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Érica Mancuso Schaden As (im) possibilidades de graduandos do curso de Pedagogia constituírem-se como sujeitos intérpretes-historicizados: uma análise sobre os estágios curriculares supervisionados 2013

Texto Tema 9 Erica Mancuso

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Érica Mancuso Schaden

As (im) possibilidades de graduandos do curso de Pedagogia constituírem-se como

sujeitos intérpretes-historicizados: uma análise sobre os estágios curriculares

supervisionados

2013

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Resumo

Com base nas premissas teóricas da Análise de Discurso Francesa e na abordagem Sócio-Histórica do Letramento, este projeto de pesquisa de mestrado visa investigar as (im) possibilidades de graduandos do curso de Pedagogia constituírem-se como sujeitos intérpretes-historicizados (ASSOLINI, 2003, 2010), em situação de estágio curricular supervisionado. Por conseguinte, analisar qual a importância e o impacto dessa atividade na vida destes graduandos, buscando saber se o (a) estudante se vê na posição de sujeito, capaz de desenvolver saberes e fazeres educacionais e pedagógicos, que contribuam para que seus futuros alunos posicionem-se também como intérpretes-historicizados de seus dizeres. O corpus desta pesquisa será constituído por meio de depoimentos e questionários, respondidos por graduandos do curso de Pedagogia, de três instituições de ensino superior brasileiras, que estejam cursando as disciplinas de estágio curricular supervisionado para o ensino fundamental, na área da Língua Portuguesa. A análise discursiva dos dados coletados será realizada por meio de recortes discursivos. Assim, oportunizar condições de produção favoráveis para que os alunos possam ser intérpretes-historicizados é o que se almeja encontrar nas propostas de estágio curricular supervisionado selecionadas. Palavras-chaves: Estágio curricular supervisionado; Análise de Discurso Francesa; Autoria Introdução

Presente nos cursos de licenciatura, o estágio curricular supervisionado

apresenta-se como um momento de interlocução entre esferas distintas, que por

possuírem suas próprias idiossincrasias, muitas vezes, possuem certas dificuldades em

dialogar: o espaço da universidade e da escola. Marco de uma passagem entre estas duas

esferas, o estágio também se mostra como um momento liminar do próprio sujeito, no

caso o graduando.

Compreendido como um rito de passagem (LIMA, 2008) entre mundos distintos,

a universidade e a escola, o estágio curricular supervisionado promove no sujeito, o

graduando de uma licenciatura, a possibilidade de se defrontar com uma nova

experiência, que lhe fornece outros olhares sobre o saber e o fazer pedagógicos, por

meio da atividade da docência.

Assim, o estágio curricular supervisionado apresenta-se como um momento em

que o sujeito, o graduando, está em um estado de “suspensão”, mas de constante

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travessia. Este novo olhar, fruto deste momento, pode se distinguir, por exemplo, da

própria experiência do graduando, quando este aciona sua memória discursiva, pensada

pela Análise do Discurso Francesa, desenvolvida e trabalhada por Orlandi (1996), do

que seria um bom ou mau professor, bem como de suas lembranças de práticas e

atividades vivenciadas na escola, durante a infância, quando era aluno. Além disso, o

que é observado e vivenciado durante o estágio pode se contrapor ao que se encontra

nas obras acadêmicas, lidas pelos graduandos, em disciplinas na universidade.

Dessa forma, a atividade da docência experimentada durante o estágio não a

exime de outras instâncias que compõem o sujeito graduando, como sua subjetividade,

sua memória, entendida “(...) não apenas o que um ‘indivíduo’ se recorda, mas também

o que ele se esquece, pelas falhas nas lembranças” (GHIRALDELO, 2011, p.357).

Assim, esta memória composta também de “sentidos não ditos, de sentidos a não dizer,

de silêncios e silenciamentos” (ORLANDI, 1999, p.59), configura-se por meio dos

implícitos (PÊCHEUX, 1999, p.52), das visões de mundo, da ideologia, da posição

social ocupada pelo sujeito, dentre outras instâncias.

Dessa maneira, o estágio curricular supervisionado, compreendido como um rito

de passagem (LIMA, 2008) na formação de professores, caracteriza-se por ser um

momento, no qual os graduandos podem conhecer novas experiências de docência, que

não somente envolvem a sala de aula, mas a instituição escolar como um todo, vivenciar

novas situações, e como se propõem em muitos cursos de licenciatura, elaborar projetos

de estágio, que envolvem a intervenção e a regência.

