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A experiência de Seu Genero - Assentamento Escalvado - Itapipoca/CE - 2005 Genésio Manoel Soares, tem 61 anos e mora no assentamento Escalvado, escondido na serra de Arapari, no município de Itapipoca. Ali ele descobriu cedo a agroecologia, muito antes de saber que o que fazia tinha esse nome. “Quando eu tinha uns 26 anos entendi que o solo produz bem hoje, mas amanhã não produz mais e aí eu chamo ele de terra ruim, mas não existe terra ruim, tiraram o que era dela e não dá mais pra produzir, isso eu fui vendo e experimentando”, lembra. Ele explica metaforicamente sua relação com a terra. “Tem que falar coisa ao vivo pra pessoa saber o que é, então eu digo assim pros meus companheiros: quando vocês têm uma porca que produz vários bacurins e vocês tiram o sustento da porca, o que acontece com os bacurins? Eles morrem, ficam defeituosos e feios, pois a terra é da mesma forma. Se nós desativarmos o potencial que a terra tem ao invés de contribuir pra que ela melhore, ela vai se acabar, e a culpa não é dela é de quem só faz tirar e não dá”. Para começar, seu Genésio deixou a monocultura de grãos e passou a se dedicar à horticultura, diversificando a produção e melhorando consideravelmente a renda da família. “Não dá pra deixar de cultivar milho e feijão, mas canteiro de horta é muito mais rápido e lucrativo”, explica. Hoje, seu Genésio trabalha com catorze tipos de cultura, sempre variando e experimentando tipos diferentes, isso sem contar o que produz para consumo próprio como a batata doce, o mamão, a macaxeira, a acerola e o alho. No tempo da seca, em 1994, veio um pessoal da Bélgica aqui e foram visitar o terreno da minha casa. Lá tem um pé de mangueira aqui, um cajueiro acolá, uma goiabeira ali, uma acerola pra cá, uma ateira, uma ingazeira e aí vai. O técnico agrônomo vendo aquela variedade me perguntou quem era que tinha mandado eu fazer daquele jeito. Eu disse: foi a necessidade! Eu preciso e fiz”, conta rindo. Usando a criatividade, como gosta de dizer, seu Genésio foi inventando adubos e defensivos naturais e transformando suas plantas nas maiores e mais bonitas da região. “O pessoal fica avexado porque eu dou a mesma semente de pimentão pro outro plantar, mas o meu acaba sendo o maior”, diverte-se. O segredo? Zelo. Fico observando a planta, vejo o que ela quer, o que está faltando”. Tem que ter Criatividade Tem que ter Criatividade

Seu Genero

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Sistematização de experiência de transição agroecológica

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Page 1: Seu Genero

A experiência de Seu Genero - Assentamento Escalvado - Itapipoca/CE - 2005

Genésio Manoel Soares, tem 61 anos e mora no assentamento Escalvado, escondido na serra de Arapari, no município de Itapipoca. Ali ele descobriu cedo a agroecologia, muito antes de saber que o que fazia tinha esse nome. “Quando eu tinha uns 26 anos entendi que o solo produz bem hoje, mas amanhã não produz mais e aí eu chamo ele de terra ruim, mas não existe terra ruim, tiraram o que era dela e não dá mais pra produzir, isso eu fui vendo e experimentando”, lembra.

Ele explica metaforicamente sua relação com a terra. “Tem que falar coisa ao vivo pra pessoa saber o que é, então eu digo assim pros meus companheiros: quando vocês têm uma porca que produz vários bacurins e vocês tiram o sustento da porca, o que acontece com os bacurins? Eles morrem, ficam defeituosos e feios, pois a terra é da mesma forma. Se nós desativarmos o potencial que a terra tem ao invés de contribuir pra que ela melhore, ela vai se acabar, e a culpa não é dela é de quem só faz tirar e não dá”.

