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Resumo: NABARRETE, Luiza Maria de Souza. Por uma abordagem psicanalítica do ciúme e seus desdobramentos Gustavo H. A. Soares A autora introduz o tema do ciúme apontando para a recorrência deste afeto nas relações contemporâneas e ao longo da história, seu caráter de triangulação, excessos, falta e aniquilamento. O tema será investigado de uma perspectiva estrutural, destacando-se os processos de constituição eu/outro, fantasia e gozo. As justificativas para escolha do tema se resumem em quatro: a pouca produção acadêmica e – principalmente – psicanalítica sobre o assunto, a recorrência clínica do discurso ciumento, a expressão violenta do ciúme – que é a principal causa aparente da violência doméstica – e, por fim, a possibilidade de ampliação do conhecimento acerca do mal- estar na cultura. (p. 12-15) Para contextualizar o assunto das vinculações amorosas contemporâneas, a autora traz as ideias de Bauman (2004, “relações amorosas liquefeitas”), Porto (2010, “era do homem sem vínculos”), Furtado (2008, “cultura consumista, produto de uso imediato e satisfação momentânea”) e também Arreguy e Garcia (2012, “ruína do amor romântico, ciúme como afeto ‘fora de moda’”) (p. 16-17). Dentre esses, destaca-se a leitura das autoras Arreguy e Garcia pelo foco no fenômeno ciumento, sobre a contribuição delas Nabarrete comenta que “é possível observar na clínica a repetição de um ciúme primitivo, patológico, representando uma forma regredida de amar, como um romantismo recalcado que, por vezes, encontra escape no delírio, na melancolia, na atuação violenta e no masoquismo. ” (p. 18)

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Resumo da dissertação de mestrado de Luiza Maria de Souza Nabarrete

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Resumo: NABARRETE, Luiza Maria de Souza. Por uma abordagem psicanalítica do ciúme

e seus desdobramentos

Gustavo H. A. Soares

A autora introduz o tema do ciúme apontando para a recorrência deste afeto nas relações contemporâneas e ao longo da história, seu caráter de triangulação, excessos, falta e aniquilamento. O tema será investigado de uma perspectiva estrutural, destacando-se os processos de constituição eu/outro, fantasia e gozo. As justificativas para escolha do tema se resumem em quatro: a pouca produção acadêmica e – principalmente – psicanalítica sobre o assunto, a recorrência clínica do discurso ciumento, a expressão violenta do ciúme – que é a principal causa aparente da violência doméstica – e, por fim, a possibilidade de ampliação do conhecimento acerca do mal-estar na cultura. (p. 12-15)

Para contextualizar o assunto das vinculações amorosas contemporâneas, a autora traz as ideias de Bauman (2004, “relações amorosas liquefeitas”), Porto (2010, “era do homem sem vínculos”), Furtado (2008, “cultura consumista, produto de uso imediato e satisfação momentânea”) e também Arreguy e Garcia (2012, “ruína do amor romântico, ciúme como afeto ‘fora de moda’”) (p. 16-17). Dentre esses, destaca-se a leitura das autoras Arreguy e Garcia pelo foco no fenômeno ciumento, sobre a contribuição delas Nabarrete comenta que “é possível observar na clínica a repetição de um ciúme primitivo, patológico, representando uma forma regredida de amar, como um romantismo recalcado que, por vezes, encontra escape no delírio, na melancolia, na atuação violenta e no masoquismo. ” (p. 18)

A despeito dos autores citados, que apontam para um esvaziamento nas formas de amor, Nabarrete cita Bifano (2002) e Levy e Gomes (2011) que partem da perspectiva dos excessos nas diferentes formas de vínculo (p. 18-19). Ao justificar a escolha teórica em Lacan, a autora retoma essa ideia e apresenta a hipótese do “ciúme como um afeto que demarca o caráter de transbordamento, de excessos em relação ao outro, portanto fundamentalmente relacionado com outros imaginários, criando triangulação e formas de gozo, abrangendo este terceiro elemento na relação” (p. 20). A ideia é elaborar um percurso que construa um “discurso linguajeiro sobre o ciúme” (p.21).

