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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO COMARCA de Araraquara FORO DE ARARAQUARA 5ª VARA CÍVEL Rua dos Libaneses, 1998 - Santana CEP: 14801-425 - Araraquara - SP Telefone: (16) 3336-1888 - E-mail: [email protected] 0907507-56.2012.8.26.0037 - lauda 1 SENTENÇA Processo nº: 0907507-56.2012.8.26.0037 Autor: Luiz Guilherme Eusébio Costa Henrique Rés: MRV Engenharia e Participações S/A e outra CONCLUSÃO Em 07 de agosto de 2013, faço estes autos conclusos ao MM. Juiz da Quinta Vara Cível Dr. Mário Camargo Magano . Vistos. Trata-se de ação de nulidade de cláusula contratual com pedido de repetição do indébito ajuizada por Luiz Guilherme Eusébio Costa Henrique contra MRV Engenharia e Participações S/A e outra. Diz o autor, em síntese, que a comissão de corretagem, não obstante prevista no contrato anexado à inicial, é abusiva, em descompasso com o sistema protetivo do CDC. Pede, ao final, a procedência da ação na forma da pretensão deduzida no fecho da petição inicial. As rés foram citadas e ofereceram contestação. A ré MRV suscita, em preliminar, ilegitimidade passiva. Quanto mérito, argumenta, em longas razões, ser descabida a pretensão do autor. Pede o acolhimento da preliminar ou, no mérito, a improcedência. A corré Tedde sustenta, em essência, a legitimidade da comissão paga pelo autor, decorrente de regular prestação de serviço de corretagem. Pede a improcedência. Houve réplica. É o relatório. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 0907507-56.2012.8.26.0037 e o código 110000000QC2Q. Este documento foi assinado digitalmente por MARIO CAMARGO MAGANO. fls. 1

sentença - corretagem

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULOCOMARCA de AraraquaraFORO DE ARARAQUARA5ª VARA CÍVELRua dos Libaneses, 1998- SantanaCEP: 14801-425 - Araraquara - SPTelefone: (16) 3336-1888 - E-mail: [email protected]

0907507-56.2012.8.26.0037 - lauda 1

SENTENÇA

Processo nº: 0907507-56.2012.8.26.0037

Autor: Luiz Guilherme Eusébio Costa Henrique

Rés: MRV Engenharia e Participações S/A e outra

CONCLUSÃO

Em 07 de agosto de 2013, faço estes autos conclusos ao MM. Juiz da Quinta Vara Cível Dr. Mário Camargo Magano.

Vistos.

Trata-se de ação de nulidade de cláusula contratual

com pedido de repetição do indébito ajuizada por Luiz Guilherme Eusébio Costa Henrique

contra MRV Engenharia e Participações S/A e outra.

Diz o autor, em síntese, que a comissão de

corretagem, não obstante prevista no contrato anexado à inicial, é abusiva, em

descompasso com o sistema protetivo do CDC.

Pede, ao final, a procedência da ação na forma da

pretensão deduzida no fecho da petição inicial.

As rés foram citadas e ofereceram contestação.

A ré MRV suscita, em preliminar, ilegitimidade

passiva. Quanto mérito, argumenta, em longas razões, ser descabida a pretensão do autor.

Pede o acolhimento da preliminar ou, no mérito, a improcedência.

A corré Tedde sustenta, em essência, a legitimidade

da comissão paga pelo autor, decorrente de regular prestação de serviço de corretagem.

Pede a improcedência.

Houve réplica.

É o relatório.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULOCOMARCA de AraraquaraFORO DE ARARAQUARA5ª VARA CÍVELRua dos Libaneses, 1998- SantanaCEP: 14801-425 - Araraquara - SPTelefone: (16) 3336-1888 - E-mail: [email protected]

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Decido.

Já reunidos nos autos elementos suficientes de

convicção, impõe-se o julgamento antecipado da lide.

É de consumo a relação jurídica entre as partes,

presentes os pressupostos dos arts. 2º e 3º do CDC.

As rés tiveram atuação conjunta - em parceria - na

venda do imóvel, de modo que têm inegável legitimidade passiva, havendo solidariedade

entre elas (CDC, art. 7º, parágrafo único).

