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Tradução de CRISTINA CAVALCANTI Revisão …G78c CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Grandin, Temple, 1947-O cérebro autista [recurso

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Tradução deCRISTINA CAVALCANTI

Revisão técnica deMARIANA BORGES DE MORAES

1ª edição

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2015

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G78c

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NAFONTE

SINDICATO NACIONAL DOSEDITORES DE LIVROS, RJ

Grandin, Temple, 1947-O cérebro autista [recurso

eletrônico] / Temple Grandin,Richard Panek; tradução MariaCristina Torquilho Cavalcanti. - 1.ed. - Rio de Janeiro: Record, 2015.

Recurso digital

Tradução de: The autistic brain:thinking across the spectrum

Formato: epubRequisitos do sistema: adobe

digital editionsModo de acesso: world wide webISBN 978-85-01-10633-9

(recurso eletrônico)

1. Autismo - Diagnóstico. 2.Livros eletrônicos. I. Panek,

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15-25433

Richard. II. Título.

CDD: 618.928982CDU: 618

Título original em inglês:The autistic brain: thinking across thespectrum

Copyright © Temple Grandin e RichardPanek, 2013

Texto revisado segundo o novo AcordoOrtográfico da Língua Portuguesa.

Todos os direitos reservados. Proibida areprodução, armazenamento outransmissão de partes deste livro, atravésde quaisquer meios, sem prévia autorizaçãopor escrito.

Direitos exclusivos de publicação em línguaportuguesa para o Brasil adquiridos pela

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EDITORA RECORD LTDA.Rua Argentina, 171 – 20921-380 – Rio deJaneiro, RJ – Tel.: 2585-2000,que se reserva a propriedade literária destatradução.

Produzido no Brasil

ISBN 978-85-01-10633-9

Seja um leitor preferencialRecord.Cadastre-se e recebainformações sobre nossoslançamentos e nossaspromoções.

Atendimento direto ao leitor:[email protected] ou (21) 2585-2002.

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Sumário

Prólogo

PARTE 1: O cérebro autista

1. Os significados do autismo2. Uma luz no cérebro autista3. O sequenciamento do cérebroautista4. Esconde-esconde

PARTE 2: Repensar océrebro autista

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5. Olhar para além dos rótulos6. Conhecer seus pontos fortes7. Repensar por imagens8. Das margens ao centro

Apêndice: O teste de QA

Notas

Agradecimentos

Índice

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Prólogo

Neste livro serei a sua guia porum passeio pelo cérebro autista.Ocupo uma posição singularpara falar tanto das minhasexperiências com o autismoquanto dos insights que tive aolongo de décadas, tendo mesubmetido a diversos estudos docérebro, sempre com atecnologia mais avançada. Nofinal da década de 1980, logoque a ressonância magnética

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nuclear (RMN) se tornouacessível, me entusiasmei com apossibilidade de fazer minhaprimeira “viagem ao centro domeu cérebro”. Na época, osaparelhos de RMN eramraridades, e ver a anatomiadetalhada do meu cérebro eraalgo assombroso. Desde então,cada vez que surge um novométodo de escaneamento sou aprimeira da fila a experimentá-lo. Os vários escaneamentos domeu cérebro forneceramexplicações possíveis para oatraso da minha fala nainfância, as crises de pânico e a

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dificuldade de reconhecerrostos.

O autismo e outrostranstornos do desenvolvimentocontinuam sendo diagnosticadossegundo o desastroso sistema deperfil comportamental de umlivro intitulado DSM,abreviação de Diagnostic andStatistical Manual of MentalDisorders [Manual diagnósticoe estatístico de transtornosmentais]. À diferença dodiagnóstico de uma infecção degarganta, os critérios dedetecção do autismo mudam acada edição do DSM. Quero

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alertar pais, professores eterapeutas para que evitem seprender a rótulos. Eles não sãoprecisos. Rogo-lhes: nãopermitam que uma criança ouum adulto sejam definidos porum rótulo do DSM.

A genética do autismo é umimbróglio excessivamentecomplicado. Ela envolvediversas pequenas variações nocódigo genético que controlamo desenvolvimento cerebral. Avariação genética encontradanuma criança autista estaráausente em outra criança

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autista. Analisarei as últimasnovidades da genética.

Pesquisadores fizeramcentenas de estudos sobre asdificuldades dos autistas com acomunicação social e oreconhecimento facial, masesqueceram-se das questõessensoriais. A hipersensibilidadesensorial é totalmentedebilitante para alguns emoderada para outros. Osproblemas sensoriais podemimpedir certos indivíduos noespectro autista de participar deatividades familiares comuns etambém de conseguir emprego.

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Por isso, minhas prioridades napesquisa sobre autismo são osdiagnósticos precisos e amelhoria nos tratamentos dosproblemas sensoriais.

O autismo, a depressão eoutros transtornos estão numcontínuo que vai do normal aoanormal. O excesso de um traçocausa incapacidade severa, masum pouco dele pode ser umavantagem. Se todos ostranstornos cerebrais genéticosfossem eliminados, as pessoaspoderiam ser mais felizes, mascom um preço terrível a pagar.

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Quando escrevi Thinking inPictures [Pensar por imagens],em 1995, equivoquei-me aojulgar que todos no espectroautista eram pensadores visuaisfotorrealistas como eu. Quandocomecei a entrevistar pessoassobre como faziam pararecordar informações, percebique estava equivocada. Teorizeique havia três tipos depensamento especializado, efiquei exultante ao descobririnúmeras pesquisas quecorroboravam minha tese.Compreender o tipo depensador que você é ajuda a

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respeitar suas limitações e,igualmente importante, aaproveitar seus pontos fortes.

O panorama em que nasci,há 65 anos, era muito diferentedo atual. Passamos dainstitucionalização de criançascom autismo severo à tentativade proporcionar-lhes uma vida amais plena possível — e, comoserá visto no capítulo 8,encontrar trabalhossignificativos para os que sãocapazes de fazê-los. Este livromostra cada passo de minhajornada.

TG

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Parte 1

O CÉREBROAUTISTA

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1 Os significados doautismo

Tive a sorte de nascer em 1947.Se tivesse nascido dez anosdepois, minha vida comoalguém com autismo teria sidobem diferente. Em 1947, odiagnóstico de autismo tinhaapenas quatro anos. Quaseninguém sabia do que setratava. Quando minha mãepercebeu que eu tinha sintomasdo que hoje se rotula de autista

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— comportamento destrutivo,incapacidade de falar,sensibilidade ao contato físico,fixação em objetos giratóriosetc. —, fez o que lhe pareceucorreto. Levou-me a umneurologista.

Bronson Crothers era diretordo serviço de neurologia doHospital Infantil de Bostondesde sua fundação, em 1920.No meu caso, a primeira coisaque o dr. Crothers fez foi umeletroencefalograma, ou EEG,para saber se eu tinha o petitmal, a epilepsia. Depois testouminha audição, para ter certeza

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de que eu não era surda. “Bem,ela é mesmo uma meninaestranha”, disse ele a minhamãe. Depois, quando comecei abalbuciar, ele modificou suaavaliação: “Ela é uma meninaestranha, mas vai aprender afalar.” O diagnóstico: danocerebral.

Ele nos recomendou umafonoaudióloga dona de umapequena escola no porão decasa. Acho que se pode dizerque as outras crianças látambém tinham dano cerebral,como síndrome de Down eoutras perturbações. Embora eu

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não fosse surda, tinhadificuldade em distinguir asconsoantes, como o c de copo.Quando os adultos falavammuito rápido, eu só ouvia ossons das vogais, então achavaque eles usavam uma linguagemespecial. Porém, falandodevagar, a terapeuta me ajudoua ouvir os sons das consoantesduras, e quando falei copo comc, ela me elogiou — que é o queum terapeuta comportamentalfaria hoje.

Ao mesmo tempo, minhamãe contratou uma babá queconstantemente propunha a

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mim e à minha irmãbrincadeiras em que se participapor turnos. A atitude da babátambém era semelhante à dosterapeutas comportamentais dehoje em dia. Em todas asbrincadeiras tínhamos deesperar a nossa vez. Durante asrefeições, aprendi a mecomportar à mesa e não medeixavam girar o garfo no aracima da cabeça. O únicomomento em que podiaregressar ao autismo era umahora a cada dia, após o almoço.No resto do dia, tinha de viver

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num mundo que não balançavanem girava.

Mamãe fez um trabalhoheroico. Na verdade, descobriupor conta própria o tratamentopadrão que os terapeutasempregam hoje. Eles podemdivergir quanto aos benefíciosde um aspecto em particulardesta terapia, comparada a umaspecto particular de outra.Mas o princípio básico de todosos programas — inclusive o quefoi usado comigo, o da Escolade Terapia da Fala da srta.Reynolds — é a interaçãopessoal diária durante horas, de

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vinte a quarenta horas porsemana.

Contudo o trabalho queminha mãe fez baseou-se nodiagnóstico inicial de danocerebral. Uma década maistarde, um médico poderia terchegado a um diagnósticototalmente diferente. Depois deme examinar, teria dito a ela:“É um problema psicológico —está tudo na mente dela.” E meencaminharia a uma instituição.

Tenho escrito muito sobreautismo, mas nunca escrevirealmente sobre como se chegaao diagnóstico. À diferença da

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meningite ou da infecção degarganta, o autismo não podeser diagnosticado emlaboratório — embora ospesquisadores estejam tentandocriar métodos para tal, comotratarei mais adiante neste livro.Em vez disso, como no caso demuitas síndromes psiquiátricas,como a depressão e o transtornoobsessivo-compulsivo, oautismo é identificado pelaobservação e avaliação docomportamento. As observaçõese avaliações são subjetivas, e oscomportamentos variam de umapessoa para a outra. O

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diagnóstico pode ser confuso evago. Ele mudou ao longo dosanos e continua apresentandomudanças.

O diagnóstico de autismo éde 1943, quando Leo Kanner,médico da Universidade JohnsHopkins e pioneiro dapsiquiatria infantil, o propôs emum artigo. Alguns anos antes elerecebera uma carta de um paipreocupado chamado OliverTriplett Jr., um advogado deForest, no Mississippi.1 Aolongo de 33 páginas, Triplettdescreveu detalhadamente osprimeiros cinco anos da vida de

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seu filho Donald. Relatou que ofilho parecia não querer ficarperto da mãe, Mary.Permanecia “totalmente alheio”a todos à sua volta. Tinhaataques de raiva frequentes,muitas vezes não atendiaquando o chamavam pelo nomee achava os objetos giratóriosinfinitamente fascinantes.Contudo, apesar de tantosproblemas de desenvolvimento,Donald exibia talentosincomuns. Aos dois anosmemorizou o Salmo 23 (“OSenhor é meu pastor...”). Eracapaz de recitar as 25 perguntas

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e respostas do catecismopresbiteriano. Adorava dizer asletras do alfabeto de trás para afrente. Tinha ouvido absoluto.

Mary e Oliver levaram ofilho de Mississippi a Baltimorepara que Kanner o examinasse.Nos anos seguintes, o médicocomeçou a identificar traçossimilares em outras crianças.Qual seria o padrão?,perguntava-se. Essas criançassofreriam todas da mesmasíndrome? Em 1943, Kannerpublicou um artigo, “AutisticDisturbances of AffectiveContact” [Distúrbios Autísticos

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do Contato Afetivo] na revistaThe Nervous Child. O artigoapresentava estudos de caso deonze crianças que, segundo ele,compartilhavam um conjuntode sintomas — que hojesabemos estarem relacionadosao autismo: necessidade desolidão, necessidade deuniformidade. Estar só nummundo que nunca varia.

Desde o início, os médicosnão souberam como tratar oautismo. A origem dessescomportamentos seria biológicaou psicológica? Essescomportamentos eram o que

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essas crianças haviam trazido aomundo? Ou teria sido o mundoque os instilara neles? Oautismo era fruto da naturezaou da criação?

Kanner se inclinou pelaexplicação biológica doautismo, ao menos no início.No artigo de 1943 ele afirmouque os comportamentos autistaspareciam se apresentar desdetenra idade. No parágrafo finalele escreveu: “Devemos,portanto, supor que estascrianças vieram ao mundo comuma incapacidadebiologicamente inata de formar

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laços afetivos comuns de basebiológica com as pessoas, assimcomo outras crianças vêm aomundo com incapacidadesfísicas ou intelectuais inatas.”2

Contudo um aspecto das suasobservações o deixara intrigado.“Não é fácil avaliar o fato deque todos os pacientes sãofilhos de pais altamenteinteligentes. O certo é que háum alto grau de obsessão nohistórico familiar” — semdúvida, ele tinha em mente acarta de 33 páginas de OliverTriplett. “Os diários erelatórios muito detalhados e a

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recordação recorrente, apósvários anos, de que a criançaaprendera a recitar 25 perguntase respostas do catecismopresbiteriano, cantar 37 cançõesde ninar ou distinguir dezoitosinfonias são uma ilustraçãoeloquente da obsessão dos pais.

“Outro fato salta à vista”,prosseguiu Kanner. “Em todo ogrupo, há muito poucos pais emães afetuosos. Em suamaioria, os pais, avós e parentescolaterais são pessoas bastantepreocupadas com abstrações denatureza científica, literária ou

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artística e seu interesse genuínopelas pessoas é limitado.”

Esses comentários de Kannernão são tão condenatórios dospais como podem parecer.Nesse estágio inicial do estudosobre o autismo, Kanner nãoestava necessariamentesugerindo causa e efeito. Nemdizendo que, ao se comportaremdesse modo, os pais levavam osfilhos a se comportarem daquelemodo. Em vez disso, estavaconstatando semelhanças entreos pais e seus pacientes. Afinal,pais e filhos provinham domesmo pool genético. Os

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comportamentos de ambas asgerações poderiam ter origemno mesmo tropeço biológico.

Contudo, em artigo posteriorde 1949,3 Kanner mudou aatenção do biológico para opsicológico. O artigo tinha dezpáginas e meia; Kanner gastoucinco páginas e meia tratandodo comportamento dos pais.Onze anos depois, em entrevistaà Time,4 ele afirmou que ascrianças autistas em geral eramfruto de pais “que sedescongelaram apenas osuficiente para gerar um filho”.5Como ele era o primeiro e o

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mais eminente especialista naquestão do autismo, sua atitudeinfluenciou o pensamentomédico por pelo menos umquarto de século.

Mais tarde, Kanner contouque “diversas vezes foi malinterpretado como tendo ditoque ‘é tudo culpa dos pais’”.Queixou-se também de que oscríticos haviam descartado suapreferência original pelaexplicação biológica. Ele nãoera fã de Sigmund Freud;escreveu em um livro publicadoem 1941: “Se você quisercontinuar venerando o Grande

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Deus Inconsciente e seusintérpretes arrogantes, não hánada que o impeça.”

Mas ele também era umproduto da sua época, e seusanos mais produtivoscoincidiram com o surgimentodo pensamento psicanalítico nosEstados Unidos. Quandoanalisou os efeitos do autismo,Kanner deve ter dito a si mesmoque possivelmente tinhamorigem biológica, mas aindaassim conseguiu encontrar umacausa psicológica. E, aoespecular sobre os vilões quepodiam ter causado o dano

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psíquico, apontou os suspeitosde sempre da psicanálise: ospais (especialmente a mãe).

O raciocínio de Kannerprovavelmente se complicoupelo fato de que ocomportamento de crianças comuma criação inadequada pode separecer com o comportamentode crianças com autismo. Ascrianças com autismo podemser rudes quando, na verdade,apenas desconhecem as regrassociais. Elas podem ter acessosde raiva. Não param quietas,não compartilham osbrinquedos, interrompem as

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conversas dos adultos. Se vocênunca estudou ocomportamento de crianças comautismo, poderá facilmenteconcluir que o problema são ospais, e não as crianças. Masonde Kanner errou feio foi emsupor que, como a criaçãoinadequada podia levar ao maucomportamento, todo maucomportamento devia serresultado dessa criação. Elesupôs que a capacidade de umacriança de três anos de nomeartodos os presidentes e vice-presidentes dos EUA não podianão se dever à intervenção

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externa. Supôs que ocomportamento psiquicamenteisolado ou fisicamentedestrutivo não podia não serprovocado por paisemocionalmente distantes.

Na verdade, Kanner inverteucausa e efeito. A criança não secomportava de modopsiquicamente isolado oufisicamente destrutivo porque ospais eram emocionalmentedistantes. Em vez disso, os paisé que eram emocionalmentedistantes porque a criança secomportava de um modopsiquicamente isolado ou

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fisicamente destrutivo. Minhamãe é um desses casos. Elaescreveu que, quando eu nãoretribuía seus abraços, elapensava: Se a Temple não mequer, manterei distância.6Porém o problema não era queeu não a quisesse. Era que asobrecarga sensorial de umabraço fazia meu sistemanervoso pifar. (Claro, naqueletempo ninguém entendia ahipersensibilidade sensorial.Falarei disso no capítulo 4.)

A lógica reversa de Kannerencontrou seu defensor maisferrenho em Bruno Bettelheim,

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o influente diretor da EscolaOrtogenética de Chicago paracrianças com transtornos. Em1967 ele publicou A fortalezavazia, livro que popularizou anoção de Kanner da mãegeladeira. Como Kanner,Bettelheim pensava que oautismo provavelmente tinhanatureza biológica. E, comoKanner, ainda assim suas ideiassobre o autismo se baseavamnos princípios psicanalíticos.Ele afirmou que a criançaautista não estavabiologicamente predeterminadaa manifestar os sintomas. Em

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vez disso, estava biologicamentepredisposta aos sintomas. Oautismo era latente — até que acriação inadequada lhe desseum sopro de vida.*

Se minha mãe não tivesse melevado ao neurologista, talveztivesse ficado vulnerável àarmadilha culposa da mãegeladeira. Ela estava comapenas 19 anos quando nasci, efui a primogênita. Como muitasmães de primeira viagem que seveem confrontadas com o“mau” comportamento dosfilhos, minha mãe a princípiosupôs que devia estar fazendo

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algo errado. Contudo o dr.Crothers aliviou sua ansiedade.Quando eu estava na segundaou terceira série, ela teve acessoao tratamento completo deKanner por um médico que lheinformou que a causa do meucomportamento era um danopsíquico e, enquanto não fosseidentificado, eu estavacondenada a habitar meupequeno mundo de isolamento.

No entanto o problema nãoera um dano psíquico, e elasabia disso. A abordagempsicanalítica do transtorno eraencontrar a causa do

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comportamento e tentarremovê-la. Mamãe supôs quenão podia fazer nada em relaçãoà causa do meucomportamento, então decidiuse concentrar nocomportamento em si. Nestecaso, estava à frente do seutempo. A psiquiatria infantillevou décadas para alcançá-la.

Muitas vezes as pessoas meperguntam: “Quando vocêsoube realmente que eraautista?” Como se houvesse ummomento definidor na minhavida, uma revelação do tipoantes e depois. Mas a concepção

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do autismo no início da décadade 1950 não funcionava assim.Como eu, a psiquiatria infantilainda era nova naquela época.As palavras autismo e autistamal figuravam na tentativainicial da Associação Americanade Psiquiatria (AAP) depadronizar os diagnósticospsiquiátricos na primeira ediçãodo DSM, publicada em 1952,quando eu tinha 5 anos. Aspoucas vezes em que estaspalavras apareciam era paradescrever sintomas de outrodiagnóstico, a esquizofrenia.Por exemplo, no verbete Reação

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Esquizofrênica do Tipo Infantilhavia referência às “reaçõespsicóticas em crianças,manifestando-se principalmenteno autismo” — sem maioresexplicações sobre o que era oautismo.

Minha mãe recorda que osprimeiros médicos na minhavida faziam referências breves a“tendências autistas”. Mas eumesma só ouvi a palavra autistareferida a mim aos 12 ou 13anos; lembro-me de terpensado, Ah, é que eu soudiferente. Contudo naqueleentão eu ainda não era capaz de

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dizer exatamente o que era ocomportamento autista. Aindanão conseguia explicar por queminha grande dificuldade defazer amigos.

Mais tarde, quando estavaentrando na casa dos 30 eestudava para o doutorado naUniversidade de Illinois, emUrbana-Champaign, eu aindaconseguia ignorar o papel doautismo na minha vida. Umadas matérias obrigatórias eraum curso de estatística, e eu erapéssima no assunto. Pergunteise podia fazer o curso com umtutor, e não em sala de aula, e

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me disseram que, para obter apermissão, precisava passar poruma “avaliaçãopsicoeducativa”. Em 17 e 22 dedezembro de 1982 me reunicom um psicólogo e fiz váriostestes-padrão.8 Hoje, quandotiro o relatório de uma pasta e oreleio, as notas praticamentegritam para mim, A pessoa quefez estes testes é autista.

Pontuei no nível da segundasérie num subteste que me pediapara identificar uma palavrafalada à velocidade de umasílaba por segundo. Tambémpontuei no nível da segunda

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série num subteste em que deviaentender frases nas quaissímbolos arbitrários substituíampalavras comuns — porexemplo, uma bandeirasimbolizava “cavalo”.

Tudo bem, pensei, claro queme saí mal nestes testes. Elesexigiam que eu me lembrasse deuma série de conceitos recém-aprendidos. Uma bandeirasignifica “cavalo”, um triângulosignifica “barco”, um quadradosignifica “igreja”. Espere — abandeira significa o quemesmo? Há três segundos asílaba era mo, dois segundos

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atrás a sílaba era de, umsegundo atrás a sílaba era ra eagora a nova sílaba é ção.Espera aí — qual era mesmo aprimeira sílaba? Meu êxitodependia da memória de curtoprazo e (como ocorre commuitas pessoas autistas, comoeu aprenderia mais tarde) minhamemória de curto prazo é ruim.Então, o que havia de novo?

No outro extremo, pontueibem em antônimos e sinônimos,porque conseguia associar aspalavras do teste a imagensmentais. Quando o psicólogoque fazia o exame me dizia

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“Pare”, eu via um sinal deparar. Quando dizia “Vá”, viaum semáforo verde. Mas nãoera qualquer sinal, nemqualquer luz verde. Eu via umsemáforo específico e uma luzverde específica do meupassado. Via um monte delas.Cheguei a lembrar do sinal desiga e pare de um postoalfandegário mexicano, a luzvermelha que ficava verdequando os funcionáriosdecidiam não revistar suabagagem — e eu tinha vistoaquele sinal havia mais de dezanos.

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Novamente: e daí? Eu achavaque todos pensavam porimagens. Só que eu era melhornisso que a maioria das pessoas,o que já sabia. Àquela altura davida, eu já fazia desenhosarquitetônicos há muitos anos.Já tivera a experiência determinar um desenho, olhá-lo epensar: Não acredito que fizisto! O que eu não pensava era:eu posso fazer este tipo dedesenho porque caminhei peloquintal e memorizei cadadetalhe, gravei as imagens nocérebro como um computador erecuperei as imagens

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necessárias. Posso fazer estetipo de desenho porque sou umapessoa com autismo. Assimcomo não pensava: obtivepercentual 60 em raciocínio e95 em capacidade verbal porquesou uma pessoa com autismo. Eo motivo para eu não pensarassim era que “pessoa comautismo” era uma categoria quesó então começava a ser criada.

Claro que a palavra autismofazia parte do léxicopsiquiátrico desde 1943, então aideia de ter autismo existia pelomenos desde essa época. Mas adefinição era vaga, para dizer o

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mínimo. A menos que alguémassinalasse uma estranheza nomeu comportamento, eusimplesmente não saía por aípensando que fazia o que faziapor ser uma pessoa comautismo. E duvido que fosse aexceção neste aspecto.

A segunda edição do DSMfoi publicada em 1968 e, àdiferença da edição de 1952,não trazia nenhuma menção aoautismo. Pelo que recordo, apalavra autista aparecia duasvezes, mas, como no DSM-I, sóestá lá para descrever sintomasde esquizofrenia, e não ligada a

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um diagnóstico próprio.“Comportamento autista,atípico e introvertido”, diziauma referência, “pensamentoautista”, dizia outra.

Contudo na década de 1970a profissão psiquiátrica passoupor uma grande mudança deperspectiva. Em vez de procurarcausas à maneira psicanalíticaantiga, os psiquiatrascomeçaram a se concentrar nosefeitos. Em vez de consideraremo diagnóstico preciso umaquestão secundária, elescomeçaram a tentar classificaros sintomas de maneira rígida,

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ordenada e uniforme. Ospsiquiatras decidiram queestava na hora de a psiquiatriase tornar uma ciência.

Este revés ocorreu por algunsmotivos.9 Em 1973, DavidRosenhan, psiquiatra deStanford, publicou um artigocontando como ele e várioscolegas tinham agido comoesquizofrênicos e enganado ospsiquiatras de forma tãoconvincente que estes osinternaram em instituiçõesmentais contra sua vontade.10

Até que ponto umaespecialização médica pode ser

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cientificamente confiável se seusprofissionais são capazes defazer diagnósticos tão incorretos— além do mais, comconsequências trágicas?

A outra razão para o revésera sociológica. Em 1972, omovimento pelos direitos dosgays protestou contra aclassificação dahomossexualidade como doençamental no DSM — como algoque precisava ser curado. Elesganharam a batalha e lançaramluz na questão da confiabilidadede quaisquer diagnósticos doDSM.

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Mas provavelmente oaumento da medicação foi omaior fator na mudança do focona psiquiatria da causa para osefeitos, da busca do danopsíquico para a catalogação dossintomas. Os psiquiatrasdescobriram que não era precisobuscar as causas dos sintomaspara tratar os pacientes. Eramais fácil aliviar o sofrimentodo paciente simplesmentetratando os efeitos.

Contudo, para tratar osefeitos eles precisavam saberquais medicamentos seadequavam às enfermidades,

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isto é, precisavam saber o queestas enfermidades eram, ouseja, era preciso identificá-las deum modo específico econsistente.

Um resultado dessaabordagem mais rigorosa foique a equipe da AssociaçãoAmericana de Psiquiatria porfim chegou à pergunta óbvia: oque é este comportamentoautista, que é um sintoma daesquizofrenia? Para responder aesta pergunta, a equipe precisouisolar o comportamento autistade outros sintomas quesugeriam esquizofrenia (delírios,

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alucinações etc.). Mas, paradescrever o comportamentoautista, tinham de descrever oscomportamentos autistas — emoutras palavras, elaborar umalista de sintomas. Uma lista quenão se sobrepusesse aos outrossintomas da esquizofreniaindicava a possibilidade de umdiagnóstico à parte: autismoinfantil, ou síndrome deKanner.

O DSM-III, publicado em1980, listava o autismo infantilem uma categoria mais ampladenominada transtornos globaisdo desenvolvimento (TGD).

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Para ter o diagnóstico deautismo infantil, o pacienteprecisava cumprir seis critérios.Um deles era a ausência desintomas que sugerissemesquizofrenia. Os outros eram:

Surgimento antes dos 30meses.Ausência geral deresponsividade às pessoas.Grandes déficits nodesenvolvimento dalinguagem.Quando a linguagem estápresente, padrões peculiaresde fala, como ecolalia

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imediata e atrasada,linguagem metafórica einversão pronominal.Reações estranhas adiversos aspectos dodesenvolvimento, p. ex.,resistência à mudança,interesses peculiares ouapego a objetos animadosou inanimados.

Mas esta descrição não eraprecisa. Na verdade, ela setornou uma espécie de alvomóvel, mudando a cada novaedição do DSM, à medida que aAAP tentava definir com

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precisão o que era o autismo —uma trajetória bastante comumnos diagnósticos psiquiátricosque dependem da observação docomportamento. Em 1987, arevisão do DSM-III, o DSM-III-R, não só mudou o nome dodiagnóstico (de autismo infantilpara transtorno autista) comoexpandiu o número de critériosde diagnóstico de seis paradezesseis, dividiu-os em trêscategorias e especificou que apessoa deveria portar ao menosoito sintomas, dos quais nomínimo dois deveriam pertencerà categoria A, um à categoria B

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e um à categoria C. Estasensibilidade de cardápio chinêslevou a índices mais elevados dediagnósticos. Em 1996, umestudo comparou os critérios doDSM-III e do DSM-III-Raplicados a uma amostra de 194crianças em idade pré-escolar“com disfunções sociaisrelevantes”.11 Segundo o DSM-III, 51% das crianças seriamautistas. Segundo o DSM-III-R,91% das mesmas criançasseriam autistas.

A edição de 1987 do DSMtambém expandiu umdiagnóstico anterior na

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categoria TGD, o transtornoglobal do desenvolvimentoatípico, com um diagnósticoabrangente que cobria casos emque os sintomas de autismoeram mais brandos ou em que amaioria, mas não todos ossintomas, estavam presentes: otranstorno global dodesenvolvimento sem outraespecificação (TGD-SOE). ODSM-IV, publicado em 1994,complicou ainda mais adefinição de autismo aoacrescentar um diagnósticototalmente novo: a síndrome deAsperger.

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Em 1981, a psiquiatra emédica britânica Lorna Wingtinha apresentado um trabalhodesenvolvido pelo pediatraaustríaco Hans Asperger em1943 e 1944.12 EnquantoKanner tentava definir oautismo, Asperger identificavaum tipo de criança quepartilhava diversoscomportamentos perceptíveis:“falta de empatia, poucacapacidade de fazer amigos,conversas unilaterais, absorçãointensa em um interesse emespecial e movimentosdesajeitados”, observando

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também que essas criançaspodiam falar sem parar sobreseus assuntos favoritos; ele asapelidou de “professorezinhos”.Asperger chamou a síndrome de“psicopatia autista”, mas, paraWing, devido às associaçõesinfelizes atribuídas à palavrapsicopatia ao longo dos anos,“seria preferível o termosíndrome de Asperger, maisneutro”.

Este acréscimo no DSM éimportante por dois motivos. Omais óbvio é que deu oreconhecimento formal dasautoridades psiquiátricas a

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Asperger. Contudo, visto emconjunto com o TGD-SOE eseus critérios de diagnóstico desintomas de autismo-mas-nem-tanto, a síndrome de Aspergertambém foi importante portransformar o modo comopensamos o autismo em geral.

A inclusão do autismo noDSM-III em 1980 foiimportante porque formalizou oautismo como um diagnóstico,ao passo que a criação do TGD-SOE no DSM-III, em 1987, e ainclusão da síndrome deAsperger no DSM-IV, em 1994,foram importantes para

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reposicionar o autismo em umespectro. A síndrome deAsperger não era tecnicamenteuma forma de autismo, segundoo DSM-IV; era um dos cincotranstornos listados como TGD,junto com o transtorno autista,TGD-SOE, síndrome de Rett etranstorno desintegrativo dainfância. Mas ela rapidamenteadquiriu a reputação de“autismo de altofuncionamento” e, quandosurgiu a revisão do DSM-IV em2000, os que faziamdiagnósticos usavamalternativamente transtorno

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global do desenvolvimento etranstorno do espectro autista(ou TEA). Em uma ponta doespectro podem-se encontrar osgravemente incapacitados. Naoutra, um Einstein ou um SteveJobs.

Contudo este espectro é partedo problema. É quase certo quenão tenha sido coincidência que,quando o conceito do espectroautista entrou no circuito oficialdo pensamento médico epopular, surgiu também a ideiade uma “epidemia” de autismo.Se a comunidade médica recebeum novo diagnóstico para

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atribuir a uma série decomportamentos familiares,claro que a incidência dodiagnóstico será mais elevada.

Isto ocorreu? Se assim fosse,não veríamos uma diminuiçãode alguns outros diagnósticos —os diagnósticos que estes novoscasos de autismo ou síndromede Asperger teriam recebidoanteriormente?

Sim — e, na verdade, háevidências a respeito. No ReinoUnido, por exemplo, algunssintomas de autismo tinhamsido identificados anteriormentecomo sintomas de transtornos

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da fala/linguagem, e osdiagnósticos da década de 1990diminuíram mais ou menos namesma proporção em queaumentaram os diagnósticos deautismo. Nos Estados Unidos,os mesmos sintomas receberamo diagnóstico de retardo mentale, novamente, o número dessesdiagnósticos diminuiu enquantoos de autismo aumentaram. Umestudo da Universidade deColumbia com 7.003 criançasda Califórnia diagnosticadascom autismo entre 1992 e 2005concluiu que 631, ou cerca deuma em cada onze, tiveram o

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diagnóstico mudado de retardomental para autismo.13 Quandoos pesquisadores incluíram assem diagnóstico algum,concluíram que a proporção decrianças diagnosticadas comretardo mental segundo oscritérios antigos de diagnósticoe que agora eram diagnosticadascomo autistas era de uma paraquatro.

Uma análise posterior daUniversidade de Columbia coma mesma amostra populacionaldescobriu que crianças queviviam próximas de criançasautistas tinham maiores chances

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de receber o mesmodiagnóstico, possivelmenteporque os pais estavam maisfamiliarizados com ossintomas.14 A criança fala naépoca esperada? A criança ficatensa e não quer colo? Conseguebrincar de pirulito que bate-bate? Faz contato visual? Nãosó era mais provável que ascrianças anteriormentediagnosticadas com retardomental recebessem odiagnóstico de autismo comoera provável que mais criançasrecebessem diagnóstico deautismo e ponto — o suficiente

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para alcançar 16% de aumentode prevalência naquela amostrapopulacional.

Percebo os efeitos doaumento da consciência sobre oautismo e a síndrome deAsperger apenas observando opúblico das minhas palestras.Quando comecei a dar palestrassobre autismo, nos anos 1980, amaior parte da plateia comautismo estava na ponta grave enão verbal do espectro. E, aindaassim, as pessoas compareciam.Hoje, o mais comum é umagarotada extremamente tímida ede mãos suarentas, e penso Ok,

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eles são um pouco como eu —estão no espectro, mas naextremidade de altofuncionamento. Será que os paisdeles teriam pensado em testá-los para autismo nos anos1980? Provavelmente não. Eeles são os nerds e obcecadosque chamo de Steve Jobsjuniores. Recordo-me dagarotada com quem fui à escola,igualzinha a esta, mas que nãotinha rótulo. Hoje o teria.

Recentemente falei numaescola para estudantes autistas,para uma centena de criançassentadas no chão de uma

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quadra. Eles não estavam muitoirrequietos, então imaginei queestariam na extremidade de altofuncionamento do espectro.Mas nunca se sabe. Fitavam-mecomo os que eu tinha vistoalguns meses antes da Feira deCiências de Minnesota. Será queos estudantes da escola paraautistas receberam odiagnóstico para que pudessemfrequentar uma escola ondeseriam deixados em paz paralevar adiante o que sabiam fazermelhor — ciência, história,independente das suas fixações?E será que algumas crianças na

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feira de ciências se encaixavamno diagnóstico de autismo ousíndrome de Asperger?

O número de diagnósticos dotranstorno do espectro autistacertamente subiu drasticamentepor outro motivo que não temtido a atenção que merece: umerro tipográfico.15 É chocante,mas é verdade. No DSM-IV, adescrição de Transtorno Globaldo Desenvolvimento Sem OutraEspecificação deveria ter sidoimpressa como “deficiênciagrave e global de interaçãosocial e das competências decomunicação verbal e não

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verbal” (grifo meu). Contudofoi impresso “deficiência gravee global de interação socialrecíproca ou das competênciasde comunicação verbal e nãoverbal” (grifo meu). Em vez deprecisar cumprir os doiscritérios para receber odiagnóstico de TGD-SOE, opaciente precisava cumprir umdeles.

Não há como saber quantosmédicos diagnosticarampacientes incorretamente comoTGD-SOE com base nesse erro.O texto foi corrigido em 2000,no DSM-IV-TR. Ainda assim,

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não podemos saber quantosmédicos continuaram fazendo odiagnóstico incorreto porque,naquela época, o diagnósticoincorreto já se tornara odiagnóstico padrão.

Juntem-se todos estes fatos— os padrões vagos, oacréscimo da síndrome deAsperger, TGD-SOE e TEA, oaumento da consciência, o errotipográfico — e eu teria ficadosurpresa se não tivesse havidouma “epidemia”.

Não estou dizendo que aincidência do autismo não tenhaaumentado ao longo dos anos.

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Os fatores ambientais pareceminfluenciá-lo — ambientais nãoapenas no sentido das toxinasno ar ou das drogas na correntesanguínea da mãe, mas outrosfatores, como a idade do pai àépoca da concepção, que pareceafetar o número de mutaçõesgenéticas no esperma, ou o pesoda mãe durante a gravidez. (Vercapítulo 3.) Se a mudançaambiental exercer influêncianegativa — se descobrirmos queuma nova droga surgida nomercado causa sintomas deautismo, ou se mudanças naforça de trabalho levarem mais

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casais a protelar a concepção—, o número de casos podeaumentar. Se a mudançaambiental for positiva — sehouver serviços para criançasdiagnosticadas com TEAdisponíveis para a comunidade,levando os pais a procuraremmédicos até que seus filhostenham um diagnóstico“correto” — bem, o número decasos também pode aumentar.

Por quaisquer combinaçõesde motivos, a incidênciaregistrada de diagnósticos deautismo continua crescendo. Em2000, o Centro de Controle e

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Prevenção de Doenças criou aRede de Monitoramento doAutismo e Transtornos deDesenvolvimento (ADDM)16

para colher dados de crianças de8 anos de idade e fazerestimativas de autismo e outrostranstornos de desenvolvimentodos Estados Unidos. Os dadosde 2002 indicavam que uma decada 150 crianças apresentavaTEA. Os dados de 2006aumentaram a incidência deuma para cada 110 crianças. Osdados de 2008 — os maisrecentes quando escrevo, emmarço de 2012 — aumentaram

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a incidência ainda mais, parauma de cada 88 crianças.Representa um aumento de70% em um período de seisanos.

A amostra era de 337.093crianças de quatorzecomunidades de vários estados,mais de 8% das crianças de 8anos de idade naquele ano.Dado o tamanho e aabrangência da amostra, a faltade consistência geográfica eramarcante. O número decrianças identificadas com TEAvariava erraticamente de umacomunidade para outra, de uma

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em cada 210 para uma em cada47. Em uma comunidade, umem cada 33 meninos foiidentificado como portador deTEA. A taxa de incidência deTEA entre crianças negrasaumentou 91% em 2002. Entrecrianças hispânicas, aumentouainda mais: 110%.

O que está acontecendo? “Aesta altura, não está claro”,escreveu Catherine Lord,diretora do Centro de Autismo eDesenvolvimento Cerebral deNova York, no CNN.comquando o relatório foidivulgado. Infelizmente, o

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DSM-5,** lançado em 2013,não esclarece nada. (Vercapítulo 5.)

Sabe quando a gente vaiarrumar o armário e a bagunçachega a um ponto em que ficapior do que quandocomeçamos? Agora, estamosneste ponto na história doautismo. De algum modo, nossoconhecimento sobre eleaumentou muito desde a décadade 1940. Mas, por outro lado,estamos tão confusos comoantes.

Por sorte, acho que estamosprontos para avançar do ponto

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da confusão máxima. Comoafirmou Jeffrey S. Anderson,diretor de neuroimagensfuncionais da Faculdade deMedicina da Universidade deUtah, “Há uma longa tradiçãona medicina em que a doençacomeça na psiquiatria e depoispassa à neurologia”17 — aepilepsia, por exemplo. Agora,o autismo se junta a essatradição. No longo prazo, oautismo está revelando seussegredos ao escrutínio daciência inflexível, graças a duasnovas rotas de investigação queserão exploradas nos próximos

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dois capítulos. Aqui, naprateleira do armáriocorrespondente ao capítulo 2,ficarão as neuroimagens. Naprateleira correspondente aocapítulo 3, ficará a genética.Podemos começar a organizar oarmário com confiança. Porqueagora temos uma nova forma depensar o autismo.

Ele está na sua mente?Não.Ele está no seu cérebro.

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Notas

* Na década posterior à morte deBettelheim, em 1990, sua reputação foimaculada. Surgiram evidências de que elefalsificara informações sobre sua formaçãoacadêmica, cometera plágio, fizerapesquisas incompletas e mentira quanto aser médico, porém o mais grave foram asacusações de abusos físicos e mentais de ex-alunos da Escola Ortogenética.7

** A razão para a mudança dos númerosromanos para os arábicos é que com elesfica mais fácil fazer atualizações: 5.1, 5.2etc.

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2 Uma luz no cérebroautista

Com o passar dos anos descobrique tenho um talento oculto.Sou muito boa em ficar deitadaabsolutamente quieta um longotempo.

A primeira vez que percebiesta capacidade foi em 1987, naUniversidade da Califórnia, emSanta Barbara, quando fui umdos primeiros autistas a passarpela ressonância magnética

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nuclear, ou RMN. Os técnicosme advertiram que aexperiência seria ruidosa, e foi.Eles disseram que o apoio decabeça seria desconfortável, eera. E que eu teria de ficarmuito, muito quieta, o que fizcom algum esforço.

No entanto nada disso mechateou. Estava empolgadademais. Ali deitada no altar daciência! Aos poucos, meu corpodeslizou para o grande cilindrometálico.

Não é ruim, pensei. Parece amáquina do abraço. Ou algosaído de Star Trek.

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Na meia hora seguinteocorreu tudo o que tinham meavisado: o som de martelos nabigorna; a câimbra no pescoço;a monotonia consciente demonitorar cada um dos meusnão movimentos. Não se mexa,não se mexa, não se mexa —trinta minutos dizendo a mimmesma para ficar absolutamenteimóvel.

Por fim acabou. Saltei damaca, fui direto para a sala dotécnico, e lá tive a recompensa:eu precisava ver meu cérebro.

“Jornada ao centro do meucérebro” é como chamo esta

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experiência. Já saí sete ou oitovezes do aparelho de RMN eolhei o funcionamento internoque me faz ser eu: as dobras,lobos e vias que determinammeu pensamento e toda minhaforma de ver o mundo. Naprimeira vez que vi uma RMNdo meu cérebro, em 1987, noteiimediatamente que ele não erasimétrico. Uma câmara no ladoesquerdo — um ventrículo —era obviamente mais longa quesua correspondente do ladodireito. Os médicos medisseram que essa assimetriaentre as duas metades do

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cérebro era típica. Porém desdeentão os cientistas aprenderama medi-la com muito maisprecisão do que era possível em1987, e agora sabemos que umventrículo tão alongado pareceestar relacionado com algunssintomas que me identificamcomo autista. Os cientistas sópuderam chegar a essaconclusão devido aos avançosextraordinários na tecnologia ena pesquisa das neuroimagens.

As neuroimagens nospermitem fazer duas perguntasfundamentais sobre todas as

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partes do cérebro: como elassão? O que fazem?

A RMN usa um ímãpoderoso e uma explosão curtanuma frequência de rádioespecífica para fazer os núcleosde átomos de hidrogênio quegiram naturalmente no corpo secomportarem de modo que amáquina os possa detectar. ARMN estrutural existe desde adécada de 1970 e, como apalavra estrutural sugere,fornece imagens das estruturasanatômicas no interior docérebro. A RMN estrutural

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ajuda a responder à pergunta:como elas são?

A RMN funcional (RMNf),criada em 1991, mostra océrebro funcionando emresposta a estímulos sensoriais(visão, audição, paladar, tato,olfato) ou quando a pessoarealiza uma tarefa — resolveproblemas, ouve uma história,aperta um botão etc. Ao seguiro fluxo sanguíneo no cérebro, aRMNf supostamente segue aatividade dos neurônios (porquemais atividade requer maissangue). Os pesquisadoressupõem que as partes do

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cérebro que se acendem quandoo cérebro responde aosestímulos ou realiza as tarefasdesignadas respondem àpergunta: o que fazem? Nasúltimas décadas, a pesquisaneurológica com o estudo daRMNf produziu mais de 20 milartigos revisados porespecialistas. Nos últimos anos,esta produção cresceu para oitoou mais artigos por dia.

Ainda assim, asneuroimagens não fazemdistinção entre causa e efeito.Consideremos um exemplo bemconhecido associado ao

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autismo: o reconhecimentofacial. Ao longo dos anos,estudos de neuroimagensindicaram repetidas vezes que ocórtex de um autista nãoresponde aos rostos tãovivamente como responde aosobjetos. Será que a ativação docórtex em reação aos rostos seatrofia nos autistas devido àinteração social reduzida comoutros indivíduos? Ou osautistas têm interação socialreduzida com outros indivíduosporque as conexões no córtexnão registram os rostos de ummodo forte? Não sabemos.

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A neuroimagem não podenos dizer tudo. (Ver quadro nofinal deste capítulo.) Mas podenos dizer muita coisa. Umatecnologia que consegue olharuma parte do cérebro eresponder: como ele é? E o quefaz? De brinde, também poderesponder a outras perguntas:em que o cérebro autista diferedo cérebro normal? O que océrebro autista faz de diferentedo cérebro normal? Ospesquisadores do autismo jáconseguiram fornecer muitasrespostas a estas duas perguntas— respostas que nos permitiram

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comparar comportamentos quesempre foram a base de umdiagnóstico de TEA com abiologia do cérebro. À medidaque essa nova compreensão doautismo for empregada em umnúmero cada vez maior detecnologias avançadas deneuroimagens, muitospesquisadores acreditam que odiagnóstico baseado na biologianão só será possível, comoestará disponível, talvez dentrode alguns anos.

Sempre digo aos meus alunos:“Se querem entender o

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comportamento animal,comecem pelo cérebro eencontrem seu caminho.” Aspartes do cérebro quepartilhamos com outrosmamíferos evoluíram primeiro— as áreas emocionaisprimárias que nos dizemquando lutar e quando fugir.Elas são a base do cérebro, ondeele se liga à medula espinhal. Asáreas que realizam funções quenos tornam humanos evoluírammais recentemente — alinguagem, o planejamento delongo prazo, a consciência de simesmo. Elas estão na área

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frontal do cérebro. Mas é arelação complexa entre asdiversas partes do cérebro quefaz de cada um de nós quemsomos.

Quando falo sobre o cérebro,muitas vezes emprego aanalogia de um edifício deescritórios. Os funcionários nasdiferentes partes do edifício têmáreas de especialização, mastrabalham em conjunto. Algunsdepartamentos trabalham maispróximos uns dos outros.Alguns departamentos são maisativos que outros, dependendoda tarefa a cumprir. Mas no

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final do dia eles se juntam paraproduzir um só produto: umpensamento, uma ação, umaresposta.

No topo do edifício fica opresidente, o córtex pré-frontal— pré-frontal porque reside nolobo frontal, e córtex porquefaz parte do córtex cerebral, asdiversas camadas de matériacinzenta que formam asuperfície exterior do cérebro.O córtex pré-frontal coordena ainformação de outras partes docórtex, de modo que possamtrabalhar em conjunto e realizartarefas executivas: multitarefas,

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estratégia, inibição de impulsos,considerar múltiplas fontes deinformação, consolidar diversasopções numa solução.

Ocupando os andares logoabaixo do presidente estãooutras partes do córtex cerebral.Cada seção é responsável pelaparte do cérebro que ocupa.Pode-se pensar na relação entreestas partes diferentes dematéria cinzenta e suas partescorrespondentes como narelação entre os vice-presidentes(VP) de uma empresa e seusrespectivos departamentos.

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O VP córtex frontal éresponsável pelo lobofrontal — a parte docérebro que lida com oraciocínio, metas, emoções,capacidade de julgamento emovimentos muscularesvoluntários.O VP córtex parietal éresponsável pelo loboparietal — a parte docérebro que recebe eprocessa a informaçãosensorial e manipulanúmeros.O VP córtex occipital éresponsável pelo lobo

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occipital — a parte docérebro que processa ainformação visual.O VP córtex temporal éresponsável pelo lobotemporal — a parteauditiva do cérebro quecontrola tempo, ritmo elinguagem.

Abaixo dos VP ficam osfuncionários dessas váriasdivisões — os geeks, comocostumo chamá-los. São asáreas do cérebro quecontribuem para funçõesespecializadas, como

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matemática, arte, música elinguagem.

No subsolo do edifício ficamos trabalhadores manuais. Sãoos que lidam com os sistemas deapoio à vida, como respirar eativar o sistema nervoso.

Claro, todos essesdepartamentos e funcionáriosprecisam se comunicar entre si.Para isso, eles dispõem decomputadores, telefones,tablets, smartphones etc.Quando uns querem conversarpessoalmente com outros, usamelevadores ou escadas. Essesmeios de acesso, que conectam

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os trabalhadores de diversaspartes do edifício de todas asmaneiras que se possa imaginar,são a matéria branca. A matériacinzenta é a cobertura fina quecontrola áreas separadas docérebro, e a matéria branca —que corresponde a três quartosdo cérebro — é um grandeemaranhado de fios que garantea comunicação entre todas asáreas.

No cérebro autista, nãoobstante, um elevador pode nãoparar no sétimo andar. Ostelefones do departamento decontabilidade podem não

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funcionar e o sinal do celular narecepção do prédio pode serfraco.

Antes da invenção dasneuroimagens, os pesquisadoresprecisavam confiar em examesdo cérebro post-mortem. Oconhecimento da anatomia docérebro era mais ou menosdireto — a resposta à pergunta:como ele é? — depois de cortá-lo, observá-lo e denominar aspartes. Descobrir ofuncionamento das partes — aresposta à pergunta: o que faz?— era muito mais complicado:encontrar alguém que se

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comporta de modo estranho eentão, quando essa pessoamorria, procurar o que estavalesado no cérebro.

Os casos de “cérebro lesado”continuam sendo úteis para aneurologia. Tumores. Danoscerebrais. Derrames. Quandoalguma coisa não funciona nocérebro, pode-se de fatocomeçar a aprender o que asdiversas partes fazem. Hoje, adiferença é que não é precisoesperar que o dono do cérebromorra. As neuroimagenspermitem observar as partes docérebro e ver o que está lesado

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agora, enquanto o paciente estávivo.

Certa vez, em visita a umcampus universitário, conhecium estudante que me disse quequando ele tentava ler, as letrasse mexiam. Perguntei-lhe setivera algum dano cerebral, eele disse que tinha sidogolpeado por um disco dehóquei. Perguntei ondeexatamente tinha sido atingido.Ele indicou a parte posterior dacabeça. (Acho que não fuigrosseira a ponto de tocar olocal, mas não tenho certeza.) Olugar que apontou era o córtex

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visual primário, precisamente oque pensei que indicaria, graçasao que as neuroimagens nosensinaram.

Nos estudos dos cérebroslesados pode-se tomar umsintoma, uma indicação de quealgo ficou caótico, e procurar ofio ou a região que sofreu odano. Na pesquisa, apontamosos circuitos na parte posteriordo cérebro que regulam apercepção das formas, cores,movimento e textura. Sabemosquais são porque, ao seremgolpeados, coisas esquisitasacontecem. Atinja seu circuito

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motor e você verá o caféderramar numa série de imagensfixas. Atinja seu circuito dascores e viverá num mundo empreto e branco.

Os cérebros autistas nãoestão lesados. O meu não está.Meus circuitos não estãorompidos. Eles simplesmentenão se desenvolveram comodeveriam. Mas como meucérebro ficou bastanteconhecido por suas diversaspeculiaridades, os pesquisadoresdo autismo entraram emcontato comigo ao longo dosanos para pedir permissão para

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me colocar neste ou naqueleescâner. Em geral fico contenteem dizer sim. Como resultadodesses estudos, aprendi muitosobre o funcionamento internodo meu cérebro.

Graças a um escâner doCentro de Excelência emAutismo da Faculdade deMedicina da Universidade daCalifórnia em San Diego,1 seique meu cerebelo é 20% menorque a norma. O cerebelo ajudaa controlar a coordenaçãomotora, então estaanormalidade provavelmenteexplica meu equilíbrio fraco.

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Em 2006, participei de umestudo do Centro de Pesquisa deImagens Cerebrais, emPittsburgh, e fui escaneada porum aparelho de RMN funcionale por uma versão da tecnologiade RMN chamada imagens detensor de difusão, outractografia por ITD. Enquantoa RMNf registra regiões docérebro que se acendem, a ITDmensura o movimento demoléculas de água nos tratosneurais da matéria branca — acomunicação interna dosescritórios nas regiões.

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A parte RMNf do estudomediu a ativação do meucórtex visual ventral (ouinferior) enquanto euolhava desenhos de rostos,objetos e prédios. Outrapessoa do grupo decontrole e eu respondemosde modo semelhante aosdesenhos de objetos eprédios, mas meu cérebroreagiu muito menos aosrostos do que o dela.A ITD examinou os tratosda fibra branca entre váriasregiões do meu cérebro. Asimagens indicaram que

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estou conectada demais, oque significa que meufascículo fronto-occipitalinferior (FFOI) e ofascículo longitudinalinferior (FLI) — dois tratosde fibras brancas queserpenteiam pelo cérebro —têm mais conexões que onormal. Quando recebi osresultados deste estudo,entendi imediatamente queconfirmavam algo que euvinha dizendo há muitotempo: que eu devia teruma linha troncal deinternet, uma linha direta

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no córtex visual queexplicava minha memóriavisual. Eu pensava queestava sendo metafórica,mas àquela altura entendique essa descrição chegavamuito próximo do querealmente ocorria dentro daminha cabeça. Pesquiseiestudos sobre cérebroslesados para ver o que maispoderia aprender sobre essalinha troncal, e descobrium sobre uma mulher de47 anos com transtornos namemória visual.2 Umaressonância por tensor de

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difusão revelou que elapossuía uma desconexãoparcial no FLI. Ospesquisadores concluíramque o FLI devia ser“altamente envolvido” namemória visual. Nossa,pensei, se este circuito seromper vou ficar no caos.

Em 2010 passei por umasérie de ressonâncias naUniversidade de Utah. Umadescoberta foi particularmentegratificante. Lembram dequando assinalei aospesquisadores a diferença de

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tamanho nos meus ventrículosdepois da minha primeiraRMN, em 1987, e elesresponderam que certaassimetria no cérebro eraesperada? Bem, o estudo daUniversidade de Utah mostrouque meu ventrículo esquerdo é57% mais longo que o direito.Isto significa uma enormidade.Na pessoa do grupo de controle,a diferença entre o esquerdo e odireito era de apenas 15%.

