42
TEXTO PARA DISCUSSÃO Nº 10 ALCANCE E LIMITES DAS FINANÇAS DE PROXIMIDADE NO COMBATE À INADIMPLÊNCIA: O CASO DO AGROAMIGO Ricardo Abramovay * São Paulo, abril de 2008 * Professor Titular da FEA/USP, pesquisador do CNPq. www.econ.fea.usp.br/abramovay/

TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

TEXTO PARA DISCUSSÃO Nº 10

ALCANCE E LIMITES DAS FINANÇAS DE PROXIMIDADE NO CO MBATE À

INADIMPLÊNCIA: O CASO DO AGROAMIGO

Ricardo Abramovay*

São Paulo, abril de 2008

* Professor Titular da FEA/USP, pesquisador do CNPq. www.econ.fea.usp.br/abramovay/

Page 2: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

i

ÍNDICE

1. APRESENTAÇÃO _________________________________________________________ 2

2. AMBIENTE INSTITUCIONAL E FINANÇAS DE PROXIMIDADE_________________ 5

2.1. O CARÁTER ENDÓGENO DAS INSTITUIÇÕES_____________________________________ 5

2.2. VIRTUDES E PERIGOS DOS LAÇOS PESSOAIS_____________________________________ 6

3. UM SISTEMA DE CRÉDITO CRIADO PELO ESTADO__________________________ 10

3.1. SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA AO PROBLEMA DA SELEÇÃO DOS CLIENTES_____________ 10

3.2. GARANTIA ESTATAL E TECNOLOGIAS DE EMPRÉSTIMO___________________________ 14

3.3. A AMEAÇA DA INADIMPLÊNCIA _____________________________________________ 17

4. O AGROAMIGO __________________________________________________________ 24

5. CONCLUSÕES ___________________________________________________________ 31

REFERÊNCIAS________________________________________________________________ 35

Page 3: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

1

Resumo: É notável a expansão do crédito rural voltado a famílias pobres, sobretudo no

Brasil, desde o início dos anos 200. O Programa Nacional de Fortalecimento da

Agricultura Familiar (PRONAF) conseguiu fazer chegar financiamentos a mais de 2

milhões de famílias (num universo de cerca de 4,2 milhões de unidades familiares de

produção), das quais a metade vive próximo à linha de pobreza. Neste segmento de maior

pobreza, correspondente a uma linha específica, chamada de PRONAF B, a inadimplência

é, entretanto, preocupante. O artigo discute as razões que explicam os atrasos no

pagamento e, sobretudo, expõe as novas políticas que pretendem modificar este quadro. O

trabalho se apóia na idéia de self-enforcing institutions (Greif, 2004 e 2005) para explicar

o imenso potencial da introdução de novas tecnologias de empréstimo baseadas no vínculo

personalizado entre o assessor de crédito e o agricultor. Ao mesmo tempo, ele se apóia na

nova economia institucional para mostrar que na ausência de uma clara sinalização de

que a inadimplência será rigorosamente punida, dificilmente estas novas tecnologias

poderão realizar os efeitos tão promissores que delas se pode esperar.

JEL: G21; Q14; Q 18; Z13

Page 4: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

2

1. APRESENTAÇÃO

O Brasil é hoje o único país em que bancos pertencentes ao Estado fazem empréstimos a

agricultores pobres, não apenas com base em recursos do Tesouro e apoiados em

importantes subsídios, mas isentando as organizações financeiras de qualquer risco.

Subsídios nas taxas de juros são praticados de forma mais ou menos freqüente em diversos

programas da União Européia, da África (Ouédraogo, 2007), em países asiáticos (Jain e

Moore, 2003; Martowijoyo, 2007), além de outras nações latino-americanas (Trivelli e

Venero, 2007). Bancos estatais estão presentes de maneira massiva nas atribuições de

crédito na Índia (Flandrin le Maire e Fontagné, 2007) e na Indonésia (Gremaud e Toneto,

2003). Esta presença pode ser direta ou por meio do repasse de recursos públicos a

organizações não governamentais, como ocorre na Índia (Guérin e Kumar, 2007). Mas o

Brasil é o único caso em que, além de se apoiar em fundos públicos e em recursos do

Tesouro, os empréstimos são concedidos com base na garantia de que o Estado cobrirá os

prejuízos decorrentes de seu eventual não pagamento.

O resultado é que pela primeira vez em sua história, a partir do ano 2000, populações rurais

desprovidas de patrimônio e garantias bancárias, nas localidades mais pobres do País,

tiveram, de forma massificada, acesso ao crédito. Dos 4,2 milhões de agricultores

familiares brasileiros, cerca de 2 milhões recebem financiamentos bancários. Destes, quase

metade inclui-se entre os segmentos mais pobres do setor. Estes dados contrastam com a

constatação mais ou menos generalizada na literatura que mostra a imensa dificuldade de

fazer chegar empréstimos a populações pobres, mesmo em países asiáticos em que o

microcrédito se desenvolveu muito nos últimos anos (Meyer, 2007). A contrapartida desta

massificação, porém, no caso brasileiro, é um preocupante e crescente nível de

inadimplência neste tipo de financiamento com um terço das operações voltadas ao público

mais pobre do programa – o chamado PRONAF B, basicamente no Nordeste do Brasil –

em atraso, ao final de 2007.

A literatura recente sobre o papel do Estado no acesso dos pobres rurais ao crédito pode ser

dividida em dois grandes blocos. Por um lado, encontra-se a chamada escola de Ohio

Page 5: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

3

segundo a qual existe hoje um “novo paradigma” das microfinanças rurais, que muda a

própria definição do problema do acesso ao crédito: o objetivo hoje não seria mais a

intervenção do Estado para corrigir falhas de mercado, mas sim de reduzir os riscos e os

custos de transação, por meio do maior envolvimento de organizações privadas e

associativas na intermediação financeira (Meyer, 2007). O essencial, neste novo paradigma,

é a sustentabilidade das organizações financeiras voltadas às necessidades dos pobres

(Schreiner e Yaron, 2001, Zeller e Meyer, 2002, Zeller, 2003).

Há, entretanto outra vertente da literatura, cética com relação à possibilidade real de a

liberalização dos mercados e um ambiente macroeconômico propício produzirem

organizações financeiras que beneficiem quem se encontra na base da pirâmide social. Esta

é, por exemplo, uma das mensagens centrais do relatório do Banco Mundial de 2007,

Equity and Development (World Bank, 2006). Bath e Tang (2001), por sua vez, contrariam

a idéia de que haveria um paradigma a ser seguido, um formato único capaz de contemplar

de maneira geral o que deveria ser uma organização voltada a oferecer crédito aos pobres

do meio rural. Jain e Moore (2003) duvidam que seja possível realmente chegar aos mais

pobres na ausência de subsídios ao trabalho das organizações. Embora Trivelli e Venero

(2007:24 e 55) reconheçam as novas visões que procuram articular os esforços do Estado

com os atores privados e o uso de mecanismos de mercado na atribuição do crédito

constatam, ao mesmo tempo, que, na América Latina, “a ausência ou a retirada das

entidades públicas dos sistemas financeiros rurais não foi capaz de expandir a oferta

privada de fundos no meio rural”.

Quais as razões da tão importante inadimplência da linha de crédito governamental

atribuída a agricultores brasileiros mais pobres com base em garantias oferecidas pelo

Tesouro Público? É possível reduzir esta inadimplência de forma consistente sem renunciar

à política que oferece recursos subsidiados, a partir de bancos comerciais pertencentes ao

Estado e na ausência de risco bancário?

A hipótese central deste trabalho é que os atrasos no pagamento não se devem ao fato de o

Estado garantir os créditos: é claro que se houvesse risco bancário, a inadimplência seria

Page 6: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

4

muito menor, como o provam os exemplos dos financiamentos a segmentos mais prósperos

da agricultura familiar no Brasil. Mas dificilmente o crédito chegaria a quantidade tão

ampla de agricultores. A inadimplência se deve – é o que este trabalho tenta provar - a dois

fatores centrais: em primeiro lugar, à inexistência, até muito recentemente, de tecnologias

de empréstimo que valorizem o papel do agente de crédito, ou seja, à maneira burocrática

como o crédito foi concedido aos agricultores. Além disso, a inadimplência é estimulada

pelo sentimento de que os indivíduos e os grupos sociais não correm qualquer risco diante

do não pagamento de suas dívidas e à expectativa – cultivada, de maneira freqüente por

lideranças locais - de que esta será renegociada ou até anistiada.

Estas hipóteses conduzem à perspectiva de que melhores tecnologias de empréstimo –

como as que começam a ser aplicadas desde 2005 - podem reduzir significativamente os

não pagamentos, desde que os agricultores endividados recebam claro sinal de que haverá

punições caso se inscrevam num horizonte de perpetuação de suas dívidas. Há uma forte

tensão entre os dois componentes da hipótese central deste trabalho: a ausência de boas

tecnologias de empréstimo para este público associa-se à institucionalização do crédito

como um direito social em que os mecanismos para garantir o recebimento do dinheiro são

mais importantes que aqueles que asseguram a devolução do empréstimo pelo produtor.

Introduzir tecnologias de proximidade exige, portanto alteração no ambiente institucional

que legitima o não pagamento das dívidas.

A segunda parte do texto expõe seus fundamentos teóricos. A parte três apresenta as

principais informações sobre a inadimplência e a quarta apresenta as tecnologias de

empréstimos que procuram superar os problemas atuais, bem como as medidas

governamentais para conduzir os agricultores ao pagamento das dívidas acumuladas.

