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PROJETO ENCONTROS SESC/UNICEF AVALIAÇÃO DOS RESULTADOS Março de 2008 CONCEPÇÃO E REALIZAÇÃO: Cláudia Ribeiro Pfeiffer (IPPUR/UFRJ; Management de Processos e Projetos Ltda.) [email protected] COLABORAÇÃO: Betina Dohman Silbert

SUMÁRIO · Web viewMas também há registros sobre a importância da Oficina para quem é tímido, sobre momentos considerados divertidos, sobre os aprendizados de que somos capazes

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PROJETO ENCONTROS SESC/UNICEF

AVALIAÇÃO DOS RESULTADOSMarço de 2008

CONCEPÇÃO E REALIZAÇÃO: Cláudia Ribeiro Pfeiffer

(IPPUR/UFRJ; Management de Processos e Projetos Ltda.)[email protected]

COLABORAÇÃO: Betina Dohman Silbert

[email protected]

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO

1. O PROJETO PLANEJADO (ANÁLISE DE DOCUMENTOS)

A. CONTRIBUIÇÕES PRETENDIDAS

B. MUDANÇAS DESEJADAS

C. RESULTADOS ESPERADOS

D. ATIVIDADES PRINCIPAIS A SEREM REALIZADAS

2. O PROJETO IMPLEMENTADO (ANÁLISE DE DOCUMENTOS, ENTREVISTAS COM OS FACILITADORES)

A. A ESCOLHA DAS ESCOLAS

B. A APRESENTAÇÃO DO PROJETO NAS ESCOLAS

C. A SELEÇÃO DOS ADOLESCENTES

D. AS OFICINAS E AS ATIVIDADES EFETIVAMENTE REALIZADAS

3. A AVALIAÇÃO DO PROJETO PELOS ADOLESCENTES

A. O PROJETO EM SANTA CRUZ

B. O PROJETO EM ROCINHA-GÁVEA

4. O PROJETO NA VISÃO DOS COORDENADORES PEDAGÓGICOS

A. O PROJETO EM SANTA CRUZ

B. O PROJETO EM ROCINHA-GÁVEA

5. A AVALIAÇÃO DO ALCANCE DO PROJETO ENCONTROS

A. OS RESULTADOS PRODUZIDOS

B. AS MUDANÇAS PROMOVIDAS

C. AS CONTRIBUIÇÕES REALIZADAS

6. OBSERVAÇÕES GERAIS

7. RECOMENDAÇÕES

8. INDICADORES DE ÊXITO PARA PROJETOS FUTUROS

APÊNDICES

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APRESENTAÇÃO

Esse documento apresenta os resultados de avaliação do Projeto Encontros, realizado com o apoio do SESC e do UNICEF no Município do Rio de Janeiro, no segundo semestre de 2007.

A avaliação teve como finalidade verificar em que medida o projeto produziu os resultados, promoveu as mudanças e realizou as contribuições que pretendia, na perspectiva de levantar subsídios para a construção de uma metodologia de trabalho com adolescentes de extratos sociais e etnias diversas, que, em sendo aplicada em grande escala, venha a contribuir para a superação de barreiras territoriais e sociais nas cidades brasileiras, assegurando, nestas, oportunidades de desenvolvimento para todos - independentemente de sua origem étnica e social - e reduzindo a violência que se verifica nas mesmas.

Ela foi feita com base na análise dos documentos existentes sobre o projeto e de informações levantadas em entrevistas realizadas com alguns dos diretamente envolvidos no mesmo – facilitadores (2 em 4), coordenadores pedagógicos das escolas (4 em 4), adolescentes (11 em 60 - sendo 3 do Colégio Cunha Mello e 2 da Escola Municipal André Vidal de Negreiros, ambos em Santa Cruz ; 3 da Escola Parque na Gávea e 3 do CIEP Ayrton Senna na Rocinha)1.

Importante registrar que: foram chamados para entrevista os adolescentes indicados pelos membros da equipe como aqueles mais participativos – para assegurar a possibilidade de identificação de visões e críticas abrangentes dos adolescentes; não foi possível entrevistar três adolescentes da Escola André Vidal de Negreiros por dificuldades em localizar os alunos dessa escola (todos mudaram de escola, porque a escola não oferece ensino médio); não foi possível

1 Ver a lista de entrevistados e os roteiros das entrevistas nos Apêndices 1, 2, 3 e 4.

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entrevistar dois facilitadores, em virtude deles não encontrarem espaço em suas agendas para esta finalidade.

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AVALIAÇÃO DOS RESULTADOS DO PROJETO ENCONTROS

1. O PROJETO PLANEJADO (ANÁLISE DE DOCUMENTOS)

A) CONTRIBUIÇÕES PRETENDIDAS

O Projeto Encontros foi elaborado com as finalidades de:

Contribuir para que os adolescentes incorporem uma nova maneira de se portar frente às diferenças e, consequentemente, frente à vida de um modo geral.

Contribuir para que adolescentes cariocas e fluminenses de diferentes estratos sociais interajam, manifestem-se e participem ativamente de um movimento de construção de uma cultura do encontro, voltada para a superação de barreiras territoriais e sociais, a redução da violência e a garantia de oportunidades iguais de desenvolvimento para seus pares, independentemente de sua classe social e de sua origem étnica.

B) MUDANÇAS DESEJADAS

Nesse sentido, pretendia promover as seguintes mudanças:

Adolescentes de estratos sociais e etnias diversas conhecem-se, reconhecem-se, convivem, comunicam-se, vivenciam e valorizam a diversidade e o encontro entre os diferentes, buscando a superação de disparidades e barreiras sociais como possibilidade de vida na cidade.

C) RESULTADOS ESPERADOS

Essas mudanças deveriam ser promovidas a partir da produção dos seguintes resultados:

2 grupos de adolescentes de estratos sociais e etnias diversas refletem, comentam e desenvolvem atividades voltadas

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para a superação de barreiras territoriais e sociais na cidade.

2 grupos de adolescentes de estratos sociais e etnias diversas, utilizando formas de expressão contemporânea, vivenciam oportunidades de encontro e integração, que visam seu desenvolvimento integral, responsável e cidadão, a redução de tensões e humanização da cidade.

2 grupos de adolescentes de diferentes estratos sociais e etnias protagonizam ações de comunicação que refletem e se manifestam sobre a sua vida, sua cidade e seu mundo.

D) ATIVIDADES PRINCIPAIS

As atividades a serem realizadas para a produção dos resultados resumir-se-iam em:

Formar 2 grupos de adolescentes de diferentes estratos sociais e etnias, que freqüentam escolas particulares e escolas da rede pública, e que apesar de residirem em áreas contíguas (comunidades populares e bairros do entorno) têm vidas apartadas, desconhecem uns aos outros e, em geral, não se percebem como partes de uma mesma cidade.

Realizar oficinas voltadas para a reflexão, o corpo, a filosofia e a construção coletiva audiovisual, ou seja, a realização de encontros presenciais interativos, em ambientes selecionados para que se possa criar um clima de mútua aceitação, com atividades criativas que contribuam para a produção dos resultados e para a promoção das mudanças desejadas, ou seja, atividades que, em princípio, deveriam:

a. Agregar adolescentes independentemente de classe social e cultura (através de elementos como o humor, a afetividade, a desculpabilização e a fragilidade);

b. Promover uma experiência de troca e de contatos, de comunicação entre esses adolescentes;

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c. Estimular adolescentes a manifestar-se e a interagir; d. Gerar experiências de descoberta da cidade e do outro;e. Estimular discussão/reflexão sobre barreiras que separam

adolescentes de diferentes estratos sociais da cidade;f. Estimular discussão/reflexão sobre pontes que unem

adolescentes de diferentes estratos sociais da cidade;g. Estimular os adolescentes a refletir sobre suas maneiras

de se portar frente às diferenças;h. Estimular os adolescentes a refletir sobre suas maneiras

de se portar frente à vida de um modo geral.i. Levar adolescentes a identificar interesses comuns e a

protagonizar a elaboração, desenvolvimento e divulgação de produtos construídos coletivamente.

j. Promover o desenvolvimento integral, responsável e cidadão dos adolescentes.

k. Reduzir tensões da cidade.l. Humanizar a cidade.m. Estimular adolescentes a participar ativamente, a

protagonizar um movimento de construção de uma cultura do encontro, voltada para a superação de barreiras territoriais e sociais, a redução da violência, e a garantia de oportunidades iguais de desenvolvimento para seus pares, independentemente de sua classe social e de sua origem étnica.

