Suma teológica questão 149 sobriedade e questão150 embriaguez

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    Rafael, A Temperana (1511)A Sobriedade

    1Ts 5,6No durmamos, pois, como os demais. Mas vigiemos e sejamos sbrios.1Tm 3,2Porque o bispo tem o dever de ser irrepreensvel, casado uma s vez,sbrio, prudente, regrado no seu proceder, hospitaleiro, capaz de ensinar.Tt 2,2Os mais velhos sejam sbrios, graves, prudentes, fortes na f, nacaridade, na pacincia.

    1Pd 1,13

    Cingi, portanto, os rins do vosso esprito, sede sbrios e colocai todavossa esperana na graa que vos ser dada no dia em que Jesus Cristoaparecer1Pd 5,8Sede sbrios e vigiai. Vosso adversrio, o demnio, anda ao redor devs como o leo que ruge, buscando a quem devorar.

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    PAPA JOO PAULO IIAUDINCIA GERAL

    A virtude da temperana[*]

    1. Na sucesso das Audincias do meu ministrio pontifcio, procureiexecutar o testamento do meu estimado Predecessor Joo Paulo I. Como sabido, ele no deixou testamento escrito, porque a morte o arrebatouinesperada e improvisamente, mas deixou alguns apontamentos de que seconclui ter-se proposto, nos primeiros encontros das quartas-feiras, falardos princpios fundamentais da vida crist, ou seja, das trs virtudesteologais e isto teve tempo de o realizar e depois das quatro virtudes

    cardeais isto o est fazendo o seu indigno sucessor. Hoje a vez de falarda quarta virtude cardeal, a temperana, acabando de cumprir assim,dalgum modo, o programa de Joo Paulo I, programa em que pode ver-secomo que um testamento do Pontfice falecido.2. Quando falamos das virtudes no s das cardeais, mas de todas e cadauma das virtudes devemos conservar sempre diante dos olhos o homemreal, o homem concreto. A virtude no alguma coisa de abstrato, separadoda vida, mas, pelo contrrio, tem profundas razes na vida mesma, dela

    brota, ela que forma. A virtude incide na vida do homem, nas suas aes eno seu comportamento. Disto resulta que, em todas estas nossas reflexes,no falamos tanto da virtude quanto do homem que vive e procedevirtuosamente; falamos do homem prudente, justo, corajoso e, por fim,hoje exatamente, falamos do homem temperante (ou sbrio).Acrescentemos imediatamente que todos estes atributos, ou melhor atitudesdo homem, provenientes de cada uma das virtudes cardeais, esto entre siconexas. No se pode, por conseguinte, ser homem verdadeiramente

    prudente, nem autenticamente justo, nem realmente forte, se no se tem

    ainda a virtude da temperana. Pode-se dizer que esta virtude condicionaindiretamente todas as outras virtudes; mas deve-se dizer tambm que todasas outras virtudes so indispensveis para que o homem possa sertemperante (ou sbrio).3. O prprio vocbulo temperana parece em certo modo referir-se aoque est fora do homem. Dizemos, de fato, que temperante aqueleque no abusa de alimentos, de bebidas e de prazeres, que no toma

    imoderadamente bebidas alcolicas, no se priva da conscincia pelo

    uso de estupefacientes, etc. Esta referncia a elementos externos ao

    * Quarta-feira, 22 de Novembro de 1978

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    humildade do corpo e a do corao. Esta humildade condionecessria para a "harmonia" interior do homem: para a beleza interior dohomem. Cada um reflita bem neste ponto, em especial reflitam os jovens, e

    mais ainda as jovens, na idade em que tanto se tem a peito ser belo ou bela,para agradar aos outros! Recordemo-nos que o homem deve ser belosobretudo interiormente. Sem esta beleza, todos os esforos que tenham emvista s o corpo no faro nem dele nem dela uma pessoaverdadeiramente bela.E no , por sinal, precisamente o corpo que sofre prejuzos sensveis emuitas vezes at notveis quanto sade, se falta ao homem a virtude datemperana, da sobriedade? A este propsito, muito poderiam dizer as

    estatsticas e as fichas clnicas de todos os hospitais do mundo. Dissopossuem tambm grande experincia os mdicos ocupados nosconsultrios, a quem muitas vezes se dirigem noivos e jovens em geral. verdade que no podemos julgar a virtude baseando-nos exclusivamente nocritrio da sade psicofsica, abundam todavia as provas de a falta davirtude da temperana, da sobriedade, vir a prejudicar a sade.6. preciso que eu termine aqui, embora esteja convencido de este assuntoficar mais interrompido do que esgotado. Talvez um dia se apresente aocasio de a ele voltar. Por agora, basta isto.

    Catecismo da Igreja Catlica

    TEMPERANA

    2407 O respeito s pessoas e aos seus bens Em matria econmica, orespeito dignidade humana exige a prtica da virtude da temperana, paramoderar o apego aos bens deste mundo; da virtude da justia, para

    preservar os direitos do prximo e lhe dar o que lhe devido; e da

    solidariedade, segundo a regra urea e segundo a liberalidade do Senhor,que se fez pobre, embora fosse rico, para nos enriquecer com sua

    pobreza.2341 A virtude da castidade comandada pela virtude cardeal datemperana, que tem em vista fazer depender da razo a paixes e osapetites da sensibilidade humana.2517 A purificao do corao O corao a sede da personalidade moral: do corao que procedem ms intenes, assassnios, adultrios,

    prostituies, roubos, falsos testemunhos e difamaes (Mt 15,19

    ). A lutacontra a concupiscncia da carne passa pela purificao do corao e aprtica da temperana:

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    Conserva-te na simplicidade, na inocncia, e sers como a criancinhas, queignoram o mal destruidor da vida dos homens.

    2521 A pureza exige o pudor. Este uma parte integrante da esperana. O

    pudor preserva a intimidade da pessoa. Consiste na recusa de mostraraquilo que deve ficar escondido. Est ordenado castidade, exprimindo suadelicadeza. Orienta os olhares e os gestos em conformidade com adignidade das pessoas e de sua unio.1809 A temperana a virtude moral que modera a atrao pelos prazerese procura o equilbrio no uso dos bens criados. Assegura o domnio davontade sobre os instintos e mantm os desejos dentro dos limites dahonestidade. A pessoa temperante orienta para o bem seus apetitessensveis, guarda uma santa discrio e no se deixa levar a seguir as

    paixes do corao. A temperana muitas vezes louvada no AntigoTestamento: No te deixes levar por tuas paixes e refreia os teus desejos(Eclo 18,30). No Novo Testamento, chamada de moderao ousobriedade. Devemos viver com moderao, justia e piedade nestemundo (Tt 2,12).

