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Stella Faccenda ODISSEIA: UMA ANALISE MITOLOGICA DA EPOPEIA DE HOMERO. Trabalho de Conclusao de Curso apresentado ao Curso de Letras - PortuguesJlngles - da Faculdade de Ci€mcias Humanas, Letras e Artes da Universidade Tuiuti do Parana, como requisito parcial para a obten9ao do grau de Licenciatura. Orientadora: Prof,- Irene Boschiero. CURITIBA 2009

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Stella Faccenda

ODISSEIA: UMA ANALISE MITOLOGICA DA EPOPEIA DE HOMERO.

Trabalho de Conclusao de Curso apresentado ao

Curso de Letras - PortuguesJlngles - da Faculdade de

Ci€mcias Humanas, Letras e Artes da Universidade

Tuiuti do Parana, como requisito parcial para a

obten9ao do grau de Licenciatura.

Orientadora: Prof,- Irene Boschiero.

CURITIBA

2009

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SUMARIO

INTRODUC;;AO .................................................................•...........................•.................................. 1

1.0 MITOLOGIA GREGA 5

2.0 MITO .................................................................•.•.................................................................... 8

2.1 DEFINIC;;AO 8

2.2 CARACTERiSTICAS E FUNC;;OES .......•...........................••..................................•....•.......... 9

2.3 TRANSMISSAO .................................................................................•................•.................. 10

2.4 DIFERENTES PROPOSITOS ATRA YES DOS CICLOS ...........................•....................... II

2.5 AS GRANDES FASES DO MITO 14

2.6 MITO E FILOSOFIA ...........................................................•..........•...................................... 16

3.0 HOMERO ..............................••..............................................................................................• 20

4.0 ODISSEIA .....................................................................................................................•........ 25

4.1 ULISSE8, SEU RETORNO DE TROIA E OUTROS MITOS ............•.•.............•....•......•.... 29

4.2 RESUMO DOS CANTOS 49

5.0 BANCO DE lMAGENS ............................................................•......................•..................... 55

6.0 CONCLUSAO E ANALISE FINAL 59

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 63

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Resumo

o objetivo deste trabalho e realizar uma analise de uma das maiores epopeias

existentes, a Odisseia de Homero. Para tal, parte-se de uma analise da mitologia grega

e, posteriormente, do mito em si, bem como de Homero, ate chegar a analise de seu

poema. Apes as devidas analises e definiyoes, apresenta-se urn resumo dos cantos da

epopeia e, na sequencia, a contextualizayao mitol6gica do retorno de Ulisses e de

outros mitos presentes na obra. 0 trabalho tern 0 intuito de analisar e contextualizar 0

fantastico mundo da Odisseia na mitologia grega. Pretende-se, com esse estudo,

fornecer informayoes que possam auxiliar as leitores de Iiteratura classica, ou, mais

precisamente, da Odisseia. 0 estudo se torna relevante a medida que ana lisa urn tema

essencial as origens do rnundo e ao auto-conhecimento do homem, proporcionado pelo

mito.

Palavras-chave: Mitologia Grega; Mito; Homero; Odisseia; Ulisses.

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INTRODUCAO

Naa apenas no mundo literinia, mas tambem na realidade cotidiana, muitas

pessoas se questionam acerca dos misterios que envolvem a mitologia grega e seus

mitos. Nao podemos falar de mito, sem citar urna das obras mais representativas a

respeito dessa simbologia, a Odisseia de Homero. Ter acesso a leitura dessa epopeia

nos permite mergulhar de cabec;a no mundo da mitologia, alam de nos despertar urna

imensa curiosidade a respeito dos mites e de seus autores poetas. Desvendar esse

mundo e ter acesso as origens e ao conhecimento de si proprio.

Atraves do estudo realizado no campo da Literatura Grega, das Biografias, da

Hist6ria, da Filosofia e da Mitologia foi passivel 0 acessa a informa~es que

proporcionassem, ou que se aproximassern da defini~ao e da contextualizayao de mito,

bem como de alguns dos rnisterias de Homero e de sua abra, a Odisseia.

o fantastico mundo da mitologia par Sl s6 ja desperta um grande interesse para a

realizac;aa de urna pesquisa, cantudo, temas ainda outros assuntos que enriquecem 0

objetivo desse trabalho. 0 mito deixou de ser apenas a explica~ao das origens do

universo para fazer parte do nosso cotidiano, norteando nosso comportamento, nossa

cren~ e designando alguns canceitos da atualidade. A partir do momenta em que

mergulhamos no estudo da riqueza de detalhes que 0 mito passu!, passamos a

entender melhor as origens, bern como a nos mesmos.

No que diz respeito a Homero, varios questionamentos sao realizados, tais

como: Homero foi um unica autor, ou um conjunto de paetas? Ha ainda quem questione

se Hornero de fato existiu. Informa~6es veridicas sobre 0 seu nascimento, a sua vida e

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a sua morte sao disputados par muitos locais que desejam possuir tal honra. Ate a

atribui9ao de seu nome como autor da Odisseia e questianada, mesmo parque, existem

alguns estudiosos que acreditam que a obra fai escnta por uma mulher.

A leitura da epopaia nao nos fornece inforrna96es e explica90es claras,

organizadas de forma seqOencial, a respeito dos mitos que ela narra, diticultando a sua

leitura no que diz respeite it interpreta9ao e cempreensae dos fatos, au ainda,

impedindo a aquisi9<io do conhecimento profunda por tras dos acontecimentos nela

narrados. Ah~m do mais, existem varias versoes dos mites narrados no poema

homerico, mesmo porque, a mito sofre variayoes com a passar das epocas e de sua

transmissao.

Dessa forma, pretende-se realizar um estudo que possa explorar 0 complexo

mundo da mitologia e de seus mitos, alam de anali5ar as hip6teses relacionadas a

existencia do poeta Homero, bern como contextualizar de forma organizada alguns dos

mitos apresentados na Odisseia.

o desejo da realizayao desse trabalho e tentar fazer com que leitore5 possam

experimentar um pouco da profundidade e da riqueza que 0 tema tern a oferecer. Que

esse estudo possa fornecer informa96es as quais auxiliem a compreensao desse

mundo fantastico. E, por tim, que este trabalho possa despertar 0 interesse dos leitores

a buscarem ainda mais informayoes a respeito do tema no texto classico integral.

Segundo Marcelo P. Marques, "nao devemos buscar a que esta atms do mito,

mas pensar a partir dele. Aceitar a autonomia dos mitos: ve-Ios em sua irredutibilidade a

outros sistemas de signos. Compreender que eles sempre significam, sim, 0 que dizem.

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Interpretar, nao traduzir. Nao buscar, no mito, a reverso do discurso verdadeiro, mas

tentar surpreender a logos no mito e 0 mito no logos. Pensar 0 mito como uma

inesgotavel reserva de sentido. Que as reflexoes que seguem contribuam para esse

esfor~o de interpreta~ao dos mitos, que nao e mais do que a decifrac;ao de nos

mesmos." (MARQUES, 1994, p.13).

No primeiro capitulo entraremos no mundo da mitologia grega, buscando explicar

a sua defini~ao, a seu objeto de estudo, seus principais autores, suas origens, alem de

suas perspectivas e sua importancia. Para isso, serao realizadas referencias a alguns

autores fundamentals no estudo dessa ciencia, tais como: Pierre Grimal, Junito Brandao

e Paul Die\.

o segundo capitulo abordara a mito em si, partindo de sua definiyao, seguindo

com suas caracteristicas, fun¢es e formas de transmissao, alem de abordar as seus

prop6sitos atraves dos ciclos, suas grandes fases e sua relal(c1o com a filosofia. Essa

tarefa necessitou de uma grande pesquisa ern teorias de diversos autores importantes,

tais como: Sonia Viegas, Marcelo Marques, Pierre Vldal-Naquet eVictor Jabouille, com

o objetivo de tentar explicar a complexidade que gira em torno do mito.

o capitulo tres trata do poeta Homero e de todos as seus questionamentos e

hipoteses. Como ja foi dito, nao sabemos bern ao certo quem foi Homero, cnde nasceu,

como foi sua vida e sua morte. 0 que temos sao apenas hip6teses a respeito,

eJaboradas par grandes estudiosos. Esse capitulo abordara tais hip6teses, baseadas na

concep"ao de alguns autores, tais como: Robert Aubreton, Alberto Manguel, Pierre

Vidal-Naquet e Arist6teles.

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o capitulo qualro Irabalha com 0 poema homerico Odisseia, buscando explora-Ia

e contextualiza-Ia, atravas de diversas hip6teses sobre a obra e de sua evoluc;ao

historica, permitindo-nos urn acesso mais profundo ao textc. 0 sub-capitulo seguinte

traz ricas informaC;6es a respeito do mito do retorno de Ulisses e de diversos Quiros

contidos na Odisseia. 0 objetivo aqui e analisar as grandes (eitos do her6i e

contextualizar de forma organizada alguns dos mites que aparecem na ohra. Para tal

pesquisa foi essencial 0 acesso aos Ires volumes do livra Mitologia Grega, de Junito

Brandao, e a enciclopedia de Mitologia Grega, de Pierre Grimal. Na sequencia, ha urn

breve resumo dos cantos da epopeia, buscando situar brevemente 0 leitor na historia e

nos acontecimentos.

o quinto capitulo nos fornece urn banco de imagens, as quais ilustram alguns

dos personagens e dos mitos da Odisseia, nos proporcionando uma imagem mental

desses relatos. 0 sexto capitulo encerra 0 trabalho com as conclusoes e considerat;6es

finais a respeito dos temas abordados no estudo e dos questionamentos realizados

acerca da queslao homerica e dos milos.

"A obra de Homere compoe um mundo em si mesma, ..

que podemos estudar ate 0 tim dos tempos e ainda sentir

que estamos dentro de um epftome de todD 0 cosmo literario. It

Northrop Frye, The Secular Scripture and other writings, 1975.

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1.0. MITOLOGIA GREGA

A definiyao de mitologia e algo bastante complexo, que possui diversas origens e

inumeras caracteristicas, as quais desempenharam, e desempenham ate hoje, um

papel importantissimo na historia do mundo.

Segundo Pierre Grimal, "Oil-se 0 nome de mitologia grega ao conjunto de relatos

fantasticos e lendas cujos textos e monumentas representativQs nos mostram que

estavam em voga nos paises de lingua grega entre os seculos IX ou VIII antes de

nossa era, epoca a que se reportam as poemas homarices e 0 tim do paganismo -

religiao em que se adoram muitos deuses - tres OU quatro seculos depois de Jesus

Cristo". (GRIMAL, 2009, pag. 7).

Mitologia refere-se ao conjunto de mitos de um grupo social especifico, pralicas

narrativas, enunciados miticos e relatos, transmitidos ao longo de uma tradicao. Alem

disso, refere-se tambem a urn discurso sobre essas narrativas, ou seja, uma area da

filosofia e da ciencia, que estuda a origem, a natureza e 0 desenvolvimento dos mitos.

Falar de mitologia nos leva a pesquisas hist6ricas e interpretayao de textos,

provenientes das mais variadas fontes.

A mitologia pode ser vista atraves de duas perspectivas: 1. A apresentayc30 de

urn corpus mitico, ou 2. 0 estudo dos mitos. Como uCiencia dos Mitos", ela surge na

Grecia antiga, como uma necessidade de refiex3o, de interrogar as historias dos

deuses e dos herois, atraves da interpretayao das epopeias, como por exemplo, a

'Iliada' e a 'Odisseia', que sao de autoria de Homero.

