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TRABALHO
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Centro Universitário Franciscano
Curso de Letras
Disciplina de Morfologia II
Professor Adriano Cezar
O uso de advérbios modalizadores em diferentes gêneros textuais:
breves considerações
Mariel Rossato Pesamosca
Santa Maria
Setembro de 2015
Considerações Iniciais
Refletir sobre as classes gramaticais, seus usos e implicações na Língua
Portuguesa é imprescindível para alunos de Licenciatura em Letras. Para tanto, esse
trabalho tem como objetivo a reflexão sobre o uso dos advérbios modalizadores no texto
escrito. Esse breve estudo justifica-se frente à necessidade de repensar o ensino da
língua materna nas escolas, principalmente as públicas, o qual ainda é calcado no ensino
sistemático de regras, sem discussões acerca do sentido e efeitos de sentido que a
escolha de determinados vocábulos em detrimento de outros acarreta ao discurso e ao
receptor desse discurso.
Para iniciar a discussão sobre esse assunto é importante que se tenha bem
definido os conceitos de língua que norteiam o trabalho. Para isso, traz-se a concepção
de língua abordada por IRANDÉ ANTUNES (2014, p. 18) que é de que a língua é
interação, ou seja, a língua é , conforme a autora, "ação" entre dois ou mais sujeitos. Ela
representa uma "ação conjunta, no sentido de que os participantes exercem, entre si,
múltiplas influências". A autora reforça ainda que, sob essa concepção de língua supõe-
se "reciprocidade e disposição colaborativa" para o cumprimento de algum propósito
comunicativo numa determinada situação social.
A gramática, por sua vez, diante da teoria de que a língua é interação, não deve
se constituir sozinha, separadamente de atividades verbais realizadas pelos seus falantes.
Por isso, conforme ANTUNES ( 2014, p.25),
(...) não existe gramática fora da língua. É na interação, é no cruzamento de todas as ações verbais que a gramática se vai internalizando e se consolidando a ponto de se estabelecer como algo constitutivo do saber linguístico de todo o falante. (grifo meu).
Diante disso, os professores de língua portuguesa devem saber qual concepção
de língua está norteando seu trabalho e que a concepção de língua como interação
pressupõe uma abordagem que tenha ligação com aquilo que o estudante já traz de
bagagem cutural. Outra noção que professores e, expandindo a abrangência, a escola
devem ter é que o desafio de uma instituição de ensino é ensinar a ler e a escrever. Para
que isso aconteça satisfatoriamente, o aluno (além de o professor) deve saber o motivo
da produção textual, seu objetivo, suporte, entre tantos outros aspectos que remetem à
teoria de gêneros textuais.
Gênero textual, segundo MARCUSCHI (2008, p. 155) "são textos
materializados em situações comunicativas recorrentes." Ainda segundo o autor, eles
são encontrados em nossa vida diária e apresentam padrões sociocomunicativos
definidos pelas "composições funcionais, objetivo enunciativos" entre outras
características.. A concepção de língua como interação e a teoria de gêneros textuais
devem permear o agir do professor de Língua Portuguesa em sala de aula. Dessa forma,
classificações estanques e descontextualizadas de termos gramaticais são esquecidos e
não fazem sentido.
1. O advérbio
A classe gramatical advérbio caracteriza-se como, conforme EVANILDO
BECHARA (2009, p. 287), " a expressão modificadora que por si só denota uma
circunstância e desempenha na oração a função de adjunto adverbial". Esse autor
reforça ainda que essa classe gramatical não se prende apenas a um núcleo, como o
verbo, por exemplo, mas ele pode aparecer, considerando-se o critério sintático, em
diferentes posições sempre relacionado ao conteúdo explicitado no predicado. Em
função dessa modalidade, BECHARA (2009) afirma que o papel semântico-sintático
do advérbio acontece de forma mais interna ou externa em relação ao núcleo verbal.
A classificação e a identificação de um advérbio ou de uma locução adverbial
e a classificação sintática como adjunto adverbial, no entanto não é relevante se não
houver uma reflexão sobre o efeito de sentido que a circunstância exprimida pelo
advérbio e a posição frasal acarretam no entendimento do enunciado e é essa reflexão
que o professor de português deve estimular em seus alunos.
1. 1. Os advérbios modalizadores
As gramáticas tradicionais seguidas nas escolas trazem três critérios para
classificar as palavras: o morfológico, semântico e sintático. Esses três critérios, no
entanto, são apresentados separadamente e não dão conta de classificar todas as
ocorrências da língua.
Para tanto, a classificação de advérbios modalizadores apresentada por NEVES (
2011, p. 244) torna-se interessante uma vez que a maioria dos autores de gramáticas
não apresentam essa classificação e ela não chega aos alunos escolares. Segundo essa
autora, os advérbios modalizadores "compõem uma classe ampla de elementos
adverbiais que têm como característica básica expressar alguma intervenção do falante
na definição de validade e do valor de seu enunciado."
NEVES ( 2011, p. 245) divide os advérbios modalizadores em subclasses que
são: "os modalizadores epistêmicos, modalizadores delimitadores, modalizadores
deônticos e modalizadores afetivos" conforme conceitos abaixo:
Advérbios modalizadores
epistêmicos:
expressam uma avaliação que passa pelo conhecimento
do falante.