Essa proposta de estágio, em que há a elaboração de projetos de intervenção e

regência, promove outro olhar sobre a docência, distinguindo-se do estágio que se volta

a

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(...) observar os professores em aula e imitar esses modelos, sem proceder a uma análise crítica fundamentada teoricamente e legitimada na realidade social em que o ensino se processa. Assim, a observação se limita à sala de aula, sem análise do contexto escolar, espera-se do estagiário a elaboração e execução de ‘aulas-modelo’ (PIMENTA, 2012, p.36, grifos nossos). Nessa perspectiva, a atividade de estágio fica reduzida à hora da prática, ao ‘como fazer’, às técnicas a ser empregadas em sala de aula, ao desenvolvimento de habilidades específicas do manejo de classe, ao preenchimento de fichas de observação, diagramas, fluxogramas (idem, p.37).

Cabe ao estágio curricular supervisionado dialogar com a prática e a teoria

docente, bem como, por meio de uma reflexão crítica, ser legitimado, reconhecido pelos

sujeitos envolvidos. As propostas de formação do futuro pedagogo devem buscar um

distanciamento, por exemplo, de uma “prática pela prática e o emprego de técnicas sem

a devida reflexão (que) podem reforçar a ilusão de que há uma prática sem teoria ou de

uma teoria desvinculada da prática” (ibidem).

Com relação ao diálogo entre a prática e a teoria no fazer pedagógico, Bernard

Charlot acrescenta mais um ponto de vista. Com base nos estudos do autor, é importante

que, durante a formação docente, sejam abarcadas tanto a prática docente (o fazer)

quanto as teorias (o saber), entendidas no plural, já que caracterizam-se por ser “uma

teoria enraizada nas práticas e uma teoria que está se desenvolvendo na área da pesquisa

e das próprias ideias entre os pesquisadores” (CHARLOT, 2006, p.24).

Conforme o autor é imprescindível que essas teorias dialoguem entre si,

juntamente com a prática docente, sem haver preponderâncias de uma sobre a outra. Isto

porque, os saberes provenientes da prática do professor não devem ser desconsiderados

frente aos saberes sobre esta prática, que circulam nos meios acadêmicos. Situação que

muitas vezes ocorre, já que o tempo disponível para a pesquisa, para a reflexão, por

conta das condições de produção do professor em sala de aula, é mais restrito do que o

disponível para o pesquisador.

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Tardiff (2012, p.274) nos ilustra essa situação: “para os professores, por

exemplo, nem sempre é fácil teorizar a sua prática e formalizar seus saberes, que eles

veem como sendo pessoais, tácitos e íntimos. Para os pesquisadores, a legitimação dos

saberes dos professores está longe de ter terminado”.

É importante que, durante o estágio curricular supervisionado, bem como nas

propostas de elaboração de projetos de estágio de intervenção e regência, sejam

relevados o fazer e os saberes docentes, originários tanto da universidade quanto da

escola. Esse imbricar proporciona que o graduando possa, ao conhecer a realidade e as

práticas da sala de aula, refletir e articular novos saberes, novos olhares e, neste

processo constituir sua identidade docente, que mesmo em formação, será o subtrato

para sua futura profissão docente.

Fundamentação teórica

Fruto da minha participação no GEPALLE (Grupo de Estudos e Pesquisas sobre

Alfabetização, Leitura e Letramento), na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de

Ribeirão Preto, coordenado pela Profª Drª Filomena Elaine Paiva Assolini, esta pesquisa

apoia-se na corrente teórica da Análise de Discurso pecheuxtiana, promovendo a

investigação dos discursos e suas multiplicidades de sentidos, que os constituem e os

atravessam, fruto de uma determinada condição de produção, que, neste caso, relaciona-

se ao estágio curricular supervisionado.

Assim, a análise de discurso dialoga com três áreas do conhecimento: a

linguística, a psicanálise e a história. No entanto, esse diálogo não ocorre por meio de

uma apropriação literal dos pressupostos dessas áreas do conhecimento, ao contrário,

trabalha no entremeio desses campos do conhecimento, problematizando-os,

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(ORLANDI, 1996), resultando em um novo campo de estudos, que é a análise de

discurso. Conforme nos explicita Orlandi (2009, p.20),

se a Análise do Discurso é herdeira das três regiões de conhecimento – Psicanálise, Linguística, Marxismo – não o é de modo servil e trabalha uma noção – a de discurso – que não se reduz ao objeto da Linguística, nem se deixa absorver pela Teoria Marxista e tampouco corresponde ao que teoriza a Psicanálise. Interroga a Linguística pela historicidade que ela deixa de lado, questiona o Materialismo perguntando pelo simbólico e se demarca da Psicanálise pelo modo como, considerando a historicidade, trabalha a ideologia como materialidade relacionada ao inconsciente sem ser absorvida por ele.

