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Sete Por Otávio José

Sete

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Sete

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  • Sete

    Por

    Otvio Jos

  • ATO I

    Cena 1

    Seth est em seu quarto. noite. Ele estasentado em sua mesa em frente a uma maquina deescrever com um telefone ao lado. Ao lado damesa h uma cama e um criado mudo. No criadomudo um abajur e um despertador. Luz na mesa.(Seth est olhando para o teto. Digita algo, masdesiste. Puxa a folha, amassa e coloca uma nova.O telefone toca, mas ele no atende)

    SETHDatas, horrios, segundos... tudo marcado... tudoagendado... tudo premeditado... ser que no temosconscincia que nem tudo pode ser programado? Crie!Crie! Crie! Imperativo... todos o verbos que escutoesto nesse modo... At quando? Pensam que simples,basta sentar em frente a um computador qualquer, ouat mesmo com um lpis e um pedao de papel... defato... isto o suficiente para escrever... quandose tem o que escrever... e eu... bem, eu no tenhonada pra escrever... No entendo, juro que noentendo! Escrever sempre foi algo to simples pramim... As vezes eu tinha que escolher o que escreverprimeiro, mas depois... Depois da minha ltimapea... (Pega o jornal e l) Quando o ego supera acapacidade... Essa foi a manchete... (continua lendo)Aps cinco sucesso, jovem dramaturgo tentainovar mas tropea em sua megalomania e faz umapea... (corta) At quatro anos atrs eu faziaespetculos, agora so apenas peas... como o mundod voltas... mas tem mais: - uma pea sem enredo, semoriginalidade, sem carisma, sem personagens deverdade, nada alm de um amontoado de conceitosvazios, clichs e boais...

    (Seth joga o jornal no cho. A cama iluminada.Um palhao sentado na cama, com culos, lendo umlivro olha para Seth e em seguida age como sefosse uma marionete)

    POPPY"Hoje eu acordei estranho... Minhas articulaesestavam duras, como se eu tivesse me tornado demadeira... no sei o que aconteceu, mas no consigome mexer... no tenho controle sobre meus atos..."

    SETH"Posso sentir tudo... (mantendo a interpretao dePoppy) posso ver tudo... mas no decido nada... seriamedo ou comodismo?"

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 2.

    POPPY"E o que importa? Isso no me interessa..."

    SETH"Afinal, no mutualismo todos ganham..."

    POPPYUsar o ttulo pra finalizar causa um tchan... (saindodo personagem)

    SETHTambm comentaram isso na crtica... falaram que foia nica coisa boa que se manteve nessa obra...

    POPPYGente... te destruram... mas se bem que isso verdade... nem eu entendi o que eu era... o que queeu significava mesmo, hein?

    SETHO bobo...

    POPPYOi? O bobo?

    SETHSim... quiseram te interpretar como uma crticapolitica... at me chamaram de opositor extremista...mas ningum de fato entendeu o que era voc...

    POPPYMas vamos e convenhamos... voc exagerou. Eu concordoque o pblico no deve ser subestimado jamais, massuperestimar complicado... devemos estar sempre umpasso a frente do publico, nunca ao lado, o publicoquer ser impressionado, mas nunca dois passos, comisso perde a conexo... Eu no entendi nada queaconteceu nesse final... e foi-se o tempo em que aspessoas respeitavam o que no entendiam.

    SETHEu sei... eu sei, mas...

    POPPYO qu?

    SETHAcho que foi um exagero o que fizeram com voc...Afinal, o que teve demais na sua historia? O que eufiz de diferente com voc que eu no fiz nas demais?

    POPPYE eu que sei? Voc que escreveu que devia saber...

    SETHTalvez a interpretao... no dos atores\ (cortado)

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 3.

    POPPYMas era ruim todo o que me fez. (olhando para asunhas)

    SETHMas de quem assistiu... (continuando) De quem seguiua critica... Em momento algum eu pensei que vocfosse representar o povo... E olhando com esses olhosat eu acho que seria uma agressividade gratuita edesnecessria... e nada gratuito vlido,principalmente violncia...

