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 1 Tópicos de pesquisa sobre metodologia de projeto em design: os objetivos do projeto  Research topic s on Design Project Methodology: t he Project Objec tives  LESSA, Washington Dias Doutor, ESDI–UERJ Palavras-chave: Design, Metodologia de projeto em design, Objetivos do projeto Propomos quatro tópicos para a pesquisa sobre metodologia de projeto em design: a) a relação entre método e objetivos do projeto; b) o desenvolvimento metodológico que se constrói ao longo do projeto, c) a síntese projetual, que se coloca como uma “caixa preta”; d) como se constitui teoricamente a consciência do método. Este texto apresenta brevemente esses quatro tópicos, e desenvolve um primeiro mapeamento de questões relativas ao primeiro deles. Key-words: Design, Design project methodology, Project objectives We propose four research topics on Design Project Methodology: a) the relation between method and Project Objectives; b) the methodological development built along the project; c) the moment of project synthesis, that stands as a “black box”; d) how is theoretically built a conscience of method. This text  presents in few wor ds these four top ics, and develops a first mappin g of questions connected to the first on e. 1- Tópicos de pesquisa sobre metodologia de projeto em design Considerando o projeto de design e sua prática, propomos quatro tópicos de investigação da questão do método: a) o primeiro parte da conexão lógica entre opções metodológicas e os objetivos do projeto, os quais desenham expectativas quanto aos resultados possíveis do processo projetual. Essas expectativas existem tanto formalmente, como ponto de partida necessário de um empreendimento comercial/industrial, quanto definem-se pragmaticamente, como conjugação dinâmica entre as referências (formais, conceituais, éticas etc) consciente ou inconscientemente trazidas pelos agentes envolvidos no processo. Neste sentido pode-se dizer que, segundo uma avaliação de ordem epistemológica, este primeiro tópico preside o reconhecimento de diferenças dadas por: critérios de produção e de mercado, culturas técnica e empresarial, diversidade de perspectivas profissionais e seus respectivos objetivos programáticos etc. E guardada a especificidade tópica do delineamento inicial dos objetivos, estes estarão sujeitos a eventuais reformulações face à especificidade dos fatores que, apesar de previstos inicialmente, ganham concretude no processo de trabalho. Temos, assim, que os objetivos são novamente chamados à cena não apenas na avaliação do resultado final, mas participam ativamente do desenrolar do projeto. b) o segundo tópico delimita-se a partir da seqüência de ações e decisões que caracterizam a realização de um projeto, a qual deve ser compreendida como atualização ou encadeamento metodológico que estrutura a prática do projeto.(1) Este encadeamento articula: 1) os conceitos e diretrizes contidos nos objetivos, dinâmicos, do projeto; 2) os dados empíricos e características e equacionamentos materiais que vão sendo buscados e concretizados ao longo do processo. E tais vetores podem ser compreendidos respectivamente como um plano discursivo – que define o domínio das enunciações – e um plano do concreto – que define o domínio das objetivações.(2) Entre esses dois planos não se estabelecem relações de subordinação de um a outro. O plano do concreto não é o lugar passivo onde se realiza o que foi previamente enunciado, pois um enunciado que se pretende ligado a uma realização prática não é nada fora das circunstâncias que o tornam o que é, ou seja, se não existirem ocorrências e referências no domínio das objetivações que o “ancorem” concretamente. A autonomia relativa das objetivações face aos enunciados evidencia-se na resistência e na “espessura” próprias das coisas concretas, que podem levar o objetivado a desdobramentos inesperados.(3) Porém este

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Tópicos de pesquisa sobre metodologia de projeto em design: os objetivos do projeto Research topics on Design Project Methodology: the Project Objectives 

LESSA, Washington DiasDoutor, ESDI–UERJ

Palavras-chave: Design, Metodologia de projeto em design, Objetivos do projeto

Propomos quatro tópicos para a pesquisa sobre metodologia de projeto em design: a) a relação entre métodoe objetivos do projeto; b) o desenvolvimento metodológico que se constrói ao longo do projeto, c) a sínteseprojetual, que se coloca como uma “caixa preta”; d) como se constitui teoricamente a consciência do método.Este texto apresenta brevemente esses quatro tópicos, e desenvolve um primeiro mapeamento de questõesrelativas ao primeiro deles.

