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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO 11ª Câmara de Direito Público Apelação Cível 629.834-5-0 Procedência: Mogi Guaçu Relator: Des. Ricardo Dip (Voto RHMD 18.960) Apelantes: Elias Fernandes de Carvalho e Outros Apelada: Promotoria Pública de Mogi Guaçu RELATÓRIO : 1. A r. sentença de primeiro grau, nestes autos, acolheu a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público da Comarca de Mogi Guaçu contra Elias Fernandes de Carvalho e Outros, vereadores e ex-vereadores locais, para o fim de, com incidente declaração de inconstitucionalidade da Lei de Mogi Guaçu nº 3.784, 21 de junho de 2000, condenar os requeridos a devolver apontados excessivos valores de subsídios percebidos por exercício na 13ª Legislatura municipal (fls. 307-12). 2. Do decidido apelaram os suplicados, argumentando, em resumo, com a higidez da referida Lei nº 3.784, além de sustentarem incabível a restituição de verbas alimentares (fls. 325-41). Respondeu-se ao recurso, e por seu não- provimento opinou a Procuradoria Geral de Justiça (fls. 362-71). É o relatório, em acréscimo ao da sentença de origem.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO11ª Câmara de Direito PúblicoApelação Cível 629.834-5-0Procedência: Mogi GuaçuRelator: Des. Ricardo Dip (Voto RHMD 18.960)Apelantes: Elias Fernandes de Carvalho e Outros Apelada: Promotoria Pública de Mogi Guaçu

RELATÓRIO :

1. A r. sentença de primeiro grau, nestes autos, acolheu a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público da Comarca de Mogi Guaçu contra Elias Fernandes de Carvalho e Outros, vereadores e ex-vereadores locais, para o fim de, com incidente declaração de inconstitucionalidade da Lei de Mogi Guaçu nº 3.784, 21 de junho de 2000, condenar os requeridos a devolver apontados excessivos valores de subsídios percebidos por exercício na 13ª Legislatura municipal (fls. 307-12).

2. Do decidido apelaram os suplicados, argumentando, em resumo, com a higidez da referida Lei nº 3.784, além de sustentarem incabível a restituição de verbas alimentares (fls. 325-41).

Respondeu-se ao recurso, e por seu não-provimento opinou a Procuradoria Geral de Justiça (fls. 362-71).

É o relatório, em acréscimo ao da sentença de origem.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO11ª Câmara de Direito PúblicoApelação Cível 629.834-5-0

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI GUAÇUANA Nº 3.784, DE 2000. CONDENAÇÃO ORIGINÁRIA DOS REQUERIDOS A DEVOLVER EXCESSO DE SUBSÍDIOS .

1. Diversamente da eiva formal que, segundo julgado do Órgão Especial deste Tribunal de Justiça (ADI 116.541), acometeu a Lei de Mogi Guaçu nº 4.120/2004, sucessiva da nestes autos versada Lei local nº 3.784/2000, esta, por editada antes da eficácia da Ec nº 25/2000, não afrontou a, quanto a ela, póstera exigência de que o subsídio dos vereadores se fixasse mediante resolução da Câmara Municipal.

2. O art. 1º da Lei nº 3.784 de Mogi Guaçu não contém enunciado relativo ao reajustamento de subsídios em afronta da reserva de legislatura, comportando seu texto interpretação conforme ao inc. V, art. 29, CF/88, com a redação da Ec nº 25/2000.

3. Desse modo, a indevida recepção de reajustamento de subsídios durante a 13ª Legislatura de Mogi Guaçu corresponde a uma situação de fato , que não deriva de eventual inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 3.784.

4. Até porque, se alguma incompatibi l idade normativa se reconhecesse, ela acarretaria apenas a revogação do art. 1º da Lei nº 3.784 pela norma posterior da Ec nº 25/2000, situação que também arremeteu contra a vigência do art. 6º da mesma Lei, por igual revogada com a eficácia da Ec nº 25.

5. A Lei nº 3.784/2000 de Mogi Guaçu tem caráter temporário e sua eficácia se exauriu em 31 de dezembro de 2004. De conseguinte, ao lado da

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repulsa do controle abstrato de sua constitucionalidade (cfr. ADI 133-STF, Min. Gilmar Mendes), tampouco se avista admissível a declaração incidental, porque não se trata de negar aplicação a lei vigente .

6. De todo modo, suposto se admitisse declaração incidente da inconstitucionalidade de leis temporárias exauridas, não se exigiria reserva de plenário , porque desaparecem, com o esgotamento da eficácia normativa da lei, as razões de segurança jurídica que alicerçam a cláusula de reserva.