Assim, segundo Orlandi (idem, p.16), a análise de discurso “não se trabalha,

como na Linguística, com a língua fechada nela mesma mas com o discurso”, ademais,

“nem se trabalha, por outro lado, com a história e a sociedade, como se elas fossem

independentes do fato de que elas significam”.

Surgida nos anos 60 do século XX, na França, a análise de discurso (A.D.), com

destaque aos trabalhos de Michel Pêcheux, tem como foco principal o discurso e suas

interrelações do real, do social com o sujeito histórico.

Dessa forma,

a análise de discurso, como seu próprio nome indica, não trata da língua, não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando (ibidem, p.15).

Os discursos, esboçados pela Análise de Discurso (A. D.) francesa, não são

materialidades fixas, imutáveis. Materialidades esféricas, que podem ser orais, escritas,

simbólicas, etc., os discursos apresentam uma complexidade na sua própria

constituição, já que produzem sentidos. E esses sentidos, podem ser evidenciados por

meio de pistas, marcas que o constituem, as quais são manifestações, tanto do

inconsciente, como do social, do sujeito e da ideologia.

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Assim, o paradigma indiciário, proposto, no século XIX, por Morelli, um

médico italiano, atribui ao detalhe, ao vestígio, à marca pessoal, o indício que propicia

desvendar a autoria de obras de arte e, por conseguinte, desvelar a sua cópia, a farsa.

Freud, ao entrar em contato com o artigo de Morelli, no qual esboçava seus

pressupostos, fica deslumbrado com a proposta, cujo método se aproximava,

sobremaneira, da psicanálise. Ginzburg (1989) relaciona a ciência de Morelli também

com o método investigativo dos detetives, como aparece na literatura de Arthur Conan

Doyle, em Sherlock Holmes.

Conforme Ginzburg (1989, pp. 149-150), o paradigma indiciário é

(...) a proposta de um método interpretativo centrado sobre os resíduos, sobre os dados marginais, considerados reveladores. Desse modo, pormenores normalmente considerados sem importância, ou até triviais, ‘baixos’, forneciam a chave para aceder aos produtos mais elevados do espírito humano (...).

As marcas que formam um discurso trazem traços, lapsos, falhas, atos falhos e

equívocos que, ao se despontarem, evidenciam a emergência do inconsciente do sujeito.

Isto porque nenhum discurso é transparente, os sentidos não são cristalizados. Assim, os

sentidos não estão atrelados à palavra, ao objeto como se fossem naturais. Existe, sim,

uma opacidade nos discursos que os afastam da obviedade. “Não há uma verdade oculta

atrás do texto. Há gestos de interpretação que o constituem e que o analista, com seu

dispositivo, deve ser capaz de compreender” (ORLANDI, 1996, 26).

Em vistas disso, para o analista de discurso, refletir sobre a falha, a fissura do

discurso, é buscar quais são os outros sentidos, outros gestos de leituras, possíveis no/do

próprio discurso, quais são os sentidos para o sujeito. A frase da autora Eni Orlandi, é

elucidativa: a análise do discurso é “a arte de refletir nos entremeios” (PÊCHEUX,

2002, p.07).

Dessa forma,

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(...) interpretar, para o analista de discurso, não é atribuir sentidos, mas expor-se à opacidade do texto (ainda Pêcheux), ou, como tenho proposto (ORLANDI, 1987), é compreender, ou seja, explicitar o modo como um objeto simbólico produz sentidos, o que resulta em saber que o sentido sempre pode ser outro (ORLANDI, 1996, p.64).

Novos sentidos emergem, porque o discurso vincula-se à exterioridade, à

condição de produção na qual se insere, ou seja, liga o sujeito com a situação, com o

contexto sócio-histórico, com a ideologia. Assim, um discurso vincula-se a outros

discursos sincrônica e diacronicamente, constituindo o interdiscurso, “(...) formulações

feitas e já esquecidas que determinam o que dizemos” (idem, p.33). E este diálogo entre

os discursos, entre os textos (intertexto), entre sentidos, é acionado, por meio da

memória discursiva do sujeito, que não é somente pessoal, interior, mas social, exterior,

isto é, “o que é dito em outro lugar também significa nas ‘nossas’ palavras”

(ORLANDI, 1996, p.32).

Além disso, as posições sociais ocupadas pelos sujeitos influenciam nos sentidos

atribuídos ao discurso, ajustando-os ao que se quer dizer, criando projeções deles,

constituindo as formações imaginárias. Assim, o sujeito produz um discurso fruto de

uma imagem que tem do outro. A fala de um empregado para seu chefe está envolta

pelo o que pode ser dito, bem como pela interdição de certos discursos, visto ser uma

relação de força, hierárquica.