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Todos as povos criaram lendas, au relatos fabulosos, durante a sua evoluc;ao -

as quais eram transmitidas de gerayao em geraCao, tomando proporc;oes quase que

veridicas. Essas lendas, na maioria das vezes, pertenciam ao mundo das religioes, pais

abordavam forc;as que iam ah~m do humano, buscando explicar as origens do mundo e

as conseqOencias das atitudes humanas. 0 heroi descrito ultrapassa os limites,

viajando a lugares fantasticos, lutando em batalhas memoraveis e superando desafios

impossiveis, mas sem perder a sua caracteristica humana.

Segundo Victor Jabouille - em seu prefacio, no livro Mitolegia Grega, de Pierre

Grimal (versao Portuguesa) - a mitologia enquanto conjunto de mitos a urn corpus

variado, heterogeneo e complexo. As narrativas dos feitos dos deuses e dos her6is da

Gracia antiga a um exemple suficiente para demonstrar essa afirmac;ao. Todas as

aventuras e hist6rias mitol6gicas narradas serviram como fonte de inspirac;ao para

diversos autores e artistas plasticos, alem de terem sido tomadas como referencia para

o cotidiano.

o conhecimento da mitologia grega e essencial como ponto de partida para uma

abordagem geral da problematica de todo a universo mitico. A ela recorreu Freud para

batizar 0 complexo basico do psiquismo humano, 0 complexo de Edipo; alem da NASA,

que a utilizou para nomear um de seus projetos de explorac;ao espacial: Apolo. A nossa

vida esta repleta de elementos que remetem a mitologia ou que recorrem a ela a

procura de uma visao poetica e maravilhosa da vida e dos seres.

Dessa forma, 0 mito deixou de pertencer a esfera dos deuses e her6is e passou

a fazer parte do nosso cotidiano. As hist6rias da mitologia, contadas de diversas

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formas, desenvolveram-se em todas as culturas, durante as epocas, tornando a mito

algo universal, como veremos a seguir.

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2.0. MITO

2.1. DEFINICAO

o milo. na Grecia, e designado pela palavra myth as, que significa: palavra, fala

divina, conversa, caisa dita, proposito, discursa, caisa pensada, palavra naD dita, fala

humana, rumor, uma seqOencia de palavras que tam um sentido, relato, mensagem,

conto, estoria, narrativa, ficc;:ao, tabula, trama, ato de fala, pensamento, opiniao,

intenc;ao, resoluc;:ao, etc. Os pr6prios dicionarios afirmarn a complexidade do fen6meno.

Segundo Eliade, a mito signifiea um corpo de narrativas que eontam 0 que se

passou nos tempos primordia is, sendo, portanto, sagradas e verdadeiras; referem-se

sempre a uma criac;ao, isto et a origem de alga; e um tipo de saber vivenciado, isto e,

efetuado ritualmente e que tern um efeite pratico, operat6rio e uma eficacia social.

(EllA DE, 1972, p. 7-23)

o mito e alga vivo, a que faz parte do que as gregos chamavam de physis, au

seja, a realidade emergente e viva. Segundo Sonia Viegas, 0 mito contem uma verdade

originaria. Sua linguagem poetica guarda uma compreensao de abrangencia, de

amplitude maxima, na qual esta presente uma busca de apreensao da realidade como

um processo evolutivo. (VIEGAS, 1994, p.41)

o mito e considerado uma imagem, urn simbolo, urn meio de expressar as

misterios do universa, mas que nem por issa deve ser tornado como veridico. Do

pensamento, ele se propagou pelo mundo atraves dos tempos, entre a razao e a fe.

Torneu-se fonte de reflexao, de temas, imagens e sentimentos. Segundo Pierre Grimal,

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"E devido ao mito que: 0 sagrado perdeu seus terrores, as almas se abriram a reflexao

e a poesia pOde se fazer sabedoria." (GRIMAL, 2009, p. 11).

2.2. CARACTERlsTICAS E FUNCOES

Os principais autores da rnitologia grega - Hornero, Hesiodo, Pindaro e Esquilo -

nos dao uma perceP9clo inicial de que ha um sistema mitico organizado e utilizado por

todos, devido ao fato dos deuses e her6is apresentarem caracteristicas fixas e fazerem

parte de lendas conhecidas. Mas essa ideia e equivocada, pois se fizermos uma analise

rnais profunda e comparativa, obselVaremos contradi90es entre os autores. Os mitos

nao nascem de fonna organizada, como urn sistema, eles surgem ao acaso. E cabe aos

autores organizarem essas inforrnayaes em conjuntos e transmitirem-nas adiante.

De acordo com Marcelo Marques, a realidade, miticamente estruturada, e um

mundo vivo de potlmcias divinas, que s6 pode ser experimentado dentro de urn sistema

magico de nomeayao. A re-efetuayao ritual das narrativas lorna presentes os deuses,

alem de tornar real 0 mundo e dar sentido ao vivido. 0 mito e urn sistema em que vigora

uma fa mitica no mundo, tal como ele e apresentado. Ele e como urn jogo de imagens e

de correspondemcias simb6licas, com varias entradas e niveis de sentido, que estrutura

urna ordern, contra a qual se delirnita urna des-ordern. (MARQUES, 1994, p.13).

o mito opera atraves de representayoes cuja apreensao se da pela vivencia. Ele

e vivo enquanto e vivenciado. A narrativa mitica nao e nem verdadeira, nem falsa, pois

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elas sao preservadas para manter vivas e operantes diversas prilticas socials,

possibilitando a coesao de um grupo dentro de um sistema de regras.

A funyao do mito e poetica et ao mesmo tempo, religiosa. Ambas combinam

entre si, com 0 objetivo de proporcionar ao homem a acesso ao conhecimento divino e

ao conhecimento de 51 proprio. Dessa forma, ele se apresenta como urn meio

importante de investigayao da hist6ria, revelando seus acontecimentos.

o mito atua sobre a existemcia humana atraves da sua for~ poetica. Tamanha a

sua propon;ao, que pessoas passaram a mistura·lo a sua vida cotidiana, tornando-o

companheiro dos pensamentos, da imaginayao e norteador das conceP90es morais.

Ate fil6sofos, baseados na razao, passaram a utilizar 0 mito como urn meio para tentar

explicar coisas complexas e desconhecidas.

2.3. TRANSMISSAO

o mito e uma narrativa preservada pela tradiyao oral, que e revivida atraves de

rituais e em situayees sociais especificas. Os relatos miticos transmitidos pensam no

mundo genealogicamente, onde 0 modelo basico para a compreensao do universo sao

as relac;6es de parentesco. Ou seja, conhecer e explicar alguma coisa significa

encontrar a sua origem.

A preservac;ao e a transmissao do sentido mitico no mundo sao realizadas

atraves de personagens sociais especlficos, tais como: 0 pai, 0 rei, os videntes, os

profetas e os poetas - individuos considerados mestres da sabedoria, que possuem 0

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acesso exclusivo as origens, atraves de heran~, au inspira980 divina, ou [ong05

treinamentos em tecnicas de memorizayao e versificacao.

A composi9iio dos cantos na tradi9iio oral era feita atraves de formulas

recitativas, que facilitavam a memorizar;ao e que eram preservadas, a medida que eram

transmitidas de gera9ao em gera9ao. Mesmo havendo alguma recria9ao por parte do

aedo que recitava urna narrativa, seu trabalho se dava dentro de regras precisas de

composiyao, conven-;:oes arraigadas e enraizadas na economia ritual religiosa.

2.4. DIFERENTES PROPOSITOS ATRAVES DOS CICLOS

Sendo a mitologia classica urn conjunto fixado sob urna forma canonica,

percebemos que nem todos as mites descritos tern 0 mesmo prop6sito. Alguns

abordam a formac;ao do mundo e 0 nascimento dos deuses (mitos teogonicos). que

serviram de suporte as crenyas religiosas. Alem desses, ha as cidos divinos e heroicos,

que narram as aventuras de urn heroi especifico. Esses ciclos sao fracionados, pois nao

nascem formados. Eles sao resultados de uma longa evoluyao, junta mente com a

conexao de epis6dios independentes. 0 terceiro tipo de relata lendario e a novela,

situada em locais determinados, sem valor cosmico, definido pela intriga.

Esses conjuntos lendarios passam a ser relatos elementares, ou seja, estudos

das causas e das origens (historias etiologicas), que objetivam explicar algo

surpreendente do real: urn ritual religioso excemtrico; urn costume; a forma de um

rochedo; ou urn nome proprio. Apesar dessa classificacrao em categorias, devemos

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lembrar que urna mesma lenda pode adquirir 0 carater de um romance au de urna

revelac;ao mitica, ou seja, 0 mito teogonico, ou a lend a dos estudos das origens (lenda

etiologica) pode se finalizar em cicio au em novela. Dessa forma, 0 mito se revela como

algo em constante transforma~ot mutavel de acordo com a fantasia ou com as

exig€mcias de cada um.

Os granctes mites teogonicos surgiram com a necessidade dos povos de

tentarem explicar 0 mundo e 0 nascimento de seus deuses. Os 9reg05 acreditavam que

a Arnor (Eros) seria 0 elemento motor do Universo em seu principia. Essas lendas, que

serviram de apaio religioso, consistiam em diversas "substituic;:6es" de gerac;:6es no

poder sobre 0 mundo, muitas vezes de urna forma nada pacifica.

A gera-rBo pre-olimpica - composta pelas divindades que nao sao conectadas

diretamente a Cron~, mas que provem dos Titas - engloba todos os monstros que van

desempenhar urn papel nos cic10s divin~s, her6icos e nas novelas. Alem disso, essa

gerayao compreende tambem divindades naturalistas, tais como: 0 sol, a lua, a aurora,

as astros, as ventos, entre outros. Percebemos que as lendas a respeito da criac;ao nao

constituem informayOes como, por exemplo, urn ato criador unico.

Sobre a criayao do homern, existem lendas que a explicarn, mas apenas sabre

urna pessoa au raya especifica, deixando de lade outros hornens e outras rayas. Aos

olhos dos gregos, segundo Pierre Grimal, 0 humano e 0 "divino degradado", onde os

homens adquirem par seu pr6prio rnerito as honras dos deuses. E as deuses, segundo

a lenda de Prometeu, nao e 0 pai dos homens, e sim, urn mestre que encontra 0

humane em seu imperio e se acostuma a ele na medida do possive1.

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Os ciclos dos olimpicos - que, devido a revolu9ao celeste provocada p~r Zeus,

instalou no poder a gera980 dos Cronidas, filhos de Crono - apresentam lendas que

estabelecem urna genealogia e apresentam urn valor local. 0 cicio de Zeus e a que

reune 0 maior numero de elementos de origens diversas e revela informac;:6es mais

profundas a respeito da religiao helenica.

Os ciclos her6icos sao relatos de aventuras vividas par grandes herois da epaca,

reunidos com mais cautela, diferentemente da incoerencia dos cielos relativos aos

deuses. I"clui-se tambem urna serie de regressos, cnde a Odisseia e a mais famosa.

