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1 TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO INTRODUÇÃO EVOLUÇÃO HISTÓRICA E TERCEIRIZAÇÃO NO ÂMBITO MUNDIAL 1. Modelo Taylorista/ Fordista de Divisão do Trabalho 2. Modelo Toyotista de Divisão do Trabalho A TERCEIRIZAÇÃO NO PROCESSO PRODUTIVO BRASILEIRO Conceito de terceirização O que significa terceirizar Relação jurídica trilateral Finalidade da terceirização Quarteirização ESPÉCIES DE TERCEIRIZAÇÃO DO PROCESSO PRODUTIVO BRASILEIRO 1. Quanto ao grau de evolução das atividades terceirizadas: a) Terceirização da atividade-meio b) Terceirização da atividade-fim 2. Quanto a forma de desenvolvimento do processo: a) Terceirização de Serviços ou Terceirização de Mão-de-Obra b) Terceirização de Atividades 3. Quanto a licitude do processo: a) Terceirização Lícita b) Terceirização Ilícita FORMATO JURÍDICO DA TERCEIRIZAÇÃO 1. A Terceirização e o Trabalho Temporário 2. A Terceirização e os Serviços de Vigilância e de Conservação e Limpeza 3. A Terceirização das Atividades-meio e Atividades-fim do Tomador 4. A Terceirização e a Administração Pública TERCEIRIZAÇÃO E FRAUDE 1. “Marchandage”: 2. Outras formas de fraude à lei: 2.1 - Subordinação Jurídica e Pessoalidade no Trabalho Terceirizado 2.2 - A Falta de Especialização e Idoneidade da Empresa Prestadora de Serviços

TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

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Page 1: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

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TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

INTRODUÇÃO

EVOLUÇÃO HISTÓRICA E TERCEIRIZAÇÃO NO ÂMBITO MUNDIAL

1. Modelo Taylorista/ Fordista de Divisão do Trabalho

2. Modelo Toyotista de Divisão do Trabalho

A TERCEIRIZAÇÃO NO PROCESSO PRODUTIVO BRASILEIRO

Conceito de terceirização

O que significa terceirizar

Relação jurídica trilateral

Finalidade da terceirização

Quarteirização

ESPÉCIES DE TERCEIRIZAÇÃO DO PROCESSO PRODUTIVO BRASILEIRO

1. Quanto ao grau de evolução das atividades terceirizadas:

a) Terceirização da atividade-meio

b) Terceirização da atividade-fim

2. Quanto a forma de desenvolvimento do processo:

a) Terceirização de Serviços ou Terceirização de Mão-de-Obra

b) Terceirização de Atividades

3. Quanto a licitude do processo:

a) Terceirização Lícita

b) Terceirização Ilícita

FORMATO JURÍDICO DA TERCEIRIZAÇÃO

1. A Terceirização e o Trabalho Temporário

2. A Terceirização e os Serviços de Vigilância e de Conservação e Limpeza

3. A Terceirização das Atividades-meio e Atividades-fim do Tomador

4. A Terceirização e a Administração Pública

TERCEIRIZAÇÃO E FRAUDE

1. “Marchandage”:

2. Outras formas de fraude à lei:

2.1 - Subordinação Jurídica e Pessoalidade no Trabalho Terceirizado

2.2 - A Falta de Especialização e Idoneidade da Empresa Prestadora de Serviços

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RESPONSABILIDADE DO TOMADOR DE SERVIÇOS EM DECORRÊNCIA DA TERCEIRIZAÇÃO

1. Responsabilidade Subsidiária:

2. Reconhecimento do Vínculo de Emprego:

3. Responsabilidade Solidária:

4. Responsabilidade da Administração Pública:

VANTAGENS E DESVANTAGENS DA TERCEIRIZAÇÃO

1. Vantagens da Terceirização:

2. Desvantagens da Terceirização:

FORMAS DE PREVENÇÃO DOS RISCOS TRABALHISTAS

1. Quanto ao relacionamento com as pessoas contratadas

2. Quanto ao objeto da terceirização

3. Quanto aos aspectos do contrato

4. Quanto à regularidade da prestadora de serviços

5. Quanto à fiscalização do trabalho

Page 3: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

3

INTRODUÇÃO

O contrato de trabalho possui natureza jurídica e características próprias, o que o torna tão

diverso das demais espécies de contratos, a ponto de merecer um ramo do direito especializado na

sua regulamentação.

A especificidade do contrato de trabalho se verifica na ocorrência de 02 (duas) obrigações

recíprocas: de um lado a obrigação do empregado, que tem por objeto a prestação de serviços e, de

outro, a obrigação do empregador, que se perfaz no pagamento da remuneração.

O contrato de trabalho ainda caracteriza-se por um terceiro elemento, qual seja a

subordinação jurídica, que significa o direito do empregador de fiscalizar e direcionar as atividades de

seus empregados, de acordo com seus interesses.

No entender de Otávio Pinto e Silva, a subordinação e o poder de direção são verso e

reverso da mesma medalha: a subordinação é a situação em que fica o empregado e o poder de

direção é a faculdade conferida ao empregador. Ambas se completam, de modo que em um processo

judicial é recomendável seguir uma diretriz para se concluir se há ou não subordinação, tal como a

verificação da quantidade e intensidade de ordens permanentes de serviço a que está sujeito o

trabalhador1.

Essa subordinação do empregado aliada ao poder de direção do empregador enfocam a

presença de uma desigualdade entre as partes no âmbito da relação de emprego, o que caracteriza a

diferença entre o contrato de trabalho e os demais contratos privatísticos.

Assim, na tentativa de restabelecer o equilíbrio entre as partes, numa relação

originariamente desigual, o legislador trabalhista amparou o trabalhador com um elenco de normas

protetivas, submetendo o empregador a inúmeros deveres e obrigações, de tal modo a garantir aos

empregados, parte hipossuficiente, uma série de direitos e acomodações.

A máxime proteção se justifica, quando retornamos à época de criação e estabelecimento

de tais normas protetivas (CLT – ano 1943). Naquele momento, a economia brasileira passava por

um período de transação. Os trabalhadores rurais começavam a deixar o campo para ir trabalhar na

cidade. Aos poucos, o país, até então agrícola, fincava suas estacas no desenvolvimento econômico

da indústria, por meio de incentivo à entrada de capital e empresas estrangeiras.

1 Otávio Pinto e SILVA. Subordinação, Autonomia e Parassubordinação nas Relações de Trabalho. Ed. LTr. São

Paulo. 2004. p. 16.

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4

Com o passar dos anos, a economia mundial ganhou nova conotação. “O fenômeno da

globalização despertou na classe empresarial a necessidade de dinamizar seus mecanismos de

reprodução de riquezas, de criar novas respostas para a sempre presente pergunta feita pelo capital

àquela que o detém: „Como você fará para me reproduzir em maior quantidade e em maior

velocidade”2.

O processo de globalização da economia alterou e continua a alterar as relações de

trabalho, especialmente em virtude do uso constante de inovações tecnológicas que resultam na

adoção de diversas formas de reestruturação produtiva. A precarização das relações de trabalho

passa a ganhar espaço, seja com o aumento do número de trabalhadores autônomos, seja com a

ampliação das formas de subcontratação de trabalho (terceirização, cooperativas), seja com a

simples informalidade ou clandestinidade3.

Originou-se, então, o entre choque da realidade econômica com as normas jurídicas

trabalhistas.

“... no Direito do Trabalho há demasiada proteção e pouca liberdade e a preocupação

do Direito do Trabalho clássico foi muito mais a de proteger o trabalhador e muito

menos de cuidar da viabilidade econômica da empresa que afinal é sua fonte de

trabalho. O que hoje está acontecendo é (...) o direito do trabalho na atualidade

passará de um direito de distribuição de riqueza a ser um direito de produção de

riqueza. Da hipertrofia de demasiada proteção nasceu rigidez não só gravosa para as

empresas, mas indiretamente para os trabalhadores, cuja frente de trabalho se vê

solapada ou então não cresce”. (Cássio Mesquita de Barros, Flexibilização do direito

do trabalho, LTr, n° 58, v. 2, p. 1038)4.

A fragmentação do mercado e a elevação da taxa de desemprego demonstram a

necessidade de redefinição do direito do trabalho.

Nesta seara, a terceirização se mostra como a saída encontrada pelos empregadores para

contornar o rigorismo das normas trabalhistas e possibilitar o enquadramento de suas empresas na

nova era da economia. Em contrapartida, aos empregados somente restou se adaptar a este novo

molde de relação trabalhista e, infelizmente, aguardar até que seja feita uma releitura dessa proteção

e autonomia nas relações empregatícias, que busquem melhor adequar o direito do trabalho à

realidade concreta.

2 José Janguiê Bezerra DINIZ. A Terceirização e o Direito do Trabalho. Revista Jurídica nº 21. Trabalho &

Doutrina. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 7. 3 Otávio Pinto e SILVA. Subordinação, Autonomia e Parassubordinação nas Relações de Trabalho. Ed. LTr. São

Paulo. 2004. p. 9. 4 José Janguiê Bezerra DINIZ. A Terceirização e o Direito do Trabalho. Revista Jurídica nº 21. Trabalho &

Doutrina. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 6.

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5

O presente módulo tem a função de desenvolver a análise do processo de terceirização,

iniciando por sua evolução histórica, conceito e classificações. Dada sua tendência de contrapor-se

ao princípio de proteção do trabalhador, será feita a análise, também, de seu formato jurídico, as

possibilidades de fraudes e as espécies de responsabilidades inerentes a esta figura. Por fim, se

demonstrarão as vantagens e desvantagens do serviço terceirizado, bem como outras formas de

contratação de prestação de serviços e, ainda, as formas de prevenção de eventuais riscos

trabalhistas.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA E TERCEIRIZAÇÃO NO ÂMBITO MUNDIAL

No mundo antigo, a escravidão caracteriza-se como sendo a situação predominante de um

trabalhador. Os escravos tinham o status não de homens, mas de “coisas”. Eram destituídos de

vontade própria, sendo considerados, pura e simplesmente, como propriedades dos grandes

detentores de terra.

A Idade Média foi marcada pelo regime do feudalismo, com a presença da servidão e de

algumas corporações de ofício. Os servos (trabalhadores rurais) estavam presos a terra em que

trabalhavam, não gozando, portanto, de autonomia nas relações de produção. Em troca dos trabalhos

prestados, recebiam tão-somente a proteção dos donos das glebas.

No final da Idade Média, a partir da crise do modelo feudal, novas formas de organização

produtiva foram surgindo. A primeira forma que surgiu foi a chamada “corporação de ofício”, que

dividiu os trabalhadores em três classes: aprendiz, companheiro e mestre. Os poderes de

organização e disciplina dessa relação concentravam-se nas mãos do respectivo mestre, todavia,

sem haver qualquer relação jurídica entre este e seus empregados, mas tão-somente uma sociedade

de direitos e deveres recíprocos.

Entretanto, somente com a decadência total do feudalismo e o surgimento da burguesia, é

que as relações de trabalho se intensificaram. Iniciava-se, então, a consolidação do capitalismo. Com

o surgimento da indústria, a burguesia se firmou como classe hegemônica.

Na Idade Contemporânea (marcada pela Revolução Francesa e Revoluções Industriais), o

regime capitalista (assalariado) viveu seu apogeu. Tal época foi marcada pela livre concorrência e

liberdade de trabalho, sem qualquer interferência do Estado, conhecido por “Estado Liberal”.

O trabalhador era juridicamente livre para contratar as condições que deveriam regular o

seu contrato de trabalho; mas essa liberdade era apenas formal, porque a lei da oferta e da procura

impunha-lhe a aceitação das piores condições de trabalho, inclusive salários aquém do indispensável

para a própria subsistência. Nesta fase de exacerbação do liberalismo econômico e jurídico, o

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trabalho humano nada mais representava do que mercadoria cujo preço oscilava em face da

disponibilidade de braços.5

O capitalismo exagerado, com a concentração de renda nas mãos da minoria, exploração

de mão-de-obra e jornada de trabalho excessiva, acentuou o empobrecimento dos trabalhadores pela

insuficiência competitiva em relação à indústria que florescia, situação esta que acabou por gerar

uma séria perturbação social. Formaram-se, assim, duas classes sociais de interesse antagônico: a

proletária e a capitalista.

O sentimento de solidariedade e a construção da consciência de classe foram pressupostos

inevitáveis para a formação do associativismo6. Houve, então, a intensificação das discussões em

torno da questão social do trabalho e o início de transição do Estado Liberal para o Estado de Bem-

Estar Social.

A necessidade da intervenção estatal, com a imposição de barreiras à liberdade contratual,

em nome do interesse coletivo e da justiça social, com a criação de normas de amparo ao

trabalhador, foi considerada a melhor estratégia para regular o desequilíbrio entre as classes sociais

proporcionados pelo Estado Liberal.

Como pondera Gabriela Delgado, “o ramo juslaboral passou a ser considerado „[...]

progressista, irrenunciável, irreversível, [...] sempre arrancando novas concessões ao capital‟. Por

conseguinte, o empregado, parte hipossuficiente na relação empregatícia, estava envolto numa

redoma protetiva composta por princípios, regras e institutos jurídicos específicos, todos

essencialmente teleológicos ou finalísticos. Foi nessa conjuntura que surgiu o princípio da “proteção,

tuitivo ou tutelar”, sustentáculo do Direito do Trabalho, „[...] inspirador amplo do complexo de regras,

princípios e institutos que compõem esse ramo jurídico especializado”7.

Pois bem. A influência das teorias surgidas a partir do século XIX contribuiu para o

surgimento de diversas normas de proteção dos trabalhadores dos países de todo o mundo. Em

1919, foi criada a Organização Internacional do Trabalho (OIT), destinada a realizar estudos sobre os

problemas relacionados ao trabalho no âmbito mundial.

Após a Segunda Guerra Mundial, as indústrias retomaram sua fase de crescimento e a

concretização de um novo avanço do capital. Todavia, com a queda das taxas de lucros, aumento do

preço da força de trabalho, desigualdade acentuada na distribuição de rendas, crescimento das

empresas multinacionais, aumento de privatizações e a crise do Estado do Bem-Estar Social, fizeram

5 Arnaldo SUSSEKIND. Instituições de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. Vol. I. p. 324.

6 Gabriela Neves DELGADO. Terceirização - Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 41. 7 Gabriela Neves DELGADO. Terceirização - Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 50.

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7

da década de 70 e 80 mais um momento de crise do capitalismo. Surgiu-se, então, o chamado

“Estado Liberal” ou “Estado Mínimo”, com redução acentuada na forma de regulamentação das

questões sociais e econômicas.

A “era da globalização”, pode ser analisada em várias acepções, configurando-se como um

fenômeno que ora provoca o encurtamento das distâncias do mundo pela maior acessibilidade

proporcionada pelos modernos meios de transporte e comunicações; ou ora provoca o fenômeno da

internacionalização comercial, produtiva, financeira, tecnológica e cultural, através do chamado

movimento de “transnacionalização”8. Em qualquer de suas acepções, verifica-se que a falta de

instrumentos sofisticados de análise macroeconômica acrescida da falta de uma forte estrutura social,

econômica e jurídica, fará com que o referido fenômeno incremente a taxa de desemprego dos

países que convivem com tais condições.

A competitividade entre as pessoas em detrimento da solidariedade e a competitividade

empresarial mediante a organização dos modos de produção e redução dos custos, provocaram a

descentralização das atividades empresariais, o que possibilitou não só a fragmentação da cadeia

produtiva como também o surgimento de novas relações de trabalho, como a terceirização.

Insta ressaltar que, em meio a esta evolução história citada, 02 (dois) modelos de

organização do trabalho merecem destaque:

1. Modelo Taylorista/ Fordista de Divisão do Trabalho:

Elaborado pelo americano Frederick Taylor no final do século XIX, o taylorismo

desenvolveu-se como alternativa a ser empregada para o aumento da produtividade no trabalho, por

meio da adoção da teoria dos tempos e movimentos, a fim de aprimorar a acumulação de capital.

No Brasil, o referido modelo passou a ser utilizado a partir dos anos 30, obtendo grande

repercussão na industrialização nascente.

Preocupado com o esbanjamento de tempo, que significava para ele o tempo morto na

produção, Taylor iniciou uma análise racional, do tipo cartesiana, por meio da cronometragem de

cada fase do trabalho, eliminando os movimentos muito longos e inúteis. Desta forma, conseguiu

dobrar a produção. Infelizmente, este método, bastante lógico do ponto de vista técnico, ignorava os

efeitos da fadiga e os aspectos humanos, psicológicos e fisiológicos, das condições de trabalho9.

8 Ancelmo César Lins de GÓIS. A flexibilização das normas trabalhistas frente a globalização. Disponível em

www.jus.com.br. Acesso em 03 de julho de 2004. 9 Ing. Néri dos SANTOS. Condições Organizacionais do Trabalho. Aula 07. Disponível em: www.eps.ufsc.br.

Acesso em: 17 de junho de 2005.

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8

Através do “taylorismo”, o controle do tempo somente foi possível mediante a separação e

fragmentação das atividades de planejamento das de execução. Cada trabalhador era fixado em

determinado posto de trabalho, sendo treinado para cumprir as tarefas impostas no tempo-padrão de

produção, segundo sistematizado pela direção empresarial10

.

Pois bem. Por este modelo, o homem foi reduzido a gestos e movimentos, sem qualquer

oportunidade de desenvolvimento de suas habilidades mentais. Era considerado como máquina.

O aprimoramento do sistema taylorista adveio com o processo de divisão do trabalho criado

por Henry Ford, após a Segunda Guerra Mundial, denominado de modelo fordista.

Ford verticalizou a empresa. Possibilitou a máxima racionalização das operações realizadas

pelos trabalhadores, combatendo o desperdício na produção, reduzindo o tempo e aumentando o

ritmo de trabalho, visando a intensificação das formas de exploração11

.

No Fordismo, a segmentação dos gestos do taylorismo tornou-se a segmentação das

tarefas, o número dos postos de trabalho foi multiplicado, cada um recobrindo o menor número de

atividades possíveis. Falava-se, então, de uma parcelização do trabalho, que se desenvolverá

igualmente no setor administrativo.

2. Modelo Toyotista de Divisão do Trabalho:

Desenvolvido no Japão, o modelo toyotista teve seu processo de implantação na empresa

Toyota, pelo engenheiro Ohno, por volta de 1945, pós-guerra mundial.

Adotado pela maior parte dos empresários de todo o mundo, após a década de 70, o

toyotismo vem sendo utilizado em larga escala como alternativa de adequação da empresa ao

mercado de trabalho globalizado, onde imperam a necessidade de redução de custos e o aumento de

competitividade.

Como bem elucida Gabriela Delgado, o toyotismo utiliza algumas técnicas para fazer

funcionar a nova lógica do capital, o que somente é possível em virtude do exercício de controles

internos e externos da produção, além da imposição de mecanismos mais modernos de relações

interempresariais12

.

10

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização - Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 44. 11

Ibid. p. 52. 12

Ibid. p. 94.

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9

Segundo a autora, o controle interno decorre de mecanismos de “produção enxuta” (lean

production) ou da “queima de gorduras” (dowsizing) e do “pronto atendimento” (just in time), tendo por

fim inserir a qualidade total em todo o processo produtivo. A produção enxuta torna-se rentável na

medida em que as empresas passam a não estocar mercadorias – produzidas com alto grau de

especialização, porém em pequena escala – atendendo, tão-somente, às demandas de públicos

específicos. Ou melhor, a demanda do mercado é que define o que será fabricado pelas empresas13

.