Meu ventrículo esquerdo étão longo que se estende pelocórtex parietal. E sabe-se que ocórtex parietal está associado à

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memória de trabalho, oumemória operacional. Aperturbação no meu córtexparietal explicaria por quetenho dificuldade em realizartarefas que exigem seguirdiversas instruções consecutivas.O córtex parietal tambémparece estar associado à aptidãopara a matemática — o quepode explicar meu problemacom álgebra.

Em 1987 a tecnologia deneuroimagens ainda não eracapaz de mensurar com muitaprecisão as estruturasanatômicas no interior do

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cérebro. Mas se aquelespesquisadores tivessem sabidoque um ventrículo do meucérebro tinha 7.093 milímetrosde comprimento, enquanto ooutro tinha 3.868, garanto queteriam parado para pensar.

Como os dois ventrículoslaterais se formavam tãodiferentes? Uma hipótese é quequando há dano no início dodesenvolvimento cerebral,outras áreas do cérebro tentamcompensá-lo. No meu caso, odano teria ocorrido na matériabranca no hemisfério esquerdo,e o ventrículo esquerdo teria

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aumentado para ocupar a áreadanificada. Ao mesmo tempo, amatéria branca no hemisfériodireito teria tentado compensara perda da função cerebral nohemisfério esquerdo, e aquelaextensão no hemisfério direitoteria limitado o crescimento doventrículo direito.

As outras descobertasimportantes do estudo de RMNde Utah incluíam:

Meu volume intracraniano— a quantidade de espaçodentro do crânio — e otamanho do meu cérebro

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eram 15% maiores do queo das pessoas do grupo decontrole. Isto pode ter sidotambém resultado de algumtipo de anormalidade nodesenvolvimento. Osneurônios devem tercrescido aceleradamentepara compensar a áreadanificada.A matéria branca no meuhemisfério cerebralesquerdo era quase 15%maior que a das pessoas dogrupo de controle. Maisuma vez, esta anomaliapoderia ser o resultado de

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uma anormalidade noinício do desenvolvimentodo meu hemisférioesquerdo e uma tentativade meu cérebro decompensá-la gerando novasconexões. Estes dadosreforçam a descobertainicial da Universidade dePittsburgh de que meucérebro é conectadodemais.Minhas amígdalas sãomaiores que o normal. Otamanho médio daamígdala das três pessoasdo grupo de controle era de

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1.498 mm3. Minhaamígdala esquerda tem1.719 mm3 e a direita éainda maior — 1.829 mm3,ou 22% maior que opadrão. Como a amígdala éuma fonte importante noprocessamento do medo eoutras emoções, estetamanho avantajado podeexplicar minha ansiedadeperene. Recordo as crisesde pânico que me afetaramdurante boa parte dos anos1970 e elas começam afazer sentido de outromodo. Minhas amígdalas

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me dizem que tenho tudo atemer, inclusive o própriotemor. Desde que comecei atomar antidepressivos, noinício dos anos 1980, aansiedade tem estado sobcontrole, provavelmentepelo bloqueio da fortereação do sistema nervososimpático. Mas a vigilânciacontinua presente,filtrando-se sob asuperfície. Meu sistema domedo está sempre alertapara o perigo. Quando osestudantes que moram

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perto de mim conversam noestacionamento abaixo daminha janela à noite, nãoconsigo dormir. Ponhomúsica New Age paraabafar o som, mesmoquando eles falam baixo.(Mas a música não pode terletra.) O volume não temrelação com o fator medo;a associação com umapossível ameaça, sim. Asvozes humanas estãoassociadas a uma ameaçapossível, enquanto a músicaNew Age, não. Tampoucoo som de um avião, então

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este som não me perturba,mesmo quando me hospedonum hotel perto de umaeroporto. Um aviãopoderia aterrissar no hotele eu não despertaria. Masgente falando no quarto aolado? Esqueça. Melhoracender a luz e ler, porquesei que não vou dormir atéeles não dormirem.A espessura cortical dosmeus córtices entorrinaisesquerdo e direito erasignificativamente maiorque a das pessoas do grupode controle — 12% o

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esquerdo e 23% o direito.“O córtex entorrinal é oportão dourado docomando central damemória cerebral”,3 afirmaItzhak Fried, professor deneurocirurgia na Faculdadede Medicina David Geffen,na UCLA. “Todas asexperiências visuais esensoriais que guardamosna memória alguma vezpassam por este portal parao hipocampo. Nossascélulas cerebrais precisamenviar sinais através destecomando para formar

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lembranças que mais tardepodemos recordarconscientemente.” Talvezesta peculiaridade naanatomia do meu cérebroexplique minha capacidadeexcepcional de memorizar.

Naturalmente, acho estesresultados fascinantes porqueassinalam algumas coisasesquisitas que acontecem nomeu cérebro que me ajudam aser quem sou. Mas o que achorealmente fascinante é que elessão compatíveis com osresultados dos estudos de

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algumas outras pessoas comautismo.

Prefere objetos em vez derostos? “Estes resultadossão típicos de indivíduoscom autismo”, escreveramos pesquisadores quefizeram o estudo de RMNem Pittsburgh em 2006resumindo suasdescobertas. “Uma coisaque parece estar surgindorepetidamente nos estudosde escaneamento deindivíduos com autismo é amarcada redução da

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ativação cortical diante derostos.”Amígdalas aumentadastambém ocorremfrequentemente em pessoascom autismo. Como aamígdala tem tantasfunções emocionais, oautista pode se sentir comose fosse um grande nervoexposto.E também há o que JasonCooperrider, estudante degraduação que fez o estudoda RMN em Utah, escreveupor e-mail: “A cabeça dadra. Grandin é grande de

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acordo com qualquerparâmetro, o que éconsistente com ocrescimento/tamanho maiorque a média dacabeça/cérebro noautismo.” O cérebroaumentado pode ter origemem uma série de falhasgenéticas, uma das quaispode sustar precocemente odesenvolvimento neuronal.O ritmo do crescimento senormaliza com o tempo,mas a macrocefaliapermanece. A últimaestimativa é de que cerca de

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20% dos autistas têmcérebros aumentados; agrande maioria parece serde homens, por motivosque ainda não estãoclaros.4

Pela primeira vez, graças acentenas ou milhares de estudosde neuroimagens de pessoasautistas, estamos vendo umacompatibilidade sólida entre oscomportamentos autistas e asfunções cerebrais. Isto é algogrande. Um artigo resumiu aépoca: “Este corpo de pesquisasestabeleceu claramente o

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autismo e seus sinais e sintomascomo sendo de origemneurológica.”5 A hipótese detrabalho mantida por muitotempo tornou-se agora oconsenso da evidência e dacomunidade: o autismo estárealmente no cérebro.

O problema é que o que está nomeu cérebro autista não énecessariamente o que está nocérebro autista de outra pessoa.Como me disse certa vez apioneira em neuroanatomiaMargaret Bauman: “Só porquesua amígdala é maior que o

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normal isso não quer dizer quea amígdala de todas as pessoasautistas seja maior que onormal.” Embora tenhamsurgido algumas similaridadesentre cérebros autistas,precisamos ser cautelosos paranão generalizar demais. Naverdade, os pesquisadores deneuroimagens enfrentam trêsdesafios para encontrar aspectoscomuns entre os cérebrosautistas.

Homogeneidade dasestruturas cerebrais. O estudode Utah de 2010 reveloudiversas anomalias anatômicas

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notáveis no meu cérebro, mastambém mostrou, comoCooperrider colocou no seu e-mail, que “em cerca de 95% dascomparações” com as pessoasdo grupo de controle, “asdiferenças eram desprezíveis”.Esta normalidade surpreendenteno cérebro autista é a norma, enão a exceção.

“Anatomicamente, estascrianças são normais”, disse JoyHirsch, pesquisadora deautismo do Centro Médico daUniversidade de Columbia, emNova York, sobre as pessoas emseu estudo. “Estruturalmente, o

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cérebro é normal segundoqualquer escala queadotemos.”6

O que não significa dizer queas estruturas dos cérebros noseu estudo, ou os cérebrosautistas em geral, não variem deum cérebro para o outro. Elesvariam. Mas isso tambémocorre com cérebros normais. Ésó que as variações entre oscérebros autistas estãopredominantemente na escalado que é normal. Thomas Insel,diretor do Instituto Nacional deSaúde Mental, disse ao USAToday em 2012, pouco depois

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de o Centro de Controle deDoenças elevar a prevalênciaestimada do autismo de 1 em110 para 1 em 88: “Mesmo quevocê veja uma criança que nãopossui linguagem, que semachuca, que teve diversosataques, você se surpreenderiaao ver como seu cérebro parecenormal. Esta é a verdade maisinconveniente sobre estacondição.”7

Não obstante estão surgindoalguns padrões. Além dasvariações no meu própriocérebro, que parecemconsistentes com as de outros

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autistas — amígdalasaumentadas, macrocefalia,ausência de ativação cortical aover rostos —, esses padrõesmuito disseminados incluem:

Evitação de contato visual.Diferente de umapreferência por objetos emlugar de rostos, trata-se daevitação ativa de rostos.Um estudo de RMNf de20118 publicado no Journalof Autism andDevelopmental Disordersrevela que os cérebrosnuma mostra de autistas

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altamente funcionais etipicamente desenvolvidospareciam responder aocontato visual de modosdistintos. No cérebroneurotípico, a junçãotemporoparietal direita(JTP) estava ativa paradirecionar o olhar, ao passoque nas pessoas autistas aJTP estava ativa para evitá-lo. Os pesquisadorespensam que a JTP estáassociada a tarefas sociaisque incluem o julgamentodo estado mental alheio. Oestudo encontrou o padrão

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oposto no córtex pré-frontal dorsolateral(CPFDL) esquerdo: nosneurotípicos, ativação paraevitar o olhar; nos autistas,ativação para direcionar oolhar. Então, não é que osautistas não respondam aocontato visual, é que a suaresposta é oposta à dosneurotípicos. “A sensibilidade aoolhar no CPFDL demonstraque o olhar direto leva auma reação neurológicaespecífica nos participantescom autismo”, diz o

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estudo. Contudo oproblema é “que estareação pode ser similar aoprocessamento do desviodo olhar em participantescom desenvolvimentotípico”. O que uma pessoaneurotípica sente quandoalguém não faz contatovisual pode ser o que umapessoa com autismo sentequando alguém faz contatovisual. E vice-versa: o queum neurotípico sentequando alguém faz contatovisual pode ser o que umautista sente quando

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alguém não faz contatovisual. Para alguém comautismo que está tentandonavegar numa situaçãosocial, as pistas deacolhimento por parte dosneurotípicos podem serinterpretadas como pistasde aversão. O que está emcima vai para baixo, o queestá embaixo vai paracima.Conectividades alta ebaixa. Um artigo muitoinfluente publicado naBrain em 20049 apresentoua tese da baixa

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conectividade — a ideia deque a baixa conectividadeentre as regiões corticaispode ser algo comum noautismo. Em escalamundial, as principaispartes do cérebro nãoconseguem coordenar asmensagens. Desde entãodiversos outros estudosapresentaram a mesmaargumentação, encontrandorelação entre a baixaconectividade entre áreascríticas do córtex e déficitsnuma série de tarefasrelacionadas à cognição

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social, linguagem e funçãoexecutiva. Em contraste com abaixa conectividade delonga distância, outrosestudos encontraram altaconectividade em escalalocal. Supostamente, estecrescimento fora do comumocorre como já descrevi,como a tentativa de umaparte do cérebro decompensar o déficit emoutra. O resultado pode serpositivo. Como mencionei,tenho alta conectividade naárea que corresponde à

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memória visual. Por sorte,sou capaz de lidar comimagens. Posso sentar-menuma sessão de consulta erepassar mentalmente ofuncionamento de umpedaço de equipamento econsigo desligar issoquando acabo. Algumaspessoas com autismo, noentanto, não têm um botãopara desligar que funcionee, para elas, a altaconectividade leva a umaenxurrada de informações,a maior parte delasconfusas.

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O que não significa quea tese da baixaconectividade descrevatodos os cérebros autistas.Como muitas tentativasiniciais de descrever asolução para um problema,ela provavelmentesimplifica demais asituação. Como observouum estudo de 2012 daUniversidade de Amsterdã,“alguns padrões deconectividade funcionalanormal no TEA não sãocaptados pelos modelosteóricos atuais. Tomadas

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em seu conjunto, asdescobertas empíricas quemensuram diferentesformas de conectividadedemonstram padrõescomplexos de conectividadeanormal em pessoas comTEA”.10 A teoria, concluiuo estudo, “precisa serrefinada”.

Heterogeneidade de causas.Mesmo quando ospesquisadores pensam terencontrado umacorrespondência entre ocomportamento de um autista e

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uma anomalia cerebral, eles nãopodem ter certeza de que outraspessoas com o mesmocomportamento apresentem amesma anomalia. Parte dotítulo de um estudo sobre oautismo de 200911 publicado noJournal of NeurodevelopmentalDisorders captou a situação demodo sucinto:“Comportamento igual,cérebros diferentes.” Em outraspalavras, só porque você temtendência à ansiedade extremanão significa que seu cérebroautista tenha a amígdalaaumentada.

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Heterogeneidade decomportamentos. Pelocontrário, quando ospesquisadores encontram umaanomalia no cérebro, nãopodem ter certeza de que estaanomalia terá o mesmo efeitocomportamental em outrocérebro. Ou, em todo caso,qualquer efeito. Só porque vocêtem uma amígdala aumentadanão significa que seja autista.

Mas, e se significasse?Não necessariamente uma

amígdala aumentada. Mas, e sealguma descoberta oucombinação de descobertas

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neuroanatômicas se tornasseuma ferramenta de diagnósticoconfiável? Um diagnósticobaseado não apenas nocomportamento, mas tambémna biologia faria muitadiferença para prever os déficitse focar o tratamento. Médicos epesquisadores poderiam:

Intervir cedo, até mesmono primeiro estágio dainfância, quando o cérebroainda é altamente suscetívela novas conexões.Concentrar-se com maisprecisão em certas áreas do

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cérebro, reabilitar as partesonde acham que podemajudar e não perder tempocom partes irrecuperáveis.Testar novas terapias emonitorar as existentesmais de perto.Fazer o prognóstico caso acaso, de acordo com opaciente.

Para o paciente, estediagnóstico também traria umtremendo benefício psicológico,permitindo-lhe saber de fato oque é incomum. Pessoalmente,gosto de saber que meu alto

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grau de ansiedade pode estarrelacionado à minha amígdalaaumentada. Este conhecimentoé importante para mim. Ajuda-me a pôr a ansiedade emperspectiva. Posso ter em menteque o problema não está lá fora— os estudantes noestacionamento sob a janela domeu quarto. O problema estáaqui — no modo comofuncionam minhas conexões.Posso tomar remédio para aansiedade, mas não consigofazê-la desaparecer. Então,como tenho de conviver comela, ao menos posso fazê-lo

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sabendo que a ameaça não éreal. O sentimento de ameaça éreal — e isto faz uma diferençaenorme.

Devido aos obstáculos parapesquisar o autismo do pontode vista neurológico — ahomogeneidade dos cérebros, aheterogeneidade das causas ecomportamentos —, pode-sequestionar se encontrar umbiomarcador seria um objetivorealista. Não obstante, nosúltimos anos os pesquisadorestêm feito progressos enormesnesse sentido, e agora muitosfalam de quando e não se.

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“Ainda não temos um testedecisivo para o autismo”, dissea neurocientista Joy Hirsch.“Mas temos uma base paratal.”

Como diretora do Centro dePesquisa em RMN Funcional doCentro Médico da Universidadede Columbia, em Nova York,Hirsch tentou criar bases para oteste definitivo. Em um estudofeito pelo seu grupo entre 2008e 2010,12 quinze autistas de 7 a22 anos de idade e doze criançase adolescentes do grupo decontrole com idades entre 4 e17 anos passaram por

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ressonâncias magnéticasfuncionais do giro temporalsuperior — a parte do sistemaauditivo que processa os sons dafala em linguagemcompreensível. “A deficiênciamais óbvia no autismo está nafala”, disse ela sobre a lógica doexperimento. “A nossa hipóteseera que no primeiro estágiocomeçaríamos a ver asdiferenças.” E eles sentiam quetinham visto: as medidas daatividade naquela regiãopuderam identificar quatorzedos quinze sujeitos autistas,uma taxa de sensibilidade de

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92%. (Outros pesquisadoresquestionaram a confiabilidadede comparar pessoas queestavam despertas com as queestavam sedadas — fatores quea equipe de Hirsch consideravacobertos. Como sempre ocorrena ciência, testes futurosreforçarão ou não a validadedas descobertas.)

Outros grupos de pesquisaprocuram biomarcadoresrecolhendo uma amostra depessoas autistas e do grupo decontrole e colocando o foconum aspecto do cérebro que elestêm razão em crer que esteja

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associado ao comportamentoautista, e ver se podem criar umalgoritmo que distinga um tipode cérebro do outro. Jeffrey S.Anderson, da Universidade deUtah, deu esta explicaçãosimplificada: “Usamos muitoscérebros normais e cérebros deindivíduos com autismo efazemos um padrão de cadaum” — dos cérebros autistas edos neurotípicos —, “e pegamosum indivíduo novo eperguntamos: ‘Bem, com qualdeles ele combina mais?’.”

A questão não é identificareste ou aquele cérebro como

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pertencente a uma pessoaautista ou neurotípica. Éencontrar um agregado queajude a identificar áreas deinteresse potencial que possamser biomarcadoras.

Em importante estudopublicado pelo grupo deAnderson em 2011,13 o aspectodo cérebro enfocado foi aconectividade. Estudosanteriores indicando que oscérebros autistas tendem a teralta conectividade local e baixaconectividade de longa distânciahaviam se centrado numpequeno número de regiões

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cerebrais separadas. Em vezdisso, Anderson e seus colegasestudaram a conectividade detoda a matéria cinzenta. Usandouma variação da RMNfchamada RMN deconectividade funcional, elesobtiveram mensurações daconectividade entre 7.266“regiões de interesse”. Em umgrupo de quarenta adolescentesdo sexo masculino e jovensadultos com autismo e umapequena amostra de quarentaindivíduos de desenvolvimentotípico, Anderson descobriu queo teste de conectividade podia

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identificar se um cérebro eraautista ou típico com 79% deprecisão geral, e com 89% deprecisão nos indivíduos commenos de 20 anos.

Este nível de precisão écompatível com os resultados deoutros grupos de pesquisa. Umestudo de RMN de 201114 daUniversidade de Louisvilledescobriu que numa amostra dedezessete indivíduos autistas edezessete neurotípicos, ocomprimento da linha centraldo corpo caloso podia servirpara distinguir entre os doistipos de cérebros com um nível

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de precisão que ia de 82% a94%, segundo os níveis deconfiabilidade estatística.

Em outro estudo de RMN de2011,15 pesquisadores daFaculdade de Medicina daUniversidade de Stanford e doHospital Infantil Lucile Packardobservaram não o tamanho deuma parte individual docérebro, como os estudos deRMN costumam fazer, mas atopologia das dobras da matériacinzenta — os vales e penhascoscerebrais. Em uma amostra de24 crianças autistas e 24crianças de desenvolvimento

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típico (todas entre 8 e 18 anos)eles identificaram diferençasentre os dois grupos na redeneural em estado padrão, umsistema associado com sonharacordado e outras atividades emque o cérebro não está ocupadocom tarefas. Os indivíduosestudados cujos cérebrosmostravam os maiores desviosda norma tambémapresentavam os déficits decomunicação mais graves.Mensurações do volume docórtex cingulado posteriortiveram uma taxa de precisão de

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92% em distinguir um cérebrodo outro.

Taxas de precisão na faixa de80 a 90% não sãosuficientemente altas para ospesquisadores afirmarem terdescoberto um marcador doautismo, mas são um progressoque teria sido difícil imaginaruma década atrás. E certamentesão suficientemente altas parainspirar confiança naabordagem algorítmica.

Um dos objetivos das novaspesquisas é adaptar essastécnicas a indivíduos maisjovens. Anderson diz: “Não

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ajuda muito diagnosticar umadolescente com autismo,porque já o sabemos.” Quantomais jovem o indivíduo, maiscedo se pode intervir. Quantomais cedo for a intervenção,maior o efeito potencial natrajetória de vida de uma pessoaautista.

Quão jovem a pessoa noescâner pode ser depende, emparte, da tecnologia. A RMNfuncional, por exemplo, requerreações a estímulos queprovocam atividade cerebral,então as crianças precisam teridade suficiente (e, claro, a

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capacidade neurológica) paraentender os estímulos. A RMNestrutural, inclusive a ITD, nãodepende da atividade cerebral,então permite aos pesquisadoresestudar indivíduos ainda maisjovens — tão jovens, naverdade, que podem ainda nãoapresentar sinaiscomportamentais de autismo.

Foi o caso de um estudo deITD de 2012,16 feito porpesquisadores da Universidadeda Carolina do Norte emChapel Hill. Os participanteseram 92 bebês com irmãos maisvelhos diagnosticados com

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autismo que, portanto, corriamo risco de apresentá-lo também.Os pesquisadores escanearam oscérebros deles aos seis meses ederam seguimento com umaavaliação comportamental aos24 meses (além de outrosescaneamentos na maior partedos casos). Àquela altura, 28indivíduos do estudopreenchiam os critérioscomportamentais do TEA, e 64não os cumpriam. Os tratosfibrosos da substância brancacerebral de um grupoapresentavam diferenças comrelação aos tratos do outro

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grupo? Os pesquisadoresconcluíram que isso ocorria emdoze dos quinze tratosinvestigados. Aos 6 meses, osbebês que mais tardedesenvolveram sintomasautistas apresentaram umaanisotropia fracionada maior(ou AF, a medida do movimentodas moléculas de água atravésdos tratos da matéria branca)que no resto dos bebês. Emgeral, aquilo seria um bomsinal; uma AF mais alta indicaum circuito mais forte.Contudo, à idade de 24 meses,estas mesmas crianças tinham

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AF menor, sinal de um circuitomais fraco. Por que estescircuitos eram mais fortes aos 6meses que o das crianças dedesenvolvimento típico? Elesrealmente tinham sido maisfortes antes? Os pesquisadoresnão sabiam a resposta, mastinham um novo objetivo: osbebês de 3 meses.

Outro objetivo de futuraspesquisas é observar o cérebroainda mais detalhadamente. Porsorte, o futuro já chegou. Eusei, porque vi.

Na verdade, estive dentro dofuturo — uma versão

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radicalmente nova de ITDchamada rastreamento de fibrasem alta definição (HDFT). OHDFT foi criado pelo Centro dePesquisa e Desenvolvimento deAprendizagem da Universidadede Pittsburgh. Walter Schneider,cientista sênior do centro,explica que o HDFT foiencomendado peloDepartamento de Defesa parapesquisar danos cerebraistraumáticos. “Eles meprocuraram dizendo queprecisavam de algo que fizessepelos danos cerebrais o que os

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raios X faziam pelas lesõesortopédicas.”17

Quando a equipe de pesquisapublicou um artigo no site doJournal of Neurosurgery,18 emmarço de 2012, a tecnologiarecebeu muita atenção da mídia.O artigo tratava do caso de umhomem de 32 anos com gravedano cerebral decorrente de umacidente com um veículo 4x4.(Não, ele não usava capacete.)Os escaneamentos com HDFTrevelaram a presença e alocalização de fibras perdidas deum modo tão preciso que aequipe de pesquisa pôde

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predizer a natureza do déficitmotor permanente — gravefraqueza da mão esquerda —“que outras modalidadesclínicas padrão nãoconseguiam”.

“Assim como há 206 ossosno corpo, há ainda maisconexões físicas no cérebro”,diz Schneider. “Você pode pedira qualquer um na rua paradesenhar um osso quebrado e épossível obter um desenhorazoável. Mas se você perguntar‘Como é um cérebro lesado?’, amaioria das pessoas — inclusive

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pesquisadores do campo — nãoconsegue dar detalhes.”

Inclusive pesquisadores docampo? É mesmo?

“Uma imagem imprecisa dosossos não permite umdiagnóstico correto”, dizSchneider. “Usamos a RMN dedifusão e fizemos isso com ela.”

O foco da pesquisa comHDFT tem sido o dano cerebraltraumático, mas o plano delongo prazo de Schneider émapear a via expressa deinformação do cérebro. Poranos comparei os circuitoscerebrais com as estradas, e não

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estou sozinha nisso. Mas a partede alta definição da tecnologiaHDFT revelou como areferência à via expressa éadequada.

A tecnologia comum de ITDmostra a estrada, rampas ecruzamentos do seu cérebrocomo se fosse um mapabidimensional. Este tipo demapa é útil quando você quersaber se uma fibra vai daquipara ali. Ele pode mostrar ondea estrada x e a rodovia 45 estãopróximas uma da outra. Podemostrar que as duas se cruzamvárias vezes. Mas não mostra

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como se cruzam. Elas fazemuma interseção, como noscruzamentos? Ou uma estradapassa por cima da outra, comonum viaduto? A tecnologiaantiga não responde a estaquestão. O HDFT responde.

Ele rastreia as fibras demodo individual por longostrechos.

E rastreia as fibras maislonge do que qualquertecnologia anterior — até ofinal da estrada.

Chega a mostrar se umcircuito danificado ainda temcontinuidade ou se deixou de

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transmitir. (Como bióloga, ficolouca com isso, é muito legal.)

Não quero exaltar demais oHDFT. Ele é incrivelmenteimportante, mas não vairesolver todos os mistérios docérebro. Como afirmaSchneider: “Uma das minhaslinhas preferidas naneurociência é que se você podepensar em cinco modos docérebro fazer algo, ele terá dezmaneiras de fazer. As cinco quevocê pensou e as cinco que vocênão pensou ainda.” O HDFTterá um grande impacto nosdiagnósticos de trauma cerebral.

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Em primeiro lugar, osdiagnósticos serão maisprecisos. Uma supermodernaressonância por tensor dedifusão coleta dados de 51direções. O HDFT coleta dadosde 257 direções. Comoresultado, ele não só diz queparte do cérebro foi danificadacomo também que fibrasespecíficas foram danificadas, equantas.

Segundo, os diagnósticosserão mais convincentes. Sabecomo os atletas às vezes têm umcolapso e morrem? Todos fazema conexão entre causa e efeito

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— entre excesso de esforçofísico e pressão no coração —porque a tragédia é visível,vívida e imediata. Não há erro.Então chega a autópsia e não háambiguidade. O jogador defutebol americano do colégiomorreu de infarto. O jogador debasquete da faculdade morreude aneurisma coronário. Mas osdanos cerebrais não têm clarezae imediatismo semelhantes e,portanto, tampouco este tipo deurgência. Quando um jogadorde futebol sofre uma concussãoou um boxeador leva diversosgolpes na cabeça, os efeitos do

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dano podem não se manifestarpor anos ou décadas. Mas istojá não é assim. O HDFT mostrao que esses golpes causaram nocérebro e, posso lhe garantir,não é bonito de se ver. Não épreciso um diploma de medicinapara comparar um cérebro comconcussão com um cérebronormal e exclamar: “Ah, não!”

“No caso do traumacerebral”, diz Schneider,“vemos uma ruptura numdaqueles cabos”. Mas não noautismo. “Neste caso”, diz ele,“vemos padrões anômalos decrescimento, sejam eles

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genéticos ou dodesenvolvimento etc., naqueleprocesso”.

Fui convidada ao laboratóriode Schneider para ser escaneadacomo parte de um programa detelevisão. Depois, Schneider meexplicou que vira áreas do meucérebro que apresentavam umadiferença de pelo menos 50%em relação a áreascorrespondentes no indivíduodo grupo de controle. Ele disseque dois achados “chamaramatenção”.

Primeiro, o meu trato visualé imenso — 400% maior que o

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de um indivíduo do grupo decontrole.

Segundo, a conexão “diga oque você vê” no sistemaauditivo é diminuta — 1% doindivíduo do controle. Isto fazsentido. No meu livroEmergence19 discuti o problemade fala que tive na infância.“Era como gaguejar. Aspalavras simplesmente nãosaíam.”

Mais tarde pedi a Schneiderque interpretasse esses achados.Como ainda estamosdescobrindo o cérebro, suainterpretação necessariamente

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tem a natureza de uma hipótese.Mas a ciência funciona assim.Recolhe-se informação (asressonâncias cerebrais que fiz)para formular uma hipótese efazer uma previsão verificável.

Entre o nascimento e a idadede 1 ano, Schneider explicou, osbebês se dedicam a duasatividades que os pesquisadoresdo desenvolvimento chamam debalbucio verbal e balbuciomotor. O balbucio verbal é oato familiar em que os bebêsfazem ruídos para ouvir comosoam. Igualmente, o balbuciomotor refere-se a ações como

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mover a mão para vê-la semexer. Neste período, quandoos bebês tentam entender comose relacionar com o mundo,seus cérebros estão criandoconexões para tornar esterelacionamento possível. Nobalbucio verbal, as fibras estãocrescendo para fazer a ligaçãoentre as partes “o que vocêouve” e “o que você diz”. Nobalbucio motor, as fibrascrescem para fazer a ligaçãoentre “o que você vê” e “o quevocê faz”.

Depois, entre as idades de 1e 2 anos, as crianças alcançam

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um estágio em que podememitir palavras isoladas. Nesteponto, o que ocorre no cérebroé que as fibras estão criandoligações internas entre os doissistemas de fibras formados noperíodo de balbucios verbal emotor. O cérebro conecta “oque você vê” com “o que vocêdiz” até surgirem mamãe,papai, bola etc.

No meu caso, Schneiderlançou a hipótese de que algoocorreu no desenvolvimento dafase de uma só palavra, e asfibras não criaram uma conexãoentre “o que você vê” e “o que

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você diz”. Este seria o trato de1% do tamanho do indivíduodo grupo de controle. Paracompensar, meu cérebroproduziu novas fibras, quetentaram ir para alguma parte,qualquer uma. Elas foram pararprincipalmente na área visual,mais do que nas áreastradicionais de produção dalinguagem. Este é o trato com400% do tamanho do trato doindivíduo do grupo de controle.

Nesse cenário, prosseguiuSchneider, a fase do balbuciopode ser normal, mas odesenvolvimento da linguagem

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diminuiria drasticamente entreas idades de 1 e 2 anos.

Isto está de acordo com opadrão de desenvolvimento queos pais de criançasdiagnosticadas com autismocostumam relatar.

“Exatamente!”, disseSchneider.

Mas ele ressalta que ocenário que descreveu ainda eraapenas uma hipótese. Ele vaiprecisar de mais dados, novosescaneamentos que mostremcomo o cérebro cresce. “Nuncativemos tecnologia para medirisso”, disse ele. “O projeto em

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que estou trabalhando consisteem mapear a sequência dedesenvolvimento.”

Ele não tinha planejadoadaptar a tecnologia HDFTpara mapear o desenvolvimentodo cérebro autista, mas umapergunta da jornalista LesleyStahl do programa 60 Minutes ofez mudar de ideia. Schneiderme pediu permissão paramostrar minhas ressonâncias aela para uma reportagem sobreautismo que estava preparando.(O programa original detelevisão que tinhaencomendado o escaneamento

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nunca o exibiu.) Para nãodespertar esperanças irreais empais desesperados, Schneiderqueria dizer que o HDFT paradiagnosticar o cérebro autistaainda não estaria disponível emhospitais no futuro próximo —levaria entre cinco e dez anospara que os hospitais de pontativessem acesso a estatecnologia. Stahl concordou.Mas é assim como ele recordaque ela formulou a pergunta:

“Então, a mãe de umacriança de 4 anos que terá 14quando tiver um diagnósticobiológico do seu dano cerebral

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— este atraso significa umadécada ou mais de tentativasfracassadas de tratamentos,perda da capacidade de secomunicar e educar seu filho e oestresse emocional queacompanha os diagnósticosimprecisos. O que poderia serfeito para acelerar o processo etorná-lo disponível dentro decinco anos?”

“É por isso”, disse Schneider,“que estou fazendo um projetosobre autismo”.

A ciência sempre avançadevido a novosdesenvolvimentos na tecnologia.

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Pense em Galileu e o telescópio.Ele foi uma das primeiraspessoas a apontar um “tubo deolhar à distância” para o céunoturno, e o que conseguiuvisualizar mudou para sempre omodo como concebemos ouniverso: montanhas na Lua,luas à volta de Júpiter, fases deVênus e muito, muito maisestrelas do que conseguimos vera olho nu. O mesmo ocorre comas neuroimagens. Você podepensá-las como um“mentescópio” (o mindoscopecunhado por Hirsch), uminstrumento com o qual

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acabamos de começar aexplorar o universo interior ereunir respostas preliminares àsnossas perguntas sobre océrebro autista: em que eledifere do cérebro normal? E oque ele faz de diferente docérebro normal?

Hoje entendemos asconexões biológicas entre partesdo cérebro e diversoscomportamentos queconformaram o atualdiagnóstico de autismo. Masainda não sabemos as causaspor trás da biologia — o quedemanda uma resposta a uma

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terceira pergunta: como eleficou assim?

Para isso, é preciso recorrer àgenética.

As neuroimagens não são perfeitas.Para entender e valorizar o que demelhor podem fazer, vejamos o quefazem e o que não fazem:

A RMNf não capta a atividadecerebral em toda a abrangênciada experiência humana. Elanecessariamente capta apenasas reações cerebrais que apessoa pode ter enquanto estádeitada quieta por longosperíodos.As neuroimagens exigem queos indivíduos mantenham acabeça imóvel. Recentemente,

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diversos estudos afirmam queconexões de curto alcance nocérebro enfraquecem à medidaque as crianças crescem, aopasso que as de longo alcancese fortalecem. Osneurocientistas considerarameste avanço muito significativopara a compreensão doprocesso de maturidadecerebral. Infelizmente, umestudo complementar dosautores do estudo originalmostrou que as supostasmudanças no desenvolvimentocerebral desapareciam quandoo movimento da cabeça eraconsiderado. “Isto é muito,muito chato”, disse opesquisador principal.20 “Meuresultado favorito dos últimoscinco anos é um artefato.”

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Essa descoberta não fez oscientistas repensarem todos osescaneamentos cerebrais.Contudo foi um alerta claro danecessidade de considerar omovimento da cabeça. Estacautela se aplicaprincipalmente aos estudos depessoas com autismo e outrostranstornos dodesenvolvimento neurológico.Por quê? Porque estesindivíduos são precisamente osque têm mais dificuldade deficar quietos. Os pesquisadorestentam descobrir um modo deeliminar o movimento cerebralnos estudos de neuroimagens,mas, mesmo que o consigam,terão de se perguntar se aeliminação de dados deestudos de um grupo de

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indivíduos (como os autistas)não distorcerá as comparaçõescom estudos de indivíduosneurotípicos. Mesmo que você consigaficar imóvel, pode alterar umresultado de RMN — sei dissopor experiência pessoal. Em umestudo de RMNf, me mostraramuma simulação de voo.Primeiro sobrevoei o GrandCanyon. Depois, planei sobrecampos de trigo. Mais tardesobrevoei topos de montanhas.Então comecei a me sentir mal— o que não é uma boa ideiaquando se está dentro de umaparelho de ressonânciamagnética. Então fechei osolhos. Aquela ressonância foitudo, menos perfeita.Mesmo a melhor ressonânciasó consegue ser tão boa

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quanto a melhor tecnologia domomento. Os neurôniosdisparam centenas de impulsospor segundo, mas o sinal em sileva diversos segundos paraflorescer e dura uma dezena desegundos. Não étemporalmente preciso. E aresolução não capta a atividadeno nível do próprio neurônio.Como afirmou um artigo naScience: “Usar RMNf paraespionar os neurônios é comousar satélites da Guerra Friapara espionar pessoas: só se vêa atividade de grandeescala.”21E há os próprios pesquisadores.Eles precisam ser cautelosos nainterpretação dos resultados.Por exemplo, não devem suporque se uma parte do cérebro seilumina ela é essencial para o

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processo mental que estásendo testado. Em um estudoos pesquisadores descobriramque o hipocampo era ativadoquando os indivíduos faziamum exercício determinado, masem outro estudo pesquisadoresdescobriram que lesões nohipocampo não afetavam acapacidade do indivíduo defazer o mesmo exercício. Naverdade, o hipocampo faziaparte da reação do cérebro,mas não era uma partenecessária da reação.Os pesquisadores também nãopodem supor que se umpaciente apresentacomportamento anormal e oscientistas encontram umalesão, encontraram o motivo docomportamento. Recordo deuma palestra sobre neurologia

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na faculdade, quando suspeiteique era um erro associar umcomportamento específico auma lesão específica nocérebro. Imaginei-me abrindo aparte de trás de uma televisãoantiga e cortando os fios. Se aimagem sumisse, eu poderiaafirmar com certeza que tinhaencontrado o “centro daimagem”? Não, porque haviaum monte de fios que eupoderia ter cortado que fariama televisão pifar. Poderia cortara ligação com a antena, e aimagem sumiria. Poderia cortaro fio da energia, e a imagemsumiria. Ou poderiasimplesmente desconectar atomada da parede! Mas algumadessas partes da televisão seriao centro da imagem? Não,porque a imagem depende de

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um conjunto de causas, todasinterdependentes. Esta éprecisamente a conclusão àqual nos últimos anos ospesquisadores começaram achegar — a de que diversasfunções cerebrais nãodependem de uma fonteespecífica, mas de redes delarga escala.

Então, não acredite se alguma vezvocê ouvir dizer que a RMNf podenos dizer as preferências políticas dealguém, como este alguém respondeà publicidade ou se está mentindo. Aciência ainda não chegou a esse nívelde sofisticação — e talvez nuncachegue.

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3 O sequenciamentodo cérebro autista

Em 6 de setembro de 2012 euestava fazendo o que costumofazer quando preciso passar otempo num aeroporto —bisbilhotando uma banca dejornais, folheando revistas,lendo as notícias nos jornais —quando uma manchete no NewYork Times chamou a minhaatenção: “Estudo descobre omapa do DNA.” Peguei o jornal

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e continuei lendo: “O genomahumano tem pelo menos quatromilhões de interruptoresgenéticos que residem empedaços do DNA e que eramdescartados como ‘lixo’ masque têm um papel importanteno controle do comportamentodas células, órgãos e outrostecidos.”1

Bem, já não era sem tempo,pensei. A ideia do “DNA lixo”nunca fez muito sentido paramim. Lembro-me de ouvir issona faculdade. Ouvi referências aele em sala de aula. Vi artigosde especialistas que revisavam

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pesquisas a respeito na Science ena Nature. DNA lixo não é umapelido, embora soe assim; éum termo científico genuíno. Échamado assim porque, àdiferença das sequências deDNA que codificam asproteínas, são sequências queparecem não ter uso.

A ideia me parecia ridícula.A dupla hélice sempre me fezpensar num programa decomputador, e você nuncaescreveria um código com ummonte de dados desnecessários.O “lixo” tinha de ter umpropósito. Tinha que ser algo

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como o sistema operacional dosgenes. Se encontrar um montede arquivos estranhos no seucomputador, você pode seperguntar para que servem, masnão concluirá que não servempara nada. E certamente não vaiquerer mudar alguns 0 e 1 sópara ver o que acontece. Omesmo ocorre com o DNA lixo.Se você se meter com ele, o“programa” dos genes não vaifuncionar.

Eu não estava sozinha nessaprofunda suspeita. Por anos, oscientistas começaram a levar aideia do DNA lixo cada vez

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menos a sério. Na verdade, osgeneticistas tinham começado apreferir os termos DNA nãocodificante e matéria escura,ambos sugerindo que esse tipode DNA era simplesmente ummistério, e não lixo. Ao ler oartigo no aeroporto, senti-merecompensada depois de tantosanos, o que sempre é bom, masnão foi isso o que me chamou aatenção.

O artigo — dentre muitosoutros naquele dia, e nassemanas seguintes, enfatizandoo DNA não lixo — baseava-senos resultados de um grande

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esforço federal de pesquisachamado Enciclopédia dosElementos do DNA, ou Encode.O projeto envolveu 440cientistas de 32 laboratórios detodo o mundo, e os primeirostrinta artigos do grupo tinhamaparecido no dia anterior nasrevistas Nature, GenomeResearch e Genome Biology.Em uma analogia comum, oprimeiro sequenciamento dogenoma humano pelo ProjetoGenoma Humano e a CeleraGenomics, de Craig Venter, em2001, “era como tirar uma fotoda Terra vista do espaço”, como

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um cientista disse ao Times, aopasso que a Encode era como oGoogle Maps: ele nos informa“onde estão os caminhos”,“como está o trânsito a quehora do dia”, “onde estão osbons restaurantes, ou oshospitais, as cidades e os rios”.O Projeto Genoma Humano nosdisse o que era o genoma. AEncode começou a nos dizer oque ele faz.

Mas o que realmente meinteressou foi a explicação noartigo sobre como o genoma fazo que faz. Para compreender asua importância, primeiro você

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precisa entender como é oDNA. Todos já vimos a imagempopular da dupla hélice: aespiral de combinaçõesaparentemente infinitas de A(adenina), C (citosina), G(guanina) e T (timina) que sealonga. Mas este modelorepresenta uma fita de DNAesticada. Uma fita de DNAtotalmente esticada teria cercade dez metros de comprimento.Mas ele não é assim. Em vezdisso, a espiral do DNA é tãocompacta que cabe dentro donúcleo de células microscópicas.Como o Times informou, os

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pesquisadores da Encodedescobriram “que pequenossegmentos de DNA de matériaescura muitas vezes estão muitopróximos dos genes quecontrolam”.

Isso é fantástico, pensei.Até então, os cientistas

pensavam no DNA na suaforma esticada. Mas quandovocê pensa no DNA como umabobina enrolada compacta —quando estava no aeroporto,com o Times nas mãos, essa eraexatamente a imagem que meucérebro criava —, uma peça nãocodificante de DNA poderia

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estar ativando interruptores doDNA codificante a centenas demilhares de pares de base dedistância. Na hélice esticada,eles não estão próximos; nahélice enrolada, estão lado alado.

Mal podia esperar para abrirmeu exemplar da Nature.Quando desci do avião fuidireto aos correios, mas arevista não tinha chegado. Nãovou dizer que fiquei esperandojunto à caixa postal, mas, tãologo chegou, eu a devorei. Oartigo “The Long-RangeInteraction Landscape of Gene

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Promoters” [Panorama dainteração de longo alcance dospromotores genéticos]2 eraespecialmente interessante, egostei muito da última frase doresumo: “Nossos resultadoscomeçam a colocar os genes eos elementos regulatórios numcontexto tridimensional e arevelar suas relaçõesfuncionais.”

Contudo, ao terminar dedevorar a revista, percebi que alição mais importante nãoestava em nenhum dos seisartigos da Encode. E sim naimpressão geral que os artigos

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causaram em mim. Emconjunto, eles me ajudaram aentender que não sabemos nadade genética.

Como neuroimagens, aciência genética ainda está nainfância. Em cem anos, o estadoatual do nosso conhecimentoparecerá primitivo. Pergunte-seo que ocorreria se enviássemosum laptop e um pen drive cemanos de volta no tempo. Oscientistas conseguiriamdescobrir como as fotos estãoarmazenadas no pen drive?Sejamos generosos e lhes demoscem laptops, para que possam

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fazer alguns testes destrutivos.O que esses cientistas fariamseria abrir o pen drive e retiraro chip. Eles mapeariam aanatomia do chip. Dariam acada parte nomes latinospomposos e bobos. (Amígdala,o nome do centro emocional docérebro? Ela deriva da palavralatina para “amêndoa”, devidoà sua forma. Hipocampo, onome do buscador de arquivoscerebral? Deriva da palavralatina “cavalo-marinho” pelomesmo motivo.) Esses cientistassuporiam que todas as partesreunidas são a Intel, porque

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todos os PC levam “IntelInside” escrito. Mas eles nãoteriam ideia de como o pendrive funciona.

É mais ou menos comoestamos hoje no conhecimentodo cérebro e do genoma.

Para um cientista, estedesconhecimento é animador.Um novo campo para explorar!A oportunidade de fazerpesquisas fundamentais, degrande alcance, antes que ocampo fique estreito eespecializado! Perguntas quelevam a outras perguntas! O

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que poderia ser maisinteressante?

Não obstante, para pais queesperam respostas sobre umacriança autista hoje, a falta deconhecimento pode serextremamente frustrante.

Felizmente, temos o início deum corpo de conhecimentossobre a genética do autismo.Saber que a genética tem umpapel no autismo já é umgrande avanço com relação aonde estávamos há poucasdécadas. Pode ser difícilacreditar nisso agora, mas arelação do DNA com o autismo

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só foi questionada em 1977,quando o primeiro estudo sobreo autismo em gêmeos foipublicado.3 A amostra erapequena, mas os resultadosforam surpreendentes. O índicede concordância — significandoque os dois gêmeos tinham otraço — para o autismo infantilentre pares de gêmeos idênticosera de 36% (quatro pares degêmeos num total de onze). Masentre dez pares de gêmeosfraternos a concordância erazero. Estes números podemparecer baixos, mas devemosrecordar que isso foi três anos

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antes de o DSM-III fornecer osprimeiros critérios para odiagnóstico formal do autismo— os índices de concordâncianaquela mesma amostra seriamde 82% (nove pares de gêmeosnum total de onze) em gêmeosidênticos e 10% (um par emdez) em gêmeos fraternos. Umestudo complementar de 1995,4usando uma amostra com odobro do tamanho, encontrouresultados comparáveis:concordância de 92% emgêmeos idênticos e de 10% emgêmeos fraternos.

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Como gêmeos idênticospossuem o mesmo DNA, estesresultados apoiam fortemente aideia de que a origem doautismo é genética. Contudo ainfluência do DNA não éabsoluta. Se um gêmeo idênticotiver autismo, a chance de que ooutro também o tenha serámuito grande. Mas não é de100%. Por quê?

Bem, poderíamos fazer amesma pergunta a respeito deoutras diferenças sutis nosgêmeos idênticos. Os paissempre conseguem diferenciá-los, e em certos casos as

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diferenças são óbvias osuficiente para que qualquer umos distinga. Um motivo é quemesmo que o genótipo — oDNA na concepção — sejaidêntico nos gêmeos, os genespodem operar de formadiferente no interior da célula.Outra razão é que os genótipospodem não ser idênticos nonascimento, devido a mutaçõesespontâneas no DNA de um ouambos os gêmeos. Os doisconjuntos de diferençasgenéticas contribuem para ofenótipo do indivíduo — sua

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aparência física, o intelecto e apersonalidade.

Obviamente, saber que agenética tem um papel noautismo é apenas o começo. Apergunta seguinte é: qual ouquais genes?

Mesmo no início do séculoXXI alguns pesquisadorestinham a esperança de que oautismo seria o resultado de umou um punhado de desviosgenéticos em um DNAindividual. Talvez o autismofosse como a síndrome deDown que, como ospesquisadores descobriram em

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1959, se devia a uma cópiaextra do cromossomo 21 — foia primeira vez que umavariação no número de cópiasfoi reconhecida como causa dadisfunção intelectual. No casoda síndrome de Down, a relaçãoentre causa e efeito é clara: estecromossomo em particularcausa aquela síndrome emparticular. Os geneticistastiveram certo sucesso emlocalizar genes específicos decausa e efeito em transtornosrelacionados ao autismo. Nasíndrome de Rett — umtranstorno do sistema nervoso

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que leva a inversões dodesenvolvimento que muitasvezes são diagnosticadas comosintomas de autismo — a causaé um defeito no gene de umaproteína em particular, MeCP2,localizada no cromossomo X.Na esclerose tuberosa —transtorno genético que fazcrescerem tumores e vemacompanhado de TEA em quasemetade dos casos — a causa sãomudanças em um de dois genes,TSC1 e TSC2. A síndrome do Xfrágil — a causa mais comumde retardo mental em meninos,e que pode levar ao autismo —

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deve-se a uma mudança no geneFMR1 no cromossomo.

De modo geral, contudo, agenética do autismo não é tãosimples. Ela está longe disso.

Depois que o ProjetoGenoma Humano e a CeleraGenomics mapearam o genomahumano em 2001, dezenas deinstituições em dezenove paísesse juntaram para criar o ProjetoGenoma do Autismo, ou AGP.5Usando um banco de dados de1.400 famílias, os cientistasempregaram o chip genético,uma nova tecnologia quefunciona num nível muito mais

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alto de resolução que osmétodos anteriores e lhespermitia observar milhares devariantes do DNA num só chipao mesmo tempo, em vez de umpor um. Eles usaram estatecnologia para observar todo ogenoma de cada indivíduo — os23 pares de cromossomos —além de áreas particulares quepesquisas anteriores haviamapontado como de possívelinteresse.

Quando a fase um do ProjetoGenoma do Autismo chegou aofim, em 2007,6 o consórciopublicou um artigo na Nature

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Genetics apontando diversasáreas específicas do genomacomo prováveis contribuintespara o autismo.7 Dentre oscampos mais promissores parafuturas pesquisas estava umamutação do gene que codificauma proteína chamadaneurexina, que se ligadiretamente a uma proteínachamada neuroligina paracontrolar o modo como duascélulas cerebrais se conectam nasinapse. Durante odesenvolvimento, essasinterações são cruciais paradirigir os neurônios aos seus

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alvos adequados e formar viasde sinalização no cérebro. Adescoberta do AGP reforçoupesquisas anteriores indicandoque mutações na proteínaSHANK3, que interage com aproteína neuroligina na sinapse,estão associadas ao aumento dorisco de TEA e retardo mental.

Mas além de servir comoindicação para futuraspesquisas, o artigo demonstroua eficácia da estratégia que oscientistas do TEA haviamempregado para detectar essasmutações. Eles procuraramvariações no número de cópias,

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ou CNVs — duplicaçõessubmicroscópicas, apagamentosou rearranjos em seções doDNA. Estas variações, quepodem ocorrer no comprimentoe posição no cromossoma, têmo potencial de afetar a funçãodo gene.

De onde surgem as variaçõesno número de cópias? A maiorparte é herdada. Em algummomento, uma irregularidadeentra no pool genético e épassada de uma geração aoutra. Mas algumas CNVs nãosão hereditárias. Surgemespontaneamente, seja no óvulo

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seja no espermatozoide, antesda fertilização ou no óvulorecém-fertilizado. São chamadasde mutações de novo, expressãolatina significando “desde ocomeço”.

Muitas CNVs são benignas.Os geneticistas estimam quecada genoma — o DNA únicode cada pessoa — pode contermuitas dezenas de mutações denovo. Elas são parte do quetorna cada pessoa única. Mas asCNVs de novo podem estarassociadas ao autismo?

Foi a pergunta que umestudo com 264 famílias

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publicado na Science em 2007tentou responder.8 Os autoresconcluíram que esta mutaçãosignifica “um fator de risco deTEA maior do que erareconhecido”. O estudodescobriu que 10% das criançasautistas com irmãos nãoautistas (12 num total de 118)tinham variações no número decópias de novo, mas só 1% dosindivíduos de controle semhistória de autismo (2 dentre196) apresentavam CNVs. Noscinco anos seguintes o artigo“Strong Association of De NovoCopy Number Mutations with

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Autism” [Forte associação demutações do número de cópiasde novo com o autismo] foicitado mais de 1.200 vezes.

A esperança de que oautismo pudesse ser traçado atéuma ou um punhado devariações genéticas foi ficandocada vez menos realista.Quando a fase dois do ProjetoGenoma do Autismo — combase no DNA de 996 criançasda escola fundamental dosEstados Unidos e Canadádiagnosticadas com TEA, dosseus pais e de 1.287 indivíduosdo grupo de controle — chegou

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ao fim, em 2010, oscolaboradores tinhamidentificado dezenas devariantes no número de cópiaspotencialmente associadas aoTEA.9 Em 2012, os geneticistasjá haviam associado o TEA comcentenas de variações nonúmero de cópias.

Para complicar ainda mais apesquisa, muitas CNVspareciam ser, se não únicas,pelo menos extremamente raras.Os autores do artigo de 2007 naScience que buscavam ligaçõesdas mutações de novo com oautismo haviam observado:

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“Nenhuma das variantesgenômicas detectadas foiobservada mais de duas vezes nanossa amostra, e a maioria foivista apenas uma vez.” Em2010, com a publicação da fasedois da pesquisa do ProjetoGenoma do Autismo, StanleyNelson, professor de genéticahumana e psiquiatria da UCLA,afirmou: “Encontramos muitosmais genes afetados em criançasautistas do que no grupo decontrole. Mas aí está oproblema: todas as criançasapresentavam um transtornodiferente num gene diferente.”10

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Em setembro de 2012, umartigo na Science, “TheEmerging Biology of AutismSpectrum Disorders” [Abiologia emergente dostranstornos do espectro doautismo], relatou oimpressionante progresso nadescoberta de CNVspossivelmente relacionadas como autismo — mas “sem um sólugar que respondesse por maisde 1% dos casos”.11

Às vezes, os geneticistasfalam de um relacionamentomuitos-para-um: diversasmutações candidatas, um

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resultado. Mas que resultadoespecificamente? Umdiagnóstico de autismo? Umsintoma de autismo? Como nocaso das neuroimagens, tentarcompreender o autismo pormeio da genética é complicadodevido à sua heterogeneidade. Oautismo manifesta-se em váriostraços e eles não são os mesmosde um indivíduo para o outro.Por que deveríamos esperar quea genética do autismofornecesse uma correspondênciaum-para-um entre mutação ediagnóstico?

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Na verdade, os pesquisadoresestão descobrindo que outrasmutações podem contribuirpara uma variedade dediagnósticos, incluindoincapacidade intelectual,epilepsia, transtorno do déficitde atenção com hiperatividade eesquizofrenia, em umrelacionamento um-para-muitos. Mais uma vez, aheterogeneidade é o problema,pois o diagnóstico do autismobaseia-se em comportamentos eo autismo partilha estescomportamentos com outrosdiagnósticos. Se os

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pesquisadores soubessem quaistraços — se os houver — sãoespecíficos do autismo, a buscade uma causa genética seriamuito mais fácil. Como disse G.Bradley Schaefer,neurogeneticista do Instituto dePesquisa do Hospital Infantil deArkansas: “A chave está emtentar descobrir que diferençassão secundárias e que diferençassão importantes na condição.”12

Até descobrirem isso, ospesquisadores precisam adotaroutras metodologias paraapontar genes relacionados aoautismo. O Projeto Genoma do

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Autismo, por exemplo,procurou um padrão nasmutações, ou ao menos o iníciode um padrão. E o encontrou:muitos genes pertenciam acategorias que sabidamenteafetam a proliferação celular e asinalização celular no cérebro— padrão que reforçava aindamais a descoberta anterior dosignificado da ligaçãoneurexina-neuroligina e oSHANK3.

