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CURSO DE DIREITO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO NO CONTRATO DE CONCESSÃO RUBENS DECOUSSAU TILKIAN SÃO PAULO 2.004

RUBENS DECOUSSAU TILKIAN - Portal FMU · do equilíbrio econômico-financeiro do contrato como uma garantia incontestável. Portanto, advindo fatos imprevistos ao contrato de concessão,

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CURSO DE DIREITO

EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO NOCONTRATO DE CONCESSÃO

RUBENS DECOUSSAU TILKIAN

SÃO PAULO2.004

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CURSO DE DIREITO

EQUILÍBRIO ECONÔMICO FINANCEIRO NO CONTRATO DECONCESSÃO

RA: 425.907/4

TURMA: 315-E1

FONE: (11) 3887-6686

Monografia apresentada ao Curso de Direito da UniFmu como requisitoparcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação daProfessora SIMONE GOMES RODRIGUES CASORETTI

SÃO PAULO2004

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Professora Orientadora: ____________________________ Simone Gomes Rodrigues Casoretti

Resultado da Avaliação: _____________________________

________________________________________________

Nota: (______) ____________________________________

Professor (a): _____________________________

Resultado da Avaliação: _____________________________

_________________________________________________

Nota: (______) ____________________________________

Professor (a): ______________________________

Resultado da Avaliação: ______________________________

__________________________________________________

Nota: (______) _____________________________________

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SUMÁRIO

Sinopse

Introdução

1 - O princípio do equilíbrio econômico financeiro

1.1. Considerações gerais

1.2. Conceito de equilíbrio econômico-financeiro

1.3. Fundamentos do equilíbrio econômico-financeiro

1.4. Previsão legal

2 - A aplicação do princípio do equilíbrio econômico-financeiro aos contratos deconcessão de serviço público

2.1. Considerações gerais sobre os contratos de concessão de serviço

público

2.2. A remuneração do concessionário de serviço público

2.3. O prazo de duração das concessões de serviço público

2.4. A adequação na prestação do serviço público

2.5. O financiamento das concessões de serviço público

2.6. Hipóteses de extinção dos contratos de concessão

3 - As hipóteses de quebra do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos deconcessão de serviço público

3.1. Considerações gerais

3.2. Álea ordinária ou negocial

3.3. Áleas administrativas

3.4. Álea econômica extraordinária

4 - As formas para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro dos contratosde concessão de serviço público

4.1. Considerações gerais

4.2. Soluções administrativas

4.3. Solução judicial

Considerações finais

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SINOPSE

Diante do enorme crescimento do país, concomitantemente com a

significante dificuldade financeira que apresenta, o Estado brasileiro não vem

conseguindo atender dignamente à sua função social.

Em virtude desse acelerado crescimento, o Estado deveria

empenhar-se na criação de políticas públicas, objetivando acompanhar à gigante

massa populacional que cresce a cada ano.

Verificando que referidas políticas públicas não surgem no país, a

máquina estatal tornou-se obsoleta, ou melhor, fraca e impotente perante as

necessidades sócio-econômicas, de forma que a população brasileira está carente

quanto aos serviços públicos que deveriam ser prestados adequadamente pelo

Estado.

A única saída que restou, foi a privatização de alguns serviços. A

partir das parcerias entre o ente público e a iniciativa privada que surgiu a

esperança de se obter uma melhoria na prestação dos serviços públicos.

Essas parcerias proporcionaram, ao Estado, a oportunidade de

aliviar os gastos na manutenção de determinados serviços e, ao mesmo tempo,

controlar a prestação adequada do serviço feita pelo concessionário à

coletividade.

No entanto, para que isto ocorra, o Estado deve, primeiramente,

atrair o particular. Ou seja, demonstrar-lhe que todo o investimento disponibilizado

lhe será devolvido na forma de lucro. Além do mais, sabe-se que, pelo fato das

prestações de serviços apresentarem certa complexidade em sua execução, os

contratos administrativos normalmente são de longo prazo.

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É a partir daí que surge a preocupação do particular quanto à

segurança financeira do contrato. Isto porque o Brasil, face à aparente

instabilidade

econômica que enfrenta, deve garantir ao concessionário aquilo que foi pactuado

no contrato, mantendo, dessarte, o seu equilíbrio econômico-financeiro.

Assim sendo, diante da necessidade que o Estado tem de apelar à

iniciativa privada para a delegação de certos serviços, deverá entrever o princípio

do equilíbrio econômico-financeiro do contrato como uma garantia incontestável.

Portanto, advindo fatos imprevistos ao contrato de concessão,

deverá a administração pública agir imediatamente, evitando um prejuízo

desnecessário ao concessionário.

O princípio do equilíbrio econômico-financeiro visa a manter uma

justa relação entre os contratantes, de forma que nenhum obtenha vantagem

calcada no prejuízo do outro, estabelecendo-se com isso, uma relação amparada

pela boa-fé e pela equidade.

Esta justa relação entre os contratantes surge a partir da celebração

do contrato e deverá perdurar até o seu final. A igualdade existente entre os

contratantes é formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo

concessionário no contrato, e do outro, pela compensação financeira a que fará

jus.

Logo, sempre que ocorra um fato que afronte o equilíbrio econômico-

financeiro do contrato, de modo a prejudicar o particular, o Estado deverá,

prontamente, recompor os termos do contrato.

Frise-se que a aplicação do princípio econômico-financeiro não está

condicionada a cláusulas contratuais, mas pelo contrário, a própria Constituição

Federal garante expressamente a sua aplicação.

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Ou seja, mesmo que não venha expressamente previsto no contrato,

a aplicação da garantia do equilíbrio econômico-financeiro é direito do

concessionário. Tal garantia está muito além do simples requisito de previsão

contratual. O princípio do equilíbrio financeiro baseia-se em regras principiológicas

assentes no Direito Brasileiro, quais sejam, (i) o princípio da equidade; (ii) o

princípio da razoabilidade; (iii) o princípio da continuidade do contrato

administrativo e (iv) o princípio da indisponibilidade do interesse público.

Ressalte-se que, ao manter o equilíbrio econômico-financeiro do

contrato, o Estado estará, também, garantindo aos usuários a prestação adequada

do serviço e evitando que o mesmo se deteriore.

A mencionada parceria entre o ente público e a iniciativa privada

estabelece-se através dos contratos de concessão. Estas avenças são regidas

pelo princípio da legalidade, de modo que, tanto o concessionário, como o poder

concedente, submetem-se ao ordenamento jurídico que regula a matéria.

O princípio do equilíbrio econômico-financeiro nos contratos está

explicitamente amparado na legislação brasileira, tanto na Constituição Federal,

como nas leis ordinárias.

A Constituição trata diretamente do assunto em seu artigo 37, XI,

onde a garantia não abrange somente os contratos de concessão mas, também,

todos os contratos administrativos.

No que se refere às Leis infraconstitucionais, podemos citar duas: a

primeira é a Lei 8.987/95 que regula os contratos de concessão em geral; a

segunda é a Lei 8.666/93, que trata das licitações e dos contratos administrativos.

Logo, não há que falar em ausência de previsão legal quanto ao

princípio do equilíbrio econômico-financeiro. Ao revés, o sistema jurídico brasileiro

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prevê, claramente, a garantia ao aludido princípio como direito inerentes aos

contratos de concessão.

Os contratos de concessão apresentam certas diferenças dos

contratos celebrados entre particulares, entretanto, ambos submetem-se à teoria

geral dos contratos.

Todo contrato de concessão é consensual, formal, oneroso,

comutativo e realizado intuitu personae.

Os contratos celebrados com o ente público têm como característica

a mutabilidade. Assim sendo, o poder concedente pode, unilateralmente, modificar

o contrato, objetivando o interesse público. Esta característica está ligada à

existência das cláusulas exorbitantes, que somente são previstas nos contratos

celebrados com a administração pública.

A aplicação das cláusulas exorbitantes, cabe única e exclusivamente

ao poder concedente.

Outra nota importante do contrato de concessão é a de pressupor

sempre um procedimento licitatório. Logo, o contrato celebrado com o particular

deverá observar todos os requisitos expressos no edital de licitação, sob pena de

nulidade.

Nos contratos de concessão, o particular nunca será o dono dos

serviços, muito pelo contrário, este será somente prestador do serviço, e estará

sempre à mercê da supervisão administrativa.

Conforme se sabe, de um lado temos a administração pública

exigindo do contratado a prestação adequada dos serviços, do outro, temos o

concessionário em busca do lucro.

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O lucro do concessionário é auferido através do preço público, mais

conhecido como tarifa, e é utilizado de duas formas. A primeira delas é na

aplicação de parte desse lucro na expansão e melhoria dos serviços públicos, e a

segunda, para reaver o investimento aplicado.

A fixação do preço das tarifas deve atender ao princípio da

razoabilidade, de forma que, as tarifas devem corresponder a um valor acessível

ao usuário e, concomitantemente, permitir ao concessionário a obtenção de uma

justa remuneração. Vale dizer que o princípio da modicidade das tarifas também

está ligado à fixação do preço da tarifa, sendo que tal princípio se esgota no fato

das tarifas deverem corresponder ao menor preço possível sem, é claro,

prejudicar a prestação adequada do serviço público.

Objetivando tornar o preço da tarifa mais baixo, o poder concedente

poderá também outorgar ao concessionário o direito do explorar as receitas

alternativas. Essas receitas são aquelas que não estão ligadas diretamente à

prestação do serviço como, v.g., explorar ao longo de uma estrada os espaços

publicitários.

Vale dizer que a exploração das receitas alternativas objetiva

baratear o preço das tarifas cobradas dos usuários pelo concessionário.

Consigne-se que o valor da tarifa será sempre estipulado pelo poder

concedente, sendo certo que, nem mesmo através de lei, tal competência poderá

ser transferida ao concessionário, que poderá tão somente contribuir com estudos

para fixação desta.

Em se tratando do prazo dos contratos de concessão,

diferentemente dos contratos administrativos, são celebrados por prazos bastante

longos. Esta característica permite ao concessionário a recuperação do seu

investimento, sem que tenha que aumentar o preço da tarifa. Prazos longos,

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conseqüentemente mais tempo para obter lucro e assim cobrir os investimentos

realizados.

Há, nos contratos de concessão, a exigência de que os serviços

sejam prestados pelo concessionário de forma adequada. Entende-se por serviço

adequado o prestado de forma eficiente e através do menor custo ao usuário.

Mais precisamente, no § 1.º, do art. 6.º, da Lei de Concessões

(8.987/95), pode-se verificar os requisitos para a prestação de um serviço

adequado, quais sejam: regularidade, continuidade, eficiência, segurança,

generalidade cortesia, atualidade e, por último, a modicidade da tarifa.

Cabe ao Estado fiscalizar os trabalhos realizados pelo

concessionário, garantindo pois, aos usuários a prestação de um serviço

adequado.

Considerando a complexidade da execução da prestação dos

serviços públicos, bem como os seus elevados custos, é possível ao

concessionário obter financiamentos junto à qualquer instituição financeira para

colaborar na elaboração das obras.

Deve ficar consignado, que esse financiamento está diretamente

ligado à concessão, ou seja, o concessionário somente contrairá o empréstimo

para a consecução das obras necessárias à prestação do serviço.

Poderá ainda o concessionário garantir à instituição financeira, os

benefícios que serão auferidos na prestação do serviço público, visando a garantir

o contrato de empréstimo celebrado.

Neste caso, diante da ocorrência de qualquer fato que acarrete o

desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, deverá a administração

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restabelecer as condições, sob pena de estar prejudicando o concessionário e a

instituição financeira patrocinante da obra.

A quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato poderá

ocorrer por diversas razões.

A primeira delas são as áleas ordinárias. Essas áleas referem-se aos

riscos previstos em todos os contratos, correspondendo à variação de lucro do

concessionário em decorrência da própria flutuação do mercado.

Em segundo, temos as áleas administrativas, que podem acarretar a

quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de duas formas: (i) através

do fato do príncipe ou (ii) através do poder de alteração unilateral da

administração.

O fato do príncipe ocorre quando uma autoridade, da mesma esfera

do governo no contrato celebrado, pratique algum ato que prejudique o

concessionário, de modo a desequilibrar a equação financeira do contrato.

Já o ato da administração, representa a execução de qualquer

conduta da administração que impossibilite a execução do contrato, ou que

prejudique o equilíbrio econômico-financeiro do mesmo. Vale dizer que, o ato

praticado deverá, necessariamente, provir de uma das partes no contrato.

Por último, temos as áleas extraordinárias, que correspondem ao

acontecimento imprevisíveis, inevitáveis, externos ao contrato, causadores de

danos insuportáveis ao concessionário.

A solução da quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato,

será efetuada com base na teoria da imprevisão (antiga cláusula rebus sic

stantibus), evitando assim um prejuízo ao particular contratado.

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Ocorrendo quaisquer das hipóteses mencionadas acima, caberá ao

poder concedente tomar as medidas necessárias ao estabelecimento das

condições iniciais do contrato (encargo/remuneração). Aludidas medidas podem

ser realizadas administrativamente, ou através do Poder Judiciário.

Em princípio, a restauração do contrato deverá ser procedida por via

administrativa, através do seu aditamento. Ocorre todavia que, na maioria das

vezes, mesmo diante do explicito desequilíbrio contratual, o Poder Concedente

não adota as medidas necessárias.

O reequilíbrio econômico-financeiro do contrato dá-se através da

revisão e do reajuste das tarifas.

A revisão pode ser requerida pelo concessionário a qualquer tempo

do contrato, e não precisa estar nele previamente prevista. Conforme dito, é uma

garantia do concessionário prevista na Constituição Federal. O concessionário

deverá apresentar um laudo demonstrando a ocorrência da quebra do equilíbrio

econômico-financeiro do contrato.

Outra modalidade de se manter o equilíbrio econômico-financeiro,

será através do reajuste. O reajuste ocorre, normalmente, uma vez por ano, e

deve vir inicialmente determinado no contrato. O seu objetivo é preservar o

equilíbrio econômico-financeiro estabelecido inicialmente, com o aumento do

preço dos insumos ligados à prestação do serviço, em virtude da inflação.

Caso o poder concedente não atenda à solicitação do

concessionário, caberá a este recorrer ao Poder Judiciário colimando o reequilíbrio

econômico-financeiro do contrato.

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Poderá, entretanto, o concessionário ingressar no judiciário em

busca do pagamento de indenização pelo poder concedente que, não atendendo

ao pedido de revisão contratual, acabou causando dano ao particular.

Poderá ainda, o concessionário requerer medidas acautelatórias. Isto

ocorrerá quando a administração pública estiver em mora com o particular,

tornando pois, insuportável a execução do contrato. O particular somente poderá

paralisar o serviço mediante deferimento judicial. Caso contrário, deverá

permanecer prestando os serviços pois, conforme se sabe, os serviços públicos

não podem parar.

Diante do exposto, restou claro que o poder público deve respeitar o

equilíbrio econômico-financeiro nos contratos, sob pena de estar infringindo às

normas constitucionais.

O respeito a tal princípio é fundamental para atrair, cada vez mais,

os particulares para ajudarem a administração pública na prestação do serviço

público adequado a coletividade.

Como exemplo, basta olharmos para o cenário atual para

percebermos que o Estado, mais do que nunca, esta solicitando o auxílio da

iniciativa privada.

Existem diversos projetos de parceria entre o poder público e o

privado, conhecidas como “PPP”. É através dessas medidas que o Estado vem

tentando suprir sua deficiência financeira, e conseguir, através da iniciativa

privada, atingir seus objetivos perante a sociedade.

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INTRODUÇÃO

Seria, no mínimo, estranho, ignorar o fato do Estado Brasileiro, nos

últimos 15 anos, vir sofrendo imensa perda de seu potencial econômico. Apesar

de inúmeros planos financeiros terem sido implementados no país, verifica-se que

o Estado continua estático, ou seja, sem capital para novos investimentos e

limitado por todos os lados, de maneira a tornar seu crescimento quase

imperceptível.

Hoje em dia, vivemos num mundo globalizado, onde a concorrência

e os desenvolvimentos tecnológico e social instigam, cada vez mais, a

responsabilidade dos governantes em dar ao seu povo o melhor e o mais

adequado tratamento, de maneira que o país com o trabalho da sociedade, possa

convenientemente acompanhar o desenvolvimento global.

Mas, infelizmente, o Brasil vem demonstrado que suas políticas

públicas não têm alcançado o resultado esperado, já que as contas do país estão

totalmente falidas, de forma que fica quase que impossível oferecer a sua

população um digno crescimento e desenvolvimento social.

Por outro lado, sabe-se que o mundo caminha aceleradamente,

prova disso é o desenvolvimento de novas potencias que vem se destacando no

cenário mundial, como por exemplo, a China, a Índia e mais recentemente o

Japão.

Pode-se dizer que o Estado Brasileiro engordou demais,

promovendo assim, crescimentos tecnológico e social incompatíveis com o

crescimento populacional, onde a falta de políticas públicas, decorrente da

insuficiente condição financeira, é sem dúvida, uma das potentes razões.

