15
SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN InformANDES Informativo Nº 106 Brasília (DF) Julho de 2020 QUEM MANDOU MATAR MARIELLE?

SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

  • Upload
    others

  • View
    5

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN

InformANDES InformativoNº 106Brasília (DF)Julho de 2020

QUEM MANDOU MATAR MARIELLE?

Page 2: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/20202Editorial

EXPEDIENTE

O InformANDES é uma publicação do ANDES-SN // site: www.andes.org.br // e-mail: [email protected] Responsável: Cláudio MendonçaEdição: Renata Maffezoli MTb 37322/SPCoordenação Editorial: Jamile Rodrigues MTb 0010916/DFJornalistas: Bruna Yunes DrT 9045/DF, Luciana Sendyk, Renata Maffezoli MTb 37322/SPDiagramação, revisão e arte final: Angel Holanda // Fotos: Imprensa ANDES-SN, Divulgação, Banco de Imagens

O mês de julho termina com mais de 90 mil vidas ceifadas pelo novo coronavírus e pela opção política do governo

federal e dos governos estaduais e municipais em garantir os lucros e a cir-culação de mercadorias, em detrimento das vidas. Certamente, o número de mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário, o Brasil entra para o topo da lista dos países que pior lidaram com a pandemia, investindo menos do que devia em saúde pública, testando absolutamente aquém da necessidade, banalizando a morte e priorizando a reabertura, nada gradativa, mesmo com a alta no número de mortos.

Ao mesmo tempo, o país que investiu pouco no controle, bate recorde nos números de desemprego, subemprego, uberização do trabalho, ampliando muito a exploração e o sobretrabalho, numa insistente tentativa de impor um “novo normal”, que de “normal” só tem a já histórica e tradicional exploração do capital sobre a classe trabalhadora.

Mas também se intensificam as rea-ções, sejam nos “breques” dos trabalha-dores de aplicativos, seja no anúncio de greve de professores, que se recusam a retornar presencialmente ao trabalho, ou ainda na greve do metrô de São Paulo.

No âmbito do ensino superior públi-co, o “novo normal” parece legiti mar a tentati va de imposição do trabalho e do ensino remoto em substi tuição ao pre-

sencial. Longe de ser uma tentati va de dar respostas e atender às demandas de uma realidade absolutamente excepcio-nal, as insti tuições de ensino, alicerçadas no projeto do capital para a educação, aprimoram suas ações de aligeiramento da educação, tentati va de certi fi cação em larga escala, ampliação do ensino a distância e a consequente reeliti zação do ensino superior público, com a exclusão de milhares de jovens de origem popular; pessoas com defi ciência; indígenas, qui-lombolas; ribeirinhos, entre outros, que "teimaram" em adentrar nas insti tuições de ensino, forçando uma alteração na exclusão estrutural das classes populares de políti cas públicas de qualidade.

Talvez a maior expressão desse pro-cesso de desvalorização da educação superior pública seja as constantes mudanças no Ministério da Educação, sempre sob o comando de um ministro desqualificado para o cargo, com ideias anticiência e/ou de base privatista e religiosa, demonstrando para onde este governo quer que caminhe a educação no Brasil. Linhas estas que foram a marca do novo projeto do “Future-se” enviado ao Congresso Nacional pelo ex-ministro da Educação, que agora foi confirmado para um cargo no Banco Mundial, explicitando seu alinhamento com o projeto do capital.

Neste momento, junto com a luta pela garantia do isolamento social, pelo não retorno do setor da educação ao ensino presencial, também lutamos para dizer o que estamos fazendo nas instituições

de ensino, a partir do tripé ensino-pes-quisa-extensão e o que mais podemos fazer. Não para dar uma aparência de normalidade à realidade excepcional im-posta pela COVID-19, mas para mostrar que já fazemos muito e que podemos fazer mais, sem naturalizar a morte, a precariedade das condições de vida, os desequilíbrios emocionais provocados por essa realidade de morte, medo e insegurança. Assim, mais uma vez, ou-samos afirmar que o ensino remoto em substituição ao presencial não atende ao projeto de educação pública de qua-lidade que defendemos.

Temos que questionar essa tentativa de adaptar-se ao “novo normal” sem diálogo devido com a comunidade acadêmica, uma imposição autoritária pela maior parte das gestões das instituições de ensino, sem garantia de estrutura para o desenvolvimento do trabalho por parte dos docentes, reduzindo a situação dos estudantes à questão do acesso à tecnologia, sem questionar a subordinação às grandes plataformas dos conglomerados da tecnologia, ampliando, assim, a apropriação privada do fundo público. A uberização do trabalho, a terceirização das funções, a degradação das condições de trabalho, a desvalorização da função do professor e o desmantelamento do sentido pleno da educação como fazer dialógico devem ser questionados, estranhados e desnaturalizados, de forma a gerar resistência e luta na defesa da educação pública de qualidade.

#FIQUE EM CASA#FIQUE EM CASABASTABASTA BOLSONARO E MOURÃO! BOLSONARO E MOURÃO!

Page 3: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/2020 3

"Canção Óbvia"“Escolhi a sombra de uma árvore para meditarno muito que podia fazer enquanto te esperavaquem espera na pura esperançavive um tempo de espera qualquer.

Por isso enquanto te esperotrabalharei nos campos e dialogarei com homens, mulheres e criançasminhas mãos ficarão calosasmeus pés aprenderão os mistérios dos caminhosmeu corpo será queimado pelo solmeus olhos verão o que nunca tinham vistomeus ouvidos escutarão ruídos antes despercebidosna difusa sonoridade de cada dia.

Desconfiarei daqueles que venham me dizerà sombra daquela árvore, prevenidosque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso caminharque é perigoso falar...porque eles rechaçam a alegria de tua chegada.Desconfiarei também daqueles que venham me dizerà sombra desta árvore, que tu já chegasteporque estes que te anunciam ingenuamenteantes te denunciavam.

Esperarei por ti como o jardineiroque prepara o jardim para a rosaque se abrirá na primavera.”

Poesia escrita por Paulo Freire quando estava exilado na Suíça, na década de 70

Desconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerDesconfiarei daqueles que venham me dizerà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosà sombra daquela árvore, prevenidosque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que esperoque é perigoso esperar da forma que espero

porque eles rechaçam a alegria de tua chegada.Desconfiarei também daqueles que venham me dizerà sombra desta árvore, que tu já chegasteà sombra desta árvore, que tu já chegasteà sombra desta árvore, que tu já chegasteà sombra desta árvore, que tu já chegasteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamenteporque estes que te anunciam ingenuamente

Esperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroEsperarei por ti como o jardineiroque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque prepara o jardim para a rosaque se abrirá na primavera.”que se abrirá na primavera.”