Page 7: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

5

2. AMBIENTE INSTITUCIONAL E FINANÇAS DE PROXIMIDADE

2.1. O CARÁTER ENDÓGENO DAS INSTITUIÇÕES

O sistema de crédito é uma construção institucional que repousa sobre três pilares básicos –

informação, confiança e capacidade de fazer cumprir contratos (enforcement) – e cuja

reprodução passa por redes sociais que podem ser estudadas empiricamente. Avner Greif

(2004:1) insiste na importância dos micro mecanismos subjacentes a diferentes sistemas de

crédito. Seu trabalho vai realçar não tanto os elementos exteriores capazes de evitar

condutas inadequadas (Estado, justiça, punições econômicas), mas aquilo que chamou de

instituições “self-enforcing” (Greif 2005). Greif reconhece, é claro, a contribuição

intelectual da nova economia institucional, com sua ênfase nos direitos de propriedade

(Coase, 1960), nas regras do jogo capazes de defini-los (North, 1990), nas bases contratuais

que permitem explorar seus benefícios e no tipo de organização econômica necessária a sua

aplicação (Williamson, 2000). No nosso caso, por exemplo, a economia institucional

enfatizaria os mecanismos que transmitem aos atores a clara mensagem de que um

empréstimo apóia-se sobre regras – das quais a mais importante é a devolução pontual dos

recursos – cujo não cumprimento traz prejuízos econômicos, além de reprovação social.

Avner Greif procura, no entanto, dar um passo além deste horizonte: os indivíduos não

seguem regras apenas por medo de punição, mas devem estar basicamente motivados a

fazê-lo: “Por que certas regras comportamentais são seguidas e outras não? Regras são

instruções comportamentais que podem ser ignoradas, o que implica que o impacto de

qualquer regra prescritiva depende da motivação dos indivíduos a segui-la” (Greif, 2004:

3). A convergência com diversas correntes da sociologia é explicitamente enfatizada por

Greif (2004): da mesma forma que Mark Granovetter (1985) ou Neil Fligstein (2001), Greif

estuda as instituições não apenas como modalidades coercitivas, funcionais ou eficientes na

explicação dos comportamentos e sim como reflexo das interdependências entre os

indivíduos em interação.

Page 8: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

6

No horizonte institucionalista, a redução da inadimplência passaria, basicamente, pela

formulação e pela aplicação de leis e medidas que punissem os indivíduos em caso de não

pagamento. Mais que isso: o horizonte institucionalista tende a concluir que o

envolvimento do Estado nas operações de empréstimo aos mais pobres cria

comportamentos “rent-secking” por parte de indivíduos e grupos sociais, gera interesses no

corpo burocrático governamental em usar o crédito como moeda de troca política e impede

que os financiamentos respondam a qualquer parâmetro de racionalidade econômica

(Adams et al. 1992).

Os estudos da sociologia econômica e o trabalho de Avner Greif em torno das instituições

“self-enforcing” inscrevem-se em outra perspectiva. Não há dúvida que os sinais exteriores

representados pelas leis e pelas regras sociais são decisivos. É certo também que a presença

do Estado é uma ameaça constante à racionalidade de qualquer programa de crédito em

virtude da possibilidade de utilização política dos financiamentos e da inibição ao

surgimento de intermediários privados e associativos. O que faz falta ao horizonte

institucionalista, porém, é a análise tanto das motivações (Greif, 2005) como das redes

sociais em que se inserem os comportamentos dos indivíduos.

2.2. VIRTUDES E PERIGOS DOS LAÇOS PESSOAIS

Independentemente das tecnologias adotadas – bancos da comunidade, grupos solidários ou

empréstimos individuais (Canales, 2005:7) – o traço fundamental das organizações

contemporâneas de microfinanças é a utilização de redes sociais e vínculos personalizados

como elementos decisivos de obtenção de informações e construção da confiança

necessária ao seu funcionamento. Mesmo quando, no caso dos ou village banks, os grupos

são formados especialmente com a finalidade de obter empréstimos, realizar poupança e

apoiar financeiramente as atividades econômicas das famílias, eles só funcionam quando se

baseiam no conhecimento real que os indivíduos têm uns dos outros e quando suas regras

são interiorizadas como legítimas por seus participantes (Ghatak, 1999, Westley, 2004).

Page 9: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

7

É bem verdade – como bem o mostra o importante trabalho crítico de Ana Marr (2004) -

que o nível de informação dos participantes de um banco da comunidade a respeito dos

negócios dos outros é relativamente baixo, já que o custo de transação para obter dados

precisos a este respeito é elevado. Marr (2004) é particularmente cética com relação à real

capacidade de as redes sociais em que se inserem os bancos da comunidade conseguirem

oferecer as informações necessárias para o funcionamento de um sistema de crédito. O

trabalho de Marr (2004) se insurge contra a visão ingênua e romântica que faz da

“comunidade” uma realidade homogênea, sem contradições e de onde o poder e a

desigualdade estão ausentes. Os bancos da comunidade por ela estudados no Peru são uma

espécie de reprodução da estrutura social em que se inserem e neste sentido acabam

produzindo efeitos não antecipados muito graves como a imensa pressão para que os mais

pobres se endividem em fontes informais para pagar os empréstimos contraídos o que

acaba, ao final de certo tempo, por excluí-los da atividade.

Mas será que o clientelismo, a ausência de racionalidade econômica na atribuição dos

empréstimos e a dominação sofrida pelos mais pobres que Ana Marr constatou em seu

trabalho são inerentes às finanças de proximidade? A personalização dos vínculos sociais,

própria à formação destes mercados, sua imersão em redes que não se limitam ao

anonimato das relações de mercado conduzem, necessariamente, à contrapartida de limitar

ainda mais as liberdades dos indivíduos que delas fazem parte?

É claro que a resposta a estas perguntas passa, em grande parte, pelo estudo do contexto em

que as organizações vão operar e especialmente pelo ambiente institucional existente, tal

como a nova economia institucional o concebe. Mas o formato institucional das

organizações e, particularmente, o papel do agente de crédito, bem como a natureza dos

incentivos a partir dos quais trabalha são essenciais. Vejamos a questão mais de perto.

É surpreendentemente escassa a literatura sobre a figura do agente de crédito nas

organizações contemporâneas de microfinanças (Canales, 2005:6). Ela pode ser dividida

em duas vertentes básicas. Por um lado, há autores que estudam sua atuação com base

fundamentalmente na teoria da agência. É o caso de Fuentes (1996), de Aubert et al.

Page 10: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

8

(2002) e de Armendariz de Aghion e Murdoch (2005). O ponto de partida destes trabalhos é

a constatação correta de que existem atores locais (em geral pequenos comerciantes) que,

independentemente da existência de organizações de microfinanças, operam regularmente

com populações pobres (Harriss-White, Abramovay, 2004, Dias e Diniz, 2004, Von

Bastelaer, 1999, Timberg e Aiyar, 1984). Caso estes pequenos comerciantes trabalhassem

para um banco ou uma organização de microfinanças seriam capazes de recuperar os

empréstimos que realizam – tanto quanto o são quando se trata de emprestar seu próprio

dinheiro? Quais seriam as melhores modalidades de remuneração para evitar o conluio

(collusion) entre o agente de crédito e os clientes da organização? É preferível que os

agentes de crédito recebam um salário fixo, uma comissão sobre a qualidade da carteira ou

uma mistura entre estas duas modalidades de remuneração? Mas a teoria da agência vai

além das técnicas e das modalidades contratuais para a recuperação dos empréstimos, já

que os objetivos do banco ou da organização de microfinanças (o principal) envolvem

também dimensões sociais como, por exemplo, fazer com que os recursos cheguem às

mulheres ou aos mais pobres. Além disso, os próprios métodos de cobrança dos recursos

emprestados são importantes para a vida da organização financeira. Fuentes (1996) constrói

um modelo em que o agente de crédito pertence à comunidade (como será o caso também

da tecnologia de empréstimo recentemente implantada pelo Banco do Nordeste – BNB -

nos empréstimos a camadas mais pobres de agricultores e exposta na parte 4 deste trabalho)

e, com isso, detém informações que dificilmente alguém de fora seria capaz de reunir. Em

suma, a literatura baseada na teoria da agência discute a atuação dos agentes de crédito a

partir de suas diferentes modalidades de remuneração (incluindo aí explicitamente a

possibilidade de que parte dos ganhos dos funcionários venha de pagamentos não

declarados que lhes seriam feitos por clientes – Aubert et al, 2002), com ênfase, portanto,

no desenho dos contratos que vão reger o que fazem.

Outra vertente da literatura coloca acento na dimensão sociológica da relação entre o agente

de crédito e a população junto à qual ele trabalha. Sua principal virtude, para o que aqui nos

interessa, é que fortalece o caráter endógeno das instituições (Greif, 2005) e coloca as

motivações dos indivíduos no interior das redes sociais em que se inserem. Danielle Guérin

Page 11: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

9

e Santosh Kumar (2007:4), por exemplo, criticam as abordagens do tema baseadas na teoria

da agência por fazerem do agente de crédito uma espécie de marionete desenraizada

socialmente. Seu trabalho procura mostrar que os agentes de crédito não são apenas

indivíduos auto-interessados atuando em nome de um principal e regidos por um contrato.

É bem verdade que parte da pesquisa recente fortalece a opinião de Ana Marr (2004), acima

citada, segundo a qual os laços de proximidade próprios às microfinanças e o tipo de

intermediação em que elas se apóiam dificilmente conseguem superar a propensão ao

clientelismo e às formas personalizadas de dominação social Este não é, entretanto, o ponto

de vista de Canales (2005), em seu estudo sobre três organizações de microfinanças

mexicanas. Ele mostra como os laços informais e a ligação afetiva entre clientes e agente de

crédito permitem não apenas melhor conhecimento por parte deste último da situação local

em que atua, mas também lhe oferecem poderosos instrumentos de pressão para aumentar

as probabilidades de reembolso. Os agentes de crédito não são apenas cumpridores de

determinações vindas das organizações a que pertencem: eles têm significativa margem de

liberdade nas decisões que tomam.

