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Cooperativas de Trabalho, Terceirização de Serviços e Direito do Trabalho

Cooperativas De Trabalho, Terceirização De Serviços E Direito Do Trabalho

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Cooperativas de Trabalho,Terceirização de Serviços

e Direito do Trabalho

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Paulo Renato Fernandes da SilvaMestre em Direito Empresarial.

Autor de diversos artigos publicados em revistasespecializadas de Direito e Processo do Trabalho.

Coautor do Curso de Direito e Processo do TrabalhoOnline da Fundação Getúlio Vargas — FGV.

Membro de bancas examinadoras de concursos públicos e doexame da Ordem dos Advogados do Brasil — OAB, na área trabalhista.

Coautor da obra Dicionário de Direito do Trabalho, DireitoProcessual do Trabalho e Direito Previdenciário, LTr Editora, 2012.

Professor do Curso de Ciências Jurídicas da

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Cooperativas de Trabalho,Terceirização de Serviços

e Direito do Trabalho2a Edição

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Silva, Paulo Renato Fernandes da Cooperativas de trabalho, terceirização de serviços e direito do trabalho / Paulo Renato Fernandes da Silva. — 2. ed. São Paulo : LTr, 2013. Bibliografi a.

1. Cooperativa e trabalho — Legislação — Brasil 2. Direito do Trabalho 3. Terceirização — Legislação — Brasil I. Título.

6.133:37.433:43-UDC 61200-31

Índice para catálogo sistemático:

1. Cooperativas de trabalho, terceirização de serviços edireito do trabalho : Direito 34:334.73:331.6

R

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Rua Jaguaribe, 571

CEP 01224-001

São Paulo, SP – Brasil

Fone: (11) 2167-1101

www.ltr.com.br

Produção Gráfi ca e Editoração Eletrônica: Peter Fritz Strotbek

Projeto de Capa: Raúl Cabrera Bravo

Impressão: Prol Alternativa Digital

Março, 2013

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Versão impressa - LTr 4789.0 - ISBN 978-85-361-2488-9Versão digital - LTr 7546.1 - ISBN 978-85-361-2524-4

Dedicatória:

Dedico este trabalho aos meus pais, Paulo e Lizete, aos meus irmãos, Sergio ePatricia, aos meus fi lhos, Paula, Daniel e Gabriel, e ao amor da minha vida: Alba.

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Agradecimento

Algumas pessoas foram fundamentais para a realização deste trabalho,em especial Fátima Trindade Fernandes e Humberto Martins,

Salete Maria Polita Maccalóz, Daniel Tabak,Sylvia Constant Vergara, Carla Marshall,

José Augusto Galdino e Patrícia Ribeiro Serra.

Aos professores Alexandre Nordskog, Márcia Regina Gonçalves Gomes,Leonardo Dias Borges, Ana Maria Reis, Regina Viana e Paulo Cosme de Oliveira.

Aos alunos, da graduação e da pós-graduação, pelo incentivo e pelossaudáveis momentos de aprendizado recíproco. Aos amigos funcionáriosda Faculdade de Direito da Universidade Candido Mendes — UCAM,

do IAG/PUC-Rio, da FGV, da ESA e daUniversidade Federal Rural do Rio de Janeiro — UFRRJ.

Para todos aqueles que fazem de seu modo de vidaum eloquente discurso na luta por um mundo mais justo.

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Sumário

Apresentação ............................................................................................................. 15

Introdução ................................................................................................................ 17

Capítulo I — Antecedentes Históricos do Cooperativismo .................................. 19

1.1. Breve histórico .................................................................................................. 19

1.2. Política Nacional de Cooperativismo .............................................................. 21

Capítulo II — Considerações Propedêuticas sobre o Instituto das Sociedades Cooperativas ..................................................................................................... 25

2.1. Conceito ............................................................................................................ 25

2.2. Natureza jurídica ............................................................................................... 29

2.3. Finalidade .......................................................................................................... 34

