamento do cirurgião, com a necessidade de aumentar sua habilidade técnica de
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 5
forma a obter os bons resultados descritos por serviços de alto volume. Esse é o
motivo pelo qual a cirurgia simulada, em suas mais diversas formas, tem ganho
espaço no treinamento de cirurgiões. O uso de simuladores permite a realização da
primeira cirurgia, progredindo, ainda, através da curva de aprendizado. A simulação
oferece a oportunidade de praticar o manejo de situações de emergência e
complicações18.
As principais categorias de simulação que podem ser empregadas para o
treinamento de cirurgiões são órgãos e tecidos inanimados artificiais, tecidos frescos
ou modelos animais e realidade virtual ou modelos computadorizados18.
1.3. O uso de modelos animais em treinamento
Desde o seu início, o aprendizado do médico, especialmente em alguns
campos do saber, não pode prescindir da atividade prática no modelo animal. O
desenvolvimento de habilidades psicomotoras e a capacitação para o ato operatório
não se consolidam apenas no exercício teórico. Treinar em anima nobile é expor o
paciente ao dano e o médico ao erro. Esse é o motivo pelo qual a simulação das
condições encontradas no campo operatório é fundamental para que o aprendiz
possa adquirir sua capacitação técnica sem o risco da maleficência ao paciente23,24.
Os porcos são animais que se assemelham ao humano em termos de
anatomia gastrointestinal e endocrinologia. Como animal de experimentação para
cirurgias têm a preferência graças a sua fácil disponibilidade em diferentes fases de
vida, baixo custo e resistência a doenças25.
Os porcos apresentam uma anatomia segmentar hepática que pode ser
comparada à anatomia hepática humana conforme descrito por Couinaud4, incluindo
a presença de tecido conjuntivo em torno dos pedículos intra-hepáticos26. Dessa
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 6
forma, o estudo em fígados porcinos constitui um meio de valor inestimável no
ensino e treinamento de ressecções hepáticas e transplante desse órgão24,27.
O desenvolvimento e treinamento em modelos animais de novas técnicas
operatórias, como as ressecções hepáticas videolaparoscópicas, tem sido objeto de
crescente número de publicações, pois constitui uma excelente preparação para
reduzir a curva de aprendizado de cirurgiões15,17,28,29.
A literatura atual carece, no entanto, de modelo animal capaz de permitir o
treinamento de ressecções hepáticas através do acesso glissoniano intra-hepático.
1.4 Objetivos do estudo
1.4.1 Objetivo geral
Tendo em vista a importância de treinamento de cirurgiões nas ressecções
segmentares do fígado, bem como a necessidade de grande número de ressecções
para completar o treinamento, o presente estudo tem por objetivo desenvolver um
modelo animal para treinamento de ressecções hepáticas com acesso glissoniano
intra-hepático.
1.4.2 Objetivos específicos
Determinar quais segmentos são passíveis de isolamento;
Descrever os marcos anatômicos para isolamento do pedículo glissoniano
de cada segmento;
Relatar as limitações no isolamento dos pedículos glissonianos.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 7
2. MATERIAL E MÉTODOS
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 8
2.1 Tipo de Estudo
O presente estudo é um estudo descritivo em laboratório.
2.2 Local do Estudo
Previamente ao desenvolvimento dos experimentos, foi realizado o estudo e
revisão da anatomia do fígado porcino através de dissecção anatômica de fígados
separados no Laboratório de Anatomia da Faculdade Pernambucana de Saúde –
IMIP.
O estudo com animais foi desenvolvido no Núcleo de Cirurgia Experimental
do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal de Pernambuco (NCE –
UFPE). Os experimentos foram realizados na sala de cirurgia daquele núcleo,
conduzidos pelo pesquisador, com o auxílio de outro cirurgião. Todos os
experimentos com animais foram realizados com o acompanhamento de veterinário
(Figura 1).
Figura 1: Sala de Cirurgia do Núcleo de Cirurgia Experimental da UFPE.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 9
2.3 Animais
Foram utilizados oito porcos domésticos (Sus scrofa) da raça Landrace do
sexo masculino provenientes de fazendas produtoras desse animal para abate e
consumo humano. Os animais possuíam idade variável, entretanto pesavam em
média 20Kg (18Kg a 26Kg). Os animais permaneceram no biotério do NCE no
período de 12 horas que antecedia o procedimento, período no qual foram
submetidos a jejum pré-operatório.