Key-words: Design, Design project methodology, Project objectives

We propose four research topics on Design Project Methodology: a) the relation between method and 

Project Objectives; b) the methodological development built along the project; c) the moment of project synthesis, that stands as a “black box”; d) how is theoretically built a conscience of method. This text 

 presents in few words these four topics, and develops a first mapping of questions connected to the first one.

1- Tópicos de pesquisa sobre metodologia de projeto em design

Considerando o projeto de design e sua prática, propomos quatro tópicos de investigação da questão dométodo:

a) o primeiro parte da conexão lógica entre opções metodológicas e os objetivos do projeto, os quaisdesenham expectativas quanto aos resultados possíveis do processo projetual. Essas expectativas existem

tanto formalmente, como ponto de partida necessário de um empreendimento comercial/industrial, quantodefinem-se pragmaticamente, como conjugação dinâmica entre as referências (formais, conceituais, éticasetc) consciente ou inconscientemente trazidas pelos agentes envolvidos no processo. Neste sentido pode-sedizer que, segundo uma avaliação de ordem epistemológica, este primeiro tópico preside oreconhecimento de diferenças dadas por: critérios de produção e de mercado, culturas técnica eempresarial, diversidade de perspectivas profissionais e seus respectivos objetivos programáticos etc. Eguardada a especificidade tópica do delineamento inicial dos objetivos, estes estarão sujeitos a eventuaisreformulações face à especificidade dos fatores que, apesar de previstos inicialmente, ganham concretudeno processo de trabalho. Temos, assim, que os objetivos são novamente chamados à cena não apenas naavaliação do resultado final, mas participam ativamente do desenrolar do projeto.

b) o segundo tópico delimita-se a partir da seqüência de ações e decisões que caracterizam a realização deum projeto, a qual deve ser compreendida como atualização ou encadeamento metodológico que estrutura

a prática do projeto.(1) Este encadeamento articula: 1) os conceitos e diretrizes contidos nos objetivos,dinâmicos, do projeto; 2) os dados empíricos e características e equacionamentos materiais que vão sendobuscados e concretizados ao longo do processo. E tais vetores podem ser compreendidos respectivamentecomo um plano discursivo – que define o domínio das enunciações – e um plano do concreto – que defineo domínio das objetivações.(2)Entre esses dois planos não se estabelecem relações de subordinação de um a outro. O plano do concretonão é o lugar passivo onde se realiza o que foi previamente enunciado, pois um enunciado que se pretendeligado a uma realização prática não é nada fora das circunstâncias que o tornam o que é, ou seja, se nãoexistirem ocorrências e referências no domínio das objetivações que o “ancorem” concretamente. Aautonomia relativa das objetivações face aos enunciados evidencia-se na resistência e na “espessura”próprias das coisas concretas, que podem levar o objetivado a desdobramentos inesperados.(3) Porém este

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caráter não faz com que o plano do concreto, da prática realizada, se coloque como determinaçãoprioritária, matriz que conferisse à enunciação um caráter meramente descritivo ou representativo. Odomínio da objetivação não se basta, pois é preciso o recurso a variáveis de enunciação para organizá-lo etorná-lo inteligível, e isto demonstra que, mesmo imaterial, o ato de enunciação pode intervir no concreto.Sintetizando, temos que a enunciação não é determinante da objetivação, assim como esta não édeterminante daquela. Não existe uma correspondência necessária entre os dois planos, e sim umaindependência que, em cada desenvolvimento específico, leva a uma pressuposição recíproca que serealiza em passagens incessantes de um a outro plano.(4)Em relação a este tópico é igualmente importante salientar que não devem ser confundidos os parâmetrosmetodológicos, que estabelecidos a partir dos objetivos atualizam-se ao longo do projeto, com as etapas doprocesso projetual. Aqueles não se desenham determinados por estas, pois a concretização do métodoprevê descontinuidades e reavaliações, ou seja, não se desenham de acordo com a linearidade dessasetapas.(5)