2.4. Classifi cação ...................................................................................................... 37

2.5. Estrutura interna ............................................................................................... 40

2.5.1. Limitação do quantitativo de diretores.................................................. 42

2.5.2. Da estabilidade dos diretores eleitos ...................................................... 43

Capítulo III — O Regime Constitucional e Infraconstitucional das Sociedades Cooperativas ..................................................................................................... 46

3.1. Tratamento constitucional ............................................................................... 46

3.2. Tratamento infraconstitucional: o novo Código Civil e a Lei n. 5.764/71 ..... 54

3.2.1. Princípio da adesão voluntária............................................................... 54

3.2.2. Princípio da variabilidade ou dispensa do capital social ...................... 54

3.2.3. Princípio da limitação do número de quotas-partes ............................ 56

3.2.4. Princípio da singularidade de voto ........................................................ 56

3.2.5. Princípio da intransferibilidade de quotas a terceiros .......................... 57

3.2.6. Quorum da Assembleia Geral ................................................................. 58

3.2.7. “Distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelos sócios com a sociedade, podendo ser atribuído juro fi xo ao capital realizado” (inciso VII, art. 1.094, CC) ............................ 59

3.2.8. Prestação de assistência aos associados.................................................. 60

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3.2.9. Quantitativo mínimo de associados ...................................................... 62

3.2.10. Indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolução da sociedade .......................................................... 63

Capítulo IV — A Sucessão Trabalhista e a Sociedade Cooperativa de Trabalho 65

4.1. Crítica à terminologia ....................................................................................... 65

4.2. Defi nição do fenômeno sucessão trabalhista .................................................. 66

4.3. Finalidade .......................................................................................................... 66

4.4. Requisitos de confi guração ............................................................................... 67

4.5. Efeitos em relação ao sucessor e ao sucedido .................................................. 71

a) O princípio da intangibilidade do contrato de trabalho ............................ 72

4.6. A possibilidade jurídica da cooperativa como sucessora ................................ 72

Capítulo V — Sociedades Cooperativas de Trabalho: O Problema da Terceirização Frente ao Direito do Trabalho ......................................................................... 77

5.1. Noções gerais sobre terceirização ..................................................................... 77

5.2. Terceirização trabalhista e terceirização empresarial ...................................... 83

5.3. Disciplina normativa da Lei n. 6.019/74 .......................................................... 86

5.4. A terceirização em larga escala e a quarterização: a licitude e a fraude do procedimento empresarial ................................................................................ 90

5.5. Confi guração dos elementos fático-jurídicos da relação de emprego ............ 101

a) Pessoa natural ............................................................................................... 102

b) Pessoalidade .................................................................................................. 103

c) Não eventualidade ........................................................................................ 104

d) Subordinação jurídica .................................................................................. 104

e) Onerosidade .................................................................................................. 106

5.6. Casos admitidos de terceirização do trabalho ................................................. 107

5.7. O enfoque pretoriano da terceirização atípica ................................................ 109

5.8. As cooperativas de trabalho e o Direito Laboral ............................................. 123

5.9. O princípio setorial da não fraude ................................................................... 134

5.10. A terceirização de atividade-fi m via cooperativas .......................................... 136

5.11. O problema do parágrafo único do art. 442, CLT ........................................... 138

5.12. Diferenciação entre as fi guras do empregado e do cooperado ...................... 144

5.13. A atuação do Ministério Público do Trabalho ................................................ 158

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Conclusão .................................................................................................................. 163

Referências bibliográfi cas......................................................................................... 167

Anexos ....................................................................................................................... 171

Lei n. 12.690, de 19 de julho de 2012 (Lei das cooperativas de trabalho) ...... 171

Mensagem n. 331, de 19 de julho de 2012 ....................................................... 177

Projeto de Lei do Senado — PL n. 4.622 ......................................................... 178

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“Não demoram muito para nos opor as leis da concorrência, da competitividade, o ajustamento às regras econômicas internacionais — que são as da desregulamentação — e de nos entoar loas sobre a fl exibilização do trabalho. Cuidado então para não insinuar que, por essa razão, o trabalho se acha, mais do que nunca, submetido ao bel-prazer da especulação, às decisões de um mundo considerado rentável em todos os níveis, um mundo totalmente reduzido a ser apenas uma vasta empresa — [...] Alguns diriam: um vasto cassino.”