Como conseqOencia desses cieles, ha urna materia mitica mais liberada de origens

religiosas, embora encontremos explicac;:oes das origens, mas mascarados par

tende!ncias morais e simb6licas. as seis maiores ciclos, que inspiraram 0 maior numero

de obras liternrias sao: a expedi~o dos Argonautas, 0 cicio tebano, 0 cicio dos Atrides,

o de Hercules, 0 de Teseu e as aventuras de Ulisses.

UA presenya e a compreensao do dinamismo do her6i e de extrema importancia

na evoluc;ao e estruturac;ao de nossa personalidade. Sempre que alga novo e

transformador vai ser implantado em nossa consciencia pessoal e coletiva, algum

dinamismo her6ico devera estar ativado" (VARGAS, 2000, p.11)

A busca pelo conhecimento da consciencia individual e coletiva do ser humano e

bem complexa. A descriyao das inumeras facetas e dos diversos comportamentos dos

her6is da Mitologia Grega pode auxiliar nessa busca. 0 her6i e aquele que vive para a

sua missao, sendo considerado interrnediario entre 0 mundo da consciencia e 0

inconsciente, pais nao e nem um deus e nem humano, e sim, a trayo que une 0 mundo

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dos homens e 0 mundo divino. as herois sao considerados simbolos da transforma98o,

dotados de forte carga emocional, grande potencial transformador, trazendo sempre

urna vida nova e enriquecendo a nossa consciencia para as intinitas possibilidades da

transforma98o humana.

2.5. AS GRANDES FASES DO MITO

o mito recebe infinitas variayaes de acordo com as epocas, nao podendo ser

considerado 0 mesma ao longo do tempo. Os mites helemicos passaram par tres

grandes lases: 1. A idade epica; 2. A idade tragica; 3. A idade filosofica, ou "solistica".

o cicio epico compreende urn nucleo historico, que de alguma maneira se dividiu em

inumeros detalhes, que deram origens a amplifica90es e explicat;6es sem tim. 0 cicio,

ao ser construido, se tornava urn resumo de urna civilizayao. Esse trabalho criava

dificuldades nas explicac;oes e soluc;oes para as mesmas, atraves da imaginayao e de

soluc;oes prontas selecionadas dos contos folcl6ricos, que sao encontrados em todas as

partes, desde os ciclos her6icos ate nos mitos relacionados as divindades.

Os contos populares nutrem os mitos, mas na~ os explicam p~r completo, po is

ha sempre na hist6ria um elemento que pode levar a variac;oes e interpretac;oes

diferentes, como per exemplo: um dado historico, no cicio troiano; ou um dado

geografico, no caso dos Argonautas. Temas folcloricos eram utilizados para

completarem explicayoes, e assim, provavelmente nasceram muitos dos mitos, que

serviam para dar uma interpretayao simbolica de urn povoamento muito antigo ou de

uma migrayao. Em outros casos, 0 nucleo original e uma especificidade cultural.

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Na Mpre-historia" dos mitos percebe-se urna narrac;ao do sagrado meio confusD,

no qual foram se agregando, com a tempo, elementos historicos e populares, cnde as

figuras mlticas adquiriam urna realidade viva e acabaram se tornando pessoas. 0 mito,

elaborado como epopeia ou romance, tinha como objetivo refletlr sabre 0 mundo e

constituia experiemcias. Os poemas homericos e as epopeias se preocupam multo mais

com a desenvolvimento da ayBo, do que com a psicologia dos personagens, pais e5sa

pSicologia e resultado da a~o do individuo.

Essa refiexao nac olha a personagem viver e, na malaria das vezes, naD taz

julgamento a ele. Ulisses e aceita plena mente, mesmo com suas mentiras. Somente

mais tarde, por volta do tim do seculo VI, com a idade filosofica, esses problemas

come~rao a ser analisados e os herois passarao pela critica da moral. as mitos, entao,

se tornarao exemplas e instrumentas de educac;ao moral por exceh§ncia.

Com 0 nascimenta da tragedia, ela nao e mais considerada um relato, e sim,

uma reflexao sabre um episodio exclusivo. Os mitos tragicos guardam de suas origens

uma grandeza religiasa, a qual e caracteristica da tragedia. Mesmo que 0 heroi tragico

tenha se humanizado, experimentado paixoes e sofrimentos comuns, ele vive em um

mundo a parte, onde tudo e mais terrivel, maior e ~exemplar".

~A historia dos mitos nao se apresenta como uma evoluc;ao continua, pois cada

mito tern sua origem, uma fase epica, uma fase tragica e, eventualmente, uma fase

filos6fica ou sofislica." (GRIMAL, 2009, pag. 105).

Foi dessa forma que os mites helenicos se prepagaram por todo 0 dominic

rnediterraneo ate a munde atualmente canhecido. A partir do seculo III antes de nossa

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era, a pensamento grego passou a ser cada vez mais dominado pel a filosofia, a qual

questionau as mites novamente, mas de Dutra maneira. Nos mites buscava-se a

revela~ao sabre a natureza do mundo. Ele era considerado urna forma simb61ica de

expressar verdades racionais. Par exemplo: Zeus naD era mais 0 vencedor dos Titas e

sim, 0 principia abstrato da razao.

2.6. MITO E FILOSOFIA

A filosofia foi ao encontro das doutrinas mfticas, buscando extrair dos mites urna

verdade secreta. Imaginavam que as lend as eram urna versao distorcida de hilbitos

norma is do cotidiano. Essa pOSii(aD foi adotada pelos racionais e pelos fil6sofos do

seculo XVIII.

No final do seculo IV, antes de nossa era, cutra tendencia surgiu, na qual 0

objetivo era uracionalizar" os mitos, excluindo suas caracterfsticas fantasticas. Assim, 0

mundo lendario foi reduzido as propor~6es humanas, onde 0 fantastico nao habitava.

Esse esfor~o de tentar racionalizar os mitos, depois de retirar toda a substancia viva

que continha em cada urn deles, acabou por tirar tambem dos mitos a sua raZ;3O de

existir.

Foi no seculo XIX que a rnitologia antiga come~ou a ser tratada com respeito e

seriedade, considerada um objeto de estudo e de conhecimento. Max MOeller, lingOista

e estudioso de poem as sanscritos, proporcionou essa nova visao de mito. Ele pensou

ter encontrado as formas primitivas das cren~as e dos mitos, nas quais 0 homem

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primitiv~, impression ado com as fen6menos da natureza, passou a nomeil-Ios. Esses

names, com 0 passar do tempo, foram se tornando humanos. A partir desse habito, a

vida no universo foi sendo dramatizada dessa forma. Essa explicac;:ao da origem

primitiva dos mites e considerada simples e hoje sabe-se que essas interpretac;:6es nao

podem ser consideradas primitivas.

Com as trabalhos de J.W.B Mannhardt e J.G. Frazer e mitologia teve a

oportunidade de participar de uma fase nova, chamada de "0 metoda comparativo".

Essa ideia consiste na crenc;a de que as ac;:6es do espirito humano sao identicas,

independente do pavo e da nac;:ao. Ou seja, urn mito 9re90 ou romano pode ser

explicado a luz de urn mito de uma Dutra nac;:ao e cultura, pais ambos respondem as

exigemcias do pensamento humano. Aos poucos, Frazer conseguiu mostrar que um ate

lenditrio conserva a lembranc;a de praticas rea is. Assim, os mitos deixaram de ser

considerado um milagre.

As pesquisas realizadas apos Frazer trouxeram grandes temas, os quais

originaram lendas, como per exemplo: ritos de passagem de uma classe para outra,

ritos de iniciaC;ao, ritos funerarios, etc. Esse metodo classifica e categoriza as lendas,

proporcionando uma explicalfiio para tal. Porem, esse metodo comparativo nao satisfaz

a todas as explica90es.

Essa busca por uma explicalfiio geral fez com que se perdesse 0 aspecto mais

importante, que e a caracteristica (mica e individual de cada lenda. Assim, surgiu urn

novo metodo, denominado "metodo sociologico", tendo como representante 0 frances

G. Dumezil. Para essa escola, a comparaC;ao deve ser feita entre povos que possuam a

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mesma origem, 0 mesma grau de parentesco, ou linguas semelhantes, pois a mitologia

derivada desses pavos sera 0 produto de uma evoluc;ao que surgiu em urn conjunto de

crencas e pn3ticas comuns. Sendo assirn, a estudioso deve focar em descobrir esse

conjunto comum de crenyas e ritos. Fai dessa forma que Dumezil mostrou, par

exemplo, que lodos as dominios "indo-europeusn possuiam uma tradi~o de preparar

"poc;oes da imortalidade". Porem, apesar do sucesso em algumas explica90es, esse

metoda encontra dificuldade em explicar as mites helemicos.

Desde as fins do secula XIX, a mito passou a se tarnar algo multo serio com

Freud, Jung, entre Quiros. Segundo Junito Brandao, a mito fol remitizado,

ressacralizado e passou a ser analisado como um arquetipo (uma imagem). "0

inconsciente coletivo e constituido pela soma dos instintos e dos seus correlatos, os

arquetipos. Assim como cada individuo possui instint05, possui tambem um conjunto de

imagens primordiais" (JUNG, 1984, p.73). Dessa forma, temos 0 mito como uma

exteriorizac;ao de conteudos do inconsciente coletivo.

Aos olhos de alguns psicanalistas a mitologia seria um "subconscienten dos

povos antigos, 0 qual representaria os temores, as aspirac;oes, enfim, tudo aquilo que a

moral humana consciente recusava, per ser horrivel. De fato, no mito hi!: incestos,

traic;oes, assassinatos, etc. Essa psicanalise dos mitos proporcionou uma vida nova as

antigas lendas, livre de preconceitos. Nessa perspectiva, os mitos adquirem posic;oes

bem definidas, como indoles simbolizadas. Em suma, aprendemos com a psicologia

analitica de JUNG, atraves do conceito de arquetipo (imagem), a importancia dos mitos

para a estruturac;c3o e desenvolvimento de nossa consciemcia individual e coletiva.

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Para conduir esse capitulo, podemos afirmar que 0 mito, entao, abrange todas

as hist6rias contadas - desde uma tragedia, ate urna fabula de Esopo. Ele se

desenvolve como epopeia e tenta explicar as origens, que sao transmitidas entre

familias e cidades. Ele e a manifestac;aoda arie, em toda a sua forma de criac;ao,

representando 0 irracional do pensamento e integrando-se a todas as atividades do

espirito. 0 mito "aD tern fronteiras, ele esta em tada a parte, sendo essencial a vida.

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3.0. HOMERO

Homero e considerado urn dos principais autares da mitologia grega, ao qual se

atribui a cria~o das obras lliada e Odisseia. Porem. falar a respeito de Homero nao e

uma tarefa facil, em virtude de trabalharmos em eima de hip6teses e naD de fatos

concretes.

Alguns estudiosos questionam se Homero de fato existiu, se foi urn unico poeta

fenomenal, ou se foi um conjunto de varios paetas. Alem dissa, 0 local de seu

nascimento, a data e 0 desenvolvimento de sua vida tambem sao questionados. Para

essas perguntas, naD ha uma res posta correta que possa ser comprovada e tamada

como veridica. Ha somente hip6teses, as quais veremos a seguir.

A imagem de Homero nos e familiar atraves de uma escultura conservada no

museu de Munique, a qual representa 0 autor como um homem cabeludo, barbudo e

cego. Porem, essa escultura nao representa urn retrato tiel do autor, e sim, uma

inspira~ao em um modelo do seculo V a.C., epaca da arte grega.