Em 2012, três grupos depesquisadores quedesenvolveram, de modoindependente, uma abordagem

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nova e idêntica para descobrirmutações de novo publicaramsuas descobertas na Nature. Suaestratégia foi incluir apenasindivíduos autistas cujos pais eirmãos não apresentassemcomportamentos autistas. Elesusaram um sequenciamentoletra por letra do exoma — aspartes codificadoras deproteínas do genoma — paraidentificar mutações de novo deuma letra. Se encontrassem umaCNV de novo em ao menos doisindivíduos autistas, e se estaCNV não aparecesse emnenhum dos indivíduos não

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autistas, consideravam amutação um agente contribuintedo autismo.

Uma das pesquisas,conduzida por Matthew W.State, neurogeneticista doCentro de Estudos da Criançada Faculdade de Medicina daUniversidade de Yale, estudouduzentas crianças autistas e seuspais e irmãos não autistas eencontrou duas crianças com amesma mutação de novo de umtipo que nenhum dosparticipantes não autistasapresentava.13 Ao mesmotempo, outra pesquisa, liderada

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por Evan E. Eichler, daUniversidade de Washington,em Seattle, estudou de modoindependente 209 famílias eencontrou um indivíduo com amesma mutação de novoapresentada em um participantedo estudo da Yale.14 Mais umavez, era de um tipo quenenhuma das análises tinhaencontrado em indivíduos nãoautistas. O estudo daUniversidade de Washingtonidentificou também outra CNVde novo em dois participantesautistas do seu próprio estudo.Então, um terceiro trabalho,

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feito por Mark J. Daly, emHarvard, procurou estas trêsvariações de novo — uma noestudo de State, outra no deEichler e ainda outracompartilhada por ambos — emuma amostra separada deindivíduos e identificou criançascom autismo com as mesmasCNVs, o que indicava umapossível correlação entre aquelaCNV e o autismo.15

Vale ressaltar outradescoberta do mesmo trio deestudos — era quatro vezesmais provável que as CNVstivessem origem do lado do pai

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do que do lado da mãe. Isso foireforçado alguns meses depoiscom a publicação de um artigona Nature16 informando sobreuma correlação entre a idade dopai e a taxa de mutações denovo. Para mim, esse artigo foium daqueles “Claro!” em que agente dá um tapa na testa. Ascélulas do esperma se dividem acada quinze dias, mais oumenos, então, quanto maisvelho o pai, maior o número demutações no esperma. É comofazer uma cópia de uma cópiade uma cópia numafotocopiadora. Quanto maior o

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número de mutações, maior orisco de uma mutaçãocontribuir para o autismo.*

Contudo, mesmo que osgeneticistas consigam fazer acorrelação da mutação com oautismo (independentemente dea mutação estar relacionadacom outras condições), elesainda não sabem se uma únicamutação é suficiente para criartraços autistas, ou se osurgimento de um só traçodepende de uma combinação demutações. Recentemente, asopiniões passaram a apoiar estahipótese de mutações múltiplas,

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em parte graças ao estudo dolaboratório de Eichler. “Odesenvolvimento do cérebroprovavelmente é muito sensívelaos desequilíbrios de dosagens”,disse ele ao descrever suasdescobertas.17 Um só insulto —como os geneticistas chamamuma mutação com o potencialde prejudicar a saúde — podeser suficiente para causar danos.E duas? Boa sorte!

Essa conclusão foi reforçadapor outros laboratórios. Porexemplo, uma análise de 2012das mutações no gene SHANK2— que codifica a proteína

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sináptica, como a SHANK3,neurexinas e neuroliginas —teria sido importante se tivesseencontrado mais apoio para aligação entre o autismo emutações genéticas relacionadascom o circuito neuronal.18 Maso estudo, com base em 851indivíduos diagnosticados comTEA e 1.090 do grupo decontrole, descobriu também queos três indivíduos com mutaçãode novo no SHANK2 tambémtinham mutações hereditáriasem uma seção do cromossoma15 há muito tempo associado aoautismo.

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“Para estes pacientes, é comose o genoma não conseguisselidar com a ocorrência de novoextra”,19 disse o pesquisador-chefe Thomas Bourgeron,professor de genética naUniversidade de Paris, Diderot.“Pode ser como nitro eglicerina. Sozinhos, tudo bem.Mas, para misturar os dois, épreciso ser muito cauteloso.”

Para mim, a hipótese demúltiplas mutações écorroborada por observaçõesque venho fazendorepetidamente, nos últimosvinte anos, quando conheço

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famílias. Notei que em muitoscasos uma criança com autismotem ao menos um pai ou umamãe com uma forma branda decomportamento autista. Muitasvezes, uma criança com autismograve tem pai e mãe com estecomportamento. Se ambos ospais contribuem com variaçõesno número de cópias de um tipocom risco maior de autismo, aincidência de autismo emcrianças nessas famíliasnaturalmente cresce. Quantomais se joga o dado de ambosos lados da família, maior a

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probabilidade de ter umacriança com o problema.

Até aqui tratei apenas dasmutações de novo e hereditárias— presentes durante e logo apósa concepção. Mas osgeneticistas também estudam oque ocorre com os genesdurante a gravidez e ao longoda vida — quando os fatoresambientais entram em questão.O escapamento dos carros podecontribuir para o autismo? Adieta da mãe durante agravidez? As vacinas?

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Se seus genes carregam umrisco maior de que um fatorambiental dispare uma doençaou distúrbio, dizemos que vocêtem uma suscetibilidade oupredisposição genética. Se osfatores ambientais interagemcom seus genes de modo acausar uma mudança genética,então dizemos que você temuma mutação adquirida ousomática. Contudo a pesquisasobre a influência ambiental noautismo é muito menosconclusiva e, em muitos casos,mais controversa que a pesquisasobre os fatores genéticos.

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“É amplamente aceito que ostranstornos do espectro autistaresultam de múltiplos fatores, eque seria extremamente raroencontrar alguém com uma sócausa para esta síndromecomportamental”,20 disse em2011 a epidemiologistaambiental Irva Hertz-Picciotto.“No entanto trabalhosanteriores sobre os genesignoraram a possibilidade deque os genes pudessem agir emconjunto com as exposiçõesambientais.”

Hertz-Picciotto foi aprincipal pesquisadora do

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CHARGE (Riscos do AutismoInfantil Genético e Ambiental),um programa de pesquisa doInstituto MIND (Instituto dePesquisa Médica emTranstornos doDesenvolvimento Neurológico)da Universidade da Califórnia,em Davis. “Esperamosencontrar muitos, talvezdezenas, de fatores ambientaisque provavelmente contribuampara uma fração dos casos deautismo. É muito provável quea maior parte deles opere emconjunto com outras exposiçõese/ou com os genes.”21

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Qual era o princípioorganizador por trás de umprojeto tão grande? Hertz-Picciotto afirma que desde oinício os colaboradoresdecidiram dividir as pesquisasem três áreas: nutrição,poluição atmosférica epesticidas.22

O primeiro estudo doCHARGE a atrair atençãonacional, no periódicoEpidemiology, em 2011,apontou que a combinação decertos genes desfavoráveis e afalta de suplementaçãovitamínica da mãe nos três

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meses anteriores à concepção eno primeiro mês de gravidezaumentavam significativamenteo risco de autismo.23 Outroestudo do CHARGE, publicadoem 2011 na EnvironmentalHealth Perspectives, descobriuque crianças nascidas de mãesque viviam a menos de doisquarteirões de autoestradastinham mais probabilidades deapresentar autismo,presumivelmente devido àexposição aos gases dacombustão.24 Um terceiroestudo do programa, publicadoem 2012, revelou que mais de

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20% das mães de crianças comTEA ou atrasos nodesenvolvimento eram obesas,ao passo que dentre as mães decrianças com desenvolvimentotípico 14% eram obesas.25

Alguns estudos do CHARGEforam muito menos conclusivos— como, por exemplo, estadescoberta em outro artigo, de2012: “Certos pesticidas podemser capazes de induzircaracterísticas centrais doautismo, mas pouco se sabesobre o tempo e a dose, ouquais dos vários mecanismossão suficientes para induzir a

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condição.”26 Na verdade, essaconclusão era, basicamente, umapelo para mais pesquisas: “Emestudos com animais,estimulamos mais pesquisassobre as interações genes x meioambiente, além de exposiçãoexperimental a misturas decomponentes. Da mesmamaneira, estudosepidemiológicos com humanosem exposiçõesexcepcionalmente altas podemidentificar quais tipos depesticidas são maispreocupantes, e estudoscentrados em genes x meio

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ambiente precisam determinarse há subpopulações suscetíveisao maior risco de exposição aospesticidas.” Não é comumencontrar diretrizes para futuraspesquisas em artigos científicos,e neste caso é notável aamplitude na solicitação. Umeditorial no exemplar de julhode 2012 da EnvironmentalHealth Perspectives fez apelosemelhante — e não só comrelação a pesticidas. Em vezdisso, solicitava pesquisas sobretudo o que pudesse serprejudicial — a “formulação deuma estratégia sistemática para

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a descoberta de causasambientais potencialmenteevitáveis de autismo e outrosNDDs”, ou transtornos dodesenvolvimento neurológico.27

“Acho que as pessoas têmexpectativas irreais”, disseHertz-Picciotto. “No campo dagenética, pensaram realmenteque aquilo ia ser a história.”Em vez de “procurar asmutações raras e as ainda maisraras”, disse, elas poderiam sermais bem-sucedidas setentassem vincular os fatoresambientais às variantesgenéticas comuns.

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Eu mesma me pergunteimuitas vezes se o aumento nouso de medicamentos nasúltimas décadas teriacontribuído para o aumento naincidência do autismo. Emjunho de 2011, a FDA(Administração Federal deAlimentos e Medicamentos)lançou um alerta de segurançaàs grávidas sobre a possívelligação entre o desenvolvimentocognitivo e o uso de valproato,um estabilizador de humor emedicamento para epilepsia.28

Mais tarde naquele ano, doisestudos provaram que crianças

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cujas mães haviam tomadovalproato na gravidez tinhammaior risco de ter baixo QI eoutras deficiências cognitivas,além de autismo e outrostranstornos do espectroautista.29 “Estima-se que de 6 a9% dos bebês expostos aovalproato in utero desenvolvemautismo”, informou o site daFundação Simons, “um riscomuitas vezes maior que o dapopulação em geral.”30

O primeiro estudo ainvestigar a ligação específicaentre uso de antidepressivos eautismo, feito pelo Programa

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Kaiser de Assistência MédicaPermanente, no norte daCalifórnia, só foi publicado em2011.31 O estudo comparou 298crianças com TEA e suas mãescom outras 1.500 crianças dogrupo de controle e suas mães eencontrou evidências de umrisco ligeiramente maior entreas mães que usavamantidepressivos durante agravidez ou imediatamenteantes de engravidar. Está bem,pensei, mas talvez uma mãe queprecise de antidepressivos játenha um risco maior devariações no número de cópias,

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o que significa que o gatilho doautismo pode ser algorelacionado à depressão, e nãoaos antidepressivos. Mas oestudo considerou estapossibilidade e descobriu que asmães deprimidas que nãotomavam antidepressivos nãoapresentavam um risco maiselevado.

Contudo o nível dos riscos érelativo. O estudo concluiu que“era improvável” que osantidepressivos “fossem umfator de risco importante”.Mas, e se forem um riscomenor? A pesquisa indicou que

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as mães que haviam tomadoantidepressivos no ano anteriorao parto tinham 2,1% maisrisco de ter crianças com TEA, eo maior aumento do risco, de2,3%, era com o uso domedicamento no primeirotrimestre.

Mas há uma coisa. Acho oProzac uma droga fabulosa.Tenho amigos que estariammuito mal se não fosse peloProzac, o Lexapro ou outroinibidor seletivo da recaptaçãode serotonina. Conheço genteque foi salva por essas drogas.Eu mesma não seria funcional

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sem elas. Elas podemtransformar uma vidasimplesmente vivida em umavida que vale a pena viver. Asmulheres grávidas ou quepensam engravidar e que tomamantidepressivos deveriamconsultar o médico e pesar osprós e os contras.

De qualquer modo,precisamos ter muito cuidadoao buscar relações de causa eefeito entre os fatoresambientais e a genética. Comotodo cientista sabe, correlaçãonão implica causalidade. Umacorrelação observada — dois

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eventos que ocorrem ao mesmotempo — pode ser apenas umacoincidência. Vamos usar ainfame controvérsia da vacinapara ver a complexidade lógicade uma argumentaçãocausalidade x coincidência. Ahistória é a seguinte:

Os pais costumam vacinar osfilhos por volta dos 18 meses.Alguns pais reparam que osfilhos começam a apresentarsinais de autismo por volta dos18 meses — recolhem-se em simesmos, regridem na aquisiçãoda linguagem, adotamcomportamentos repetitivos. A

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correlação entre certas vacinas eo surgimento do autismo é umexemplo de coincidência ou decausalidade? Um estudo de199832 publicado na Lancetapresenta a resposta:causalidade. Segue-se aindignação dos pais,** além deum amplo movimento popularpara persuadir pais a nãovacinar seus filhos. Contudovários estudos complementaresnão conseguiram reproduzir osresultados do estudo de 1998 e,em 2010, depois de umapesquisa do Conselho Geral deMedicina do Reino Unido

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determinando que a pesquisatinha sido malconduzida e eraincorreta, a Lancet retratou-se.33

Fim da história? Nãoexatamente.

Na verdade, sabe-se quealgumas crianças ficam muitodoentes e apresentam sintomasgraves compatíveis com oautismo pouco depois dasvacinações aos 18 meses. Nestescasos raros, o diagnósticocorreto é uma doençamitocondrial. O núcleo dacélula guarda os cromossomos;é onde nossos genes estão

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codificados. Mas, fora donúcleo, no citoplasma da célula,ficam as organelas (a palavravem da ideia de que organelassão para as células o que osórgãos são para o organismo), ealgumas destas organelas sãomitocôndrias. Seu propósito épegar as substâncias químicasdo corpo e convertê-las emenergia utilizável. Asmitocôndrias têm seu próprioDNA, separado do DNA doscromossomos. E assim como oDNA nos cromossomos, o DNAmitocondrial pode sofrermutações. Em alguns casos, as

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vacinas e o surgimento dossintomas podem estar realmenterelacionados. Alguns sintomaspodem ser relativamentemoderados, alguns podemameaçar a vida e outros podemincluir perda de coordenaçãomuscular, problemas visuais eauditivos, incapacidade deaprendizagem, transtornosgastrintestinais, problemasneurológicos. Todos estessintomas são parte da doençamitocondrial, e todos seriamcompatíveis com o autismo.

“As pesquisas nesta área sãointensas”, disse G. Bradley

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Schaefer, neurogeneticista doInstituto de Pesquisa doHospital Infantil de Arkansas eprincipal autor das diretrizes de2008 para testes genéticos emcrianças para o AmericanCollege of Medical Genetics.“Mas não sabemos o suficientepara tirar conclusões.” Aatualização das diretrizes em2013 não estava disponívelquando este livro foi escrito,mas Schaefer as resumiu ementrevista para o livro: “Há aquestão sobre a influênciamitocondrial no autismo, hápesquisas a respeito, há casos

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claramente anedóticos — masno momento nãorecomendamos testes de rotinadevido à falta de evidênciasobjetivas suficientes.” (Alémdisso, os testes são caros edifíceis, e em geral exigem umabiopsia do músculo.)

Um exemplo talvez maisconvincente da predisposiçãogenética seja o gene DRD4, quecodifica um receptor que regulao nível de dopamina nocérebro.34 Algumas pessoaspossuem uma variante do geneDRD4 chamada DRD4-7R, o7R significando “alelo de sete

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repetições”, o que quer dizerque a sequência dosnucleotídeos se repete setevezes. Os cérebros das pessoascom a versão 7R do gene DRD4são menos sensíveis à dopamina— um neurotransmissor queafeta processos cerebrais queenvolvem movimento, respostaemocional e a capacidade desentir prazer e dor —, o que oscoloca em risco paratranstornos de atenção econduta.35 Por isso, a versão 7Rdo DRD4 é chamada o geneliberal ou o gene da bebida.

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Num nível mais clínico (elinguisticamente mais bondoso),diversos estudos vincularam estealelo à ansiedade, depressão,epilepsia, dislexia, transtornodo déficit de atenção comhiperatividade, enxaqueca,comportamento obsessivo-compulsivo e autismo. Porexemplo, um estudo publicadoem 2010 relatou diversasassociações entre criançasautistas com a variante 7R eseus pais.36

Crianças com a variante 7Rcom ao menos um dos pais

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com a mesma varianteeram significativamentemais propensas aapresentar tiques nervososque aquelas cujos pais nãotinham a variante 7R.Se o pai tinha a variante7R, a criança com a mesmavariante tinha maispropensão a apresentarcomportamento compatívelcom transtorno obsessivo-compulsivo e tique grave.Se a mãe tinha a variante7R, a criança com a mesmavariante tinha maisprobabilidade de apresentar

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comportamento compatívelcom transtorno de oposiçãoe desafio e transtorno deansiedade social.

Há algum tempo oscientistas sabem que criançascom a versão 7R do DRD4(além de outros genes “derisco”, como o MAOA e oASERT) são vulneráveis ainfluências negativas doambiente — como paisviolentos ou indiferentes, porexemplo. Essas influênciasnegativas podem produzirversões mais graves de qualquer

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comportamento já manifestadopela criança. Por isso, há muitotempo os cientistas considerama versão 7R o “gene pôster” dosgenes que interagem com umambiente negativo na criação deum comportamento negativo.Daí seu apelido: vulnerabilidadeou gene de risco.

Mas, e quando as criançascom genes de risco recebemapoio dos pais ou têm vidasfamiliares saudáveis, em vez deambientes ruins? As pesquisaseram convincentes em afirmarque os ambientes negativostendiam a levar a

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comportamentos negativos empessoas com esta variação nogene DRD4, porém, e se amesma pesquisa apresentassedados indicando que ambientespositivos tendiam a levar acomportamentos positivos — e,como os pesquisadorestentavam medir efeitosnegativos, não faziam asperguntas adequadas?

Por sorte, mais tarde outrospesquisadores pensaram em sefazer essa pergunta.37 Quandocomeçaram a observarespecificamente os efeitospositivos — e reanalisaram

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estudos antigos dos efeitosnegativos — perceberam que erapreciso repensar o modo como aciência via essas variaçõesgenéticas. Pessoas com essasvariações nos genes sãosimplesmente mais sensíveis aoambiente — “para o bem oupara o mal”, como afirmou umpesquisador. Pode-se pensarnelas como “criançasorquídeas”,38 porque florescemou murcham facilmente, o quedepende de o ambiente da estufaque habitam ser ou nãofavorável ao crescimento. Emcontraste, as “crianças dente-de-

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leão”, que possuem a versãoregular do gene, não sãoafetadas pelo ambiente.

Com esse novo entendimentode como a versão 7R do DRD4funciona, os geneticistascomeçaram a chamá-lo nãomais de gene de risco, mas degene responsivo. A natureza ofez neutro. O ambiente o tornanegativo ou positivo.

Pode-se indagar se estainterpretação significa que LeoKanner estava certo quanto àinfluência negativa da criaçãonegativa. Nem tanto. Ele sebaseou na correspondência um-

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para-um entre o genitorgeladeira e o autismo nacriança. A versão de BrunoBettelheim para o modelo deKanner ao menos considerou apossibilidade de umcomponente genético — umapredisposição genética aoautismo que precisava de umpai ou mãe violento para semanifestar. Mas nem Kannernem Bettelheim parecem terconsiderado o autismo oresultado de umapredeterminação genética, maisdo que uma predisposição.

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Mas sabem quem o fez?Apesar de todas as associaçõespsicanalíticas desacreditadassubjacentes às suposições ehipóteses de Kanner eBettelheim, a resposta éSigmund Freud — até certoponto.

Freud tinha formação médicaem neurobiologia eneuroanatomia. Ele sempreafirmou que seus conceitospsicanalíticos eram marcadoresde posição, até que a ciênciaencontrasse algo melhor.“Devemos lembrar que todas asnossas ideias provisórias em

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psicologia um dia poderãobasear-se em uma subestruturaorgânica”,39 escreveu Freud em1914. Seis anos mais tarde, eledeu continuidade a essa ideia:“As deficiências da nossadescrição provavelmente seesfumariam se já tivéssemoscondições de substituir ostermos psicológicos por termosfisiológicos ou químicos”,escreveu. “Devemos esperar[que a fisiologia e a química]nos tragam informaçõessurpreendentes e não podemosadivinhar que respostas terãodaqui a dez anos às perguntas

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que fizermos. Elas podem ser detal monta que venham aderrubar toda a nossa estruturaartificial de hipóteses.”40

O mesmo ocorre hoje. Asneuroimagens nos permitemsondar característicasneuroanatômicas e perguntar:como é? E o que ocorre? Agenética nos permitiu começar aresponder à pergunta: como océrebro faz o que faz? Temosdécadas de progresso pelafrente, mas já começamos aencontrar algumas respostas quecompletam a definição doautismo, que hoje se baseia

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exclusivamente na observaçãodo comportamento — ummétodo de diagnóstico que,como veremos no próximocapítulo, tem seus riscos.

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Notas

* No plano individual, o aumento do risco éextremamente baixo. A mudança na taxade incidência só se torna estatisticamentesignificativa com uma amostrapopulacional.

** Pessoalmente, não acho que devemosconsiderar a questão resolvida enquantonão for feito um estudo separando osindivíduos regressivos (as crianças quecomeçam a ter um desenvolvimento normale depois regridem por volta dos 18 meses) eos não regressivos.

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4 Esconde-esconde

Sabe o que odeio? O barulho dosecador de mãos nos banheirospúblicos. Não tanto quando ojato de ar começa, mas nomomento em que as mãos ficamsob o jato. A queda súbita doregistro me deixa louca. É comoo toalete a vácuo nos aviões.Primeiro vem o prelúdio brevecomo uma chuvarada, depois otrovão da sucção. Eu odeioaquilo. Um ódio como o das

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unhas arranhando o quadro-negro.

Sabe o que mais odeio nasviagens de avião? O alarme quesoa quando alguémacidentalmente abre uma portade segurança no aeroporto.Odeio alarmes em geral, dequalquer tipo. Quando eracriança, o sinal da escola medeixava completamente doida.Era como um obturador dedentista. Sem exagero: o somcausava uma sensação dentro domeu crânio como a dor doobturador.

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Você já deve ter notado umpadrão no que odeio. Sousensível aos sons. Sons altos.Sons súbitos. Pior, sons altos esúbitos que não estouesperando. Ainda pior, sonsaltos e súbitos que eu espero,mas não posso controlar —problema comum em pessoascom autismo. Os balões de arme aterrorizavam na infância,porque eu não sabia quandoiam estourar.

Hoje sei que se tivesse sidocapaz de estourar os balões comuma caneta produzindo um somsuave, e depois tivesse tentado

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com balões maiores e sons cadavez mais altos, talvez tivesseconseguido tolerá-los. Ouvimuita gente com autismo dizerque, quando provocam o som, émais fácil tolerá-lo. O mesmoocorre quando sabem de ondevem o som; fogos de artifíciodisparados aleatoriamente pelosgarotos da vizinhança podemser insuportáveis, mas quandosão queimados no parque dacidade como parte de umprograma no feriado sãoaceitáveis. Porém quando eu eracriança via com terror o mesmobalão que extasiava e deixava as

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outras crianças contentes, obalão que elas queriam jogarumas para as outras eimpulsionavam com os dedospara que tocasse no teto. Paramim, ele pairava como umanuvem de dor em potencial.

Os cinco sentidos são comocompreendemos tudo o que nãosomos. Visão, audição, olfato,paladar e tato são as cincomaneiras — as únicas cincomaneiras — como o universopode se comunicar conosco.Deste modo, nossos sentidosdefinem a realidade para cadaum de nós. Quando seus

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sentidos funcionamnormalmente, você pode suporque sua realidade sensorial émuito similar à realidadesensorial de todos aqueles cujossentidos funcionamnormalmente. Afinal, elesevoluíram para captar umarealidade comum — para nospermitir interpretar, do modomais confiável possível, asinformações de quenecessitamos para sobreviver.

Mas e quando seus sentidosnão funcionam normalmente?Não me refiro aos seus globosoculares ou às trompas de

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Eustáquio, aos receptores na sualíngua ou nariz ou à ponta dosseus dedos. Refiro-me aocérebro. E se você receber amesma informação sensorialque os outros, mas seu cérebrointerpretá-la de um mododiferente? Então, suaexperiência do mundo ao redorserá a experiência dos outros,mas talvez de um mododoloroso. Neste caso, você viveliteralmente em uma realidadealternativa — uma realidadesensorialmente alternativa.

Falo sobre problemassensoriais desde que comecei a

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dar palestras sobre autismo, láse vão trinta anos. Neste tempo,encontrei gente cuja audiçãooscila, e neste caso as palavraspodem soar como num celularruim ou como foguetes.Conversei com crianças queodeiam ir para a quadraesportiva por causa do sinal doplacar. Vi crianças que sóconseguem pronunciar sons devogais, talvez por não ouviremas consoantes. Quase todos sãoautistas e, na verdade, cerca denove em dez pessoas comautismo apresentam um ou maistranstornos sensoriais.

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Mas a dor e a confusão nãoafetam só suas vidas. Afetamtambém a vida daqueles a quemamam. Uma criança normal nãotem de ouvir que o irmão ouirmã autista precisa de maisatenção dos pais — que, demuitas formas, o mundofamiliar gira em torno daquelacriança. Para os pais, cuidar deuma criança normal já pode serum trabalho em tempo integral;cuidar de uma criança cujocérebro não tolera o movimentode um adulto andando pelocômodo pode ser um trabalhovitalício. Você não pode levar a

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criança ao shopping, aorestaurante ou ao jogo defutebol do irmão mais velho seela urra de dor o tempo todo.

Além disso, os transtornossensoriais não são um problemasó no autismo. Estudos comcrianças não autistas apontaramque mais da metade tem umsintoma sensorial, que uma decada seis tem um problemasensorial suficientementeimportante para afetar sua vidacotidiana e uma de cada vintedeveria ser formalmentediagnosticada com transtornode processamento sensorial, o

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que significa que os problemassensoriais são crônicos eperturbadores. Eu mesmaobservei em uma aula que dou acada semestre que um ou doisdentre sessenta alunos têmdificuldade para desenhar umsistema de manejo de gado. Elesdesenham linhas imprecisas emvez de curvas suaves. Sei quenão são autistas, nem têmastigmatismo, mas quando lhespergunto o que veem ao olharuma página impressa,respondem que as letras semovem.

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No entanto, o que sabemosda ciência dos problemassensoriais? Surpreendentementepouco. Fiquei surpresa quandocomecei a ler pesquisas sobreproblemas sensoriais.

Em todas as pesquisas sobreo cérebro autista feita porgeneticistas e neurocientistas,apesar dos avanços, fica claroque a questão dos problemassensoriais não é prioritária. Osproblemas sensoriais emautistas são “ubíquos”, comodisse um artigo de 2011 naPediatric Research,1 e aindaassim o tema recebe atenção

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proporcionalmente pequena.Grande parte das pesquisas queencontrei sobre problemassensoriais em autistas deriva deperiódicos sobre temas nãoautistas, e muitos não sãopublicados nos Estados Unidos.Mesmo os artigos sobreproblemas sensoriais dapopulação autista publicadosnos periódicos sobre autismomuitas vezes se queixam daescassez de pesquisas na área.“Há preocupação com a falta depesquisas empíricas sistemáticassobre comportamentossensoriais no TEA e confusão

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quanto à descrição eclassificação dos sintomassensoriais”, escreveram osautores de um estudo de 2009,2e os autores de outro estudodaquele mesmo ano queixaram-se da “escassez deinformação”.3 Em 2011,contribuí para um importantelivro acadêmico sobre autismo.4Mais de quatrocentas páginas.Um total de 81 artigos.Adivinhe. O único artigo sobreproblemas sensoriais era o meu.

Ao longo dos anos, vicentenas ou milhares de artigosde pesquisas sobre se os autistas

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possuem uma teoria da mente— a capacidade de se imaginarobservando o mundo do pontode vista de outrem e de obteruma resposta emocionaladequada. Mas vi muito menosestudos sobre problemassensoriais — provavelmenteporque eles exigiriam que ospesquisadores se imaginassemolhando o mundo do ponto devista da confusão de falhasneuronais dos autistas. Pode-sedizer que eles não têm umateoria do cérebro.

Suspeito que ospesquisadores simplesmente não

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entendem a urgência doproblema. Eles não conseguemimaginar um mundo onderoupas que pinicam o fazemsentir-se pegando fogo, ou ondeuma sirene soa “como sealguém estivesse perfurandomeu crânio com umafuradeira”,5 como alguémdescreveu. A maioria dospesquisadores não consegueimaginar uma vida em que cadasituação nova, ameaçadora ounão, vem com uma descarga deadrenalina, como um estudo6

indica suceder com muitaspessoas com autismo. Porque a

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maioria dos pesquisadores sãopessoas normais, criaturassociais, então, do ponto de vistadeles, faz sentido se preocuparem socializar autistas. E faz, atécerto ponto. Mas comosocializar pessoas que nãotoleram o ambiente onde devemse mostrar sociáveis — que nãotêm prática de reconhecer ossignificados emocionais dasexpressões faciais em ambientessociais porque não podemfrequentar um restaurante?Como outros pesquisadores, osestudiosos do autismo queremresolver os problemas

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causadores de mais danos, masacho que não percebem oquanto a sensibilidade sensorialpode ser prejudicial.

Conversei com pesquisadoresque chegam a dizer que osproblemas sensoriais não sãoreais. É difícil acreditar, eu sei.Eles se denominambehavioristas estritos. Eu oschamo de negadores dabiologia. Digo-lhes queconsiderem esta possibilidade:“Talvez aquela criança estejatendo um ataque no meio doWalmart porque se sente comose estivesse dentro de uma caixa

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de som num concerto de rock.Você também não teria umataque se estivesse dentro deuma caixa de som num concertode rock?” Alguns pesquisadoreschegaram a retrucar: “Se acriança está gritando porque ésensível aos sons, então será quenão é aquele som que aincomoda?” Não se ela forsensível a apenas certos tipos desons. Às vezes o som nãoprecisa nem ser alto paraincomodar.

Nem todas as pessoas comtranstorno sensorial respondemaos estímulos do mesmo modo.

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Já vi crianças gritarem quando aporta do supermercado se abrerapidamente, mas eu própriasempre achei fascinante omovimento das portas. Umacriança gosta de brincar comágua corrente. Outra saicorrendo da descarga sanitária.

E nem todos que sofrem detranstornos sensoriais os têm nomesmo grau. Aprendi a convivercom o som das mãos sob o jatode ar do secador e os alarmesdas portas dos aeroportos. Paraalgumas pessoas, no entanto, osproblemas sensoriais causamtranstornos. Elas não

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conseguem conviver emambientes normais, comoescritórios e restaurantes. A dore a confusão definem suas vidas.

Mas, independente dosproblemas sensoriais, eles sãoreais, comuns e exigem atenção.Eu lhes dei atenção — e o queencontrei me deixou surpresa,chocada e, inclusive, me levou aquestionar alguns pressupostosbásicos do próprio autismo.

Embora os especialistas emautismo tenham, em grandemedida, desprezado osproblemas sensoriais como

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objeto de estudo, o fato é quenão se pode estudar o autismosem buscar um modo decategorizar as questõessensoriais. Eu mesma aceitei hámuito tempo o modotradicional de classificar aspessoas autistas com problemasde processamento sensorial emtrês categorias ou subtipos:

Busca sensorial. Estacategoria cobre problemasque surgem quando oautista busca sensações.Claro, todos buscamossensações o tempo todo.

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Qual será o gosto daquelebolo? Como será usaraquela camisa de linho?Posso ouvir o que aspessoas atrás de mim noônibus estão dizendo? Masos autistas com problemassensoriais tendem a buscaressas sensações o tempotodo. Não se fartam delas.Podem ansiar por ruídosaltos ou, no meu caso,pressão profunda. Muitasvezes elas emulam essassensações embalando-se,girando, batendo palmas oufazendo ruídos.

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As outras duas categorias sãocomo o oposto da primeira. Emvez de buscar sensações, aspessoas nestas categoriasrespondem a sensações nãobuscadas.

Alta responsividadesensorial. Pessoas que sãohipersensíveis aos sentidos.Não suportam o cheiro domolho de macarrão, sentar-se num restaurantebarulhento, usar certostipos de tecidos ouconsumir certas comidas.Baixa responsividade

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sensorial. Pessoas que têmpouca ou nenhuma respostaaos estímulos comuns. Porexemplo, podem nãoresponder aos própriosnomes, mesmo semproblemas de audição, oupodem não reagir à dor.

Estes três subtipos fazemmuito sentido. Nunca pensei emquestioná-los. Vemos autistascom problemas deprocessamento sensorial e oscolocamos em uma ou outracategoria.

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Porém alguns cientistascomeçaram a repensar estascategorias. Em 2010, AlisonLane e três colaboradores daUniversidade de Ohiopublicaram um artigo intitulado“Sensory Processing Subtypes inAutism: Association withAdaptive Behaviors” [Subtiposde processamento sensorial noautismo: associação comcomportamentos adaptativos]7

no Journal of AutismDevelopmental Disorders.(Bom, pensei. Um artigo sobreproblemas sensoriais numperiódico sobre autismo.) Como

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sempre ocorre nos artigos sobreprocessamento sensorial, osautores logo ressaltaram que oassunto era negligenciado:“Poucos estudos tentaraminvestigar a relação entredificuldade de PS[processamento sensorial] e asmanifestações clínicas do TEA.”Em seguida, entraram noassunto.

Os autores coletaram dadosdo modo corrente. Confiaramnos resultados do PerfilSensorial Curto, umaferramenta de pesquisa dos anos1990. Observadores (em geral

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os pais) de pessoas comproblemas sensoriaisselecionam, dentre 38comportamentos, os quedescrevem o comportamento doindivíduo. Estescomportamentos correspondema sete domínios sensoriais:sensibilidade tátil; sensibilidadegustativa/olfativa; sensibilidademotora; baixa resposta/busca desensações; filtro auditivo; baixaenergia/fraqueza; sensibilidadevisual/auditiva. Um indicadorde sensibilidade tátil, porexemplo, era “Reage emocionalou agressivamente ao toque”.

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Um item que indicavasensibilidade motora era “Temecair ou tem medo de altura”.No item filtro auditivo: “Édistraído ou tem dificuldade defazer as coisas com muito ruídoà sua volta.”

Depois de coletar os dadoscomuns, contudo, Lane e seuscolaboradores os submeteram aum modelo diferente de análiseestatística e descobriram trêscategorias ligeiramentedistintas. Não preciso entrar emdetalhes sobre sua metodologia;você pode procurá-la caso esteja

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interessado. Em resumo, asnovas categorias são:

Busca sensorial levando acomportamento distraídoou hiperfocado.Modulação sensorial (baixaou alta responsividade)com sensibilidade motora ebaixo tônus muscular.Modulação sensorial (baixaou alta responsividade)com extrema sensibilidadegustativa/olfativa.

A princípio estas categoriastambém fazem muito sentido.

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Extrema sensibilidadegustativa/olfativa? Nunca penseique ela estivesse separada deoutros problemas sensoriais,mas claro, entendo a utilidadede criar esta categoria. Baixotônus muscular? Certamenteconheci vários autistas commembros débeis e pele pastosa.“[Este] subgrupo éparticularmente importantepara os terapeutas físicos”, dizum artigo de 20118 na PhysicalTherapy baseado na pesquisa deLane. “Crianças com TEA comsensibilidade motora atípica emgeral são hiper-responsivas a

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estímulos proprioceptivos evestibulares” —respectivamente, a sensação decomo as partes do corpotrabalham em conjunto e osentido do equilíbrio —, “aopasso que crianças com baixaenergia e baixa reação motorapossuem má coordenaçãomotora fina e grossa”.

Ainda assim, a ideia de usaros mesmos dados para criarduas formas diferentes deorganização — dois conjuntosdistintos de categorias — aindame incomodava. Os dois modosseriam válidos? Nenhum dos

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dois seria válido? O que essascategorias nos diziam?

Por fim, entendi: o problemanão é o modo como seinterpreta os dados. Oproblema são os própriosdados.

Os estudos sobre problemassensoriais graves baseiam-se notestemunho dos pais oucuidadores. As conclusõesdependem da metodologia dospesquisadores. Mas por quedeveríamos supor que asinterpretações refletem o queacontece com os indivíduos?Alguém que não consegue

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imaginar o que é viver nummundo de sobrecarga sensorialprovavelmente vai subestimar agravidade das sensações alheiase o impacto na vida da pessoa epode interpretar ocomportamento como sinal deum problema sensorial, quandopode ser outro.

Se os pesquisadores queremsaber como é ser uma dasmuitas e muitas pessoas quevivem em uma realidadesensorial paralela, eles precisamperguntar a elas.

Pesquisadores costumammenosprezar o relato dessas

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pessoas por pensarem que nãose presta à verificação científicapor ser subjetivo. Mas essa é aquestão. A observação objetivado comportamento podefornecer informaçõesimportantes. Mas só a pessoacom sobrecarga sensorial podedizer o que isso realmenterepresenta. Em um livroanterior tentei descrever meusproblemas sensoriais e outrosautistas altamente funcionaistambém foram capazes dedescrever o impacto dosproblemas sensoriais em suasvidas. Mas e quem tem

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problemas sensoriais muitomais graves e debilitantes?

O problema de eliciar relatosnesta população é óbvio. Se umproblema sensorial desorganizacompletamente o modo depensar da pessoa, ela terádificuldades em descrever oproblema. Se ela for não verbal,deve-se usar outro meio deexpressão, como digitar ouapontar. Nos casos maisextremos, porém, até isso seriairreal. Por sorte, a escrita depróprio punho produzinformação confiável; ofacilitador pode mover a mão

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sem perceber, como numtabuleiro Ouija.

É importante superar osproblemas inerentes à coleta derelatos. Se os pesquisadores sóobtiverem relatos sobrequestões sensoriais de adultosaltamente funcionais, estes nãoserão representativos. Osproblemas sensoriais podem serpiores nos níveis mais baixos defuncionamento; podem até ser acausa dos baixos níveis defuncionamento. Por isso, umestudo que cite apenas autistasde alto funcionamentoapresentará uma visão

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tremendamente oblíqua dapopulação. E tem mais: naidade adulta a pessoa podedesenvolver mecanismos paralidar com isso que disfarcem agravidade dos seus problemassensoriais e podem não refletir arealidade do problemavivenciado por uma criançaassustada.

Espero que algumastecnologias novas possamaumentar a incidência derelatos. Os tablets, porexemplo, têm uma enormevantagem sobre oscomputadores comuns, e até

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mesmo os notebooks: não épreciso tirar os olhos da tela.Em geral, digitar é um processode dois passos. Primeiro olha-separa o teclado; depois para atela, para ver o que foi digitado.Isso pode ser demais paraalguém com problemascognitivos agudos. Antes dostablets, um terapeuta montava oteclado de um notebook numacaixa, para que ficasse logoabaixo do que aparecia na tela.Nos tablets, porém, o teclado éparte da tela, então osmovimentos oculares do tecladopara as letras digitadas são

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mínimos. Causa e efeitoadquirem uma correlação muitomais clara. Esta diferença podeser importante ao permitir quepessoas com problemassensoriais graves nos digamcomo é isto para elas.

No livro How Can I Talk IfMy Lips Don’t Move? InsideMy Autistic Mind [Como possofalar se meus lábios não semovem? Por dentro de minhamente autista],9 Tito RajarshiMukhopadhyay descreve sualibertação de uma existênciatrancada no autismo. Elaocorreu na forma de uma

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tabuleta repleta de letras enúmeros que a mãe deu a eleantes dos 4 anos, no início dosanos 1990. Com a ajuda dela,ele aprendeu matemática e asoletrar. Mais tarde, a mãeamarrou uma caneta na suamão para que ele pudesse secomunicar pela escrita. Aolongo dos anos, Tito publicoudiversos livros em que descrevecomo vivencia sua realidade emduas partes: um “eu atuante” eum “eu pensante”. Há poucotempo reli seus livros e lembreide quando o conheci. Pudeentender que, embora não

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percebesse isso à época, eu tinhavisto estes eu atuante e eupensante numa rápida sucessão.

Conheci Tito numabiblioteca médica em SanFrancisco. A luz era suave; se abiblioteca tinha luzesfluorescentes, tinham sidodesligadas antes da nossa visita.A sala estava silenciosa, aatmosfera, serena — livre dedistrações. A conversa foi entremim, Tito e seu teclado.

Mostrei-lhe a foto de umastronauta montado numcavalo. Escolheradeliberadamente uma imagem

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que ele nunca tivesse visto, oanúncio de uma empresa detecnologia num exemplar antigoda Scientific American queencontrara numa prateleira.Queria ver como ele seexpressava com as palavras.Estudou a foto e depois se viroupara o teclado.

Apollo 11 a cavalo, escreveurapidamente.

Depois, correu pelabiblioteca batendo os braços.

Quando voltou para oteclado, mostrei-lhe a foto deuma vaca.

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Não as comemos na Índia,escreveu.* Então, correu pelabiblioteca batendo os braços.

Fiz outra pergunta, nãolembro qual. Pode-se imaginar oque aconteceu depois. Titorespondeu e correu pelabiblioteca batendo os braços.

Isso foi tudo. Ele já haviaescrito tudo o que conseguiaescrever em uma sessão.Precisava descansar, poisresponder três perguntas curtaslhe exigia um esforço tremendo.

Agora sei que o quetestemunhei foi o eu atuante deTito em movimento, o eu que o

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mundo externo vê: um meninoque gira, se agita e bate osbraços. Que é também o eu queTito vê.

No livro, ele descreve o seueu atuante como “estranho echeio de energia”. Ele se viacomo peças, “como uma mãoou uma perna” e disse que giraem círculos para poder “juntaras partes no todo”. Lembrouque se olhara no espelhotentando forçar os lábios a semover. “A sua imagem apenas oolhava de volta”, escreveu Tito,adotando o ponto de vista daterceira pessoa e sublinhando a

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desconexão entre o seu euatuante e o seu eu pensante.

Aquele eu, o pensante, estava“cheio de aprendizados esentimentos”. E frustrações. Elese lembrava de um médico quetinha dito aos seus pais que Titonão entendia o que ocorria àsua volta e a resposta não ditado seu eu pensante: “‘Entendoperfeitamente’, disse o espíritono menino.”

O eu atuante corre pelabiblioteca batendo os braços. Oeu pensante observa o atuantecorrer pela biblioteca batendoos braços.

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Para mim, a ideia de dois eusé reforçada pelo que CarlyFleischmann descreveu em seulivro de 2012, Carly’s Voice:Breaking Through Autism [Avoz de Carly: rompendo oautismo],10 que ela escreveucom o pai, Arthur Fleischmann.Nos seus dez primeiros anos devida, Carly parecia ser umaautista não verbal. Então, umdia ela surpreendeu os pais ecuidadores quando, de repente,usou o teclado do seudispositivo de transmissão devoz. Antes daquela tardemarcante, ela usava o

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dispositivo para uma coisa:tocava na figura de um objetoou atividade e a voz eletrônicadizia as palavrascorrespondentes. Na verdade,naquela tarde um dos terapeutastinha apagado itens dodispositivo para liberarmemória, e chegara a pensar emapagar toda a função doalfabeto. Felizmente, nãochegou a fazê-lo.

Naquele dia, quando Carlychegou para a aula, estavaincomumente irrequieta e mal-humorada e não queriacooperar. “O que você quer?”,

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perguntou o terapeutaexasperado, como se Carly fossecapaz de responder. E era! Carlypegou o dispositivo detransmissão de voz. “A-J-U-D-A-D-E-N-T-E-D-Ó-I”, escreveulaboriosamente.

Carly tinha umafuncionalidade bastante baixa.Como Tito, o seu eu atuanteestava em movimentopermanente, sentava-se e seembalava, gritava e tentavadestruir tudo à sua volta. ComoTito, o seu eu pensante captavamuito mais informações do queera possível imaginar. Em

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alguns níveis, sua vida interiorera surpreendentemente normal.Ao entrar na adolescênciadesenvolveu o que se podechamar de interesses típicos deadolescentes. Tinha fixação emJustin Timberlake e Brad Pitt.Quando ela aparecia numprograma de TV, não tirava osolhos dos câmeras bonitos.Contudo, em outros planos, suavida interior era complicada deum modo que só ela sabia.

Numa cena particularmenteimpressionante de Carly’sVoice, ela convida o leitor aimaginar uma conversa numa

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cafeteria. Se for como a maioriadas pessoas, você se imaginarásentado à mesa diante dealguém que fala com você, e seimaginará ouvindo atentamente.

Carly não.

Para mim, trata-se de algototalmente diferente. A mulher quepassa pela nossa mesa deixa umodor de perfume fortíssimo e o meufoco muda. Então, por cima do meuombro esquerdo escuto a conversada mesa de trás. O lado áspero daabotoadura da minha mangaesquerda roça no meu corpo paracima e para baixo. Isto começa achamar minha atenção, enquanto osussurro e o chiado da cafeteira semisturam aos outros sons à minhavolta. O visual da porta abrindo e

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fechando na frente da loja meconsome por completo. Perdi o fio daconversa e não escutei quase nadado que a pessoa à minha frentefalou... Percebo que escuto apenas omundo estranho.

A esta altura da conversacondenada ao fracasso, dizCarly, ela se comportaria dedois modos possíveis. Fecha-se ese alheia ou tem um ataque deraiva.

Que interessante, pensei aoler este trecho. Imagine quevocê é a pessoa sentada diantedela e precisa descrever seucomportamento para o perfilsensorial. Se Carly se fechar —

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se parecer que não escuta,embora você esteja sentadodiante dela, falando diretamentecom ela — você a categorizarácomo de baixa responsividade.Porém, se ela tiver um ataquede raiva — se, como ela disse,começar “a rir ou chorar, seenfezar e gritar sem motivoaparente” —, você acategorizaria como tendo altaresponsividade.

Dois comportamentosdiferentes, dois subtipos deperfis sensoriais diferentes — aomenos é o que pareceria aalguém sentado diante dela e

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que a visse de fora. Mas se vocêfosse Carly, vivendo sua vida dedentro, as duas reações teriam amesma causa: sobrecargasensorial. Informação demais.

Tito apresentou um cenárioparecido em seu livro.Descreveu como é entrar em umcômodo desconhecido: ele olhaem volta e gira por diferentespartes do ambiente atéencontrar um objeto que odeixa intrigado.

“A primeira coisa que vejo éa cor”, escreveu. “Se não entrarnuma reflexão profunda sobre acor definindo-a como ‘amarelo’

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e listar mentalmente todas ascoisas amarelas que conheço,incluindo uma das minhas bolasde tênis amarelas quando eutinha 7 anos de idade, eu mudopara a forma do objeto”. Oobjeto tem uma dobradiça, queele pode ou não notar. Caso anote:

Posso ser distraído pelas funções dasalavancas. Porém desvio a atençãodali e penso na função daquelegrande objeto retangular amarelo,com alavancas de primeirachamadas dobradiças.

Por que aquele grande objetoamarelo retangular com dobradiçasestá ali?, me pergunto. “Ele mepermitiu entrar na sala, e pode ser

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aberto ou fechado. O que mais podeser, senão uma porta?” A minhaclassificação se completa.

Depois, ele se dirige aopróximo objeto na sala.

Tito também conta quevisitou uma casa e seconcentrou numa revista.Adorou tocar e folhear “aquelaspáginas suaves e brilhantes”, eadorou cheirá-las. Só depois,quando sua mãe conversousobre a visita e mencionou asrosas cor-de-rosa nas cortinasde renda, o piano e uma fotonuma moldura de prata, Titopercebeu que estivera tão

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absorto com a revista que nãovira nada mais no aposento.

De fora, os comportamentosnas duas situações pareceriamdistintos. Parado, com o olharfixo na porta, Tito pareceriadistraído, alheio. Cheirando arevista, parecia estar muitofocado, envolvido demais. Mas,assim como ocorreu com Carlyna cafeteria, embora oscomportamentos observáveissejam diferentes, os sentimentosde ambos eram os mesmos.

Estes relatos reforçam minhaantiga hipótese de que algunsautistas não verbais podem

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estar muito mais ligados aomundo do que aparentam. Elessimplesmente vivem tamanhaconfusão de sensações que nãoconseguem experimentar omundo exterior de modoprodutivo, muito menosexpressar sua relação com ele.

Mas estes relatos tambémdemonstram que Tito e Carlyobservam seus próprioscomportamentos tão de pertoquanto seus pais e cuidadoresou um pesquisador. À diferençados observadores externos, elespodem nos dizer o querealmente significa seu

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comportamento. A diferençaentre a visão do observador e aexperiência do indivíduo —entre o eu atuante e o pensante— é a mesma que há entre oque os problemas sensoriaisparecem ser e como sãosentidos.

Perguntei a mim mesmasobre minha experiência comdificuldade auditiva na infância,quando tentava entender obalbucio das vozes dos adultos,que falavam rápido demais paraque eu pudesse acompanhá-los.Minha audição tinha doisajustes: Desligada e Que Entrem

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Todos os Estímulos. Às vezes,eu me fechava e bloqueava osestímulos. Outras vezes tinhaataques de raiva. Doiscomportamentos, umsentimento.

No artigo “SensoryProcessing Subtypes”mencionado anteriormente —que sugere outro modo deorganização dos problemassensoriais — os autoresobservaram que a baixaresponsividade e a altaresponsividade podiam“coexistir” na mesma criança.Com base nestes exemplos, eu

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iria mais longe. Seresponsividade se refere àresposta visível que os pais oucuidadores ou pesquisadoresobservam, tudo bem — vocêpode fazer uma distinção. Doponto de vista externo, acriança responde muito ounada, está distraída ou focadademais. O eu atuante apresentadois tipos de comportamento.Mas, se responsividade se refereao que experimenta o eupensante com problemassensoriais, então a distinção nãofaz sentido. A baixa ou altaresponsividade, o alheamento

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ou a concentração podem ser amesma coisa.

Isso tem realmente algumfundamento? Acho que sim.

Em várias descrições emrelatos pessoais online encontreievidências curiosas que seassemelhavam às de Carly.

“Quando muita gente falaao mesmo tempo ao meuredor, como num pub, mesinto agoniada e começo aficar alheia a tudo e nãoconsigo entender o queacontece.”“Simplesmente me fecho e

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não consigo sentir nemreagir, então em geralpermaneço sentadaabsolutamente imóvel eolho fixamente para algo.Às vezes minha mente estáa mil e é muito difícil detê-la.”“Só preciso sentarcalmamente e recuperar ofoco.”“Muitas vezes ficocatatônica, com umaexpressão estoica.”“Meus olhos tentam seguirtodos os movimentos quepercebem. Isto é parte do

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que destrói o contato visuale me faz parecer muitodesatento.”

E quanto ao apoio científico?Encontrei dois artigos comhipóteses de que tanto aausência quanto o excesso defoco eram fruto do excesso deestímulos. Um artigo publicadona Frontiers of Neuroscience em200711 propôs que os autistascom problemas sensoriaissofriam do que os autoresdenominaram “síndrome domundo intenso”. Os autoresescreveram que “o excesso de

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processamento neuronal podetornar o mundo dolorosamenteintenso”. Ao qual a resposta docérebro pode ser “fecharrapidamente o indivíduo em umpequeno repertório paraassegurar rotinascomportamentais repetidasobsessivamente”. Segundo outroartigo, publicado naNeuroscience and BehavioralReviews, em 2009, as pessoascom autismo podem estarvivendo o que os autoreschamaram “um mundo quemuda rápido demais”.12 Nãoconseguem acompanhar o que

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ocorre à sua volta, então serecolhem.

De qualquer modo, a liçãonão é que alguns autistasrecebem informação demais e,portanto, são responsivosdemais, ao passo que outrosrecebem informação de menose, portanto, não são responsivoso suficiente. A lição é que se seucérebro recebe informaçõessensoriais demais, o seu euatuante pode facilmente parecernão responsivo, mas o seu eupensante se sente oprimido.

O artigo que mencionei,“World Changing Too Fast” [O

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mundo está mudando rápidodemais], trazia diversosexemplos da vida real deadultos com autismo, inclusiveum de minha autoria. Afirmeique o sintoma autista comumde evitar o contato visual “podenão ser nada além deintolerância ao movimento dosolhos da outra pessoa”.Perguntei a crianças: “Por quevocê olha pelo canto do olho?”,e elas responderam: “Porqueassim vejo melhor.” Não seicomo elas podem ver melhorassim. Porque o mundo se moverápido demais um olhar de

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esguelha torna o movimentomenos opressor? Talvez. Gostodesta hipótese, mas sem maispesquisas ela é apenas isso —uma hipótese.

Para outras pessoas autistas,eu mesma sou acusada demover-me rápido demais.Daniel Temmet escreveu quequando nos conhecemos eu oquestionei rápido demais: “Elafalava muito rápido e eu tinhadificuldade em entendê-la.” Aautora autista Donna Williamsescreveu que “a mudançaconstante da maior parte dascoisas não me dava chance de

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me preparar para elas”. É porisso, disse, que sempre gostouda expressão “Pare o mundoque eu quero descer”.

