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Soberania, DH e Migrações Internacionais

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Texto sobre migração

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  • No dia 28 de agosto de 2001, um navio car-gueiro, denominado Tampa, de bandeira norue-guesa resgatou 438 pessoas que estavam numbarco indonsio deriva em alto-mar. A maioriadessas pessoas vinha do Afeganisto, mas tambmhavia passageiros do Sri Lanka e do Paquisto,todos tentando chegar Austrlia. A imprensadividiu-se entre falar de um navio cheio de refu-giados ou de um navio cheio de imigrantes ile-gais. A Austrlia recusou-se a receb-lo, e afirmouque a carga do Tampa era responsabilidade daIndonsia ou da Noruega. A Indonsia ameaoumandar o exrcito ao porto para impedir os refu-giados de desembarcarem, mas depois voltouatrs, aceitando receb-los. Os passageiros, porsua vez, recusaram-se a voltar e resolveram fazergreve de fome. Durante uma semana, o navio

    Tampa permaneceu no mar, vigiado pela marinhaaustraliana e impedido de atracar em qualquerlugar do mundo.

    A situao desse navio serve como umametfora da questo da imigrao atualmente,refletindo, na figura de um navio impedido deatracar, a situao de milhes de pessoas ao redordo mundo. Os dilemas e os questionamentos quevieram tona durante as negociaes sobre odestino dos passageiros do Tampa sintetizam, decerta forma, uma srie de problemas gerais rela-cionados aos aspectos polticos das migraesinternacionais hoje. Em uma s questo: Afinal, oque impede um indivduo de viajar para o exteri-or ou viver em um determinado pas?

    Levando em considerao de que cada vezmais fcil, tanto em termos de custo como de tec-nologia de transporte, se deslocar de um pontoao outro do planeta, e tendo em mente que asoportunidades econmicas so to desigualmente

    SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS EMIGRAES INTERNACIONAIS

    Rossana Rocha Reis

    Artigo recebido em julho/2003Aprovado em maro/2004

    RBCS Vol. 19 n. 55 junho/2004

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    distribudas em termos geogrficos, por que,ento, as pessoas no podem simplesmente sairde um lugar e ir para outro em busca de uma vidamelhor?

    Imigrao e Estado

    A resposta mais simples para essa questo a constatao imediata de que o mundo dividi-do em Estados, e Estados so associaes que,entre outras caractersticas, possuem o monopliode legitimidade da mobilidade, isto :

    [] os Estados modernos e o sistema interna-cional de Estados do qual eles so parte expro-priaram do indivduo e das entidades privadas,particularmente, mas de maneira nenhuma exclu-sivamente, os meios legtimos de movimentosatravs das fronteiras internacionais (Torpey,2000, p. 4).

    Nenhuma pessoa hoje pode cruzar a fron-teira de nenhum pas sem estar munida de umpassaporte, e muitas vezes tambm de um visto,a no ser nos casos em que haja acordos entre ospases como, por exemplo, entre os pases mem-bros da Unio Europia. Assim, os passageiros doTampa no poderiam desembarcar na Austrliasem a concordncia desse pas. O monoplio delegitimidade da mobilidade considerado um dosfundamentos da soberania do Estado.1

    Protestos podem ser feitos, e ocorreramnesse caso dentro e fora da Austrlia, mas, em lti-ma instncia, no existe nenhuma organizaosuperior ao Estado neste aspecto especfico quepossa obrig-lo a aceitar quem quer que seja emseu territrio. A autonomia do Estado no campodas migraes uma das principais caractersticasdo direito internacional tradicional. Dentro desseparadigma, o indivduo um no-sujeito, isto ,no existe. Internacionalmente, so os Estadosque se relacionam entre si, ou seja, no h umarelao entre indivduos de uma determinadanacionalidade e Estados de outra. Quando porventura ocorre um conflito nesses termos, porexemplo, se um determinado Estado ofende dealguma forma um cidado de outro Estado, aquesto passa a ser tratada na esfera governamen-

    tal, assume a forma de uma ofensa de um Estadoao outro, e s pode ser discutida e resolvida entreeles (Lilich, 1984).

    A caracterstica fundamental que distingueas migraes internacionais de outros tipos demigrao , portanto, que elas implicam umamudana do indivduo entre duas entidades, entredois sistemas polticos diferentes. Nesse sentido,pode-se afirmar que as migraes internacionaisso no apenas um fenmeno social, mas tam-bm inerentemente poltico, que advm da orga-nizao do mundo num conjunto de Estadossoberanos mutuamente exclusivos, comumentechamado de sistema westphaliano (Zolberg,1999, p. 81).

    Reconhecer a importncia do Estado nas mi-graes internacionais no significa afirmar queele necessariamente o fator mais relevante naformao e na manuteno dos fluxos. As migra-es internacionais no so causadas exclusiva ouprincipalmente pela ao do Estado. No entanto,ele, por meio de polticas de imigrao e cidada-nia, um importante fator explicativo no proces-so de formao dos fluxos e ajuda a moldar aforma que esses fluxos adquirem.

    Se, no caso do navio Tampa, a Austrliadecidiu que no aceitaria os passageiros, o naviodeveria, ento, voltar Indonsia, de onde elestinham partido. No entanto, valendo-se do mes-mo princpio de soberania, este pas tambm de-cidiu, num primeiro momento, no receb-los. Ospassageiros, por sua vez, no queriam voltar aseus pases de origem, e mesmo quando a In-donsia se disps a receb-los, recusaram a ofer-ta. Eles alegavam estar em busca de asilo poltico,e, nesse caso, as normas internacionais deter-minam que, antes de qualquer ao, deve ser jul-gada a pertinncia do requerimento. Ao obrig-los a voltar, a Austrlia estaria, portanto, violandoo artigo 33 da Conveno de Genebra, a chama-da norma de non-refoulement, presente tambmno protocolo de Nova York, a qual regulamenta aquesto dos refugiados em termos do direitointernacional.

    A Conveno de Genebra e o protocolo deNova York representam um constrangimentopara a autonomia decisria do Estado no que diz

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    respeito ao controle de suas fronteiras, e por issono se inserem na lgica do direito internacionaltradicional, que garante a soberania nacional nocontrole dos movimentos migratrios.

    A Conveno Relativa ao Status de Refugiadofoi assinada em 1951, na cidade de Genebra, etinha um mbito bastante limitado e preciso, qualseja, a situao das pessoas deslocadas pelosregimes totalitrios da Europa nos anos de 1930 epela Segunda Guerra Mundial. Em 1954, surgiu aConveno Relativa aos Aptridas, que tambm sereferia basicamente a situaes do ps-guerra. Noentanto, com a persistncia dos conflitos armadose das ditaduras nos anos subseqentes, essesmecanismos foram sendo estendidos e aperfeioa-dos para dar conta das novas situaes. Em 1961,foi assinada a Conveno de Preveno daFormao de Aptridas, e, em 1967, o Protocolo deRefugiados, em Nova York, o qual estendeu o con-ceito de refugiados para outros tipos de situao.