    POPPYE existe violncia vlida?

    SETHT falando de violncia metafrica, no de violnciamaterial... de quebrar tabus, escancarar o que escondido, gritar, botar a cara... isso umaviolncia vlida, quando no gratuita...

    POPPYE o qu que eu era ento?...

    SETHEu... voc sou eu... o bobo sou eu... voc foi umdesabafo...

    POPPYMas por que voc no deixou isso claro?

    SETHEu no sei... talvez estivesse com medo de meexpor... A arte impessoalmente pessoal... Elasempre um retrato de quem a faz... pormtravestida... E esse momento era muito intimo, mas euprecisa exp-lo de alguma maneira.

    POPPYEu ainda no entendi o porque voc se travestiu demarionete de um bobo...

    SETHPrimeiramente qual era a sua histria? (Ele mesmoresponde) Voc (aponta para Poppy) um homem comum quese descobre bobo...

    POPPYIsso... eu tinha vocao pra bobo e me torno o reidos bobos... o bobo mais aclamado...

    SETHExato! Porm, pra manter o seu lugar voc acaba setornando o bobo dos bobos, e passa a fazer exatamenteo que as pessoas querem para se manter...

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 4.

    POPPYEu caio no comodismo... (entendendo-se) Eu percominha vontade e a minha originalidade... (falalentamente olhando para Seth)

    SETHE ento comea o processo de transformao de homempara marionete... porque voc perdeu sua genialidadeao tentar agradar ao invs de criar... foi umacrtica ao que eu estava passando...

    POPPYComeo a perder os movimentos... (espantando-se) Emcertos momentos fico mudo... At que...

    SETHVoc finalmente acorda marionete... mas por incrvelque parea se conforma...

    POPPY"Afinal, no mutualismo todos ganham..." E as pessoasentenderam como se voc estivesse falando delas...

    SETHExatamente... Infelizmente, ou felizmente, no sei, acarapua serviu... Mas, pagar para ser insultado algo terrvel...

    POPPYBola pra frente camarada... O que passou no muda. Emesmo que voc falasse agora o que realmentesignificava\ (cortado)

    SETHNo mudaria em nada...(completando a frase) O estragoj est feito.

    POPPYPois ento escreva uma nova historia.

    SETHEsse o problema... eu no t conseguindo...

    POPPYE qual a razo pra voc no conseguir escrever algonovo?

    SETHEu no sei... e isso que eu estou tentandoentender...

    POPPYComo voc fazia pra escrever? Voc no tem nenhumritual? Uma mandinga, ou algo do tipo?

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 5.

    SETHNo... nada... eu simplesmente escrevia...

    POPPYEnto reveja todas as suas peas... quem sabe noajuda?

    SETHPode ser... ... no vou perder nada...

    POPPY"O que est fazendo em casa essa hora? Voc deviaestar no trabalho!" (Interpretando a me de um jovemsem entender o porque o filho estava em casa)

    SETHHum?

    POPPY"O que est fazendo em casa essa hora? Voc deviaestar no trabalho!"(Repetindo a fala da mesma forma)

    SETH"J decidi!" (Interpretando um garoto determinado,com um brilho no olhar e energia de sobra)

    POPPY"O qu?" (apreensivo)

    SETH"J decidi o que vai ser da minha vida!"

    POPPY"Do que voc ta falando, garoto?"

    SETH"Eu cansei! Eu cansei, me! (abre os braos) Eucansei de fazer o que eu no quero! Eu cansei dedesperdiar a minha vida! Eu cansei de sobreviver! Euquero viver! Ser! Ser! Ser! A senhora no viverepetindo que eu tenho que ser algum na vida?"

    POPPY"Mas voc tem que ser! Ou voc no quer ter umfuturo?"

    SETH"T ai! Futuro... (olha pro horizonte) Eu havia meesquecido dele..." (olha pra Poppy)

    POPPY"Pois trate de lembrar!"

    SETH"Eu lembrei... e justamente pra ser algo, pra terum futuro, e pra existir, que eu decidi, eu vou ser oque eu quero! Eu vou fazer o que eu quero! No

    (MAIS...)(CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 6.

