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Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia Uma viagem acima Entrevista exclusiva com o músico Ian Ferreira rio O papel da música no desenvolvimento da criança |04 A vida dos cantores de barzinho |07 |09 Nenho do Arrocha um produto

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Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia

Uma viagemacimaEntrevista exclusiva com o músico

Ian Ferreira

rio

O papel da música nodesenvolvimento da criança|04

A vida dos cantores debarzinho|07

|09Nenho do Arrocha

um produto

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Centro de Artes Humanidades e Letras (CAHL)Quarteirão Leite Alves, Cachoeira/BA

CEP - 44.300-000 Tel.: (75) 3425-3189

Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo

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ReitorPaulo Gabriel Soledad Nacif

Coordenação EditorialJ. Péricles Diniz e Robério Marcelo

EditoresJ. Péricles DinizVanessa Araújo

RedatoresAndrêi SoaresMário JorgeReisania KarlaRodrigo DanielWiliane Passos

Coordenador de Editoração Gráfica/Editor de ArteVanessa Araújo

Editoração GráficaVanessa Araújo

>>EXPEDIENTE<<Ouvir música já não é mais visto apenas como um entretenimento ou medida para se acalmar e relaxar. Já é constatado que ela pode trazer diver-sos benefícios para a saúde, como o alívio de dores, melhora da memória, estímulo para a prática de atividade fí-sica, entre outros. Pode ser uma batida pop, a cadên-cia dos sambas, sinfonias da música clássica, tangos com incorporações de jazz, MPB ou gospel, não importa; bas-ta ouvir aquela música preferida para que as emoções positivas venham aos montes, revivendo situações prazero-sas e desenvolvendo diferentes estí-mulos. Não há como negar a importância que a música tem em nossas vidas, seja no nível consciente, seja no incons-ciente. Mas qual seria o seu poder de influência sobre nossos potenciais? O seu efeito benéfico começa no cérebro, para em seguida, refletir no coração. “Ela aumenta a produção de endorfina e serotonina - substâncias produzidas

no cérebro e responsáveis pela sensa-ção de prazer - faz diminuir a liberação de cortisol - o hormônio do estresse - e por fim, regula a freqüência cardíaca”, diz Muszkat, que é um dos coordena-dores do In Music, grupo de cientistas da Unifesp que estuda a ação da músi-ca sobre o corpo. O efeito da música é semelhante à sensação de prazer pro-porcionada pelo sexo ou pelo chocola-te, por exemplo. Não é de hoje que se notam esses be-nefícios. Há muitos anos atrás Platão revelou especial admiração pelo estu-do dos efeitos da música sobre os se-res humanos e, em particular, por seus efeitos terapêuticos. Ele afirmava que “a música é o remédio da alma” e que chega ao corpo por intermédio dela. Ainda segundo o filósofo, “a alma pode ser condicionada pela música as-sim como o corpo pela ginástica.” Para os estudiosos, a influência da música atinge diversos órgãos e siste-mas do corpo humano. Ela funciona como “remédio” para muitos proble-

mas, como pontuam a pediatra Ana Escobar e a musicoterapeuta Marly Chagas: •Induz ao movimento •Melhora a comunicação: •Cria vínculos •Ameniza a dor •Acalma •Fortalece a memória •Promove o autoconhecimento Quanta coisa boa, não é mesmo?É por tudo isso que o pesquisadoramericano Michael Miller reco-menda: “de 20 minutos a meiahora de música agradável, vá-rias vezes por semana, já éuma boa pedida”. Que talcomeçar agora?