    A Conveno de Genebra prev, entre ou-tras coisas, que os Estados signatrios tm obri-gao de analisar os pedidos de asilo e de con-ceder aos refugiados o mesmo tratamento de queusufruem os cidados do pas no que concerne educao, sade e s condies de emprego.Alm disso, deve-se garantir que no haja dis-criminao e que no sejam penalizados mesmoos candidatos a asilo que entrarem em um passem autorizao. A partir do Protocolo de NovaYork, a Conveno de Genebra passou a ser apli-cada tambm para casos no diretamente rela-cionados aos eventos anteriores a 1951.

    A Conveno sobre os Aptridas de 1954afirma basicamente que os indivduos no con-siderados cidados nacionais por nenhum pasdevem ter seus direitos garantidos pelo Estado noqual residem, o qual deve tambm ser respons-vel pela emisso de documentos de identidade,alm de facilitar o processo de naturalizao. AConveno de 1961 trata da preveno da for-mao de aptridas, comprometendo os Estadossignatrios a concederem a nacionalidade a pes-soas que nasceram em seu territrio ou aquelesnascidos em outro territrio, cujos pais sejamnacionais desse Estado, e que, de outra forma,se tornariam aptridas; e tambm a no punirem

    com a perda da nacionalidade os casos de mu-dana de status, como casamento, divrcio, ado-o ou aquisio de outra nacionalidade.

    A legislao referente ao problema dos refu-giados e aptridas, mesmo expandida e aperfeioa-da, continua a se basear numa lgica de exceo,sem questionar os fundamentos do paradigmawestphaliano. Em respeito sua soberania, ne-nhum Estado obrigado a acolher os refugiados,apenas so proibidos de mand-los de volta aospases acusados de perseguio (princpio de non-refoulement). Tambm no existe nenhum organis-mo supranacional capaz de controlar ou de pu-nir os Estados que infringirem a lei (Bhabha, 1998;Mbaya, 1998).

    No mbito geral dos direitos humanos, ape-sar de suas limitaes, as convenes relativas aosrefugiados e aptridas representam um ponto deinflexo no direito internacional, pois pela pri-meira vez reconhecida a existncia do indivduono cenrio internacional. Lentamente, direitosindividuais universais independentes do Estadovo sendo reconhecidos, numa tendncia quevinha se acentuando desde o fim da SegundaGuerra Mundial.

    De fato, antes disso, a criao da Liga dasNaes, da Organizao Internacional do Trabalhoe a existncia de um direito internacional de guer-ra j revelavam uma preocupao internacionalcom o indivduo. Mas somente aps a SegundaGuerra Mundial que comea a ser criado umregime internacional de direitos humanos, a partirda instaurao do Tribunal de Nuremberg, entre1945 e 1946, para julgar os criminosos de guerra,e da adoo da Declarao Universal dos DiretosHumanos em 1948 pela ONU.

    No mbito da imigrao propriamente dito,cabe destacar que a Declarao garante aos indiv-duos, no artigo 15, o direito a ter direitos, isto , odireito a ter uma nacionalidade, de no perd-la ede poder trocar de nacionalidade; no artigo 14, odireito de procurar asilo em casos de perseguio;e no artigo 13, pargrafo 2, o direito de sair, isto ,deixar seu pas de origem, e de voltar quando tivervontade. Os avanos nesse sentido no represen-tam, entretanto, uma ruptura com o paradigmaanterior. A autonomia decisria do Estado a respei-

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    to de quem pode entrar ou residir em seu territriopermanece assegurada. O mesmo artigo 13, emseu pargrafo 1, deixa claro que a liberdade demovimento e de residncia limitada ao interiordas fronteiras de cada Estado. No existe nadacomo um direito de entrar que possa serequiparado ao direito de sair. O artigo 14 garante vtima de perseguio [] o direito de procurare de gozar asilo em outros pases, contudo ne-nhum pas obrigado a aceit-la.

    A Declarao dos Direitos Humanos, em suainterpretao mais tradicional, serviria para regularapenas a relao entre os Estados e seus cidados.Entretanto, com o reconhecimento cada vez maiordo indivduo no campo internacional, e com oaumento do nmero de imigrantes no mundo,tornou-se cada vez mais freqente sua utilizaocomo um parmetro para regular as relaes entreos Estados receptores e os imigrantes. Por exem-plo, o artigo 16, pargrafo 3, afirma que a famlia o ncleo natural e fundamental da sociedade etem o direito proteo da sociedade e doEstado. Uma interpretao mais liberal desse arti-go d margem a uma poltica de imigrao quepreveja a concesso de vistos para membrosestrangeiros de famlias de nacionais ou de imi-grantes legais, mesmo quando no for do inte-resse do Estado receber mais imigrantes.Contudo, a maior parte dos pases receptores,mesmo aqueles que mantm uma poltica dereunificao familiar, reluta em aceitar esse tipode interpretao e em reconhecer a existncia for-mal desse direito. Alm disso, persiste a questode determinar quais pessoas pertencem famlia,isto , que tipo de laos familiares justificam aincluso do indivduo num programa de reunifi-cao familiar.

    Diante de situaes como essa, formou-se aconscincia de que a Declarao dos DireitosHumanos no era suficiente para lidar com pro-blemas que ocorrem na relao dos Estados comindivduos estrangeiros. O primeiro organismointernacional a produzir uma legislao especficasobre o assunto foi a Organizao Internacionaldo Trabalho (OIT). Em 1949, a OIT produziu aConveno de Imigrao para o Trabalho (n. 97)e, em 1975, a Conveno dos Trabalhadores

    Imigrantes (n. 143). Essas duas convenesrecomendavam um esforo dos Estados no senti-do de divulgar informaes que pudessem facili-tar o processo de imigrao e procuravam garan-tir que os imigrantes recebessem o mesmotratamento e tivessem os mesmos direitos que ostrabalhadores nacionais, independentemente denacionalidade, raa, religio ou sexo. A segundaincluiu artigos relacionados questo da imi-grao ilegal e do trfico de pessoas, alm daincluso de pargrafos relativos a direitos cultur-ais. No entanto, ambas tm uma baixa taxa deratificao, sobretudo a segunda (41 pases rati-ficaram a primeira, e somente 18, a segunda). Nosdois casos, pases como a Austrlia, os EstadosUnidos e a Frana, grandes receptores de imi-grantes, esto ausentes. Ainda assim, a situaodos imigrantes tem atrado cada vez mais aateno dos organismos internacionais. Desdemeados da dcada de 1970, em diversas ocasies,e por meio de diferentes rgos, a ONU tem semanifestado pela necessidade de uma maior regu-lamentao internacional sobre o assunto.

