Tese Goias

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Descriçao da urbanizaçao do estado de Goias

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  • FAU-USP

    DEUSA MARIA RODRIGUES BOAVENTURA

    URBANIZAOEM GOIS NOSCULO XVIIIPROF. DR. MRIO HENRIQUE SIMO DAGOSTINOO r i e n t a d o r

  • URBANIZAO EM GOIS NO SCULO XVIII

  • DEUSA MARIA RODRIGUES BOAVENTURA

    URBANIZAO EM GOIS NO SCULO XVIII

    TESE APRESENTADA AO PROGRAMA DE PS-GRADUAO EMARQUITETURA E URBANISMO DA FAU-USP PARA A OBTENO DOGRAU DE DOUTORA EM HISTRIA E FUNDAMENTOS DA ARQUITETURAE URBANISMO.

    Orientador:Prof. Dr. MRIO HENRIQUE SIMO DAGOSTINO.

    FAU-USP2007

  • DEDICATRIA

    o poderia deixar de dedicar os quatro anos de rduo trabalho quele que sempre foi o meumaior incentivador e incansvel companheiro. Ao grande amigo e professor Mrio Henrique,

    TRS DEDICATRIAS ESPECIAIS

    Na quem carinhosamente chamamos de Maique.

    Aos meus pais, pela minha vida.

    Ao Alberto, meu marido, e s minhas filhas Lorena e Carolina, sem os quais no teria foraspara alcanar o fim de mais uma jornada.

  • AGRADECIMENTOS

    tese que agora apresento no foi apenas fruto de meus esforos pessoais, pois todo o seudesenvolvimento contou com a participao e o auxlio de diversas pessoas e instituies, sA

    quais agora, com muita satisfao, agradeo. Em primeiro lugar, ao meu orientador, e por que nodizer o meu grande mestre o Professor Dr Mrio Henrique Simo DAgostino, ao qual quero expri-mir publicamente o meu mais profundo reconhecimento e agradecimento por suas orientaesterico-metodolgicas, seus dilogos, companheirismo, entusiasmo e profundo respeito ao sugeriras modificaes nos textos que lhe foram apresentados, o que, seguramente os enriqueceram.

    Aos membros da banca de qualificao, professores Dr. Benedito Lima Toledo e Dra. AnaPaula Torres Megiane, no s por suas disponibilidades como tambm pelas pertinentes observa-es que apontaram no trabalho.

    Ao pesquisador portugus Mrio Clemente Ferreira, pelo apoio e gentileza ao presentear-mecom o seu importante livro O tratado de Madrid e o Brasil Meridional e com o livro e a tese de RenataArajo Malcher, alm de documentos importantes de seu acervo pessoal, sem os quais este trabalhono obteria o mesmo resultado.

    professora Dra. Maria Helena Flexor, por encaminhar-me suas publicaes mais atualizadas,ajudando-me a refletir sobre algumas das minhas indagaes.

    historiadora e paleogrfa Maria Lenke Loiola, pelo substancial auxlio relativo s transcri-es e interpretaes dos inmeros manuscritos setecentistas existentes no Instituto de PesquisaHistrica do Brasil Central.

    Ao artista grfico e arquiteto Laerte Arajo Pereira, ex-professor e extraordinrio compa-nheiro, por presentear-me com o projeto grfico desta tese.

    Ao grande amigo e ex-aluno Rodrigo de Almeida Bastos, por gentilmente acompanhar-meaos arquivos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e do Exrcito, onde horas a fio se disps afotografar alguns documentos iconogrficos.

    Ao Gustavo Amaral, amigo e companheiro, a quem tambm tive o prazer de ser professora,por ajudar-me incessantemente na construo de vrios mapas.

    s amigas Juliana de Almeida e Viviane Cruz, por me acolherem gentilmente em suas residn-cias em So Paulo ao longo de todo o tempo em que estive cursando as disciplinas do doutorado.

  • s minhas filhas Lorena e Carolina Boaventura, por inmeras vezes me acompanharem nasvisitas s cidades estudadas, ajudando-me a fotograf-las.

    Tambm no gostaria de deixar de lembrar de todos os funcionrios das instituies nas quaisfiz inmeras consultas por longos dias, aqui representados pelo atencioso palegrafo Antnio Cal-das Pinheiro, do IPEHBC da Sociedade Goiana de Cultura/ UCG. Palavras de ateno tambmdirijo queles que trabalham no arquivo da Biblioteca Nacional e do Exrcito, do Rio de Janeiro; noArquivo do Estado e na Biblioteca Mrio de Andrade, de So Paulo; no Arquivo do Estado edo Instituto Histrico e Geogrfico de Gois; na biblioteca da Universidade Federal de Gois e noarquivo da SANEAGO (Saneamento de Gois), em Goinia onde obtive cpias atualizadas devrios mapas de cidades goianas e, por ltimo, no Arquivo Frei Simo Dorvi, da cidade de Gois.

    E, por fim, os meus mais profundos e ternos agradecimentos ao meu companheiro AlbertoBoaventura e, mais uma vez, s minhas duas filhas, por nunca reclamaram das minhas eternas au-sncias do convvio familiar e por sempre apostarem em mim, no me deixando desanimar peranteas dificuldades e os percalos encontrados no curso desses quatro longos anos.

  • RESUMO

    urbanizao da Capitania de Gois esteve na dependncia direta da poltica centralizadora deocupao colonial portuguesa do sculo XVIII, particularmente no que se refere expansoA

    e legitimao do territrio alm do meridiano de Tordesilhas e ao descobrimento de importantespontos mineratrios localizados na regio central do Brasil. A consolidao dessa poltica e, conse-qentemente, da ocupao de Gois, coube ao colonizador que, colocando-se a servio da averigua-o de mticos imaginrios, utilizou os recursos de uma cartografia em crescente desenvolvimentodesde o sculo XVI e que lhe permitiram comutar imprecisas informaes e relatos em clculosexatos e ter uma real visualizao do novo espao. Com essas aes, formaram-se na Capitania maisde cinqenta ncleos urbanos, segundo uma tradicional concepo do urbanismo portugus, queprevia a realizao de levantamentos topogrficos e o uso de mapas feitos por sertanistas, engenhei-ros militares e governadores que, juntos, se responsabilizaram pela organizao e desenho do terri-trio. Outras formas estratgicas de ocupao territorial tambm foram adotadas por Portugal, taiscomo a criao da prelazia e de parquias, a abertura de caminhos, a adoo do sistema sesmarial, afundao da capital e o incentivo s atividades mineratrias e agropastoris. Para a efetiva posse doterritrio goiano, a Coroa lusa implantou tambm normas indigenistas e incentivou a construo dealdeamentos desde a primeira metade do sculo XVIII, os quais, embora sem a perfeio de traadoalcanada no perodo pombalino, foram concebidos a partir de praas centrais, retangulares ouquadradas, inscritas em malhas previstas, cujas caractersticas garantiram a continuidade de umatradio portuguesa de desenho urbano erudito e regular, que se baseava em princpios matemti-cos e geomtricos.

  • ABSTRACT

    T he urbanization of the Captainship of Gois founds its explanations in a group of factorsthat are related to the Portuguese centralizing politics of colonial occupation in the 18th century,particularly those that are referred to the expansion and legitimating of the territory beyond theTordesilhas meridian, and to the discovering of important mining spots localized in the centralregion of Brazil. The consolidation of the politics and, consequently, of the occupation of Gois,was carried by the colonizer, which, with the access to a cartography that had been developed sincethe 16th century, set to the purpose of the checking imaginary myths, transforming inaccurateinformation and reports into exact calculation and a real visualization of the new space. With theseactions it was created on the Captainship more than fifty urban clusters, following a traditionalconception of the Portuguese urbanism, with topographic studies and maps made by peasants,military engineers and governors which together were responsible to the organization and the mappingof the territory. Another strategic ways of territorial occupation were also implemented by Portu-gal, such as: the creation of the prelature, of the parishes, the opening of colonial ways, the adoptionof the sesmarial system, the foundation of the capital and the stimulation of the mining andagricultural activities. Due to the possession effectiveness of the territory, the Portuguese crownalso implemented Indian regulations and stimulated the construction of villages since the first halfof the 18th century, which, even though, without the perfect drawing reached on the Pombalinperiod, were conceived with rectangular or squared central squares, inscribed into predicted streets,which it characteristics guaranteed the continuity of a Portuguese tradition of erudite and regularurban drawing that was based on mathematical and geometrical principles.

  • LISTA DE FIGURAS

    Fig. 1 Mapa da Capitania de Gois. Fonte: TEIXEIRA NETO, Antnio. In: Palacin, Lus;GARCIA, Lenidas Franco; AMADO, Janana. Histria de Gois em Documentos: Colnia. Goinia.Goinia: UFG, 1995, p. 44.

    Fig. 2 Mapa do Arquivo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, seo cartografia: CDICE CART 1079075 f 01.

    Fig. 3 A bandeira pioneira de Domingos Grou e Antnio Macedo (1590-1593), segundo ManoelRodrigues Pereira. Fonte: apud: BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no Brasil Central: Eco-histria do Distrito Federal; do indgena ao colonizador. Braslia: Verano, 2000, p.41.

    Fig. 4 Expedio de Joo de Souza Botafogo, continuada por Domingos Rodrigues (1596-1600),conforme M. R. Ferreira. Fonte: apud: BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no Brasil Central:Eco-histria do Distrito Federal; do indgena ao colonizador. Braslia: Verano, 2000, p.42.

    Fig. 5 Bandeira de Nicolau Barreto e dos mineradores paulistas (1602-1604), por M. R. Ferreira.Fonte: apud: BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no Brasil Central: Eco-histria do DistritoFederal; do indgena ao colonizador. Braslia: Verano, 2000, p.44.

    Fig. 6 Itinerrio de Martim Rodrigues Tenrio de Aguiar (1608-1613), segundo M. R. Ferreira.Fonte: apud: BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no Brasil Central: Eco-histria do DistritoFederal; do indgena ao colonizador. Braslia: Verano, 2000, p.45.

    Fig. 7 Etnias do sculo XVIII. Fonte: Desenho de Gustavo Amaral elaborado a partir do AtlasHistrico de ROCHA, Leandro (coord.). Atlas Histrico: Gois pr-colonial e colonial. Goinia:Editora CECAB, 2001.

    Fig. 8 Vila Boa em relao ao meridiano de Tordesilhas Desenho: Gustavo Amaral

    Fig. 9 Vilas e arraiais da Capitania de Gois, sc. XVIII. Fonte: TEIXEIRA NETO, Antnio. In:Palacin, Lus; GARCIA, Lenidas Franco; AMADO, Janana. Histria de Gois em Documentos: Col-nia. Goinia. Goinia: UFG, 1995, p. 44.

  • Fig. 10 Detalhe do primeiro mapa de JooTeixeira Albernaz II, de 1665, mostrando o Rio Araguaiae a Ilha de Paraupaba. In: BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no Brasil Central: Eco-histriado Distrito Federal; do indgena ao colonizador. Braslia: Verano, 2000, p. 51.

    Fig. 11 Detalhe do segundo mapa de JooTeixeira Albernaz II, de 1670. In: BERTRAN, Paulo.Histria da terra e do homem no Brasil Central: Eco-histria do Distrito Federal; do indgena ao coloni-zador. Braslia: Verano, 2000, p. 52.

    Fig 12 Detalhe do terceiro mapa de JooTeixeira Albernaz II, de 1675, com identificao da lagoaonde h muito salitre. In: BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no Brasil Central: Eco-histriado Distrito Federal; do indgena ao colonizador. Braslia: Verano, 2000, p. 53.

    Fig. 13 Carta Topogrfica da regio do Rio Claro e Piles, 1805. SALLES, Gilka V. F. Economia eescravido na Capitania de Gois. Goinia: CEGRAF/UFG, 1992, p. 100.

    Fig. 14 Mapa da Capitania de Gois, atribudo a Francisco Tosi Colombina, cpia do original doAMU, Lisboa.Fonte: FONTANA, Riccardo. Francesco Tosi Colombina. Braslia: Charbel, 2004, p. 50-51.

    Fig. 15 Mapa de Tosi Colombina. Fonte: FONTANA, Riccardo. Francesco Tosi Colombina. Braslia:Charbel, 2004, p. 50-51.