A localizac;ao do lugar do nascimento de Homere nao e precisa, mas sabe-se

que sete cidades gregas disputam a homa de ter sido esse local. Sao elas: Quios,

Esmirna, Colofon, Salam ina, Rodes, Argos e Atenas. Uma das tradi<;6es antigas

afirmava que Homere havia nascido na ilha de Quios, pois, no final do seculo VII a.C, 0

Hino de Apolo, atribuido a Homere, era conhecido como a obra "do homem cego que

vive na escarpada Quias". Esse mesmo local mostra aos seus visitantes uma rocha na

qual Homere e seus descendentes - os Homeridas - supostamente sentavam para

cantar seus poemas. Dutra hipotese que afirma 0 nascimento do poeta ern Quios e a de

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que a lingua dos poemas do autor era a ~j6nica", falada pelos primeiros greg05, que se

estabeleceram na costa ocidental da Asia menor e, inclusive, em Quias.

o local da morte do poeta tambem e disputado. A ilha de Cos afirmou ser 0 lugar

de sepultamento de Homero, porem, Chipre contestou, alegando que a tradiyao cipriota

dizia que urna nativa de Chipre chamada Temisto teria sido a mae de Homero, e que 0

poeta havia escolhido ser enterrado ao lado de sua mae, em Chi pre.

No secula V a.C., Her6doto, 0 pai da Historia, duvidou que a autoria da lliada e

da Odisseia fosse atribuida a Homero, mas nunca duvidou da existencia do poeta em

si. Esquilo, um dos pais da tragedia, declareu que suas pe9as eram "fatias dos grandes

banquetes de Homero", sugerindo a sua inspirac;ao nos poemas homericos.

Para as antigos 9reg05, nao havia nenhuma duvida sabre a existencia de

Homero. Ele era considerado um homem, de carne e osso, 0 qual se tornou 0 maior dos

poetas, atraves da composic;ao das obras que contemplavam a cultura grega: a lIfada, a

Odisseia e varios outros hin~s.

Ambos os poemas de Homero comec;am depois de um periodo de dez anos: na

lliada, uma decada depois do comeC;o do sitio de Troia; na Odisseia, uma dt§cada

depois da queda da cidade - a qual foi considerada a primeiro ponto convencional dos

acontecimentos testemunhados. Os poemas de Homero sao considerados 0 inicio de

todas as nossas narrativas.

Homero era um rapsodo, compositor e interprete de canc;oes epicas. Tambem

denominado "aedo", palavra que vem do grego aoid6s, que significa "cantor". Dos

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primeiros bardos (paetas, trovadores) e rapsodos nao sabemas muito, exceto que a

maiaria era cega e que viajavam de cidade em cidade, se apresentando em lugares

publicos e em cortes reais. Sabemos, segundo 0 proprio Homero em suas obras, que

esses bardos e rapsodos cantavam "sabre os feitos dos homens, gestas de her6is".

Na decada de 1930, 0 norte-americano Milman Parry descobriu - atraves de seu

estudo sabre as bardos da ex-Iugoslavia - varios cantores populares com semelhan~as

ao estilo do Homero. Baseado nesses estudos, Parry sugere que a lliada e a Odisseia

podem ter side cantadas de urna maneira parecida com ados bardos baicimicos, as

quais eram transmitidas de gerac;ao em gera980, com a ajuda de urn instrumento de

corda, chamado ph6rm;nx, para auxilia-Ios na improvisa9ao dos textos, na elabora9ao

de entonac;6es e cadencias dos trechos do poema. Os personagens da obra eram

sempre acompanhados de epitetos, que sao constantemente repetidos, exemplo:

MUlisses das mil astClcias". Esse estilo e denominado Mestilo formular", descoberto par

Milman Parry. Os epitetos e as formulas tem como fun9ao repousar 0 aedo durante a

sua recita9ao, que adquire um carc3ter automatico, e Ihe fornece pausas, as quais

permitem estender au restringir a narrativa a sua vontade.

Em IV a.C., tres seculas apos Homero, os bardos nao utilizavam mais a lira

instrumental para acompanhar suas palavras, e sim, uma bengal a emblematica, alem

de se vestirem com elegancia. Homero se tornou 0 padrao de excelencia em sua arte,

que jamais fai superada. Uma ordem, sem data, atribuida a Solon, Pisistrato ou Hiparco

declara que tanto a lliada, quanto a Odisseia eram cantadas na integra em urn festival

de homenagem a deusa Atena, na Panateneia.

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Com 0 sistema de esenta alfabetica chegado a Grecia, tivemos as primeiros

exemplos de composi'fces literarias escritas alfabeticamente, por volta do secula VIII.

Os poem as homericos podem ter side as primeiros a aproveitarem as possibilidades

aferecidas pela escrita, tais como: maior comprimento, consistancia e harmonia. 0

poema escrito possibilitava urn alcance mais ample da obra.

Para alguns estudiosos modernos, e passivel que Homero tenha escrito 0 telda

dos poemas em rolos de papira do Egito. as Jonios do seculo VII a. C., eram

cernerciantes empreendedores, que trouxeram para casa a fantastica invenc;ao dos

roles de papiro. Se Homero escreveu de fatc sua obra, seu comprimento deve ter side

determinado pela quantidade de texto que urn papiro podia canter. Portanto,

provavelmente, a divisao da obra em 24 cantos (dos dois poemas) pode ter side uma

conseqCu3ncia dessa limitat;ao de espa90.

Os poemas de Homero ofereciam dois elementos unificadores as cidades

gregas: hist6rias comuns e deuses comuns. Esses poemas se tornaram textos

canonicos, que ofereciam uma visao dos deuses e dos her6is, como cidadaos do

mundo. De urn lado, historiadores argumentavam que essas lendas eram vers6es de

acontecimentos factuais. Par outro lado, alguns fil6sofos sustentam que as lendas eram

alegorias que escondiam uma prova poetica. Segundo 0 histariador Paul Veyne, "0 mito

era uma alegoria de verdades filos6ficas. Para os historiadores, era uma deformar;ao

menos de verdades hist6ricas. ft 0 mundo homerico e um mundo poetico. 0 verdadeiro

assunto de Homero e a terra dos homens e 0 mundo dos deuses, na qual a Odisseia

nos ensina a arte da sobrevivencia.

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No secula VI a.C, Homero ja havia se tornado 0 maior dos paetas e 0 mestre que

informava toda a cultura e COnCeP9aO grega do mundo, atraves de relatos de mortais,

deuses e her6is. Os seres humanos, segundo a poeta, tin ham que depender se sua

propria Inteligencia e astucia, e nao do comportamento instavel dos deuses. A obra de

Homero serviu como meio de informayao, conhecimento e analise do comportamento,

das virtudes e dos erros humanos.

Assim, Homero deu origem a varias biografras, escritas par diversos Qutros

autores, as quais honravam a famoso poeta. Porem, 0 fata dessas biografias terem side

escritas, naD significa que elas sejam veridicas e nem que 0 poeta de tata existiu.

Alguns estudiosos acreditam que Homero nunea existiu. Qutros pensam que ele naD

era apenas uma pessoa, e sim, um conjunto de paetas. Segundo Alberto Manguel,

"talvez Homero naD tenha sido urn homem, e sim, a nome que as bardos antigos deram

a arte deles, transformando uma atividade atemporal numa pessoa lendaria primordial."

(MANGUEL, p.38).

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2S

4.0. ODISSEIA

A Odisseia, de Homero, esta entre as primeiras epopeias da lingua grega,

considerada urn mito. Ela se caracteriza pela mistura do humane e do super-human~,

contando hist6rias de combate entre deuses e deusas; e narrando aventuras de

grandes herois, muitos considerados semi-deuses, ou seja, filhos de divindades que

fazem parte de familias nobres hist6ricas. A epopeia abarda as debates e desafios do

homem, ampliando-os a urna proporyao universal atraves do mito.

A obra compreende tres conjuntos: 1. Telemaquia: composta pelos quatro cantos

iniciais, no qual 0 filho de Odisseu (Telemaco) e 0 protagonista; 2. Regresso, cantos 5 a

12: que narram as aventuras de Odisseu ern seu retorno a pcHria; 3. Itaea, cantos 13 a

24: que mostram a reconquista do palacio pelo heroi em ftaca.

Alguns criticos sugerem que inicialmente foram escritos tres poem as, que

posteriormente foram compilados. A hip6tese, apesar de ter 0 seu fundamento, nao foi

considerada verdadeira.

Foi em 1488 a primeira vez que a Odisseia foi impressa, em Florenc;a, na Italia.

Entre 0 momento em que foram fixados e impressos, esses textos provavelmente

varia ram um pouco.

Os 26 mil versos tem uma forma chamada uhexametro" dactilo, onde cada verso

e formado por seis medidas. UHex" significa seis em grego e "metron" significa medida.

Cada medida e composta p~r uma silaba longa e duas silabas breves, denominado

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dactilo, au entao, par duas longa5, denominado urn espondeu. Ha urn aeente mel6dico,

em forma de canto.

No inicio da obra, a poeta se dirige a uma divindade, a Musa, que sabe tude e

que pode expressar tudo. "0 homem canta-me, 6 MUS8, a multifacetado, que muitos

males padeceu, depois de arrasar Troia, cidade sacra." (Od I, p.13) A divindade e quem

inspira as atos dos mortais. A obra introduz uma ideia de merito e demerito, de bern e

mal, que provocam a interven~o dos deuses. Se as seres sao bons, a divindade os

acompanhara, casa contra rio, darao a eles castigos.

Temas a presenya de varios aedos na obra: ha urn entre as Feaceos; outro no

palacio de Ulisses; a proprio Ulisses se torna urn ao cantar as suas aventuras; as

sereias ao cantarem a sua melodia, entre Qutros. A Odisseia aborda a respeito da

grandeza do aedo, os quais eram capazes de reproduzir as epopeias de forma oral,

com variac;6es minim as.

A present;a, feminina e constante e intensa na obra. 0 ingles Richard Bentley, um

dos fundadores da filologia moderna, em 1713, sugeriu que a Odisseia havia side

composta para um publico feminino. Samuel Butler, escritor da epoca vitoriana, chegou

a propor que a obra havia sido escrita por urna mulher. Tudo na obra se passa como se

o mundo feminino fosse duplo, como, por exemplo: as sereias sao cantoras, mas

destrutivas; em Itaca temos as servas fieis e as infil3is; ha Penelope, a mulher fiel, e

Clitemnestra, a mulher adultera, etc. Todas essas presenc;as femininas contribuem para

a composiC;ao e caracterizac;ao do heroi Ulisses.