Viviane Forrester

“A cooperação é a coisa mais simples do mundo para se entender. Não há nada de complicado. A cooperação, no senso do trabalho em conjunto, para um resultado comum, é tão velha como a natureza humana. No mundo moderno, a cooperação é juntar o povo para realizar seus próprios negócios, com seu próprio dinheiro, para seu próprio benefício mútuo.”

Valdiki Moura

“Nada é tão contagiante como o gosto pela liberdade.”

Roberto Freire (Sociólogo)

“Existe uma esfera social não mercantil, como o trabalho e os direitos fundamentais... o socialismo deve ser entendido como democracia sem fi m...”

Boaventura de Souza Santos

“O homem, sem os artifícios da civilização, é só um pobre animal...”

Willian Shakespeare

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Apresentação

Este estudo visa a realizar uma análise jurídica do fenômeno econômico denominado terceirização de serviços, por intermédio de sociedades cooperativas de trabalho, e suas relações com o Direito do Trabalho. O desafi o é de verifi car se a terceirização através de sociedades cooperativas constitui procedimento empresarial lícito na ordem jurídica pátria.

Há natural tensão entre o regime cooperativo e o regime empregatício, em razão do fato de que, tradicionalmente, o trabalho humano é dignifi cado através de ajuste previsto via contrato de trabalho, onde são prefi xados direitos laborais compulsórios aos trabalhadores. No sistema cooperativo, há trabalho, mas sem emprego, entretanto, há incidência automática de direitos laborais mínimo previstos na novel e alvissareira lei das cooperativas de trabalho (Lei n. 12.690, de 19 de julho de 2012). Assim, serão postos em xeque a terceirização, a sociedade cooperativa e as normas de tutela do trabalho, bem como suas relações e os efeitos jurídicos daí decorrentes.

Como suporte teórico serão examinados aspectos fundamentais do regime jurídico cooperativo, enfoque nodal para a compreensão deste sistema. Pretende-se, dessa forma, colher subsídios importantes para a tentativa de aprofundamento e a ampliação dos argumentos para a discussão em tela.

O Direito do Trabalho atualmente constitui um ramo de direito em franca mutação, rendendo ensejo para o debate da questão da possibilidade jurídica da contratação de serviços por meio de sociedades cooperativas

Flagrante, pois o objetivo principal do presente estudo, qual seja, confrontar o regime cooperativo com as normas de tutela do trabalho, a fi m de verifi car se há antinomia entre esses dois sistemas jurídicos, com especial atenção para terceirização de serviços mediante sociedades cooperativas de trabalho.

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Introdução

O presente estudo tem por escopo investigar, de forma analítica e crítica, o regime jurídico das sociedades cooperativas de trabalho sob o enfoque do Direito do Trabalho brasileiro, especialmente no tocante ao problema social e econômico da legalidade ou não da terceirização de serviços mediante a contratação de sociedades cooperativas de trabalho.

A insegurança jurídica gerada pela tensão entre o cooperativismo e o Direito do Trabalho vem aturdindo os profi ssionais do direito, as empresas, as entidades associativas de obreiros e o próprio Poder Judiciário, conquanto esteja entrelaçada com temas ligados às questões constitucionais, comerciais, tributárias e, fundamentalmente, aos postulados protecionistas das normas jurídicas de proteção ao trabalho humano.

Antes, contudo, no primeiro capítulo, será feita uma breve abordagem dos ante-cedentes históricos que deram origem ao nascimento das cooperativas, desde a época dos pioneiros de Rochdale, na Inglaterra, até os dias atuais, em que já existe positivada na legislação nacional uma Política Nacional de Cooperativismo.