    Fig. 16 Mapa da Capitania de Gois, elaborado pelo engenheiro militar Toms de Souza. Fonte:Original Arquivo da Casa da nsua Portugal.

    Fig. 17 Mapa dos Julgados da Capitania de Gois, feito por Toms de Souza a mando do Gov.Baro de Mossmedes. Fonte: AHE-RJ.

    Fig. 18 Detalhe do mapa do Rio Tocantins da poca de Jos de Almeida. Fonte: AHE-RJ.

    Fig. 19 Mapa da Capitania de Goyazes e todo o serto por onde passa o Rio Maranho ou Tuctins.Fonte: BNRJ, cdice 1033413, dimenses: 4673x 3287.

    Fig. 20 Demarcao do termo da Vila de Paracatu do Prncipe, com a indicao de caminhos quechegavam a Capitania de Gois, 1800. Fonte: COSTA, Antnio Gilberto. (coord.). Os caminhos doouro e a Estrada Real. Belo Horizonte: UFMG; Lisboa: Kapa Editorial, 2005, p. 104.

    Fig. 21 Caminho do Anhanguera. Fonte: Desenho de Gustavo Amaral elaborado a partir do AtlasHistrico de ROCHA, Leandro (coord.). Atlas Histrico: Gois pr-colonial e colonial. Goinia:Editora CECAB, 2001.

    Fig. 22 As primeiras vias de penetrao na Capitania de Gois. Fonte: VALE, Marlia Maria Brasi-leiro Teixeira. Arquitetura religiosa do sculo XIX no antigo Serto da Farinha Podre. Tese de doutoramento.So Paulo: FAU-USP, 1995, p. 8.

    Fig.23 Caminho Velho que passava na regio do Tringulo Mineiro, antiga Farinha Podre. Fonte:Mappa da Capitania de So Paulo, e seu serto em que servem os descobertos, que lhe forotomados para Minas Geraes, como tambm o caminho para os Goiazes, com todos os seus pouzos,e passagem, delineado por Francisco Tosi Colombina. BNRJ, cdice 1033415.

  • Fig. 24 Representao dos Caminhos e do Registro de So Marcos nos documentos: Mostracenesse Mapa o Julgado das Cabeceiras do Rio das Velhas [Rio Araguari] e parte da Capitania deMinas Geraes com a devida de ambas as capitanias, por Joze Joaquim da Rocha, 1780. Fonte:COSTA, Antnio Gilberto. (coord.). Os caminhos do ouro e a Estrada Real. Belo Horizonte: UFMG;Lisboa: Kapa Editorial, 2005, p. 105.

    Fig. 25 Nova Fortaleza de Nossa Senhora de Nazareth Fonte: REIS FILHO, Goulart. Imagens deVilas e cidades do Brasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000.

    Fig. 26 Mapa dos Registros. Fonte: ROCHA, Leandro Mendes (org.). Atlas histrico: Gois pr-Colonial. Goinia: CECAB, 2001, p. 52.

    Fig. 27 Vila Boa de Gois e tudo que pertence ao seu termo. Fonte: Catlogo de verbetes dosdocumentos de manuscritos avulsos da Capitania de Gois existentes no AHU. Coor. TELES, Jos Mendona.Braslia: Ministrio da Cultura; Goinia IPEHBC, 2001, p 23.

    Fig. 28 Vista deVila Boa de Gois no sc. XIX. Fonte: Biblioteca Mrio de Andrade. S. Paulo.

    Fig. 29 Arcebispados e bispados da colnia no sculo XVIII. Fonte: ROCHA, Leandro Mendes.Atlas histrico de Gois pr-colonial e colonial. Goinia: CECAB Editora, 2001, p. 64.

    Fig. 30 Mapa do Bispado do Gram-Par. Fonte: MATOSO, Caetano da Costa. Cdice Costa Matoso.Coleo das notcias dos descobrimentos das minas na Amrica que fez o doutor Caetano da CostaMatoso sendo ouvidor-geral das do Ouro Preto, de que tomou posse em fevereiro de 1749, & e vriospapis. Belo Horizonte: Fundao Joo Pinheiro, Centro de Estudos Histricos e Culturais, 1999.

    Fig. 31 Imagem da Igreja de Jaragu Fotos de Lorena e Carolina Boaventura.

    Fig. 32 Imagem da Igreja de Jaragu Fotos de Lorena e Carolina Boaventura.

    Fig. 33 Imagem da Igreja de Jaragu. Fotos de Lorena e Carolina Boaventura.

    Fig. 34 Imagem da Igreja de Corumb Fotos de Lorena e Carolina Boaventura.

    Fig. 35 Imagem da Igreja de Corumb Fotos de Lorena e Carolina Boaventura.

    Fig.36 Imagem do casario de Corumb. Fotos de Lorena e Carolina Boaventura.

    Fig.37 Vista do Largo da Matriz ( direita) de Vila Boa de Gois. Fonte: FERREZ, Gilberto.O Brasil do primeiro reinado visto pelo botnico William John Burchel, 1825, 1829. Rio de Janeiro: FundaoJoo Moreira Salles; Fundao Pr-Memria, 1981.

    Fig. 38 Nossa Senhora da Abadia. Foto: Deusa Boaventura, arquivo da autora.

    Fig. 39 Capela de Santa Ifignia de So Jos do Tocantins. Fonte: BORGES, Ana Maria; PALACIN,Lus. Patrimnio histrico de Gois. Braslia: SPHAN/Pr-Memria, 1987.

    Fig. 40 Antiga Igreja dos Pretos de Meia Ponte. Fonte: VAZ, Adriana Mara. Um estudo da CasaMeia-pontense: Uma ponte para o mundo goiano do sculo XIX. Goinia: Agncia Goiana de CulturaPedro Ludovico Teixeira, 2001, p. 148.

  • Fig. 41 Igreja de Nossa Senhora da Natividade. BORGES, Ana Maria; PALACIN, Luis. Patrimniohistrico de Gois. Braslia: SPAHAN / Pr- Memria, 1987.

    Fig. 42 Runas da Igreja de N. S. do Rosrio de Traras. Fonte: BORGES, Ana Maria; PALACIN,Luis. Patrimnio histrico de Gois. Braslia: SPHAN / Pr-Memria, 1987.

    Fig. 43 Desenhos da antiga Matriz de Traras (Original Arquivo Histrico Ultramarino de Lisboa)

    Fig. 44 Imagem do mapa de Gois com as capelas e de igrejas de Vila Boa. Fonte: Deusa Boaventura,arquivo da autora.

    Fig. 45 Imagem da igreja inacabada de Nossa Senhora do Rosrio de Natividade. Fonte: PALACIN,Lus. BORGES, Ana Maria; PALACIN, Luis. Patrimnio histrico de Gois. Braslia. SPHAN/Pr-Memria, 1987.

    Fig. 46 Vista do Arraial de Natividade. Fonte: FERREZ, Gilberto. O Brasil do primeiro reinado vistopelo botnico Willham John Burchel. 1825, 1829. Rio de Janeiro: Fundao Joo Moreira Salles. Funda-o Pr-Memria, 1981.

    Fig. 47 Figura 8 Antigo Arraial de Bomfim, atual Silvnia. Fonte: FERREZ, Gilberto. O Brasildo primeiro reinado visto pelo botnico Willham John Burchel. 1825, 1829. Rio de Janeiro: Fundao JooMoreira SallesFundao Pr-Memria, 1981.

    Fig. 48 Figura 9 Antigo Arraial de Meia Ponte, atual Pirenpolis. Fonte: FERREZ, Gilberto.O Brasil do primeiro reinado visto pelo botnico Willham John Burchel. 1825, 1829. Rio de Janeiro: FundaoJoo Moreira SallesFundao Pr-Memria, 1981.

    Fig. 49 Vista do Largo da Matriz ( direita) de Vila Boa de Gois. Fonte: FERREZ, Gilberto.O Brasil do primeiro reinado visto pelo botnico Willham John Burchel. 1825, 1829. Rio de Janeiro: FundaoJoo Moreira Salles. Fundao Pr-Memria, 1981

    Fig. 50 51 Antiga Matriz do Rosrio de Meia Ponte. Fonte: BUENO, Alexei; TELLES, Augustoda Silva, CAVALCANTI, Lauro(coord.). O Patrimnio Construdo: As 100 mais belas edificaes doBrasil. So Paulo: Editora Capivara LTDA, 2002. p. 262, 263.

    Fig. 52, 53, 54 Igreja Nosso Senhor do Bomfim, do Arraial de Bomfim (atual Silvania ). Fotos:Carolina Boaventura

    Fig. 55, 56 Igreja do Rosrio do Arraial de Santa Luzia (atual Luzinia). Fotos: Carolina Boaventura

    Fig. 57 Mapa da Misso de So Francisco Xavier. Fonte: ADONIAS, Isa. Cartografia da regioAmaznica. Catlogo descritivo (1500-1961). Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Pesquisas daAmaznica, 1963, p. 640.

    Fig. 58 Mapa da Capitania de Gois. In: APOLINRIO, Juciene Ricarte. Os Akro e outros povosindgenas nas fronteiras do serto. Goinia: Kelps, 2000, p. 227.

    Fig. 59 Mapa da Capitania de Gois (detalhe). In: APOLINRIO, Juciene Ricarte. Os Akro eoutros povos indgenas nas fronteiras do serto. Goinia: Kelps, 2000, p. 228.

  • Fig. 60 Mapa dos Aldeamentos da antiga Capitania de Gois. Fonte: ROCHA, Leandro Mendes(org). Atlas Histrico de Gois Pr-colonial e Colonial. Goinia. CECAB editora, 2001. p. 33.

    Fig. 61 Esquema do traado do Arraial de Santana. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 62 Esquema do traado do Arraial de Meia Ponte. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 63 Mapa da cidade de Pirenpolis, anterior arraial de Meia Ponte. Fonte: JAIME, Jarbas eJAYME, Jos Sisenando. Pirenpolis: Casas de Deus, Casas de Mortos. Goinia: IPEHBC/UCG, 2001.

    Fig. 64 Vista area da atual cidade de Pirenpolis, antigo Arraial de Meia Ponte, mostrando amatriz Nossa Senhora do Rosrio e o eixo que a ligava a igreja dos pretos. Fonte: Google Earth.

    Fig. 65 Esquema do Arraial de Jaragu. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 66 Esquema do traado do Arraial de Santa Cruz. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 67 Esquema do traado do Arraial de Pilar. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 68 Esquema do traado do Arraial de Conceio. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 69 Esquema do traado do Arraial de Santa Luzia. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 70 Esquema do traado do Arraial de Bomfim. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 71 Esquema do traado do Arraial de So Jos do Tocantins (atual Niquelndia). Desenho:Gustavo Amaral.

    Fig. 72 Esquema do traado do arraial de Cavalcante. Desenho: Gustavo Amaral.

    Fig. 73 Prospecto de Villa Boa tomada da parte do Esnoroeste para Les Sueste no anno de 1751. REIS, Nestor Goulart. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000, p. 239.

    Fig. 74 Prospecto de Villa Boa tomada da parte de Norte para o Sul no anno de 1751 REIS,Nestor Goulart. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000, p. 239.

    Fig. 75 Prospecto de Villa Boa tomada da parte do Sul para o Norte no anno de 1751 REIS,Nestor Goulart. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000, p. 235.

    Fig. 76 Imagem do quartel de Vila Boa de Gois. Fonte: BORGES, Ana Maria: Palacin, Lus.Patrimnio histrico de Gois. Braslia: SPHAN/Pr-Memria, 1987, p. 22.

    Fig. 77 Casa de Cmara e Cadeia. Foto: Deusa Boaventura.

    Fig. 78 Projeto original da Casa de Cmara e Cadeia de Vila Boa de Gois. Fonte: Arquivo doSPHAN.

    Fig. 79 Imagem do Palcio conde dos Arcos em Vila Boa de Goiz. Fonte: COELHO, GustavoNeiva. Guia dos Bens Imveis Tombados em Gois. Vol. 1. Goinia. IAB, 1999, p. 48.

    Fig. 80 Imagem do largo do chafariz de Villa Boa de Gois. Foto: Deusa Boaventura.