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A Odisseia narra as aventuras de Ulisses, contando seu regresso a sua patria,

apas a guerra de Troia. A narrativa nao ultrapassa a capacidade de memorizac;ao, pais

apesar do heroi estar envolvido em aventuras que duraram dez anos, tudo e eontado de

forma resumida, passando de urn evento para 0 outro. Homero transforma 0 her6i em

narrador de suas pr6prias aventuras, pais Ulisses narra as pessoas ao seu redor suas

experiemcias, dedicando urn tempo maior aquelas que exigiram muito de sua

inteligemcia, esperteza e sabedoria - mesmo parquet eram essas aventuras que

impressionavam mais e 0 consagravam como urn dos principais herois da epoea.

o her6i Ulisses e caracterizado par inumeras qualidades, tais como: ser

cavalheiro, inteligente, esperto, astuto, forte, bonito, guerreiro, pai, esposo, amante,

conquistador, estrangeiro, rei, lider, entre outros - como veremos posteriormente, no

capitulo a respeito do her6i. Nao ha nenhum exercito contra 0 her6i na obra, e sim,

for~as da natureza que tentam impedi-Io de chegar ao seu destin~, tais como:

tempestades, escassez de alimento, rochas lan~adas, ventos fortes ou contrarios a

navega~ao, entre outros. Dessa forma, ele se ve obrigado a superar todos esses

obstaculos e desafios para poder retornar a sua patria. Mas com a sua inteligencia e

com 0 auxilio dos deuses que 0 protegem, como Atena, ele consegue superar ate 0

impossive!.

Segundo Donaldo SchOler, doutor em Letras e tradutor da Odisseia, "Odisseu e

vitorioso por ser quem e." (Telemaquia, pag. 9). Suas multiplas faces permitem que 0

leitor escolha a sua favorita.

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Enquanto a iliada e considerada urn poema da guerra, a Odisseia pode ser

considerada 0 poema da paz, pais term ina com a paz estabelecida entre Ulisses e as

familias dos pretendentes martos par ele.

A Odisseia nos libera para a fantasia e a imaginayao, contidas no fantastico. Ao

lermos a obra, temes a oportunidade de viver sonhos assustadores, rices au reais, al8m

de entrarmos em contata com 0 nossa eu interior mais intimo, libertando-nos dos

padr6es de confinamento.

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4.1. ULISSES, SEU RETORNO DE TROIA E OUTROS MITOS

o vocabulo grego "Odysseus" naa e a primeira fonte de Ulisses. A forma dialetal

grega "Ulikses", alraves do lalim "Ulixes", nos deu 0 nome Ulisses.

Ulisses e filho de Laerte e de Anticleia. Do lado paterno, seu avo chamava-se

Arcisio, 0 qual era filho de Zeus. Do lado malerno, seu avo chamava-se Aul6lico, do

qual seu bisav6 era Hermes. 0 nascimento do her6i foi urn tanto quanta complicado.

Ulisses nasceu na ilha de (taea, no monte Nerito, em urn dia que sua mae tal

surpreendida por um temporal.

o nome Odisseu, dado ao heroi, possui algumas vers6es. Urna delas diz que 0

nome originou-se da interpretac;ao da frase grega uZeus chavia pelo caminho", 0 que

impediu a mae do her6i de descer 0 monte Nerito. Outra versao diz que avo do heroi,

Aut6lico, fora visitar 0 neto recem-nascido e "por ter se irritado com muitos homens e

mulheres que encontrara pela terra fecunda", aconselhou aos pais do her6i a/he darem

o nome de UOdysseus", que lembrava 0 verbo "Odyssomai", que significa "eu me irrito,

eu me zango". Alguns estudiosos dizem que, ao analisar 0 radical e 0 derivado da

palavra, temos 0 significado "Iuminoso". Mas nao se sabe ao certo a etirnologia de

Odysseus.

Ulisses e considerado urn her6i cheio de malicia, habilidade, deterrninar;ao,

coragem e inteligencia. Desde muito jovem 0 her6i deu inicio as suas aventuras.

Durante urna estada na corte de seu avo Aut6lico, Ulisses participou de uma cac;ada e

foi ferido por urn javali, 0 quallhe gerou urna cicatriz acirna do joe/ho, que selViu para 0

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reconhecimento do heroi na Odisseia. par urna de suas escravas, quando esse chegou

a Itaca disfar9ado.

A pedido de seu pai (Laerte), Ulisses foi a Messena, com 0 intuito de reclamar

urna parte do rebanho de seu pai, que havia sido furtado. Na corte do rei Orsiloco,

Ulisses encontrou com 0 lfita (filho de Eurito) e herdeiro do areo paterno. Os dais her6is

resolveram, como pacto de amizade, trocar de armas. Ulisses deu a lfita sua espada e

lan~, enquanto ifita a presenteou com urn areo divino - utilizado para matar todos as

pretendentes usurpadores na Odisseia.

Ulisses recebeu do pai, que se recolheu par se sentir velho demais e cansado, a

reino de itaea, com todas as suas riquezas, constituida principal mente de rebanhos. 0

hero;, com a objetivo de se casar, cortejou Helena, mas percebendo que 0 numero de

pretendentes dela era excessiv~, voltou-se para Penelope, prima de Helena, filha de

lcario. Hit duas versoes para como Ulisses conseguiu a mao de Penelope: uma, diz que

foi por Tindaro (pai de Helena), em forma de gratidilo por um conselho dado pelo heroi;

outra, afirma que a her6i a conseguiu como premia, ap6s ter ganhado uma corrida de

carros.

Do casamento de Ulisses e Penelope nasceu Telemaco, 0 qual ainda era muito

novo na ocasiao da guerra de Troia. 0 heroi tentou evitar a sua ida para a guerra, nao

por falta de coragem, mas par amar it esposa e ao filho. Em seu plano, Ulisses se fingiu

de louco para escapar do juramenta de ter que ir para a guerra, mas Palamedes, a

inteligencia inventiva par excelencia e primo de Ulisses, desconfiado da loucura do

heroi, teve a ideia de coloear Telemaco na frente das rodas do arado. Ulisses, agindo

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de forma sa, deteve as animais a tempo de salvar seu filho e foi, assim, desmascarado

par Palamedes, tendo que if a guerra. Ulisses nunca perdoou 0 primo par tal

acontecimento. Inclusive, no decorrer da guerra de Tr6ia a her6i vingou-se cruelmente

de Palamedes.

Junto ao conselheiro Miisco, enviado per Laerte, Ulisses se engajou na armada

aqueia. Ap6s a guerra de Troia, 0 her6i e as outros reis aqueus se apresentaram para 0

longo e dificil regresso a seus respectivos reinos. Menelau partiu primeiro com sua

Helena e com 0 velho sabia Nestor. As naus de Ulisses navegaram junto ao mar. Na

ilha de Tenedos, retornou a Tr6ada e se uniu a Agamemnon, que la permaneceu mais

alguns dias, com 0 objetivo de conciliar com presentes as grayas da deusa Atena.

Quando Agamemnon tomou 0 rumo do mar, Ulisses 0 seguiu, mas uma forte

tempestade os separou e 0 rei de ftaca foi parar em Tracia, na regiao dos Cicones.

Os Cicones eram uma tribo belicosa da Tracia, que tin ham como heroi Cicon.

Eles participaram da guerra de Troia como aliados de Priamo, 0 que justificaria a

destruiyao de uma de suas cidades par Ulisses. Desembarcando na cidade, Ulisses e

seus marujos arrasaram-na, juntamente com alguns de seus habitantes, poupando

somente um sacerdote de Apolo, Marao, que deu ao rei de Itaca doze jarras do melhar

vinho. Num contra-ataque rapido, os Cicones eliminaram alguns gregos, que seguiram

em direyao ao mar.

Os aqueus viajaram rurno ao suI. Dois dias depois avistaram 0 cabo de Maleia,

mas urn vento forte os lanyou ao largo da ilha de Citera. Durante nove dias, os marujos

enfrentaram dificuldades no mar, ate que, no decimo dia, chegaram ao pais dos

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Lotafagos (provavelmente em algum lugar da costa da Africa do norte), que se

alimentavam de f10res (Od. IX). 0 Lota era urn fruto saboroso, magico e amnestico, que

fazia com que a pessoa que 0 provasse, naD desejasse mais retornar a sua patria. Tres

marujos aqueus provaram do Iota.

aE aquele que saboreava 0 doce fruto do Iota,

Nao mais queria frazer notrcias nem voltar,

Mas preferia permanecer ali entre as Lot6fagos,

Comendo /oto, esquecido do regresso"

(Od. IX, 94-97)

Ulisses conseguiu traze-Ios de volta e prendeHos no navio. Dati partiram e,

posteriormente, chegaram a terra dos ciclopes - identificada com a Sidlia.

"Dali continuamos viagem, de coray8o triste,

e chegamos a terra dos soberbos ciclopes, infensos as leis.

que, confiados nos deuses imortais, nao pfantam, nem lavram,

mas tudo Ihes nasce sem semear nem lavrar"

(Od. IX, 105-109)

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Com seus doze melhores homens, Ulisses decidiu explorar aquela regiao,

levando consigo urna das jarras de vinho que havia ganhado de Marao. Na explora<;ao,

Ulisses e seus homens entraram em urna gruta, na qual havia gordos rebanhos. La, as

homens aguardaram 0 dono da cavern a e dele esperavam hospitalidade. No final da

tarde, 0 ciclope Polifemo, dono da gruta, chegou ao local.

"Era urn monstro hOffendo, em nada semelhante

a urn homem que come paD, mas antes a um pieD

a/candorado de altos montes, que aparece iso/ado dos oulros"

(Od.lX, 190-192)

Polifemo era filho de Posidon com a amante Toasa. Era urn ciclope gigante de

urn 56 olho, que ocupava urna tertii regiao cnde 0 solo gerava abundantes plantayoes

par conta pr6pria, fornecendo um pasto farto para as gordas ovelhas e bodes. 0

gigante, ao chegar a sua gruta, ja foi devorando seis dos marujos de Ulisses, ate que 0

rei de itaca teve uma brilhante ideia. 0 her6i resolveu oferecer a Polifemo um pouco do

vinho de Marao. 0 gigante, que nunca havia provado a bebida, gostou e bebeu em

excesso, ate embriagar-se. Antes de dormir, 0 gigante perguntou ao her6i 0 seu nome,

que respondeu "Ninguemft. 0 cic[ope, entao, prometeu que comeria WNinguemn par

ultimo, em retribui(f6l0 ao vinho, e assim dormiu.

Nesse momenta, Ulisses afiou uma estaca, aqueceu-a ao fogo e enfiou-a no

unico olho do Ciclope, cegando-o. 0 Ciclope, acordado pela dor terrivel, urrou e rugiu,

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chamando seus vizinhos, as Qutros Cicio pes, para que viessem ajuda-Io. Mas quando

esses se agruparam ao lado de fora de sua cavern a e perguntaram quem 0 estava

incomodando, quem a tinha ferido, sua (mica res posta toi que "Ninguem" a incomodava

e "Ninguem" 0 estava ferindo. Sendo assim, eles acabaram a tendo como laueo e se

retiraram.

Ao amanhecer, Ulisses e seus homens se preparam para fugir da caverna: cada

homem toi amarrado embaixo de urn dos carneiros do ciclope. Quando a 9i9ante cega

afastou a pedra, ele sentou-se a entrada da caverna, tentando agarrar a tripulayao de

Ulisses, mas esses passaram a salvo por suas maos, presos aos animais. Ulisses e

seus companheiros correram ate a praia e embarcaram em suas naus. Ao tomarem

uma certa distancia da ilha, Ulisses grita para Polifemo:

"Ouve Cic/ope! Se um dia, qua/quer dos mortais inquiririr-te

sobre a raZBo vergonhosa de estares com 0 a/ho vazado,

dize ter sido 0 potente Odisseu, eversor de cidades,

que de Laertes e filho e que em {taca tem a morada .• (p. 168)

Polifemo ergueu urn enorme rochedo e lan~ou-o contra a nau de Odisseu, mas

sem acerta-Ia. Oali, a tropa continuou viagern, feliz por ter escapado da morte, porem,

triste pelos companheiros que haviarn sido devorados pelo temivel Ciclope. Apes esse

acontecimento, Polifemo divide sua desgra~a com seu pai, Posidon. Esse, enfurecido,

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3S

se prop6e a impedir ao maximo 0 retorno de Odisseu a itaca, enviando-o diversos

obstaculos, como forma de vingant;:a.