Se não for para pará-lo, aomenos para diminuir suavelocidade. “O estresse detentar alcançar e acompanhar”,escreveu Williams, “muitasvezes era demasiado e me viatentando diminuir a velocidadedas coisas e dar uma pausa.”Ela desenvolveu uma maneirade diminuir a velocidade domundo piscando rapidamenteou acendendo e apagando a luz:“Quando piscava bem rápido,

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as pessoas se moviam quadro aquadro como nos filmesantigos, como no efeito da luzestroboscópica, sem que ocontrole saísse das minhasmãos.” Uma frase de J. G. T.van Dalen, um adulto comautismo moderado, foi citadano artigo “World Changing TooFast” quando disse que era“obrigado a digerir cada objetopedaço por pedaço”. Para ele,este período de focoextraordinário não era normal.“O tempo parece fluirrapidamente”, disse. Para umobservador, tampouco parecia

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normal. A diferença, disse ele,era que “uma pessoa não autistame vê vivendo lentamente”.

Em todos estes casos, apessoa atuante olhavalentamente para o observador.Mas a pessoa pensante sentia ooposto.

A ideia de que a hiper-reatividade e a hiporreatividadeseriam dois lados da mesmamoeda traz diversas implicaçõesimportantes.

Uma é farmacológica. “Amaior parte [dos] medicamentosreceitados [tenta] aumentar ofuncionamento neuronal e

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cognitivo, mas concluímos queo cérebro precisa seracalmado”, escreveram osautores de “Intense World” e“as funções cognitivas precisamser diminuídas para reinstaurara funcionalidade adequada.”Por experiência própria, vi quequando tomava antidepressivospara controlar a ansiedade —antidepressivos antigos comoZoloft e Prozac —, eles meacalmavam e eu podia aprendercomportamentos sociais.Estudos demonstraram queembora a risperidona (nome demarca Risperdal), uma droga

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antipsicótica, não afetediretamente o déficit central daincapacidade social, ela reduz airritabilidade que causa aagressão. Mas acho que pode,indiretamente, ajudar também asuperar a disfunção social,porque se você consegue lidarcom os comportamentosinadaptados, ao menos tem achance de participar do mundode um modo mais produtivosocialmente.** (Como sempreocorre com os remédios tarjapreta, não faça nada semconsultar seu médico. E oremédio deve ser tomado com

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cautela; as crianças,especialmente, às vezes recebemsuperdosagens.)

A outra implicação éeducacional. Um sintomacomum entre autistas é asuposta incapacidade decompreender as expressõesfaciais. Contudo uma série deestudos nos anos 1990demonstrou que crianças comTEA que viam expressões faciaisapresentadas lentamente emvídeo as entendiam tão bemquanto crianças neurotípicas damesma idade dedesenvolvimento. Os autores de

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“World Changing Too Fast”desenvolveram um software quediminuía a velocidade naapresentação de estímulosvisuais e auditivos. Quandoindivíduos com TEA eramexpostos àqueles gestos e sons,começavam a imitá-los, aopasso que indivíduos normaisnão respondiam assim porquefazia muito tempo haviaminternalizado aquelescomportamentos. De igualmaneira, ao diminuir avelocidade das frasesenunciadas, os pesquisadoresdescobriram que os indivíduos

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com TEA compreendiam muitomelhor seu significado.

A ideia de que a hiper-reatividade e a hiporreatividadesão variações do mesmo temapode ter implicações até para ateoria da mente. O artigo“Intense World” propôs que sea amígdala, que é associada àsrespostas emocionais, inclusiveo medo, é afetada pelasobrecarga sensorial, certasrespostas que parecemantissociais na verdade não oseriam. “As interações sociaisdiminuídas e o recolhimentopodem não ser resultado de

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falta de compaixão,incapacidade de se colocar naposição de outrem ou falta desentimentos, mas, pelocontrário, podem resultar de umambiente percebido de modointenso e até doloroso.”Comportamentos que parecemantissociais para quem está defora podem, na verdade, seruma expressão de medo.

Como agora dividir osproblemas sensoriais em trêssubtipos me parece umaestratégia falível, vou fazer oque sempre faço quando não seio suficiente sobre algo. Vou me

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perguntar o que eu sei? O quesei sobre problemas sensoriais éque temos cinco sentidos.Então, vou organizar minhadiscussão de acordo com cadaum deles. (Para identificar ossintomas e dicas práticas paraaliviá-los, veja o quadro nofinal do capítulo.)

Problemas deprocessamento visual

Meu processamento visual é, nomínimo, superior ao de outraspessoas, embora eu não saiba seisso se deve ao funcionamento

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dos meus olhos ou à maneiracomo meu cérebro interpreta ossinais enviados pelos olhos. Dequalquer modo, posso dizerque, aos 65 anos, leio o jornalsem óculos (embora cardápiosem restaurantes escuros ecartões de visita com letrasmiúdas comecem a me dar certotrabalho). Quando me entedionuma conferência, distraio-meolhando as fibras do carpete.Minha visão noturna é tão boaque às vezes me esqueço deacender os faróis.

Isso não significa que nãotenha certa sensibilidade

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visual.13 Quando me canso vejoum halo em volta da luz doposte ou chuvisco na tela decomputador, como nostelevisores antigos. Quandotroco de pista na estrada,preciso estar bem segura dedeixar espaço suficiente. Odeioquando o médico me pede paramanter a cabeça imóvel e seguirum ponto com os olhos. Osterapeutas dizem que meusolhos saltam e não acompanhoos movimentos de modo suave.

No outro extremo estãoproblemas visuais como o tipoque a autora autista Donna

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Williams descreveu: “A refraçãoda luz, i.e., o brilho, é umequivalente visual dareverberação do ruído e fonteimportante de sobrecargavisual. Para alguém sensível aestas coisas, o brilho, ou arefração da luz, pode provocaro efeito visual de disparos decorrentes ou lampejos de luz.Isto distrai a atenção de outrascoisas, mas este brilho tambémpode ter o efeito visual decortar pessoas ou objetos.”14

Thomas McKean, autista,descreveu esta síndrome comovisão de Picasso, dizendo que

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era como “olhar através devidro quebrado ou um espelhorachado”.15

No dia a dia, costumoconhecer alunos com síndromede Irlen — assim batizada porcausa de Helen Irlen, terapeutaamericana que descobriu quecertos problemas de escrita eleitura podem diminuir ou sereliminados com o uso de lentesou papéis coloridos.*** A ideiaé que o papel brancosobrecarrega um sistema visualsensível à luminosidade, aopasso que as ondas de luz no

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papel ou lentes coloridos aamenizam.

Um caso brando de síndromede Irlen — por exemplo, asletras na página saltam umpouco com o cansaço — nãoafeta o desempenho acadêmico.Lentes coloridas podem ajudar atensão ocular, do mesmo modoque reduzir o contraste no leitorde livros eletrônicos. Mas hácasos graves em que a síndromede Irlen definitivamenteinterfere com o trabalho escolar— a pintura fica imprecisa, aspalavras se mexem, as linhas

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desaparecem — e os papéis oulentes coloridas ajudam.

Às vezes vejo alunos lutandocom a tarefa de desenhar. Elespodem apresentar desenhosrepletos de linhas onduladas etremidas no lugar de arcossuaves. Primeiro sugiro que sedirijam ao centro deaconselhamento, mas às vezes,por alguma razão, eles nãoquerem ir. Então, ok. Nessecaso, eu os mando àfotocopiadora para copiarpáginas de um livro e usarpapéis em diferentes tons pastelaté encontrarem o tom que os

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ajude a enxergar melhor. Podeser bege. Pode ser lavanda. Masalguma cor vai funcionarmelhor.

Também os mando àfarmácia para experimentaróculos escuros com lentes decores diferentes, e o mesmoprincípio se aplica aqui: épreciso encontrar a cor certa.“Não compre um que fiquebem”, recomendo, “mas quefuncione”. Um dia, uma alunaque tinha escolhido umas lentesrosadas veio correndo me dizer:“Ah, dra. Grandin, tirei 10 naprova de economia!” Por quê?

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Porque os slides do PowerPointjá não tremiam e por fim elaconseguia ler os números nosgráficos do professor. Sempredigo aos meus alunos que seriaburrice ser reprovado na escolasó porque não usaram papelbege, ou a cor lavanda na telado computador!

Não custa nada experimentaros óculos escuros. Não há nadaa perder e tudo a ganhar.Conheço uma menina de 4 anosde idade que, depois de usar umpar de óculos rosados que seuspais compraram naDisneylândia, em vez de tolerar

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o Walmart por apenas cincominutos, conseguia ficar lá poruma hora. Para os pais fazmuita diferença poder levar osfilhos às compras!

Problemas deprocessamento auditivo

Ao longo dos anos, identifiqueiquatro problemas deprocessamento auditivo maiscomuns:

Input de linguagem. Umtipo de problema de inputde linguagem é não

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conseguir ouvir os sons deconsoantes duras. Nainfância, eu tinhadificuldade em diferenciá-los. Para mim, cat, hat epat soavam iguais, porqueestas consoantes sãorápidas, são pronunciadasrapidamente. Eu tinha deentender o que era o quepensando no sentido dapalavra num contextodeterminado. Estadescrição certamenteencaixa na hipótese doartigo “World ChangingToo Fast” que discuti

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antes. Outro tipo deproblema de input delinguagem é ouvir aspalavras mas não ser capazde associá-las a um sentido,síndrome que DonnaWilliams chama de“cegueira do sentido”.Output de linguagem.Descrevo este problemacomo uma “grandegagueira”. Quando criança,eu entendia as palavras queas pessoas pronunciavamlentamente, mas não eracapaz de produzir minhaprópria fala. A solução

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proposta pela minhaterapeuta da fala foi amesma sugerida em “WorldChanging Too Fast”:diminuir a velocidade.Lentidão na mudança deatenção. Quando um somcapta minha atenção, tenhodificuldade em deixá-lo epassar a outro som. Se umcelular toca quando estoudando uma palestra,atrapalha totalmente meufluxo de pensamentos; eleatrai minha atenção eminha capacidade de voltaré mais lenta que a de outras

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pessoas.Hipersensibilidade ao som.A internet está cheia derelatos de autistas sobreproblemas com todo tipode sons altos e súbitos —estouro de balões, sirenes,fogos de artifício. Masalguns sons problemáticossão considerados maisprosaicos: “Não suporto osom do miojo sendomexido na panela (aquelesom de chapinharhorrível).”16 Às vezes,porém, a hipersensibilidadeenvolve não um som

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específico, mas umariqueza de sons: “Talvezvocê precise pedir à pessoacom quem conversa pararepetir o que disse algumasvezes, porque estavatentando superar o barulhode carros passando, o cãolatindo a três quarteirões eo inseto que zuniu ao ladodo seu ouvido.”17

Embora estes sejam osproblemas auditivos maiscomuns que já encontrei, hámuitos outros, maisespecializados. Por exemplo,

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conheci muitas criançasecolálicas. São crianças quepodem repetir os anúncios daTV palavra por palavra. Suafala funciona, mas elas não têma menor ideia do que aspalavras significam. Muitasvezes, nem compreendem que osignificado está nas palavras,pensam que está no tom da voz.Compare esta síndrome commeu problema infantil decompreender o que as palavrassignificavam, mas comdificuldade de pronunciá-las.Estou trabalhando numaproposta de escaneamento

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cerebral para estudar estes doistipos de síndromes lado a lado.

Seja qual for a forma queadotem, os problemas auditivosparecem ser especialmenteprevalentes entre pessoas comautismo. Um estudo de 200318

comparou a ativação cerebralem resposta a sons semelhantesà fala em cinco autistas e oitoindivíduos do grupo decontrole. Os autistasmostraram, de maneirauniforme, menos ativação dasáreas da fala. Outro estudo de2003 comparou as respostas dequatorze autistas e dez

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indivíduos do grupo de controlea mudanças sutis numasequência de sons repetitivos —denominado campo discrepante(MMF).Magnetoencefalografias (MEG)dos indivíduos do grupo decontrole mostraram de modouniforme que seus cérebrosdetectavam as mudanças, aopasso que as respostas dosindivíduos autistas indicavamque seus cérebros não asdetectavam.19

Só para complicar mais ascoisas, os autistas parecemconfundir estímulos visuais com

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os auditivos. Normalmente,quando uma pessoa ouve, ocórtex visual fica mais lento.Mas um estudo de 2012 comRMNf descobriu que quando osautistas ouvem estímulosauditivos, seu córtex visualpermanece mais ativo que o dosneurotípicos.20 Se for assim,então até quando se esforçampara processar os estímulosauditivos eles são distraídos econfundidos pelos estímulosvisuais.

Mas há esperança, e não sópara os autistas. Pesquisadorescomeçaram a observar o efeito

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terapêutico do canto. Mais deuma vez ouvi pais e professorescontando que ensinaramcrianças a falar por meio docanto e me perguntei se haveriauma base científica para isso.

Nos cérebros sadios, aspartes que parecem estarrelacionadas à linguagem e àmúsica estão em grande medidasobrepostas. Contudo há muitoos pesquisadores observaramque até pacientes autistas nãoverbais tinham forteresponsividade à música.21 Numestudo de 2012 do CentroMédico da Universidade de

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Columbia, em Nova York,supervisionado por Joy Hirsch(mencionado no capítulo 2), 36indivíduos autistas não verbaiscom idades entre 6 e 22 anosforam comparados a 21indivíduos não autistas dogrupo de controle com idadesentre 4 e 18 anos.22 Por meio daRMNf, RMN de conectividadefuncional e ressonância portensor de difusão (ITD), ospesquisadores observaram quedurante o estímulo à fala aativação do giro frontal inferioresquerdo, fortemente associadoà linguagem, era reduzida na

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amostra autista com relação àamostra do grupo de controle.Contudo, com estimulaçãointensa, a ativação da mesmaárea era maior na populaçãoautista que na de controle.

Até recentemente, noentanto, havia muito poucosestudos sobre o uso damusicoterapia em indivíduosautistas — para não falar deestudos da mente sobre o uso damusicoterapia para ajudarautistas não verbais a adquirir afala. Um estudo de 200523

analisou dados de 40 indivíduosautistas entre 2 e 49 anos de

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idade que fizeram musicoterapiadurante dois anos. Todosapresentavam melhora nalinguagem e na comunicação,assim como nas capacidadescomportamental, psicossocial,cognitiva, musical eperceptivo/motora. E os pais ecuidadores dessas quarentapessoas relataram que asmelhoras iam além da música,atingindo outras áreas da vida.

“As intervenções musicaisteoricamente fundamentadastêm sido subutilizadas, o que éuma pena, pois sabe-se que apercepção e a execução musical

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são pontos relativamente fortesde indivíduos com autismo”,concluíram os autores de umestudo de 2010.24 “Nenhumestudo investigousistematicamente a eficácia deintervenções baseadas na músicapara facilitar a fala ou se umprograma intensivo podeprovocar mudanças plásticasnos cérebros desses indivíduos.Com base em pesquisasanteriores e atuais, esperamosque estes tratamentosespecializados para o autismosejam criados num futuropróximo.”

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Um dos autores desse estudo— Catherine Y. Wan, doLaboratório de Música eNeuroimagem do Departamentode Neurologia da Faculdade deMedicina de Harvard — não sósonhava com tratamentosespecializados como seguiu emfrente e criou um. Ele se chamatreinamento para mapeamentoauditivo-motor (AMMT) e foiprojetado para promover aprodução de fala diretamente,treinando os indivíduos aexperimentar a relação entrefalar em tons diferentesenquanto tocam um tambor

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eletrônico afinadoeletronicamente. “O terapeutaapresenta as palavras-alvo oufrases enquanto, ao mesmotempo, entoa as palavras e tocao tambor afinado nos mesmostons”, escreveu Wan numestudo de prova de conceito25

publicado em 2011. O artigorelata que após sessõesindividuais de 45 minutos, cincovezes por semana, durante umperíodo de oito semanas, as seiscrianças não verbais do estudo,com idades entre 5 e 9 anos,apresentaram “melhorassignificativas na capacidade de

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articular palavras e frases, comgeneralização para itens que nãoeram praticados nas sessões deterapia”.

O artigo conclui, de modoprevisível e comovente, que onúmero de intervenções destetipo costuma ser“extremamente limitado”.Então, temos provas científicasconclusivas de que amusicoterapia facilita acomunicação em criançasautistas não verbais? Não. Maseu apostaria que as provascircunstanciais de pais e

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professores que acumulei aolongo dos anos estão corretas.

Sensibilidade tátil

Como alguém que precisouinventar a máquina do abraçopara conter a ansiedade e ascrises de pânico, obviamentetenho um grande problema coma sensibilidade ao toque — eescrevi extensamente sobre issoem outros livros. Mas meusproblemas táteis não acabamaqui. As roupas me deixamlouca se não tiverem a texturacorreta. Tenho um monte de

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camisetas que recebi de presentede participantes das minhaspalestras públicas. Às vezes elassão ásperas, às vezes não, aindaque sejam feitas de 100%algodão e eu as lave paraamaciar as fibras. A diferença,por incrível que pareça, está naurdidura ou no tipo de algodão.

Que outras experiênciastáteis trazem problemas? Vocêvai se surpreender. Eis algunsexemplos do site Wrong Planet(wrongplanet.net) sobresensibilidades autistasrelacionadas ao tato:

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“Eu simplesmente nãosuporto areia molhada. Osferiados na praia eram uminferno para mim.”“Sou absolutamenteincapaz de tocar coisasmacias... ursinhos depelúcia, cobertores maciosdemais etc., principalmentecom as mãos secas. Só depensar fico fora de mim.”(A solução desta pessoateria me deixadocompletamente doida: “ostecidos mais ásperos e coma menor quantidade de fiospossível”.)

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“Areia molhada, cremes etoalhas. Isto é a piorcombinação para mim, queé pele com protetor solarcoberta de areia e esfregadacom a toalha úmida.”“Mangas de roupamolhadas.”“Não aguento a sensaçãodo papel de jornal — écomo se tivesse farpasminúsculas nas pontas dosdedos.”“Esponjas são horríveis,embora, estranhamente, eucostumasse gostar muito decomer esponjas.”

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“Toda vez que visto algomeio apertado sinto comose pequenos insetossubissem pela minha pele.”“Eu ODEIO, ODEIO,ODEIO a sensação e atextura das calças jeans.São tão secas e rugosas.”“Acariciar um cachorrocom as mãos molhadas.”“Vidro que saiu damáquina de lavar louças —ele guincha horrivelmente.”

Sensibilidades olfativa egustativa

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Algumas pessoas simplesmentenão suportam certos odores.Elas avançam pelas gôndolasdos detergentes nosupermercado e sentem-seoprimidas. Meu colaborador,Richard, tem uma amiga quesente dor de cabeça com ocheiro de jornal. Na infância,tinha horror à edição do jornalde domingo por ter muito maispáginas. Hoje, só lê jornaisonline.

Algumas pessoassimplesmente não suportamcertos sabores. Muitas vezes aaversão tem a ver com a

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textura. Eu não gosto de coisascom baba. Clara de ovo crua?Nem pensar. (Embora o quepareça uma sensibilidadegustativa pode, na verdade, serum problema auditivo. Algumaspessoas acham insuportável oruído crocante da batata fritasoando no crânio.)

Como na sensibilidade tátil,a variedade do que provoca issoé surpreendente:

“Qualquer grão oucarboidrato pastoso.”“Refrigerante sem gás —depois de aberto por mais

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de um minuto eu já nãobebo.”“O tempero do taco medeixa tonto.”“Nunca entrei numrestaurante de frutos domar. Só de passar na frentesinto náuseas. Não suportoo cheiro.”

Os pesquisadores podem nãoconfiar nos relatos pessoais,mas eu os considero uma fontevaliosa, não só pela informaçãoque contêm como pela liçãomais abrangente: se você quersaber o que significa um

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sintoma de autismo, precisa iralém do comportamento doautista e entrar no seu cérebro.

Mas espere. O diagnóstico deautismo não se baseia nocomportamento? Nossaabordagem do autismo não éresultado do que se vê de fora(o eu atuante), muito mais doque é a experiência a partir dedentro (o eu pensante)?

Sim, e por isso acho que jáestá na hora de repensar océrebro autista.

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Problemas deprocessamento visual

Como identificar umapessoa com problemas deprocessamento visual:

Mexe os dedos perto dos olhos.Inclina a cabeça para ler ouolha pelo canto do olho.Evita luzes fluorescentes. (Esteproblema é prevalente comluzes fluorescentes que operamem ciclos entre 50 e 60 Hz.)Tem medo de escada rolante;dificuldade de saber como subire descer.Age como um cego em umambiente desconhecido, comoa escada em uma casa

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estranha.As letras dançam quando lê.Tem percepção noturnadeficiente; em geral odeiadirigir à noite.Não gosta de movimentosrápidos; evita portasautomáticas e outras coisas quese movem rapidamente (e/oude maneira inesperada).Não gosta de grandescontrastes de claro e escuro;evita cores fortementecontrastantes.Não gosta de ladrilhosmulticoloridos e nada queforme grades ou quadrículas.

Dicas práticas para pessoascom problemas deprocessamento visual:

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Quando estiver exposto a luzesfluorescentes, use um chapéucom abas, sente-se perto dajanela ou leve sua próprialâmpada incandescenteantiquada.Compre lentes Irlen ouexperimente diferentes óculosde sol com lentes coloridas.Imprima material de leitura empapel bege, azul-claro, cinza,verde-claro ou outro tom pastelpara reduzir o contraste, ou usepelículas coloridastransparentes.Consiga um notebook ou umtablet, em vez dos desktopsantigos com telas que piscam.Tente usar fundos coloridos.

Problemas deprocessamento auditivo

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Como identificar umapessoa com problemas deprocessamento auditivo:

Às vezes parece surda, emborao limiar auditivo seja normal ouquase normal.Não ouve quando há ruído defundo.Tem dificuldade em ouvirconsoantes duras; ouve melhoras vogais.Tapa os ouvidos quando hásons altos.Tem ataques de raivafrequentes em lugaresbarulhentos como estações detrem, estádios esportivos,cinemas.Os ouvidos doem devido acertos sons como alarmes defumaça e de incêndio, fogos de

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artifício, estouro de balões degás.A audição fica interrompida oumuda de volume,especialmente em ambientesmuito estimulantes; os ruídospodem soar como umaconexão ruim de celular.Tem dificuldade em localizar afonte de um ruído.

Dicas práticas para pessoascom problemas deprocessamento auditivo:

Use fones de ouvido em locaisbarulhentos (mas retire-os porpelo menos a metade do dia,para evitar que a audição fiqueainda mais sensível).Grave os sons que ferem osouvidos num gravador e ouça-

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os em volume baixo.Os sons e ruídos altos são maisfacilmente tolerados quando seestá descansado.É mais fácil tolerar sons altosquando você os provoca ouconhece sua origem.

Sensibilidade tátil

Como identificar umapessoa com sensibilidadetátil:

Encolhe-se ao receber o abraçode alguém conhecido.Tira toda a roupa ou só vestecertos artigos (lã e outrostecidos ásperos causam a maiorparte dos problemas).Não tolera certos tecidos etexturas.

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Procura estímulos de muitapressão enfiando-se embaixode travesseiros pesados etapetes, enrolando-se emcobertores ou se espremendoem lugares apertados (porexemplo, entre o colchão e oboxe do colchão).Reage agressivamente ou temuma explosão de raiva quandoé tocada.

Dicas práticas para pessoascom sensibilidade tátil:

Uma forte pressão pode ajudara dessensibilizar o indivíduo;também pode ajudar a ensinarsentimentos de gentileza. Amaioria dos indivíduos comautismo podem serdessensibilizados e tolerar serabraçados se usarem coletes

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pesados, se se enfiaremdebaixo de cobertas pesadasou receberem massagensvigorosas.A sensibilidade às vestimentasásperas é mais difícil dedessensibilizar, mas tente lavaras roupas novas várias vezesantes de deixá-las tocar suapele; remova as etiquetas e usea roupa interior pelo avesso(para manter as costuras longeda pele).A sensibilidade aos examesmédicos às vezes pode diminuircom a aplicação de fortepressão na área a serexaminada.

Sensibilidades olfativa egustativa

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Como identificar umapessoa com sensibilidadeolfativa:

Evita certas substâncias eodores.É atraída por alguns odoresfortes.Tem um ataque de raiva napresença de determinadosodores.

Como identificar umapessoa com sensibilidadegustativa:

Só come certos alimentos.Pode evitar alimentos comdeterminadas texturas.

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Dicas práticas para pessoascom problemas desensibilidades olfativa egustativa:Recorro aqui a uma antiga piada: ohomem entra no consultório médico,ergue a mão acima da cabeça e diz:“Doutor, quando eu faço isso dói!” Eo médico responde: “Bem, então nãofaça!”

É mais ou menos o que tenho adizer sobre essas duas categorias. Senão gosta, não faça! Se o odor queatrai a pessoa é algo vexatório, comoo das fezes, tente substituí-lo por umodor forte e agradável, como mentaou outros usados em aromaterapia.

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Notas

* Note-se que Tito não usava as palavrasastronauta e vaca. Ele entrava pela portados fundos, por assim dizer. Descrevia oobjeto em vez de nomeá-lo.

** Para mais informações sobre este tema,ver o capítulo 6, “Believer in Biochemistry”[Crente na bioquímica], no meu livroThinking in Pictures, e o capítulo 7,“Medications and Biomedical Therapy”[Remédios e terapia biomédica], no meulivro The Way I See It [Da forma que vejo](2ª ed.).

*** Às vezes chamada síndrome de Irlen-Meares. Na mesma época em que HelenIrlen fez sua pesquisa, uma professoraneozelandesa chamada Olive Mearesdescreveu problemas envolvendo a visão deimpressão preta sobre papel branco.

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Parte 2

REPENSAR OCÉREBRO AUTISTA

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5 Olhar para além dosrótulos

Eu estava de olho em Jack. Eletinha 10 anos e só tivera trêsaulas de esqui. Eu estava noensino médio e fazia aulas deesqui havia três anos. Noentanto Jack me ultrapassava napista e executava aquelas lindascurvas e, puxa vida, ele davasaltos de 1 metro comdesenvoltura. Enquanto isso, eucontinuava trabalhando na

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minha única curva boa, e todasas vezes em que tentava dar umsalto eu caía, até ficar commedo de saltar.

O que havia de especial emJack?

No final das contas, nada. Oque havia de especial, naverdade, era eu — eu e meuautismo. Em retrospecto, arelação entre meu desempenhoatlético ruim e o autismo ébastante óbvia. Porém na épocaeu não a via. Só quando jáestava com uns 40 anos e umaressonância mostrou que meucerebelo — a parte do cérebro

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que ajuda a controlar acoordenação motora — é 20%menor que o normal, foi quesomei dois mais dois. Agora euentendia! Eu não conseguiamanter os esquis juntos sem cairporque...

Porque o quê? Porque souautista? Ou porque meucerebelo é pequeno?

Ambas as respostas estãocorretas. Mas qual é a maisútil? Isso depende do que vocêquer saber. Se você procurar umrótulo, algo que ajude aentender quem sou de modogeral, então “porque sou

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autista” talvez baste. Mas sequiser saber como fiqueidaquele jeito em especial — seprocurar a fonte biológica dosintoma —, a melhor resposta,definitivamente, é “porque meucerebelo é pequeno”.

Esta diferença é importante.É a diferença entre diagnóstico ecausa.

Minha pesquisa sobresubtipos de problemassensoriais para o capítuloanterior me fez pensar naslimitações dos rótulos. Percebique dois rótulos diferentes —baixa responsividade ao

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estímulo sensorial e altaresponsividade ao estímulosensorial — podem descrever amesma experiência: informaçãodemais! Os rótulos podem serúteis, mas, como no exemplo doesqui, isso depende do que sequer saber; você quer sabercomo é o comportamento vistode fora? Ou quer saber como aexperiência é percebida dedentro? Quer a descrição de umconjunto de sintomas — umdiagnóstico? Ou a fonte de umsintoma particular — umacausa?

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Toda hora sou procurada porpais que dizem coisas como:“Primeiro, meu filho foidiagnosticado com autismo dealto grau. Depois, foidiagnosticado com transtornodo déficit de atenção comhiperatividade. Depois comAsperger. O que ele tem?”Entendo a frustração deles.Estão à mercê de um sistemamédico repleto de pensadorespresos a rótulos. Mas os paisfazem parte deste sistema. Elesme perguntam: “Qual é a coisamais importante para umacriança autista?” ou “O que

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fazer com uma criança que seporta mal?”. Mas o que issoquer dizer?

Digo que esse tipo depensamento é preso a rótulosporque as pessoas ficam tãopreocupadas com a palavra paraa coisa que já não veem a coisaem si. Encontrei o mesmo tipode pensamento preso a rótulosem outras partes. Um vaqueiroque lera meus livros sobrecomportamento animal medisse: “O meu cachorro émaluco. O que devo fazer?”Bem, primeiro você tem de medizer o que quer dizer com

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maluco ou selvagem em cadacaso. Não tenho ideia, a menosque você me dê uma dica. O cãotenta morder a mão deestranhos? Ou pula nas pessoasporque está muito contente?

Sempre respondo o mesmonesses casos: não se preocupecom o rótulo. Diga-me qual é oproblema. Vamos conversarsobre sintomas específicos.

A primeira pergunta que façoaos pais que me pedemconselhos é: “Que idade tem acriança?” O que possorecomendar para uma criançade 3 anos é totalmente diferente

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do que poderia recomendar paraalguém de 16 anos.

A pergunta seguinte é: “Acriança fala?” Se for não verbal,é uma coisa. É preciso tentarensinar-lhe e ver o que acontece.Se for verbal, digo: “Dê-me umexemplo.” Quero saber se acriança diz frases completas,gramaticalmente corretas. Falausando palavras soltas?Pronuncia as palavrascorretamente ou, como eu fazia,diz buh para bola?

A criança consegue manteruma conversa? Consegue fazerum pedido no balcão da

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lanchonete? Caso contrário, aprimeira coisa a fazer é ensinar-lhe como se comportar, acomeçar por esperar sua vez defalar e dizer “por favor” e“obrigado”.

A criança tem dificuldade emfazer amigos? Está na escola?Tem um assunto predileto?

As perguntas podem semultiplicar infinitamente, claro,como para qualquer pessoa —autista ou não. Todos somosindivíduos, todos temos umasérie de hábitos, capacidades,preferências, limitações. O queseria um cérebro completamente

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normal? Um cérebro médio emtodos os sentidos, com onúmero médio de conexõesneuronais, o tamanho médio daamígdala e do cerebelo, ocomprimento médio do corpocaloso?

Provavelmente ele seriamuito chato.

As diferenças nos tornamindivíduos — a distância danorma, as variações no cérebro.Considere o corpo caloso, acoleção de cabos neurais que sealongam por todo o cérebro econectam os hemisférios direitoe esquerdo. Eu tenho mais

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desses cabos que o normal, masobviamente alguém pode terainda mais do que eu, ou menosdo que eu, ou a quantidadenormal, ou menos que onormal. E o circuito delinguagem do meu cérebroramifica mais do que umcérebro normal, mas,novamente, a extensão que oscircuitos de linguagemramificam existe numcontinuum. O tamanho docerebelo que provavelmenteafeta o modo como esquio —outro continuum. O número devariações nas cópias de novo no

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DNA de alguém? A posiçãoparticular dos CNVs nocromossomo? Continuum econtinuum. Às vezes penso queno futuro nos perguntaremosem que ponto esta ou aquelavariação genética no autismonão será apenas uma variaçãonormal. Tudo no cérebro, nagenética — é tudo um grandecontinuum.

A inclusão da síndrome deAsperger no DSM-IV em 1994validou a ideia de um espectroautista, mas o significado de“espectro” mudou ao longo dotempo. “Nos círculos

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científicos”, um artigo naNature em 20111 informou:“muitos aceitam a ideia de quecertas características autistas —dificuldades sociais, limitaçãode interesses, problemas decomunicação — formam umcontinuum na população emgeral, com o autismo no outroextremo”.

Em outras palavras, você nãoprecisa ter um diagnóstico detranstorno do espectro autistapara estar “no espectro”.

Essa noção foi popularizadapelo psicólogo Simon Baron-Cohen. Em 2001, ele e seus

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colegas do Centro de Pesquisade Autismo da Universidade deCambridge apresentaram oquestionário do quociente doespectro autista, ou quocientede autismo (QA).2 Muitaspessoas respondem o QA onlinesó para saber se estão noespectro. Elas podem seperguntar se têm síndrome deAsperger ou autismo de altofuncionamento. Ou podemquerer saber quaiscaracterísticas possuem que,ampliadas, as classificariamcom um desses rótulos.

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No mínimo, o teste de QAfez muita gente pensar sobre ocomportamento de outro modo— no comportamento dosautistas, certamente, mastambém no dos não autistas.Em seu própriocomportamento. Nocomportamento de um vizinho,de um colega de trabalho, ou deum tio esquisito com suacoleção de selos estranhamentemeticulosa. Comportamentosque antes pareciam peculiares,ou talvez agressivamenteestranhos, começavam a fazersentido.

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O teste consiste emcinquenta afirmações. (Verapêndice.) Para cada afirmaçãohá quatro respostas, que vão de“concordo plenamente” a“discordo plenamente”.Concordar plenamente com aafirmação “Prefiro ir a umabiblioteca que a uma festa”pode indicar que a pessoa temum viés autista. Concordarplenamente com a afirmação“Sou mais atraído para pessoasdo que para coisas” sugere umapessoa mais neurotípica.Quando Baron-Cohen e seuscolaboradores aplicaram o teste

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em um ambiente clínico, apontuação média do grupo decontrole foi 16,4 em 50, aopasso que 80% dosdiagnosticados com autismo outranstornos a ele relacionadospontuaram 32 ou mais. Mas, sepontuar 33, você é autista? Nãonecessariamente. E 36? Ou 39?Qual é a pontuação limite?

Quem pensa de acordo comrótulos quer respostas.

Esse tipo de pensamentopode causar muitos danos. Paraalgumas pessoas, o rótulo podese tornar o que as define. Podefacilmente levar ao que

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denomino uma mentalidadedeficiente. Quando alguémrecebe o diagnóstico desíndrome de Asperger, porexemplo, pode começar apensar Qual é o sentido? OuNunca terei um emprego. Todasua vida começa a girar emtorno do que ela não pode fazer,e não do que ela pode fazer, oupelo menos do que ela podetentar melhorar.

O pensamento preso arótulos também vai na direçãooposta. Você pode estarconfortável com seudiagnóstico, mas se preocupar

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com o que o define aos olhosalheios. O que seu patrão vaipensar? E seus colegas detrabalho? Aqueles que vocêama? A metade dosfuncionários das empresas detecnologia do Vale do Silícioseria diagnosticada comsíndrome de Asperger se fossetestada, o que eles evitam comouma praga bíblica. Estivenaqueles escritórios; vi de pertoaquela força de trabalho.Muitas visitas ao meu site vêmdo Vale do Silício e outras áreascom alta concentração deindústrias de tecnologia. Há uns

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vinte anos, muitas dessaspessoas teriam sidoconsideradas apenassuperdotadas. Agora que existeum diagnóstico, fazem de tudopara não serem colocadas numgueto.

O pensamento preso arótulos pode afetar otratamento. Por exemplo, ouvium médico comentar sobre umacriança com problemasgastrintestinais: “Ah, ele temautismo. Esse é o problema”, e,depois, não tratar o problemagastrintestinal. Isso é absurdo.Só porque esses problemas são

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comuns em pessoas comautismo,3 não significa que nãosejam tratáveis. Se você querajudar uma criança comproblemas gastrintestinais, falesobre sua dieta, não sobre seuautismo.

O pensamento preso arótulos também pode alterar aspesquisas. “Uma das pragasneste campo”, concluiu umestudo sobre a visão noautismo, “é o tamanho dasbarras de erros nos gráficos, quesempre parecem ser pelo menosduas vezes maiores nos dadosdos TEA do que nos dos grupos

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de controle”.4 Barras de errosduas vezes maiores que as dosgrupos de controle? Isso deveriaindicar que há uma enormevariação na amostra — que hásubgrupos na população queprecisam ser identificados eseparados. Se você coloca namesma amostra gente comsíndrome de Irlen e gente queolha pelo canto do olho,termina comparando alhos combugalhos. As barras de errosnão são um problema. São umobstáculo que os pesquisadorescriaram para si mesmos ecolocaram no seu caminho.

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O mesmo ocorre com osestudos que concluem que certassoluções para os problemassensoriais, como coletes pesadosou lentes Irlen, não funcionamem pessoas com autismo. Eu liaestes estudos e disse a mimmesma: Mas se eu vi os coletespesados funcionarem mais deuma vez! Percebi que oproblema da pesquisa é que aspessoas com autismo não têmos mesmos problemassensoriais. Se você tiver vintepessoas com autismo, os óculosde lentes coloridas e os coletespesados talvez ajudem umas três

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ou quatro. Então, ospesquisadores dizem: “Vejabem, estas coisas funcionam emapenas 15 ou 20% dapopulação autista!” E daí? Issonão significa que óculoscoloridos não funcionam para oautismo; significa quefuncionam para autistas comcertos problemas visuaisespecíficos. Eles funcionam paraum subgrupo da populaçãoautista.

Não quero dizer que nãodeveríamos usar rótulos. Claroque devemos. Sem o rótulodado por Leo Kanner, o autismo

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poderia ter permanecido semdiagnóstico, sem tratamento,simplesmente ignorado. Osrótulos têm sido incrivelmenteimportantes e continuarão a sê-lo. São necessários para finsmédicos, benefícios educativos,reembolsos de seguros,programas sociais etc., então,são necessários. Se você for umpesquisador do autismo, àsvezes faz sentido compararapenas indivíduos autistas comindivíduos de controle.

Mas às vezes não é assim,porque o autismo não é um

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diagnóstico de “tamanhoúnico”.

Embora a AssociaçãoAmericana de Psiquiatria definao autismo, o diagnóstico serásempre impreciso. Esta é anatureza do espectro. Oprimeiro conjunto de padrõesformais do DSM-III tentoucorrigir esta falta de umdiagnóstico e as ediçõesseguintes tentaram corrigir aimprecisão nos diagnósticos deautismo e dos transtornosrelacionados ao autismo.Infelizmente, não acho que aúltima tentativa — o DSM-5 —

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ajude muito a esclarecer aconfusão e, de certo modo, sóvai complicar a situação.

No DSM-IV, o diagnósticode autismo, chamado de modelotriádico, depende de trêscritérios:

Prejuízo na interaçãosocial.Prejuízo na comunicaçãosocial.Padrões restritos,repetitivos e estereotipadosde comportamento,interesses e atividades.

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Os dois primeiros podemparecer semelhantes, na medidaem que envolvem questões desocialização. Na verdade, esta éa justificativa oficial para juntá-los no mesmo critério no DSM-5. Numa apresentação em20105 à Comissão deCoordenação Interagências parao Autismo (IACC), órgãofederal, o presidente do Grupode Trabalho emDesenvolvimento Neurológicodo DSM-5 afirmou: “Os déficitsde comunicação estãointimamente relacionados aosdéficits sociais. Os dois são

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‘manifestações’ de um sóconjunto de sintomas muitasvezes presentes em contextosdistintos.” Como resultado, oDSM-5 usa um modelo diádico,de dois critérios:

Déficits persistentes nacomunicação social einteração social.Padrões restritos,repetitivos e estereotipadosde comportamento,interesses e atividades.

Compreendo que a AAPpossa considerar mudar do

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modelo triádico para o diádico.A ideia de separar o social docomportamental tem base naciência; os dois domínios são,na verdade, biologicamentedistintos. Em testes delaboratório com ratos,pesquisadores demonstraramque a risperidona, uma drogaantipsicótica, não afeta ocomportamento social, masafeta o comportamentoobsessivo — talvez por sedar osratos. Contrariamente, ospesquisadores demonstraramque o comportamento social dosratos melhorava com

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treinamento, mas não ocomportamento obsessivo.6 Osresultados indicam que oscomportamentos repetitivos e osproblemas sociais operam emsistemas separados no cérebro.Então, faz sentido um sistemadiádico que reconheça adistinção entre estes doissistemas.

O que não é científico naexecução dos critérios dediagnóstico pelo DSM-5,contudo, é a junção de interaçãosocial e comunicação social. Ainteração social recobre ocomportamento não verbal que

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envolve estar com outra pessoa— fazer contato visual, sorriretc. A comunicação socialrecobre a capacidade de se teruma conversa verbal e nãoverbal — partilhar ideias einteresses, por exemplo. Asdisfunções na comunicaçãosocial e na interação socialpertencem ao mesmo domínio?A incapacidade de pronunciarpalavras e dominar a gramáticae a sintaxe (conhecidas comotranstorno específico delinguagem ou transtornosintático-semântico) realmenteprovém do mesmo lugar no

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cérebro que a tendência a falarcom entonação anormal eresponder de modo socialmenteinadequado (conhecida comotranstorno pragmático delinguagem ou transtornosemântico-pragmático)? Amecânica da linguagem e aconsciência social estãointimamente relacionadas doponto de vista neurológico? Euduvido — e não estou sozinhanessa opinião.

Um artigo de 20117 noJournal of Autism andDevelopmental Disorderspesquisou mais de duzentos

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estudos de RMNf e ITD paratentar determinar se o modelodiádico tem base nos dados dasneuroimagens. A conclusão dosautores: “só em parte”. Elesdescobriram que asneuroimagens corroboram aseparação de comportamento ecomunicação em duascategorias. Nenhuma surpresaaté aqui. Mas eles tambémdescobriram que asneuroimagens corroboram adivisão da comunicação emduas outras categorias, como oDSM-IV havia afirmado —embora não necessariamente

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nas duas categorias queapresenta!

O DSM-5 também estámudando a abrangência dopróprio diagnóstico. No DSM-IV, a categoria relacionada aoautismo era transtornos globaisdo desenvolvimento e incluía*os seguintes diagnósticos:

Transtorno autista (ouautismo “clássico”)Síndrome de AspergerTranstorno global dodesenvolvimento sem outraespecificação (TGD-SOE)(ou autismo típico)

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O DSM-5 lista um:

Transtorno do espectroautista

Então, pode-se perguntar: Oque ocorreu com a síndrome deAsperger e o TGD-SOE?Consideremos um de cada vez.

A grande mudança comrelação à síndrome de Aspergere ao autismo é o atraso na fala.Antes, quando havia atraso nafala, como eu tive, caía-se dolado do autismo na divisão dodiagnóstico (supondo-se que osdemais critérios fossem

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cumpridos, claro). Quando nãocumpria, caía do lado daAsperger. Agora, alguns antigosaspies terão diagnóstico de TEAse cumprirem todos os critériosdeste diagnóstico, mas sematraso na fala.

Segundo a AAP, os que jáforam diagnosticados comautismo manterão odiagnóstico. Mas e os aspiesnão diagnosticadosanteriormente que cumpremapenas a metade social do novocritério diádico — déficit nainteração social e nacomunicação, mas não nos

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comportamentos repetitivos enos interesses obsessivos? Elespoderiam entrar em umacategoria totalmente diferente:transtornos de comunicação.Especificamente, receberão umdiagnóstico no DSM: transtornode comunicação social. Que,basicamente, é o autismo sem ocomportamento repetitivo e osinteresses obsessivos. (No meumodo de pensar, a disfunçãosocial está no cerne do autismo,mais do que os comportamentosrepetitivos.) Então, receber umdiagnóstico de disfunção socialdiferente do diagnóstico de

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autismo é o mesmo que ter umdiagnóstico de autismo diferentedo diagnóstico de autismo!

Os diagnosticados antes comsíndrome de Asperger podem vira descobrir que não pertencem àcategoria dos transtornos dodesenvolvimento neurológico,pelo menos não oficialmente.Podem entrar para umacategoria totalmente distinta dediagnóstico: transtornosdisruptivos de conduta e decontrole dos impulsos. Adecisão, em última instância,depende da opinião de um sómédico — e, se você disser que

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isso não parece ciência, eu nãodiscordaria.

Em primeiro lugar, comobióloga, considero todacategoria de diagnósticocientificamente suspeita. Acategoria inclui seisdiagnósticos. Pelo que vejo, sóum tem alguma base científica:transtorno explosivointermitente.8 Neuroimagensmostram que se você não temcontrole do córtex frontal até aamígdala, está sujeito a ataquesque podem levá-lo a serdemitido ou preso. Porém e osoutros diagnósticos na categoria

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transtornos disruptivos deconduta e de controle dosimpulsos? Sinto o cheiro de “seos rotularmos assim, nãoteremos de lhes oferecerserviços para o TEA e podemossimplesmente mandar a políciaresolver o assunto”. O DSMpoderia perfeitamentedenominar esta categoria“Mande-os para a prisão”.

Em segundo, essesdiagnósticos negligenciam osdotados, porém frustrados — otípico aspie ou autista de altofuncionamento que trabalha emum ambiente pouco acolhedor.

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Considere o diagnóstico detranstorno de oposição edesafio: “O transtorno nocomportamento causa déficitsclinicamente significativos nasatividades sociais, educacionaisou vocacionais.” Garanto que sevocê pegar um aluno da terceirasérie que consiga ler textos dematemática do segundo grau emandá-lo fazer repetidamenteexercícios matemáticos parabebês, ele se oporá de formadesafiadora — porque ficarámuito entediado.

Como sei? Porque já vi casosassim — crianças apontadas

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com graves problemas decomportamento na escola atéque alguém lhes dá lições dematemática à altura da suacapacidade. Então, seucomportamento se normaliza eelas se tornam produtivas eparticipativas — e atéestudantes modelos.

Aqui, mais uma vez, vemosas limitações e os perigos dopensamento preso a rótulos — adiferença entre o que ocomportamento parece visto defora e como ele é sentido pordentro.

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Quanto ao TGD-SOE, oDSM-IV usa este diagnósticoabrangente para descreverdiversos cenários, inclusive oautismo atípico, definido como“apresentações que nãocumprem os critérios dotranstorno autista devido àidade avançada do surgimento,sintomatologia atípica ousintomatologia abaixo do limiarou todos os anteriores”. NoDSM-5, porém, pessoas comeste diagnóstico podem serretiradas do autismo ecolocadas em outrasubcategoria de transtorno do

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desenvolvimento neurológico,transtornos do desenvolvimentointelectual — especificamente,atraso no desenvolvimentointelectual ou global nãoclassificado em outro aspecto.Não surpreende que tantos paisse sintam no Clube doDiagnóstico do Ano.

Para muitas pessoas, asmudanças no DSM não fazemdiferença. Por exemplo, segundoas diretrizes do DSM-5, eu seriadiagnosticada com transtornodo espectro autista. Se olhar adescrição do que constituem asdisfunções sociais e os

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comportamentos repetitivos,definitivamente me encaixo.Extrema aflição com pequenasmudanças? Eu quando pequena.Interesses obsessivos? Nossa, eutinha isso. Hipersensibilidadesensorial? Veja a máquina doabraço.

Contudo para muitas pessoasessas mudanças farão umaenorme diferença. Uma pesquisade 20129 com 657 pessoasclinicamente diagnosticadascom qualquer um dos trêstranstornos do espectro doautismo do DSM-IV descobriuque 60% continuariam a ter

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diagnóstico de TEA segundo oscritérios do DSM-5, mas 40%,não. Ao separar estes númerosem subgrupos de diagnósticos,os pesquisadores descobriramque 75% dos indivíduos quehaviam tido o diagnósticoespecífico de autismo segundoos critérios do DSM-IV tambémcumpriam os critérios do DSM-5 para TEA, mas só 28%daqueles diagnosticados comsíndrome de Asperger oscumpriam, e só 25% daquelesdiagnosticados com TGD-SOEos cumpriam.

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Estudo posterior,concentrado apenas nosdiagnósticos de TGD-SOE,chegou a uma conclusão muitomais otimista: nove de cada dezcrianças com diagnóstico deTGD-SOE segundo o DSM-IVteriam um diagnóstico de TEAsegundo o DSM-5.10 Contudo adisparidade entre os doisrelatórios deveria fazer pensarqualquer pai, mãe ou cientista.

Quais os efeitos práticosdessas mudanças nodiagnóstico? Pessoas que eramrotuladas com síndrome deAsperger e agora são rotuladas

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como autistas têm uma respostadiferente do mundo? De nós?Como estas mudanças afetarãoa cobertura do seguro? E osserviços sociais? Os autistas têmmais problemas do que aspessoas com síndrome deAsperger; eles continuarão a tero mesmo tipo de serviços queantes? Esta pergunta serádecidida em cada estado porseparado, mas as mudançasabriram uma caixa de Pandorade possibilidades.

E as pesquisas! Qualquerestudo sobre o autismo queempregue os critérios do DSM-5

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estará mesclando os alhos doatraso da fala com os bugalhosdo não atraso da fala. Porexemplo, na literatura vimosque problemas sensoriaistendem a ser muito piores entremembros da população comatraso na fala. Como ospesquisadores irão compararestudos sobre problemassensoriais do DSM-5 comestudos prévios ao DSM-5?

Em minha opinião, o DSM-5parece um diagnóstico decomitê. Um monte de médicossentados à mesa de conferênciadiscutindo códigos de

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segurança. Graças aopensamento preso a rótulos,agora temos uma cornucópia dediagnósticos — e simplesmentenão há suficientes sistemascerebrais para todas essasnomenclaturas.

Em 1980, quando o DSM-IIItentou pela primeira vezcodificar os diagnósticos deautismo, ninguém conhecia ossistemas cerebrais. Ninguémsabia muito sobre a sequênciado DNA. Agora sabemos.Podemos ainda não conseguiraplicar estes avanços da ciênciaao DSM, mas acho que

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podemos começar a pensar océrebro autista de outro modo.Em vez de falar em conjuntos desintomas e tentar atribuir-lhesum rótulo, podemos começar afalar de um sintoma emparticular e tentar determinarsua fonte. Chegamos ao pontona pesquisa em que podemosunir sintomas e biologia.

Nos primeiros trinta e tantosanos depois de Leo Kannerapresentar o termo autismo em1943, a ênfase da comunidadepsiquiátrica estava na busca dacausa e, como a teoriapsicanalítica dominava o

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pensamento psiquiátrico daépoca, a hipótese para a causaera o comportamento dos pais,especialmente o da mãe.

Chamemos esse período defase um na história do autismo,e digamos que ele se estendeu de1943 a 1980, quando aAssociação Americana dePsiquiatria publicou o DSM-III.

Aquela edição do DSMrepresentou uma mudança nacomunidade psiquiátrica comrelação a um maior rigorcientífico no tratamento dadoença mental, mudança queincluiu o primeiro diagnóstico

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oficial de autismo. Desde então,muito da discussão sobre oautismo envolveu os sintomasespecíficos que formam odiagnóstico.

Chamemos esse período defase dois na história doautismo, e digamos que seestendeu de 1980 a 2013, anoda publicação do DSM-5.

O diagnóstico pode econtinuará a mudar, mas agorapodemos mudar a ênfase umavez mais. Graças aos avanços naneurociência e na genéticapodemos começar a fase três nahistória do autismo, de retorno

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à pesquisa da causa da fase um,desta vez com três grandesdiferenças.

Primeira, a busca da causaenvolve não a mente, mas océrebro — não a mãe geladeira,mas evidências neurológicas egenéticas observáveis.

Segunda, como percebemoscomo o cérebro éextraordinariamente complexo,sabemos que a pesquisa levaránão a uma causa, mas a causas.

Terceira, precisamos buscaruma causa ou causas múltiplasnão do autismo, mas de cadasintoma no espectro inteiro.

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O pensamento da fase doisdiz: Talvez eu não consigaesquiar porque sou autista. Opensamento da fase três diz:Talvez eu não consiga esquiarporque tenho um cerebelomenor do que o normal.

O pensamento da fase doisdiz: Vamos agrupar as pessoassegundo o diagnóstico. Opensamento da fase três diz:Esqueça o diagnóstico. Esqueçaos rótulos. Concentre-se nosintoma.

Em vez de — ou, ao menos,além de — classificar osindivíduos humanos nos estudos

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segundo os diagnósticos deautismo, deveríamos classificá-los segundo os sintomasprincipais. Como aprendi comos exemplos da descrição deCarly Fleischmann, que sesentia hiperestimulada numacafeteria, penso que ospesquisadores deveriam pararde desdenhar os relatos pessoaise começar a vê-los com atençãoe a solicitar novos relatos deoutros indivíduos. Depois,deveriam colocar estes sujeitosem estudos com base nos seusrelatos.

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Certa vez tive uma aluna depós-graduação que via linhasonduladas entre as linhas curvasde um desenho de uma rampapara bovinos, e às vezes viaapenas fragmento de palavras.Ela não era autista, mas ossintomas eram muito similaresaos descritos por DonnaWilliams, que definitivamenteera autista.

Digo: coloque-as numescâner e vamos ver o quesurge. Vamos ver onde está oproblema. Está na área de saídada linguagem? No significadoda linguagem?

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Vamos considerar as pessoasque não conseguem usar aescada rolante porque nãoentendem como entrar e sairdela. Ou as que odeiam dirigir ànoite. Vamos comparar estessubgrupos com grupos decontrole que não apresentameste problema. Vamos pegar asecretária que consegue digitar180 palavras por minuto e umasecretária que digita noventapalavras por minuto. E depoiscolocá-las num escâner ecompará-las, córtex motorcontra córtex motor.

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Fico contente em ver quealguns pesquisadores começama reconhecer as limitações dosrótulos. Eles estão começando areconhecer a necessidade dedefinir mais estreitamente osobjetivos. Um artigo de 2010,11

“Neuroimaging of Autism”[Neuroimagens do autismo],concluiu: “No autismo, é cadavez mais claro que apossibilidade de identificar umsó marcador pode ser muitopequena devido à grandevariabilidade que vemos [neste]espectro. Em vista disso, adefinição de subgrupos menores

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de autismo com característicasmuito específicas pode ser achave para elucidar melhor estadoença complexa” (grifosmeus).

Pessoalmente, eu iria maislonge e argumentaria queprecisamos pensar não só emsubgrupos menores definidospor sintomas, mas nos própriossintomas. Porque pensar emsintomas individuais com baseem cada sintoma nos permitepensar no diagnóstico etratamento com base em cadapaciente.