Por outro lado, o controle externo se verifica pela imposição de novos mecanismos de

relações interempresariais, mediante a estratégia de implemento das “demissões em massa” (fire) e

da “criação de empregos” (hire)14

. Neste interregno, é que surgem os serviços terceirizados.

Em suma, como lembra Carolina Pereira Marcante, o referido modelo de organização de

produção tem como características básicas: a produção vinculada a demanda, ao contrário da

produção em massa do fordismo; trabalho operário em equipe, como multivariedade de funções,

processo produtivo flexível, que possibilita ao operário manusear simultaneamente várias máquinas;

presença do just in time (melhor aproveitamento do tempo de produção); estoques mínimos; senhas

de comando para a reposição de peças e estoque; estrutura horizontalizada – apenas 25% (vinte e

cinco por cento) da produção é realizada pela própria empresa, o restante é realizado por empresas

terceirizadas; organização de círculos de controle de qualidade, compostos de empregados, que são

instigados a melhorar seu trabalho e desempenho15

.

13

Ibid. 14

Ibid. p. 100. 15

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em 15 de março

de 2005.

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10

A TERCEIRIZAÇÃO NO PROCESSO PRODUTIVO BRASILEIRO

Orlando Gomes e Elson Gottschalk afirmam que a história do Direito do Trabalho no Brasil

deve ser dividida em 03 (três) fases: uma pré-histórica e duas históricas. A primeira, que abrange o

período de 1822 (Independência) à 1888 (abolição da escravatura). A segunda, que se inicia com a

abolição da escravatura e termina com a Revolução de 1930. E, a terceira e última fase, que se

principia com a Revolução de 1930 e estende-se ao longo de todo o século XX16

.

Antes da Revolução de 1930, as relações de emprego no país eram de pouca relevância,

uma vez que o país caracterizava-se por uma economia essencialmente agrícola. As poucas

indústrias que existiam eram compostas em sua grande maioria por imigrantes europeus, que se

concentravam sobre tudo em São Paulo e na região sul do país.

Somente em meados do século XX é que a população brasileira passou a integrar a massa

de trabalhadores urbanos do Brasil. Entretanto, os efeitos do capitalismo sobre os obreiros (péssimas

condições no ambiente de trabalho, miserabilidade de salários e jornadas excessivas, má distribuição

de renda, etc.) também marcaram o mercado de trabalho brasileiro.

Tendo em vista tais condições de trabalho neste período, se fez necessário a adoção de

medidas destinadas a proteção eficaz dos trabalhadores urbanos brasileiros, vez que até então

existia, tão-somente, legislações trabalhistas esparsas, destinadas a proteção de determinados

grupos (ex.: trabalho do menor).

Em 1943 foi a provada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pelo Decreto n°

5.452/43, que nada mais fez senão proteger minuciosamente cada trabalhador inserido em uma

relação de emprego existente no país naquela época.

No ano de 1988, pós-fase do regime militar, o legislador constituinte sob a influência do

estabelecimento de uma sociedade democrática e cidadã, promulgou a Constituição Federal de 1988,

hoje vigente. A Carta Magna tem como objetivo primordial a defesa e garantia dos direitos dos

cidadãos, enquanto seres humanos, através da concretização de direitos individuais (de cunho social,

político, civil e cultural) e direitos coletivos.

Neste interregno, tem-se a década de 60, onde as primeiras noções sobre serviços

terceirizados foram enfatizadas no Brasil, pelas empresas multinacionais que naquele período aqui se

estabeleciam.

Os decretos-leis n° 1.212 e 1.216, ambos de 1966, autorizavam a utilização de serviços de

segurança terceirizado. O decreto 62.756/68 legalizou a locação de mão-de-obra através de agências

16

Orlando GOMES e Élson GOTTSCHALK. Curso de direito do Trabalho. Ed. Forense. São Paulo. 1995. p. 6.

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11

especializadas. O decreto 1.034/69 regulou os serviços de vigilância em bancos, diretamente ou

através de empresas intermediadoras. Na década de 70, passou-se a terceirizar o setor de serviços,

principalmente, os serviços de limpeza e de segurança/ conservação para estabelecimentos

bancários. Elaborou-se a Lei 6.019/74, que trata do trabalho temporário. Posteriormente, veio a Lei

7.102/83, regulamentada pelo decreto 89.056/83, permitindo a terceirização de serviços de vigilância

e de transporte de valores17

.

A partir da década de 70, o sistema terceirizado foi implementado e, posteriormente,

consolidado no país, através da adoção do modelo toyotista de divisão de trabalho. Não havendo

uma legislação específica sobre o assunto, mas apenas legislações esparsas regulamentando

determinados serviços e casos, as empresas impulsionaram novas técnicas de estratégias produtivas

(just in time), programas de qualidade e a terceirização dos serviços.

As taxas de desemprego aumentaram e a defasagem do salário saltava aos olhos. A

competição empresarial fundava-se na redução dos custos. Visando conter tais abusos, o Tribunal

Superior do Trabalho, no ano de 1986, editou o Enunciado 256 que, na tentativa de conter o avanço

da terceirização, tornou-se um obstáculo ao desenvolvimento econômico nacional.

Em virtude do rigor excessivo com que o citado Enunciado tratava os serviços terceirizados,

em 1993, o TST o revisou (para permitir a terceirização de determinados serviços) e, ato contínuo,

elaborou o Enunciado 331, posteriormente alterado pela Resolução n° 96, de 11 de setembro de

2000.

Não há como fechar os olhos para a terceirização, que dia-a-dia se consolida como a

melhor saída encontrada pelas empresas para sustentar a competitividade das relações de produção.

Entretanto, conforme poderá se observar nos capítulos seguintes, em virtude de não haver legislação

específica sobre o tema e dado o rigor inerente a proteção das relações de emprego, tal sistema é

passível de várias críticas ante aos reais problemas que causa aos empregados.

17

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em 15 de março

de 2005.

Page 12: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

12

CONCEITO

1. O que significa terceirizar?

A expressão terceirização resulta de neologismo oriundo da palavra terceiro, compreendido

como intermediário, interveniente. Não se trata seguramente, de terceiro, no sentido jurídico, como

aquele que é estranho a certa relação jurídica entre duas ou mais partes. O neologismo foi construído

pela área de administração de empresas, fora da cultura do Direito, visando enfatizar a

descentralização empresarial de atividades para outrem, um terceiro à empresa18

.

Sob esta mesma lógica de raciocínio, Otávio Pinto e Silva, define a terceirização como

sendo uma técnica de administração que reflete a tendência de transferir a terceiros atividades que

anteriormente estavam a cargo da própria empresa19

. Em outras palavras, terceirização é a

transferência de segmento ou segmentos do processo de produção da empresa para outras de

menor envergadura, porém de maior especialização na atividade transferida20

.

Como aponta Marcelo Augusto Souto de Oliveira, “a terceirização tem múltiplas e variadas

definições. Para alguns conformados com o fenômeno, apontam para sua disseminação, e afirmam

que a terceirização é a „horizontalização da atividade econômica, segundo a qual muitas grandes

empresas estão transferindo para outras uma parte das funções até então por elas diretamente

exercidas, concentrando-se, progressivamente, em rol de atividades cada vez mais restrito‟. Para

outros, preocupados em limitar seu campo de incidência, é a „contratação, por determinada empresa,

de serviços de terceiro, para suas atividades-meio‟. Há ainda, os que definem como sendo o

„processo de repasse para a realização de complexo de atividades por empresa especializada, sendo

que estas atividades poderiam ser desenvolvidas pela própria empresa‟, fazendo crítica à „exclusão, o

apartamento e a fragmentação da classe trabalhadora pela terceirização como intermediação de

mão-de-obra‟”21

.

Em posição divergente, Arion Sayão Romita conceitua a terceirização a partir do

neologismo criado pela palavra terciário, manifestando sua preferência, portanto, pelo uso da

expressão “terciarização”.

Como cita Maranhão, Romita ensaia a preferência pelo vocábulo “terciarização”, recordando

os setores em que a atividade econômica está subdividida: setor primário, correspondente aos

recursos naturais (agricultura, pecuária); setor secundário, onde reside um processo de

18

Maurício Godinho DELGADO. Curso de direito do trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 428. 19

Otávio Pinto e SILVA. Subordinação, Autonomia e Parassubordinação nas Relações de Trabalho. Ed. LTr.

São Paulo. 2004. p. 60. 20

José Augusto Rodrigues PINTO e Rodolfo Pamplona FILHO. Repertórios de Conceitos Trabalhistas. Ed. LTr.

São Paulo. 2000. Vol. I. p. 500. 21

Marcelo Augusto Souto de OLIVEIRA. Terceirização: Avanço ou Retrocesso?. Disponível em:

www.ibcbrasil.com.br Acesso em 15 de março de 2005.

Page 13: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

13

transformação (indústria); e o setor terciário, ligado essencialmente a serviços. Esta segmentação

econômica adquire a expressão de linha divisória para significar, por exclusão, que os setores

primários e secundários da economia estão infensos a repasse de terceiros. A possibilidade desse

desmembramento ocorrer tem lindes no próprio setor terciário (serviços)22

.

Entende-se que a conceituação empregada pelo nobre jurista supracitado não deve

prosperar, uma vez que os termos “terceirização” e “terciarização” não se confundem. A primeira

expressão tem origem no ramo de Administração de Empresas e consiste em um modo de organizar

a empresa e a força de trabalho, através da desconcentração produtiva. O segundo vocábulo retrata

um segmento da economia (setor terciário), onde também se encontram trabalhadores terceirizados.

Em suma, o vocábulo “terceirização” deve ser entendido como uma técnica administrativa

de desconcentração produtiva, que provoca uma relação jurídica trilateral, por meio da qual o

trabalhador presta serviços a um tomador de serviços, apesar de possuir contrato laborativo com uma

empresa interveniente ou fornecedora.

2. Relação Jurídica Trilateral:

Ao invés de uma única relação jurídica, envolvendo as partes, temos agora três sujeitos e

dois contratos: o interempresário e o de trabalho. O primeiro, entre a empresa fornecedora e a cliente.

O segundo, entre a fornecedora e o trabalhador23

.

Os sujeitos dessa relação trilateral são: o trabalhador, prestador de serviços, que possui

vínculo de emprego (relação jurídica trabalhista) com a empresa fornecedora, mas que executa seu

trabalho junto a empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata empregados

especializados para laborar para as empresas tomadoras, possuindo com estas um contrato

interempresário, de natureza civil; a empresa tomado de serviços, que recebe a prestação de

serviços, mantendo com os empregados da primeira uma relação econômica de trabalho e não

jurídica.

22

Délio MARANHÃO. Instituições de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. Vol. I. p. 277. 23

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização - Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 140.

Page 14: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

14

Ilustrativamente, tem-se:

Cumpre mencionar que o referido gráfico vislumbra as hipóteses de terceirização lícita,

devendo ser desconsiderado para as situações de serviços terceirizados ilegais, casos em que

ocorrem a formação de vínculo de emprego direto entre empregado e tomador de serviços

(configuração da relação jurídica trabalhista).

2. Finalidade:

Conforme já explanado, a década de 60 marcou o início do estabelecimento da

terceirização no Brasil. A competitividade entre as empresas nacionais e internacionais, instaladas no

país, obrigaram a adoção do modelo toyotista de divisão de trabalho para a conquista do mercado.

Por meio da consecução do controle externo inerente ao modelo toyotista, as empresas

buscaram a terceirização, como forma de concentrar-se na realização das atividades em que se

especializaram e delegar a outros a execução de certos serviços diferenciados ou a produção de

determinados bens.

Segundo informa Robortella, a terceirização permite a dedicação e emprenho da empresa

em seu foco ou objetivo final. Ela provoca um desmonte da estrutura organizacional clássica, que

concebia a empresa como uma entidade auto-suficiente, autárquica, que se responsabilizava por

todas, ou quase todas, as fases do processo produtivo. Em verdade, ela se movimenta no sentido da

desconcentração produtiva, sendo o fornecimento de serviços buscado fora da empresa, em mãos de

terceiros24

.

Em outras palavras, a terceirização tem a função de dinamizar a relação produtiva, vez que

é o meio pelo qual uma empresa obtém trabalhos específicos de quem não é seu empregado, mas

24

Luiz Carlos Amorim ROBORTELLA. Terceirização. Tendência em doutrina e jurisprudência. Revista Jurídica

nº 21. Trabalho & Doutrina. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 33.

Relação Jurídica Civil

Empresa

Terceirizante vil

Relação Jurídica

Trabalhista

Relação Econômica

de Trabalho

Empresa

Terceirizante

Trabalhador

Empresa

Tomadora

Page 15: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

15

que pertencente ao quadro de trabalhadores de empresa especializada no ramo almejado pela

contratante.

3. Quarteirização:

“Quarteirização” ou “terceirização gerenciada”, segundo definição de Sérgio Pinto Martins,

vem ser a contratação de uma empresa especializada que se encarrega de gerenciar as empresas

terceirizadas, as parceiras. Normalmente se contrata uma empresa completamente distinta das

terceirizadas e especialista no mercado num determinado ramo de serviços ou de administração de

serviços. Esta empresa passa a administrar os fornecedores da terceirizante, em função do grande

número deles25

.

Através da quarteirização, tem-se uma maior qualidade e segurança na execução dos

serviços especializados, uma vez que o trabalho prestado pelo terceiro, que configura o processo de

terceirização, será fiscalizado e administrado por outra empresa, caracterizando, assim, a

“quarteirização” de serviço.

Como esclarece Polônio, os efeitos comerciais, trabalhistas ou fiscais, da chamada

“quarteirização” em nada difere do que se verifica no processo de terceirização, pois todo e qualquer

serviço prestado por pessoa não vinculada à empresa contratante, independentemente da posição

em que se encontra, gera os mesmos efeitos do processo de terceirização, dependendo da forma

como ela se opera. Dessa feita, as conseqüências de um processo de quarteirização serão as

mesmas do processo de terceirização26

.

ESPÉCIES DE TERCEIRIZAÇÃO DO PROCESSO PRODUTIVO BRASILEIRO

O processo de terceirização, de acordo com o critério para sua classificação, pode ser

subdivido em diversas espécies, dentre as quais:

1. Quanto ao grau de evolução das atividades terceirizadas:

a) Terceirização da atividade-meio

Atividade-meio é aquela tarefa que não se relaciona com o objeto principal desenvolvido

pela empresa tomadora de serviços, ou seja, é aquela atividade que corre paralelamente a atividade

principal, sendo, portanto, acessória desta.

25

Sérgio Pinto MARTINS. A Terceirização e o Direito do Trabalho. Ed. Malheiros. São Paulo. 1995. p. 19. 26

Wilson Alves POLONIO. Terceirização – Aspectos legais, trabalhistas e tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 127.

Page 16: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

16

b) Terceirização da atividade-fim

Atividade-fim é aquela função relacionada ao objeto principal da empresa, ou seja, que se

ajusta ao núcleo essencial do processo produtivo desenvolvido pelo tomador de serviços.

Em virtude da polêmica sobre tais tipos de terceirização, cumpre-nos mencionar que o tema

em questão será minuciosamente analisado em capítulo próprio.

2. Quanto a forma de desenvolvimento do processo:

a) Terceirização de Serviços ou Terceirização de Mão-de-Obra (terceirização para

dentro da empresa tomadora de serviços)

Por essa forma de terceirização, entende-se que a empresa tomadora incorpora em seus

quadros o trabalhador terceirizado (contratado pela empresa terceirizante). Essa forma de

terceirização, conforme veremos adiante, esta disciplinada pelo nosso ordenamento jurídico através

da Súmula 331 do TST.

b) Terceirização de Atividades (terceirização para fora da empresa tomadora de serviços)

Também denominada de subcontratação, por alguns autores, essa espécie de terceirização

tende a dar origem a parceria entre empresas, cada qual especializada em determinada atividade,

direta ou indiretamente ligada ao ciclo produtivo, como seus próprios empregados ou prestadores de

serviços, sem qualquer relação subordinante entre elas, mas com divisão e definição de

responsabilidades. Da mesma forma, os empregados da empresa contratada não se sujeitam ao

poder de comando da empresa contratante27

.

Nessa espécie de terceirização verifica-se com bastante clareza a desconcentração do

processo produtivo, dada a horizontalização da organização da produção pela tomadora de serviços,

através da transferência de certas atividades para outras empresas, cuja prestação será realizada no

âmbito destas.

A título de ilustração, têm-se as indústrias automobilísticas que, pela desconcentração

produtiva, delegam à determinadas empresas de pequeno e médio porte a fabricação de peças a

serem utilizadas no veículo.

27

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização – Paradoxo do direito do trabalho contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 120.

Page 17: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

17

3. Quanto a licitude do processo:

a) Terceirização Lícita

Por terceirização lícita entende-se a terceirização cujo objeto contratual é a transferência

das atividades-meio do ente tomador de serviço para empresas que as desenvolvam como sua

atividade-fim28

.

As hipóteses de terceirização lícita vêm expressas pela Súmula 331 do TST: situações

empresariais que autorizem contratação de trabalho temporário; atividades de vigilância; atividades

de conservação e limpeza; serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador.

b) Terceirização Ilícita

A terceirização ilícita configura-se justamente na intermediação de mão-de-obra por

empresa interposta, onde a empresa terceirizada fica responsável por transferir o objeto do contrato

ao trabalhador29

.

Como bem salienta Maurício Godinho Delgado, excluídas as quatro hipóteses de

terceirização lícita, não na ordem jurídica do país preceito legal a dar validade trabalhista a contratos

mediante os quais uma pessoa física preste serviços não-eventuais, onerosos, pessoais e

subordinados a outrem (art. 2°, caput, e 3°, caput, CLT), sem que esse tomador responda

juridicamente, pela relação laboral estabelecida30

.

28

Desireé de Araújo PIMENTEL. O Enunciado n° 331, IV, do TST e o regime próprio da Administração

Pública. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em 14 de fevereiro de 2005. 29

Ibid. 30

Maurício Godinho DELGADO. Curso de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 442.

Page 18: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

18

FORMATO JURÍDICO DA TERCEIRIZAÇÃO

Nos dias atuais, a terceirização configura-se como sendo uma prática consagrada pelo

sistema econômico e jurídico. Considerada pelos empregadores como alternativa encontrada à

dinamizar as relações de produção frente a rigidez da legislação pátria trabalhista, dizem que a

terceirização tornou-se medida hábil para a solução de problemas como o desemprego.

Nesta seara, salienta Luiz Carlos Amorim Robortella, que o direito do trabalho tem a função

de organizar e disciplinar a economia, podendo ser concebido como verdadeiro instrumento da

política econômica. Deixou de ser apenas um direito de proteção do mais fraco para ser um direito de

organização da produção. Em lugar de somente direito de proteção ao trabalhador e redistribuição da

riqueza, converteu-se em direito da produção, com especial ênfase para a regulação do mercado de

trabalho. A revisão dogmática do direito do trabalho é hoje uma realidade concreta. O protecionismo

deixou de ser sua preocupação maior, para não dizer exclusiva31

.

