Territorios - O Cinturão de Fogo A5 diagramado release

8/8/2019 Territorios - O Cinturo de Fogo A5 diagramado release

1/30

Este documento contm os trs primeiros captulos do livro

Territrios: O Cinturo de Fogo. Espero que vocs, queridos

leitores, curtam esta leitura inicial tanto quanto eu curti

escrever. Espero em breve lanar o livro oficial.

Obrigado,

Andr L. I. de Lima


2/30

Meu nome Alfonso de Tornelia, mas todos na escola

me chamam de Alf. No sou o que se pode chamar de garoto

popular. Afinal, que garota acharia um menino de quinze anos,

com um metro e setenta, cabelos ruivos, olhos de cor vinho e

um nariz gigantesco, bonito? Sem mencionar que com a

puberdade vieram tambm as espinhas e o que faltava no meu

rosto era espao para encaixar mais uma delas. Quem conhecer

essa garota, ento, por favor, me apresente a ela.

Eu nasci em um reino chamado Reino Leonida, tambm

conhecido como Reino da Aurora. Existem muitas lendas que

povoam o folclore do nosso reino, mas a mais importante delas

de como surgiu o nosso reino.

Nos tempos antigos, o continente era povoado porhumanos que viviam em relativa harmonia. No existia ainda o

Reino Leonida, apenas pores de terra denominados

Territrios. Cada Territrio tinha seu governante: uma pessoa

intitulada Marqus. Existiam ao todo cinco pessoas com esse

ttulo e cada uma delas representava um dos cinco elementos


3/30

mais comuns do continente. Os elementos eram: gua, fogo,

vento, lua, terra.

Esses soberanos mantinham relaes estreitas de

amizade e ajuda entre si e casamentos entre pessoas de

diferentes Territrios era freqente. Existia tambm uma

complexa estrutura hierrquica entre os Marqueses que

mantinha o equilbrio entre eles evitando guerras. Contudo, um

dia, um Marqus poderoso e cruel comeou a marchar com

tropas e armas que nenhum outro Marqus, ser humano, ou at

mesmo ser vivo daquele continente tinham algum dia visto.

Era uma fora formada por homens e seres horrendos.

Alguns to grandes que em uma pegada deles podiam caber atdez homens, outros to fortes que moviam pedras mais pesadas

que elefantes. Mulheres que mais pareciam serpentes lanavam

chuvas de flechas sobre vilas. Monstros peludos que uivavam

para a Lua amedrontando as pessoas que os ouvissem.

Um a um, os Marqueses foram perdendo a guerra e o

Marqus soberano foi sobrepujando a fora dos seus iguais. Em

poucos anos, o Territrio do Vento e em seguida o Territrio

da Terra foram conquistados em duas batalhas picos que

ficaram conhecidas como A Batalha da Cortina e a Batalha do

Canyon, respectivamente.


4/30

O continente estava vivendo uma poca de crise. A

fome, a insegurana e o medo assolavam o esprito de todos os

seres vivos que habitavam nosso mundo. Foi ento que de umapequena vila, um garoto que mais tarde se tornaria o unificador

do continente, surgiu.

O Marqus da Lua estendeu suas garras para o

Territrio do Fogo destruindo muitas vilas construdas na

periferia do Territrio. O Marqus do Fogo enviou seus

soldados de elite que mais tarde ficaram conhecidos como

Cavaleiros da Aurora. Esses soldados conseguiram conter o

avano das tropas do Marqus da Lua numa pequena vila de

onde viria o salvador de todo o continente.

Um garoto rfo chamou a ateno dos soldados. Esse

garoto chamava-se Lenidas e sua habilidade com a espada

superava a habilidade de muitos dos soldados que protegiam a

vila. O lder dos Cavaleiros da Aurora resolveu ento treinar o

garoto para que ele se tornasse um soldado tambm. J naprimeira batalha, Lenidas matou vrios inimigos e a partir da

ele no parou mais. Lenidas marchou junto com os lendrios

Cavaleiros da Aurora contra as tropas do Marqus soberano

vencendo muitas batalhas e empurrando as tropas do inimigo

de volta para fora da fronteira. Logo Lenidas ficou conhecido


5/30

por todo o continente por sua habilidade e pelas vitrias no

campo de batalha.