Page 4: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

Breque dos apps: revolta contemporânea, expoliação tradicional

O dia 1º de julho ficará marcado na história das lutas recentes como a data de uma mobili-zação inédita, que, também,

consolidou a ocupação do espaço pú-blico por quem dele não conseguiu se afastar durante o isolamento social re-comendado como forma de prevenção à Covid-19. Da mesma forma, o dia 25 de julho, um sábado, mostrou o alcance do movimento que ficou conhecido como "breque dos apps".

Precarizados por definição, onipre-sentes nas ruas por falta de opção, entregadores que atuam por demanda dos aplicativos, ao contrário de diversos segmentos que conseguiram manter suas ocupações e renda permanecendo em casa, continuaram trabalhando nas ruas. Enquanto aumentou o volume de pedidos de comida e outros itens, para que as pessoas não precisassem sair de

casa, paradoxalmente, os entregadores viram a diminuição dos seus rendimentos e dos níveis de segurança e de proteção.

Com o crescente desemprego, houve aumento dos chamados 'empreende-dores de si mesmos’. Como pontua o sociólogo e professor da Universidade de Campinas (Unicamp), Ricardo Antunes, são operárias e operários do trabalho digital, que sabem quais são as suas metas e que têm que cumpri-las.

Esse exército de mão de obra está mais suscetível à crueldade do mercado que, quando conta com muitos dispos-tos a trabalhar, sabe que pode pagar menos, sobrepondo a lei da oferta e da procura à dignidade dos trabalhadores. E esses indivíduos, que não puderam se retirar das ruas no momento da pande-mia, então a tomaram, brecando suas motos e carros para colocar em pauta suas reivindicações.

São demandas básicas, como alimen-tação; água; banheiro; valor mínimo por hora trabalhada, pagamentos recebidos e quilômetro rodado; fornecimento de equipamentos de segurança e EPIs; afastamento remunerado por motivos de saúde; vínculo empregatício; fim dos bloqueios injustificados nas platafor-mas; clareza nas regras de pontuação e avaliações.

Com essa pauta, os entregadores refutam os discursos de auto-empreen-dedorismo, flexibilidade e autonomia e resistem ao aprofundamento do neolibe-ralismo, que busca derrubar limites ainda existentes à exploração máxima da força de trabalho pelo Capital. Ao longo dos últimos anos, assistimos ao desmonte da legislação trabalhista brasileira, além do enfraquecimento e tentativa de extinção dos diferentes órgãos de fiscalização e proteção do trabalhador.

Trabalho precarizado transforma presença constante nas ruas em estratégia de mobilização

4Mundo do trabalho

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Page 5: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/2020 5Mundo do trabalho

A manifestação dos entregadores por aplicativos deu visibilidade à essa explo-ração e espoliação de direitos e contou com relevante apoio da sociedade, mo-vimentos sociais, pastorais, sindicatos e artistas, que além de manifestar-se nas redes sociais, não utilizaram os aplicativos nos dias 1 e 25 de julho e ainda avaliaram mal as plataformas. Até mesmo donos de restaurantes e outros estabelecimentos boicotaram os serviços das plataformas digitais.

Para Ricardo Antunes, vivemos o século do mundo maquínico, que afetou profundamente o universo do trabalho. "As empresas se horizontalizaram, o que terceirizou e desregulamentou totalmente as condições laborais, fragmentando a classe operária com o propósito, justamente, de desmembrar a luta da classe trabalhadora", explica.

Ele destaca o setor de serviços, onde houve a decomposição do “ope-rário massa”, sendo substituído pelos colaboradores individualizados, que recebem conforme a produção. "Esse infoproletariado ou cybertariado é uma massa de trabalhadoras e trabalhado-res sempre disponíveis para o Capital.

Trata-se da mais pura extração de mais-valia", resume.

Embora não possam prescindir do entregador, o valor arrecadado pelas empresas de aplicativo ultrapassa a hiperexploração da mão de obra para envolver outros ativos, como a cons-trução de um banco de dados pessoais capaz de gerar lucro pela possibilidade preditiva dos hábitos e das necessida-des do público consumidor, de resto considerada a maior riqueza da cha-mada 'nova economia'. O trabalho dos algoritmos dessas plataformas, assim, é precarizar ao limite as condições de trabalho, enquanto obtém a maior quantidade possível de informações de seus usuários.

"O capitalismo de plataforma é uma espécie de protoforma do capitalismo. O trabalho digital se fundamenta na acumulação primitiva, sendo a espolia-ção digital uma nova face da espolia-ção colonial, ou, em suma, escravidão digital", afirma Ricardo Antunes. "Esse novo proletariado, desregulamentado, intermitente, terceirizado, dependente e precarizado tem sido importante nas atuais revoltas", conclui.

Pesquisa realizada pelo GT Trabalho Digital/Remir (Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista) da Unicamp sobre as condições laborais dos entregado-res de plataformas digitais no Brasil - especialmente iFood, Uber Eats, Rappi e Loggi - levantou dados a respeito de rendimento, tempo de trabalho, medidas de proteção e rendimentos, obtendo que, durante a pandemia, 72% dos respondentes passaram a auferir até R$ 520,00 se-manais; antes, esse teto atingia 47% dos entregadores, tendo havido portanto, redução de ganhos para 25% dos respondentes. Houve, ain-da, aumento de 100% daqueles que receberam R$ 260,00 por semana. Mais de 60% declararam trabalhar mais do que 9 horas por dia; e qua-se 8% mais do que 15 horas diárias; 78% dos entregadores trabalham 6 ou 7 dias por semana.

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Page 6: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/20206Movimento Docente

MEC se consolida como inimigo da Educação

Há um ano e sete meses sob o comando do atual governo, o Ministério da Educação (MEC) ganhou seu quarto ministro. No

dia 10 de julho, Jair Bolsonaro nomeou o professor e pastor Milton Ribeiro para estar à frente da pasta. O último, Carlos Alberto Decotelli, teve uma passagem relâmpago pelo MEC, no mês de junho, e não chegou a tomar posse, após ser acusado de inserir informações falsas em seu currículo Lattes.

O MEC tem sido objeto de disputa ideológica dentro do governo Bolsonaro e cada ala - olavista e militar - insiste em emplacar seu indicado, um que atenda sua agenda anticiência, conservadora e privatista. Ataques à autonomia das universidades, institutos federais e Cefet, discursos contra o pensamento crítico, o conhecimento científico, contingencia-mento de recursos das instituições de ensino superior (IES) públicas e o incentivo à ampliação do ensino superior privado fazem parte do legado bolsonarista, desde janeiro de 2019.