Os trabalhos de Michel Ferrary vão também na mesma direção. Mesmo organizações

formais como os bancos parisienses apóiam-se em sistemas de proximidade e na

construção, por parte dos gerentes, de vínculos personalizados com o meio social da

clientela onde atuam. Canales (2005) mostra que há agentes de crédito que seguem “a letra

da lei – evitando vínculos pessoais com os clientes – ao contrário de outros que aplicam o

“espírito da lei” e cujo desempenho está ligado a sua proximidade dos clientes”. A

obrigação moral de devolver os recursos emprestados não é genérica e impessoal, mas se

insere em relações personalizadas, tanto no caso do crédito aos desempregados na França

(Ferrary, 2006), nos empréstimos formais feitos por bancos (Ferrary, 2003), como nas

organizações de microfinanças estudadas por Canales (2005) no México.

Page 12: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

10

3. UM SISTEMA DE CRÉDITO CRIADO PELO ESTADO

3.1. SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA AO PROBLEMA DA SELEÇÃO DOS CLIENTES

Os mercados financeiros rurais latino-americanos são segmentados, pouco dinâmicos, não

competitivos e ineficientes (Trivelli e Venero, 2007, Wenner et al., 2002). Esta

precariedade, no Brasil, é agravada pela escassa tradição histórica de grupos financeiros

informais no meio rural. É verdade que a “venda na palha” no Nordeste, (Garcia, 1983,

Abramovay, 2008), o “regatão” no Norte (referência) e a “caderneta do colono” no Sudeste

e no Sul (modalidades de financiamento do consumo familiar dos agricultores contra algum

tipo de garantia de aquisição da safra) foram muito comuns até, no mínimo, o início dos

anos 1970. Mas não se formou no Brasil nada que se compare à densidade das finanças

informais na Indonésia - em que milhões de “arisan” (grupos de crédito rotativo) existem

até hoje (Martowijoyo, 2007:6) - ou no México, que possui uma longa e variada tradição

histórica de instituições locais que estão na origem de organizações contemporâneas como

as cajas populares, as cooperativas de poupança e crédito ou as redes de micro bancos

(Gómez Soto e Gonzáles Vega, 2006, Muñoz Rodríguez et al. 2002).

Esta circunstância histórica se explica, ao menos parcialmente, pela proibição formal, desde

1967, de organizações financeiras que captassem poupança do público e que não fossem

rigidamente controladas pelo Banco Central do Brasil. A instabilidade financeira e a

inflação que acompanharam a vida nacional até meados dos anos 1990 são fatores que

bloquearam o surgimento de organizações financeiras associativas em larga escala no País,

seja no meio urbano seja no meio rural. Por fim, é importante assinalar que o próprio setor

agrícola patronal brasileiro sempre foi financiado (desde a fundação do Banco do Brasil na

primeira metade do Século XIX) por bancos pertencentes ao Estado, o que, é claro, limita a

formação de um sistema privado voltado a esta finalidade.

É neste contexto que foi formado, sob intensa pressão do Movimento Sindical de

Trabalhadores Rurais, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

(PRONAF), em 1995. Ele tem o objetivo explícito de romper com a marca dominante das

Page 13: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

11

políticas agrícolas brasileiras até então: a sistemática transferência de recursos públicos

subsidiados basicamente a grandes proprietários, ou, quando muito, àquelas camadas mais

prósperas da agricultura familiar, situadas no Sul do País e altamente integradas à

agroindústria. Optar por uma solução que se apoiasse em atores privados ou associativos

para fazer chegar o crédito aos mais pobres – como o preconizam os adeptos do “novo

paradigma das microfinanças rurais” - poderia ser teoricamente mais interessante, mas

certamente não responderia à importante pressão política que se fazia nesta direção no

início dos anos 1990 e envolvia o risco mais que provável de pura e simples paralisia.

O PRONAF enfrenta dois desafios básicos que serão decisivos para sua evolução

institucional:

a) Embora o programa se apóie em recursos públicos ele é levado adiante por bancos

comerciais (1). Existe, portanto, desde o início, uma tensão entre o objetivo de

ampliar a base social da política de crédito e as necessidades bancárias de obtenção

de informações e garantias capazes de reduzir os riscos de inadimplência.

b) O Programa visa corrigir uma distorção histórica da política de crédito rural,

permitindo que os recursos cheguem a milhões de famílias que até então a eles não

tinham acesso. Mas estas famílias teriam que ser selecionadas evitando que grandes

proprietários, profissionais liberais ou assalariados de alta renda do interior do País,

que possuíssem um sítio de recreio, pudessem ser caracterizados como “agricultores

familiares”. Na verdade, a seleção dos clientes é um dos mais importantes desafios

de qualquer organização e de qualquer programa de crédito. O que está em jogo

nesta seleção são mecanismos de transmissão de informação entre tomadores de

1 Alvarado et al. (2002:14) mostram a tendência geral de que os bancos estatais, durante os anos 1990, passem a reger-se segundo as regras dos bancos comerciais. O Banco do Nordeste é, antes de tudo, um banco de desenvolvimento: 90% de sua carteira é formada por crédito de longo prazo. Mas, suas operações comerciais sujeitam-se às regras prudenciais em vigor no sistema bancário e submetem-se às orientações dos Acordos de Basiléia.

Page 14: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

12

recursos e os que os emprestam (2). Nas organizações de microfinanças, o desafio

de localizar o cliente com as características do público almejado é resolvido, quase

sempre, por meio de relações sociais diretas seja entre os participantes dos

programas, como os grupos solidários (Cassar et al., 2007, Ritchie, 2007), seja por

meio da inserção local do próprio agente de crédito (Canales, 2005), como foi visto

acima, no item 2.2. No caso brasileiro, este desafio foi enfrentado pelo apelo à

participação de organizações locais, como o movimento sindical de trabalhadores

rurais e as organizações estaduais de assistência técnica e extensão rural (3). Estas

organizações são fortemente inseridas localmente. No entanto, sua capacidade de

selecionar clientes é extremamente limitada. O que elas podiam fazer – e fizeram –

é eliminar aqueles que não pertenciam ao público potencial do programa e oferecer

algum auxílio administrativo para facilitar o preenchimento de formulários,

reduzindo os custos bancários na administração do programa. O que elas não

podiam fazer é selecionar clientes pela qualidade de seus projetos ou pelo

conhecimento individualizado de cada tomador e por sua disposição a devolver

no prazo os recursos tomados. Este segundo desafio envolve, portanto, uma tensão

entre o crédito como resultado de informações que fazem parte de um contrato

capaz de reduzir os riscos de ambos os lados e o crédito como puro e simples

direito social, cuja atribuição se faz de maneira massiva e onde a noção de risco

fica quase excluída.

Este duplo desafio (bancos comerciais e de desenvolvimento pertencentes ao Estado,

conduzidos a atender um público que não faz parte de sua clientela, por um lado, e clientes

2 Os professores Alain de Janvry e Elizabeth Sadoulet da Universidade da Califórnia (Berkeley) conduziram um projeto de pesquisa sobre informações de crédito (BASIS/USAID). Ver, por exemplo, McIntosh e Wydick (2004) e Bittencourt et al. (2006), elaborado especialmente para o projeto BASIS/USAID. 3 Na esmagadora maioria das vezes, a assistência técnica não levava adiante práticas que permitissem atenuar a escassez de meios técnicos do agricultor com orientações organizativas que melhorassem o exercício de suas atividades. A extensão atuava fundamentalmente como um elo na cadeia administrativa que levava à concessão do crédito e não como organismo de melhoria das técnicas produtivas, organizativas e de comercialização.

Page 15: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

13

selecionados por suas características sócio-econômicas e não pela qualidade de seus

projetos ou por sua disposição de pagamento, por outro) foi enfrentado basicamente de duas

maneiras. Os bancos estatais passaram a receber diretamente do Tesouro recompensa por

trabalharem com o público do PRONAF (Bittencourt, 2003). Além disso, em muitos

municípios foram constituídos fundos de aval a partir dos recursos do próprio PRONAF

(Parente, 2003) e que serviriam de garantia ao banco em caso de não pagamento. Quanto à

seleção do público do Programa, foi criada a Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP),

documento emitido seja pelo sindicato local, pelo escritório local de extensão rural ou

outras organizações credenciadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário capazes de

atestar que o agricultor realmente correspondia ao que era definido como o público do

programa pela política governamental (4).

A pergunta básica na construção de qualquer organização financeira – como montar um

sistema de informações capaz de selecionar os clientes dotados dos melhores projetos e das

melhores condições de pagamento – recebeu, no âmbito do PRONAF, uma resposta

político-administrativa . Isso significa que o temor – tão freqüente na literatura de

microfinanças - de captura dos subsídios embutidos no PRONAF por segmentos sociais não

visados pela política foi evitado por controles administrativos com forte base local. A

contrapartida desta garantia é que o crédito passa a ser visto e vivido pelos atores como

direito de certo grupo social e não se colocam em funcionamento mecanismos que possam

selecionar, no interior deste grupo social, os que realmente podem corresponder ao que

deles pode esperar uma organização financeira.