Conforme Orlandi (1996), outro aspecto corrobora para este jogo discursivo: a

antecipação. Momento empático, a situação da antecipação, a qual o sujeito se coloca no

lugar de um suposto interlocutor, o faz imaginar que pode controlar o efeito do seu

discurso. Dessa maneira,

é pois todo um jogo imaginário que preside a troca de palavras. E se fazemos intervir a antecipação, este jogo fica ainda mais complexo pois incluirá: a imagem que o locutor faz da imagem que seu interlocutor faz dele, a imagem que o interlocutor faz da imagem que

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ele faz do objeto do discurso e assim por diante (ORLANDI, 1996, p.40).

Há, portanto, uma forte relação entre as formações imaginárias do discurso com

as formações discursivas, e estas, com as formações ideológicas. Isto porque, a

projeção, a imagem, criada na relação discursiva não é fruto da elaboração unicamente

do sujeito, mas é também social. Por isso, engloba-se em formações discursivas, as

quais se vinculam à ideologia, às formações ideológicas. “As palavras mudam de

sentido segundo as posições daqueles que as empregam” (idem, p.42), já que “a

formação discursiva se define como aquilo que numa formação ideológica dada – ou

seja, a partir de uma posição dada em uma conjuntura sócio-histórica dada – determina

o que pode e deve ser dito” (ibidem, p.43).

Referente ao que foi dito, a ideologia “(...) não é um conteúdo ‘x’ mas o

mecanismo de produzi-lo” (ORLANDI, 1996, p.65). Ou seja, a ideologia gera um efeito

no discurso, já que “(...) não há sentido sem interpretação” (idem, p.45), por isso, não há

discurso sem ideologia e não há uma relação sentido-palavra-objeto determinada, mas

um imaginário, fruto da formação ideológica.

Assim, o discurso é um misto de estrutura e acontecimento, que opera

conjuntamente em uma condição de produção, em uma formação discursiva. Relação

com o já-dito – o interdiscurso – o discurso é renovado no acontecimento, na situação

em que emerge, na história.

Segundo Pêcheux (2002, p.53), “(...) todo enunciado é intrinsecamente suscetível de

tornar-se outro, diferente de si mesmo, se deslocar discursivamente de seu sentido para derivar

para um outro (a não ser que a proibição da interpretação própria ao logicamente estável se

exerça sobre ele explicitamente)”. Assim, a busca dos sentidos do discurso é o que a

análise de discurso propõe-se a fazer, problematizando o que se nos apresenta como

óbvio, evidente, natural.

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Perspectivas sobre a autoria

A questão da autoria é um tema muito discutido. Por conta disso, temos na

literatura, várias interpretações do que seria um autor, cujos discursos se diferenciam

entre si. Assim, caberia perguntar: quem é o autor de um discurso. A quem se atribui a

legitimidade de ocupar a posição de autor?

Em vista dos possíveis sentidos existentes, os estudiosos divergem quanto ao

que consideram ser um autor e, por ventura, um discurso autoral. Para Michel Foucault

(1999), a posição de autor não seria disponível a todos na sociedade. Caberia somente a

algumas pessoas, cujos discursos, caracterizam-se por possibilitarem o surgimento de

novas discursividades. Esses seriam os discursos que promoveriam o nascimento de

inúmeros outros discursos, denominados comentários. Entretanto, conforme ressalva

Foucault, essas caracterizações dos discursos não são estanques, imutáveis, já que um

comentário pode vir a ocupar o lugar do discurso que o originou.

Conforme o trecho abaixo (FOUCAULT, 1999, p. 23):

é certo que esse deslocamento não é estável, nem constante, nem absoluto. Não há, de um lado, a categoria dada uma vez por todas, dos discursos fundamentais ou criadores; e, de outro, a massa daqueles que repetem, glosam e comentam. Muitos textos maiores se confundem e desaparecem e, por vezes, comentários vêm tomar o primeiro lugar.

Assim, o comentário, cuja função, para o autor, é “dizer enfim o que estava

articulado silenciosamente no texto primeiro” (idem, p.25), possibilita trazer para a

discussão novos sentidos que não foram ditos no discurso de origem, visto estar no

tempo do acontecimento, ou seja, “o novo não está no que é dito, mas no acontecimento

de sua volta” (ibidem, p.26).