  • Fig. 81 O Plano de Vila Boa. REIS, Nestor Goulart. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. SoPaulo: EDUSP, 2000, p. 240.

    Fig. 82 Proposta de realinhamento do tecido urbano de Vila Boa, 1782. Fonte: REIS, NestorGoulart. Imagens de Vilas e Cidades do Brasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000, p. 240.

    Fig. 83 Prespectiva de Villa Boa de Goyaz. Fonte: Arquivo da Biblioteca Mrio de Andrade.

    Fig. 84 Planta da Aldeia de Santa Ana. Fonte: REIS, Nestor Goulart. Imagens de Vilas e Cidades doBrasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000, p. 243.

    Fig. 85 Planta da Aldeya de S. Joze de Mossamedes 1801. REIS, Nestor Goulart. Imagens de Vilase Cidades do Brasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000, p. 241.

    Fig. 86 Prespectiva da Aldeya de So Joze de Mossamedes. Fonte: Arquivo da Biblioteca Mrio deAndrade.

    Fig. 87 Prespectiva da Aldeya de So Joze de Mossamedes. Fonte: Arquivo da Biblioteca Mrio deAndrade.

    Fig. 88 Vista area da atual cidade de Mossmedes. Fonte: Google Earth.

    Fig. 89, 90, 91 Fotos da Igreja de So Jos de Mossmedes. Fotos: Carolina Boaventura.

    Fig. 92 Plano Projectivo de um novo estabelecimento de ndios. REIS, Nestor Goulart. Imagensde Vilas e Cidades do Brasil Colonial. So Paulo: EDUSP, 2000, p. 242.

  • AHU Arquivo Histrico Ultramarino.AHSP Arquivo Histrico de So Paulo.AHE Arquivo Histrico do Exrcito, Rio de Janeiro.AHEGO Arquivo Histrico de Gois.BNRJ Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.IHGG Instituto Histrico e Geogrfico de Gois.IPEHBC Instituto de Pesquisas Histricas do Brasil Central.AFSD Arquivo Frei Simo Dorvi, Cidade de Gois.

    LISTA DE SIGLAS

  • SUMRIO

    INTRODUOPara uma reviso historiogrfica 23

    Captulo I

    AD INSULAM BRASILIS: IMAGINRIO E CONSTRUO DO TERRITRIO 31

    1.1 A Identificao do territrio 331.2 O mito de Paraupava e o territrio goiano 351.3 Desbravando o territrio em busca do mito 421.4 Entre as promessas mticas e os avanos territoriais 47

    Captulo II

    A POLTICA DE OCUPAO DE GOIS NO SCULO XVIII: URBANIZAOE CONTROLE TERRITORIAL 59

    2.1 Os engenheiros militares e a formao dos territrios 662.2 Os funcionrios da Coroa, a cartografia e a construo de Gois 75

    Captulo III

    A APROPRIAO DO TERRITRIO 101

    3.1 Os caminhos e o rios 1033.2 A partilha das terras: as sesmarias e as datas minerais 1183.3 A vila e o territrio 1263.4 As atividades agropastoris 130

  • 24

    Captulo IV

    TERRITRIO ECLESISTICO: FORMAO DE FRONTEIRASE URBANIZAO DA CAPITANIA DE GOIS 133

    4.1 A prelazia e o territrio 1354.2 A organizao das parquias e a urbanizao 1454.3 As irmandades e a arquitetura religiosa 152

    Captulo V

    ENTRE A BUSCA DOS NDIOS E A IMPLANTAO DOS PRIMEIROSALDEAMENTOS GOIANOS 169

    5.1 O desbravamento do territrio goiano e a formao dos seus primeiros aldeamentos 1755.2 A poltica de urbanizao de Gois no perodo pombalino 184

    Captulo VI

    OS MODELOS DE CIDADES PORTUGUESAS E A URBANIZAONA CAPITANIA GOIANA 201

    6.1 Uma vila no interior do serto 2156.2 As reformas urbanas em Vila Boa de Gois 2256.3 Urbanismo pombalino: Simbolismo e mtodo 2296.4 O urbanismo regulador na formao dos aldeamentos da Capitania de Gois 237

    CONSIDERAES FINAIS 247

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 253

    ANEXOS 263

  • 25

    INTRODUO

    s povoaes setecentistas que surgiram em Gois fizeram parte de uma nova e centralizadorapoltica de ocupao e urbanizao da metrpole portuguesa, iniciada aproximadamente emA

    PARA UMA REVISO HISTORIOGRFICA

    meados do sculo XVII, em decorrncia de problemas econmicos relacionados ao preo do a-car no mercado internacional e da perda de uma grande parte de colnias lusitanas no Oriente.Diante desse quadro, a metrpole se viu obrigada a rever toda a sua estratgia anterior de ocupaoem relao ao Brasil. Para tanto, incentivou aes de explorao de reas no conhecidas, que envol-veram expanses territoriais alm do meridiano de Tordesilhas; criou o Conselho Ultramarino, res-ponsvel pela elaborao e execuo dessas novas orientaes; contratou tcnicos especializadospara mapear regies ignotas; centralizou a economia e a administrao das terras americanas ediminuiu os poderes dos donatrios, que foram sendo extinguidos gradativamente at alcanar operodo pombalino, quando houve a supresso de todas as capitanias particulares remanescentes ea criao de outras, governadas por funcionrios do Rei.

    Nas regies centrais do atual territrio brasileiro, expresses dessa poltica se evidenciammais claramente no final do sculo XVII e incio do XVIII, com a efetiva descoberta do ouro emMinas Gerais, Mato Grosso e Gois, e do firme propsito da Coroa de expandir seus domnios aoeste de Tordesilhas. Regulamentos para as terras minerais, jurisdies que incidiram sobre os ex-ploradores aventureiros, levantamentos cartogrficos para o conhecimento da regio, demarcaode novos territrios, combinao de um sistema de partilha de terras, ou de direitos sobre elas, e oestabelecimento de algumas povoaes e aldeamentos articulados entre si foram alguns dos funda-mentos dessa nova poltica de explorao econmica, ocupao e legitimao territorial, confirma-da pelo Tratado de Madri e consolidada na segunda metade do Setecentos.

    Em Gois, especificamente, essas reorientaes do governo portugus fizeram surgir mais decinqenta arraiais em um territrio que desde os primeiros momentos do sculo XVIII foi contro-lado por regimentos, levantamentos cartogrficos, criao de caminhos, instituio da Prelazia, daCapitania, fundao da capital (Vila Boa), definio de procedimentos jurdico-administrativos, instala-o de intendncias, formao de aldeamentos, casas de fundio e postos alfandegrios. A ocupa-

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    o dessa regio insere-se, desta maneira, no contexto expansionista e de consolidao de posses deterras, garantidas pelas formaes de ncleos urbanos, cujas concepes ou modos de organizaopodem remontar s diversas e complexas formas de fazer cidades possibilitadas pelas ricas experin-cias da Expanso Ultramarina, no s no Brasil como tambm na frica e na sia. Esse o momen-to em que se pode encontrar as razes do urbanismo colonial brasileiro, quando Portugal formouum programa de fundao de cidades com novas prticas urbansticas que se desenvolveram, sediversificaram e se estenderam at, pelo menos, o perodo pombalino, como diz Rafael Moreira1. ,portanto, sob essa perspectiva que se pode entender as formaes urbanas de Gois, pois elas soresultados de snteses de diferentes modelos de cidades, reproduzidos ora por aes dos bandeiran-tes, ora por governadores como Luiz de Mascarenhas, Jos de Almeida e Cunha Menezes.

    Os bandeirantes foram os primeiros responsveis pela maioria dos assentamentos goianos ecom eles veio a tradicional forma de fazer cidades. Organizadas a partir do edifcio religioso, carac-terizavam-se por estruturas lineares, que se desenvolviam geralmente ao longo das estradas. Umoutro modelo urbano inaugura-se com Luiz de Mascarenhas, com tendncias regularidade, em quea ordenao do espao era pr-estabelecida segundo normas gerais que se apresentavam em vriascartas de fundao de cidades brasileiras, iguais de Vila Boa. Diferentemente da concepo ante-rior, escolhia-se um stio prximo a boas guas, onde se marcava a praa, agora o elemento geradore de expanso do novo ncleo urbano, auxiliada pela antiga prtica do arruamento, como fizeramMascarenhas e seu auxiliar Domingos Pires ao escolher e arruar um lugar para fundar o Arraial deArraias. Mas o primeiro plano regular plenamente implementado e concebido por meio de dese-nhos s surgiu na segunda metade do sculo XVIII, com o dinmico governador Jos de AlmeidaVasconcelos Soveral e Carvalho, quando props o aldeamento So Jos de Mossmedes, em 15 denovembro de 1774. Suas aes visavam tambm reorganizar o territrio, mediante levantamentostopogrficos, criao de novas estradas, mudanas de localizao de registros, formao de maisjulgados, estabelecimento de limites territoriais dos maiores arraiais e incentivo navegabilidadedos rios Araguaia e Tocantins. Na capital, fez calamento nas ruas, construiu o grande Chafariz erecuperou pontes que haviam sido destrudas na inundao de 1776.

    Atribui-se tambm a ele a primeira ponte que se ergueu sobre o Rio das Almas, em MeiaPonte. Mas o maior reformador urbano da Vila foi o governador Cunha Menezes, que props orealinhamento e a expanso do traado da Vila e a elaborao de um Cdigo de Posturas que definiua uniformidade das fachadas e reas para construes de novos edifcios. Como seu antecessor,planejou tambm o aldeamento e deu continuidade aos esforos para o desenvolvimento do comr-cio da regio, com mercadorias circulando pelos rios Araguaia e Tocantins.

    A despeito de todas essas iniciativas e propostas setecentistas que ajudaram a construo deGois, no sculo XIX a antiga Capitania se colocou como um apndice em relao ao Brasil, pois,com o fim da minerao, no surgiu nenhum nexo econmico que a reabilitasse. Esse fato, alimen-tado desde a poca dos viajantes oitocentistas europeus, e cuja natureza era mais econmica quepoltica, levou a historiografia tradicional a associar a regio s idias de marginalidade, isolamento,lugar distante do litoral, decadncia e espontaneidade na formao dos arraiais, que compromete-

    1 MOREIRA, Rafael. A arte da ruao e a cidade luso-brasileira, sc. XVI- XVIII. V Seminrio da cidade e do urbanismo. So Paulo: PUCCAMP, out.,1998, p. 4

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    ram o entendimento da ocupao do territrio goiano do sculo XVIII, por desconsiderar, princi-palmente, a poltica de controle portugus que foi adotada em todo perodo colonial.

    Nars Fayad Chaul2 um dos estudiosos que alerta para questes dessa ordem. Para ele, equ-vocos de interpretao histrica, formados ao longo do sculo XIX e meados do XX, marcaram oterritrio de Gois com traos da pobreza. Sob o paradigma da decadncia, confundiu-se cresci-mento econmico com desenvolvimento social. O declnio do ciclo do ouro ficou estigmatizado,portanto, por uma viso que possui suas razes na idia de atraso e que no leva em conta o processoportugus de ocupao e urbanizao que alcanou a regio.

    Buscar outras possibilidades interpretativas, com opes paradigmticas que entendam as cida-des a partir de relaes entre organizao do espao e agentes sociais, territrio e polticas de ocupaoe urbanizao, diferentes modalidades de vnculos entre colnia e metrpole nosso intento. Mas paradefinir melhor essa possibilidade, convm desconsiderar os tradicionais conceitos atrelados idia dedecadncia ou a franca aceitao de formaes urbanas como sendo puramente espontneas, valores comos quais as investigaes de alguns historiadores goianos se estabeleceram no passado.

    No quadro da literatura histrica regional, entre outros, encontram-se os autores Silva e Sou-za, Jos Martins Pereira de Alencastre, Cunha Matos, Lus Palacin, Paulo Bertran e Gustavo Coelho.So, entretanto, esses trs ltimos os que mais fornecem publicaes sobre o urbanismo colonial deGois, embora com atenes, muitas vezes, voltadas para questes mais gerais ou para estudos decasos ainda no contextualizados no mbito da poltica de ocupao portuguesa.