2. O PROJETO IMPLEMENTADO (ANÁLISE DE DOUMENTOS, ENTREVISTAS COM FACILITADORES)

O projeto foi implementado na Zona Oeste (Santa Cruz) e na Zona Sul (Rocinha e Gávea) da cidade do Rio de Janeiro.

Em Santa Cruz, o grupo de adolescentes foi formado por adolescentes da 8ª série do Ensino Fundamental do Colégio Cunha Mello (particular) e da Escola Municipal André Vidal

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de Negreiros. Na Zona Sul, por adolescentes da 1ª série do Ensino Fundamental da Escola Parque (escola particular na Gávea) e de adolescentes entre a 7ª série do Ensino Fundamental e a 2ª série do Ensino Médio do CIEP Ayrton Senna (Rocinha).

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a) A escolha dos Locais e das Escolas

Alguns critérios orientaram a escolha dos locais e escolas acima destacados.

A escolha da Zona Oeste ocorreu em função de se considerar que era preciso levar o projeto a áreas mais remotas da cidade. A escolha da Zona Sul, por nesta área territorial localizarem-se os maiores abismos territoriais e sociais da cidade.

Na Zona Oeste, a escolha das escolas decorreu do fato do Colégio Cunha Mello e da Escola Municipal André Vidal de Negreiros estarem situadas na mesma rua, uma em frente à outra; e de membros da equipe terem conhecimento de que os alunos de ambas as escolas evitavam passar na calçada da escola alheia.

Na Zona Sul, as escolas foram escolhidas com o propósito de colocar em interação adolescentes de universos sócio-culturais muito adversos: adolescentes que estudam em um bairro e em uma escola reconhecidamente como de elite e adolescentes que estudam em uma escola pública, em uma área territorial estigmatizada socialmente pelas condições precárias de moradia e pela violência.

Facilidades de contato de membros da equipe com a direção das escolas e com seus Coordenadores Pedagógicos, por relações profissionais e pessoais previamente existentes, também influenciaram a escolha das escolas.

b) A apresentação do Projeto nas Escolas

A apresentação do Projeto nas escolas foi iniciada mediante carta, assinada pelo Assessor de Projetos Comunitários do SESC e pela Coordenadora do Escritório do UNICEF no Rio de Janeiro,

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enviada aos diretores/diretoras das mesmas. A carta continha um resumo dos objetivos do projeto e das atividades a serem realizadas no sentido do seu alcance.

Em um segundo momento, o projeto foi apresentado por seus coordenadores aos Coordenadores Pedagógicos das escolas. E estes marcaram encontros entre os coordenadores do projeto e os adolescentes para dar início ao processo de seleção.

Na primeira reunião da equipe do projeto com os adolescentes, houve alguns problemas, que cabe registrar. Esses problemas levaram os adolescentes a não compreenderem bem as finalidades e objetivos do projeto. Quais sejam: no Colégio Cunha Mello, passou-se a idéia de um projeto pioneiro, que seria exibido em televisões de todo o mundo. Na Escola Parque, a sensação de que a equipe tinha preconceito em relação a adolescentes de escolas de elite.

c) A seleção dos adolescentes

Os alunos que fizeram parte do projeto foram aqueles que se interessaram em participar, se inscrevendo no mesmo. E quando o número de inscritos excedeu o número de vagas estipulado como adequado (15 vagas por escolas), houve sorteio.

d) As Oficinas

Os dois grupos realizaram 3 oficinas voltadas para a reflexão, o corpo, a filosofia e a construção coletiva audiovisual (Oficinas Corpo e Emoção, Filosofia e Vídeo). Na Zona Oeste, as Oficinas ocorreram na Cidade das Crianças, no Jardim do Mar. Na Zona Sul, no Planetário da Gávea.

As Oficinas tiveram a duração total de 24 horas, distribuídas em 8 encontros de 3 horas.

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A Oficina de Corpo e Emoção, com duração total de 6 horas, tinha por objetivo desenvolver atividades que levassem os adolescentes a perceber: que todos somos iguais por trás de nossas máscaras sociais - “as emoções, tão básicas quanto as cores, dão em reis e mendigos, judeus e muçulmanos, jovens e velhos, gente do asfalto, gente da favela” (Michel Robim); que a aproximação, os encontros não competitivos, construtivos, criativos entre “estranhos” (grupos de diferentes estratos sociais) permitem desfazer preconceitos, “humanizam” as relações entre os seres humanos, diminuem a ação para a guerra.

A Oficina de Filosofia, também com duração total de 6 horas, tinha como objetivos principais: despertar dúvidas e inseguranças nos adolescentes, em relação ao que eles estavam acostumados a pensar; e desconstruir a idéia de uma verdade absoluta.

A Oficina de Vídeo, com duração total de 12 horas, visava criar dispositivos e situações dramatúrgicas, onde os jovens fossem convocados a organizar o pensamento e as imagens de tais situações; e levados a perceber que as imagens do outro e da cidade são construções.

No contexto das Oficinas, foram realizadas atividades voltadas para:

Agregar adolescentes independentemente de classe social ou cultura.

Explicitação de preconceitos e pré-conceitos.

Estimular a expressão oral das sensações, sentimentos e pensamentos.

Reconhecer a existência do outro, do diferente.

Reconhecer o outro, o diferente, como também um igual.

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Reconhecer trajetórias de vida diferentes.

Estimular o convívio com o outro, com o diferente, como possibilidade de modificação dos olhares, como possibilidade de desfazer preconceitos e pré-conceitos, e não como um problema.

Estimular discussão/reflexão sobre barreiras (preconceitos) que separam adolescentes de diferentes estratos sociais da cidade.

Problematizar e relativizar visões e conceitos estabelecidos e dados como verdadeiros. Despertar suspeitas intelectuais nos adolescentes, levando-os a colocar a cabeça fora da manada.

Estimular a confecção de produtos coletivos (áudios-visuais)

Vivenciar e valorizar a diversidade e o encontro entre os diferentes.

Destacar a importância das escolhas.

Em Santa Cruz, para além de atividades voltadas para as finalidades acima foram realizadas atividades com os propósitos de levar os adolescentes a:

Distinguir sensações, sentimentos e pensamentos.

Reconhecer sentimentos diversos e contraditórios que fundamentam e, muitas vezes, dificultam, os relacionamentos.

Situar-se no ambiente geográfico (rua).

Reconhecer ambientes sociais diferentes (escolas).

Reduzir tensões na convivência sócio-territorial.

E em Rocinha/Gávea, atividades voltadas para:

Aproximar universos sócio-culturais e territoriais diferentes (asfalto e favela)

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Promover reconhecimento da desigualdade social (cidade partida)

Gerar experiências de descoberta da cidade e da sociedade

Ao término das Oficinas foram realizados encontros de finalização do projeto.

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3. A AVALIAÇÃO DO PROJETO PELOS ADOLESCENTES 2

A) O PROJETO EM SANTA CRUZ

SOBRE AS OFICINAS

Os adolescentes preferiram a Oficina de Vídeo. As justificativas apresentadas foram as seguintes:

Foi uma coisa nova;

Nessa Oficina houve mais interação entre eles;

O Faustini tem mais postura, orienta melhor;

A Oficina permitiu que eles identificassem e desfizessem preconceitos.

A Oficina propiciou a oportunidade de ter que falar o que pensa e não guardar;

Ensinou um pouco a filmar.

A Oficina de Corpo e Emoção não foi tão bem recebida quanto à de Vídeo, porque os adolescentes disseram que não compreenderam bem o seu sentido. Alguns se sentiram constrangidos em alguns momentos. Perceberam os trabalhos em sub-grupos como isolamento (“Michel fechava em grupos ou isolava a gente”).

Mas também há registros sobre a importância da Oficina para quem é tímido, sobre momentos considerados divertidos, sobre os aprendizados de que somos capazes de fazer coisas que nunca imaginamos e de que alguns conseguem fazer coisas que os outros não.