7. Além disso, a regra do art. 3º da Lei guaçuana nº 3.784 conflita com o § 4º, art. 39, CF/88, conforme se infere dos motivos determinantes adotados pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, inter plures , nas ADI’s-MC’s 2.648 (Min. Ricardo Lewandowski) e 3.771 (Min. Carlos Ayres Britto) e na AO 584 (Min. Maurício Corrêa ).

8. Cabe estender a teoria dos motivos determinantes das decisões da Justiça constitucional, para nutrir a interpretação da regra do p.ún., art. 481, CPC.

9. O STJ tem admitido a modulação do princípio da irrepetibilidade de alimentos e, em caso de pagamento efetuado em erro pela Administração Pública, sustentado admissível a repetição, pena de enriquecimento, sem causa legal, com maltrato do erário.

10. A partição em dez prestações do valor a devolver-se aos cofres públicos, em caso de recepção incorreta de valores alimentares, já se decidiu extensivamente em favor de não-integrantes dos quadros do serviço público, apontando-se nisso solução “razoável, teleológica e consentânea aos fins sociais” (REsp 996.850 –Min. Arnaldo Esteves Lima).

11. Quanto aos juros de mora, sua disciplina convoca, por isonomia , o constante do Código Civil (art. 405) e da Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997 (art. 1º-F). Vale por dizer que esses juros se hão de contar da citação e com a taxa de 6% ao ano, porque essa a taxa infligível à

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Fazenda Pública se condenada a pagamentos de verbas remuneratórias.

Provimento parcial da apelação.

VOTO :

3. A Lei municipal de Mogi Guaçu nº 3.784, cuja declaração incidente de inconstitucionalidade amparou a conclusão de procedência de ação civil pública versada nestes autos, guarda alguma simetria normativa com a ela posterior Lei local nº 4.120, de 31 de março de 2004.

Ao passo que a primeira trata da fixação dos subsídios dos vereadores guaçuanos da 13ª Legislatura —de 1º janeiro de 2001 a 31 de dezembro de 2004—, a segunda, a Lei nº 4.120, refere-se à 14ª Legislatura, estendida de 1º de janeiro de 2005 a 31 de dezembro de 2008.

Essa indicação de cercania dos casos —proximidade de situações que, nada obstante, se acompanha de diferenças importantes— releva já por os subsídios dos Vereadores de Mogi Guaçu terem sido fixados, nos períodos em foco, sempre mediante leis e não por meio de resoluções da Câmara Municipal.

Mais ainda importa essa vizinhança das normativas apontadas quanto se tenha em conta que a norma de atrelamento proporcional dos subsídios dos vereadores de Mogi Guaçu aos dos deputados estaduais de São Paulo, objeto do art. 1º da Lei guaçuana nº 3.784, reproduziu-se no § 1º, art. 1º, da Lei local nº 4.120, nesta com o acréscimo, embora, de regra expressa sobre seu reajustamento que, como se apreende das razões recursórias (cfr. fl. 331), se aplicou por admitida implicitação no art. 1º da Lei nº 3.784.

4. Lê-se na mencionada Lei nº 3.784 :

“Art. 1º- O subsídio mensal dos Vereadores à Câmara Municipal de Mogi Guaçu, para a Legislatura que se iniciará em 1º de Janeiro de 2001 com término

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previsto para 31 de Dezembro de 2004 (13ª Legislatura) fixa fixado em 50% (cinqüenta por cento) dos subsídios dos Deputados Estaduais, que será pago inclusive nos períodos de recesso”.

E no § 1º do art. 1º da Lei de Mogi Guaçu nº 4.120:

“O valor do subsídio a que se refere o ‘caput’ deste artigo, a ser pago mensalmente e inclusive nos períodos de recesso, é de 50% (cinqüenta por cento) do subsídio dos Deputados à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo”.

5. O egrégio Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, apreciando e decidindo a ADI 116.541 , declarou, em votação unânime, a inconstitucionalidade da Lei guaçuana nº 4.120, de 31 de março de 2004.

