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REVISTA DO CINECLUBE Cachoeiro de Itapemirim- ES - Folha do ES - Cineclube Jece Valadão página 01 por Gilson Leão e Beto Souza Subi a escada contando os degraus. Vinte e nove, se não me engano. A casa de Zé não tem campainha nem companhia. Árvores hab- itam os terrenos vizinhos. Grito. Grito mais uma vez. Zé vem me receber de cueca e gorro. Parece contente com minha visita. Entro calculando onde pisar. Zé trabalha muito. Seus trabalhos, pequenas esculturas em argila, preenchem o chão de sua casa. Ele me serve café. Me oferece um cigarro de palha. É um homem generoso. Solidão. Nos encontramos pela solidão. Só assim nos entendemos. Nos entendemos o suficiente para que seja possível nosso encontro. Ele diz que fez uma escultura para assustar os mosquitos. De fato, não há um só mosquito. Solidão. Peço para ver a escultura. Ele diz que é melhor não. Se espanta até um mosquito, eu poderia ficar cego. Ou correr até vomitar meu coração. Tomo mais uma taça de café. É. Zé serve café em taças. É um homem elegante. Tem um recorte de jornal colado na porta do seu banheiro. Uma imagem do Oscar Wilde. Embaixo dela escreveu UNISEX com giz de cera. Zé me oferece uma manga. Zé espera as mangas caírem do pé. Diz que é preciso estar com uma fome gigante para se matar um animal para comer. Também me oferece um palito de dente. Diz que está bem lava- do. Eu não aceito a manga e uso o palito para ajustar o fumo do cigarro de palha, que se apaga. Ouço a filha mais nova do Zé gritar do quarto: Estou pronta! Tiro meus sapatos. Zé não permite que se entre em sua casa sem eles, por isso estou calçado até agora. Entro no quarto. Ela é linda. Está nua. Usa colares de ouro. Deito na cama e fecho os olhos. Ela respira fundo. Faz uma oração em espanhol. Então me levanto, saio do quarto, abraço Zé (ele não gosta de agradecimentos ), calço os sapatos e vou embora. Curado. Refugiado em seu apartamento de Guaraparí, ele tem criado muito, e como é de seu feitio, em todas as manifestações artísticas. Seu primeiro conto não tem título, o que, em se tratando de Mourad, não é de se estranhar. Como também não é de se estranhar a qualidade de tudo que este “enfant terrible” da cultura cachoeirense se propõe a fazer. Outros amigos, diletantes ou profissionais da cultura, jornalistas ou artistas, que tenham interesse em publicar conosco podem fazer contato através do email do cine- clube: cineclubejecevaladão@hotmail. com . FAZ UMA ORAÇÃO EM ESPANHOL CONTO 01 Passado este período tivemos uma respos- ta amplamente positiva e começamos a receber matérias de Bruno Torres Paraíso e Clauber Fabre, do Rio de Janeiro, Cássio Cavalcanti, de Recife, Roberto Pimentel, Hilda Helena Mancine, Fabiano Herken- hoff, de Vitória, Sergio Garschagen de Brasília, Delcley Machado de Belém do Pará, Maria Elvira e Higner Mansur, de Cachoeiro...................entre outros. Vamos então reiteirar o convite: ACEITAMOS COLABORAÇÃO EM ARTIGOS SOBRE ASSUNTOS CUL- TURAIS DE TODOS OS AMIGOS QUE SE INTERESSAM PELAS “BELAS ARTES”. ESCREVA SOBRE CINEMA, VÍDEO, PROPAGANDA, ARTES PLÁSTICAS, LITERATURA, ETC.........E MANDE PARA NÓS. ESTE ESPAÇO PERTENCE A CUL- TURA ! cineclubejecevaladã[email protected] Felipe Mourad..... músico, compositor, artista plástico, performer de butô, escritor, poe- ta, nasceu em 1982 e mudou para Guaraparí em 2012. É um de nossos primeiros colabora- dores, mas anda devendo matéri- as......... Felipe Mourad - Guarapari, 28/12/2011 Há quase um ano, publica- mos na Folha a seguinte informação: Atendendo a várias sugestões, ini- ciamos hoje nova coluna em nossas páginas na Folha do ES, falando so- bre Artes. Estreiamos com Felipe Mourad, um de nossos colaboradores mais habituais,

REVISTA MENTAL COLABORADORES 1

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Page 1: REVISTA MENTAL COLABORADORES 1

REVISTA DO CINECLUBE Cachoeiro de Itapemirim- ES - Folha do ES - Cineclube Jece Valadão página 01

por Gilson Leão e Beto Souza

Subi a escada contando os degraus. Vinte e nove, se não me engano.