Todavia, em que pese essa realidade, a terceirização não está regulamentada por norma

específica. As hipóteses de terceirização lícitas permitidas pelo ordenamento jurídico brasileiro

encontram-se previstas tão-somente na Súmula n° 331 do TST (revisão do Enunciado n° 25632

do

TST), nos seguintes termos:

“I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o

vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho

temporário (lei 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera

vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou

fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de

vigilância (lei 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de

serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a

pessoalidade e a subordinação direta.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica

a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços, quanto àquelas obrigações,

inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações

públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que

hajam participado da relação processual e constem também do título executivo

judicial (art. 71 da Lei 8.666, de 21.06.1993).”

31

Luiz Carlos Amorim ROBORTELLA. Terceirização. Tendência em Doutrina e Jurisprudência. Revista

Jurídica Trabalho & Doutrina. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 32. 32

“Salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previstos nas Leis n° 6019, de 3.1.74 e

7102, de 20.6.83, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo

empregatício diretamente com o tomador dos serviços.”

Page 19: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

19

O inciso I constante da Súmula n° 331 do TST consagra o princípio basilar referente a

intermediação de mão-de-obra, qual seja: “a contratação de trabalhadores por empresa interposta é

ilegal, formando-se vínculo diretamente com o tomador de serviços”.

Pois bem. Como exceção à regra geral, tem-se a terceirização lícita, composta por 04

situações-tipo, quais sejam: situações empresariais que autorizem a contratação de trabalho

temporário, atividades de vigilância, atividades de conservação e de limpeza e serviços

especializados ligados à atividade-meio do tomador. Além dessas 04 hipóteses, ainda merece

destaque a terceirização dos serviços inerentes à Administração Pública.

1. A Terceirização e o Trabalho Temporário

Segundo definição constante no artigo 2°, da Lei 6.019/74, “trabalho temporário é aquele

prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de

pessoal regular e permanente ou a acréscimos extraordinários de serviços”.

Por este conceito pode-se concluir que o contrato de trabalho temporário, embora regulado

por lei especial, configura-se como sendo um contrato de emprego por prazo determinado, nos

termos que dispõe o artigo 443, § 1°, da CLT:

“Considera-se como de prazo determinado o contrato de trabalho cuja vigência

dependa de termo prefixado ou da execução de serviços especificados ou ainda da

realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada”.

Essa espécie de contrato, por se tratar de uma exceção ao princípio da continuidade da

relação de emprego - concretizado pela vigência de contratos a prazo indeterminado – apenas será

válido diante das hipóteses consignadas pelo § 2°, do artigo 443 da CLT: “a) de serviços cuja

natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; b) de atividades empresariais de

caráter transitório; c) de contrato de experiência;” e diante das hipóteses autorizadas pela Lei

6.019/74.

A Lei 6.019/74 menciona as hipóteses de terceirização de mão-de-obra no trabalho

temporário. Estabeleceu-se, portanto, a relação jurídica trilateral entre trabalhador temporário,

empresa de trabalho temporário e empresa tomadora de serviços. Assim, tem-se o vínculo de

emprego do trabalhador temporário com a empresa de trabalho temporário, embora preste o primeiro

serviços para a empresa tomadora de serviços; entre o trabalhador temporário e a empresa tomadora

de serviços, tem-se tão-somente uma relação econômico-trabalhista, sendo certo existir uma relação

jurídica de natureza civil entre esta e a empresa de trabalho temporário.

Page 20: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

20

A empresa de trabalho temporário, portanto, compreende “a pessoa física ou jurídica

urbana, cuja atividade consiste em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente,

trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos”33

.

Sob a mesma ótica, trabalhador temporário é toda pessoa física vinculada a uma empresa

de trabalho temporário (vínculo empregatício), de quem recebe suas parcelas salariais e de quem é

subordinado, para prestar serviços a outra empresa, seja para atender alguma necessidade

transitória em decorrência de substituição de pessoal ou para atender acréscimo extraordinário de

serviço.

Neste interregno, importante mencionar, que o trabalhador temporário não se confunde com

a figura do trabalhador contratado a prazo determinado, vez que este último encontra fundamento nas

hipóteses constantes do artigo 443 da CLT. O trabalhador temporário é regido por legislação especial

enquanto que outro tem seu contrato regido pelas normas celetistas.

Com relação às hipóteses de cabimento do trabalho temporário, o legislador especial

consagrou duas situações-tipo: a primeira para atender as necessidades transitórias de substituição

de pessoal regular e permanente da empresa tomadora e, a outra, para atender a necessidade

resultante de acréscimo extraordinário de serviços dentro da empresa tomadora.

Segundo esclarece Maurício Godinho Delgado, a primeira dessas hipóteses diz respeito a

situações rotineiras de substituição de empregados originais da empresa tomadora (férias; licença-

maternidade; outras licenças previdenciárias, etc.). A segunda abrange situações de elevação

excepcional da produção ou de serviços da empresa tomadora. Ilustrativamente, elevação

excepcional de vendas, em face de nova e excepcional contratação; elevação de vendas em face de

períodos de festas anuais, etc34

.

Insta ressaltar que, fora tais hipóteses de cabimento, não há o que se falar em licitude

acerca da existência do trabalho temporário. Por conseqüência, uma vez desrespeitadas tais

situações, configurado estará o vínculo de emprego entre o trabalhador temporário e o tomador de

serviços, em atenção ao que dispõe a regra geral constante do inciso I, da Súmula 331 do TST.

Ademais, outras formalidades ainda devem ser observadas quanto a celebração dos

contratos de trabalho temporário. Os contratos que ligam os sujeitos da relação trilateral devem ser

necessariamente escritos, não havendo possibilidade para contratação meramente tácita ou verbal,

conforme se verifica pela leitura dos artigos 9° e 11 da Lei 6.019/74:

33

Artigo 4°, da Lei 6.019, de 03 de janeiro de 1974. 34

Maurício Godinho DELGADO. Curso de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 451.

Page 21: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

21

“O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora de serviço

ou cliente deverá ser obrigatoriamente escrito e dele deverá constar expressamente o

motivo justificador da demanda de trabalho temporário, assim como as modalidades

de remuneração da prestação de serviços.”35

“O contrato de trabalho celebrado entre a empresa de trabalho temporário e cada um

dos assalariados colocados à disposição de uma empresa tomadora ou cliente será,

obrigatoriamente, escrito e dele deverão constar, expressamente, os direitos

conferidos aos trabalhadores por esta Lei.”36

Como bem salienta Maurício Godinho Delgado, a ausência desses requisitos formais do

contrato temporário implica sua automática descaracterização, dando origem a um contrato

empregatício clássico, por tempo indeterminado, com respeito ao trabalhador envolvido37

.

Por fim, o artigo 10 da mencionada Lei, determina o prazo máximo de vigência do contrato

temporário, qual seja: 03 (três) meses com relação a um mesmo empregado e a empresa tomadora

de serviços, salvo autorização conferida pelo Ministério do Trabalho. Excedido este prazo, a relação

de trabalho consagrada pela Lei 6.019/74 estará descaracterizada, formando-se o vínculo

empregatício clássico celetista com o tomador de serviços.

Diante de todo o exposto, pode-se concluir que a contratação de trabalhador por intermédio

de empresa de trabalho temporário, portanto, nos estritos termos da Lei n° 6.019/74, afasta a

possibilidade de caracterização de vínculo direto com o tomador dos serviços, isto porque a

especificidade do contrato de trabalho temporário reside no fato de não transferir ao contratante

nenhuma responsabilidade sobre o trabalho alheio, salvo nas hipóteses de insolvência da empresa

prestadora de serviços. Pelo que se percebe, o inciso I do Enunciado parece ter endereço certo: as

terceirizações fraudulentas ou simuladas utilizadas no intuito único de evitar a contratação de

funcionário e o correspondente pagamento das verbas trabalhistas, previdenciárias e demais

encargos sociais38

.

2. A Terceirização e os Serviços de Vigilância e de Conservação e Limpeza

A Súmula n° 331, inciso III, do TST, arrolou como forma de terceirização lícita as hipóteses

de serviços de vigilância, não somente referente ao segmento bancário, mas quaisquer modalidades

35

Artigo 9°, da Lei 6.019, de 03 de janeiro de 1974. 36

Artigo 11, da lei 6.019, de 03 de janeiro de 1974. 37

Maurício Godinho DELGADO. Curso de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 453. 38

Wilson Alves POLONIO. Terceirização – Aspectos Legais, Trabalhistas e Tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 28.

Page 22: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

22

do mercado de trabalho, que contratem esta espécie de atividade através de empresas

especializadas.

O Enunciado n° 256 do TST admitia apenas a terceirização de atividades de vigilância

ligadas ao setor bancário (Lei 7.102/8339

). Entretanto, com a revisão efetuada pela Súmula n° 331, a

situação-tipo foi ampliada, ao passo que, atualmente, é permitida a terceirização de serviços de

vigilância para quaisquer segmentos do mercado de trabalho.

Nesta seara, como bem salienta Maurício Godinho Delgado, vigilante não é vigia. Este é

empregado não especializado ou semi-especializado, que se vincula ao próprio ente tomador de seus

serviços (trabalhando, em geral, em condomínios, guarda de obras, pequenas lojas, etc.).Vigilante é

membro de categoria especial, diferenciada – ao contrário do vigia, que se submete às regras da

categoria definida pela atividade do empregador. O vigilante submete-se a regras próprias não

somente quanto à formação e treinamento da força de trabalho como também à estrutura e dinâmica

da própria entidade empresarial40

.

No que se refere às atividades de conservação e limpeza, a Súmula n° 331, inciso III, do

TST também é bastante clara ao consagrar como possível a terceirização de tais serviços. Desde a

década de 70, essa situação-tipo preponderava no mercado de trabalho brasileiro, ao ponto do

legislador ordinário elaborar semelhante rol, mediante a Lei 5.645/7041

, permitindo a prática do

processo terceirizante destes serviços à Administração Pública.

Apesar de considerados como atividades de apoio semelhantes, intenta-se traçar alguns

aspectos que lhes são distintivos. As atividades de conservação caracterizam-se pelo “conjunto de

medidas e práticas, periódicas e permanentes, que visam à proteção e à manutenção em bem estado

de bens, monumentos e objetos pertencentes a instituições públicas ou privadas”. De cunho genérico,

materializam-se especialmente por meio das atividades de limpeza, com a devida “exclusão de

substâncias indesejáveis, purificação, depuração” de lugares, bens, monumentos e objetos. Como

exemplos de atividades de asseio e conservação, citem-se: a faxina, a detetização, a limpeza de

vidros, os serviços de copeira, etc42

.

39

Artigo 2°, § 2°, da Lei 7.102/83: “As empresas especializadas em prestação de serviços de segurança,

vigilância e transporte de valores, constituídas sob a forma de empresas privadas, além das hipóteses previstas

nos incisos do caput deste artigo, poderão se prestar ao exercício das atividades de segurança privada a pessoas;

a estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residenciais; a entidades sem fins

lucrativos; e órgãos e empresas públicas.” 40

Maurício Godinho DELGADO. Curso de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 439. 41

Artigo 3°, da Lei 5.645/70: “As atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de

elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de execução indireta, mediante contrato,

de acordo com o artigo 10, § 7°, do Decreto-lei 200/67 (que regulamenta as atividades da Administração

Federal)”. 42

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização. Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 145.

Page 23: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

23

3. A Terceirização das Atividades-meio e Atividades-fim do Tomador

A parte final do inciso III, da Súmula n° 331 do TST permite uma outra forma de

terceirização lícita, que diz respeito a “serviços especializados ligados à atividade-meio do

tomador...”.

Entretanto, antes do aprofundamento do tema, cumpre-nos identificar a dualidade existente

entre as atividades-meio e atividades-fim de uma empresa, destacando a dificuldade que doutrina e

jurisprudência têm em caminhar de forma convergente.

Segundo aponta Wilson Alves Polônio, os estudos sobre a referida polêmica desdobram-se

em duas correntes de opinião. Para alguns, a atividade-fim está relacionada à essencialidade do

serviço, o que permitiria a conclusão absurda de que atividade-meio não seria essencial. Outros

doutrinadores propugnam que a atividade-fim está intrinsecamente relacionada com o objeto social

da pessoa jurídica, o que permitiria dizer, por outras palavras, que as demais atividades, ainda que

ligadas indiretamente a seu objeto, e todas são, salvo casos específicos e isolados, não seriam

caracterizadas como atividades-fim43

.

Nesta seara, tem-se o conceito trazido por Maurício Godinho Delgado, em sua obra Curso

de Direito do Trabalho, que retrata sua tendência pela adoção da primeira corrente doutrinária, senão

vejamos:

“Atividades-fim podem ser conceituadas como funções e tarefas empresariais e

laborais que se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do tomador dos serviços,

compondo a essência, dessa dinâmica e contribuindo inclusive para a definição de

seu posicionamento e classificação no contexto empresarial e econômico. São,

portanto, atividades nucleares e definitórias da essência da dinâmica empresarial do

tomador de serviços. Por outro lado, atividades-meio são aquelas funções e tarefas

empresariais e laborais que não se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do

tomador dos serviços, nem compõem a essência dessa dinâmica ou contribuem para

a definição de seu posicionamento no contexto empresarial e econômico mais amplo.

São, portanto, atividades periféricas à essência da dinâmica empresarial do tomador

de serviços”44

.

Por outro lado, Wilson Alves Polônio, defensor da segunda corrente, prefere diferenciar as

atividades sob a ótica dos sistemas operacionais da empresa, de tal modo que a atividade-fim se

configure como aquela concernente ao objetivo principal da empresa, expresso em contrato social ou

43

Wilson Alves POLONIO. Terceirização – Aspectos Legais, Trabalhistas e Tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 34. 44

Maurício Godinho DELGADO. Curso de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 440.

Page 24: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

24

no registro de firma individual, enquanto que a atividade-meio se caracterize pela atividade acessória

da empresa, ou seja, aquela que corre paralela à atividade principal.

Segundo o autor, na primeira linha de pensamento reside certa dificuldade em visualizar, na

prática, a aplicação do critério de identificação da atividade-fim por ela sustentada, uma vez que a

essencialidade está intrinsecamente relacionada à necessidade. Em contrapartida, pela adoção da

segunda corrente, a identificação das atividades seria mais coerente. Na área administrativa, por

exemplo, todo e qualquer tipo de serviço poderia ser terceirizado, de vez que não estaria diretamente

ligado ao objeto social45

.

Pois bem. Teoricamente, a conceituação e, conseqüente, distinção entre atividades-meio e

atividades-fim é sempre possível de ser efetuada, independente da corrente adotada pelo

doutrinador. Entretanto, na prática (na análise de cada caso concreto), há uma séria dificuldade em

classificar e identificar tais atividades, mesmo adotando como base os preceitos exarados pela

segunda corrente.

A Súmula n° 331 do TST, ao mencionar expressamente que “não forma vínculo de emprego

com o tomador a contratação de serviços especializados ligados à sua atividade-meio”, faz concluir,

através de raciocínio inverso, que aqueles serviços não ligados a tal atividade (portanto, ligados a

atividade-fim) gera vínculo de emprego entre o trabalhador e o tomador.

A nosso ver, um posicionamento excessivamente radical, que se choca com a realidade

concreta. Todavia, os tribunais assim têm decidido:

TERCEIRIZAÇÃO. ATIVIDADE-FIM. IMPOSSIBILIDADE. Somente pode-se falar em

terceirização válida quando é repassada atribuição que não se insere na atividade-fim

do tomador do serviço. Aplicação dos incisos I e III do Enunciado nº 331 do C. TST.

(TRT. 9ª Região. TRT-PR-24555-2000-007-09-00-0/RO-06792-2002. Relator:

LISIANE SANSON PASETTI BORDIN. Publicado em 21-03-2003).

TERCEIRIZAÇÃO IRREGULAR. Vínculo empregatício com a tomadora. A

contratação de trabalhadores através de supostos empreiteiros, para a execução de

serviços ligados à atividade-fim da tomadora de serviços, revela-se com o objetivo de

fraudar a proteção trabalhista. Forma-se, assim, diretamente com a tomadora dos

serviços o vínculo empregatício, inclusive por não se enquadrar na exceção a que se

refere o Enunciado n° 331, III, do TST. (TRT. 20ª Região. RO n° 10614-2003-002-20-

00-4. Aracajú – SE. Relator: AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO. J.

14/01/2004; maioria de votos).

45

Wilson Alves POLONIO. Terceirização – Aspectos Legais, Trabalhistas e Tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 35.

Page 25: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

25

Para muitos casos concretos, a clara distinção entre atividade-meio e atividade-fim

desaparece. Em outros, a terceirização da atividade-fim se faz necessária.

Ilustrativamente, tem-se a hipótese da indústria automobilística, que delega para outras

empresas serviços inerentes a sua atividade-fim, como o fornecimento de peças usadas na

composição dos veículos. Ou, então, o caso da indústria têxtil, que contrata com outras empresas

serviços referentes à colocação de botões nas peças fabricadas, etiquetas, etc. Na área financeira,

muitas vezes, se confunde a terceirização das atividades-fim e atividades-meio, principalmente

quando há delegação de serviços no que toca ao processamento de dados referentes às contas

bancárias e aplicações financeiras.

E, para todas estas situações, a redação atual do inciso III, da Súmula n° 331 do TST,

torna-se um contra-senso à dinamização da produção, gerando efeitos gravíssimos aos contratantes

quando aplicada.

Vislumbrando a ocorrência de tais hipóteses, comenta Robortella que, na dinâmica

empresarial, a atividade-meio, considerando-se o grau de especialização atingido pelos novos

métodos e tecnologias, nem sempre é de fácil conceituação. Há atividades-fim que, a depender da

orientação tecnológica, podem converter-se em atividades-meio e vice-versa. Por essa razão,

entende o autor que a terceirização das atividades-fim não pode ser necessariamente reputada ilegal,

estando, pois, o Enunciado 331 (que só admite a terceirização na atividade-meio e não na atividade-

fim) em descompasso com a doutrina mais recente a respeito da matéria46

.

Acompanham o posicionamento do autor citado, Amauri Mascaro Nascimento, Pedro Vidal

Neto, O Ministro Vantuil Abdalla, Sérgio Pinto Martins, José Janguiê Bezerra Diniz, Reginaldo

Melhado, entre outros.

“É verdade que não há parâmetros bem definidos do que sejam atividade-fim e

atividade-meio e muitas vezes estar-se-ia diante de uma zona cinzenta em que se

aproximam uma da outra. Quando tal ocorrer e a matéria for levada a juízo, ficará ao

prudente arbítrio do juiz defini-la. E fá-lo-á, naturalmente, levando em conta as razões

mais elevadas do instituto: a especialização; a concentração de esforços naquilo que

é a vocação principal da empresa; a busca de maior eficiência na sua finalidade

original; e não apenas a diminuição de custos”. (Ministro Vantuil Abdalla, do TST.

Terceirização: atividade-fim e atividade-meio – responsabilidade do tomador de

serviço, Revista LTr, São Paulo, LTr, 60(5): 588, maio de 1996)47

.

46

Luiz Carlos Amorim ROBORTELLA. Terceirização. Tendência em doutrina e jurisprudência. Revista Jurídica

Trabalho & Doutrina. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 34. 47

Ibid. p. 35.