Seguindo o que se afirma para os discursos, Foucault, explicita que o autor é

quem possibilita a origem de novos dizeres. Por isso, distingue o discurso das conversas

cotidianas, as quais, sem um autor propriamente reconhecível, possuem uma

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eventualidade, uma volatilidade, que não a faz existir por muito tempo. Segundo

Foucault (1999, p. 26), “o autor, não entendido, é claro, como o indivíduo falante que

pronunciou ou escreveu um texto, mas o autor como princípio de agrupamento do

discurso, como unidade e origem de suas significações, como foco de sua coerência”.

Duas ideias expostas neste trecho são essenciais para a concepção de autor para

Foucault: agrupamento do discurso, isto é, a posição de autor o legitima a ser origem de

novas discursividades; e a questão da coerência, ou seja, o discurso do autor precisa

apresentar um sentido, não entendido como a sua completude (nenhum discurso

consegue abarcar todos os sentidos existentes), mas, sim, um sentido compreensível

para o leitor, já que não se pode dizer qualquer coisa. Os atributos da coerência e da

coesão são essenciais para os estudos sobre autoria, presentes também em outros autores

que serão discutidos a seguir.

Oposta a essa perspectiva, de que somente alguns sujeitos podem ocupar a

posição de autor, quem gera discursividades, cujo discurso é legitimado socialmente,

para Eni Orlandi, todo sujeito pode vir a ser um autor, cuja posição relaciona-se ao dizer

- não na sua completude, pois os sentidos são muitos e escapam do controle -, ou seja,

um dizer que tem um sentido possível de interpretação pelo leitor, já que apresenta

coesão e coerência. Ou seja, “o sujeito só se faz autor se o que ele produz for

interpretável” (ORLANDI, 1996, p.70). Ele assina o texto, instalando sua marca

pessoal. Assim, Orlandi (1996, p.69) nos diz que

a função-autor, para nós, não se limita, como em Foucault (1983), a um quadro restrito e privilegiado de produtores ‘originais’ de linguagem (que se definiriam em relação a uma obra). Para nós, a função-autor se realiza toda vez que o produtor da linguagem se representa na origem, produzindo um texto com unidade, coerência, progressão, não-contradição e fim. Em outras palavras, ela se aplica ao corriqueiro da fabricação da unidade do dizer comum, afetada pela responsabilidade social (ORLANDI, 1993): o autor responde pelo que diz ou escreve pois é suposto estar em sua origem.

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O ponto extremo, segundo a autora, do processo da interpretação, da função-

autor, seria o plágio, o qual apaga todas as marcas discursivas do sujeito que produziu

primeiramente o discurso, já que “o plagiador silencia seu trajeto, ele cala a voz do

outro que ele retoma” (idem, p.72). A repetição, o já-dito, se inscreve na autoria, mas de

uma forma distinta da que ocorre com o plágio. Em virtude do interdiscurso - em um

dizer, existe a relação com outros discursos, consoante a formação ideológica na qual se

insere o sujeito - a repetição, o já-dito, na autoria, promove a emergência do novo,

enquanto acontecimento, relacionado, portanto, a condição de produção inserida. Dessa

forma, “resulta o movimento da identidade e o movimento dos sentidos: eles não

retornam apenas, eles se transformam, eles deslocam seu lugar na rede de filiações

históricas, eles se projetam em novos sentidos” (ibidem).

A autoria vista como a possibilidade de produção de novos sentidos é

compartilhada por Leda V. Tfouni. Além disso, essa autora acrescenta um novo olhar

sobre a autoria e o autor, quando atribui a presença de autoria também em discursos

provenientes da oralidade e não somente da escrita. Assim, pode-se existir, em um

mesmo discurso, marcas da oralidade no texto escrito e vice-versa. Essa ampliação da

emergência da autoria nos diversos discursos produzidos corrobora para a noção de

autor como um sujeito que possui um movimento, na produção de seu texto escrito ou

oral, de retorno às palavras ditas, no sentido de retomá-las, a fim de se buscar, mesmo

ilusoriamente, a coesão e coerência no discurso.

Assim, o autor, em seu discurso, navega entre o intra e o interdicurso, buscando

um elo, entre a estrutura do texto, no caso o uso das palavras, as escolhas e posições que

são alocadas, com os sentidos emergentes no discurso e entre outros discursos, que o

sucederam ou que existem em concomitância. A busca em aliar a coesão e coerência

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interna do texto com os sentidos possíveis e existentes faz com que o autor seja,

segundo Tfouni (1995, p.42),

(...) aquele que estrutura seu discurso (oral e escrito) de acordo com um princípio organizador contraditório, porém necessário e desejável, que lhe possibilita uma ‘posição de auto-reflexibilidade crítica no processo de produção de seu discurso (...) fato este que provocaria, no próprio texto, um retorno constante à forma como aquele sentido está produzido, sem que isso impeça que ele seja constantemente produzido (TFOUNI, 1992a).