Advérbios modalizadores
delimitadores
não garantem nem negam propriamente o valor da
verdade do que se diz
Advérbios modalizadores
deônticos
são usados para indicar uma obrigação, dever, tais como
" obrigatoriamente" e "necessariamente".
Essas são as classificações dos advérbios trazidas por NEVES (2011) as quais
possibilitam uma análise mais ampla em relação a essa classe gramatical. O que a torna
importante é a consideração do uso como classificador do advérbio. Dessa mesma
forma as classes gramaticais devem ser trabalhadas em sala de aula, com base no seu
uso e nos sentidos que esse uso proporciona.
Assim, trabalhar advérbios em sala de aula pode ser uma experiência
interessante quando associada à produção textual de diferentes gêneros, por exemplo. O
uso de advérbios modalizadores em uma redação de vestibular marca a tese, o
posicionamento do autor em relação ao tema. Em textos jornalísticos, a presença de
advérbios modalizadores indica a ideologia da empresa jornalística uma vez que
demonstra implicitamente e , é possível dizer, explicitamente, o posicionamento em
relação ao acontecimento narrado.
Pode-se constatar tal fato no seguinte texto do doutor Jairo Bauer, publicado no
site UOL.
Brutalidade não pode ser reação à cantada
Jairo Bouer
Infelizmente, em menos de um mês tenho que voltar ao tema da violência
gratuita, face aos incidentes que aconteceram em plena avenida Paulista,
quando um grupo de quatro menores e um garoto de 19, todos de classe média
e teoricamente "educados", agrediram outros jovens.
Nesse parágrafo inicial, observa-se que a primeira palavra do texto é um
advérbio epistêmico que explicita a opinião do autor sobre o fato narrado, no caso, tem-
se um fato de agressão sobre o qual, Jairo Bauer é contra já que trata-se de um ato
violento feito por pessoas consideradas com boa educação, que segundo as aspas na
palavra "educados' já demonstra que o autor não concorda com a educação apresentada
pelos jovens.
No seguinte editorial, publicado no jornal O GLOBO em 2013 também é um
exemplo de texto jornalístico com a opinião bem marcada pelo uso de advérbios.
Na quinta linha do primeiro parágrafo, o auto usa o advérbio "principalmente"
para explicar o "flagelo que as drogas são no planeta" e achar os responsáveis por isso,
no caso, "as políticas equivocadas". Dessa forma, o autor já sinaliza o seu
posicionamento sobre as políticas de erradicação de drogas e deixa claro que são
equivocadas pois são baseadas na força da polícia.
No quarto parágrafo, quando há uma análise da situação do Brasil, outro
advérbio é utilidado: infelizmente. O escritor do editorial usa esse advérbio para indicar
que no Brasil, apesar de aguns avanços no assunto drogas, há uma força política forte
que permite um retrocesso em tomadas de decisões relativas a esse assunto.
Portanto, a partir dessa breve análise, é possível observar que os advérbios
modalizadores estão presentes em textros cotidianos e deixam bem marcado o
posicinamento do autor, possibilitanto uma crítica ou uma reflexão acerca de diferentes
assuntos.
Considerações Finais
A concepção de língua que o professor de língua portuguesa possui influencia a
forma com que ele transmitirá informações acerca da língua ao seu aluno. Uma
concepção de língua como interação, na qual o falante age sobre essa língua, permite
que os alunos reflitam sobre o uso das classes gramaticais e a disposição sintática dessas
classes em uma frase ou parágrafo e construam suas conclusões sobre como a língua se
constitui no seu uso. É dessa maneira que se torna possível a presença de pessoas
capazes de interpretar, refletir e entender a ideologia, o posicionamento , a opinião que
os diferentes gêneros do discurso, presentes no dia a dia, possuem. Além disso, é
possível, com um ensino de língua baseado no uso, que os alunos percebam o quanto a
língua é viva e é usada para criar opiniões e até manipular.
Portanto, a ideia de advérbios modalizadores é bastante válida para a marcação
de posicionamento, atitudes, desejos do falante e amplia a classificação e uso dessa
classe gramatical vista apenas como indicadora de circunstâncias. Ela assim o é, mas
também é muito mais que isso, ela permite a manifestação do usuário da língua e é isso
que deve-se ser abordado na escola, para, assim, buscar-se o efetivo surgimento de
pessoas pensantes e sujeitos da língua que os constitui.
Referências Bibliográficas
ANTUNES, Irandé. Gramática contextualizada: limpando o pó das ideias simples. 1 ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2014.
BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 37. ed. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2009.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise e compreensão. São Paulo:
Parábola Editorial., 2008.
NEVES, Maria Helena de Moura. Gramática de usos do português. São Paulo:
Editora UNESP, 2011.
SALGADO, Janaína Lopes. Advérbios modalizadores discursivos, advérbios de
comentário avaliativo ou palavras modais? Um estudo comparativo das descrições
gramaticais do item lexical advérbio em português e alemão. In: Pandemonium . v.15,
n 19. São Paulo, Julho de 2012, p. 154-184.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/folhatee/fm2211201012.html. Acesso em 26 de
setembro de 2015.
http://coletivodar.org/2013/03/editorial-de-o-globo-projeto-que-altera-lei-de-
drogas-precisa-ser-barrado-no-congresso/. Acesso em 26 de setembro de 2015.