    Em 1990, a ONU aprovou, em AssembliaGeral, a Conveno sobre Direitos dos Imigrantes(18/12/1990), a qual exige no s o mesmo trata-mento no mbito do trabalho para cidadosnacionais e imigrantes legais, mas tambm queestes sejam informados de seus direitos numa ln-gua compreensvel para eles, que tenham direitode recorrer ao judicirio em caso de deportao;ademais, estabelece regras para o recrutamento deestrangeiros. Essa conveno conseguiu o nmeromnimo de ratificaes em 14 de maro de 2003, epassou a vigorar em 1 de julho desse ano. Porm,os principais pases receptores no a assinaram.

    Alm das convenes internacionais, exis-tem tambm convenes regionais e tratadosbilaterais que regulamentam situaes especficas.A Organizao dos Estados Africanos tm con-venes prprias para a situao dos refugiados,assim como os pases do Oriente Mdio, a Orga-nizao dos Estados Americanos, o Conselho daEuropa e a Unio Europia. Esta, de fato, possuio nico mecanismo internacional de carter vin-culante, a saber, a Declarao Europia de Direi-tos Humanos. Alm disso, os pases membros

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    esto trabalhando na adoo de uma poltica deimigrao comum, o que discutiremos com maisateno adiante.

    A importncia cada vez maior das migraesinternacionais no cenrio internacional tambmpode ser medida tanto pela proliferao de reu-nies onde esse assunto se tornou tema principal(Seminrio Internacional sobre o Dilogo Culturalentre Pases de Origem e Destino de Trabalhado-res Imigrantes, 1989), como pelo papel de desta-que que o tema adquiriu em conferncias maisamplas, como as relacionadas populao, ao tra-balho e ao combate ao racismo (ConfernciaMundial de Direitos Humanos, parte 2, pargrafos33-35; Conferncia Internacional em Populao eDesenvolvimento, captulo 10; Cpula Mundial deDesenvolvimento Social, cap. 3 e 4; e IV Confern-cia Internacional da Mulher, cap. IV. D).

    Alm da questo dos refugiados e dos pro-blemas que envolvem a reunificao familiar, umdos principais pontos no debate entre a soberaniado Estado e os direitos individuais no campo dasmigraes internacionais concerne ao tratamentodado aos imigrantes indocumentados. Existe mui-ta controvrsia sobre quais so as obrigaes dosEstados para com os indivduos que se encontramem situao irregular dentro de seu territrio. Emtermos mais abstratos, trata-se de saber quais soos direitos individuais que devem ser garantidosmesmo aos indivduos que esto fora da lei.Muitos Estados temem que uma poltica que con-ceda muitos direitos aos indocumentados possaservir como um estmulo para que mais pessoasmigrem de forma ilegal. As convenes interna-cionais tm recomendado que os Estados ajam,sobretudo, no sentido de coibir o emprego de ile-gais e as redes internacionais de trfico de pes-soas,2 e no os imigrantes ilegais em si. Apesardisso a imigrao ilegal vem sendo cada vez maiscriminalizada na legislao domstica dos pasesreceptores, com conseqncias nefastas para todosos imigrantes.

    Especificamente no caso do atual movimen-to de emigrao brasileiro, a questo dos indocu-mentados de particular importncia e j comeaa preocupar setores do governo brasileiro, poisgrande parte dos emigrantes brasileiros no exteri-

    or est em situao ilegal (1/3 do total de emi-grantes segundo estimativas do Itamaraty). A fragi-lidade da situao legal desses imigrantes torna-osalvos fceis do desrespeito aos direitos humanos.Nesse sentido, de fundamental importncia oenvolvimento do Estado de origem na questo.

    Recentemente, o Estado brasileiro tem assu-mido uma posio mais ativa em relao situaodos imigrantes ilegais brasileiros. Em 2003, o presi-dente do Brasil, em viagem a Portugal, incluiu naagenda das conversaes uma discusso sobre asituao dos imigrantes ilegais brasileiros no pas.Estima-se que a populao de brasileiros ilegais emPortugal seja de 15.000 a 25.000 pessoas, e que1.800 brasileiros j tenham sido deportados desdeque a ltima reforma nas leis de imigrao por-tuguesa entrou em vigor em novembro de 2001(Folha de S. Paulo, 09/07/2003). Em 11 de julhodesse ano, os dois pases assinaram um acordopara facilitar a regularizao dessa populao. Noentanto, segundo a Casa do Brasil, entidade for-mada por emigrantes brasileiros em Portugal, dos10.793 brasileiros que se apresentaram para oprocesso de regularizao, apenas 562 con-seguiram o visto de trabalho (at o final de feverei-ro de 2004).

    A participao do Estado brasileiro tambmfoi importante na obteno de um acordo para adeportao de centenas de brasileiros que estavampresos nos Estados Unidos, sob a acusao de imi-grao ilegal. Uma comisso parlamentar negocioucom o governo dos Estados Unidos os termos doacordo, com vistas a garantir, nas palavras do de-putado Joo Magno (PT-MG), que os repatriadossero tratados como cidados e no como bandi-dos, no viro algemados ou acorrentados, nemcom roupas de prisioneiros.3 A Operao De-sembarque, como foi chamada, mobilizou aproxi-madamente duzentas pessoas, entre policiais civis,militares e federais, agentes da Defesa Civil, Minis-trio Pblico Federal, Itamaraty e Ministrio da Jus-tia, mas as despesas com a viagem foramcusteadas pelo governo dos Estados Unidos (Folhade S. Paulo, 29/1/2004).

    Alm dos dois casos mencionados, h rela-tos de que brasileiros ilegais enfrentam problemasno Paraguai (segunda maior populao de

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    brasileiros no exterior, estimada entre 350 e 400mil), na Inglaterra, na Guiana Francesa, entre ou-tros pases.

    O problema dos indocumentados est nocentro de vrias polmicas entre pases receptorese emissores. No incio dos anos de 1980, nosEstados Unidos, um dos mais importantes acon-tecimentos nessa rea envolveu a polmicaaprovao, num plebiscito na Califrnia, de umamedida que pretendia excluir do ensino pblicoos filhos de imigrantes ilegais. A proposio 187,como ficou conhecida, foi revogada na SupremaCorte, que considerou no apenas que a educao um direito inalienvel de todo ser humano, mastambm que as crianas no deveriam ser punidaspelos crimes de seus responsveis.