Compartilhando da mesma concepção sobre a autoria Susy Lagazzi-Rodrigues

(2006, p.93) esclarece que “o autor (se) produz (n)o texto, dá ao texto seus limites e se

reconhece no texto. O sentido da autoria depende do efeito de unidade e coesão do

texto”. E acrescenta (idem, p.99):

a autoria não é uma qualidade, mas uma prática na configuração de um texto. Texto tomado como delimitação em diferentes formulações significantes, sempre sob a determinação da produção dos efeitos de desfecho, unidade, coesão, coerência e responsabilidade. Não só o texto escrito, composto em palavras, mas também o texto que busca espacializar a autoria no desenho, nas imagens, na pintura, na música, na dança, na mímica, no grafite, na tatuagem.

Assim, trabalhar com a unidade do discurso escrito, oral, etc., no sentido de ser

algo inteligível para o leitor, é também permitir a possibilidade da interpretação e o jogo

do simbólico, na forma da polissemia, com os diversos sentidos.

Com base no que foi dito, trabalhar-se-á com o conceito desenvolvido por

Assolini (2003; 2010) de sujeito intérprete-historicizado. Segundo a autora, este sujeito

ocupa uma posição, na qual “está autorizado a falar, a produzir outras leituras, recontar

histórias, a partir de sua memória discursiva” (ASSOLINI, 2010, p.29). Assim, a

questão da autorização dos sujeitos para interpretar, desvinculando-se dos processos

parafrásticos, dos sentidos cristalizados e legitimados pela instituição escolar

(ASSOLINI, 2003; 2010) é um diferencial desta proposta, trazendo contribuições ao

conceito de autoria, proposto pelas autoras citadas anteriormente.

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Neste ensejo, o termo “intérprete-historicizado” busca se contrapor à concepção

de intérprete, quem, ao interpretar, o faz literalmente e de forma direcionada, excluindo-

se os processos identificatórios deste sujeito, bem como as possibilidades de ocupar

diferentes posições no discurso. Opondo-se a isso, entende-se a interpretação como

sinônimo de leitura historicizada de um texto, devendo-se ser relevadas as condições de

produção do texto, não somente quem o escreveu, quando, o assunto, tema etc, mas

também quais as filiações históricas do texto, qual o interdiscurso, no qual este texto se

inscreve (idem).

Assim, “posicionar-se como ‘intérprete-historicizado’ requer (...) ter em mente

que as interpretações nunca são definitivas e, por isso mesmo, o sujeito pode arriscar-se

a diferentes gestos de interpretação” (ASSOLINI, 2010, p.33).

Oportunizar condições de produção para que os alunos possam ser autores, que

possam trabalhar com as outras possibilidades de sentidos, a fim de ampliarem seus

universos de experiências vivenciadas, é o que se almeja encontrar nas propostas das

disciplinas de estágio curricular supervisionado, bem como durante o desenvolvimento

delas. A formação inicial do professor precisa autorizá-lo a exercer a posição de autor,

para que, em seu futuro exercício profissional, possibilite que outros sujeitos ocupem

essa posição. Assim, novas discursividades poderão surgir.

Justificativa

A temática do estágio curricular supervisionado tem sido abordada por diversos

autores da área da educação, o que nos demonstra a importância deste momento para a

formação de professores e, especificamente, para a formação inicial do futuro professor.

Segundo Pimenta (2012, p.24), a finalidade do estágio curricular é “(...) integrar

o processo de formação do aluno, futuro profissional, de modo a considerar o campo de

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atuação como objeto de análise, de investigação e de interpretação crítica, a partir dos

nexos com as disciplinas do curso”.

Em vistas disso, esse tema foi escolhido para compor este projeto de pesquisa,

que, além de ser uma temática que suscita novas investigações científicas e por ser de

extrema importância para a formação profissional do graduando de cursos de

licenciatura, marcou-se também como um momento liminar na minha formação como

pedagoga, decorrente das experiências vivenciadas ao longo dos estágios curriculares

supervisionados, do curso de Pedagogia, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de

Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo.

Dessa forma, as minhas experiências, enquanto graduanda, ao longo dos estágios

desenvolvidos na citada universidade, instigaram-me a refletir como são as experiências

vividas por outros graduandos, em diferentes universidades e faculdades brasileiras.

Entretanto, embora haja algumas obras que comentam alguns relatos, bem como

dissertações e teses que apresentam uma determinada experiência de estágio de uma

instituição de ensino superior, ainda há muito a ser pesquisado, dada a importância da

temática no âmbito dos estudos sobre o ensino superior.