Devido às polêmicas que envolveram os ministros que passaram pelo cargo, a pasta tem sido alvo constante de críticas e manifestações de várias entidades ligadas à educação, entre elas o ANDES-SN, que entendem que apesar das divergências pontuais, ambas as alas estão unidas na agenda de ataques à educação pública, gratuita, laica e de qualidade.

‘Deus me ajude’O quarto indicado e atual gestor do

MEC, Milton Ribeiro não tem nenhuma experiência no setor público e, apesar da garantia constitucional do Estado laico, se posiciona em uma perspec-tiva fundamentalista. Pastor da Igreja Presbiteriana, Ribeiro é ligado ao setor privado da educação, foi vice-reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e é membro do Conselho Deliberativo do instituto Presbiteriano Mackenzie, entidade mantenedora da universi-dade. No ano passado, foi nomeado para a Comissão de Ética Pública da Presidência da República.

Declarações em vídeos e redes sociais do novo ministro de que novas univer-sidades ensinam “sexo sem limite”, a minimização do feminicídio e da violência de gênero e, ainda, sua defesa de castigo físico para crianças no ensino causaram surpresa e reações de repúdio de entida-des que defendem a educação pública e da sociedade em geral. No dia da sua posse, encerrou o discurso pedindo ajuda a Deus.

De acordo com Elizabeth Barbosa, uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Política Educacional (GTPE) do ANDES-SN, o ataque à educação pública não é algo novo e, desde a década de 1990, o grande Capital avança de forma mais acelerada no seu objetivo de transformação da educação pública em mercadoria.

“Vivemos uma intensificação dos ataques à educação pública, iniciados na década de 90. E, agora, nos deparamos com um governo de extrema direita, mi-sógino, racista, genocida, negacionista, com uma pauta anticiência, ideológica, conservadora, privatista, dando segmen-to para essa perspectiva mercadológica

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Ineficiência, aparelhamento ideológico e troca-troca marcam o MEC sob governo Bolsonaro

Page 7: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/2020 7Movimento Docente

da educação pública. Um exemplo é o Future-se, um projeto com teor meri-tocrático e mercadológico, se encontra [no Congresso Nacional] em sua quarta versão e que reforça a perspectiva de mercado, para adequar a educação ao ajuste fiscal da Emenda Constitucional 95 [Teto dos Gastos]”, explica a docente.

Fature-se Sem diálogo com a comunidade aca-

dêmica, o segundo ministro indicado por Bolsonaro, Abraham Weintraub, lançou no ano passado o Future-se que, entre outros pontos, cria um fundo de natureza privada para financiar as universidades, institutos federais e Cefet de todo o país. O programa veio logo depois do contingenciamento de 30% do orçamento das universidades e institutos federais e foi uma tentativa de forçar as instituições a aderirem à proposta. [Veja Box]

Em um ano e dois meses de gestão, Weintraub promoveu inúmeros ataques às instituições de ensino superior públi-cas, fez declarações xenofóbicas e ra-cistas, incentivou a perseguição aos do-centes em sala de aula, bloqueou bolsas de mestrado e doutorado oferecidas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), interferiu nos processos de consulta à comunidade universitária para eleição de reitores, entre outras medidas.

“Dentro das universidades, institutos e Cefet nós estamos vivenciando há mais de um ano a retirada da nossa autonomia, a imposição do governo em não respeitar inclusive as nossas elei-

ções internas para reitores e de nomear pessoas que sequer faziam parte da lista tríplice”, ressaltou Elizabeth.

Os desgastes, somados à repercussão do episódio no qual Weintraub chamou ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de "vagabundos", resultaram em sua saída. Antes disso, neste ano, em meio a pandemia de Covid-19, o ex-mi-nistro publicou instruções normativas que retiram benefícios como auxílio periculosidade e insalubridade dos salá-rios dos servidores públicos federais na adoção do regime de teletrabalho, que interferem na apresentação de plano de trabalho e, também, portarias que autorizam a substituição das discipli-nas presenciais por aulas que utilizem meios e tecnologias de informação e comunicação por ensino a distancia.

“O ANDES-SN tem batalhado pela sus-pensão do calendário acadêmico deste ano e que a universidade se coloque para a comunidade e, internamente, a partir do ensino, da pesquisa e extensão. O ensino remoto é excludente, elitista, misógino e racista e vai ao encontro do que o grande Capital defende. Além disso, ele ainda traz sérios impactos na saúde mental dos docentes”, afirmou a diretora do Sindicato Nacional.

‘Não existe universidade para todos’Indicado por Olavo de Carvalho,

o primeiro ministro da Educação do governo Bolsonaro, Ricardo Vélez Rodrigues, também acumulou, ao longo de sua gestão de três meses, declara-ções polêmicas e uma série de medidas

atrapalhadas que colocaram as pautas da educação pública em risco.

Em entrevista a um jornal, Vélez afirmou que não existia “a ideia de uni-versidade para todos”, e que esse é um espaço que deveria ficar restrito à elite intelectual. Em outra ocasião, declarou que pretendia mudar a forma como o golpe de 1964 e a ditadura militar são retratados nos livros didáticos, "para dar uma visão mais ampla da história".

Na sua curta gestão, Vélez extinguiu secretarias importantes, criou um órgão de fomento a escolas militares, demitiu mais de 20 pessoas, 10 do alto escalão do ministério. As demissões e indefinições da pasta colocaram em risco o andamento de importantes projetos, como o Enem.

Segundo a coordenadora do GTPE, o presidente Jair Bolsonaro e seus ministros travam, desde o ano passa-do, uma guerra contra as IES públicas com inúmeras tentativas de macular a imagem e o prestígio das instituições para beneficiar o ensino privado no país. “Enfrentamos um momento difícil no qual não podemos estar nas ruas e nos encontros presenciais, por conta do isolamento social. Estamos, das nossas casas, denunciando através da internet a cada dia um novo ataque desse governo e como responder a eles, mantendo os nossos princípios e a defesa de uma educação pública, gratuita, laica. Essa tem sido nossa luta diária e não tem sido fácil”, afirmou. Para ela, independente do ministro indicado ao MEC, a sua agenda de ataques à educação pública brasileira será a mesma.

Lançado pelo ex-ministro da Edu-cação, Abraham Weintraub, em julho de 2019, o Programa Uni-versidades e Institutos Empreen-dedores e Inovadores - Future-se foi apresentado como uma “pon-te para o futuro”. Na época, o ANDES-SN se posicionou contra o projeto devido ao seu teor merito-crático e mercadológico e, tam-bém, questionou o desrespeito à autonomia universitária e a falta de garantia de financiamento público do ensino superior no programa.