Nestas condições é óbvia, no início do Programa, a resistência dos bancos estatais a ampliar

de fato seu público. É bem verdade que no final de 1996, o PRONAF já atinge mais de 300

mil agricultores e em 1997 quase dobra de tamanho. Mas, apesar de sua extensão o

4 Uma vez que o acesso ao PRONAF envolve subsídios públicos, todos os agricultores com Declaração de Aptidão ao PRONAF estão listados nominalmente com acesso público pela internet, por município (http://smap.mda.gov.br/credito/dap/dap.asp): é uma forma de evitar que recebam os recursos indivíduos que não fazem parte do público alvo do Programa. A definição legal da DAP e as organizações que podem emiti-las estão em http://www.mda.gov.br/saf/index.php?sccid=697.

Page 16: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

14

PRONAF revela, neste seu início, uma tríplice concentração: são financiados de forma

esmagadoramente majoritária agricultores do Sul do Brasil, entre estes, os que se dedicam

aos produtos de maior integração agroindustrial e, em grande medida, segmentos mais

prósperos da agricultura familiar (Abramovay e Veiga, 1999).

Nestas condições, a agenda da política agrícola passa a ser fortemente pressionada por

amplo leque de movimentos sociais (aí não mais apenas o Movimento Sindical de

Trabalhadores Rurais, mas também o Movimento dos Pequenos Agricultores, ligado ao

Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) visando maior democratização do crédito.

Quando da vinda ao Brasil do Papa João Paulo II, em 1997, um grupo de agricultores,

ligados ao Movimento dos Pequenos Agricultores entra em greve de fome, é recebido pelo

Papa e, daí resulta uma transformação decisiva na própria lógica do PRONAF, a partir de

1999, durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso.

3.2. GARANTIA ESTATAL E TECNOLOGIAS DE EMPRÉSTIMO

O caminho encontrado para ampliar de maneira rápida o público do PRONAF foi a criação

de uma vertente em seu interior, voltada especialmente a populações vivendo próximo à

linha de pobreza (5).Hoje, o atendimento aos segmentos que se encontram na base da

pirâmide social da agricultura familiar (o PRONAF B) visa agricultores com faturamento

bruto anual até R$ 4.000,00, excluídos os benefícios da previdência social e o bolsa-

família. O Programa assume claramente que são famílias pluriativas que, na maior parte

dos casos, não retiram do estabelecimento o essencial de seus meios de vida. Estas famílias

fazem jus a empréstimos de até R$ 1.500,00, valor a ser reembolsado em até dois anos após

a tomada do financiamento. A taxa de juros é de 0,5% ao ano e há um bônus de

adimplência de 25% do valor principal e dos juros.

5 A Declaração de Aptidão do Produtor enfrenta o problema da seleção social da clientela determinando a que classe de renda pertence o agricultor que a recebe e, portanto, a que modalidade de crédito ele faz jus. Na página do PRONAF o leitor poderá encontrar todas as categorias de renda em que foi subdividido o Programa, os financiamentos a elas correspondentes, as taxas de juros e os prêmios de pontualidade no pagamento de seus créditos.

Page 17: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

15

Os recursos para esta linha provêm de duas fontes. Do Orçamento Geral da União e dos

Fundos Constitucionais: a Constituição de 1988 destinou 3% do Imposto de Renda e do

Imposto sobre Produtos Industrializados a fundos atuando no Norte (FNO), no Centro-

Oeste (FCO) e no Nordeste (FNE). A grande diferença entre estas duas fontes – para a

discussão levada adiante neste artigo – é que as punições pelo não pagamento da dívida são

diferentes conforme a fonte dos recursos emprestados. Sob o ângulo legal, somente o

dinheiro vindo do Tesouro pode ser objeto de inclusão na dívida ativa da União, em caso de

inadimplência (6).

Mas a grande novidade desta nova vertente do PRONAF (o PRONAF B e que se

concentrou no Nordeste, nas áreas mais pobres de Minas Gerais e no Norte do País) é que –

como já se fazia para os financiamentos destinados a populações assentadas – não há risco

bancário nas operações. Convém destacar cinco traços básicos do PRONAF B que vão

fundamentar as novas tecnologias de empréstimos expostas na parte 4 deste trabalho.

a) Os tomadores de empréstimo não tinham qualquer relação orgânica com o Banco de

quem tomavam o empréstimo. Para o BNB a situação era tanto mais paradoxal que

ele, quando tem início o PRONAF B, em agosto de 2000, já acumulara larga

experiência na construção daquele que hoje é o mais importante sistema de

microcrédito urbano da América Latina, o CREDIAMIGO.

b) Os atores locais envolvidos com a concessão dos empréstimos (sindicatos e

extensão) estão interessados fundamentalmente em ampliar o público do programa e

cumprir as exigências formais necessárias para esta finalidade. Mas não há qualquer

sinalização real com relação à importância do pagamento da dívida.

6 Isso não quer dizer que esta inclusão seja o melhor método de combate à inadimplência. Em primeiro lugar, ela envolve custos de transação imensos dados pela desproporção entre as exigências burocráticas decorrentes da inscrição na dívida ativa da União e o baixo montante devido pelo agricultor. Além disso, esta inscrição acabaria por eliminar definitivamente o devedor do sistema e não estimularia seu pagamento. Só o fato de o pagamento ter que ser feito junto a um órgão público (e não junto ao banco) já inviabiliza que a grande maioria dos devedores o faça.

Page 18: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

16

c) Não existe projeto produtivo específico a cada produtor, onde as chances e os riscos

sejam avaliados. A assistência técnica oficial não cumpre o papel que os agentes de

crédito exercem nas organizações de microcrédito. Ela limita-se a preencher

formalidades necessárias à obtenção dos recursos e opera de maneira padronizada,

com base naquilo que, em campo, os atores locais não hesitam em caracterizar

como um “kit” produtivo. 36,8% dos entrevistados por Gomes da Silva (2007) e que

receberam PRONAF B declararam não ter nenhuma renda monetária a partir do

que fazem no estabelecimento para cuja melhoria tomaram o empréstimo. É

interessante observar que os entrevistados por ele declaram conhecer as regras do

programa, os prazos de pagamento das parcelas e os montantes devidos. Mais que

isso: “eles sabiam que deviam pagar dentro do prazo de vencimento, para ter direito

ao bônus de 25% do valor financiado” (Gomes da Silva, 2007, p. 9). O trabalho

qualitativo de Gomes da Silva deixa claro que os agricultores percebem o crédito da

mesma maneira que outros programas de transferência de renda: um montante ao

qual a precariedade de sua situação lhes abre direito .

d) As informações sobre crédito limitam-se às dos serviços de proteção ao crédito e

são apenas negativas. Não há qualquer dispositivo capaz de valorizar informações

positivas quanto à capacidade de pagamento dos atores. A questão central em

qualquer relação de crédito - a informação sobre os riscos – (Guirkinger e Boucher,

2005) está totalmente afastada desta modalidade de operação. Tampouco existem

mecanismos sentidos pelos atores locais como eficientes para punir a inadimplência,

além daquele que consiste em não renovar o crédito de quem está devendo.

e) Neste contexto não é de se estranhar que atores locais (políticos, sindicalistas)

estimulem os agricultores a não honrarem seus compromissos, tanto pelo fato de o

crédito ser um direito ligado ao pagamento de uma imensa dívida social, como com

o argumento de que haverá renegociação dos débitos. Frases como “chegou o 13º

salário, pago pelo Governo” ou, logo no início do Programa, “pega R$ 500,00 que

só vai devolver R$ 300,00” eram bastante freqüentes. Como a prática de

Page 19: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

17

renegociação de dívidas é comum no âmbito da agricultura patronal (Dias, 2007,

Rezende, 2008), aumenta o sentimento social de legitimidade quanto ao não

pagamento do que se deve. Na verdade, o contexto geral de implantação do

PRONAF é o de um País cujas políticas públicas nunca sinalizaram claramente a

noção de risco para a atividade agrícola, a começar pela agricultura patronal. Este é

um componente decisivo do ambiente institucional em que o PRONAF é construído

e na maneira como se formam o que Avner Greif (2005) define como as motivações

inerentes ao funcionamento de seu aparato institucional.

3.3. A AMEAÇA DA INADIMPLÊNCIA

Estas cinco características resumem a modalidade convencional de atribuição do PRONAF

B que, desde 2005, começa a ser substituída por tecnologias cuja exposição é objeto da

parte 4 deste trabalho. Nesta modalidade convencional, o saldo devedor dos agricultores,

em outubro de 2007 era de 895 milhões de reais. Deste total, 280 milhões estavam em

atraso. Dos 768 mil agricultores contemplados com o financiamento, 229 mil não haviam

honrado pontualmente seus compromissos 7.

Existem quatro razões possíveis para um devedor não pagar o que deve a uma organização

financeira. A primeira refere-se a condições possivelmente draconianas quanto às taxas de

juros e aos prazos do empréstimo. A segunda vem de catástrofes como seca, enchente,

morte ou doenças de animais ou de membros da família. A terceira pode ser determinada

pela própria pobreza da família - agravada por ausência de orientação técnica e falta de

acesso aos mercados - que a impede de investir e a obriga a consumir o que tomou

emprestado para sua sobrevivência. A quarta é de natureza moral e habitualmente exprime

uma cultura disseminada legitimando o não pagamento. Na avaliação da inadimplência, é

7 Este cálculo baseia-se no retrato da situação de outubro de 2007. Ele não leva em consideração os contratos devidamente liquidados que devem ser muito importantes, já que o programa existe desde 2000. Na verdade, uma imagem realista da inadimplência exigiria a montagem de planilhas capazes de acompanhar, desde o começo do PRONAF B, o início e o vencimento dos contratos ao longo do tempo e não apenas um retrato a partir de um mês. Infelizmente as informações não são disponíveis desta maneira.