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Meu amigo WalterSchneider, que criou orastreamento de fibras em altadefinição na Universidade dePittsburgh, já está fazendo estacolocação — talvez porque eletenha observado vividamente opotencial desta abordagem.

“Estamos em busca de umdiagnóstico sobre o qualpossamos agir”, diz ele. “Não ésó dizer ‘É, você é diferente’,mas ‘Você é diferente e porcausa desta forma particular dediferença para nós este é ocaminho mais provável paralevar você ao resultado que

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queremos que tenha’. Queremosadentrar cada vez mais naquelecérebro individual — não umestudo de grupo, mas umcérebro individual — de formaque possamos dizer aos pais: ‘Asituação é a seguinte, este é oefeito que esperamos, e assim écomo planejamos chegar a eledo modo mais eficiente possívelpara lhe dar informaçõeseficazes sobre seu filho nospróximos dois anos.”

Pode-se ouvir que a mesmaargumentação começa a surgirtambém na genética. Oneurogeneticista da

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Universidade de Yale, MatthewW. State, gosta de invocar afrase médica do laboratório àcabeceira do doente — quesignifica dos experimentos comgrupos aos tratamentosindividuais. Em um artigo de201212 na Science, ele e seucolaborador Nenad estansugeriram que os pesquisadoresbuscassem inspiração em outrasáreas da medicina que fizeramessa transição. “Por exemplo, asdoenças cardíacas e a prevençãodo infarto dependem em partedo controle da hipertensão”,escreveram. “Pode ser que o

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TEA e a esquizofrenia cada vezmais venham a ser vistos sobuma luz semelhante” —comportamentos distintosprovenientes da mesma fontegenética. Como resultado, estan e State anteciparam queos testes de tratamentos seriamorganizados em torno de“mecanismos partilhados” enão de “categorias psiquiátricasde diagnósticos”. Eles não têmdúvida de que este repensar océrebro autista será um desafio.Mas, como Schneider, previramo desenvolvimento de terapias

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não só mais eficazes como“mais personalizadas”.

Daqui a vinte anos acho quevamos olhar retrospectivamenteesses diagnósticos e dizer“aquilo era lixo”. Então, nomeu modo de ver, temos umaescolha. Podemos esperar vinteanos e várias novas edições doDSM antes de começar aarrumar essa mixórdia. Oupodemos aproveitar os recursostecnológicos que começam aestar disponíveis e iniciar já afase três.

Como logo verão, escolhi afase três.

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Nota

* Ela também incluía síndrome de Rett etranstorno desintegrativo da infância, quenão concerne a esta discussão.

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6 Conhecer seuspontos fortes

Alguns anos atrás, MichelleDawson, pesquisadora deautismo no Hospital Rivière-des-Prairies na Universidade deMontreal, se fez uma perguntaimportante. Sua pesquisa sobreo cérebro autista, como outrosestudos sobre autismo na clínicae em toda parte, abordava adeficiência cognitiva — no quehavia de errado. Ela percebeu

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que quando um autistaapresentava característicasconsideradas pontos fortes emuma pessoa normal, aindacontinuávamos a ver essespontos fortes como merossubprodutos afortunados deconexões ruins. Mas, e se nãofosse assim?, ela se perguntou.Se, pelo contrário, eles nãofossem subprodutos de nada? Sefossem simplesmente osprodutos da conexão —conexão que não é boa nemruim?

Ela e outros colegascomeçaram a esquadrinhar a

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literatura especializada.Certamente, viram querotineiramente os estudosenfatizavam apenas os aspectosnegativos do autismo, mesmoquando alguns resultados erampositivos. Segundo LaurentMottron,1 colaboradorfrequente de Dawson e diretordo programa de autismo doHospital Rivière-des-Prairies,“Os pesquisadores que fazemRMNf relatamsistematicamente mudanças naativação de algumas regiões docérebro como déficits no grupoautista — em vez de

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simplesmente enxergar aevidência de uma organizaçãocerebral alternativa, mas àsvezes bem-sucedida.” Quandoos pesquisadores veem osvolumes corticais, por exemplo,automaticamente jogam asvariações na lixeira, semconsiderar se o córtex é maisfino ou mais espesso que oesperado. Mesmo quando umestudo reconhece um pontoforte em indivíduos autistas, osautores frequentemente encaramisso como uma compensação dodéficit — porém uma matériade 20092 na Philosophical

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Transactions of the RoyalSociety, que resenhou artigosbaseados nesta suposição,concluiu “que esta hipóteseinversa raramente prova serverdadeira”.

Dawson e seus colaboradorescomeçaram a fazer seuspróprios experimentos paradeterminar o nível deinteligência de pessoas comautismo. Em 2007 eles fizeramum estudo que usava dois testescomuns de inteligência: a EscalaWechsler de Inteligência paraCrianças e as MatrizesProgressivas de Raven.3 O teste

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Wechsler consiste em dozesubtestes, alguns verbais, outrosnão verbais (formar desenhoscom blocos, por exemplo). O deRaven é totalmente não verbal.Consiste em sessenta questõesque mostram uma série dedesenhos geométricos e depoisuma opção de seis ou oitodesenhos alternativos, dos quaissó um completa a série. Ostestes foram aplicados porneuropsicólogos independentesque desconheciam o objetivo doestudo, e os indivíduos testadosincluíam 51 crianças e adultos

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com autismo e 43 crianças eadultos do grupo de controle.

Os resultados foramimpressionantes. Dawsondescobriu que a medida dainteligência na populaçãoautista depende do tipo de teste.No teste Wechsler, um terçodos indivíduos com autismo foiclassificado como “de baixofuncionamento”. No testeRaven, porém, isso só ocorreucom 5% — e um terço foiclassificado como de “altainteligência”. No testeWechsler, os indivíduos autistasem seu conjunto pontuaram

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muito abaixo da populaçãomédia, ao passo que no testeRaven pontuaram na faixanormal. Eu própria pontueimuito bem no teste dasMatrizes Progressivas de Raven.

Por que esta ampladisparidade de respostas nosdois testes? Talvez porqueresponder corretamente amuitas perguntas do testeWechsler dependa dacapacidade social de adquirirhabilidades e informações deoutros, ao passo que o testeRaven é puramente visual.

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“Chegamos à conclusão”,escreveu o grupo de Montrealem seu estudo inovador naPsychological Science, em 2007,“de que a inteligência tem sidosubestimada nos autistas”.

“Os cientistas que trabalhamcom autismo sempre apontaramas aptidões como casuais, maselas raramente têm sido ocentro das pesquisas”,4 dissemais tarde Isabelle Soulières,uma das autoras do artigo.“Agora, eles começam adesenvolver um interesse porestes pontos fortes para ajudar acompreender o autismo.”

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Esta nova atitude em relaçãoao autismo condiz com opensamento da fase três quedescrevi no capítulo anterior.Assim como agora podemoscomeçar a ver de forma isoladacada traço do comportamentoautista, também podemosrepensar os traços autistas emcada cérebro isoladamente.

Não me interpretem mal.Não estou dizendo que oautismo é ótimo e todas aspessoas com autismo deveriamsimplesmente se sentar ecelebrar nossos pontos fortes. Oque afirmo é que, se pudermos

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reconhecer, de modo realista ecaso a caso, os pontos fortes deum indivíduo, podemosdeterminar melhor seu futuro.Preciso que você me conserte,escreveu certa vez CarlyFleischmann, a não verbal queconhecemos no capítulo 4.Conserte meu cérebro. Pelocontrário, quando um jornalistaperguntou a Tito RajarshiMukhopadhyay, o outro nãoverbal que conhecemos nocapítulo 4, “Você gostaria deser normal?”,5 Tito respondeu:“Por que eu deveria ser Dick enão Tito?” Para Tito, o “eu

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atuante” podia ser esquisito,mas era uma parte tão suaquanto o seu “eu pensante”.

Também quero deixar claroque, ao falar de pontos fortes,não me refiro às habilidades deautistas savant como StephenWiltshire, que depois de apenasum voo de helicóptero sobreparte de uma cidade, comoLondres ou Roma, conseguedesenhar toda a paisagem, até oúltimo parapeito de janela, nemde Leslie Lemke, que precisaouvir apenas uma vez uma peçamusical — qualquer estilo,inclusive composições clássicas

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complexas — para reproduzi-lano piano. Apenas cerca de 10%dos autistas pertencem àcategoria dos savants (embora amaioria dos savants sejaautista).

Então, que pontos fortespodemos buscar? Ospesquisadores do autismotradicionalmente nãoconsideram esta característicaum ponto forte, mas ao longodos anos eles observaram quepessoas com autismo às vezesprestam mais atenção nosdetalhes que as neurotípicas.

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Comecemos por aqui e vejamosaonde isso nos leva.

O pensamento de baixopara cima

As pessoas com autismo sãomuito boas em reparar detalhes.“Quando um autista entra numcômodo”, disse umapesquisadora, “a primeira coisaque vê é uma mancha de café namesa e dezessete tacos nopiso”.6 Isso me parece umexagero e uma generalização,mas a ideia está no caminhocerto.

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Tradicionalmente, ospesquisadores têm classificadoessa característica como“coerência central fraca” — umdéficit. A coerência central fracaestá no cerne das deficiências decomunicação social e deinteração social que há muitofazem parte do diagnósticooficial do autismo. De ummodo mais informal, pode-sedizer que os autistas têmdificuldade em captar o todo,ou que percebem a florestapelas árvores.

Pense em Tito e seu encontrocom o médico. Ele enxergou na

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porta uma série de propriedades— seu aspecto físico (asdobradiças), sua forma(retangular), sua função(permitir que ele entrasse nasala). Só ao reunir detalhessuficientes ele entendeu o quevia. Quando o conheci nabiblioteca médica, pedi quedescrevesse a sala. Em vez dediscutir os objetos no ambienteou seu tamanho, ele falou sobrefragmentos de cor.

Minha experiência não é tãoextrema, mas a tendência a verdetalhes antes de ver o todosempre foi uma característica

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central em como me relacionocom o mundo. Quando eracriança, meu comportamentorepetitivo favorito era escorrerareia pelos dedos. Ficavafascinada com as formas; cadagrão parecia uma pedrinha.Sentia-me como uma cientistatrabalhando num microscópio.

Um estudo fundamental de1978, “Recognition of Faces:An Approach to the Study ofAutism” [Reconhecimento derostos: uma abordagem para oestudo do autismo],7 colocouem evidência nas pesquisas asimplicações sociais desta

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característica. Mostrava-se aosindivíduos apenas a parteinferior de uma série de rostosde pessoas conhecidas para queas identificassem. A populaçãoautista pontuou melhor que osindivíduos do grupo decontrole. O mesmo ocorreuquando ambos os grupos viramas imagens invertidas. Aspessoas com autismo se saírammelhor em entender o que era aimagem de cabeça para baixo.O pesquisador que fez o estudo,Tim Langdell, afirmou que osautistas conseguiam enxergar

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melhor os “padrões puros” doque os “padrões sociais”.

Esta interpretação seriacompatível com os resultados detestes de movimento biológico.Sabe a tecnologia de captura domovimento utilizada no cinema,quando um ator usa um montede pontos brancos que mapeiamseus movimentos nocomputador? Isso é movimentobiológico. Na tela docomputador, o movimentobiológico não passa de pontosem movimento, mas eles estãodispostos de modo a sugerir aação que uma pessoa ou animal

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vivo podem executar, comocorrer. Os estudosdemonstraram frequentemente8

que autistas podem identificar omovimento biológico, mas nãoo fazem do mesmo modo que osneurotípicos. E eles tampoucoatribuem emoções e sentimentosao movimento. Além disso,utilizam partes do cérebrodiferentes das usadas pelosneurotípicos. Estes exibem umagrande atividade nos doishemisférios, ao passo que osautistas exibem menos ativaçãogeral. O modo como o cérebroautista se envolve no

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movimento biológico lembra adescrição de Tito do foco naporta em detrimento da sala, oua descrição de Donna Williamsque li certa vez, em que elaficava extasiada com partículasde poeira.

A interpretação destatendência como um déficit nospadrões de reconhecimentosocial foi adotada por R. PeterHobson em uma influente sériede estudos9 que ele liderou nadécada de 1980 no Instituto dePsiquiatria em Londres. Ascrianças autistas preferemclassificar fotografias pelas

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expressões faciais (triste oualegre) ou o tipo de chapéu (defeltro ou de lã)? Os chapéusvenceram. As crianças comautismo têm dificuldade demontar as peças de um rosto einterpretar emoções faciais?Sim.*

Essas descobertas sãoimportantes. Mas pode haveroutro lado para um déficit nospadrões de reconhecimentosocial: a capacidade dereconhecimento do padrão puro— ser muito bom em verárvores. Diversos estudosdemonstraram que pessoas com

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autismo se saem melhor do queas neurotípicas nos testes defiguras ocultas — uma variaçãodo antigo jogo em que há algooculto na imagem. Há váriosanos fiz um teste em que olhavaletras grandes compostas porpequenas letras diferentes —por exemplo, um H giganteformado por Fs minúsculos. Eudevia identificar a letra grandeou a pequena. Eu identificavamais rapidamente as letraspequenas, um resultado maiscomum entre autistas do queentre neurotípicos. A pesquisatambém mostrou10 que, ao fazer

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tarefas linguísticas, o indivíduoautista usa mais as áreas visuale espacial do cérebro do que osneurotípicos, talvez paracompensar a carência de umconhecimento semântico queprovém da interação social. Umestudo com RMNf em 2008mostrou que quando o cérebroneurotípico faz uma pesquisavisual, a maior parte daatividade se limita a uma regiãodo cérebro (a occipito temporal,associada ao processamentovisual), enquanto no cérebroautista quase tudo eraativado.11 Talvez seja por isso

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que consigo enxergarimediatamente o copo de papelou a corrente dependurada quevai assustar o gado, enquanto osneurotípicos à minha volta nemos percebem. Os pesquisadoresusam uma expressão adorávelpara esta tendência a ver asárvores antes de reconhecer afloresta: viés local.

Consideremos MichelleDawson, a pesquisadora quepensou em procurar referênciassobre os pontos fortes dosautistas ocultos na literatura.Ela é autista. Posso dizer queela deu o salto conceitual

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porque é autista, mas acho queprovavelmente ela tenha feitoisso por ter uma atençãoaguçada aos detalhes. “O olharagudo de Dawson mantém olaboratório focado no aspectomais importante da ciência: osdados”, escreveu Mottron numartigo na Nature em 2011.12

“Ela tem uma heurística debaixo para cima, na qual asideias provêm dos fatosdisponíveis, e apenas deles.”

Dawson sempre abordarasua pesquisa com os mesmoscritérios que aprendeu, fazendoa mesma suposição irrefletida,

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como seus mentores e colegas— a de que estudar o autismosignificava estudar déficits. Masessa suposição era resultado doque Mottron identificou em simesmo como “uma abordagemde cima para baixo: eu pego emanipulo ideias gerais de menosfontes”. Só quando ele chega auma hipótese é que “volta aosfatos”. Dawson achou maisfácil se livrar das concepçõesinerentes ao pensamento decima para baixo porque eracapaz de ver os detalhes deforma isolada e desapaixonada.Quando outros pesquisadores

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olham os dados dela sobre ospontos fortes dos autistas edizem: “É tão bom ver algopositivo!”, ela responde que nãoo vê como positivo ou negativo:“Acho que são exatos.”

Identifico-me totalmentecom esta atitude. Na minhamonografia do bacharelado,quis explorar o tema dainteração sensorial. Como oestímulo a um sentido, como aaudição, afeta a sensibilidade deoutros sentidos? Reuni mais decem artigos de periódicos.Como meu pensamento étotalmente não sequencial, tive

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de encontrar um modo de darcoerência à pesquisa.

Primeiro, numerei os artigos.Em seguida, copiei as principaisdescobertas de cada um empedaços de papel. Os artigoscom revisões produziam mais deuma dúzia de tiras de papel.Depois coloquei todos os papéisnuma caixa. Pendurei um painelenorme no meu quarto dodormitório estudantil — talvezde 1,20 m por 1,80 m. Recolhia primeira tira de papel dacaixa e espetei-a num pontoqualquer do painel. Depois,peguei outra tira. Digamos que

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a primeira fosse sobre o sentidoda visão, e a segunda, sobre osentido da audição. Então, asegunda tira foi para outraparte do painel, porque agoraeu tinha duas categorias iniciais.Fiz etiquetas para elas ecoloquei-as no alto do painel,encabeçando duas colunas.Continuei tirando papéis dacaixa, um por um. Colocava-osjunto aos demais em umacategoria ou criava uma nova,ou jogava fora as categoriasvelhas e rearrumava todas astiras de papel. Quando acabeide selecionar todas as tiras em

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diferentes categorias deinformação, comecei a ver queelas se uniam e formavamconceitos mais amplos.

Mais tarde, apliquei esseprincípio à minha vidaprofissional. Quando comecei acriar meus projetos para manejode gado, primeiro fui a todas asfazendas do Arizona — talvezumas vinte — e depois a outrasno Texas. Trabalhei com gadoem cerca de trinta fazendas nototal, mas o que realmente faziaera observar. Notei que umcurral tinha cercados em curvamuito bons e outro tinha uma

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boa rampa de carga, mascercados horríveis. Quando mesentava para fazer um desenho,dispensava as partes ruins econservava as boas.

Esse processo pode serextremamente lento. Quandoestava na faculdade, às vezespassava meses lendo artigos deperiódicos e espetando tiras depapel no painel até chegar aoprincípio básico. Agora possuomuito mais experiência emselecionar devido à pesquisacientífica. Já não preciso de umpainel na parede, pois tenho umna minha mente. Por isso confio

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nas minhas conclusões. Sintoque meu viés local me libera doviés global, que atrapalha quempensa de cima para baixo.

Mottron identificou omesmo padrão na pesquisa deDawson: “Ela precisa de umaenorme quantidade de dadospara chegar a uma conclusão”,escreveu ele na Nature. Mas,acrescentou, “os seus modelosnunca abarcam demasiado e sãoquase infalivelmente precisos”.

Este sentimento de certeza éprovavelmente o que temalimentado, entre matemáticose cientistas com Asperger ou

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que são autistas de altofuncionamento, a reputação deserem rígidos e inabaláveis.Uma vez que obtêm uma prova,sua atitude em relação a elatorna-se inflexível, porqueexperimentaram a trabalhosalógica passo a passo que levou àsua criação. Matemáticos ecientistas chegam a falar dabeleza de uma equação ouprova.

Para quem pensa de cimapara baixo, contudo, estacerteza não é necessariamenteadquirida — não sem um montede evidências para apoiá-la.

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Tive um cliente que insistia quepodia construir uma fábrica deprocessamento de carne em trêsmeses. Bem, não dá. Não vaifuncionar de jeito nenhum. Masele não se deixava convencer.Ele sabia que estava certo, etodos os prazos que oconstrutor não cumpriu, porqueera impossível cumpri-los, todosos atrasos imprevistos quenormalmente, desde o início,estão embutidos naprogramação, não significavamcoisa alguma. No final, elejogou 20 milhões de dólares nolixo.

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Para um pensador de baixopara cima como eu, contudo,equivocar-me num detalhequando estou tentando resolverum problema não trazimplicações para o conjunto dasolução, porque ainda nãocheguei a ela. Quando alguémme mostra parte de um projetoem que fiz algo errado, eu digo:“Mude-o.”

Pensamento associativo

Não faz muito tempo estive noterminal da United Airlines emChicago, que tem um telhado de

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vidro. Olhei para o alto e naminha mente vi imagens daestufa da minha universidade, oPalácio de Cristal da FeiraMundial de 1851 em Londres,um jardim botânico e a Biosferano Arizona. Estas estruturas nãotêm o mesmo formato doterminal aeroportuário, masestavam todas no meu arquivode telhados de vidro.

Então, quando vi a Biosferamentalmente, notei as pequenastorres na estrutura. Elas mefizeram lembrar das torres darepresa Hoover. Então comeceia ver imagens de torres: num

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castelo na Alemanha, no casteloda Fantasyland na Disney, numtanque militar.

Àquela altura, eu podia terido por dois caminhos. Podiater continuado a buscar no meuarquivo de telhados de vidro.Ou podia ter ficado na pastadas torres. Para alguém de fora,meus pensamentos podiamparecer aleatórios, mas euestava simplesmente escolhendoa pasta que queria explorar.

Eu sempre digo que meucérebro funciona como ummecanismo de busca.13 Se vocême pedir para pensar num

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assunto, ele gera um monte deresultados. Ele também podefazer conexões fáceis que saemrapidamente do assunto originale vão muito longe. Asemelhança entre meu cérebro eum mecanismo de busca,contudo, não deveriasurpreender. Quem você pensaque projetou os mecanismos debusca originais? Muitoprovavelmente gente cujoscérebros funcionam como omeu — gente com cérebros quetêm dificuldades com opensamento linear, cérebros quedivagam, cérebros que possuem

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uma memória de curto prazofraca.

Lembram do escaneamentodo meu cérebro com HDFT naUniversidade de Pittsburgh em2011? Ele revelou que meucorpo caloso — a autoestradaneural que se estende pelocomprimento do cérebro entreos hemisférios esquerdo edireito — tinha um númeroincomum de fibras horizontaisque se ramificavam para ambosos lados. Minhas fibras sejuntam na área parietal,associada à memória. Acho quetodos estes circuitos extras na

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área parietal do meu cérebrodevem ser o que me permitefazer muito mais associações doque as pessoas com cérebrosnormais. “Ah”, exclameiquando Walter Schneider memostrou as imagens doescaneamento, “você encontroumeu mecanismo de busca!”.

De qualquer modo, para queum buscador gere resultados, obanco de dados precisa estarrepleto de informações. Emtermos humanos, precisa delembranças.

Em parte, o que fez deMichelle Dawson uma

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pesquisadora e colaboradora tãoformidável, disse Mottron, éque ela possui uma memóriaexcepcional: “A maior parte daspessoas não autistas nãoconsegue lembrar do que leu hádez dias. Para alguns autistas,isto é uma tarefa fácil. Elestambém têm menosprobabilidades de esquecerdados.”

Isso é verdade? A memóriade longo prazo costuma sermelhor nos autistas?

Sei que minha memória decurto prazo é horrível, o quenão é incomum entre autistas de

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alto desempenho. Não somosbons em multitarefas. Temosmemória ruim para rostos enomes. Sequenciamento?Esqueça. Um estudo de 198114

demonstrou que criançasautistas de alto funcionamentolembravam-sesignificativamente menos deacontecimentos recentes do quecrianças normais da mesmaidade e indivíduos de controlecom problemas mentais e idadee capacidades semelhantes. Emum estudo de 2006,15 com 38crianças autistas de altofuncionamento e 38 indivíduos

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do grupo de controle, o testemais confiável e preciso paradistinguir entre os dois gruposera o subteste Finger Window— uma mensuração da memóriaespacial em que o especialistatoca uma série de varetas numquadro e o indivíduo deveduplicar a sequência de padrões.Os indivíduos do grupo decontrole tiveram umdesempenho muito superior aodos autistas de altofuncionamento. Quando fiz esteteste, eu falhei; ele colocavamuita carga de trabalho naminha memória operacional.

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E a memória de longo prazodos autistas? Para minhasurpresa, a literatura científicanessa área é muito escassa.Passei duas horas pesquisandona internet artigos sobre o temarevisados por especialistas; omais recente era de 2002 ebasicamente se perguntava se amemória de longo prazo eradeficiente nos autistas.16

Ainda assim, é quaseirrelevante se a memória delongo prazo das pessoas autistastende a ser melhor ou pior doque a dos neurotípicos. O fato é

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que as pessoas precisam delembranças. De dados.

Quando olhava meu painelna universidade, eu não tinhamuita experiência em pesquisa,e como era relativamentejovem, não tinha muitaexperiência da vida. À medidaque fiz 40 anos, e 50, e depois60, minha capacidade de fazerassociações — ver ligações entreos detalhes — foi ficando cadavez mais precisa, e anecessidade de usar o paineldesapareceu, porque tenho cadavez mais detalhes no meu bancode dados. Pense assim: se não

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conseguir enxergar as árvores,você nunca enxergará a floresta.

Pensamento criativo

A floresta que o cérebro autistatermina por enxergar, contudo,pode não ser a mesma vista pelocérebro neurotípico.

Recentemente li umadefinição de criatividade naScience que me deixou muitoimpressionada: “oreconhecimento súbito einesperado de conceitos ou fatosnuma relação nova que nãotinha sido percebida”. Foi o que

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ocorreu quando MichelleDawson desafiou toda a históriada pesquisa sobre autismobaseada na identificação dosdéficits. Ela possuía os mesmosconceitos e fatos que todomundo, mas os percebeu “numarelação nova que não tinha sidopercebida”.

Posso pensar em muitosexemplos deste tipo decriatividade em minha novavida. Recordo de quando eraestudante no Franklin PierceCollege e fazia um curso degenética. O professor, o sr.Burns, nos ensinou o modelo

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comum da genéticadesenvolvido por GregorMendel no século XIX — quecada genitor contribui com ametade dos genes da criança eas espécies mudamgradualmente mediante umalonga série de mutaçõesgenéticas aleatórias. Aquilo nãofazia sentido para mim. Claro,era parte da explicação. Masnão podia ser só isso. Comomutações aleatórias explicamque a cruza de um border colliee um springer spaniel produzafilhotes que parecem umamistura dos dois, mas não

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exatamente 50% e 50% iguais?Alguns filhotes parecem maisspaniels, outros parecem maiscollies. Procurei o sr. Burns eperguntei a ele: “Como Mendelexplica isso?”

Ele ficou surpreso, para dizero mínimo. Hoje sabemos que asmutações aleatórias não sãosuficientes para produzir adiversidade nas espécies. Aevolução precisa também devariações no número de cópias.O que a genética de Mendel dizé que temos genes. Mas oconceito de variações nonúmero de cópias nos diz que

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temos um monte de cópias ouapenas um punhado delas.

Há alguns anos fui a umareunião na Franklin Pierce e vi osr. Burns, que então já estavaaposentado. “Você me fezalgumas perguntas muitoprofundas”, disse-me ele. Elasnão me pareciam profundas.Pareciam uma questão de bomsenso. Mas agora entendo queeu não teria conseguido fazer aassociação entre a genética deMendel e a cruza de raçascaninas se já não tivesse umnúmero suficiente de cãescruzados no meu banco de

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dados. Na verdade, quandoconfrontei o sr. Burns, estavapensando num border collie enum springer spaniel emparticular que conheci quandoestava no ensino médio. Elestiveram uma ninhada. Eu aindapodia ver mentalmente a mãe eo pai e os filhotes, e vi como oscachorros ficaram quandocresceram.

Gosto de olhar os materiaiscomuns para qualquer projeto eimaginar uma aplicação possívelou construção em que outraspessoas não pensariam. Nãodiria que todos os autistas são

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criativos, ou que a criatividadeé um subproduto feliz doautismo. Estudos do genomacompleto17 indicaram certasobreposição na variação nonúmero de cópias de novo entreo autismo e a esquizofrenia, epessoas altamente criativasapresentam risco elevado paraesquizofrenia e outraspsicopatologias.18 Contudo estaárea de pesquisa ainda épreliminar. Mas, para mim, serautista torna mais possível quecerto tipo de criatividade venhaà tona. Para ilustrar meu

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pensamento, vou mostrar umteste que fiz recentemente.

O desafio deste teste, queapareceu primeiro num estudosobre o cérebro e foireproduzido na New Scientist,era usar um círculo para criar omaior número de desenhospossíveis em cinco minutos. Ailustração mostrava apenas isso:um círculo. Os dois exemplosdo artigo traziam um smiley,que era “um dos menosoriginais”, e um homemreclinado num assento de avião(em que o círculo era a janelado avião vista de fora).

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Os desenhos que fiz foram:

O visor da mira do rifledos créditos iniciais dosfilmes de James Bond.O diafragma de umacâmera.Uma roda de bicicleta.Um barco visto peloperiscópio.Um estábulo redondo parabisões (que eu já haviaprojetado).Um carrossel (visto decima).Uma ordenhadeirarotatória.

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A esta altura, comecei apensar nas regras. Era possívelsair do círculo? Desenhei:

Uma roda-gigante, com osassentos balançando parafora do círculo.

Não tinha certeza se odesenho era legal, mas e daí?Estava com sorte. Então,desenhei:

Uma roda de hamster —com uma base, para nãocair.

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Pensei se poderia usar ocírculo como o centro de umdesenho maior, e neste casopoderia desenhar todo tipo deflores.

Este teste é uma variação deum antigo exercício de sala deaula que uso frequentemente.Podemos chamá-lo de PensandoFora do Tijolo. Pergunto:“Quantos usos pode-se dar aum tijolo?” De cara, recebo asrespostas óbvias. Pode-se usá-lopara construir uma parede.Pode-se jogá-lo numa vidraça.Em geral, os alunos levam umtempo (com a ajuda de uma ou

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duas dicas da minha parte) paraentender que podem mudar aforma do tijolo. Pode-se moê-loe usá-lo como pigmento oupintura. Pode-se cortá-lo emcubos, pintar bolotas nos cubose jogar dados.

O truque para descobrirnovos usos para o tijolo é nãoficar preso à sua identidade detijolo. O truque é recriá-locomo um não tijolo.

Acho que os que pensam debaixo para cima e primeiro nosdetalhes, como eu, apresentammais probabilidades de terrompantes criativos

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simplesmente porque nãosabemos o que estamos fazendo.Acumulamos detalhes sem sabero que significam e semnecessariamente agregar-lhessignificado emocional. Vemosconexões sem saber aonde noslevam. Esperamos que asassociações nos levem à visãodo todo — a floresta —, masnão sabemos onde estaremos atéchegar lá. Esperamos surpresas.

Mencionei neste capítulo queem geral os autistas tendem aver detalhes melhor que osneurotípicos, e depois disse:

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“Vamos começar por aí e veraonde isso nos leva.” Isto nostrouxe aqui: a um salto criativosobre saltos criativos —especificamente, que o cérebroautista pode ter maisprobabilidades, em média, dedar saltos criativos. A atençãoaos detalhes, a memóriaformidável e a capacidade defazer associações podemfuncionar juntas para tornar oimprovável salto criativo aindamais provável.

Em seu livro Be Different:Adventures of a Free-RangeAspergian,19 John Elder

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Robison descreve estaprogressão da criatividade —que ele aplicou na sua carreirade criador de efeitos sonoros,instrumentos musicais, showsde laser e videogames. Eleescreveu que primeiro seinteressou pela música quandoera adolescente porque ficavafascinado com os padrõescriados pelas ondas musicais noosciloscópio, instrumento queexibe sinais elétricos, linhas eformas numa pequena tela.“Cada sinal tinha uma formasingular”, escreveu. Estes sinais

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eram os detalhes de baixo paracima.

Ele passava de oito a dezhoras por dia “absorvendo amúsica e desemaranhando aaparência das ondas e ofuncionamento dos sinaiselétricos”, escreveu. “Eu via eescutava e via novamente atémeus olhos e ouvidos setornarem intercambiáveis.” Emoutras palavras, ele estavaarmazenando dados.

“Na época, eu podia olharum padrão no osciloscópio esaber como ele soava, e podiaolhar um som e identificar sua

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forma.” Com base nestamemória dos detalhes, eleaprendeu a fazer as associaçõesnecessárias.

Então ele ficou pronto para osalto criativo:

Quando eu ajustava o osciloscópiopara que se movesse lentamente, oritmo da música dominava a tela. Ostrechos em volume alto apareciamcomo riscos largos, ao passo que ostrechos calmos ficavam finos comoum tracinho. Uma velocidade umpouco maior me mostrava as ondassonoras grandes e pesadas da basedo baixo e a bateria rápida apareciacomo traços largos. A maior parteda energia estava contida naquelasnotas baixas. Mais alto, com umajuste mais rápido, eu encontrava os

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vocais. No topo de tudo estavam asondas rápidas e dentadas dos pratos.

Cada instrumento tinha umpadrão diferente, mesmo quandotocavam a mesma melodia. Com aprática, aprendi a distinguir umtrecho tocado no órgão da mesmamúsica tocada no violão. Mas nãofiquei nisso. Enquanto ouvia osinstrumentos, percebi que cada umtinha uma voz: “Você está doido”,diziam meus amigos, mas eu estavacerto. Cada músico tem um modo detocar, mas os instrumentos tambémeram únicos.

Os grifos são meus. Aresposta neurotípica a estapercepção seria descartá-la. MasRobison escutava o que outrosnão conseguiam escutar.

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Na verdade, ele conseguiaver aquilo: “Eu via tudo comoum grande quebra-cabeçamental — acrescentava ondas dediferentes instrumentos naminha mente e descobria qualseria o resultado.” Ele aprendeuque estava trabalhando numaespécie de matemática dasformas das ondas, embora nãopensasse no seu trabalho comomatemático.

Enxergar as ondas,acrescentá-las à sua cabeça —aquilo soava como pensamentovisual, como “pensar porimagens”. É o meu tipo de

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pensamento. Mas de modoalgum vejo as coisas comoRobison as descreve. Vejoexemplos concretos do meupassado, e não abstrações. Ele eeu usamos nossos cérebrosautistas para sermos criativos, ea criatividade é visual, mas seutipo de criatividade não eracomo o meu.

Ao tentar descobrir comotirar o máximo dos pontosfortes dos cérebros autistas,aparentemente eu aindaprecisava dar um último saltocriativo.

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Nota

* Eu mesma só soube aos 50 anos que aspessoas tinham sinais visuais sutis. Tenhotanta dificuldade de gravar rostos que,numa reunião de negócios, por exemplo, meforço a reconhecer detalhes físicos: Tá, elausa óculos grandes com aros pretos. Ele é oque usa cavanhaque.

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7 Repensar porimagens

O livro é grande parte [sic] bom,completo. Contudo, a dra. Grandinfaz algumas generalizaçõesevidentes, e às vezes parece suporque todas as pessoas com autismosão como ela. Embora admita quenão é assim, no parágrafo seguinteela diz coisas como “porque todas aspessoas autistas são visuais...”,quando, na verdade, alguns autistastêm sérias dificuldades deprocessamento visual e não são nadavisuais. Embora, como autista, euconsiga entender a maior parte do

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que ela diz, sei que muitos nãoconseguem.

Como muitos autores, liresenhas dos meus livros naAmazon.com. Esta resenha, de1998, foi uma das primeirassobre meu livro Thinking inPictures, e devo admitir quedoeu muito. Não a interpreteiexatamente como umamanifestação de ódio. Nãoachei que alguém estivessetentando me magoar, mastampouco levei a coisa nabrincadeira. Alguns autistas

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“não são nada visuais”? Seriaverdade?

Escrevi Thinking in Picturesporque havia percebido que omodo como eu enxergava omundo não era igual ao modocomo outras pessoas oenxergavam. Mesmo depois desaber que era autista, não acheique o autismo afetava o modocomo eu via o mundo. Quandocomecei a projetar instalaçõespara manejo de gado, nos anos1970, não entendia por queoutros projetistas nãoenxergavam erros óbvios —erros que eu via de relance.

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Pensava que eles eram burros.Claro, hoje entendo que elessimplesmente enxergavam omundo com pares de olhostotalmente distintos — ou, devodizer, com cérebros muitodiferentes. Então, eu estavaerrada. Nem todos pensam porimagens? Está bem. Mas aspessoas com autismo pensam.

Eu tinha bons motivos paraachar que todos os autistaseram pensadores visuais eapenas isso. Em 1982, quandoescrevia um artigo1 que maistarde foi publicado no Journalof Orthomolecular Psychiatry,

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encontrei vários artigos queapoiavam essa suposição. Umestudo informava que criançascom autismo pontuavamnormalmente nos testes deWechsler de desenho de blocos emontagem de objetos. Outroestudo dizia que crianças comautismo pareciam “terresultados ruins em testes queexigem aptidões verbais esequenciais, mesmo em testesque não empregam a palavrafalada”. Com base nestapesquisa e no modo como eu viao mundo, sentia-me confortávelcom minha conclusão: “Estudos

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de vários pesquisadores comcrianças autistas apontam anatureza visual e espacial damente autista.”

Bem, eu estava certa. É o queaqueles estudos indicavam. Mase aquele resenhista da Amazon— e outros resenhistas do siteque ecoaram sua queixa?

Desde a primeira resenha,pensei muito no tema dasdiferentes formas de pensar.Podemos conceber o cérebroautista como um depósito dealguns pontos fortes — acapacidade de perceber detalhes,de armazenar um grande

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número de informações nobanco de dados, de fazerassociações. Mas, claro, nemtodos os cérebros autistasenxergam o mundo do mesmomodo — apesar do que eupensava. Os cérebros autistastendem a possuir estes pontosfortes em comum, mas amaneira como cada indivíduo osusa varia. Que tipo de detalhes?Que tipo de informação? Quetipo de associações? Asrespostas a essas perguntasdependem do tipo de pensador,porque um cérebro focado naspalavras não vai chegar às

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mesmas conclusões que océrebro focado nas imagens.

Na verdade, minha busca melevou a propor uma novacategoria de pensador além dostradicionais verbal e visual.Neste momento, esta terceiracategoria é apenas umahipótese.2 Mas ela transformouo modo como vejo os pontosfortes dos autistas. E até recebicerto apoio científico para ela.

Há muitos anos eu vinha dandopalestras e havia feito umasuposição sem pensar muito:penso por imagens; sou autista;

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portanto, todas as pessoasautistas pensam por imagens.Para mim, aquilo fazia sentido.Se você disser a palavra trem,automaticamente vejo um tremde metrô em Nova York; o tremque atravessa o campus dauniversidade onde leciono; otrem que carrega carvão emFort Morgan, perto da minhacasa; o trem em que andei naInglaterra onde só podia ficarde pé, abarrotado de torcedoresde futebol que ocuparam todosos assentos e não deixaramninguém sentar durante toda ainfeliz viagem de quatro horas;

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o trem na Dinamarca ondecrianças me importunaram atéque a dona de uma banca dejornais as mandou embora.

No entanto, eu queriadescobrir se as pessoas comautismo na plateia pensavam domesmo jeito que eu. Então,comecei a perguntar aosouvintes que se aproximaram demim depois da palestra. “Qualera — ou qual é, se estivessefalando com uma criança — suamatéria preferida na escola?”Em geral, a resposta não eraaula de artes, como se esperaria

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de um pensador visual. Muitasvezes, era história.

História?, pensei. A históriaé cheia de fatos e os fatos estãocheios de palavras, e não deimagens.

Tudo bem. Os autistaspodem pensar em termos visuaisou verbais, como osneurotípicos. O resenhista daAmazon tinha razão.

Contudo, certo dia no iníciode 2001, recebi pelo correio asprovas do livro ExitingNirvana: A Daughter’s Lifewith Autism [Saindo doNirvana: a vida de uma filha

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com autismo],3 de ClaraClairborne Park. O editorqueria que eu escrevesse umasinopse para ele — umarecomendação para sair naquarta capa. Eu já sabia sobreClara e sua filha, Jessica, ouJessy. Ela nasceu uns dez anosdepois de mim, quando oconsenso médico sobre oautismo tinha mudado para abusca psicanalítica das feridaspsíquicas. Como Jessy era maisjovem que eu, Clara Park teveuma luta constante contra asautoridades médicas para fazeras pessoas entenderem que a

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fonte do comportamento da suafilha não estava na sua mente. Esim no seu cérebro.

Eu tinha escrito um poucosobre Jessy em Thinking inPictures; mencionei um artigocientífico de 1974 queexaminou o elaborado sistemade símbolos e números criadopor Jessy para conduzir suavida. As coisas que elaconsiderava muito boas, como orock, ganhavam quatro portas enenhuma nuvem. Coisas queconsiderava boas, como músicaclássica, ganhavam duas portase duas nuvens. A palavra escrita

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não tinha nenhuma porta mastinha quatro nuvens — a piorpontuação.

Quando recebi as provas deExiting Nirvana, fiquei curiosapara ler o livro. Contudo fiqueichocada com o que encontrei.

Eu sabia que Jessy era umaartista, mas nada tinha mealertado para o que vi naquelelivro. Sua arte era diferente detudo o que eu já vira. Erarepleta de cores psicodélicas —laranja e rosa e turquesa,verdes-claros e tangerinas eameixas vibrantes, quase emtons de néon. E ela as aplicava

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em objetos que nunca teriamessas cores. Os cabos de umaponte. As janelas de um prédiocomercial. A lateral de umacasa.

A que categoria pertenciaaquele tipo de mente? Visual ouverbal? Visual, obviamente.Mas a história não podiaterminar ali, porque sou umapensadora visual e certamenteeu não pensava daquele jeito.

Ela pintava os objetos do seudesenho em detalhesfotorrealistas a partir damemória, então estava claro quepodia pensar por imagens,

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assim como eu. Mas sua artenão era como meus desenhos; asfiguras que ela via mentalmentenão eram o tipo de figuras queeu via. Quando Jessy desenhavaum prédio, a ênfase estava nacor e nos padrões. Quando eudesenhava uma estrutura, aênfase estava nos detalhes dasdiferentes superfícies — tubosredondos, canaletas de cimento,cercas metálicas. Jessy devia terarquivos repletos de imagens namente, como eu, mas elamanipulava as imagens demodos que eu não conseguiaimaginar.

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Então, qual era seu tipo demente? Meu sistema de dividiro mundo do autismo empensadores por imagens epensadores por palavras/fatosmerecia uma pontuação denenhuma porta e quatronuvens?

Parei de olhar os desenhos ecomecei a ler. Concentrei-mefixamente em qualquer coisaque me desse uma pista decomo Jessy pensava. Na página71, li que ela gostava de buscarregularidades nas palavras. “Elapensava nelas, falava delas, asescrevia. Elf, elves; self, selves;

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shelf, shelves; half, halves etc. Àmargem do texto nesteparágrafo eu escrevi padrõesvocabulares.

Na página seguinte, a mãe deJessy, Clara, conta sobre umlivro que Jessy escreveu poucodepois de completar 14 anos.Era “uma comemoração dastransformações das palavras. Olivro era uma coisa bela, umtema e suas variações, quatropalavras em três cores: SING,SANG, SUNG, e SONG”.

No pé da página escrevipadrões vocabulares.

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“Os relógios tornaram-sefascinantes”, escreveu Clarasobre Jessy no capítulo seguinte,

quando ela aprendeu que osfranceses não contavam o tempo em12, mas em 24 horas. Ela desenhouum relógio de dez horas, outro de 12horas, um relógio de 14 horas, 16,18, 24 e de 36 horas. Converteu ashoras em minutos, os minutos emsegundos; as folhas que restaramregistram que 3.600 segundos = 60minutos = 1 hora. Ela desenhoucuidadosamente cada segundo.Agora, o tempo era algo com quebrincar. As conversões fracionadaseram tão rápidas que pareciamintuitivas: 49 horas = 21/24 dias.Logo ela estava mapeando o espaçoe o tempo: 7 ½ polegadas = 5/8 pés.

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Encontrar todos os padrões,rabisquei na margem.

Espere.Padrões.Por três vezes eu havia usado

esta palavra em apenas algumaspáginas.

Lembrei do teste de MatrizesProgressivas de Raven. Oindivíduo olha uma matriz oupadrão em que falta uma peça eprecisa escolher a que completao quebra-cabeça. Sei, peloExciting Nirvana, que aos 23anos Jessy tinha obtidopercentual 95 naquele teste.Então ela fez o teste de Matrizes

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Progressivas Avançado. Maisuma vez, obteve percentual 95.

Pensei também num trabalhode origami — a arte japonesaque vem das palavras “dobrar”e “papel” — que um garoto medeu ao final de uma palestra.Era diferente de todos osorigamis que eu tinha visto. Eujá havia feito figuras deorigami, mas usava uma folhade papel para cada uma e seguiainstruções simples queproduziam os desenhos maiscomuns, como o grou. Mas oorigami daquele menino estavarepleto de cores, cada uma de

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uma folha diferente, e odesenho era na forma de estrela.Fiquei tão impressionada que aovoltar para casa coloquei aestrela de origami num lugar dehonra no parapeito da janelapara vê-la todos os dias. Àsvezes eu a pegava para estudá-la.

A estrela tinhaaproximadamente 7 × 7 × 7centímetros. Tinha oito pontas.Cada ponta com três cores,mas, devido à minha memóriaoperacional ruim, tive deescrever isso para ter certeza deque tinha contado direito. Rosa,

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roxo, vermelho, verde-claro,verde-escuro, azul, amarelo,laranja. Oito cores, oito folhasde papel. As folhas estavaminterligadas e a base de cadaponta triangular fazia interseçãocom a base das outras pontastriangulares.

O menino correu para longedepois de me dar o presente,mas reparei que seus paisestavam ali. Perguntei-lhes pelofilho, e disseram que erasuperdotado em matemática.Fazia sentido. Era preciso umamente matemática para bolaruma estrutura tão complicada.

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Mas aquela obra de arte tãobela e sutil não seria tambémfruto de uma mente visual?Talvez, pensei um dia enquantocolocava o origami de volta noparapeito da janela, quem sejabom em matemática pense porpadrões.

Quando percebi que pensarpor padrões poderia ser umaterceira categoria, junto compensar por imagens e pensar porpalavras, comecei a verexemplos disso por todo lado.

Depois de dar uma palestranuma empresa de altatecnologia no Vale do Silício,

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perguntei às pessoas comoescreviam códigos. Elasresponderam que visualizavam aárvore da programação inteira edepois mentalmente escreviam ocódigo em cada ramo. Pensei:pensadores por padrões.

Lembrei da minha amigaautista Sara R. S. Miller,programadora de computador,que me dizia que conseguiaperceber irregularidades nopadrão de código. Então ligueipara minha amiga JenniferMcIlwee Myers,4 outraprogramadora autista.Perguntei-lhe se via os ramos da

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programação. Não, respondeu,ela não era visual daquelemodo; quando começou aestudar ciência da computação,tirou C em desenho gráfico. Eladisse que quando alguém faziauma descrição verbal, ela nãoconseguia “ver” a coisa. Ao leros livros de Harry Potter, nãoconseguiu entender os torneiosde quadribol; só entendeu o queacontecia ao assistir aos filmes.Contudo, ela disse que pensavapor padrões. “Escrever códigosé como fazer palavras cruzadas,ou sudoku”, disse.

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As palavras cruzadasenvolvem palavras, claro, aopasso que o sudoku usanúmeros. Mas o que eles têmem comum é o pensamento porpadrões. No documentárioWordplay, de 2006, um filmesobre palavras cruzadas, aspessoas que criavam osmelhores jogos erammatemáticos e músicos. Paramelhorar sua capacidade desolucionar o sudoku, énecessária uma percepção cadavez maior dos padrões no jogo.

Então, li um artigo sobreorigami na revista Discovery

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que me deixou maravilhada.Aprendi que há centenas deanos os padrões mais complexosdo origami só precisavam devinte passos e que,recentemente, os competidoresdo origami radical usamprogramas de computador paradesenhar padrões que exigemcem passos. E li esta passagemextraordinária:

O campeão dos origamis intrincadosé um autista savant japonês de 23anos chamado Satoshi Kamiya. Semajuda de software, ele produziurecentemente o que foi consideradoo ápice neste campo, um dragãooriental de 20 cm de altura com

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olhos, dentes, língua torcida, bigodessinuosos, rabo com espinhos e milescamas sobrepostas. A dobraduralevou 40 horas ao longo de váriosmeses.5

Como ele conseguiu essefeito? “Eu o vejo concluído”,disse ele. “Depois eu o desdobroem minha mente. Uma peça decada vez.” Padrões.

Em 2004, Daniel Temmetchamou minha atenção, e a demuita gente, ao bater o recordeeuropeu recitando o maiornúmero de dígitos de pi:22.514. Ele fez isso em cincohoras. Dá uma média de 75

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dígitos por minuto — mais deum por segundo. Depois, exibiuoutras aptidões: tornou-sefluente em islandês em apenasuma semana; sabia dizer em quedia da semana cairia uma datadistante; em entrevistas, disseque tinha sido diagnosticadocom síndrome de Asperger.Quando publicou seu livro,Born on a Blue Day [Nascidonum dia azul], naturalmentefiquei ansiosa para lê-lo.6

Ele explicou o título napágina 1: nasceu em 31 dejaneiro de 1979, uma quarta-feira — e, na sua mente, as

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quartas-feiras são sempre azuis.À medida que lia, aprendi queele achava os númerossingulares, cada um com suaprópria personalidade. Disseque tinha uma respostaemocional para cada númeroaté 10.000. Contou que via osnúmeros como formas, cores,texturas e movimentos.Explicou que conseguiamultiplicar instantaneamentedois números grandes — 53 ×131, por exemplo — sem fazermatemática, mas “vendo” asformas dos números sefundirem noutra forma, que ele

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reconhecia como o número6.943.

Padrões.Quis saber mais sobre como

ele pensava e encontrei umaentrevista em que explicoucomo aprendia línguas.7 Aoaprender alemão por contaprópria, por exemplo, percebeuque “coisas pequenas eredondas muitas vezescomeçavam com ‘Kn’” —Knoblauch (alho), Knopf(botão) e Knospe (broto).Coisas longas e finas muitasvezes começavam com “Str”,como Strand (praia), Strasse

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(rua) e Strahlen (raios). Eledisse que estava em busca depadrões.

Bem, certamente não sou aprimeira pessoa a perceber queos padrões fazem parte domodo como os humanospensam. Os matemáticos, porexemplo, estudam os padrões namúsica há milhares de anos.8Eles descobriram que ageometria é capaz de descrevercordas, ritmos, escala,mudanças de oitavas e outrascaracterísticas musicais. Emestudos recentes, pesquisadoresdescobriram que ao mapear as

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relações entre estascaracterísticas os diagramasresultantes têm uma formasemelhante à da fita deMoebius.

Claro, os compositores nãopensam nas suas composiçõesnestes termos. Eles não pensamna matemática. Mas de algummodo caminham em direção aum padrão matematicamentesólido, que é outro modo dedizer que é universal. Amatemática nem precisa existir.Quando estudiosos se debruçamsobre a música clássica,9descobrem que um compositor

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como Chopin escreveu músicasque incorporavam formas dageometria de alta dimensão queainda não tinha sido descoberta.O mesmo vale para as artesvisuais. As últimas pinturas deVan Gogh tinham todo tipo depadrões de remoinhos eagitação no céu — nuvens eestrelas que ele pintou como sefossem redemoinhos de ar e luz.E descobriu-se que eram issomesmo! Em 2006, físicoscompararam os padrões deturbulência de Van Gogh àfórmula matemática para aturbulência dos líquidos.10 As

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pinturas são da década de 1880.A fórmula matemática é dadécada de 1930. No entanto, aturbulência de Van Gogh no céuquadrava de modo quaseidêntico à turbulência noslíquidos. “Esperávamos algumasemelhança com a turbulênciareal”, disse um dospesquisadores, “mas ficamossurpresos ao encontrar umarelação tão próxima”.11

Até os salpicosaparentemente ao acaso queJackson Pollock despejava emsuas telas mostram que ele tinhaum sentido intuitivo dos

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padrões na natureza.12 Nosanos 1990, um físicoaustraliano, Richard Taylor,descobriu que as pinturasseguiam a matemática dageometria fractal — uma sériede padrões idênticos emdistintas escalas, como nasmatrioskas russas. As pinturassão das décadas de 1940 e 1950.A geometria fractal é dos anos1970. Este mesmo físicodescobriu que conseguiadistinguir um Pollock genuínode uma falsificação examinandoos padrões fractais na obra.

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“Às vezes a arte precede aanálise científica”, disse um dospesquisadores dos Van Goghs.Chopin escreveu a música queescreveu, e Van Gogh e Pollockpintaram os quadros quepintaram porque algo pareciaficar bem assim. E parecia bemporque, de certo modo, estavacerto. De alguma maneiraprofunda e intuitiva estes gêniosapreenderam os padrões danatureza.

A relação entre arte e ciênciatambém pode andar no sentidoinverso; os cientistas podemusar a arte para compreender a

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matemática. O físico RichardFeynman revolucionou seucampo na década de 1940 aocriar uma maneira simples dediagramar os efeitos quânticos:uma linha reta sólidarepresentava partículas dematéria ou antimatéria viajandopelo espaço e o tempo. Linhasonduladas ou em traçosrepresentavam partículas quecarregavam força. Quando umelétron movendo-se em linhareta emitia um fóton numalinha curva, a linha reta recuavapara a direita. De repente,equações que levavam meses

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para serem calculadas podiamser entendidas, mediantediagramas, em questão dehoras.

Em 2011, jogadores de umvideogame online chamadoFoldit13 solucionaram omistério da estrutura de cristalde uma protease retroviralmonomérica específica. Aconfiguração da enzima hámuito tempo iludia oscientistas, e a solução era tãoimportante que foi publicadanum periódico científico. O queera particularmente notável nofeito, porém, era que os

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jogadores não erambioquímicos. Mas certamentepensavam por padrões.

Os matemáticos distinguemos pensadores em algébricos egeométricos. Os pensadoresalgébricos enxergam o mundoem termos de números evariáveis. Os geométricos oveem em termos de formas.Sabe o teorema de Pitágoras? Éassim: a soma dos quadradosdos catetos é igual ao quadradoda hipotenusa.* Se for umpensador algébrico, você verá a2

+ b2 = c2. Mas, se for umpensador geométrico, verá:

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© Houghton Mifflin Harcourt/AcademyArtworks

E tem o xadrez. Sempre temo xadrez. Há um século oxadrez é a placa de Petri doscientistas cognitivos —pesquisadores que pensam sobreo pensamento. É fácil mensurara aptidão no xadrez, e por issoas classificações são tão precisase ele pode ser observado emambientes controlados comolaboratórios — a sala dotorneio.

O que faz de um mestre doxadrez um mestre?Definitivamente não são as

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palavras. Mas tampouco asimagens, que é o que se poderiapensar. Quando uma mestra doxadrez olha o tabuleiro, ela nãovê todas as partidas que jájogou para encontrar umajogada equiparável à que fez há3, 4 ou 20 anos. (Que éprovavelmente o que eu tentariafazer.) Uma mestra do xadreznão “vê” o tabuleiro de umapartida do século XIX queestudou atentamente.

Então, o que ela vê, se nãosão figuras? Você já deve terimaginado: padrões.