Cá pra nós, quem é que não gosta de ouvir música, não é? Não há com-panhia melhor na hora de relaxar, de se divertir, de cair na nostalgia, até de se concentrar em algo. Como compa-nheira fiel, a música merece um espa-cinho especial em nossos corações, e é pensando nesse mérito que a Estúdio 11, revista do laboratório Reverso, se dedica exclusivamente a tratar desta arte, trazer informações, curiosidades e novidades sobre o mundo musical em geral e especialmente sobre a mú-sica na Bahia. Nesta edição estamos trazendo en-trevistas com cantores do Recôncavo baiano, como Levy Emmanuel, Ian Ferreira e Nenho do Arrocha. Também matérias especiais sobre o papel da música no desenvolvimento infantil e sobre a vida dos cantores de barzinho. Sem mais delongas, solte o som!

carta ao leitor

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Por Wiliane Passos

Coluna

Música para o coração

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Em cada nota musical, um se-gundo a mais de concentração e dis-ciplina. A música é a arte de combi-nar sons e silêncio. As crianças que praticam música desenvolvem ha-bilidades e capacidades intelectu-ais como atenção, raciocínio lógico e paciência. Os pais têm buscado cada vez mais atividades que con-tribuam para o crescimento de seus filhos e que também auxiliem no desenvolvimento cognitivo. A mú-sica é uma boa alternativa, por se tratar de uma forma de expressão artística livre, que encanta e ensina. Percebendo alguns excessos de hiperatividade e falta de paciên-cia na filha, Aline Rezende matri-culou Júlia no piano aos sete anos de idade. Hoje com nove anos, Jú-lia também pratica violão e afirma que ama tudo que envolve música, “Amo cantar, dançar, tocar, encaro minhas aulas como algo divertido, é como brincar”. A mãe relata que percebeu uma progressão signifi-cativa no temperamento da filha nesse período de dois anos, e uma melhora na atenção, concentração e dedicação nas atividades escola-res. Ela cita a descoberta do talento musical na Julia devido a ela pos-suir grande facilidade de aprender qualquer música. A musicista Thalita Passos, espe-cialista em musicoterapia e coral, trabalha com crianças há oito anos e enfatiza que o processo de musi-calização infantil é longo e por isso deve haver identificação por parte do aluno e para isso as atividades musicais devem ser dinâmicas, chamativas e engraçadas para não se tornarem monótonas. O neuro-logista Antônio Carlos Farias ex-plica que O cérebro nasce com de-terminado número de neurônios e cada aprendizado ajuda a formar um novo circuito de memórias. “A música ajuda na medida em que desenvolve os sentidos, ensina rit-mos, desenvolve habilidades sensó-

rias, motoras e estimula o raciocínio matemático e aritmético”. Nos Estados Unidos foi realizado um estudo em duas escolas. Os pes-quisadores avaliaram um grupo de crianças que se dedicavam ao estu-do do piano. No período de três anos os alunos de piano foram comparados a ou-tros que nunca tiveram aula de mú-sica. A conclusão da pesquisa foi que os alunos que praticavam pia-no possuíam um melhor vocabulá-rio que os demais avaliados. A psi-copedagoga Quézia Bombonatto, presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia, explica que a leitura musical é feita por meio de códigos, onde a criança precisa aliar

a leitura das notas com o ritmo e a melodia. As crianças que passam pelo processo de alfabetização mu-sical ampliam suas possibilidades de lidar com códigos, sejam verbais ou não. “Como têm as funções ce-rebrais mais estimuladas, elas au-mentam suas possibilidades para adquirir conhecimento, afirma.” O aprendizado musical também pode facilitar a concentração e a identificação de diferentes vozes num ambiente barulhento, como destaca outra pesquisa realiza-da pela Northwestern University, de Illinois, nos Estados Unidos. Segundo os pesquisadores, a ha-bilidade de perceber diferentes padrões de som, como diferentes

Com todos esses benefícios, é claro que não poderia faltar música nas escolas. Devido a aprovação da Lei nº 11.769 as escolas brasileiras têm que acrescentar à sua grade curricu-lar a música. Para a pedagoga Aline Tavares, a música trabalhada nas es-colas, além de desenvolver caracte-rísticas primordiais nas crianças do ensino fundamental, traz consigo a possibilidade do uso lúdico, para enfatizar um determinado assunto, ou fixar um conteúdo importante. No entanto, a despeito de sua natu-reza multifacetada, a música deve ser ensinada e transmitida como a arte que é, para que a escola crie in-divíduos cultos e conhecedores da mesma. Sendo assim, a inserção da música na grade escolar é mais que simplesmente o cumprimento de uma lei, é um privilégio de amplo conhecimento a todos.