Page 20: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

18

muito importante separar estes fatores. O que os dados expostos abaixo indicam é que os

não pagamentos, no caso do PRONAF B, devem-se fundamentalmente à difusão, por parte

de organizações locais, da mensagem de que os créditos serão renegociados e que, portanto,

não vale a pena honrar os compromissos assumidos.

Os dados de inadimplência aqui expostos correspondem a certo momento no tempo. É

bastante verossímil a hipótese de que os 30% de inadimplência tendem a aumentar,

conforme outros contratos forem vencendo. É o temor deste crescimento que está na raiz de

um conjunto de medidas, das quais uma das mais importantes foi a portaria 105, da

Secretaria de Agricultura Familiar, do MDA, publicada no dia 3/12/2007 com três

determinações fundamentais:

a) Até o dia 20 de cada mês, em cada município onde houver PRONAF B, os bancos

devem mandar para a Secretaria de Agricultura Familiar a situação municipal da

inadimplência.

b) Quando a taxa de inadimplência atingir 15% dos contratos e, isso corresponder a 50

contratos ou mais, novos financiamentos nesta linha deverão ser suspensos no

município. A portaria diz (artigo 2º parágrafo 2º) que a SAF/MDA publicará

mensalmente a lista dos municípios onde a inadimplência atingiu estas proporções.

Só terão direito a novos financiamentos pelo PRONAF B agricultores que já

tiveram o crédito e pagaram-no pontualmente ou aqueles novos agricultores cuja

atribuição de financiamento for feita sob as novas tecnologias de empréstimo das

quais a praticada pelo Banco do Nordeste e que será exposta na parte 4 deste

trabalho. Também agricultores produtores de matéria-prima no âmbito do Programa

Nacional de Produção e Uso de Biodiesel continuam tendo direito ao PRONAF B.

c) Os municípios inadimplentes devem elaborar um Plano Municipal de Aplicação e

Recuperação das Operações da Linha de Crédito do Grupo “B” do Pronaf (PMAR),

por meio de seu Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural ou de Comissão

especialmente criada para este fim. Este plano deverá conter o diagnóstico da

Page 21: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

19

inadimplência, as medidas para a recuperação das dívidas, bem como o que será

feito para o funcionamento salutar do programa, depois que a dívida tiver sido

reduzida a menos de 50 contratos.

A aplicação destas medidas vai exigir um imenso esforço de mobilização. O gráfico 1 e a

tabela 1 mostram que cerca de três quartos dos municípios que receberam PRONAF B têm

inadimplência superior a 15%.

Gráfico 1

Tabela 1

Distribuição dos municípios por intervalos da taxa de inadimplência Intervalos Número de municípios Proporção de Municípios

0 28 1,42%

entre 0 e 15% 450 22,89%

entre 15% e 30 % 468 23,80%

entre 30 % e 60% 541 27,52%

entre 60% e 100% 479 24,36%

Totais 1966 100%

A tabela 2 e o gráfico 2 referem-se aos municípios cuja inadimplência situa-se entre 0 e

15%. Como era de se esperar, na sua grande maioria (três quartos dos casos) são

Page 22: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

20

municípios em que há poucos contratos. O que significa, presumivelmente, que o aumento

do número de contratos nestes municípios – sob as modalidades convencionais de

atribuição do crédito, bem entendido - conduziria igualmente à elevação da inadimplência

além dos 50 contratos. Significa também que nas situações de inadimplência abaixo de 15%

são poucos os municípios com grande número de empréstimos.

Gráfico 2

Tabela 2

Distribuição dos municípios com inadimplência entre 0 e 15% em intervalos para o número de contratos em atraso

Intervalos (número de contratos em

atraso)

Número de municípios Proporção de Municípios

50 368 76,99%

entre 50 e 100 58 12,13% entre 100 e

500 52 10,88%

entre 500 e 1000

0 0,00%

Mais de 1000 0 0,00%

Totais 1966 100%

Page 23: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

21

Já para os municípios com inadimplência superior a 15%, é bem maior a concentração no

número de contratos por município: 70% dos municípios com taxa de inadimplência maior

do que 15% possuem mais de 50 contratos em atraso, como se vê pelo gráfico 3 e pela

tabela 3.

Gráfico 3

Tabela 3

Distribuição dos municípios com inadimplência maior do que 15% em intervalos para o número de contratos em atraso

Intervalos (número de contratos em

atraso)

Número de municípios Proporção de Municípios

50 459 12,30% entre 50 e 100 362 11,63%

entre 100 e 500

607 69,29%

entre 500 e 1000

59 6,72%

Mais de 1000 1 0,07% Totais 1966 100%

Existem nada menos que 1029 municípios, dos quais a maior parte encontra-se nos Estados

do Nordeste, que superam 15% de inadimplência e, ao mesmo tempo, o número de 50

Page 24: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

22

contratos em atraso. É a este considerável conjunto que deverá aplicar-se o esforço de

mobilização indicado na Portaria 105.

Convém chamar a atenção para dois elementos que explicam a adoção por parte do Banco

do Nordeste e do Governo Federal das novas tecnológicas de empréstimos examinadas logo

abaixo:

a) A inadimplência é tão generalizada que não poderia ser atribuída a qualquer

circunstância local ligada a fatores climáticos ou mercadológicos. Há duas

justificativas para esta afirmação. Em primeiro lugar, fatores climáticos negativos

não podem ser tratados como surpresa, mas ocorrem de maneira regular na região.

A atribuição de crédito tem que contar com o fato de que as condições climáticas da

região são negativas e procurar atividades e tecnologias menos expostas a suas

conseqüências. Sem isso, as chances de os atores viverem os financiamentos

recebidos como transferência de renda aumentam enormemente. Isso envolve não

só cisternas, como métodos para garantir a alimentação animal em condições

climáticas adversas. A segunda justificativa baseia-se numa evidência expressiva e

cujo aprofundamento estatístico vai além dos objetivos deste trabalho. Foram

considerados – dentre os municípios com mais de 50 contratos e mais de 15% de

inadimplência – os dez que apresentam maior proporção de contratos não pagos.

Verificou-se então, entre estes dez municípios de maior proporção de contratos não

pagos, quantos registraram junto à Secretaria Nacional de Defesa Civil

(http://www.defesacivil.gov.br/situacao/municipios.asp) a decretação de estado de

urgência ou calamidade entre 2004 e 2007. Dos dez municípios com maior

proporção de inadimplência, nenhum teve episódios climáticos que justificassem o

não pagamento dos empréstimos por seca ou inundação. Foram então considerados

os dez municípios que apresentaram a maior quantidade absoluta de contratos

não pagos, verificando-se em quantos, entre estes, o estado de emergência ou

calamidade foi decretado: somente em três deles. Claro que estes dados podem ser

Page 25: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

23

aprofundados, mas esta evidência anedótica já é bastante ilustrativa da dissociação

ao menos parcial entre inadimplência e catástrofes naturais.

b) A inadimplência é maior conforme aumenta o número absoluto de empréstimos, o

que fortalece a idéia de que os não pagamentos vinculam-se àquilo que os

economistas costumam chamar de “efeito manada”. O que está em jogo não é tanto

a capacidade de pagamento dos devedores, mas a generalização de que é desejável,

é possível e é aceitável não honrar suas dívidas com o PRONAF B.

Page 26: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

24

4. O AGROAMIGO

Tecnologias de empréstimo baseadas em relações de proximidade, com um papel de

destaque ao agente de crédito podem reverter o quadro de inadimplência acima descrito?

Os três primeiros anos de funcionamento do AGROAMIGO fornecem indicações bastante

promissoras a este respeito. De uma carteira total de R$ 284,7 milhões emprestados sob

esta nova modalidade, apenas 3,2% estavam em atraso. Dos 260 mil agricultores que

tomaram PRONAF a partir do AGROAMIGO, 17 mil estavam em atraso 8.

A grande novidade do AGROAMIGO é que os financiamentos passam a ser geridos por um

assessor de crédito, responsável por uma carteira de projetos e que estabelece uma relação

personalizada com cada agricultor beneficiário do Programa. Vejamos a questão mais de

perto.

a) A base da nova tecnologia de empréstimo está na proximidade e no conhecimento

pessoal que existe entre o assessor de crédito e o agricultor. O agricultor não tem

mais a relação impessoal com uma instância que não pertence a sua vida cotidiana e

que lhe serve apenas de meio de chegada do dinheiro: o banco. Ter acesso ao

crédito depende agora da elaboração de um projeto na companhia de alguém que

pertence a sua comunidade. O assessor de crédito é um técnico agrícola que procura

transmitir ao tomador do empréstimo a idéia de que os recursos não lhe são

atribuídos simplesmente por um “direito”, mas como parte de um projeto de geração

de renda. As decisões de empréstimo, neste sentido, decorrem das relações

descentralizadas entre assessor de crédito e agricultores (Canales, 2005). Passa a

existir entre o agricultor e o Programa um ponto de contacto encarnado,

corporificado numa figura que pertence ao universo social local. É importante levar

em conta um intenso – e contínuo - trabalho de formação dos agentes de crédito não

apenas em técnicas contábeis e administrativas, mas, sobretudo no que se refere a

8 Aqui também, esta informação refere-se a outubro de 2007: na verdade, ela só toma real sentido caso se coloque o total da inadimplência sobre os contratos vencidos e não sobre o total que ainda se encontra em carência.