2.4 Anestesia
Iniciou-se a anestesia com sedação através de injeção intramuscular profunda
de ketamina (20 mg/kg) na musculatura para-espinhal do quarto posterior. Foi
realizada punção venosa na orelha com jelco 20 gauge para manutenção de acesso
venoso. Após indução com tiopental (30 mg/Kg) endovenoso, o animal foi submetido
à traqueostomia, com cânula de diâmetro compatível com o tamanho / peso do
animal. A canulação traqueal transoral no porco é difícil pela anatomia da laringe,
motivo da necessidade de traqueostomia30. Após a canulação traqueal, foi realizado
bloqueio muscular com pancurônio, e o animal foi acoplado a ventilador mecânico. A
manutenção anestésica deu-se através de inalatório halogenado (Isoflurano).
Durante o procedimento cirúrgico o animal foi submetido à monitorização não
invasiva, através de oximetria de pulso e cardioscopia.
2.5 Procedimento cirúrgico
Os animais anestesiados foram colocados em posição supina. A cavidade
abdominal foi acessada através de incisão mediana, sendo as alças intestinais
retraídas inferiormente de forma a expor o hilo hepático por inteiro (Figura 2).
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 10
Os segmentos hepáticos foram abordados individualmente de forma a
proceder a isquemia de cada segmento individualmente, a fim de permitir a previsão
de ressecção de cada segmento. Os marcos anatômicos para o isolamento desses
segmentos e pedículos foram descritos.
Figura 2: Na figura A, identifica-se o animal em posição para o procedimento operatório. Na figura, após a incisão, vê-se a disposição visceral.
2.6 Eutanásia
Ao final do procedimento cirúrgico o animal foi submetido à eutanásia com o
aprofundamento do plano anestésico e injeção endovenosa de cloreto de potássio a
19,1% em bolos até parada cardíaca completa evidenciada à cardioscopia.
2.7 Procedimentos éticos
A pesquisa aqui apresentada respeita a Lei Federal nº 6638 de 08/05/1979,
bem como os Princípios Éticos de Pesquisa do Colégio Brasileiro de
Experimentação Animal de 1991, e foi submetido à apreciação do Comitê de Ética
em Pesquisa Animal da Universidade Federal de Pernambuco, sendo aprovado sem
restrições (processo nº 23076.017217/2009-17).
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 11
3. RESULTADOS
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 12
3.1. Estudo da Anatomia
Inicialmente, foi realizado o estudo da anatomia hepática porcina através de
dois fígados isolados, com a finalidade de revisão da segmentação hepática, da
drenagem venosa, bem como profundidade dos pedículos glissonianos segmentares
(Figura 3).
Figura 3: Fígado porcino, com a respectiva representação dos oito segmentos hepáticos.
A) vê-se a face visceral; B) vê-se a face diafragmática.
Os fígados porcinos podem ser divididos em cinco lobos ou oito segmentos,
sendo essa divisão a de maior interesse para o presente estudo (Tabela 1). A
lobulação do fígado porcino é bem mais marcante que no fígado humano, assim
como os volumes dos segmentos são bastante distintos.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 13
Tabela 1: Anatomia segmentar do fígado porcino
Anatomia Lobar Anatomia Segmentar
Lobo Lateral Esquerdo Segmento 2 e 3
Lobo Medial Esquerdo Segmento 4
Lobo Medial Direito Segmento 5 e 8
Lobo Lateral Direito Segmento 6 e 7
Lobo Caudado Segmento 1
Cada segmento possui suprimento arterial, venoso e drenagem biliar próprios,
envoltos em bainha de tecido conjuntivo.
O Segmento 1 porcino tem como particularidade localizar-se na face visceral
do lobo direito, e conter em seu interior a veia cava.
A veia porta divide-se em dois troncos quase dentro do parênquima hilar. O
ramo direito emite ramos para o segmento 6, 7 e 1. O ramo portal esquerdo divide-
se em dois ramos principais, sendo o medial que perfunde os segmentos 5 e 8 e o
lateral que perfunde os segmentos 2, 3 e 4 (Figura 4).