Agora é lei da criança

A música no desenvolvimento

E11: Fale um pouco sobre o início de sua carreira.

Levy: O início de tudo sempre é movido pelo so-nho... E foi desta forma que comecei; sonhando muito em

trabalhar com a arte do belo: a música. Pois nada é mais profundo à alma do que o amor e a mú-sica.

E11: Além de cantar, você compõe. O que te inspira a compor suas canções?

Levy: A vida por si só é inspiradora, basta se ob-servar em volta. Outros fatores também, como momentos, pessoas, histórias de vida, enfim, tudo pode ser um motivo para a poesia sonora.

E11: Como você analisa o momento musical do Brasil, e principalmente da Bahia?

Levy: Me preocupa muito. Eu penso que, até mesmo as ideias mais sublimes, quando muito repetidas, perdem a sua essência. E com muita sensatez percebo pouquíssimas ideias sublimes no cenário da música baiana/brasileira. São re-petições rítmicas, mesmices patéticas. A musi-calidade brasileira nos últimos tempos tem se distorcido integralmente, em diversos estilos, concepções harmônicas, e especialmente no que se refere à letra. É um estúpido mercado musical no Brasil e na Bahia, que nada tem a ver com criatividade, arte, cultura ou educação; sem ne-nhuma qualidade de ideias musicais. Hoje qual-quer um pode ser qualquer coisa na mão de um grande empresário que se oportunize de tais si-tuações, modismos ou comportamentos.

E11: Em sua carreira, você já dividiu o palco com no-mes da música nacional como Chico César, Vander Lee, Jorge Vercilo, Lenine e muitos outros. Como você avalia esses momentos?

A Estúdio 11 conversou com o cantor Levy Emmanuel dos Santos, ou apenas Levy Emma-nuel como é apresentado nos seus shows. Ele 12 anos de carreira e quatro CDs lançados, o mais recente trabalho é intitulado Pelos Ângulos do Tempo. Amante da música e da poesia, os seus versos encantam não apenas o Recôncavo, mas já se espalharam pelo Brasil, Chile e Argentina. Dentre as suas canções destaca como as mais marcantes Os caminhos do amor, Edleuza, Lem-brança e Alma de Aço.

Confira a seguir a entrevista.

Estúdio 11: Como você descobriu sua vocação?

Levy Emmanuel: Sentindo a natureza de todas as coisas transformadas em música e poesia...

vozes que falam ao mesmo tempo, é estimulada pelo estudo de músi-ca. Esse processo é um ponto posi-tivo na concentração da criança que precisa ler em um lugar barulhento, por exemplo. Além destas características, uma das mais importantes desenvolvi-da é a paciência e persistência. No estudo de partitura o aluno percebe que precisa doar horas do seu es-tudo para terminar uma música e que nem tudo acontece tão rápido. É preciso esforço, treino, disciplina. Ele desperta essas características não só na música, mas também no convívio social e na construção aca-dêmica.

Levy: São momentos em que elevo meus pen-samentos ao criador de tudo e de todos e con-centro-me na importância de mostrar aos outros a importância do sentimento através da música.

E11: Você se define, primeiramente, como músico ou poeta?

Levy: Primeiramente, como ser humano, falho e crescente, mas aberto para sentir a poesia e a música.

E11: Você tem um público consolidado. A que você atribui isso?

Leyv: Imagino que seja pela responsabilidade que exijo de mim mesmo ao proporcionar algo que é necessário à alma humana:

E11: Você já tocou ou ainda toca em barzinho? Como você analisa essa experiência?

Levy: Sim, já toquei bastante em barzinhos. Esta experiência é grandiosa à vida de qualquer mú-sico. No mas, no barzinho é onde tudo começa.

E11: Você participou de grandes eventos culturais como o Festival de Inverno de Lençóis e o Festival de Canções Latino – Americano, em Buenos Aires. Fale um pouco desses momentos.

Levy: A todos os lugares aonde a música me proporcionou ir tive a honra e o prazer de mos-trar o que tenho em mim e o que temos na de música popular brasileira. É um desafio custoso e árduo, mas o resultado é fascinante.

E11: Fale do seu novo trabalho, o cd Pelos Ângulos do Tempo.