Page 27: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

25

sua missão. Da mesma forma que o mostra Ferrary (2006), no estudo do

microcrédito dirigido a desempregados na França, no AGROAMIGO, igualmente,

“o contrato de financiamento torna-se um pretexto para a construção de um laço

social entre o financiador e o financiado pelo qual vão transitar não apenas recursos

financeiros, mas igualmente conselhos, recursos não monetários, relações,

sustentação psicológica e uma valorização simbólica da atividade profissional”. O

assessor de crédito traz ao agricultor informações básicas a respeito de higiene

animal e de organização econômica que faz toda a diferença no momento da

utilização do crédito. Ele não é um extensionista e não substitui o que deve fazer a

assistência técnica. Mas o assessor de crédito injeta conhecimento no interior da

unidade produtiva que – embora de maneira simples, com conselhos elementares –

contribui à viabilidade de atividades econômicas ao alcance das capacidades locais.

Este vínculo pessoal será importante nas motivações socialmente construídas que

levarão ao pagamento da dívida ou à inadimplência. O vínculo personalizado com o

assessor de crédito inscreve o pagamento da dívida no interior das obrigações em

torno das quais se faz a própria reprodução da vida local. É claro que a proximidade

pode abrir caminho igualmente a empréstimos realizados de maneira inadequada e

pouco criteriosa, por razões familiares ou de amizade. Mas, como será visto adiante,

o risco do assessor de crédito, neste caso é imenso e, de fato, no início do Programa

aqueles que não foram capazes de compreender que suas funções exigiam colocar

limites a ambições pouco consistentes, foram despedidos. Como bem mostra o

trabalho de Canales (2005), a concessão do crédito, por parte do assessor de crédito,

em situação de forte inserção localizada, é um ato de confiança pessoal. O não

pagamento, portanto, envolve quebra não de um compromisso genérico e anônimo,

mas da reciprocidade que é básica na construção dos vínculos de uma sociedade de

interconhecimento. A informação que o assessor de crédito detém sobre a vida da

comunidade traz em si a forte tensão entre a expectativa de que possa atender às

urgências derivadas de vários tipos de necessidade cotidiana e as exigências

profissionais do rigor de seu trabalho. Pior: no caso brasileiro, haverá uma tensão

Page 28: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

26

entre um passado muito recente em que o crédito era distribuído de forma

indiscriminada e a tentativa agora de submeter sua concessão a critérios técnicos

rigorosos. À existência de um corpo organizado de centenas de agentes de crédito

atuando em diversos municípios na mesma direção, faz pender a balança para o lado

do rigor na concessão dos empréstimos, mas não suprime os vínculos pessoais em

eles se apóiam, nem o peso da forma burocrática que marcou a existência do

PRONAF durante anos. Daí a importância de as finanças de proximidade – que

podem oferecer motivações (Greif, 2005) socialmente válidas para o uso adequado e

o pagamento dos recursos devido – acoplar-se claramente a mudanças no ambiente

institucional capazes de sinalizar aos indivíduos as punições que vão derivar da

tentativa de perpetuar suas dívidas.

b) Atualmente existem 400 assessores de crédito que operam estas novas tecnologias

de empréstimo e a idéia é que este número se estabilize em torno de 500 até o final

de 2008. Cada um deles é responsável pela gestão de uma carteira de projetos.

Nenhum crédito é atribuído sem que o agricultor participe de algumas reuniões

explicativas. O assessor visita, pessoalmente, no mínimo, metade dos clientes

atendidos. Em caso de inadimplência o contato com o assessor de crédito é

imediato. Os créditos agropecuários têm prazos de vencimento maiores que os do

microcrédito urbano. Isso permite que o tamanho da carteira do assessor voltado ao

PRONAF seja superior ao daquela do assessor do CREDIAMIGO, em meio urbano.

Em média, cada assessor de crédito deve chegar a 1.200 clientes a cada dois anos,

período pelo qual acompanha seus projetos (9). A remuneração deste agente de

crédito corresponde à mistura entre um pagamento fixo de R$ 600,00 reais mensais,

9 Guérin e Kumar (2007) consideram excessivo o tamanho da carteira gerida pelos agentes de crédito da região que estudaram, na Índia: igualmente de 1.200 clientes. Mas no caso brasileiro, os assessores de crédito se deslocam em motocicletas e contam com estradas, ao que tudo indica, em melhores condições que na Índia. Além disso, é parte decisiva da formação dos assessores de crédito brasileiros, tomar distância da politização dos empréstimos, que é um dos traços essenciais da atuação das ONGs indianas, que chegam a convocar clientes para participar de manifestações eleitorais, o que seria impensável para um assessor de crédito brasileiro (Guérin e Kumar, 2007).

Page 29: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

27

mais uma remuneração variável em função do tamanho da carteira e da

adimplência. Isso significa que embora não haja risco na operação para o Banco que

concede o empréstimo, este risco é real para o agente de crédito que concretiza a

operação. Se o agricultor não paga, ele prejudica o assessor de crédito direta e

pessoalmente, o que reforça a dimensão já mencionada da quebra da reciprocidade

nas relações locais. Pode-se dizer que estas tecnologias de empréstimos introduzem

a noção de risco não em instituições formais, mas nos próprios vínculos locais.

c) Uma das possíveis reações do assessor de crédito aos riscos da gestão de sua

carteira seria a seleção de clientes que escapam aos objetivos da organização. No

limite, poderia ser reproduzida a situação inicial do PRONAF, em que os bancos

selecionavam pela riqueza (screening on wealth, para usar a expressão de Aubert et

al., 2002). Este risco será reduzido por meio de dois mecanismos básicos. O

primeiro é a própria Declaração de Aptidão ao PRONAF, que continua sendo a base

primeira para a concessão do crédito. O segundo mecanismo é ainda mais

importante: parte da demanda por crédito para os segmentos mais pobres da

agricultura familiar tenderá a ser atendida por outro programa do Banco do

Nordeste: o Crediamigo Comunidade, produto do Crediamigo, que atende as

atividades urbanas nos segmentos de indústria, comércio e serviços, bem como

atividades não agrícolas no meio rural e/ou semi-urbano. Como forma de apoio à

expansão do microcrédito, o Governo Federal determinou que 2% dos depósitos à

vista dos bancos comerciais sejam aplicados no Programa de Microcrédito

Produtivo Orientado. Estes recursos formam o funding de Programa de

Microcrédito Produtivo e Orientado do BNB – o Crediamigo que procura

contemplar tanto segmentos cujas condições não permitem tomar recursos pelo

CREDIAMIGO, no meio urbano, como aqueles que tampouco preencheriam

condições de probabilidade de adimplência nos financiamentos agropecuários.

d) A comparação entre PRONAF B e CREDIAMIGO é problemática, já que as

atividades urbanas são financiadas com taxas de juros mensais líquidas que variam

Page 30: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

28

de 1,95 a 4% e nas agropecuárias as taxas são não apenas negativas (quando

comparadas com a inflação), mas existe um prêmio de pontualidade no pagamento

que corresponde a um subsídio de 25% sobre o principal (e os juros). Por outro

lado, a viabilidade econômica das atividades urbanas é muito maior e seus riscos

bem menores do que aqueles a que se expõe o agricultor. Portanto, caso se

considerem os recursos emprestados como base para a geração de renda, a verdade é

que nem todo o universo dos agricultores vivendo em situação de pobreza é hoje

capaz de levar adiante projetos que permitam atividades que permitirão fazer frente

aos empréstimos do PRONAF B, ainda que sejam altamente subsidiados. A

extensão do CREDIAMIGO comunidade ao meio rural é uma forma de estimular

não apenas a educação para o crédito, mas também de preparar o agricultor para

investimentos de maior porte.

e) O CREDIAMIGO comunidade funciona como um “village bank”. É formado um

grupo entre quinze e trinta pessoas sobre a base de indicações estritamente pessoais.

Existe um assessor de crédito que faz uma convocação geral da iniciativa, que a

explica, procurando sensibilizar a comunidade para sua importância e acompanha

sua implantação. Mas este assessor jamais indicará um membro para participar no

grupo nem tão pouco assumirá responsabilidades executivas em sua gestão

cotidiana. O grupo vai constituir uma organização própria que funciona como um

banco de propriedade coletiva: tem um nome, os indivíduos nela fazem depósitos

numa conta de poupança aberta no Banco do Nordeste em nome de três de seus

representantes. Além disso, cada participante do grupo possui uma conta

simplificada, o que já dá início a sua bancarização. Há regras com relação aos

pagamentos, à pontualidade nas reuniões e ao comportamento dos membros. A

fundação do “banco” é um evento festivo com inauguração, fita e uma série de

rituais voltados a marcar o compromisso do grupo com seu sucesso. O

CREDIAMIGO admite emprestar a pessoas cujos nomes estão assinalados em

serviços de proteção ao crédito (desde que sejam dívidas pequenas e não bancárias).

Page 31: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

29

O indivíduo não precisa ter um ano na atividade (ao contrário do que ocorre com os

demais produtos do CREDIAMIGO) para fazer jus ao empréstimo. O

CREDIAMIGO Comunidade teve início em 2005 e, em dezembro de 2007 tinha

uma carteira ativa de R$ 5,6 milhões, com 20 mil clientes e 1.145“bancos” ativos.