    Viver bem no outra coisa seno amar a Deus de todo o corao, de toda aalma e em toda forma de agir. Dedicar-lhe um amor integral (pelatemperana) que nenhum infortnio poder abalar (o que depende da

    fortaleza), que obedece exclusivamente a Ele (e nisto consiste a justia), quevela para discernir todas as coisas com receio de deixar-se surpreender peloardil e pela mentira (e isto a prudncia).

    1838 A temperana modera a atrao dos prazeres sensveis e procura oequilbrio no uso dos bens criados.2290 A virtude da temperana manda evitar toda espcie de exceo, oabuso da comida, do lcool, do fumo e dos medicamentos. Aqueles que, emestado de embriaguez ou por gosto imoderado pela velocidade, pem emrisco a segurana alheia e a prpria, nas estradas, no mar ou no ar, tomam-se gravemente culpveis.1805 Quatro virtudes tm um papel de dobradia (que, em latim, se dizcardo, cardinis). Por esta razo so chamadas cardeais: todas as outrasse agrupam em torno delas. So a prudncia, a justia, a fortaleza e atemperana. Ama-se a retido? As virtudes so seus frutos; ela ensina atemperana e a prudncia a justia e a fortaleza (Sb 8,7). Estas virtudes solouvadas em numerosas passagens da Escritura sob outros nomes.

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    Suma TeolgicaSo Toms de Aquino

    Parte II-IIQuesto 149 Sobriedade

    Passemos agora a considerar a Sobriedade e seu vcio oposto:embriaguez (q150).

    Sobre a Sobriedade se coloca quatro questes:1. Qual sua matria prpria? 2. uma virtude especial? 3. lcito o usodo vinho? 4. A quem convm, principalmente, ser sbrio?

    Artigo 1: a bebida o objeto da sobriedade?

    Objees: pelo que parece que a bebida[1] no objeto da sobriedade.1. Diz em Rm 12,3 [] no tenha de si mesmo um conceito mais elevadodo que convm, mas uma justa estima[a], ditada pela sabedoria, [].Portanto, a sobriedade se ocupa da sabedoria, e no s da bebida.2. Mas tambm: em Sb 8,7 se diz, da sabedoria de Deus. Que ela ensina a

    temperana[b] e a prudncia, tomando a sobriedade como temperana.Porm a temperana no se ocupa s da bebida, seno do alimento e dos

    prazeres venreos (sexuais). Logo a sobriedade no tem como nico objetoa bebida.

    [1] O termo de sobriedade pode ser confuso. Aqui no se fala abster-se de bebidasalcolicas, nem mesmo o excesso voluntria do consumo de vinho, que pode ser devido aoutras razes, tais como medicamento, mas o desejo imoderado no uso dessas bebidas, oucomo o mesmo So Toms, para o prazer desordenado (q.150 a.1) ou pelo simples prazerde beber vinho (1-2 Q.8 5, ad 1). Bem moral ferido aqui a obrigao de preservao nouso da razo que Deus nos deu. O que acontece que em tempos de So Toms no eraconhecido voluntariamente abrir mo de outros meios de razo que o consumo de vinho, porisso aqui laconicamente disse que o assunto adequada de sobriedade a bebida. Hojesabemos que h muito outros mais nociva e destrutiva de razo do que apenas uma bebida.[a] Em Latim: Rm 12,3Dico enim per gratiam, quae data est mihi, omnibus, qui sunt inter

    vos, non altius sapere quam oportet sapere, sed sapere ad sobrietatem, unicuique sicutDeus divisit mensuram fidei. A palavra sobientatem foi traduzida por seu sinnimojustaestima.

    [b] Em Latim: Sb 8,7Et, si iustitiam quis diligit, labores huius sunt virtutes: sobrietatemenim et prudentiam docet, iustitiam et fortitudinem, quibus utilius nihil est in vitahominibus. A palavra sobientatem foi traduzida por seu sinnimo Temperana.

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    3. e tambm: a palavra sobriedade parece haver sido tomada na obervaoda medida. Veja bem: devemos guardar uma certa medida em tudo no quese refere a ns. Por isso diz em Tt 2, 12 e a viver neste mundo com

    autodomnio[c]

    , justia e piedade, e na Glosa comenta[2]

    : Sobriamente emns. E 1Tm 2,9 diz: Quanto s mulheres, que elas tenham roupas decentes,se enfeitem com pudor e modstia[d]. Por isso parece que a sobriedade serefere no s ao interior, seno as coisas referentes ao ornato exterior. Logoa bebida no o objeto prprio da sobriedade.

    Por outro lado: est em Eclo 31,27(32)O vinho vida para o homem, quandoo bebe com moderao.[e]

    Soluo: O que dizer: as virtudes que recebem o nome de uma qualidadegeral a toda virtude reclama para si, de um modo especifico, aquela matriana qual sumamente difcil e til conservar sua condio. Assim, afortaleza reclama os perigos de morte e a temperana os deleites do tato.

    No entanto: a palavra sobriedade se deriva de medida. Ao dizer que algum sbrio indicamos que guarda uma medida. Por isso a sobriedade seapropria, de um modo especfico, uma matria na qual sumamentelouvvel o observar uma medida, com relao a bebida alcolica. Comefeito, o uso da bebida com moderao muito saudvel, enquanto que oexcesso faz muito mal, porque impede o uso da razo mais inclui o excessode comida. Por isso lemos em Eclo 31,28(36)Gozo do corao e alegria daalma: eis o que o vinho, (37)bebido a seu tempo e o necessrio.29(39)Amargura para a alma: eis o que o vinho, bebido em excesso, por

    [c] Em Latim: Tt 2,12 erudiens nos, ut abnegantes impietatem et saecularia desideria sobrieet iuste et pie vivamus in hoc saeculo. A palavra sobie foi traduzida por seu sinnimoautodomnio.