No segundo capítulo há uma retomada da concepção de amor romântico e da leitura freudiana do amor. Essa retomada é dividida em três partes: a primeira analisa o amor narcísico, a segunda o amor como reencontro das

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relações primárias, e por fim amor e desamparo. Há mais duas partes nesse capítulo dedicadas a introduzir as noções lacanianas do amor: “o dom ativo do amor: uma possibilidade de leitura em Lacan” e “dos excessos do amor”. Nestas é traçada uma comparação de conceitos freudianos e lacanianos, como por exemplo as contribuições da linguística saussuriana para pensar a experiência discursiva do amor. (p. 22-44)

É no terceiro capítulo (e último, considerando que o quarto são as considerações finais) que se apresenta uma conceituação do que vem a ser ciúmes. Intitulado “por uma abordagem lacaniana do ciúme” o capítulo começa com a definição de duas autoras, Farinha (2010) e Porto (2010), que estabelecem esse afeto como sendo uma “reação à ameaça de outrem, real ou imaginário, a um relacionamento significativo”, portanto é um afeto direcionado a um terceiro. Para as duas autoras, o ciumento objetivaria atenuar os riscos da perda do objeto de amor. Porém, esta leitura, segundo Nabarrete, está presa no romance familiar, e a dissertação pretende ser construída para além da heteronormatividade que a família nuclear representa. (p. 45)

Este capítulo é dividido em duas partes, “para além de uma leitura freudiana do ciúme” e “por uma construção linguajeira do ciúme”. Por tratar diretamente do tema, o resumo focará neste capítulo, especificamente na segunda parte, que contém o núcleo da pesquisa realizada pela autora, e é fragmentado em três subdivisões: “o ciúme e a fantasia”, “ciúme e gozo” e “ciúme e o olhar como objeto A”.

Na primeira parte, a autora retoma o artigo de Freud (1922) que trata diretamente do ciúme, chamado “Alguns mecanismos neuróticos no ciúme, na paranóia e no homossexualismo”. No texto, Freud divide o ciúme em três tipos: normal projetado e delirante. Por ser o tipo normal aquele ciúme que vem desde o período edípico, na rivalidade entre os irmãos pelo amor da mãe ou da relação entre os pais, a autora emenda uma crítica que Lacan faz ao “excesso de imaginarização e familiarização” (p. 46) da questão edípica. Trata-se de pensar as relações familiares como funções, e não nas figuras em si, como a família tradicional sugere (p. e., autoridade paterna). O que se segue a isso são explanações sobre o caráter que o Complexo de Édipo assumiu na obra de Freud, e as contribuições de Lacan, como, por exemplo, a recuperação na psicanálise do “centro paterno do sujeito freudiano”, a despeito das teorizações que alguns pós-freudianos (como Klein, Winnicott e Anna Freud) conceberam como “além do pai”, dando mais ênfase ao papel da mãe na trama edípica. (p. 47)

A partir disso, a autora retoma alguns conceitos essenciais na obra de Lacan, como a fórmula da metáfora paterna. A importância do reconhecimento do que Lacan chama de significante do Nome-do-pai vai ter influências, segundo a autora, no questionamento da normatividade e da família “tradicional”, na medida em que aponta para uma função simbólica que está concebida dentro de um percurso histórico da cultura e não em uma rigidez de papéis separados pelo sexo anatômico. (p. 48-50)

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Voltando ao artigo do Freud, é observado que ele aborda este afeto tanto pela via da psicose quanto da paranoia. Isso também fica evidente nos artigos “O caso Schreber” (1911) e “O Rascunho H” (1895), porém não é possível encontrar qualquer sistematização além disso sobre o tema. Dunker (1996) aponta que a relação do ciúme com a paranoia encontra-se atrelada ao preenchimento daquilo que falta ao outro, a uma imagem fixa, ou seja, à cena de traição. Nesse sentido, o paranoico se basearia numa certeza antecipada, fixando-se na traição e justificando assim a perseguição e impulsos agressivos. A chave da questão estaria na figura do terceiro. Ao analisar os sentimentos de hostilidade dirigidos à um novo irmão durante o Complexo de Édipo, Freud já associava o papel do terceiro nas experiências sexuais infantis. No artigo de 1922, Freud considera as origens do ciúme como uma “continuação das primeiras manifestações da vida emocional da criança” (p. 51).