c) o terceiro tópico destaca o âmbito da síntese projetual, cerne do trabalho de design, a qual estabeleceuma forma configurada visual/plasticamente que atende os objetivos do projeto. Dado este caráterplástico/visual, as investigações em torno a este tópico buscam evitar o termo criação, tendo em vista sua“contaminação” por uma leitura estetizante própria da área das artes visuais. Esta precaução se justifica na

medida em que um produto que apresenta qualidade estética pode não ser um bom projeto de design (oque não quer dizer que a estética não seja um dos fatores que devem ser considerados no desenvolvimentode um projeto).(6) Mas mesmo estando claro que uma boa síntese projetual supõe uma combinaçãoespecífica de funcionalidade, invenção, engenhosidade, beleza, e outros eventuais aspectos, é importanteindicar que o dispositivo metodológico correspondente não perderia um certo caráter de “caixa preta”.(7)Apesar deste aspecto ser tabu para uma certa tradição racionalista, a sua importância não pode serignorada. Destacar a questão tem como conseqüência imediata, por exemplo, a crítica à idéia de que asíntese projetual resulta de uma dedução feita a partir do levantamento de dados, suposição que,definitivamente, não corresponde à realidade (ressalvando que raciocínios dedutivos fazem-se presentesem outros momentos do encadeamento metodológico).

d) o quarto tópico define-se a partir do desenvolvimento de uma consciência quanto ao método, podendosituar-se tanto no âmbito de uma metodologia de projeto em design, quanto no de uma teoria do design

e/ou de uma teoria geral das atividades projetuais. O método pode ser considerado a partir de duasperspectivas: como “caminho pelo qual chega-se a um certo resultado, mesmo que este caminho não tenhasido fixado previamente de modo intencional e refletido”, e como”programa regulando previamente umaseqüência de operações a realizar e sinalizando certos erros que devem ser evitados, visando atingir umresultado determinado” (Lalande, 1976: 623). A partir desses dois modos de ocorrência estruturam-se asduas tendências de tomada de consciência do método: a primeira a posteriori, caracterizando um vetor decompreensão da prática; e a segunda colocando-se para esta prática de modo apriorístico. No âmbito dessetópico é que se desenvolve a consideração especificamente teórica das características que a prática dodesign apresenta. E é também aí que: 1) coloca-se a questão da autonomia relativa do plano teórico face àprática correspondente; 2) a metodologia de projeto é confrontada teoricamente com a metodologia dapesquisa científica.(8)

Aos três primeiros tópicos correspondem a manifestação/concretização do método, lembrando que, se

respeitada a especificidade de cada projeto de design, o encadeamento metodológico deve ser consideradoem seu caráter singular. No entanto a construção de uma consciência quanto à prática leva à depuração eao estabelecimento de traços gerais. E o quarto tópico corresponde à institucionalização de um espaço dereconhecimento e compreensão teórica do método, e de sua consequente caracterização como objetocientífico.