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O estereótipo do grão-mestrede xadrez é o de alguém quepensa várias jogadas à frente. Éverdade que muitos enxadristasarmam estratégias dessa forma.Magnus Carlsen,14 um prodígionorueguês que se tornou grão-mestre em 2004, aos 13 anos,calcula 20 jogadas adiante erotineiramente arma jogadascom as quais outros grão-mestres nem sonharam. Amaioria dos grão-mestresconsegue calcular muitasjogadas à frente, mesmojogando dezenas de jogos aomesmo tempo, indo de tabuleiro

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em tabuleiro num espaço deexibição.

Mas uma pista sobre comopensam vem de José RaúlCapablanca, o grão-mestrecubano.15 Em 1909 eleparticipou de uma exibição emque jogou 28 partidassimultaneamente e venceutodas. Sua estratégia, contudo,era oposta à de MagnusCarlsen.

“Vejo apenas uma jogadaadiante”, disse Capablanca,“mas é sempre a correta”.

Para os cientistas cognitivosnão há contradição entre as

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duas abordagens. Se oenxadrista imediatamente vêuma jogada que só poderáacontecer vinte jogadas à frenteou se a vê no contexto dajogada seguinte, a questão é queele a vê imediatamente.

Os grão-mestres a veem deimediato não por terem melhormemória que os enxadristascomuns. Segundo estudos quetestaram suas memórias, elesnão possuem memóriasnotáveis. Tampouco os mestrese grão-mestres veem a próximajogada de imediato porque suasmemórias oferecem mais

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possibilidades de onde escolher.Suas memórias realmentecarregam mais possibilidades,mas isso ocorre porque osmelhores enxadristas do mundojogaram mais que os demais. Oque eles coletam na memórianão são mais possibilidades,mas possibilidades melhores.Não é só a quantidade quecresce com o tempo. É aqualidade.

Contudo, mesmo que tenhamacesso a jogadas de melhorqualidade, isso não explica porque os melhores jogadoresconseguem ver imediatamente

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as próximas jogadas. A razão éque eles são melhores emreconhecer e reter padrões — oque os cientistas cognitivosdenominam chunks.

Um chunk é um conjunto deinformações inter-relacionadas.A letra b é um chunk, assimcomo a letra e, e a letra d. Aordem das letras em palavras oufrases também são chunks. Amemória média de curto prazode uma pessoa consegue reterapenas de quatro a seis chunks.Quando enxadristas superiorese iniciantes foram apresentadosa peças de tabuleiros sem

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sentido e depois lhes pediramque recriassem as posições daspeças de memória, membrosdos dois grupos conseguiramrecordar a localização de quatroa seis peças. Ao seremapresentados a peças emtabuleiros de xadrezverdadeiros, contudo, osmelhores enxadristasconseguiram recordar asposições das peças no tabuleiro,ao passo que os iniciantespermaneceram no nível dasquatro a seis peças. Ostabuleiros de verdadecontinham padrões familiares

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de peças e, para um grandejogador, cada padrãorepresentava um chunk. Para aolhada rápida de umespecialista, um tabuleiro com25 peças poderia ter quatro ouseis chunks — e o mestre ou ogrão-mestre conhece mais de 50mil chunks, o que quer dizermais de 50 mil padrões.

Michael Shermer, psicólogo,historiador da ciência e céticoprofissional (fundador darevista Skeptic), denomina estapropriedade da mente humana“padronicidade”. Ele a definiucomo “a tendência a encontrar

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padrões de sentido em dadoscom sentido e sem sentido”. Porque precisamos encontrarpadrões mesmo quando nãoexistem? “Não podemosevitar”,16 escreveu ele em TheBelieving Brain [O cérebrocrente]. “O nosso cérebroevoluiu para ligar pontos donosso mundo formando padrõesde sentido que expliquem porque as coisas acontecem.”

Na verdade, podemos tomardecisões ruins porque nossoscérebros nos forneceminformações ruins. Nossocérebro “quer” ver padrões e,

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como resultado, pode identificarpadrões inexistentes. Em umexperimento, por exemplo,pesquisadores observaram que,ao verem linhas que apontavamaleatoriamente numa tela decomputador e seremperguntados em que direção, namédia, as linhas apontavam, osindivíduos tendiam sempre a veruma direção mais vertical oumais horizontal que o real. Ospesquisadores formularam ahipótese de que nosso cérebro“quer” enxergar horizontal ouvertical porque é o queprecisamos ver na natureza. O

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horizonte nos indica aondevamos; o vertical nos indica quehá uma pessoa ereta vindo nanossa direção.

Mesmo que a capacidade deidentificar padrões na naturezanão seja infalível, ela éfinamente calibrada, e sem elanão estaríamos aqui. É partefundamental do nosso pensarpor imagens e palavras. Ospadrões parecem fazer parte dequem somos.

Pense na razão áurea: pegueuma linha e divida-a em doissegmentos desiguais. Se a razãodo comprimento total da linha

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com relação ao segmento maislongo for igual à razão docomprimento do segmento maislongo com relação ao segmentomais curto, diz-se que ambos ossegmentos têm a razão áurea.Arredondado, este número é1.618 e, há milhares de anos, osmatemáticos conjeturaramsobre sua “ubiquidade eapelo”,17 como escreveu oastrofísico Mario Livio em seulivro Razão áurea. “Biólogos,artistas, músicos, historiadores,arquitetos, psicólogos” oestudaram, escreveu. “De fato,talvez seja correto dizer que a

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razão áurea inspirou pensadoresde todas as disciplinas comonenhum outro número nahistória da matemática.”

Há mais ou menos umadécada, Jason Padgett, que tinhaabandonado a faculdade,18

sobreviveu a um ataque do ladode fora de um bar de karaokêem Tacoma, Washington. Foigolpeado na cabeça logo acimado córtex visual primário esofreu uma concussão. Um oudois dias depois, ele começou aenxergar o mundo como umafórmula matemática. “Vejofragmentos e traços do teorema

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pitagórico por toda parte”,disse ele. “Toda curva, todapequena espiral, tudo é partedaquela equação.” Ele se viuimpelido a desenharrepetidamente o que via, anoapós ano. O trabalho artísticoresultante eram fractaismatematicamente precisos —embora ele não tivesse nenhumtreinamento matemático nemtalento artístico anterior. Foicomo se os fractais estivessemno seu cérebro à espera deserem libertados.

Talvez estivessem. Em 1983eu tinha recortado um artigo da

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New Scientist que consideravaesta possibilidade.19 (Acho queo assunto dos padrões já meinteressava, embora não o tenhapercebido por quase duasdécadas.) O artigo se referia àpesquisa de Jack Cowan, ummatemático do Instituto deTecnologia da Universidade daCalifórnia, sobre alucinaçõesvisuais induzidas por drogas,enxaquecas, luzes piscantes,experiências de quase morte ouqualquer outro catalisador.

Em 1926, o psicólogoalemão Heinrich Klüverobservou que as alucinações se

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encaixavam em uma ou mais dequatro categorias básicas:quadrículas, como tabuleiros dexadrez e triângulos; túneis efunis; espirais; e teias dearanha. “As pessoas têminformado sobre isto... desdeque a história é registrada, e atéantes”,20 disse Cowan ementrevista. “Você vê isso empinturas rupestres e na arterupestre; todos parecem ver omesmo tipo de imagens e elasparecem ser muitogeométricas.”

Cowan formulou a hipótesede que, como as alucinações

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ocorriam independentementedos olhos, a fonte das imagensnão estava na retina, mas nopróprio córtex visual. “O queisso me indica”, disse ele, “éque quando você vê padrõesgeométricos, a arquitetura doseu cérebro deve refletir essespadrões e, portanto, deve sergeométrica”.

Cowan e outrospesquisadores continuaramtrabalhando nessa ideia nasúltimas três décadas, e hojeaceitam, como afirma umaresenha de 2010 na Frontiers ofPsychology, “a prevalência dos

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fractais em todos os níveis dosistema nervoso”.21

Pode-se dizer que todo ouniverso é fractal. Observe aestrutura em rede nas célulasneurais no cérebro, a rede quetransmite sinais elétricos equímicos. Depois observe aestrutura em grande escala douniverso, os grupos esupergrupos de galáxias queformam o que os astrônomosdenominam rede cósmica.Entrecerrando os olhos éimpossível distingui-las. Talveznão seja surpresa que oscosmologistas do Instituto

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Johns Hopkins de Ciência eEngenharia Intensiva de Dadostentem compreender acomplexidade da evolução darede cósmica aplicando osprincípios do origami.22

Ainda assim, me perguntei:existiria um pensador porpadrões de verdade? Opensamento por padrões mereceuma categoria própria? Será tãodistinto do pensamento verbal edo pensamento visual comoestes diferem entre si? Apesar detodas as evidências ao longo dosséculos sobre o pensamento porpadrões e apesar de pesquisas

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recentes sobre o pensamentopor padrões, as pessoas nãofalavam sobre isso. Ou sim?

Numa noite de sábado, fiz um“safári virtual”. É como euchamo quando faço umapesquisa grande e longa nainternet. Posso começar com umobjetivo em mente, mas depoissimplesmente sigo a trilha nafloresta, de um trecho depesquisa a outro. Naquelaocasião, meu objetivo eraencontrar artigos científicossobre um terceiro tipo depensamento. Logo de cara,

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claro, encontrei muitos artigossobre pensadores por imagens epor palavras. Durante quaseuma hora, foi tudo o que achei.Mas então — lá estava ele, numbelo preto e branco: “Evidencefor Two Types of Visualizers”[Evidências de dois tipos devisualizadores], dizia parte dotítulo do artigo.23 Não de doistipos de pensadores, o verbal eo visual, mas de dois tipos devisualizadores. Dois tipos depensamento visual. E quaiseram eles? O título de outroartigo da mesma autora trazia aresposta: “Spacial Versus

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Object Visualizers”[Visualizadores espaciais vs.visualizadores de objetos].24

Comecei a procurarrapidamente mais artigos destaautora e encontrei uns poucos.Mas quando fui ao índice decitações — a lista de outrosartigos que citavam estes artigos—, a trilha se extinguiu. Aquelepequeno conjunto de artigos eratudo: um novo ramo depesquisa estava encontrandoevidências empíricas queapoiavam minha intuição.

Esses artigos e eu usávamostermos distintos. O que eu

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chamava de pensador porimagens, os artigosdenominavam visualizador deobjetos, e o que eu chamava depensador por padrões, eleschamavam de visualizadoresespaciais. Mas estávamosdizendo a mesma coisa: o modoantigo de agrupar os pensadoresvisuais numa só categoria estavaerrado.

Esta categorização nuncatinha passado de umasuposição. Ela era sensível à suamaneira, mas não estavabaseada em evidências. Erasimplista: pensadores visuais

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são pessoas cujos pensamentosdependem de imagens. Bem, elessão assim. Jessy Park e euvemos o mundo medianteimagens. Daniel Tammet e euvemos o mundo medianteimagens. Mas certamente nãovemos o mundo do mesmomodo.

Telefonei para a autora cujonome figurava (ao lado dediversos colaboradores) emtodos aqueles artigos. MariaKozhevnikov era professoravisitante de radiologia naFaculdade de Medicina deHarvard quando falei com ela.

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A conversa, pensei, me dariaalguns insights sobre opensamento científico por trásda necessidade de uma terceiracategoria de pensamento. Nãome decepcionei.

Kozhevnikov disse quequando era candidata aodoutorado na Universidade daCalifórnia em Santa Barbara, nofinal dos anos 1990, tinhaestudado dados de testesespaciais — testes que pedempara manipular imagens noespaço, mais do quesimplesmente olhá-las —quando notou um artefato

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estranho.25 Os indivíduos que seidentificavam como pensadoresprincipalmente verbais e aquelesque se identificavamprincipalmente comopensadores visuais pontuavam,na média, praticamente amesma coisa nos testesespaciais. Aquilo era estranho.Era de se esperar que quempensa por imagens fosse melhorna manipulação de imagens doque quem não pensa destemodo.

Ela foi um pouco mais fundonos dados. Observou queenquanto a média nos testes

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espaciais do grupo dospensadores visuais erasemelhante à média do grupo depensadores por palavras, apontuação individual dospensadores visuais divergiasegundo dois extremos. Algunspontuavam muito bem. Outros,muito mal. Eram todospensadores visuais, mas algunsconseguiam manipularfacilmente os objetos no espaço,e outros, não.

“Era claramente umadistribuição bimodal”, disse ela.“Claramente. Nos dadosestatísticos era óbvio que havia

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dois tipos de pessoas que sedeclaram altamente visuais. Umgrupo tinha grande percepçãoespacial, o outro, muito pouca.E tive a ideia: talvez os doisgrupos sejam simplesmentediferentes.”

Então, usando técnicas deneuroimagem, pesquisadorestinham começado a estabelecera existência de dois caminhosvisuais no cérebro. Um é ocaminho dorsal (ou superior),que processa informações sobrea aparência visual dos objetos,como cor e detalhes. O outro éo caminho ventral (ou inferior),

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que processa informações sobrecomo os objetos se relacionamespacialmente. Esta visão dadivisão de trabalho no cérebrologo se converteu em ortodoxia.Em 2004, por exemplo,pesquisadores do centro deneuroimagem26 da Université deCaen e da Université RenéDescartes, na França,compilaram os resultados dediversos estudos PET feitos emseus laboratórios e viram que amaior ativação no caminhodorsal parecia corresponder àvisualização de objetos, e amaior ativação no caminho

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ventral parecia corresponder àvisualização espacial.

Obviamente, as pessoasusam os dois caminhos, edependem mais de um ou dooutro segundo a tarefa. Odesafio de Kozhevnikov eradeterminar se algumas pessoasusam mais um caminho que ooutro de modo consistente,independentemente da tarefa.Umas seriam pensadoras dorsais— imagens —, e outras,ventrais, — espaciais? À medidaque eu considerava estapossibilidade e quanto maisKozhevnikov pensava a respeito,

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mais ela fazia sentido.“Intuitivamente, isto seria deesperar”, disse ela, “porque aarte visual difere tanto daciência” — duas vocações quedependem do pensamentovisual.

Kozhevnikov contou-me queseu artigo original queapresentava a hipótese27 haviasido rejeitado por oito ou noveperiódicos pedagógicos. Oseditores diziam que talvez ospensadores visuais com baixapontuação nos testes espaciaisnão tivessem avaliadoadequadamente as próprias

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aptidões, talvez tivessemaptidões que não reconheciam,ou talvez ela não estivesselevando em conta diferenças degênero etc. Então, ela enviou oartigo a publicações depsicologia, que foi aceito.

Em 2005 ela publicou umartigo com dadoscomportamentais em quedefendeu a existência de doistipos de pensadores visuais —objetal e espacial.28 Ela e seuscolaboradores desenvolveramum SRQ (questionário deautorrelato)29 para distinguir osdois tipos de pensadores.

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Contudo ela sabia que ospsicólogos não ficariamsatisfeitos apenas com estudoscomportamentais ou comautorrelatos. Eles exigiriamevidências por meio deneuroimagens — e, em 2008,ela e sua equipe produziram umestudo de RMNf mostrando queos visualizadores espaciais eobjetais de fato empregavam oscaminhos dorsal e ventral emproporções distintas.30

Agora, o trabalho deKozhevnikov31 é amplamenteaceito em seu campo;32 elarecebe “toneladas” de convites

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para palestras sobre o tema, eos testes projetados por ela eseus colaboradores ao longo dosanos são muito usados nosEstados Unidos, especialmenteem seleção de pessoal eavaliações.

Perguntei-lhe se poderia fazerum teste, para compreendermelhor meu própriopensamento e o pensamento emgeral, e ela, generosamente,consentiu.

O primeiro teste se chamavaQVVI: Quociente de Vividez daVisualização de Imagens. Comoo nome sugere, ele pretende

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identificar até que ponto oindivíduo vê imagens em termospuramente visuais (em oposiçãoao espacial). Ele é dividido emquatro partes, e para cada umaeu tinha de imaginar uma figuradiferente. Uma parte me faziaimaginar um parente ou umamigo, outra, um sol nascente,a terceira, uma loja que eufrequentasse, e a quarta, umacena campestre que envolvesseárvores, uma montanha e umlago. Cada parte consistia emquatro aspectos da imagem(“Aparece um arco-íris”, porexemplo, ou “A cor e a forma

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das árvores”) que eu deviaimaginar e avaliar numa escalade 1 a 5 — de “Não háimagem” (você apenas ‘sabe’que está pensando num objeto)a “Perfeitamente claro e vívidocomo na visão normal”.

Suponho que não foisurpresa que eu tenha avaliadoem 5 quase todas as minhasimagens mentais. Quando li“Aparece um arco-íris”,imediatamente imaginei umarco-íris que tinha visto numhotel de Chicago alguns anosantes; eu tinha saído do hotelpara apreciá-lo melhor. Quando

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li “A fachada de uma loja quevocê frequenta”, vi o mercadoKing Scoopers; eu o vi de frente,vi quando entrava nele e viexatamente onde ficavam ascestinhas de compras.

Só não dei 5 a três dasquatro imagens envolvendoamigos. Uma me instruía a vero “contorno exato do rosto,cabeça, ombros e corpo” (grifomeu) e, puxa, eu os vi. E os viporque me pediram detalhesespecíficos. Dei 5 à imagem.Mas nas três imagens seguinteso teste pedia para ver aspectosmais gerais — um deles era “As

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diferentes cores de algumasroupas familiares” (grifo meu)—, e aí tive problemas. Deinota 2 às imagens que vinaquelas três questões — “Vagoe tênue”.

Entretanto, ao somar os 13cincos e os 3 dois, meu QVVIfoi de 71, num total de 80.Kozhevnikov escreveu que estetotal era “MUITO alto, no níveldos artistas visuais”, cuja médiaera 70,19.

Depois, fiz o teste deresolução de grão. “Grão édensidade”, explicaram osinstrutores, “definida

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aproximadamente como:‘número de pontos’ por área (ouvolume).” Por exemplo, pode-sefalar na granulosidade dasbolinhas da framboesa ou daspintas da onça. A framboesatem mais calombos que aspintas por unidade de área daonça. Pense na sua pelearrepiada e depois pense numacolher cheia de grãos de café.Qual tem o maior grau degranulosidade? Se tiverrespondido que a pele arrepiadatem mais granulosidade que osgrãos de café, maiores e soltos,acertou. E o queijo cottage e o

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algodão-doce? Se pensar nosaglomerados no queijo cottage enos grãos de açúcar do algodão-doce, saberá que o último émais granulado.

O segredo é ver. Oquestionário sobre grãos, comoo QVVI, é um teste devisualização objetal, e nãoespacial. Então, para mim foimoleza. Se você me perguntarqual dos dois é mais granulado,os briquetes numa pilha decarvão ou os buracos numacesta de basquete, eu vejo ocarvão atravessando o buracoda cesta de basquete. Se me

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perguntar qual dos dois é maisgranulado, uma raquete de tênisou um cacho de uvas, vejo quenão dá para fazer uma uva detamanho médio passar pelascordas da raquete de tênis semesmigalhá-la.

O teste consistia em vintepares como estes, e acertei 17num total de 20 — emboratenha anotado uma reclamaçãosobre uma resposta “incorreta”.Pavimento ou esponja? Aresposta chave era pavimento.Eu disse esponja, mas porquenão sabia a que tipo de materialde pavimento o questionário se

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referia! Diga-me o que querdizer com pavimento e eu lhedirei se é mais granulado queuma esponja. Asfalto ouconcreto? Quando se aplica oasfalto pode-se ver o material— a base composta departículas de várias substâncias.Elas podem ser bastantegrandes, maiores que os furosna esponja. Mesmo no concretoa mistura aparece na superfíciequando fica gasta. Pode apostarque, dias depois de fazer o teste,fui observar o pavimento. Olheitodo tipo de pavimentos. Trêspassos diante do meu prédio? É

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de concreto queimado — dotipo em que as partículas finasflutuam na superfície. Está bem,naquele caso a resposta dogabarito estava correta; oconcreto queimado é maisgranuloso que a esponja. Mas eno estacionamento? Eu tinharazão. Parada no sinal vermelhona Prospect Avenue, abri aporta do carro e olhei parabaixo. Sabe de uma coisa? Vouaumentar minha pontuaçãopara 18.

Onde errei? Na pele degalinha e na casca de abacate.Já vi muitos frangos crus em

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processadoras. O problema éque não cozinho, então nãotenho muita experiência nomanejo de abacates. E as fatiasde abacate que como na saladado restaurante estão, claro,descascadas. Para ter certeza deque entendi mal a comparação,fui ao supermercado e olhei umfrango cru e um abacate.Certamente a pele do frango émais granulosa, o oposto do queeu tinha respondido.

Com isso, restam a espumade barbear e o açúcar. Bem, hádécadas eu não usava espuma debarbear, então não sabia a

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resposta. Achei que era aespuma, errado. (Novamente,só para ter certeza, comprei trêstipos de espuma de barbear e fizum experimento comparativona cozinha. Não sei o que afuncionária do caixa pensou.)

Ainda assim, minhapontuação de 17 era “MUITOalta”, disse Kozhevnikov. Entreos artistas visuais, a média é11,75. Entre cientistas earquitetos, acrescentou, a médiaé menor do que 9.

Bem, aquilo me pareceumuito interessante. Duas vezespontuei no mesmo nível dos

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artistas visuais, e não no doscientistas. Mas eu sou umacientista. Contudo, tratava-se detestes de imagens objetais, eobjetos — figuras — são minhaprimeira natureza. O quemostraria o teste das relaçõesespaciais?

No primeiro teste que fiz,cada pergunta começava comuma série de ilustrações de umafolha de papel sendo dobrada.Digamos que a primeirailustração fosse de um pedaçode papel quadrado, a seguinte, afolha de papel sendo dobradapela metade de cima para baixo,

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a terceira, com a metade dafolha sendo novamente dobradaao meio, da esquerda para adireita. A ilustração final traziaum lápis fazendo um furo nametade da metade da folha. Odesafio era imaginar a folhasendo aberta de volta aotamanho natural e comparar afolha desdobrada na mente comas cinco ilustrações da página.Que ilustração de uma folha depapel com um furo ou furos eraigual à que eu via mentalmente?

Desta vez pontuei abaixo damédia — quatro num total dedez. Outra vez, porém, a

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pontuação se assemelhava à dosartistas visuais e era o oposto àde cientistas e arquitetos.

Depois, fiz o teste espacial.Ele trazia uma série de blocostipo Lego em diversasformações tridimensionais comângulos retos. Costumo me sairbem em testes de projetarblocos; acertei tudorecentemente ao participar deum estudo da Universidade deUtah. Acertei tudo. E na horaprevista. Mas naquele teste eupodia tocar e manipular osobjetos. O desafio no teste deKozhevnikov era girar

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mentalmente cada objeto edepois “ver” qual das cincoilustrações que oacompanhavam lhecorrespondia. Não conseguinem fazer o teste. Minhamemória de curto prazo é quaseinexistente, então, quandocomecei a girar o objeto noespaço mental, esqueci suaforma original.

Já pensei muito sobre o testede relações espaciais, escrevi aKozhevnikov. Saio-me bem emcertos tipos de testes visuais-espaciais. Expliquei queconseguia girar um objeto

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bidimensional — um desenhoplano — mentalmente. Se vocême mostrar o contorno doTexas de cabeça para baixo eme perguntar o que é, eu nãohesito: “É o Texas.” Mas nomeu trabalho não preciso girarobjetos. Quando visualizo umagrande instalação de manejo degado mentalmente, digitei no e-mail, os olhos de minha mentedão a volta nela toda.

Kozhevnikov considerou aresposta, enviou outro teste eme pediu para fazê-lo. Eraoutro teste de percepçãoespacial, mas desta vez sem

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precisar girar objetosmentalmente. Em vez disso, eutinha de mudar a perspectivacom relação a uma paisagem.

O teste utilizava o mesmodesenho várias vezes. Mostravauma variedade de objetosposicionados de formaaleatória, como se vistos decima — uma flor, uma casa, umsinal de pare etc. Eu tinha de(por exemplo) imaginar-meparada na flor, de frente para acasa, apontando para o sinal detrânsito — e depois desenhar oângulo para onde apontava meudedo num gráfico circular,

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colocando-me no centro. Sei quesou boa em discernir ângulos.Posso olhar uma rampa numestábulo e dizer: “Este é umângulo de 20 graus”, e estareicerta. Mas este teste exigia queme imaginasse pairando sobre acena e vendo os ângulos daperspectiva de uma pessoa láembaixo. Devo dizer que não éa mesma coisa estar no chão eolhar com os dois olhos. Aomenos consegui completar oteste. Não que isso importasse:tirei zero.

Os resultados não faziamnenhum sentido para mim.

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Quando aprendi a desenharprojetos, há muitos e muitosanos, dei a volta por toda afábrica de carnes Swift paracomparar cada linha da plantaoriginal do arquiteto com suaestrutura real correspondente.Por exemplo, um grande círculona planta era a torre de água, eum pequeno quadrado era umacoluna de concreto quesustentava o telhado. Esteexercício me ensinou arelacionar as linhas abstratas daplanta às estruturas reais.Quando faço um trabalho deremodelamento e preciso

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descobrir como encaixar novosequipamentos num lugarexistente onde algumas partesprecisam ser demolidas, passoquinze ou vinte minutos apenasolhando o lugar, até sentir quefiz o download completo dosdetalhes visuais na memória.Quando testo um equipamentomentalmente, me movo emtorno da imagem. Voo por cimadele, atravesso-o e circulo emvolta dele. Vejo todo ocomplexo do ponto de vista deum helicóptero e também doponto de vista de um animalque caminha no solo.

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Quando presto consultoriaou desenho um projeto inédito,perscruto a memória em buscade imagens similares. Parademonstrar como este processofunciona, pedi a Richard, meucolaborador neste livro, quesugerisse algo para eu desenharmentalmente. Ele disse “umacerca”.

“Cerca?”, respondi. “Quetipo de cerca? Para quê? Umacerca de gado? Uma cerca aolongo de uma estrada? Umacerca de uma casa? Cercas dearame farpado? De estacas? Detábuas de madeira? De ferro

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forjado? De postes para currais?Com laterais sólidas comonuma instalação para gado?”Todas surgiam como imagensna minha mente. “Não existeuma cerca.”

Não preciso dizer queRichard não é autista.

Ele tentou de novo. Disseque tinha visto na televisão oprojeto de uma ponte entreHong Kong e a China. EmHong Kong os carros trafegamdo lado esquerdo da rua(porque é uma ex-colôniainglesa) e no resto da China oscarros trafegam pelo lado

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direito. Como eu desenhariaesta ponte?

“Vejo pistas que se cruzam”,disse eu. “Vejo as pistas doautorama do meu irmãozinho.Vejo uma cesta de palhapendurada com um vaso deflores dentro. Agora vejorampas na autoestrada —especificamente rampas. Vejoestradas. Está bem”, disse,pronta para dar a resposta,“teria de ter uma passagem porbaixo, outra por cima, e asestradas se entrecruzam emudam de lado”.

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Richard me disse paraprocurar no Google ponteinversora. A imagem que vi natela do computador era a quetinha visto mentalmente.

Às vezes, quando douconsultorias, os executivos dasempresas me levam a uma salade reunião e mostram asespecificações do projeto; sento-me ali e passo o “filme”mentalmente. Vejo exatamentecomo o projeto será feito e digoalgo como: “Não vai funcionar.Vai fazer muita tração nascorrentes e arrancá-las do teto.”

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Usei esta técnica em algunsexercícios de um artigo deKozhevnikov e seuscolaboradores. O tema doartigo era como distintos tiposde mentes lidavam comproblemas da física. Umexercício (ver ilustração aseguir) pede para imaginar umdisco de hóquei avançando emlinha reta até ser direcionadopor uma tacada para o ângulodireito. Para onde irá o disco? Aresposta, que vi de imediato, erauma linha reta que partia doângulo da tacada. Vi porqueconseguia passar o filme.

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Um disco de hóquei avança em linha reta deA a B. Ao chegar, recebe uma forte tacadana direção da seta maior. Qual doscaminhos abaixo o disco seguirá? © DavidHestenes

A resposta é (B) — uma linha reta que fazângulo com a tacada. © David Hestenes

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© Maria Kozhevnikov

O mesmo ocorre com ooutro problema (ver ilustraçãoanterior): há uma bola no altode um poste num carrinho quevai em linha reta numa estrada.Se a bola cair do alto do poste

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no chão do carrinho, qual serásua trajetória da perspectiva dequem viaja no carrinho juntocom a bola? Vai parecer que abola se move de cima parabaixo. Qual será a trajetória daperspectiva de quem observa ocarrinho da lateral da estrada?Parecerá que a bola se movepara a frente enquanto viajajunto com o carrinho. Como seidisso? Porque passei o filmementalmente.

Quando imagino a bolacaindo do poste no chão docarrinho e me imagino viajandonele junto com a bola, vejo

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imediatamente um lápis caindodo painel de um carro emmovimento — e ele cai em linhareta. Então me vi de pé nocarrinho vendo a bola cair emlinha reta no chão do carrinho.

Escrevi para Kozhevnikov econfessei que estava confusacom o resultado do testeespacial. Quando fotografo dosolo, disse-lhe, possodeterminar o melhor lugar paraficar parada num telhado paraobter a melhor foto. Já fiz issocom equipes profissionais detelevisão e cinema. “Querem amelhor foto do gado?”, eu

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perguntava. “Subam no cantodaquele telhado e fiquem defrente para o curral deengorda.” Como é possível queeu não seja uma pensadoraespacial?

Kozhevnikov respondeu que,ao imaginar a cena no telhado,eu não estou manipulando umobjeto no espaço. Estoumanipulando a mim mesma noespaço. Estou visualizando umobjeto de uma nova perspectiva,mas continuo visualizando umobjeto. Continuo pensando porimagens. Quando faço umaplanta, remodelo uma fábrica

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ou desenho um projeto, meupensamento começa com aimagem de um objeto. Até meucinema mental começa comuma imagem fixa.

Por isso tive essa pontuaçãonos testes. Nos testes devisualização de objetos, eu tinhapontuado tão alto quantoartistas visuais, e até mais. Nostestes de visualização espacialpontuei pouco — tanto quantoartistas visuais, e ainda menos.Sou uma pensadora visual, e nosdois conjuntos de testes meuspontos foram notavelmentesemelhantes aos dos artistas

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visuais. Mas como explicar ofato de que sou cientista e que,onde pontuei alto, os cientistaspontuam baixo, e vice-versa?

Richard também fez ostestes. Ele pontuou bem nostestes espaciais — a dobradurade papel, a rotação mental, ofique parado na flor e olhe acasa e aponte para o sinal detrânsito. Mas o teste de grão foiproblemático; ele não conseguiunem onze num total de vinte.Não estava mal, mas não nacategoria de extrair imagens dedois objetos e compará-las,como eu faço. Como ele é

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escritor, ele se identifica comopensador por palavras. Os testesvisuais demonstraram que elepossui capacidades visuaissuperiores, similares às de umcientista. Então, não é deespantar que, embora não sejaum cientista, tenha seespecializado em escrever sobreciência.

A correlação entre como ostestes preveem como elepensaria e como ele realmentepensou era simples, direta eclara. Contudo os mesmostestes indicaram que eu era o

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tipo de pensadora que estavacerta de não ser. Por quê?

A resposta era o autismo.Encontrei um exercício em umartigo de Kozhevnikov contendoduas pinturas abstratas. Aprimeira consistia em grandesmanchas respingadas de cores; aimpressão geral do quadro eradinâmica. A segunda traziavários tipos de formasgeométricas; a impressão eraestática. Ao olhar a pinturadinâmica com os respingos, vide imediato um caça-bombardeiro que tinha vistonum livro que estava lendo. Ao

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olhar a pintura estática,imediatamente vi a cesta decostura da minha mãe.

“Que tipo de sentimentosisto desperta em você?”,perguntou-me Richard quandodiscutimos aquelas pinturas.

“Sentimentos?”“Que tipo de resposta

emocional você experimenta aover a cesta de costura da suamãe?”

“Nenhuma”, respondi. “Vejoa cesta de costura da minha mãeao olhar aquela pintura porqueela me parece igual à cesta daminha mãe. Vejo também uma

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salada que comi na semanapassada no restaurante ondegosto de almoçar às vezes. Elespõem cereais nas saladas em vezde croutons. Gosto daquelapintura, nela vejo mentalmentea cesta de costura da minha mãee vejo outra pintura, comcereais na salada.”

Porém eu entendia o queRichard queria dizer. Outrapessoa poderia ter uma ligaçãoemocional com a cesta decostura da mãe, objeto dainfância pleno de recordaçõescarinhosas. Na verdade, apesquisa de Kozhevnikov

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mostrou que, ao descrever asduas pinturas, os artistasempregavam termos emocionais— choque, rompimento, tensãoextrema.

Entendi que vejo como umaartista, mas não sinto comouma artista.

Em vez disso, minhasemoções funcionam como as deum cientista. Quando cientistasdescrevem as pinturas, usampalavras não emocionais —quadrados, manchas, cristais,pontas afiadas e cartela decores. Não quero dizer quecientistas e engenheiros não

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sintam emoções; tenho certezade que a maioria dos cientistas eengenheiros teriam algum tipode sentimento pelas cestas decostura das suas mães. Masneste estudo eles não viam ascestas de costura das mães nemqualquer outro objeto. Viamformas geométricas. Viam o queestava literalmente ali, e o quehavia ali não era o tipo deimagem que desperta respostasemocionais. Por outro lado, osartistas viam o que estavafigurativamente ali, e o queestava ali figurativamente era,de fato, o tipo de imagem que

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provocava alguma respostaemocional. Eu também vi o queestava ali figurativamente — sóque as imagens não provocaramem mim uma respostaemocional.

Como Michelle Dawson, quedescrevera os traços autistasnão como positivos ounegativos, mas como precisos,não atribuo uma respostaemocional a objetos concretos.Por isso sou capaz de manejá-los com objetividade —literalmente como objetos, eapenas isso. Não consigomanipulá-los no espaço. Não

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consigo submetê-los aoraciocínio espacial. Mas decertoconsigo desenhar um brete quefuncione.

Por isso eu nunca cometeriacertos erros de projeto, emboraisso aconteça com algunsengenheiros ao usarem opensamento visual espacial, maseu uso o pensamento visualobjetal, então sou capaz de veruma catástrofe antes que elaocorra. Os airbags nos carrosmataram muitas criançasporque os engenheiros seguiramcegamente uma especificaçãofalha — a de que, num acidente,

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a bolsa deve proteger umhomem adulto sem cinto desegurança. Se eu tivesseassistido aos vídeos dos testesde colisão teria visto facilmenteque os bebês não sobreviveriamao impacto do airbag. Durantea catástrofe japonesa dotsunami de 2011, a centralnuclear de Fukushima derreteuporque a onda que passou porcima do paredão de proteçãoinundou não só o geradorprincipal mas também os deemergência. E onde estavam osde emergência? No subsolo — osubsolo de uma usina nuclear

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localizada junto ao mar. Àmedida que lia descrições doacidente, eu via os geradores deemergência desaparecendo sob aágua. (Isto é parte do que façocomo consultora: vejo osacidentes antes que ocorram.)

Então, no final os resultadosdos meus testes eramcompatíveis. A correlação entrecomo eles prediziam o que euiria pensar e como eu realmentepenso era simples, direta e clara— sempre que eu fatorasse oautismo na equação: altavisualização objetal maisautismo é igual a mente

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científica, pelo menos no meucaso.

Agora que estava convencidade que a hipótese dos três tiposde mente fazia sentido, eu tinhade perguntar: isso pode ajudar océrebro autista?

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Nota

* Por falar nisso, não dê ouvidos aoEspantalho de O mágico de Oz depois queele recebe um cérebro. O que eleaparentemente tenta recitar é o teorema dePitágoras. Mas o que realmente diz é: “Asoma das raízes quadradas de dois ladosquaisquer de um triângulo isósceles é igualà raiz quadrada do lado que resta” — o queé uma bobagem. Pobre Espantalho.

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8 Das margens aocentro

Lembra do Jack? O garoto quedepois de três aulas esquiavamelhor do que eu conseguiriafazer depois de três anos,porque eu tinha o cerebelo 20%menor que o normal? Mas sabeo que eu conseguia fazer?Desenhar, projetar.

Às vezes, enquanto Jackpraticava esqui comdesenvoltura, eu ficava no alto

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da pista e me punha a trabalhar— o meu tipo de trabalho.Restaurei a plataforma doteleférico, instalei tábuas depinho e as envernizei;acrescentei uma borda branca;fiz uma linda placa com oescudo da minha escola. Pegueiuma cabana feia de compensadoe, porque sou quem eu sou,transformei-a em algo gracioso— graça que, também por serquem sou, nos meusmovimentos físicos eu nuncapoderia imitar.

Essa experiência foi umaprimeira lição de como aplicar

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meus pontos fortes. Naquelaépoca eu não me via como umapensadora visual, claro. Massabia que desenhar era algo quepodia fazer e o que faziamelhor. Então, era o que fazia.Usei o que a natureza me deu eexplorei ao máximo.

A relação entre nature enurture (natureza e criação dospais, ou ambiente) tem recebidomuita atenção na imprensapopular. A regra das 10 milhoras, em particular, parece teralimentado a imaginação dopúblico. Malcolm Gladwell,colunista da New Yorker, não

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criou a regra, mas popularizou-a em seu best-seller Fora desérie — Outliers.1 Na verdade,o princípio vem de um estudode 1993,2 embora em parte seusautores a tenham denominado aregra dos dez anos.Independentemente do nome,basicamente a regra diz que,para ser especialista emqualquer campo, é precisotrabalhar por pelo menos xtempo.

Não entendo o motivo daceleuma. Afinal, tem a velhapiada, “Como se chega aoCarnegie Hall?” “Praticando,

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praticando e praticando”, e não,“Nasça com talento e não façanada”. Mas acho que umnúmero grande e redondo dávida à equação e faz umafórmula para o sucesso parecercientífica de um jeito que sópraticar não faria. De qualquermodo, esta interpretação daregra me parece razoável.Talento mais 10 mil horas detrabalho é igual a sucesso?Talento mais dez anos detrabalho é igual a sucesso?Claro!

Mas muitas vezes não éassim que a regra é

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interpretada. Consideremos umartigo sobre a regra das 10 milhoras na revista Fortune.3 Foipublicado em 2006, mas ainda émuito divulgado na internet. Oartigo começa com o exemplode Warren Buffett, um doshomens mais ricos do mundo.“Como Buffett contou àFortune há pouco tempo, ‘desdeque nasceu ele estava ligado naalocação de capital’... Bem,pessoal, não é tão simplesassim. Em primeiro lugar,ninguém tem um dom naturalpara certo tipo de trabalho,porque não há dons naturais

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direcionados. (Sinto muito,Warren.)”

Talvez o problema aqui fossea palavra direcionados. Será queWarren Buffett tinha nascidopara ser especificamente umCEO? Teria nascido para dirigirum conglomerado colossalcomo o Berkshire Hathaway emvez de, digamos, trabalhar comcompra e venda diária de ativosfinanceiros? Não. Mas elenasceu com um cérebro para osnegócios — um cérebro que sepresta a cálculos e riscos, aidentificar oportunidades etodas as demais competências

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necessárias para se tornar oprincipal investidor de suageração? Eu diria que sim.

Certamente Buffett sededicou às suas 10 mil horas oudez anos de trabalho. Comprousuas primeiras ações aos 11anos, montou um negócio bem-sucedido de máquinas defliperama com um amigo aos 15anos e, antes de terminar oensino médio, já era rico osuficiente para comprar umafazenda.

Mas esta não é a trajetóriada carreira de alguéminteressado em negócios que

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quer se dedicar por 10 milhoras. É a trajetória de alguémque vive para fazer negócios.Pode-se dizer que é o caminhode alguém que nasceu para fazernegócios. Pode-se até dizer queé o caminho de alguém ligadonos negócios desde que nasceu.

Ao colocar ênfase na prática,prática e mais prática emdetrimento do talento natural, ainterpretação da regra das 10mil horas pela Fortune prestaum tremendo desserviço aosnaturalmente dotados.

Mas espere. A coisa aindapiora. Algumas interpretações

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da regra das 10 mil horasdeixam o talentocompletamente fora da equação.

Segue-se uma descrição daregra das 10 mil horas num sitechamado Squidoo (comunidademundial que, como aWikipedia, permite que osusuários criem verbetes curtossobre assuntos populares): “Sequiser tornar-se um especialistana sua área — seja ela arte,esporte ou negócios —, vocêpode. Ao contrário da crençapopular, nem sempre o gênionato fará de você um sucesso;são as horas dedicadas ao

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assunto, o que significa queQUALQUER UM podeconseguir.”

Bem, não é assim. Nem todomundo consegue. Vamos aoexemplo de Bill Gates emGladwell. No final dos anos1960, quando Gates aindaestava no ensino médio, tinhaacesso a um terminal deTeletype, e seu professor dematemática o dispensava dasaulas para que ele escrevessecódigos. Os códigos setornaram uma espécie deobsessão para Gates e, 10 mil

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horas depois... bem, vocêconhece a história.

Permita-me contar o outrolado da história. No final dosanos 1960, quando estudava noFranklin Pierce College, eutinha acesso ao mesmo terminalque Gates — exatamente omesmo terminal de Teletype. Osistema de computadores dafaculdade estava conectado aocomputador central daUniversidade de NewHampshire. Eu tinha todo oacesso que quisesse, aspossibilidades que quisesse, etudo de graça. Você pode

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apostar que eu queria passartodo o tempo possível naquelecomputador. Amo essas coisas;adoro ver novas tecnologias emfuncionamento. O computadorchamava-se Rax, e quando eu oligava saía uma mensagemimpressa em papel: Rax diz olá.Por favor, cadastre-se. Eu mecadastrava, ansiosa.

Era só. Eu conseguia fazeraquilo — mas era tudo.

Eu era nula. Meu cérebrosimplesmente não funciona paraescrever códigos. Então, é umaloucura dizer que se eu passasse10 mil horas falando com Rax

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eu seria uma programadora decomputação de sucesso, porquequalquer um pode ser umprogramador bem-sucedido.

Eu diria:

Talento + 10 mil horas de trabalho =sucesso

Ou, dizendo de outro modo:

Natureza + criação = sucesso

O Squidoo diz:

10 mil horas de trabalho = sucesso

Ou, dizendo de outro modo:

Criação = sucesso

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Dito assim, a interpretaçãoda regra das 10 mil horasparece ridícula. Como naanálise do sucesso de WarrenBuffett pela Fortune, ainterpretação do Squidoo éinjusta para com osnaturalmente dotados. Mas elatambém presta um enormedesserviço aos naturalmente nãodotados. Ela alça asexpectativas a um nível irreal.Nem todo o trabalho árduo domundo supera um déficitcerebral (como um cerebelo20% menor do que o normal).

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Neuroanatomia não édestino. Tampouco a genética.Elas não definem quem vocêserá. Mas definem o que vocêpoderia ser. Definem quem vocêpode ser. Então, o que pretendofazer aqui é concentrar-me emcomo o cérebro autista podeconstruir áreas de força real —como podemos realmentemudar o cérebro para ajudá-lono que pode fazer de melhor.

A ideia da plasticidade docérebro — de que nosso cérebropode criar novas conexões aolongo de toda a vida, não só na

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infância — ainda é muito novae, como muitas ideias novassobre o cérebro, devemos seuconhecimento às neuroimagens.Até o final dos anos 1990, oscientistas tendiam a pensar queao longo do tempo o cérebropermanecia basicamente omesmo e que até se deteriorava.Uma descoberta particularmenteconvincente que ajudou a mudaresta visão foi um estudo de2000 com taxistas londrinos.4Para obter uma licença, umtaxista em Londres precisaadquirir o que se denomina oConhecimento — a localização

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de cada beco da cidade e aforma mais rápida de chegar lá.Especificamente, ele precisamemorizar os nomes e alocalização das 25 mil ruas queirradiam do centro de Londres,tarefa que uma pessoa comumleva de dois a quatro anos paraaprender. O candidato a taxistaprecisa demonstrar esseconhecimento numa série detestes feitos ao longo de váriosmeses. Os testes consistem ementrevistas individuais comfiscais que indicam um ponto departida e um ponto de chegada;o trabalho do candidato é

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descrever a viagem, ponto porponto.

Um estudo de EleanorMaguire, neurocientistabritânica, analisou ressonânciasmagnéticas funcionais doshipocampos de 16 taxistaslondrinos. Acredita-se que ohipocampo abrigue três tipos decélulas que nos ajudam anavegar: células de lugar, quereconhecem pontos dereferência; células de direção,que dizem para que ladoestamos olhando; e células degrade, que dizem onde estamoscom relação a onde estávamos

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antes. Maguire descobriu que ohipocampo dos taxistas quetinham adquirido oConhecimento era maior do queo dos indivíduos do grupo decontrole. E mais, quanto maistempo o taxista tinha deprofissão, maior o hipocampo.

O que ocorre quando otaxista deixa o trabalho? Numestudo complementar, Maguiredescobriu que o hipocampovoltava ao tamanho natural.

“O cérebro comporta-secomo um músculo”, disseMaguire. “Use regiões docérebro e elas crescem.”

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Contudo, se você não usaruma região do cérebro, ela nãonecessariamente se atrofia. Osneurocientistas ficaramintrigados com um caso naÍndia: um homem quase cego denascença teve a visãorecuperada. SK (como eraconhecido) tinha afaquiacongênita, condição em que oglobo ocular se desenvolve semo cristalino. Ele tinha uma visão6/275 — isto é, conseguia ver aseis metros o que pessoas comvisão normal viam a 275metros. Para SK, o mundo erauma paisagem sombria. Quando

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tinha 29 anos, um médico lhedeu um par de óculos. Suaacuidade visual melhorou para6/36, mas os médicos nãosabiam se ele chegaria a definiro que via. Por exemplo, ele viamanchas de preto e branco, masse elas não se movessem, elenão percebia que eram asmanchas de uma vaca.Inicialmente, sua percepçãovisual era rudimentar. Elereconhecia alguns objetosbidimensionais e nada mais.

Por um tempo, a qualidadeda sua visão permaneceu nesseponto. A ausência de progresso

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não surpreendia, ao menossegundo a teoria neurológica deque o cérebro era uma janela deoportunidades onde a visão sedesenvolvia. Perdê-la — o quepara ele ocorreu muito cedo navida — é fechá-la para sempre.

Contudo, uns 18 mesesdepois de receber os óculos, SKconseguia reconhecer algunsobjetos complexos. Distinguiacores e níveis de brilho queantes não percebia. A vaca nãoprecisava mais se mexer paraque eu reconhecesse como tal.

Ele podia ver.

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O que mudara não fora suavisão, mas o modo como océrebro processava as imagens.Sua visão continuava sendo6/36, mas agora ele interpretavaas imagens de outro modo. Seucérebro precisou de tempo parase adaptar.

Por causa de SK, ospesquisadores tiveram dedescartar muitas ideias sobrecomo a visão se desenvolve nocérebro. Agora, tentam ajudarcrianças cegas com mais de 8anos de idade — o limitepadrão anterior. Eles terão dever o que as neuroimagens

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revelam. Como disse umcientista maravilhado: “Aspessoas podem aprender a usara visão que possuem.”

Não só áreas adormecidas docérebro “adquirem vida” efazem o que sempre deveriamter feito, como estas áreaspodem adquirir novospropósitos e fazer o quesupostamente não fariam.

Pesquisadores do Hospital deOlhos e Ouvidos deMassachusetts desenvolveramum método5 para pesquisar aatividade cerebral de pessoascegas de nascença. Funciona

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como um videogame. Osjogadores navegam por umprédio em busca de diamantes.Mas o jogo não usa imagens.Ele usa sons.

Os jogadores imaginam ondeestão e onde espreita o perigoao ouvir sobre o ambiente emsom 3-D, em vez de olhá-lo. Ospassos ecoam. Uma batidaindica a localização de umaporta. O som “ping” indica queo jogador esbarrou num móvel.Os diamantes tilintam cada vezmais forte à medida que ojogador se aproxima deles.

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A planta do labirinto naverdade corresponde a umprédio de escritórios localizadojunto ao laboratório de pesquisa— lugar que os jogadores nãovisitaram. Porém, quando elesacabam o jogo e entram noprédio, imediatamente sabemcomo mover-se por lá. Quandoum experimento similar foirealizado com crianças cegas ecrianças dotadas de visão emSantiago, no Chile (onde apesquisa começou), os jogadorescom visão nem perceberam quesupostamente deveriam estar“dentro” dos corredores de um

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prédio.Ao longo dos anos, os

cientistas têm usadotomografias, RMNf e máquinasde RMN para estudar o córtexvisual (que cobre de 30 a 40%da superfície cortical docérebro) de indivíduos cegos denascença. Eles descobriram queembora o córtex visual doscegos nunca tenha recebidoestímulos visuais, estava emuso. Ele fora reorientado pararealizar tarefas equivalentes àstarefas visuais, como leitura(braille), localização de sons,

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interpretação de linguagemcorporal etc.

Estes resultados condiziamcom o que os pesquisadores deMassachusetts encontraram aoobservar a atividade cerebraldos jogadores cegos de nascençado videogame. Eles tambémviram que um indivíduo dotadode visão usava o hipocampo, ocentro de memória do cérebro,na hora de tomar decisõesestratégicas. Já os cegos usavamo córtex visual.

Testemunhei habilidadesnotáveis no comportamento daminha colega de quarto, que era

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cega, no ensino médio. Eu achamava de “mestra dabengala”. Ela não queria umcão guia. Queria aprender a seguiar sozinha. E, puxa vida, elao fazia. Só era preciso guiá-lanum novo ambiente uma vez, elogo aprendia o caminho. Dolado de fora do dormitóriohavia um cruzamentomovimentado; ela se movia porali como qualquer pessoa comvisão. Agora vejoretrospectivamente o que elafazia e ao menos tenho umapequena ideia de como o fazia.De certo modo realmente via o

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ambiente à sua volta. Talveznão usasse imagens reais, masseu córtex visual lhe permitiaconstruir um mundo vívido,conhecível e navegável.

Uma mudança em uma partedo cérebro aparentemente podelevar a mudanças em outraspartes. Ajudei uma alunauniversitária disléxica a superarcertos problemas visuais com ouso de óculos de lentescoloridas. Deu certo — suavisão melhorou e ela foiclareando o tom das lentes aténão precisar mais delas. Mas acorreção da visão ajudou a

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corrigir outros problemas queaparentemente não tinhamrelação com isso. A organizaçãoda sua escrita melhorou. Derepente, passou a se expressarno papel com mais facilidade eclareza.

Não sei como meu própriocérebro mudou ao longo dosanos, mas sei que, à medida queminha carreira mudava, minhashabilidades também mudavam.Há mais de dez anos nãodesenho, em parte devido amudanças na indústria. Amáquina de fax foi a ruína dosbons desenhos arquitetônicos.

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Os clientes me diziam: “Ah,manda por fax”, e depoisusavam o fax como planta.Perdi a motivação para fazerdesenhos caprichados. Porém,ao mesmo tempo, minhasprioridades profissionaisestavam mudando. Eu mededicava muito mais a darpalestras e várias pessoas medisseram que meu jeito de falarestava ficando cada vez maisnatural. Aquilo era trabalhopesado. Eu sabia que precisavatreinar para ser alguém que nãoera natural, e o que é treinar

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uma nova habilidade senão“religar” o cérebro?

A geração de hoje tem sortenum aspecto importante. É ageração do tablet — a geraçãodo touchscreen que criaqualquer coisa. Já falei de comoesses aparelhos são umaperfeiçoamento doscomputadores anteriores porqueo teclado fica na tela; osautistas não precisam mover osolhos para ver o que digitam.Mas os tablets trazem outrasvantagens para a pessoa autista.

Em primeiro lugar, sãolegais. Um tablet não é algo que

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nos rotula como deficientes emrelação ao resto do mundo. Éuma coisa que as pessoasnormais carregam por aí.

Em segundo, sãorelativamente baratos. São maisbaratos até que os tradicionaisaparelhos de comunicaçãopessoal usados nas aulas dosautistas.

E o número de aplicativosparece ilimitado. Em vez de umaparelho com apenas algumasfunções, o tablet abre ummundo de oportunidadeseducativas. Claro que é precisoter cautela. Vi um aplicativo

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educativo que era visualmentelindo — ele usava ospersonagens do dr. Seuss — mascom uma abordageminconsistente. Quando se tocavana imagem de uma bola, otablet dizia “bola”. Mas, sefosse a de uma bicicleta, eledizia “brincar” e, se tocassenuma parede, dizia “casa”.Estas palavras são abstratasdemais. Ele precisava dizer“bicicleta” e “parede”. Mas osmelhores programas eaplicativos cumprem o queprometem, e podem ser de

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grande valia para ajudar os nãoverbais a se comunicarem.

Hoje pode-se obter toda aeducação online. Surgiramdiversos sites e ferramentas dealta tecnologia que oferecemoportunidades incríveis. Osnomes e objetivos destes sitescertamente mudarão ao longodo tempo, mas a seguirapresento alguns dos meusacessórios educativos favoritos,perfeitos para alguns cérebrosautistas:

Vídeos gratuitos. A KhanAcademy oferece centenas

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ou milhares de vídeoseducativos e gráficosinterativos em dezenas decategorias. Você é umpensador por padrões equer saber mais sobreprogramação decomputador? Tente acategoria software paraanimação. É um pensadorvisual? Navegue nascentenas de vídeos dehistória da arte que cobremmovimentos históricos,especialidades geográficas,artistas e obras.Cursos de um semestre. O

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Coursera oferece cursosgratuitos de mais de trintauniversidades. E elesmudam o tempo todo. Seufilho é fanático por ciênciae interessado no universo?Você tem sorte. Umprofessor da Universidadede Duke dá um curso deIntrodução à Astronomiade nove semanas, com trêshoras de vídeo semanais.Você é um pensador porpalavras/fatos que desejaescrever poesia? Aprendacom os mestres em PoesiaAmericana Moderna e

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Contemporânea, num cursode dez semanas de umprofessor da Universidadeda Pensilvânia. O Udacity éoutro portal para cursosgratuitos, neste caso comênfase na matemática.Dê uma olhada naspróprias universidades.6Acabo de escrever Stanforde cursos gratuitos no meusite de buscas e apareceuuma lista de dezesseiscursos disponíveis,inclusive Criptografia e umCurso Intensivo deCriatividade. Em 2012,

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Harvard, o MIT e aUniversidade da Califórniaem Berkeley criaram umaparceria sem fins lucrativospara cursos gratuitoschamada edX.Software para desenhos em3-D. Os programas sãográtis, fáceis de baixar etêm variados graus decomplexidade. Meufavorito é o SketchUp.Impressoras em 3-D. Osprogramas são gratuitos,como o SketchUp, e o preçodas impressoras estábaixando. Sim, elas são

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caras agora, quandoescrevo isso — cerca de2.500 dólares o modelomais barato, mas quefunciona perfeitamente.Porém, com a velocidadecom que a tecnologiamuda, provavelmente ele jábaixou para 2.400 dólaresenquanto escrevo esta frase.