Levy: É a concepção de mais um filho, vindo de muito esforço, com o mesmo amor, cuidado e a simplicidade dos outros irmãos. Eu canto para que o sentimento seja ouvido e levado à alma. Alma, espaço infinito onde o amor tem som de música!Levy

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Por Reisania Karla

Por Andrêi Borges

Emmanuel Foto por Melinna Pereira

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Baiano, nascido em Salvador, Ian Ferreira ainda criança foi morar em Jacobina. Voltou à capital baiana para estudar, porém nas férias escolares não deixava jamais de ir à conhecida ci-dade do ouro. Um dia ao retornar dos descansos de Jacobina, visitou seu tio Zé Carlos, que mora até hoje no bair-ro Iapi, em Salvador. Lá encontrou um violão quebrado pelos dentes raivosos de um cachorro da raça pastor-alemão. Ian gostava de ir à casa do tio para con-templar o violão, e por muitas vezes, chegou a pedir:- Poxa, meu tio, me deixe levar o violão para casa! Eu quero aprender a tocar.- Não, deixa o violão aí! - respondia o tio. Zé Carlos não tocava no instrumen-to, nem o filho dele. O violão era como qualquer outro objeto da casa. Apesar disso, ele só deu para o sobrinho quan-do quebrou. Ian levou para um senhor de nome Cajui, que trabalhava com marcenaria na base aérea de Salvador. Ele consertou o violão, com o qual Ian

Ferreira deu os seus primeiros dedi-lhados. Olhava um, olhava outro para aprender. Isto por volta dos 15 anos. Ian segue a filosofia de que a música

é uma soma de 95% de transpiração e somente 5% de inspiração. “A música para mim se construiu com muito suor. Eu sempre toquei muito, ficava muitas horas por dia no instrumento”, disse--me ele. A sua evolução foi rápida. Em menos de cinco anos Ian tocava em bandas de diversos ritmos, como por exemplo MPB, axé, heavy metal, etc. Em razão da sobrevivência, chegou a tocar por um prato de comida, mas já tocou também por uma boa amizade e uma cervejinha. Não quis conhecer no-

vos instrumentos, queria se dedicar tão somente ao violão. “Se eu fosse tocar outros instrumentos, na minha concep-ção, ia tocar um pouco de cada instru-

Ian

Uma viagem rio acima

Ferreira

mento. Eu queria saber muito sobre o violão. Este foi o caminho que eu tri-lhei”, contou. Aos 26 anos, no entanto, o destino ar-mou uma surpresa. Ele foi comprar um novo violão na cidade de Feira de San-tana. Chegando lá, observou um instru-mento empoeirado no cantinho. - Que instrumento é aquele? - pergun-tou Ian.- Ali é uma viola. - respondeu com des-prezo o vendedor. - Deixa eu ver essa viola - pediu.

- Mas tem esse violão aqui. - disse o vendedor, querendo vender o violão, pois sabia que o valor era maior.Ian persistiu e saiu da loja com o violão

e a viola nos braços. “O aprendizado foi muito tranquilo”, diz ele. “Eu pe-guei toda a base harmônica e do clássi-co que tinha e apliquei na viola”. Mas é óbvio que precisou se adaptar às novas cordas, às afinações e às sonoridades. Após ouvir os violeiros Fernando De-ghi e Ivan Vilela, Ian teve a convicção de que desejava mesmo traçar o cami-nho da viola. Ele aponta Fernando So-dré como ícone da viola.“Tem vários nomes que estão traba-lhando muito em prol desse fomento da viola. Hoje em dia, eu me sinto parte desse movimento da cadeia produtiva”, afirmou ele. Em agosto deste ano Ian lançou a sua primeira obra “Uma via-gem Rio Acima”, na cidade de Cruz das Almas. Ian conta que, certa vez, enquanto tocava em casa a música Ma-tagal, sua mãe comentou sobre a beleza da música. Ian não lhe disse que a mú-sica era de sua autoria. Talvez porque quisesse ouvir um elogio ou uma críti-ca, não de uma mãe, mas sim de outra pessoa sobre sua obra. Dizem por aí que elogio de mãe não conta. Aos olhos dela, nós somos Shakespeare, Beetho-ven, Machado de Assis ou Scorsese. Em uma palavra, o melhor.“Não tem pagamento melhor do que ela chegar pra mim e falar ‘meu fi-lho, quando ouço seu disco é a mesma coisa que você estar aqui em casa, me mata sua saudade’”, disse ele. Quando perguntei aonde Ian deseja chegar, ele simplesmente respondeu:“Quero chegar no coração das pesso-as”, e finalizou.