Figura 4: A) Disposição dos ramos portais segmentares; B) vê-se diagrama explicativo.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 14
A artéria hepática principal divide-se em três ramos principais, localizados
anteriormente ao tronco portal, até a entrada no parênquima hepática. A partir desse
ponto, os ramos arteriais acompanham os ramos portais em cada segmento.
A drenagem venosa hepática é realizada através de seis troncos principais
cuja confluência com a veia cava acontece dentro do parênquima hepático,
impedindo seu isolamento. O segmento 1 drena diretamente na veia cava através de
múltiplas pequenas veias (Figura 5).
Figura 5: A) Disposição dos ramos venosos hepáticos e sua relação com a veia cava; B) identifica-se diagrama explicativo da relação com os segmentos
Durante o estudo anatômico, chamou a atenção a proximidade entre a veia
hepática e o pedículo glissoniano, com cerca de 0,5 cm de distância entre tais
estruturas no segmento 2 e cerca de 0,9 cm no segmento 7. Esse fato tem
relevância pela possibilidade de lesão da veia hepática durante o isolamento do
pedículo. (Figura 6)
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 15
Figura 6: A) o círculo amarelo evidencia o pedículo glissoniano e o círculo vermelho a veia hepática;
B) percebe-se como a pinça atravessa entre as estruturas com pouca distância entre as mesmas.
3.2. Técnica de isolamento do pedículo glissoniano
Os segmentos hepáticos foram isolados através da identificação e ligadura do
pedículo referente àquele segmento. Dessa forma delimitou-se a área isquêmica.
A técnica utilizada para o isolamento do pedículo glissoniano foi a realização
de incisões paralelas ao pedículo com eletrocautério a fim de abrir a cápsula de
tecido conjuntivo do fígado. Uma pinça hemostática ou mixter é insinuada através de
uma das incisões até atingir a incisão oposta. Um fio de algodão 2.0 é passado em
forma de laçada tipo Blalock. A passagem da pinça pode ocasionar sangramento
discreto secundário ao rompimento dos pequenos vasos parenquimatosos, que
cessa, em geral, espontaneamente. (Figura 7)
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 16
Figura 7: Técnica usada no isolamento do pedículo. A e B) abertura da cápsula de Glisson com eletrocautério em torno do pedículo; C) Isolamento do pedículo com pinça de Mixter; D) Ligadura do pedículo para confirmação da área isquêmica.
3.3. Técnica de ressecção hepática
A ressecção do segmento foi realizada quando necessário para a
demonstração da técnica.
Para a realização da ressecção hepática, realizou-se a delimitação com
eletrocautério cerca de 1 cm para dentro da área isquêmica. Procedeu-se pontos em
colchetes através do parênquima com fio de seda 2.0 e a partir daí a secção do
parênquima com a passagem da pinça Mixter e ligadura de fio de algodão, técnica
conhecida como silkclasia31.(Figura 8)
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 17
Figura 8: A) a adelimitação da área a ser ressecada. B) a ligadura de pontos através do parênquima; C) a ressecção do parênquima com fio de algodão; D e E) a área ressecada, evidenciando mínimo sangramento. F: o segmento ressecado.
3.4 Segmento 1
O segmento hepático 1 não foi isolado em nenhum dos animais estudados,
pois envolve a veia cava em toda sua circunferência impossibilitando sua ressecção
(Figura 9). Dessa forma, não se presta para o treinamento do isolamento do pedículo
intra-hepático.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 18
Figura 9: A) evidencia o Segmento 1 e sua relação com a veia cava; B) a veia cava aberta exibindo seu trajeto no interior do segmento.
3.5 Segmento 2
O segmento 2 apresenta o pedículo facilmente visível na face visceral do lobo
lateral esquerdo, com localização superficial. O pedículo tem trajeto paralelo à borda
posterior do lobo lateral esquerdo. Esse segmento foi isolado em todos os animais
do experimento sem dificuldades (Figura 10).
Figura 10: A) os pedículos glissonianos dos segmentos 2 e 3, com a seta exibindo o local de
isolamento do pedículo 2; B) vê-se o segmento 2 isquêmico após a ligadura de seu pedículo.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 19
3.6 Segmento 3
O segmento 3 apresenta o pedículo anterior e medial ao pedículo do
segmento 2, paralelo a borda medial do lobo lateral esquerdo. Assim como o
pedículo do segmento 2, possui situação superficial e é facilmente percebido na face
visceral do órgão. Em geral, é o pedículo mais calibroso do lobo lateral esquerdo.