    [2] Glosa Interlineais (VI 129v.); Glossa Lombardi: PL 192,391. sobrie in nobis, et justead proximum, et pie ad Deum vivamus in hoc sculo tam fragili.

    [d] Em Latim: 1Tm 2,9similiter et mulieres in habitu ornato cum verecundia et sobrietateornantes se non in tortis crinibus aut auro aut margaritis vel veste pretiosa. A palavrasobrietate foi traduzida por seu sinnimo modstia.

    [e] Em Latim: Eclo 31,32quavit in vita vinum hominibus si bibas illud moderate erissobrius. A palavrasobrius foi traduzida por seu sinnimo moderao.Eclo 31,27(32)O vinho vida para o homem, quando o bebe com moderao. (33)Que vidase vive quando falta o vinho? (35)Ele foi criado para a alegria dos homens. 28(36)Gozo docorao e alegria da alma: eis o que o vinho, (37)bebido a seu tempo e o necessrio.29(39)Amargura para a alma: eis o que o vinho, bebido em excesso, por vcio e pordesafio. 30(40)O excesso de bebida aumenta o furor do insensato para sua perda, diminuia sua fora e provoca feridas.

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    vcio e por desafio. Por isso, a sobriedade se ocupa especialmente dabebida, no de qualquer bebida, seno da que, por sua qualidade espirituosa(teor alcolico), pode transformar a cabea, como so os vinhos e todas as

    demais bebidas inebriantes. Por outro lado, se tomamos a sobriedade nosentido genrico, pode-se aplicar a qualquer matria, exatamente igual aoque dizemos antes sobre a fortaleza e a temperana (q. 123 a.2; q. 141 a,2|).

    Resposta as objees:1. Na primeira devemos dizer: De igual modo que dizemos que o vinhomaterial embriaga o corpo, assim tambm, no sentido metafrico, se dizque a sabedoria uma bebida enebriante porque atrai a alma com seu

    deleite, segundo o Salmo 22,5

    o meu clice inebriante quo preclaro (nobre,belo) .[f] por isso se fala, por paralelismo, de uma certa sobriedade nacontemplao da sabedoria.2. Na segunda devemos dizer: Tudo o relativo a sabedoria necessrio paraa vida presente, e seu excesso mal. Por isso convm observar uma certamedida em todas as ordens, o qual a misso da sobriedade. Dai que, sob onome de sobriedade, se designa a temperana. Porm um pequeno excessode bebida mais prejudicial que outras coisas, e portanto a sobriedade seocupa especialmente da bebida.3. Na terceira dizemos: Embora se requeira uma certa medida em todo asordens, nem sempre se chama de sobriedade, seno s naquelas coisas naqual a medida (quantidade, limite) necessria.

    Artigo 2: a sobriedade, em si mesma uma virtude especial?

    Objees: pelo que parece que a sobriedade no , em si mesma, uma

    virtude especial.

    1. A abstinncia se ocupa da comida e da bebida. Mas no uma virtudeespecifica que se ocupe da comida. Logo tampouco uma virtudeespecifica a sobriedade, que se ocupa da bebida.2. Alm disso: a abstinncia e a gula tem por objeto os deleites do paladarem quanto sensao de alimento. No entanto: ambas, comida e bebida, so

    [f] Psl 22,5parasti in conspectu meo mensam adversus eos qui tribulant me inpinguasti in

    oleo caput meum et calix meus inebrians quam prclarus est.Sl 23,5Diante de mim preparas uma mesa, frente dos meus opressores; unges minhacabea com leo, e minha taa transborda.

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    alimentos, posto que o animal necessita alimento seco e mido. Logo asobriedade, que se ocupa da bebida, no uma virtude especifica.3. E tambm: assim como na ordem da nutrio distinguimos entre comida

    e bebida, assim tambm existem distintas classes de comidas e de bebidas.Por isso se a sobriedade fosse por si mesma uma virtude especfica, pareceque seria necessria a existncia de uma virtude especfica para qualquerdiferena de bebida ou comida, o que inadmissvel. Portanto, parece que asobriedade no uma virtude especfica.

    Por outro lado o fato de que Macrbio[3] diz que a sobriedade umaparte especial da temperana.

    Soluo: O que dizer: como j dissemos (q.146 a.2; cf. q.123 a.12; q.136a.1; q.141 a.3.), prprio de toda virtude moral conservar o bem racionalcontra os obstculos que podem impedi-lo. Por isso, sempre que exista umespecial impedimento para a razo, convm que exista uma virtudeespecfica para o supera. Tambm: o uso de bebida inebriante pode impediro uso da razo de um modo especial quando com sua emanao perturba ocrebro. Da que se requeira uma virtude especifica que retire esteimpedimento, e tal virtude a sobriedade.

    Resposta as objees:1. O que dizer: Tanto a comida como a bebida podem impedir o bem darazo, atra-la (prend-la) mediante o prazer imoderado, e para evit-lo esta abstinncia. Porm as bebidas alcolicas f-lo de um modo especial,como j dito. Por isso requer uma virtude especial.2. Na segunda dizemos que: A virtude da abstinncia no s se ocupa dacomida e bebida em quanto alimento, seno quando podem impedir o bom

    uso da razo. Por isso no preciso estabelecer uma virtude especial que sepreocupe deles enquanto elementos nutritivos.3. Na terceira dizemos que: Todas as bebidas alcolicas impedem o reto usoda razo de igual modo. Da decorre que para essa diversidade de bebidasno exista uma virtude para cada uma delas. Este argumento vale tambm

    para a diversidade de comidas.

    [3] Ambrsio Teodsio Macrbio (em latim: Flavius Macrobius Ambrosius Theodosius ou

    Ambrosius Aurelius Theodosius Macrobius) um escritor, filsofo e fillogo romano,autor das Saturnais e do Comentrio ao Sonho de Cipio. In somn. Scipion. l.1 c.8 (DD33).

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    Artigo 3: totalmente ilcito o uso do vinho?

    Em 1Tm 5,3No continues a beber somente gua; toma um pouco de vinho por causa de teu estmago ede tuas frequentes fraquezas.

    Objees: Pelo que parece que o uso do vinho (bebidas alcolicas) totalmente ilcito.