A partir da a esperana voltou a correr nas veias das

pessoas. Com um contingente humilde, Lenidas conseguiu

libertar o Territrio da Terra do domnio do Marqus da Lua e

em seguida iniciaram uma campanha para libertar o Territrio

do Vento.

Vendo seu imprio comear a desmoronar, o Marqus

da Lua usou sua carta na manga. Ele lanou seus quatro

Generais para combater Lenidas e os Cavaleiros da Aurora.

Muitas batalhas sangrentas explodiram nos vrios cantos do

continente. Vilas foram destrudas at no sobrar nada em p.Famlias foram separadas. Contudo, Lenidas e os Cavaleiros

da Aurora continuavam vencendo as batalhas e o exrcito do

Marqus da Lua recuava continuamente.

Por fim, Lenidas derrotou os quatro Generais do

Marqus da Lua e percebendo sua derrota iminente, ele fugiu

pelo mar desaparecendo no horizonte escuro.

A notcia da vitria de Lenidas e dos Cavaleiros da

Aurora logo percorreu os quatro cantos do continente. A vida

voltou a irradiar e as pessoas comemoravam cada segundo com


6/30

a certeza de que dias de paz viriam. Aproveitando sua

reputao, Lenidas unificou os cinco Territrios e tornou-se o

primeiro rei do reino recm-formado Aurora, nome que deu emhomenagem aos cavaleiros que lutaram bravamente ao seu

lado.

Mas esta apenas uma lenda. O que ser contado nestaspginas a minha histria.


7/30


8/30

apenas a parte de cima de um crculo trespassado por uma

espada.No vo dar aula com um tempo assim.

Minha me me fitou irritada.

- Vai logo dormir, moleque.uma voz mais grossa veio

do sof. A voz era do meu pai. Um homem gordo e

insuportvel que sentia uma satisfao irritante em me

perturbar.

- Alf, - minha me falou com a voz calma.por favor.

Olhei para minha me e no conseguia negar algo a ela.

Assenti contrariado.

- T bem.falei.

- Esse moleque. Voc pega muito leve com ele.ainda

pude ouvir meu pai enquanto eu subia a escada para o meu

quarto.

- Ora, Arnaldo. Pare com isso.os dois provavelmente

comeariam a discutir, mas no ouvi mais nada porque tranquei

a porta do meu quarto e fui deitar na minha cama. Antes

mesmo de amanhecer, j era possvel ouvir o barulho de trovo

e dos pingos de chuva caindo no telhado.


9/30

- Alf. J est na hora de voc ir para escola. minha

me me acordou me descobrindo do lenol.

Abri os olhos e minha viso estava turva.

- Mas ainda noite. reclamei voltando a me enrolar

no lenol depois de ver um cu escuro atravs da janela.

- No noite. J dia. S que essa chuva...um trovo

cortou as palavras da minha me. Em compensao, ele me

despertou.

Levantei contra a minha vontade e minha me desceu

para a cozinha. Ela tremeu quando mais um trovo chacoalhou

as paredes de casa. Sorri dela. Desde que me lembro ela tinhapavor de tempestades, mas o que a assustava de verdade eram

os troves.

Troquei de roupa e desci para o caf da manh. Apenas

minha me estava l. Meu pai ainda devia estar dormindo

porque era apenas isso que ele sabia fazer. J minha irm quase

nunca estava em casa. Ela preferia muito mais estar na casa das

suas amigas. Minha me colocou desastradamente um bule

com caf na mesa e senti pena dela ao notar suas mos

tremendo.


10/30

- Calma me. falei carinhosamente embora ela nem

tenha escutado.

Tomei o caf da manh e corri para a escola. A escola

que eu estudava se chamava Bela Aurora. Eu no entendia o

motivo de chamar nossa escola de bela, j que de bela ela no

tinha nada. A escola era freqentada, em sua maioria, por

garotos e garotas de comportamento fora do padro da

sociedade. Os garotos problemticos adoravam quebrar

paredes, enfiar a cabea de garotos mais fracos nas privadas

imundas da escola, entre tantas outras coisas. Antigamente ela

era muito melhor, mas depois que a outra escola fechou, Bela

Aurora teve uma queda de qualidade porque passou a ser a

nica escola da cidade. No caminho, a chuva deu um descanso

ento consegui chegar pouco molhado na escola. Atravessei o

corredor at a sala onde eu tinha aula. Hoje era dia de aula de

Histria e senti um desnimo enorme ao girar a maaneta e dar

de cara com o Sr. Jairo me fitando desdenhosamente.