Decota-se do voto condutor de seu ven. acórdão, prolatado pelo Des. Walter de Almeida Guilherme :

“No exercício de atribuição fixada no artigo 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual n° 734, de 26 de novembro de 1993, e, na forma dos art igos 125, § 2°, e 129, inciso IV, da Constituição Federal, e dos artigos 74, inciso VI, e 90, inciso I I I , da Constituição do Estado de São Paulo, o Procurador-Geral de Justiça propõe, com pedido de l iminar, ação direta de inconstitucionalidade da Lei n° 4.120, de 31 de março de 2004, do Município de Mogi Guaçu, que dispõe sobre a fixação dos subsídios dos Vereadores à Câmara Municipal de Mogi Guaçu, referentemente à 14ª Legislatura (2005/2008). Aludindo aos parágrafos primeiro e segundo do artigo 1º do mencionado diploma legislativo, alega o autor sua vertical incompatibi lidade com os artigos 111 e 144 da Constituição Paulista.

A inconstitucionalidade reside, prossegue o requerente, em ter a lei fixado o subsídio mensal dos Vereadores para a legislatura de 2005/2008 de forma a corresponder a 50% do que, a igual t ítulo, for pago por mês aos Deputados Estaduais, e com isso permitir que ocorra modificação do subsídio dos Vereadores

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dentro da própria legislatura, o que é vedado; ainda que o subsídio deve ser lixado em valor certo e determinado, e não percentualmente sobre aquele pago a um agente de outra esfera federativa; e também que essa vincularão ao subsídio pago aos Deputados Estaduais implica renúncia da própria autonomia municipal. Diz mais, que citada Lei ofende ainda o princípio da separação de poderes e a regra da indelegabilidade de funções, previstos no artigo 5º caput e seu § 1º da Constituição do Estado de São Paulo, uma vez que a Câmara Municipal está renunciando as suas competências, delegando-a, ainda que parcialmente, ao Chefe do Executivo.

A l iminar foi concedida, para efeito de suspender, com efeito ‘ex nunc’, a vigência e eficácia da Lei Municipal n° 4.120, de 31 de março de 2004, do Município de Mogi Guaçu, até o julgamento da ação (…), sendo desprovido o correspondente agravo regimental (…).

Informando, a Câmara Municipal de Mogi Guaçu suscita a preliminar de carência da ação, dado que os pretensos vícios da lei apontados pelo autor se manifestariam em face da Constituição Federal, e não da Constituição do Estado de São Paulo, inviabil izando o pedido. Ademais, ainda em preliminar, não estão nos autos as informações do chefe do Poder Executivo Municipal, necessárias na medida em que a lei é um ato complexo que se aperfeiçoa com a sanção dessa autoridade. No mérito, sustenta não inexistir a invariabil idade absoluta dos subsídios dos Vereadores; referido subsídio pode não ser expresso em valor certo e determinado, em moeda corrente nacional; a vinculação do subsídio do Vereador àquele estabelecido para o Deputado Estadual não expressa renúncia da autonomia municipal (…). A Fazenda Pública do Estado de São Paulo manifestou desinteresse na ação (…) e a Procuradoria-Geral de Justiça insiste na procedência da representação de inconstitucionalidade (…).

Eis o relatório.

1. A Constituição Federal de 1988, no artigo 29, VI, com a redação dada pela Emenda Constitucional n°

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25, de 14 de fevereiro de 2000, para entrar em vigor em 1º de janeiro de 2001, estabeleceu que o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição, respeitados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os limites máximos que enumera nas al íneas de ‘a' até ‘f ' .

É certo que não vamos encontrar dispositivo semelhante na Constituição do Estado de São Paulo, o que daria azo à preliminar de carência da ação propugnada pela Câmara Municipal de Mogi Guaçu. Mas assim não é, pois, malgrado não exista art igo expresso na Constituição Paulista que disponha sobre fixação dos subsídios dos Vereadores, abrigou a mesma, no artigo 144, principio sobre o tema da Constituição Federal, ao assinalar, a respeito da autonomia municipal, que os municípios se auto-organizarão, por Lei Orgânica, respeitados os princípios estabelecidos na Constituição Federal e na do Estado respectivo. Ou seja, aquele princípio de organização municipal instituído na Constituição Federal, por força do artigo 144 da Constituição do Estado de São Paulo, impõe-se aos Municípios deste Estado, de sorte que se há violação, em tese, ofendida, diretamente, é a Carta do Estado, fato que autoriza a propositura de ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal que não observou um princípio que a Constituição da República impõe ser observado pelos Municípios.

Outrossim, embora, é fato, não tenham vindo informações do Prefeito Municipal —diga-se de passagem, porque não requeridas por este Relator, a ausência não impede o exame da questão, pois o texto da lei, obviamente, está nos autos e todo o seu processo legislativo, inclusive a sanção e promulgação, está retratado às fls. 96/107.

Rejeito, nestes termos, as preliminares.

