Texto para leitura, Um homem de consciência

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Literatura Brasileira Prof Macilda Sena

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TEXTO PARA LEITURA Itaoca o smbolo da cidade paulista que entra em decadncia por causa da misria e da corrupo poltica. Esse o tema do livro Cidades mortas. Um homem de conscincia Chamava-se Joo Teodoro, s. O mais pacato e modesto dos homens. Honestssimo e lealssimo, com um defeito apenas: no dar o mnimo valor a si prprio. Para Joo Teodoro, a coisa de menos importncia no mundo era Joo Teodoro. Nunca fora nada na vida, nem admitia a hiptese de vir a ser alguma coisa. E por muito tempo ao quis nem sequer o que todos ali queriam: mudar-se para terra melhor. Mas Joo Teodoro acompanhava com aperto de corao o deperecimento visvel de sua Itaoca. Isto j foi muito melhor, dizia consigo. J teve trs mdicos bem bons agora s um e bem ruinzote. J teve seis advogados e hoje mal d servio para um rbula ordinrio como o Tenrio. Nem circo de cavalinhos bate mais por aqui. A gente que presta se muda. Fica o restolho. Decididamente a minha Itaoca est se acabando... Joo Teodoro entrou a incubar a idia de tambm mudar-se, mas para isso necessitava dum fato qualquer que o convencesse de maneira absoluta de que Itaoca no tinha mesmo jeito ou arranjo possvel. isso, deliberou l por dentro. Quando eu verificar que tudo est perdido, que Itaoca no vale mais nada, ento arrumo a trouxa e boto-me fora daqui. Um dia aconteceu a grande novidade: a nomeao de Joo Teodoro para delegado. Nosso homem recebeu a notcia como se fosse uma porretada no crnio. Delegado, ele! Ele que no era nada, nunca fora nada, no queria ser nada, no se julgava capaz de nada... Ser delegado numa cidadinha daquelas coisa serissima. No h cargo mais importante. o homem que prende os outros, que solta, que manda dar sovas, que vai capital falar com o governo. Uma coisa colossal ser delegado e estava ele, Joo Teodoro, de-le-ga-do de Itaoca!... Joo Teodoro caiu em meditao profunda. Passou a noite em claro, pensando e arrumando as malas. Pela madrugada botou-as num burro, montou no seu cavalinho magro e partiu. Antes de deixar a cidade foi visto por um amigo madrugador. Que isso, Joo? Para onde se atira to cedo, assim de armas e bagagens? Vou-me embora, respondeu o retirante. Verifiquei que Itaoca chegou mesmo ao fim. Mas, como? Agora que voc est delegado? Justamente por isso. Terra em que Joo Teodoro chega a delegado, eu no moro. Adeus. E sumiu.Monteiro Lobato. Cidades mortas. 12. ed. So Paulo, Brasiliense, 1965. p. 185-6. Rbula: advogado sem diploma

CARACTERSTICAS DA OBRA Espao Os contos de Urups e Cidades mortas so, em sua quase totalidade, ambientados em Itaoca, uma cidadezinha qualquer que simboliza o interior do estado de So Paulo, principalmente o Vale do Paraba, na poca da decadncia da lavoura cafeeira.

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Personagem Nesse espao decadente, aparece o caipira subnutrido, vivendo na misria, na ignorncia, no desnimo. Jeca Tatu um piraquara do Paraba, maravilhoso eptome de carne onde se resume todas as caractersticas da espcie. Ei-lo que vem falar ao patro. Entrou, saudou. Seu primeiro movimento aps prender entre os lbios a palha de milho, sacar o rolete de fumo e disparar a cusparada desguicho, sentar-se jeitosamente sobre os calcanhares. S ento destrava a lngua e a inteligncia. (Urups)piraquara: habitante da margem do Paraba do Sul; caipira eptome: sntese

Linguagem Uma das lutas constantes de Monteiro Lobato foi pelo emprego de uma linguagem prxima da coloquial. Observa-se ainda a incorporao linguagem literria de termos e expresso tpicas da fala regional. Diabo! A m que o Joli do Pedro Surdo? e com uma pedra o espanta. Sai porquera! No ouve o carro? No tem medo de morr masgaiado? (Cidades mortas)a m que: de modo que porquera: porcaria, porqueira morr masgaiado: morrer esmigalahdo