    SETH (...cont.)importa se arriscado para o futuro... no importase vai ser difcil... no importa o que eu vou terque aguentar... eu vou... sem olhar pra trs, euvou... vou seguir em frente e vou ter um futuro..."

    POPPY"Mas e se der errado?" (cabisbaixo)

    SETH"Bem... se no fim nada der certo, eu arrumo umemprego."

    POPPYSensacional... (senta na cama saindo do personagem)Por que voc no interpretou esse personagem? Vocfoi sensacional... Voc passou uma veracidade acena...

    SETHPor isso que no interpreto meus personagens... elesso pessoais demais, e sabendo disso eu noconseguiria agir naturalmente em cena, pois euestaria representando a mim mesmo, o que umincomodo muito grande...

    POPPYRealmente... vendo por esse ngulo... ainda maisvoc...

    SETHComo assim?

    POPPYVoc fechado... nunca se expressa abertamente...deve ser muito complicado se expor dessa maneira...soaria at falso... se voc no faz issonormalmente...

    SETHExatamente... voc respondeu sua prpria pergunta...

    POPPYVoc escreveu essa pea quando decidiu largar tudopra seguir pro teatro?

    SETHNa verdade eu no larguei tudo, o teatro sempre foiminha nica opo, mas eu sempre tive medo de quetudo desse errado.

    POPPYAs pessoas te pressionavam?

    SETHNo... eu me pressionava. Eu sempre me questionava:"- O que eu vou ser? O que eu vou fazer?", ento

    (MAIS...)(CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 7.

    SETH (...cont.)quando eu escrevi "Se nada der certo arrumo umemprego" eu simplesmente estava me respondendo... foium grito de coragem...

    POPPYE acabou que deu certo...

    SETHAinda bem... ia detestar ter que arrumar umemprego...

    POPPY uma pea biogrfica?

    SETHNo... acho meio petulante fazer uma peabiogrfica... tipo... obrigar os outros aconhecerem sua vida... acho isso desconfortvel...no... (balana a cabea descartando essapossibilidade) Vitor no tem nada de parecidocomigo... o conflito dele que o mesmo... Ele temum sonho, quer ser pintor... tem talento, mas sua meacha que ele tem que arrumar um emprego, fazer umafaculdade sria... isso engraado... faculdadesria... existe faculdade de brincadeira? (ri) Mastudo bem... tem gente que acha que sim... e a medele fica falando que ele precisa ser algum navida... ento ele segue os conselhos dela... atperceber que ao ter que ser algum na vida ele vaiacabar no sendo nada, e antes que isso acontea elelarga aquele caminho e vai no direo que elerealmente quer...

    POPPYE por que o titulo "Se nada der certo eu arrumo umemprego"?

    SETHPorque emprego pra mim uma atividadedesconfortvel, o que se fa pra apenas ganhardinheiro. Ento, se eu no conseguisse alcanar o queeu esperava, eu teria que fazer algo desagradvelpara me sustentar... ou seja...

    POPPYTeria que arrumar um emprego... (completando a frase)As pessoas acreditam que todos que vivem por arte ede arte so vagabundos... pra eles tudo no passa deuma diverso... um hobbie... no deve ser levado asrio.

    SETHMas de fato uma diverso, pois fazer o que se gosta muito prazeroso, e poder viver a partir disso melhor ainda! "As pessoas esquecem o que serfeliz... (comea um dialogo de uma das peas olhando

    (MAIS...)(CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 8.

    SETH (...cont.)para o horizonte) Elas esto to preocupadas em sersrias demais que deixam de enxergar o que realmenteimporta!"

    POPPY"No diga sandices, Laura! O que voc chama decegueira eu chamo de responsabilidade! Coisa que vocno tem!"

    SETH"Ah, Pedro... Voc que acredita nisso... Eu tenhoresponsabilidades sim! Eu concordo com voc... defato ridculo o modo como vivo!"