Rejeitada a matéria preliminar arguida, examina-se o

mérito.

O autor insurge-se contra a comissão de corretagem,

assim prevista na cláusula 6ª do contrato particular de promessa de compra e venda:

“A comissão de intermediação devida pela realização

do presente negócio, bem como outras despesas com assessoria relativas à presente

transação, são devidas por mim (nós), sendo que qualquer outra quantia deverá ser paga

nas condições negociadas entre nós, PROMITENTE COMPRADOR (A) e imobiliária e/ou

corretor, isentando-se a PROMITENTE VENDEDORA de qualquer responsabilidade.”

fls. 14.

A comissão pactuada não tem conteúdo claro e

adequado.

Com efeito, não dispõe sobre o percentual a ser

aplicado, para efeito de cálculo da corretagem, nem indica o valor efetivo a ser suportado

pelo consumidor adquirente de bem imóvel.

Além disso, não faz distinção entre “comissão de

intermediação” e outras “despesas com assessoria relativas à presente transação”.

Daí resulta que a cláusula em questão é abusiva, em

descompasso com o Código de Defesa do Consumidor (arts. 6º, III, 46, e 51, IV) e com a

boa-fé objetiva que deve presidir as relações contratuais (art. 4º, III, do CDC e art. 422 do

CC).

Nelson Rosenvald anota que o princípio da boa-fé

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULOCOMARCA de AraraquaraFORO DE ARARAQUARA5ª VARA CÍVELRua dos Libaneses, 1998- SantanaCEP: 14801-425 - Araraquara - SPTelefone: (16) 3336-1888 - E-mail: [email protected]

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objetiva compreende “um modelo de conduta social, verdadeiro standard jurídico ou regra

de conduta, caracterizado por uma atuação de acordo com determinados padrões sociais de

lisura, honestidade e correção de modo a não frustrar a legítima confiança da outra parte”.

E mais adiante sublinha que a “boa-fé objetiva é examinada externamente, vale dizer que a

aferição se dirige à correção da conduta do indivíduo, pouco importando a sua convicção.

De fato, o princípio da boa-fé encontra a sua justificação no interesse coletivo de que as

pessoas pautem seu agir pela cooperação e lealdade, incentivando-se o sentimento de

justiça social, com repressão a todas as condutas que importem em desvio aos

sedimentados parâmetros de honestidade e retidão” (Código Civil Comentado, sob a

coordenação do Min. Cezar Peluso, 2ª Ed., p. 411).

Em julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo,

lição importante do Ministro Ruy Rosado de Aguiar é invocada:

“Mas não é essa boa-fé que aqui mais nos interessa,

mas sim a “boa-fé objetiva”, que se constitui em uma norma jurídica, ou melhor, em um

princípio geral do Direito, segundo o qual todos devem comportar-se de boa-fé nas suas

relações recíprocas. A inter-relação humana deve pautar-se por um padrão ético de

confiança e lealdade, indispensável ao próprio desenvolvimento normal da convivência

social. A expectativa de um comportamento adequado por parte do outro é um componente

indissociável da vida de relação, sem o qual ela mesma seria inviável. Isso significa que as

pessoas devem adotar um comportamento leal em toda fase prévia à constituição de tais

relações (diligência in contrahendo); e que devem também comportar-se lealmente no

desenvolvimento das relações jurídicas já constituídas entre elas. Este dever de comportar-

se segundo a boa-fé se projeta nas duas direções e se estende tanto aos direitos como aos

deveres. Os direitos devem exercitar-se de boa-fé, as obrigações têm de cumprir-se de boa-

fé. O princípio guia a vida das pessoas e serve de parâmetro para avaliação de suas

condutas, tendo em vista o sistema jurídico global” (Apelação nº 492.422-4/5-00, Rel. Des.

Luiz Antonio Costa, 7ª Câmara de Direito Privado).