Por Rodrigo Daniel

perfil de

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Foto por Vanessa Araújo

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público, que não poupa os elogios me-recidos, mas não titubeia em rechaçar oque não o agrada. O músico Léo Senaafirma que esse tipo de trabalho permiteao artista aperfeiçoar-se na sua profissão,segundo ele “um ponto positivo é a ex-periência adquirida e o aguçamento dacapacidade de improvisação; no bar-zinho as intervenções do público sãoconstantes e músicas que estariam forado repertorio aparecem em pedidos cons-tantes e às vezes insistentes, e acabam en-trando como parte improvisada do show”.O também músico e figura frequente nos bar-zinhos do Recôncavo, Rodolfo Assunção,acrescenta que somado a isso os bares funcionam

como aliados na divulgação do traba- lho. “Os bares são para os músicos como uma vitrine. Ali estamos expondo o nosso trabalho para possíveis contratantes. É mui- to comum sermos contra- tados por pessoas que nos escutaram em um desses estabelecimentos”. Mas nem tudo são flo- res para aquele que se dedica a esse ofício. Alguns fatores muitas vezes dificultam a vida do cantor. Geralmente eles têm hora marcada pra

iciar o seu show, mas nunca para aca-bar. O público costuma solicitar numa insistência quase exigente que o show se estenda mais e mais. Somado a isso muitas vezes vem o baixo valor do cachê pago pelos donos de bares, a falta de camarim e a necessidade que o músico tem de investir por si próprio em som e equipamentos para garantir a qua-lidade do seu trabalho. Como revela Léo Sena, “um dos maiores problemas é a desvalorização do músico, principal-mente expressada pelo pagamento de cachês, praticamente simbólicos, mui-to pequenos. A duração dos shows e a falta de estrutura da maioria dos esta-belecimentos (apoio e aparelhagem de som) também surgem como pontos a serem melhorados. Cada apresentação de barzinho tem em média três horas deduração, e esse fator aliado aos outros tornam as apresentações desgastantes para o artista”. Como a maioria das profissões, dedi- car-se a cantar em bares pode ter seus altos e baixos. Algumas vezes, ter êxito nessa carreira é uma lo- teria, n’outras tantas depende de conseguir consolidar-se no mercado, podendo assim es- tabelecer algumas exigências ao oferecer os seus serviços. Mas ainda assim o que conta é a vocação, é esta que leva muitas vozes a embalar as noites de um público ávido por boa comida e boa música. “Com todas as dificuldades vale ressaltar que essa é uma ati- vidade prazerosa que acaba sen- do executada por amor à musica e à arte, já que diante das adversi- dades financeiras, estruturais, e da falta de reconhecimento, se torna uma atividade que não é tão recom-pensadora e que quase sempre é exerci-

Cantores da noiteAs dores e as delícias de cantar Eles são

figurinha obri-gatória nos me-lhores bares dequalquer lugar, osmúsicos de barzinhoestão cada vez mais pre-sentes no lazer daquelesque gostam de desfrutar deum delicioso jantar ouvindouma boa música. O bar é um dos ambientes onde ocantor tem a oportunidade de inte-ragir de maneira muito íntimacom público. Essa possibilidade acon-tece graças à maneira com se organizaesse ambiente. Um pequenopalco, muito próximo de ondegeralmente estão organizadasas mesas que acomodarãoa “plateia”. Cantar nesse tipo de estabe-lecimento também possibilitaao profissional educar sua vozpara não agredir os ouvidos dopúblico, desenvolver técnicasde concentração e aperfeiçoaro repertório. Além de podercontar com a sinceridade de um