Page 26: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

26

“As características básicas da terceirização ou subcontratação de serviços são: a)

especialização do trabalho; b) a direção da atividade pelo fornecedor; c) a sua

idoneidade econômica e d) inexistência de fraude. Presentes estes elementos

estamos com Luiz Carlos Amorim Robortella, que considera perfeitamente lícita a

terceirização de qualquer parte do sistema produtivo, pouco importando se os

serviços são realizados no estabelecimento da fornecedora ou da tomadora, ou se se

trata de atividade-fim, essencial ou atividade-meio (acessória ou de apoio). Admitir-se

a terceirização apenas na atividade-meio seria o mesmo que inadmiti-la, porquanto,

na maioria das vezes, se torna impossível fazer essa distinção. (...) Apenas em caso

de fraude à lei (CLT, arts. 9° e 444), inadimplemento ou inidoneidade financeira do

fornecedor ou prestador, o tomador responderá subsidiariamente e não

solidariamente pelas verbas dos empregados fornecidos ...”. (José Janguiê Bezerra

Diniz. O fenômeno da terceirização. Revista LTr. São Paulo. LTr. 60 (2):209, fevereiro

1996)48

.

Algumas decisões dos tribunais, ainda minoritárias, se adequam a esta nova leitura do

processo de desconcentração produtiva, mediante a análise de caso a caso, de tal modo a retirar-lhe

as amarras do inciso III, da Súmula n° 331 do TST. Vejamos:

TERCEIRIZAÇÃO. LICITUDE. A empresa pode descentralizar a execução de

determinadas tarefas utilizando-se, para isso, de convênios e contratos com

empresas ou organizações prestadoras de serviços, sem que tal hipótese implique

burla na aplicação da legislação trabalhista ou ilegalidade do que foi pactuado. Ainda

que se diga que uma atividade é permanente ou essencial, tal não afasta a

possibilidade de ela vir a ser executada de forma descentralizada, mediante a

utilização de serviços prestados por terceiros, principalmente quando diz respeito à

atividade-meio, e não à atividade-fim do contratante. (TRT. 9ª Região. RO 401/92. 1ª

Turma. AC. 1.885/95. Relator: Armando de Souza Couto. DJ. 10.02.1995).

Em que pese todos os argumentos expostos, para Jorge Luiz Souto Maior, o essencial para

a validade da terceirização é a especialização da empresa prestadora de serviço, pois uma empresa

que se constitua com o objetivo único de colocar mão-de-obra a serviço de outra não possui atividade

empresarial alguma e, por isso mesmo, não pode ser considerada empregadora, formando-se,

obrigatoriamente, o vínculo com a empresa tomadora dos serviços49

.

Nesse sentido, manifestamos concordância com o autor. O requisito da especialidade dos

serviços prestados é fundamental para a distinção entre a terceirização lícita e ilícita, pois, se assim

48

Ibid. 49

Otávio Pinto e SILVA. Subordinação, autonomia e parassubordinação nas relações de trabalho. Ed. LTr. São

Paulo. 2004. p. 69.

Page 27: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

27

não fosse, desnecessária seria a previsão contida na Súmula 331 do TST – “serviços especializados

ligados à atividade-meio do tomador”.

Serviços especializados são aqueles serviços que exigem certa habilidade ou conhecimento

específico para a sua realização, que compete a profissionais especialmente treinados e experientes

ou com formação acadêmica para tal. Por outro lado, os serviços sem especialização são aqueles

que não necessitam de treinamento específico, embora possa exigir orientação para sua realização50

.

Atualmente, a verificação desse requisito torna-se muito mais apropriada e urgente para a

caracterização da terceirização lícita ou ilícita do que propriamente a constatação da existência de

terceirização na atividade-fim do tomador de serviços. Essa última hipótese, em virtude da dinâmica

empresarial, vem se solidificando dia-a-dia e, na maioria das vezes, sem o intuito de fraudar os

direitos dos trabalhadores, mas tão-somente dinamizar a produção para a competitividade.

Portanto, uma coisa é certa. A tendência não é mais erigir-se a terceirização na atividade-

meio como critério absoluto de legalidade ou validade. Inexistente a intenção de fraudar direitos do

trabalhador, a subcontratação na atividade-fim vai sendo lentamente admitida, reconhecida que é

como instrumento do progresso econômico e geração de emprego51

.

4. A Terceirização e a Administração Pública

O Poder Público está desacreditado pela sociedade. O sistema não funciona. Muitos já

afirmam que o Estado está falido. Princípios como o da eficiência e moralidade, consagrados pelo

texto constitucional (artigo 37, caput52

) não são observados pelos administradores em geral. A

burocracia e incompetência estatal se digladiam com a era da informação e informatização.

Na tentativa de resgatar os preceitos fundamentais e na busca de seu enquadramento a

modernidade, o Estado aderiu à prática do processo de desconcentração produtiva, para dividir com

o particular a realização de determinadas obrigações públicas.

Assim, com o intuito de reduzir o volume na sua estrutura estatal, inviável para o pleno

desenvolvimento dos fundamentos e objetivos consagrados pela República Federativa do Brasil, a

Administração Pública acabou por adotar o mecanismo utilizado pela empresa privada frente a

globalização, qual seja: a terceirização.

50

Wilson Alves POLONIO. Terceirização – Aspectos Legais, Trabalhistas e Tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 34. 51

Luiz Carlos Amorim ROBORTELLA. Terceirização. Tendência em doutrina e jurisprudência. Revista Jurídica

Trabalho & Doutrina. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 37. 52

“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal

e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

eficiência...”.

Page 28: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

28

A terceirização, portanto, tornou-se um dos meios de modernização da estrutura estatal, na

medida em que a Administração Pública busca a colaboração do setor privado para a realização de

determinados serviços públicos relacionados as atividades-meio do Estado, permitindo ao órgão

público se concentrar no desenvolvimento de suas atividades principais.

Entretanto, diferentemente das situações de terceirização ilícita que ocorrem no setor

privado, a terceirização no serviço público, quando irregular, não gera reconhecimento de vínculo

empregatício com os entes da Administração Pública, em consonância com o que dispõe o inciso II,

da Súmula n° 331 do TST ( “A contratação irregular de trabalhadores, mediante empresa interposta,

não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração direta, indireta ou fundacional”). Isto

porque o Setor Público é regido pelo princípio da supremacia do interesse público e bem-estar

coletivo sobre o particular.

Tanto é assim, que o artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, determina que:

“II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em

concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a

complexidade do cargo ou emprego, na forma da lei, ressalvadas as nomeações para

cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação ou exoneração;”

Como pondera Delgado, o que pretendeu a Constituição foi estabelecer, em tais situações,

uma garantia em favor de toda a sociedade, em face da tradição fortemente patrimonialista das

práticas administrativas públicas imperantes no país. Tal garantia estaria fundada na suposição de

que a administração e patrimônios públicos sintetizam valores e interesses de toda a coletividade,

sobrepondo-se, assim, aos interesses de pessoas ou categorias particulares53

.

Com relação ao posicionamento sedimentado pelo inciso II, da Súmula 331 do TST, Délio

Maranhão afirma que este entendimento se mostra censurável em relação às sociedades de

economia mista e empresas públicas, que não possuem “cargo ou emprego público” (artigo 37, II, da

CF), que são criados por lei (art. 61, § 1°, II, a). Por não estarem submetidos ao Regime Jurídico

único, aplicável aos servidores da Administração direta, autárquica e fundacional (lei 8.112), os

empregados destas sociedades, exploradoras de atividade econômica, sujeitam-se ao regime jurídico

próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações (...) trabalhistas, por

expresso comando constitucional (art. 173, § 1°, II). Logo, seus cargos ou encargos não são

“públicos”. São privados, por extensão constitucional do direito de regência, o Direito do Trabalho54

.

Cumpre mencionar, a título de argumentação, que não obstante a regra acima (art. 37, II, da

CF), o legislador constitucional trouxe uma exceção à contratação mediante concursos públicos, ao

53

Maurício Godinho DELGADO. Curso de Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 446. 54

Délio MARANHÃO. Instituições de Direito do Trabalho. ED. LTr. São Paulo. 2004.. Vol. I. p. 280.

Page 29: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

29

permitir em seu artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal, a contratação por prazo determinado

para o atendimento de necessidades temporárias de excepcional interesse público:

“IX – a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender

a necessidade temporária de excepcional interesse público.”

A Lei que regulamenta a contratação por tempo determinado de servidores pela

Administração Federal é a Lei 8.745/93, alterada pela Lei 9.849/99. Entretanto, entendemos não se

tratar das hipóteses de terceirização, uma vez que se perfaz uma contratação direta entre o Estado e

o trabalhador temporário, não havendo a intermediação da empresa de trabalho temporário.

As normas jurídicas que fundamentam o processo de terceirização no serviço público

brasileiro são:

O artigo 10, § 7°, do Decreto-lei 200/67:

“A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente

descentralizada.

§ 7°: Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação,

supervisão e controle com objetivo de impedir o crescimento desmesurado da

máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização

material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, a execução indireta,

mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente

desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução.”

Conforme se verifica pela leitura do dispositivo legal supracitado, o legislador permitiu ao

Estado contratar serviços de empresas privadas especializadas em determinadas atividades.

Entretanto, não mencionou quais as atividades que poderiam ser objeto de terceirização, função esta

que ficou a cargo do artigo 3°, da Lei 5.645/70.

“As atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de

elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de

execução indireta, mediante contrato, de acordo com o art. 10, § 7°, do Decreto-lei

200/67.”

A permissão para a contratação de empresas terceirizadas no âmbito do setor público

sempre esteve limitada à execução de atividades-meio, atividades de apoio ou meramente

instrumentais.

Page 30: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

30

A Lei que trata das licitações e contratos administrativos (Lei 8.666/93), em seu artigo 6°

traz um rol exemplificativo de serviços que podem ser contratados pela Administração Pública, tais

como: serviços de “demolição, conserto, instalação, montagem, operação, conservação, reparação,

adaptação, manutenção, transporte, locação de bens, publicidade, seguro ou trabalhos técnicos-

profissionais”.

Outra norma que diz respeito a terceirização no serviço público é a Lei 8.036/90 (Lei do

FGTS), em seu artigo 15, § 1°:

“Para os fins previstos nesta lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar,

até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância

correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração paga ou devida, no mês

anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os

arts. 457 e 458 da CLT e a gratificação de Natal a que se refere a Lei 4.090, de 13 de

julho de 1962, com as modificações da Lei 4.749, de 12 de agosto de 1965.

§ 1°: entende-se por empregador a pessoa física ou a pessoa jurídica de direito

privado ou de direito público, da administração pública direta, indireta ou fundacional

de qualquer dos Poderes, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, que admitir trabalhadores a seu serviço, bem assim aquele que, regido

por legislação especial, encontrar-se nessa condição ou figurar como fornecedor ou

tomador de mão-de-obra, independente da responsabilidade solidária e/ou subsidiária

a que eventualmente venha obrigar-se.”

O artigo 1° do Decreto 2.271/97, que regula a contratação de serviços pela Administração

Pública Federal direta, autárquica e fundacional estabelece que podem ser executados indiretamente

os serviços de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem,

recepção, reprografia, telecomunicações, manutenção de prédios, equipamentos e instalações. Já o §

2° da mesma norma prevê que não poderão ser objeto de execução indireta atividades inerentes às

categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa

disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito

do quadro geral de pessoal. Mas há situações excepcionais a esta regra. É o caso da necessidade

transitória de serviço ligado à atividade-fim. Exemplo: a contratação de um jurista consagrado para a

elaboração de parecer técnico55

.

Por fim, cumpre citar a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/00) que em

seu artigo 18, § 1°, admite a terceirização no serviço público, nos seguintes termos:

55

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 15 de março

de 2005.

Page 31: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

31

“Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com

pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e

os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos,

civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias,

tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da

aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas

extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e

contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

§ 1o Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à

substituição de servidores e empregados públicos serão contabilizados como

"Outras Despesas de Pessoal".

Em suma, como bem afirma Carlos César Pimenta, “o Estado pode terceirizar e efetuar

parcerias no caso dos serviços que não sejam considerados estratégicos e que apresentem um

mercado atomizado e competitivo entre os possíveis fornecedores, mantendo apenas o controle

sobre a quantidade, a qualidade e o preço dos bens e serviços ofertados”. Entretanto, não poderão

terceirizar serviços que lhe são peculiares, como de justiça, segurança pública, fiscalização,

diplomacia, etc., bem como os serviços públicos essenciais, intimamente relacionados à soberania e

a supremacia do Estado56

.

A terceirização do serviço público deverá obedecer às mesmas regras inerentes a

terceirização do serviço privado, sob pena de incorrer na responsabilidade prevista no inciso IV, da

Súmula n° 331, do TST, que analisaremos mais adiante.

56

Ibid.

Page 32: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

32

TERCEIRIZAÇÃO E FRAUDE

A terceirização, conforme analisada em capítulos anteriores, é o processo pelo qual a

empresa tomadora de serviços, com o intuito de descentralizar suas atividades, contrata outra

empresa, que por meio da utilização de mão de obra própria, irá intermediar algumas das atividades

da primeira.

O processo de desconcentração produtiva é uma realidade do mercado de trabalho.

Entretanto, se por um lado foi a saída encontrada pelos empregadores para dinamizar a produção,

por outro, acarretou aos trabalhadores uma redução em suas garantias laborais, dada a rotatividade

do sistema e a abertura para as fraudes.

A fraude à lei trabalhista não é novidade. A complexidade da legislação trabalhista e o

aperto do protecionismo por parte do Estado, aliado ao constante crescimento dos encargos

previdenciários, foram aos poucos aguçando a criatividade de alguns empregadores que passaram a

empregar métodos sofisticados para fugir de suas obrigações trabalhistas e previdenciárias, mediante

a fraude à lei57

.

Porém, o que significa fraudar a lei?

Como bem define Wilson Polônio, a fraude à lei consiste em buscar um resultado, por

qualquer meio ou artifício, que a lei cogente pretendeu evitar, com o objetivo de prejudicar terceiros.

Segundo o autor, a doutrina faz distinção entre a violação da lei (agere contra legem) e fraude à lei (in

fraudem legis agere). Age contra a lei quem a viola diretamente. Age em fraude à lei aquele que

indiretamente frustra o resultado que dela se espera. A fraude à lei, portanto, pressupõe a

incompatibilidade do resultado obtido em determinado suporte fático e a regra que se pretendeu ver

aplicada. Por outras palavras, diz-se que a fraude à lei é a violação indireta da lei58

.

A legislação trabalhista é expressa ao considerar como nulos qualquer ato praticado com o

intuito de violar, direta ou indiretamente, à lei. Dispõe o artigo 9°, da CLT:

“Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir

ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.”

Pois bem. No que diz respeito à prática de atos fraudatórios, cumpre-nos voltar a atenção

para o processo terceirizante. Em virtude da ineficiência do critério jurídico adotado pela Súmula n°

331 do TST, a terceirização passou a ser utilizada como forma de precarização das condições de

57

Wilson Alves POLONIO. Terceirização – aspectos legais, trabalhistas e tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 104. 58

Ibid. p. 102.

Page 33: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

33

trabalho59

, através da ocorrência dos denominados casos de “marchandage” e outras fraudes à lei,

que passamos a analisar a seguir:

1. “Marchandage”:

O marchandage se verifica através de formas de intermediação de mão-de-obra não

disciplinadas e autorizadas por lei. A forma regular de contratação da força laborativa por empresa

interposta somente é aceita pelo ordenamento justrabalhista em 02 (duas) hipóteses: trabalho

temporário (Lei 6.019/74 e Súmula 331, inciso I, do TST) e trabalho avulso sindicalizado (artigo 513,

parágrafo único, da CLT). Apenas diante destas duas possibilidades, portanto, é que o tomador de

serviços poderá contratar serviços de terceiros para substituir sua própria mão-de-obra, razão pela

qual todas as demais hipóteses são consideradas como práticas fraudatórias à lei.

Segundo José Janguiê, o marchandage foi o meio encontrado de burlar a vinculação

contratual entre o empregador e o empregado. Nele o empregador de fato se desprende do vínculo

que o une ao empregado, ocupando outro aquela posição.

No marchandage o empregado fica subordinado a dois empregadores: ao “de direito”,

quando este determina de quanto será a remuneração e qual será seu local de trabalho; e o “de fato”,

quando determina o que será, quanto será e até mesmo de que maneira será produzido o bem a que

ele assenhorará. A grande questão nessa forma de fraude à lei é que o segundo empregador, o “de

fato”, não se alheia à relação jurídica, visto que a subordinação do empregado continua a existir e a

interferência nas relações de produção subsiste mesmo com o distanciamento jurídico, o que

caracteriza a fraude60

.

A finalidade dessa prática fraudatória tem como fundamento o objetivo escuso do

empregador de se eximir de qualquer responsabilidade perante os empregados, mantendo, pois, seu

patrimônio protegido de eventuais reclamações e execuções trabalhistas.

Os agenciadores, gatos ou empreiteiros não autorizados, por meio do agenciamento de

mão-de-obra, vende e explora a força de trabalho de trabalhadores para a prestação de serviços.

Através da simulação de um aparente contrato de trabalho com o empregado, o agenciador transfere

ao tomador de serviços a respectiva mão-de-obra, para que este exerça todos os atos inerentes de

59

Márcio Túlio Viana afirma que, do ponto de vista das empresas, a terceirização apresenta vantagens: redução

de custos, crescimento de lucros, ingresso rápido e simples de mão-de-obra, elevação da produtividade com

concentração de forças no foco da atividade central. Contudo, adverte que, para os trabalhadores, comporta a

técnica imensa gama de desvantagens: redução dos postos de trabalho, aumento da carga de subordinação,

destruição do sentimento de classe, degradação de condições de higiene e segurança e redução de valores

salariais. (Fraude à lei em tempos de crise. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, v. 21, pp. 61-

70. julho a dezembro de 1996). 60

José Janguiê Bezerra DINIZ. A terceirização e o direito do trabalho. Revista Jurídica Trabalho & Doutrina. N°

21. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 9/10.

Page 34: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

34

um típico vínculo de emprego (poder de direção e fiscalização com a conseqüente subordinação

jurídica).

O marchandage é prática rotineira na realidade do mercado de trabalho, que se intensifica

ainda mais pela ausência de amparo jurídico, no combate a tal espécie de burla. Basta pesquisar nas

jurisprudências dos Tribunais Superiores, para se deparar com os mais diversos casos de

intermediação de mão-de-obra irregular.

RECURSO ORDINÁRIO - COOPERATIVA DE TRABALHO - FRAUDE

CARACTERIZADA - VÍNCULO DE EMPREGO COM ELA RECONHECIDO –

RESTRIÇÃO DO PEDIDO. Uma vez que os depoimentos pessoais das

representantes da Cooperativa e do Hospital, beneficiário final da mão-de-obra,

revelam a prática da marchandage, pura exploração da mão-de-obra, como se

mercadoria fosse, ao arrepio do próprio art. 442 da CLT, pois havia subordinação e

pessoalidade, com fiscalização por ambas reclamadas, deve ser reconhecido o

vínculo de emprego com a primeira, como pretendido pelo Autor, observados os arts.

128 e 460 do CPC e vedada a reformatio in pejus. Recurso improvido. ( TRT. 15ª

Região. Processo 00411-2001-094-15-00-3 RO. Juiz(a): José Pedro de Camargo R.

de Souza. Publicado em 01.10.2004).