    POPPY"Voc concorda? (incrdulo)"

    SETH"Concordo... de fato ridculo me vestir com o queeu quero, realmente usar meia cala laranja em plenodia muito ridculo... de fato ridculo assistirnovela e comdias romnticas... de fato ridculodanar uma musica eletrnica sem letra... de fato ridculo chorar com livros adolescente vazios...defato ridiculo viver quando eu deveria ser apenasresponsvel... verdade... ridculo ser feliz naminha idade... s que ridculo mesmo, quem no sed a permisso de ser ridculo!"

    POPPYIsso aconteceu com quem? Eu sei que com voc no foi,mas tem que ter acontecido com algum, que voc noia inventar isso do nada.

    SETHNa verdade no aconteceu com ningum... aindabem...(sensao de alivio)

    POPPYU! Por que ainda bem?

    SETHPorque se tivesse acontecido a pea no existiria...

    POPPYE por que no? No seria biogrfica...

    SETHMas eu no acho legal voc pegar a opinio de algume criticar de forma explicita assim... seria meio queexpor a pessoa, e ningum, por mais idiota que essapessoa possa ser, merece ser exposto... Ento eununca transformaria em pea algo que eu tenha vistoacontecer...

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 9.

    POPPYAcho exagero...

    SETHSe eu fizesse isso teria que ser fiel ao extremo... ecopiar a realidade torna o teatro mrbido... a peasem crtica ou sem algum questionamento se tornavazia... e uma cena s no faz uma pea... edificilmente eu conseguiria um acontecimento quedurasse o necessrio para compor um espetculo...

    POPPYNo precisa necessariamente ser acontecimentosseguidos.

    SETHAi ia virar um amontoado de esquetes, que pra mim no teatro...

    POPPYE de onde veio ento essa historia? J que voc nose inspirou em ninguem, nem em nenhum acontecimento,nem foi com voc...

    SETHEu no disse que eu no me inspirei em ningum... eufalei que no aconteceu com ningum...

    POPPYE voc se inspirou em quem?

    SETHEm mim...

    POPPYEnto biogrfica!

    SETHNo... isso no aconteceu. Essa historia umaauto-crtica...

    POPPYMas ento o que aconteceu pra voc se auto-crticar?

    SETHFoi numa livraria, eu tinha ido comprar um livro, masno sabia qual, ento comecei a ver os livros, derepente me deparo com uma pirmide de um mesmo livro,na capa tinha escrito bem grande: "Livro mais vendidodo ano!" e tinham ainda comentrios de revistafeminina adolescente como: "Emocionante...", "Umahistoria de amor incrvel!" e "Tocante e leve...".Ento proferi a seguinte frase: "Livro de meninaftil. No leio!" Ao ouvir o que eu falei eu percebio quo ridculo havia sido e me espantei... porque euhavia me tornado uma daquelas pessoas chatas epreconceituosas que crtica tudo que novo, faz

    (MAIS...)(CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 10.

    SETH (...cont.)sucesso e popular, sem nem ao menos me dar otrabalho de conhecer...

    POPPYIntelectuais ininfectaveis... essa palavra existe?

    SETHNo fao a menor ideia...

    POPPYNo importa (ri) Esse tipo de gente insuportvel...acha que melhor que todo mundo... Mas voc fez oqu depois disso?

    SETHEu comprei o livro e li... De fato era muito ruim...Mas ai foi coisa de gosto... H quem goste,infelizmente... mas no posso criticar quem goste,nem o livro, ainda mais sem conhec-lo...

    POPPYMas tambm no obrigado a achar bom...

    SETHE quem achou no ridculo por isso... Da eu fiz ahistoria da Laura...

    POPPYEla chama uma garota de ridcula, no isso?

    SETHNo... Ela fala "No seja ridcula, Marta!" e Martaresponde "Ridcula voc que finge viver!" e depoisdisso Marta sofre um acidente e morre...

    POPPYDai Laura fica com aquela frase na cabea e faz umalista de tudo que ela julga ridculo.

    SETHE decidi fazer tudo...

    POPPYEla se permite ser ridcula... e o ttulo provocador...