Para começar, seu Genésio deixou a monocultura de grãos e passou a se dedicar à horticultura, diversificando a produção e melhorando consideravelmente a renda da família. “Não dá pra deixar de cultivar milho e feijão, mas canteiro de horta é muito mais rápido e lucrativo”, explica. Hoje, seu Genésio trabalha com catorze tipos de cultura, sempre variando e experimentando tipos diferentes, isso sem contar o que produz para consumo próprio como a batata doce, o mamão, a macaxeira, a acerola e o alho.

“No tempo da seca, em 1994, veio um pessoal da Bélgica aqui e foram visitar o terreno da minha casa. Lá tem um pé de mangueira aqui, um cajueiro acolá, uma goiabeira ali, uma acerola pra cá, uma ateira, uma ingazeira e aí vai. O técnico agrônomo vendo aquela variedade me perguntou quem era que tinha mandado eu fazer daquele jeito. Eu disse: foi a necessidade! Eu preciso e fiz”, conta rindo.

Usando a criatividade, como gosta de dizer, seu Genésio foi inventando adubos e defensivos naturais e transformando suas plantas nas maiores e mais bonitas da região. “O pessoal fica avexado porque eu dou a mesma semente de pimentão pro outro plantar, mas o meu acaba sendo o maior”, diverte-se. O segredo? Zelo. “Fico observando a planta, vejo o que ela quer, o que está faltando”.

Tem que ter CriatividadeTem que ter Criatividade

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Rede de

AGRICULTORES/AS AGRECOLÓGICOS DO TERRITÓRIO DE ITAPIPOCA

REALIZAÇÃO: APOIO:

No topo da lista de adubos naturais utilizados por seu Genésio está a cinza da madeira e do carvão. “Eu não preciso queimar a terra! Eu guardo toda a cinza do fogareiro de casa e uso como adubo!”, conta. Para melhorar a produção, o agricultor costuma colocar uma colher de cinza em um buraco feito a um palmo de distância do pé. Esterco de galinha e de cabra é outro componente essencial no preparo dos compostos orgânicos usados pelo agricultor.

“Lá em casa ninguém mexe no esterco. Junto tudo num depósito e deixo curtir. Cada safra tem que ter uma adubação. A planta pode estar morta, quando eu boto cinza a bichinha dá que é uma coisa! Aí dorme de novo, eu poderia botar cinza, mas dou logo estrume de cabra, ela muda depressa, renasce, corre, sobe e

floreia tudo de novo! Pimentão meu já dura dois anos!”, conta orgulhoso. Os defensivos também variam. “Cada produção

tem uma praga. O pimentão é uma lagarta, o coentro é um pulgãozinho que dá na folha, a cebola é uma lagarta mais dura, que vem por dentro, cada planta tem seu inimigo por isso é que, se trabalho com horta, tenho que ter vários defensivos”, explica. Além do nim, seu Genésio utiliza o pé de fumo para proteger seus canteiros. “Nunca passei sem fumo dentro das minhas hortas. Sempre tem um pé aqui e acolá”.

A criatividade e a consciência ecológica de seu Genésio lhe renderam uma mania que alguns vizinhos estranham: a qualquer hora do dia, ele passa recolhendo sacos plásticos usados nos terrenos e veredas do assentamento. Seus bolsos costumam estar sempre cheios de saquinhos vazios que viram abrigo para suas mudas. A idéia é vantajosa para a natureza e para o próprio Genésio que economiza R$ 10,00 por mês. “Antes gastava mais ou menos essa quantia no comércio comprando saquinhos pra minhas mudas”, diz.

O ativismo agroecológico de seu Genésio extrapola a questão produtiva. O

despertar de sua preocupação com a natureza coincidiu, não por acaso, com o começo

de sua luta pela melhoria da qualidade de vida da população do Escalvado e ele sabe

que só existe possibilidade de mudança e melhora com a união de todos. “Se você vê

três ou quatro abelhas no mato nem vai atrás de mel porque sabe que esse tantinho de

abelha não produz, mas se vê 15 abelhas voando tem certeza de que por ali tem mel. É a

mesma coisa com a gente”, ensina.