    1. Sem sabedoria ningum pode est em estado de graa, pois em Sb 7,28 sediz: pois Deus ama s quem habita com a Sabedoria. e mais adiante Sb9,18 diz: e os homens aprenderam o que te agrada, e a Sabedoria os

    salvou.[g]e tambm: o uso do vinho impede a sabedoria, j que diz: Ecl 2, 3:Ponderei seriamente entregar meu corpo ao vinho, mantendo meu corao

    sob a influncia da sabedoria. Logo sempre ilcito beber vinho (bebidasalcolicas).2. Mas tambm: o Apstolo diz em Romanos Rm 14,21: bom se abster decarne, de vinho e de tudo o que seja causa de tropeo, de queda ou deenfraquecimento para teu irmo. Mas deixar de praticar o bem da virtude eescandalizar aos irmos so vcios. Logo o uso do vinho ilcito.3. E tambm: disse So Jernimo [h] o vinho e a carne foram permitidosdepois do Dilvio, mas Cristo ( e ) veio no final dos tempos e

    restabeleceu o que era desde o princpio. Logo parece que, sob a LeiCrist, ilcito o uso do vinho (bebidas alcolicas).

    Por outro lado est o que diz o Apstolo em 1Tm5,23: No continues abeber somente gua; toma um pouco de vinho por causa de teu estmago ede tuas frequentes fraquezas. E Eclo 31,28(36) diz: Gozo do corao ealegria da alma: eis o que o vinho,(37)bebido a seu tempo e o necessrio.

    Soluo: O que dizer: Nenhuma comida, nem bebida so ilcita por simesma, j que o Senhor diz em Mt 15,11 Ouvi e entendei! No o queentra pela boca que torna o homem impuro, mas o que sai da boca, isto

    sim o torna impuro. Logo beber vinho (bebidas alcolicas), em si mesmo,no ilcito. No entanto, pode fazer-se ilcita acidentalmente, isso s vezesdevido a uma circunstncia por parte de quem bebe, quem facilmente afetado por ele, ou porque havia feito um voto de no beber, ou pelo modode beb-lo, se excede em quantidade. Tambm poderia resultar em um malao beb-lo quando serve de escndalo para os outros.

    [g] Sb 9,19et per sapientiam sanati sunt.[h] PL 23,248 Adversus Jovinianum Lib. I.

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    Respostas as objees:1. Na primeira o que dizer: h um duplo modo de possuir a sabedoria, em

    primeiro lugar, de um modo amplo, em quanto suficiente para salvar-se.

    Neste sentido no necessrio, para possu-la, abster-se totalmente dovinho, seno do uso imoderado dele (vinho). Em segundo lugar, paraalcanar um certo grau de perfeio. Neste sentido, alguns devem abster-sedo vinho totalmente para possuir a sabedoria de um modo mas perfeito,segundo o modo de ser de algumas pessoas e lugares[i].2. Na segunda o que dizer: O Apstolo no diz que seja bom, mas sim,abster-se do vinho, seno no caso de que algum se escandalize.3. Na terceira o que dizer: Cristo queria afastar-nos de algumas coisas

    ilcitas e de outras em quanto que impedem a perfeio. Neste sentidoaparta a alguns do vinho para que se dediquem a perfeio, bem comoafastar das riquezas e de outras coisas semelhantes[j].

    Artigo 4: mas necessria a sobriedade dos dignitrios?

    1Tm 2,2pelos reis e todos os que detm a autoridade, a fim de que levemos uma vida calma e serena,com toda piedade e dignidade.

    Objees: pelo que parece que a sobriedade se requer de um modo especialnas pessoas de maior dignidade.1. A velhice d ao homem certa proeminncia, pela qual deve-se revernciae honra ao ancio, segundo lemos em Lv 19,32Levantar-te-s diante deuma cabea encanecida, honrars a pessoa do ancio e temers o teu

    Deus. Eu sou Iahweh. Tambm o Apstolo diz para exortar os ancies, de

    [i] 1Tm 3,2 preciso, porm, que o epscopo seja irrepreensvel, esposo de uma nicamulher, sbrio, cheio de bom senso, simples no vestir, hospitaleiro, competente noensino, 3nem dado ao vinho, nem briguento, mas indulgente, pacfico, desinteresseiro.

    [j] Mt 13,22 O que foi semeado entre os espinhos aquele que ouve a Palavra, mas oscuidados do mundo e a seduo da riqueza sufocam a Palavra e ela se tornainfrutfera.Mc 4,19Mas os cuidados do mundo, a seduo da riqueza e as ambies de outrascoisas os penetram, sufocam a Palavra e a tornam infrutfera.Mc 10,23 Ento Jesus, olhando em torno, disse a seus discpulos: Como difcil aquem tem riquezas entrar no Reino de Deus!Lc 8,14 Aquilo que caiu nos espinhos so os que ouviram, mas, caminhando sob o pesodos cuidados, da riqueza e dos prazeres da vida , ficam sufocados e no chegam

    maturidade.Lc 18,24 Vendo-o assim, Jesus disse: Como difcil aos que tm riquezas entrar noReino de Deus!

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    modo especial, a que sejam sbrios, segundo diz em Tt 2,2Os ancios, quesejam sbrios. Logo a sobriedade especialmente necessria as pessoasmas eminentes.

    2. Mas tambm: o Bispo ocupa o grau mais proeminente na Igreja. Paraquem o Apstolo recomenda a sobriedade em 1Tm 3,2 preciso, porm,que o epscopo seja irrepreensvel, esposo de uma nica mulher, sbrio,cheio de bom senso, simples no vestir, hospitaleiro, competente no ensino .Logo a sobriedade exigida, de um modo especial, s pessoas maisimportantes.3. Alm disso, a sobriedade leva consigo a abstinncia do vinho (bebidaalcolica), pois o vinho proibido aos reis, que ocupam o lugar principal na

    escala social, e permitida para aqueles que esto em estado de aflio,segundo diz em Pr 31,4 No prprio do rei beber vinho, Lamuel, no prprio do rei beber vinho, nem dos governadores gostar de licor; 5porqueao beber se esquecem das leis, e no atendem ao direito dos pobres. 6Dlicor ao moribundo, e vinho aos amargurados: 7bebam e esqueam-se damisria, e no se lembrem de suas penas! Portanto, necessrio asobriedade nas pessoas mais importantes.