    SETH"A permisso pra ser ridculo"... Eu gosto dessettulo...

    POPPYTanto Laura, quanto voc, foram nobres... assumir queest errado e corrigir algo raro... so poucos quefazem isso.

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 11.

    SETH"Mas eu me sinto to sujo..." (olhando para ohorizonte)

    POPPYHm?! (se assusta e ento entende)

    SETH"Ser que certo?" (olha para Poppy)

    POPPY"No sei... (correspondendo a interpretao) Mas noacredito que seja errado."

    SETH"Sei l... as vezes eu penso, sabe? Ser que ser bom,ajudar, ser atuante... tudo isso para que algo de bomacontea de volta... ser que isso no corrompe o atoe imoraliza a bondade?"

    POPPY"Pode at ser corrupo... pode de fato no trazer devolta o que bom... mas, duvido que possa trazeralgum mal..."

    SETH"Eu sei disso... mas que as vezes vem o medo e..."

    POPPY"Medo de qu? Esquea isso..."

    SETH"Medo do que pode acontecer por no ser bom... e essemedo nos transforma em escravos. Sempre fazendo tudopelos outros... o medo nos torna passivos a vida... Eo grande problema quando surgem pessoas malintencionadas... essas sim so terrveis... elasexploram e se aproveitam da fraqueza alheia... elassabem como sugar... at a ultima gota."

    POPPY"Mas nesse caso deve existir o bom-senso... quemquiser ser explorado ser... quem no quiser no..."

    SETH"Eu te entendo, e voc tem razo..."

    POPPY"Cada paga o preo que acha justo por seus atos...Deve haver coerncia nesses atos, pois quem acha quea caridade est resumida no simples ato de dar coisasest completamente enganado, e pior que isso daralm do que tem por medo..."

    SETH"O medo do destino terrvel... ele nos torna refnsde um futuro descohecido e nos obriga a agir feito

    (MAIS...)(CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 12.

    SETH (...cont.)idiotas cegos... Essa loteria do acaso destriqualquer vida, mas nada pior do que no saberquanto custa a salvao..."

    Seth e Poppy comeam a rir saindo do personagem.

    POPPYEu adoro esse texto! muito doido!

    SETHE o pior que ele fez polmica s pelo nome.

    POPPY"Quanto custa a salvao"... meio apocalptico,mas...

    SETHReligio... (olha para Poppy) As trs coisas que nose deve discutir com fanticos: politica, futebol ereligio.

    POPPYE eles reclamaram do qu?

    SETHUm grupo de fanticos acreditava que a pea fossefalar do dzimo... da corrupo de lderesreligiosos... de quem acha que s ser salvopagando... ou seja, quem de fato no ser salvo,porque uma pessoa ruim e age assim, se doeu.

    POPPYPassarinho que come pedra, sabe o\ (cortado)

    SETHEnfim...

    POPPYChato! (d lngua pra Seth) E quando mudaram deidia?

    SETHDepois da estreia, que saiu uma reportagem falando dapea e mostrando que ela no falava de nada disso. Sque ai o circo j tava pegando fogo, e foram eles quecomearam o incndio. Foi um bafaf, pior pra elesque trouxeram a tona temas importantes que elesqueriam esconder, e melhor pra mim... tem publicidademelhor? No tem. Sendo de graa... assim ficagostoso.

    POPPYE por que voc escreveu essa historia?

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 13.

    SETH que eu morria de medo da lei do retorno, sabe? Ochamado efeito boomerang. que eu sempre ouvia quetudo que a gente fazia voltava trs vezes mais fortepra gente... que o universo era espelhado... ai era amisria, n? Se ficasse s no misticismo, mas misturacom fsica, era terrvel... E eu sempre tive medodessas coisas, porque no tem como se defender...Ento um dia eu me questionei que se fazer algo bompelo simples medo de que algo ruim me acontecesse, seisso no anularia o bom, ou se transformaria ele emruim... dai entrar num labirinto... pra onde vou?(ele age como se tivesse perdido) A gente fica presodentro da dvida... do invisvel... O que no se podever nem tocar se tornar aterrorizante! (Coloca a monos ouvidos e fica olhando para os lados. De sbitovolta ao normal) Da eu escrevi o Davi.