    Silva e Souza3 se destaca por ser o primeiro historiador de Gois, com a obra oitocentista Memriasobre o descobrimento, Governo, populao e coisas mais notveis da Capitania de Gois e Memria Estatstica. Torna-se,portanto, uma fonte documental imprescindvel e de grande referncia para os estudos sobre a colnia ea Provncia de Gois. No que diz respeito s cidades, sua leitura descritiva, informando-nos sobre osfundadores dos ncleos urbanos setecentistas, as populaes, as matrizes e capelas filiais, os governado-res e algumas de suas atuaes, os aspectos geogrficos e administrativos da Capitania etc.

    Jos Martins de Alencastre, escritor, gegrafo e governador de Gois de abril de 1861 a junho de1862, publica Os anais da provncia de Gois em 1864. Esse livro, tambm informativo, ou seja, queestabelece a verdade dos fatos contidos na fonte documental, consiste em uma significativa profusode dados, advindos de raros manuscritos setecentistas transcritos, bastante importantes para o estudode Gois colonial. Seguindo a mesma linha historiogrfica de Alencastre, encontra-se tambmChoroghaphia da Provncia de Goyaz, de Cunha Matos, o Governador das Armas e ex-deputado da Provncia.

    Demais estudiosos viajantes que percorreram o territrio goiano, como Aires de Casal, Augustede Saint-Hilaire, DAlincourt, Spix e Martius4, tambm deixaram testemunhos sob a forma de di-rios, memrias, guias de viagens ou relatrios, nos quais avaliaram as cidades goianas, mas sempre

    2 Em torno da imagem da decadncia, vai girar todo o universo interpretativo acerca da sociedade goiana que transitou da minerao para aagropecuria. A partir da idia de um pretenso desenvolvimento da sociedade mineradora, criou-se o posterior espectro de decadncia quepassa a rondar a sociedade aps a minerao CHAUL, Nars Fayad. Caminhos de Gois: da construo da decadncia aos limites da modernidade.Goinia: Editora da UFG, 1997, p. 46.

    3 Silva e Souza chegou a Gois no final de 1790, com 26 anos de idade, Capitania na qual morreu, aos 50 anos. Sua obra foi impressa pela primeiravez no jornal O Patriota, de 1813 a 1814, e depois transcrita em um dos nmeros da Revista Trimestral do Instituto Histrico e Geogrfico de Gois.

    4 Aires de Casal considerado o primeiro viajante a fazer um relato sobre Gois, em 1817. Leite Moraes e Oscar Leal tambm foram cronistasque passaram por Gois, embora no estrangeiros.

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    guardando distncia para informar sobre uma realidade da qual nunca se sentiram fazendo parte,pois tomavam como modelo comparativo as suas cidades de origem. Com eles, apareceram asenfticas descries sobre a precariedade das estradas e acessos a Gois, que contriburam paracoloc-lo, a partir do sculo XIX, numa situao de penria, atraso e total isolamento em relao sdemais regies desenvolvidas do Brasil.

    Mas no sculo XX, com Lus Palacin5, que, pode-se dizer, se inaugura uma nova fase dosestudos histricos em Gois. Sua maior contribuio est exatamente em estimular a pesquisa docu-mental, obtendo como resultado a publicao de vrios documentos, reunidos na coleo Histria deGois em Documentos. Apesar do inestimvel valor dos trabalhos desse autor, sua interpretao sealinha quelas pesquisas que apostam no paradigma da decadncia, influenciando o importantehistoriador Mendona Teles e Paulo Bertran. O primeiro, mais voltado divulgao documental,quando frente do Instituto de Pesquisas Histricas do Brasil Central promoveu a divulgao dasMemrias Goianas, na quais se encontra, na ntegra, a reproduo de inmeros manuscritos dos scu-los XVIII e XIX.

    Paulo Bertran se destaca pelos seus trabalhos, que abordam diferentes temas sobre aCapitania de Gois: Histria da terra e do homem do Planalto Central, de 1994; Uma introduo histria econmica do Centro-Oeste, de 1998, e Notcia Geral da Capitania de Gois em 1783, de 1997,dentre outros. O primeiro texto interessou a presente investigao por registrar e apontar umasrie de documentos sobre o sistema de distribuio de terras goianas existentes em arquivospaulistas6. J Notcia Geral da Capitania de Gois em 1783 pode ser compreendida como uma dasgrandes contribuies que Bertran deixou pesquisa histrica, por dar maior publicidade aomanuscrito mais antigo e completo sobre a Capitania, cujo original encontra-se na BibliotecaNacional do Rio de Janeiro.

    Pode-se afirmar que seus esforos se concentraram mais na divulgao e transcrio de fon-tes primrias do que em problematizar questes historiogrficas, particularmente as que se referems antigas cidades goianas. o que se observa em alguns de seus textos, nos quais considera asfontes isoladamente, sem estabelecer as possveis relaes existentes entre elas e as polticas deocupao previstas pela Coroa. O estudo de maior relevncia o que se refere ao desenvolvimentoda antiga Vila Boa, fundamentado nos conceitos de incidentalidade e intencionalidade. Para ele, aincidentalidade est vinculada aos primeiros momentos de existncia dos arraiais portugueses im-plantados no territrio americano, em especial aqueles surgidos nas regies mineradoras, onde oque se observa uma conjuntura adversa a investimentos urbanos. Como complemento desse de-senvolvimento, surge a intencionalidade, como fora de alterao da organizao espacial: aos ele-mentos iniciais de organizao espontnea contrapem-se aqueles representativos do poder e dasclasses sociais, e que definem o crescimento do ncleo7.

    5 O professor Doutor Lus Palacin Gomes era natural de Valladolid, Espanha. Foi bacharel em Filosofia e Teologia pela Universidade deComillas, Espanha, licenciado em Histria pela Universidade de Santiago de Compostela, doutor em Histria pela Universidade de Madrid,apresentou tese para o concurso de Livre Docncia na UFG. Faleceu em 1998.

    6 O Captulo XIV desse livro refere-se s sesmarias povoadoras do Planalto das cidades que hoje se encontram prximas a Braslia, comoLuzinia. No captulo XVIII, Bertran reflete sobre a passagem dos viajantes por essa mesma regio.

    7 BERTRAN, Paulo. Evoluo urbana da cidade de Gois no perodo colonial. Trabalho apresentado no ARQUIMEMRIA II. Belo Horizonte, ago.,1987, p. 1-2.

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    Por fim, com a mesma compreenso de Bertran, encontra-se Gustavo Neiva Coelho, com olivro O espao urbano em Vila Boa: entre o erudito e o vernacular. Nesse trabalho, o autor aceita as hipte-ses de Bertran de incidentalidade e intencionalidade, e sugere a influncia direta dos antecedentesmedievais (a cidade medieval rabe e a cidade medieval crist), embora sinalize como elementosinovadores as prticas urbansticas desenvolvidas por Cunha Menezes. , portanto, o trabalho que,na linha de Bertran, mais avana sobre a reflexo do espao de Vila Boa.

    Essa idia de formaes urbanas puramente espontneas, irregulares, relacionadas s cidadesmedievais, remete-nos a Srgio Buarque de Holanda e a Robert Smith. Este ltimo afirma serem taisassentamentos resultados formais urbanos de uma tradio nacional de cidade alta e baixa, pela suatopografia de extrema irregularidade, ausncia de grandes superfcies abertas e espaos interligadospor ladeiras ngremes, em cujas cotas mais altas estariam assentadas capelas e fortes, configurando atipologia das cidades litorneas e ncleos mineratrios do sculo XVIII8.

    Interpretaes semelhantes a essas e s que estabeleceram analogias entre as cidades orgnicasportuguesas e as brasileiras conduziram vrios pesquisadores a avaliar pejorativamente inmeras delas,desconsiderando radicalmente outras possveis ordenaes e at legislaes que pressupunham um tipode planejamento que regulamentava no s a vida metropolitana como a colonial. Com as Ordenaesdo Reino, as Cartas Forais, os Termos de Assentamentos, as legislaes eclesisticas e as prticas dosarruadores, os colonizadores conseguiram impor uma certa uniformidade s cidades do sculo XVIII,com freqente respeito topografia e singular valorizao dos edifcios religiosos e pblicos.

    Em contraponto a essas leituras que apostam nos denominados crescimentos espontneos, uma historiografiamais recente, na qual se destacam Rafael Moreira, Renata de Arajo Malcher, Manuel Teixeira e MargaridaValla, Rui Carita, Walter Rossa e Horta Correia, descortina um novo eixo interpretativo. Por exemplo,para os dois primeiros autores, principais marcos referenciais desta tese, o modo de se fazer cidades noBrasil setecentista o resultado de um complexo conjunto de snteses de procedimentos, vindos pelo menosdesde o Quinhentos, com os avanos da Expanso Ultramarina, e que, gradativamente, foram se firmandoe se preocupando mais com as questes atinentes regularidade. o que se denomina Cincia da Ruao,uma teoria emprica e, sobretudo, pragmtica, de terreno mais que de gabinete, [...] ligada ideologia do iluminismo [...]. Almdos engenheiros militares, habituados a abrir caminhos e a traar novas povoaes j perfeitamente regulares (como mostram ascartas de Vila Boa de Gois e Vila de Io, 1736, So Jos do Rio Negro, 1755, e Oeiras no Piau, 1761, to idnticas queparecem seguir um formulrio pr-estabelecido), os agentes do urbanismo regular sistemtico sero [foram] os annimos ocupantesdo cargo igual ao medidor, os ruadores 9. Com os ruadores, fundaram-se cidades mais regulares, com categorias deapreciao que consideravam ruas planas como construes formosas maneira do reino.

    Concorrendo com esforos semelhantes e leituras aproximadas a essas encontram-se os pes-quisadores Walter Rossa, Horta Correia, Margarida Valla e Manuel Teixeira. Os dois ltimos tam-bm chamam a ateno para a possibilidade de grandes equvocos nas investigaes quedesconsideram a interdependncia entre a histria urbana portuguesa e a brasileira, pois [...] elas soantes duas componentes da mesma histria sendo necessrio o seu estudo conjunto para sua compreenso 10.

    8 SMITH, Robert C. Arquitetura civil do perodo colonial. Revista do Patrimnio Histrico e Artstico. Rio de Janeiro: SPHAN, n.17, 1969.

    9 MOREIRA, Rafael. A arte da ruao e a cidade luso-brasileira, sc. XVI- XVIII. V Seminrio da cidade e do urbanismo. So Paulo: PUCCAMP, out.,1998, p. 13.

    10 TEIXEIRA, C. Manuel; VALLA, Margarida. O urbanismo portugus. Sculo XIII XVIII. Lisboa: Livros Horizonte, 1999, p. 13.

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    Com essa nova possibilidade interpretativa, pode-se compreender muitas das intervenes ur-banas no territrio goiano, ainda que no tivessem sido to explcitas e rigorosas como em outrasregies do Brasil. Vila Boa, alguns arraiais goianos e os aldeamentos, ao inserirem-se no contextoexpansionista, estabeleceram vnculos com as vrias experincias portuguesas, tanto em suas forma-es como em seus desenvolvimentos. Verificar tais influncias implica considerar o permanente in-tercmbio de Gois com Portugal e com as demais regies da colnia, quando se observa particularmentea sua posio estratgica de confluncia de caminhos que o conectavam, inclusive, com o litoral eas vrias motivaes de alguns governadores em promover interlocues comerciais, pelos rios Araguaiae Tocantins, com o Par e o Mato Grosso. Essas e outras iniciativas contrariam as tradicionais afirma-es historiogrficas locais que consideram o atraso e isolamento de Gois. Desde as primeiras ocupa-es, a Capitania fez parte da colnia lusitana e, como tal, submeteu-se aos desgnios metropolitanos,mesmo se levarmos em conta seu ritmo prprio de desenvolvimento econmico.

    Considerando tais condicionantes, a tese A URBANIZAO DE GOIS NO SCULOXVIII estrutura-se em seis centros principais de interesse:

    Em primeiro lugar, com o captulo Ad Insulam Brasilis: imaginrio e contruo do territrio procura-se entender como e quando se formou o mito das riquezas aurferas do interior do Brasil, por seconsiderar essa idia uma das importantes motivaes para as primeiras incurses s terras da antigaCapitania de Gois. Foi ela que permitiu o gradual e contnuo conhecimento dessa regio e de todaaquela que se situava a oeste do meridiano de Tordesilhas. Mas para a sua posse e a consolidao daspolticas portuguesas de controle do territrio central, caberia ao colonizador transformar as impre-cisas e vagas informaes dos primeiros viajantes em conhecimento exato do lugar e, para tanto, foia cartografia que se colocou a servio da averiguao do imaginrio, em direo real visualizaodesse espao.