Os Helenos navegaram em direy30 a ilha E61ia, reino do Senhor dos Ventos -

possivelmente Lipari, na costa oeste da Italia Meridional.

"Chegamos entao a i1haE61ia.Ali habitava E%,

filho de Hip6tes, caro aos deuses imortais, numa ilha flutuante,

cingida em foda a volta por infragive/ muralha de bronze ..

(Od.X, 1-4)

Eolo acolheu Ulisses e sua tripula~o com hospitalidade durante urn meso Na partida,

deu ao hero; urn saco (urn odre) contendo todos as ventos desfavoraveis. deixando de fora

apenas a brisa que as levaria de volta a patna, denominada de Zefiro. A tripulat;Ao assim partiu

navegando no mar por nove dias. No decima, quando conseguiram avistar urn sinal longe de

itaca, 0 her61, exausto, adormeceu. Seus homens, desconfiados que Eolo havia Ihe dado um

saco de ouro, abriram 0 odre de ventos destavoraveis, deixando todos escaparem. A tripula~o

fol jogada imediatamente ao sentido contrario do qual estavam, chegando novamente a ilha de

Eolo, que dessa vez nao as acolheu com hospltalidade. 0 Dono dos ventos disse que

provavelmente as Deuses nao desejavam a retorno de Ulisses e sua tripula~o, portanto nao

havia nada que ele pudesse fazer.

Entristecido, Ulisses voltou a navegar, chegando - no setimo dia - aLamos,

cidade da Lestrig6nia, terra dos gigantes e antrop6fagos lestrigoes, povos que

habitavam a regiao de F6rmias, ao sui de Laclo, ou 0 porto siciliano de Leontinos. Os

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Lestrigiles eram uma tribo de canibais, que, sob a ordem de seu rei, 0 gigante Antifates,

precipitaram-se sabre as homens enviados por Ulisses, devorando logo urn deles e

arremessando em seguida blocos de pedra sobre a frota ancorada em seu porto.

Oestruiram todas as naus, menes a de Ulisses, que estava mais distante.

-Depois, de cima dos rochedos, lanyaram sobre n6s pedras imensas.

levantou-se logo das naus 0 grito medonho dos que morriam

e 0 estrepito das naus que se partiam. E os lestrigoes,

cortando os homens como se fassem peixes,

levavam-nos para um trisle banquete. "

(Od. X, 121-124)

Assim, com urn unico navio. 0 heroi navegou em direcao a ilha de Eeia, cuja

localizayao e impassivel, mas podendo ser identificada com Malta au com urna ilha

situada na entrada do Mar Adriatico, contribuindo com a fantastica geografia mitica de

Homero. A ilha fabulosa era residencia da feiticeira Circe - filha de Helio e Perseida,

irma do valente Eetes. Ulisses enviau vinte e tres de seus tripulantes para explorarem 0

lugar. Quando esses chegaram ao palacio da maga foram recebido cordialmente por

ela, que os fez sentar e preparou-Ihes uma poyao.Em seguida, com sua varinha

magica, os transformou em animais semelhantes a porcos. 0 unico que escapou do

encantamento foi Euriloco. que nao havia entrado no palacio da bruxa.

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Ulisses se dirigiu ao local, em busea de seus companheiros. Quando se

aproximava do Palacio, Hermes apareceu, sob a forma de um adolescente. Esse

ensinou ao heroi 0 segredo para escapar do feiti~o, dando-Ihe a planta magica

denominada m61i, que deveria ser colocada na POIY80 que a feiticeira faria a Ulisses.

Quando entrou no palacio, Circe ja foi logo Ihe dando a bebida, tocando-o com a

varinha e dizendo toda confiante:

·Va agora deitar com as Quiros companheiros na pocilga"

(Od. X, 320)

Porem, a bruxa ficou surpresa quando viu que sua magica naD havia funcionado

com 0 her6i. Ulisses, com sua espada nas maos - conforme Hermes havia aconselhado

- exigiu que a feiticeira devolvesse a forma normal de seus companheiros e ainda

desfrutou de um ano de hospitalidade em seu palacio e de seu amor. Ap6s esse

periodo, a heroi partiu em direlfSo ao mundo ctonio, a mundo das sombras, a Hades.

Circe havia aconselhado Ulisses a ir aD mundo das sombras, com 0 objetivo de

consultar a alma do adivinho Tiresias, para saber como eles fariam para retornar a

Itaca.

"Ali esta a terra e a cidade dis Cimerios,

cobertas pela bruma e pelas nuvens:

jamais recebem um (mica raio do sol brilhante."

(Od. XI, 14-16)

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Ulisses, chegando ao local, deixou a nau junto aos bosques consagrados a

Persefone e, a beira-mar, abriu urn fossa e realizou as sacrificios rituais aconselhados

por Circe. Quando 0 sangue penetrou no fossa, as almas vieram a tona.

"... 0 sangue negro corria e logo as a/mas dos mortos,

subindo do Hades, se ajuntaram. "

(Od. XI, 36-37)

Ulisses pode conversar com muitas sombras e, especialmente, com a adivinho

Tiresias, que informou a Ulisses que ele regressaria a sua patria sQzinho, em eima de

urn barco estrangeiro. E que depois, ele partiria novamente, a procura de urn povo que

nao possuia as habilidades da navegayao. E que, alern disso, ele faria urn sacrificio a

Posidon e morreria velho, feliz e em terra firme.

De volta, ainda urna pequena permanemcia na ilha de Eeia, Ulisses ouviu atento

aos conselhos de Circe a respeito de como passar pelas Sereias e pelos monstros Cila

e Caribdes, ah~m da proibi-;:ao de comerem as vacas de Helio. Ulisses partiu para uma

nova aventura, que 0 levou em direyao ao oeste. Seu primeiro encontro toi com as

sereias, localizadas possivelmente no Mediterraneo Ocidental, pr6ximo a Sorrento. As

sereias antrop6tagas tentariam encantar 0 her6i atraves de seus cantos. Depois,

atirariam todos nos recites, devorando-os. Para evitar que isso acontecesse, Ulisses e

seus companheiros deveriam tapar os ouvidos com cera. E, se caso 0 her6i ordenasse

aos seus tripulantes que 0 deixassem ouvir os cantos - por nao resistir a tentayao -

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esses deveriam amarra-Io ao mastro. Quando a "au se aproximou. as sereias iniciaram

seu canto.

"Aproxima-fe daqui, preclaro Uiisses, gl6ria ilustre dos aqueus!

Detem a nau para escutares nossa voz. Jamais a/guem

passou par aqui, em escura nave, sem que primeiro

Quvisse a voz mellflua que sa; de nossas bacas.

Somente parliu ap6s se haver de/eitado com ela

e de fiear sabendo muitas eoisas. Em verdade sabemos tudo ..

(Od. XII, 184 - 189)

As sereias eram tithas do rio Aqueloo e de Melpomene ou de Esterope. Eram, a

principia, duas: Partenope e Ligia; depois tn§s: Partenope, Leucosia e Ligia; e depois

quatro: Tetes, Redne, Molpe e Telxiope. Eram jovens muito belas, que participavam do

cortejo de Persefone. Quando Hades a raptou, as sereias pediram asas aos deuses,

para que elas pudessem procurar Persefone na terra, na agua e no ar. Demeter, irritada

par elas nao terem impedido a rapto de Persefone, transformou-as em monstros. Meio

mulheres e meio passaros, au mulher na parte de cima e peixe na parte de baixo, as

sereias se tornaram dem6nios marinhos. Eram habeis musicas e cantoras: Partenope

tocava lira; Leuc6sia cantava e Ugia tocava f1auta. Utilizavam 0 canto para atrairem as

homens, prenderem-nos e devortl-los.

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Passados pelas sereias, as aqueus enfrentariam Cila (urn monstro de seis

cabe93s, que habitava urn rochedo) e Caribdes (urn monstro, que absorvia grande

quantidade de agua, devorando tudo que nela estivesse). Quem escapasse de urn,

provavelmente seria devorado par Dutro. A localizat;ao do penhasco em que se

escondiam as dais monstros e defendida como 0 estreito de Messina, entre a Italia e a

Sicilia. Seguindo a canselho de Circe, Ulisses decidiu passar mais perte de Cila, mas

mesmo assim perdeu seis de seus companheiros.

Apes enfrentarem as monstros, Ulisses e seus companheiros navegaram em

direc;ao a ilha de Helio, chamada Trinacia. La, permaneceram durante urn mes, par

fon;a dos ventos. Nessa terra pastavam vacas do Deus Sol, que eram sagradas.

Ulisses ja tinha sido advertido que nao poderia come-las, parem, seus homens nao

resistiram e devoraram as mel hares vacas do Deus. Assim estava feita a desgrac;a.

Quando 0 barco voltou a navegar, uma tempestade se formou e, Zeus - a pedido de

Helio - com seu raio, destruiu a navio, onde somente Ulisses sobreviveu, par nao ter

participado do banquete das vacas. Agarrando-se aos destroc;os, a her6i se deixou

levar pelos ventos.

"Partin do daJi errei par nove dias; na decima noite

os deuses conduziram-me para a ilha de Oglgia,

onde mora Calipso, de linda Cabeleira ..

(Od. XII, 447-449)

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A ilha de Ogigia e imaginada na regiao Ceuta, na costa marroquina. 0 heroi,

semi-morto, foi acolhido, cuidado e amado pela ninfa Calipso durante dez anos. Param,

Atena, que protegia Ulisses, solicitou a Zeus que enviasse uma mensagem, atraves de

Hermes, a ninta, pedindo que ela deixasse 0 her6i partir. Assim, Cal ipso forneceu a

Ulisses 0 material necessario para construir uma jangada. No quinto dia, 0 her6i partiu.

Quando Ulisses estava quase chegando a sua patria, Posidon - querendo vingar seu

filho Polifemo - enviou uma tempestade, a qual quebrou a jangada do heroi.

"Assim dizendo, Posidon reuniu as nuvens, empunhou 0 fridente

e sacudiu 0 mar. Transformou lodos as ventos em procelas

e, envolvendo em nuvens a terra e 0 mar,

fez descer a neUe do ceu."

(Od. V, 291-294)

Ulisses se agarrou a uma prancha da jangada e ao veu precioso que 0 protegia,

dado por Ino Leucott~ia. Apos tres dias no mar, alcanryou terra firme, a ilha dos Feaceos

(provavelmente a ilha de Corfu). Esgotado, 0 heroi dormiu na mata. A princesa

Nausicaa - filha dos reis Alcinoo e Arete - inspirada par Atena, decidiu lavar 0 seu

enxoval de casamento no rio. La, ela e suas companheiras comec;aram a brincar nas

aguas, despertando 0 heroi, que solicitou ajuda it princesa. Eta the deu comida e roupa,

pois 0 heroi estava nu, e convidou-o a conhecer 0 palacio.