    POPPYO praguejado!

    SETHExato. Ta uma coisa da qual eu fujo... praga. Nuncase sabe se tem poder ou no. E com o Davi foi assim,ele negou esmola e a mendiga praguejou ele.

    POPPY"Garoto ruim! (interpretando a mendiga) Nosso futuro um mistrio... hoje estamos assim, mas amanh podeser o inverso! Voc acha que vai ser assim prasempre? Pois no vai! O futuro se contri imagem dopassado! O que voc faz hoje se repete l na frente,mas do outro lado! o efeito espelho... Suas aesretornam pra voc... Uma espcie de investimento...Cuidado garoto, semente ruim no d fruto!" (sai dopersonagem) Essa mendiga fala bem, n?

    SETHCriticaram isso, mas eu perguntei se eles sabiam oque tinha acontecido na vida da mendiga.

    POPPYHumm... Sambou! (ri)

    SETHPalhao... onde que eu tava?

    POPPYNa praga.

    SETHOh, ... sim, depois de praguejado ele atropelado,e passa a acreditar que foi a praga da mendiga. E daiele comea a fazer tudo pra ser bom, vai atrs damendiga pra ajuda-la, mas s que ela passa aexplor-lo, e o pobre morrendo de medo vira escravodela, at que a policia a encontra e ela presa comochefe de quadrilha.

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 14.

    POPPYMas a dvida se mantem no final, e eu adorei isso.

    SETHEra o que tinha que fazer... eu no sei o preo dasalvao... eu no sei se existe salvao... comoposso supor quanto custa se nem ao menos fao ideiado que acontece? E qualquer coisa que eu tivesseproposto no seria satisfatrio... Sobre o que notem o que se falar...

    POPPYMelhor se calar... (completando a frase)

    Poppy senta no cho, olha pro horizonte eencolhe as pernas.

    POPPY"O mar est subindo... acho que ele ir nos molhar...... (sem jeito)"

    SETH"No sabe o que falar? (ri) esquisito n? (olhapara alto) Antes a gente falava o tempo todo, detudo, de qualquer coisa... agora..."

    POPPY"Agora as palavras somem... e quanto mais eu buscomais elas fogem... Por que voc quis se encontraraqui?"

    SETH"O som... O mar nunca nos deixaria em silncio... elesempre saber a palavra certa para falar... Osilencio pesa... (cabisbaixo e olhando para ohorizonte, apoiando uma das pernas na cadeira) Umsilncio pode falar mais que um tratado..."

    POPPY"Mas o silencio as vezes preenche o espao muitobem..."

    SETH"Mas o pior silencio o silencio vazio... elegrita... ele atormenta... ele sufoca... o silncio asvezes algo desconfortvel... Esse tipo de silencio triste... Esse tipo de silencio engole a tudo queestiver ao seu redor, e determina o ritmo e osmovimentos de quem a ele pertence..."

    POPPY"E quando esse silencio aparece?

    SETH"Quando estamos entre estranhos..."

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 15.

    POPPY"Nem sempre, alguns estranhos so muitocomunicativos."

    SETH"Exceto os que se tornam estranhos."

    POPPY"E quem so esses?"

    SETH"So a coisa mais triste que pode acontecer, que quando um silencio cheio se transforma em silenciovazio... quando voc passa a desconhecer algo quesabia de cor... quando voc se perde no caminho quevoc mesmo criou... um estranho pode se tornar umgrande amigo, e isso bom... mas um grande amigopode se tornar um estranho... e isso di..."

    POPPY"E quando que isso acontece?"

    SETH"... (olha pra Poppy) Quando o amor acaba..."

    POPPYLindo, lindo, lindo (balanando a cabea com os olhosfechados, j fora do personagem) e triste... adoroesse texto...

    SETHEu tambm... mas...

    POPPYO qu?

    SETH que nesse texto eu fui muito pessoal... acho queminha experincia me fez ser nele to... a palavrasumiu...