Em conseqüência disso, o país mantém, hoje, um aparelho obsoleto,

tanto nas suas repartições públicas, como nas empresas públicas e nas

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sociedades de economia mista, que são administradas de forma condenável e, na

maioria das vezes, destituídas de um espírito empresarial.

Se por um lado, em nosso país, a Administração Pública mantida

sob lamentável estrutura atende a população utilizando-se de métodos arcaicos, o

que pode até ser comparado aos tempos medievais, por outro, encontram-se as

atividades empresariais privadas, dotadas das mais modernas técnicas de

produção e de gestão condizentes com o início do século XXI.

Cabe, portanto, ao Estado, reconhecer tal defasagem, estruturando-se

de forma que possa bem fortalecer o funcionamento dos serviços públicos, a fim

de prestá-los adequadamente.

Vale dizer que, em 1995, quando se deu início às privatizações, o

Brasil, em reconhecimento às suas deficiências administrativas e financeiras,

incorporou um processo de aceitação ao espírito empresarial, reestruturando suas

estatais e abrindo portas para as privatizações. Uma verdadeira revolução que

tinha como objetivos a modernização do Estado e a atuação mais eficiente

perante a sua população.

A partir daí, tivemos o surgimento das parcerias entre o poder

público e o privado, sem sombra de dúvidas, o marco inicial do desenvolvimento

dos serviços públicos.

Além dos serviços públicos passarem a ter mais agilidade e mais

eficiência, o Estado viu-se desonerado, porquanto os serviços públicos estavam

sendo prestados e patrocinados pelos particulares, ainda sob a sua supervisão.

Entretanto, é do conhecimento de todos que, para suprir a

deficiência estatal na prestação dos serviços, a sociedade já vinha, há muito

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tempo, se associando para, numa fórmula de parceria, garantir a sua segurança

nos bairros. Ex: segurança patrimonial.

Todavia, vale salientar que, mesmo diante da delegação dos

serviços públicos aos particulares, não estamos diante da diminuição do papel do

Estado. Aliás, muito pelo contrário! Daquela forma, dá-se ao Poder Público maior

eficiência nos respectivos campos de atuação e atribui-se à iniciativa privada,

aqueles outros serviços que, esta, melhor prestará.

Com o início das parcerias entre administração pública e a iniciativa

privada, sejam através de concessões, ou de permissões dos serviços públicos,

sempre estaremos diante de uma significativa perspectiva de desenvolvimento e

de adequação dos serviços públicos sem, contudo, depender do escasso dinheiro

do Estado. Sendo assim, o Estado estará cumprindo com o seu principal objetivo,

qual seja, o de atender a sociedade da melhor maneira possível e de forma mais

eficiente.

Porém, o Estado jamais poderá esquecer que, nessas parcerias, a

iniciativa privada estará sempre visando a sua rentabilidade, ou melhor, o seu

próprio lucro.

Portanto, com o início das concessões dos serviços públicos, o

Estado, em busca de novas parcerias com o setor privado, deverá garantir um

equilíbrio entre as partes, de modo que o investimento necessário para a

administração dos serviços, se torne atrativo e vantajoso.

Afinal, do que valeria a intenção da Administração Pública, em

conceder determinados serviços, se, do outro lado, não existisse o particular

interessado em prestá-los?

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É por este motivo, que o tema escolhido nesta monografia

representa distinta importância nos dias de hoje. O equilíbrio econômico financeiro

trata da garantia que o particular terá, ao longo do processo de prestação de

serviço, face ao vultuoso investimento que assumiu.

O assunto torna-se mais importante quando pensamos em termos de

“Brasil”. Isto, pois, o nosso país sempre devotou instabilidades financeira e

econômica, posicionando com “um pé atrás” a maioria dos investidores, quando o

assunto envolve negociar com a administração pública.

Face a isso é, sobretudo, garantindo o equilíbrio econômico-

financeiro dos contratos que a administração pública ganha a confiança e atrai a

iniciativa privada.

Os casos de desequilíbrio econômico financeiro são diversos e serão

abordados neste trabalho. Entretanto, o ponto crucial é ter em mente que o Estado

brasileiro precisa da ajuda do setor privado para o desenvolvimento de seus

serviços. E para que isto ocorra, deve ser oferecida ao particular uma garantia de

que o seu investimento será respeitado e, ao final do contrato, devolvido em forma

de receitas provenientes do serviço prestado. Esta deve ser a condição primeira

de parceria.

Portanto, um país que delega determinados serviços à iniciativa

privada, precisa respeitar o investimento aplicado pelo particular, dando com isso,

grandes passos na busca por um crescimento forte e verdadeiro, já que não é

novidade ser o setor privado aquele que melhores condições tem, de prestar um

serviço dinâmico à população do país.

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1 - O PRINCÍPIO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO FINANCEIRO

1.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

O tema abordado, repita-se, merece grande destaque em nosso

país, visto que vivemos num estado permanente de inflação. É claro, muito mais

significativo antes da implementação do Plano Real.

O equilíbrio econômico financeiro visa à preservação dos valores

monetários previstos no ato da celebração do contrato até o término do exercício

do mesmo.

Assim sendo, incontestável o fato de que o equilíbrio econômico

financeiro deva ser observado e atendido, como meio de manter as parcerias

entre ente estatal e o particular funcionando, trazendo assim inúmeros benefícios

para coletividade.

Diante da importância do equilíbrio econômico financeiro nos

contratos de concessão, a administração pública deve encarar tal dispositivo como

uma garantia incontestável prevista nos contratos, de forma que esta garantia, que

surge no momento da celebração contratual, deva perdurar até o encerramento do

aludido contrato, atendendo assim o fato de que as condições do contrato devem

ser mantidas do começo ao fim.

Ao contratar com a administração púbica, o particular estará diante

de um contrato flexível, ou seja, face ao longo prazo de duração dos contratos,

poderão advir inúmeros casos que não poderiam ter sido previstos no início da

negociação, daí a necessidade de observar-se o princípio da equação econômico-

financeira do contrato.

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Ao tratar das questões imprevisíveis que poderiam causar prejuízos

a um dos contratantes, já ensinava ARISTÓTELES:

“Quando ocorresse uma mudança, causada por um ato

inter-humano, na situação mútua de duas pessoas

opostas, em proveito de uma e em detrimento da outra,

o justo corretivo teria que impor, à pessoa que havia

ganho que suprimisse a mudança sobrevinda,

restabelecendo a situação da pessoa lesada, tal como

existia anteriormente”.1

Assim sendo, na execução de todos os contratos administrativos,

deve ser essencialmente observado o exato cumprimento das prestações

conforme avençadas pelas partes, de forma que, se estas forem desvirtuadas, por

questões não previstas no instrumento celebrado, merecem ser restabelecidas.

Dessa forma, a administração pública não estará descumprindo o

quanto pactuado com o particular, pelo contrário, estará fazendo valer o princípio

elementar existente nas relações contratuais que é o da boa-fé. Confira-se:

“Para realizar seus planos, o Estado e a Administração

vêem-se obrigando a cumprir suas obrigações de

acordo com os princípios da negociação, da boa-fé, e

do respeito aos compromissos recíprocos das partes”.2

No que se refere à doutrina, esta vem afirmando que a equação

econômico-financeira do contrato administrativo constitui-se no mais legítimo

direito do contratado. Veja-se:

1 Despotopoulos, “La notion de synallagma chez Aristote”, Archives de Philosophie du Droit n.º 13, Paris, Sirey, 1968, p.120, Apud. Boletim de Licitações e Contratos, julho/2000, n.º 7, p. 386.2 ARNOLDO WALD, O Direito de Parceria, São Paulo, 1996, p. 38.

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“É o direito fundamental de quantos pactuam com o

Estado”.3

----------------------

“É o primeiro direito original do co-contratante da

Administração”.4

Portanto, tratando-se de equilíbrio econômico financeiro do contrato

de concessão, é preciso ter em mente a brilhante definição de HELY LOPES

MEIRELLES, antes mesmo de entrarmos mais profundamente no tema abordado.

“Em última análise, é a correlação entre objeto do

contrato e a sua remuneração, originariamente prevista

e fixada pelas partes em números absolutos ou em

escala móvel. Essa relação deve ser conservada

durante toda a execução do contrato, mesmo que

alteradas as cláusulas regulamentares da prestação

ajustada, a fim de que se mantenha o equilíbrio

econômico, ou, por outras palavras, a equação

financeira do contrato”.5

Através das considerações gerais expostas, pode se ter uma idéia a

respeito do tema que será discutido mais adiante. Basicamente, podemos dizer

que o princípio do equilíbrio econômico-financeiro, existente nos contratos, nada

mais é do que um dispositivo que visa manter uma justa relação entre os

contratantes, de forma que um não se beneficie em função do prejuízo do outro.

Além disso, segundo entendimento jurisprudencial, a idéia de equilíbrio

econômico-financeiro nos contratos, baseia-se em princípios basilares do direito

3 MARCEL WALINE, Droit Administratif, Paris, Dalloz, 1959, p. 574. Apud., RDA, janeiro/março, 1961, vol. 63, p. 2.4 GEORGES PÉQUIGNOT, Théorie Générale du Contract Administratif, Paris, Pédone, 1945, p. 430. Apud., RDA, conformesupra, p. 3.5 HELY LOPES MEIRELLES, Licitação e Contrato Administrativo, Editora Revistas dos Tribunais, 4.ª edição, São Paulo,1979, os. 206/207.

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administrativo brasileiro, como aqueles da equidade, da razoabilidade e da

continuidade do contrato administrativo.

1.2 CONCEITO DE EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO

O equilíbrio econômico-financeiro surgiu no Conselho de Estado

Francês, órgão de cúpula da jurisdição administrativa francesa.

No início, aplicava-se aos contratos de concessão os princípios

herdados do direito privado, quais sejam: pacta sunt servanda (os contratos

devem ser cumpridos) e lex inter partes (o contrato é lei entre as partes).

Mais adiante, verificou-se a necessidade de os contratos de

concessão valerem-se de uma flexibilidade maior, visando ao interesse geral, e

assegurando a continuidade dos serviços públicos.

Daí a importância do equilíbrio econômico-financeiro como um

princípio geral do direito. É também, direito fundamental que deve ser observado

pelos contratantes do começo ao fim da execução do contrato, aplicando-se, ao

caso, referido princípio quando verificada a circunstância que prejudique a

equação econômico-financeira do mesmo.

É também, um poder-dever das partes, de modo que seja imperioso

observar, ao longo do contrato, uma proporção entre os encargos e remuneração,

que não podem distinguir da forma como fora pactuado inicialmente.

É fundamentalmente relevante saber a diferença entre a equação

econômica e a equação financeira do contrato.

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A equação financeira significa a manutenção das entradas e saídas

de recursos no patrimônio do concessionário, respeitando-se a forma e o ritmo

previstos no contrato.

A equação econômica está relacionada ao lucro que o

concessionário receberá face à concessão dos serviços a ele conferido.

Para entender melhor o assunto, faz-se necessário a analise dos

brilhantes comentários de doutrinadores sobre o tema, de modo a perceber, ao

final, que o elemento chave para conceituar o equilíbrio econômico-financeiro é a

preservação da relação entre os lucros objetivados pelo contratado e dos gastos

que deverá disponibilizar para dar cumprimento à prestação do serviço.

“O princípio visa, sobre tudo, à correlação entre os

encargos e a remuneração correspondente, de acordo

com o espírito lucrativo que é elementar aos contratos

administrativos”.6

Ou seja, o particular, sempre que procurar a administração pública,

para com ela celebrar contrato de prestação de serviço público, estará de olho no

lucro. Desse modo, dever-se-á observar ao longo do contrato a correlação entre

os encargos e remuneração, evitando-se assim, o desequilíbrio econômico e

financeiro do contrato para qualquer das partes.

Da mesma forma entende Celso Antônio Bandeira de Melo:

“Equilíbrio econômico-financeiro ou equação

econômico-financeira é a relação de igualdade

formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo

contratante no momento do ajuste e, de outro lado,

6 CAIO TÁCITO, tese RDA 63/1, 64/15, 65/1, p. 5.

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pela compensação econômica que lhe corresponderá.

A equação econômico-financeira é intangível.7

Para tanto, o que importa, obviamente, não é a

aparência de um respeito ao valor contido na equação

econômico-financeira, mas o real acatamento dele. De

nada vale homenagear a forma quando se agrava o

conteúdo. O que as partes colimam em um ajuste não

é satisfação de fórmulas ou de fantasias, mas um

resultado real, uma realidade efetiva que se determina

pelo espírito da avenca; vale dizer, pelo conteúdo

verdadeiro do convencionado”.8

Sendo assim, uma vez configurada a quebra da equação econômico-

financeira do contrato, de modo que venha a prejudicar o concessionário, deve o

Estado, imediatamente, recompor a mesma.

“Se, portanto, vem a incidir sobre a relação entre os

termos da equação financeira um fator que a faça

variar em detrimento do concessionário, nasce para o

Estando a obrigação de restaurar a relação primitiva ou

o equilíbrio da economia do contrato”.9

Diante do exposto, ressalta-se que, a aplicação do princípio

econômico financeiro não está condicionado à cláusulas contratuais, pelo

contrário, a sua aplicação é garantida por determinação da Constituição Federal,

da lei federal, da lei estadual e pelos entendimentos jurisprudencial e doutrinário.

7 CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELO, Elementos de Direito Administrativo, Editora Revista dos Tribunais, 2.ª edição,São Paulo, 1990, ps. 218/219.8 Obra supra citada, p. 221.9 FRANCISCO CAMPOS, Direito Constitucional, Rio Freitas Bastos, 1956, 1.º vol., p. 113.

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Além disso, a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro não é

nem direito nem dever de cada parte, e sim característica do contrato

administrativo.

1.3 FUNDAMENTOS DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO

Os contratos administrativos em geral envolvem, de certa forma,

muito mais riscos do que os demais contratos. Isto ocorre por diversas questões,

dentre elas, pela longa duração dos mesmos, pelo gigante volume de gastos

públicos e, na maioria das vezes, pela exigida mão de obra especializada, tendo

em vista a complexidade da natureza das atividades.

Estes fatores vem demonstrando, ao longo do tempo que o equilíbrio

econômico-financeiro, nos contratos de concessão, pode se romper muito mais

facilmente do que nos contratos celebrados com a iniciativa privada.

Não bastasse isso, o contrato administrativo de concessão de

serviços públicos possui uma característica de natureza sinalagmática, ou seja,

entre as partes contratantes exigi-se a reciprocidade das obrigações.

Desse modo, como já vimos, com a celebração de um contrato de

concessão, teremos, de um lado, a iniciativa privada que se obriga a prestar

adequadamente os serviços à coletividade e com o objetivo de lucro, e do outro, o

ente estatal, que deverá, “ab initio”, garantir ao particular a equação econômico-

financeira do contrato, inalterando-a até o término do contrato, a fim de não

prejudicar a continuidade dos serviços públicos e a plena satisfação do interesse

coletivo.

Em outras palavras, pretende-se com a preservação do equilíbrio

econômico-financeiro do contrato, a equivalência entre a obrigação de realizar do

contratante privado, e a obrigação de pagar da Administração Pública.

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É imperioso saber que o equilíbrio econômico-financeiro tornou-se

direito do concessionário, sendo certo que, a sua ausência nas cláusulas

contratuais, não obstará a sua aplicação. Isto ocorre, pois a teoria do equilíbrio

econômico-financeiro se baseia em teorias maiores do direito brasileiro, dentre

elas: (a) o princípio da equidade; (b) o princípio da razoabilidade; (c) o princípio da

continuidade do contrato administrativo e (d) o princípio da indisponibilidade do

interesse público.

A - O princípio da equidade previsto nos contratos tem o objetivo de

impedir que uma parte experimente locupletamento ilícito, em detrimento da outra.

Com base neste princípio, sobrevindo qualquer fato que implique na

alteração da equação econômico-financeira prevista inicialmente no contrato, a

administração pública necessitará adequar, prontamente, tal ocorrência. Ressalta-

se que, a adequação pode tanto ser favorável ao concessionário, aumentando-se

o seu lucro, como pode representar uma diminuição de sua remuneração.

Como é cediço em nossa jurisprudência, é inaceitável e totalmente

contrário aos princípios da justiça, o ganho, a vantagem, o enriquecimento sem

causa nas relações humanas, conforme relata o julgado abaixo:

“...tanto quanto não deve o Poder Público pagar mais,

também não deve pagar menos do que realmente vale

o trabalho na ocasião, valendo-se para isso de

circunstâncias inelutavelmente intercorrentes, uma vez

que não lhe assenta, naquelas condições, a posição de

especulador a favorecer-se com o prejuízo do outro

contratante”.10

10 Tribunal Justiça do Estado de São Paulo, Revista dos Tribunais vol. 507, p. 118 (RDA 82:217).

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Acrescentando importante subsídio ao julgado acima transcrito,

confira-se o enunciado por MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO:

“ O rompimento do equilíbrio econômico-financeiro do

contrato, se tolerado, gera enriquecimento ilícito, e

eventualmente confisco em proveito de uma das

partes. De fato, ele resulta em quebra da justa

compensação, de modo que uma das partes sai

beneficiada, por dar menos em troca do que recebe”.11

B – No que se refere ao princípio da razoabilidade, exige-se

proporção entre o custo e o benefício tirado do negócio. Assim sendo, se a

concessão de serviços públicos se apóia na idéia de se obter uma melhoria para a

coletividade sem desembolsar recursos orçamentários do Estado, a Administração

Pública, diante de um desequilíbrio contratual para o concessionário, deverá tomar

frente ao problema para restabelecer o quanto avençado.