Trata-se de um programa que vincula a obtenção de créditos à formação de

poupança por parte dos clientes: contrariamente ao que ocorre com o PRONAF B,

os empréstimos do CREDIAMIGO comunidade envolvem risco bancário. Cada

“banco” responde, de maneira descentralizada, por seus depósitos de poupança que,

ao todo, somavam, ao final de 2007, cerca de R$ 745 mil, que correspondem a 10%

dos valores emprestados naquela ocasião. Desde seu início o CREDIAMIGO

Comunidade liberou R$ 20,3 milhões, num total de 55,8 mil operações. O valor

médio liberado até aqui é de R$ 364,49. A perda é irrisória, com 0,18% do total

liberado e um saldo em atraso até 90 dias para os empréstimos ativos de 1,12%. O

CREDIAMIGO Comunidade e o PRONAF B têm em comum o fato de se dirigirem,

em grande parte, para beneficiários do bolsa-família, ou seja, famílias vivendo

muito próximo à linha de pobreza.

f) O AGROAMIGO possui uma forma de organização interna que favorece incorporar

a noção de risco ao conjunto dos atores que o compõem. Da mesma forma que no

CREDIAMIGO e no CREDIAMIGO Comunidade, o assessor de crédito do

AGROAMIGO não é funcionário do BNB. O Programa é gerenciado por uma

Organização Não Governamental, o Instituto Nordeste Cidadania, dirigida por

funcionários do BNB. Esta modalidade de organização reduz imensamente os

custos, já que as remunerações dos assessores de crédito são inferiores às de

bancários. Além disso, esta forma de operacionalização permite reduzir o

atendimento dos clientes na própria agência, o que é um importante elemento de

redução de custos. Os assessores de crédito são sistematicamente avaliados não

apenas pelo desempenho de sua carteira, mas também por monitores que também

entram em contato direto com os clientes e têm a função de impedir desvios na

Page 32: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

30

metodologia, antes que estes se traduzam em deterioração da qualidade da carteira

de crédito. A estrutura do AGROAMIGO é custeada pelo pagamento feito pelo

Governo Federal de 6% de comissão sobre o total financiado para a gestão do

PRONAF B.

Page 33: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

31

5. CONCLUSÕES

É possível reverter o quadro de crescente inadimplência do PRONAF B e, por aí, recuperar

os objetivos de uma das mais importantes iniciativas brasileiras de luta contra a pobreza

pelo estímulo à geração de renda. É perfeitamente compreensível que tanto as populações

beneficiárias do PRONAF B, quanto os atores sociais que junto a elas atuam – a extensão

rural e o sindicalismo – tratem o crédito muito mais como um direito do que como parte de

um contrato que envolve riscos e obrigações. A tradição da política agrícola brasileira,

durante décadas, consolidou a ausência da noção de risco na relação entre Estado e

fazendeiros. Ao eliminar o risco bancário das operações do PRONAF B, foi aberto o

caminho para a real massificação dos financiamentos. Ao mesmo tempo, consolidaram-se

práticas locais que acabaram por fazer do crédito pouco mais que uma modalidade de

transferência de renda.

A introdução de tecnologias de empréstimo que valorizem a proximidade pessoal entre

assessor de crédito e agricultor pode ser um fator decisivo para mudar esta atitude. Por um

lado, o assessor de crédito compõe uma rede social localizada que faz da reciprocidade

entre seus participantes um dos elementos da própria vida cotidiana. Atribuir crédito passa

a ser não a expressão de um direito genérico – como receber a aposentadoria ou a bolsa-

família – mas um gesto de confiança para o qual a retribuição é básica na própria

construção da vida social, como mostram os trabalhos de Marcel Mauss e sua tríade central:

dar, receber, retribuir. A existência deste vínculo personalizado permite que a relação com

um elemento aparentemente tão impessoal – o dinheiro – seja inserida em motivações

decisivas para a decisão de pagar ou não os empréstimos. É claro que esta relação pessoal

deve trazer ao agricultor elementos que ele não possuía anteriormente em termos de

informação e abertura de novas possibilidades de uso de seus recursos e, ao que tudo

indica, o assessor de crédito está especialmente preparado para fazê-lo – nos limites

permitidos pela situação de precariedade das economias junto às quais atua, bem entendido.

No caso brasileiro, os riscos apontados na literatura internacional, de que este poder do

assessor de crédito seja fonte de distorção – seja por seu uso político, seja pelo estímulo à

Page 34: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

32

seleção de clientes de maior renda – parecem estar afastados. Tanto a formação dos agentes

de crédito quanto mecanismos como a Declaração de Aptidão ao PRONAF reduzem as

chances de que o agente de crédito possa selecionar de forma discriminatória sua carteira de

clientes. O próprio limite do crédito do PRONAF B (de R$ 1.500 reais a cada dois anos) é

suficientemente baixo para reduzir o interesse de captura vindo de segmentos que não

fazem parte do público visado pelo Programa.. A existência de supervisores dos assessores

de crédito também contribui para especial vigilância neste sentido. Há um programa de

monitoria executado por meio tanto de análise à distância como presencialmente, em que

todas as unidades do AGROAMIGO são visitadas pelo menos uma vez ao ano. Nesta

ocasião é avaliado se a metodologia proposta está sendo colocada em prática, e são

entrevistados diversos parceiros, inclusive visitados produtores, para a avaliação dos

resultados do programa no município.

Mas exatamente aí está a tensão de cujo desenvolvimento vai depender a evolução do

PRONAF. Para que o assessor de crédito possa fazer sentir os recursos que atribui como

base de aplicações cujos resultados devem ser devolvidos pontualmente, ele terá que dispor

da possibilidade de negar financiamentos àqueles que – a seu critério - não preenchem os

critérios para tanto. A verdade é que, até agora, esta possibilidade é muito reduzida, já que,

em princípio, para receber o crédito, basta que o agricultor preencha certos requisitos

formais. Introduzir critérios qualitativos nesta relação é algo inédito. Não há organização

creditícia que possa funcionar sem dispor de mecanismos a partir dos quais financiamentos

possam ser recusados. Se estes mecanismos forem os convencionais – patrimônio,

garantias e cadastro negativo – a seleção terá natureza socialmente negativa. Aí reside a

utilidade das tecnologias de proximidade, como as expostas rapidamente acima para o

CREDIAMIGO comunidade ou as que começam a existir sob o AGROAMIGO. Mas é

fundamental que a atribuição do crédito deixe de ser uma decorrência automática da

condição de agricultor familiar de baixa a renda e passe, de fato, a exprimir a elaboração de

um projeto e a relação de confiança entre o agricultor e a organização que o financia, por

meio do assessor de crédito.

Page 35: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

33

Além disso – e mais importante – o efeito real da introdução de tecnologias de proximidade

nos empréstimos dependerá do sentimento de que a perpetuação da inadimplência será

seriamente punida. Exatamente por se tratar de público de baixíssima renda é fundamental

que circunstâncias objetivas (catástrofes naturais, doenças) envolvendo atrasos no

pagamento não sejam consideradas da mesma maneira que a disposição ao não pagamento

gerada por expectativa de renegociação. Ainda assim, é fundamental fortalecer mecanismos

que sinalizem claramente aos indivíduos que o não pagamento pontual de seus

compromissos será objeto de punição, salvo situações muito excepcionais. A caracterização

da inadimplência como ato ilícito não pode limitar-se àqueles financiamentos que se

originam no Orçamento Geral da União, mas tem que atingir igualmente outras fontes de

financiamento do Programa e particularmente os fundos constitucionais.

É impossível saber qual será a reação dos movimentos sociais diante do esforço

governamental de fazer com que agricultores em dívida com o Tesouro sejam declarados

publicamente como inadimplentes. O tema é tanto mais delicado que não envolve apenas os

devedores do PRONAF B, mas igualmente, os que receberam créditos produtivos após sua

instalação nos assentamentos. Muitos destes são organizados pelo Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra que nunca escondeu sua posição de que estes créditos não

deveriam ser pagos.

O horizonte institucionalista insiste no quadro legal e na capacidade de cumprimento de leis

que sinalizem aos atores os benefícios e os riscos dos contratos em que se envolvem. A

sociologia contemporânea e a perspectiva que procura estudar a capacidade de “self-

enforcing” das instituições colocam ênfase tanto nas redes sociais em que se localizam os

atores como nas motivações a partir das quais agem. A junção destas duas perspectivas é

especialmente interessante em estudos sobre sistemas de crédito, como mostra o trabalho de

Avner Greif (2005). Sua conseqüência prática, para o nosso caso, é que os resultados das

tecnologias de proximidade do PRONAF B não dependem apenas de sua execução correta,

mas também da efetiva incorporação, por parte de todos os protagonistas deste processo –

movimentos sociais, atores políticos locais e extensão – de que mesmo os pobres podem ser

Page 36: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

34

portadores de contratos e que, portanto, estão submetidos a riscos e possibilidades de

punições.

Page 37: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

35

REFERÊNCIAS

ABRAMOVAY (2008) Paradigmas do Capitalismo Agrário em Questão. São Paulo.

EDUSP.

___________________ (2004) “A densa vida financeira das famílias pobres” in

Abramovay, Ricardo (org) – Laços Financeiros na Luta contra a Pobreza. São

Paulo. FAPESP/Annablume.

____________________e José Eli da Veiga (1999) “Novas instituições para o

desenvolvimento rural: o caso do Programa Nacional de Fortalecimento da

Agricultura Familiar”. Brasília. IPEA. Texto para discussão 641.

ADAMS, Dale; Douglas Graham, e J.D. von Pischke (1984) Undermining Rural

Development with Cheap Credit. Boulder, CO: Westview Press.

ALVARADO, Javier, Francisco Galarza e Mark D. Wenner (2002) “Introducción”. In .

WENNER, Mark, Javier Alvarado e Francisco Galarza, orgs. (2002) Prácticas

prometedoras en finanzas rurales . Experiencias de América Latina y el

Caribe. Centro Peruano de Estudios Sociales/Banco Interamericano de Desarrollo

Academia de Centro América. Peru. San José. Washington.

ARMENDÁRIZ DE AGHION e Jonathan Murdoch (2005) The Economics of

Microfinance. Cambridge. The MIT Press

AUBERT, Cécile ; Alain de Janvrye Elisabeth Sadoulet (2002) “Lending to poor borrowers

and incentives for micro-credit agents” http://www.csae.ox.ac.uk/conferences/2002-

UPaGiSSA/papers/Aubert-csae2002.pdf. Extraído da internet em 15/12/2007.