RELAÇÃO DE EMPREGO. INTERMEDIAÇÃO. O sistema de marchandage, ou

comércio de mão-de-obra não raro dissimulado como terceirização, é proibido em

vários países e até punido criminalmente. No Código Penal Brasileiro, a matéria

aproxima-se da configuração de crime contra a organização do trabalho (arts. 203 e

207). Nesse sistema, o locador é mero intermediário, imiscuindo-se na relação direta

entre o trabalhador e seu patrão natural, a ponto de, em grau extremo, o lucro da

intermediação aviltar o salário. Relação de emprego. Tomadora bancária. Baneser. É

bancária a empregada contratada pelo Baneser e imediatamente posta a serviço do

Banespa em função administrativa inalienável de seus objetivos empresariais,

ativando-se sempre e exclusivamente nas dependência do estabelecimento bancário,

subordinada a chefias constituídas por empregados do banco, dos quais recebia

ordens e orientações, observando seus horários de entrada/saída e com eles

convivendo e concorrendo funcionalmente. (TRT. 2ª Região. Processo n°

20000413032/2000. Relator(a): Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva; Publicação:

14/08/2001).

A Súmula n° 331, inciso III, do TST foi a grande precursora das hipóteses de marchandage.

Sob o pretexto de regularizar a terceirização, acabou legalizando a mera intermediação de mão-de-

obra, que era considerada ilícita, no Brasil, conforme orientação que se continha no Enunciado 256,

do TST:

Page 35: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

35

“Salvo nos casos de trabalho temporário e de serviços de vigilância, previstos nas

Leis 6.019, de 03.01.1974, e 7.102, de 20.06.1983, é ilegal a contratação de

trabalhadores por empresas interposta, formando-se o vínculo empregatício

diretamente com o tomador de serviços.”

Não estamos aqui na defesa pelo resgate do referido Enunciado. Se a Súmula n° 331 do

TST mostra-se ineficiente para disciplinar e regulamentar todo o processo terceirizante, por uma

razão muito maior, o Enunciado n° 256 não merece prosperar.

O Enunciado n° 256 do TST, elaborado em 1986, nasceu divorciado da realidade concreta,

o que gerou, por parte da doutrina, inúmeras manifestações de repúdio. Otávio Bueno Magano

ressaltava que:

“O Tribunal Superior do Trabalho ao adotar o Enunciado em tela, fundado nas

apontadas razões a decidir, mostrou-se inteiramente divorciado da realidade

palpitante de nossos dias, em que sobressai o fenômeno de cooperação entre as

empresas, explicável pelas exigências da técnica e pela exacerbação da

concorrência...”.61

Se, por um lado, o Enunciado n° 256 do TST protegia os direitos dos trabalhadores

terceirizados da mera intermediação de mão-de-obra (sob a proibição expressa da mera

intermediação de mão-de-obra), por outro, emperrava o empreendimento empresarial.

Quando da edição do Enunciado n° 331 do TST, que substituiu e inovou a temática do

Enunciado n° 256 do TST, Pedro Carlos Sampaio Garcia (in Magistratura & Trabalho, Ano II, Janeiro/

Feveiro 1994, n° 11, 2° caderno, p. 2), assim se pronunciou:

“O colendo Tribunal Superior do Trabalho, buscando dar orientação às diversas

hipóteses de terceirização dos serviços no setor público e privado, editou o recente

Enunciado 331, que trata de diversas questões relativas à matéria destaque especial

à participação do Estado nestas relações. Vale a pena examinar o conteúdo dessa

orientação jurisprudencial, pois a nosso ver existem alguns avanços, mas em

contrapartida alguns equívocos sérios no texto do enunciado.

O enunciado 331 revisou o enunciado 256 a pedido do Ministério Público do Trabalho,

em razão de inquéritos policiais promovidos por esse órgão em casos de terceirização

de serviços por empresas participantes da administração pública indireta. Tais

inquéritos resultaram em ações civis públicas, nas quais se imporia o reconhecimento

de relação de emprego com as empresas estatais, senão tivesse o Supremo Tribunal

61

José Janguiê Bezerra DINIZ. A terceirização e o direito do trabalho. Revista Jurídica Trabalho & Doutrina. N°

21. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 13.

Page 36: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

36

Federal decidido recentemente que também essas empresas estão submetidas à

regra do concurso público para a contratação de empregados (v. sobre este assunto

matéria editorial da Revista LTr de janeiro/94 – p. 58-01/7). Diante de tal impasse a

revisão de tal enunciado foi pedida pelo Ministério Público do Trabalho, tendo em

vista precedentes das turmas do C. TST que vinham excluindo a administração

pública do rigor com que a matéria era tratada no enunciado 256. O Enunciado 331

acabou por ser editado, dando tratamento diferenciado à administração pública direta

e indireta no caso de intermediação ilegal de mão-de-obra.

Vale inicialmente observar que a nova Súmula, no seu item III, deixou de lado o rigor

excessivo do Enunciado 256, inadequado para as inúmeras hipóteses de

terceirização de serviços, permitindo uma interpretação mais compatível com as

várias situações que podem ocorrer quando se contrata empresas prestadoras de

serviços, que podem em não implicar em intermediação fraudulenta de mão-de-obra.

Orienta assim alargando o campo de análise não só para a administração pública,

como também para a iniciativa privada, em medida que nos parece acertada.

Manteve, entretanto, a Súmula jurisprudencial, intacto o entendimento expresso em

seu item I, de que a interposição fraudulenta de mão-de-obra continua não sendo

aceita, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços. Ocorre a

intermediação fraudulenta quando o trabalho está inserido na atividade econômica do

tomador dos serviços, é por ele dirigido e a ele beneficia. O trabalho relaciona-se à

atividade-fim do tomador dos serviços, para fazer uso das expressões utilizadas no

verbete sumulado.”62

Ora, o Enunciado n° 256 do TST foi revisto e, atualmente, sob a égide da Súmula n° 331 do

TST, novamente a realidade concreta impõe uma releitura de tais normas atenta as novas técnicas

de produção. E, não só para o combate ao marchandage, mas também para que se deixe de

considerar como fraude terceirizações absolutamente lícitas, efetuadas sem qualquer objetivo de

burlar à lei ou causar prejuízos aos direitos dos trabalhadores (ex.: terceirização de atividades

especializadas inerentes a etapas do processo produtivo da empresa tomadora de serviços).

Portanto, até que seja publicada uma lei que regulamente tal instituto63

, faz-se necessário

encontrar no ordenamento justrabalhista alternativas hábeis a manter a proteção dos trabalhadores,

sem negar o processo terceirizante que, atualmente, se perfaz como uma realidade concreta e, mais,

como saída encontrada pelas empresas para dinamizar a produção e integrar na competitividade

imperante no mercado de trabalho. Mais adiante, em capítulo exclusivo, demonstraremos as formas e

os mecanismos de identificação das práticas fraudatórias e as técnicas de prevenção dos riscos.

62

José Luiz Ferreira PRUNES. Terceirização do Trabalho. Ed. Juruá. Curitiba. 1995. p. 182. 63

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n° 4.302/98, que dispõe sobre as relações de trabalho na

empresa de trabalho temporário e na empresa de prestação de serviços a terceiros. Em outras palavras, o referido

Projeto de Lei determina novas regras, a serem integradas ao ordenamento jurídico brasileiro, que poderão

disciplinar e regulamentar o processo terceirizante imperante no nosso mercado de trabalho. Segue anexo ao

final deste trabalho o projeto em referência.

Page 37: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

37

2. Outras formas de fraude à lei:

Não comungamos com os que vêem a fraude em qualquer das situações de terceirização,

nem com os que vislumbram procedimento desonesto quando um empregado (que conhece bem os

métodos da empresa) evolui e se estabelece por conta própria – mesmo modestamente – para

participar da produção autônoma. As muitas formas de terceirização não devem e não podem ser

encaradas como um excesso. Cabe nesta quadra histórica rememorar – para muitos juízes e juízes –

a velha expressão romana: Fraus nunquam praesumitur ( ... a fraude não se presume). Havendo,

deve ser coibida, tolhida pela sociedade e reprimida pelos tribunais. Mas não pode ser vista como um

princípio operacional quando a empresa, por inúmeras razões de conveniência, usa meios que não

são vedados em lei64

.

Os tribunais, em quase toda a sua totalidade, distinguem a licitude ou ilicitude da

terceirização de serviços com fulcro na distinção entre atividade-meio e atividade-fim. Entretanto,

conforme já mencionado, tais conceitos não se demonstram totalmente hábeis para a referida

caracterização do processo terceirizante, dada a peculiaridade de cada caso concreto e a falta de lei

específica regulamentando o assunto.

O critério adotado pela Súmula 331 do TST para a distinção entre terceirização lícita e

terceirização ilícita não foi feliz. Como bem acentua Souto Maior, “é plenamente inseguro tentar

definir o que vem a ser uma e outra”. E, indaga: ”o serviço de limpeza, por exemplo, normalmente

apontado como atividade-meio, em se tratando de um hospital, seria realmente uma atividade-

meio?”65

.

Não há em nosso ordenamento jurídico qualquer lei, norma ou preceito que disponha

diretamente acerca da regulamentação de empresas prestadoras de serviços nas atividades-meio e

atividades-fim da empresa. Não há dispositivo jurídico que faça distinção das referidas atividades, ao

contrário do que ocorre com o trabalho temporário – em que cada forma de prestação, cada sujeito

da relação trilateral são conceituados e identificados. Como, então, considerar como prática

fraudatória uma atividade não regulamentada por lei, mas tão-somente conceituada pela doutrina?

Ora, a fraude somente ocorre na hipótese de violação de lei. Entretanto, se não existe lei,

como ocorrerá tal violação?

Para responder a esta questão, cumpre resgatar o conceito a pouco fornecido por Wilson

Polônio, no sentido de que “age em fraude à lei aquele que indiretamente frustra o resultado que dela

se espera”.

64

José Luiz Ferreira PRUNES. Terceirização do Trabalho. Ed. Juruá. Curitiba. 1995. p. 183. 65

Jorge Luiz Souto MAIOR. A terceirização sob uma perspectiva humanista. Revista Nacional de Direito do

Trabalho. n° 82. Doutrina. Fevereiro de 2005.

Page 38: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

38

O que se espera como resultado do ordenamento justrabalhista é a manutenção dos direitos

e garantias inerentes a categoria dos trabalhadores, cujas regras basilares encontram-se previstas na

Consolidação das Leis do Trabalho. A importância dos ditames celetistas pode ser vislumbrada pela

regra contida no artigo 9°, da CLT, em que serão considerados como nulos os atos praticados com o

intuito de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na referida lei.

Assim, entendemos que não se configura como fraude à lei qualquer forma de terceirização,

mas somente aquelas que possuem como único objetivo precarizar as condições de trabalho,

mediante a redução dos direitos e garantias mínimas estabelecidas pela legislação trabalhistas aos

trabalhadores. A nosso ver, portanto, perfeitamente lícita à terceirização de atividades essenciais da

empresa, desde que a prestação de tal serviço seja feita por empresas especializadas e idôneas. Por

outro lado, ilícita a mera intermediação de mão-de-obra, quando permanente e dirigida por aquele

que se beneficia (tomador de serviços).

É nesse sentido, pois, que afirmamos ser necessário o estabelecimento de uma nova

distinção entre terceirização lícita e ilícita, destinada a complementar o raciocínio da referida Súmula

– que arrola apenas 04 (quatro) situações-tipo lícitas –, de tal modo a coibir as fraudes à lei através

do processo terceirizante. Mas, ressalte-se: fraudes à lei (situações que colocam em risco os direitos

e garantias dos trabalhadores).

A terceirização lícita, portanto, deve ser aquela que observa os preceitos legais relativos aos

direitos dos trabalhadores, não pretendendo fraudá-los, distanciando-se da existência da relação de

emprego. Em contrapartida, a terceirização ilícita deve ser entendida como aquela que se refere a

locação permanente de mão-de-obra, que pode dar ensejo a fraudes e a prejuízos em relação aos

trabalhadores66

.

Por fim, para que a terceirização seja plenamente válida no âmbito empresarial, também,

não podem existir elementos pertinentes à relação de emprego no trabalho terceirizado,

principalmente os elementos da pessoalidade e subordinação jurídica. Além disso, deve-se atentar

para a especialização e idoneidade econômica das empresas prestadoras de serviços. Passemos,

pois, ao estudo de cada um deles.

2.1 - Subordinação Jurídica e Pessoalidade no Trabalho Terceirizado

A parte final do inciso III, da Súmula n° 331 do TST, é bastante clara ao determinar que a

terceirização das atividades ali mencionadas (serviços de vigilância, conservação e limpeza, serviços

especializados ligados a atividade-meio do tomador) não suscitará reconhecimento do vínculo de

emprego, desde que inexistentes a pessoalidade e a subordinação direta entre o trabalhador

66

Sergio Pinto MARTINS. A terceirização e o Direito do Trabalho. Ed. Malheiros. São Paulo. 1995.103.

Page 39: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

39

terceirizado e o tomador de serviços. Mediante uma leitura inversa, portanto, tem-se que uma vez

configurada a pessoalidade e a subordinação direta entre tomador e empregado, haverá relação de

emprego entre eles, afastando-se, pois, a hipótese de terceirização regular.

A subordinação e a pessoalidade são elementos que compõem as características do

contrato de trabalho. Ensina Otávio Bueno Magano que o contrato de trabalho é o “negócio jurídico

pelo qual uma pessoa física se obriga, mediante remuneração, a prestar serviços não eventuais, a

outra pessoa ou entidade, sob a direção de qualquer das últimas”67

.

A pessoalidade reflete na obrigação principal do empregado, qual seja, a inerente a

execução da prestação dos serviços. O trabalhador vincula-se ao seu empregador, de tal modo que o

contrato de trabalho é executado intuitu personae.

Intimamente relacionada a esta característica encontra-se a subordinação – mais

precisamente a subordinação jurídica – que considera o poder de comando e de direção do

empregador. O empregado submete-se ao poder de direção do empregador, que organiza e controla

os fatores da produção. O empregador, assim, detém a faculdade de determinar um conteúdo

concreto à atividade de seus empregados68

.

Essa subordinação jurídica, segundo Mario L. Deveali, pode-se manifestar de diversas

maneiras, sendo as mais freqüentes as seguintes: “a) jornada de trabalho; b) pela retribuição, sem

olhar para o resultado econômico; c) realização do trabalho em estabelecimento do empresário, o que

enseja a fiscalização; d) caráter pessoal da prestação de serviços”69

.

Ora, em existindo tais elementos na relação entre trabalhador terceirizado e tomador de

serviços, descaracterizada está a relação econômica de trabalho entre ambos, dada a concretização

pura e evidente da relação jurídica trabalhista. Isto porque, o verdadeiro empregador não pode se

desincumbir de suas obrigações contratuais justrabalhistas, pois é somente mediante o cumprimento

destas que o empregado, parte hipossuficiente da relação de emprego, conquista o mínimo de

condições que possibilitam a sua sobrevivência e de toda a sua família.

Dessa forma, não há como considerar lícito um processo terceirizante em que fica evidente

a existência de uma relação jurídica trabalhista entre o tomador e o trabalhador terceirizado, com a

presença de todos os elementos do contrato de trabalho. Nessa hipótese, onde se enquadraria a

função específica e determinada da empresa tomadora de serviços? Com certeza, na função de mero

67

Otávio Pinto e SILVA. Subordinação, Autonomia e Parassubordinação nas Relações de Trabalho. Ed. LTr.

São Paulo. 2004. p. 19. 68

Ibid. p. 21. 69

José Janguiê Bezerra DINIZ. A terceirização e o direito do trabalho. Revista Jurídica Trabalho & Doutrina. N°

21. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 06.

Page 40: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

40

empregador aparente, com o intuito de, conjuntamente com o tomador, burlar as disposições legais,

de modo a abalar à finalidade protetiva do direito laboral.

2.2 - A Falta de Especialização e Idoneidade da Empresa Prestadora de Serviços

O fenômeno da terceirização, como aponta José Janguiê Bezerra Diniz, “consiste na

existência de um terceiro especialista, chamado de fornecedor ou prestador de serviços, que com

competência, habilidade e qualidade técnica, presta serviços especializados ou produz bens, em

condições de parceria, para a empresa contratante, chamada de tomadora ou cliente”70

.

A terceirização trata-se, como visto, de técnica administrativa, para possibilitar a

especialização dos serviços empresariais. No entanto, o enunciado 331, do TST, não vincula a

legalidade da terceirização a qualquer especialização, o que tem permitido, concretamente, que

empresas de mera prestação de serviços sejam constituídas; empresas estas sem qualquer

finalidade empresarial específica e, pior, sem idoneidade econômica71

.

Para Souto Maior, se é verdade que o pressuposto técnico da idéia de “terceirização” é a

especialização dos serviços, em nome da qualidade, para atendimento desta característica de tal

modelo produtivo, é essencial que a empresa prestadora tenha uma atividade empresarial própria

sendo, portanto, especializada no serviço que se propõe a prestar72

.

Assim, não há como admitir a figura daquela empresa terceirizante que contrata mão-de-

obra barata e desqualificada e a oferece à empresas que estão objetivando reduzir custos, através da

demissão de seus empregados efetivos. O intuito fraudulento, nestas hipóteses, salta aos olhos.

Importante, pois, diante de um caso concreto, efetuar uma análise no âmbito empresarial da

prestadora de serviços (principalmente no que diz respeito a sua especialização e idoneidade

econômica), a fim de se evitar a concretização fraude no processo terceirizante, com conseqüências

desastrosas à parte hipossuficiente (trabalhador).

RESPONSABILIDADE DO TOMADOR DE SERVIÇOS EM DECORRÊNCIA DA TERCEIRIZAÇÃO

A terceirização só se concretiza, validamente, no sentido de manter a relação de emprego

entre os trabalhadores e a empresa prestadora, quando a prestadora de serviços possua uma

atividade empresarial própria, assumindo o risco econômico, que é o próprio da atividade

70

Ibid. p. 16. 71

Jorge Luiz Souto MAIOR. A terceirização sob uma perspectiva humanista. Revista Nacional de Direito do

Trabalho. N° 82. Doutrina. Fevereiro de 2005. 72

Ibid.

Page 41: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

41

empresarial, e a sua contratação se destine à realização de serviços especializados, isto é, serviços

que não sejam indispensáveis ou permanentes no desenvolvimento da atividade produtiva da

empresa contratante (tomadora), configurando-se, por isso, uma situação excepcional e com duração

determinada dentro do contexto empresarial da empresa tomadora73

.

Conforme observamos em capítulos anteriores, a terceirização, da forma como vem sendo

contemplada, não só vem trazendo conseqüências desastrosas a classe operária, através da

precarização das condições de trabalho, como também vem prejudicando o aperfeiçoamento da

administração empresarial de empreendedores sérios, mediante a idéia preconceituosa de que

apenas serão tidas como lícitas às terceirizações previstas pela ultrapassada Súmula 331 do TST.

Um processo de terceirização, quando mal estruturado, além de causar prejuízos

imensuráveis ao trabalhador, pode acarretar uma série de responsabilidades ao tomador de serviços.

Vamos a elas:

1. Responsabilidade Subsidiária:

Dispõe a Súmula n° 331, inciso IV, do TST, que em havendo o “inadimplemento das

obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador

dos serviços, quanto àquelas obrigações”.