2 Quadros com detalhes das falas dos adolescentes da Zona Oeste e da Zona Sul sobre o projeto, nos Apêndices 5 e 6.

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A Oficina de Filosofia, assim como a de Corpo e Emoção, também não foi tão bem recebida pelos adolescentes de Santa Cruz quanto à de Vídeo. Os adolescentes registraram que não entenderam não apenas o sentido como o conteúdo da Oficina, atribuindo a este fato, sobretudo, a falta de interesse em filosofia.

Mas também registraram que a Oficina foi boa, que tratou de vários assuntos, que fez com que eles parassem para pensar (“é bom parar para pensar”).

Um dos entrevistados enviou o seguinte recado para o Charles:

“Diz aí pro Charles: “Se todo mundo é diferente, todo mundo é igual.”. É filosofia também? Não é?”.

SOBRE A COMPREENSÃO DO PROJETO

Os objetivos do projeto

A idéia de promover a interação entre grupos diferentes ficou clara, mas que grupos eram esses - adolescentes de escolas ou de classes sociais diferentes - e a finalidade da interação - conhecerem-se melhor, debaterem assuntos, perceber diferenças, se entrosarem - não.

Interesses e expectativas dos adolescentes ao se inscreverem no projeto

Os interesses na participação no projeto dividiram-se em conhecer/aprender coisas novas, inclusive filmagem; e verificar se o preconceito existente em relação aos adolescentes da escola alheia se justificava.

A maioria não tinha expectativas em relação ao projeto. Participou por sugestão/insistência das Coordenadoras Pedagógicas de ambas as escolas.

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Sobre o contato com os adolescentes da outra escola

O que pensavam sobre os adolescentes da outra escola, antes do projeto

Os adolescentes da escola particular ou não viam ou tinham medo dos adolescentes da escola pública, porque estes os “xingavam”.

Os adolescentes da escola pública achavam que os adolescentes da escola particular eram “marrentos”, que não iriam falar com eles.

Quem eram os adolescentes da outra escola

Os adolescentes da escola pública foram vistos pelos adolescentes da escola particular como mais alegres e desinibidos do que eles, embora também haja menção ao fato de alguns terem ficado distantes em grande parte do tempo.

Já os adolescentes da escola particular foram vistos pelos adolescentes da escola pública como gostando das mesmas coisas que eles, por serem da mesma faixa etária; como humildes e sem preconceito.

Opinião dos adolescentes da outra escola sobre as Oficinas e o Projeto

Todos acharam que a maioria dos adolescentes da outra escola gostou das Oficinas e do Projeto.

Discordâncias de comportamentos dos adolescentes da escola alheia

Adolescentes da escola particular afirmaram que discordaram de alguns comportamentos dos adolescentes da escola pública, mas não especificaram quais. Apenas um

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comportamento foi destacado: o fato deles acharem que os adolescentes da escola particular chamavam eles de cenourinhas por conta do uniforme da escola – o que, segundo os adolescentes da escola particular, não era verdade.

Os adolescentes da escola pública não apresentaram nenhuma discordância em relação ao comportamento dos adolescentes da escola particular.

O que mais marcou na convivência com os colegas

Os adolescentes da escola particular ficaram surpresos ao descobrir que os adolescentes da escola pública tinham preconceitos em relação a eles; todos destacaram o bom relacionamento estabelecido entre eles.

O que mudou a partir da convivência

Preconceitos foram desfeitos. Conheceram o mundo do outro, fizeram amizades.

Mudanças na visão sobre os adolescentes da outra escola

Passaram a se ver ou a se ver de outra maneira. O medo diminuiu ou desapareceu.

Mudanças na visão sobre a outra escola

Os adolescentes da escola particular pensavam que a escola pública era menos arrumada do que ela era. Os adolescentes da escola pública achavam que não seriam bem tratados na escola particular e o foram.

Sobre a comunicação/encontros com os colegas da outra escola, após o término do projeto

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Houve pouca comunicação após o término do projeto. Quando ela ocorreu foi, sobretudo, via internet (MSN e ORKUT).

Um adolescente da escola pública afirmou ter um pouco de vergonha de procurar os adolescentes da escola particular.

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Sobre o impacto do projeto

O que foi o projeto (resultados/efeitos)

Novos conhecimentos. Novos aprendizados. Novas amizades. Dissolução de preconceitos. Deu certo. Perceberam que são da mesma idade, que gostam das mesmas coisas, só a classe social é que muda.

O que foi mais marcante

Os adolescentes da escola particular ficaram impressionados com o fato dos adolescentes da escola pública acharem que eles tinham preconceitos contra eles. Os adolescentes da escola pública ficaram sensibilizados com a solidariedade dos adolescentes da escola particular, que ensinaram algumas matérias para uma prova que eles iriam fazer.

Todos os adolescentes gostaram do tempo que passavam no ônibus. Destacaram, ainda, várias atividades das Oficinas e o último encontro.

Mudanças na visão da cidade

O projeto não modificou a visão de cidade dos adolescentes nele envolvidos.

Mudanças na visão da vida

Os adolescentes passaram a ver a vida diferente, tanto porque conheceram o lado do outro, como o outro sente, quanto porque perceberam que o preconceito pode ser quebrado no âmbito das escolas em geral, como aconteceu em Santa Cruz.

As “Lições Aprendidas”

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Os adolescentes da escola particular descobriram que também são objeto de preconceitos. Acreditam que podem passar a idéia da importância de superar preconceitos. Pararam para pensar mais nas coisas e acharam isso bom. Amadureceram.

Os aprendizados destacados pelos adolescentes da escola pública relacionaram-se ao que aprenderam nas oficinas (sabedoria de corpo, interpretação para entretenimento, o fundamento da filosofia).

O que modificar no projeto

Explicar o sentido das Oficinas. Trabalhar mais com o cotidiano das pessoas. Melhorar a produção. Escolher atividades mais próximas da realidade dos adolescentes.

O futuro do projeto

Sobre a continuidade do projeto

Todos os adolescentes gostariam que o projeto continuasse, para que o grupo pudesse continuar convivendo.

Sobre a recomendação do projeto para outros adolescentes

Apenas um dos adolescentes entrevistados não recomendaria a participação no projeto para colegas.

Sobre a realização de projetos em outros bairros e escolas

Todos os adolescentes de Santa Cruz afirmaram que o projeto deve ser levado a outros bairros e escolas, apresentando como justificativas o fato de valer a pena pensar no outro mundo que não só o seu; perceber que não há diferença entre os adolescentes.

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Sobre a participação em movimentos para a dissolução de preconceitos

À exceção de um adolescente entrevistado, todos participariam de movimentos em prol da dissolução de preconceitos, mas sem serem os responsáveis por sua condução.

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B) O PROJETO EM ROCINHA-GÁVEA

SOBRE AS OFICINAS

Em Rocinha-Gávea, os adolescentes gostaram menos da Oficina de Vídeo do que das Oficinas de Corpo e Emoção e Filosofia, percebidas pelos adolescentes como integradas. Sentiram-se mais à vontade nessas Oficinas e muito pressionados ou constrangidos na primeira. Principalmente os adolescentes da Escola Parque, que sentiram preconceito do Faustini (e de outros membros da equipe) contra eles, por pertencerem à classe média ou média alta.

Sobre a Oficina de Vídeo, dois comentários distintos parecem resumir os problemas ocorridos:

“Tiveram momentos muito legais, de teatro, de filmar essas coisas, mas grande parte do tempo eles tentavam forçar uma barreira que não existia tanto, mas eles faziam questão de colocar essa barreira”.

“Acho que foi a do Faustini que eu menos gostei. Porque eu percebia muito no discurso dele, e naquela câmera sempre fechada, que te enquadrava. Apesar dele dar liberdade para a gente filmar, parecia que a gente tinha que filmar os outros, tinha que mostrar uma visão, tinha que, tinha que,... o cinema tem um pouco disso, mas a gente se sentia pressionado.”

Por outro lado, os adolescentes também destacaram como aspectos positivos da Oficina, o clima de interação gerado entre os adolescentes:

A Oficina foi muito boa, ele é muito divertido, fazia todo mundo conversar. Ele conversa muito, gosta de interagir, não gosta de ver ninguém separado e gostava que a gente batesse papo como se estivesse em casa.