A relação entre este lugar de representação analítica do método e o método em ação, a que se referem ostrês primeiros tópicos, levanta algumas questões. Inicialmente temos que a não familiaridade com acompreensão teórica não invalida a possibilidade de que uma compreensão vivencial-prática do métodogaranta a qualidade de um projeto. Apesar de óbvia a observação se justifica frente ao fato de que anatureza do trabalho teórico – que busca a isenção e o distanciamento face ao empiricamente dado – pode

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sugerir uma desqualificação do método em ação que não se reconhece em sua possível dimensãoteórica.(9) Em contrapartida existem, simétrica e igualmente inconsistentes, as radicalizações por parte dosque buscam uma “essencialidade prática” e desqualificam a possibilidade de uma reflexão teórica sobre aprática e o método. É importante enfatizar que, mesmo se esta reflexão não tem uma aplicabilidadediretamente operativa sobre a prática, ela confere consistência ao campo do design e, consequentemente, àsua prática, contribuindo mediatamente para um aprofundamento da sua compreensão.

Buscaremos balizar, a seguir, alguns aspectos do primeiro tópico (sendo que pretendemos, num futuropróximo, fazer o mesmo em relação aos outros três).

2- Objetivos e metodologia do projeto

Conforme indicado, os objetivos do projeto são dados por uma conjugação de referências trazidas pelosagentes do processo, conectados a partir da decisão empresarial ou institucional de levar adiante umaprodução particular.(10) Destaca-se aí o cliente ou o empregador face ao designer e a outros profissionaisigualmente técnicos.

A solicitação feita a esses profissionais parte, logicamente, de uma intenção produtivo-comercial

considerada viável, e envolve aspectos da cultura empresarial, tais como o suposto conhecimento domercado, a disposição de investir etc. Assim como pressupõe o conhecimento das profissões queviabilizam o projeto, sua produção, distribuição e venda. Isto significa que os objetivos geraisempresariais, os quais levam ao acionamento do designer, também podem, se for o caso, levar aoacionamento do engenheiro, dos profissionais de marketing e de propaganda etc, os quais partilham omesmo espaço – apresentando similaridades, especificidades, confluências e conflitos – com o designer.

Apesar da caracterização dos conhecimentos técnicos respectivos ocorrer no âmbito das relações detrabalho, sua legitimação social articula-se a partir da regulamentação profissional, da delimitação de umaárea no sistema de ensino, da ação de associações profissionais etc. Mas isso não significa queconsolidações no âmbito institucional garantam as especificidades técnicas próprias das relações detrabalho. O processo de caracterização dos campos é dinâmico, pois conjuntamente com a dinâmica dasociedade eles continuamente se transformam: colocam-se “crises de fronteira”, assiste-se à migração e à

apropriação de temas de um campo por outros, limites epistemológicos são relativizados por novastecnologias que englobam aspectos de vários campos etc.

As iniciativas de institucionalização social buscam acompanhar – e intervir – nesses confrontos erearranjos, sendo que a sua estratégia principal é dada pela busca de uma concepção unitária do campo.Mas enquanto, de acordo com esta lógica, as especializações são compreendidas como desdobramentos deuma unidade conceitual, no mercado as especializações colocam-se a partir de uma relativa autonomiaprática; mesmo porque elas eventualmente surgem aglutinando questões e iniciativas de mais de umcampo.(11) No balizamento dos objetivos temos, assim, tanto as diferenças entre campos profissionais,quanto aquelas entre especializações em um campo. Como também existem as diferenças entreconcepções da prática que surgem em contextos histórico-sociais definidos e assumem caráterideológico.(12)

2.1- Objetivos gerais do design como atividade 

Uma vez reconhecida a política de comparação/confronto/confluência entre as referências invocadas parao estabelecimento dos objetivos do projeto, e independentemente tanto das alianças efetuadas quanto dasatitudes tomadas pelo designer neste processo, podem ser indicadas algumas diretrizes que se consagraramcomo objetivos gerais da prática profissional. Mesmo que por algum tipo de adequação o designer venha anão insistir em alguma ênfase específica, ou mesmo venha a abrir mão da defesa dessas referências.