Objetivos

A fim de dar andamento ao que tem sido exposto, com este projeto de pesquisa

de mestrado, em virtude da minha aprovação no Programa de Pós Graduação em

Educação, da FFCLRP-USP, com início no 2º semestre de 2013, pretende-se

desenvolver uma pesquisa científica que aborde o tema do estágio curricular

supervisionado, de cursos de licenciatura em Pedagogia, de faculdades e universidades

brasileiras.

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Com base na Análise de Discurso de matriz francesa e nos estudos sócio-

históricos sobre autoria, objetiva-se:

• investigar as (im) possibilidades de graduandos do curso de Pedagogia

constituírem-se como sujeitos intérpretes-historicizados, em situação de

estágio curricular supervisionado, pois, ocupar a posição de intérprete-

historicizado é condição basilar para que o sujeito possa ocupar o lugar

de autor, segundo o que defende Assolini (2003; 2008, 2010),

• analisar qual a importância e o impacto dessa atividade na vida do

graduando, buscamos saber se o (a) estudante se vê na posição de sujeito

capaz de desenvolver saberes e fazeres educacionais e pedagógicos

que contribuam para que seus futuros alunos posicionem-se também

como intérpretes-historicizados de seus dizeres.

Além disso, almejamos responder algumas das questões apresentadas a seguir:

como está estruturado o estágio curricular supervisionado do curso de Pedagogia nas

instituições de ensino superior a serem observadas, no que tange ao Projeto Político

Pedagógico (PPP) proposto? Quais sentidos podem ser compreendidos, por meio deste

documento, que nos levam a indagar sobre qual ideal de sujeito está se formando para a

prática da futura docência? Como o momento do estágio curricular supervisionado está

sendo proposto? Como os graduandos imaginam o momento do estágio curricular

supervisionado?

Metodologia

• serão escolhidas três instituições de ensino superior brasileiras.

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• para a análise discursiva, será dado destaque às disciplinas referentes ao estágio

curricular supervisionado, que dialogam com o ensino fundamental, na área da

língua portuguesa.

• serão coletados dados por meio de questionários, após a apreciação do Comitê

de Ética responsável, respondidos por graduandos do curso de Pedagogia, que

estejam cursando as disciplinas de estágio curricular supervisionado para o

ensino fundamental, que aborde a língua portuguesa. Ressalta-se que já

possuímos dez depoimentos escritos de graduandos, que cursavam disciplinas

de estágio curricular supervisionado, em uma universidade pública do interior

do estado de São Paulo. Os depoimentos que também constituem o nosso

corpus foram coletados em novembro de 2012, ao longo do desenvolvimento de

projetos de pesquisas, vinculados ao GEPALLE (Grupo de Estudos e Pesquisas

sobre Alfabetização, Leitura e Letramento). Salienta-se que dispomos da

anuência expressa desses sujeitos, através do Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido, para integrar tais depoimentos ao nosso corpus.

• será aprofundada a leitura de documentos oficiais (Projeto Político Pedagógico

da instituição de ensino, legislações que abordam a organização de estágios

curriculares supervisionados), além de outras obras referentes à temática do

estágio curricular supervisionado, sobre formação de professores, análise de

discurso de linha francesa e estudos sócio-históricos sobre autoria.

A partir desse amplo espaço discursivo, constituído pelos dados provenientes de

questionários, depoimentos escritos e pela análise de documentos oficiais (Projeto

Político Pedagógico) realizaremos alguns recortes, entendidos como “unidades

Page 18: Texto Tema 9 Erica Mancuso

discursivas” (ORLANDI, 2009, p.22), fragmentos que se relacionam com a linguagem e

o contexto de sua produção.

Nesses recortes serão analisadas as marcas linguísticas, as quais “(...) dizem

respeito à organização do discurso e a propriedade tem a ver com a consideração do

discurso como um todo em relação com a exterioridade, com as instituições, com o

contexto sócio-histórico, com a cultura, com a ideologia” (ORLANDI, 1999, p.25).

Ao desvelarmos as marcas discursivas, pode-se compreende dois eixos

constitutivos do discurso. O intradiscurso, que tece os sentidos verticalmente, e o

interdiscurso, aberto a exterioridade, aos outros discursos, o qual forma a memória

discursiva do sujeito.