BHATT, Niting e Shui Yan-Tang (2001) “Delivering Microfinance in Developing

Countries: Controversies and Policy Perspectives” Policy Studies Journal. Vol. 29,

No. 2:319-333

BITTENCOURT, Gilson A. (2003) Abrindo a caixa-preta: o financiamento da agricultura

familiar no Brasil. Dissertação de mestrado. IE/UNICAMP.

Page 38: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

36

_______________________; Reginaldo Magalhães Ricardo Abramovay (2005)

“Informação de crédito: um meio para ampliar o acesso dos mais pobres ao sistema

financeiro” PESQUISA & DEBATE , SP, vol. 16, número 2(28):203-248

CANALES, Rodrigo (2006) “Weaving straw into gold: enhancing microcredit impact

through personal involvement”. MIT. Sloan School of Management.

http://www.mit.edu/~rcanales/straw_gold.pdf. Extraído da internet em 20/12/07.

CASSAR, Alessandra, Lucas Crowley, and Bruce Wydick (2007) “The effect of social

capital on group loan repayment: evidence from field experiments” The Economic

Journal 117 (517): 85-106.

COASE, Ronald H (1960) “The Problem of Social Cost.” Journal of Law and Economics.

3:1-44

DIAS, Guilherme (2007) “Como sair do imbróglio da divida rural?”.

DIAS, Julio e João Helder Diniz (2004) “Crédito rural e economia solidária no Sub-Médio

São Francisco” in Abramovay, Ricardo (org) Laços Financeiros na Luta contra a

Pobreza. São Paulo. FAPESP/Annablume.

FERRARY, Michel (2003) “Trust and social capital in the regulation of lending activities”

Journal of Socio-economics 31:673?699

_________________ (2006) « Microfinance et lutte contre l’exclusion : Du contrat formel

de financement au contrat implicite de socialisation ». Sociologies Pratiques

n°13 :61-76

FLANDRIN LE MAIRE, Gwenaëlle e Aurélie Fontagné (2007) « Bancarisation des

milieux ruraux indiens par le biais de la microfinance ». Horizons Bancaires.

Nº334 :23-31.

FLIGSTEIN, Neil (2001) – The Architecture of the Markets – N. J. Princeton University

Press

Page 39: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

37

FUENTES Gabriel A. (1996) “The Use of Village Agents in Rural Credit Delivery” The

Journal of Development Studies. Vo.. 33, nº2:188-209.

GARCIA, Jr. Afrânio (1983) Terra de Trabalho. Paz e Terra, São Paulo, Rio.

GHATAK, M (1999) “Group Lending, Local Information and Peer Selection” Journal of

Development Economics, 60(1):27-50

GHATAK, Maitreesh (1999) “Group lending, local information and peer selection”.

Journal of Development Economics. Vol.6-:27-50.

GOMES DA SILVA, Aldenôr (2007) Pronaf B: uma política inconclusa. XIII Congresso

Brasileiro de Sociologia. 29 de maio a 1 de junho de 2007, UFPE, Recife(PE)

GÓMEZ SOTO, Franz e Claudio Gonzáles Vega (2006) “Formas de asociación cooperativa

y su participación en la provisión de servicios financieros en las áreas rurales de

México”. Programa Finanzas Rurales. The Ohio State University. Proyecto Afirma.

http://www.cide.edu/cide-osu/documentos/AFIRMA4.pdf. Extraído da internet em

3/01/2008.

GRANOVETTER, Mark (1985), “Economic action and social structure: the problem of

embeddedness”. American Journal of Sociology, 91:481-510.

GREIF, Avner (2004) “Self-enforcing Institutions: Comparative and Historical Institutional

Analysis1”. European School on New Institutional Economics (ESNIE). Mimeo.

GREIF, Avner (2005) Institutions: Theory and History . New York: Cambridge

University Press

GREMAUD, Amauri. P. e TONETO, Rudinei (2003) “A Descentralização do

Financiamento Rural na Indonésia é um Exemplo para o Brasil” ? Revista

Econômica do Nordeste, Fortaleza: Banco do Nordeste, v. 34, n. 4, p. 591-606.

GUERIN, Danielle e Santosh Kumar (2007) « Clientélisme, courtage et gestion des risques

en microfinance. Étude de cas en Inde du Sud ». Autrepart . Nº44 :3-16

Page 40: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

38

GUIRKINGER, Catherine e Steve Boucher (2005) “Credit Constraints and Productivity in

Peruvian Agriculture”. University of California Davis. Apresentado na reunião

annual da Western Agricultural Economics Association.

HARRISS-WHITE, Barbara (1994) “The Question of Traders as Credit Agents in India” in

BOUMAN, F.J.A. e Otto Hospes Financial Landscapes Reconstructed The Fine

Art of Mapping Development. Westview Press, Boulder, Colorado

JAIN, Panjak e Mick Moore (2003) “What makes microcredit programs

effective?Fashionable fallacies and workable realities”. IDS Working Paper. 177.

MARR, Ana (2004) “A Challenge to the Orthodoxy Concerning Microfinance and Poverty

Reduction”. Journal of Microfinance. Vol. 5, nº 2:7-42

MARTOWIJOYO, Sumantoro (2007) “Indonesian Microfinance at the Crossroads Caught

between Popular and Populist Policies”. Essays On Regulation And Supervision.

Nº 23.

MCINTOSH, Craig e Bruce Wydick (2004) “A Decomposition of Screening and Incentive

Effects in Credit Information Systems” Berkeley.

http://are.berkeley.edu/courses/DEVELWORK/papers/Theory.pdf. Extraído da

internet em 3/01/2008.

MEYER, Richard (2007) « Microfinance Services fore Agriculture : Opportunities and

Challenges » Colloquium on What form of microfinance for farmers in the

Developing World. Paris. 4-6/12/2007.

MUÑOZ RODRIGUEZ M. et al., Mercados e instituciones financieras rurales,

CIESTAAM/UACh, México, 2002

MUÑOZ RODRIGUEZ, Manrubio, V. Horacio Santoyo Cortés y J. Reyes Altamirano

Cárdenas, Mercados e instituciones financieras rurales, CIESTAAM/UACh,

México, 2002.

Page 41: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

39

NORTH, Douglass C (1990) Institutions, Institutional Change and Economic

Performance. Cambridge: Cambridge University Press

OUÉDRAOGO, Alpha (2007) “Les enjeux de la microfinance em Afrique de l’Ouest”.

Horizons Bancaires. Nº 334 :33-35.

PARENTE, Silvana (2003) “Mercado financeiro e a população de baixa renda”

LC/BRS/R.136. Março.

http://www.bcb.gov.br/pre/SeMicro/Trabalhos/02_4_Silvana.pdf. Extraído da

internet em 20/12/2007.

REZENDE, Gervásio (2008)

RITCHIE, Anne (2007) “Community-based Financial Organizations: A Solution to Access

in Remote Rural Areas”? The World Bank Agriculture and Rural Development

Discussion Paper 34. Washington.

SCHREINER, Mark e Jacob Yaron (2001). Development Finance Institutions –

Measuring their Subsidy. The World Bank. Washington.

TIMBERG, T. e Aiyar, C. (1984) – “Informal Credit Markets in India” – Economic

Development and Cultural Change, 33:43-59

TRIVELLI, Carolina e Hildegardi Venero (2007) Banca de desarrollo para el agro:

experiencias en curso en América Latrina. Lima. Institutos de Estudios Peruanos.

Von BASTELAER, Thierry (1999) – “Does Social Capital facilitate the Poor´s Access to

Credit”? – Social Capital Initiative – Working Paper, nº8 – The World Bank Social

Development Family Environmentally and Socially Sustainable Development

Network - http://www.inform.umd.edu/IRIS/IRIS/docs/SCI-WPS-08.pdf - extraído

em 14 de julho de 2003

WENNER, Mark, Javier Alvarado e Francisco Galarza, orgs. (2002) Prácticas

prometedoras en finanzas rurales . Experiencias de América Latina y el

Page 42: TEXTO PARA DISCUSSÃO N 10 ALCANCE E LIMITES DAS …downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto... · privada de fundos no meio rural”. ... contemporâneas

Textos para Discussão FIPE nº 10

40

Caribe. Centro Peruano de Estudios Sociales/Banco Interamericano de Desarrollo

Academia de Centro América. Peru. San José. Washington.

WESTLEY, Glenn (2004) “A Tale of Four Village Banking Programs Best Practices in

Latin America”. Inter-American Development Bank.

http://www.ruralfinance.org/servlet/BinaryDownloaderServlet?filename=11280060

58947_A_tale_of_four_village_banking_programs.pdf. Extraído da internet em

2/01/2008.

WILLIAMSON, Oliver E (2000) "The New Institutional Economics: Taking Stock,

Looking Ahead," Journal of Economic Literature, 38 (Setembro):595-613.

WORLD BANK (2006) World Development Report: Equity and Development. The World

Bank. Wshington, D.C.

ZELLER, Manfred (2003) “Models of Rural Financial Institutions,” Lead Theme Paper

presented at “Paving the Way Forward for Rural Finance: An International

Conference on Best Practices,” USAID, Washington, D.C., June 2-4.

http://www.basis.wisc.edu/rfc/agenda.html (extraído da internet em 20/12/2007).

ZELLER, Manfred, and Richard L. Meyer, editors (2002). The Triangle of Microfinance:

Financial Sustainability, Outreach and Impact. Baltimore and London: The John

Hopkins University Press (in cooperation with the International Food Policy

Research Institute, Washington, D.C.), 2002.