Sobre o dever de informar, confira-se o escólio de

Cláudia Lima Marques:

“Enquanto tratado como simples dever secundário

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULOCOMARCA de AraraquaraFORO DE ARARAQUARA5ª VARA CÍVELRua dos Libaneses, 1998- SantanaCEP: 14801-425 - Araraquara - SPTelefone: (16) 3336-1888 - E-mail: [email protected]

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pela doutrina contratual, o dever de indicação e esclarecimento tinha sua origem somente

no princípio jurisprudencial de boa-fé e só atingia determinadas circunstâncias

consideradas pelo Judiciário como relevantes contratualmente. Era um dever de cooperação

entre contratantes, portanto, restrito pelos interesses individuais (e comerciais) de cada um.

No sistema do CDC este dever assume proporções de dever básico, verdadeiro ônus

imposto aos fornecedores, obrigação agora legal, cabendo ao art. 31 do CDC determinar

quais os aspectos relevantes a serem obrigatoriamente informados.” (Contratos no Código

de Defesa do Consumidor, 4ª Edição, p. 647/648).

Assim, declara-se nula a disposição contratual sob

exame, a qual não informa clara e adequadamente o percentual da comissão, a forma de seu

cálculo, não indica o número de inscrição no CRECI do suposto corretor, embute na

comissão despesas outras, sem nexo ou pertinência com a corretagem.

O autor tem direito à repetição, mas na sua forma

simples, e não em dobro, à falta de dolo ou má-fé a ser aqui admitida.

Em caso idêntico, já se decidiu:

“AÇÃO REVISIONAL DE COMPROMISSO DE

VENDA E COMPRA DE IMÓVEL CUMULADA COM REPETIÇÃO DO INDÉBITO.

Ação proposta por adquirente de imóvel, questionando a obrigação de pagamento da

comissão de corretagem. Alegação de violação ao direito de informação (CDC), para

motivar o pedido de devolução em dobro. Sentença de procedência em parte, afastando a

devolução dobrada, com verba honorária fixada em 15% sobre o valor da condenação. Data

da distribuição da ação: 21/09/2012. Valor da causa: R$ 6.257,42. Valor da condenação:

R$ 2.655,00. Apela a autora sustentando a má-fé da parte contrária e a necessidade de

devolução em dobro, além de pugnar pela majoração dos honorários advocatícios. Apela a

ré sustentando que a corretagem é lícita e que a cobrança tem base contratual.

Descabimento. Recurso da ré. Direcionamento do custo da corretagem para a autora

não está claro no contrato. Apenas é possível subentender de cláusula que trata da

transferência do imóvel. Preceitos subliminares ofendem o direito do consumidor de

ampla informação. Inteligência do art. 6º, III, do CDC. Falta da informação clara

coloca o consumidor em desvantagem exagerada. Inteligência do art. 51, IV, do CDC.

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Configurada a abusividade da cláusula no que tange à cobrança da corretagem em

desfavor da autora. Recurso da autora. Inaplicável a regra da repetição em dobro.

Cobrança estava lastreada em interpretação de cláusula contratual. Necessidade de

primeiro se declarar a abusividade, para que fosse possível determinar a restituição.

Cobrança não partiu de má-fé ou erro injustificável. Inteligência do parágrafo único

do art. 42 do CDC. Honorários advocatícios. Majoração. Impossibilidade. Sucumbência

parcial da autora. Necessário sopesar o decaimento proporcional da pretensão. Sentença

confirmada. Recursos improvidos.” (TJ/SP, Apelação nº 0050138-72.2012.8.26.0576, 5ª

Câmara de Direito Privado, Rel. James Siano, j. 26 de junho de 2013, sem destaques no

original).

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a

ação, para (1) declarar nula a disposição contratual discutida nos autos e (2) condenar

solidariamente as rés no pagamento de R$2.700,00 ao autor, com correção monetária desde

o desembolso mais juros de mora de 1% ao mês, contados da citação. Fixo os honorários

advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da condenação. As rés responderão por 2/3 e

o autor por 1/3, da verba honorária ora fixada, observada a mesma proporção em relação às

custas e às despesas processuais. A execução da sucumbência carreada ao autor está

condicionada ao disposto no art. 12 da LAJ.

P.R.I.

Araraquara, 23 de setembro de 2013.

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