    Num segundo momento, em A poltica de ocupao de Gois no sculo XVIII: urbanizao e controleterritorial, analisa-se a ocupao e a formao urbana de Gois a partir de uma antiga estratgia deposse e controle das terras coloniais, ligadas diretamente Coroa portuguesa. Para as terras do interiordo Brasil, essas aes podem ser vistas a partir do perodo filipino, ao longo da gesto do governa-dor D. Francisco de Souza, mas s nos fins do Seiscentos, aps a descoberta do ouro, o governometropolitano garantiu uma maior superviso desse serto, com medidas que redefiniram um pro-grama de ocupao e soberania do territrio central. Em Gois, essas novas orientaes chegaramlogo no incio do sculo XVIII, aps as notcias das minas de rico metal encontradas por BartolomeuBueno da Silva. Contriburam, portanto, para a definio dos limites territoriais da Capitania, com oincentivo busca de novas minas e, conseqentemente, com a formao de novos ncleos urbanos,aldeamentos, instalao da capital Vila Boa, da Prelazia, da Capitania, dos caminhos reais, dos pos-tos alfandegrios, dos vrios levantamentos topogrficos e mapas feitos por sertanistas e engenhei-ros militares. Estes ltimos foram tambm responsveis, com os governadores, pela organizao econsolidao do territrio da Capitania goiana.

    Em Apropriao do territrio, o propsito primordial o entendimento das outras formas eestratgias de ocupao territorial adotadas pela Coroa portuguesa, alm dos registros cartogrficose das inmeras expedies que se organizaram para a explorao de Gois. Trata-se da abertura decaminhos terrestres e fluviais que buscaram a articulao da Capitania com as regies Norte, Oestee as zonas litorneas; da partilha das terras sob os sistemas sesmarial e de datas minerais; da funda-o de uma vila, instalada a oeste do antigo meridiano de Tordesilhas, representando efetivamente o

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    controle estatal sobre os diversos arraiais existentes e, por fim, do incentivo s atividades agropastorisque se desenvolveram paralelamente busca do ouro. Com a poltica de demarcao dos limitesterritoriais de diversas capitanias do Brasil Colnia, essas foram tambm importantes aes queauxiliaram a fixao do colono e o povoamento de Gois.

    O captulo Territrio eclesistico: formao de fronteiras e urbanizao da capitania de Gois mostra quea formao territorial e a urbanizao dessa Capitania tambm estiveram fortemente vinculadas atuao da Igreja, que poca se caracterizava por complexas relaes com o Estado. No sculoXVIII, unidos intimamente pelo regime do Padroado, participaram lado a lado na conquista dointerior do Brasil, quando decidiram pela criao de novas circunscries eclesisticas, designadasprelazias ou dioceses, que no s contriburam para as questes geopolticas, mais precisamentepara a ocupao lusa das terras a oeste de Tordesilhas, como ajudaram tambm na estruturao depovoados, vilas e aldeamentos, nos quais o edifcio religioso sempre assumiu um papel decisivo emsuas fundaes, expanses urbanas, paisagens e organizaes sociais.

    Em seguida, Entre a busca dos ndios e a implantao dos aldeamentos goianos esquadrinha a polticaindigenista do sculo XVIII. Para o alcance de tal objetivo, o captulo perquire dois momentosdistintos: o primeiro cuidou das formas da captura indgena do sculo XVII fossem elas paramo-de-obra, cristianizao dos naturais ou at mesmo para a formao de aldeamentos e decomo essas prticas, que contaram com missionrios originrios do Par, avanaram pela primeiravez em direo ao futuro territrio de Gois, particularmente na regio margeada pelo Rio Tocantins,marcando-a com uma importante trilha que serviu aos expedicionrios do sculo seguinte. O se-gundo momento abrange a implantao da poltica indigenista setecentista nas terras goianas, assi-nalando os conflitos e massacres entre nativos e colonos ocorridos ao longo de todo o processo deocupao de um territrio que prometia grandes riquezas aurferas. A garantia da posse desse alme-jado metal, bem como a do prprio territrio, levou a Coroa portuguesa, na primeira metade dosculo XVIII, a incentivar a construo dos primeiros e malsucedidos aldeamentos e a misso deSo Francisco de Xavier, localizando-os ao norte, onde havia um enorme contingente de bravossilvcolas, e outros ao sul, na regio do caminho que alcanava as minas. Mas somente no perodode D. Jos e de D. Maria I foram erguidos os mais importantes aldeamentos de Gois (So Jos deMossmedes e Aldeia Maria I), a partir de um conjunto de novas aes de interveno na colnia,orientadas pela gesto pombalina e que envolveram desde questes relativas ao povoamento de reasincultas e ao desenvolvimento comercial do Brasil at a expulso de jesutas e a implantao dediretrios e vigrias subjugadas pelo Estado.

    O sexto e ltimo foco de interesse da tese centra-se na anlise sobre Os modelos de cidadesportuguesas e a urbanizao na capitania goiana, quando se aponta os diferentes modos portugueses defazer cidades, caracterizados por um amplo e complexo processo de acmulo e snteses de conheci-mentos que se desenvolveram no curso de vrios sculos at e alcanar o Setecentos, perodo deformao e urbanizao do territrio goiano. Entre esse rico universo de modos de fazer cidadesencontram-se aqueles cujas caractersticas se aproximam das organizaes urbanas que se desenvol-veram em Gois. O primeiro deles, conhecido como o mais antigo e tradicional, norteou a organi-zao dos vrios arraiais da Capitania. Identificado por atribuir ao edifcio religioso a formaoinicial e a posterior orientao dos espaos, suas respostas rigorosamente pragmticas ligavam-sediretamente s solues locais, contrapondo-se diferentemente quelas que apresentavam esque-mas ou desenhos preconcebidos. Com a fundao da capital Vila Boa, novos conceitos urbansticos

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    foram inaugurados, nos quais a praa, contendo a marcao de um edifcio religioso, e a Casa deCmara e Cadeia seriam o elemento inovador e orientador de uma outra organizao espacial. Massignificativas distores do plano dessa vila a marcaram, levando, na segunda metade do sculoXVIII, o governador e reformador ilustrado Lus da Cunha Menezes a buscar alternativas parao realinhamento de seu traado, segundo cuidadosos levantamentos e desenhos que previram noapenas retificaes como tambm futuras expanses. No mbito do territrio da Capitania, simul-taneamente a essas aes corretivas, planos para aldeamentos foram concebidos a partir de praascentrais, retangulares ou quadradas, inscritas em malhas previstas. Executados de acordo com seusmtodos especficos, garantiram em Gois a continuidade de uma tradio portuguesa de desenhourbano erudito e regular, que se baseava em princpios matemticos e geomtricos.

    Nas pginas que se seguem, procura-se contribuir para todas estas questes e, quando possvel,com interpretaes inovadoras que possam auxiliar os poucos estudos isolados sobre os padres deurbanizao do sculo XVIII em Gois, bem como o avano das anlises crticas desse perodo. Almdisso, so fornecidos tambm dados inditos a respeito do urbanismo colonial, que seguramente irosuprir uma deficincia documental na historiografia regional e brasileira e auxiliar as intervenes emanuteno de nossos acervos culturais, pois, atualmente, as antigas cidades goianas encontram-se fortemente ameaadas pelas transformaes econmicas, demogrficas e, sobretudo, culturais, quese tm traduzido em intervenes modernizadoras, descaracterizando-as completamente.

  • CAPTULO IAD INSULAM BRASILIS: IMAGINRIO

    E CONSTRUO DO TERRITRIO

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    o sculo XVIII, as extenses territoriais dos atuais Estados de Gois e Tocantins foram co-nhecidas inicialmente por Minas dos Goyazes e, logo depois, Capitania de Gois, nome origi-

    1.1 A identificao do territrio

    Nnado dos ndios Goyazes que habitavam o sul dessa regio. Situado entre o litoral e um grande vaziodemogrfico, esse territrio constitui ponto de encontro de diferentes lugares, como a Amaznia, oNordeste e o Sul do Brasil. Com relevo de planalto, revestido de cerrado, ele recortado pelos riosdas trs grandes bacias brasileiras Tocantins Amaznica, Paranaica e Sanfranciscana destacando-se os rios Araguaia e Tocantins, para a primeira bacia, e os rios Paranaba e Araguaia ou Grande,como era denominado no sculo XVIII, para a segunda. Este ltimo rio possui a particularidade deconter a maior ilha fluvial do mundo, a do Bananal, conhecida nos anos coloniais por Ilha de Santana.Seus afluentes mais significativos da margem direita so: o Rio Vermelho, que corta a cidade deGois, a antiga capital; os rios Claro e Piles, abundantes em diamantes nos anos setecentistas; e oRio Crixs, em cujas proximidades viviam tribos indgenas, posteriormente dizimadas pelos coloni-zadores. sua esquerda, destacam-se os rios Barreiros, Cristalino e das Mortes. Com o Paranaba, oAraguaia constitua, no sculo XVIII, um dos caminhos fluviais mais transitados pelos bandeirantesque buscavam as riquezas da regio.

    No meio da Capitania, no sentido centro-norte corre o Rio Tocantins ou Maranho, como eraconhecido. Possui sua nascente, ou olho dgua, na confluncia dos atuais rios Maranho e Paran,prximos antiga capital, desembocando na baa de Marapat, no rio Par. Seus principais tribut-rios so os rios das Almas, em cujas proximidades ergueu-se o importante Arraial de Meia Ponte,atual Pirenpolis; Uru; Palma; Santa Teresa; Canabrava; Itacainas; Sono e Manuel Alves de Nativi-dade. Ao lado deste, foram construdos os aldeamentos de So Francisco Xavier do Duro ou Duroe o So Jos do Duro ou Formiga, com o objetivo de abrigar naes indgenas hostis.

    Completando a paisagem, o territrio recortado por cordilheiras e serras como a do Estrondo,na estrada do Amaro Leite, e a Dourada, que nasce no litoral do Brasil com o nome de Serra Geral,entra em Gois pelos sertes do Rio das Velhas, chega s proximidades do Rio Vermelho e da regiodo antigo Arraial de Meia Ponte, onde chamada Pirineus. Da desentranham rios que vo ao Paraguai,Gro Par e sertes do So Francisco e Mato Grosso, desenvolvendo um longo percurso com diferen-

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    tes denominaes e inmeros morros e serras1, inclinando-se para o Pacfico2. Outras serras que dese-nham o territrio so a de Caldas, prxima ao Rio Corumb, cercada por pastagens e ribeiros e lagosque nela se originam; a dos Cristais, a leste de Santa Luzia, local onde se instalaram os registros de SoMarcos e So Bartolomeu; a enorme serra do Fanha, localizada nas adjacncias de Crixs e Amaro Leite;e as do Duro, Taguatinga e So Domingos, que cercam as terras do norte da Capitania.

    Com toda essa riqueza topogrfica, a grande dimenso territorial de Gois/Tocantins podeser dividida em sete regies, que se apresentam distintamente. Duas delas correspondem ao atualEstado do Tocantins e as demais, ao de Gois. Na primeira, elas so identificadas por Tocantinsocidental e oriental e na segunda, por nordeste, norte, centro, leste e sul3. Mas, apesar de se conside-rar a especificidade de cada uma dessas regies, historicamente, as caractersticas geogrficas daCapitania que mais marcaram os contrastes de sua paisagem foram: as da regio do Mato GrossoGoiano, localizado na confluncia das bacias Amaznica e Paranaica, com a presena de grandefloresta tropical; as do grande planalto central regio de Braslia onde se instalaram vriosncleos urbanos setecentistas, e a regio da Ilha de Camonar4, ou Ilha do Bananal, que se encontraentre os braos do Rio Araguaia. s margens dessa ilha, mais prximo do Tocantins, a vegetao vaido rasteiro do cerrado s matas tipicamente amaznicas, para onde se dirigiram as primeiras expedi-es exploratrias feitas pelos missionrios jesutas.