    O estudo da evoluo do regime internacionalde direitos humanos mostra que crescente oreconhecimento do indivduo como portador dedireitos independentes de sua nacionalidade, mas,ao mesmo tempo, revela que a implementaodesses direitos continua basicamente dependentedos Estados, no caso especfico das migraes inter-nacionais, dos Estados receptores. Em relaoquele navio noruegus na costa da Austrlia, porexemplo, no havia nem mesmo um consenso sobrequal era o pas responsvel por fazer valer a lei. AAustrlia insistia no fato de que se tratava de umproblema da Noruega ou da Indonsia (bandeira dosnavios). No entanto, a Conveno de Genebra prevque, em situao de perigo, os imigrantes devem serlevados para o porto mais prximo. Como os imi-grantes foram resgatados prximos do mar daAustrlia, as presses internacionais recaram sobreeste pas. O secretrio geral da ONU, Kofi Annan,afirmou que isto no maneira de lidar com umasituao envolvendo refugiados (New York Times,30/8/2001); Mary Robinson, alta comissria dasNaes Unidas para Direitos Humanos, foi maisenftica: muito lamentvel o fato de um pas comuma grande reputao como a Austrlia seja incapazde estender a mo, nos termos apropriados, esegundo as prticas estabelecidas, a essas pessoas(Le Monde, 31/8/2001). Depois de uma semana queos refugiados estavam no mar, a Austrlia resolveucolaborar para a soluo do caso. Os candidatos arefugiados foram transferidos para um barco da

    marinha australiana, o HMAS Manoora, e levadospara Nova Zelndia, Papua-Nova Guin e Nauru(pas localizado em uma pequena ilha do Pacfico),onde funcionrios da ONU conduziriam entrevistaspara decidir seu status, e depois encaminh-los paraum pas receptor, tendo a Austrlia se comprometi-do a receber alguns deles.

    A situao do Tampa pe em evidncia, deforma muito clara, a tenso entre o respeito aosdireitos individuais e a soberania do Estado, umdos aspectos mais importantes das polticas deimigrao. No entanto, na mesma situao dospassageiros desse navio existem milhes de pes-soas4 no mundo candidatos reunificao fami-liar, imigrantes ilegais e at mesmo pessoas quenasceram e sempre viveram num mesmo pas,mas ainda assim so consideradas imigrantes,como o caso de muitos pases cuja base da ci-dadania o jus sanguini.5

    Imigrao, cidadania e nacionalidade

    Alm de deterem o monoplio sobre amobilidade, os Estados tambm detm o controlesobre a prpria identidade do indivduo, suanacionalidade. Se os indivduos nascessem e mor-ressem todos no interior de um mesmo Estado, adefinio de sua nacionalidade talvez fossemenos problemtica. De fato, a nacionalidade quase sempre atribuda ao indivduo, indepen-dentemente de sua vontade. Ele pode at decidirdeixar o territrio de seu pas, se encontrar algumoutro pas disposto a receb-lo, mas dificilmentepode renunciar sua nacionalidade. A imigrao,uma vez que subverte a relao povo/Estado/ter-ritrio obriga o Estado a formalizar, por meio depolticas de imigrao e cidadania, as regras deacesso ao territrio e nacionalidade.

    O acesso nacionalidade importante namedida em que a prpria legitimidade da ordemmundial ps-Westphalia dada pelo chamadoprincpio de autodeterminao nacional, que

    [] estabelece que a um povo deve ser oferecidaa possibilidade de conduzir livremente a sua vidapoltica, econmica e cultural segundo princpios

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    democrticos. A conduo livre de sua vida po-ltica demanda, em primeiro lugar, que o poderpoltico esteja sob o controle daquele povo e quetal controle seja exercido sob bases igualitrias edemocrticas (a chamada autodeterminao inter-na, equivalente democracia) e, em segundolugar, que o controle seja exercido livre da inde-pendncia de terceiros (a autodeterminaoexterna equivalente independncia) (Ikeda,2001, p. 75).

    O maior problema em relao utilizaodo princpio de autodeterminao nacional comouma forma de definir unidades polticas que,em ltima instncia, no existe nada dentro doslimites da frmula de autodeterminao que sirvacomo uma guia na definio ou concretizao doque seja esse auto (Whelan, 1994, p. 103). Esseproblema acaba por ser resolvido caso a caso, ouseja, cada entidade poltica que visa a se auto-organizar como Estado buscar afirmar sua singu-laridade, sua prpria verso do que seja umanao, de modo a justificar sua existncia comouma entidade poltica independente (Hobsbawn eRanger, 1984; Hobsbawn, 1990).

    Apesar de as solues serem individuais, deum modo geral os defensores do princpio deautodeterminao nacional conferem uma cono-tao tnica ao conceito de nao, pretendendocom isso estabelecer entidades polticas sobera-nas as mais etnicamente homogneas possveis.Ainda que essa homogeneizao no seja com-pleta, o nus da prova ir sempre ficar comaqueles que propem um desvio do princpio deautodeterminao nacional, o qual permanece co-mo a pedra fundamental do sistema de Versailles(Keylor, 1995, p. 3).

    A ligao entre Estado e nao, construdana modernidade, assim como o princpio deautodeterminao interna, implica na formaode um lao entre nacionalidade e cidadania, isto, medida que o Estado-nao generalizadocomo a forma de organizar politicamente o mun-do, a cidadania passa a ser atribuda em funoda nacionalidade. Entre outras coisas, isso signifi-ca que o acesso aos direitos de cidadania estcondicionado posse da nacionalidade.

    A definio de nacionalidade to compli-

    cada quanto a definio de nao. No existemcritrios lgicos ou naturais para decidir sobrea composio da nacionalidade. De um modogeral, h duas tradies para estabelecer tais cri-trios uma baseada no contrato poltico, outra,na cultura. Essas tradies so tambm conheci-das como a francesa e a alem, respectivamente,por serem historicamente identificveis com essesdois pases, embora nenhum deles tenha polticasque correspondam exatamente ao paradigma aoqual emprestam o nome. A nacionalidade seriauma escolha no ponto de vista francs, e, do pon-to de vista alem, um destino. Segundo a tradiorepublicana francesa, a nacionalidade baseia-sena adeso voluntria do indivduo nao. Aconstituio de 1791 atribui a cidadania francesaa todos que

    [] so nascidos na Frana de um pai francs,nascidos na Frana de um pai estrangeiro e quefixaram residncia no pas, vieram a se estabele-cer na Frana e prestaram o juramento civil,nascidos de um pai estrangeiro, descendentes deum francs ou francesa expatriados por motivosreligiosos, desejam se estabelecer na Frana eprestam o juramento cvico.

    Nesse caso, a idia de cidadania absorve aidia de nacionalidade. O ideal revolucionrio dacidadania como ato voluntrio no apenas influ-enciou todas as legislaes francesas que seseguiram, mas tambm serviu de inspirao paraoutros cdigos de nacionalidade pelo mundo,embora nenhum pas, nem mesmo a Frana,tenha retomado fielmente essa proposio(Bernard, 1993).

    A tradio alem, originada no perodoromntico, repousa numa concepo tnica e cul-tural do povo, e considera como nacionais apenasas pessoas que pertencem cultura dominante dopas, cultura essa transmitida pelo sangue. A nao,nesse caso, seria uma espcie de comunidade desangue e de idioma. Alguns dos principais tericosdessa corrente, como Herder, desenvolveram suasidias em clara oposio aos ideais iluministas queinspiraram a Revoluo Francesa. Sua principal cr-tica a essas idias, e, especificamente ao pensa-mento de Rousseau, era a de que ele se baseava

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    num conceito abstrato de humanidade, o qual noencontrava eco na realidade humana (Herder,1995). A essa abstrao, Herder opunha o conceitode enraizamento, a idia de que as pessoas estoinseridas em culturas, das quais so indissociveis,e que as culturas tm razes profundas e marcamdiferenas de fato entre os indivduos. Isso, segun-do a concepo alem, desconsiderado por fil-sofos como Rousseau, quando pregam a igualdadeentre todos os homens.