O segundo capítulo destina-se a apresentar considerações preliminares sobre o instituto das cooperativas, dentro do campo dogmático, como: conceito, natureza jurídica, fi nalidade, classifi cação, características, estrutura; além de cuidar de temas tormentosos como as questões relativas ao quantitativo de diretores da entidade e da estabilidade dos membros eleitos para determinados cargos nas cooperativas de empregados.

No terceiro capítulo, em foco está o regime jurídico constitucional das cooperativas. O estudo trata da defi nição do que vem a ser o denominado ato cooperativo e, espe-cialmente, dos benefícios normativos e fi scais de que são titulares essas entidades. A relevância do assunto é evidenciada de sobremaneira pela análise do arcabouço constitucional criado para incentivar e promover as diversas formas de cooperativismo. Também será objeto de análise as normas do novo Código Civil atinentes ao cooperativismo.

A questão da sucessão trabalhista será discutida no quarto capítulo. Suas peculia-ridades, efeitos e hipóteses serão abordadas objetivando a verifi cação da adequação hipotética do instituto dentro do contexto das sociedades cooperativas de trabalho.

O quinto capítulo encontra-se dedicado ao exame das dissonâncias das cooperativas de trabalho frente aos princípios que norteiam o Direito do Trabalho brasileiro. A fl exibili-zação, a precarização e a desregulamentação do Direito Social também serão utilizados como instrumentais da análise do contexto em que estão inseridas as cooperativas.

A identifi cação dos conceitos e funcionalidades da terceirização e da quarterização, a discussão acerca da licitude da terceirização de serviços através de cooperativas de trabalho, a interpretação que deve ser dada ao parágrafo único do art. 442 da CLT, as

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diferenças básicas entre o cooperado e o empregado e os possíveis direitos trabalhistas que podem ser atribuídos aos cooperados dentro do contexto constitucional de valorização do trabalho humano, a análise do Projeto de Lei n. 4.622, aprovado pela Câmara dos Deputados e enviado para sanção da Presidenta da República, em junho de 2012, e da Lei n. 12.690/12, que é nova lei das cooperativas de trabalho, cujo texto está no anexo deste livro, bem como a atuação do Ministério Público do Trabalho, são questões abordadas a serem respondidas neste capítulo.

Finalmente, em sede de conclusão, será apresentada uma síntese dos argumentos desenvolvidos no decorrer do trabalho; oportunidade em que se verifi cará se existem e quais são os reais benefícios positivados pela ordem jurídica ao cooperativismo, bem como as conclusões quanto ao instituto, à luz do Direito do Trabalho pátrio.

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Capítulo I

Antecedentes Históricos do Cooperativismo

1.1. Breve histórico

O primeiro registro histórico do movimento cooperativista remonta ao século XIX, mais precisamente em 1844(1), na Inglaterra, quando aproximadamente 28 operários tecelões da cidade de Rochdale, após terem sido despedidos(2) da indústria na qual trabalhavam, decidiram fundar um pequeno dispensário cooperativo com a fi nalidade de prover suas necessidades básicas de consumo.

Deste evento deriva-se a gênese de um fenômeno novo que surgia no mundo(3). Na mesma época, na França e na Alemanha desenhavam-se outras iniciativas de criação de cooperativas, mas nenhuma delas teve o êxito dos pioneiros ingleses, que fi caram conhecidos como os fundadores da Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale.

Tal cooperativa tinha objetivos precisos, pois se preocupava unicamente em obter artigos indispensáveis à subsistência de seus membros, nas melhores condições de preço e qualidade. Para tanto, a entidade foi constituída com um capital social dividido em ações de uma libra esterlina cada, produto da integralização (contribuição) de seus cooperados.