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Foi legal. A gente tinha que falar um pouco sobre cada um, e a gente filmou bastante.

Sobre a Oficina de Corpo e Emoção, o comentário que segue resume o sentimento dos adolescentes:

Era uma interação corporal, transcendia essa barreira que existia, porque o Michel nos tratava como humanos, independente de qualquer coisa. Isso proporcionava a gente uma conexão, porque não estávamos pensando sobre qualquer outra coisa, porque não tem como identificar isso corporalmente.

Também cabe destacar os seguintes comentários:

Foi legal. Várias coisas loucas, coisas sobre sentimentos, ações, reações, legal. Sempre que lembro começo a rir, traz alegria, é engraçado, traz felicidade. Para rir tem que me fazer feliz.

Foi bem legal, todo mundo se movimentou um pouco, refletia bastante, fazia careta, despertava emoções, ele queria que a gente pensasse, provocava sentimentos de alegria e tristeza na gente.

Foi muito boa. Ensina a gente ficar bem com nós mesmos. Teve uma oficina que a gente chorou, se emocionou, não me lembro direito do assunto, mas todo mundo se emocionou.

Ensina a respeitar as diferenças, conviver melhor com as pessoas e com nós mesmos.

Quanto à Oficina de Filosofia, o destaque foi dado ao fato da Oficina tratar de temas variados, aos conhecimentos novos transmitidos, ao fato “do Charles conseguir levar o nosso pensamento a um estado de “o que é isso?” ... faz parar para pensar”.

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SOBRE A COMPREENSÃO DO PROJETO

Os objetivos do projeto

A idéia de aproximar e fazer interagir adolescentes de escolas particulares e públicas, de classes sociais diversas, ficou clara, mas a finalidade dessas aproximação/interação não. Menções foram feitas à promoção de experiências de vídeo, filosofia e dança.

Interesses e expectativas dos adolescentes ao se inscreverem no projeto

Os interesses dos adolescentes da escola particular em participar do projeto dividiram-se em: contato e interação com escola pública e com classe social diferente; interesse em cinema. Os interesses dos adolescentes da escola pública, em: conhecer melhor adolescentes de escolas particulares, o modo de vida deles, as diferenças que tem; participar de projetos sociais.

Enquanto os adolescentes da escola particular não tinham nenhuma expectativa em relação ao projeto; adolescentes da escola pública esperavam ser vítimas de preconceito e descaso.

Sobre o contato com os adolescentes da outra escola

O que pensavam sobre os adolescentes da outra escola, antes do projeto

Os adolescentes da escola particular pensavam que os adolescentes da escola pública eram “despolitizados”, “alienados”, sem estrutura para pensar, sem “riqueza” a oferecer, em virtude de serem de escola fraca.

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Os adolescentes da escola pública pensavam que os adolescentes da escola particular eram “playboys”, “mauricinhos”, “drogados”, “metidos à besta”, que iriam evitar contato com eles.

Quem eram os adolescentes da outra escola

Para os adolescentes da escola particular, os adolescentes da escola pública são passivos, conformados, acomodados, embora alguns sejam posicionados em relação à vida. Também são humanos no sentido de quererem ajudar a quem precisa mais do que eles.

Já para os adolescentes da escola pública, os adolescentes da escola particular desconhecem a realidade em que eles vivem. Não podem imaginar como eles se sentem. Tem muito mais oportunidades na vida do que eles (referindo-se, sobretudo, à educação de qualidade).

Opinião dos adolescentes da outra escola sobre as Oficinas e o Projeto

Os adolescentes da escola particular avaliaram que os adolescentes da escola pública gostaram das oficinas e do projeto, porque era divertido, todos se davam bem, eram momentos de união. Mas que, como eles, acharam que não deu em nada.

Já os adolescentes da escola pública acharam que alguns gostaram, porque se interessam muito por debater assuntos gerais e porque são politicamente corretos.

Discordâncias de comportamentos dos adolescentes da escola alheia

Ao contrário do que ocorreu na Zona Oeste, na Zona Sul os adolescentes da escola particular não lembraram de ter

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discordado de comportamentos dos adolescentes da escola pública, enquanto estes se incomodaram com o fato dos primeiros acharem que para entrarem na Rocinha precisariam de autorização do chefe do tráfico.

O que mais marcou na convivência com os colegas

Para os adolescentes da escola particular, o que mais marcou foram as diferentes idéias e visões, as limitações econômicas, de acesso à cultura, de visão de mundo, de esperança dos adolescentes da outra escola; a passividade, a falta de indignação, o conformismo frente à realidade em que eles vivem; a naturalização das condições precárias em que vivem.

Para os adolescentes da escola pública, perceber que apesar de serem diferentes dos adolescentes da escola particular também tem coisas em comum. E a amizade pelos adolescentes da outra escola.

O que mudou a partir da convivência

Para os adolescentes da escola particular, pouco mudou. Fizeram menção à construção de uma nova visão.

Para os adolescentes da escola pública, a mudança foi muito grande. Desfizeram preconceitos em relação aos adolescentes da escola particular (os “mauricinhos”), passaram a defendê-los na Rocinha. Dizendo que eles não são “metidos”. Que são pessoas legais também. Aprenderam a conviver melhor com as diferenças e a perceber que são todos pessoas que tem febre, doenças, ou seja, que sofrem coisas semelhantes.

Mudanças na visão sobre os adolescentes da outra escola

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Para os adolescentes da escola particular, os adolescentes da escola pública não eram tão alienados, nem tão sem riqueza a oferecer quanto pensavam.

Os adolescentes da escola pública passaram a ver os adolescentes da escola particular como pessoas humildes, humanas como eles.

Mudanças na visão sobre a outra escola

Na opinião dos adolescentes da escola particular, a escola pública é melhor do que esperavam. A estrutura não é boa, mas também não está caindo aos pedaços.

Para os adolescentes da escola pública, a escola particular não é tão certinha quanto eles pensavam. E, por outro lado, também sofre com o preconceito de outras escolas particulares.

Sobre a comunicação/encontros com os colegas da outra escola, após o término do projeto

Não houve interesse efetivo por parte dos adolescentes de ambas as escolas, embora a disposição para a comunicação/encontros exista.

Adolescentes da escola pública sentem-se um pouco envergonhados e sem tempo para tomar iniciativas.

Sobre o impacto do projeto

O que foi o projeto (resultados/efeitos)

Para os adolescentes da escola particular, a equipe do projeto criou e forçou conflitos, barreiras e sensação de dilema entre os adolescentes das diferentes escolas. A dificuldade de aproximação entre eles, no início, era menos por

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serem de classes sociais diferentes do que por não se conhecerem (O distanciamento também ocorreria se o projeto fosse entre adolescentes de escolas particulares).

Mas apesar disso, a experiência foi benéfica para todos, como pessoas. Levantou a necessidade de conversar com as pessoas ao redor. Perceberam que as pessoas tinham muitas coisas em comum, problemas parecidos, que a distância não era tão grande assim. Que é mais importante quebrar a barreira territorial do que o preconceito social. Que problemas sociais afetam a todos de diferentes formas.

Para os adolescentes da escola pública, o projeto começou com eles na “zoação” e terminou como coisa séria, com o compromisso de todos. Ao longo do tempo viram que tem muitas diferenças, injustiças, mas também muito em comum. Puderam, juntos, reconhecer, aceitar e conviver com a diferença.

Consideraram um grande aprendizado para todos e vão levar do projeto boas lembranças.

O que foi mais marcante

Para os adolescentes da escola particular, os exercícios com o Michel e o Charles, de expressão corporal, fizeram com que todo mundo ficasse igual.

Para os adolescentes da escola pública, perceber que as diferenças entre o ensino público e o particular são enormes, colocando em situação desfavorável na sociedade (vestibular) os alunos de escolas públicas; que o desenvolvimento dos adolescentes das escolas particulares é muito maior; que não se pode mudar o mundo, mas que é possível fazer uma revolução, falando o que deve ser dito.

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Mudanças na visão da cidade

Para os adolescentes da escola particular, o que mais chamou a atenção foi perceber como é difícil entrar numa favela, não só psicologicamente como territorialmente. A visão que eles já tinham da cidade não se alterou.