Coloca-se, inicialmente, o aspecto formal das relações entre cliente, usuário/consumidor, designer,podendo ser indicados pontos programáticos (quase clichês):

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a) o solicitante deve ser atendido, e estão associadas a esta determinação o respeito às condições eviabilidade produtivas, a busca da racionalização da produção, um bom desempenho das vendas etc;b) o usuário/consumidor deve ficar satisfeito, e para isto o seu perfil deve ser respeitado; ao mesmo tempodeve-se buscar ultrapassar seu horizonte de expectativa, otimizando condições de percepção e de uso;c) o projeto deve apresentar qualidade que contribua para uma boa imagem pública do trabalho de design,fortalecendo o campo e as opções de mercado do profissional (que depende de seu trabalho parasobreviver).

Por outro lado esta grade de relações prevista para o projeto é atravessada pela consideração dos objetivossociais da atividade, tendo em vista tanto o plano empresarial quanto o plano técnico. E isto aponta para adimensão ética da atividade, que se distingue da ética profissional pois se liga: a) a um projeto próprio daburguesia industrial, pregando a expansão da produção em função de uma desejável democratização doconsumo; b) à busca de qualidade e à “honestidade” do produto (segundo um registro propriamentetécnico).(13) É importante assinalar que, no cenário atual, a questão da responsabilidade social dasempresas não se limita mais a um “funcionamento saudável” da economia capitalista. Um novoenquadramento ético deve partir do reconhecimento de que a expansão e a integração mundial dasatividades econômicas coloca novas questões de ordem holística face às transformações do planeta e àdegradação do meio ambiente; e isto vem somar-se ao problema dos déficits de desenvolvimento social da

maior parte da população.2.2- Estruturação dos objetivos específicos 

À singularidade de uma solicitação projetual vai corresponder uma articulação específica entre a definiçãodo(s) produto(s) a serem desenvolvidos e as condições para o respectivo desenvolvimento. E estas sãodadas pela disponibilidade dos dados, pelo dimensionamento orçamentário, pelo estabelecimento de umcronograma, pela eleição de referências visuais/plásticas etc. A esta estruturação corresponderá umbriefing, termo emprestado da propaganda, ou um programa, termo usado na arquitetura, ou acaracterização de um problema de design, conforme a categorização proposta pela teoria do problemsolving etc.(14)

Inicialmente é importante assinalar que o cliente pode estar equivocado na caracterização dos objetivos

específicos. De modo similar, uma investigação sobre o que o usuário/consumidor considera o melhordesejável pode não dar conta da questão. Pois se uma pesquisa quanto às expectativas do consumidor nãoé bem conceituada, ela pode não chegar a identificar melhoras possíveis, pois se estas ainda não existem,não podem ser pensadas ou imaginadas pelo consumidor. Daí a importância de um diagnóstico elaboradopelo designer (mas que deve ser aprovado pelo cliente), buscando contextualizar e compreender ademanda feita, considerando os dados disponíveis, e as intenções e expectativas do cliente, assim como apossibilidade de melhoria da qualidade de vida do consumidor.

E existe a limitação dada pelos protocolos formais/funcionais do(s) tipo(s) de produto(s) a ser(em)projetado(s) – circunscrição de necessidades, programas e formatações de uso –, assim como a suainserção nos sistemas de circulação social – canais de comercialização, projeção de imagem em veículos emídias etc.

Em relação a esses protocolos/limitações, e utilizando um esquema produzido pela Teoria da Recepçãoliterária, pode-se dizer que “existe um ´horizonte de expectativa´ (...) Este descreve as convenções de ummodo, tradição, genre ou idioma literário às quais um trabalho particular se relaciona, e as quais um leitor,tendo internalizado tais características da experiência da leitura, traz para um novo trabalho. Este sistemainterativo de convenções e expectativas compreende um paradigma, mas trabalhos individuais podem ircontra a disposição do leitor de recebê-los nos seus termos, e assim iniciar um novo horizonte.” (Brooker,1999:188). Ou seja: é necessário considerar – para reafirmar ou alterar – os protocolos da formataçãofuncional, seja a partir das diferenças entre tipos de produto, seja a partir das variações possíveis de ummesmo tipo.