A referida responsabilidade se impõe independe do vínculo de emprego ou da contratação

ilícita no processo terceirizante. Ela advém pura e simplesmente da falta de cumprimento das

obrigações trabalhistas por parte da prestadora de serviço e se fundamenta na presunção de culpa in

vigilando ou in eligendo do tomador.

Como bem define Plácido e Silva, a culpa in eligendo (resultante da escolha), é a que se

atribui ao proprietário, patrão, empregador, etc... pelas faltas cometidas por seus serviçais,

empregados ou prepostos, na execução de atos ou omissões que possam causar danos a outrem,

desde que ocorridos no exercício do trabalho que lhes é cometido. Já a culpa in vigilando (falta de

vigilância) é a que se imputa à pessoa, em razão de prejuízos ou danos causados a outrem, por atos

de pessoas, sob sua dependência, ou por animais de sua propriedade, conseqüentes da falta de

vigilância ou atenção que deveria ter, de que resultaram os fatos, motivadores dos danos e

prejuízos74

.

Sob esta ótica, em sendo o trabalho terceirizado executado em favor do tomador, a ele se

impõe o dever de zelar pelo cumprimento das obrigações trabalhistas dos empregados terceirizados.

73

Jorge Luiz Souto MAIOR. A terceirização sob uma perspectiva humanista. Revista Nacional de Direito do

Trabalho. Nº 82. Doutrina. Fevereiro de 2005. 74

PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. Ed. Forense. Rio de Janeiro. 1999. p. 234.

Page 42: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

42

No momento da contratação da empresa terceirizada, cumpre ao tomador se atentar para a

idoneidade moral e econômica da contratada. Durante a vigência do contrato, é prudente que o

mesmo exija da prestadora de serviços os comprovantes de pagamento das parcelas trabalhistas e

fiscais devidas aos empregados, visando, assim, se resguardar de problemas futuros.

O inciso IV da Súmula n° 331 do TST tem como finalidade única proteger o trabalhador de

eventuais problemas que o mesmo venha a ter com seu empregador (empresa prestadora de

serviços), razão pela qual impõe-se a cobrança de débitos trabalhistas ao devedor secundário

(tomador de serviços), se o principal não vier a cumprir com suas obrigações. Isto porque, com bem

justifica Sérgio Pinto Martins, não se é possível determinar o retorno do empregado ao status quo

ante, uma vez que não pode ser devolvida a sua energia de trabalho75

.

Nesse sentido, tem decidido nossos Tribunais Superiores:

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – IMPOSIÇÃO – FATORES DETERMINANTES. A imposição da

responsabilidade subsidiária tem como premissa o disposto no artigo 186 do vigente Código Civil (anterior

159), onde consubstanciam-se as teorias da culpa in vigilando e in eligendo. Forçoso concluir, assim, que o

inciso IV do E. 331 do C.TST aplica-se, inclusive, às hipóteses de terceirização lícita, sendo o fim colimado

pelo aludido verbete a preservação dos créditos laborais, que podem ser violados inclusive nos casos em que

a lei não obsta a intermediação de mão-de-obra. Mantém-se, destarte, a responsabilidade subsidiária imposta

à empresa tomadora dos serviços. (TRT. 15ª Região. Decisão n° 019130/2003. Relator: Vera Teresa Martins

Crespo. Publicação 04/07/2003).

Entretanto, em que pese o posicionamento jurisprudencial sumulado e as decisões quase

que unânimes de nossos tribunais, alguns poucos doutrinadores não admitem qualquer forma de

responsabilização do tomador de serviços, ante a falta de amparo legal para tanto.

O Juiz Francisco Rodrigues de Barros, adepto a esta corrente, assim justifica seu

entendimento:

“O simples fato de a empresa apresentar-se idônea no momento da contratação não

obsta que ela venha a se tornar inidônea durante a execução do contrato, cujos

efeitos não vemos como, em qualquer hipótese, incidirem sobre o tomador.

(...)

75

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 15 de março

de 2005.

Page 43: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

43

Há de salientar que o tomador, indicado como responsável subsidiário, não tem como

contestar as alegações fáticas, já que o reclamante não era seu empregado e não

tinha com o mesmo qualquer relação de subordinação. Somente quem conhece os

fatos que nortearam a relação jurídica empregatícia é o verdadeiro empregador,

inclusive quanto à prova dos recolhimentos de encargos, recibos de pagamentos,

controles de horários e demais condições de trabalho.

(...)

Comenta-se muito acerca da culpa „in eligendo‟ ou „in vigilando‟. Não se pode falar

que a tomadora tivesse eleito mal a prestadora, ou negligenciado na escolha, de

modo a atrair a culpa „in eligendo‟, pois, ao contrário, há que se convir que o

reclamante também o teria feito, com idêntico risco, ao escolher seu empregador. É

bem verdade que ele precisa de emprego, como também o tomador precisa de

alguém para executar aquelas atividades. Ademais, até que se prove ao contrário, no

momento da contratação a tomadora era pessoa adimplente com suas obrigações.

(...) Também, a culpa „in vigilando‟ não pode afigurar-se presente, já que esta decorre

da falta dos devidos cuidados em relação ao comportamento de outra pessoa, por

cujo ilícito deve responder. (...) Destarte, para que se pudesse falar em culpa „in

vigilando‟, necessário seria que existisse a possibilidade de vir o tomador a controlar

os empregados do prestador, inclusive fixando os horários de trabalho, escalas, etc.,

o que não é viável, mesmo diante da inexistência de previsão legal criando para o

tomador a obrigação de acompanhar a regularidade do vínculo mantido entre a

tomadora e seus empregados ou qualquer outra relação jurídica.

Eventuais descumprimentos de obrigações do verdadeiro empregador não foram por

culpa do tomador e „culpa ubi non est, nec poena esse debet‟, já que dizia a velha

máxima de onde se extrai a lição de que onde não existe culpa, não deve haver pena.

E na presente hipótese não existe culpa, pois não era obrigação do tomador cumprir

com os encargos trabalhistas decorrentes dos vínculos mantidos entre a prestadora e

os seus empregados. Nesta razão se assenta o brocardo jurídico: „culpas non potest

imputari ei, qui non facit, a quod facere no tenebatur‟, ou seja, não se pode imputar

culpa a quem não fez o que não era de sua obrigação...” 76

Nesse sentido, também, encontramos a seguinte decisão:

CONTRATO DE TRABALHO. VINCULAÇÃO E RESPONSABILIDADE DO DONO DA

OBRA. Não há responsabilidade subsidiária do dono da obra se, da análise dos fatos

e do seu enquadramento legal, já foi recusada, sem gerar recurso, a responsabilidade

solidária. Empreitada de mão de obra, mesmo quando denominada de contrato de

76

Francisco Rodrigues de BARROS. Responsabilidade subsidiária. Contratos de prestação de serviços.

Impossibilidade. Disponível em: www.oas.sp.org.br. Acesso em: 10 de março de 2004.

Page 44: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

44

prestação de serviços por terceiros (pois o nomem juris diverso não altera a definição

legal) não se confunde com a contratação por interposta pessoa. (TRT. 12ª Região.

Processo n° RO – V – 452/96. Relator: Roberto João Motta. Publicação em

04.08.1997).

Todavia, cremos que razão assite ao posicionamento defendido pela maioria dos

doutrinadores e juristas. Ao contrário do que afirmam essa minoria, a responsabilização subsidiária

do tomador de serviços possui sim amparo legal condizente com a figura jurídica.

A responsabilização subsidiária do tomador de serviços no processo terceirizante pelo

inadimplemento das obrigações trabalhistas, advém da aplicação analógica do artigo 455 da CLT,

que prevê a responsabilidade do empreiteiro, em caso de inadimplência das obrigações trabalhistas

do subempreiteiro para com seus empregados. Dispõe o artigo 455 da CLT:

“Nos contratos de subempreitada responderá o subempreiteiro pelas obrigações

derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o

direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas

obrigações por parte do primeiro.”

Ora, se a responsabilidade constante do dispositivo citado possui natureza civil, pois retrata

de uma relação jurídica não propriamente trabalhista, mas que se origina de um contrato pactuado na

esfera cível, tem-se a possibilidade de aplicação de fundamentos desse ramo jurídico para configurar

a responsabilidade do tomador. Trata-se das responsabilidades pautadas na culpa “in eligendo” ou “in

vigilando” tratadas pelos artigos 18677

e 92778

do Código Civil.

Nesta seara, insta ressaltar que, perfeitamente aplicáveis tais conceitos na esfera

trabalhista, em consonância com o que dispõe o artigo 8°79

da CLT.

Por fim, cumpre mencionar que o tomador somente responderá subsidiariamente pelo

inadimplemento das obrigações trabalhistas se figurar no pólo passivo da presente Reclamação, uma

vez que não pode ser considerada parte no processo de execução quem não foi parte na fase de

conhecimento.

77

“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a

outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. 78

“Aquele que por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. 79

“As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais,

decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais

do direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito

comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse

público”.

Page 45: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

45

A própria Súmula n° 331, inciso IV, parte final é expressa ao determinar que a

responsabilidade subsidiária somente recairá sobre o tomador dos serviços “desde que hajam

participado da relação processual e constem do título executivo judicial”.

3. Reconhecimento do Vínculo de Emprego:

Em consonância com o que dispõe o inciso I e III, da Súmula 331 do TST, tem-se que o

reconhecimento do vínculo de emprego ocorre diante da configuração das situações de terceirização

ilícita. Diferentemente da responsabilidade subsidiária, que ocorre nas hipóteses de terceirização

lícita, porém, diante do inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte da empresa prestadora

de serviços.

A mera intermediação de mão-de-obra é ilegal e, por conseqüência, forma vínculo

diretamente com o tomador de serviços, salvo nos casos de trabalho temporário (artigo 2° da Lei

6.019/74) e quando a empresa cliente configura-se como um órgão da administração pública direta,

indireta ou fundacional (artigo 37, II, da CF).

Além dessas hipóteses, também haverá reconhecimento do vínculo de emprego quando

ficar caracterizada a subordinação jurídica e a pessoalidade entre os trabalhadores e o tomador de

serviço, mesmo diante das situações-tipo autorizadas pelo verbete jurisprudencial para o processo

terceirizante, como: serviços especializados ligados a atividade-meio do tomador, serviços de

vigilância, de conservação e limpeza.

Várias são as práticas ilícitas de terceirização.

“a) uma empresa cria outra que irá absorver o seu setor de manutenção, que irá lhe

prestar serviços com exclusividade; b) uma empresa que contrata o serviço de outra,

sem ampla e total autonomia da prestadora, que não direciona o trabalho, não

assume os risco da atividade e não aufere os lucros do empreendimento econômico;

c) uma empresa ajusta um serviço com uma prestadora, cujo objeto social não guarda

harmonia com a prestação do serviço ou com a execução da obra; d) uma empresa

contrata um serviço de outra, e os empregados da prestadora ficam à inteira

disposição da tomadora, que direciona o trabalho realizado, com amplo poder de

mando e comando sobre aqueles, enfim, com ampla interferência no curso da

execução da obra, de forma econômica e administrativa”80

.

80

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização. Paradoxo do direito do trabalho contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 148.

Page 46: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

46

Uma vez configurada a terceirização ilícita, deverá o Juiz do Trabalho declarar a

inexistência do vínculo de emprego entre o trabalhador e a empresa prestadora de serviços e, por

conseqüência, reconhecer a existência de vínculo empregatício entre aquele trabalhador e a empresa

tomadora dos serviços.

Nesse sentido, tem decidido nossos tribunais:

TRT-PR-05-11-2004. INTERMEDIAÇÃO ILEGAL DE MÃO-DE-OBRA. VÍNCULO

EMPREGATÍCIO COM O TOMADOR DOS SERVIÇOS. Empregado que após quase

oito anos de vínculo empregatício com a empresa é imediatamente contratado por

empresa interposta, continuando a prestar as mesmas funções, ligadas à atividade

fim da tomadora, nas próprias instalações desta e subordinando-se aos seus

empregados, ou seja, nas mesmas condições do contrato de trabalho anterior, não se

enquadra na hipótese de terceirização de serviços, mas sim de intermediação ilícita

de mão-de-obra. A hipótese é de vínculo direto entre o obreiro e o tomador dos

serviços, na forma do art. 3º da CLT. (TRT. 9ª região. PR-00576-2003-072-09-00-2-

ACO-25228-2004. Relator: ARNOR LIMA NETO. Publicado no DJPR em 05-11-2004)

3. Responsabilidade Solidária:

Como salienta Maria Helena Diniz, a obrigação solidária é aquela em que, havendo

multiplicidade de credores ou de devedores, ou de uns e outros, cada credor terá direito à totalidade

da prestação, como se fosse o único credor, ou cada devedor estará obrigado pelo débito todo, como

se fosse o único devedor81

. A primeira hipótese configura a chamada solidariedade ativa; a segunda,

configura a chamada solidariedade passiva.

A solidariedade passiva, que no momento nos interessa, é aquela que ocorre quando cada

um dos devedores for responsável pelo pagamento de toda a dívida. Essa espécie de

responsabilidade tem ganhando força entre alguns doutrinadores, que se manifestam contrariamente

à responsabilidade subsidiária prevista no inciso IV, da Súmula n° 331 do TST (para os casos de

terceirização lícita) ou ao reconhecimento de vínculo de emprego com o tomador disposto nos incisos

I e III do mesmo verbete jurisprudencial (para os casos de terceirização ilícita).

A fundamentação para a responsabilidade solidária do tomador de serviços num processo

de terceirização lícito, em que ocorre o inadimplemento de obrigações trabalhistas por parte do

empregador, advém da questão social em relação ao trabalhador, que é hipossuficiente e tem sua

remuneração como de natureza alimentar. Ademais, deve-se levar em conta a efetividade do

exercício jurisdicional, para que as decisões na esfera trabalhista não fiquem sem a devida e

81

Maria Helena DINIZ. Curso de Direito Civil Brasileiro. Ed. Saraiva. São Paulo. 2000. Vol. II. p. 151.

Page 47: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

47

necessária execução e satisfação diante da competência dos contratados, dos intermediadores,

independentemente, até, de tratar-se à atividade-fim ou não, de constituir-se em terceirização legal ou

ilegal. O beneficiário da terceirização não pode estar alheio ao prejuízo do trabalhador, sob pena de

enriquecer sem causa82

.

Autores como Jorge Luiz Souto Maior defendem esta corrente doutrinária. Para ele, a

responsabilidade em uma terceirização considerada válida, deve ser sempre solidária, pois de uma

forma ou de outra as empresas contratantes utilizam o trabalho prestado pelo empregado.

Outra parte de estudiosos, que defendem a responsabilidade solidária do tomador,

entendem que esta somente ocorrerá nas hipóteses de terceirização ilícita. Segundo Gabriela

Delgado, o texto do enunciado 331 do TST pode parecer sugerir, por sua omissão, não haver

responsabilidade da empresa terceirizante, caso reconhecido o vínculo empregatício com a tomadora

de serviços. Entretanto, entende a autora não ser esta a devida interpretação para a norma. É que o

ato ilícito praticado pela empresa terceirizante conjuntamente com a tomadora de serviços não pode

lhe gerar apenas vantagens, sem contrapartida da responsabilidade83

.

A responsabilidade solidária perquirida por tais doutrinadores possui pertinência no

processo terceirizante. Os mesmos fundamentos jurídicos encontrados nos artigos 186 e 927 do

Código Civil para a caracterização da responsabilidade subsidiária, é aqui, também aplicável.

Nesse sentido, citamos algumas decisões:

BANCÁRIO. SERVIÇO DE ATENDIMENTO A CLIENTE. TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA.

Pertence a categoria bancária pessoa contratada por empresa interposta para execução de serviços relacionados diretamente com o atendimento pessoal de clientes na agência, sobretudo em se tratando de atividades de suporte à gerência, em que a reclamante

desempenha tarefas afetas ao contato pessoal com os clientes, abertura de contas, captação e agendamento de visitas. É ilícita a

terceirização efetivada, ensejando a responsabilidade solidária dos co-autores envolvidos na prática de atos ilícitos trabalhistas, a teor do § único, do art. 942 do CC/02. Sentença mantida. (TRT. 15ª Região. Decisão 021334/2005. Juiz: Edison dos Santos Pelegrini.

Publicação em 13.05.2005).

O tomador de serviços, ainda que indiretamente, causou prejuízo ao trabalhador, a partir do

momento que contratou empresa inidônea e/ou não a fiscalizou no tocante ao cumprimento de suas

obrigações trabalhistas. Portanto, incorreu na culpa “in eligendo” e/ou na culpa “in vigilando”,

devendo, portanto, ser responsabilizado por tais atos.

Contudo, a responsabilidade solidária é uma figura jurídica que não se presume. Ou decorre

da lei ou da vontade das partes. Não há no ordenamento justrabalhista qualquer disposição legal ou

mesmo jurisprudencial prevendo a referida hipótese para o processo terceirizante, a não ser a regra

82

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos Trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 15 de março

de 2005. 83

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização. Paradoxo do direito do trabalho contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p. 151.

Page 48: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

48

do artigo 16 da Lei 6.019/74 (solidariedade da empresa cliente na hipótese de falência da empresa de

trabalho temporário).

Apenas a título de elucidação, cumpre-nos citar o que dispõe o mencionado dispositivo de

Lei:

“No caso de falência da empresa de trabalho temporário, a empresa tomadora ou

cliente é solidariamente responsável pelo recolhimento das contribuições

previdenciárias, no tocante ao tempo em que o trabalhador esteve sob suas ordens,

assim como em referencia ao mesmo período, pela remuneração e indenização

prevista em Lei.”

A regra contida no artigo 16 da lei 6.019/74 é expressa ao determinar a responsabilidade

solidária do tomador de serviços pelas verbas trabalhistas e previdenciárias. Entretanto, limita-se a

ocorrência de casos de falência da empresa de trabalho temporário.

Pois bem. O artigo 265 do Código Civil é bastante claro, ao determinar que:

“A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.”

Dessa forma, em que pese os argumentos favoráveis a responsabilidade solidária do

tomador de serviços, entendemos que, no momento, não é possível, ante a falta de fundamento legal

para tanto. A nosso ver, a solidariedade, no âmbito justrabalhista, somente ocorrerá na hipótese

contida no artigo 16 da Lei 6.019/74; na hipótese da empresa terceirizando e tomadora de serviços

pertencerem ao mesmo grupo econômico (artigo 2°, § 2°84

, da CLT); ou diante da existência de

cláusula no contrato entre as partes (manifestação de vontade das partes).

4. Responsabilidade da Administração Pública:

A terceirização no serviço público possui um tratamento diferenciado das formas de

terceirização no setor privado, tendo em vista o princípio da supremacia dos interesses públicos

sobre os particulares.

Em se tratando das hipóteses de terceirização ilícita, não há o que se falar em

reconhecimento de vinculo de emprego entre o trabalhador terceirizado e a Administração Pública,

84

“Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem

sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra

atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa

principal e cada uma das subordinadas”.

Page 49: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

49

face o que estabelece o artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. Nesse sentido, estabeleceu o

inciso II, da Súmula 331 do TST:

“II – A contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta, não gera

vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública, direta, indireta ou

fundacional (art. 37, II, da Constituição Federal)”

Como bem salienta Maurício Godinho Delgado, a Súmula 331 em análise reporta-se aos

entes estatais apenas para conferir a eficácia à vedação constitucional de não estabelecimento de

relação empregatícia (ou administrativa) de trabalhador com o Estado sem a observância do requisito

formal do concurso público85

.