Para os adolescentes da escola pública, a percepção da visão dos adolescentes da outra escola sobre a Rocinha. O medo que eles tem de ir até lá. Não vêem que lá é um lugar onde tem pessoas que tem modos de vida parecidos com os deles.

Mudanças na visão da vida

A destacar a percepção dos adolescentes da escola particular de que as mudanças na vida dos adolescentes das escolas públicas ou de quem mora em favela são mais impactantes do que as mudanças nas suas vidas. A vida deles é mais incerta, tem mais dificuldades.

E, por outro lado, mudanças em relação ao tabu sobre as diferenças de classe e a tomada de consciência de que podemos fazer alguma coisa para mudar entre os adolescentes da escola pública.

As “Lições Aprendidas”

Os adolescentes da escola particular não identificaram nenhum aprendizado que merecesse destaque. Enquanto os adolescentes da escola pública registraram que: perceberam que eles são a sociedade e não só os adolescentes da escola particular e que, por isso, não adianta culpar a sociedade pelos problemas dela, porque cada um é culpado por esses problemas; aprenderam o que é filosofia, a ficar bem com

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eles mesmos, a respeitar as diferenças e a conviver melhor com as pessoas.

O que modificar no projeto

Como sugestões para o projeto, os adolescentes de ambas as escolas sugeriram que fossem discutidos assuntos que eles teriam em comum, mais próximos de seu cotidiano.

Os adolescentes da escola particular gostariam de mais debate, mais conversa, mais profundidade, para que se conhecessem melhor e criassem vínculos.

Os adolescentes da escola pública sugeriram que os encontros ocorressem uma vez por semana. Que a duração do projeto fosse maior e que envolvesse mais escolas. Que focasse mais no que é ser cidadão, porque os jovens não sabem que a sociedade deveria oferecer bem mais para eles.

O futuro do projeto

Sobre a continuidade do projeto

Os adolescentes da escola particular gostariam que o projeto continuasse, mas de outra forma, com espaço para conversas mais espontâneas, que permitissem uma interação maior entre os adolescentes. Gostariam também que o projeto tivesse alguma conseqüência, um produto final satisfatório, porque a impressão que ficou é que o projeto não deu em nada. Mas, por outro lado, levantaram dúvida sobre a possibilidade de superação real de barreiras entre dois mundos.

Os adolescentes da escola pública também afirmaram que para continuar teria que ter coisas novas, evoluir. Sugeriram que o projeto deveria se desenvolver em outros lugares porque é um modo interessante de se compreender a sociedade, porque

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assim muitas pessoas mudariam de opinião e superariam preconceitos. Mas, por outro lado, levantaram a possibilidade da continuidade tornar o projeto sem graça.

Sobre a recomendação do projeto para outros adolescentes

Os adolescentes da escola particular não recomendariam, porque foi muito sem objetivo. Os da escola pública recomendariam, porque aprende-se coisas que pode-se levar para a vida, porque o preconceito iria diminuindo.

Sobre a realização de projetos em outros bairros e escolas

Os adolescentes da escola particular disseram que o projeto é mais interessante quando as escolas são próximas como em Santa Cruz. Porque as pessoas se encontram e tem a possibilidade de manter o contato. Os da escola pública, que a realização de projetos em outros bairros e escolas seria legal, porque contribuiria para mudar o mundo.

Sobre a participação em movimentos para a dissolução de preconceitos

Assim como em Santa Cruz, os adolescentes da Rocinha e da Gávea afirmaram que não protagonizariam, mas participariam de movimentos para a dissolução de preconceitos.

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4. A AVALIAÇÃO DO PROJETO PELOS COORDENADORES PEDAGÓGICOS

O nível de envolvimento dos coordenadores foi distinto e por motivos diferenciados.

Em Santa Cruz, a Coordenadora Pedagógica do Colégio Cunha Melo envolveu-se bastante com o projeto, sendo totalmente apoiada pela escola, que sinalizou identificação com o propósito do projeto, por ter uma cultura voltada para o social. A direção da escola considerou que os patrocinadores – SESC e UNICEF - eram instituições reconhecidas e que unir-se a elas nesse projeto seria uma experiência positiva. O interesse pessoal da coordenadora contribuiu para seu alto grau de envolvimento com os objetivos propostos, além de demonstrar afinidade e interesse na convivência com adolescentes.

Esses fatores talvez tenham sido a razão pela qual essa foi a única escola envolvida no projeto que recebeu visitas fora da programação oficial dos alunos da outra escola de Santa Cruz, a André Vidal. A Coordenadora observou que a orientação que a escola dá aos seus alunos para o tema social permitiu que o envolvimento daqueles que quiseram participar do projeto fosse baseado em interesse e compromisso. Alguns deles tiveram dificuldade em administrar suas agendas para estar presentes às oficinas e, mesmo assim, no momento das entrevistas, estavam ansiosos, disponíveis e interessados. Ela ressaltou que um feed back, é uma coisa importante para todos os envolvidos.

Na visão da coordenadora, as oficinas não consideraram a falta de maturidade dos meninos, o que fez com que eles não pudessem aproveitar as experiências com as devidas reflexões e discussões cabíveis. Ela acredita que uma participação pedagógica é importante para clarear os objetivos e contribuir no planejamento, sugerindo dinâmicas mais adequadas

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aos interesses dos adolescentes e a questões pertinentes ao objetivo do projeto.

Destacou que o preconceito tem de ser abordado e trabalhado numa visão ampla, no que lembrou questões como o “preconceito invertido”, dando alguns exemplos de questões onde os anteriormente discriminados são agora os discriminadores e apresentam seus preconceitos de forma explícita e recíproca. Ou seja, os meninos que vivem em condições sociais menos favorecidas apresentaram de maneira clara e objetiva seu preconceito contra “os mauricinhos e playboyzinhos ... as patricinhas, ... os mimados. ... aqueles que vivem um outro mundo”.

Outro ponto por ela apresentado foi de que é necessário uma coordenação para os envolvidos e suas atividades para que se alcancem os objetivos previamente propostos, o que ela entende não ter havido e até criado algumas dificuldades.

Edna também chamou a atenção para o fato que, de acordo com sua observação, os “oficineiros” conduziram as dinâmicas sem dar oportunidade para que os adolescentes tivessem uma participação mais espontânea e interativa, absolutamente necessária ao entrosamento entre eles. Para ela, como exemplo para essa observação, assim como para muitos dos adolescentes, o trajeto no ônibus era um momento de extrema contribuição na integração dos jovens.

O tempo de duração do projeto, assim como o momento de sua realização também foram questionados. Para Edna o tempo deveria ser mais longo e com mais momentos de participação livre e espontânea dos adolescentes, propiciando uma convivência mais rica e criando laços mais consistentes. E finalmente, que um projeto conjunto entre os envolvidos seria de grande valia para que eles pudessem se perceber enquanto complementares na consecução de seus objetivos.

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A Coordenadora da Escola Municipal André Vidal de Negreiros, também de Santa Cruz, não teve quase participação no projeto e acompanhou de forma superficial, mais na observação casual dos alunos envolvidos. No seu momento profissional estava sobrecarregada devido à ausência do diretor da escola por motivos de doença.

Ela entende que a convivência proposta pelo projeto poderia dar aos seus alunos uma visão mais ampla das opções que poderiam ser buscadas para suas vidas. Ela mesma teve uma vivência nesse sentido, conforme depoimento que prestou, quando ao conviver com uma família mais abastada conheceu um universo de possibilidades que não vislumbraria sem essa oportunidade. O desenvolvimento da auto-estima dos adolescentes, a valorização de si mesmos, como ela enfatizou algumas vezes, foi o que ela entendeu como grande oportunidade. Apostou que na convivência os adolescentes descobrem que o pensar pode ser o mesmo apesar de realidades diferentes.

Sua avaliação positiva dessa convivência se deu na observação da interação e alegria entre esses jovens. Observou que o grau de expectativa dos meninos para cada encontro era alto, positivo e que o entusiasmo deles se manteve até o final.

Ela também acredita que o momento do projeto deveria ser anterior ao final do ano e que poderia ser mais longo e que no caso da André Vidal, trabalhar com alunos do 8º ano foi um erro, pois eles se desligam da escola no final do período letivo, visto que não tem ensino médio no curriculum, o que obrigatoriamente os afasta dos colegas.