Numa leitura estritamente freudiana do fenômeno há uma diferença entre os ciúmes masculino e feminino, sendo as mulheres designadas como mais ciumentas por conta da angústia de castração, o que nesses termos se traduz como consequência da inveja do falo. A mulher desenvolveria um sentimento de inferioridade, ao perceber sua ferida narcísica, que pode retornar como sintoma na forma de ciúme. Já nos homens, a angústia de castração apareceria como o medo de ser comparado a um rival. A ameaça de perda do objeto gera uma reação mais violenta nos homens, dada a posição narcísica que se tem em relação ao falo durante o Complexo de Édipo. Assim, uma falha narcísica na constituição do ego retornaria com mais intensidade no homem. (p. 52)

Depois das considerações freudianas é feita uma crítica com vistas a introduzir a segunda parte do capítulo. A autora destaca novamente o excesso de imaginarização na teoria de Freud, e indica que, para Lacan, o ponto central está na questão do falo, ter/não ter (em oposição à relação corpo de menina/corpo de menino) fugindo de uma concepção evolucionista da psicanálise. A partir da diferenciação entre necessidade (biológico) e desejo (alienado ao desejo do Outro), Lacan abre espaço para a elaboração da noção de objeto a. Também se introduz na sequência a diferença entre castração, frustração e privação. (p. 52-54)

Em “Por uma construção linguajeira do ciúme” a autora procura situar o ciúme como súbdito à experiência do significante. Para isso, retoma aspectos centrais da obra lacaniana concernentes à constituição do sujeito. O principal deles é a teoria do Estádio do Espelho. Nessa fase se caracteriza uma confusão nas relações afetivas entre amor e identificação. O complexo de intrusão, identificado por Lacan no início de sua obra, indica o momento traumático da origem do fenômeno ciumento, quando a criança teme perder seu primeiro objeto de amor ao constatar a presença de um irmão. Este período entre o desmame e o surgimento do intruso coincide com o estádio do espelho (p. 56). “Lacan ainda reitera que este ciúme surge no próprio momento da identificação, não estabelecendo simplesmente uma rivalidade. O desejo de que o outro desapareça surge na mesma proporção em que este representa e

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sustenta o desejo do sujeito, uma vez que, não há desejo sem inscrição da falta. ” (p. 57)

(Comentário: este trecho transcrito da dissertação é uma das únicas referências explícitas ao ciúme das últimas páginas, porém o texto gerou uma confusão de interpretação que frustraram as tentativas de resumi-lo. A autora não deixa claro a que “momento da identificação” se refere, pois está falando até então do complexo de intrusão – período posterior ao estádio no espelho, que justificaria o uso da palavra “rivalidade” – no entanto a alusão a uma identificação nos leva a pensar no próprio estádio do espelho. Já a segunda frase confunde em seu próprio enunciado. O sujeito deseja que o outro desapareça, pressupondo que a falta deste outro sustentaria o seu desejo? Ou é o próprio desejo de aniquilamento do outro que é sustentado na medida que este desejo aponta para uma falta?)