Lembre-se, ademais, que nos contratos de concessão, o

concessionário estará obrigado a realizar obras objetivando a melhoria dos

serviços. Portanto, não se pode olvidar que, no caso do desequilíbrio econômico-

financeiro, deverá o Estado, prontamente, reajustar a remuneração do particular

para evitar prejuízos financeiro-econômicos não previstos, de forma que possam,

eventualmente, afetar a adequada prestação do serviço público.

Sabendo-se que o concessionário depende do lucro para reaver o

valor aplicado na melhoria da obra, bem como de cobrir o risco assumido, não se

pode desconsiderar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, sob pena de

estar-se desrespeitando o princípio da razoabilidade.

11 Equilíbrio Econômico-Financeiro dos Contratos de Imóveis – Parecer de 08.08.1995, distribuído pelo Setor deComunicação do Sinduscon, São Paulo.

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A seguir, em atenção ao princípio da razoabilidade, vale a pena

conferir um trecho do acórdão proferido pelo DES. VICENTE LEAL, que trata da

questão da defasagem do valor das tarifas no contrato de concessão de transporte

aéreo de passageiros:

“ADMINISTRATIVO E CIVIL. CONTRATOS DE CONCESSÃO DE

TRANSPORTE AÉREO. DEFASAGEM NO VALOR DAS TARIFAS.

PREJUÍZO. INDENIZAÇÃO.

A Constituição Federal de 1967, sob a redação da

Ementa n.º 01/69, assegurava, nos contratos de

concessão de serviços públicos, a manutenção do

equilíbrio econômico e financeiro do pacto, por meio da

fixação de tarifas reais, suficientes, inclusive, para justa

remuneração do capital e a expansão dos serviços (art.

167,II).

O mesmo princípio, com maior abrangência encontra-

se esculpido no artigo 37, XXI, da nova Carta-Política.

Demonstrada, de forma sobeja, por via de prova

pericial e documental, a ocorrência de efetiva

defasagem no valor das tarifas do transporte aéreo,

com graves e vultosos prejuízos à empresa

concessionária, em conseqüência de omissão do poder

Concedente, impõe-se a reparação dos danos por meio

de pagamento de indenização.

Não comporta censura laudo pericial sobejamente

fundamentado, que não sofreu impugnação na fase

processual própria, nem se ofereceu qualquer alegação

contra a capacidade técnica do experto oficial.

Apelação e remessa oficial desprovidas”.12

12 AC n.º 0111006/91-DF. 3.ª Turma/TRF/1.ª Região – D.J.U. de 06.08.92, ps. 22953 e RF 319, p. 141.

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Logo, não resta dúvida que na ocorrência de desequilíbrio entre

custo/benefício, conforme previsto inicialmente, estaremos diante da necessidade

de readaptar o contrato, evitando-se assim, um desequilíbrio entre as partes.

C – Outro princípio existente nos contratos de concessão, que deve

ser respeitado, é o da continuidade do contrato administrativo.

Ocorrendo fato superveniente ou ato unilateral da administração, o

desequilíbrio contratual deverá ser recomposto de forma que o contrato não seja

interrompido, acarretando diversos prejuízos à coletividade.

O fato de a administração pública ter o direito de alterar

unilateralmente as condições pré-fixadas no contrato, faz com que o princípio

tradicional dos contratos “pacta sunt servanda” venha sendo superado pela idéia

de que o serviço público não pode parar.

Obriga-se, portanto, ao Estado, indenizar o concessionário, evitando-

se assim, a paralisação dos serviços públicos. Veja-se o trecho do julgado:

“Como visto, a doutrina é unissonante em proclamar

que o equilíbrio econômico-financeiro do contrato

administrativo deve ser resguardado”.

Desrespeitado este princípio por ato comissivo ou

omissivo do Poder Concedente, impões-se a

recomposição da equação financeira, tendo em vista

não só a imperiosa necessidade de que os serviços

públicos tenham continuidade, mas também em razão

do princípio jurídico que preconiza que todo aquele

que, por ação ou omissão causar prejuízo a outrem,

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fica obrigado a reparar o dano (Código Civil, art.

159)”.13

D – Por fim, no que se refere aos fundamentos da aplicação do

equilíbrio econômico-financeiro do contrato, consideramos o princípio da

indisponibilidade do interesse público, ou seja, se qualquer questão indireta ao

contrato for necessária para atender alguma necessidade imperiosa da

Administração, esta deverá assegurar a continuidade do contrato, recompondo o

equilíbrio econômico-financeiro do mesmo.

Basta imaginar a situação em que a Administração Pública,

objetivando atender de outra forma os interesses da coletividade, retire do

concessionário alguma forma alternativa de lucro, como por exemplo, os espaços

para publicidades. Ao insurgir este procedimento, aquela receita que dependia o

concessionário, passará a não mais existir, causando um desequilíbrio na

equação financeira do contrato.

Dessa forma, não havendo providências por parte do poder

Concedente em restabelecer tal perda de receita, estaremos diante do início da

deterioração do serviço público.

Concluímos, portanto, que o equilíbrio econômico-financeiro é um

direito subjetivo do particular contratado, caracterizando-se, tão somente, como

um fator capaz de desbalancear a relação encargo/remuneração do contrato.

Acrescenta-se a isto, que não mais se exige que o desequilíbrio do

contrato seja ruinoso, bastando apenas a constatação de prejuízo ao

concessionário.

1.4. PREVISÃO LEGAL

13 AC n.º 0111006/91-DF. 3.ª Turma/TRF/1.ª Região – D.J.U. de 06.08.92, ps. 22953 e RF 319, p. 141.

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Antes de mais nada, institui-se imperioso frisar que, a concessão de

serviços públicos, assim como qualquer outra atividade administrativa, é regida

pelo princípio da legalidade, o que significa dizer que, tanto o concessionário como

o Poder Concedente, submetem-se ao ordenamento jurídico referente à matéria.

Inicialmente, vale salientar que a Constituição Brasileira foi uma das

poucas a tratar diretamente sobre o equilíbrio econômico-financeiro. Isto porque,

nos demais países, o regime jurídico dos contratos administrativos e das

concessões, são tratados diretamente através da legislação ordinária e da

jurisprudência.

O Brasil e o Uruguai foram os únicos países que trataram do tema,

em suas legislações supremas.

A previsão do equilíbrio econômico-financeiro não é verificada de

forma explicita nas Constituições de 1934, de 1946 e tampouco na Carta de 1937.

Tal fato se justifica, pois, à época, os principais constitucionalistas, entre eles

THEMÍSTOCLES CAVALCANTI e PONTES DE MIRANDA, não se apegaram ao assunto.

No entanto, aludidas Constituições já traziam em seus textos considerações que,

mais adiante, tiveram relevante importância no surgimento do equilíbrio

econômico-financeiro.

Referidas considerações tratavam da garantia da revisão tarifária em

favor do concessionário, para que este, através da obtenção de lucro, pudesse

atender às melhorias e às expansões dos serviços públicos.14

Apesar de aludidos dispositivos constitucionais não tratarem

diretamente sobre o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, vale a pena ler

os comentários a Constituição de 1946 feitos por CAIO TÁCITO:

14 Previsão legal: Constituição de 1934, art. 137; Carta de 1937, art. 147 e Constituição de 1946, art. 151.

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“A doutrina ou a jurisprudência nacionais não foram,

ainda, mobilizadas para a exegese construtiva do

preceito constitucional. Os comentadores à lei

fundamental não vão além das apreciações gerais, na

compreensível expectativa de que a lei ordinária

especifique critérios e medidas sobre o regime dos

serviços públicos concedidos”.

Decorre, no entanto, diretamente, da norma

constitucional, a consagração inequívoca do princípio

do equilíbrio financeiro da concessão de serviço

público”.15

Mais adiante, na Constituição de 1967, na Emenda n.º 1 de 1969 e

na Constituição de 1988, verificou-se que o princípio do equilíbrio econômico-

financeiro passou a ser tratado com mais profundidade.

A Constituição de 1967, através do texto da Emenda n.º 1 de 1969,

em seu art. 167, II, previa, nos contratos de concessão, a manutenção do

equilíbrio econômico-financeiro pactuado, mediante a fixação de tarifas reais,

suficientes para remuneração do concessionário, bem como da expansão dos

serviços públicos.

No que se refere a Constituição de 1988, alguns autores sustentam

que, apesar do texto constitucional não tratar diretamente do tema, como fizeram

as demais Constituições, tal princípio encontra-se presente no artigo 175 da Carta

Política. Confira o texto:

“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei,

diretamente ou sob regime de concessão ou

15 Direito Administrativo, p. 246.

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permissão, sempre através de licitação, a prestação de

serviços públicos”.

Parágrafo único. A lei disporá sobre:

I – o regime das empresas concessionárias e

permissionárias de serviços públicos, o caráter especial

de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as

condições de caducidade, fiscalização e rescisão da

concessão ou permissão;

II – os direitos dos usuários;

III – política tarifária;

IV – a obrigação de manter serviço adequado.

Ocorre que, ao realizar atenta leitura do dispositivo legal acima,

verificar-se-á que, referido artigo trata diretamente da política tarifária, assim como

da obrigação do concessionário em manter adequado o serviço prestado.

Assim sendo, foi a jurisprudência a responsável em assinalar onde

realmente encontrava-se a garantia do equilíbrio econômico-financeiro na

Constituição de 1988.

Tal garantia, conforme entendimento jurisprudencial, encontrava-se

disposta no art. 37, XXI da Magna Carta e, além disso, em maior extensão que as

demais Constituições, porquanto em aludido artigo, o princípio do equilíbrio

econômico-financeiro passou a vigorar em todos os contratos administrativos, e

não somente às concessões, como previa anteriormente. Veja-se:

“Art. 37. A administração pública direta, indireta ou

fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos

Estados, do Distrito federal e dos Municípios obedecerá

aos princípios de legalidade, impessoalidade,

moralidade, publicidade e também ao seguinte:

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(...)

XXI – ressalvados os casos especificados na

legislação, as obras, serviços, compras e alienações

serão contratados mediante processo de licitação

pública que assegure igualdade de condições a todos

os concorrentes, com cláusula que estabeleçam

obrigações de pagamento, mantidas as condições

efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente

permitirá as exigências de qualificação técnica e

econômica indispensáveis à garantia do cumprimento

das obrigações”.

Logo, de acordo com o texto Constitucional vigente, as obras, os

serviços, as compras e as alienações, no campo do direito administrativo, inclusive

as concessões, devem obedecer ao princípio da garantia da equação econômico-

financeira, sendo mantidas as condições reais e efetivas, econômicas e

financeiras da proposta.

Assim, se no decorrer do contrato, por questões supervenientes

àquelas previstas, ocorrer o desequilíbrio do contrato, o poder público observando

os termos iniciais, ou seja o edital de licitação e o contrato firmado, deverá

restabelecer o equilíbrio contratual.

Portanto, não há o que se falar em não observância do princípio do

equilíbrio econômico-financeiro na atual Constituição, pelo contrário, o artigo 37,

XXI, bem como o art. 175, garantem, em maiores dimensões, a observância de

aludido princípio. Leia-se:

“Ressalta-se, por fim, que não procede a tese de que a

Constituição de 1988 excluiu do equilíbrio econômico-

financeiro dos contratos administrativos como afirmado

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no recurso. De modo contrário, o novo Estatuto

Fundamental tratou do assunto com maior

abrangência, contemplando tosos os contratos

celebrados entre a Administração Pública e o partícula.

O preceito constitucional, inserto no art.37, XXI, da Lei

Maior, obriga a inserção, nos contratos administrativos

d cláusula que estabeleça obrigações de pagamentos,

mantidas as condições efetivas da proposta. Tal

preceito consubstancia, sem qualquer dúvida, o

princípio do equilíbrio econômico-financeiro do

contrato. Assim, o art. 175 da Constituição deve ser

compreendido na visão do preceito geral inscrito no art.

37, XXI do mesmo Estatuto Fundamental”.16

Com relação às concessionárias de transporte urbano, o Superior

Tribunal de Justiça também se manifestou a favor da matéria, no RMS 1681-0,

julgado em 28.04.93, sendo Relator o Ministro DEMÓCRITO REINALDO.17

Igualmente aos contratos de concessão, o Superior Tribunal de

Justiça vem entendo ser aplicável a garantia do equilíbrio econômico-financeiro

aos contratos de permissão, uma vez que a permissão é um contrato, e não mais

um ato unilateral, como anteriormente entendia a doutrina.18

A nova concepção dada aos contratos de permissão foi claramente

reconhecida pelo Ministro CARLOS MÁRIO VELLOSO do SUPREMO TRIBUNAL

FEDERAL, conforme o voto a seguir:

16 Revista Forense, vol. 319, p. 146. Aludida decisão foi objeto de Recurso Extraordinário da União Federal, do qual oSupremo Tribunal Federal, pela sua 1.ª Turma, não conheceu, em decisão unânime de 17.06.97, sendo relator o MinistroOCTÁVIO GALLOTTI (RE n.º 183.180).17 RSTJ, n.º 52, p. 30518 MIN. AMÉRICO LUZ, 2.ª Turma - STJ, RMS n.º 582-SP, JSTJTRF, n.º 30, p. 30.

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“Existe, em ampla doutrina pátria, a distinção entre

permissão e concessão.

(...)

Entendo que a partir da Constituição de 88, a

permissão tem contratualidade, foi equiparada à

concessão sob este aspecto. Não há mais distinção

substancial entre um e outro instituto em face do art.

175, §ún. Da CF”.

Em atenção ao conflito que possa surgir entre o princípio do

equilíbrio econômico-financeiro dos contratos que rege a revisão das tarifas

cobradas e o princípio da modicidade das tarifas (menor preço ao usuário),

prevalece o primeiro em relação ao segundo, uma vez que, o princípio da

modicidade está previsto apenas em lei ordinária, não podendo, portanto,

prevalecer sobre aquele que possui previsão Constitucional.

No que se refere às Leis de nível infraconstitucional, analisemos,

primeiramente, a Lei Federal das Concessões n.º 8.987 de 13.02.95, que trata, em

seus arts. 9.º e 10.º, sobre o tema, corroborando os princípios contidos na

Constituição Federal de 1988.

Lei n.º 8.987 de 13.02.95

“Art. 9 - A tarifa do serviço público concedido será

fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e

preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei,

no edital e no contrato:

§ 1.º. A tarifa não será subordinada à legislação

específica anterior.

§ 2.º. Os contratos poderão prever mecanismos de

revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio

econômico-financeiro.

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§ 3.º. Ressalvados os impostos sobre renda, a criação,

alteração ou extinção de quaisquer tributos ou

encargos legais, após a apresentação da proposta,

quando comprovado seu impacto, implicará revisão da

tarifa, para mais ou para menos, conforme o caso.

§ 4.º. Em havendo alteração unilateral do contrato que

afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o

poder concedente deverá restabelecê-lo,

concomitantemente à alteração”.

“Art. 10 – Sempre que forem atendidas as condições do

contrato, considera-se mantido o equilíbrio econômico-

financeiro”.

Conforme se depreende da leitura do texto legal, conclui-se que o

equilíbrio econômico-financeiro, nos contratos de concessão, deve ser respeitado

pelo Poder Concedente, independente do fato superveniente ocorrido, de modo

que seja mantida a equação do contrato nos seus termos iniciais.

Referida Lei trás em seu texto demais questões relevantes que serão

tratadas ao longo do trabalho.

Além da Lei supra mencionada, é necessário, também, fazer

referência à Lei Federal n.º 8.666/93, que regula as licitações e os contratos da

Administração, trazendo em seu texto provisões que garantem o equilíbrio

econômico-financeiros nos contratos.

Apesar dessa Lei tratar do assunto ora em discussão, esclareça-se

que a mesma deixa a desejar pela falta de ordenamento sistemático que

apresenta.

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Para o estudo em tela, os artigos que mais nos interessa é o Art. 57,

§1.º e o Art. 65, inc. II, alínea d). Veja-se:

“Art. 57 – A duração dos contratos regidos por esta Lei

ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos

orçamentários, exceto quanto aos relativos:

(...)