Pois bem. Qual seria, portanto, a responsabilidade do Estado frente a hipótese de

terceirização ilícita? E, no caso de terceirização lícita? Vige a regra contida no inciso IV da Súmula

331 do TST?

A regra geral, no Direito do Trabalho, é de que o empregador, exclusivamente ele, deverá

responder pelos débitos trabalhistas com relação aos seus empregados. Entretanto, quando esse

empregador é a Administração Pública, a questão se apresenta bastante nebulosa.

O problema surge com a redação do artigo 71, § 1°, da Lei 8.666/93, que dentre outras

prerrogativas, estabelece normas a serem observadas sobre o procedimento de Licitações e

Contratos na Administração Pública:

“O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e

comerciais resultantes da execução do contrato.

§ 1°: A inadimplência do contratado com referência aos encargos trabalhistas, fiscais

e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu

pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o

uso das obras e edificações, inclusive perante o registro de imóveis.”

A referida norma legal, pode ser aplicada para as hipóteses de terceirização de serviços? O

inciso IV, da Súmula 331 do TST, que prevê a responsabilidade subsidiária em caso de

inadimplemento das verbas trabalhistas por parte do empregador, aplicável também à Administração

Pública, apresenta-se contrário à lei ou a lei é que se apresenta contrária ao restante do ordenamento

jurídico?

85

Maurício Godinho DELGADO. Curso de direito do trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 458.

Page 50: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

50

Carolina Pereira Marcante86

identifica 02 (duas) correntes inerentes a possibilidade ou não

da responsabilização estatal.

A primeira, com argumentações favoráveis à responsabilização estatal, com fundamento na

Súmula 331, inciso IV, do TST. Seus defensores subdividem-se em 02 (duas) outras correntes:

aqueles que propugnam pela responsabilidade subsidiária (a maioria dos autores) e aqueles que

defendem a responsabilidade solidária.

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E A RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. O Órgão da

Administração Pública, direta ou indireta, responde, subsidiariamente, pelos encargos

trabalhistas do empregado de empreiteira financeiramente inidônea, em face da

ocorrência de sua culpa "in ilegendo" e "in vigilando" (Artigo 159, do Código Civil),

haja vista ter sido o trabalho do empregado revertido em seu proveito. (TRT. 2ª

Região. 9ª turma. Processo n°20000058372/2000. Relator: LAURA ROSSI.

Publicação: 29/05/2001).

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. ATO ILÍCITO. Incontroversa a prestação de

serviços a pessoa jurídica de direito público, através de outra empresa, vislumbrando-

se a clara intenção de se burlar o art. 37, II, da CF, que exige contratação somente

mediante concurso, impõe-se, no caso a responsabilidade solidária das demandadas.

Em se tratando de concorrência a ilicitude, não se cogita de subsidiariedade (art. 942

do novo Código Civil). (TRT. 9ª Região. PR-17596-2002-006-09-00-6-ACO-21844-

2004. Relator: LUIZ EDUARDO GUNTHER. Publicado no DJPR em 01-10-2004).

Os fundamentos para essa primeira corrente advêm dos conceitos de culpa “in eligendo”

(má escolha da prestadora de serviços) e/ou culpa “in vigilando” (má fiscalização sobre os atos

praticados pela prestadora de serviços), conforme já estudado no início deste capítulo. Além disso,

seus defensores sustentam a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 71, § 1°, da lei

8.666/93, com base no artigo 37, § 6°87

, da CF, que determina a responsabilidade objetiva do Estado

por danos causados por seus agentes a terceiros. Nesse sentido, citamos o seguinte julgado:

PETROBRÁS. RESPONSABILIDADE TRABALHISTA SUBSIDIÁRIA.

INAPLICABILIDADE DO ART. 71 DA LEI 8.666/93.A ocorrência do processo

licitatório exigido por lei não tem o condão, por si só, de afastar a responsabilidade do

tomador dos serviços,na esfera da administração pública.Em face dos incontornáveis

princípios constitucionais da legalidade e da moralidade (CF, art. 37, caput) e bem

86

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 15 de março

de 2005. 87

“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão

pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o

responsável nos casos de dolo ou culpa.”

Page 51: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

51

assim, daqueles sobre os quais fundamenta-se a República e que velam pela

dignidade da pessoa humana (CF, artigo 1º, inciso III) e os valores sociais do

trabalho (CF, artigo 1º, IV), não há como agasalhar confortável alheamento do

administrador diante do inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte de

empresas inidôneas junto às quais a empresa pública, da administração direta ou

indireta, sem maiores cuidados, proveu-se de mão-de-obra. Verificada esta situação,

não incide a regra do artigo 71, Lei 8.666/93, vez que não se amolda aos textos

constitucionais referidos, declarando-se, in casu,a responsabilidade trabalhista

subsidiária da PETROBRÁS, tomadora dos serviços, decorrente da culpa in eligendo,

com aplicação do art. 173, §1º, II, da Carta Magna e do padrão interpretativo

consubstanciado no Enunciado 331, IV, do C.TST. (TRT. 2ª Região. Processo

n°02553-2003-201-02-00-0. 4ª Turma. Relator: RICARDO ARTUR COSTA E

TRIGUEIROS. Publicação em 10/12/2004).

A segunda corrente, solidificada em argumentações desfavoráveis à responsabilização

estatal, fundamenta seu posicionamento na absoluta falta de vínculo de emprego entre o tomador de

serviços e o empregador da firma terceirizada. Além disso, justifica-se pela leitura literal do artigo 71,

§ 1°, da lei 8.666/93.

André Wilson Avellar Aquino se manifesta da seguinte maneira:

“Quanto à responsabilidade pelas parcelas decorrentes do trabalho realizado, tenho

que, não sendo possível o reconhecimento do vínculo de emprego, não há como se

reconhecer o direito de pleitear verbas trabalhistas correspondentes, isto em relação

à Administração Pública. Ora, qualquer espécie de indenização deve ser alcançada

junto à empresa fornecedora de mão-de-obra ou do serviço. Ao estado não pode

resultar essa responsabilidade do mau administrador, devendo-se, mais uma vez,

ressaltar que o interesse público deve prevalecer sobre o interesse individual.”

Nesse sentido, cumpre-nos citar o seguinte julgado:

TERCEIRIZAÇÃO. AUTARQUIA. INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE

SUBSIDIÁRIA. Considerando-se que a administração pública fulcra-se no princípio da

legalidade, o não pagamento das obrigações trabalhistas, por empresa fornecedora

de mão-de-obra, não implica na responsabilidade subsidiária do tomador de serviço,

quando este é entidade pública, por força do que dispõe a Lei 8.666/93, em seu art.

71, parágrafo 1° e art. 37, inc. XXI, da atual carta política. Recursos providos88

.

88

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 15 de março

de 2005.

Page 52: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

52

Pois bem. Conforme pode ser observado, as posições doutrinárias e as decisões judiciais

são as mais diversas possíveis. Entretanto, entendemos que os argumentos favoráveis a

responsabilização estatal são aqueles que melhor atendem aos anseios da Carta Magna. Deixar de

responsabilizar o Estado com base em um privilégio manifestamente inconstitucional – artigo 71, § 1°,

da Lei 8.666/93 – seria o mesmo que incentivar a fraude no processo terceirizante e deflagrar o

princípio de proteção ao trabalhador. Não se pode olvidar da questão social.

TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. A responsabilidade da

empresa contratante, na terceirização de serviços que poderiam ser executados com

mão-de-obra própria, é questão, simplesmente de justiça e, mais que isso, impede a

exploração do trabalho humano, atendendo, portanto, ao elevado princípio, universal

e constitucional, que é o da dignidade humana. A terceirização não permite que a

contratante lave as mãos diante da angústia daqueles que trabalharam em prol dos

seus interesses, ainda que através de outro empregador, que em regra ou

desaparece ou não tem como satisfazer as obrigações trabalhistas.Escolher bem e

fiscalizar a satisfação dessas obrigações das empresas contratadas não só é uma

exigência ética, como também uma decorrência da abrangente função social da

empresa. (TRT. 2ª Região. Processo n° 10792-2002-902-02-00-6. 1ª Turma. Relator:

Eduardo de Azevedo Silva. Recorrente: Petróleo Brasileiro S/A – Petrobás.

20.08.2002).

E, como ressalta Godinho, “mesmo que se entenda não caber a incidência, no presente

caso, da regra da responsabilidade objetiva do Estado, não se pode negar a validade da incidência

da responsabilidade subjetiva da entidade estatal terceirizante (responsabilidade própria a qualquer

pessoa jurídica e que não foi excluída do estado pela Carta Magna – ao contrário, a Constituição,

como visto, aprofundou a responsabilidade dos entes estatais)”89

.

Ora, pela regra constante do artigo 37, II, da Constituição Federal, não há o que se falar em

reconhecimento de vínculo de emprego entre a entidade estatal e o trabalhador terceirizado.

Entretanto, seja diante da hipótese de terceirização ilícita ou terceirização lícita, havendo

inadimplemento de verbas trabalhistas e fiscais por parte do empregador, responderá o Estado pelos

valores resultantes de tais débitos, quer em face de sua responsabilidade objetiva quer em face de

sua responsabilidade subjetiva.

89

Maurício Godinho DELGADO. Curso de direito do trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 459.

Page 53: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

53

VANTAGENS E DESVANTAGENS DA TERCEIRIZAÇÃO

A terceirização, conforme já relatado, consiste na saída encontrada pelos empresários para,

de maneira menos dispendiosa, reformular suas relações de produção a fim de superar os efeitos

advindos da chamada “globalização”.

Enquanto fenômeno econômico, a terceirização traz uma série de mudanças, seja em maior

ou menor grau, para os contratos de trabalho. Segundo Cássio Mesquita de Barros, a principal destas

alterações é a flexibilização do Direito do Trabalho, que consiste na possibilidade de oferecer

mecanismos jurídicos que permitam a empresa ajuste a sua produção, emprego e condições de

trabalho às flutuações rápidas e contínuas do sistema econômico. Flexibilização esta, que pode ser

classificada sob diversos aspectos: flexibilidade da remuneração; flexibilização da força de trabalho; e

flexibilidade em relação à estabilidade no tempo de duração do contrato de trabalho90

.

Como se pode notar, o processo terceirizante implica em inúmeras vantagens e

desvantagens, dependendo sob qual aspecto se analisa o fenômeno. Geralmente, dada a

flexibilidade do Direito do Trabalho frente a terceirização, a longa listagem dos malefícios incidirão

sobre os trabalhadores, parte hipossuficiente da relação empregatícia. Entretanto, a dinamização da

produção necessita ser implementada, para acompanhar os avanços tecnológicos e vencer a

competição no mercado de trabalho, sob pena de se instalar o caos econômico-social, com o

fechamento em massa de grandes empresas e indústrias nacionais, que empregam milhares de pais

de família.

Nesta seara, o processo de desconcentração produtiva torna-se um tanto espinhoso. Como

conciliar Desenvolvimento Econômico e Direito do Trabalho dentro de um país subdesenvolvido, mas

que possui uma rígida legislação trabalhista de proteção a parte hipossuficiente?

Para encontrar a solução para o problema exposto, tem-se a necessidade de conhecer,

primeiramente, as vantagens e desvantagens da terceirização. Portanto, passemos ao seu estudo:

1. Vantagens da Terceirização:

Sob o aspecto administrativo, os doutrinadores, de modo geral, identificam as seguintes

vantagens para a utilização do processo de terceirização:

- aceleração na capacidade de produção da empresa sem a necessidade de novos

investimentos de capitais91

;

90

José Janguiê Bezerra DINIZ. A terceirização e o direito do trabalho. Revista Jurídica Trabalho & Doutrina. N°

21. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 15/16. 91

Marcelo Augusto Souto de OLIVEIRA. Terceirização: avanço ou retrocesso? Disponível em:

www.ibcbrasil.com.br. Acesso em: 17 de março de 2005.

Page 54: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

54

- melhoramento na qualidade do produto ou serviço vendido, através da concentração de

recursos e esforços por parte da empresa na sua própria área produtiva92

;

- desburocratização da estrutura organizacional da empresa, com a concentração na

atividade-fim da empresa93

;

- diminuição nos encargos trabalhistas e previdenciários, uma vez que a relação jurídico-

trabalhista será firmada não entre a empresa tomadora e o trabalhador, mas entre este e a empresa

terceirizada94

;

- racionalização da produção, com a redução, inclusive, de perdas no processo produtivo e

diminuição em setores completamente ociosos95

;

- diminuição dos riscos financeiros, com redução dos custos fixos, transformando também

os custos fixos em variáveis e aumentando os lucros da empresa, gerando eficácia e eficiência nas

ações desta, além de economia em escala96

.

- facilitação na administração e gerenciamento da empresa, dada a redução interna de

funcionários97

;

- melhoria nas condições de segurança e saúde, em virtude da diminuição de aglomeração

de pessoas num mesmo local, reduzindo acidentes de trabalho e, por conseqüência, trazendo um

mecanismo de proteção ao próprio trabalhador98

;

Sob o ponto de vista social, identifica-se uma única vantagem, qual seja, a terceirização se

apresenta como meio de incremento de emprego, quando se utiliza mão-de-obra desqualificada e

ociosa para a prestação de certos serviços (vigia, faxineiro, etc.), nem país em que, segundo

estatísticas confiáveis, o número de trabalhadores desempregados ultrapassa os sete milhões99

.

Segundo Sérgio Pinto Martins, para o trabalhador é possível apontar as seguintes

vantagens implementação do sonho de adquirir e trabalhar no seu próprio negócio, deixando de ser

empregado para ser patrão; independência na prestação dos serviços, que não tinha quando era

empregado, e estava sujeito a ordens de serviço; maior motivação para produzir, pois o negócio é

92

Sérgio Pinto MARTINS. A Terceirização e o direito do trabalho. Ed. Malheiros. São Paulo. 1995. p. 35. 93

Ibid. 94

Astried Brettas GRUNWALD. Terceirização: a flexibilidade em prol do desenvolvimento jurídico-social.

Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em 17 de março de 2005. 95

Sérgio Pinto MARTINS. A Terceirização e o direito do trabalho. Ed. Malheiros. São Paulo. 1995. p. 35. 96

Ibid. p. 36. 97

Astried Brettas GRUNWALD. Terceirização: a flexibilidade em prol do desenvolvimento jurídico-social.

Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em 17 de março de 2005. 98

Sérgio Pinto MARTINS. A Terceirização e o direito do trabalho. Ed. Malheiros. São Paulo. 1995. p. 36. 99

Marcelo Augusto Souto de OLIVEIRA. Terceirização: avanço ou retrocesso? Disponível em:

www.ibcbrasil.com.br. Acesso em: 17 de março de 2005.

Page 55: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

55

seu; desenvolve no trabalhador o seu lado empreendedor, de produzir alguma coisa por sua própria

conta100

.

Em síntese, a maior parte das vantagens apresentadas, que advém do próprio conceito de

terceirização beneficiam tão-somente os empresários, isto porque o processo terceirizante trata-se de

um fenômeno econômico, destinado a reorganização da estrutura empresarial, tendo em vista a

competitividade do mercado. Dessa forma, vantagens como: especialização nos serviços, redução

nos custos, diminuição de funcionários, melhoria na qualidade do produto, aumento da produtividade

e lucro, refletem a nova forma de gerenciamento (desconcentrado) praticada pelas empresas como

alternativa para a tentativa de superação da crise econômica instalada no país, que, pouco a pouco,

acarretaria o fechamento de tais estabelecimentos.

2. Desvantagens da Terceirização:

São inúmeras as desvantagens, sob o aspecto social, do processo de desconcentração

produtiva, principalmente aos trabalhadores. Dentre tais desvantagens, aponta-se:

- precarização das condições de trabalho, com a eliminação de benefícios sociais diretos

(decorrentes do contrato de trabalho) e indiretos (decorrentes de normas coletivas);

- redução salarial. Em virtude da chamada “Lei da Oferta e da Procura”, os trabalhadores se

submetem a prestar seus serviços sob pagamentos salariais aquém da média destinada a sanar suas

necessidades mínimas vitais;

- insegurança no emprego, dada a ocorrência da ampliação da rotatividade de mão-de-

obra101

.

- aviltamento das relações trabalhistas, pois os empregados terceirizados perdem as

possibilidades de acesso à carreira e ao salário da categoria, situação que se agrava quando os

trabalhadores exercem suas atividades nas mesmas condições e ao lado de empregados do

quadro102

;

100

Sérgio Pinto MARTINS. A Terceirização e o direito do trabalho. Ed. Malheiros. São Paulo. 1995. p. 36. 101

José Janguiê Bezerra DINIZ. A terceirização e o direito do trabalho. Revista Jurídica Trabalho & Doutrina.

N° 21. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 17. 102

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 24 de janeiro

de 2005.

Page 56: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

56

- permite a degradação do ambiente de trabalho e das condições de segurança e higiene, já

que as subcontratadas geralmente não têm a estrutura das empresas contratantes103

;

- enfraquecimento dos sindicatos e desestruturação da categoria104

, dada a dificuldade de

filiação da categoria subcontratada;

- fragmentação da classe trabalhadora, com perda de sua identidade e, conseqüentemente,

do poder organizativo dos trabalhadores;

- gera o paradoxo de existir dois patrões a comandar o processo, ou, em certos casos, de

inexistir patrão definido105

.

- tendência de individualização das profissionais106

;

Sob o ponto de vista administrativo, algumas desvantagens também poderá ocorrer para a

empresa contratante, tais como:

- dependência total da empresa prestadora de serviços para o desenvolvimento de certas

atividades;

- possibilidade de queda da qualidade dos serviços que ficam a cargo da empresa

terceirizada107

;

Em síntese, as desvantagens que a utilização do processo terceirizante são incontáveis.

Acarretam, sem margem de dúvida, malefícios enormes ao trabalhador terceirizado. Sob a

prerrogativa de redução de custos, as empresas utilizam a terceirização como meio para o

achatamento de salários e demais direitos dos trabalhadores. Entretanto, estes empreendedores não

se atentam para o fato de que somente a camada da população com poder aquisitivo é que poderá

consumir os produtos ali fabricados, com alta qualidade.

Pois bem. Dado o rol de vantagens e desvantagens advindas de um processo de

desconcentração produtiva, justificada está a enorme polêmica e discussão que engloba o referido

tema: de um lado, encontra-se a necessidade de desenvolvimento econômico do país; de outro, a

necessidade de proteção dos direitos de uma classe considerada hipossuficiente.

103

José Janguiê Bezerra DINIZ. A terceirização e o direito do trabalho. Revista Jurídica Trabalho & Doutrina.

N° 21. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 17. 104

Sérgio Pinto MARTINS. A Terceirização e o direito do trabalho. Ed. Malheiros. São Paulo. 1995. p. 37. 105

José Janguiê Bezerra DINIZ. A terceirização e o direito do trabalho. Revista Jurídica Trabalho & Doutrina.

N° 21. Ed. Saraiva. São Paulo. Junho de 1999. p. 17. 106

Ibid. 107

Carolina Pereira MARCANTE. A responsabilidade subsidiária do Estado pelos encargos trabalhistas

decorrentes da contratação de serviços terceirizados. Disponível em: www.jus.com.br. Acesso em: 24 de janeiro

de 2005.