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Os Feaceos levavam urna vida luxuosa e tranqGila. Alcinoo, 0 rei, ofereceu a

Ulisses excelente hospitalidade. Durante urn banquete, 0 rei de Itaca solicitou ao aedo

Oemodoco que cantasse as acontecimentos de Troia. Ulisses se emocionou muito,

levando Alcinoo a perguntar sabre as aventuras que vivera. Assim, 0 heroi narrou todas

as suas aventuras. 0 rei sugeriu que Ulisses se casasse com sua filha, Nausicaa.

Porem, 0 heroi recusou, alegando a saudade de sua esposa e filho. No dia seguinte, 0

rei embarcou Ulisses em urna das "aus, que a levaria de volta a patria, acompanhado

de presentes.

"Ela corria com tanta seguran98 e firmeza,

que, nem mesma a falcao, a mais ligeira das aves,

poderia segui-Ia. n

(Od. XIII, 86-87)

Em urna noite, as marujos de Alcinoo alcanc;aram Itaca, deixando 0 her6i

adormecido na praia, com seus presentes escondidos em uma oliveira. Posidon,

vigilante, transformou a nau que retornava em urn grande rochedo.

Em Itaca, quando Ulisses estava ausente, devido a guerra de Tr6ia, seu pai

Laerte ja nao reinava mais. Sua mae Anticleia havia morrido de saudades do filho.

Telemaco, ~o que combate, °que atinge a distancia", filho de Ulisses e Penelope, era

muito crianc;a quando 0 pai partira. Quando completou dezessete anos, Telemaco

decidiu partir em busca do pai, com a orientayao de Atena - pois os pretendentes de

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Penelope planejavam mata-Io. Todos julgavam que Ulisses estava marto. Assim, cento

e oito pretendentes passaram a usufruir das propriedades do heroi, com festas e

banquetes, bern como a cortejar a mao de Penelope. Os subordinados do pal,kio, fieis

a Ulisses, eram humilhados. Penelope, esposa de Ulisses, aparece como 0 simbolo da

fidelidade, pois 0 esperou durante vinte anas. Pressionada pelos pretendentes para

escolher urn novo marido, Penelope prometeu que quando acabasse de tecer uma

mortalha para Laerte, ela escolheria um deles como marido. Assim, de dia ela tecia,

mas a noite ela desfazia 0 trabalho. 0 plano durou tres anas, ate uma de suas servas a

denunciarem.

Quando acordou, Ulisses tai disfan;:ado de mendigo per Atena. 0 her6i decidiu ir

primeiro a casa de Eumeu, seu porqueiro, ° rnais fiel de seus servos. Ele pretendia

passar por desconhecido, para atualizar-se de tudo que estava acontecendo em seu

palacio, para entao, elaborar urn plano para retornar 0 seu reinado. Telernaco, nesse

momenta, ja esta de volta em ftaca. Pai e filho se reconhecessem no porcariyo. AIE~mda

fidelidade de Eumeu, Ulisses pode contar com a fidelidade do seu cao, Argos, que a

reconheceu, mesrno disfaryado e, na sequencia, morreu.

aE um cao, que estava deitado, erguendo a cabeqa,

erir;ou as ore/has: era Argos que a paciente Uiisses havia

eriado antes de ir para a sagrada ilion (...)

Abandonado na ausencia de seu senhor, rolava diante do portal

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sobre as estrumes das mulas e dos bois.

Ali estava deitado Argos, comido das carraY8s.

Venda aproximar-se Uiisses, agitou a cauda e baixou a cabeY8.

Fa/taram-Ihe {oryas para chegar ate ande estava 0 seu senhor.

Este, voltando a cabe9a, chorou ..

(Od. XVIII, 291 - 304)

Ulisses foi mal recebido em seu palacio, disfar9ado de mendigo, pelo

pretendente AntinoD. 0 heroi foi insultado e obrigado a lutar com 0 mendigo lro, para 0

divertimento dos pretendentes. Telemaco interferiu seguramente, para evitar que 0 pai

passasse par novos vexames. Penelope 0 recebeu com muita hospitalidade, mas sem

saber quem ele realmente era. Ela falava da saudade que sentia de seu marido:

"Saudades de UJisses me consomem docemente 0 coray8o.

as pretendentes apressam minhas nupcias:

eu me defendo com ardis. n

(Od, XIX, 136 - 137)

Eurich§ia, uma fiel ama do heroi, quase colocou a plano a perder, pais ao lavar as

pes de Ulisses, par ordem de Penelope, a criada reconheceu a cicatriz na perna do

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heroi. Porem, ele logo pediu silemcio a ela, antes que 0 segredo fosse revelado, e 0

plano perdido.

"Esia cicafriz, pais, reconheceu-a a ancia, tao logo 0 tocou

e apa/pou com a palma da mao e, largando-Ihe 0 pe,

a perna bateu na bacia: 0 bronze cantou e inclinando-se

a bacia, a agua entomou-se ..

(Od. XIX, 467-470)

A hora da vinganc;:a se aproximava. Atena inspirou Penelope a apresentar aos

pretendentes 0 areo de Ulisses, para a celebrac;ao que daria inicio a eliminac;ao de

todos eles. Segue a proposta de casamento de Penelope:

"Escutai-me, ilustres pretendentes (.. .) nao podeis apresentar

Dutro pretexto, a nao ser 0 desejo de me tomar par esposB.

Animo, paiS, pretendentes: 0 premia do combate esta a vista!

Apresentarei 0 grande areo do divino Ulisses e aquele que,

tomando-o nas maos, conseguir arma-/o mais faci/mente,

e fizer passar uma flecha pelo orificio dos doze machados,

A este eu seguirei ... "

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(Od. XXI, 68-77)

o orgulhoso Antinoo comanda a organizat;ao para a prova.

"Levantai-vas em ordem, companheiros,

Da esquerda para a direita. "

(Od. XXI, 141)

Nenhum dos pretendentes conseguiu ao menDS estica-Io, pais 0 areo 56 obedece

a vontade de seu senhor, no caso, Ulisses. IS50 aconteee devido a urna energia

poderosa chamada mana, que Ihe advem de sua origem. Penelope insistiu para que 0

mendigo tentasse a prava do areo e as pretendentes se viram obrigados a permitir.

a(...) 0 astuto Uiisses, contudo, apenas tomou e inspecionou

Em todos os sen/idos 0 grande areo,

Armou-o sem dificuldade alguma.

(...J Dos pretendentes, porem, se apossou uma grande magoa

e mudaram de cor ... "

(Od.404-412)

Ulisses disparou a fJecha e naD errou nenhum dos machados, desde 0 primeiro

orifida. Depois, abandonou 0 seu disfarce de mendigo e tomou novamente sua

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aparencia de her6i. E assim, deu inicio ao exterminio dos pretendentes. Antinoo foi 0

primeiro. A morte atingiu todos as pretendentes. Dos servos, foram poupados apenas

quatro. Doze escravas infieis fcram enforcadas.

Penelope resistia em acreditar que aquete era 0 seu marida. Assim, ele teve que

the dar urna prova de algo que somente eles sabiam. 0 rei de Itaca descreveu

detalhadamente 0 leito conjugal, que ele mesma havia feito. 0 grande detalhe era 0 pe

da cama, construido com urn tronco de oliveira.

"(.. .) e a Penelope, no mesmo instante, desfaleceram as joelhos

E 0 corar;aoamante, reconhecendo as sinais que Ulisses

Dera sem hesitar. Correu direta para ele com as lagrimas nos a/hos

E lan,ou as bra,os em tome de seu pesco,o ..

(Od. XXIII, 205-208)

Como estava de madrugada, a pouco para amanhecer, Atena prolongou a noite,

para que 0 heroi e sua amada tivessem mais tempo para matar a saudade.

Os parentes dos pretendentes mortos, arm ados, foram protestar e vingar seus

entes queridos. Ulisses, Teh~maco, Laerte e outros - orientados por Atena - lutaram

contra todos. 0 episodio teria side uma imensa extermina98.0, se nao fosse a

intervenc;ao da propria deusa.

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"Fifho de Laerte, da estirpe de Zeus,

Ulisses fecundo em recursos, suspende 0 combate (.. ).

Assim falou Atena e ele obedeceu de cora,ao alegre.

Depois, entre as duas partes, foi ce/ebrado

um pacta solene para as tempos futuros,

obra de Palas Atena, filha de Zeus, portador da Egide."

(Od. XXIV, 542-547)

Oessa forma, cumprem-se as profecias de Tiresias, as quais diziam que Ulisses

morreria em terra firme, feliz e tranqOilo. A paz volta a reinar em itaca, gra~as a

imposi~o de Palas Atena.

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4.2. RESUMO DOS CANTOS

Canto I

Atenas questiona Zeus por que ele esqueceu Ulisses. Zeus responde que a ira

de Posidon impedira 0 retorno do her6i Ulisses a itaca, mas que agora, com 0

afastamento de Posidan, porque esse estava visitando as etiopes, Ulisses poderia dar

inicio ao seu regresso. Atena, disfan;ado como Mentes, visita Teh§maco, filho de

Ulisses, instruindo-o a procurar noticias de seu pai, para tomar medidas contra os

pretendentes.

Canto II

Telemaco convoca uma assembh~ia para denunciar as pretendentes, a qual nao

surtiu 0 efeito desejado. Sendo assim, Telemaco parte - em segredo e acompanhado

de Atena (disfar~ada de Mentor) - para Pilos, em busca de Nestor, para obter

informa90es de seu pai.

Canto III

o rei Nestor diz nao ter informa90es de Ulisses, mas conta 0 regresso de Qutros

her6is. Ele ordena que seu filho Pisistrato acompanhe Telemaco ate Esparta.

Canto IV

Em Esparta, no palacio de Menelau, Telemaco e seus companheiros sao

recebidos pelo rei e por Helena, de volta ao trono. Menelau conta que Ulisses era

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mantido cativo pela ninfa Calipso. Enquanto issa, Penelope e as pretendentes ficam

sabendo a respeito da viagem de Telemaco, que pretendem mata-Io quando ele voltar.

Canto V

Hermes e enviado a Cal ipso, par ordem dos Deuses, solicitando que a ninfa

liberte 0 her6i. A ninfa fomece ao her6i material para ele construir urna jangada. Ulisses

navega em direc;ao a sua patria, porem, Posidon 0 faz naufragar em urna tempestade.

Nu e ferido, Ulisses consegue chegar a terra dos Feaceos.

Canto VI

Ulisses e descoberto pela princesa Nausicaa e suas criadas. 0 her6i implora

hospitalidade, e a princesa 0 convida para conhecer 0 palacio.

Canto VII

Ulisses pede aos pais de Nausicaa, a rei Alcinoo e a rainha Arete, que 0 ajudem

a regressar. 0 heroi conta algumas de suas aventuras. 0 rei sugere que Ulisses case

com Nausicaa, porem 0 heroi recusa, por desejar voltar a sua patria e rever sua familia.

Canto VIII

o rei Alcinoo oferece uma festa, na qual 0 aedo Demodoco canta sobre os feitos

de Ulisses na guerra de Troia. 0 her6i chora de emoyao. Durante uma exibiyao atletica,

zombam de Ulisses, e ele e foryado a mostrar suas habilidades.