O sucesso da experiência fez com que a cooperativa inglesa ampliasse seus objetivos sociais, passando também a vender e a fabricar artigos para absorver a mão de obra de seus associados desempregados, garantindo-lhes uma fonte de renda. Os vanguardistas de Rochdale, então, ditaram as quatro leis fundamentais da cooperação, que são as seguintes:

1a) venda das mercadorias ao preço da praça;

(1) FROLA, Francisco. A cooperação livre. Rio de Janeiro: Athena, 1937. p. 12.

(2) Despedida é o termo técnico adequado para designar a resilição do contrato de trabalho por parte do empregador, vale dizer, é o ato patronal de desligamento do empregado da empresa sem justa causa. Diferencia-se do pedido de demissão, que é feito pelo trabalhador que não deseja mais continuar labo-rando para o seu empregador.

(3) Segundo Valdiki Moura, in Democracia Econômica, São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1942. p. 4, a referência a palavra cooperação foi empregada pela primeira vez, em 1828, pelo Dr. Wilian King, médico londrino que dera início, como precursor dos famosos tecelões de Rochdale, ao chamado “Union Shop Movement”. Mas a maioria dos registros atribui a Robert Owen a utilização do termo para descrever uma nova ordem social, que nascia como sinônimo do termo socialismo e comunismo. Owen era um rico industrial socialista, proprietário de uma próspera indústria têxtil, em Lanark, na Escócia, que se destacou pelo importante papel que teve na defesa dos direitos trabalhistas do operariado, bem como pela preocupação com os desvalidos da sociedade. Para tanto, elaborou um projeto de reforma social tendo como princípios a propriedade coletiva, a utilização de seus próprios meios, a associação voluntária e democrática, a neutralidade política e religiosa etc. Propugnava, ainda, que os pobres se organizassem para criar coopera-tivas agrícolas, industriais e de consumo a fi m de melhorarem suas condições de vida. Owen pode ser considerado um dos precursores do movimento cooperativista mundial.

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2a) devolução dos proventos aos associados em proporção às compras que cada um realizar;

3a) administração da sociedade de acordo com os princípios democráticos;

4a) venda a dinheiro.

Essas quatro regras constituíram a estrutura fundamental da cooperação daquela fase histórica, e de tão importantes, algumas delas continuam informando o sistema cooperativista mundial até hoje, como será visto oportunamente.

Assim, percebe-se que as cooperativas nasceram como uma via alternativa para os trabalhadores combaterem os cáusticos efeitos da carestia, reinante na Europa do século XIX. Como o Estado Liberal da época nada provia para socorrer aos desafortunados, e tampouco os empresários tinham essa preocupação, restava ao povo economicamente débil, encontrar por si próprio uma saída, não para que ascendesse economicamente, mas sim para que pelo menos sobrevivesse.

No Brasil, as primeiras iniciativas cooperativistas ocorreram no fi nal do século XIX basicamente promovidas pelos interesses das elites agrárias nacionais em manter o controle social e econômico sobre o trabalho. O modelo europeu é implantado no país de forma distorcida, “de cima para baixo”, mais em razão dos interesses econômicos do que em função dos interesses sociais.

O primeiro diploma legal brasileiro dedicado ao assunto foi o Decreto n. 796, de 2 de outubro do ano de 1890, que autorizava a organização de sociedades cooperativas. Desse momento em diante, houve farta produção legislativa sobre o tema, merecendo especial destaque o Decreto n. 979, de 6 de janeiro de 1903, que regulava as atividades dos sindicatos dos profi ssionais da agricultura e das atividades rurais e, de cooperativas de produção e consumo.