- Chegou cedo hoje, Sr. Alf.

De todos os professores que eu detestava, o Sr. Jairo era

o campeo. Ele era muito magro e baixo. Sua calvcie permitia

que ele cultivasse apenas um pequeno tufo de cabelos grisalhos

atrs da orelha. Ele usava culos fundo-de-garrafa que


11/30

aumentavam seus olhos a uma proporo bizarra. Adorava

realizar testes surpresa e eu frequentemente ia muito mal nos

testes.

Observei a sala de aula vazia. Menos de vinte pessoas

estavam presentes. Juliana, Tom, Bia, Thas e Paula eram umas

dessas pessoas. Caminhei entre duas fileiras de cadeiras at

chegar neles. Cumprimentei cada um deles e sentei na cadeira

atrs de Bia e ao lado de Tom ficando prximo a janela.

A tempestade continuava assolando a cidade. Alguns

loucos j comeavam a gritar que era o fim do mundo, que

logo Finnyes, nome da cidade onde nasci e cresci, estaria

mergulhada na gua. Outros at gritavam ofensas as cidades doNorte, antigas vilas do Territrio da gua, acusando-as de

serem as responsveis pela tempestade. Eu at me divertia um

pouco observando aqueles loucos gritando embaixo daquela

tempestade assustadora.

- Pst...

- Pst...olhei para o lado e vi Paula tentando chamar a

ateno de Juliana. J... sussurrou nervosa. Juliana virou

para trs discretamente. Paula sorriu para a amiga.

- Que foi Paula?Juliana perguntou irritada.


12/30

Paula suspirou decepcionada.S queria conversar.

- A gente t em aula. Juliana retrucou virando-se para

frente. Sr. Jairo pareceu nem notar a conversa recente das duas

e continuava explicando sobre alguma guerra importante no

seu ponto de vista. Virei-me de novo para a janela observando

um fio de gua escorrendo atravs da janela. Ento notei que a

chuva estava diminuindo, embora o vento forte e os troves

continuassem. Suspirei entediado.

- Minha aula no est boa para voc, senhor Alf? ouvi

novamente a voz irritante do professor se referindo a mim.

Olhei para ele tentando parecer o mais educado que pude, mas

talvez no tenha sido o suficiente pela careta dele quando ofitei.

- Est. respondi secamente mantendo meus olhos

fixos nos dele.

Ele caminhou at minha mesa. Seu sapato tinha a solade madeira o que causava certo desconforto aos nossos ouvidos

quando ele andava. O professor apoiou suas duas mos na

minha mesa ficando de frente para mim.

- Que bom que voc est gostando, senhor Alf. falou

com desdm arrumando seus culos no seu nariz. Ento,


13/30

talvez, eu possa passar um teste surpresa e acredito que voc se

sair muito bem.

Olhei fundo nos seus olhos. Eu realmente o detestava.

Por mim...respondi dando de ombros.

- Ento est decidido. exclamou maldosamente

afastando-se da minha mesa e indo na direo da sua. Ele abriu

sua pasta e puxou um plstico com um punhado de folhasbrancas dentro. Ele as retirou do plstico contando

meticulosamente o nmero de alunos presentes. Ao apontar seu

dedo para mim, ele sorriu. Dezessete alunos? exclamou.

At que no estamos mal para um dia de tempestade. Sr.

Jairo avanou atravs das mesas entregando uma folha paracada aluno e quando todos os alunos j estavam com uma

folha, o professor voltou para sua mesa e sentou-se

incomodamente animado.

Puxei o teste para mais perto lendo as questes sem

muita empolgao. Mais uma nota baixa para meu currculo.

pensei. Olhei para o lado e Tom j estava respondendo as

perguntas do teste. Bia tambm, assim como Juliana e Paula.

Thas olhava confusa para o teste. Ela viu que eu a observava e

fez uma careta de confusa que me fez dar risada.


14/30

- Tsk! olhei na direo do Sr. Jairo e sua ateno

estava voltada em mim. Ele apontou para os olhos dele e em

seguida para mim. Voltei minha ateno para o teste, masestava difcil ler o que estava escrito na folha. Minha viso foi

se tornando turva at escurecer completamente.