    Por outro lado s o que diz o Apstolo, em 1Tm 3,11Tambm as mulheresdevem ser respeitveis, no maldizentes, sbrias, fiis em todas as coisas.E Tt 2,6Exorta igualmente os jovens, para que em tudo sejam criteriosos[k].

    Soluo: O que dizer: Toda virtude um hbito com uma dupla relao:por uma parte, contrrio aos vicio[l], excludo-o, e freando asconcupiscncias[m]; e ao fim que elas conduzem. Assim pois, uma virtude

    pode ser necessria em uma pessoa por um duplo motivo. Primeiro, porquesente mais inclinado para as concupiscncias, a qual deve ser freada pela

    virtude[n], e para os vcios que so suprimidas por ela. Neste sentido, a

    [k] Em Latim: Tt 3,6juvenes similiter hortare ut sobriisints. A palavrasobrii foi traduzidapor seu sinnimo criteriosos.

    [l] Vcio: defeito ou imperfeio grave de uma pessoa ou coisa; disposio natural parapraticar o mal e cometer aes contra a moral; depravao; tendncia especfica para(algo indecoroso ou nocivo); qualquer costume prejudicial ou censurvel; dependnciaque leva ao consumo irresistvel, especialmente de bebida alcolica ou substnciasestupefacientes

    [m] Concupiscncia: cobia de bens materiais; desejo intenso de prazeres sensuais; luxria

    carnal, desejo libidinoso; cobia natural do homem pelos bens terrenos, consequncia dopecado original e que produz desordem dos sentidos e da razo.

    [n] Virtude: qualidade do que se conforma com o considerado correto e desejvel; uma

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    sobriedade sumamente necessria nos jovens e nas mulheres: nosprimeiros se d um maior desejo do deleite, devido ao ardor de sua idade, enas segundas no h suficiente vigor mental para resistir

    concupiscncia[o]

    . Por isso, segundo Mximo Valrio[4]

    as mulheres romanasno bebem vinho.Em segundo lugar, a sobriedade mais necessria em algumas pessoas pararealizar suas prprias aes. O vinho, por sua parte, se se torna comimoderao, impede o funcionamento da razo. Por isso se recomenda asobriedade, de um modo especial, aos ancies, cuja inteligencia convmque esteja desperta para ensinar aos demais; aos bispos e os demaismembros da Igreja, que devem realizar seu trabalho espiritual com uma

    mente devota, e aos reis (governantes), que devem governar ao seu povosobriamente.Com isso damos por respondidas as objees.

    + - + - +

    LDA SOBRIEDADE VICIO OPOSTO: A EMBRIAGUEZ[5]

    Existe, alm da abstinncia, alguma outra virtude que ajude o homem aevitar tao desastrosos resultados?

    Sim, Senhor; a Virtude da Sobriedade (q 149). Que entendeis por Sobriedade? Uma virtude, cujo fim moderar o uso das bebidas alcolicas (q 149,1,2). Como se peca conta eles?

    qualidade moral particular; conformidade com o Bem, com a excelncia moral ou deconduta etc.; dignidade; prtica ou exerccio da virtude; disposio de comportamentoadquirida por meio da vontade e do hbito, e que se caracteriza por buscar o equilbrio, ajusta medida na experincia dos afetos, em oposio a paixes extremas edescontroladas.

    [o] Mulheres: O corpo da mulher muito mais sensvel aos excessos de lcool e drogas do que o dohomem. A explicao para isso simples. O corpo das mulheres tem menos gua do que oshomens. Nelas, o lcool no dilui tanto e mais absorvido pelo sangue. Assim, elas sofrem maisdanos fsicos do que eles. Alm disso, dizem os especialistas, que elas metabolizam o lcool deforma menos eficiente do que eles.

    [4] Pblio Valrio Mximo (sculo I a.C.-sculo I d.C.), foi um escritor romano. Sua obra capital so osnove livros Factorum dictorum memorabilium (Fatos e ditos memorveis), dedicados ao imperadorTibrio. Foi escrito em Roma em 31 d.C. e o seu fim era elogiar uma srie estabelecida de virtudesromanas por meio de anedotas e relatos tradicionais ou extrados de historiadores e filsofos.

    [5] A Suma Teolgica de Santo Tomaz de Aquino em forma de Catecismo para uso de todosos fiis, Editora SCJ, Taubat, 1942. Pgs 164 e 165.

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    Excedendo-se no uso desta classe de bebidas at chegar ao estado deembriaguez (q 150).

    Que entendeis por estado de embriaguez?

    O estado fsico no qual, por abusar da bebida, se xhega a perder o uso darazo (q 150,1). Constitui sempre pecado? Quando provem, como consequncia de no se tomarem precauues,nem reparar nos resultados que podia trazer o excesso da bebida, sim,Senhor (q 150,2).

    Quando ser pecado mortal? Quando, previsto o resultado, se prefere o estado de embriaguez ao de

    privar-se da bebida (q 150,2). a embriaguez um vcio repugnante e embrutecedor? Sim, Senhor; porque priva o homem do uso da razo, e o rebaixa a umnvel inferior ao dos animais que sempre conservam expedito o instinto,

    para se governarem (q 150, 3).

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    A Embriaguez

    Lc 21,34Velai sobre vs mesmos, para que os vossos coraes no se tornem

    pesados com o excesso do comer, com a embriaguez e com aspreocupaes da vida; para que aquele dia no vos apanhe de improviso.1Cor 6,10nem os ladres, nem os avarentos, nem os bbados, nem osdifamadores, nem os assaltantes ho de possuir o Reino de Deus.1Pd 4,3 Baste-vos que no tempo passado tenhais vivido segundo oscaprichos dos pagos, em luxrias, concupiscncias, embriaguez, orgias,

    bebedeiras e criminosas idolatrias.

    A embriaguez de No

    Gn 9, 20No, o cultivador, comeou a plantar a vinha. 21Bebendo vinho,embriagou-se e ficou nu dentro de sua tenda. 22Cam, pai de Cana, viu anudez de seu pai e advertiu, fora, a seus dois irmos. 23Mas Sem e Jaf

    tomaram o manto, puseram-no sobre os seus prprios ombros e, andando decostas, cobriram a nudez de seu pai; seus rostos estavam voltados para trse eles no viram a nudez de seu pai. 24Quando No acordou de suaembriaguez, soube o que lhe fizera seu filho mais jovem. 25E disse:Maldito seja Cana! Que ele seja, para seus irmos, o ltimo dosescravos! 26E disse tambm: Bendito seja Iahweh, o Deus de Sem, e queCana seja seu escravo! 27Que Deus dilate Jaf, que ele habite nas tendas deSem, e que Cana seja seu escravo!