No dia 27 de maio, em meio à interrupção das aulas presen-ciais por causa da pandemia da Covid-19, a quarta versão do Future-se foi enviada a Câmara dos Deputados. O Projeto de Lei (PL) 3076/2020 estabelece que cada instituição poderá firmar um contrato, com intermediação do MEC, em que serão definidos resultados a serem alcançados em diversas áreas, como pesquisa. Se os objetivos forem alcançados, a universidade receberá recursos

adicionais da Educação e terá preferência na concessão de bolsas da Coordenação de Aper-feiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).O ANDES-SN, desde então, tem se posicionado contra o Future--se e realizado atos e campanhas contra o programa. O Sindicato Nacional elaborou um material com 20 motivos que apontam os perigos do programa Future-se, que busca mercantilizar e privati-zar o ensino público.

Page 8: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/20208

Ensino remoto na Educação Básica revela exclusão e precarização do ensino

O ensino remoto tem sido ado-tado por escolas do Ensino Básico da rede pública e priva-da de todo o país no período

de suspensão das aulas presenciais em função da Covid-19. Mesmo com a pan-demia, o MEC manteve, para este ano, a obrigatoriedade de 800 horas para o ano letivo nas escolas. A Educação Básica compreende três etapas do ensino: Infantil, Fundamental e Médio.

Imposto por muitos governadores e prefeitos, o ensino remoto tem revela-do barreiras nos processos de ensino e aprendizagem. A falta de internet e equipamentos adequados, somados à realidade financeira das famílias e aos efeitos psicológicos do isolamento social e, ainda, às mortes causadas pelo novo coronavírus - frequentes na vida de alunos e professores – trazem danos irreparáveis para o ensino por parte dos professores e aprendizagem de estudantes e suas famílias.

Assim como os adultos, as crianças tiveram suas rotinas brutalmente alte-radas diante da nova realidade impos-ta. A cartilha “Crianças na pandemia Covid-19”, publicada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), revelou que entre as reações emocionais e alte-rações comportamentais frequente-mente apresentadas pelas crianças durante a pandemia, destacam-se: dificuldades de concentração, irrita-bilidade, medo, inquietação, tédio, sensação de solidão, alterações no padrão de sono e alimentação.

Entidades ligadas à Educação Básica defendem que o ensino remoto não é adequado, pois os alunos ainda precisam desenvolver autonomia, capacidade de concentração e auto-disciplina que a modalidade requer. As atividades repassadas pelas escolas aos alunos exigem tempo e dedica-ção não somente das crianças, mas também de um adulto que as auxilie.

De acordo com Antonio Gonçalves, presidente do ANDES-SN, a pandemia da Covid-19 explicitou, nos últimos meses, a desigualdade social no país e expôs a situação de vulnerabilidade de muitos estudantes brasileiros.

“A manutenção de aulas remotas sem que haja condições objetivas adequadas para desenvolvê-las é impor um projeto absolutamente ex-cludente, aligeirado e sem qualidade. A alternativa seria preparar as escolas públicas para esse desafio, através da inclusão digital de alunos, técnicos e docentes; construção de plataformas públicas de acesso; qualificação de trabalhadores para o desenvolvimen-to de tarefas remotas e avaliação continuada do processo. Do mesmo modo, prepará-las para o período pós-pandemia. Fazer de qualquer jeito é ruim para a educação pública e não interessa para o conjunto da sociedade”, disse Gonçalves.

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Matéria Central

Page 9: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/2020 9

Falsa normalidadeDiante das tentativas do governo

federal de difundir uma falsa sensa-ção de normalidade em meio a uma conjuntura de incertezas, muitas es-colas particulares saíram na frente e implantaram o ensino remoto. “Houve intensa pressão de entidades privadas pelo ensino remoto, seja no ensino fundamental, médio, técnico-tecno-lógico e superior, porque entendem a educação como uma mercadoria e o lucro como prioridade, a despeito da qualidade do processo de ensino--aprendizagem”, afirmou o presidente do Sindicato Nacional.

Nessa corrida, as escolas da rede pública, pressionadas pelo MEC, tentam em muitos estados e muni-cípios impor, a todo custo, o ensino remoto. Muitos dos estudantes da rede pública não têm acesso à tec-nologia ou à internet em suas resi-dências, diferente dos tantos que estudam na rede particular.

Segundo uma pesquisa do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), divulgada em maio deste ano, 61% dos domicílios no Brasil não têm acesso a computadores ou tablets e 29% não dispõem de internet. Pelo recorte socioeconômico, enquanto 95% domicílios da classe A possuem algum tipo de computador, eles estão presentes em apenas 44% dos domicí-lios da classe C e 14% dos domicílios das classes D e E. Desde 2016, há uma queda na presença desses dispositivos nos domicílios brasileiros.

No que se refere à conexão domici-liar, mais de 20 milhões de residências não possuem internet, realidade que afeta especialmente a região Nordeste (35%) e famílias com renda de até 1 salário mínimo (45%). Outra pesqui-sa, realizada pelo mesmo Comitê, avaliou especif icamente o acesso dos estudantes à internet e às tec-nologias. O estudo apontou que 39% dos estudantes que não têm acesso a computadores ou tablets são de escolas públicas urbanas.

Estudantes com deficiência No caso dos estudantes com defi-

ciência, o ensino remoto represen-ta novas barreiras à continuidade dos estudos e tem sobrecarregado familiares ou cuidadores, que são responsabilizados por criar solu-ções de acessibilidade e adaptações de material para que as crianças

possam acompanhar a turma. O Censo Escolar 2019, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), divulgou que há 1,2 milhão de estudantes com defici-ência na Educação Básica brasileira.

Segundo um estudo do CGI.br sobre acessibilidade de tecnologias da infor-mação por pessoas com deficiência no Brasil e América Latina, o uso de tecnologias por brasileiros com de-ficiência é inferior ao da população sem deficiência. Em 2016, apenas 23% das pessoas com deficiência usavam computador, enquanto essa propor-ção era quase o dobro (41%) entre as pessoas sem deficiência. A falta da inclusão digital para pessoas com deficiência limita o acesso à educação de qualidade e afeta o bem-estar e a garantia de direitos fundamentais.

“O ANDES-SN tem pautado a sua luta no combate a todas as formas de opressão, que estruturam o siste-ma capitalista. O capacitismo é uma opressão que se expressa nitidamente nesse caso e deve ser combatido. Estruturar nossas escolas públicas pressupõe garantir a acessibilidade, sem exclusão, ainda mais em tempos de pandemia. Qualquer ‘solução’ excludente não nos interessa”, con-siderou Antonio.