    POPPYMisterioso?

    SETHNo seria essa a palavra, mas foi isso... enigmtico!(lembra) Foi ela que me fez ser to enigimtico nasua histria...

    POPPYPor que?

    SETHQuando eu escrevi essa historia eu tinha tido a piorexperincia que eu pensei que pudesse ter... euencontrei um amigo antigo em uma livraria e no sabiacomo agir... era um grande amigo meu, mas quando eu

    (MAIS...)(CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 16.

    SETH (...cont.)encontrei com ele... ns ramos estranhos entrens...

    POPPYAi ficou aquele clima tenso...

    SETHPior. Eu agi da pior forma que eu poderia... eutentei falar com ele como se ainda fosse a mesmacoisa... mas era to falso... eu no era eu... erato teatral... eu estava tentando interpretar quem eutinha sido... mas pessoas mudam... o tempo muda atrochas, quem dir pessoas...

    POPPYE ele?

    SETHAcho que acreditou na minha cena... mas eu me sentiato sujo por ter feito aquilo... mas cada segundo emsilncio me incomodava... eu achava que tinha anecessidade de preencher o silncio de algumaforma...

    POPPYE o que aconteceu depois?

    SETHQuando eu cheguei em casa eu passei a noite inteiraolhando pela janela pro cu... num escuroaterrorizante... eu no tinha coragem de meencarar... eu no tinha coragem de aparecer sob aluz... eu no consegui dormir... passei a noitepensando naquele momento... no quo falso e sujo euhavia sido... no s com aquele antigo conhecido...mas, comigo...

    POPPYE ento decidiu escrever sobre?

    SETHEu no tive outra escolha! Ou eu escrevia, ou eumorria... foi um desabafo... uma espcie de div...eu deveria ter queimado o texto ao terminar... mas eugostei tanto que decidi que no...

    POPPYE se arrepende?

    SETHNo de ter escrito, mas...

    POPPYDe deixar ser encenado?

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 17.

    SETHSim... Quando eu assisti a estreia... eu me senti...eu me senti n... exposto... foi uma sensaoterrvel... eu via no palco todas as minhas emoes emeus sentimentos expostos... e quando as pessoasvinham falar comigo eu ficava com medo... ser queelas viam o mesmo que eu? Essa dvida era terrvel...

    POPPYMas a historia falava de um casal... no tinha nadaparecido com a sua...

    SETHComo no? Na historia um casal se reencontra depoisda separao para poder conversar, mas durante aconversa eles no conseguem encontrar a sintonia queeles possuam, eles discutem, se exaltam, mas nofim... no fim eles so apenas estranhos que seconhecem muito bem... foi basicamente o que aconteceucomigo... sem necessariamente ter acontecido...

    POPPYVoc acha que o seu antigo amigo conseguiu enxergar omesmo que voc?

    SETHNo...

    POPPYU... E qual era o problema ento?

    SETHA falta de conexo no foi em relao ao meu encontrocom ele... foi em relao a desconexo comigo... osilncio interno... a escurido... a solido... terrvel quando voc no tem a prpria companhia...mas naquela noite... naquela noite eu no queriaestar perto de mim... e foi isso que eu enxerguei naencenao... o dois personagens estavam extremamentesolitrios, ainda que estivessem juntos... no sei sevoc me entende...

    Poppy ri e entra no personagem seguinte, um serextremamente cido e frio no seu modo de falar.

    POPPY"No... eu no entendo... no consigo entender comouma pessoa prefere viver num mundo falso pelosimples... pelo simples medo da solido."

    SETH"Ser s terrvel..."

    POPPY"Terrvel ser um utenslio... os utenslios vivemna solido e possuem momentos em que, quando souteis e necessrios, so procurados, mas... a solidose mantem..."

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 18.

    SETH"Eu sou livre para viver a minha fantasia, e assim euprefiro..."

    POPPY"Voc prefere ser usado do que estar s?"

    SETH"Sim... eu prefiro."

    POPPY"Mas ns nunca estamos ss... sempre teremos nsmesmos como companhia."