    Em consonncia com esse conceito de cul-tura, a Alemanha desenvolveu uma poltica denacionalidade que, at pouco tempo atrs, reco-nhecia somente o direito de sangue, pois a cul-tura seria transmitida pela famlia. Essa posturacausou alguns problemas ao Estado alemo,sobretudo depois da queda do muro de Berlim,pois muitos habitantes da Europa do Leste tinhamascendncia alem e, portanto, direito naciona-lidade alem, mesmo que no tivessem mais ne-nhum lao com o pas. Por outro lado, os descen-dentes de turcos estabelecidos na Alemanha htrs geraes dificilmente conseguiam ter acesso nacionalidade alem, formando um enclave depessoas que habitavam o pas, viviam comoalemes, mas no tinham os mesmos direitos queeles. A partir de 2000, uma reforma no cdigo denacionalidade alem reconheceu a possibilidadedo jus soli, ou seja, a atribuio da nacionalidadebaseada no local de nascimento, ainda que deforma bastante restritiva.

    A atribuio da nacionalidade como um atode vontade (adeso poltica ou escolha de localpara viver) ou como um pertencimento tnico ecultural est presente em todos os Estados mo-dernos. Isso nem sempre se apresenta de formaclara; muitas vezes ambas as tradies aparecemcombinadas e, freqentemente, as diversas com-binaes de jus soli e jus sanguini se sucedem notempo no interior de um mesmo Estado. Antes dadcada de 1980, porm, a questo de identificar aparcela da populao que teria direito naciona-lidade no foi, de um modo geral, um problemagrave para os Estados. Contudo, o aumento daimigrao e a fixao dos estrangeiros no ter-ritrio, que vinha ocorrendo desde a dcada de1970, geraram a necessidade de repensar as polti-

    cas de nacionalidade e de imigrao. Desdeento, os principais pases receptores de imigran-tes vm, sistematicamente, alterando suas polti-cas nessa rea.

    As polticas de nacionalidade e imigraoesto intimamente ligadas. Antes de qualquercoisa, para se definir quem o imigrante, pre-ciso se definir quem o nacional. Alm disso, oEstado tem de definir se deseja ou no que o imi-grante se torne um cidado nacional, e qual tipode imigrante estaria nessa situao, e, ainda, quaisseriam os critrios adequados para esse processo.

    Diferentes concepes de nao favorecemdiferentes polticas de nacionalidade/cidadania, etambm de imigrao. As polticas de imigrao,sejam elas mais abertas ou mais fechadas, podemprivilegiar determinado tipo de indivduo ou deter-minada nao, em funo dessa concepo denacionalidade. Por exemplo, no caso do Estado deIsrael, que se autodefine como um Estado judeu,os judeus de qualquer parte do mundo tm direito imigrao, direito este negado a outras etnias. Nocaso das ex-metrpoles coloniais europias,durante muito tempo os ex-colonos tiveram liber-dade de circulao no territrio das antigasmetrpoles, que os entendiam como j tendo feitoparte do Estado-nao. Nos Estados Unidos, no in-cio do sculo XX, a idia do pas como uma naode brancos protestantes teve um papel importantena definio da poltica de quotas para imigrao.Enfim, os exemplos so os mais variados.

    A forma pela qual essas polticas se modifi-cam ao longo da histria revela como o prprioauto-entendimento do Estado nacional se trans-forma. Isso no equivale a dizer que essas polti-cas sejam uma simples transposio de idiasabstratas de nacionalidade para a realidade. Defato, as polticas de migrao e nacionalidaderefletem interesses econmicos, demogrficos econjunturas polticas. Contudo, por suas prpriasnaturezas, elas obrigam os atores sociais envolvi-dos nas suas produes a se expressarem em ter-mos de um discurso de nacionalidade, a tentaremresponder questo quem ns somos, ouquem ns queremos ser, e, nesse sentido, elasacabam sendo um reflexo interessante da formacomo a imagem da nao construda.

  • SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS E MIGRAES 157

    Retomando a idia de que a cidadania, namodernidade, est ligada nacionalidade, os direi-tos de cidadania esto, portanto, subordinados posse da nacionalidade. O Estado tem de definirquais so os direitos exclusivos dos cidados, e deque forma uma pessoa pode ter acesso a eles. Nadefinio de suas fronteiras externas e internas,6 osEstados tm de lidar com questes como: Que tipode indivduo pode entrar ou no em seu territrio,e por qu? Entre os que entram, quais podem setornar permanentes e quais no podem? Dos quese tornam permanentes, quais podem se tornarcidados, e quais no podem?

    Cidadania ps-nacional?

    Recentemente, uma srie de estudos apontapara uma modificao nas relaes entre naciona-lidade/cidadania e soberania/imigrao. O fortale-cimento de um regime internacional de direitoshumanos, segundo essas novas pesquisas, temobrigado os Estados a redefinirem suas fronteiras,tanto a interna como a externa, em funo da uni-versalidade dos direitos individuais. Esse processopossuiria duas caractersticas: de um lado, os Es-tados estariam vendo sua soberania enfraquecidafrente ao indivduo, de outro, os laos que ligamos direitos de cidadania nacionalidade estariamse tornando mais fracos. Isso significa, entre outrascoisas, que o Estado no seria mais capaz dedefinir, em funo de seus prprios interesses,quem pode ou no entrar e se estabelecer em seuterritrio, e, ainda, que cada vez mais os direitosso atribudos em nome da dignidade inerente dapessoa humana, e no da sua nacionalidade, demodo que a prpria distino entre nacional e nonacional estaria perdendo sua importncia.

    A criao de um regime internacional dedireitos humanos estaria, pois, levando a umaperda de autonomia do Estado na tarefa de de-cidir sobre questes referentes ao direito de entra-da, ao tipo de diferenciao entre nacionais eestrangeiros dentro de seu territrio, ao direito deresidncia permanente e aos critrios de naciona-lizao. Diante deste quadro de transferncia dedireitos do cidado para o indivduo, alguns

    autores consideram que o Estado est perdendo ocontrole de suas fronteiras e que estaria surgindouma espcie de cidadania ps-nacional outransnacional.

    Quanto perda de controle sobre as fron-teiras, diz-se que o Estado tem sido cada vez maisconstrangido a aceitar uma imigrao indesejada,definida por Jopke como aquela que

    [] no ativamente solicitada pelos Estados,como a imigrao legal por quotas, caractersticadas clssicas naes de povoamento. Ao con-trrio, ela aceita passivamente pelo Estado, sejapor razes humanitrias e em reconhecimentodos direitos individuais, como de buscar asilo ede reunificao familiar de trabalhadores imi-grantes, seja pela total incapacidade dos Estadosde manter os imigrantes fora, como na imigraoilegal (1997, p. 266).