Em alguns estadosMais de 4 milhões de alunos estão

matriculados no Ensino Fundamental e Médio de escolas da rede estadu-al de São Paulo. Desde o dia 27 de abril, as aulas estão sendo realizadas pelo ensino remoto. Uma pesquisa feita pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), divulgada em 9 de junho, apontou que apenas 42% dos estudantes têm frequentado as aulas online em toda a rede estadual pau-lista. As informações foram coletadas voluntariamente de professores da rede estadual de ensino entre 21 de maio a 8 de junho.

Já no Distrito Federal, uma pes-quisa realizada pelo Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro-DF), entre os dias 21 e 31 de maio, constatou que 26,27% dos 460 mil estudantes da rede pública de ensino não têm nenhum equipamento de uso digital em casa para assistir as aulas e 27,71% dos estudantes não têm conexão com internet nas suas casas. Somados, são 247 mil alunos

com barreiras tecnológicas para o ensino remoto. Ainda neste período da pesquisa, 57,90% deles, 265 mil, não assistiram às teleaulas. O DF instituiu atividades remotas no início da pan-demia e retomou o calendário oficial para o ensino básico no dia 13 de julho.

Segundo Antonio Gonçalves, a baixa adesão ao ensino remoto traz a compreensão de que há uma grande proporção de estudantes excluídos desse processo. “Os dados que nos chegam informam que a participação dos alunos nas atividades remotas é muito baixa e a evasão tem sido muito alta. Não podemos desconsi-derar esses aspectos perniciosos de conduzir a política educacional sem zelo e sem compromisso com a qua-lidade”, disse.

Para o presidente do ANDES-SN, é impossível assegurar inclusão na educação, de fato, quando se anula as diferenças. “As consequências futuras apontam no sentido da intensificação desses danos, tanto na qualidade da educação, que tende a piorar, quanto no acesso e permanência dos estudantes, ainda no aumento do adoecimento de trabalhadores em educação, consequência da pre-carização. Alertamos que o ensino remoto substitutivo do presencial faz parte do projeto do Capital para a educação, que intenciona torná-lo permanente após o período da pan-demia”, finalizou.

Menos de um terço dos professores da Educação Básica avalia o ensino remoto como uma experiência positiva. O levantamento “A situação dos professores no Brasil durante a pandemia”, desenvolvido pelo portal Nova Escola, foi realizado através de um questionário online, entre os dias 16 e 28 de maio. 30% dos que responderam classificaram a experiência com o ensino remoto como péssima ou ruim. 33% dos professores consideraram razoável, 27% boa e apenas 5% atribuíram nota 9 e 10 para o ensino remoto. Foram coletadas 8.121 respostas de professores.

Matéria Central

Page 10: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/202010

Em universidades públicas, institutos federais e Cefets de todo o país, após a disseminação do novo coro-navírus, as atividades presenciais e

o calendário acadêmico foram suspensos. Poucas fizeram a transição imediata, des-preparada e compulsória para o ensino remoto, como foi o caso da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS).

Mas, apesar da suspenção das ativida-des de ensino, em todas as instituições a comunidade acadêmica deu sequência, dentro das possibilidades, às atividades de pesquisa e extensão. Porém, agora, em meio à pandemia que atualmente ceifa mais de 1.000 vidas todos os dias no país, se discute a retomada do ensino, através de modalidade remota.

Passados alguns meses desde o início do distanciamento físico, se intensifica-ram as pressões, tanto do Ministério da Educação, dos governos Federal, estaduais e municipais quanto de muitos gestores, para a retomada do calendário acadêmico, inclusive com ameaças vela-das de corte de salário.

Em algumas cidades, como Uberlândia (MG), até o Ministério Público Federal se manifestou pelo retorno imediato das atividades de ensino remoto, em uma expressa interferência na autonomia universitária.

“O ANDES-SN vem fazendo o debate sobre esse momento de excepcionali-dade que estamos vivendo, a partir do reconhecimento de que as nossas ações, o nosso trabalho nas universidades públicas, cefets e institutos federais se organizam a partir de um tripé - ensino, pesquisa e extensão - previsto no artigo 207 da Constituição Federal. Nesse sentido, durante todo esse período da pandemia, em momento nenhum nós deixamos de trabalhar”, explica Eblin Farage, secretária-geral do ANDES-SN.

“Existem uma série de atividades que estamos realizando. Ou seja, não esta-mos parados. As instituições públicas de ensino têm muito a fazer neste mo-mento, e, não necessariamente precisam cumprir a carga horária e o calendário acadêmico de ensino como se estivés-

semos vivendo uma normalidade das nossas condições de vida”, acrescenta.

A campanha criada pelo Sindicato Nacional “O que alguns de chamam balbúrdia, nós chamamos de produção de conhecimento público” trouxe alguns exemplos do que a comunidade acadê-mica está fazendo nesse período. Foram listadas mais de duzentas atividades de pesquisa e extensão direcionadas ao com-bate à Covid-19 e em apoio à população, desenvolvidas nas universidades federais e estaduais, Cefet e Institutos Federais.

Ausência de diálogoPoucas são as instituições que têm

feito um amplo, democrático e abran-gente debate com a comunidade acadê-mica sobre o que fazer nesse momento. Em muitas, as opiniões de docentes, discentes e técnico-administrativos foram ignoradas. Resoluções têm sido aprovadas de forma aligeirada, sem con-siderar dos diversos aspectos envolvidos na retomada do calendário acadêmico de maneira remota.

Propostas de adoção de ensino remoto podem aprofundar desigualdades na Educação públicaAlém disso, a intensificação do trabalho docente deve contribuir para o adoecimento ainda maior da categoria

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Matéria Central

Page 11: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/2020 11

Para Eblin, não basta apenas pensar uma forma que transponha o ensino presencial para o ensino a distância, porque, na avaliação do ANDES-SN, isso é impossível de ser realizado. Haverá perda de qualidade no processo de ensino/aprendizagem.

“Teremos perdas no sentido de uma educação dialógica, coletiva. Isso é muito importante ser frisado, porque faz com que o debate não se restrinja ao acesso ou não às tecnologias da informação, que é o que algumas universidades estão fazendo para impor o retorno do calen-dário através do ensino remoto”, pontua.

Desconhecimento da realidade Além do aspecto tecnológico, a dire-

tora do Sindicato Nacional aponta que muitas instituições estão atropelando o debate democrático e, ainda, ignorando os demais aspectos de impor o ensino remoto a discentes, docentes e técni-cos nesse período de tantas incertezas e dificuldades materiais e subjetivas.