Ao analisar as noções lacanianas de falo, a autora assinala a possibilidade de leitura do ciúme como um discurso acerca da ameaça da perda de um parceiro que representaria imaginariamente a perda do falo, considerando que a relação entre dois amantes envolve a negociação do falo como metáfora de poder. Isso também seria relacionado à lógica da frustração, ao passo que reivindica uma ilusão da unidade de si que foi perdida. (p. 58)

A experiência identificatória do estádio do espelho marca o amor no seu registro imaginário, na medida em que há um espelhamento da imagem de si no outro. Portanto o amor é construído uma vez que supõe significantes à imagem do outro. Segundo Lacan, ama-se no objeto aquilo que falta ao sujeito, e nessa perspectiva da ausência se constrói o que é chamado de “dom do amor”, posto que o sujeito se doa a troco de algo, em essência, vazio. (p. 59-60)

Nesse momento a dissertação se encaminha para esmiuçar as definições de Lacan. A primeira subdivisão, intitulada “O ciúme e a fantasia” investiga os aspectos da fantasia na dinâmica amorosa e vem na esteira dessa concepção de amor como falta e imagem de si mesmo. De acordo com Nasio (2009), essa fantasia opera no inconsciente através de imagens e significantes dando liga à relação amorosa e tornando o outro uma fonte de excitações (p. 61). Moura (2007) vai acrescentar que na fantasia o sujeito goza daquilo que foi obrigado a renunciar na realidade, agindo assim como modo de satisfação pulsional que não ameaça as defesas do eu (p. 62).

Nabarrete também cita outra autora, Brasil (2009), que enfatiza que o verdadeiro adversário dos ciumentos se refere ao desejo, mais especificamente a autonomia do desejo, que tentam controlar. O afeto ciumento se constitui como efeito do engajamento do significante, engajamento esse que mantém estreita relação com a angústia visto que se trata de uma reação à ameaça da perda de objeto ou a ideia de que outro possa faltar. Nesse sentido que esta autora recupera o termo havaiano para ciúme, cujo significante é o mesmo de despedida, expondo assim o aspecto da perda, levando em conta que é uma característica dos ciumentos antecipá-la ou promove-la. (p. 63)

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A autora volta a reconstruir as ideias de Nasio (2005) em relação à angústia e perda do ser amado. Nessa leitura a dor não é uma reação à perda, mas justamente uma resposta a esta fantasia que desmoronou. O ciúme e a angústia seriam respostas frente a essa ameaça de desabamento da fantasia, que poderia induzir o sujeito a confrontar seu próprio interior transtornado. A desestruturação de cadeias e o confronto com o real leva o sujeito a vivenciar um processo em que uma pequena parcela da imagem do outro desaparecido é superinvestida de afeto, e para que esse investimento se atenue é necessário um trabalho do luto. O autor também entende o ciúme como um representante de um aspecto dessa dor psíquica da perda, sendo assim “um afeto em que se misturam a dor de ter perdido o amor do amado, a integridade da minha imagem narcísica, o ódio contra meu rival e, enfim, as acusações que eu me faço por não ter sabido conservar meu lugar”. É no medo de lesão deste laço com o outro (laço onde se encontra a representação psíquica e a realidade exterior) em que se situa a reação ciumenta. (p. 64)

A segunda subdivisão, “Ciúme e gozo”, dedica-se a explorar as noções de gozo em Lacan. Inicialmente há uma retomada do que se entende por objeto a e suas relações com os formatos que a pulsão adquire em busca do gozo. O texto cita Lacan (1964) no momento que em situa o objeto da pulsão metaforicamente como uma subjetivação acéfala, sendo essa metáfora central para pensar o objeto a como um contorno, uma estrutura. Outro trecho de Lacan ilustra bem essa ideia ao analisar o gozo voyeurístico como uma busca por uma sombra detrás da cortina, dando mais preeminência à ausência do falo do que se chamaria de sua presença. (p. 65-66)

Quinet (2002) apresenta o ciúme e a inveja como afetos próximos, ambos apresentam versões da angústia e colocam em jogo o desejo, o falo como faltante e o objeto que se insere sob a modalidade escópica. Estes afetos manifestam o mal-estar da falta e o gozo para além do princípio do prazer. O autor também aponta que atributos valorizados indicam um objeto algamático (?) que contém e escamoteia a castração. Além disso, estes afetos engajam uma forma de gozo envolvendo um terceiro e contemplando objetos perdidos, porém a inveja barraria o outro de seu gozo, enquanto o ciúme procura barrar a completude desejada do próprio sujeito do seu objeto de gozo. Há também uma relação disso com o olhar como representante do objeto a, nas palavras do autor: “esse objeto perdido que é o olhar, excluído da linguagem, dejeto do discurso, retorna para o sujeito trazendo-lhe essa modalidade de mal-estar na civilização que habita os laços amorosos entre homens e mulheres: o gozo da inveja e o gozo do ciúme”. Nesse sentido, o ciúme é o medo de perder o objeto de desejo para um “outro-ele-mesmo”, um outro marcado pela falta e o desejo, em que o sujeito projeta sua própria falta estrutural de objeto. (p. 67)