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    L e suas filhas - Orazio Gentileschi (c. 1621)A Embriaguez de L

    Gn 19,30L subiu de Segor e se estabeleceu na montanha com suas duasfilhas, porque no ousava continuar em Segor. Ele se instalou numacaverna, ele e suas duas filhas. 31A mais velha disse mais nova: Nosso

    pai idoso e no h homem na terra que venha unir-se a ns, segundo ocostume de todo o mundo. 32Vem, faamos nosso pai beber vinho edeitemo-nos com ele; assim suscitaremos uma descendncia de nosso pai.33Elas fizeram seu pai beber vinho, naquela noite, e a mais velha veio

    deitar-se junto de seu pai, que no percebeu nem quando ela se deitou, nemquando se levantou. 34No dia seguinte, a mais velha disse mais nova: Nanoite passada eu dormi com meu pai; faamo-lo beber vinho tambm nestanoite e vai deitar-te com ele; assim suscitaremos uma descendncia denosso pai. 35Elas fizeram seu pai beber vinho tambm naquela noite, e amenor deitou-se junto dele, que no percebeu nem quando ela se deitou,nem quando se levantou. 36As duas filhas de L ficaram grvidas de seu

    pai. 37A mais velha deu luz um filho e o chamou Moab; o pai dos

    moabitas de hoje.

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    A mais nova deu tambm luz um filho e o chamouBen-Ami; o pai dos Ben-Amon de hoje.

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    Questo 150A embriaguez

    Em seguida, vem a questo da embriaguez. Nela esto quatro pontos e

    perguntas, a saber:1. pecado a embriaguez? 2. pecado mortal? 3. o mais grave dos

    pecados? 4. Exime de pecado?

    Artigo 1: pecado a embriaguez?

    Objees: pelo que parece que a embriaguez no pecado.

    1. A todo pecado se ope outro pecado: a timidez, a audcia; apusilanimidade, a presuno. Veja bem: no h nenhum pecado que seoponha embriaguez. Logo est no pecado.2. Alm disso: todo pecado voluntrio[6]. Porm ningum quer estar

    bbado[aa], porque ningum quer se ver privado do uso da razo. Por tanto, aembriaguez no pecado.3. E tambm: todo aquele que causa do pecado do outro, peca tambmele. Logo se a embriaguez fosse pecado, pecaria todos aqueles queconvidam a outros para tomarem uma bebida com a qual se embriagam.Porm isto parece demasiado duro.4. Ainda mais, todo o pecado deve ser corrigido. Mas a correo no aplicado aos bbados: So Gregrio[7] diz que: devemos abster de seuscaminhos, para que no fiquem piores se forem obrigados a abandonaremo vcio. Portanto, a embriaguez no pecado.

    Por outro lado est o que disse o Apstolo em Rm 13,13 Como de dia,andemos decentemente; no em orgias e bebedeiras, nem em devassido e

    libertinagem, nem em rixas e cimes.

    Soluo: O que dizer: podemos considerar a embriaguez sob dois aspectos.Primeiro, em quanto que, significa a falta de controle sobre a razo, que

    [6] Agostinho, PL 34,133: De Vera Religione liber unus, Cap. 14 (27). Nunc vero usqueadeo peccatum voluntarium est malum,

    [aa]Bbado: aquele que se intoxicou com bebida(s) alcolica(s); que ou aquele que seembriaga por hbito; aquele que dado ao vcio da embriaguez; borracho; em estado de

    atordoamento; estonteado, zonzo, atarantado[7] Glosa Interlnea; Glossa Lombardi: Pl 192,209. Canon Denique, dist. 4, onde Graciano

    refere-se a uma carta de So Gregrio de Santo Agostinho de Canturia

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    sobrevm ao homem como consequncia de haver bebido excessivamente.Tomada assim, a embriaguez no indica culpa, seno a pena que se seguede uma culpa. Em segundo lugar, a embriaguez pode designar o ato pelo

    qual o homem chega a esse estado, que pode causar a embriaguez de umduplo modo. Primeiro, por a excessiva fora do vinho (bebida alcolica) aqual est sujeito quem o bebe. Sem ter consciencia o bebedor: e destamaneira tambm, a embriaguez pode ocorrer sem pecado, especialmente seno for atravs de sua negligncia, parece que sucedeu com No estavaembriagado, tal como lemos em Gn 9,20No, o cultivador, comeou a

    plantar a vinha. 21Bebendo vinho, embriagou-se e ficou nu dentro de suatenda. Pode dar-se a embriaguez, em um segundo modo, como

    consequncia do excessivo desejo e uso do vinho (bebida alcolica). Nestecaso, a embriaguez pecado, e pertence a gula como uma espcie de seugnero, porque a gula se divide em comilana (glutoneria) e embriaguez,que probe o Apstolo no texto aduzido (Rm 13,13)[ab]

    Resposta as objees:1. Na primeira o que havemos de dizer: Como disse o Filsofo em IIItica8, a insensibilidade, que se ope a temperana, no muito frequente.Por conseguinte, tanto ela como todas suas especies que se opem asdiversas intemperanas precisam de um nome. E tambm necessitam denome o vcio que se ope a embriaguez. Sem dificuldade, se algum seabster de vinho, enquanto fazendo muitos danos natureza, ele no serialivre do pecado.2. Na segunda o que diremos: a objeo a ela procede das consequncias,que involuntria. Se o uso imoderado do vinho voluntrio, nisto consistea essncia do pecado.3. Na terceira dizemos: Assim com o que se embriaga est isento de pecado

    se no conhece a fora do vinho (da bebida alcolica) do mesmo modo oque convida a outro para beber no incorre em pecado se no sabe qual acondio de quem bebe seja tal que ele se embriaga com essa bebida.Porm se no existe tal ignorncia, nenhum dos dois est isento do pecado.4. Na quarta que dizer: As vezes convm no corrigir o pecador para evitarmales maiores, como dissemos antes (q.33 a.6). Por isso diz Santo

    [ab]Em latim Rm 13,13 sicut in die honeste ambulemus non in comesationibus et

    ebrietatibus non in cubilibus et inpudicitiis non in contentione et mulatione. A palavracomesationibus foi traduzida porcomilana.