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Canto IX

Ulisses revela seu nome e conta tode 0 resto de sua historia: como ele e seus

companheiros partiram de Troia, atacaram Tracia, chegaram a terra dos lot6fa905 e

desembarcaram na ilha dos Ciclopes. 0 her6i narra como toi capturado par Polifemo e

como conseguiu escapar do gigante.

Canto X

Ulisses continua a sua hist6ria, contando como ele e seus companheiros

chegaram a ilha do deus Eclc, que lhes deu urn saco contendo as ventos desfavoraveis

ao retorno, 0 qual foi aberto pelos companheiros de Ulisses, libertando tai5 ventos que

enviaram tada a tripulayao de volta a ilha. Depois desse episodio, eles atingiram a ilha

dos lestrigoes, cnde 11 navias fcram destruidos. Par fim, chegaram a ilha da feiticeira

Circe, que transformou alguns dos homens de Ulisses em porcos. Apos um ano, Ulisses

resotveu partir, seguindo 0 conselho de Circe, que orientou 0 heroi a viajar ao Hades,

em busca do adivinho Tiresias, para obter informac;:oes de como regressar a Itaca.

Canto XI

Ulisses relata a sua visita ao hades, onde Tiresias the deu provisoes e

orientac;:oes. Ulisses tambem teve a oportunidade de falar com sua mae, 0 rei

Agamemnon, Aquites e Hercules.

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Canto XII

Ulisses conclui sua hist6ria aos Feaceos, contando que perdeu muitos homens

entre as monstros Cila e Caribdes, que navegou entre as sereias e que desembarcou

na ilha do deus Sol, 0 qual guardava seu gada. Embora advertidos que naD poderiam

comer as vacas sagradas, as tripulantes de Ulisses comeram algumas. Zeus, como

punic;ao, destruiu as navios com um raio, sobrevivendo somente Ulisses, que vagou ate

chegar a ilha de Cal ipso.

Canto XIII

o rei Alcinoo envia Ulisses em uma de suas naus, repleto de presentes, ern

direc;:aoa Itaca. Os marinheiros Feaceos 0 deixam na praia, enquanto ele estava

adormecido. Atena aparece para 0 her6i, propondo ajuda-Io contra as pretendentes,

disfar",ndo-o de mendigo.

Canto XIV

Ulisses, disfaryado, e recebido pelo porqueiro Eumeu e inventa hist6rias sabre si

mesmo.

Canto XV

Teh§maco volta para casa e evita cair na armadilha dos pretendentes. Eumeu

conta a Ulisses a hist6ria de sua vida.

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Canto XVI

Telemaco chega a cabana do porqueiro Eumeu, cnde Ulisses se revela a ele. Os

dais planejam como se ]ivrar dos pretendentes.

Canto XVII

Telemaco voila ao palacio e tala com Penelope. Os prelendenles insullam e

humilham Ulisses, que estava disfar~do de mendigo. Argos, 0 cao fiel de Ulisses, 0

reconhece e, na seqOencia, morre.

Canto XVIII

Ira, mendigo de verdade, e Ulisses brigam em uma luta. Penelope recebe

presentes dos pretendentes. Qutros pretendentes insultam Ulisses.

Canto XIX

Orientados par Atena, Ulisses e Telemaco retiram todas as armas do sa lao. 0

heroi, disfar~dot conta a Penelope que encontrou seu marido. Euricieia. a fiel criada do

heroi, lava seus pes e 0 reconhece atraves de uma cicatriz.

Canto XX

Ulisses, impaciente, nac consegue donnir. Os pretendentes continuam a zombar

do her6i.

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Canto XXI

Penelope traz 0 areo de Ulisses e anunda a prova, cnde 0 vencedor ganharia a

sua mao em casamento: as pretendentes devem atirar urna f1echa atraves de varios

oriffcios. lodos tentam, mas fracassam. Ulisses atira com seu areo e aeerta.

Canto XXII

Ulisses revela sua identidade aos pretenctentes e mata primeiro Antinoo. Depois,

continua a matanc;:a, com 0 auxflio de Eumeu, Telemaco entre Qutros. Doze criadas

infieis sao enforcadas tambem.

Canto XXIII

Euricleia conta a Penelope que Ulisses havia voltado, mas a rainha se recusa a

acreditar. 0 her6i e posto a prova, tendo que falar alga que somente as dais sabiam.

Par fim, Penelope 0 reconhece.

Canto XXIV

As almas dos pretendentes chegam ao hades. Ulisses visita seu pai, Laerte.

Parentes dos pretenctentes planejam vingan~, mas Atena imp6e paz duradoura a

Itaca.

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5.0. BANCO DE IMAGENS

1. Busto de Homero.

C6pia romana de um original grego do periodo helenistico. 0 aedo cego visto

pelos gregos e romanos.

2. Um rapsodo.

Anfora atica com figuras vermelhas atribuidas ao pintor Cleofrades, c. 480

a.C.

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3. Mascara mortuaria de DUro do rei Agamemnon.

Museu Nacional de Atenas.

4. Ulisses vasa 0 olho do Ciclope Polifemo.

Museu de EIElusis.

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5. Ulisses Quve 0 canto das sereias.

Vaso grego do seculo V a.C.

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6. Zeus.

Escultura grega do seculo IV a.C.

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6.0. CONCLUSAO E ANALISE FINAL

De acordo com 0 estudo proposto, Mitologia refere-se a uma ciencia que estuda

a origem, 0 nascimento e 0 desenvolvimento dos mitos, atraves de grandes pesquisas

hist6ricas provenientes das mais variadas fontes. Ah~m dissa, Mitolegia refere-se

tambem ao conjunto de mites de urn grupo social especifico, transmitidos ao longo de

uma gerayao. Todos as povos criaram lendas, ou relatos fabulosos, durante a sua

evolu9ao, buscando explicar as origens do mundo e as conseqOencias das atitudes

humanas.

Essas hist6rias fantasticas fazem parte do que chamamos de mito, que e um

corpo de narrativas que eontam 0 que se passou nos tempos primordiais, referindo-se

sempre a cria~o e as origens. Alem dessa definiyao, temos 0 mito como uma imagem,

urn simbolo, ou seja, urn meio de explicar os misterios do universo.

A narrativa mitica nao pode ser considerada nem verdadeira, nem talsa, pois

elas sao preservadas para manter vivas diversas praticas sociais, possibilitando a

inser930 de um grupo denlro de um sislema de regras. A fun930 do milo e lanlo poelica

quanta religiosa, pois ambas se combinam entre si, com 0 objetivo de proporcionar ao

hom em 0 acesso ao conhecimento divino e ao conhecimento de si pr6prio. Dessa

forma, 0 mito se apresenta como urn meio importante de investigayao da hist6ria,

revelando seus acontecimentos.

o mito e preservado atraves da tradiyao oral, que ocorria em rituais e em

situac;oes socia is especificas. Essa preserva~ao e transmissao eram realizadas por

alguns personagens sociais especificos, tais como: 0 pai, 0 rei, os videntes, os profetas

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e, principalmente, as poetas - indivlduos considerados mestres da sabedoria, que

possuiam 0 acesso exclusivo as origen5, atraves de heranc;a, ou inspirayao divina, ou

lon905 treinamentos em tecnicas de memorizac;ao e versificac;ao.

A cornposi~o dos cantos na tradi~o oral era feita atraves de f6mnulas

recitativas, que facilitavam a memorizat;ao e que eram preselVadas a medida em quem

erarn transmitidas de gera~o em gerac;ao. Mesmo havendo alguma recriayclo por parte

do aedo que recitava urna narrativa, seu trabalho se dava dentro de regras precisas de

composic;ao.

Urn dos principais autores da mitologia grega, responsavel pela transmissao dos

mitos toi Hornero. Porem, nae possuimos informac;oes concretas, que possam ser

tomadas como veridicas, a respeito desse grande autor. Temos apenas possibilidades,

baseadas nas pesquisas de grandes estudiosos.

Dentre essas possibilidades, temos os gregos que acreditavam que Homero era

urn unico poeta, homern de carne e osso. Porem, ha alguns autores que acreditam que,

na verdade, se tratava de urn grupo de poetas, devido a cornplexidade da obra. Existern

tam bern aqueles que acreditam que Homero era 0 nome dado a arte dos bardos (dos

poetas). E por tim, ainda ha aqueles que questionarn se Homere de fato existiu. Cada

urn possu; suas teorias e seus argumentos, porem, nao ha prova concreta que tome

qualquer uma das versoes veridica.

o local de nascirnento do autor tarnbern e disputado entre sete cidades gregas,

ah§m de haver controversias entre a data de seu nascimento. Independente de tais

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questionamentos ha urn Homero, considerado urn dos maio res paetas que ja existiu,

autor dos grandes poemas lJiada e Odisseia.

Esse poeta era chamado de rapsodo, compositor e interprete de canr;oes epicas.

Ou ainda de aeda, palavra que ern 9re90 significa Ucantor". Acredita-se que a maio ria

desses paetas cantores eram cegos e que viajam de cidade em cidade, se

apresentando, propagando os mitos lendarios, atraves de uma composi9ao mel6dica

sistematica, acompanhada de urn instrumento musical.

A Odisseia, urn dos poemas de Homero esta entre as primeiras epopeias da

lingua grega, considerada urn mito. Ela narra as aventuras do her6i Ulisses, contando

seu regresso a sua patria, ap6s a guerra de Troia. Ela se caracteriza peJa mistura do

humano e do super-human~, contando historias de combate entre deuses e deusas; e

narrando aventuras de grandes her6is. A epopeia aborda os debates e desafios do

homem, ampliando-os a uma proporyao universal atraves do mito.

A obra compreende tres conjuntos: 1. Telemaquia: composta pelos quatro cantos

iniciais, no qual 0 filho de Odisseu (Telemaco) e 0 protagonista; 2. Regresso, cantos 5 a

12: que narram as aventuras de Odisseu em seu retorno a patria; 3. Itaca, cantos 13 a

24: que mostram a reconquista do palacio pelo her6i em itaca. A narrativa nao

ultrapassa a capacidade de memoriza'Yao, pais apesar do her6i estar envolvido em

aventuras que duraram dez anos, tudo e contado de forma resumida, passando de um

evento para 0 outro.

Ulisses, um dos maiores her6is ja existentes, e caracterizado por inumeras

qualidades, tais como: ser cavalheiro, inteligente, esperto, astuto, forte, bonito,

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guerreiro. pai, esposo, amante, conquistador, estrangeiro, rei, lider, entre Qutros,

virtudes as quais serviam de exemplo e modelo de conduta da epoca. Suas aventuras

descrevem um her6i, que ultrapassava as limites do universa, viajando a lugares

desconhecidos, lutando em batalhas memoraveis e superando desafios impossiveis,

mas sem perder a sua caracteristica humana.

o acesso a mitologia grega e aos mitos nos permite mergulhar em urn rnundo

misterioso, que buscava explicar as origens primordiais do universa, bern como a

homem em si. Tais relates lendarios, como as contidos na Odisseia, nos liberam para a

fantasia e para a imaginayao, contidas no fantastico. Ao lermos a obra e tomarmos

conhecimento dos seus mitos, temes a oportunidade de viver sonhos assustadores,

ricos ou reais, ah3m de entrarmos em contato com 0 nosso eu interior mais intimo,

libertando-nos dos pad roes de confinamento.

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