    Segundo essa linha de argumentao, a in-fluncia crescente e decisiva dos direitos humanosno campo das polticas de migrao levou a umagrande expanso de sobretudo trs tipos de imi-grao: reunificao familiar, refugiados e ilegais.

    As polticas de reunificao familiar assen-tam-se na idia, presente em diferentes artigos daslegislaes internacionais, que tratam do direito detodo ser humano de levar uma vida familiar nor-mal; as polticas para refugiados, se assentam naidia de que todo homem tem o direito de fugirquando sua vida est sendo ameaada direitoreconhecido por diversos artigos e convenesinternacionais j citadas; e a imigrao ilegal resul-taria em grande medida da incapacidade de oEstado impor sanes contra esse tipo de imi-grao, tambm em virtude do reconhecimentodos direitos individuais dos imigrantes ilegais.

    A crescente influncia dos direitos humanosteria gerado tambm o que Gary Freeman (1992)chama de norma antipopulista, segundo a qualas elites polticas dos Estados liberais no poderiamapresentar, por conta do idioma universalista doliberalismo, o problema da composio tnica eracial dos fluxos migratrios. Assim, os atoressociais e polticos estariam sendo forados a seenquadrar ao novo paradigma.

    Analisando o caso especfico dos Estados

  • 158 REVISTA BRASILEIRA DE CINCIAS SOCIAIS - VOL. 19 N. 55

    Unidos, Debra DeLaet desenvolve um argumentoprximo ao de Freeman. Segundo a autora,

    [] enquanto na primeira metade do sculo XX apoltica de imigrao americana era moldada poruma ampla aceitao de distines raciais, desde1960 o apoio cada vez maior aos direitos civis,somado oposio crescente discriminaoracial, estabeleceu o fundamento para a libera-lizao da poltica imigratria dos EstadosUnidos. Assim, as polticas de interesse de gru-pos, moldadas cada vez mais pelas normas libe-rais nas dcadas recentes, explicam em grandemedida por que o governo americano adotoupolticas de imigrao liberais apesar do amploapoio pblico a novas restries imigrao nadcada de 1980. Enfim, a poltica interna e asidias liberais contriburam significativamentepara o aumento da imigrao no pas em dcadasrecentes por meio da passagem de polticas deimigrao liberais (Delaet, 1998, p. 4).

    Na mesma linha, James Hollifield argumentaque, embora as condies econmicas e socio-lgicas sejam importantes para a existncia deuma migrao continuada,

    [] as condies fundamentais so legais e polti-cas. Nas ltimas trs dcadas do sculo XX, oprincipal fator que tem sustentado a migraointernacional (tanto sul-norte como em menorextenso leste-oeste) o acrscimo de direitospara estrangeiros nas democracias liberais, ou oque eu chamei em outro momento de liberalismobaseado em direitos (Hollifield, 2000, p. 148).

    Hollifield, Jopke e Freeman enfatizam osmecanismos domsticos de formao das polti-cas. Todos eles se baseiam em estudos realizadosem pases que so Estados de direito democrti-cos e liberais. J Yasemin Soysal (1998) e SaskiaSassen (2000) preferem enfatizar o papel dosmecanismos internacionais de proteo dos direi-tos dos imigrantes.

    Os direitos e as demandas dos indivduos so legi-timados por ideologias baseadas na comunidadetransnacional, por meio de cdigos e convenesinternacionais, e em leis de direitos humanos,independentemente de suas cidadanias em umEstado-nao. Logo, o indivduo transcende o

    cidado. Essa a forma mais elementar segundoa qual o modelo ps-nacional difere do modelonacional (Soysal, 1998, p. 194).

    Como j afirmamos anteriormente, o surgi-mento de um regime internacional de direitoshumanos apontado no somente como causa dafragilidade do Estado nas decises sobre quempode atravessar suas fronteiras e se estabelecer noseu territrio, mas tambm como causador de umadissociao entre direitos e cidadania, isto , emvirtude do reconhecimento cada vez maior dedireitos universais da pessoa, os direitos exclusivosde cidadania estariam diminuindo. Cada vez maisos imigrantes tm os mesmos direitos que os cida-dos, sem que, para isso, tenham de tornar-se ci-dado, de se naturalizarem.

    A membership e o acesso aos direitos, queeram definidos pela nacionalidade, passam a sercodificados em termos de humanidade interna-cional, uma nova forma de membership que trans-cende as fronteiras do Estado-nao. Estariahavendo, portanto, uma profunda transformaona concepo de cidadania, na sua lgica institu-cional e na maneira como ela legitimada. A idiade Estados como associaes exclusivas vmsendo questionada, por exemplo, pelo reconheci-mento da possibilidade de o indivduo ser aomesmo tempo cidado de mais de um Estado,possuir mltiplas cidadanias (Brubaker, 1992).

    Soysal baseia sua teoria no estudo das polticasde integrao dos pases da Europa Ocidental, pormeio das quais os imigrantes estariam sendo incor-porados a vrios aspectos da sociedade receptora,como o mercado de trabalho, o sistema educacionale outras vantagens do Estado de bem-estar social,sem que, para isso, eles tenham adquirido anacionalidade e, por conseguinte, a cidadania dospases receptores. Em outras palavras, eles estariamtendo acesso a direitos de cidadania, sem que paraisso se tornem cidados. Para a autora, essa situaocaracteriza uma contradio entre dois aspectos cons-titutivos da cidadania identidade e direitos. Ondedireitos e demandas por direitos se tornam univer-salizadas e abstratas, a identidade ainda concebidacomo particular e delimitada por caractersticasnacionais, tnicas ou regionais (Soysal, 1993, p. 8).

  • SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS E MIGRAES 159

    Um conjunto de instrumentos legais, tendopor base o discurso dos direitos humanos, estaria,pois, se desenvolvendo e atuando como diretrizespara a administrao dos assuntos migratrios nalegislao nacional, padronizando e racionalizandoa categoria e o status de migrantes internacionais(Soysal, 1998, p. 200). Segundo Soysal, essa novasdiretrizes obrigam os Estados-naes a concede-rem aos indivduos, independentemente da nacio-nalidade, direitos civis, sociais e polticos. Em su-ma, o Estado estaria perdendo o controle sobresuas fronteiras, tanto as externas, territoriais, comoas internas, de cidadania, e com isso estaria per-dendo parte importante de sua soberania.