“Em muitas universidades, não estão sendo feitos levantamentos sobre as condições de vida, para além do acesso tecnológico, de estudantes e docentes. E, as que estão realizando, estão fazendo de forma muito precária. Os questioná-rios atingem um percentual pequeno da comunidade acadêmica. Nem os questionários são construídos coleti-vamente, nem as respostas trabalhadas no âmbito da comunidade acadêmica. Mas essas respostas estão servindo para uma inferência no universo de toda a instituição, o que nem sempre condiz a realidade. Estamos tendo acesso a levantamentos que não atingem nem 40% dos estudantes. O que fazer com os outros 60% que se quer responderam ao questionário? A gente finge que eles não existem?”, questiona.

Por exemplo, na UFMS, segundo relato da seção sindical do ANDES-SN (Adufms SSind), a reitoria divulgou apenas as respostas positivas à implementação do ensino remoto. E, nem mesmo o questionário de avaliação institucional teve grande adesão. Até o final de junho, após a terceira prorrogação do prazo, apenas 23% da comunidade acadêmica havia respondido. A UFMS foi a primeira a fazer a transição imediata e obrigatória para o ensino remoto. Àqueles estudan-tes que não conseguirem se adequar, foi dada a opção de trancamento do curso.

Já na Federal de Santa Maria (UFSM), uma pesquisa da universidade apontou alguns dos desafios enfrentados pelos

docentes e discentes que aderiram à metodologia de ensino remoto, desen-volvida e disponibilizada pela instituição em março, denominada Rede.

Do questionário voltado aos docentes, 67% do total de professores da UFSM participaram. Destes, 54,3% afirmaram que estão encontrando dificuldades no trabalho remoto, 51,8% disseram ter problemas na transposição dos conteú-dos do presencial para o virtual e 47,6% relataram ter uma conexão de internet de má qualidade.

Em relação aos estudantes, apenas 32% dos 25.877 mil discentes (8.289) responderam o questionário. Dos que participaram, 43% está no cadastro de Benefício Socioeconômico (BSE). Dentre os que responderam, 86% optaram e conseguiram participar do Rede.

Dos 14% que não participam do Regime Especial, 44% apontaram dificuldades psicológicas causadas pelo isolamento social, 34% dificuldades no contexto familiar, econômico ou de trabalho, 34% por não concordar com a adoção do Rede e, em quarto e quinto lugar, respectiva-mente, 29% apontou a baixa qualidade de internet e 29% equipamento de acesso inadequado ou com problema.

“Parece-nos que algumas das propos-tas que estão sendo levadas a cabo nas universidades desconsideram os amplos seguimentos da comunidade acadêmica, em especial de discentes, mas também de docentes e técnico-administrativos, que não têm condições de um retorno normal e que, portanto, vão ficar para trás nesse processo. Na nossa avaliação, do que vimos até agora, não há uma

proposta que não deixe ninguém para trás”, diz Eblin Farage.

A diretora do ANDES-SN reforça que a oferta de kits tecnológicos, que vem sendo apresentada como alternativa por algumas IFEs, é importante e deve ser feita, tanto para discentes quanto para os docentes, porque nem todos os docentes têm condições ideais para a realização do seu trabalho em estado remoto. Mas isso não é suficiente.

Para Eblin, não é só uma questão de garantir o acesso à tecnologia. Precisam ser consideradas as condições reais, materiais e subjetivas da vida de cada um, as condições de estudo dentro de casa, a conciliação com um conjunto de outras tarefas no âmbito da família e da casa, que nem sempre permitem condições para o acompanhamento de uma disciplina regular. O resultado quase certo desse processo será o aprofunda-mento da exclusão na Educação, com altos índices de evasão e trancamento de matrículas e a precarização da qualidade do ensino e aprendizagem.

“Essas universidades que impuseram o ensino remoto desde março, por exemplo, sem nenhum levantamento, sem nenhum debate com a comunida-de acadêmica, fizeram uma opção pela exclusão de importantes segmentos, em especial de discentes. Me parece que esse é um erro profundo, porque essa modalidade, aliada a essa forma de ser conduzida, pode levar a uma das formas mais perversas de exclusão que nós tivemos nos últimos tempos dentro das instituições públicas de ensino”, frisa a secretária-geral do ANDES-SN.

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Matéria Central

Page 12: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/202012

Ela aponta que serão excluídos justa-mente aqueles segmentos que adentra-ram a universidade no último período pelas cotas sociais, e que nem sempre têm as condições materiais e subjetivas para acompanhar o ensino remoto. Com isso, poderá ocorrer um aumento no abandono dos cursos, criando um novo processo de elitização da educação, em especial das universidades públicas.

“E a universidade passa a ser mais um elemento de aprofundamento da desi-gualdade social, na medida em que ela vai permitir com que alguns se formem antes de outros e acessem, antes ou em condições mais desiguais, o mercado de trabalho que, neste momento, está absolutamente em crise”, complementa.

TICOutro elemento importante a ser

considerado na adoção de qualquer proposta remota de ensino são as plataformas tecnológicas utilizadas. Em vez de adotar plataformas públi-cas, desenvolvidas pelas próprias ins-tituições, algumas universidades vêm optando por ferramentas de grandes conglomerados tecnológicos.

Além de permitir a essas empresas o acesso ao conhecimento ali disponibili-zado e a dados pessoais da comunidade acadêmica, essa é mais uma forma de transferência de recursos públicos, que deveriam ser investidos na educação, ciência e tecnologias públicas, para empresas privadas.

“A tecnologia é só um dos aspectos, temos que considerar as questões sub-jetivas também, condições de saúde e outras dimensões da vida. E, ao

considerar as questões tecnológicas, nós temos que levar em conta não só o acesso, mas também a necessidade de democratização das tecnologias da informação. A subordinação aos gran-des conglomerados deve ser combatida por nós”, ressalta.

Saúde docenteRelevante destacar também que esse

processo açodado de implementação do ensino remoto contribui para a intensifica-ção do adoecimento docente. Pois, além da pressão e vigilância impostas que podem se configurar em assédio, o uso constante das tecnologias, com as quais nem todos são familiarizados, amplia as possibilidades de adoecimento físico e mental.

A elevação da carga de trabalho se dá, ainda, em condições subjetivas desfa-voráveis, uma vez que muitas e muitos docentes têm que lidar com o teletra-balho em meio a afazeres domésticos e demandas familiares.