§1.º Os prazos de início de etapa de execução, de

conclusão e entrega admitem prorrogação, mantidas as

demais cláusulas do contrato e assegurada a

manutenção de seu equilíbrio econômico-,financeiro,

desde que ocorra algum dos seguintes motivos,

devidamente autuados em processo:

I – alteração do projeto ou especificações, pela

Administração;

II – superveniência de fato excepcional ou imprevisível,

estranho à vontade das partes que altere

fundamentalmente as condições de execução do

contrato;

III – interrupção da execução do contrato ou diminuição

do ritmo de trabalho por ordem e no interesse da

Administração;

IV – aumento das quantidades inicialmente previstas no

contrato, nos limites permitidos por esta Lei;

V – impedimento de execução do contrato por fato ou

ato de terceiro reconhecido pela Administração em

documento contemporâneo à sua ocorrência;

VI – omissão ou atraso de providências a cargo da

Administração, inclusive quanto aos pagamentos

previstos de que resulte, diretamente, impedimento ou

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retardamento na execução do contrato, sem prejuízo

das sanções legais aplicáveis aos responsáveis”.

Ao verificarmos aludidos incisos, facilmente será identificar que cada

um trata de questões geradoras da quebra do equilíbrio econômico-financeiro do

contrato, causas estas, que serão estudadas adiante com maior profundidade.

No entanto, pode se adiantar que, referido texto legal trata, em seus

incisos, sobre os fatos imprevisíveis e estranhos à vontade das partes, sobre as

causas de mudança contratual por ato unilateral da administração pública e

através do fato do príncipe. Lembre-se que tais causas são responsáveis pela

quebra da equação financeira do contrato, devendo, portanto, o contrato ser

restabelecido, em função de suas ocorrências.

Mais adiante, no mesmo diploma legal, verifica-se a possibilidade de

alteração do contrato desde que observadas certas condições. Vejamos.

“Art. 65 – Os contratos regidos por esta Lei poderão ser

alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes

casos:

(...)

II – por acordo das partes:

(...)

d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram

inicialmente entre os encargos do contrato e a

retribuição da Administração para a justa remuneração

da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a

manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial

do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos

imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências

incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução

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do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso

fortuito ou fato do príncipe, configurando área

econômica extraordinária e extracontratual”.

Configurando-se alteração contratual, por ato unilateral da

Administração, é de direito ao particular ter o seu contrato restabelecido por

aditamento, levando o mesmo, a equação financeira inicialmente pactuada.

Logo, resta evidente o cabimento da aplicação da Lei 8.666/93 aos

contratos de concessão quando, ocorrendo quaisquer das hipóteses mencionadas

acima, acarrete no desequilíbrio do contrato celebrado.

Outra disposição legal que se refere à necessidade de se garantir o

equilíbrio econômico-financeiro do contrato, é o Decreto-Lei 2,300 de 21.11.86.

Todavia, tendo em vista que aludido dispositivo foi revogado, não se faz

necessário o seu estudo aprofundado.19

Diante do exposto, fica evidentemente comprovado que, a garantia

do princípio econômico-financeiro está claramente amparada, não só pelo texto

constitucional, mas também pelas leis ordinárias de nosso sistema.

Em se tratando de análise no âmbito constitucional, percebeu-se que

desde a elaboração da Constituição de 1946, já havia uma preocupação com o

assunto, de maneira que, com o passar do tempo, o tema foi ganhando espaço

com o aumento das parcerias realizadas entre o ente público e a iniciativa privada.

19 Muitas vezes, observava-se que tal dispositivo era utilizado para corrigir um preço mais baixo, fixado intencionalmentena proposta com vistas à adjudicação. Desse modo, o dispositivo acabou por gerar abuso, permitindo a recomposição depreços com base na cláusula rebus sic stantibus, quando, na verdade, não havia ocorrido o desequilíbrio econômico-financeiro no contrato.

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2 - A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO ECONÔMICO-FINANCEIRO AOS

CONTRATOS DE CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO

2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE OS CONTRATOS DE CONCESSÃO DE SERVIÇOS

PÚBLICOS

No âmbito do Direito brasileiro, considerando as diferenças

existentes nos contratos administrativos e nos contratos privados, é certo que

ambos subsumem-se à teoria geral dos contratos.

O contrato administrativo é sempre (i) consensual, (ii) formal; (iii)

oneroso; (iv) comutativo; e (v) realizado “intuitu personae”. Diz-se que o contrato é

consensual, pois, representa um acordo de vontades entre as partes, e não um

ato impositivo da administração pública. É formal porque exige a forma escrita e

que atenda os requisitos especiais. O contrato é também oneroso pois, a

remuneração do concessionário é garantida conforme pactuado. Tem, também, o

contrato administrativo, característica sinalagmática (ou comutativo), pois

estabelece compensações recíprocas e equivalentes entre as partes. Por fim, o

contrato é celebrado “intuitu personae”, porque deve, necessariamente, ser

executado por aquele que contratou com o Poder Concedente.

O contrato, negócio jurídico celebrado entre particulares, é utilizado

pela Administração Pública quando se pretende estabelecer direitos e obrigações

em favor do interesse público.

Pode-se dizer, que o contrato administrativo de um modo geral, está

amparado pelo princípio da “mutabilidade”, ou seja, por vontade da administração,

o contrato em busca dos interesses sociais, pode ser alterado a qualquer tempo.

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Além disso, o contrato administrativo possui outras peculiaridades

que o distingue dos contratos efetuados entre particulares, como por exemplo, as

cláusulas exorbitantes, que permitem ao ente Estatal, objetivando o interesse

público, e através de ato unilateral, mudar, rescindir, fiscalizar, intervir e aplicar

sanções nos contratos celebrados. Frise-se que, tal medida no âmbito do direito

privado, acarretaria rescisão imediata do contrato por inadimplência de uma das

partes.

Vale dizer que tal prerrogativa da administração, sendo justa ou não,

não está à mercê da aplicação da teoria da “exceptio non adimpleti, contractus”,

pois trata-se de contrato de interesse coletivo, devendo ser mutável e flexível,

objetivando, assim, a continuidade da prestação do serviço.

Por outro lado, parte da doutrina entende que nos dias atuais,

credita-se ao particular, embora em menor amplitude, o poder de invocar a teoria

da “exceptio non adimpleti contractus”, porquanto, muitas vezes o ato praticado

unilateralmente pela administração pública, pode inviabilizar a continuação da

prestação dos serviços públicos pelo particular.

Faz-se necessário saber o significado das cláusulas exorbitantes,

visto que essas estão sempre presentes nos contratos administrativos.

“são, pois, as que excedem do Direito Comum para

consignar uma vantagem ou uma restrição à

Administração ou ao contratado. A cláusula exorbitante

não seria lícita num contrato privado, porque

desigualaria as partes na execução do avençado, mas

é absolutamente válida no contrato administrativo,

desde que decorrente da lei ou dos princípios que

regem a atividade administrativa, porque visa a

estabelecer uma prerrogativa em favor de uma das

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partes para o perfeito atendimento do interesse público,

que se sobrepõe sempre aos interesses particulares. É,

portanto, a presença dessas cláusulas exorbitantes no

contrato administrativo que lhe imprime o que os

franceses denominam ‘la marque du Droit Public’ uma

vez que observa Laubadère “C’ est em effet la

prèsence de Telles clauses dans um contrat que est lê

critère par excellence de son caractère administratif”20

Observe que a prerrogativa de utilizar-se das cláusulas exorbitantes,

cabe única e exclusivamente ao Estado. Isto porque, este, através do seu poder

de império, tem o direito de alterar as condições do contrato, respeitando os

limites legais. Lembre-se que aludida prerrogativa, não poderia viger um contrato

celebrado entre particulares, pois estaríamos diante de um atentado à ordem

pública.

Segundo a definição de ROUVIÈRE (1930:161), cláusula exorbitante é:

“a cláusula que o particular não poderia inserir no

contrato celebrado com outro particular, porque ela

postula a existência do poder público, atuando no

contrato”.21

Ainda com relação as cláusulas exorbitantes, slienta WALINE

(1963:161):

“a cláusula exorbitante é aquela que não se encontra

normalmente no contrato, seja porque nele seria nula

por contrária à ordem pública, seja ainda porque foi

20 ANDRÉ DE LAUBADÈRE, Contrats Administratifs, Paris, 1956, I/85, Apud. HELY LOPES MEIRELLES, DireitoAdministrativo Brasileiro, Malheiros, 27.ª Edição, 2002. p. 207.21 MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, Do Direito Privado na Administração Pública, Editora Atlas, 1989, p. 140.

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inserida no contrato pela autoridade administrativa em

função de preocupações de interesse público que são

estranhas às pessoas de direito privado quando

contratam entre si”.22

Sobre as cláusulas essenciais do contrato de concessão, vale a

pena analisarmos o artigo abaixo transcrito:

“Art. 23 – São cláusulas essenciais do contrato de

concessão as relativas:

I – ao objeto, à áreas e ao prazo de concessão;

II – ao modo, forma e condições da prestação do

serviço;

III – aos critérios, indicadores, ´fórmulas e parâmetros

definidores da qualidade do serviço;

IV – ao preço do serviço e aos critérios e

procedimentos para o reajuste e a revisão das tarifas;

V – aos direitos, garantias e obrigações do poder

concedente e da concessionária, inclusive os

relacionados às previsíveis necessidades de futura

alteração e expansão dos serviço e conseqüente

modernização, aperfeiçoamento e ampliação dos

equipamentos e das instalações;

VI – aos direitos e deveres dos usuários para obtenção

e utilização dos serviços;

VII – à forma de fiscalização das instalações dos

equipamentos dos métodos e práticas de execução do

serviço, bem como a indicação de órgãos competentes

para exerce-la;

22 MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, conforme citação acima.

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VIII – às penalidades contratuais e administrativas a

que se sujeita a concessionária e a sua forma de

aplicação;

IX – aos casos de extinção da concessão;

X – aos bens reversíveis;

XI – aos critérios para cálculo e forma de pagamentos

das indenizações devidas à concessionária, quando for

o caso;

XII – às condições para prorrogação do contrato;

XIII – à obrigatoriedade, forma e periodicidade da

prestação de contas da concessionária ao poder

concedente;

XIV – à exigência da publicação de demonstrações

financeiras periódicas da concessionárias; e

XV – ao foro e ao modo amigável de solução das

divergências contratuais.

Parágrafo único: Os contratos relativos à concessão de

serviço público precedido da execução de obra pública

deverão, adicionalmente:

I – estipular os cronogramas físico-financeiros de

execução das obras vinculadas à concessão; e

II – exigir garantia do fiel cumprimento, pela

concessionária, das obrigações relativas às obras

vinculadas à concessão.

A forma do contrato de concessão deverá ser escrita e sempre

atendendo às exigências legais.

Pode se dizer, inicialmente, que o contrato de concessão nasce a

partir da realização do procedimento licitatório. Ou seja, o contrato firmado entre o

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ente público e o privado deverá, veementemente, observar o contido no edital de

licitação.

Ao verificar que o contrato foi celebrado diferentemente das

condições disposta no edital da licitação, estaremos diante da frustração do

procedimento licitatório, devendo, portanto, anular-se a licitação,

responsabilizando os agentes públicos.

Isto ocorre porque se entende que o edital de licitação é a peça

fundamental na concessão de serviços públicos. É a partir daí, que as empresas

medem o seu potencial de trabalho, verificando se podem, ou não, participar na

concorrência da prestação dos serviços.

Celebrado um contrato de concessão, diferente do previsto no edital

de licitação, estaremos, por certo, diante de uma injustiça com aquelas empresas

que não atenderam os padrões exigidos na licitação. Isto pois, as empresas que

não participaram da disputa em decorrência das regras do edital, talvez

atenderiam os requisitos do contrato celebrado.

Assim sendo, pode-se afirmar que a administração pública não

possui discricionariedade para produzir modificações nas cláusulas do contrato de

concessão.

Em última instância, se a Administração Pública verificar que o

contrato restou inadequado, não poderá valer-se de seu poder de

discricionariedade, mas sim, adotar providências para evitar a continuidade de sua

execução.

O contrato de concessão é promovido pelo Estado e firmado por

agentes do Poder Executivo.

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Tendo em vista a complexidade dos contratos de concessão, o

mesmo deve prever regras acerca de: (a) relacionamento entre poder concedente

e concessionário; (b) condições da prestação do serviço; (c) relacionamento entre

poder concedente e usuários; e (d) relacionamento entre concessionário e

usuários.

É imperioso saber que nos contratos de concessão de serviços

públicos, o concessionário não é senhor do serviço público e sim, mero prestador

de serviços, de modo que sempre estará à mercê da supervisão do poder

concedente, sob pena do ente estatal estar infringindo os princípios

constitucionais.

Ao final do contrato de concessão, os bens e direitos vinculados à

prestação do serviço, retornam ao poder concedente conforme condições

estabelecidas no contrato.

“Na concessão de uma obra ou serviço público, o

Governo não transfere propriedade alguma ao

concessionário; este obtém, apenas, o uso ou gozo da

coisa durante o prazo da exploração concedida”.23

“(...)a legislatura não teria o poder para sancionar

validamente uma lei cujos termos se limitasse ou

cerceasse o direito do Estado relativamente ao

exercício de seu poder de polícia, que é soberano para

fixar, por exemplo, tarifas razoáveis nos serviços

públicos...Em reiteradas decisões da Suprema Corte

Federal estabeleceu-se que nenhuma das disposições

23 STF, de 1908, publicado RDA, 9:30.

Page 47: RUBENS DECOUSSAU TILKIAN - Portal FMU · do equilíbrio econômico-financeiro do contrato como uma garantia incontestável. Portanto, advindo fatos imprevistos ao contrato de concessão,

da Constituição Federal têm o efeito de sobrepor-se ao

poder que o Estado tem de estabelecer todas as

regulamentações razoavelmente necessárias para

assegurar a saúde, segurança, bem-estar em geral da

comunidade: e que esse poder nunca pode abdicar-se

nem ser objeto de truques (bargained away), pois é

inalienável, ainda que não seja expressamente

outorgado”.24

Toda concessão de serviços públicos está submetida a duas

categorias de normas: a primeira é de natureza regulamentar, que determina o

modo e a forma da prestação do serviço; a segunda, de ordem contratual, que

dizem respeito às condições da remuneração do concessionário.

Saiba-se que, mesmo mediante autorização de lei, o Estado não

poderá delegar tal prerrogativa ao concessionário. Assim, será sempre o Estado

quem determinará os novos serviços a serem prestados bem como as tarifas que

o concessionário terá direito.

Em outras palavras, num contrato de concessão de serviços

públicos, a Administração quer a prestação adequada do serviço (forma

regulamentar) e o particular objetiva o lucro (forma de ordem contratual).

As normas de natureza regulamentar podem ser alteradas pelo

poder concedente, em função das exigências da comunidade. Entretanto, aquelas

de ordem contratual, somente poderão ser alteradas com o consentimento das

partes.

Para melhor conceituar a concessão dos serviços públicos, valem as

citações abaixo, provenientes de renomados juristas:

24 Bielsa, Derecho Administrativo, B. Aires, El Ateno, 1947, 4.ª ed., p. 392, nota 44. Apud., Concessão de Serviços

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“Entende-se por concessão de serviço público o ato

complexo através do qual o Estado atribui a alguém o

exercício de um serviço público e este aceita prestá-lo

em nome do Poder Público sob condições fixadas e

alteráveis unilateralmente pelo Estado mas por sua

conta, risco e perigo, remunerando-se com a própria

exploração do serviço, geralmente pela cobrança de

tarifas diretamente dos usuários do serviço e tendo

garantia contratual de um equilíbrio econômico-

financeiro”.25

Já para o saudoso HELY LOPES MEIRELLES, “a concessão é a

delegação contratual ou legal da execução de um serviço, na forma autorizada e

regulamentada pelo Executivo (cf. Mario Masagão – Natureza Jurídica da

Concessão de Serviço Público, 1933, p.10). O contrato de concessão é ajuste de

Direito Administrativo, bilateral, onerodo, comutativo e realizado ‘intuitu

personae’”26

Ou seja, observe-se: (i) bilateral, considerando que de um lado do

contrato temos o poder público e do outro o particular; (ii) oneroso, pois o

concessionário, ao assumir a prestação dos serviços, deverá aplicar recursos

financeiros para prestar um serviço adequado; (iii) comutativo, uma vez que os

contratantes ajustam prestações equivalentes e recíprocas e (iv) realizado ‘intuitu

personae’ pois, o contrato regerá a relação entre o ente estatal e especificamente

o vencedor do certame licitatório, não podendo este transferir simplesmente o

direito a ele conferido a outrem.

Públicos, MARÇAL JUSTEN FILHO, Dialética, S. Paulo, 1997.25 CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, Curso, cit. 369).26 Direito Administrativo Brasileiro, cit., p. 337).

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Atente-se para o entendimento de CRETELLA JR. Acerca do contrato

de concessão:

“o processo pelo qual a pessoa jurídica pública,

denominada ‘autoridade concedente’, transfere à

pessoa jurídica ou física, de direito privado,

denominada ‘concessionária’ a tarefa de gerir

determinado serviço público sob a fiscalização da

autoridade concedente, mediante remuneração que

consiste, na maioria das vezes, em quantia em dinheiro

(tarifa) que o concessionário receberá das pessoas que

usam o serviço público ou usuários.

A concessão de serviços públicos é, pois, o modo de

gestão de serviço, durante determinado tempo,

mediante remuneração paga pelos usuários”.27

Conclui-se, portanto, que o contrato de concessão representa um

vínculo jurídico entre o poder concedente e o concessionário, onde ambos estão

atrelados a interesses recíprocos, a fim de produzir uma vantagem a coletividade.