    No entanto, o estudo da evoluo do regimeinternacional de direitos humanos nos mostra que,apesar do crescente reconhecimento do indivduocomo portador de direitos independentes de suanacionalidade, a implementao desses direitoscontinua basicamente dependente do Estado, e,no caso especfico das migraes internacionais,do Estado receptor. Vale dizer que o direito de ire vir no mbito internacional o direito de imigrar no reconhecido como um direito humano. Amaior parte da legislao internacional dizrespeito somente a situaes concretas, em que oimigrante j existe. No toa que normalmenteas convenes se referem aos direitos dos traba-lhadores imigrantes, e no a um direito de imi-grao. Na realidade, este s existe em casos detemor justificado, previsto nas convenes relati-vas ao refgio e ao asilo poltico, mas, mesmo nes-ses casos, a ltima palavra do Estado, e a ausn-cia de um organismo internacional com capacidadede coero para verificar se os Estados estocumprindo a lei bastante significativa.

    Com respeito relao entre cidadania edireitos, a crtica a essa interpretao consideraque a cidadania no se define a partir de seu con-tedo, afinal o contedo da cidadania nunca foifixo: sociedades diferentes atribuiro direitos edeveres diferentes ao status de cidado, pois queno existe qualquer princpio universal que deter-mine os direitos e os deveres inalienveis dacidadania em geral (Barbalet, 1989, p. 18). Hcinqenta anos, por exemplo, os direitos culturaisnem mesmo eram considerados direitos. Cidada-

    nia significa, acima de tudo, igualdade perante alei e igualdade de acesso aos direitos, e, definiti-vamente, no h, sob esses aspectos, nenhumaidentidade entre imigrantes e cidados nacio-nais. O fato de os estrangeiros gozarem de ummaior nmero de direitos hoje no modifica anatureza da cidadania. O estrangeiro continua nu-ma situao precria em relao ao cidado.

    Somente os cidados gozam de um direitoincondicional de permanncia e residncia noterritrio, e podem planejar suas vidas de acordocom esses direitos. A entrada e a residncia deno-cidados nunca incondicional. Alguns no-cidados, os que entraram clandestinamente, porexemplo, ou pessoas no final do seu perodo deresidncia legal, no tm esses direitos. Masmesmo no-cidados privilegiados, aquelesaceitos formalmente como imigrantes ou colonos,continuam residentes probatrios, suscetveis excluso ou deportao em certas circunstn-cias (Brubaker, 1992, p. 24).

    To importante quanto a ausncia do direi-to de residir o fato de os estrangeiros no par-ticiparem nas decises a respeito de sua prpriasituao, no terem direitos polticos. De um mo-do geral, independentemente de quais sejam osdireitos acordados aos cidados, todas as demo-cracias modernas definem a excluso sobretudoem relao aos direitos polticos. Estes, definidospor Marshall como o direito de participar noexerccio do poder poltico, como membro docorpo investido de autoridade poltica, ou comoeleitor dos membros de tal corpo (Marshall,1998, p. 94), so componentes fundamentais daidia de cidadania, de modo que no possveldefini-la excluindo esse aspecto.

    A participao poltica fundamental nadefinio da nacionalidade/cidadania e vice-versa,e por isso que, ao longo da histria, semprehouve tanta disputa para decidir quem fazia parteda plis. Definir quem pode ser um cidado uma das questes mais importantes para a vidapoltica de um pas. Em se tratando de pases quese pretendem democrticos, a deciso aindamais importante, porque define quem vai partici-par do processo poltico. Sendo tambm uma

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    questo de distribuio de direitos, a definio decidadania envolve uma luta poltica em torno deobjetivos bastante concretos. No episdio daproposio 187 da Califrnia, por exemplo, o go-verno desse estado tinha o maior interesse em quea educao fosse considerada um privilgio dacidadania, ou pelo menos dos imigrantes legais,pois de acordo com ele, os custos da poltica fe-deral liberal em relao aos imigrantes acabavamrecaindo sobre o estado, que o responsvel pe-las despesas da rea de educao. J os fazendei-ros da Califrnia preferem uma poltica mais rela-xada em relao aos ilegais, que so mo-de-obrafundamental para a indstria agronmica, pelomenos da forma como ela estruturada. Comoreconheceu, em documento recente, uma organi-zao antiimigrao norte-americana: Residncianos Estados Unidos um dos mais valiosos pri-vilgios mundiais (Symcox, 1997).

    Na disputa por esse privilgio, diferentesgrupos de interesse defendem diferentes concep-es de nao para justificar suas escolhas polti-cas, razo pela qual to difcil atribuir a umanica concepo de nao o papel determinantena formulao das polticas de nacionalidade eimigrao. A legislao de cidadania acaba sendoo resultado de um processo de acomodao deinteresses contraditrios, que se articulam em tor-no de diferentes discursos.

    Levando-se em considerao que as socie-dades, sobretudo as sociedades receptoras de imi-grantes, caracterizam-se cada vez mais pela plurali-dade, evidente que as concepes de naotambm se diversificam, isto , diferentes gruposcom concepes de nao diversas tentam imporsua viso de nao ao processo de construo dasfronteiras por meio das polticas de migrao enacionalidade. A pluralidade de opinies e a com-plexidade do processo de elaborao das polticasde imigrao e nacionalidade refletem-se na formafinal das legislaes sobre essas questes. De fato,tais polticas no so fruto da ao de uma entidadeabstrata, o Estado, mas da luta e da acomodaode interesses divergentes na sociedade e dentro doprprio Estado, sobretudo em democracias liberais.

    Paralelamente ao fortalecimento do discursodos direitos, difundiu-se tambm a idia de que a

    imigrao e os imigrantes pem em risco a segu-rana e a integridade do Estado, e que so, portan-to, um problema de segurana nacional. Grandeparte da populao dos pases receptores, motiva-da seja pela crise econmica, seja pela ameaa doterrorismo ou do narcotrfico, seja simplesmentepela xenofobia, pressiona esses governos no senti-do de fechar as portas para a imigrao. A existn-cia de grupos de presso com interesses to ds-pares, aliados a interesses econmicos e polticosde outras naturezas, contribuiu para a formulaode polticas de imigrao e nacionalidade com-plexas e, muitas vezes, incoerentes, que acabamno satisfazendo a nenhum dos lados e sendo taxa-das de ineficazes, tanto pelos que defendem umfechamento maior, como pelos que defendem umamaior liberalizao das fronteiras.

    O que a literatura estudada considera umalimitao do papel do Estado seria, na verdade,apenas um reflexo do fato de que no existe umator nico o Estado , cuja vontade seja clara eindivisvel. As polticas de migrao refletem o dis-senso dos diferentes atores polticos, dentro e forado Estado, sobre a construo de suas fronteiras. Asuposta ineficcia das polticas de imigrao enacionalidade no resultado da perda de sobera-nia do Estado em funo do desenvolvimento daeconomia ou da evoluo dos direitos humanos,mas, sim, um espelho das dificuldades de se che-gar a um consenso quando se trata de delimitar asfronteiras do Estado. Quando se alinha a opiniopblica ao lado dos restricionistas e alega-se que adefesa dos direitos humanos dos imigrantes nopossui bases sociais, no se leva em conta queexistem tambm defensores dos direitos dos imi-grantes e que, mesmo entre os que preferemreduzir o nvel da imigrao, muito difcil para aspesquisas de opinio captarem quais seriam as pri-oridades dessas pessoas, isto , se elas aceitariamuma restrio de direitos em nome de uma restri-o no nmero de imigrantes.