Em relação à Coordenadora Pedagógica do CIEP Ayrton Senna da Rocinha, esta pouco ou nada participou do projeto. A pessoa que acompanhou o projeto junto aos alunos da Ayrton Senna foi a Coordenadora do Projeto Adolescentro, da Secretaria

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Municipal de Saúde do Rio. Por sua ampla experiência frente ao trabalho com adolescentes, participou de todo o processo, inclusive porque conhecia alguns de seus idealizadores/ patrocinadores.

Ela atribui a não participação da coordenação da escola ao seu alto grau de envolvimento com as demais atividades do dia a dia. Ela entende que são pessoas extremamente assoberbadas que gerenciam muitos problemas complexos e que trazem uma cultura onde as orientações devem vir de seus superiores para que possam ser devidamente trabalhadas.

Em sua avaliação também existe a percepção da falta de um norte às atividades, da falta de uma coordenação geral e da falta de orientação pedagógica. Sobre a equipe, ela reconhece que os envolvidos são pessoas extremamente inteligentes e capacitadas, que algumas discussões foram muito ricas, mas que não houve uma orquestração objetiva das atividades. Na observação de Dilma, as oficinas atendiam muito mais ao público da Escola Parque, que ela entende trazer uma maior bagagem acadêmica e uma visão social mais elaborada. Ela não considerou totalmente produtivas as dinâmicas aplicadas.

Entende que os indivíduos e suas relações foram muito pouco valorizados e trabalhados. Acredita que eles tiveram pouco espaço para se relacionarem, se conhecerem melhor, se enxergarem em suas diferenças e igualdades. Não considerou adequada a falta de visão pedagógica, a falta de uma didática mais assertiva.

Apesar de não ter feito nenhuma avaliação formal ou informal com os meninos ela não acredita que tenha havido uma reflexão muito mais profunda por parte de seus alunos (acredita que o impacto foi maior nos alunos da Escola Parque). Entende que sues alunos perceberam com muita clareza a diferença entre as classes sociais e que esse impacto muitas vezes foi “minimizado” no

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discurso quando “eles idealizavam a vida deles, tinham uma preocupação de diluir a dificuldade da rotina. Eles precisam não se sentir tão por baixo.”

Outro ponto enfatizado pela Coordenadora do Adolescentro foi a necessidade dos adolescentes trabalharem num projeto conjunto, gerenciando recursos, prazos e resultados.

Ela entende que o projeto foi uma “ousadia”, que produziu um montante de informações valiosas que podem ser úteis no redesenho do projeto. Mas chama atenção para a compreensão de uma realidade dura em falta de oportunidades para os adolescentes da Rocinha e que o projeto deve ter a proposta de trazer alguma coisa para essa comunidade tão carente.

Uma das coisas que ela ressalta nessa convivência entre as diferentes classes sociais é que só a elite tem o poder de mudança desse cenário e que para isso é necessário esse tipo de convivência, de provocação a uma reflexão que traga propostas que possam alterar o atual cenário.

O Coordenador Pedagógico da Escola Parque da Gávea teve pouca ou nenhuma participação junto às oficinas, mas demonstra ter mantido um grau de interatividade, durante o projeto, com seus alunos. Ele lembra que a Escola Parque tem uma cultura voltada para o social e que seus alunos apresentam um perfil altamente receptivo e adequado a trabalhar essas propostas.

Ele comentou ter recebido a orientação de não interferência, de manter-se afastado do acompanhamento do projeto. Sendo assim, apesar de ter constatado que o impacto do discurso inicial, de alguns profissionais, na condução do projeto sobre os seus alunos era negativo, pouco pode fazer para alterar esse quadro. Em sua visão e de seus alunos a prática de algumas oficinas foi influenciada, negativamente, por uma imposição da valorização de

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um preconceito, que deveria supostamente existir, por parte dos alunos da Escola Parque em relação aos alunos da Escola Ayrton Senna.

Alguns alunos abandonaram o projeto em função desse desconforto. Aqueles que permaneceram, foram estigmatizados no perfil da elite culpada e preconceituosa em relação aos adolescentes da Rocinha. Esse estigma fez com que os resultados do projeto ficassem aquém de suas expectativas, visto que ele considera que o perfil dos meninos que permaneceram no projeto era extremamente receptivo às ações como as propostas pela idéia original. Ele entende como nocivo essa exacerbação do preconceito e do choque de classes, principalmente porque são jovens que já tem o convívio com comunidades de baixa renda em outras atividades organizadas pela escola.

Sentiu-se pessoalmente vítima desse mesmo preconceito e tendo já uma longa experiência em escolas públicas, lamenta a falta de interação e a não possibilidade de contribuição.

Partilha da percepção de uma falta de coordenação e estrutura adequadas para a consecução dos objetivos. Avaliou a equipe como desorganizada e destacou o fato de que eles não tinham conhecimento e experiência para com o público adolescente, que ele considera muito específico em suas características. Na percepção dele, as idéias estavam prontas e acabadas antes mesmo do começo das atividades, pois ele não testemunhou nenhum interesse ou aproximação com os adolescentes da Escola Parque que pudessem facilitar a dinâmica a ser adotada.

Na avaliação dele os meninos “saíram mais confusos do que entraram”, e eles ficaram com a percepção de que nada de concreto aconteceu e que foi perda de tempo. Apesar disso, ficaram curiosos e disponíveis para as entrevistas e

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continuam acreditando em iniciativas dessa natureza, mas para esse projeto específico, apontam mais falhas do que acertos.

O Coordenador acredita que a reestruturação do projeto é absolutamente válida.

5. A AVALIAÇÃO DO ALCANCE DO PROJETO ENCONTROS

Como apresentado no início desse texto, o Projeto Encontros visava contribuir para que: adolescentes interagissem, manifestassem-se e participassem ativamente de um movimento de construção de uma cultura do encontro, voltada para a superação de barreiras territoriais e sociais, a redução da violência e a garantia de oportunidades iguais de desenvolvimento para seus pares, independentemente de sua classe social e de sua origem étnica; e, assim, incorporassem uma nova maneira de se portar frente às diferenças e, consequentemente, frente à vida de um modo geral.

Nesse sentido, seriam formados dois grupos compostos por adolescentes de estratos sociais e etnias diversas, de escolas públicas e particulares; e realizadas Oficinas de Corpo e Emoção, Reflexão e Vídeo, com as finalidades de levar os adolescentes a se conhecerem, reconhecerem, conviverem, comunicarem-se, vivenciarem e valorizarem a diversidade e o encontro entre os diferentes, para , juntos, buscarem a superação de disparidades e barreiras sociais como possibilidade de vida na cidade.

As atividades a serem realizadas para que os propósitos das Oficinas fossem alcançados, no entanto, não estavam especificadas. E com base nos resultados esperados, ficou subentendido que essas atividades deveriam:

a. Agregar adolescentes independentemente de classe social e cultura (através de elementos como o humor, a afetividade, a desculpabilização e a fragilidade);

b. Promover uma experiência de troca e de contatos, de comunicação entre esses adolescentes;

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c. Estimular adolescentes a manifestar-se e a interagir; d. Gerar experiências de descoberta da cidade e do outro;e. Estimular discussão/reflexão sobre barreiras que separam

adolescentes de diferentes estratos sociais da cidade;f. Estimular discussão/reflexão sobre pontes que unem

adolescentes de diferentes estratos sociais da cidade;g. Estimular os adolescentes a refletir sobre suas maneiras

de se portar frente às diferenças;h. Estimular os adolescentes a refletir sobre suas maneiras

de se portar frente à vida de um modo geral.i. Levar adolescentes a identificar interesses comuns e a

protagonizar a elaboração, desenvolvimento e divulgação de produtos construídos coletivamente.

j. Promover o desenvolvimento integral, responsável e cidadão dos adolescentes.

k. Reduzir tensões da cidade.l. Humanizar a cidade.m. Estimular adolescentes a participar ativamente, a

protagonizar um movimento de construção de uma cultura do encontro, voltada para a superação de barreiras territoriais e sociais, a redução da violência, e a garantia de oportunidades iguais de desenvolvimento para seus pares, independentemente de sua classe social e de sua origem étnica.