A casa de Zé não tem campainha nem companhia. Árvores hab-itam os terrenos vizinhos.

Grito. Grito mais uma vez. Zé vem me receber de cueca e gorro.

Parece contente com minha visita.

Entro calculando onde pisar. Zé trabalha muito. Seus trabalhos, pequenas esculturas em argila,

preenchem o chão de sua casa. Ele me serve café. Me oferece um cigarro de palha. É um

homem generoso. Solidão. Nos encontramos pela solidão.

Só assim nos entendemos. Nos entendemos o suficiente para que seja possível nosso encontro.

Ele diz que fez uma escultura para assustar os mosquitos. De fato, não há um só mosquito.

Solidão. Peço para ver a escultura. Ele diz que é melhor não. Se espanta até um mosquito, eu poderia ficar cego. Ou correr até vomitar

meu coração.

Tomo mais uma taça de café. É. Zé serve café em taças. É um homem elegante. Tem um recorte de jornal colado na porta do

seu banheiro. Uma imagem do Oscar Wilde. Embaixo dela escreveu UNISEX

com giz de cera.

Zé me oferece uma manga. Zé espera as mangas caírem do pé. Diz que é preciso estar com uma fome gigante para se matar um

animal para comer. Também me oferece um palito de dente. Diz que está bem lava-do. Eu não aceito a manga e uso o palito para ajustar o fumo do

cigarro de palha, que se apaga.

Ouço a filha mais nova do Zé gritar do quarto: Estou pronta!

Tiro meus sapatos. Zé não permite que se entre em sua casa sem eles, por isso estou calçado até agora.

Entro no quarto. Ela é linda. Está nua. Usa colares de ouro. Deito na cama e fecho os olhos. Ela respira fundo.

Faz uma oração em espanhol. Então me levanto, saio do quarto, abraço Zé (ele não gosta de

agradecimentos ), calço os sapatos e vou embora.

Curado.

Refugiado em seu apartamento de Guaraparí, ele tem criado muito, e como é de seu feitio, em todas as

manifestações artísticas. Seu primeiro conto não tem título, o que, em se tratando de Mourad,

não é de se estranhar. Como também não é de se estranhar a

qualidade de tudo que este “enfant terrible” da cultura cachoeirense se

propõe a fazer.

Outros amigos, diletantes ou profissionais da cultura, jornalistas ou artistas, que tenham interesse em publicar conosco podem fazer contato através do email do cine-

clube: cineclubejecevaladão@hotmail.

com .

FAZ UMA ORAÇÃO EM ESPANHOL

CONTO 01

Passado este período tivemos uma respos-ta amplamente positiva e começamos a receber matérias de Bruno Torres Paraíso e Clauber Fabre, do Rio de Janeiro, Cássio Cavalcanti, de Recife, Roberto Pimentel, Hilda Helena Mancine, Fabiano Herken-hoff, de Vitória, Sergio Garschagen de Brasília, Delcley Machado de Belém do Pará, Maria Elvira e Higner Mansur, de Cachoeiro...................entre outros. Vamos então reiteirar o convite:ACEITAMOS COLABORAÇÃO EM ARTIGOS SOBRE ASSUNTOS CUL-TURAIS DE TODOS OS AMIGOS QUE SE INTERESSAM PELAS “BELAS ARTES”. ESCREVA SOBRE CINEMA, VÍDEO, PROPAGANDA, ARTES PLÁSTICAS, LITERATURA, ETC.........E MANDE PARA NÓS.

ESTE ESPAÇO PERTENCE A CUL-TURA !

cineclubejecevaladã[email protected]

Felipe Mourad..... músico, compositor, artista plástico, performer de butô, escritor, poe-ta, nasceu em 1982 e mudou para Guaraparí em 2012. É um de nossos primeiros colabora-dores, mas anda devendo matéri-as.........

Felipe Mourad - Guarapari, 28/12/2011

Há quase um ano, publica-mos na Folha a seguinte informação:Atendendo a várias sugestões, ini-ciamos hoje nova coluna em nossas páginas na Folha do ES, falando so-bre Artes.Estreiamos com Felipe Mourad, um de nossos colaboradores mais habituais,