Em seguida, mais noções sobre o gozo são acrescentadas, como por exemplo a contribuição de Lacan de que toda pulsão é pulsão de morte e o gozo seria o “mais além do princípio do prazer” de Freud. Outra conhecida expressão lacaniana citada é a de que é o corpo de um que goza com uma parte do corpo do outro, ressaltando seu caráter de parcialidade (p. 69). Há que

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se mencionar também o caráter radical do gozo que pode irromper na tentativa de eliminação do desejo do outro, culminando em crimes passionais. Lacan (1953-54) postula que o ódio surge na conjugação do imaginário e do real, aprisionando o simbólico e, invalidando deste modo o papel da palavra nesta relação entre o sujeito e o outro. (p. 70)

Na relação entre engajamento amoroso e liberdade, Lacan diz que a natureza do desejo espera que sejamos, para o outro, um objeto que tenha o mesmo valor de limite que tem, no que diz respeito à liberdade, o seu próprio corpo. Mesmo assim, é preciso que haja liberdade, ou melhor, um engajamento livre, contudo se espera que uma parte dessa liberdade abdique de si mesma a fim de que possamos nos sentir amados. Nesse sentido, Lacan compreende que no enlace ciumento o sujeito busca incansavelmente apreender o desejo do outro na tentativa de captá-lo como seu desejo, o que implica uma renúncia inteira do desejo próprio do outro. (p. 71)

Por fim, na terceira subdivisão, “Ciúme e o olhar como objeto A”, a autora procura dar ênfase na pulsão escopofílica e a noção de objeto a, analisando como isso interage nos enlaces ciumentos e anuncia o desfecho do tema a partir de uma posição linguajeira, propondo uma espécie de sintaxe do ciúme (p. 73). O ciúme, dado seu aspecto de triangulação, é relacionado ao gozo do espetáculo e à necessidade desse mais-de-gozar escópico, isto é, a necessidade de dar a ver, ser visto pelo outro. A pulsão escópica, segundo Quinet, é o que confere ao objeto desejado do mundo sensível seu caráter de beleza (p. 75). Porém, a dialética do gozo do espetáculo comporta a possibilidade de gerar o gozo do horror, haja vista que no olhar está contida a dimensão do desaparecimento do outro (p. 76).

O olhar enquanto objeto a é pensado como agalma, causa do desejo, retornando como esse a-mais dos objetos. A psicanálise construiu a noção de pulsão como algo que está sempre à deriva em busca de satisfações parciais, portanto a sexualidade desliza pela cadeia significante. Agindo dessa forma, ela contornaria os objetos e retornaria a si, num ciclo. Um dos desdobramentos ciumentos dessa dinâmica, além do gozo do espetáculo, é a suposição de perda desse olhar por parte do outro amado, ou melhor, desse terceiro que de alguma forma impede o gozo do sujeito, roubando-lhe o olhar do outro. Esse processo pode levar a uma dessubjetivação, já que o sujeito desaparece comparecendo apenas sua condição de objeto. (p. 77)

A dissertação caminha para o fim emendando uma crítica à contemporaneidade, pela crença disseminada de que todo gozo é possível e deve ser alcançado. Conclui a crítica dizendo que a leitura clínica do ciúme deve ser estrutural, e não meramente diagnóstica, semiológica e nosográfica. (p. 78-79)

As considerações finais são apenas um resumo da dissertação, não contendo nada significativo para ser acrescido.