    SETH"Mas no a mesma coisa..."

    POPPY"Voc tem razo... no a mesma coisa... muitomelhor."

    SETH"Eu no acho..."

    POPPY"E o que isso importa? Voc acha que no est s... eonde esto seus amigos? Eles no esto aqui... porqueeles no existem. Voc no tem amigos... voc no temcompanhia... voc possui pessoas que precisam de vocem determinados momentos, e nesses momentos queelas lhe procuram. Ento no adianta voc quererfugir da solido... voc est s."

    SETH"E o que voc quer que eu faa?"

    POPPY"Que voc pare de se subjulgar. A solido inevitvel... no fim todos ns estaremos ss...ningum estar conosco. Ento pare de ser usado!"

    SETH"No importa se no fim estaremos ss, eu prefiropossuir raros momentos, mesmo que seja pra ser usado,do que viver na solido eterna."

    POPPY"Eu no te entendo..."

    SETH"Todo a minha vida eu fui til... e isso, bem... issonunca foi um transtorno. Sempre fui muito bem tratadopor ser til... eu sei que muita das pessoas que metratavam bem simplesmente precisavam de mim. Eacredite, eu me esforcei cada segundo, cada instanteda minha vida para ser til... E sabe por que?Medo... Medo que ningum mais precisasse de mim...

    (MAIS...)(CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 19.

    SETH (...cont.)medo de me tornar ultrapassado e intil... E cada vezque eu era utilizado eu sentia um prazer togrande... porque naquele momento eu no estava s...As pessoas so ms... se voc no tem utilidade paraelas, elas simplesmente de jogam no lixo... Pode mechamar de fraco... Eu vivo uma mentira? E da? Eu nome importo... Enquanto eu for til... enquanto aspessoas precisarem de mim eu viverei... em relao asolido ser inevitvel... eu sei disso, mas euprefiro adi-la... e eu te garanto... por mais quedoa eu aceito ser um boi de piranha."

    Poppy sai do personagem

    POPPYEu nunca entendi ao certo se voc estava falando aide uma relao amorosa ou de fato de pessoas querodeiam...

    SETHNa verdade serve para ambos... que eu percebi quemuitas pessoas me usavam como boi de piranha, equando eu parei pra pensar a respeito eu cheguei aconcluso que eu aceitava ser boi de piranha... pramim era melhor ser usado e ter a pessoa perto de mimdo que ficar s...

    POPPYMas l no fundo tinha uma voz que queria que vocdeixasse de ser boi de piranha...

    SETHExato...

    POPPY sete\ (cortado)

    SETHSeth... Th tem som de f...

    POPPYSeth... sete... poppy... (ri) Por que poppy?

    SETHPopular... o desejo de ser popular...

    POPPYPoppy... eu gosto do som que faz...

    SETHE agora?

    POPPYO que?

    (CONTINUA...)

  • ...CONTINUANDO: 20.

    SETHJ revimos as minhas seis peas...

    POPPYJ descobriu o tem em todas?

    SETHNo...

    POPPY obvio... voc.

    SETHEu?

    POPPYSim... E isso se repete em todos os seus textos...

    SETHO qu?

    POPPYO dialogo com voc... em todas as suas peas vocconstruiu um paralelo entre o que voc sentia e o quevoc pensava... em todos os textos voc colocava suarazo diante de sua emoo e deixava que elesdecidissem entre si o que era melhor pra voc... Eisso se repetiu em todas as suas obras...

    SETHMas na sua...

    POPPYNa minha voc fez a mesma coisa...

    SETHE onde foi que falhei com voc?

    POPPYEm lugar nenhum... deve ter sido problema deinterpretao... de quem assistiu.

    SETHMas... eu olho pra mim e no consigo me encontrar...eu no consigo enxergar... eu para aquela pessoa,mas... quem ela? Sou eu... mas... quem eu?

    POPPYSou eu... voc... eu... e todos os outros seis...

    SETHComo assim?

    POPPYMais uma vez a razo se encontra com a emoo...Somos todos um s... Ns seis e voc... Bem vindoSete.

    (FIM)