Como servia aos interesses da classe dominante da época, já em 1907, foi baixado o Decreto n. 1.637, de 5 de janeiro, que, no seu art. 10, previa que as sociedades coope-rativas podiam se constituir na forma de sociedades anônimas, em nome coletivo ou em comandita simples.(4)

À cooperativa era conferida uma estrutura deturpada de empresa capitalista, em claro desvirtuamento dos princípios inspiradores de Rochdale, que se baseavam na

(4) A sociedade anônima é uma sociedade de capital, em que este é dividido em unidades denominadas de ações. Seus sócios são chamados, por conseguinte, de acionistas, tendo como característica o fato de poderem negociar livremente suas ações. Nenhum acionista pode impedir o ingresso de novo acionista no quadro associativo. Cada acionista responde pelas obrigações sociais até o limite que faltar para a integralização de suas ações. A sociedade em nome coletivo é aquela em que duas ou mais pessoas, ainda que algumas delas não sejam comerciantes, se unem para comerciar em comum, debaixo de uma mesma fi rma comercial, com responsabilidade dos sócios solidária e ilimitada, pelas obrigações sociais. A sociedade comandita simples se caracteriza em razão do aspecto da associação de duas ou mais pessoas, com objetivos comerciais, obrigando-se alguns como sócios solidários e ilimitadamente responsáveis (sócios comanditados), e outros como simples prestadores de capitais, com responsabili-dade limitada às suas contribuições de capital (sócios comanditários).

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solidariedade e na mutualidade como ideal de vida. A cooperativa estava presa a um formato jurídico que não era adequado a sua natureza.

Mas foi em 1932 que surgiu, realmente, o primeiro estatuto nacional a regulamentar de forma geral e pertinente (uma vez que incorporou princípios universais do coopera-tivismo no direito pátrio) o sistema cooperativo, feito através do Decreto n. 22.239, de 19 de dezembro, que chegou a ser adjetivado, na ocasião, como a melhor lei do mundo sobre o tema. Dentre as inovações apresentadas merece realce a que reconheceu às coope-rativas uma forma jurídica sui generis, retratada da seguinte maneira no aludido Decreto:

Art. 2o As sociedades cooperativas, qualquer que seja a natureza, civil ou mercantil, são socie-dades de pessoas e não de capitais, de forma jurídica sui generis, que se distinguem das demais sociedades pelos pontos característicos que se seguem, não podendo os estatutos consignar disposições que os infrinjam.

Em seguida foram realizadas as seguintes alterações no sistema legal do coo-perativismo: Decreto n. 23.611, de 20 de dezembro de 1933 (permite a instituição de consórcios profi ssionais de cooperativas), Decreto n. 24.647, de 10 de julho de 1934 (trata dos princípios para cooperação profi ssional e social), Decreto-lei n. 581, de 1o de agosto de 1938 (cuida do registro, fi scalização e assistência às cooperativas), Decreto-lei n. 926, de 5 de novembro de 1938 (dispõe sobre as cooperativas de seguro), Decreto n. 6.980, de 19 de março de 1941 (aprova o regulamento para fi scalização das cooperativas), Decreto n. 5.893, de 10 de outubro de 1943 (dispõe sobre a organização, funcionamento e fi scalização das cooperativas), Decreto-lei n. 6.274, de 14 de fevereiro de 1944 (altera o Decreto-lei n. 5.893/43), Decreto-lei n. 8.401, de 19 de dezembro de 1945 (derroga os Decretos-Lei ns. 5.893/43 e 6.274/44), Lei n. 4.504, de 30 de novembro de 1964 (aprova o Estatuto da Terra).

Depois de todas essas alterações o Decreto-lei n. 22.239/32 foi revogado, em 21 de novembro de 1966, pelo Decreto-lei n. 59 (regulamentado pelo Decreto n. 60.597, de 19 de abril de 1967), expedido com base no Ato Institucional n. 2, em pleno regime militar, redefi nindo a Política Nacional de Cooperativismo, tendo o mérito de ter tratado dos aspectos operacionais do cooperativismo, matéria até então olvidada pela legislação.

1.2. Política Nacional de Cooperativismo

Em 16 de dezembro de 1971, foi promulgada a atual Lei de Regência das Socie-dades Cooperativas, consubstanciada na Lei n. 5.764, que defi ne a Política Nacional de Cooperativismo e seu regime jurídico. Para tanto, discorre largamente sobre o sistema cooperativista através de seus 117 artigos.