De fato, foram formados dois grupos de adolescentes de estratos sociais e escolas diversas (a etnia não foi considerada na formação dos grupos), um na Zona Oeste, outro na Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro; e realizadas Oficinas de Corpo e Emoção, Filosofia e Vídeo.

As finalidades das Oficinas de Corpo e Emoção, Filosofia e Vídeo, bem como as atividades nelas realizadas, no entanto, não seguiram fielmente ao planejado no projeto, ainda que tenham sido pensadas

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para promover os resultados, as mudanças e as contribuições esperados.

A Oficina de Corpo e Emoção foi realizada com a finalidade de levar os adolescentes a perceber que todos somos iguais por trás de nossas máscaras sociais e que a aproximação, os encontros não competitivos, construtivos, criativos entre “estranhos” permitem desfazer preconceitos, “humanizam” as relações entre os seres humanos, diminuem a ação para a guerra. A Oficina de Filosofia, com os objetivos de despertar dúvidas e inseguranças nos adolescentes, em relação ao que eles estavam acostumados a pensar, e de desconstruir a idéia de uma verdade absoluta. E a Oficina de Vídeo, visando levar os jovens a perceber que as imagens do outro e da cidade são construções.

Ou seja: no desenvolvimento do projeto, tentou-se mostrar aos adolescentes que somos todos iguais em nossa “humanidade”; que as imagens do outro, da cidade e da sociedade são construções; que devemos duvidar do que nos apresentam como verdades absolutas; que devemos superar preconceitos.

Em assim sendo, as atividades realizadas voltaram-se, sobretudo, para:

A problematização e a relativização de visões e conceitos estabelecidos e dados como verdadeiros.

A explicitação e superação de preconceitos.

O reconhecimento da existência do outro, como diferente e como igual.

A aproximação e o reconhecimento de universos sócio-culturais diversos.

A valorização da diversidade e do encontro entre os diferentes.

Despertar a responsabilidade social dos adolescentes.

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Não sendo realizadas atividades voltadas para:

A reflexão sobre cidadania

A redução de tensões da cidade.

A humanização da cidade.

O estímulo à participação ativa dos adolescentes em um movimento de construção de uma cultura do encontro, voltada para a superação de barreiras territoriais e sociais, a redução da violência, e a garantia de oportunidades iguais de desenvolvimento para seus pares, independentemente de sua classe social e de sua origem étnica.

Mas as atividades efetivamente realizadas produziram os resultados, as mudanças e as contribuições esperados?

A) OS RESULTADOS PRODUZIDOS

O projeto definia como resultados a formação de 2 grupos de estratos sociais e etnias diversas para refletir, comentar e desenvolver atividades voltadas para a superação de barreiras territoriais e sociais na cidade; vivenciar oportunidades de encontro e integração, que visassem seu desenvolvimento integral, responsável e cidadão, a redução de tensões e a humanização da cidade; e protagonizar ações de comunicação que refletissem e se manifestassem sobre a sua vida, sua cidade e seu mundo.

Como já mencionado, a questão da etnia não foi considerada na seleção dos participantes, nem trabalhada ao longo do projeto. As atividades voltadas para a superação de barreiras territoriais limitaram-se a visitas dos adolescentes às escolas alheias. E as atividades voltadas para a superação de barreiras sociais, às atividades voltadas para a superação de preconceitos entre os grupos envolvidos no projeto.

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A questão da responsabilidade social foi tratada, indiretamente, na Oficina de Filosofia e na Oficina de Vídeo, somente na Zona Sul. Não constituía o foco das atividades desenvolvidas.

E também não se pode afirmar que houve encontros voltados para a redução de tensões da cidade e para humanizá-la.

Quanto às ações de comunicação, estas disseram respeito, sobretudo, à vida dos adolescentes e não a sua cidade e ao seu mundo.

Em síntese, os resultados produzidos ficaram muito aquém dos esperados.

A explicação para essa situação pode estar no fato do projeto ter sido iniciado sem o amadurecimento necessário da equipe, que não dispôs do tempo necessário para o planejamento criterioso da produção dos resultados pretendidos, em virtude de ter que elaborar o projeto em curto espaço de tempo, para não perder a oportunidade de apoio institucional e financeiro para o seu desenvolvimento.

Outra explicação é que os resultados esperados podem ser ambiciosos demais, considerando-se a duração do projeto.

Essas explicações também podem justificar o não-alcance de algumas mudanças desejadas.

B) AS MUDANÇAS PROMOVIDAS

O que se pretendia como mudanças nesse projeto era que adolescentes de estratos sociais e etnias diversas conhecessem-se (adquirissem informações uns sobre os outros, mantivessem relações pessoais, se incorporassem à memória uns dos outros); convivessem (vivessem em proximidade, se relacionassem); comunicassem-se (trocassem idéias e experiências); reconhecessem-se (distinguissem-se por suas características); vivenciassem a diversidade (vivessem a diversidade, deixando-se afetar por ela); valorizassem a diversidade (dessem importância, atribuíssem valor à diversidade); vivenciassem o encontro entre os diferentes (vivessem o encontro entre os

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diferentes deixando-se afetar por ele); valorizassem o encontro entre os diferentes (dessem importância, atribuíssem valor a encontrar-se com o diferente); buscassem a superação de disparidades e barreiras territoriais e sociais como possibilidade de vida na cidade (interagissem fora do âmbito do projeto; propusessem ações nesse sentido).

As informações levantadas para fins dessa avaliação, sobretudo nas entrevistas, indicam que:

Os adolescentes que efetivamente participaram do projeto conviveram, se conheceram, se comunicaram e se reconheceram, ainda que superficialmente. Sendo que a convivência entre eles foi maior na Zona Oeste. E a comunicação, na Zona Sul.

Os adolescentes da Zona Oeste vivenciaram e valorizaram a diversidade e o encontro entre os diferentes.

Os adolescentes da Zona Sul vivenciaram, mas não valorizaram a diversidade. Valorizaram, mais do que vivenciaram, o encontro entre os diferentes.

Os adolescentes das escolas públicas vivenciaram e valorizaram o encontro entre os diferentes em uma intensidade muito maior do que os adolescentes das escolas particulares.

Entre os adolescentes das escolas públicas, o impacto maior do encontro foi sobre os adolescentes do CIEP Aytron Senna, na Rocinha.

Entre os adolescentes das escolas particulares o impacto menor do encontro foi sobre os alunos da Escola Parque, na Gávea.

Os adolescentes das escolas públicas desenvolveram expectativas positivas em relação às possibilidades de superação de disparidades e barreiras sociais como

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possibilidade de vida na cidade. Muito mais do que os das escolas particulares.

Concretamente, nenhum adolescente buscou efetivamente interagir com os colegas fora do âmbito do projeto, nem propôs ações para a superação de barreiras territoriais e sociais como possibilidade de vida na cidade.

Os adolescentes das escolas públicas pensaram em procurar os adolescentes das escolas particulares, mas se sentem envergonhados em fazê-lo.

Em síntese, pode-se afirmar que as mudanças pretendidas foram promovidas em uma escala menor do que a esperada, com um impacto maior entre os adolescentes das escolas públicas do que entre os adolescentes das escolas particulares e com um impacto maior ainda entre os adolescentes do CIEP Ayrton Senna da Rocinha do que entre os demais adolescentes – o que merece uma reflexão mais profunda.

Cabe registrar que o fato do Projeto Encontros ter repercutido menos nos adolescentes da Escola Parque pode ser relacionado ao preconceito que sentiram da equipe em relação a eles ou a sua maior dificuldade em se expressar livremente, sem ter que ser “politicamente corretos”.

C) CONTRIBUIÇÕES REALIZADAS

Como já referido, com a realização do projeto pretendia-se contribuir para que os adolescentes incorporassem uma nova maneira de se portar frente às diferenças e, consequentemente, frente à vida de um modo geral. E para que adolescentes cariocas e fluminenses de diferentes estratos sociais interagissem, manifestassem-se e participassem ativamente de um movimento de construção de uma cultura do encontro, voltada para a superação de barreiras territoriais e sociais, a redução da violência e a garantia de oportunidades iguais

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de desenvolvimento para seus pares, independentemente de sua classe social e de sua origem étnica.