    [8] Aristteles, Lect. 11, n. 7.

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    Agostinho na carta Ad Aurelium Episcopum[9] falando da glutonarias ebebedeiras: Estas coisas creio que no se ensina com aspereza, comdureza nem pela fora, seno ensina melhor, mandando, aconselhando do

    que ameaando. Deste modo que se deve agir quando os pecadores somuito, enquanto h de usar a severidade quando os pecadores sopoucos.

    Artigo 2: a embriaguez um pecado mortal?

    Objees: pelo que parece a embriaguez no pecado mortal.

    1. Para Agostinho diz em um sermo sobre o Purgatrio[10]

    que: aembriaguez um pecado mortal se contnua. Mas a assiduidade umacircunstncia que no conduz a outras espcies de pecado, e assim no podeagravar um pecado infinitamente, e de um pecado venial torna-se um

    pecado mortal, como mostrado acima[ac]. Portanto, se a embriaguez no um pecado mortal, to pouco o ser por esta circunstancia.2. Ainda mais: Santo Agostinho, no mesmo sermo11, diz: Cada vez queuma pessoa toma mais comida ou bebida do que a necessria, saiba quecomete um pecado pequeno. E tambm: os pequenos pecados so osveniais. Logo a embriaguez, por consequncia de imoderao, pecadovenial.3. E tambm: nenhum pecado mortal pode justificar-se por razes mdicas.Porm alguns bebem mais do que o devido por conselho mdico, para ser

    purgado[ad] pelo vmito. Ento este excesso de bebida tambm d lugar aembriaguez. Logo esta no pecado mortal.

    [9] Agostinho: PL 33,92 Epistolarum Classis I Epistola XXII[10]Agostinho: PL 39,1946 Appendix Sermones supposititios Classis I Sermo CIV

    2. Peccata capitalia. et, ebrietas, si assidua sit,in eorum numero computatur. (1Cor3,11-15)

    [ac] I-II q.88 O pecado venial e o mortal. a.5 Pode as circunstncias mudar um pecadovenial em mortal?

    [11] Agostinho: PL 39,1946 Appendix Sermones supposititios Classis I Sermo CIV 3. Peccata minuta. et, ebrietas, si assidua sit,in eorum numero computatur. (1Cor 3,11-

    15)[ad] Purgado: que se purgou, de que se retiraram as impurezas; depurado, puro, purificado.

    (provvel tcnica de desintoxicao alimentar).

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    Por outro lado est o que dizem os Cnones dos Apstolos[12]: O bispo, opresbtero e o dicono que se do ao jogo ou a bebedeira, ou abandone seucargo ou abandone seu posto. Enquanto o subdicono, leitor ou cantor que

    faa isso, abandone seu cargo ou seja privado da comunho. Fazer omesmo com os leigos. E tambm: tais penas s se aplica em caso de pecadomortal. Logo a embriaguez um pecado mortal.

    Soluo: O que dizer: O pecado de embriaguez consiste, como dissemosantes (a.1) no uso e desejo imoderado do vinho (bebida alcolica). Isto

    pode suceder de trs modos. Em primeiro lugar, quando uma pessoa nosabe que a bebida forte e capaz de embriagar, em cujo caso pode dar-se

    a embriaguez sem existir pecado, tal como j dissemos (a.1). Em segundolugar, quando se sabe que uma bebida forte[ae] porm, no se sabe quepode embriagar-se[af], neste caso a embriaguez um pecado venial. E, emterceiro lugar, pode acontecer que se sabe perfeitamente que a bebida forte e que pode embriagar, porm prefere embriagar-se a privar-se da

    bebida. Este terceiro o que incorre em embriaguez, porque as matriasmorais se especificam, no por aquilo que sucede acidentalmente e seminteno, e sim por que busca intencionalmente. Assim tomada, aembriaguez pecado mortal, porque neste caso o homem se privaconscientemente do uso da razo, que o faz praticar a virtude e aparta-se do

    pecado. Peca pois mortalmente porque se expe ao perigo de pecar. Comefeito, So Ambrsio diz em sua obra De Patriachis[13]: Dizemos quedevemos evitar a embriaguez, por que quanto estamos sbrio evitamoscometer pecado, os cometemos sem nos darmos conta quando estamosembriagados. Logo a embriaguez em si mesma pecado mortal[14].

    Respostas as objees:

    1. Na primeira o que dizer: A assiduidade faz com que a embriaguez sejapecado mortal, no s pela repetio do ato, tambm porque no possvelque o homem beba com frequncia sem incorrer na embriaguez

    [12] Can. 42 e 43 (MA I 56), ou Can. 41 e 42 (MA I 38); cf. GRACIANO, Decreto, P.I. d.35,Can.I Episcopus (RF I 131).

    [ae] Forte: embriagante, ex: cachaa, rum, vodca, usque, licor forte, vinhos forte, e outrasbebidas com alto teores alcolicos.

    [af] Inexperincia da pessoa.[13]De Abraham, Lib.1 c.6. PL 14,463

    [14] O privar-se do uso da razo privar-se do bem mximo de nossa dignidade humana.Por isso a embriaguez um pecado s inferior aos pecados contra Deus (Heresia,Blasfmia e Sacrilgio).

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    o pecado mais grave.3. E tambm: A gravidade do pecado se mede pela gravidade do castigo.Veja bem: parece que a embriaguez a mais severamente castigada, j que

    diz So Ambrsio18

    : O homem no seria escravo se no existe-se aembriaguez. Por conseguinte, este um pecado mais grave.

    Por outro lado est que, segundo So Gregrio19, os vcios espirituais somais graves que os carnais, veja bem: a embriaguez se considera vciocarnal. Logo no o pecado mais grave.

    Solao. O que dizer: Consideramos mal uma coisa na medida em que

    priva de um bem. Por isso, quanto maior o bem do qual priva o mal, tantomais grave ser este mal. Por outra parte, evidente que um bem divino mais importante que um humano. Por tanto, os pecados que vodiretamente contra Deus so mais graves do que o pecado de embriaguez,que se ope diretamente ao bem da rao humana.