Page 57: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

57

Neste ponto, cumpre-nos citar a constatação Roberto Ferraiuolo: “a política de aumentar

seus lucros à custa do sacrifício dos trabalhadores, reduzindo o seu poder de compra,

marginalizando-os do poder de consumo, amplia a concentração de renda e leva nosso País,

naturalmente, a uma total dependência econômica internacional, posto que, pela falta de mercado

interno, tornamo-nos vulneráveis às oscilações e às crises políticas e econômicas dos países

importadores” (Os empresários e a terceirização. Palestra proferida no Seminário promovido pelo

Instituto Brasileiro de Direito Social. São Paulo. Ed. LTR. 1993. p. 76)108

.

Para que a terceirização se configure como o cenário do futuro, colaborando para o

desenvolvimento econômico-social do País, faz-se necessário repensar os mecanismos legais e, até

mesmo, culturais que fundamentam nosso ordenamento. O processo terceirizante é instrumento hábil

para o crescimento e desenvolvimento da economia, entretanto, necessita ser controlado, de forma a

obedecer aos ditames legais, de modo a não se instalar no ordenamento jurídico como forma de

precarização dos direitos trabalhistas conquistados.

108

Marcelo Augusto Souto de OLIVEIRA. Terceirização: avanço ou retrocesso? Disponível em:

www.ibcbrasil.com.br. Acesso em: 17 de março de 2005.

Page 58: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

58

FORMAS DE PREVENÇÃO DOS RISCOS TRABALHISTAS

A desconcentração produtiva, conforme observamos ao longo deste estudo, desde a data

de sua primeira ocorrência no País trouxe uma série de modificações, seja no âmbito econômico ou

social. Entretanto, há quase duas décadas nossos legisladores se mantêm inertes ao fenômeno,

deixando a sua regulamentação ao arbítrio de um mero verbete jurisprudencial, que se demonstra

incapaz de regular todas as hipóteses lícitas e ilícitas do processo terceirizante.

Nesta seara, como salienta Gabriela Neves Delgado, a introdução da terceirização na

normativa jurídica trabalhista gerou um fosso entre os princípios cardeais do Direito Constitucional,

princípios cardeais do Direito do Trabalho e o novo sistema de gestão da força de trabalho109

.

É preciso, pois, restabelecer o caminho para a adequação e possível democratização das

relações trilaterais terceirizantes por meio do que Maurício Godinho Delgado denomina de “controle

civilizatório da terceirização”.

Na concepção de Maurício Godinho Delgado110

, a jurisprudência deve adotar e combinar

trilhas para percorrer o caminho de adequação jurídica da terceirização ao Direito do Trabalho:

1. Isonomia remuneratória entre os trabalhadores terceirizados e os empregados originais

da empresa tomadora de serviços. A terceirização, qualquer que seja sua espécie (lícita ou ilícita; de

serviços ou de mão-de-obra) não pode ser instrumento de redução dos custos de mão-de-obra,

quando trabalhadores efetivos e terceirizados venham a exercer a mesma função (trabalho

temporário).

Entende Delgado que o critério isonômico deve ser estendido para além das hipóteses de

trabalho temporário, mas para todo e qualquer empregado terceirizado, seja ele permanente ou não.

O fundamento jurídico, para tanto, advém do princípio isonômico central do artigo 5°, caput, da CF

(“todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...”) e inciso I (“homens e

mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”), que acabam por

harmonizar-se com o princípio da valoração do trabalho humano (artigo 1°, inciso IV, artigo 3°, inciso

III e artigo 170, caput, CF).

“A evolução que admite a terceirização não pode, validamente, implicar em

desigualdade social, ou em acirrar a sociedade injusta para atrair a prevalência de

menor custo em detrimento do trabalhador com aumento de lucratividade do

empreendimento. Os objetivos da terceirização não se lastreiam em lucro maior ou

menor. Utilizá-la para pagar salários menores que os observados pela tomadora

109

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização. Paradoxo do direito do trabalho contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p.176. 110

Maurício Godinho DELGADO. Curso de direito do trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 462.

Page 59: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

59

quanto aos seus empregados que exercem a mesma atividade é ilegítimo,

constituindo-se em prática voltada à distorção dos preceitos protetivos da legislação

trabalhista. Dentre as suas vantagens não se inclui a diversidade salarial ou de

direitos individuais do empregado e independente da pessoa que seja seu

empregador. O empregado de terceirizante, que desenvolve seu trabalho em

atividade terceirizada, tem os mesmos direitos individuais e salários dos empregados

da tomadora dos serviços exercentes da mesma função”. (TRT. 3ª Região. 3ª turma.

RO 08157/94. Relator: Freire Pimenta. DJMG 29.08.95. p. 56)111

.

2. Responsabilização do tomador de serviços pelos valores trabalhistas oriundos da prática

terceirizante; O enunciado 331 do TST estabelece a responsabilidade subsidiária da tomadora de

serviços para a hipótese de terceirização lícita em que ocorreu o inadimplemento das verbas

trabalhistas por parte do empregador. No caso de terceirização ilícita, o mesmo enunciado, em seu

inciso I e III, determina o reconhecimento do vínculo empregatício do trabalhador com a empresa

tomadora de serviços.

Entretanto, não há qualquer responsabilização da empresa prestadora de serviços

(empresa terceirizante) quando das hipóteses de terceirização ilícita, que de algum modo também se

beneficiou com a ilicitude.

Nesse sentido, portanto, autores como Gabriela Neves Delgado, Jorge Luiz Souto Maior,

Maurício Godinho Delgado, Marcos Túlio Viana, defendem a tese de fixação de co-responsabilidade

da empresa terceirizante junto à empresa tomadora de serviços, já que ambas praticaram atos “(...)

com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos” na Consolidação

das Leis do Trabalho, nos termos de seu art 9°”112

.

O fundamento legal para tanto advém dos artigos 186, 927 e 942, do Código Civil

combinados com o artigo 8° da CLT.

3. Representação e Atuação Sindical.

Como bem salienta Maurício Godinho Delgado, a terceirização desorganiza perversamente

a atuação sindical e praticamente suprime qualquer possibilidade eficaz de ação, atuação e

representação coletivas dos trabalhadores terceirizados. Segundo o autor, a idéia de formação de um

sindicato de trabalhadores terceirizados, os quais servem a dezenas de diferentes tomadores de

111

Jorge Luiz Souto MAIOR. A terceirização sob uma perspectiva humanista. Revista Nacional de Direito do

Trabalho. N° 82. Doutrina. Fevereiro de 2005. 112

Gabriela Neves DELGADO. Terceirização. Paradoxo do direito do trabalho contemporâneo. Ed. LTr. São

Paulo. 2003. p.181.

Page 60: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

60

serviços, integrantes estes de segmentos econômicos extremamente díspares, é simplesmente um

contrasenso113

.

Somente pode ser organização sindical efetivamente representativa da categoria

profissional do trabalhador terceirizado aquela entidade sindical que represente, também

hegemonicamente, os trabalhadores da empresa tomadora de serviços do obreiro! Toda a formação

profissional, seus interesses profissionais, materiais e culturais, toda a vinculação laborativa e

essencial do trabalhador terceirizado, tudo se encontra direcionado à empresa tomadora de serviços,

e não à mera intermediária de mão-de-obra. A real categoria profissional desse obreiro é aquela em

que ele efetivamente se integra em seu cotidiano labor114

.

O fundamento jurídico encontra-se previsto no artigo 511, § 2°, da CLT, que trata da

similitude de condições de vida oriunda da profissão ou trabalho em comum para a formação de uma

categoria profissional.

Por todo o exposto, fica claro que o “controle civilizatório” da terceirização é uma alternativa,

no momento, para a adequação dessa realidade concreta ao Direito do Trabalho. Até que surja a tão

esperada lei que discipline a realidade concreta do fenômeno de terceirização e ao mesmo tempo

proteja os direitos dos trabalhadores, cabe a nós, operadores do direito, encontrarmos fórmulas

operacionais para a condução com segurança do referido processo, de modo que,

concomitantemente, a empresa alcance a tão sonhada qualidade e produtividade e que os

empregados não tenham seus direitos precarizados pelas novas relações de trabalho.

O caminho para um julgamento mais justo foi demonstrado. Nos resta apenas apontar os

cuidados que as partes contratantes devem ter para evitar problemas futuros. Um processo de

terceirização mal conduzido pode trazer graves prejuízos no campo econômico, social e jurídico.

Portanto, para que se evitar maiores gravames, Wilson Alves Polônio115

sugere os seguintes cuidados

a serem observados:

1. Quanto ao relacionamento com as pessoas contratadas

A terceirização, conforme já comentado, retrata uma relação jurídica trilateral. Um primeiro

contrato, de natureza civil, envolvendo a empresa tomadora de serviços e a empresa terceirizada. Um

segundo, contrato de trabalho, entre a empresa terceirizada e os trabalhadores. Apenas a título de

elucidação, entre a empresa cliente e os trabalhadores terceirizados, existirá tão-somente uma

relação econômica de trabalho.

113

Maurício Godinho DELGADO. Curso de direito do trabalho. Ed. LTr. São Paulo. 2004. p. 468. 114

Ibid. p. 469. 115

Wilson Alves POLONIO. Terceirização. Aspectos legais, trabalhistas e tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 109/116.

Page 61: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

61

O vínculo de emprego, portanto, com todos os seus requisitos caracterizadores

(pessoalidade, subordinação jurídica, pagamento e habitualidade) se perfaz apenas entre a empresa

terceirizada e seus trabalhadores, sob pena do processo de terceirização vir a ser considerado como

ilícito.

Em suma, para se evitar o reconhecimento do vínculo de emprego entre o tomador de

serviços e os trabalhadores terceirizados, deve-se ter atenção para os seguintes aspectos:

- as pessoas que realizam as tarefas contratadas não devem receber ordem ou orientação

de qualquer pessoa relacionada com a empresa contratante, quer sejam empregados, quer

administradores. Caso sejam necessárias orientações durante a execução dos trabalhos, essas

devem ser dirigidas diretamente ao representante da empresa prestadora de serviços116

;

- é imperioso que os pagamentos pelos serviços prestados sejam efetuados diretamente à

empresa prestadora dos serviços, nos estritos termos do contrato, nunca às pessoas incumbidas de

realizar as tarefas, individualmente117

; Quem remunera o trabalhador terceirizado é a empresa

prestadora de serviços, que após receber o pagamento da empresa tomadora, efetua o repasse da

quantia destinada ao pagamento mensal de cada um de seus empregados.

- a permanência de um trabalhador terceirizado por muito tempo no ambiente de trabalho do

tomador de serviços pode acarretar a configuração da pessoalidade. Portanto, recomenda-se que de

tempos em tempos haja uma rotatividade da mão-de-obra.

2. Quanto ao objeto da terceirização

A Súmula n° 331 do TST arrola quais as situações-tipo possíveis de serem terceirizadas:

trabalho temporário, serviços de vigilância, serviços de conservação e limpeza e serviços

especializados ligados à atividade-meio do tomador de serviços. Pois bem. Fora tais hipóteses, a

terceirização, tal como entende a maioria dos julgados, é considerada ilícita.

Portanto, em que pesem os argumentos favoráveis à terceirização de atividades-fim ligadas

a uma etapa do processo produtivo da empresa tomadora, esta espécie não é aceita pelo nosso

ordenamento jurídico, razão pela qual havendo a ocorrência de tal hipótese a empresa tomadora

estará incorrendo no risco do reconhecimento de vínculo de emprego entre ela e os trabalhadores

terceirizados.

116

Ibid. p. 110 117

Ibid.

Page 62: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

62

Além disso, importante verificar a especialização dos serviços, vez que este é o pressuposto

técnico para se terceirizar. A empresa prestadora, portanto, deve possuir uma atividade empresarial

própria, especializada no serviço que se propõe a prestar118

.

3. Quanto aos aspectos do contrato119

- objeto do contrato: o contrato de prestação de serviços deve ter como objeto, por óbvio,

a prestação de serviço, nunca a disponibilização (locação ou concessão) de mão-de-obra. É o

resultado final, o serviço concluído, que interessa ao tomador. Esse aspecto deve estar claro no

contrato;

- metas a serem atingidas e o modus operandi: deve ser evitado qualquer indício de

ingerência sobre a prestadora dos serviços ou seus empregados. Por essa razão, a forma de

acompanhamento dos serviços prestados, quanto à qualidade, ao tempo ou ao modus operandi, deve

constar do contrato de prestação d serviços. Inclusive quanto às penalidades aplicáveis em caso de

inadimplemento das condições contratuais;

- exclusividade: não obstante a exclusividade na prestação de serviços não represente,

isoladamente, indício de vínculo empregatício, de vez que não se trata de requisito para sua

caracterização, esta deve ser evitada. Esse cuidado, no entanto, é de maior interesse da empresa/

cooperativa prestadora de serviços do que, propriamente, da contratante. De fato, ter um cliente

exclusivo representa uma dependência econômica que deve ser evitada, sob pena de extinção da

prestadora dos serviços em eventual não-renovação ou rescisão do contrato;

- cumprimento da legislação trabalhista e da seguridade social: como forma de prevenir

futuros questionamentos fiscais e trabalhistas decorrentes da relação contratual estabelecida, será de

todo conveniente que a tomadora do serviço exija mensalmente, da empresa contratada, máxime se

esta e de pequeno porte, a apresentação dos comprovantes de pagamento das remunerações, bem

como das guias de recolhimento das contribuições relativas à seguridade social, FGTS, e demais

encargos sociais pertinentes aos funcionários alocados ao serviço contratado;

- o cuidado com a livre concorrência: a terceirização com cooperativa de trabalho implica

um cuidado adicional em relação às cláusulas contratuais. Esse cuidado relaciona-se à exclusividade

(ou contrato de adesão) na relação dos cooperados com a cooperativa, que possa lesar o princípio da

livre concorrência.

118

Jorge Luiz Souto MAIOR. A terceirização sob uma perspectiva humanista. Revista Nacional de Direito do

Trabalho. N° 82. Doutrina. Fevereiro de 2005. 119

Wilson Alves POLONIO. Terceirização. Aspectos legais, trabalhistas e tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 112.

Page 63: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

63

4. Quanto à regularidade da prestadora de serviços

Conforme já estudado, a culpa in eligendo (má escolha) e a culpa in vigilando (má

fiscalização) são os fundamentos jurídicos norteadores da responsabilidade subsidiária (ou solidária,

como pretendem alguns julgadores) do tomador de serviços, diante do inadimplemento das verbas

trabalhistas e fiscais por parte do empregador (empresa prestadora de serviços).

Assim, na tentativa de se evitar problemas futuros, imperioso que a empresa tomadora de

serviços elabore um processo de investigação acerca da idoneidade econômica, financeira e moral

da empresa contratada.

Para tanto, necessário que se exija da empresa prestadora de serviços a seguinte

documentação:

- contrato social, devidamente assinado e registrado no cartório competente;

- prova de inscrição junto a Receita Federal (CNPJ);

- prova de inscrição no cadastro de contribuintes da Prefeitura Municipal de sua sede social;

- carta de referência em relação a serviços prestados a outros tomadores;

- certidões negativas de débitos junto aos órgãos competentes: INSS, para comprovação do

recolhimento das contribuições previdenciárias de seus empregados; Caixa Econômica Federal, para

comprovação do recolhimento do FGTS de seus empregados, Receita Federal e Prefeitura Municipal,

para comprovação do recolhimento dos respectivos impostos.

5. Quanto à fiscalização do trabalho

A terceirização é um fenômeno que traz inúmeras desvantagens para os direitos dos

trabalhadores, chegando a ser considerada por alguns doutrinadores como “técnica de precarização

das condições de trabalho”120

. Em virtude dessa situação estabelecida, o processo terceirizante é

sempre objeto de inspeção pelos órgãos responsáveis pela fiscalização do trabalho.

Por ocasião dessa fiscalização, se faz necessária à adoção de algumas medidas para

impedir eventuais punições administrativas:

- o registro do empregado deve permanecer no local da prestação de serviços (geralmente,

no estabelecimento da empresa tomadora) para exame do contrato e identificação do cargo para o

qual o trabalhador foi contratado. Se assim não for possível, faz-se necessário a confecção de um

cartão de identidade (crachá) para cada empregado terceirizado contendo nome completo, função,

120

Jorge Luiz Souto MAIOR. A terceirização sob uma perspectiva humanista. Revista Nacional de Direito do

Trabalho. N° 82. Doutrina. Fevereiro de 2005.

Page 64: TERCEIRIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

64

data de admissão e número do PIS/Pasep, situação esta em que o fiscal se dirigirá para a sede da

empresa prestadora de serviços para apuração dos registros121

.

- o controle de horário e as atividades prestadas pelo trabalhador terceirizado são objetos

de fiscalização na própria empresa tomadora de serviços, vez que é no estabelecimento desta que o

empregado presta, na maioria das vezes o seu serviço. As atividades executadas pelos trabalhadores

terceirizados não devem coincidir com a atividade principal da tomadora de serviços, constante de

seu objeto social. Suas atividades devem coincidir com o objeto do contrato de prestação de serviços,

sob pena de caracterizar um desvio de função.

- em se tratando de trabalho temporário, há necessidade, ainda, para as exigências

constantes dos artigos 9° a 11 da Lei 6.019/74: os contratos (seja entre empresa prestadora e

tomadora ou entre prestadora e trabalhador) deverão ser obrigatoriamente escritos; deverão, ainda,

constar o motivo justificador para a contratação de trabalhadores temporários; e, seu prazo de

vigência não poderá ser superior a 03 (três) meses, salvo autorização do Ministério do Trabalho.

6. Quanto aos aspectos específicos relacionados à terceirização com a cooperativa de trabalho

Todos os cuidados acima mencionados deverão ser observados na ocorrência de um

processo terceirizante com a cooperativa de trabalho. Entretanto, dada a peculiaridade que envolve

essa espécie de contratação, cumpre-nos ressaltar outros pontos específicos que ensejarão maior

atenção:

- as cooperativas não podem desenvolver atividades especializadas de segurança, em face

do disposto na Lei n° 7.102/83, que restringe a prestação de serviço a empresas habilitadas122

;

- a exigência de prestação de serviços especializados também existe em relação às

cooperativas de trabalho. A finalidade principal da existência das sociedades cooperativas não é a

prestação de serviços a terceiros, mas, ao reverso, a prestação de serviços destinados a seus

próprios cooperados. Portanto, o objeto dessas cooperativas deve ser conciliado com o interesse dos

próprios membros do grupo123

;

- as cooperativas devem ser administradas por seus próprios associados e, atender as

regras constantes da Lei 5.764/71 e Lei 8.949/94, para seu enquadramento no regime jurídico.

Portanto, a opção pelo processo de terceirização deve partir dos associados e não do contratante,

sob pena de ferir o princípio norteador desta espécie de sociedade (princípio da solidariedade,

igualdade e comunhão de interesses dos participantes), indicando um desvio de finalidade.

121

Wilson Alves POLONIO. Terceirização. Aspectos legais, trabalhistas e tributários. Ed. Atlas. São Paulo.

2000. p. 114. 122

Marcelo MAUAD. Cooperativas de Trabalho – Sua relação com o Direito do Trabalho. Ed. LTr. São Paulo.

2001. p. 234. 123

Ibid. p. 235.