Nas entrevistas realizadas há indicadores claros do interesse dos adolescentes em participar de um movimento voltado para a superação de barreiras territoriais e sociais - que valorizam -, mas não como deflagradores ou protagonistas do mesmo, nem com clareza quanto às barreiras a serem superadas. Todos manifestaram esse interesse ao serem perguntados a respeito.

Por outro lado, também são observadas mudanças significativas na maneira dos adolescentes se posicionarem ou se portarem frente às diferenças e à vida de um modo geral.

Em primeiro lugar, cabe destacar o fato de todos eles, a partir da interação promovida pelo projeto, passarem a se identificar tanto em sua “humanidade”, quanto em sua “adolescência”, independentemente de sua inserção social.

Em segundo lugar, cabe destacar o fato dos adolescentes das escolas públicas, tanto da Zona Oeste quanto da Zona Sul, terem afirmado que não apenas desfizeram o preconceito que tinham em relação aos adolescentes das escolas particulares, como que passaram a difundir, entre os que não fizeram parte do projeto, que esse preconceito não se justificava.

Importante registrar, ainda, as seguintes descobertas de adolescentes do CIEP Ayrton Senna da Rocinha:

A descoberta de que eles também fazem parte da sociedade. Na realidade, de que eles são a sociedade e que, portanto, também têm responsabilidade sobre o que acontece na mesma.

A descoberta da imensa desigualdade no acesso a oportunidades de desenvolvimento na sociedade, em virtude de estudarem em escola com qualidade de ensino muito inferior a de escolas particulares. E, consequentemente, da importância de lutar para reduzir essa diferença.

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Por outro lado, no entanto, não se pode deixar de mencionar que os “pré-conceitos” (porque talvez nessa idade ainda não se possa falar em conceitos) ou preconceitos dos adolescentes da Escola Parque em relação aos adolescentes do CIEP Ayrton Senna pouco se alteraram a partir da convivência com eles no projeto.

Antes de os conhecerem, os adolescentes da Escola Parque achavam que eles eram “despolitizados”, “alienados”, sem estrutura para pensar, sem “riqueza” a oferecer, em virtude de estudarem em escola com baixa qualidade de ensino. Após os conhecerem, descreveram-nos como passivos, conformados, acomodados, embora reconhecessem que alguns eram posicionados em relação à vida e que também eram humanos no sentido de quererem ajudar a quem precisa mais do que eles.

Em síntese, pode-se afirmar que o projeto contribuiu, principalmente, para que os adolescentes das escolas públicas se posicionassem de novas maneiras em relação à diferença e à vida de um modo geral, e para despertar em todos a vontade de participar de um movimento voltado para a superação de barreiras sociais e territoriais na cidade.

6. OBSERVAÇÕES GERAIS

As conversas com os adolescentes do projeto, realizadas para fins dessa avaliação, permitiram algumas conclusões sobre esse grupo, compartilhadas a seguir:

Adolescentes têm muito mais “pré-conceitos” do que preconceitos. Estão em busca da formação de conceitos.

Adolescentes das escolas públicas têm mais facilidade de assumir preconceitos do que adolescentes de escolas particulares.

Adolescentes têm disposição para superar barreiras e preconceitos.

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Adolescentes não apenas precisam, gostam de receber orientação.

Adolescentes do ensino médio, com idade maior ou igual a 16 anos são muito mais maduros do que adolescentes do ensino fundamental.

Adolescentes de escolas públicas são muito mais maduros do que adolescentes de escolas particulares.

Adolescentes de escolas particulares têm que ser “politicamente corretos”. Adolescentes de escolas públicas podem ser mais autênticos.

Adolescentes querem autonomia em relação aos pais. Não tem interesse em envolvê-los nos projetos que participam.

Das conversas com os coordenadores pedagógicos, resultaram as seguintes considerações para o projeto:

A importância do apoio de instituições de peso para a acolhida de um projeto como o Projeto Encontros nas escolas.

A necessidade de uma boa apresentação do projeto nas escolas para o seu êxito.

O fato de a equipe ter manifestado preconceito em relação aos adolescentes das escolas particulares (impensável repetir uma coisa como essa).

A relevância de se tomar cuidado com o “preconceito invertido”, ou seja, o preconceito dos alunos das escolas públicas em relação aos alunos das escolas particulares (esse fato também ficou claro em depoimentos dos adolescentes).

A importância de se buscar dinâmicas mais adequadas à maturidade e aos interesses dos adolescentes (o que é confirmado em depoimentos destes).

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A necessidade de promover uma participação mais interativa e espontânea, menos dirigida, entre os adolescentes (necessidade essa confirmada nos depoimentos dos adolescentes).

A necessidade de o projeto resultar na elaboração de um projeto conjunto pelos adolescentes (os adolescentes também formularam essa demanda).

As observações em relação ao momento em que o projeto deve ser iniciado (começo do ano) e em relação à duração do projeto (deveria ser mais longa, para facilitar criação de vínculos).

O fato da convivência com os adolescentes das escolas particulares propiciarem uma visão mais ampla das opções que podem ser buscadas na vida para os adolescentes das escolas públicas.

Por fim, a importância da participação de pedagogos e de Coordenadores Pedagógicos das escolas para o êxito do projeto.

7. RECOMENDAÇÕES

Diante do exposto até aqui, é possível fazer as seguintes recomendações em relação ao que repetir, modificar e evitar nas próximas experiências.

O QUE REPETIR

Promover a aproximação e a interação de adolescentes de estratos sociais diversos, estudantes de escolas da rede pública de ensino e de escolas particulares.

Manter o limite de participantes de cada escola em 15.

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Realizar atividades/vivências que estimulem a expressão, a reflexão e a criatividade dos adolescentes.

Distribuir as atividades em 8 encontros de 3 horas cada.

O QUE MODIFICAR

Realizar o projeto em escolas que estejam próximas umas das outras - para facilitar o encontro e a interação entre os adolescentes fora do âmbito do projeto.

Sempre que possível, realizar os encontros nas próprias escolas, alternadamente (uma parte em uma escola, outra parte em outra).

Envolver os Coordenadores Pedagógicos das escolas na elaboração e implementação do projeto.

Definir atividades que sejam adequadas à maturidade, aos interesses, ao cotidiano dos adolescentes.

Estruturar e distribuir as atividades do projeto com base nos indicadores de êxito nele definidos.

Estabelecer como produto final do projeto um projeto conjunto, elaborado pelos adolescentes.

Mudar a forma de apresentação do projeto nas escolas (as finalidades e os objetivos do projeto devem ficar claros para todos).

Articular o Projeto Encontros às disciplinas de Sociologia e Filosofia, quando elas forem ministradas nas escolas.

O QUE EVITAR

Preconceito de qualquer natureza.

Escolas muito distantes umas das outras.

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Deslocamentos de longa distância.

8. INDICADORES DE ÊXITO

Como indicadores de êxito do projeto, em suas próximas edições, propõe-se o alcance das situações especificadas a seguir.

Espera-se que ao final do projeto, adolescentes reconheçam, compreendam e/ou acreditem que:

Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão  e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade. (Artigo I da Declaração Universal dos Direitos Humanos).

Suas histórias de vida têm semelhanças e diferenças.

São pessoas diferentes, indivíduos, mas que têm em comum, no mínimo, os fatos de serem humanos e adolescentes.

O encontro entre os diferentes é positivo, porque constitui uma oportunidade de pluralização da existência, de troca e de cooperação entre as pessoas.

Vivem em sociedades e em cidades nas quais adolescentes das elites têm mais e melhores oportunidades de desenvolvimento do que adolescentes das classes populares.

É preciso iniciar movimento no sentido de superar essa desigualdade, assegurando oportunidades iguais de desenvolvimento para todos os adolescentes, independentemente de sua classe social, nas cidades.

Sua participação nesses movimentos é fundamental.

Como indicador de êxito absoluto do projeto, sugere-se:

Projeto no sentido de dar continuidade à interação entre adolescentes de estratos sociais diversos com vistas à superação de barreiras

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territoriais e sociais como possibilidade de vida na cidade, promovida pelo Projeto Encontros, é elaborado pelos adolescentes envolvidos no mesmo.

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