Jorge olha o relógio pela décima vez em menos de duas horas, está ansioso para cumprir o seu destino de todas as sextas-feiras. Ele é muito importante, muitos precisam dele, e o tempo insiste em prendê-lo naquele lugar onde o que lhe resta é bater alguns carimbos e dis-tribuir os documentos nos seus devidos lugares. Mas agora falta pouco, falta muito pouco. E a sua arma o espera, no seu armário, cuidadosamente embrulha-da para que não sofra nenhum tipo de dano. Juntos eles são invencíveis, são capazes penetrar no mais profundo da alma humana. Tudo podem, tudo ven-cem. Absolutamente tudo. Enquanto espera, quase que num sur-to psicótico, que chegue o fim do seu expediente, aproveita para recordar os grandes feitos nas noites passadas. Re-corda-se do jovem casal que adentrou o restaurante na última sexta-feira. Os anos de experiência o ajudaram a re-conhecer o que passa no coração de cada casal, de cada grupo de amigos ou cada alma solitária que adentra aquele recinto. E ele sabia que aqueles jovens sofriam. Ela estava zangada, magoada, certamente por alguma besteira dita ou feita por aquele rapaz que mal conse-guia sustentar o olhar, pois sobre ele pairava o peso do arrependimento. Imediatamente entrou em ação. Ele sabia que se não agisse rápido e cer-

teiro, aqueles dois corações poderiam separar-se e nunca mais se juntariam novamente. Recorreu rapidamente ao banco de dados guardado na memória, precisava da música perfeita, aque-la que ao mesmo tempo abrandasse o coração da linda moça e fornecesse ao cavalheiro as palavras perfeitas para re-conquistar o seu amor. Ele encontra a música perfeita, sabe que não terá erro, coração nenhum re-siste a esse clássico do Rei. Desembru-lha imediatamente o seu violão, limpa a voz (tudo tem que sair perfeito) e engata um “Eu tenho tanto pra lhe fa-lar, mas com palavras não sei dizer...”. Não tira os olhos do casal em busca dos primeiros sinais de que seu plano deu certo. Não demora muito e os sinais aparecem, o rapaz segura suavemente a mão da amada, encosta a boca em seu ouvido e como um coro o acompanha até o final da música. Ela nem liga em disfarçar as lágrimas que rolam em seu rosto. São lágrimas de alegria. Jorge termina a música, certo de que salvou a noite daquele casal, e a partir daquele momento definementalmente todo o repertório que vai embalar os bei-jos apaixonados no resto da noite. Ele está satisfeito, essa é a sua vocação: resgatar do sofrimento os corações par-tidos que adentram aquele bar. Por isso ele precisar ir, ele sabe que o seu traba-lho é muito importante. Mas é nas ho-

ras vagas que ele é verdadeiramente útil, é ali naquele pequeno bar que ele tem o poder de transformar os corações, naquele bar ele éum herói. O relógio despertou, ele precisa ir. Despede-se ra-pidamente dos seus companheiros de trabalho, pega o seu vi-olão cuidadosamente embrulhado e vai cumprir o seu papelde herói nas horas vagas. Por Reisania Karla

nas horasHerói

da paralelamente a outra mais estável e ren-tável”.Léo Sena, músico e professor.

Por Reisania Karla

em barzinhos vagas

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Crônica

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Arrocha coladinhoMovimento musical tem em Nenho um nome em ascensão no