3- Conclusão

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 Acreditamos em um compromisso com a pragmática do projeto de design. Segundo o que foi exposto, istoleva a uma relativização da intenção demiúrgica que pode estar presente no estabelecimento dos objetivos.Ela se impõe face à constatação de que não existe uma “pureza técnica” neste estabelecimento, supostapela idealização do design como atividade funcional e eticamente correta: os objetivos resultam tanto dereferências profissionais, éticas diferenciadas e de uma movimentação micro-política por parte dos agentesque se defrontam no mercado, quanto do caráter heterogêneo das forças em jogo e seu cruzamento deintenções e referências técnicas com pressupostos e iniciativas empresariais.

Com esta conclusão nossa intenção não é a de desenhar um cenário de pessimismo projetual. Trabalhar noestabelecimento de objetivos significa acionar diretrizes que, conforme indicado acima, apesar daindependência de seu caráter de enunciação, podem efetivamente interferir nos processos concretos, tantono nível diretamente operativo, quanto em eventuais repercussões de caráter social. De todo modo éimportante estar atento às atitudes de uma razão cínica que, alegando realismo, acaba glorificando a lógicacega do mercado.(15)

Notas

1) O termo ´atualização´ deve ser aqui compreendido com base na oposição atual/virtual. É importante assinalar queeste talvez seja o tópico mais investigado na bibliografia especializada, embora frequentemente a ênfase seja dadamais a aspectos operacionais do que à relação entre o pensamento projetual e a efetivação projetual.2) Objetivar sendo compreendido como “dar existência material” (Houaiss)3) Ítalo Calvino destaca este tipo de processo no âmbito da produção literária: “a primeira coisa que me vem à mente naidealização de um conto é, pois, uma imagem que, por uma razão qualquer se apresenta a mim carregada designificados, (…) a partir do momento em que começo a por o preto no branco, é a palavra escrita que conta: à busca deum equivalente da imagem visual se sucede o desenvolvimento coerente da impostação estilística inicial, até que poucoa pouco a escrita se torna a dona do campo” (Calvino, 1990: 104-105)4)) Este modelo teórico baseia-se na formulação desenvolvida por Deleuze e Guattari, quanto à oposiçãoexpressão/conteúdo proposta pela lingüística. Ao primeiro termo dessa polaridade correspondem as transformaçõesincorpóreas dadas no plano discursivo – funcionando os enunciados como “palavras de ordem” –, e ao segundocorrespondem as misturas de corpos, ou seja, suas ações e paixões recíprocas. O primeiro seria o “pólo rosto-linguagem, ou a lição dos signos” e o segundo seria o “pólo mão-ferramenta, ou a lição das coisas” (Deleuze, 1995: 11-4). Vale salientar que este modelo esclarece não apenas a relação entre objetivos/diretrizes e desenvolvimento do

projeto. Ele também funciona no âmbito da investigação quanto à polaridade existente entre síntese projetual e osprocessos de percepção/uso do produto correspondente. Pretendo desenvolver esta questão em texto futuro.5) Em um consistente trabalho sobre as diferenças entre método de projeto e método científico, Luis Antonio Coelhodesenvolve, entre outras, esta questão. (Coelho, 1999)6) Maldonado indica que não se deve partir “exclusivamente de uma idéia apriorística sobre o valor estético (ouestético-funcional) da forma, (.. .) o design não é uma atividade projetual cujas motivações se situam à parte eprecedem o processo constitutivo da própria forma” (Maldonado, 1977: 13)7) Segundo a acepção que o termo “caixa-preta” assume nas áreas da informática, da ciberética e da eletrônica, como“nome dado a qualquer elemento, máquina ou dispositivo de cujo funcionamento não se tem nenhum conhecimento poracesso direto, sendo apenas identificado ou caracterizado através da verificação da relação existente entre asinformações ou estímulos que chegam a ele (entrada) e as respostas de saída” (Houaiss)8) Ver Coelho, 1999.9) Uma crítica deste tipo de paradoxo pode ser encontrada na introdução do livro Lógica de Port Royal, marco da