“O ritmo de trabalho tem sido muito intensificado nesse período da pandemia. São muitas reuniões, leituras, estudos, enfim, um conjunto de atividades online que também podem gerar o adoecimen-to dos docentes, como já temos relato. Aliado, obviamente, à essa condição de excepcionalidade que tem deixado a categoria subjetivamente fragilizada. Inclusive, alguns professores têm ado-ecido, ficado em depressão. O que nós deveríamos estar preocupados nesse momento é em preservar a saúde mental também dos docentes e dos técnicos administrativos. E não que o trabalho seja mais um elemento de adoecimento e pressão sobre nós”, afirma Eblin.

AlternativaPara o ANDES-SN, existem alternativas ao

ensino remoto, as quais podem ser pensadas e construídas, em conjunto, pela comuni-dade acadêmica. Algumas instituições vêm realizando seminários, congressos e outros espaços de debate, troca de conhecimento e desenvolvimento da formação sem que essas atividades sejam consideradas obri-gatórias ou parte do calendário acadêmico. Muitas ajudam também a refletir sobre o momento da pandemia nas mais diferentes áreas de conhecimento, sem contribuir para ampliar a desigualdade social.

“Essas são algumas das alternativas. E, se nos dispusermos a pensar juntos, coletivamente, mais propostas podem surgir. O problema é que, hoje, a comu-nidade acadêmica está pressionada entre o desejo dos gestores e o autoritarismo do governo federal e dos governos esta-duais e municipais para a retomada do trabalho remoto sob a ameaça de mais perdas de direitos, inclusive salarial. Então, nessa condição, sob a batuta do medo, da ameaça, da falta de diálogo, é muito difícil construir coletivamente”, analisa a diretora do Sindicato Nacional.

Eblin reforça que é necessário pensar a realidade das instituições nesse mo-mento excepcional de pandemia, mas considerando alguns pressupostos. Primeiro, que por não vivenciarmos um momento de normalidade, não é possível impor um ritmo de normalidade. Para ela, isso apenas favorece aos interes-ses que vêm historicamente tentando desestruturar a educação pública bra-sileira e sucatear os serviços públicos, transformando direitos em mercadoria.

O segundo ponto é que todas as alter-nativas para a comunidade acadêmica têm que ser construídas coletivamente. Nenhuma proposta individual, ou imposta por gestores, ou que não passem por um amplo debate podem ser aceitas pela categoria docente.

“Terceiro, devemos reafirmar que a educação e a universidade públicas que nós defendemos são absolutamente an-tagônicas a qualquer projeto excludente. Nesse sentido, não podem ficar de fora de qualquer possibilidade de ensino, pesquisa e extensão, nesse momento da pandemia, os jovens da periferia, os negros e as negras, os LGBTs, os ribeirinhos, os quilombolas, os povos indígenas, as mulheres e as pessoas com deficiência. Se alguém fica de fora ou se determinados seguimentos ficam de fora, isso rompe a perspectiva de educação que nós defendemos e, portanto, devem ser por nós rejeitado”, conclui.

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Matéria Central

Page 13: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

Em um momento em que combinamos apagão de dados, total ausência de planejamento e inobservância de medidas preventi vas básicas frente

aos desafi os trazidos pelo novo coronavírus, parece difícil lembrar que o Brasil foi exemplo mundial no combate à uma outra pandemia gravíssima, a da AIDS, surgida nos anos 1980. Na ocasião, uma combinação de pesquisas epidemiológicas e ênfase em Educação em Saúde Pública colocou o país no topo da comunidade cientí fi ca, chegando inclusive a quebrar tabus, com a ampla distribuição, e divulgação da importância do uso de camisinhas.

Hoje, a utilização de máscaras, amplamente difundida como eficaz e adotada em diversos locais do mundo, é objeto de polarização ideológica no Brasil. Não há acordo sequer na prescrição ou não de medicamentos, conforme recomendação dos organismos internacionais de saúde.

“O Brasil é hoje um dos piores, senão o pior, país do mundo no enfrentamento da pandemia”, lamenta Lúcia Souto, mestre em Saúde Coletiva, professora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e presidenta do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes). Para ela, esclarecimento e educação são os itens básicos para ultrapassar a grave crise sanitária que atravessamos. “A grande alma de uma crise inédita como essa é a comunicação”, afi rma.

Gilberto Calil, professor de História da Unioeste, destaca que os números ofi ciais expressam apenas uma parcela dos óbitos, deixando de considerar dois outros grupos: o dos que morrem em casa e que mesmo tendo sintomas indicati vos de Covid-19, não são sequer contabilizados; e o dos que morrem em ambiente hospitalar, com sintomas compatí veis aos causados pela Covid-19, mas que não são testados. Neste caso, o óbito é registrado como Síndrome Respiratória Aguda Grave (“não identi fi cada”).

“É muito difí cil esti mar o número de óbitos decorrentes de Covid-19 nesta situação, restando apenas a comparação do número total de óbitos, desconsiderando aqueles por causas externas, como homicídio e acidentes, em relação ao ano anterior”, destaca o professor.

“Além disto, o Ministério da Saúde segue propagando o número de “recuperados” como se fosse um dado positi vo, ignorando as diversas pesquisas que indicam que mesmo entre os sobreviventes há diversas sequelas, que só poderão ser adequadamente avaliadas com o tempo", afi rma.

Para Calil, o número de “recuperados”, além de ser arti fi cialmente infl acionado pelos critérios arbitrários utilizados, só indicaria avanço na contenção da pandemia se fosse superior ao de novos casos, o que não ocorre.

13InformANDES/2020Em defesa do SUS

Embora sem alimentar ilusões, é preciso construir uma unidade de ação para derrotar o projeto deste governo genocida

Revitalizar o SUS para salvar vidas

“Precisamos de dados epidemiológicos confi áveis e localizados, uma vez que vivemos em um país de dimensões conti nentais. A ausência de liderança é catastrófi ca nesse momento. A comunicação diária, clara e objetiva é insubstituível. Ao invés, o Ministério da Saúde oculta informações, o que levou à criação de um colegiado de imprensa paralelo, uma necessidade grotesca”, destaca.

Para Lúcia, a receita para vencer o coronavírus passa por atenção básica, testagem maciça, isolamento social, inclusive recorrendo a hotéis e outros estabelecimentos se necessário e, sobretudo, auxílio financeiro aos mais fragilizados. “São necessárias medidas de proteção social robustas. O Cebes defende postergar ou, de preferência, perenizar a renda universal básica, única forma de amenizar a abissal desigualdade existente no país, exposta ainda mais pela pandemia”, acrescenta.