Certamente não quero dizerque devemos deixar de lado anecessidade de trabalhar osdéficits. Mas, como vimos, ofoco nos déficits é tão intenso eautomático que as pessoas

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perdem de vista seus pontosfortes. Ontem conversei com adiretora de uma escola paracrianças autistas e elamencionou que a escola tentaempregar os pontos fortes dosalunos em estágios eoportunidades de emprego navizinhança. Mas quando lheperguntei como ela identificavaestes pontos fortes, elaimediatamente começou a falarde como eles ajudavam osalunos a superar seus déficitssociais. Se nem mesmo osespecialistas conseguem pararde pensar sobre o que está

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errado, em vez de o que poderiaestar melhor, como se podeesperar que as famílias quelidam com o autismodiariamente pensem de outromodo?

Fico preocupada quandocrianças de 10 anos vêm atémim e só querem falar sobre “aminha síndrome de Asperger”ou “o meu autismo”. Preferiaouvir sobre “meu projeto deciências” ou “meu livro dehistória” ou “o que quero serquando crescer”. Queroconhecer seus interesses, seuspontos fortes, suas esperanças.

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Quero que elas tenham asmesmas vantagens eoportunidades educacionais e nomercado de trabalho que eutive.

Encontro nos pais a mesmaincapacidade de pensar nospontos fortes das crianças edigo: “Do que seu filho gosta?”,“Em que ele é bom?”, e possover a perplexidade nos seusrostos. Gostar? Ser bom emalgo? O meu Timmy?

Nestes casos, sigo umarotina. Qual é o assuntofavorito do seu filho? Ele temalgum passatempo? Há alguma

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coisa que ela tenha feito —trabalho artístico, artesanato,qualquer coisa — que ela possame mostrar? Às vezes leva umtempo para os pais perceberemque, na verdade, seu filho temum talento ou um interesse. Umcasal me procurou recentementee estava preocupado porquesabia que o filho não seriacapaz de gerir o negóciofamiliar, uma fazenda. O queseria dele, já que aquele era oúnico mundo que ele conhecia?Bem, pode ser o único mundoque ele conhece, mas o garotonão era não verbal. Ele era

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funcional. Então, que partedaquele mundo lhe interessava?Quinze minutos depois, por fimeles disseram que o filhogostava de pescar.

“Então talvez ele possa serum guia de pesca”, respondi.

Eu quase podia ver aslâmpadas se acendendo acimadas suas cabeças. Agora os doistinham como repensar oproblema. Em vez de pensar sóem acomodar as deficiências dofilho, podiam pensar em seusinteresses, suas habilidades, seuspontos fortes.

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Para mim, o autismo ésecundário. Minha primeiraidentidade é especialista emgado — professora, consultora,cientista. Para manter intactaesta parte da minha identidade,separo regularmente trechos docalendário como “tempo dogado”. O mês de junho? Étempo do gado. A primeiraparte de janeiro? Tempo dogado. Não me comprometo compalestras nesses períodos.Certamente o autismo é partedo que sou, mas não deixo queele me defina.

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O mesmo ocorre com todosos casos não diagnosticados desíndrome de Asperger no Valedo Silício. Estar no espectro nãoé o que os define. É o trabalho.(Por isso eu os chamo de“Happy Aspies”, os aspiesfelizes.)

Claro, algumas pessoasnunca terão essa oportunidade.Suas dificuldades são gravesdemais para que consigam viversem cuidados constantes,mesmo que se esforcem muito.

Mas e os que conseguem? Eos que não conseguem, maspodem ter vidas mais

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produtivas se conseguirmosidentificar e cultivar seus pontosfortes? Como usar aplasticidade do cérebro a nossofavor?

Certo, um passo de cada vez.Começar do começo: comoidentificar os pontos fortes?

Um modo é aplicar o modelodos três modos de pensamentoque discuti antes: visual, porpadrões, por palavras/fatos.Penso que este modelo pode serde grande ajuda para a mudançada educação e dasoportunidades de emprego parapessoas com autismo.

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Educação

Quando dou palestras no Valedo Silício, vejo muitas pessoassolidamente localizadas noespectro autista e depois viajopelo país e falo em escolas evejo muitos garotos semelhantesque nunca terão a oportunidadede trabalhar no Vale do Silício.Por quê? Porque suas escolastentam tratar estas criançascomo se fossem todas iguais.

É um erro colocar criançasdo espectro na mesma sala deaula com não autistas e tratá-lastodas do mesmo modo. Para

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crianças do ensino fundamental,estar na mesma sala de aulacom colegas normais é bompara a socialização. O professorpode propor tarefas de altonível em temas em que a criançase sobressai. Mas se a escolatratar todos do mesmo modo,adivinhe: quem não for igual vaificar isolado. Essa pessoa serádiscriminada em sala de aula.Quando isso acontece, nãodemora para que o aluno sejadiscriminado para sempre —enviado para uma sala de aula àparte e até para uma escola àparte. E de repente o portador

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da síndrome de Asperger podeparar no mesmo programa dascrianças não verbais.

Se você tiver lido algumoutro livro meu ou assistiu aofilme da HBO sobre minhavida, saberá a enorme dívidaque tenho para com o sr.Carlock, meu professor deciências no ensino médio. Elemudou minha vida de váriasmaneiras ao identificar meuspontos fortes — mecânica eengenharia — e me ajudar aexplorá-los. Ele tinha um clubede modelagem de foguetes queeu amava. Ele despertou meu

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interesse por todo tipo deexperimentos eletrônicos.

Contudo, num aspectocrucial, seu pensamentoprovavelmente me bloqueou.

Quando o sr. Carlock disseque eu não conseguiria aprenderálgebra — simplesmente nãoconseguiria —, ele redobrou osesforços para fazer-me aprendê-la. Não entendeu que meucérebro não funciona do modoabstrato e simbólico necessáriopara resolver o x. Ele nãogostava de desistir de um aluno,e tenho certeza de que pensavaque estava me ajudando ao se

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esforçar tanto comigo naálgebra. Em vez disso, podia terreconhecido tanto minhalimitação nesta área eempregado minhas habilidadesem outro campo.

Meu talento para aengenharia devia ter sido apista. A engenharia não éabstrata, mas concreta. Elatrata de formas. Ângulos. Tem aver com geometria.

Mas não. O currículo padrãodo ensino médio diz que álgebravem antes de geometria, egeometria antes datrigonometria, e trigonometria

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antes do cálculo, e é assim. Nãoimporta que você não precisesaber álgebra para estudargeometria. Como muitoseducadores, o sr. Carlock estavapreso a um currículo e não sedava conta disso.

Quando comento a respeitoem palestras, pergunto sealguém teria uma experiênciaparecida. Sempre quatro oucinco mãos se erguem. Se umautista de 14 anos não consegueaprender álgebra porque éabstrata demais, você não diz:“Estude álgebra de qualquermodo.” Você tenta conduzi-lo

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para a geometria! Se outracriança não consegue aprenderálgebra, geometria ou qualquertipo de matemática, você nãodiz: “Você precisa aprendermatemática antes de aprender oresto.” Em vez disso, deixe-a àvontade no laboratório! Se umacriança não consegue escrever àmão, deixe-a usar o teclado.Quando uma criança como euinventa algo parecido com amáquina do abraço, você nãodiz: “Esta criança deveria sercomo os outros alunos” edestrói a máquina; você diz:“Esta criança não é como as

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outras; isto é um fato.” Otrabalho do educador — o papelda educação na sociedade — éperguntar: “Bem, como ela é?”Em vez de ignorar asdeficiências, é preciso se ajustara elas.

Há pouco tempo ouvi umamãe se queixar de que, como afilha não suportava o barulhono refeitório, o diretor permitiaque ela almoçasse na sala dosprofessores. A mãe estavachateada porque o diretor tinhasegregado a filha. Mas eu dissea ela que aquela era umasolução perfeita para o

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problema da filha. O diretorfora suficientemente sensívelpara perceber o que a filha delapodia e não podia suportar eencontrara uma saída criativapara sua deficiência.

Mas para realmente prepararcrianças para participar nocurso da vida, é preciso fazermais do que ajustar suasdeficiências. É preciso encontrarformas de explorar os pontosfortes delas.

Como fazer isso? Comoreconhecer os pontos fortes?Aqui, as três formas depensamento — por imagens,

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padrões e palavras/fatos — sãoúteis.

Recentemente conversei comum pai cujo filho, aluno doensino fundamental, eraexcepcional em arte, mas aescola queria desestimulá-loporque sua extrema dedicaçãoao desenho “não era normal”.Ele é um pensador porimagens!, pensei. Trabalhenisto. Não tente transformá-lono que ele não é ou, pior ainda,no que não pode ser. O que sedeve fazer é estimular sua arte— mas ampliar suaabrangência. Se ele desenha

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figuras de carros de corrida otempo todo, peça-lhe paradesenhar também a pista.Depois, peça-lhe para desenharas ruas e prédios ao redor dapista. Se ele conseguir fazerisso, sua fraqueza (pensamentoobsessivo em um objeto) setransformará em força (ummodo de entender a relaçãoentre algo simples como umcarro de corrida e o resto dasociedade).

A menos que a criança sejaum verdadeiro prodígio, não sepode saber que tipo depensadora ela é aos 2 anos. Na

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minha experiência, as evidênciasde predisposição ao pensamentopor imagens, padrões oupalavras/fatos só se apresentamno 2º, 3º ou 4º ano do ensinofundamental.

As crianças que pensam porimagens são as que se dedicam aatividades manuais. Gostam deconstruir com Lego, pintar,cozinhar, marcenaria, costura.Podem não ser boas em álgebrae outras formas de matemática,mas não tem problema. Pode-setrabalhar a matemática nasatividades manuais. Se a criançaestiver cozinhando, por

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exemplo, podem-se usar fraçõesna aula — meia xícara disto,um quarto de xícara daquilo.Podem-se ensinar formasgeométricas com o origami. Euteria aprendido trigonometriaconstruindo modelos de pontese testando-as pela destruição —experimentando com dimensõesde comprimentos diferentes,colocando-as em ângulosdistintos e vendo o pesonecessário para romper a ponte.(Lembre-se, o concreto é umpapel cartão adulto.)

Infelizmente, o sistemaeducacional atual está deixando

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as crianças na mão. Estáeliminando aos poucos as aulasde artes manuais, como osateliês — justamente o tipo deaula em que as criançasobsessivas sentem-se à vontadee soltam sua imaginação. Hápouco tempo estive numafábrica de processamento paraassistir a uma demonstração derobôs que fazem algumastarefas perigosas e difíceis.Perguntei quem programava osrobôs, e soube que isto era feitopor cinco pessoas na China e naÍndia. Perguntei por que nãousavam gente dos Estados

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Unidos. Disseram-me que eraporque nosso sistemaeducacional não produz mentesbrilhantes com a combinaçãoideal de engenharia elétrica eengenharia computacional.

É como se os que pensam porpalavras/fatos tenham seapossado do sistemaeducacional. Sei que a economiapode estar difícil e o dinheiro ésempre curto, mas estamosfalando do futuro de umageração — ou mais.

Assim como quem pensa porimagens, os que pensam porpadrões tendem a adorar o Lego

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e outros brinquedosconstrutivos, mas de outro jeito.Quem pensa por imagens quercriar objetos que se equiparemaos que veem mentalmente, aopasso que quem pensa porpadrões pensa em como aspartes dos objetos se encaixam.

Eu era péssima para entenderos problemas de física porescrito. Não conseguia nementender como armar osproblemas, porque eles exigiamdemais da minha memória detrabalho. Contudo, se tivesse deresolver um problema de físicahoje, eu saberia o que fazer.

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Conseguiria cinco livrosescolares, sentaria com umtutor e uma planilha,identificaria cinco exemplosespecíficos de problemas queusem uma fórmula e exemplosespecíficos de problemas queusem outra fórmula e no finalidentificaria os padrões nosproblemas.

No entanto um pensador porpadrão veria os padrões muitoantes. É o que os torna bons emmatemática e em música: elescaptam a forma por trás dafunção.

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Muitos pensadores porpadrão, mas não todos,gravitam ao redor da música.Para eles, ler é um desafio, masestão quilômetros à frente doscolegas de sala em álgebra,geometria e trigonometria. Éimportante que as escolas osdeixem trabalhar emmatemática nos seus própriosritmos. Se estiverem prontospara um texto de matemáticadois níveis adiante, devem obtê-lo. Jacob Barnett, na época umpré-adolescente de um subúrbiode Indianápolis, estava tãoentediado com as aulas de

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matemática que começou aodiar a matéria. Por fim,frustrado, sentou-se com ummonte de livros e em duassemanas aprendeu sozinho todoo currículo de matemática daescola. Então, foi para afaculdade — aos 12 anos.

Também é importante que asescolas permitam aos gêniosmatemáticos estudar a matériado seu jeito. Se conseguem fazê-lo mentalmente, não se devedizer: “Você precisa demonstraro que fez.” Que o façammentalmente. (Embora sejapreciso assegurar que não

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colem. Um simples teste na salade aula vazia, sem aparelhoseletrônicos, responde aquestão.)

Sabe-se quem são os quepensam por palavras/fatosporque eles o dizem. Recitamtodos os diálogos de um filme.Disparam estatísticasinfindáveis do beisebol.Lembram facilmente de todas asdatas importantes na história dapenínsula Ibérica. Suashabilidades matemáticas serãomédias, eles não se dedicarão aoLego e aos blocos de construirnem terão o menor interesse em

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desenhar. Na verdade, podenem fazer sentido forçá-los aparticipar da aula de artes.

Uma maneira de ajudar estetipo de pensador a se envolvercom o mundo é estimulá-lo aescrever. Dar-lhe tarefas.Estimulá-lo a postar na internet.(Em minha experiência, quempensa por palavras/fatos tende ater opiniões fortes, entãoconvém monitorar seu uso dainternet por questão desegurança — o que é um bomconselho na supervisão dequalquer criança.)

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Emprego

Todos os anos, só nos EstadosUnidos, cerca de 50 milpessoas7 diagnosticadas comTEA completam 18 anos. É umpouco tarde para pensar naidade adulta. Sempre digo aospais que quando seus filhos comTEA estão com 11 ou 12 anos,eles devem começar a pensar noque os filhos farão quandocrescer. Não é preciso tomaruma decisão, mas os pais devemcomeçar a considerar aspossibilidades para terem tempode preparar a criança.

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Como disse antes, mas nuncao suficiente: pais e cuidadoresprecisam colocar as crianças nomundo, porque elas não vão seinteressar por coisas com asquais não têm contato. Istopode parecer óbvio, mas todahora conheço pessoas comsíndrome de Asperger ouautistas de alto funcionamentoque terminam o ensino médio ea faculdade sem emprego. Seuspais os deixaram cair numarotina que nunca varia e nãotraz experiências novas. Eu sóme interessei por gado quandofui à fazenda de minha tia. Uma

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aula de psicologia experimentalno ensino médio com um montede ilusões óticas fascinantesestimulou meu interesse pelapsicologia e pelocomportamento do gado. Omundo está cheio de coisasfascinantes que podem alterarnossa vida, mas as crianças nãoirão adotá-las se não asconhecerem. (Até os autistascom problemas graves precisamver o mundo. Ver o capítulo 4para dicas de dessensibilização.)

Claro, uma criança com TEAnão precisa visitar uma tia emoutro estado para se inspirar.

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Também serve estar perto decasa. Não em casa, mas pertode casa. É essencial que acriança saia de casa e seresponsabilize por tarefas queoutros querem que sejam feitas— e que devem ser feitas naprogramação deles. Porque éassim que o trabalho funcionano mundo real.

Levar o cachorro parapassear. Ser voluntário numainstituição de caridade. Limparcalçadas, cortar grama, vendercartões de felicitações. Quandoeu tinha 13 anos, minha mãeconseguiu para mim um

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trabalho de costureira, duastardes por semana, na casa deuma modista que trabalhava emcasa. Eu gostava de me sentirútil. E gostava de ganhardinheiro. Foi a primeira vez queganhei dinheiro trabalhando ecomprei umas blusas malucas esuéteres de listras.(Infelizmente, mamãe as“perdeu” na lavanderia.)Quando estava no ensinomédio, trabalhava na fazendada minha tia nos verões.Embora eu falasse sem parar deassuntos que deixavam aspessoas entediadas, todos

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adoravam os arreios para cavaloque eu fazia.

Na verdade, as obsessõespodem ser grandes motivadoras.Um pai ou professor criativopode canalizar as obsessões parahabilidades relevantes para umacarreira. Se a criança gosta detrens, leia um livro sobre oassunto e ensine matemáticacom trens. Meu professor deciências usou minha obsessãocom a máquina do abraço paramotivar o estudo científico. Eleme disse que se eu queria provarque a pressão física erarelaxante, teria de aprender a

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ler artigos nos periódicoscientíficos para apoiar minhatese.

Nem todas as obsessões sãoiguais, claro. Vejo crianças tãoviciadas em videogames que nãose consegue interessá-las emnada mais — ainda que conheçauma mãe que estimulou odesenvolvimento de habilidadesartísticas no filho fazendo-odesenhar personagens devideogames. Se não for possíveltransformar o videogame numaoportunidade de aprendizado,ao menos ele pode ser limitadoa uma hora por dia (embora

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habilidades importantes parauma carreira, como programargames, possam ser realizadaspor períodos mais longos).

Mantenha os olhos abertospara as oportunidades e nãotenha medo de ser criativo.Outro dia, na mercearia, vi umarevista sobre frangos. Comecei afolheá-la e li um artigo sobrecomo criar galinhas no quintal.Isto é uma grande oportunidadepara os pais, pensei. Vocêcompra um casal de frangos, ede repente a criança tem um“trabalho” — ou, ao menos, aoportunidade de aprender todo

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tipo de habilidades que serãoúteis pelo resto da vida. Podemler sobre frangos juntos,aprender a cuidar deles,alimentá-los, limpar a área ondeestão. A criança pode atécomeçar um negócio — recolhero ovos, vendê-los aos vizinhos,recolher os pagamentos.

Claro, é sempre melhorquando se encontra umaoportunidade que encaixe com omodo de pensar da criança e aprepare para, mais tarde, entrarno mercado de trabalho fazendoo que sabe de melhor. O ideal éa criança ser preparada para um

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emprego que não só sejaprodutivo como também fontede energia e alegria (versugestões no final destecapítulo).8

Por exemplo, pensadores porpalavras/fatos se sairiam bemem tarefas em que possamescrever. Podem contribuir parao boletim da igreja. Podemcomeçar um blog sobre avizinhança. Ou mesmo escreverpara o jornal local. Afinal,alguém tem de informarquantos cães de rua foramrecolhidos pela carrocinhanaquela semana.

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Infelizmente, muitosempregos ideais para quempensa por palavras/fatos estãodesaparecendo. Preencher,arquivar são tarefas cada vezmais feitas pelos computadores.O truque, então, é deixar que ocomputador seja amigo dos quepensam por palavras/fatos.Muitos deles seriam ótimosfazendo pesquisas complicadasna internet e organizando osresultados.

Para os que pensam porpalavras/fatos seria proveitosoaprender a ser o que chamo desocial-comercial. Eles podem

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falar, mas precisam aprenderquando e como, seja saindopara o mundo e aprendendomediante inúmeros exemplos ousegundo treinamento notrabalho. Televendas, porexemplo, seria um bomemprego depois de aprenderemo roteiro. Não é porcoincidência que DonaldTriplett, o primeiro paciente deLeo Kanner, tenha se tornadocaixa de banco ao ficar adulto.

Um pensador por imagenspode produzir arte e vendê-la.Recentemente, depois de umapalestra, conheci uma

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adolescente que desenha joias.Entendo de joias, então possodizer com confiança: ela temtalento e é profissional. Disse aela que as vendesse online, edepois orientei a mãe dela acomo calcular preços justos: 20dólares por hora de trabalho,além do custo dos materiais.Por 125 dólares, o bracelete quevi seria uma pechincha.

O pensador por padrões queé bom em matemática podeconsertar computadores ouensinar as crianças davizinhança. Um pensador porpadrões dotado em música pode

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tocar numa banda ou participarde um coro — tecnicamenteestes não são empregosremunerados, mas sãotrabalhos, no sentido de queexigem cooperação com outrosmúsicos e um compromissoregular de tempo.

Em resumo, qualquer ofícioque ensine às crianças autistassobre responsabilidade asajudará a se preparar para aidade adulta.

Mas as habilidades para otrabalho são só a metade daluta. A pessoa com autismotambém precisa de habilidades

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sociais. Essas aulas tambémdevem começar desde cedo.Aprender a dizer “por favor” e“obrigado” é básico. O mesmocom relação a aprender aesperar sua vez; jogos detabuleiro e de cartas são bonsmétodos para ensinar isto. Bonsmodos à mesa também.Comportar-se numa loja ourestaurante. Ser pontual.

Mais uma vez, ponham estascrianças no mundo! Outro diaconversei com uma mãe quedisse que sua filha adulta nuncatinha feito compras namercearia. Como ela estará

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preparada para a vida adulta,especialmente se tiver de viversozinha, se não consegue ir auma loja? A mãe tinha poucosrecursos, então lhe expliqueique não ia pedir que gastassemais dinheiro que o necessário.“De qualquer modo, você vaicomprar alimentos”, disse eu.“Mande sua filha fazer isso.Entregue-lhe a lista de compras,algum dinheiro ou um cartão decrédito e mande-a à loja. Vocêpode ficar esperando noestacionamento.”

Minha mãe me obrigava acumprir algumas tarefas sociais

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de que eu não gostava. Lembrode ter medo de ir à madeireiraporque temia falar com osfuncionários. Mas mamãeinsistiu. Então eu fui, e volteipara casa chorando. Masconsegui a madeira que queria— além de uma nova habilidadesocial. Da próxima vez eu iria àmadeireira com menos temorese mais confiança.

O básico é só o começo — ashabilidades sociais são um dadopara qualquer um que entra nomercado de trabalho. Contudoos autistas muitas vezes

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precisam dominar habilidadessociais mais especializadas.

Lembro de dois colegas decolégio que, hoje, seriamrotulados com síndrome deAsperger. Um deles tem umPh.D. e um bom emprego naárea de psicologia. O outro sefirmou no setor de vendas novarejo e é um membroimportante da equipe, pois écapaz de conversar com osclientes sobre todos os produtosda loja. Na indústria de carnestrabalhei com muitos indivíduosbem-sucedidos que, tenhocerteza, têm síndrome de

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Asperger não diagnosticada.Numa fábrica que visitei, osaspies não diagnosticados nuncaentravam no refeitório; em vezdisso, comiam do lado de fora,numa mesa de piquenique.Certa vez visitei um laboratóriode pesquisa de piscicultura.Percebi que todos osequipamentos tinham sido feitosa partir de materiais disponíveisna Home Depot, a loja varejistada construção — filtros d’águafeitos de tela de mosquiteiro,por exemplo. O laboratório eraincrivelmente criativo, entãoclaro que perguntei quem era o

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responsável por todas aquelasinovações. Era um aspie nãodiagnosticado, que trabalhavana manutenção quando criouaqueles inventos — e tinhaascendido ao posto de diretordo laboratório.

Todas essas pessoas tiverama sorte de encontrar trabalhosonde puderam se desenvolver.Algumas, como o diretor dolaboratório de piscicultura,tinham entrado pela porta dosfundos. Mas ao menos ele soubeo que fazer depois de entrar.

Não sei se hoje isso seriapossível. Tenho conversado com

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muitos jovens com síndrome deAsperger que foram demitidos.No entanto sua condição nãoera mais ou menos grave do quea das crianças que conheci naescola, a dos aspies que sereuniam para almoçar, a dodiretor de pesquisa dolaboratório, ou a de qualquerpessoa no espectro que conheçoque conseguiu manter oemprego por décadas. Acho queé uma coisa de geração. Ageração mais jovem não sabe secomportar. Talvez as famílias ecuidadores das crianças quetiveram diagnósticos oficiais

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desde o acréscimo do TEA aoDSM, em 1980, tenham sefixado tanto no rótulo — e nasdeficiências — que acharam quenão precisavam dar atenção àshabilidades sociais necessáriaspara progredir na sociedade.Não quero soar como uma tiavelha que sempre fala de comotudo era melhor antigamente.Mas quando pergunto a essaspessoas por que foramdemitidas, descubro que nãosabem realizar tarefas simplescomo ser pontuais, ou quefaziam bobagens que aprendi anão fazer aos 9 anos.

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A seguir, meus conselhos —que dou a quem me perguntasobre como preparar alguémque está no espectro para umemprego.

Não arranje desculpas

Outro dia um aluno do ensinomédio queixou-se comigo deque tinha fracassado na aula deinglês devido a uma dificuldadede aprendizagem, e mencionouque tinha ido bem na aula defilosofia. “Espere um pouco”,respondi. “Escrever um artigoem inglês e escrever um artigo

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de filosofia exigem as mesmashabilidades. Não me diga quevocê tem dificuldade deaprendizagem em inglês.” Eleinsistiu que sim. Continuei apressioná-lo e, claro, por fimconfessou que não se interessavapor inglês, mas gostava defilosofia.

Em primeiro lugar, “Não meinteressa” não é desculpa paranão realizar uma tarefanecessária da melhor maneirapossível; só significa que épreciso se esforçar mais do quese ela fosse prazerosa. Mas“tenho dificuldade de

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aprendizagem” é uma desculpaainda pior se não for overdadeiro motivo.

Seja legal com os outros

Conheço uma mulher que vivediscutindo — com o motoristade ônibus, a funcionária doscorreios, com qualquer um.Diariamente. Claro, a culpanunca é dela. Sempre o outroagiu mal. Ela me disse isso e eupensei: Como você conseguebrigar com um motorista deônibus todos os dias? A maioriadas pessoas nem conversa com

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os motoristas! Ouçofrequentemente pessoas comsíndrome de Asperger dizeremcoisas como: “Tenho problemasde autoridade com minhachefe.” Quero dizer a essaspessoas que há uma razão parauma chefe ser chamada dechefe. É porque ela é a chefe.

Aprendi esta lição do modomais difícil. Durante afaculdade, fiz um estágio deverão num hospital que tinhaum programa para crianças comautismo e outros problemas, emeu chefe fez algo com umacriança de que não gostei. Não

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recordo o que era, mas lembroque pulei no pescoço dele.Queixei-me com odepartamento de psicologia, queera outro departamento. Ochefe não me demitiu, masdeixou claro que ficouaborrecido. Ele me explicou ahierarquia do hospital, disse queeu trabalhava no departamentode assistência à criança e que, setivesse uma reclamação, eudevia apresentá-la a ele emprimeiro lugar. Ele tinha razão.Nunca cometi o mesmo errooutra vez.

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Ser legal com os outros,porém, não é só evitarconfrontos. Também é aprendera tentar agradar. Mamãe memotivou assegurando-se de queeu obtivesse reconhecimentoquando fazia um bom trabalho— como quando ela emoldurouuma aquarela da praia que eutinha pintado. Outra vez, fuiautorizada a cantar um solonum concerto de adultos. Fiqueieufórica. Sabia que era umprivilégio especial, e quando aplateia reagiu com aplausos egritos, senti um orgulho imenso.No ensino médio pintei letreiros

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para muita gente. Aprendi quequando eu fazia um letreiropara o cabeleireiro, porexemplo, tinha de fazer o que ocliente queria. Foramexperiências que mais tarde useipara começar minha carreira deprojetista. Eu queria fazertrabalhos que as pessoasapreciassem de verdade.

Controle suas emoções

Como se faz? Aprendendo achorar. E como se aprende achorar? Permitindo-se. (Seestiver numa situação em que

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possa dar esta permissão aoutra pessoa, faça-o.) Não épreciso chorar em público. Nãoé preciso chorar diante doscolegas. Mas se a alternativa forpegar ou largar, então sim, vocêprecisa chorar. Quando pais mecontam que seu filhoadolescente chora quando sefrustra, eu digo: “Ótimo!”Garotos que choram podemtrabalhar para o Google.Garotos que quebramcomputadores não. Certa vez euestava numa conferênciacientífica e vi um cientista daNASA que acabara de descobrir

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que seu projeto tinha sidocancelado — projeto em que eletrabalhara por anos. Devia teruns 65 anos, e sabe de umacoisa? Ele estava chorando. Eupensei: é bom para ele. Por issoconseguiu chegar à idade daaposentadoria num trabalho deque gostava.

Do ponto de vista daneurociência, controlar asemoções depende do controle decima para baixo pelo córtexfrontal. Se você não controlasuas emoções, precisa mudá-las.Se quiser manter o emprego,precisa aprender a transformar

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a raiva em frustração. Li numartigo de revista que Steve Jobschorava de frustração. Por issoele ainda tinha um emprego.Podia ser verbalmente grosseirocom os funcionários, mas, peloque sei, não saía atirando coisasneles nem agredindo-os.

Aprendi a lição no ensinomédio. Briguei com alguém queestava me provocando e fiqueisem andar a cavalo por duassemanas. Foi a última briga emque me envolvi. Quando entreipara o negócio do gado, muitasvezes senti raiva, mas sabia quenão devia demonstrá-la. Em vez

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disso, me escondia no alto dapassarela do curral. Eu ficava àvista de todos, mas sabia queestava tão longe do chão queninguém podia me ver chorar.Ou me enfiava debaixo de umaescada, ou sentava no meu carrono estacionamento. Às vezesentrava na sala da eletricidade,porque aquele adorável aviso naporta dizia a todos: NÃOENTRE. Mas nunca me escondino banheiro, porque ali nuncase sabe quando alguém podeentrar.

Tenha bons modos

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Quando eu tinha uns 8 anos,aprendi que não se deviachamar ninguém de balofo.Conheci muitos autistas de altofuncionamento e gente comsíndrome de Asperger queforam demitidos porque tinhamfeito comentários indelicadossobre a aparência de colegas eclientes. Mesmo que você tenhachegado à idade adulta semsaber o que é grosseiro e comose relacionar com as pessoas empúblico, nunca é tarde paraaprender.

Conheci alguém que me disseque o conselho do seu terapeuta

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para aprender a socializar erapraticar dizer “olá”. Respondique este conselho não erasuficientemente específico.Disse-lhe para não fazer todasas compras do supermercado deuma vez só, para ser obrigado air lá diariamente, mesmo quefosse para comprar uma lata desopa. Quando chegasse aocaixa, devia iniciar umaconversa simples.

Venda seu trabalho, não asi mesmo

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Se puder evitar a entrevista naporta de casa, faça-o. Osdepartamentos de recursoshumanos costumam sergerenciados por pessoassociáveis que tendem a premiara camaradagem e o trabalho emequipe, então eles podem pensarque uma pessoa com autismonão é adequada para o trabalho.Eles podem não enxergar ostalentos individuais por trás doembaraço social. Uma estratégiamelhor para obter um empregoseria entrar em contato com oresponsável pelo departamentoem que você quer trabalhar (o

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departamento de engenharia, o

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departamento de desenhográfico etc.).

As pessoas me achavamesquisita, mas ficavamimpressionadas quando viammeu portfólio com desenhos efotos dos projetos concluídos.Eu usava folhetos e portfóliosatraentes para vender meusserviços. Hoje os dispositivoseletrônicos podem eliminargrande parte doconstrangimento de mostrar seutrabalho e até ser entrevistadopara um emprego. Você podeanexar seu trabalho a um e-maildepois de fazer contato com o

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possível empregador (mas nãoantes — ninguém vai abrir oanexo de e-mail de umdesconhecido). Você podeguardá-lo no smartphone,porque nunca se sabe quandoalguém vai querer vê-lo. Oportfólio de textos de umpensador verbal, a arte ou oartesanato de um pensador porimagens, as gravações de ummúsico, até os códigos de umgênio matemático — tudo isso éportátil hoje em dia.

Use mentores

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Quando estava no ensinomédio, eu era uma alunadesmotivada que raramenteestudava. Não via razão paraestudar até o sr. Carlock instilarem mim o objetivo de me tornaruma cientista. Conversei comvários profissionais bem-sucedidos, diagnosticados ounão com síndrome de Asperger,que me disseram que só tiveramêxito porque contaram com oapoio do pai, mãe ou umprofessor para instruí-los e,talvez, inspirá-los. Por exemplo,jovens com síndrome deAsperger ou autistas altamente

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funcionais podem brincar comcomputadores, mas precisarãode um mentor para ajudá-los ase concentrar e aprenderprogramação.

Tudo bem, digamos que acriança autista teve umaeducação que identificou edesenvolveu seus pontos fortes.Digamos que esta criançacresceu e entrou num mercadode trabalho que aprecia suascompetências particulares. Issoé ótimo para ela. Mas sabe oque mais? Também é ótimopara a sociedade.

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Não só é possível terdiferentes tipos de pensadoresfazendo o que melhor sabemfazer como eles podem executá-lo junto com outros tipos depensadores que fazem o que elesmelhor sabem.

Quando recordo ascolaborações de que participei,percebo que diferentes tipos depensadores trabalharam emconjunto para criar um produtoque era maior do que a somadas suas partes. Penso notrabalho que fiz com uma aluna(não autista) que era boa emtudo aquilo em que eu era ruim.

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Bridget era excelente emestatística, muito organizada euma incrível coletora de dados earquivista — alguém em quemeu podia confiar para fazer bemo experimento. Um experimentoque fizemos juntascorrelacionava a excitabilidadedo gado no brete e seu ganho depeso. Usamos doisobservadores, e elesclassificavam o comportamentodo rebanho numa escala de 1 a4, sendo 1 para calmo e 4 parafurioso. Um dia, Bridget medisse: “Dra. Grandin, acho quenão estamos conseguindo

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resultados úteis.” Então repasseimentalmente o “filme” doexperimento e vi que osobservadores pareciam ter doispadrões distintos do que era ocomportamento furioso. Bridgete eu descobrimos que um delestinha uma porcentagem muitomais alta de avaliações do tipo4. Posso projetar experimentose detectar falhas na metodologiaporque meu pensamento visualme permite ver o que quero doexperimento e onde ele falhou.Mas preciso de alguém quepense por padrões, comoBridget, para fazer a análise

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estatística e registrar oexperimento meticulosamente.

Penso na construção para orebanho. O pensador porpadrões — o engenheiroformado — não projeta afábrica. O pensador visual —desenhista —, sim. Oengenheiro só começa atrabalhar quando o desenhistatermina de projetar o piso daempacotadora e do matadouro,então ele calcula a cumeeira,especifica a concretagem,calcula os vergalhões. A parteda fábrica que uma desenhistaque conheço — eu mesma —

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não desenha é a refrigeração.Por quê? Porque exigedemasiado pensamento porpadrões e não sei desenhá-lacorretamente — matemática eengenharia abstratas demais. Seio suficiente de refrigeração paraficar longe dela.

Penso em Mick Jackson,diretor do filme da HBOTemple Grandin. Se vocêassistir a um filme anterior dele,a comédia com Steve Martin,Viver e amar em Los Angeles,verá que ele não tem muitaestrutura. Isso é porque Mick éum pensador visual, e não por

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padrões. Quando estavatrabalhando no meu filme, eleconhecia seus pontos fortes eem que precisava de ajuda,então, toda vez que ele queriamudar algo no texto, consultavaum dos roteiristas, ChristopherMonger. Este era um pensadorpor palavras, claro, mastambém pensava por padrões econseguia perceber o efeito decada pequena mudança naestrutura geral. O filme ganhoumuito por ter sido criado portrês tipos de pensamento.

No capítulo anteriorcomentei que, ao apreender o

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pensamento por padrão,comecei a vê-lo por toda parte.O mesmo ocorre com exemplosde como os três tipos depensamento operam emconjunto. Agora os vejo não sóna minha experiência, mas poronde olhe.

Ao ler uma entrevista deSteve Jobs,9 encontrei estacitação: “O que eu gosto naPixar é que é exatamente comoo LaserWriter.” O quê? O maisbem-sucedido estúdio deanimação na memória recente é“exatamente como” uma peçade tecnologia de 1985?

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Ele explicou que quando viua primeira página impressa noLaserWriter da Apple — aprimeira impressora a laser queexistiu —, ele pensou: Estacaixa tem uma incrívelquantidade de tecnologia. Elesabia qual era a tecnologia, etambém do trabalho usado nasua criação, e sabia como erainovadora. Mas ele sabia que opúblico não ia ligar para oconteúdo da caixa. Só o produtoiria importar — as belas fontesque ele assegurou que fariamparte da estética da Apple. Estaé a lição que ele aplicou à Pixar:

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você pode usar todo tipo denovos softwares para criar umnovo tipo de animação, mas opúblico não vai ligar para nadaque não seja o que vê na tela.

Ele tinha razão —obviamente. Embora não usasseos termos pensador por padrãoou pensador por imagens, eranisso que estava pensando.Naquele momento, em 1985,ele compreendeu que sãonecessários pensadores porpadrões para criar os milagresdentro da caixa e os pensadorespor imagens para tornar belo oque sai da caixa.

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Não consigo olhar um iPodou um iPhone sem lembrardaquela entrevista. Agoraentendo que quando a Apple fazalgo errado é porque nãoconseguiu o equilíbrio perfeitodos dois tipos de pensamento.O conhecido problema daantena no iPhone 4? Artedemais, pouca engenharia.

Compare esta filosofia com oGoogle; garanto que as mentespor trás do Google pensam porpadrões. Até hoje o Googleprefere a engenharia à arte.

Estes exemplos demonstramque, na sociedade, os três tipos

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de mentes naturalmente secomplementam. A sociedade osjunta sem que ninguém pensenisso. Mas, e se pensarmos? Ese reconhecermos essascategorias de modo consciente etentarmos fazer as diferentescombinações trabalharem anosso favor? E se cada um denós pudesse dizer: Ah, este émeu ponto forte, este é meuponto fraco — o que possofazer por você, ou o que vocêpode fazer por mim?

Quando Richard e eucomeçamos a colaborar paraeste livro, vimos que

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trabalhávamos bem emconjunto. Mas ao desenvolver aideia dos cérebros ligados emdistintas formas de pensar,entendemos por quetrabalhávamos bem juntos.Richard é um pensador porpadrões e por palavras, e eu,uma pensadora por imagens.Como percebemos quecomplementamos os pontosfortes um do outro, temosconseguido explorá-los muitomais do que se tivéssemos feitode outro jeito.

Sempre digo a Richard:“Você é o cara da estrutura” —

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sua capacidade de organizar osconceitos no livro compensaminha debilidade nessa área.Quando leio os artigos queescrevi na década de 1990, ficoconstrangida ao constatar queestão organizados ao acaso. Osconceitos não se sucedem numaforma lógica. Simplesmente seagrupam de modo aleatório —um pouco à medida que vinhamà minha mente enquantoescrevia. Com o tempo melhoreina estrutura, mas sei que nuncaserei igual a Richard. Quandoele me diz que um conceito que

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estivemos trabalhando pertenceao capítulo 6, eu digo: “Ok.”

Bom. É bom para nós.Mesmo que eu não fosseautista, faríamos uma boaequipe, pois nossas mentes secomplementam. Mas o fato éque sou autista, e os pontosfortes que trago para acolaboração são forçaspertinentes ao meu tipo decérebro autista — a associaçãorápida, a memória de longoprazo, o foco nos detalhes.

Apliquemos este mesmoprincípio ao mercado detrabalho. Se as pessoas

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reconhecerem conscientementeos pontos fortes e fracos no seumodo de pensar, podemprocurar o tipo certo de mentespelas razões corretas. Se fizeremisso, reconhecerão que às vezesa mente certa só pode pertencera um cérebro autista.

Discutimos como os cérebrosautistas parecem ser melhoresna observação de detalhes queos cérebros normais. Seconsiderarmos estacaracterística não como umsubproduto mas simplesmentecomo o produto da má conexão— o tipo de argumentação que

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Michelle Dawson faz nocapítulo 6 —, poderemos verque ele traz uma vantagempossível em algumascircunstâncias. Se percebermosque enxergar as árvores antes deenxergar a floresta pode fazeralguém ser melhor paravisualizar certos tipos depadrões, então nosperguntaremos em que estahabilidade pode ser útil. Equando vemos que os escâneresde segurança dos aeroportosprecisam captar detalhesrapidamente, aí está: umemprego.

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Ao cultivar a mente autistacérebro por cérebro, ponto fortepor ponto forte, podemosrepensar os adolescentes eadultos autistas em empregos eestágios sem um esquemacaritativo, como gente valiosa eaté essencial que contribui paraa sociedade.

Alguns empreendedores jáderam este salto. A Aspiritech,10

no subúrbio de Highland Park,em Chicago, e a Specialisterne,em Copenhague, empregamprincipalmente autistas de altofuncionamento e indivíduoscom síndrome de Asperger para

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testar software. Seus cérebros— programados para suportar arepetição, focar atentamente erecordar detalhes — sãoexatamente o que o trabalhorequer. O filho do fundador daAspiritech foi diagnosticadocom Asperger aos 14 anos, e jáadulto foi demitido do empregode empacotador desupermercado. Mas quando setrata de testar software, ele é ocara.

Em 2007, a rede Walgreensabriu um centro de distribuiçãoem Anderson, na Carolina doSul, com uma força de trabalho

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com 40% de pessoas comdeficiências, incluídas as doespectro autista. A ideia foi deRandy Lewis, vice-presidente darede de varejo que era pai deuma criança autista. Graças atelas touchscreen e estações detrabalho flexíveis, osfuncionários com deficiênciatrabalham lado a lado com oscolegas “normais”. Quando aWalgreen percebeu que estecentro era 20% mais eficienteque os demais centros daempresa, expandiu a filosofiapara outro centro de

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distribuição em Windsor, emConnecticut, em 2009.11

Mas não é preciso que umagrande empresa com políticasde emprego esclarecidasconstrua uma filial perto devocê. Os pais podem levar osfilhos autistas a uma loja ourestaurante das redondezas.Conversar com o dono ou ogerente e ver se têm umtrabalho adequado ao nível deaptidão do jovem. Se uma portase fechar, depois outra e maisoutra, “continue batendo”.12

Esse conselho é uma cortesiade Savino Nuccio D’Argento —

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conhecido como Nuccio. Ele(com um sócio) é dono doVince’s, um restaurante italianono subúrbio de HarwoodHeight, em Chicago. Nucciotem um filho autista, Enzo, epor meio de seus contatos naEaster Seals de Chicago, umaONG voltada para asnecessidades de pessoas comdeficiência, empregaregularmente adultos comautismo. Ele também abre asportas para programas detreinamento de crianças emidade escolar; eles aprendem aaspirar, pôr a mesa, encher

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saleiros — o tipo de tarefas queajudam a preparar alguns delespara entrar no mundo adulto.

“Para outras pessoas seria,‘Ah, odeio este emprego’”, dizNuccio. Mas não para gentecom autismo. “Eles adoram,porque todo dia fazem a mesmacoisa.”

Os problemas com que ele sedeparou, na verdade, nãoprovêm dos funcionários etrainees autistas. Surgem entreos funcionários “normais” queresistem a mudanças noambiente de trabalho.

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“Ainda vai levar um tempopara as pessoas seacostumarem”, diz ele. “Aindatem gente que olha isso e diz:‘Que saco, tenho de lidar comisso.’ É lamentável. No começofiquei triste porque não acheique meus funcionáriospensassem assim. Mas é precisodeixar que eles superem oobstáculo e percebam que estátudo bem.” Talvez as primeirassemanas sejam difíceis para osoutros funcionários, diz, e ele osentende. “Eles precisam lidarcom aquela pessoa que ficaperguntando a mesma coisa o

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tempo todo.” No final,contudo, os funcionários seadaptam — principalmente,conta, quando têm umaepifania: “Estamos ajudandoessas pessoas, claro, mas nofinal elas vão nos ajudar,porque fazem muito bem seutrabalho.”

Quando preciso, a EasterSeals tenta recolocar os traineesem empregos pagos em outraparte. Uma delas atende otelefone na própria Easter Seals.Outra trabalha 40 horas porsemana numa loja de produtosalimentícios local. Nuccio

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espera que o filho, agora com14 anos, um dia tenha o mesmobom resultado — bom paraambos. Como disse RandyLewis, o executivo da Walgreen,à NBC News, a inspiração paraa inovação na política deempregos foi a velha perguntaque assombra tantos pais decrianças com deficiência: o queserá do meu filho quando eumorrer? Ao que a mãe de umadulto com Asperger quetrabalha no centro dedistribuição respondeu: “Já nãome preocupo com isso.”

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E quanto aos própriosfuncionários — os autistas quetiveram a sorte de bater naporta certa? A seguir, um casoinspirador que conheci háalgum tempo.

No outono de 2009, JohnFienberg,13 um autista de altofuncionamento, conseguiu umtrabalho temporário em NovaYork como bibliotecário digitalnuma agência de propaganda —um grande feito para umpensador por palavras como ele.O trabalho devia durar umasemana, mas as aptidões deJohn — precisão, rapidez e

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disposição de realizar tarefasrepetitivas que irritam oscérebros normais — fizeramdele uma aquisição valiosa paraa agência. Ele continuoutrabalhando temporariamenteoutros seis meses, até a agênciaencontrar dinheiro noorçamento para contratá-lo emtempo integral. Hoje, elecataloga, arquiva e gerencia asfotografias de produtos, ospilotos das propagandas e oestoque de imagens dabiblioteca digital da agência.

“Sou naturalmente inclinadoa me fixar em detalhes de um

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modo que torna a catalogaçãoalgo fácil para mim”, relatouele num e-mail. O fato de secomunicar por e-mail era umreflexo das suas habilidadessociais. Quando lhe enviamosum e-mail (um amigo deRichard contara sobre ele), eleconcordou em ser entrevistado,mas preferia não falar portelefone. Disse também que nosencontrar pessoalmente seriaum problema; ele sabe quedeixa as pessoas exaustas comseu falatório.

“O meu chefe sabe dasminhas deficiências e faz o que

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pode para trabalhar comigo”,prosseguiu John, “e trato deretribuir produzindo resultadosque façam valer a pena meaguentar quando não entendoalgo exatamente do jeito que elegostaria. Os demais colegas nãointeragem comigo, exceto portelefone e e-mail.” No entanto,disse, “pelo que sei todosgostam de mim e valorizam aminha contribuição. Eu atérecebi um elogio de um delesmês passado que foimencionado numa reunião detrabalho”.

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John agora tem 29 anos eficou noivo recentemente. Ele ea noiva pretendem trocar NovaYork por “algum lugar onde omeu salário renda mais”. Porémnão se preocupe com eleprecisar encontrar outrotrabalho tão bom. “Tenhopermissão para trabalhar àdistância permanentemente.”

Estamos muito distantes dotempo em que os médicosdiziam aos pais de criançasautistas que não havia saída e aúnica opção humana era a

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condenação de passar a vidanuma instituição.

Ainda há um logo caminho apercorrer, claro. A ignorância eas interpretações incorretassempre são difíceis de superarquando passam a fazer parte dosistema de crenças de umasociedade. Por exemplo, quandoo filme A rede social foilançado, em 2010, o colunistaDavid Brooks do New YorkTimes escreveu esta avaliaçãosobre o personagem MarkZuckerberg, fundador doFacebook: “Não é que ele sejamá pessoa. Ele apenas não

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recebeu educação em casa.” A“educação” do personagemfictício, porém, teria tido que seadaptar a um cérebro que nãoprocessa dados faciais e gestuaisque a maioria das pessoasassimila e que se realiza não naefervescência de criar umarelação pessoal, mas na lógicaclique-claque da escrita decódigos.

Quando algo está“totalmente na sua mente”, aspessoas tendem a pensar queisto é voluntário, que é algo quevocê poderia controlar caso seesforçasse mais ou tivesse sido

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educado de outro modo. Esperoque a recente certeza de que oautismo está no cérebro e nosgenes influencie as atitudes daspessoas.

Como vimos, isso já estáafetando as pesquisas, levandoos cientistas a redobraremesforços para encontrar a causae a cura. E já está afetando asatitudes terapêuticas, mudandoa ênfase do foco nas deficiênciaspara uma maior valorização dospontos fortes.

Quando faço umaretrospectiva sobre o autismo desessenta anos atrás, quando meu

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cérebro causava muitaansiedade em minha mãe,curiosidade nos médicos edesafiava minha babá e osprofessores, sei que tentarimaginar onde ele estará daqui asessenta anos é uma tarefaidiota. Mas tenho certeza deque qualquer que seja opensamento sobre o autismo,ele vai incorporar a necessidadede considerá-lo isoladamente,cérebro por cérebro, filamentopor filamento do DNA,característica por característica,ponto forte por ponto forte e,

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talvez o mais importante,indivíduo por indivíduo.

Profissões para quempensa por imagens

Desenhista de arquitetura eengenhariaFotógrafoAdestrador de animaisArtista gráficoJoalheiro/artesãoWeb designerTécnico em veterináriaMecânico de automóveisTécnico em manutenção demáquinasTécnico em computadoresDiretor de iluminação teatralProjetista de automação

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industrialPaisagistaProfessor de biologiaAnalista de mapas de satéliteBombeiro hidráulicoTécnico em calefação, ar-condicionado e ventilaçãoTécnico em fotocopiadoraTécnico em equipamentosaudiovisuaisSoldadorEngenheiro industrialTécnico em radiologiaTécnico em equipamentosmédicosDesenhista industrialAnimador digital

Profissões para quempensa por palavras/fatos

Jornalista

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TradutorBibliotecárioAnalista de mercadoEditor de textoContadorAnalista de orçamentoEscriturárioProfessor de educação especialIndexador de livrosFonoaudiólogoEspecialista em controle deinventáriosPesquisador jurídicoEspecialista em contratos emconcessionárias de automóveisHistoriadorEscritor técnicoCaixa de bancoGuia de turismoAtendente de balcões deinformação

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Profissões para quempensa por padrões

Programador de computadorEngenheiroFísicoMúsico/compositorEstatísticoProfessor de matemáticaQuímicoTécnico em eletrônicaProfessor de análise de dadosPesquisador científicoAnalista de mineração de dadosAnalista de mercado e deinvestimento financeiroAtuárioEletricista

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Apêndice: O teste deQA

O psicólogo Simon Baron-Cohen e seus colegas do Centrode Pesquisa em Autismo daUniversidade de Cambridgecriaram o Quociente doEspectro do Autismo, ou QA ,para medir a extensão dostraços autistas em adultos. Noprimeiro experimento do teste,a pontuação média do grupo decontrole foi 16,4. Dentre os

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diagnosticados com autismo outranstornos relacionados, 80%pontuaram 32 ou mais. Todaviao teste não é um meio de fazerum diagnóstico, e muitos quepontuam mais de 32 e atécumprem os critériosdiagnósticos de autismomoderado ou síndrome deAsperger não apresentamdificuldades no seu cotidiano.

Concordo

plenamente

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1. Prefiro fazercoisas com outros doque sozinho.

2. Prefiro fazer ascoisas sempre domesmo modo.

3. Quando tentoimaginar algo, achomuito fácil criar uma

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imagem mental.

4. Às vezes fico tãoconcentrado emalgo que perco devista outras coisas.

5. Consigo escutarpequenos sons queoutros nãopercebem.

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6. Costumoobservar placas decarros ou sequênciassimilares deinformação.

7. As pessoascostumam meadvertir que fuigrosseiro, mesmoquando acho queestou sendoeducado.

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8. Quando leio umahistória, consigoimaginar comfacilidade aaparência dospersonagens.

9. Datas mefascinam.

10. Num gruposocial, consigoacompanhar as

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conversas de váriaspessoas diferentes.

11. Acho fácil merelacionarsocialmente.

12. Percebodetalhes que osoutros não notam.

13. Prefiro ir a uma

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biblioteca do que ira uma festa.

14. Tenho facilidadede inventar histórias.

15. Sinto-me maisatraído por pessoasdo que por coisas.

16. Tenho muitosinteresses e fico

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chateado quandonão posso mededicar a eles.

17. Gosto de bate-papos sociais.

18. Quando falo,nem sempre é fácilpara os outrosentenderem o quedigo.

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19. Os números mefascinam.

20. Quando leiouma história, é difícilcompreender asintenções dospersonagens.

21. Não gostomuito de ler ficção

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22. Tenhodificuldades de fazernovos amigos.

23. Percebo padrõesnas coisas o tempotodo.

24. Prefiro ir aoteatro que aomuseu.

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25. Não meincomodo quandominha rotina diária éperturbada.

26. Frequentementepercebo que não seimanter umaconversa.

27. A cho fácil “lernas entrelinhas”quando alguém falacomigo.

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28. Normalmenteme concentro maisno todo do que empequenos detalhes.

29. Não sou muitobom para lembrarde números detelefone.

30. Não costumo

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perceber pequenasmudanças numasituação ou naaparência daspessoas.

31. Percebo quandoalguém ficaentediado quandome ouve.

32. Acho fácil fazermais de uma coisa

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ao mesmo tempo.

33. Quando falo aotelefone, não seiquando é minha vezde falar.

34. Gosto de fazeras coisasespontaneamente.

35. Em geral sou o

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último a entenderuma piada.

36. Acho fácilentender o quealguém pensa ousente só de olhar seurosto.

37. Quando souinterrompido, voltorapidamente ao queestava fazendo.

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38. Sou bom depapo.