Importante é considerar que num Estado de Direito, onde as partes

são livres para contratar, não há o que se falar em inadimplência do Estado diante

de um contrato de concessão. Tal fato dispensa previsão legal pois, em havendo

inadimplemento por parte do poder concedente, ou até mesmo prática de ato

ilícito, este será responsabilizado civilmente por isso.

2.2 A REMUNERAÇÃO DO CONCESSIONÁRIO DE SERVIÇO PÚBLICO

Conforme já explicado, o concessionário de serviço público, ao

celebrar um contrato com a Administração, estará, acima de tudo, visando o lucro.

27 Manual de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Forense, p. 238.

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Esse lucro, objetivado pelo concessionário, caminha paralelamente à

obrigação do concessionário de realizar investimentos para a melhoria da

prestação do serviço.

Assim sendo, daremos início ao estudo das formas de obtenção de

lucro, por parte do concessionário, num contrato de concessão.

Primeiramente, faz-se necessário mencionar que a forma pela qual o

concessionário obtém o lucro é através do preço público, mais conhecido como

tarifas. A tarifa permitirá ao concessionário a justa remuneração pelos serviços

prestados, assegurando, sobretudo, o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

A Constituição Federal prevê, em seu artigo 175, III, que a lei

discipline sobre a política tarifária de modo a preocupar-se com o direito dos

usuários e com a adoção de tarifas compatíveis à prestação do serviço adequado.

Confira-se a transcrição do trecho legislativo referente à Lei de Concessões n.º

8.987/95 em seu artigo 9.º:

“Art. 9.º. A Tarifa do serviço público concedido será

fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e

preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei,

no edital, e no contrato.

§ 1.º A tarifa não será subordinada a legislação

específica anterior.

§ 2.º Os contratos poderão prever mecanismos de

revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio

econômico-financeiro.

§ 3.ºRessalvados os impostos sobre a renda, a criação,

alteração ou extinção de qualquer tributos ou encargos

legais, após a apresentação da proposta, quando

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comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa,

para mais ou para menos, conforme o caso.

§ 4.º Em havendo alteração unilateral do contrato que

afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o

poder concedente deverá restabelece-lo,

concomitantemente à alteração.

Assim sendo, verifica-se que a tarifa será estipulada com base no

certame licitatório e, ocorrendo mudança que acarrete impacto no preço

avençado, implicará na revisão da mesma para garantir o equilíbrio financeiro do

contrato.

Ademais, as tarifas precisam corresponder ao critério da

razoabilidade, visando, de um lado, a defesa do usuário, e do outro, a estabilidade

financeira das concessões, de modo a permitir ao concessionário, a justa

remuneração para a expansão e melhoria dos serviços.

Ora, de que vale manter uma tarifa abaixo do normal, se isto

implicaria a prestação de um serviço insuficiente, antiquado, não atendendo aos

requisitos essenciais do mundo moderno, e ainda mais, não satisfazendo aos

usuários.

O conceito de justa remuneração do capital se define em:

“No determinar essa justa remuneração do capital,

deve-se ter em vista a natureza do serviço

desempenhado; a existência ou não do monopólio,

legal ou de fato,; o risco maior ou menor, a que esteja

exposto o capital; a necessidade de atrair capitais, para

expansão e melhoramento do serviço, e a remuneração

atualmente obtida por empresas de serviço público que

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corram os mesmos riscos e incertezas, no mesmo

lugar”.28

Esta questão é de suma importância visto que, ao ser estabelecido o

valor da tarifa, deve-se analisar, primeiramente, se o usuário terá ou não

condições de bem usufruir daquele serviço, e por fim, se o concessionário auferirá

o lucro esperado.

“As tarifas devem ser bitoladas dentro de termos

razoáveis, a fim de, por um lado, permitir a difusão do

serviço público por toda a população e por outro lado,

dar resultado financeiro ao concessionário. Elas se

subordinam aos lucros a que tem direito o

concessionário pelos serviços prestados”.29

Portanto, os lucros dos concessionários não devem ficar aquém ou

além da justa remuneração do capital.

Veja-se a lição de BIELSA:

“É certo que o concessionário atua por conta e risco

próprios, salvo pacto especial em contrário, e já nesse

sentido a gestão patrimonial entrará na órbita de seu

direito. Mas como o concessionário não pode converter

a exploração do serviço em um em um negócio

lucrativo sem limites, o que implicaria enriquecimento

irregular à causa dos usuários como conseqüência de

uma atividade própria do Estado, este tem o dever de

28 J H MEIRELES TEIXEIRA, Revisão das Tarifas do Serviço Telefônico, 2.ª Edição, 1943, p. 125.29 OSWALDO ARANHA BANDEIRA DE MELO, Aspectos da Regulamentação dos Serviços Públicos, Revista Forense, vol.87, p. 20.

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moderar a exploração mediante a revisão de tarifas,

que devem ser justas e razoáveis”.30

Acrescente-se que, no que tange a fixação do preço das tarifas, tal

prerrogativa cabe, única e exclusivamente, ao Poder Concedente. Nem mesmo a

previsão legal daria o direito do concessionário exercer tal função.

O que, muitas vezes se permite, é conceder ao concessionário a

elaboração de um estudo atinente à definição da tarifa.

Repita-se, mais uma vez, que a tarifa possui a dupla função de

retribuir o capital investido, e a de propiciar recursos para expansão e melhoria do

serviço.

Desse modo, o Poder Concedente, com base na proposta inicial

(edital de licitação), deverá utilizar-se da seguinte forma para definir o preço da

tarifa:

Custos mais lucro mais amortização de investimentos

menos receitas alternativas, complementares ou

acessórias ou de projetos associados.

Conforme a fórmula acima, verifica-se que além da tarifa cobrada

dos usuários, existem outras formas de obtenção de receitas31 para ajudar no

lucro do concessionário.

Objetivando atender ao princípio da modicidade das tarifas, pode o

Poder Concedente, além das tarifas pagas pelos usuários, delegar ao

30 BIELSA, Derecho Administrativo, B. Aires, El Ateneo, 1947, 4.ª ed., pp. 394-395. Apud MARÇAL JUSTENFILHO, Concessões de Serviços Públicos, Dialética, São Paulo, 1997, p. 252.31 Receitas: soma pecuniária recebida pelo concessionário. Despesas: gastos alusivos ao serviço público.

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concessionários outras formas de remuneração, as chamadas receitas

alternativas.

A modicidade da tarifa não significa imperativo de valor reduzido. O

custo do serviço público não poderá ser arcado pelo concessionário, sendo assim,

transferido para comunidade através de tarifas. O cumprimento de todos os

objetivos fixados no art. 6.º (trata do serviço adequado que será apreciado

oportunamente) produz, como efeito direto, a elevação dos custos e das tarifas.

Portanto, a modicidade da tarifa corresponde à idéia de menor tarifa em face do

custo, e do menor custo, em face da equação do serviço.

Antes de entrarmos mais a fundo no que se refere às tarifas

alternativas, é imperioso frisar que, ao elaborar o edital de licitação, o Poder

Concedente deverá, desde início, ventilar a questão referente a modalidade de

tarifação para a prestação do serviço.

Existem três formas de determinar a maneira pela qual será cobrada

a prestação do serviço:

(a) Onde a única forma de arrecadação será através

das tarifas pagas pelos usuários. Esta tarifa será

fixada em função do custo da prestação do serviço;

(b) Existe a remuneração através da tarifa paga pelo

usuário, complementada por outros tipos de

receitas. Ocorre quando se deve fixar tarifa módica;

(c) Por último, temos o caso da remuneração provir

inteiramente de outro tipo de receitas que não a

tarifa.

Confira o trecho legal que prevê tal determinação por parte da

Administração Púbica:

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“Art. 11. No atendimento às peculiaridades de cada

serviço público, poderá o poder concedente prever, em

favor da concessionária, no edital de licitação, a

possibilidade de outras fontes provenientes de receitas

alternativas, complementares, acessórias ou de

projetos associados com ou sem exclusividade, com

vistas a favorecer a modicidade das tarifas, observado

o disposto no art. 17 desta Lei”.32

Além da receita proveniente da tarifa paga pelos usuários,

passaremos a estudar outras formas de obtenção de ganhos.

As receitas alternativas substituem as receitas cobradas dos

usuários. Neste caso, os usuários utilizarão os serviços sem qualquer ônus. As

receitas, poderão surgir, por exemplo, da utilização de certos espaços para

publicidade, cobrada pelos concessionários.

Temos também as receitas complementares, são aquelas utilizadas

para complementar o valor da tarifa cobrado pelos concessionários. Isto ocorre

quando o preço cobrado pela tarifa não consegue equiparar-se ao valor

despendido pelos concessionários para prestação e implementação dos serviços.

Já as receita acessórias, têm a mesma finalidade das outras duas já

citadas. Ocorre que, estas, serão acessórias à principal. Um exemplo de receita

acessória é a venda de folhetos explicativos, produzidos pelo concessionário de

transporte público, destinados a orientar aos usuários sobre as utilidades

existentes no trajeto a ser percorrido.

32 Lei Federal de Concessões n.º 8.987/95

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Por último, temos as receitas derivadas de projetos acessórios.

Estas diferem das anteriores, pois são obtidas através de projetos associados,

porém inconfundíveis com aquelas da concessão. Um exemplo de receita

derivada é o caso de ao longo de uma obra pública, objeto da concessão, surgir

um projeto de um centro comercial interligado a obra. Dá-se então, ao

concessionário, o direito de explorar o centro comercial.

Para complementar a análise dos diversos tipos de receitas, deve-se

levar em consideração também, a possibilidade de atribui ao concessionário, a

exclusividade de determinada exploração ou não.

Lembre-se que, isto não ocorrerá se parte das receitas adquiridas

pelo contratado for suficiente para suprir os gastos na melhoria do serviço bem

como para promover o lucro do concessionário.

Por fim, saiba que, apesar do princípio da uniformidade da tarifa,

esta poderá ser diferenciada, porquanto não são todos os serviços que

apresentam a mesma complexidade na sua execução.

“Art. 13. As tarifas poderão ser diferenciadas em função

das características técnicas e dos custos específicos

provenientes do atendimento aos distintos segmentos

de usuários”.

Ou seja, não é pelo fato de duas empresas prestarem serviços de

saneamento básico em duas cidades distintas, que ambas deverão cobrar a

mesma tarifa, pois uma das cidades pode apresentar, em sua disposição

geográfica, condições muito menos favoráveis à prestação do serviço, de modo

que as instalações sejam bem mais complexas que na outra. Neste caso a tarifa

deverá compensar tal complexidade. Portanto, serão diversas.

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Outro exemplo pode ser citado considerando que duas cidades

apresentem a mesma disposição geográfica, e os mesmos custos de instalação

dos serviços, apenas que, o nível econômico-social de uma é bem inferior ao da

outra. Neste caso, deverá ocorrer a redução da tarifa para aquela, cujo potencial

econômico é inferior, podendo assim os usuários se valerem da prestação do

serviço.

Para que haja o reconhecimento da necessidade de se estipular um

valor diferente às tarifas, é preciso que haja a comprovação da alegação.

Ademais, a diferenciação deverá ser compatível com os valores jurídicos

consagrados constitucionalmente.

Apenas a título ilustrativo, faremos, a seguir, uma análise de uma

modalidade distinta das receitas já estudadas, qual seja, a receita “extrafiscal”.

Esta receita aparece quando Estado encontra-se em época de

racionamento de um determinado serviço. Assim, para prevenir o uso excessivo

daquele serviço, e sendo praticamente impossível regular caso a caso, o Estado

determina um agravamento na tarifa para aqueles que consumirem mais o serviço,

tentando, com isso, evitar um colapso no sistema geral.

Embora tenhamos verificado as diversas formas de remuneração do

concessionário, devemos lembrar que, seja qual for a forma de tarifação aplicada,

a garantia àquele, de um valor que possibilite a melhoria e a expansão dos

serviços, e um lucro para cobrir os gastos efetuados, é o que verdadeiramente

importa.

2.3 O PRAZO DAS CONCESSÕES DE SERVIÇOS PÚBLICOS

Inicialmente, os contratos de concessão recebem tratamento

diferenciado dos demais contratos administrativos, no que se refere ao prazo de

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duração. Os contratos administrativos em geral, regidos pela Lei 8.666/93 em seu

artigo 57, II, prevêem o seu prazo máximo de 5 anos.

Já para os contratos de concessão não há prazo máximo determinado (a Lei não

referencia a respeito).

Assim, levando-se em consideração que a tarifa cobrada pelo

concessionário deve ser módica e capaz de cobrir o custo do investimento

efetuado, faz-se necessária a celebração de um contrato longo, possibilitando ao

concessionário, a cobertura do referido investimento.

É através do extenso prazo contratual, que o concessionário terá

mais chances de reaver os seus investimentos.

Vale salientar que, os contratos de concessão, com base no edital,

poderão ter os seus prazos estendidos, até que se concretize a amortização dos

investimentos despendidos.

Tal característica desses contratos acarreta, no caso de rescisão por

ato unilateral da administração, em multa indenizatória elevadíssima ao

concessionário, porquanto o prazo contratual é bastante longo.

Por outro lado, o prazo do contrato de concessão pode ser menor se,

em havendo disponibilidade de delegar ao concessionário o maior número de

receitas, este, através delas, terá o seu dinheiro devolvido mais rapidamente, não

havendo, assim, a necessidade de um contrato de longa duração.

Portanto, antes de se determinar a duração do contrato de

concessão, é preciso executar um estudo minucioso de averiguação quanto ao

prazo necessário para a amortização dos investimentos do contratado. Dessa

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forma, pode-se dizer que o prazo de concessão dos serviços públicos está

atrelado à equação econômica do contrato.

Logo, não é cabível a colocação de que o Estado, ao delegar certa

atividade ao particular, estaria frente a um alívio de caixa. Pelo contrário, sendo o

contrato de longa duração, a motivação para tanto deverá ser solidamente

justificada.

2.4 A ADEQUAÇÃO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO

Todo e qualquer serviço público prestado, seja pelo Estado ou pelo

Concessionário, deverá ser adequado. “In casu”, tratando-se dos casos de

concessão de serviços públicos, a prestação do serviço adequado é dever do

concessionário perante o poder concedente e os usuários.

No tratamento da questão da garantia da prestação de um serviço

adequado, aparecem três figuras importantes: a primeira refere-se ao Estado

como poder Concedente, que deverá exigir do contratado a prestação do serviço

adequado, através da observância dos dispositivos contratuais. A Segunda, o

Concessionário, que promoverá todas as atividades necessárias para que o

serviço seja compatível ao modelo legal. Por último, a terceira figura, os usuários,

que serão os destinatários finais do serviço prestado.

O serviço adequado é, conforme já dito, elemento capital em um

contrato de prestação de serviço público. Está exigência esta amplamente

esculpida na Lei que trata dos contratos de concessões e permissões de serviços

públicos (Lei 8.987/95). Veja-se:

“Art. 6.º Toda concessão ou permissão pressupõe a

prestação de serviço adequado ao pleno atendimento

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dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas

normas pertinentes e no respectivo contrato.

§ 1.º Serviço adequado é o que satisfaz as condições

de regularidade, continuidade, eficiência, segurança,

atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e

modicidade das tarifas.

§ 2.º A atualidade compreende a modernidade das

técnicas, do equipamento e das instalações e a sua

conservação, bem como a melhoria e expansão dos

serviços.

§ 3.º Não se caracteriza como descontinuidade do

serviço a sua interrupção em situação de emergência

ou após prévio aviso, quando:

I – motivada por razões de ordem técnica ou de

segurança das instalações; e,

II – por inadimplemento do usuário, considerado o

interesse da coletividade.

Apenas a título de complementação, verifique-se que o parágrafo

terceiro do artigo supramencionado, trata das causas excludentes da

descontinuidade do serviço público.

Ou seja, havendo a paralisação dos serviços públicos face a um dos

motivos enquadrados nos incisos I e II, não estará o concessionário diante de um

caso de quebra do princípio da continuidade do serviço público.

Como exemplo para o inciso I, temos o corte de eletricidade, em

razão da necessidade de se realizar algum reparo na rede elétrica. Neste caso os

usuários serão previamente avisados. Para o inciso II, o usuário de telefonia fixa

que não paga sua conta telefônica. Neste caso, o concessionário poderá cortar o

serviço de linha.

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Ressalta-se que, com relação ao segundo caso, não poderá o

concessionário suspender os serviços quando forem essenciais à dignidade da

pessoa humana. Neste caso, caberá ao Estado resolver o impasse da

inadimplência, seja por vias de cobrança compulsória do usuário, seja, até

mesmo, pela elevação do valor da tarifa.

Salienta-se que, o entendimento jurisprudencial referente a

possibilidade de corte de serviços essenciais, não é manso e nem pacífico.

Mais adiante, aludida Lei, no capítulo que trata dos encargos do

concessionário, trata da questão da obrigatoriedade da prestação de um serviço

adequado:

“Art. 31. Incumbe à concessionária:

I – prestar serviço adequado, na forma prevista nesta

Lei, nas normas técnicas aplicáveis e no contrato;

(...)