15/30

- Conde Alfonso.ouvi uma voz na minha cabea me

chamando.

- Me deixa dormir.reclamei ainda com os olhos fechados.

- Mas senhor, os emissrios do Marqus Fausto esto a tua

espera no hall.

Abri os olhos subitamente e levou um tempo at minhaviso voltar ao normal. Aos poucos, consegui distinguir uma

sombra que estava na minha frente suplicando. Um homem de

longos cabelos brancos cacheados olhava para mim suplicante.

- Quem voc?perguntei.

- Como assim, Conde? Essa mais uma das suas brincadeiras?

Ento notei que eu no estava mais na sala de aula. Eu

estava sentado numa cama confortvel num quarto imenso.


16/30

- Onde eu vim parar?exclamei assustado me levantando de

supeto da cama.

- Conde Alfonso, por favor, j hora de parar com

brincadeiras. No podemos deix-los esperando.

Deixar quem esperando... pensei.

...

Precisei me beliscar vrias vezes para acreditar que eu

no estava sonhando. Fechei mais uma vez os olhos mesmo

sobre os protestos insistentes do homem do cabelo branco.

Tentei dormir para ver se assim acordaria na sala de aula com o

professor Jairo apoiado na minha mesa e sorrindo satisfeito por

dar mais uma nota baixa para mim.

Ouvi algum falando. Queria que fosse a voz do

professor Jairo, mas era a mesma voz que me acordoumomentos antes. Tentei com todas as foras pensar na sala de

aula. Quais eram mesmo as perguntas do teste? Precisava me

lembrar de alguma coisa! Tentava, mas nada. Eu continuava

ouvindo as splicas interminveis do homem do cabelo branco.


17/30

Comecei a me sentir confuso e assustado. Minutos antes

eu estava sentado na sala de aula fazendo um teste de Histria.

No momento seguinte, estava sentado numa cama confortvelnum imenso quarto com um velho suplicando que eu fosse

encontrar os emissrios. Eu no conhecia nenhum emissrio. E

como ele sabia meu nome? E por que ele me chamava de

Conde? Comecei a enxergar as palavras rodopiando na minha

cabea num turbilho furioso e quando fiquei tonto resolviabrir os olhos.

- Ah, senhor. Finalmente. Os emissrios esto esperando e a

pacincia daqueles homens no vai da ponta de um cadaro ao

outro.o homem resmungou.

- Emissrios? Que emissrios?perguntei acalmando os

pensamentos para tentar encontrar algum sentido em tudo

aquilo.

- Ora. Os emissrios do Marqus Fausto, senhor.continuou,

embora agora sua voz comeasse a soar preocupada.

Olhei ao redor dando um tempo para minha cabea

assimilar os recentes acontecimentos. O quarto era imenso,

podia ver no fundo uma porta e um armrio de vidro. Dentro

dele estavam algumas espadas, escudos, peas de vesturio,


18/30

entre outros adereos de guerra pendurados como se estivessem

mostra numa exposio. Uma janela grande na parede ao lado

da minha cama era responsvel por boa parte da iluminao doquarto. Duas cortinas, uma de cada lado, estavam penduradas

num suporte acima da janela. Elas eram vermelhas e no p de

cada uma consegui identificar algumas grafias estranhas. Na

minha frente, o homem dos cabelos brancos continuava

olhando para mim me deixando um pouco incomodado.

- Aonde eu vim parar?era a pergunta mais bvia a se fazer

perante a confuso que ainda estava instaurada na minha

cabea.

- Como assim, senhor? Tu ests no teu quarto.o homemrespondeu cada vez mais preocupado.

- Eu quis dizer, - fiz uma breve pausa para limpar minha

garganta. - ONDE EU ESTOU?!levantei a voz e o homem

caiu assustado de bunda no cho. Fiquei com um pingo de

remorso.

- Conde, tu ests bem? Talvez o treino de ontem tenha sido

pesado demais.concluiu enquanto levantava-se.


19/30

Treino de ontem? Como assim?! Ontem eu estava em

casa assistindo ao noticirio de uma grande tempestade que iria

assolar todo o continente.

- Do que voc t falando?perguntei.

- Senhor, acho melhor adiar o encontro com os emissrios.

bvio o teu cansao. Inventarei uma desculpa e pedirei para

algum criado gui-los para um cmodo do castelo e nosreuniremos amanh.