Tal situação anatômica facilitou o isolamento do pedículo em todos os animais (Figura
11).
Figura 11: A) os pedículos glissonianos dos segmentos 2 e 3, com a seta ressaltando o local de
isolamento do pedículo 3; B) percebe-se o segmento 3 isquêmico, após a ligadura de seu pedículo.
3.7 Segmento 4
O segmento 4 tem o pedículo profundo, que não pode ser percebido
facilmente na superfície do fígado. Conseguiu-se o isolamento desse pedículo na
região de encontro entre o lobo lateral esquerdo e o lobo medial esquerdo. Nesse
local a pinça deve fazer uma curva mais profunda do que quando realizada no
isolamento dos segmentos 2 e 3, já que seu trajeto não é superficial. Tal situação
anatômica esteve presente em todos os animais do estudo (Figura 12).
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 20
Figura 12: A) vê-se a ligadura do pedículo do segmento 4; B) percebe-se o segmento correspondente isquêmico.
3.8 Segmento 5
O segmento 5 é localizado na porção mais inferior do lobo medial direito. O
pedículo correspondente a esse segmento encontra-se localizado paralelo à direita
da vesícula biliar, cerca de 1cm. Sua profundidade é variável, e pôde ser visto na
superfície visceral do lobo medial direito em duas ocasiões. Mesmo quando não
esteve presente na superfície do fígado, o isolamento do pedículo do segmento 5 foi
possível sem dificuldades. Assim, isolamento de seu pedículo foi realizado em todos
os animais do estudo (Figura 13).
Figura 13: A) vê-se o pedículo do segmento 5 ligado; B) percebe-se a isquemia no segmento correspondente.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 21
3.9 Segmento 6
O segmento 6 está localizado na borda medial do lobo lateral direito. Seu
isolamento foi possível na região de encontro do lobo lateral direito com o lobo
medial direito. A localização mais profunda obriga uma curvatura maior com a pinça
no momento de isolamento do pedículo. Esse segmento foi isolado em todos os
animais do estudo, apesar de em nenhum dos animais ser perceptível na superfície
do órgão (Figura 14).
Figura 14: A) vê-se a seta indicando o local para o isolamento dos pedículos; B) o segmento 6 após
ligadura do pedículo correspondente.
3.10 Segmento 7
O segmento 7 está localizado látero-posteriormente ao segmento 6. O seu
pedículo tem trajeto não evidenciado na superfície do órgão, com localização na
borda posterior do segmento lateral direito. A proximidade com o segmento 1 e
assim com a veia cava impede manobras mais amplas para isolamento do pedículo.
Não foi conseguido o isolamento desse pedículo em dois animais do estudo (Figura
15).
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 22
Figura 15: A) vê-se a seta localizando o ponto para o isolamento do pedículo 7; B) o segmento 7 após ligadura do pedículo correspondente.
3.11 Segmento 8
O segmento 8, localizado látero–posteriormente ao segmento 5, tem pedículo
em borda medial do lobo medial direito, com localização bem mais profunda. Esse
segmento não foi isolado individualmente me nenhum animal. Contudo, ao ligar-se o
pedículo do segmento 5 proximal ao hilo foi possível o isolamento conjunto do
segmento 8 (Figura 16).
Figura 16: A) a ligadura proximal do pedículo do segmento 5 e 8; B) todo o lóbo isquêmico,
principalmente sua porção superior (círculo amarelo).
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 23
4. DISCUSSÃO
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 24
A prática cirúrgica está intimamente relacionada ao desenvolvimento da
técnica cirúrgica e do conhecimento anatômico. A explosão no número de
ressecções hepáticas nos últimos 30 anos é um bom exemplo disso32.
A ressecção hepática tem sido indicada para distintas patologias do fígado,
tais como tumores primários benignos ou malignos, trauma hepático e
principalmente tumores hepáticos metastáticos. A ressecção hepática persiste como
única forma de tratamento curativo potencial dessas doenças32,33.