Pode-se dizer, em sentido “latu sensu”, que a prestação do serviço

adequado existe quando a prestação do serviço é eficiente, de modo que esta

eficiência seja a aptidão da atividade a satisfazer à necessidade do modo menos

oneroso.

“O conceito de adequação do serviço não se aplica às

hipóteses de concessão ou permissão. Todo serviço

público, simplesmente por sê-lo, deve ser prestado

adequadamente, o que significa, na radição da

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doutrina, ser dotado das qualidades de generalidade,

uniformidade, continuidade e regularidade”.33

A seguir estão delimitadas as características de um serviço

adequado, conforme já previu o § 1.º do art. 6.º, da Lei de Concessões.

Referido dispositivo legal, ao determinar o que vem a ser o serviço

adequado, preceitua oito características, quais sejam:

(i) Regularidade – sob certo ponto de vista, ele pressupões continuidade,

para o serviço ser regular, deve ser contínuo. O serviço regular ocorre

quando é mantida a sua prestação, sob padrões qualitativos e

quantitativos uniformes;

(ii) Continuidade – significa ausência de interrupção, segundo a natureza

da atividade desenvolvida e o interesse a ser atendido. Ressalta-se que

os serviços podem ser contínuos e não necessariamente regulares;

(iii) Eficiência – decorre da prestação de um serviço satisfatório. A eficiência

passeia por quase todos os demais itens, pois, a soma de todas as

características indispensáveis leva a uma prestação eficiente dos

serviços, de modo a satisfazer os usuários;

(iv) Segurança – decorre da adoção de técnicas conhecidas e de todas as

providências necessárias para reduzir o risco de danos, ainda que

sabido serem tais providências, insuficientes para afastar totalmente o

dano ao usuário. Todas as cautelas devem ser tomadas pelo

concessionário para garantir a segurança dos usuários;

33 MIGUEL ÁNGEL BERÇAITZ, Teoria Geral de los Contratos Administrativos, B. Aires, Depalma, 2.ª Ed., 1980, p. 426.Apud., MARÇAL JUSTEN FILHO, Concessões de Serviços Públicos, Dialética, São Paulo, 1997, p. 123.

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(v) Generalidade – tratando-se de serviço público, este deve ser prestado

de modo que possa beneficiar a todos. Consiste na universalização da

oferta do serviço, de modo que propicie a fruição deste, por todos os

potenciais usuários. Ofende-se o princípio da generalidade não com a

mera fixação de limites, mas com o privilégio na eleição dos usuários

que serão beneficiados;

(vi) Cortesia – o concessionário não é dono dos serviços prestados. Não

pode pensar que está fazendo um favor ao usuário. Pelo contrário, o

concessionário apenas administra a prestação do serviço. Assim sendo,

deve o concessionário tratar o usuário com respeito e civilidade. Não se

pode admitir o desrespeito ao usuário. Se isto ocorrer, estaremos diante

de uma ofensa à dignidade humana;

(vii) Atualidade – relevante característica das concessões de serviços

públicos, está enquadrado na idéia de modernização tecnológica. No

entanto, não se pode descartar a idéia de que um serviço antigo não

seja eficaz. Ao se verificar a necessidade de se atualizar um serviço,

deve-se, primeiramente, observar as questões econômicas que

acarretarão tal mudança. Isto porque, não será o concessionário quem

arcará com os investimentos de modernização, e sim os usuários

através do pagamento de tarifas. Portanto, é importante saber, se a

modernização pretendida não elevaria em muito o custo final das tarifas,

inviabilizando, assim, a fruição dos usuários. O que se deve ter em

mente é que não importa se o serviço atende as modernas inovações

globais, e sim se ele é prestado de forma eficiente ou não. Não sendo,

faz-se necessário a sua atualização em busca da adequação do serviço.

(viii) Modicidade – conforme já explanado, modicidade da tarifa não quer,

necessariamente, dizer redução do preço. A modicidade da tarifa

corresponde à idéia de menor tarifa em face do custo, e do menor custo

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em face da adequação do serviço. Será módica a tarifa quando seu

valor for o menor possível, mesmo que seus valores absolutos possam

ser considerados elevados.

O Estado deverá fiscalizar periodicamente o concessionário, para

constatar se o mesmo está prestando o serviço adequadamente.

Esta fiscalização está prevista em lei, não podendo o Estado deixar

de fazê-la. Na elaboração do contrato, estarão previstas as formas de fiscalização,

que poderão, por vontade do poder concedente, ser alteradas, de forma que não

tragam prejuízos ao concessionário.

Assim sendo, pode se concluir que, a falta de remuneração

adequada ao concessionário, ou a não observância do princípio do equilíbrio

econômico-financeiro do contrato, comprometerão a prestação adequada dos

serviços públicos. Contudo, a remuneração do concessionário é assunto de

extrema relevância no combate a degradação dos serviços públicos, e

conseqüente prejudicialidade à coletividade.

Por fim, o Estado, ao se preocupar com a remuneração do

concessionário, não o estará protegendo, mas sim, preservando o interesse

público através da adequação dos serviços prestados.

2.5 O FINANCIAMENTO DAS CONCESSÕES DE SERVIÇO PÚBLICO

Sabe-se que, a maioria dos contratos de concessão, por serem

complexos e exigirem elevados investimentos, acabam se tornando bastante

onerosos para o concessionário.

Dessa forma, é garantido ao concessionário o direito de buscar

recursos para a execução das obras, tendo em vista a necessidade da prestação

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do serviço adequado. Posto isso, poderá adquirir financiamento externo com

terceiro que acredite no desenvolvimento e na lucratividade do serviço de

concessão.

Este financiamento recebe o nome de project finance, e sua

definição é a seguinte:

“a captação de recursos para financiar um projeto de

investimento de capital economicamente separável, no

qual os provedores de recursos vêem o fluxo de caixa

vindo do projeto como fonte primária de recursos para

atender aos serviços de seus empréstimos e fornecer o

retorno sobre seu capital investido no projeto”.34

Diante disso e com respaldo legal, mais precisamente no artigo 28

da Lei 8.987/95, verifica-se a possibilidade da concessionária, em busca verbas

para viabilizar o projeto, oferecendo ao credor a garantia dos direitos decorrentes

da concessão. Confira-se.

“Art. 28. Nos contratos de financiamento, as

concessionárias poderão oferecer em garantia os

direitos emergentes da concessão, até o limite que não

comprometa a operacionalização e a continuidade da

prestação do serviço”.

Em primeiro lugar, deve-se visualizar que o concessionário somente

poderá atrair investidores, se o negócio for bom. Ou seja, o investidor, em

princípio, verificará a segurança do contrato e a margem de lucro existente no

mesmo.

34 CF. JOHN D. FINNERT, Project Finance, Rio de Janeiro, Qualitymark Editora, 1998, p. 02.

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A margem razoável no contrato pode ser entendida como:

“Chama-se margem razoável de remuneração do

capital aquela necessária para atraí-lo, suficiente para

inspirar confiança na estrutura financeira de uma

empresa, e adequada à conservação integral do seu

crédito”35

O equilíbrio econômico-financeiro, sem sombra de dúvidas, é

condição central para o ente financiador, devendo, por isso, ser observado no

início do contrato. Afinal, de nada adiantaria, se necessário fosse, rever tal

condição ao final do mesmo, pois até lá, o projeto já poderia ter sido todo

inviabilizado.

É preciso ter em mente que, sempre que aparecer um fator gerador

de desequilíbrio, o poder concedente deverá, imediatamente, fazer prevalecer o

equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Ao analisar o entendimento da doutrina estrangeira, FLORIANO

AZEVEDO MARQUES NETO, asseverou, em seu artigo, comentários sobre o tema:

“Como outra vez nos lembra Finnerty, ‘um project

finance requer uma cuidadosa engenharia financeira

para alocar os riscos e retornos entre as partes

envolvidas, de foma que seja mutuamente aceitável’.

Qualquer alteração nesta engenharia financeira

(equilíbrio da concessão) trará empecilhos para a

efetivação do projeto, prejudicando não só os

empreendedores como o próprio poder concedente”.

35 ANHAIA MELO, ob. cit., p. 117. Ver igualmente, ODILON C. ANDRADE, Serviços Públicos e de Utilidade Pública, 1937,p. 130; FRANCISCO CAMPOS, Direito Administrativo, 1943, p. 156. Apud., RDA, julho/setembro, 1961, p. 15.

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Decorre daí que o ordenamento jurídico, no caso das

concessões, a par de assegurar e garantir o direito do

concessionário ao reequilíbrio econômico e financeiro,

introduz uma exigência de que a restauração deste

seja concomitante ao evento desequilibrador. É o que

vemos predicado no art. 9.º, § 4.º da Lei 8.987/95. Isso

porque se apercebeu o legislador de que, nas

complexas modelagens de contrato de concessão,

mormente a partir da introdução dos referidos project

finance, de nada servirá recompor o equilíbrio ao final

do contrato, pois até lá poderá já estar inviabilizado

todo o projeto”.36

Por todo o exposto, pode-se concluir que todos os contratos de

financiamentos, contraídos com o objetivo de atender as exigências do contrato de

concessão, estarão vinculados entre si, e que o primeiro é condição “sine qua non”

para o cumprimento do segundo, e assim por diante.

Além do mais, estará o poder concedente, nos casos de

inadimplência da administração, e acarretando prejuízo ao concessionário para

com o seu financiador, obrigado a ressarcir os danos, através do pagamento dos

juros mais altos pagos pelo contratado ao seu credor.

2.6 HIPÓTESES DE EXTINÇÃO DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO

São modalidade de extinção do contrato de concessão de serviço

público: (a) advento de termo contratual; (b) encampação; (c) caducidade; (d)

rescisão; (e) anulação; e (f) falência ou extinção da concessionária.

36 Artigo publicado no Boletim de Licitações e Contratos de julho de 2002, pág. 421.

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O advento do término do contrato de concessão, ou também

conhecido como reversão se dá pelo término do prazo estipulado entre as partes

para prestação do serviço. O término do contrato se traduz no retorno do serviço

às mãos do poder concedente, e a transferência de quaisquer bens que estejam

ligados à prestação dos serviços.

Já a encampação, ou resgate, pode ocorrer em pleno curso da

concessão, de modo que a Administração, em razão de interesse administrativo,

retome o serviço concedido ao particular. Ressalta-se que, neste caso, o Poder

Concedente deverá indenizar o concessionário.

No que se refere à caducidade da concessão, esta se caracteriza

pela inadimplência do concessionário, seja pelo descumprimento de cláusulas

contratuais, seja pela prestação inadequada dos serviços, seja pela paralisação

dos serviços - salvo as hipóteses previstas na lei - e seja até mesmo, em face de

condenação (transitada em julgado) por sonegação de tributos. Nesta modalidade,

pode-se, também, inserir a rescisão do contrato, que ocorrerá face ao interesse

público, e jamais esquecendo da garantia da competente indenização cabível ao

particular.

A anulação do contrato se dá quando verificada a ocorrência de

ilegalidade na formalização do contrato. Ou seja, se a lei prevê determinada

questão, e o contrato não a respeita, este será nulo. No caso da licitação for

declarada nula, o contrato também será. Deve-se ter em mente que, o contrato

somente poderá ser anulado se verificada ilegalidade no mesmo. O contrato nulo

poderá acarretar para administração o dever de indenizar o contratado, no

entanto, aludida indenização se fundará não na obrigação contratual (inexistente,

no caso, tendo em vista a nulidade contratual), mas sim através do dever moral e

legal.

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Por fim, a última hipótese de extinção do contrato de concessão é

aquela proveniente de falência ou extinção do concessionário. Neste caso, face a

insolvência do concessionário, o contrato deverá ser extinto. Não seria possível

permitir ao concessionário, a sua continuidade na prestação do serviço, uma vez

que perderá a característica de idoneidade. Já com relação a extinção do

concessionário, a extinção do contrato deverá ocorrer pois, conforme dito, o

contrato é celebrado “intuitu personae”, e uma vez extinta a empresa contratada, o

contrato perderá o seu objeto.

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3 - AS HIPÓTESES DE QUEBRA DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-

FINANCEIRO DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO

3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Em referência ao exposto, não resta dúvidas quanto ao fato que,

tendo as partes celebrado um contrato administrativo com base no princípio da

autonomia da vontade, a equivalência deverá ser mantida até o final do contrato,

podendo, tão somente, ser alterada mediante um novo acordo entre as partes.

Entretanto, e conforme o abordado no início do trabalho, o contrato

de concessão recebe uma característica diferente dos contratos celebrados entre

os particulares. Esta diferença aparece através da mutabilidade do contrato, que

poderá advir tanto de fatos inerentes ou externos ao contrato. É a partir desses

fatos que ocorrerá o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Mais especificamente, pode-se dizer que referida mutabilidade está

relacionada a fatos que alteram direta ou indiretamente a equação financeira do

contrato, ou ainda àqueles atos unilaterais da administração pública que decorrem

do seu poder exorbitante.

É obvio que, qual seja o caso gerador do desequilíbrio do contrato ao

concessionário, lhe será garantido a justa indenização por perdas e danos.

“O rompimento do equilíbrio econômico-financeiro da

contratação tanto poderá, derivar de fatos imputáveis à

Administração como de eventos a ela estranhos. A

Administração poderá ampliar os encargos do

contratado, unilateralmente, para melhor atender as

suas necessidades, por exemplo. Ou poderá fazer-se

necessária redução de prazos de fornecimento; ou a

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Administração poderá alterar a composição química de

produtos alimentícios, para aumentar suas qualidades

nutritivas. Mas o rompimento do equilíbrio econômico

financeiro poderá decorrer de outros fatos, totalmente

alheios à Administração. Assim, a crise econômica

poderá produzir uma extraordinária elevação de preço

de determinados insumos; uma greve poderá acarretar

a impossibilidade de fabricação dos produtos; uma

crise internacional poderá provocar elevação

extraordinária dos preços dos combustíveis, etc.”.37

Quanto a atuação do Estado, no exercício de seu poder exorbitante,

não lhe será permitido alterar o contrato ilimitadamente. Pelo contrário, o Poder

Concedente, somente poderá alterar questões acessórias ao objeto da licitação,

sob pena de nulidade do certame licitatório.

Pois bem, ao delimitar de forma mais precisa as causas de quebra

do equilíbrio econômico-financeiro, conclui-se que o desequilíbrio dar-se-á em

face da “defasagem do preço da tarifa cobrada, da imposição, direta ou indireta,

de novos encargos para o concessionário, da alteração das condições de

exploração do bem ou do serviço, ou de fatores externos que afetem as condições

de realização do negócio, entendida aí a imbricação entre investimento, tempo de

amortização, taxa de retorno, percentual de lucro, fluxo de caixa etc.”.38

Antes de adentrarmos mais profundamente no estudo das áleas

correspondentes ás causas de desequilíbrio econômico-financeiro do contrato,

faz-se necessário uma breve explicação sobre as áleas ordinária e extraordinária.

37 MARÇAL JUSTEN FILHO, Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 4.ª edição, Ed. Dialética, Rio deJaneiro, Aide, 1996, p. 399.38 PLÍNIO A. BRANCO: “As relações que se estabelecem entre investimento, remuneração do capital, taxa de renovação edespesas de operação das instalações (compreendendo as de custeio dos serviços e as de conservação das instalações),

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As áleas ordinárias são aquelas correspondentes à variação do lucro

do concessionário e, está vinculada ao risco que todo contrato apresenta por

natureza, como por exemplo, o resultado da própria flutuação do mercado.

Temos também a chamada álea administrativa, que abrange duas

modalidades, quais sejam: (i) o poder de alteração unilateral da administração e

(ii) o fato do príncipe.

As áleas extraordinárias correspondem a um risco imprevisível,

inevitável e não imputável ao contrato, mais precisamente, e conforme veremos,

correspondem as áleas econômica e administrativa.

Basicamente, estes são os fatores causadores do desequilíbrio do

contrato, que serão a seguir, vistos com maior abrangência.

Lembre-se que, a administração tem o poder-dever de reajustar os

termos do contrato, em caso de rompimento do equilíbrio econômico-financeiro.

3.2 ÁLEA ORDINÁRIA OU NEGOCIAL

Conforme acima citado, nem todos os fatores geradores do

desequilíbrio econômico financeiro, são pacíficos de revisão pela Administração.

Em todo e qualquer contrato celebrado com a administração, a álea

administrativa estará presente, pois esta álea está diretamente ligada àqueles

riscos existentes em função da flutuação de mercado.

Desde a celebração do contrato, o particular já deverá saber dos

riscos inerentes ao mesmo. Sendo assim, deve-se partir do princípio que, tais

riscos, serão considerados do concessionário.

determinam a equação econômica do contrato de concessão” (Cf. Diretrizes Modernas para Concessão de Serviços de

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Há quem entenda, como por exemplo, CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE

MELLO, que, seja qual for o tipo de álea geradora do desequilíbrio, será o Poder

Concedente o responsável em providenciar o reequilíbrio do contrato, visando

garantir ao concessionário, a justa remuneração, indispensável para a melhoria e

a expansão dos serviços públicos.