    O velho territrio goiano no correspondia exatamente s atuais extenses dos Estados deGois e Tocantins, pois a ele somavam-se outras regies, como a do Desemboque, antigo Serto daFarinha Podre. Localizada a sudeste, constitua-se, no sculo XVIII, apenas como uma passagemcortada pela estrada do Anhangera, ligando So Paulo s reas mineradoras de Gois e Mato Gros-so5. Com o Desemboque, outras regies tambm fizeram parte da Capitania: aquelas que se localiza-vam prximas aos rios Apor, Pardo, Araguaia e das Mortes, atualmente pertencentes aos territriosde Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, e as terras que se situavam a noroeste e nordeste da Capitania,regio conhecida como Bico do Papagaio. As do noroeste foram cedidas para o Par, com litgios queduraram de 1804 a 1920, e as do nordeste, para o Maranho, entre 1810 e 1838 6. Dessa forma,estendendo-se de norte a sul por quase dois mil quilmetros quadrados de extenso e avizinhando-sede quase todas as outras regies da colnia luso-brasileira, formou-se a antiga Capitania de Gois. (Fig. 1)

    1 Silva e Souza destaca as seguintes designaes para diferentes serras dessa Cordilheira: Miguel Ribeiro e Cocalzinho, que se dirigem para onorte; Mangabas, que termina junto ao pequeno Arraial do Rio do Peixe; a das Mamoeiras, que comea no Rio Corumb; do Popoia edoTapanhoacanga, que terminam no Ribeiro dos Pinheiros; da Matutina, que nasce em frente a Meia Ponte; a do Jaragu, que se inicia pertodo Rio das Almas; o Morro do Frota, ao norte de Meia Ponte; Santa Brbara, ao sul desse mesmo arraial. J os morros receberam as designa-es: dos Pirineus, cheio de vales cobertos de bosques e pastagens em que correm ribeires; os do Descanso, do Retiro e o do Santo Antnio,que termina no Rio das Almas. SOUZA, Silva e. O descobrimento, governo, populao, e cousas mais notveis da Capitania de Goyaz. In:TELES, Jos Mendona. Vida e obra de Silva e Souza. Goinia: UFG, 1998. p. 72.

    2 SOUZA, Silva e. O descobrimento, governo, populao, e cousas mais notveis da Capitania de Goyaz. In: TELES, Jos Mendona. Op. Cit., p. 72.

    3 BARBOSA, Altair; TEIXEIRA NETO, Antnio; GOMES, Horieste. Geografia: Gois Tocantins. Goinia: UFG, 2004, p. 115-129.4 Nome dado Ilha do Bananal pelos ndios Karaj.

    5 Atualmente, essa regio pertence ao Estado de Minas Gerais e corresponde ao que chamamos de Tringulo Mineiro.

    6 De acordo com Neto, no sculo XIX, duas regies foram incorporadas ao atual territrio goianotocantinense: uma que pertencia Bahia e quehoje faz parte do estado do Tocantins; e outra que era de Minas Gerais e, atualmente, est incorporada ao territrio de Gois. BARBOSA,Altair; TEIXEIRA NETO, Antnio; GOMES, Horieste. Op. Cit., p. 55

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    1.2 O mito de Paraupava e o territrio goiano

    A formao do territrio da Capitania de Gois, assim como ode toda a colnia, resultou de um processo de permutas culturais aservio de um projeto colonial imposto pelos portugueses. Mas almdas questes mais racionais tambm faziam parte desse processo asvises idlicas do serto da Amrica Portuguesa, traduzidas no imagi-nrio da terra brasilis desenvolvido nos sculos XVI e XVII, e cujosdesdobramentos persistiriam at o XVIII. nesse universo que seencontra a fora motriz que impulsionou os exploradores a adentrar

    Fig. 1 Mapa da Capitania de Gois.

    Fonte: TEIXEIRA NETO, Antnio.In: Palacin, Lus; GARCIA, LenidasFranco; AMADO, Janana. Histria deGois em Documentos: Colnia. Goinia.Goinia: UFG, 1995, p. 44.

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    o interior da colnia, permitindo a expanso dos domnios portugueses, a busca de metais valiosose de mo-de-obra indgena, o que resultou no extermnio e destribalizao dos nativos7 .

    O projeto de ocupao das terras da colnia portuguesa e as explicaes fantsticas sobre aexistncia de lugares distantes do litoral, paradisacos, cheios de tesouros, foram os parmetrosgerais que orientaram as primeiras incurses ao serto inspito, de realidade mal conhecida e imagi-nria. Entretanto, foram tambm esses entendimentos mticos, que encerravam em si uma f prag-mtica, alguns dos importantes princpios do reconhecimento da regio de Gois, onde se pensavaencontrar [...] tesouros de ouro, prata, diamantes e pedras preciosas 8.

    Para Kok, luz do mito, o processo de reconhecimento do serto iniciou-se em 1 de maio de1500, quando Pero Vaz de Caminha, fez a primeira descrio a olho nu dessas terras. Segundo seurelato, naquele momento no se podia saber da existncia de ouro, prata ou de qualquer outro metal,mas [...] a terra em si de muitos bons ares, assim frios e temperados, como os de entre Doiro e Minho, porque nestetempo de agora os achvamos como os de l. guas so muitas, infindas 9.

    Coligada a essa imagem inaugural, encontra-se tambm a idia do Paraso terreal que, desde apoca de Cristvo Colombo, em 1492, fazia parte do imaginrio da regio da embocadura doOrenoco, onde se supunha ter sido descoberto um dos rios que vinham do Paraso. Foi nessa pocaque houve a veiculao no novo continente de uma diversidade de mitos e lendas, provenientes,provavelmente, da ndia e da frica, resultando naquele que ficou conhecido por Eupana e cujotopnimo da Espanha Dourado. Georg Friederici10, ao estudar a abrangncia do Eldorado, iden-tifica-o nas regies de Mojos e Chiquitos, com o nome de Dourado de Paititi; na Patagnia, alcan-ando o Estreito de Magalhes at o norte, na rea do Chaco, onde chamado por Dourado dosCsares; no territrio do Novo Mxico atual, com a denominao de Dourado das Sete Cidades; e,por fim, no oriente das grandes planuras da Amrica do Norte, onde conhecido por Quivira.

    Mas Srgio Buarque de Holanda11 alerta que a origem do Eldorado se deu com a conquista deQuito por Sebastin de Benalcazar, em 1533, a partir do ritual de um chefe indgena, que mergulhavatodas as manhs numa lagoa com todo o corpo coberto com ouro em p. No sculo posterior, segun-do a crnica Histria de la Nueva Granada (1636), de Juan Rodrguez Freyle, ritual semelhante eravisto em regies colombianas, com ndios de corpos untados com terra argilosa e empoados com ouromodo. Dessa lenda originou-se o mito de El-Dourado, caracterizado por constantes deslocamentos emdecorrncia dos avanos dos conquistadores. De acordo com Langer, pelas metamorfoses que sofreu,o mito pode ser identificado, inicialmente, em regies onde existiam minas aurferas e, posteriormente,em toda a cidade e pas inexplorado, no qual corria qualquer rumor de riqueza 12 .

    7 KOK, Glria. O serto itinerante: Expedies da Capitania de So Paulo no sculo XVIII. So Paulo: HUCITEC/ FAPESP, 2004, p. 18.

    8 Relao do primeiro descobrimento das minas de Gois, por Bartolomeu Bueno da Silva, escrita por Jos Ribeiro da Fonseca. In: BERTRAN,Paulo. Notcia geral da Capitania de Gois. V 1. Braslia/ Goinia: Solo Editores/ UFG, 1997, p. 45.

    9 CORTESO, Jaime Zuzarte. apud: KOK, Glria. Op. Cit., p. 19.

    10 HOLANDA, Srgio Buarque de. Viso do Paraso. So Paulo: Brasiliense, 1996, p. 35.

    11 HOLANDA, Srgio Buarque de. Op. Cit., p. 33.

    12 LANGER, Johnni. apud: KOK, Glria. Op. Cit., p. 23.

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    A flexibilidade de um mito que fazia parte tanto do imaginrio portugus quanto do espanhol,e a sua ampla divulgao feita pelos indgenas permitiram que ele alcanasse as terras do Brasil, asso-ciando-se quele que se refere existncia de um grande lago fechado, sem acessos, chamado IlhaBrasil, que surgiu no interior da colnia, assumindo diferentes denominaes: Dourado de Vupabuu,de Paraupava ou de Xarais. Esse mito inicia-se a partir da clara aceitao lusa da existncia do extensoterritrio americano compreendido entre as bacias fluviais Platina e Amaznica, e representado, emalguns mapas dos tempos iniciais da histria colonial, como uma grande unidade contnua destinada expanso dos domnios portugueses, conforme afirma Jaime Corteso13. S a partir de 1559, com odesenho de Andr Homem, essa imaginria extenso foi por vezes subdividida em vrias ilhas, sempreenvolvidas pelas bacias e nascendo de um imenso lago. nesse registro cartogrfico que aparecem asnascentes de importantes rios, como o Tocantins, o Paraguai e o Paran, este ltimo comunicando-seainda com o Parnaba e o So Francisco, configurando a ampla rede fluvial de acessos regio mtica.

    Ainda no Quinhentos, foi a crena na existncia do lago cheio de ricos e fantsticos tesourosque seduziu Martim Afonso de Souza a defender os possveis trajetos que o alcanavam, comosugere uma carta de 20 de agosto de 1530, encaminhada pelo embaixador da Espanha em Portugal,Lope Hurtado de Mendona, a Carlos V, da Espanha. Nela, l-se: Um capito Martim Afonso deSouza, marido de Dona Ana Pimentel, dizem que ir descobrir uns rios que h no Brasil e fazer uma fortaleza [ade So Vicente] em certa parte e retirar os franceses que andam naquela costa14.

    O jovem navegador Martim e seu irmo Pero Lopes de Souza desejavam chegar ao Rio da Prata,seguir por ele at alcanar o Rio Paraguai e encontrar a esplndida lagoa. Mas o trajeto foi o seguinte: aoparar na costa norte do Brasil, a expedio expulsa os franceses, desce para o sul e ao chegar ao Rio deJaneiro recebe dos ndios a informao da existncia de ricas jazidas de ouro e prata no Rio Paraguai.Seguindo jornada, chega Canania no dia 12 de agosto de 1531, quando o portugus Francisco Chavesconvence Martim e seu irmo da importncia de uma expedio por terra. Foram tomadas, ento, duasdecises: a de formar uma expedio com oitenta homens, chefiada por Pero Lobo que penetrou oserto e desapareceu , e a de dirigir-se, com o restante da armada, por uma rota que levaria ao sul, pelasbandas do Rio da Prata. Aps contratempos de viagem, Martim Afonso regressa regio Norte, pisandoo solo da Ilha de So Vicente no dia 22 de janeiro de 1532. Com Joo Ramalho, toma conhecimento daexistncia de dois caminhos para penetrar o interior do Brasil e chegar clebre lagoa: o Peabiru, que, porterra, alcanaria o Rio Paraguai, e o Rio Anhembi, hoje Tiet, que se estendia a noroeste. Essa teria sidouma das motivaes para que ele, em 1532, fundasse a Repblica da Vila de So Vicente.

    Mas as motivaes exploratrias do territrio dadas pelo Eldorado ainda foram muitas. Notciasposteriores desse paraso, ao que se sabe, surgem em 1550, quando Filipe Guilln comunicou ao Rei D.Joo III a presena de ndios em Porto Seguro, que diziam habitar junto de hum gram rio e de uma serraque resplandece muito, chamada sol da terra 15. Por essa razo, o novo governador Tom de Souza,motivado, determina a busca dessa montanha, na esperana de ver o que vai por esta terra.

    13 Mas, segundo Glria Kok, uma historiografia mais recente contrape-se a essa idia de Jaime Corteso. No entanto, para o caso especfico doestudo da formao da Capitania de Gois, optou-se pela aproximao com esse historiador, pois a vasta documentao levantada nos leva aaceitar a existncia de um plano de ocupao elaborado pelos portugueses. Nessa mesma linha interpretativa encontram-se as pesquisadorasRenata Malcher e Beatriz Bueno. KOK, Glria. Idem, p. 21.