O intuito em uma ressecção hepática é ocasionar o menor sangramento e
permitir a persistência de função hepática adequada. Para tanto é crucial a
permanência de parênquima hepático residual a fim de impedir a insuficiência
hepática pós-operatória32,34.
Nos dias atuais, o acesso glissoniano intra-hepático destaca-se como uma
técnica de abordagem aos pedículos intra-hepáticos, pois tal acesso assegura uma
reduzida hemorragia intra-operatório e garante a preservação da vascularização do
parênquima hepático subjacente, já que permite a ressecção da menor quantidade
de fígado necessária ao tratamento6,35.
Para a realização de ressecções hepáticas é necessário o conhecimento
teórico da técnica aplicada, mas também uma destreza motora, adquirida no
dinâmico cenário cirúrgico. Sabe-se que a duração do processo de aprendizagem de
uma habilidade cirúrgica, habitualmente chamado de curva de aprendizado, está
diretamente relacionada ao tempo de exposição do cirurgião em treinamento à
técnica em questão11.
A principal questão a ser considerada no treinamento de um cirurgião é a
dificuldade em executar técnicas complexas, como a abordagem intra-hepática
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 25
glissoniana, sem causar dano ao paciente e com a garantia dos bons resultados de
cirurgiões experientes ou hospitais de alto volume8,19,36-38.
A simulação cirúrgica oferece a oportunidade de ensino e treinamento de
habilidades cirúrgicas sem a preocupação ética e legal da segurança do paciente. A
simulação de uma cirurgia pode ser feita através de órgãos e tecidos artificiais,
órgão e tecidos frescos, cirurgia em animais, realidade virtual ou modelos
computadorizados16,18.
A simulação em animais vivos anestesiados é o mais realístico e oferece o
melhor treinamento16,18. Entretanto esbarra em preconceitos e resistências de alguns
que julgam que o experimento técnico-científico com animais está sempre associado
a sofrimento físico e condutas eticamente reprováveis23.
Definir o modelo animal ideal não é tarefa fácil, pois é necessário uma
proximidade nas características fisiológicas, anatômicas e orgânicas com as
características do ser humano, a fim de permitir maior aplicabilidade das conclusões
obtidas23.
Os cães utilizados em nosso meio são capturados nas ruas e entregues às
instituições cadastradas pela vigilância animal da secretaria de saúde. Muitos
desses animais não têm raça definida, apresentando variação de tamanho, peso,
idade e condições de saúde precárias30. Além do exposto, o uso de cães ocasiona
questões morais e legais relacionados à eutanásia. A lei estadual n° 14.139 de 31 de
agosto de 2010, impede a eutanásia de cães e gatos.
O porco foi o animal escolhido para o presente estudo, pois apresenta
similaridades com o ser humano no tamanho da cavidade abdominal16, na anatomia
gastrointestinal5 e, principalmente, na segmentação hepática24,25,28,39. Por ser um
animal de produção comercial para consumo, traz ainda vantagens como facilidade
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 26
de obtenção em diversos tamanhos, preço acessível e baixa possibilidade de
transmissão de zoonoses.
Para a realização de cirurgia hepática faz-se mister o conhecimento
adequado da anatomia do fígado10,32. O conhecimento da anatomia visceral porcina
também é necessária para a realização adequada dos mais diversos procedimentos
cirúrgicos desenvolvidos nesse animal2. Esse foi o motivo pelo qual o presente
estudo foi iniciado com a dissecção de fígados separados para estudo e revisão da
anatomia animal.
Durante as dissecções dos fígados, foi possível a confirmação dos oito
segmentos hepáticos, amplamente descritos na literatura. Pôde-se ainda verificar a
distribuição e localização dos ramos portais segmentares24,25,39.
Nos fígados dissecados para estudo anatômico, havia seis troncos principais,
que encontra semelhança com a literatura24. Há, contudo, uma discordância em
algumas publicações, como a descrição de apenas quatro veias hepáticas
principais25. Tal discordância não teve relevância ao estudo, pois a técnica de
acesso glissoniano intra-hepático prescinde do isolamento das veias hepáticas, já
que sua ligadura é dentro do parênquima do órgão.