Hodiernamente, o Estado deve assumir o papel de incentivador e impulsionador do cooperativismo, o que pode ser feito através de ações legislativas e ações executivas práticas e concretas como desenvolvimento, fomento e informação da educação coo-perativa, incentivos fi scais e de fi nanciamento, formação de convênios entre entidades públicas e universidades para prestação de assistência técnica para a criação e manu-tenção de cooperativas dentre outras.

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Nesse sentido, o § 2o do art. 2o do Estatuto Legal das cooperativas, estabelece, desde 1971, que:

A ação do Poder Público se exercerá, principalmente, mediante prestação de assistência técnica e de incentivos fi nanceiros e creditórios especiais, necessários à criação, desenvolvimento e integração das entidades cooperativas.

Este dispositivo foi recepcionado pela Constituição da República de 1988, que previu que a lei deverá apoiar e estimular o cooperativismo (parágrafo primeiro do art. 174 CRFB), como se verá no capítulo III deste trabalho. Logo, a política econômica adotada pelo governo deve observar esses dois comandos, uma vez que isso corresponde à consagração, como destaca Carla Marshall,(5) “da ideologia adotada pelo Estado no domínio econômico”.(6)

A 90a Conferência da Organização Internacional do Trabalho – OIT, ocorrida no mês de junho de 2002, em Genebra, e com ativa participação do Brasil(7) e da Aliança Cooperativista Internacional — ACI, aprovou a Recomendação de n. 193 — sobre a Promoção das Cooperativas, dispondo que os Estados Membros deveriam facilitar o

(5) MARSHALL, Carla. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. p. 99.

(6) Por iniciativa do Fórum Nacional de Estudos sobre a População de Rua, em parceria com a CNBB, Cáritas e Unicef, foi realizado, em 7 de junho de 2001, o primeiro Congresso de Catadores de Papel, em Brasília, que teve por fi nalidade discutir o fenômeno social da população de rua, com vistas a apoiar experiências organizativas a tal respeito. Os 1.500 catadores de papel que lá compareceram estavam interessados em capacitação profi ssional e acesso a cursos e atividades ligadas aos temas cooperativismo, educação ambiental, saúde, segurança no trabalho, gestão de negócios, informática, assuntos jurídicos, bem como educação básica e alfabetização. Frei Beto, em artigo publicado no Jornal do Brasil, de 3.6.2001, informa que esses trabalhadores: “Desejam ser reconhecidos legalmente como categoria profi ssional, incluídos em programas municipais de coleta seletiva, e obter a criação de linhas de fi nanciamento específi cas para cooperativas-associações de catadores e a criação de mecanismos (tributários etc.) que incentivem a indústria nacional de reciclagem.”

(7) A Conferência contou com a participação de 156 países, tendo a delegação brasileira contado com 36 participantes, divididos da seguinte maneira: dois delegados governamentais, 1 delegado representante dos empregados e 1 outro representante dos empregadores, mais 14 conselheiros governamentais, 10 conselheiros dos trabalhadores e 10 dos empregadores. A Recomendção 193 estabeleceu os seguintes vetores para uma boa política de apoio ao cooperativismo: “6. Uma sociedade equilibrada requer a exis-tência de fortes setores públicos e privados, mas também de forte setor social cooperativo, mutualista e de outros setores sociais e não governamentais. É nesse contexto que os governos deveriam ofecerer uma política de apoio e uma estrutura legal compatível com a natureza e função das cooperativas e, inspirados nos valores e princípios cooperativos, enunciados no § 3o, deveriam: (a) criar uma estrutura institucional com o objetivo de facilitar o registro de cooperativas de modo tão rápido, simples, acessível e efi ciente quanto possível; (b) promover políticas para facilitar a criação, nas cooperativas, de reser-vas apropriadas, das quais pelo menos parte pudesse ser indivisível, e de fundos de solidariedade; (c) adotar medidas para a supervisão de cooperativas, de modo apropriado a sua natureza e funções, que respeitassem sua autonomia, fossem conformes à lei e à prática nacionais e não menos favoráveis que as medidas aplicáveis a outras formas de empresa e organização social; (d) facilitar a associação de co-operativas a estruturas cooperativas que atendessem às necessidades dos cooperados e (e) incentivar a criação de cooperativas como empresas autônomas e de autogestão, especialmente em áreas em que as cooperativas tivessem importante papel a desempenhar ou serviços a prestar que, de outro modo, não estariam disponíveis. 7. (1) A promoção de cooperativas inspiradas nos valores e princípios enunciados no § 3o deve ser considerada um dos pilares do desenvolvimento econômico e social tanto em âmbito nacional como internacional.”