    14 Carta ao Imperador Carlos V da Espanha. In: FERREIRA, Rodrigues Manoel. O 2 descobrimento do Brasil: o interior. So Paulo: Editores, 2000, p. 23.15 HOLANDA, Sergio Buarque de. Idem, p. 37.

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    O mtico lago foi, ainda, o grande incentivo para a maior parte das expedies exploratriasque o perseguiram, visando descobrir minas no serto, notadamente a partir das guas do gran rioSo Francisco. No perodo da unio das coroas (1580/1640), segundo Gandavo, por esse rio,cujaboca est a dez graus e um tero [...] e que corre da boca do sul para o Norte 16, passaram as primeirasbandeiras que alcanaram os confins goianos17.

    Em Gois, o mito do Eldorado est vinculado ao nome de Paraupava, advindo de Sabarabuu.Srgio Buarque de Holanda sugere que a informao de Guilln pode ter sido o momento daprimeira apario do nome Sabarabuu, pois serra resplandecente corresponde, em tupi, a Itaberaba eno aumentativo, a Itaberabaou, que, sem dificuldade, corresponderia a Taberabou e, finalmente, aSabarabuu. Afirma ainda a possvel relao de continuidade existente entre o mito de Porto Seguro,descrito pelo expedicionrio Ferno Dias Pais e os que se espalharam por diversas pocas nas capi-tanias do sul e do centro, como o caso da de Gois e a sua Paraupava ou Paraupaba. Entretanto, asrotas de entrada para esses lugares, no foram feitas por Porto Seguro, e sim por outras, como as doEsprito Santo e So Paulo, alternando, dessa forma, a porta de entrada para o serto das esmeraldase do ouro18, por causa da ameaa de ataque e o domnio indgena que se assenhoreou da antiga via.

    Muito provavelmente relacionada ainda s primeiras informaes de Filipe de Guilln e aosapontamentos de Gandavo, est a expedio, de 1597, do ingls Knivet, que partiu de Parati rumoao interior da colnia, onde encontrou, segundo suas descries, inmeras maravilhas. Dentre estasse destacam as vises que teve de uma enorme serra aurfera, dos ofuscantes cristais e das formosasgemas verdes, vermelhas, azuis e brancas. Mas esse tesouro, para ele, encontrava-se a pouca distn-cia da rica Potosi, no Peru. Reza essa estria que a partir dessa data [...] iria repousar, aparentemente, afama de certa montanha de prata no ntimo do continente, identificada aos poucos com Sabarabou e distinguida deuma serra das esmeraldas. Assim se vai duplicando ou multiplicando aquela misteriosa serra resplandecente dosprimeiros tempos, segundo o parecer que mais atenda cobia dos colonizadores 19.

    A condio de procedncia de rios levou Jaime Corteso20 a advertir que, anteriormente histria de Sabarabuu, Paraupava e demais lagos mticos, j se encontrava a idia de uma ilha-Brasil, ou a de um territrio contnuo e coeso, compreendido entre o delta amaznico e o esturioplatino, ultrapassando largamente os limites impostos pelo meridiano de Tordesilhas, o quecorrespondia desejada e pretensa unio entre essas duas importantes bacias brasileiras. Infereainda a existncia do antigo sonho dos portugueses de fomentar a ocupao de todo territriobrasileiro at se atingirem os rios das bacias do Prata e do Amazonas, constituindo a grande unidadeque seria a idia-fora para a soluo da soberania portuguesa na Amrica do Sul, com a implanta-o de uma poltica de controle e ocupao do territrio. Mas, para tanto, caberia a transformaodo mito em realidade e da vaga intuio em conhecimento exato do lugar.

    16 GANDAVO, Pero de Magalhes. Das riquezas que se esperam da terra do sertam. In: ABREU, J. Capistrano de. Captulos de Histria colonial(1500-1800) & Os caminhos antigos e o povoamento do Brasil. Braslia: Editora da UnB, 1963, p. 336.

    17 Segundo Bertran e Manoel Rodrigues Ferreira, as expedies pioneiras que chegaram a Gois datam de 1590/ 93, chefiadas por DomingosLus Grou e Antnio Macedo.

    18 Holanda destaca que o fator motivador para tal mudana foi, certamente, a familiaridade dos paulistas em tratar com os silvcolas, bem comosua vasta experincia com o serto. HOLANDA, Srgio Buarque de. Op. Cit., p. 53.

    19 HOLANDA, Srgio Buarque de. Idem, p. 40.20 CORTESO, Jaime Zuzarte. Alexandre de Gusmo e o Tratado de Madrid. Ed. Fac-similar. Vol. II Braslia: Senado Federal, 2001, p. 135.

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    A gradativa transformao se efetuou a partir das diversas incurses ao interior do territrio edos consecutivos avanos da cincia cartogrfica. Impulsionados pelo mito e ajudando a configurarum quadro aparentemente desconexo, os mapas se colocaram a servio da averiguao do imaginrio,em direo real visualizao do espao. Mesmo na fase inicial, quando o mito prevalecia e o conhe-cimento da terra se fazia sem grandes certezas, os cientistas gegrafos deram importantes contribui-es: Lopo Homem e Diogo Ribeiro21, ambos em 1519, foram alguns deles. Posteriormente, o crescenteinteresse pelo desenho do territrio do Magnus Brasil, pelo seu domnio, tambm incitaria holandeses,espanhis, franceses e outros portugueses a represent-lo, resultando numa considervel produo demapas, textos e tratados que descreviam a fantstica regio mitolgica do Brasil, ou seja, a regio daesplndida Lagoa Eupana, Upaua, Upavuu, Vupabuu, Hepabuu e Paraupava, [...] dentro da qualdizem haver muitas ilhas e nellas edificadas muitas povoaes, e outras ao redor dela mui grandes, onde h muito ouro,e mais quantidade, segundo se affirma, que em nenhuma parte desta Provncia 22. So alguns exemplos dessaliteratura geogrfica a Cosmographie, de Joo Afonso (1527-1543), as Voyages Aventureux (1527) 23 e osdemais trabalhos de Antnio Rodrigues (1617); Gabriel Soares de Sousa (1584), com seu TratadoDescritivo sobre o Brasil; Ambrsio Fernandes Brando (1617); Simo Estcio da Silveira (1624); PadreAntnio de Arajo (c. 1625); Padre Simo de Vasconcelos (c. 1654) e Pero de Magalhes Gandavo,com o Tratado da Terra do Brasil (s/d) e Histria da Provncia de Santa Cruz (1576).

    nesse universo cartogrfico e literrio, entre outros, e movido de incio mais enfaticamente pelasexplicaes mticas, que se encontram os primeiros e imprecisos registros das terras sertanejas que fariamparte do territrio goiano. Neles, ora sim, ora no, esto representados o Araguaia e o Tocantins, colocan-do em relevo as suas condies de grandes eixos de acesso Regio Central do Brasil. Esse fato se revelacom a carta de Bartolomeu Velho, de 1562, em que se v a grande Lagoa Eupana, localizada nas imedi-aes do Tocantins e ligando-se ao Prata, ao Par e ao So Francisco. Por volta de 1600, sero os mapasdo cosmgrafo Joo Baptista Lavanha e Lus Teixeira1 que indicariam, mais uma vez, a Lagoa Eupana.Seguem-se a esses desenhos os de Pero Domingues, porm com a Lagoa se apresentando com a denomi-nao Paraupaba, igualmente que aparece nos relatos do Padre Antnio de Arajo25.

    Para as representaes que envolvem mais diretamente o territrio de Gois, os mapas de maiorvalor so os dos cartgrafos portugueses Antnio Sanches, de 1641, e Joo Teixeira Albernaz II, de 1655,1670 e 1675 26. De acordo com esses trabalhos, o lago Dourado vai sendo suprimido e substitudo pelo esboo do RioAraguaia, ilha do Bananal e a juno Araguaia-Tocantins 27. Com essas alteraes, pode-se deduzir que,gradativamente, as primeiras cartas em que o territrio goiano apresentava-se subjetivamente, como um

    21 RODRIGUES, Manoel Ferreira. O 2 descobrimento do Brasil: o interior. So Paulo: Editores, 2000, p. 22

    22 GANDAVO, Pero de Magalhes. apud: CORTESO, Jaime Zuzarte. Histria do Brasil nos velhos mapas. Tomo 1. Rio de Janeiro: Ministrio dasRelaes Exteriores e Instituto Rio Branco, s/d, p. 344.

    23 CORTESO, Jaime Zuzarte. Histria do Brasil nos velhos mapas. Tomo 1. Rio de Janeiro: Ministrio das Relaes Exteriores e Instituto RioBranco, s/d, p. 344.

    24 Esse mapa encontra-se na obra Portugaliae Monumenta Cartographica. Itlia, Torino: Biblioteca Reale.

    25 CORTESO, Jaime Zuzarte. Alexandre de Gusmo e o Tratado de Madrid. Ed. Fac-similar. Vol. II Braslia: Senado Federal, 2001, p. 136.

    26 KONINKLIJKE BIBLIOTHLEEK, BIBLIOTECA DE HAIA. Holanda. Portugaliae Monumenta Cartographica. N. E. 530.

    27 BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no Brasil Central: Eco-histria do Distrito Federal; do indgena ao colonizador. Braslia: Verano,2000, p. 50-51.

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    todo amalgamado, identificado apenas pelas imagens lendrias, foram setransformando em outras que revelavam mais concretamente a realida-de do lugar. No mapa de Antnio Sanches, por exemplo, no existe afantstica Lagoa Paraupava, apenas a indicao dos rios Paraguai (Prata),So Francisco e Paraupava (Araguaia), com suas nascentes independen-tes. No de Joo Teixeira, de 1642, tambm aparecem claramente os riosAraguaia e Tocantins e a Ilha do Bananal (Ilha Peraupaba). Vinte anosdepois, no mapa de Joo Albernaz II, so representados, igualmente aoanterior, a Ilha do Bananal, duas nascentes para o Tocantins Maranho eParan e duas para a bacia Platina o Rio Corumb e, ao que parece, oSo Marcos. Entre as cabeceiras do Tocantins e do Prata, a presena deuma nova lagoa sem nenhuma denominao. No mapa de 1675, elavem acompanhada da descrio: Lagoa onde h muito salitre 28. (Fig. 2)

    Fig. 2 Fonte: Mapa do Arquivo daBiblioteca Nacional do Rio de Janeiro,seo cartografia: CDICE CART1079075 f 01.

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    Segundo o relato do padre jesuta Antnio de Arajo, a descoberta do salitre, um importanteminrio para a fabricao de plvora, foi feita pela expedio de Andr Fernandes: [...] depois degastos alguns meses no discurso de vrios sertes foram dar com as cabeceiras de um rio chamado Iabebri, nome quelhe deram muitas raias que nele h. Aqui descobriu [...] um mineral de salitre que conheceu mui bem pela experinciaque dele tomara entre os castelhanos [...] 29. Se se consideram, com os textos literrios, os mapas comoroteiros e registros do tempo vivido, as freqentes revises cartogrficas feitas pela famlia Albernaz,decorrentes de novos devassamentos e descobertas como essa, podem ser entendidas como formaslegtimas de transformao dos mitos em realidade geogrfica, ou melhor, do mito em conhecimen-to e controle de uma regio apartada do mar, & por todas as partes metidas entre terras 30.

    A cartografia e os registros escritos corresponderam, nesse sentido, aos diferentes nveis deinformao do imprio portugus sobre as novas terras americanas, como se v neste relato doPadre Simo de Vasconcelos:

    Contam os ndios versados no serto que bem no meio dele so vistos darem-se as mos estes dois rios(Amazonas e Prata) em uma lagoa famosa ou lago profundo, de que guas que se ajuntam das vertentes dasgrandes serras do Chile e do Peru, e demora sobre as cabeceiras do rio que chamam So Francisco, que vemdesembocar ao mar em altura de 10o e um quarto; e que desta grande lagoa se formam os braos daquelesgrossos corpos: o direito ao das Amazonas, para a banda do norte, o esquerdo ao da Prata, para a bandado sul, e que com estes abarcam e torneiam todo o serto do Brasil; e que com o mais grosso do peito, pescooe boca presidem ao mar 31.