No entanto, o que prevalece é o entendimento da maioria, onde as

questões previstas, da celebração do contrato, referente as áleas ordinárias,

sempre estarão presentes na vida do empresário, devendo, portanto, recair única

e exclusivamente por sua responsabilidade.

“A álea ordinária fica a inteiro cargo do concessionário,

que não se pode eximir ao risco voluntariamente

assumido. Na ocorrência, porém, de um ônus

imprevisível, ou da atribuição unilateral de novos

serviços, cumpre ao Estado absorver ou partilhar dessa

álea extraordinária, não somente por um princípio da

equidade, como pelo interesse público na manutenção

do serviço, dependente da estabilidade financeira do

concessionário”.39

Assim sendo, se houver desequilíbrio econômico-financeiro do

contrato, em razão da ocorrência de álea negocial, os riscos não serão

compartilhados entre o poder concedente e o concessionário, devendo, o último,

arcar com o prejuízo.

3.3 ÁLEA ADMINISTRATIVA

Utilidades Públicas, publicação da PMSP, 1949, p. 227, apud RDP 37/38, janeiro a junho de 1976, p. 87.39 GEORGES VEDEL, Droit Administratif, II, 1959, p. 579. Apud., RDA, janeiro/março, 1961, vol. 63, p. 2.

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As áleas administrativas estão inseridas nas chamadas áleas

extraordinárias, que por sua vez, se referem ao risco imprevisível, inevitável e não

imputável ao contrato, que devem ser ressarcidas pela administração.

Dentro do estudo das áleas administrativas, podemos dividi-la em

dois grupos, de um lado o fato do príncipe e do outro o fato da administração.

Primeiramente, vale lembrar que, é lícito ao poder concedente alterar

unilateralmente as condições do contrato, dentro é claro, dos limites legais, ode

deverá adaptar a mudança ocorrida à justa remuneração do concessionário.

“É lícito ao poder concedente alterar unilateralmente,

as cláusulas objetivas do serviço, e até agravar os

encargos ou as obrigações do concessionário, desde

que reajuste a remuneração estipulada, evitando a

quebra do equilíbrio econômico-financeiro do

contrato”.40

Em brilhante colocação o eminente Ministro AMÉRICO LUZ esclarece:

“Isto quer dizer que a prestação do serviço público é

feita em nome do poder público, sob condições

alteráveis unilateralmente pelo estado só que, além da

tarifa dever-se cobrar ao usuário do serviço público

permitido, há a obrigação de manter-se o equilíbrio

econômico-financeiro inicial, no caso desrespeitado

pela administração quando altera a permissão

quebrando aquele equilíbrio”.41

40 Recurso em Mandado de Segurança, n.º 3.161-6 RJ, Relator Ministro DEMÓCRITO REINALDO, Revista do SuperiorTribunal de Justiça, vol. 55, p. 378.

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O primeiro diz respeito ao fato do príncipe.

A teoria do fato do príncipe surgiu, originariamente, durante a época

do absolutismo, quando o Rei tinha o poder de descumprir qualquer contrato. Daí,

através de trabalho pretoriano da jurisdição administrativa francesa, passou a ser

aplicada nos contratos administrativos em geral.

Nos contratos de concessão, aquela teoria representa a prática de

um ato de autoridade administrativa, não relacionada diretamente ao contrato,

embora, indiretamente, repercuta sobre ele.

Vale dizer que, inicialmente a teoria do fato do príncipe abrangia todo

e qualquer ato de autoridade administrativa que viesse a onerar, direta ou

indiretamente, os encargos de exploração do concessionário.

Atualmente, para o Direito brasileiro, a teoria do príncipe somente se

caracterizará se a autoridade responsável pelo fato do príncipe, for da mesma

esfera do governo no contrato celebrado. Caso contrário, entende-se que deva ser

aplicada a teoria da imprevisão.

Em havendo a ocorrência de quebra do equilíbrio econômico-

financeiro em decorrência do fato do príncipe, a recomposição do contrato se fará

necessária e fundamentar-se-á na teoria da responsabilidade objetiva do Estado.

Cite-se, como exemplo, a majoração de um tributo que incida sobre

determinada matéria-prima necessária ao cumprimento do contrato de concessão,

ou medida de ordem geral que dificulte a importação dessa mesma matéria-prima.

Para que bem seja aplicada a teoria do fato do príncipe, deve-se

observar os seguintes requisitos: (i) que o ato seja praticado por pessoa jurídica

41 Recurso em Mandado de Segurança, n.º 582-SP, Ministro Relator AMÉRICO LUZ, Revista de Direito Administrativo,

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da mesma esfera governamental que a do contrato; (ii) que o ato acarrete prejuízo

ao contratado, desequilibrando assim, a equação financeira do contrato, sem que

seja confundido com a álea ordinária; e (iii) que este ato seja imprevisível ao

contrato.

Assim sendo, diante de um fato que desequilibre a equação

financeira do contrato, caberá à Administração indenizar o concessionário pelas

perdas e danos e também, se necessário for, pelos lucro cessantes.

O segundo caso, que compõe as áleas administrativas, é o fato da

administração. Este, diferentemente do fato do príncipe, está condicionado como

parte do contrato, quando o fato do príncipe parte de um ato da autoridade

pública, que acaba por refletir no contrato de concessão.

Mais precisamente, o ato da administração compreende qualquer

conduta da administração que torne impossível a execução do contrato, ou o seu

desequilíbrio econômico.

O fato da administração poderá causar ao concessionário, não só a

suspensão temporária do serviço, como a paralisação definitiva do mesmo.

Para aclarar mais a questão, veja-se o exemplo dado pelo saudoso

HELY LOPES MEIRELLES:

“quando a Administração deixa de entregar o local da

obra ou do serviço, ou não providencia as

desapropriações necessárias, ou não expede a tempo

as competentes ordens de serviço, ou pratica qualquer

ato impediente dos trabalhos a cargo da outra parte.

Até mesmo a falta de pagamento, por longo tempo, das

vol. 186, p. 138.

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prestações contratuais pode construir fato da

Administração capaz de autorizar a rescisão do

contrato por culpa do Poder Público com as

indenizações devidas”.42

O fato da administração poderá assemelhar-se ao caso de força

maior apenas no tocante à temporariedade e à previsibilidade do fato, ou seja,

quando decorre após a celebração do contrato, e de forma imprevisível.

No entanto, no caso de fato da administração, este se dará por culpa

do poder público, devendo o mesmo indenizar o contratado. Já no caso de força

maior, nada poderiam fazer ambos os contratantes, de modo a inviabilizar a

indenização, mas garantindo-se o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Partindo do acontecimento do fato da administração, surge a

seguinte indagação: seria cabível ao concessionário, invocando a exeptio non

adimpleti contractus, paralisar os serviços?

Para maior parte da doutrina a resposta é negativa, porquanto o

particular nada mais é do que um colaborador do ente público, de modo que este

deve agir em benefício do interesse público, não se admitindo a paralisação dos

serviços públicos.

Não obstante, parte da doutrina entende que a “exeptio non adimpleti

contractus” poderia ser aplicada em proporções menores que no direito privado.

Portanto, conclui-se que, sempre que a Administração Pública,

mediante ato lícito e de interesse público, modificar as condições de um contrato

administrativo já concluído, ela obrigatoriamente responderá pela álea

administrativa.

42 Licitação e Contrato Administrativo, 1990, 9.ª ed., p. 235-236.

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3.4 ÁLEA ECONÔMICA EXTRAORDINÁRIA

Outro fator passível de acarretar a quebra do equilíbrio econômico-

financeiro é o acontecimento de fatos imprevisíveis aos contratantes, fatos estes

que nunca estiveram previstos no contrato, e que acabam por gerar um

desequilíbrio insuportável na relação encargo/remuneração.

Mais precisamente, pode-se dizer que os fatos que levam a

aplicação da teoria da imprevisão poderão advir de questões administrativas, ou

até mesmo de fatos provenientes da natureza. Lembre-se que, referidos fatos

precisam, necessariamente, ser estranhos e imprevisíveis à vontade das partes,

de forma que tornem a relação contratual insuportável.

A teoria da imprevisão surgiu no Conselho de Estado Francês em

1916, sendo que sua repercussão no direito administrativo foi a mesma da antiga

cláusula “rebus sic stantibus”. Verificou-se, à época, que o princípio da

imutabilidade dos contratos (“pacta sunt servanda”), face a ocorrência de fatos

imprevisíveis às partes, estava levando um dos contratantes à ruína.

Segundo CAIO TÁCITO:

“foi o conflito mundial da segunda década do século

atual que veio reavivar a teoria. As violentas flutuações

econômicas geradas pelo desequilíbrio social e político

oriundo da guerra exigiram dos intérpretes e dos

tribunais a mitigação do princípio rígido da

imutabilidade dos contratos (pacta sunt servanda)”.43

43 Direito Administrativo, Saraiva, 1975, p. 297.

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Desse modo, não seria justo ao concessionário arcar com um

prejuízo que, em momento algum, estava previsto no contrato, pois se soubesse

de tal conseqüência, talvez pensasse duas vezes antes de celebrar o tal contrato.

Os contratos que têm duração sucessiva e não dependem de fatos

futuros devem ser cumpridos de modo que o avençado permaneça igualmente

como estava no momento da celebração.

Logo, diante do acontecimento imprevisível, seja ele proveniente da

administração ou da natureza, deverá o concessionário, sem é claro, paralisar os

serviços, pleitear junto ao Poder Concedente o equilíbrio contratual.

Vale dizer que o particular contratado não poderá requerer o

reequilíbrio do contrato, se não der continuidade aos serviços.

É evidente que podem existir casos em que o fato imprevisível torne

impossível a prestação do serviço, bem como a continuidade do mesmo. Neste

cenário, deverá a Administração rescindir o contrato e indenizar o concessionário,

porquanto este, nada poderia fazer em face das circunstâncias adversas à sua

vontade.

Ressalta-se que, caso fosse apurado que o fato gerador do

desequilíbrio contratual pudesse ser previsto pelo concessionário, ou ainda, que

não representasse um desequilíbrio muito grande, não estaríamos diante de uma

álea extraordinária econômica, e sim diante de uma álea negocial ordinária,

eximindo assim o Poder Concedente de reajustar o contrato.

Existe, também, um outro caso em que não ocorreria a adequação

contratual, qual seja, nos casos em que o particular pudesse evitar o fato, e não o

fez por culpa própria. Dessa maneira, não seria justo cobrar providências do ente

público, em face de uma desídia do contratado.

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Os fatores que ensejam na aplicação da teoria da imprevisão são

divididos em dois grupos: (i) fatos administrativos e (ii) fatos da natureza.

Os fatos administrativos são aqueles ligados à guerras, às crises

econômicas, à desvalorização da moeda, ao aumento do barril de petróleo, ao

bloqueio de preços pelo administração etc. Já as causas da natureza classificam-

se como os terremotos, as inundações, os incêndios, os desmoronamentos etc.

Faz-se necessário saber que, nem sempre deverá ser lançada a

aplicação da teoria da imprevisão, não cabendo, portanto, nos casos em que:

a) se foi o próprio contratado, com atuação

imprevidente e negligente, quem contribuiu para a

subversão da economia do contrato;

b) se o contrato não fez tudo quanto poderia ter feito,

com a diligência do homem probo, para impedir os

efeitos do evento perturbador da economia contratual;

e

c) se o contratado cometeu falta que prejudicasse a

execução contratual, como por exemplo, se tivesse

incorrido em mora no cumprimento de suas obrigações.

Para CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, no Direito brasileiro e,

diferentemente do Direito francês, aplica-se com mais freqüência a teoria da

imprevisão aos contratos, pois no Brasil, a gama de fatos que são considerados

áleas ordinárias, são muito mais amplos do que na França. Ademais, no Direito

Francês, quando invocada a teoria da imprevisão aos contratos, estabelece-se

uma repartição dos prejuízos, o que aqui no Brasil, o reajuste fica tão somente a

cargo da Administração Pública.

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Assim sendo, em síntese, os requisitos para aplicação da teoria da

imprevisão requerem que o fato seja: (i) imprevisível; (ii) estranho à vontade das

partes; (iii) inevitável; e (iv) responsável por desequilíbrio muito grande no

contrato.

A única diferença que se pode destacar entre a teoria da imprevisão

e a força maior, é que a primeira representa apenas um desequilíbrio econômico,

o que não impediria a execução do contrato, enquanto que na força maior,

verificar-se-ia a impossibilidade absoluta de dar prosseguimento ao contrato.

Por fim, resta comprovada a importância de garantir-se o equilíbrio

econômico-financeiro dos contratos diante das causas expostas neste capítulo.

Somente assim, o concessionário será capaz de dar a adequada continuidade à

prestação dos serviços públicos, executados sob sua responsabilidade.

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4 - AS FORMAS PARA RESTABELECER O EQUILÍBRIO ECONÔMICO-

FINANCEIRO

4.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

Conforme ensina o Professor ARNOLDO WALD:

“Constitui dever legal e contratual do poder

concedente, em face do preceito da preservação do

equilíbrio econômico-financeiro do contrato –

assegurado pela Constituição Federal (art. 37, XXI),

pelo art. 9.º, § 3.º da Lei 8.987/95 – promover a revisão

extraordinária do valor da tarifa, no caso de aumento

imprevisto do custo de insumo incorrido pela

concessionária”.44

Assim sendo, havendo desequilíbrio econômico-financeiro do

contrato, deverá o Poder Concedente, mediante apresentação de prova

documental e pericial referente à defasagem das receitas do concessionário,

indenizar.

A preocupação com a equação econômico-financeira do contrato

deve ser efetiva. A Administração Pública, através de atos e medidas, obriga-se a

manter a relação de isonomia entre encargos/remuneração do particular. Tal

conduta parte da idéia de que o Poder Concedente tem o poder-dever de

restabelecer a equação do contrato, independente de qualquer pedido formulado

pelo concessionário, sob pena de descumprir a Carta Política.

44 Revista dos Tribunais, ano 90, vol. 785, março de 2001 - Do equilíbrio Econômico-Financeiro do Contrato deConcessão. Direito da Concessionária à Recomposição Tarifária em Virtude de Aumento de Custo de Insumo, p. 117.

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O reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, sempre que

quebrado, deverá ser restabelecido independente do motivo que ensejou o

desequilíbrio (áleas extraordinárias administrativas ou negociais).

“A recomposição dos preços contratuais baseia-se na

denominada teoria da imprevisão consistente no

reconhecimento de que a superveniência de eventos

imprevistos e imprevisíveis pelas partes autoriza a

revisão do contrato para seu reajustamento às novas

circunstâncias. É a moderna aplicação da cláusula

rebus sic stantibus aos ajustes administrativos, à

semelhança do que ocorre nas avencas do direito

privado, quando surgem fatos não cogitados pelos

contratantes, criando ônus excessivo para um deles,

com vantagem desmedida para o outro”.45

A previsão no edital torna inquestionável o direito do particular, e o

dever do Poder Concedente, em adequar o valor correspondente à

encargo/remuneração. Caso não haja previsão expressa no edital, deverá o

particular, demonstrar que não agregou à sua proposta inicial, verba referente à

circunstância ocorrida, ou que o valor reservado para cobrir tais gastos se tornou

muito maior do que o previsto inicialmente.

O que não se pode admitir é a eventual alegação de que, tendo em

vista que a previsão de recomposição não encontra-se prevista no edital, não

caberá reajustamento do contrato.

A própria Lei 8.666/93, prevê em seu artigo 65, II, d). o direito que

detém o particular de restabelecer a relação que as partes pactuaram no início do

contrato, objetivando manter o equilíbrio econômico-financeiro.

45 HELY LOPES MEIRELLE, Reajustamento e Recomposição de Preços em Contrato Administrativo, RDA vol. 139, p. 16.

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A seguir estudaremos as formas que o concessionário dispõe para

requerer junto à Administração Pública, a adequação do equilíbrio econômico-

financeiro do contrato.

O que se deve ter em mente, é que o concessionário, não só tem o

direito de exigir o restabelecimento da equação econômico-financeira do contrato,

como também a Administração Pública tem o dever de atender, uma vez que não

dispõe de discricionariedade para tal fim.

Assim sendo, no caso de desequilíbrio do contrato, o particular deve

continuar a prestação do serviço, e pleitear a adequação ou rescisão do contrato

através das vias administrativas ou judiciais, pois, a sua paralisação emana

exclusivamente de ato unilateral da Administração.

4.2 SOLUÇÕES ADMINISTRATIVAS

Dentre as formas de se garantir ao concessionário o equilíbrio da

equação econômico-financeira do contrato (do começo ao fim de sua vigência),

podemos citar, inicialmente aquelas do reajuste e da revisão das tarifas.