Aquele homem falava extremamente educado. No

deixava escapar nenhuma slaba e me tratava por tu, uma

denominao pouqussima utilizada. Apenas os acadmicos e

pessoas mais antigas a utilizavam. Achei estranho. Estava

acostumado a linguagem que usava com meus colegas. A

linguagem do engula-quantas-slabas-puder-e-deixe-o-outro-

tentar-adivinhar-o-que-voc-quer-dizer. Eu sei que o nome

longo e complicado, mas acredite, a maneira mais simples de

conversar quando voc est numa roda de adolescentes.

Olhei ao redor e continuava tentando entender como eu

sa da sala de aula no meio de um teste de Histria da minha

escola e fui parar naquele quarto.

- Desculpa perguntar, mas qual seu nome?


20/30

O homem do cabelo branco pareceu ser apunhalado

pelas costas. Ele me observou por um momento, ento

respondeu:

- Bael, senhor. Meu nome Bael.

- Que lugar esse, Bael?tentei mais uma vez. Eu devia estar

branco, porque o homem parecia cada vez mais preocupado.

- Por favor, senhor. Descanse um pouco. Falarei com os

emissrios sobre a tua indisponibilidade e pedirei tambm a

algum criado que traga tua refeio e que um mdico venha

atender-te.aquele homem parecia se preocupar muito

comigo. Fiquei imaginando o que ele seria meu. Nunca o

conheci, pelo menos meus pais nunca falaram de nenhum

parente distante que parecesse com esse homem. E falando

essas palavras, o homem do cabelo branco despediu-se e saiu

pela porta, trancando-a em seguida.

Deitei na cama olhando para o teto. Tentei encaixar as peas doquebra-cabea, mas elas no faziam sentido nenhum. A ltima

coisa que lembrava era do professor Jairo me lanando um

olhar desaprovador e ento minha viso ficou turva e adormeci.

Quando acordei estava deitado nessa cama com o homem do

cabelo branco me observando. Ele se referia a mim como


21/30

Conde, mas eu nunca fui um conde. Na verdade, no existia

mais essa coisa de Conde, Duque, Marqus ou qualquer um

desses ttulos. Eu devia ter entrado em alguma pea teatralsobre a Era Antiga ou dos Territrios, nome a qual os

historiadores davam aos anos quando o continente ainda era

dividido em Territrios.

Toc-Toc...

Ouvi batidas na porta e aps alguns segundos, barulhos

parecidos com os de chave. Quando a porta abriu, uma senhora

entrou. Era uma senhora j de idade. Devia beirar os cinquenta

anos, talvez at mais. Era um pouco gorda e seu cabelo, bem,

no pude ver como eram seus cabelos j que ela usava umleno amarrado na cabea que encobria todo seu cabelo. Sua

pele era clara e seus olhos vinhos como os meus.

- Ol, Conde Alfonso. Trouxe teu jantar.a mulher me

cumprimentou aproximando-se com um carrinho de rodas

repleto de comidas de aparncia apetitosa. Era uma verdadeira

refeio de Marqus.

- Ah...obrigado.agradeci surpreso.


22/30

A voz daquela mulher parecia um eco em uma caverna. Soava

forte e aposto que se levantasse a voz faria com que as paredes

tremessem at ruir.

- Logo o mdico chegar para examinar o senhorio. O

conselheiro Bael me contou que vossa graa est passando mal.

Foi algo que comeste ontem?a mulher enrolava-se com as

palavras parecendo bastante apreensiva.

- No sei, mas acho que a comida no teve culpa alguma.

respondi tentando tranquiliza-la.

- Bom.ela sorriu constrangida, apesar de aliviada. - melhor

vossa graa descansar para se recuperar. Bom apetite.a

mulher virou-se me cumprimentando antes de sair.

- Obrigado.agradeci, mas ela j tinha sado do quarto.

Agora eu estava novamente sozinho naquele quarto

gigantesco. Por mais que pensasse, no chegava concluso

nenhuma. Ento resolvi levantar e procurar descobrir onde eu

estava sozinho.

Caminhei na ponta dos ps at a porta tentando fazer o

menor nmero de rudos. No foi difcil. Apesar do quarto ser


23/30

grande, no havia muitas coisas l que pudessem transformar-

se num obstculo acidental.