    Contudo, apesar de tanta divergncia, aexistncia das fronteiras estatais tratada pela le-gislao internacional como algo evidente, e aautonomia dos Estados nas decises sobre suasfronteiras incontestada. Discute-se muito sobrecomo e onde construir essas fronteiras, mas no

  • SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS E MIGRAES 161

    h praticamente ningum que defenda sua extin-o ou que considere que a deciso sobre elasno deveria ser tomada pelo Estado. A questo daimigrao continua a ser regulamentada basica-mente pelo Estado, alm de ser tratada, na maio-ria das vezes, como um problema de seguranapblica e uma questo de polcia. Como vimos, aAustrlia tratou o problema do navio Tampa comouma questo de segurana nacional desde o co-meo, convocando a Fora Area para interceptaro navio e obrig-lo a voltar para guas interna-cionais. A Unio Europia, por sua vez, discuteuma poltica de imigrao comum no mesmogrupo de trabalho que discute terrorismo, nar-cotrfico e questes relacionadas seguranainterna. Nos Estados Unidos, sobretudo aps osatentados de 11 de setembro de 2001, a questoda imigrao tambm considerada sobretudo umproblema de segurana nacional.

    Direitos e identidade permanecem, assim,fundamentalmente interligados. A definio dequem faz parte dos ns, de quem nacional e,portanto, cidado, fundamental para a atribui-o de determinados direitos. At o momento, fundamentalmente o prprio ns quem definesua natureza.

    O que o argumento em torno da cidadaniamundial e da perda do controle das fronteiraspelo Estado afirma que, diante do novo contex-to internacional, o ns estaria perdendo essacapacidade de decidir sobre as identidades e osdireitos relacionados a elas. Ou seja, no s oEstado estaria se tornando impotente diante dacirculao de indivduos entre fronteiras, comotambm a identidade nacional estaria perdendo acentralidade como fonte do reconhecimento dedireitos de cidadania. Afirma-se que a decisosobre as fronteiras no mais uma deciso polti-ca, mas que as fronteiras so estabelecidas porconvenes, tratados e legislaes internacionaisde acordo com critrios relacionados aos direitosindividuais universais.

    As fronteiras continuam existindo, tanto asterritoriais, como as de membership, e, mais doque isso, elas continuam a ter um significadoimportante apesar de toda a evoluo do regimeinternacional de direitos humanos e o reconheci-

    mento desses mesmos direitos na legislaodomstica dos pases receptores. O no-reconhe-cimento de um direito de imigrao e a autono-mia do Estado na deciso de quem faz parte dasua populao sustentam a diviso do mundo emEstados como associaes de membership. A ex-cluso do imigrante dos processos decisrios queafetam sua prpria situao garante a continuida-de dessa situao. Recentemente tivemos uma cla-ra demonstrao desse ponto quando da restriodos direitos civis de estrangeiros nos Estados Uni-dos depois dos atentados terroristas de 11 de se-tembro de 2001.

    NOTAS

    1 A exigncia de autorizao no significa queningum consiga cruzar a fronteira sem o con-sentimento do Estado. No existe, nem nuncaexistiu, um Estado que tivesse fronteiras imper-meveis, ou absoluto controle sobre quem entrae sai do pas.

    2 Em novembro de 2000, a ONU aprovou dois proto-colos referentes ao problema do trfico de ilegais, asaber, Protocolo Contra o Trfico de Pessoas eProtocolo Contra o Smuggling de Imigrantes. Trfi-co refere-se a um processo de imigrao que envol-ve coero, e smuggling diz respeito facilitaodo movimento ilegal de pessoas pelas fronteiras.

    3 Cf. site (http://www.consciencia.net/2004/mes/01/eua-brasil.html).

    4 De acordo com a ONU, em 2001 existiam 150 mi-lhes de pessoas vivendo fora de seus pases deorigem. Desse total, estima-se que entre 80 e 97 mi-lhes sejam de trabalhadores e suas famlias, e 12milhes, refugiados (ILO,OIM, OHCRH, 2001).

    5 Segundo o jus sanguini, a nacionalidade transmi-tida por descendncia. A outra modalidade maiscomum de atribuio de nacionalidade o jus soli,quando a nacionalidade atribuda em funo dolocal de nascimento.

    6 A distino entre fronteira interna e fronteira exter-na de autoria de Rogers Brubaker (1992). Fronteirainterna definida por direitos e diz respeito cidadania; fronteira externa a territorial.

  • 162 REVISTA BRASILEIRA DE CINCIAS SOCIAIS - VOL. 19 N. 55

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  • RESUMOS / ABSTRACTS / RSUMS

    SOBERANIA,DIREITOS HUMANOS EMIGRAES INTERNACIONAIS

    Rossana Rocha Reis

    Palavras-chaveDireitos humanos; Poltica de imi-grao; Soberania; Nacionalidade;Refugiados.

    O presente artigo discute a relaoentre soberania e direitos humanosno contexto da elaborao das pol-ticas migratrias. Trata do papel dosEstados nas migraes internacio-nais e dos efeitos da construo deum sistema internacional de prote-o aos direitos humanos sobre aquesto migratria. Por fim, discutea idia de que o crescimento das mi-graes internacionais estaria levan-do o Estado perda do controle so-bre a sua populao e seu territrio,dois elementos centrais do prprioconceito de soberania.

    SOVEREIGNTY, HUMAN RIGHTS,AND INTERNATIONALMIGRATIONS

    Rossana Rocha Reis

    Key wordsHuman rights; Immigration policy;Sovereignty; Nationality; Refugees.

    This article discusses the relations-hip between sovereignty and humanrights concerning the elaboration ofimmigration policies. It deals withthe role of the State in internationalmigrations, the effects of the deve-lopment of an international humanrights legislation over the immigra-tion question, and finally discussesthe idea that the increasing interna-tional migration is leading the Stateto lose control over its populationand territory, two central features ofthe sovereignty concept.

    SOUVERAINET, DROITS DELHOMME ET MIGRATIONSINTERNATIONALES

    Rossana Rocha Reis

    Mots-clsDroits de lhomme; Politique dim-migration; Souverainet; Nationalit;Rfugis.

    Cet article analyse la relation entre lasouverainet et les droits de lhom-me dans le contexte de llaborationdes politiques de migration. Il abor-de le rle des tats dans les migra-tions internationales, les effets de laconstruction dun systme internatio-nal de protection des droits delhomme sur la question de la migra-tion, et discute, en conclusion, lideselon laquelle la croissance des mi-grations internationales entranerait,actuellement, une perte du contrlede ltat sur les deux lments cen-traux du concept de souverainet: sapopulation et son territoire.