A proximidade da veia porta com a veia hepática dentro do parênquima,
encontrada durante o estudo havia sido descrito como uma desvantagem na
utilização do porco como modelo de treinamento para transplante hepático inter-
vivos27. Entretanto esse procedimento cirúrgico envolve anastomoses vasculares, ao
passo que no presente estudo existe apenas ligaduras vasculares. Assim, não foram
encontradas adversidades devido a tal situação anatômica.
Com o conhecimento anatômico, foi possível aplicar a técnica do acesso
glissoniano intra-hepático descrito na literatura32,33,35. O acesso direto ao pedículo
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 27
permitiu o isolamento dos segmentos com a previsão do parênquima a ser
ressecado com grande acurácia.
Os segmentos 2, 3, 4, 5 e 6 foram isolados em todos os animais de forma
reprodutível e sem dificuldades. Os segmentos 2 e 3 são os de maior facilidade, já
que têm o pedículo em trajeto totalmente superficial, o que permite seu isolamento
praticamente sob visão direta. Os segmentos 4, 5 e 6, graças à situação intra-
parenquimatosa dos pedículos, auxiliam na destreza motora de sentir a passagem
da pinça através do parênquima hepático, o que permite conhecer as distintas
consistências presentes no fígado. Tal habilidade tem por finalidade impedir a
passagem da pinça por dentro do pedículo, causando hemorragias graves.
O segmento 1 não permite seu isolamento ou ressecção, já que a veia cava
encontra-se no seu interior e assim implicaria em ressecção da cava. Tal situação
anatômica específica não é encontrada nos humanos e dessa forma, não teria
nenhuma aplicabilidade no treinamento de cirurgiões.
O isolamento do pedículo do segmento 7 não foi possível em dois animais.
Nesses animais, apesar da manobra habitual com a pinça, não conseguimos a
adequada demarcação do segmento. Tentativas com maior profundidade da pinça
foram realizadas, mas se hesitou em continuar pelo risco de lesão na veia cava,
localizada próximo ao pedículo em questão.
O pedículo do segmento 8 não foi isolado individualmente em nenhum animal.
Tal impossibilidade do isolamento do pedículo não impede o ensino e treinamento
da técnica, utilizando todo o lobo medial direito.
A ressecção do segmento foi realizada para demonstração da técnica, através
da secção entre fios do parênquima hepático com o eletrocautério. Esse método, já
bem estabelecido, é simples, barato e rápido31. Não há necessidade do emprego de
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 28
tecnologias que utilizam ultra-som, radiofreqüência ou outras formas de energia que
são caras e indisponíveis na maioria dos hospitais de nosso meio e principalmente
nos núcleos de cirurgias experimentais.
Os princípios cirúrgicos para o isolamento do pedículo, assim como para a
ressecção do segmento, foi reprodutível em todos os animais do estudo. A
estimulação tátil e visual dos procedimentos, embora não possam ser mensurados
objetivamente, são similares a uma cirurgia em humanos.
Atualmente a cirurgia laparoscópica tem avançado sobre a cirurgia hepática,
entretanto não está amplamente difundida graças à dificuldade técnica, bem como a
habilidade na execução de tal procedimento ainda ser incomum. Apesar de já existir
descrições de ressecções hepáticas com acesso glissoniano, a experiência é
pequena40, havendo a necessidade de treinamento adequado. O presente estudo
evidencia a oportunidade para o treinamento da ressecção hepática laparoscópica
com acesso glissoniano intra-hepático, de forma a permitir maior difusão de tal
cirurgia.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 29
5. CONCLUSÃO
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 30
O porco é um modelo animal viável para treinamento de ressecções hepáticas
com acesso glissoniano intra-hepático.
O acesso glissoniano intra-hepático em porcos é técnica simples e
reprodutível, quando se utiliza os segmentos 2, 3, 4, 5 e 6.
Os segmentos 1, 7 e 8 não apresentam facilidade técnica para isolamento e
ressecção, devido a anatomia dos mesmos e assim não se presta ao treinamento de
cirurgiões.
Durante o procedimento operatório em porcos é possível a realização de
estimulação de diversas áreas do processo de aprendizado, o que permite
entendimento da técnica bem como o desenvolvimento das habilidades motoras
necessárias para a realização da cirurgia em humanos.
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 31
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ANEXO
Lima PMA Ressecção hepática com acesso glissoniano intra-hepático: modelo suíno... 38
ANEXO 1