Abri a porta lentamente e ela rangeu. Parei atrs da

porta esperando ouvir passos do lado de fora. Como no ouvi

nada, abri a porta num solavanco e dessa vez ela no rangeu.

Olhei para fora e vi um corredor imenso. Era to grande que

no consegui ver o final dele. Pensei aonde ele daria. Sa e

resolvi seguir pelo lado esquerdo, que ao contrrio do que as

lnguas populares dizem, o lado esquerdo o meu lado da

sorte.

Caminhei lentamente ficando atento a qualquer barulho

que denunciasse a aproximao de algum. O corredor eraescuro, ento seria fcil me esconder caso ouvisse passos.

Apenas as chamas de tochas iluminavam o local. O corredor

no possua janela e um cheiro de mofo empesteava o local.

Comecei ento a ouvir barulho de passos e vozes.

Procurei um local para me esconder, mas onde eu me

esconderia se no corredor no havia nada?! Agora eu percebia

que apenas a escurido no era suficiente para esconder uma

pessoa de um metro e setenta no meio do nada. Resolvi ento

me encostar no canto mais escuro da parede, exatamente no

meio de duas tochas. Fiquei parado segurando a respirao. Os


24/30

passos aumentaram paulatinamente. Parecia ferro batendo em

pedra. Trs soldados passaram por mim numa conversa

animada sobre uma taberna que era frequentado pelasmelhores mulheres do Territrio. Agucei o ouvido tentando ter

certeza da meno dos soldados sobre o Territrio. Ainda

assim, no consegui ter certeza se realmente eles falaram sobre

o Territrio do Fogo, mas o importante era que no me

notaram. Os dois continuaram caminhando normalmenteenquanto conversavam alegremente. Pensei que eles

provavelmente no deviam estar fazendo alguma ronda, pois se

estivessem, eram pssimos nas suas tarefas. Dando a volta no

corredor pude ver uma luz que no era causada pelas tochas e

sim pela luz do dia.

- Uma janela!sussurrei empolgado porque ainda podia ouvir

as vozes e os passos dos soldados.

Caminhei apressado, mas cuidadosamente at ela

animado com o achado. Ao me aproximar da janela, preciseisemicerrar os olhos, j que eles estavam acostumados com a

penumbra do corredor e a repentina claridade os incomodava.

Quando eles comearam a acostumar-se com a claridade,

comecei a abri-los e pude ver um grande jardim estendendo-se

at o fim da vista. Ele era cheio de rvores e muitas pareciam


25/30

ter frutos que pintavam a copa das rvores com cores que

migravam do rosa, passando para o vermelho e indo at o

amarelo. Vi algumas pessoas caminhando calmamente por l.Outras mexendo nas plantas. Ao longe, antes do fim do jardim,

um imenso vale mesclava-se com uma pequena floresta. E atrs

dele uma cordilheira que mesmo to longe, pareciam tocar o

cu. Seu pico estava coberto por nuvens e seu sop estava

camuflado pelo azul e branco pintado no cho pelos raios doSol. A paisagem era realmente muito bonita e reconfortante.

- lindo, no ?uma voz veio do meu lado.

Tomei um susto quase caindo para o outro lado.

Algum aparecera do nada no corredor e nem ao menos escuteiseus passos se aproximando. Olhei e uma garota com cabelo

loiro amarrado num rabo-de-cavalo e olhos claros estava

apoiada na janela observando a paisagem. Um arco estava

preso s suas costas, mas no vi sinal de flechas. Fiquei

imaginando a razo dela andar com um arco, mas sem qualquerflecha.

- Um gato comeu tua lngua?a garota perguntou me

encarando.


26/30

No soube o que responder. Ela parecia me conhecer,

mas eu no sabia quem ela era.

- Ahn.

- . Acho que Bael tinha razo. Tu j ests ficando maluco com

estes treinamentos.ela concluiu com um suspiro.

A garota ento me deu as costas e seguiu pelo corredor

para o lado do qual eu viera. Permaneci admirando a paisagem

mais alguns minutos. Tempo suficiente para Bael me encontrar.

- Oh Senhor! Estava a tua procura. Deste um susto tremendo

nesta pobre alma.falou.

- Ora. Nosso Conde realmente cresceu bastante desde a ltima

vez que o vi.uma voz diferente entrou na conversa e ento

reparei que Bael no estava sozinho.