Assim, como no paradigma indiciário (GINZBURG, 1989), ao ressaltar os

indícios, os sentidos ocultos, implícitos, mas constitutivos, como na busca realizada

pelo detetive, essas marcas discursivas nos fornece subsídios, pistas para a interpretação

dos possíveis sentidos que envolvem os discursos, para investigarmos as formações

discursivas, envolvidas pelas formações ideológicas. Estas permitem aos sujeitos

realizarem gestos de interpretação e interditam outros, corroborando para que na

formação discursiva em que se encontra o discurso, leituras sejam legitimadas e

sentidos sejam edificados, como se fossem os únicos.

Além dos recortes e suas marcas discursivas, a seleção do nosso corpus resulta

de um gesto de interpretação, articulado pelos conceitos do quadro teórico da Análise de

Discurso Francesa e das Ciências da Educação, em particular, o que diz respeito à

formação inicial de professores.

Cronograma

2º Semestre de 2013

1º Semestre de 2014

2º Semestre de 2014

1º Semestre de 2015

2º Semestre de 2015

Cumprimento dos créditos em disciplinas

X X X X

Page 19: Texto Tema 9 Erica Mancuso

Leituras para fundamentação teórico metodológica

X X X X

Análise de documentos oficiais normatizadores

X

Aplicação de questionários X Elaboração de texto contendo análise dos dados dos questionários

X X

Exame de qualificação X Revisão do texto apresentado ao exame de qualificação

X

Revisão final do texto, a ser apresentado à defesa, na forma de dissertação

X

Defesa da dissertação X Referência Bibliográfica

ASSOLINI, Filomena E. P. Interpretação e letramento: os pilares de sustentação da

autoria. FFCLRP. Tese de Doutorado, 2003

ASSOLINI, Filomena E. P. Professoras alfabetizadoras e suas leituras: história,

memória e prática pedagógica escolar. Práxis Educacional, v. 01, p. 25-45, 2010

ASSOLINI, Filomena E. P. O discurso lúdico na sala de aula: letramento, autoria e

subjetividade. ASSOLINI, Filomena Elaine Paiva; LASTÓRIA, A.C. Diferentes Linguagens

no Ensino Fundamental. 1ª. ed. Florianópolis: Editora Insular, 2013. v. 1. 192 p

TFOUNI, Leda V.; ASSOLINI, Filomena E. P. Interpretação, autoria e prática

pedagógica escolar. Odisséia (UFRN) (Cessou em 2006. Cont. ISSN 1983-2435 Revista

Odisséia), v. 1, p. 1-16, 2008

CHARLOT, Bernard. Formação de Professores: a pesquisa e a política educacional. In:

FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. São Paulo: Edições Loyola, 1999

GHIRALDELO, Claudete M. Memórias de Alfabetização. In: CORACINI, M., J.;

GHIRALDELO, C. M. (orgs), Nas malhas do discurso: memória, imaginário e

subjetividade – formação de professores (línguas maternas e estrangeiras), leitura e

escrita. São Paulo: Pontes Editores, 2011

Page 20: Texto Tema 9 Erica Mancuso

GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais – morfologia e história. São Paulo:

Companhia das letras, 1989

LAGAZZI-RODRIGUES, Suzy. Texto e autoria. In: ORLANDI, E. P.; LAGAZZI-

RODRIGUES, Suzy (orgs), Introdução às Ciências da linguagem: Discurso e

Textualidade. Campinas, SP: Pontes Editores, 2006

LIMA, Maria S. L. Reflexões sobre o estágio-prática de ensino na formação de

professores. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v.8, n.23, p.195-205, jan./abr., 2008

ORLANDI, Eni P. Discurso e leitura. São Paulo: Cortez, 1999.

ORLANDI, Eni P. A linguagem e seu funcionamento – as formas do discurso. São

Paulo: Pontes editores, 2003

ORLANDI, Eni P. Análise de Discurso – princípios e procedimentos. São Paulo:

Pontes, 2009

ORLANDI, Eni P. Interpretação - autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. Rio de

Janeiro: Editora Vozes, 1996

ORLANDI, Eni P. Maio de 1968: os silêncios da memória. In: ARCHARD, P. et al.

Papel da Memória, Campinas: Pontes, 1999

PÊCHEUX, Michel. O discurso: estrutura ou acontecimento, 2002

PÊCHEUX, Michel. Papel da memória. In: ARCHARD, P. et al. Papel da Memória.

Campinas: Pontes, 1999

PIMENTA, Selma G.; LIMA, Maria S. L. Estágio e Docência. São Paulo: Cortez

Editora, 2012

TARDIFF, Maurice, Saberes docentes e formação profissional. Rio de Janeiro: Editora

Vozes, 2012

TFOUNI, Leda V. Letramento e Alfabetização. São Paulo: Cortez, 1995