    Nas palavras desse sacerdote, realidade e mito parecem se fundir indistintamente, formandouma nica verdade indivisvel, da mesma maneira que ocorre nos mapas da famlia Albernaz em queaparece a regio goiana. Mas essa aparente condio no apaga as evidncias iniciais e mais concre-tas da gradual construo de uma realidade territorial guiada pela razo. As diversas expedies regio e as posteriores descobertas, como as do salitre, foram as condies que permitiram as retifi-caes e transformaes da cartografia. A continuidade do processo que, sobretudo, visava verifi-cao de um mito e as inovaes geogrficas marcaro as bases das futuras representaes da regio,quando se fixar definitivamente a apropriao do territrio auxiliada por mapas. O Setecentos ser,portanto, o exemplo desse perodo. Nele ocorrer a matematizao do espao, revelada por cartastopogrficas orientadas por latitudes e longitudes, feitas por experientes gegrafos e engenheirosmilitares da poca. Com elas, sim, se reconhece o apogeu de uma cultura que se dirigia a caminho doconhecimento cientfico do interior do Brasil, embora ainda e igualmente motivada, em diferentesgraus e momentos, pelo imaginrio das ricas regies de ouro.

    28 Mineral de grande importncia para os portugueses pelo seu elevado valor na composio da plvora. BERTRAN, Paulo. Op. Cit., p. 51-53. Deacordo com Bertran, esses mapas se encontram na Library of the University of Yale e na Spanic Society of Amrica, NY.

    29 Notcia que o escrivo Pero Domingues passou ao Padre Arajo. In: BERTRAN, Paulo. Histria da terra e do homem no planalto central: Eco-histria do Distrito Federal, do indgena ao colonizador. Braslia: Verano, 2000. p. 50.

    30 BLUTEAU, Raphael. Vocabulrio Portuguez e Latino [...] Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus, 1712-1721. Vol. VII, p. 613.

    31 VASCONCELOS, Pe. Simo de. Livro primeiro das notcias antecedentes curiosas e necessrias das coisas do Brasil: Introduo Crnica daCompanhia de Jesus do Estado do Brasil, 27. apud: CORTESO, Jaime Zuzarte Op. Cit., p. 137.

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    1.3 Desbravando o territrio em busca do mito

    No s com a cartografia possvel verificar as origens e a formao do territrio goiano.As vrias expedies bandeiristas e missionrias, medida que iam avanando em direo aosnovos espaos internos do continente americano, contribuam para a sua conquista, efetivandoo controle desse territrio e transformando-se, assim, nas verdadeiras protagonistas dessasaes. A histria colonial do Brasil est repleta de exemplos dessas incurses desbravadoras,em especial a partir do Seiscentos, quando muitas delas, paralelamente s que se dirigiram regio de Gois, avanaram e permitiram a posse das terras do sul, norte e regio mais a oeste,como a do Mato Grosso. Para o Sul, homens foram em busca do So Francisco, para manter aintegridade do territrio portugus. Em direo ao Norte, dando seqncia conquista dolitoral do Rio Grande, do Cear e do Maranho, ordens de Portugal determinaram a constru-o de uma casa fortificada, denominada Prespio, na embocadura do Amazonas. Havia umaantiga preocupao luso-brasileira para alcanar essa regio, fronteira natural a marcar os pon-tos extremos das terras de Portugal e Espanha, mesmo na condio de unificadas. FranciscoCaldeiras Castelo Branco foi destacado como chefe da expedio e, chegando baa de Guaraj,nomeou a terra vizinha de Feliz Lusitnia. Nos anos seguintes, foram atacadas posiesestratgicas de holandeses e britnicos no Macap, na Ilha do Tocuju e no Amazonas, dandoincio aos trabalhos dos missionrios franciscanos.

    Em 1637, armou-se a maior faanha sertanista do Norte: uma entrada com mais de duasmil pessoas para identificar a existncia de uma ligao fluvial entre o Atlntico e o Peru. Coubea chefia ao capito Pedro Teixeira que, anteriormente, logo depois da fundao de Belm (1616),j havia percorrido grandes extenses pelo Rio Tapajs, colhendo importantes informaes geo-grficas, econmicas e etnogrficas. A nova jornada, por tamanha ousadia em cobrir uma grandeextenso territorial, mostrou ao vice-rei da Espanha a vulnerabilidade de sua Coroa, induzindo-oa ordenar o retorno de Pedro Teixeira ao Par. Em Belm, no ano seguinte, os trabalhosdo expedicionrio tm continuidade com a fundao de Franciscana, na confluncia do Napocom o Aguarico, impondo novos limites para os territrios das coroas ibricas. Aquela primeiralinha fixada pelo meridiano de Tordesilhas j no era mais considerada. A expedio no haviafeito apenas um reconhecimento preliminar; ela procurou igualmente assegurar soberania lusaas terras alm Tapajs. E um sonho e plano expansionista nasceu: ao mito da Ilha Brasil e do Lago Douradoveio agregar-se o do Rio do Ouro 32. Com esse plano expansionista e as possveis movimentaes pelonovo territrio estabeleceram-se as ligaes entre o Amazonas e o Brasil Central atravs dos riosTocantins e Araguaia33, permitindo, pela primeira vez, uma maior compreenso da hidrografia doterritrio e a indicao de importantes vias fluviais de acesso regio da Ilha do Bananal, ondechegaram os primeiros religiosos jesutas em busca de ndios para catequizar e de locais para osoerguimento de futuros aldeamentos.

    32 CORTESO, Jaime Zuzarte. Op. Cit., 145.

    33 HOLANDA, Srgio Buarque de. Histria geral da civilizao brasileira: a poca colonial, do descobrimento expanso territorial. Rio de Janeiro:Bertrand Brasil, 1989, p. 264.

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    Logo aps a separao dos reinos ibricos, em 1640, o movimento dos bandeirantes, comoum todo, sofreu sensveis alteraes. Com a maior entrada de escravos negros, o apresamento dos ndios foiprogressivamente deixando de ser um negcio rentvel desviando, em partes, o interesse dos bandeirantes dasexpedies de resgate para outro tipo de projeto que envolvia a prpria Coroa 34. A ordem, agora, era areordenao da penetrao do interior, j iniciada anteriormente com significativos avanos tantopara as terras do Sul como para as do Norte e Oeste. Para o atendimento das novas orientaes,a metrpole determinou a formao de expedies bandeiristas, que partiram ora de So Paulo,ora de Belm, remuneradas com concesses de cargos e ttulos, visando, principalmente, aprospeco de minas e, em maior escala, a garantia dos avanos territoriais que alcanaram a regiodos rios Araguaia e Tocantins.

    As incurses originrias do Par eram formadas, normalmente, por religiosos jesutascomo Padre Antnio Vieira, que embora tenha chegado ao Tocantins, no conseguiu pisar nasterras goianas; Padre Tom Ribeiro (1658), que andou pelas margens do Rio Araguaia; PadreManuel Nunes (1659) e os padres Gonalo de Veras e Sebastio Teixeira (1671), que, segundoconsta, procuraram, numa ao quase ciclpica, estender seus programas de evangelizao regio. As aes jesuticas nas terras de Gois, embora modestas se comparadas s grandesmisses do Sul e do Norte da colnia, sinalizam as tentativas de implantao da poltica deocupao portuguesa, fundamentada na incorporao de novos territrios, que seriam garanti-dos pela participao dos diferentes agentes35 a servio da estrutura maior que os reivindicava.A participao de padres e bandeirantes, apesar de seus propsitos distintos dentro do panora-ma da colonizao, era o apoio da sustentabilidade da posse efetiva, anunciada desde o sculoXVII na regio goiana.

    Mas, para alm dessas consideraes, no conjunto das incurses seiscentistas, foram asbandeiristas originrias de So Paulo que mais contriburam para a ocupao do territrio das minas docentro da colnia. A historiografia colonial destaca como a maior e mais expressiva dessas jornadasa do caador de esmeralda Sebastio Pais de Barros (1673), que, acompanhado de 800 homens,atingiu o serto bruto de Paraupava, galgando

    [...] os sertes do So Francisco e do Piau, indo parar beira do curso do Tocantins. Logo o procurou umapatrulha do Gro-Par, tentando dissuadi-lo a abandonar o local, que j se dizia achar-se ligado a So Paulopor uma estrada (1673). Nesse episdio, o que, contudo, merece relevo o apoio oficial que o sertanista houveda Corte: o prprio regente mandou escrever-lhe uma carta a perguntar-lhe dados precisos sobre o local a quechegara e a incit-lo a prosseguir na busca de ouro, pedras e prata e na extrao das drogas da terra 36.

    34 ARAJO, Renata Malcher de. A urbanizao do Mato Grosso no sculo XVIII: discurso e mtodo. Tese de doutoramento. Lisboa: UniversidadeNova de Lisboa, 2000, p. 78.

    35 No era possvel, para qualquer dos agentes atuantes no processo, sustentar a posse da regio com o simples argumento da prioridade dosavanos sobre o territrio. Pelo contrrio a base da sustentabilidade da posse residia, sobretudo, na capacidade de manuteno de vnculosdesses territrios estrutura que o reivindicava para si [...]. ARAJO, Renata Malcher de. A urbanizao do Mato Grosso no sculo XVIII: discursoe mtodo. Tese de doutoramento. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, 2000, p. 80.

    36 REIS MIRANDA, Tiago C. P. dos. Op. Cit., p. 37.

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    Um pouco antes da expedio de Pais, por determinao rgia, o padre portugus AntnioRaposo Tavares (1648/1751) chefiou uma ambiciosa viagem, com duzentos brancos e mamelucose mais de mil ndios, que saiu de So Paulo e estabeleceu, pelo curso dos rios Tocantins, Tapajs eMadeira, o contato entre a regio central do Brasil, as minas do Mato Grosso e a Amaznia. Seguin-do esse roteiro, eles percorreram pela primeira vez os limites mximos do territrio do Brasil, dandoa conhecer a possibilidade de ligao entre as bacias do Prata e do Amazonas, fundindo os dois mitosda ilha Brasil e do Rio do Ouro numa nica realidade 37, e de consolidao de um perodo decisivo para acompreenso da estrutura geral da hidrografia continental.

    Ao final do Seiscentos, entre 1673/78, outros dois pontos localizados na fronteira sulinatambm chamavam a ateno dos portugueses: o Rio Paranagu e a foz do Rio Prata. Para tanto,eles fundaram margem esquerda deste ltimo o povoado de Sacramento, que lhes garantiria odireito de posse dessa faixa de terras, bem como o de concorrer com Buenos Aires pelas transaescomerciais que ali se desenvolviam (1680). A reao da Espanha foi imediata. Pouco tempo depois,j havia formado um exrcito para tomar Sacramento, obtendo sucesso. Dois anos aps a ocupao,o povoado retornou ao poder de Portugal, mas at o final do reinado de D. Jos foram registradosinmeros conflitos e sucessivas ocupaes espanholas. A insistncia em permanecer e proteger aregio garantiu aos portugueses sucesso efetivo na conquista e colonizao do Rio Grande do Sul(1737) e, no sculo seguinte, a ampliao do territrio da futura Capitania de Santa Catarina (1738).

    Mas no foram os grandes empreendimentos expansionistas que mais contriburam parao alargamento do territrio goiano. Os maiores responsveis pelo desnudamento dessas terrasforam as modestas expedies de carter oficial e semi-oficial que, antes mesmo da aberturado acesso norte, ainda no Quinhentos, percorreram essa regio, dando incio sua descoberta.A primeira delas foi uma bandeira paulista formada por apenas 50 homens, chefiados por Do-mingos Grou (1590 - 1593), que partiu de So Paulo, passou pelas cabeceiras do Rio So Francis-co e alcanou o serto da Grande Lagoa Paraupava. Abriam-se, assim, as portas para a continuidadedo mito que perdurou at o sculo XVIII. As aes de desbravamento territorial, entretanto, nopararam por a. Seguindo essa primeira expedio, outras tambm percorreram o pretendidoterritrio, dinamizadas por importantes prioridades do governador D. Francisco de Souza: a bus-ca do to propalado ouro.

    No se pode esquecer, contudo, que esse perodo, da Corte de El Rei Filipe II, foi marcado pelasincertezas em relao a quem pert