    Resposta as objees:

    1. Na primeira o que dizer: O homem se mostra inclinado de um modoespecial para os pecados de intemperana[ah]porque esses desejos e deleitesnos so conaturais[ai]Neste sentido se diz que estes pecados so os maisamigos do demnio, no porque so os mais graves, seno porque so maisfrequentes entre os homens.2. Na segunda o que dizer: o bem da razo pode ser impedido de doismodos: por algo que contrrio a razo ou por algo que tira o uso da razo. mais grave o primeiro, j que o uso da razo, impedido pela embriaguez,

    pode ser bom ou mal, como que os bens das virtudes, que so impedidospor aquilo que se ope a razo, so sempre bons[aj].

    [18] PL 14,736 De Elia et Jejunio Liber Unus Caput V. (11) Ed. 1882. e (PL 14,702Ed. 1845).

    [19] PL 76,688 Moralium Libri, Expositio in Librum B. Job. Liber XXXIII Caput XII(25. Cur Deus electos a carnalibus vitiis illaesos non custodit. Superbia majus peccatum quamluxuria. homo de medicamento vulnus facit, Deus de vulnere medicamentum.)

    [ah] Intemperana: falta de temperana; descomedimento, imoderao; descomedimentono comer e no beber; gula.Temperana: qualidade ou virtude de quem moderado, comedido; sobriedade noconsumo de alimentos e/ou bebidas; parcimnia.

    [ai] Conaturais: que nasce com o indivduo; congnito, inato, conato; conforme,

    semelhante, natural. (devido ao pecado original).[aj] Exemplo o uso de drogas anestsicas, elas tiram a razo para um bem maior. (o paciente

    no sente a dor) antigamente se usava bebidas alcolicas para anestesiar.

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    3. Na terceira que dizer: A escravido foi um efeito ocasional daembriaguez, quando Cam (Gn 9) transmitiu a usa descendncia a maldioda escravido por ter rido de seu pai bbado Porm a escravido no foi um

    castigo derivado diretamente da embriaguez.

    Artigo 4:A embriaguez exime de pecado?

    Objees: Pelo que parece que a embriaguez no exime[ak] de pecado.

    1. O Filsofo (Aristteles) disse em tica (III,5): O embriagado merece o

    dobro da punio. Logo a embriaguez, ao em vez de desculpar o pecado, oagrava.2. Alm do mais: um pecado no diminui com outro, seno que aumentasua gravidade. E, como a embriaguez pecado, no pode eximir de pecado.3. E tambm: disse o Filsofo (Aristteles), em tica (7,3), que assim comoa razo humana se sente atacada pela embriaguez, assim tambm se sentedominada pela concupiscncia[al]. Logo, do mesmo modo que aconcupiscncia no exime de pecado, tampouco o faz a embriaguez.

    Por outro lado est o que fez L (Gn 19,30-38) se lhes desculpa o pecado deincesto por seu estado de embriaguez, como disse So Agostinho em suaobra Contra Fausto[20].

    Soluo: o que dizer: Temos de levar em conta dois fatores que estoenvolvidos na embriaguez, como dissemos antes (a.1): ou seja, do pecadoresultante e do ato anterior. por parte do pecado, do qual se v impedido douso da razo, a embriaguez exime de pecado, na medida em que ela faz

    com que um ato seja involuntria por ignorncia. Mas na parte do atoAnestesia (do grego antigo -, an-, ausncia; e , aisthsis, sensao) tradicionalmente significa a condio de ter a sensibilidade (incluindo a dor) bloqueada ou temporariamenteremovida. Isso permite que os pacientes passem por cirurgias e outros procedimentos sem aangstia e a dor que experienciariam de outra maneira. Anestesia um estado farmacologicamenteinduzido de amnesia, analgesia, perda de responsividade, perda de reflexos musculares esquelticose diminuda resposta a estresse.

    [ak] Eximir: tornar(-se) isento; dispensar(-se), desobrigar(-se); tornar-se esquivo; escusar(-se); pr-se a salvo, escapar, livrar-se.

    [al] Concupiscncia: cobia de bens materiais; anelo de prazeres sensuais; luxria carnal,

    desejo libidinoso; cobia natural do homem pelos bens terrenos, consequncia do pecadooriginal e que produz desordem dos sentidos e da razo.

    [20] PL 42,427 Contra Faustum Manichum Libri Trinta tres.

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    anterior, uma distino seria necessrio, porque, se a embriaguez queresulta de ato que ser sem pecado, o pecado subsequente totalmenteisentos de culpa, como talvez no caso de L. Se, no entanto, o ato anterior

    era pecado, a pessoa no est totalmente dispensada do pecadosubsequente, porque este ltimo processado voluntria atravs davoluntariedade do ato anterior, pois estava fazendo algo ilegal por que elecaiu no pecado subsequente. No entanto, o pecado resultante diminudo,assim como o carter de voluntariedade diminuda. Portanto Agostinhodiz (Contra Fausto) que a culpa de L deve ser medida no pelo incesto,mas por sua embriaguez.

    Resposta as objees:1. Na primeira o que havemos de dizer: O Filsofo no afirma que o briomerea uma punio mais grave, seno duas punies pelos dois pecados.Poderia se dizer tambm, que falando conforme a lei de um tal de Pitaco, oqual, segundo nos disse em Poltica (Aristteles) [21] declara que os brios(bbados), se ferissem a algum, eram castigados mais severamente que os

    sbrios, porque cometem esses atos mais frequentemente. SegundoAristteles no mesmo lugar, assim parece que se fixar na utilidade, Isto ,

    para evitar injustias, no perdo que devem ser considerados tambm osbbados, pelo fato de no ser senhor de si mesmo.2. Na segunda o que dizer: a embriaguez pode eximir de pecado, no emquanto que pecado, seno pela deficincia consequente, segundodissemos antes.3. Na terceira o que diremos, a concupiscncia no se apodera da razototalmente, como a embriaguez, a no ser que seja to forte que enlouqueao homem. E, sem dificuldade, a paixo da concupiscncia diminui agravidade do pecado, porque mais leve peca por fraqueza que por malcia.

    [21] Aristteles Poltica Livro II, parte 9.