39. As pessoascostumam dizer queinsisto sempre nomesmo assunto.

40. Quando eracriança, eu gostavade brincar de faz de

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conta.

41. Gosto de reunirinformações sobrecategorias de coisas(p. ex., tipos decarros, aves, trens,plantas).

42. Acho difícilimaginar como seriaser outra pessoa.

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43. Gosto deplanejaratentamente asatividades de queparticipo.

44. Gosto deeventos sociais.

45. Acho difícilperceber asintenções daspessoas.

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46. Situações novasme deixam ansioso.

47. Gosto deconhecer pessoasnovas.

48. Sou muitodiplomático.

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49. Não sou muitobom para lembrar osaniversários daspessoas.

50. Acho muito fácilbrincar de faz deconta com crianças.

Discordo

em

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parte

1. Prefiro fazercoisas com outros doque sozinho.

2. Prefiro fazer ascoisas sempre domesmo modo.

3. Quando tento

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imaginar algo, achomuito fácil criar umaimagem mental.

4. Às vezes fico tãoconcentrado emalgo que perco devista outras coisas.

5. Consigo escutarpequenos sons queoutros nãopercebem.

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6. Costumoobservar placas decarros ou sequênciassimilares deinformação.

7. As pessoascostumam meadvertir que fuigrosseiro, mesmoquando acho queestou sendoeducado.

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8. Quando leio umahistória, consigoimaginar comfacilidade aaparência dospersonagens.

9. Datas mefascinam.

10. Num gruposocial, consigo

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acompanhar asconversas de váriaspessoas diferentes.

11. Acho fácil merelacionarsocialmente.

12. Percebodetalhes que osoutros não notam.

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13. Prefiro ir a umabiblioteca do que ira uma festa.

14. Tenho facilidadede inventar histórias.

15. Sinto-me maisatraído por pessoasdo que por coisas.

16. Tenho muitos

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interesses e ficochateado quandonão posso mededicar a eles.

17. Gosto de bate-papos sociais.

18. Quando falo,nem sempre é fácilpara os outrosentenderem o quedigo.

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19. Os números mefascinam.

20. Quando leiouma história, é difícilcompreender asintenções dospersonagens.

21. Não gostomuito de ler ficção

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22. Tenhodificuldades de fazernovos amigos.

23. Percebo padrõesnas coisas o tempotodo.

24. Prefiro ir aoteatro que ao

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museu.

25. Não meincomodo quandominha rotina diária éperturbada.

26. Frequentementepercebo que não seimanter umaconversa.

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27. A cho fácil “lernas entrelinhas”quando alguém falacomigo.

28. Normalmenteme concentro maisno todo do que empequenos detalhes.

29. Não sou muitobom para lembrarde números detelefone.

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30. Não costumoperceber pequenasmudanças numasituação ou naaparência daspessoas.

31. Percebo quandoalguém ficaentediado quandome ouve.

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32. Acho fácil fazermais de uma coisaao mesmo tempo.

33. Quando falo aotelefone, não seiquando é minha vezde falar.

34. Gosto de fazeras coisasespontaneamente.

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35. Em geral sou oúltimo a entenderuma piada.

36. Acho fácilentender o quealguém pensa ousente só de olhar seurosto.

37. Quando souinterrompido, volto

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rapidamente ao queestava fazendo.

38. Sou bom depapo.

39. As pessoascostumam dizer queinsisto sempre nomesmo assunto.

40. Quando era

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criança, eu gostavade brincar de faz deconta.

41. Gosto de reunirinformações sobrecategorias de coisas(p. ex., tipos decarros, aves, trens,plantas).

42. Acho difícilimaginar como seria

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ser outra pessoa.

43. Gosto deplanejaratentamente asatividades de queparticipo.

44. Gosto deeventos sociais.

45. Acho difícil

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perceber asintenções daspessoas.

46. Situações novasme deixam ansioso.

47. Gosto deconhecer pessoasnovas.

48. Sou muito

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diplomático.

49. Não sou muitobom para lembrar osaniversários daspessoas.

50. Acho muito fácilbrincar de faz deconta com crianças.

© Simon Baron-Cohen

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A pontuação: as respostas“concordo plenamente” ou“concordo em parte” àsperguntas 2, 4, 5, 6, 7, 9, 12,13, 16, 18, 19, 20, 21, 22, 23,26, 33, 35, 39, 41, 42, 43, 45 e46 valem 1 ponto. As respostas“discordo plenamente” ou“discordo em parte” àsperguntas 1, 3, 8, 10, 11, 14,15, 17, 24, 25, 27, 28, 29, 30,31, 32, 34, 36, 37, 38, 40, 44,47, 48, 49 e 50 valem 1 ponto.

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Notas

1. Os significados do autismo

1. John Donvan e Caren Zucker, “Autism’sFirst Child”, Atlantic, outubro de 2010.

2. Leo Kanner, “Autistic Disturbances ofAffective Contact”, Nervous Child 2(1943): 217-50.

3. Leo Kanner, “Problems of Nosology andPsychodynamics in Early ChildhoodAutism”, American Journal ofOrtopsychiatry 19, nº 3 (1949): 416-26.

4. “Medicine: The Child is Father”, Time,25 de julho de 1960,http://autismedsp5310s20f10.pbworks.com/f/Time-The+Child+is+Father.pdf.

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5. Disponível em: http://www.autism-help.org/points-refrigerator-mothers.htm.

6. Eustacia Cutler, Thorn in My Pocket:Temple Grandin’s Mother Tells the FamilyStory (Arlington, TX: Future Horizons,2004).

7. Richard Pollak, The Creation of Dr. B:A Biography of Bruno Bettelheim (NovaYork: Simon & Schuster, 1997).

8. Temple Grandin, “My Experiences as anAutistic Child and Review of SelectedLiterature”, Journal of OrthomolecularPsychiatry 13, nº 3 (1984): 144-74.

9. Roy Richard Grinker, Unstrange Minds:Remapping the World of Autism (NovaYork: Basic Books, 2007).

10. D. L. Rosehan, “On Being Sane inInsane Places”, Science 179, nº 4070 (19 dejaneiro de 1973): 250-58.

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11. Lynn Waterhouse et al., “Diagnosisand Classification in Autism”, Journal ofAutism and Developmental Disorders 26, nº1 (1966): 59-68.

12. Lorna Wing, “Asperger’s Syndrome: AClinical Account”, Psychological Medicine11 (1981): 115-30.

13. Marissa King e Peter Bearman,“Diagnostic Change and the IncreasedPrevalence of Autism”, InternationalJournal of Epidemiology 38, nº 5 (outubrode 2009): 1224-34.

14. Ka-Yuet Liu, Marissa King e PeterBearman, “Social Influence and the AutismEpidemic”, American Journal of Sociology115, nº 5 (março de 2010): 1387-1434.

15. Grinker, Unstrange Minds.

16. Disponível em:http://www.cdc.gov/ncbddd/autism/addm.html

17. Entrevista de Jeffrey S. Anderson.

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2. Uma luz no cérebro autista

1. Eric Courchesne et al., “CerebellarHypoplasia and Hyperplasia in InfantileAustim”, Lancet 343, nº 8888 (1º de janeirode 1994): 63-64.

2. N. Shinoura et al., “Impairment ofLongitudinal Fasciculous Plays a Role inVisual Memory Disturbance”, Neurocase13, nº 2 (abril de 2007): 127-30.

3. Disponível em:http://newsroom.ucla.edu/portal/ucla/ucla-scientists-boost-memory-by-228557.aspx.

4. Sarah DeWeerdt, “Study Links BrainSize to Regressive Autism”, SimonsFoundation Autism Research Initiative, 12de dezembro de 2011, http://sfari.org/news-and-opinion/news/2001/study-links-brains-size-to-regressive-autism.

5. Nancy J. Minshew e Timothy A. Keller,“The Nature of Brain Dysfunction inAutism: Functional Brain Imaging Studies”,

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Current Opinion in Neurology 23, nº 2(abril de 2010): 124-30.

6. Entrevista de Joy Hirsch.

7. Liz Zsabo, “Autismo Science is Moving‘Stunningly Fast’”, USA Today, 30 de abrilde 2012,http://usatoday30.usatoday.com/news/health/story/2012-04-08/Autims-science-research-moving-faster/54134028/1.

8. Naomi B. Pitskel et al., “BrainMechanisms for Processing Direct andAverted Gaze in Individuals with Autism”,Journal of Autism and DevelopmentalDisorders 41, nº 12 (dezembro de 2011):1686-93.

9. Marcel Adam Just et al., “CorticalActivation and Synchronization DuringSentence Comprehension in High-Functioning Autism: Evidence ofUnderconnectivity”, Brain 127, nº 8 (agostode 2004): 1811-21.

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10. M. E. Vissers et al., “BrainConnectivity and High Functioning Autism:A Promising Path of Research that NeedsRefined Models, MethodologicalConvergence and Stronger BehavioralLinks”, Neuroscience and BiobehavioralReviews 36, nº 1 (janeiro de 2012): 604-25.

11. H. C. Hazlett et al., “Teasing Apartthe Heterogeneity of Autism: SameBehavior, Different Brains in Toddlers withFragile X Syndrome and Autism”, Journalof Neurodevelopmental Disorders 1, nº 1(março de 2009): 81-90.

12. Grace Lai et al., “Speech StimulationDuring Functional MR Imaging as aPotential Indicator of Autism”, Radiology260, nº 2 (agosto de 2011): 521-30.

13. Jeffrey S. Anderson et al., “FunctionalConnectivity Magnetic Resonance ImagingClassification of Autism”, Brain 134(dezembro de 2011): 3742-54.

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14. A. Elnakib et al., “Autism Diagnosticsby Centerline-Based Shape Analysis of theCorpus Callosum”, IEEE InternationalSymposium on Biomedical Imaging: FromNano to Macro (30 de março de 2011)1843-46.

15. Lucina Q. Uddin et al., “MultivariateSearchlight Classification of StructuralMagnetic Resonance Imaging in Childrenand Adolescents with Autism”, BiologicalPsychiatry 70, nº 9 (novembro de 2011):833-41.

16. Jason J. Wolff et al., “Differences inWhite Matter Fiber Tract DevelopmentPresent from 6 to 24 Months in Infants withAutism”, American Journal of Psychiatry169, nº 6 (junho de 2012): 589-600.

17. Entrevista com Walter Schneider.

18. S. S. Shin et al., “High-Definition FiberTacking for Assessment of NeurologicalDeficit in a Case of Traumatic Brain Injury:

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Finding, Visualizing and Interpreting SmallSites of Damage”, Journal of Neurosurgery116, nº 5 (maio de 2012): 1062-69.

19. Temple Grandin e Margaret M.Scariano, Emergence (Nova York: WarnerBooks, 1996).

20. Virginia Hughes, “Movement DuringBrain Scans May Lead to SpuriousPatterns”, Simons Foundation AutismResearch Initiative, 16 de janeiro de 2012,http://sfari.org/news-and-opinion/news/2012/movement-during-brain-scans-may-lead-to-spurious-patterns.

21. Greg Miller, “Growing Pains forfMRI”, Science 320 (13 de junho de 2008):1412-14.

3. O sequenciamento do cérebroautista

1. Gina Kolata. “Study Discovers RoadMap of DNA”, New York Times, 6 de

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setembro de 2012.

2. Amartya Sanyal et al., “The Long-Range Interaction Landscape of GenePromoters”, Nature 489 (6 de setembro de2012): 109-13.

3. S. Folstein e M. Rutter, “InfantileAutism: A Genetic Study of 21 Twin Pairs”,Journal of Child Psychology and Psychiatry18, nº 4 (setembro de 1977): 297-321.

4. A. Bailey et al., “Autism as a StronglyGenetic Disorder: Evidence from a BritishTwin Study”, Psychological Medicine 25, nº1 (janeiro de 1995): 63-77.

5. Disponível em:http://autismspeaks.org/science/initiatives/autism-genome-project/first-findings.

6. Disponível em:http://www.autismspeaks.org/about-us/press-releases/autism-speaks-and-worlds-leading-autism-experts-announce-publication-autism.

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7. Peter Szatmari et al., “Mapping AutismRisk Loci Using Genetic Linkage andChomosomal Rearrangements”, NatureGenetics 39, nº 3 (março de 2007): 319-28.

8. Jonathan Sebat et al., “StrongAssociation of De Novo Copy NumberMutations with Autism”, Science 316, nº5823 (20 de abril de 2007): 445-49.

9. Disponível em:http://www.autismspeaks.org/about-us/press-releases/new-autism-genes-discovered-autism-speaks-and-worlds-leading-autism-experts.

10. Disponível em:http://geschwindlab.neurology.ucla.edu/index.php/in-the-news/16news/88-dna-scan-for-familial-autism-finds-variants-that-disrupt-gene-activity-in-autistic-kids.

11. Mathew W. State e Nenad estan, “TheEmerging Biology of Autism Spectrum

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Disorders”, Science 337 (setembro de2012): 1301-3.

12. Entrevista com G. Bradley Schaefer.

13. Stephen Sanders et al., “De NovoMutations Revealed by Whole-ExomeSequencing Are Strongly Associated withAutism”, Nature 485 (10 de maio de 2012):237-41.

14. Brian J. O’Roak et al., “SporadicAutism Exomes Reveal a HighlyInterconnected Protein Network of DeNovo Mutations”, Nature 485 (10 de maiode 2012): 246-50

15. Benjamin M. Neale et al., “Patternsand Rates of Exonic De Novo Mutations inAutism Spectrum Disorders”, Nature 485(10 de maio de 2012): 242-45.

16. Augustine Kong et al., “Rate of DeNovo Mutations and the Importance ofFather’s Age to Disease Risk”, Nature 488(agosto de 2012): 471-75.

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17. Deborah Rudacille, “FamilySequencing Study Boosts Two-Hit Model ofAutism”, Simons Foundation AutismResearch Initiative, 15 de maio de 2011,http://sfari.org/news-and-opinion/news/2011/family-sequencing-study-boosts-two-hit-model-of-autism.

18. Claire S. Leblond et al., “Genetic andFunctional Analyses of SHANK2 MutationsSuggest a Multiple Hit Model of AutismSpectrum Disorders”, PLoS Genetics 8, nº 2(fevereiro de 2012): e1002521,doi:10.1371/journal.pgen.1002521.

19. Virginia Hughes, “SHANK2 StudyBolsters ‘Multi-Hit’ Gene Model ofAutism”, Simons Foundation AutismResearch Initiative, 13 de fevereiro de2012, http://sfari.org/news-and-opinion/news/2012/shank2-study-bolsters-multi-hit-model-of-autism.

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20. Disponível em:http://universityofcalifornia.edu/news/article/25624

21. Disponível em:http://universityofcalifornia.edu/news/article/24693

22. Entrevista com Irva Hertz-Picciotto.

23. R. J. Schmidt et al., “Prenatal Vitamins,One-Carbon Metabolism Gene Variantsand Risk for Autism”, Epidemiology 22, nº4 (julho de 2011): 476-85.

24. H. E. Volk et al., “ResidentialProximity to Freeways and Autism inCHARGE Study”, Environmental HealthPerspectives 119, nº 6 (junho de 2011): 873-77.

25. P. Krakowiak et al., “MaternalMetabolical Conditins and Risk for Autismand Other Neurodevelopmental Disorders”,Pediatrics 129, nº 5 (maio de 2012): 1121-28.

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26. J. F. Shelton et al., “Tipping theBalance os Autism Risk: PotentialMechanisms Linking Pesticides andAutism”, Environmental HealthPerspectives 120, nº 7 (abril de 2012): 944-51.

27. Philip J. Landrigan et al., “A ResearchStrategy to Discover the EnvironmentalCases of Autism and NeurodevelopmentalDisabilities”, Environmental HealthPerspectives 120, nº 7 (julho de 2012): a258-a260.

28. Disponível em:http://www.fda.gov/Safety/MedWatch/SafetyInformation/SafetyAlertsforHumanMedicalProducts/ucm261610.htm.

29. Miriam E. Tucker, “ValproateExposure Associated with Autism, LowerIQ”, Internal Medicine News DigitalNetwork, 5 de dezembro de 2011:http://www.internalmedicinenews.com/specialty-focus/women-s-health/single-article-

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30. Simons Foundation Autism ResearchInitiative, 5 de junho de 2012,https://sfari.org/news-and-opinion/blog/2012/valproate-fate.

31. Lisa A. Croen et al., “AntidepressantUse During Pregnancy and ChildhoodAutism Spectrum Disorders”, Archives ofGeneral Psychiatry 68, nº 11 (novembro de2011): 1104-12.

32. A. J. Wakefield et al., “Ileal-Lymphoid-Nodular Hyperplasia, Non-Specific Colitisand Pervasive Developmental Disorder inChildren”, Lancet 351, nº 9103 (28 defevereiro de 1998): 637-41.

33. Editores da Lancet, “Retractation —‘Ileal-Lymphoid-Nodular Hyperplasia,Non-Specific Colitis and PervasiveDevelopmental Disorder in Children’”,

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Lancet 375, nº 9713 (6 de fevereiro de2010): 445.

34. David Dobbs, “The Orchid Children”,New Scientist, 28 de janeiro de 2012.

35. Disponível em:http://www.utexas.edu/research/asrec/dopamine.html

36. Kenneth D. Gadow et al., “Parent-Child DRD4 Genotype as a PotentialBiomarker for Oppositional, Anxiety andRepetitive Behaviors in Children withAutism Spectrum Disorder”, Progress inNeuro-Psychopharmacology and BiologicalPsychiatry 34, nº 7 (1º de outubro de 2010):1208-14.

37. J. Belsky et al., “Vulnerability Genes orPlasticity Genes?” Molecular Psychiatry 14,nº 8 (agosto de 2009): 746-54.

38. W. Thomas Boyce e Bruce J. Ellis,“Biological Sensitivity to Context: I. AnEvolutionary-Developmental Theory of theOrigins and Functions of Stress Reactivity”,

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Development and Psychopathology 17, nº 2(1º de junho de 2005): 271-301.

39. Sigmund Freud, “On Narcisism: AnIntroduction”, em The Standard Edition ofthe Complete Psychological Works ofSigmund Freud, vol. 14 (Londres: HogarthPress, 1957).

40. Sigmund Freud, “Beyond the PleasurePrinciple”, em The Standard Edition of theComplete Psychological Works of SigmundFreud, vol. 18 (Londres: Hogarth Press,1955).

4. Esconde-esconde

1. Elysa Jill Marco et al., “SensoryProcessing in Autism: A Review ofNeurophysical Findings”, PediatricResearch 69, nº 5, pt. 2 (maio de 2011):48R-54R.

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2. Laura Crane et al., “Sensory Processingin Adults with Autism Spectrum Disorders”,Autism 13, nº 3 (maio de 2009): 215-18.

3. Lisa D. Wiggins et al., “Brief Report:Sensory Abnormalities as DistinguishingSymptoms in Autism Spectrum Disorders inYoung Children”, Journal of Autism andDevelopmental Disorders 39 (2009): 1087-91.

4. David Amaral at al., orgs., AutismSpectrum Disorders (Nova York: OxfordUniversity Press, 2011).

5. Disponível:http://www.autismsouthafrica.org/virtuallibrary/htm. “Asperger adults describe theirexperience of sensory overload.;”

6. B. A. Corbett et al., “Cortisol CircadianRhythms and Response to Stress InChildren with Autism”,Psychoneuroendocrinology 31, nº 1 (janeirode 2006): 59-68.

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7. A. E. Lane et al., “Sensory ProcessingSubtypes in Autism: Association withAdaptive Behavior”, Journal of AutismDevelopmental Disorders 40, nº 1 (janeirode 2010): 122-22.

8. Ananja N. Bhat, “Current Perspectiveson Motor Functioning in Infants, Childrenand Adults with Autism SpectrumDisorders”, Physical Therapy 91, nº 7(julho de 2011): 1116-29.

9. Tito Rajarshi Mukhopadhyay, How CanI Talk If My Lips Don’t Move: Inside MyAutistic Mind (Nova York: ArcadePublishing, 2008).

10. Arthur Fleischmann e CarlyFleischmann, Carly’s Voice: BreakingThrough Autism (Nova York: Touchstone,2012).

11. Henry Markram, “The Intense WorldSyndrome — an Alternative Hypothesis for

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Autism”, Frontiers of Neuroscience 1, nº 1(2007): 77-96.

12. B. Gepner e F. Féron, “Autism: AWorld Changing Too Fast for a Mis-WiredBrian?”, Neuroscience and BiobehavioralReviews 33, nº 8 (setembro de 2009): 1227-42.

13. Temple Grandin, “Visual Abilities andSensory Differences in a Person withAutism”, Biological Psychiatry 65 (2009):15-16.

14. Donna Williams, Autism: An Inside-Out Approach (Londres: Jessica KingsleyPublishers, 1996).

15. “Visão de Picasso”:http://www.autismathomeseries.com/library/2009/08/inside-the-mind-of-sensory-overload/.

16. Disponível em:http://www.wrongplanet.net/postp4758182.html&highlight=

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17. Disponível em:http://thewildeman2.hubpages.com/hub/Autistic-sensory-Overload.

18. Nathalie Boddaert et al., “Perception ofComplex Sounds: Abnormal Pattern ofCortical Activation in Autism”, AmericanJournal of Psychiatry 160, nº 11 (2003):2057-60.

19. F. Tecchio et al., “Auditory SensoryProcessing in Autism: AMagnetoencephalografic Study”, BiologicalPsychiatry 54, nº 6 (setembro de 2003):647-54.

20. Sandra Sánchez, “FunctionalConnectivity of Sensory Systems in AutismSpectrum Disorders: An fcMRI Study ofAudio-Visual Processing” (tese de Ph.D.,Universidade Estadual de San Diego, 2011).

21. Ver, por exemplo, I. Molnar-Szakacs eP. Heaton, “Music: A Unique Window intothe World of Autism”, Annals of the New

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York Academy of Sciences 1252 (abril de2012): 318-24.

22. Grace Lai et al., “Neural Systems forSpeech and Song in Autism”, Brain 135 nº 3(março de 2012): 961-75.N

23. R. S. Kaplan e A. L. Steele, “AnAnalysis of Music Therapy Program Goalsand Outcomes for Clients with Diagnoseson the Autism Spectrum”, Journal of MusicTherapy 42, nº 1 (primavera de 2005): 2-19.

24. Catherine Y. Wan e Gottfried Schlaug,“Neural Pathways for Language in Autism:The Potential for Music-BasedTreatments”, Future Neurology 5, nº 6(2010): 797-805.

25. Catherine Y. Wan et al., “Auditory-Motor Mapping Training as Intervention toFacilitate Speach Output in Non-VerbalChildren with Autism: A Proof of ConceptStudy”, PLoS ONE 6, nº 9 (2011): e25505,doi:10.1371/journal.pone.0025505.

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5. Olhar para além dos rótulos

1. Lizzie Buchen, “Scientists and Autism:When Geeks Meet”, Nature 479 (novembrode 2011): 25-27.

2. Simon Baron-Cohen et al., “The Autism-Spectrum Quotient (AQ): Evidence fromAsperger Syndrome/High-FunctioningAutism, Males and Females, Scientists andMathematicians”, Journal of Autism andDevelopmental Disorders 31 (2011): 5-17.

3. T. Buie et al., “Evaluation, Diagnosis,and Treatment of GastrointestinalDisorders in Individuals with ASDs: AConsensus Report”, Pediatrics 125,suplemento 1 (janeiro de 2010): S1-18.

4. David R. Simmons et al., “Vision inAutism Spectrum Disorders”, VisionResearch 49 (209): 2705-39.

5. Disponível em:http://iacs.hhs.gov/events/2010/slides_susan_swedo_043010.pdf

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6. Ver, por exemplo, K. K. Chadman,“Fluoxetine but Not Risperidone IncreasesSociability in the BTBR Mouse Model ofAutism”, Pharmacology, Biochemistry andBehavior 97, nº 3 (janeiro de 2011): 586-94.

7. Laura Pina-Camacho et al., “AutismSpectrum Disorder: Does NeuroimagingSupport the DSM-5 Proposal for aSymptom Dyad? A Systematic Review ofFunctional Magnetic Resonance Imagingand Diffusion Tensor Imaging Studies”,Journal of Autism and DevelopmentalDisorders 42, nº 7 (julho de 2012): 1326-41.

8. Ver, por exemplo, Emil. F. Coccaro,“Intermittent Explosive Disorder as aDisorder of Impulsive Aggression for DSM-5”, American Journal of Psychiatry 169(junho de 2012): 577-88.

9. James C. McPartland et al., “Sensitivityand Specificity of Proposed DSM-5Diagnostic Criteria for Autism Spectrum

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Disorder”, Journal of the AmericanAcademy of Child and AdolescentPsychiatry 51, nº 4 (abril de 2012): 368-83.

10. M. Huerta et al., “Application of DSM-5 Criteria for Autism Spectrum Disorder toThree Samples of Children with DSM-IVDiagnosis of Pervasive DevelopmentalDisorders”, American Journal of Psychiatry10 (outubro de 2012) 1056-64.

11. Judith S. Verhoeven et al.,“Neuroimaging of Autism”,Neuroradiology 52, nº 1 (2010): 3-14.

12. Matthew W. State e Nenad estan,“The Emerging Biology of Autism SpectrumDisorders”, Science 337 (setembro de2012): 1301-3.

6. Conhecer seus pontos fortes

1. Laurent Mottron, “ChangingPerceptions: The Power of Autism”, Nature

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479 (novembro de 2011): 33-35.

2. Grant K. Plaisted e G. Davis,“Perception and Apperception in Autism:Rejecting the Inverse Assumption”,Philosophical Transactions of the RoyalSociety B: Biological Sciences 364, nº 1522(maio de 2009): 1391-98.

3. M. Dawson et al., “The Level andNature of Autistic Intelligence”,Psychological Science 18, nº 8 (agosto de2007): 647-62.

4. David Wolman, “The AutieAdvantage”, New Scientist 206 (abril de2010): 32-35.

5. Madhursree Mukerjee, “A TransparentEnigma”, Scientific American, junho de2004.

6. Virginia Hughes, “Autism OftenAccompanied by ‘Super Vision’ StudiesFind”, Simons Foundation Autism ResearchInitiative, 12 de fevereiro de 2009,

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http://sfari.org/news-and-opinion/news/2009/autism-often-accompanied-by-super-vision-studies-find.

7. Tim Langdell, “Recognition of Faces: AnApproach to the Study of Autism”, Journalof Child Psychology and Psychiatry andAllied Disciplines 19, nº 3 (julho de 1978):255-68.

8. Ver, por exemplo, O. Murphy et al.,“Perception of Biological Motion inIndividuals with Autism SpectrumDisorder”, Perception 37 ECVP AbstractSupplement (2008): 113; Evelien Nackaerts,“Recognizing Biological Motion andEmotions from Point-Light Displays inAutism Spectrum Disorders”, PLoS ONE 7,nº 9 (setembro de 2012): e44473, PMID22970227, PMCIDPMC343510.

9. Ver, por exemplo, R. P. Hobson, “TheAutistic Child’s Appraisal of Expressions of

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Emotion”, Journal of Child Psychology andPsychiatry 27 (1986): 321-42.

10. Ver, por exemplo, Michael S. Gaffreyet al., “Atypical Participation of VisualCortex During Word Processing in Autism:An fMRI Study of Semantic Decision”,Neuropsychologia 45, nº 8 (9 de abril de2007): 1672-84; R. K. Kana et al.,“Sentence Comprehension in Autism:Thinking in Pictures with DecreasedFunctional Connectivity”, Brain 129, nº 9(setembro de 2009): 2484-93.

11. B. Keehn et al., “Functional BrainOrganization for Visual Search in ASD”,Journal of the InternationalNeuropsychological Society 14, nº 6 (2008):990-1003.

12. Mottron, “Changing Perceptions”.

13. Ver, por exemplo, Temple Grandin,“My Mind is a Web Browser: How People

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with Autism Think”, Cerebrum 2, nº 1(inverno de 2000): 14-22.

14. Lisa D. Wiggins et al., “Brief Report:Sensory Abnormalities as DistinguishingSymptoms in Autism Spectrum Disorders inYoung Children”, Journal of Autism andDevelopmental Disorders 39 (2009): 1087-91.

15. D. L. Williams et al., “The Profile ofMemory Function in Children withAutism”, Neuropsychology 20, nº 1 (janeirode 2006): 21-29.

16. Motomi Toichi e Yoko Kamio, “Long-Term Memory and Levels-of-ProcessingAutism”, Neuropsychologia 40 (2002): 964-69.

17. Liam S. Carroll e Michael J. Owen,“Genetic Overlap Between Autism,Schizophrenia and Bipolar Disorder”,Genome Medicine 1 (2009): 102.1-102.7.

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18. S. H. Carson, “Creativity andPsychopathology: A Shared VulnerabilityModel”, Canadian Journal of Psychiatry56, nº 3 (março de 2011): 144-53.

19. John Elder Robison, Be Different:Adventures of a Free-Range Aspergian(Nova York: Crown, 2011).

7. Repensar por imagens

1. Temple Grandin, “My Experiences as anAutistic Child and Review of SelectedLiterature”, Journal of OrthomolecularPsychiatry 13, nº 3 (1982): 144-74.

2. Ver, por exemplo, Temple Grandin,“How Does Visual Thinking Work in theMind of a Person with Autism? A PersonalAccount”, Philosophical Transactions of theRoyal Society 364 (20009): 1437-42.

3. Clara Clairbone Park, Exiting Nirvana:A Daughter’s Life with Austism. (NewYork: Little, Brown and Company, 2001).

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4. Entrevista com Jennifer McIlwee Myers.

5. Jennifer Khan, “The Extreme Sport ofOrigami”, Discover, julho de 2006.

6. Daniel Tammet, Born on a Blue Day:Inside the Extraordinary Mind of anAutistic Savant (Nova York: Free Press,2007).

7. Philip Bethge, “Who Needs Berlitz?British Savant Learns German in a Week”,Der Spiegel, 3 de maio de 2009.

8. Ver, por exemplo, Clifton Callender etal., “Generalized Voice-Leading Spaces”Science 320 (18 de abril de 2008):346-48.

9. Davide Castelvecchi, “The Shape ofBeethoven’s Ninth”, Science News 173, nº17 (24 de maio de 2008) 13.

10. J. L. Aragón et al., “TurbulentLuminance in Impassioned van Gogh’sPaintings”, Journal of Mathematical

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Imaging and Vision 30, nº 3 (março de2008): 275-83.

11. http://plus.maths.org/content/troubled-minds-and-perfect-turbulence.

12. Jackson Pollock: Jennifer Ouellette,“Pollocks’s Fractals”, Discover, novembrode 2001.

13. Firas Khatib et al., “Crystal Structureof a Monomeric Retroviral Protease Solvedby Protein Folding Game Players”, NatureStructural and Molecular Biology 18(2011): 1175-77.

14. D. T. Max, “The Prince’s Gambit”,New Yorker, 21 de março de 2011.

15. Philip E. Ross, “The Expert Mind”,Scientific American, agosto de 2006.

16. Michael Shermer, The Believing Brain:From Ghosts and Gods to Politics andConspiracies — How We Construct Beliefs

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and Reinforce Them as Truths (Nova York:Times Books, 2011).

17. Mario Livio, The Golden Ratio: TheStory of Phi, the World’s Most AstonishingNumber (Nova York: Broadway Books,2003).

18. Neal Barlinsky e Meredith Frost, “Real‘Beautiful Mind’: College Dropout BecameMathematical Genius After Mugging”,ABCNews.com, 27 de abril de 2012,http://abcnews.go.com/blogs/health/2012/04/27/real-beautiful-mind-accidental-genius-draws-complex-math-formulas-photos.

19. “The Mathematics of Hallucination”,New Scientist, 10 de fevereiro de 1983.

20. http://thesciencenetwork.org/media/videos/52/Transcript.pdf.

21. Gerhard Werner, “Fractals in theNervous System: Conceptual Implicationsfor Theoretical Neuroscience”, Frontiers inPhysiology 1 (julho de 2010): 15,doi:10.3389/fphys.2010.00015.

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22. http://release.jhu.edu/2012/10/04/jhu-cosmologists-receive-new-frontiers-award-for-work-on-origami-universe/.

23. Maria Kozhevnikov et al., “Revisingthe Visualizer-Verbalizer Dimension:Evidence of Two Types of Visualizers”,Cognition and Instruction 20, nº 1 (2002):44-47.

24. Maria Kozhevnikov et al., “Spatialversus Object Visualizers: A NewCharacterization of Visual CognitiveStyle”, Memory and Cognition 33, nº 4(2005): 7190-26.

25. Entrevista com Maria Kozhevnikov.

26. Angélique Mazard et al., “A PETMeta-Analysis of Object and SpacialMental Imagery”, European Journal ofEducational Psychology 91, nº 4 (1999):684-89.

27. Mary Hegarty e Maria Kozhevnikov,“Types of Visual-Spatial Representations

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and Mathematical Problem Solving”,Journal of Educational Psychology 91, nº 4(1999): 684-69.

28. Kozhevnikov et al., “Spatial versusObject Visualizers”.

29. O. Blajenkova et al., “Object-SpatialImagery: A New Self-ReportQuestionnaire”, Applied CognitivePsychology 20 (2006): 239-63.

30. M. A. Motes et al., “Object-ProcessingNeural Efficiency Differentiates Objectfrom Spatial Visualizers”, Neuro Report 19,nº 17 (2008) 1727-31.

31. Ver, por exemplo, Maria Kozhevnikov,“Trade-Off in Object versus SpatialVisualization Abilities: Restriction in theDevelopment of Visual-ProcessingResources”, Psychonomic Bulletin andReview 17, nº 1 (2010): 29-35.

32. G. Borst et al., “Understanding theDorsal and Ventral Systems of the Human

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Cerebral Cortex: Beyond Dichotomies”,American Psychologist 66, nº 7 (outubro de2011): 624-32.

8. Das margens ao centro

1. Malcolm Gladwell, Outliers: The Storyof Success (Boston: Little, Brown andCompany, 2008).

2. K. Anders Eticsson et al., “The Role ofDeliberate Practice in the Acquisition ofExpert Performance”, Pychological Review100, nº 3 (1993): 363-406.

3. Geoffrey Colvin, “What it Takes to BeGreat”, Fortune, 19 de outubro de 2006.

4. Eleanor A. Maguire et al., “Navigation-Related Structural Change in theHippocampi of Taxi Drivers”, Proceedingsof the National Academy of Sciences 97, nº3 (abril de 2000); 4398-4400.

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5. Sara Reardon, “Playing by Ear”, Science333 (setembro de 2011): 1816-18.

6. Disponível em:http://theweek.com/article/index/232522/virtual-princeton-a-guide-to-free-online-ivy-league-classes.

7. Gareth Cook, “The Autism Advantage”,New York Times, 2 de dezembro de 2012.

8. Temple Grandin e Kate Duffy,Developing Talents: Careers for Individualswith Asperger’s Syndrome and High-Functioning Autism, ed. revista e ampliada(Overland Park: Autism AspergerPublishing Company, 2008).

9. Brent Schlender, “Exclusive: NewWisdom from Steve Jobs on Technology,Hollywood and How ‘Good Managementis Like the Beatles’”, Fast Company, maiode 2012.

10. Carla K. Johnson: “Startup CompanySucceeds at Hiring Autistic Adults”,

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Associated Press, 21 de setembro de 2011,http://news.yahoo.com/startup-company-succeds-hiring-autistic-adults-162558148.html.

11. Disponível em:http://walgreens.com/topic/sr/distribution_centers.jsp

12. Entrevista com Savino NuccioD’Argento.

13. Entrevista com John Fienberg.

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Agradecimentos

Quero agradecer a todas aspessoas que tornaram este livropossível. Primeiro à minhaeditora, Andrea Schulz, e àminha agente, Betsy Lerner, queajudaram a conceitualizar aestrutura do livro. Tem sidomaravilhoso trabalhar comRichard Panek, meu coautor. Éum excelente escritor quecaptou minha voz e armou aestrutura do livro. A capacidade

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de Richard de pensar porpalavras e padrõescomplementou meu pensamentovisual. Éramos dois tipos dementes diferentes trabalhandoem conjunto. Seu conhecimentocientífico foi valioso noprocesso. Quero tambémagradecer a Tracy Roe, aeditora de texto, que foi alémda sua tarefa. Ela é tambémmédica, e sua contribuição parao manuscrito foi enorme. Porfim, quero agradecer aoscientistas Walter Schneider,Nancy Minshew, MarleneBerhmann da Carnegie Mellon,

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e Jason Cooperrider daUniversidade de Utah, quefizeram o trabalho quepossibilitou este livro.

Temple Grandin

Além das pessoas que Templemencionou, gostaria deagradecer a Henry Dunow, meuagente, que me reuniu comTemple; a Virginia Hughes, cujaorientação em neuroimagens egenética foi incalculável; e àprópria Temple, umacolaboradora que me inspirou.Sentirei saudades das nossas

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sessões semanais debrainstorming.

Richard Panek

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Índice

A noite estrelada (pintura de Van Gogh)A rede social (filme)AAP, ver Associação Americana de

Psiquiatria (AAP)abordagem dos três tipos de mentes. Ver

também pensamento por padrões;pensamento por imagens; pensamentoverbal (palavras/fatos); pensamentovisual (imagens)

educação eemprego e

abordagem psicanalítica do diagnósticoAGP, ver Projeto Genoma do Autismo

(AGP)alta responsividade a sensaçõesalucinações

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amígdalaautismo ecérebro TG eemoções e

AMMT, ver treinamento para mapeamentoauditivo-motor (AMMT)

anatomia cerebral, 32-33. Ver tambémautismo, neuroanatomia do

visualização objetal e visualizaçãoespacial e

Anderson Jeffreyanisotropia fracional (AF)antidepressivos

ansiedade erelação entre autismo e

artepensamento por padrão evisualização objetal e visualização

espacial eAsperger, HansAspiritech (companhia)

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Associação Americana de Psiquiatria(AAP). Ver também Manual deDiagnóstico de Transtornos Mentais(DSM)

atenção ao detalheatividades manuaisautismo atípico (categoria do DSM)“autismo de alto funcionamento”. Ver

síndrome de Aspergerautismo, história do, ver também transtorno

do espectro autista (TEA)abordagem psicanalítica ebusca das causas biológicas efases dofoco nos sintomas emudança no diagnóstico psiquiátrico e

autismo, neuroanatomia do. Ver tambémgenética do autismo, neuroimagens:pontos fortes do cérebro autista

anormalidades no desenvolvimento eassimetria edesafios à pesquisa e

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diagnóstico eheterogeneidade causal eheterogeneidade comportamental ehomogeneidade estrutural erumos de pesquisa etamanho e

balbucioBarnett, JacobBaron-Cohen, Simonbarras de errosBauman, MargaretBe Different: Adventures of a Free-Range

Aspergian (Robison)Bettelheim, BrunoBrooks, DavidBuffett, WarrenBurns, sr. (professor de genética)

canto, efeitos terapêuticos doCapablanca, José Raúlcapacidade de pensar de baixo para cima

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capacidade do pensamento criativoCarlock, sr. (professor)Carlsen, MagnusCarly’s Voice: Breaking Through Autism

(Fleischmann)“cegueira do sentido”cegueira e atividade cerebralCelera GenomicsCentro de Controle e Prevenção de

Doenças, rede ADDMCentro de Estudos da Criança da Faculdade

de Medicina da Universidade de YaleCentro de Excelência em Autismo

(Faculdade de Medicina da UCLA)Centro de Pesquisa de Autismo,

Universidade de Cambridge. Vertambém teste QA (Quociente deAutismo)

Centro Médico da Universidade deColumbia

cerebelo e coordenação motoracerteza, sentimento de

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CHARGE, estudos do (UC Davis). VerRiscos de Autismo Infantil Genético eAmbiental

Chopin, Frédéricchoro, importância dochunksCNVs. Ver variações no número de cópias

(CNVs)“coerência central fraca”colaboração e três tipos de pensamentocomportamentos que buscam sensaçõesconceito de “mãe geladeira”conectividade

cérebro autista edesenvolvimento dapesquisa HDFT eno cérebro de TG

contato visual, evitação deCooperrider, Jasoncorpo calosocórtex frontalcórtex occipital. Ver também córtex visual

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córtex parietalcórtex pré-frontalcórtex temporalcórtex visual

alucinações eanatomia cerebral edanos aoestímulos auditivos eindivíduos cegos eplasticidade deTG e

CourseraCowan, Jackcriação. Ver também genética do autismo

ambientes negativos eidentificação dos pontos fortes da

criança emãe de TG epreparação para emprego e

Crothers, Bronson

D’Argento, Savino Nuccio

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Daly, Mark J.Dawson, MichelleDéficits de comunicação. Ver também

transtornos da linguagem; pacientesautistas não verbais; transtornos dafala

diagnóstico de autismo eestudos de neuroimagens e

déficits sociaisantidepressivos ediagnóstico de autismo eemprego egrosseria eproblemas sensoriais etreinamento e

diagnóstico de autismoabordagem psicanalítica eKanner elimitações dos rótulos emudança nos critériospara TGpotencial dos biomarcadores e

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precoce, importância dediagnóstico de trauma cerebral. Ver

rastreamento de fibras em altadefinição (HDTF)

diagnóstico infantil do autismo (síndromede Kanner)

diferenças individuaisfoco nos sintomas e“pensamento preso a rótulos” equestões sensoriais etipos de pensamento e

dislexiaDNA lixoDNA. Ver genética do autismoDRD4-7R, geneDSM. Ver Manual de Diagnóstico de

Transtornos Mentais (DSM)

Easter Sealseducação

acessórios online úteis eadequação aos déficits e

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exploração dos pontos fortes emodelo dos três modos de pensamento esalas de aulas especiais e

Eichler, Evan V.emoções

amígdala edistância dos pais emanejo dassobrecarga sensorial evisualização objetal e espacial em

empregoconselho sobre preparação paradeficiências sociais eoutros empregos epensadores por imagens epensadores por padrões epensadores por palavras/fatos esíndrome de Asperger evenda do trabalho e

Enciclopédia dos Elementos do DNA(Encode)

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Encode. Ver Enciclopédia dos Elementos doDNA (Encode)

Escala Wechsler de Inteligência paraCrianças

esclerose tuberosaesquizofreniaestudos de gêmeosestudos do “cérebro lesado”estudos MMF. Ver estudos do campo

discrepante (MMF)“eu atuante”“eu pensante”Exiting Nirvana: A Daughter’s Life with

Autism (Clara Claiborne Park)exposição a pesticidas

fascículo fronto-occipital inferior (FFOI)fascículo longitudinal inferior (FLI)fatores ambientaisfenótipoferramentas de desenho 3DFeynman, Richard

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FFOI. Ver fascículo fronto-occipital inferior(FFOI)

Fienberg, JohnFleischmann, ArthurFleischmann, CarlyFLI. Ver fascículo longitudinal inferior (FLI)foco nos sintomasFoldit (videogame)fractaisFranklin Pierce CollegeFreud, SigmundFried, ItzhakFrontiers of Neurosciencefuncionários do Vale do Silício

GalileuGates, Billgene responsivo. Ver também fatores

ambientaisgene liberalgene SHANK2genética do autismo

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dados AGP eDNA lixo eestudos de gêmeos eestudos de mutações egatilhos ambientais ehipótese de múltiplas mutações emães epais epredisposição erumos de pesquisa emtratamentos para indivíduos e

genótipoGladwell, MalcolmGoogleGrandin, Temple

assimetrias cerebrais edesenhos arquitetônicos dediagnóstico de autismo eestudos de neuroimagens depensamento associativo epensamento criativo epensamento de baixo para cima epensamento por imagens de

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plasticidade cerebral eproblemas sensoriais eprojetos para manejo do gado etamanho do cerebeloteste visual-espacial e

grosseria

habilidades de pensamento associativoHDFT. Ver rastreamento de fibras em alta

definiçãoHertz-Piccicotto, Irvaheterogeneidade no autismo. Ver também

diferenças individuaishiperdotadoshipocampoHirsch, JoyHobson, R. PeterHospital de Olhos e Ouvidos de

Massachusetts

ideias públicas sobre autismo

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imagem de tensor de difusão (ITD) Vertambém rastreamento de fibras em altadefinição (HDFT)

impressoras 3DInsel, Thomasinsensibilidade às sensaçõesInstituto de Pesquisa Médica em

Transtornos do DesenvolvimentoNeurológico (MIND), Universidade daCalifórnia, Davis

inteligênciainteração pessoalinteração sensorial, estudo sobreIrlen, HelenITD. Ver imagem de tensor de difusão

(ITD)

Jackson, MickJobs, SteveJournal of Autism and Developmental

DisordersJournal of Orthomolecular Psychiatry

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JTP. Ver junção temporoparietal (JTP)junção temporoparietal (JTP)

Kanner, LeoKhan AcademyKlúver, HeinrichKozhevnikov, Maria

LancetLane, AlisonLangdell, Timleitura. Ver problemas de processamento

visualLemke, LeslieLewis, RandyLivio, MarioLord, Catherine

Maguire, EleanorManual de Diagnóstico de Transtornos

Mentais (DSM)DSM-5, critérios e

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DSM-III, critérios eDSM-IV, critérios e

matemáticapensamento algébrico e geométrico empensamento por padrões na

matéria brancamatéria cinzenta. Ver córtex cerebralmatrizes progressivas de RavenMcKean, ThomasMeares, Olivemedicação. Ver medicamentosmedicamentos

foco nos efeitos egatilhos ambientaisresposta cognitiva e

memória de curto prazomemória de longo prazomemória espacial de curto prazomemória visualmemória. Ver também memória de curto

prazo; memória visualestruturas cerebrais e

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pensamento associativo eMendel, Gregormentalidade deficientemente, teoria damentores, a importância deMiller, Sara R. S.modelo diádico, em DSM-5modelo triádico, no DSM-IVmodosMonger, ChristopherMottron, Laurentmovimento biológicomúsicamusicoterapiamutações de novoMyers, Jennifer McIlwe

NatureNelson, Stanleyneuroimagem. Ver também autismo,

neuroanatomia docérebro de TG e

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interpretação elimitações dapesquisa sobre cérebro autista etipos devisualização de imagens e espacialvisualização objetal e espacial e

Neuroscience and Biobehavioral ReviewsNew Scientistnovas experiências, valor de

obesidade maternaobsessõesodores, sensibilidade a. Ver sensibilidade

olfativaorigami

pacientes autistas não verbaiscritérios de diagnóstico emúsica epontos fortes erelatos pessoais eresposta e

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tecnologia etestes de inteligência etranstornos sensoriais e

Padgett, JasonpadrãoPalácio de Cristal, Feira Mundial de

Londres (1851)palavras cruzadasParke, Jessica (Jessy)pensamento por imagens. Ver também

pensamento por padrões; pensamentoverbal (palavras/fatos); pensamentovisual (imagens)

educação eemprego e

pensamento por padrões. Ver tambémpensamento por imagens; pensamentoverbal (palavras/fatos); pensamentovisual (imagens)

como categoriaeducação eemprego e

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exemplos dematemática eorigami epesquisa evisualização espacial e objetal exadrez e

pensamento por palavras/fatos. Vertambém pensamento por padrões;pensamento por imagens; pensamentoverbal (palavras/fatos); pensamentovisual (imagens)

educação eemprego e

“pensamento preso a rótulos”definição do autismo no DSM ediferenças individuais eefeitos negativos doestar no espectro evalor dos rótulos e

pensamento verbal (palavras/fatos). Vertambém pensamento por padrões;pensamento por imagens; pensamento

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verbal (palavras/fatos); pensamentovisual (imagens)

autismo ecomo categoriaeducação eempregos que envolvemteste espacial eTG e

pensamento visual (imagens)pensamento por padrões como categoria

evisualização espacial e objetal eTG e

pensamento, tipos de. Ver pensamento porpadrões; pontos fortes do cérebroautista; abordagem dos três tipos demente; pensamento verbal(palavras/fatos); pensamento visual(imagens)

Pensando Fora do Tijolo, exercícioPerfil Sensorial Curto (ferramenta de

pesquisa)

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pesquisaabordagem algorítmica ecritérios de diagnóstico do DSM-5 efoco nos sintomas eHDFT eindivíduos jovens epensamento preso a rótulos esobre biomarcadores neuroanatômicossobre plasticidade cerebralsobre problema sensoriaistecnologia e

Physical Therapy (periódico)plasticidade cerebralPollock, Jacksonponte inversorapontos fortes do cérebro autista

capacidade de pensamento associativo ecapacidade de pensar criativamente ecapacidade de pensar de baixo para cima

ecolaboração eidentificação dos

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inteligência ememória eplasticidade cerebral e“Strong Association of De Novo Copy

Number Mutations with Autism”(artigo de 2007 na Science)

problemas de alternância da atençãoproblemas de input de linguagemproblemas de output de linguagemproblemas de processamento auditivo

dicas para pessoas comidentificação deTG e

problemas de processamento visualdicas para pessoas comidentificação deplasticidade cerebral e

problemas sensoriais no autismoatitudes antedicas para pessoas comdomínios sensoriais eidentificação de

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impactos depesquisa sobrerelatos pessoais sobresensibilidade esubtipos deTG e

programação de computadorProjeto Genoma do Autismo (AGP)Projeto Genoma Humanoproteína neuroliginaproteína neurexinaproteína SHANK3

QA (Quociente de Autismo), teste de

Rajarshi Mukhopadhyay, Titorastreamento de fibras em alta definição

(HDFT)razão áurea“Recognition of Faces: An Approach to the

Study of Autism” (estudo de 1978)rede cósmica

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Rede de Monitoramento do Autismo eTranstornos de Desenvolvimento(ADDM), 26

regra das 10 mil horasRelatos pessoais. Ver também Grandin,

Templefoco nos sintomas eproblemas de eliciar eproblemas sensoriais etablets etipos de pensadores visuais e

ressonância magnética nuclear (RMN). Vertambém imagem de tensor de difusão(ITD); ressonância magnética funcional(RMNf); neuroimagem

ressonância magnética nuclear funcional(RMNf)

biomarcadores para autismo esensibilidade ao som eTG e

retardo mental e autismo

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Riscos de Autismo Infantil Genético eAmbiental (CHARGE), programa

risperidona (Risperdal)RMN estrutural. Ver ressonância

magnética (RMN)Robison, John ElderRosehan, Davidrostos

pensamento de cima para baixo eresposta cortical a

Schaefer, G. BradleySchneider, WalterSciencesensibilidade ao som. Ver problemas de

processamento auditivo; problemassensoriais no autismo

sensibilidade ao toquesensibilidade gustativasensibilidade motora. Ver também

movimento biológicosensibilidade olfativa

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sensibilidade tátil. Ver sensibilidade aotoque

sensibilidade, e problemas sensoriais“Sensory Processing Subtypes in Autism:

Association with Adaptive Disorders”(Lane et al.)

sentimento e comportamento. Ver tambémrelatos pessoais em pesquisas

estan, NenadShermer, Michaelsíndrome de Asperger (categoria do DSM)

emprego epensamento por padrões e

síndrome de Downsíndrome de Kanner (autismo infantil)síndrome de Rettsíndrome do X frágilSoulières, IsabelleSpecialisterne (companhia)Squidoo (site)Stahl, LesleyState, Matthew W.

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sudokusuplementação vitamínica

tablets (computador), vantagens doTammet, DanielTaylor, RichardTEA, ver transtorno do espectro autista

(TEA)tecnologia

pacientes autistas não verbais epesquisa eTemple Grandin (filme da HBO)

teorema pitagóricoteoria da alta conectividade

teoria da baixa conectividadeterminal aeroportuário da United Airlines

em O’Hareteste da resolução de grãoteste das figuras ocultasteste de relações espaciais

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teste QVVI (Quociente de Vividez daVisualização de Imagens)

testes visuais-espaciaisTG e

TGD. Ver transtorno global dodesenvolvimento

“The Emerging Biology of Autism SpectrumDisorders” (artigo de 2012 na Science)

“The Long-Range Interaction Landscape ofGene Promoters” (artigo da Nature)

The New York TimesThinking in Pictures (Grandin)transtorno de comunicação social

(categoria do DSM)transtorno do espectro autista (TEA)

como diagnóstico“comportamento autista”exposição à combustão de veículosimpacto das mudanças no DSM eincidência dolimitação dos rótulos e

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transtorno global do desenvolvimento(TGD). Ver também síndrome deAsperger; transtornos do espectroautista (TEA)

transtornos da falaTG e

transtornos da linguagem. Ver tambémdéficits de comunicação; pacientesautistas não verbais, transtornos dafala

autismo emúsica etipos de

transtornos disruptivos de conduta e decontrole de impulsos (categoria doDSM)

transtornos do desenvolvimento intelectual(categoria do DSM)

transtornos globais do desenvolvimento semoutra especificação (TGD-SOE)

tratamento farmacológico. Verantidepressivos; medicamentos

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tratamento médico e rótulostreinamento para mapeamento auditivo-

motorTriplett, Donald

Universidade de AmsterdãUniversidade de Caen e Universidade René

Descartes, FrançaUniversidade da Califórnia, San DiegoUniversidade da Carolina do Norte em

Chapel Hill, estudo da criançaUniversidade de LouisvilleUniversidade de OhioUniversidade de PittsburghUniversidade de UtahUniversidade de Washingtonuso da internet, ver também tablets

(computador), vantagens do

vacinação e autismoVan Dalen, J. G. T.Van Gogh, Vincent

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Venter, Craigvideogamesviés localvisão, recuperação davisualização de objetos e espacialvisualização espacial. Ver também

pensamento por padrõesvisualizador de objetos. Ver também

pensamento visual (imagens)

WalgreensWan, Catherine Y.Williams, DonnaWiltshire, StephenWing, Lorna“World Changing Too Fast” (artigo de

2009)

xadrez e pensamento por padrões

Zuckerberg, Mark

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O cérebro autista

Wikipédia Temple Grandinhttps://pt.wikipedia.org/wiki/Temple_Grandin

Good reads Richard Panekhttp://www.goodreads.com/author/show/144472.Richard_Panek