reflexão quanto aos métodos da lógica, que foi publicado em 1662: “[é chamada método a ordenação da] ação doespírito pela qual, tendo sobre um mesmo assunto diversas idéias, diversos julgamentos e diversos raciocínios, ele osdispõe da maneira mais adequada para levar ao conhecimento deste assunto. (…) Tudo isto é feito naturalmente eeventualmente de modo melhor por aqueles que não aprenderam nenhuma regra de lógica do que por aqueles que asaprenderam” (apud . Lalande, 1976: 623).10) O projeto pode surgir a partir de iniciativa empresarial ou do poder público. Não desenvolveremos esta questão poiso que nos interessa aqui é a autonomia decisória de quem solicita o projeto.11) Como é, por exemplo, o caso do branding e da area de HCI.12) Como no caso do confronto entre o “engineering first” e o “styling first” na indústria automobilística norteamericana das primeiras décadas do século XX.13) Pode-se dizer que o designer, assim como outros profissionais ligados à atividade industrial, coloca-se como umintelectual orgânico da burguesia industrial, conforme a categoria proposta por Gramsci. Isto supõe a minha adesão à

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leitura que compreende a definição do intelectual orgânico não apenas a partir de uma vinculação explicitamentepolítica à ação da classe a que se liga, mas também como aquele intelectual que tem a sua existência e práticapossibilitadas pela ascensão política dessa classe. A respeito dessa questão ver também entrevista de Pedro Luiz Pereirade Souza (SOUZA, 2007)14) Vale assinalar que o programa do projeto de arquitetura sugere uma acepção não muito clara para o design, já quepara este o termo é utilizado em oposição a produto, com a acepção de processo de implantação de um sistema de

 produtos.15) tomo a categoria de razão cínica de COSTA, 1989.

BIBLIOGRAFIA

BROOKER, Peter. A concise glossary of cultural theory. London: Arnold; New York: OxfordUniversity Press, 1999.CALVINO, Ítalo. Seis propostas para o próximo milênio: lições americanas. Tradução de Ivo Barroso.São Paulo: Companhia das Letras, 1990.COELHO, Luiz Antonio L. Percebendo o método, em COUTO, Rita Maria de Souza; OLIVEIRA, AlfredoJefferson de (org.). Formas do design: por uma metodologia interdisciplinar. Rio de Janeiro: 2AB,PUC-Rio, 1999.COSTA, Jurandir Freire. Narcisismo em tempos sombrios, em BIRMAN, Joel. Percursos na história da

psicanálise. Rio de Janeiro: Taurus, 1989.DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs – capitalismo e esquizofrenia. Vol. 2. Tradução deAna Lúcia de Oliveira e Lúcia Cláudia Leão. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995.LALANDE, André. Vocabulaire technique et critique de la philosophie. Paris: Presses Universitairesde France, 1976.MALDONADO, Tomas. Vanguardia y racionalidad – artículos, ensayos y otros escrito: 1946-1974 .Prólogo de Tomas Llorens; tradução de Francesc Serra i Cantarell. Barcelona: Ed. Gustavo Gili, 1977.SOUZA, Pedro Luiz Pereira de. Entrevista com Pedro Luiz Pereira de Souza (06.07.07) (concedida a AnaCarolina Felix e Juliano Kestenberg, sobre curso ministrado no Centro Universitário Maria Antônia, daUSP entre 17 e 19 de julho de 2007). Disponível em http://www.esdi.uerj.br/sinal Acesso em 23 jul 2007.