Informação é o melhor remédioPara combater a doença, seria

de extrema importância saber a prevalência e distribuição de casos de Covid-19 no país. Entretanto, sequer temos informações precisas sobre a quantidade de óbitos causados pelo novo coronavírus.

Page 14: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/2020Luta antirracista

14

Vírus da desigualdade é patologia social estruturante da nossa sociedade

Negros são mais suscetíveis a contrair e a morrer por Covid-19 por diversos fatores que, juntos, apontam para uma

mesma causa: o racismo estrutural decorrente da herança da escravidão. A doença, que chegou ao Brasil na bagagem de turistas da parcela mais abastada da sociedade, começou vi-timando trabalhadores da parcela mais fragilizada da classe: emprega-das domésticas, aqueles na linha de frente do atendimento de enfermagem, trabalhadores de serviços essenciais e os que não foram liberados pelos seus patrões, além dos informais, uma imensa massa de pessoas que têm que trabalhar a cada dia para garantir a refeição cotidiana.

As múltiplas causas da vulnerabili-dade da camada mais pobre, formada majoritariamente pela população negra, têm razões históricas e deixam milhares ainda mais expostos à pandemia do

novo coronavírus. Um dos fatores que aumenta o risco de contrair a doença é a desigualdade no acesso ao siste-ma de saúde, o que contribui para a prevalência de comorbidades, como hipertensão e diabetes. A localização geográfica da moradia dessa parcela da sociedade agrava ainda mais esse quadro: se, por um lado, a distância física de centros de atendimento em saúde é um complicador ao tratamento, a falta de saneamento básico é algo que inviabiliza as medidas de higienização recomendadas - em comunidades que sequer têm acesso à água. Além disso, as pequenas residências com grande número de habitantes, dificulta o dis-tanciamento social e isolamento.

Para Erlando Rêses, 3º tesoureiro do ANDES-SN, a distribuição demográfica nos territórios ilustra bastante bem a relação entre desigualdade social, pan-demia, pobreza e raça negra. Segundo ele, a demarcação do avanço do racis-

mo estrutural fez com que surgissem contingentes populacionais em regiões periféricas. “O fato da população negra ter sido alijada da posse da terra, desde a chamada Lei de Terras no século XIX, fez com que o grupo oriundo de um pro-cesso de mais de 350 anos de escravidão ficasse perambulando, sem terra, sem emprego e sem escolaridade”, explica.

A consequência direta foi a forma-ção de uma população mais suscetível a doenças, acentuando a exclusão social em vários aspectos da sociedade brasileira, refletida no acesso às polí-ticas públicas serviços, como saúde e educação. Segundo os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), a população brasileira é constituída por 46,8% de pardos, 42,7% de brancos, 9,4% de pretos e 1,1% de amarelos e indígenas. Dentro da população negra e parda, a mais numerosa no Brasil, 67% dependem do Sistema Único de Saúde (SUS).

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Enquanto 55% de pretos e pardos morreram por Covid-19, índice ficou em 38% entre pessoas brancas

Page 15: SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE … · 2020-08-06 · mortos e infectados é muito superior ao oficial, dada a subnotificação exis-tente no país. Nesse cenário,

InformANDES/2020 15

Subnotificação de dadosOs números de contaminados, para

Erlando, são ao mesmo tempo assus-tadores e misteriosos. “Temos um presidente que aplica a necropolítica, um genocida, negacionista, além da au-sência do ministro da Saúde, que recusa a divulgação de números atualizados, a ponto de dependermos da formação de um consórcio de mídias para a veiculação de dados corretos”, frisa.

O diretor do Sindicato Nacional destaca, ainda, que quando a doença passa a atingir mais pobres e negros, ao invés dos turistas endinheirados, é o momento em que alguns governantes começam a falar em flexibilização e reabertura do comércio. “Nós enfatiza-mos em alto e bom tom que a vida está acima dos lucros, pedindo que governos sejam mais rigorosos no enfrentamento à pandemia”, afirma.

Levantamentos realizados com o intuito de driblar a imprecisão de informações oficiais apontam para a desigualdade racial na disseminação da doença, como é o caso de um estudo do Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde, da PUC-Rio. O estudo con-firma a morte de um número maior de pretos e pardos por Covid-19 no Brasil do que de brancos.

O Núcleo analisou variáveis demo-gráficas e socioeconômicas em cerca de 30 mil casos de notificações de Covid-19 até 18 de maio, disponibi-lizados pelo Ministério da Saúde. Os resultados mostraram que, enquanto 55% de pretos e pardos morreram víti-mas da doença, o índice ficou em 38% entre pessoas brancas. Outro achado foi que a letalidade varia também conforme o nível de escolaridade, di-minuindo em proporção inversa a esse valor. Pessoas com nível educacional superior morreram três vezes menos (22,5%) do que aquelas com menor escolaridade (71,3%).

Mortes naturais também refletem a desigualdade racial O registro de óbitos reunidos por

cartórios do país mostram que morre-ram, por causas naturais, três vezes mais negros do que brancos durante a pande-mia do que no mesmo período do ano an-terior. Sem o recorte de raça, esse mesmo índice aumentou 13%, segundo dados do Portal da Transparência da Arpen Brasil (Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais), que reúne os registros feitos pelos cartórios brasileiros.

A alta na mortalidade atinge raças de maneira diferente, com um cresci-

mento 3,4 vezes maior entre pretos e pardos do que entre brancos. Excluídas mortes por violência ou acidentais, 9,3% mais brancos perderam a vida entre 16 de março e 30 de junho de 2020, em relação ao mesmo período de 2019. Já entre os pretos, a alta foi de 31,1%, entre os pardos, 31,4% e entre a população indígena, 13,2%.

Os dados mostram, ainda, que os óbitos causados por doenças respirató-rias no Brasil, que além da Covid-19, in-cluem insuficiência respiratória, pneu-monia, septicemia e SRAG (Síndrome Respiratória Grave) cresceram 34,5% durante o período da pandemia. Entre pardos esse aumento alcançou 72,8%; seguido por pretos (70,2%) e indígenas (45,5%); entre os brancos foi de 24,5%.

Os dados apontam que um dos ele-mentos fundamentais para ultrapassar a grave crise sanitária, política e social que o país enfrenta, é o reconheci-mento do racismo como estrutural. O diretor do Sindicato Nacional destaca que é preciso colocar o enfrentamento ao racismo no centro do combate às desigualdades e no acesso à saúde pú-blica, além de ampliar o investimento no SUS. “A mortalidade brasileira tem seletividade e escancara a segregação social e racial”, conclui Erlando Rêses.

Foto

: Shu

tter

stoc

k

Luta antirracista