A voz era de um homem trajando roupa branca. Aquele

devia ser o mdico que Bael falou antes de sair do quarto. Omdico era um homem extremamente magro e com culos

fundo de garrafa muito parecido com os do Sr. Jairo. Seu

cabelo liso escorria pela testa. Ele no me passava muita

confiana. Era muito plido. Provavelmente, devia passar

dcadas sem ver a luz do Sol. Sua mo tremia constantemente e


27/30

at ele parecia ficar incomodado com isso.Essa tremedeira

que no me deixa.resmungava. Contudo, o que mais

chamava a ateno nele era sua altura. Devia ter quase doismetros.

- Vossa Graa cresceu bastante. Creio que no se lembre de

mim.o mdico falou educadamente.

Finalmente algum que eu poderia no conhecer sem sertaxado de maluco.pensei. Com certeza, isso me deixou mais

aliviado.

- Tenho uma vaga lembrana do senhor.menti para no

desapont-lo.

- Ora, Vossa Graa. Por favor, no mereo a honra de ser

chamado de senhor pelo Senhor.

Achei graa do mdico e ele pareceu perceber a

confuso que estava fazendo. Deu um leve sorriso e pegou sua

mala. Quando ele a jogou no cho e abriu no pude acreditar.

Ela, por si s, j parecia bem pesada. Era feita de couro, mas

no sei bem de que animal foi tirado o couro porque nunca vira

nada igual aquilo. Era vermelho com algumas partes branca e

preta. Vendo todos aqueles acessrios de mdico que ele

carregava me fez imaginar que a mala devia pesar pelo menos


28/30

uns quarenta quilos. Olhei mais uma vez para ele. Algum tipo

de fora interna muito poderosa devia estar oculto nele, porque

sua estatura fsica no lhe devia conferir fora para carregaruma mala daquelas.

- Muito bem, Vossa Graa. Poderia abrir a boca?ele pediu

enquanto segurava um palito.

Abri a boca ainda espantado com a fora daquelemdico.

- Hum.

- Hun-hun.O mdico fazia sons estranhos como se estivesse

confirmando o que ele achava que estava acontecendo.

- Certo. Vossa Graa parece estar sofrendo de exausto. Por

isso, recomendo que descanse um pouco. Agora devo pedir

licena para cuidar de uma garotinha no condado que est com

sintomas de gripe. E todos ns sabemos o quanto a gripe tem

matado nossas crianas. realmente uma pena.o mdico

guardou suas quinquilharias rapidamente na mala lamentando-

se pelas pessoas que morriam por causa da gripe. Pensei que

ele era um bom homem. Ento ele se despediu e desceu pelo

corredor carregando sua mala de quarenta quilos para mais uma

consulta.


29/30

- Bom, senhor. Tu ouviste o que Linfucius receitou. melhor

descansares um pouco, pois amanh ainda ters uma reunio

importante com os emissrios do Marqus Fausto. Eu teacompanharei at teu aposento.

At o quarto, eu e o Sr. Bael no pronunciamos

qualquer palavra. Ao deitar na cama, finalmente tive coragem

de perguntar aquilo que me estava afligindo.

- Er...senhor Bael.o chamei.

- Por favor, senhor. No me chame por senhor.ele pediu

educadamente.

- Certo. Bael.todos que eu encontrei no castelo pareciam merespeitar bastante, com exceo da garota da janela.

Pude ver que ele sorriu. Era at um sorriso reconfortante.

- Onde exatamente eu estou?perguntei apreensivo esperando

que ele inventaria alguma desculpa e sairia pela porta.

Bael olhou para mim e suspirou.

- Senhor.e mais uma pausa para outro suspiro. - Tu ests nas

tuas terras: O Condado de Tornelius. Tu s o Conde Alfonso de


30/30

Tornelia.falou e sua voz adquiriu um tom de orgulho

enchendo-se de jbilo.

Falando isso, Bael sorriu, mas agora parecia um sorriso

mais de preocupao. Talvez estivesse preocupado comigo.

Com a minha sanidade. Ele levantou-se e saiu trancando a

porta. Voltei a deitar na cama e bocejei antes dos meus olhos

fecharem-se involuntariamente.

Livro escrito por Andr L. I. de Lima

Livro oficial ser lanado em breve. =P

Documents

Territorios - O Cinturão de Fogo A5 diagramado release