Salienta-se que reajuste dos preços é bem diferente de

recomposição ou revisão dos mesmos. Veja-se:

“Cabe aqui ressaltar que reajuste e recomposição de

preço são coisas distintas. O reajuste é uma

atualização do preço com base nos índices que

refletiam a variação do custo do contrato. A

recomposição, por sua vez, é a restauração do

equilíbrio econômico-financeiro perturbado e está

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diretamente ligada à manutenção da margem de lucro

do concessionário”.46

No caso de reajuste, a sua previsão já aparece na celebração do

contrato. Esta previsão se dá através de uma fórmula que contemple a variação

do preço de cada insumo necessário à prestação do serviço. Normalmente é feita

uma vez por ano, e reflete a variação inflacionária sofrida.

Deve-se, a título de complementação, fazer distinção entre o reajuste

da tarifa e a aplicação de correção monetária. Apesar de ambos visarem a

manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, o reajuste tem como

objetivo maior o de assegurar ao contratado a manutenção do real custo da

produção durante toda a vigência do contrato. Já a correção monetária é devida

em caso de atraso no pagamento da obrigação pelo Poder Concedente, devendo,

também, sua aplicação estar previamente estipulada no contrato (art. 40, XIV, c),

da Lei 8.666/93).

A revisão da tarifa, que também visa manter o equilíbrio econômico-

financeiro do contrato, diferencia-se do reajuste, pelo fato de que, para haver a

revisão, é preciso ser observada a ocorrência de fatos imprevisíveis que afetem

significativamente o contrato. Não é necessária a previsão expressa no contrato,

para que se garanta a revisão das tarifas e, tampouco haverá momento certo para

sua aplicação.

Tal forma de recomposição do status inicial do contrato celebrado

entre as partes, está prevista no Art. 9.º, § 2.º, da Lei 8.987/95.

Conforme visto, a intangibilidade da equação econômico-financeira é

garantia constitucional, de forma que independe de expressa previsão no edital

ou, até mesmo, no contrato celebrado.

46 ARNOLDO WALD, ALEXANDRE DE MENDONÇA WALD e LUIZA RANGEL DE MORAES, O Direito de Parcerias e a Nova

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“(...) Temos que concluir que, se o reajuste pode ser

sobrestado por 12 meses, no âmbito de uma política

econômica, a revisão é insuscetível de aprisionamento

por norma legal, porque são fatos absolutamente forma

de controle. Por isso, diz que o reajuste pode e deve

ser passível de controle. A lei que está em vigor,

medidas provisórias sucessivas estabeleceram este

prazo em 12 meses; não se reajusta antes de 12

meses. Mas a revisão não. A revisão tem de ser

admitida a qualquer tempo., porque a qualquer tempo

pode ocorrer o fato do príncipe; a qualquer tempo pode

ocorrer o caso fortuito ou força maior; a qualquer

momento pode ocorrer o fato imprevisível, ou previsível

de conseqüências incalculáveis”.47

Diferente de como ocorria anteriormente, quando toda mudança

relacionada a um contrato administrativo se dava por vias judiciais, hoje, em se

tratando de revisão ou recomposição de preço, ocorre por vias administrativas.

A elevação da remuneração do concessionário, nos casos de

recomposição, independem de previsão legal, ou seja, não esta vinculada ao

princípio da legalidade. Ademais, conforme o exposto, ela pode ser feita a

qualquer tempo.

Ocorrendo o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, a

Administração Pública deverá, mediante aditamento contratual, recompor a

equação financeira do contrato, conforme previsto no § 6.º do art. 65 da Lei

8.666/93.

Lei de Concessões, São Paulo, Ed. RT, 1996, p. 117.47 JESSÉ TORRES PEREIRA JUNIOR, A Inexecução Contratual Ocasionada pela Quebra do Equilíbrio Econômico-Financeiro, Boletim de Licitações e Contratos, Ed. NDJ, junho/1997, São Paulo, p. 280.

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“Recomposição de preços por fatos supervenientes,

que antes só se fazia por via judicial, é, modernamente,

admitida por aditamento, desde que a Administração

reconheça e indique a justa causa ensejadora da

revisão do ajuste inicial”.48

Para tanto, o concessionário deverá apresentar junto ao Poder

Concedente, uma solicitação de recomposição, incluindo as justificativas para tal

fim.

Esta solicitação precisará provar ao poder concedente (a) a

relevância da circunstância para execução do contrato; (b) a alteração dessa

circunstância; e (c) a imprevisibilidade da alteração da circunstância, ou a

impossibilidade de continuidade do contrato em decorrência dos efeitos dessas

circunstâncias.

Para MARÇAL JUSTEN FILHO, a recomposição se dá quando:

“A administração e o particular, após efetivado o exame

dos fatos, promoverão o aditamento contratual,

destinando a restabelecer o equilíbrio econômico-

financeiro da contratação”.

Outras formas de se restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro

do contrato é através da extensão do prazo contratual. Neste caso, é dado ao

concessionário mais tempo na manutenção do serviço a fim de que possa

amortizar os seus investimentos. Poderá também o Poder Concedente diminuir os

encargos do concessionário. No entanto, isto somente ocorrerá se permanecer

intocado o requisito de serviço adequado.

48 HELY LOPES MEIRELLES, Estudos e Pareceres, cit., vol. VI, p. 9.

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Portanto, é dever da Administração Pública, nos casos de

desequilíbrio contratual, restaurar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Caso isto seja negado ao concessionário, caberá, a este, socorrer-se das vias

judiciais para tal fim.

4.3 SOLUÇÃO JUDICIAL

Tendo o concessionário pleiteado, junto à Administração Pública, a

restauração do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, e se esta, por sua vez

negar tal pedido, ou até mesmo omitir-se para tanto, caberá, ao particular

contratado, buscar as vias judiciais com o objetivo de restaurar o referido

equilíbrio, e ainda requerer judicialmente eventuais prejuízos decorrentes da

omissão do Poder Concedente.

Isto, pois, conforme já foi abordado, o direito do concessionário em

pleitear a recomposição do contrato existe a partir do momento em que se verifica

a quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato em decorrência de álea

administrativa, ou de álea econômica extraordinária.

Confira-se o exemplo: o artigo 9, § 4.º, da Lei 9.987/95 é claro ao

determinar que “em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial

equilíbrio econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo,

concomitantemente à alteração”.

Portanto, se assim não agir a Administração Pública, poderá o

particular impetrar mandado de segurança contra o poder concedente, em busca

de reequilíbrio contratual.

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Poderá, todavia, o concessionário, através de ação indenizatória,

requerer do poder concedente o pagamento relativo ás perdas que sofreu em

decorrência da omissão do Poder Público. Ressalta-se que, a prova pericial é

elemento chave para que o particular obtenha sucesso na sua ação judicial.

“ADMINISTRATIVO E CIVIL. CONTRATOS DE CONCESSÃO DE

TRANSPORTE AÉREO. DEFASAGEM NO VALOR DAS TARIFAS.

PREJUÍZO. INDENIZAÇÃO.

A Constituição Federal de 1967, sob a redação da

Ementa n.º 01/69, assegurava, nos contratos de

concessão de serviços públicos, a manutenção do

equilíbrio econômico e financeiro do pacto, por meio da

fixação de tarifas reais, suficientes, inclusive, para justa

remuneração do capital e a expansão dos serviços (art.

167,II).

O mesmo princípio, com maior abrangência encontra-

se esculpido no artigo 37, XXI, da nova Carta-Política.

Demonstrada, de forma sobeja, por via de prova

pericial e documental, a ocorrência de efetiva

defasagem no valor das tarifas do transporte aéreo,

com graves e vultosos prejuízos à empresa

concessionária, em conseqüência de omissão do poder

Concedente, impõe-se a reparação dos danos por meio

de pagamento de indenização

Não comporta censura laudo pericial sobejamente

fundamentado, que não sofreu impugnação na fase

processual própria, nem se ofereceu qualquer

alegação contra a capacidade técnica do experto

oficial”. .49

49 DESEMBARGADOR VICENTE LEAL, AC n.º 0111006/91- DF., 3.ª Turma/TRF/1.ª Região – D.J.U. de 06.08.92, ps. 22953e RF 319, p. 141.

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Poderá também o concessionário, em caso de risco de danos

irreparáveis, sob pena de ofensa ao Art. 5.º, XXXV, da Constituição Federal,

recorrer ao Poder Judiciário em busca de medidas acautelatórias.

Essas medidas se fazem necessárias, uma vez que, o

concessionário, impossibilitado de paralisar os serviços públicos, venha sofrendo

imensos prejuízos em face de omissão do Poder Concedente em atender o pedido

de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Neste caso, não há o que se falar em aplicação do parágrafo único

do art. 39 da Lei 8.987/95 (veda a interrupção e paralisação dos serviços públicos

até que haja decisão transitada em julgado), pois o concessionário estará diante

de fatos que poderão arruinar a sua empresa.

Portanto, não resta dúvida quanto a garantia que detém o particular

para se defender de irregularidades cometidas pelo Poder Concedente, em busca

de preservar a saúde financeira da sua empresa.

Assim sendo, no caso de mora da Administração Pública, o

concessionário poderá, judicialmente, requerer o pagamento de juros de mercado

com base no equilíbrio econômico-financeiro.50

Exemplificando tal circunstância, cito o caso de uma construtora ter

que financiar uma obra em decorrência do inadimplemento do dono daquela obra.

Aqui, seria cabível a aplicação de juros de mercado em face do inadimplente.

“Na realidade, não cumprindo a obrigação de manter o

equilíbrio financeiro, a Administração Pública, além de

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violar frontalmente o artigo 167 da Constituição

Federal, também pratica, por via oblíqua, uma

desapropriação em relação ao contratado, razão pela

qual Caio Tácito concluiu que no Direito brasileiro, a

tarifa confiscatória (ou a remuneração confiscatória de

empreiteiro) imposta também em infração à garantia

constitucional do direito de propriedade (art. 153, § 22

da EC/1).51

Vale a pena conferir o julgado do eminente relator, Desembargador

ITAMAR PEREIRA DA SILVA da 1.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de

Pernambuco, na Apelação n.º 816/89, de 03.04.1990, que trata diretamente do

assunto:

“In casu, não havendo sido possível o acordo, na

forma administrativa, entre as partes, cuido ser

inafastável o direito do particular de obter sua

pretensão através do Judiciário, a fim de restabelecer

aquele equilíbrio econômico-financeiro rompido

brutalmente no contrato questionado, face a

inadimplência da Administração (por longo tempo),

determinando que a empreiteira fosse buscar recursos

no mercado, para não paralisar os trabalhos e entregar

a obra na forma pactuada.

Mesmo que a Mendes Júnior não houvesse recorrido

ao mercado financeiro, injetando sim, dinheiro próprio

na obra, a situação seria inalterável, pois aquele seu

capital deveria ser remunerado pelas taxas operadas

50 Trata-se de parecer dado pelo Dr. RAIMUNDO NONATO BOTELHO DE NORONHA, aprovado pelo Dr. SAULO RAMOS, noqual apreciou pleito da CONSTRUTORA MENDES JR. contra CHESF.51 CAIO TÁCITO, Direito Administrativo, S. Paulo, Saraiva, 1975, p. 246.

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pelos Bancos do país. Doutra forma, volto a dizer, seria

locupletamento indevido da Administração.

Chamo a isso de reembolso, que não foi compensado

pela correção monetária, destinada apenas a repor o

poder aquisitivo original do valor do débito em atraso,

não cobrindo gastos.

Penso que é o mínimo que a Administração está

obrigada a pagar. Se as partes não acordaram em

cláusula de defesa à altura desta inesperada

hiperinflação que atingiu o país, onde já se começa a

exigir atualização dos salários dia-a-dia, ao invés de

quinzenalmente como já ocorre, nada mais correto do

que a intervenção do Judiciário, funcionando como

verdadeiro termostato da situação, para restabelecer o

equilíbrio perdido por força dos atrasos nos

pagamentos, pela Administração, obrigando o particular

a ir buscar meios financeiros no mercado de capitais,

juros esses que nos dias de hoje alcançam cifras

inimagináveis mesmo para os mais derrotistas

economistas.

Esse elemento gravoso que interferiu na questão,

comprometendo o contrato, não foi querido nem

previsto pelas partes. Entra aí, então, o Judiciário para

solução dos desencontros.

É legal e é justo, porque ninguém de bom senso pode

negar o direito do particular de ser reembolsado dos

custos financeiros que suportou para manter a obra

sem paralisação, nestas condições excepcionais, face

a não-disponibilidade de recursos por parte da

Administração”.

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Importante ressaltar que a decisão supra citada foi objeto de recurso

especial, que não foi conhecido.

Dessa forma, sendo a manutenção do equilíbrio econômico-

financeiro matéria pacífica e defesa na Constituição, poderá, o concessionário, a

qualquer tempo, fazer uso das vias judiciais para preservar os seus direitos.

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CONCLUSÃO

Diante de tudo o que foi exposto, concluímos que as parcerias, entre

o entes público e privado, vêm se tornando indispensáveis para o

desenvolvimento das atividades de prestação de serviços do Estado.

Assim sendo, deve o Estado, e de forma inquestionável, garantir ao

particular contratado, o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos.

Somente, dessa maneira, o ente Público conseguirá atrair o

particular na contribuição da prestação do serviço público adequado à

coletividade.

A teoria do equilíbrio econômico-financeiro foi desenvolvida

construtivamente no Direito brasileiro, devido às condições de instabilidade,

peculiares ao nosso país.

Portanto, diante da análise dos principais itens do trabalho, em

síntese conclui-se que:

I – A preservação do equilíbrio econômico-financeiro é condição essencial de

legalidade na concessão dos serviços públicos;

II – O Estado tem o poder-dever de, assim que constatado o desequilíbrio da

equação financeira do contrato, restabelecê-lo, sob pena de infringir os preceitos

constitucionais de nosso país;

III – Sempre que o Estado, utilizando-se da prerrogativa de alterar unilateralmente

o contrato (princípio da mutabilidade dos contratos administrativos), causar

desequilíbrio contratual, deverá revê-lo.

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IV – A teoria do fato do príncipe e a da imprevisão, são fatos geradores de quebra

do equilíbrio econômico-financeiro.

V – As tarifas pagas ao concessionário devem atender o princípio da

razoabilidade, garantindo, de um lado, a defesa dos consumidores ou usuários e,

do outro, a estabilidade financeira dos concessionários.

VI – Deve ser garantido, ao concessionário, a justa remuneração. Ou seja, as

tarifas devem atender às necessidades de expansão e de melhoramento dos

serviços

Hoje em dia, fala-se muito em parceria entre a Administração Pública

e a iniciativa privada. No entanto, acredito que isso poderia ter um significado

muito maior se esta relação realmente fosse vista como parceria.

Entende-se por parceria a reunião de grupos ou pessoas com

interesse em comum. Este entendimento aplica-se ao caso em tela, no sentido de

que o Estado e o particular devem unir forças para atingir o objetivo final, que é o

de atender a população através de serviços qualificados.

É lamentável que o Estado ainda não tenha entendido a correta

definição de parceria. Na maioria das vezes, o Estado, ao delegar a prestação do

serviço ao concessionário, torna-se o seu fiel inimigo, tentando, de todos os

modos, burlar o quanto convencionado no contrato, tirando assim, vantagens

indevidas do particular.

Podemos citar, como exemplo, algumas práticas abusivas do Estado

que, data vênia, não nos leva a pensar que a relação, poder concedente e

concessionário, possa ser chamada de parceria:

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a) Pagar os valores contratados com atraso e fugir ao

pagamento das parcelas de correção monetária;

b) Não pagar os débitos já contraídos em gestões

anteriores, principalmente quando se trata de

facções políticas diferentes;

c) Suspender, por longos meses, a execução de obras

ou serviços por ordem meramente verbal;

d) Deixar de pagar valores já contraídos, sob o

argumento de que houve superfaturamento;

e) Obrigar ao contratado a recorrer das vias judiciais,

para que consiga obter o que lhe é de direito.

f) Utilizar todos os meios recursais, para protelar o

julgamento dos litígios;

g) Nunca acolher administrativamente os

requerimentos dos concessionários, mesmo

naqueles casos onde não há dúvidas quanto ao seu

direito de restabelecer o equilíbrio econômico-

financeiro; e

h) Manipular, a seu bel-prazer, as fórmulas de

reajustamento de preços.

Contudo, o que se espera dos administradores públicos, é que esta

conduta seja abolida. A uma, porque o poder público cada vez mais depende da

iniciativa privada. A duas, porque se essa mentalidade prevalecer, aos poucos

teremos toda a iniciativa privada evitando negociar com o Estado.

Como prova disso, temos a atual situação do sistema carcerário

brasileiro. O Estado encontra-se falido e sem a menor condição de investimento

na área.

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Assim sendo, qual a melhor alternativa? É claro que a participação

da iniciativa privada, que inclusive, já vem participando de licitações na construção

de seis novos presídios para o Estado.

Logo, não podemos aceitar este descaso por parte do poder

concedente para com o concessionário. Ambos têm que trabalhar juntos em busca

do melhor resultado para sociedade.

Por fim, parabéns aos Autores responsáveis pelos brilhantes

trabalhos sobre o tema, que tanto lutaram e vêm lutando pelo direito e pela

segurança jurídica dos contratos, preceitos estes, indispensáveis para o

desenvolvimento de uma sociedade amparada pela justiça.

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