Nascido e criado no bairro do Caquende em Cachoeira, o cantor e compositor Nenho, 27 anos, é atualmente um dos nomes de maior destaque do movimento Arrocha no Recôn-cavo. Suas canções tocam nas principais rádios da região, seu CD está nas casas de muita gente e nos carros que circulam pela cidade no final de semana é audiência garantida, além do show que virou sinônimo de casa cheia. Sua voz é marcada pelo timbre agudo, suas músicas por um romantismo que contagia um público fiel e ascendente, suas fotos estampam paredes das cidades divulgando shows, suas redes sociais estão lotadas e seu bordão “coladinho, coladi-nho” está na boca de crianças e adultos. Atualmente ir à Ca-choeira e não ouvir o cantor e instrumentista Nenho “falando de amor” em algum lugar é quase impossível. Nenho percebeu que queria seguir o caminho musical aos 12 anos de idade, quando ingressou nas escolas de música das filarmônicas locais. A partir daí, começou a soltar a voz e aos 15 anos já cantava em aniversários e festas de casamen-to fazendo voz e teclado. Segundo ele, a família e os amigos desempenharam um papel importante nesse processo, pois desde o inicio o incentivou a cantar. “Se em algum momento eu duvidei que a música fosse o meu caminho, minha família esteve sempre por perto pra dizer que era um caminho pos-sível sim.” A partir daí, começou a cantar em serestas, fazer festas par-ticulares, cantar em eventos públicos e foi criando afinidade com o público. Hoje é presença garantida nos principais eventos musicais de Cachoeira e outras cidades se reve- lando um dos principais cantores do movimento Arrocha na região. Perguntado sobre porque a opção pelo Arrocha, não ttubeia. “Hoje não me vejo cantando outra coisa. Inclusive comecei cantando Reggae, mas não tive como fugir do Arrocha, minha voz se identi- ficou plenamente com esse estilo”.

Sobre a carreira

Nenho acabou de gravar seu primeiro CD intitulado “Nenho falando de amor”, com 14 faixas que mescla composições autorais e outras já conheci-das do publico, o carro chefe é a música “Nos meus sonhos”. O compacto foi produzido num estúdio em Salvador com recursos pró-prios e tem distribuição gratuita nos Shows. Segundo ele, a recepção do público ao trabalho é altamente positiva e a estratégia de divulgação do CD tem funcionado. “Nós distribuímos o CD entre os fãs e disponibiliza-mos na internet”, e acrescenta, “fico emocionado ao ver que as pessoas têm reconhecido o meu trabalho”.

Sobre o CD

Em seu show, Nenho é acompa-nhado por uma banda composta por cinco músicos, o repertório re-úne as canções do Cd e outras que fazem sucesso na voz de outros cantores. O show é sua principal fonte de renda e diferente de ou-tros momentos da vida, hoje o can-tor não precisa desenvolver outras atividades e consegue manter-se financeiramente com esse trabalho, atualmente sua agenda de shows está comprometida todos os finais de semana. “Graças a Deus, hoje eu vivo do meu trabalho com a música, o que é uma experiência maravilho-

sa, que é viver do que mais me dá prazer de fazer, que é a cantar”. Dentre suas referência musicais, quem se destaca é o cantor Pablo, considerado um dos principais no-mes do movimento Arrocha. O can-tor cachoeirano busca seguir o mes-mo caminho do ídolo, e a afinidade entre os dois pode ser percebida no estilo, linha melódica, repertório e no tom de voz. Cantar com Pablo é um de seus sonhos, “meu sonho é dividir o palco com ele, pra mim se-ria um grande prazer” e acrescenta a razão desse desejo. “As músicas de Pablo tocam na alma”.

A banda, as referências, o show e os sonhos

Apesar do sucesso que faz, o arro-cha ainda enfrenta preconceito por ter suas composições simples, pelas letras que retratam problemas da vida amorosa e por sua dança con-siderada sensual. Mas apesar disso, tem conquistado espaço na mídia e adeptos por todo Brasil. “Nenhum ritmo de forma alguma poderá agradar a todos os públicos, mas é preciso respeitar e reconhecer que o arrocha não para de crescer”, pon-tuou. Para o cantor, ao falar sobre o mo-vimento Arrocha é preciso definir primeiro de qual estilo do movi-mento se está falando. “É perigoso generalizar, existem várias manei-ras de classificar o arrocha, existem ritmos diferentes dentro do mesmo estilo, no meu caso o arrocha é ro-mantismo, por que falo de amor e isso agrada o publico e é sucesso”, enfatizou.

Mas Nenho não está satisfeito com o que já conseguiu e se mostra oti-mista ao falar do seu futuro. “Meu sonho é conquistar a fama, espaço que eu possa crescer enquanto artis-ta. Por onde temos passado somos aplaudidos de modo que minha vi-são é de sucesso”, finalizou.

Sobre o arrocha

Recôncavo da Bahia

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Por Mário Jorge

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