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acesso das cooperativas a serviços de apoio com o fi m de fortalecer e melhorar sua viabilidade empresarial e capacidade de criar empregos, proporcionar assessoramento em matéria de gestão, tecnologia, inovações, acesso facilitado a empréstimos e fi nan-ciamentos, facilitar o acesso das cooperativas aos mercados, dentre outros objetivos.

A Assembleia de 2002, da Organização Internacional do Trabalho — OIT, também cuidou de reconhecer os sete princípios universais de identidade do cooperativismo, fi xados anteriormente no Congresso Centenário da Aliança Cooperativista Internacional —ACI,(8) ocorrido em Manchester, em agosto de 1995, são eles: adesão voluntária e aberta; gestão democrática por parte dos sócios; participação econômica dos sócios; autonomia e independência; educação, treinamento e informação; cooperação entre cooperativas; e compromisso com a comunidade (item I, 3, b, da referida Recomendação da OIT). Esses princípios serão analisados ao longo do trabalho.

Infl uenciado por esse contexto normativo a Câmara dos Deputados, em 26.6.2012, aprovou em votação fi nal o Projeto de Lei n. 4.622, que foi enviado para sanção pre-sidencial, sendo transformado na Lei n. 12.690/2012, que institui lei das cooperativas de trabalho, estabelecendo no seu CAPÍTULO IV , O PROGRAMA NACIONAL DE FOMENTO ÀS COOPERATIVAS DE TRABALHO (PRONACOOP), leia-se:

Art. 19. É instituído, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego, o Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho (Pronacoop), com a fi nalidade de promover o desen-volvimento e a melhoria do desempenho econômico e social da Cooperativa de Trabalho.

Parágrafo único. O Pronacoop tem como fi nalidade apoiar:

I – a produção de diagnóstico e plano de desenvolvimento institucional para as Cooperativas de Trabalho dele participantes;

II – a realização de acompanhamento técnico visando ao fortalecimento fi nanceiro, de gestão, de organização do processo produtivo ou de trabalho, bem como qualifi cação dos recursos humanos;

III – a viabilização de linhas de crédito;

IV – o acesso a mercados e à comercialização da produção;

V – o fortalecimento institucional, a educação cooperativista e a constituição de cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas;

VI – outras ações que venham a ser defi nidas por seu Comitê Gestor no cumprimento da fi nalidade estabelecida no caput deste artigo.

(8) A representação do sistema cooperativista nacional cabe à Organização das Cooperativas Brasileiras — OCB, sociedade civil, com sede na Capital Federal, sendo, por força da Lei n. 5.764/1971, órgão técnico-consultivo do governo, que tem por fi nalidades básicas integrar todos os ramos das atividades cooperativas, manter os registros de todas as sociedades cooperativas, manter relações de integração com entidades congêneres do exterior, manter serviços de assistência geral ao sistema cooperativista etc. Em cada Estado da Federação existe uma afi liada dessa entidade, que recebe o nome de Organização das Cooperativas do Estado respectivo, como, por exemplo, a Organização das Cooperativas do Rio de Janeiro — OCERJ, ou a de Minas Gerais — OCEMG etc. As sociedades cooperativas estão obrigadas, como condição de funcionamento, a promover o seu registro nas organizações estaduais ou na própria OCB, mediante a apresentação dos estatutos sociais e suas alterações.

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