2. Como está absolutamente claro no mencionado dispositivo da Constituição, não cabe à lei fixar o subsídio dos Vereadores, senão que à Câmara de Vereadores. Há nítida ofensa à iniciativa das Câmaras

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Municipais estabelecer em lei o subsídio dos Vereadores. A matéria não se enquadra no princípio da reserva legal, pois, havendo determinação constitucional de que a fixação do subsídio cabe à Câmara, esta o fará por resolução, espécie normativa integrante do processo legislativo, prevista no art. 59, VII , da Constituição Federal, descabendo delegação. Nas matérias de sua competência privativa —e esta é uma delas—, as Casas Legislativas deliberam por resolução. Não poderia, pois, lei fixar os subsídios dos Vereadores, sob pena de violação da autonomia do Poder Legislativo local e, por conseguinte, da independência e harmonia dos Poderes, vedada a delegação, princípio esse que se impõe à União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Mas, quiséssemos validar a fixação do subsídio dos Vereadores por lei, de iniciativa da Câmara Municipal —e no caso realmente o projeto foi de iniciativa da Mesa da Câmara de Vereadores de Mogi Guaçu—, examinemo-la.

A Lei n° 4.120/2004, do Município de Mogi Guaçu, dispõe, no art. 1º, que ‘É fixado o subsídio dos Vereadores à Câmara Municipal para a 14ª Legislatura, que vigerá de 1º de janeiro de 2005 a 31 de Dezembro de 2008’, estabelecendo, o § 1º, que ‘O valor do subsídio a que se refere o 'caput' deste artigo, a ser pago mensalmente e inclusive nos períodos de recesso, é de 50% (cinqüenta por cento) do subsídio dos Deputados à Assembléia Legislativa do Estado.’ e, na seqüência, dispondo o § 2º, que ‘O valor do subsídio fixado no parágrafo 1º deste artigo será reajustado na mesma data e no mesmo percentual fixado aos Deputados à Assembléia Legislativa do Estado.’, concluindo, o § 3º, por asseverar que ‘O subsídio a que se refere esta Lei terá seu valor definido por Ato da Mesa da Câmara.’.

A Emenda Constitucional n° 25/2000 reintroduziu a denominada ‘regra da legislatura’, que consiste em determinar que o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, de forma a evitar que aqueles fixem a sua própria remuneração, vale dizer para viger na própria legislatura, prática que não

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seria condizente com o princípio constitucional da moralidade administrativa. Essa mesma Emenda Constitucional dispôs que o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a um dado percentual do subsídio dos Deputados Estaduais, variando conforme a população do Município. Assim, em Municípios de cem mil e um a trezentos mil habitantes —que é o caso do Município de Mogi Guaçu—, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a cinqüenta por cento dos subsídios dos Deputados Estaduais (art. 29, VI, ‘d’, da Constituição Federal).

Nesse sentido, o art. 1º e § 1º da Lei em apreço não contrariam a Constituição da República e, conseqüentemente, a Constituição do Estado de São Paulo. Não ofende a Constituição a fixação do subsídio do Vereador em percentual daquele estabelecido para o Deputado Estadual, e não em valor certo e determinado, pois esta é precisamente a regra da Constituição Federal, não configurando, por certo, a determinação renúncia à autonomia municipal. Está expresso no § 3º do diploma legislativo acoimado de inconstitucional que Ato da Mesa Câmara definirá o valor, isto é, apurado o subsídio do Deputado Estadual, esse órgão da Câmara de Vereadores definirá o valor do subsídio do Vereador de forma a torná-lo equivalente a 50% do subsídio daquele agente polít ico do Estado.

Mas, e o reajustamento do valor desse subsídio, ordenado se proceder na mesma data e no mesmo percentual fixado aos Deputados à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, pelo § 2º da Lei n° 4.120/04?

A Constituição da República não deixou ao alvedrio absoluto dos Estados federados a fixação do subsídio de seus Deputados, pois, com o advento da Emenda Constitucional n° 19/1998, estabeleceu-se que este será fixado por lei de iniciativa da Assembléia Legislativa, na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Federais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º, 57, § 7º, 150, I I, 153, I I I , e 153, § 2º, I (art. 27, § 2º). Observe-se que, relativamente ao subsídio dos Deputados Estaduais, não existe

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determinação de que este será fixado em cada legislatura para a subseqüente, vale dizer, não há a ‘regra da legislatura’ estatuída para a fixação do subsídio dos Vereadores. Assim, lei de iniciativa da Assembléia Legislativa poderá fixar o subsídio dos Deputados Estaduais em cada legislatura para esta própria. Bem ou mal, portanto, a regra da invariabil idade do subsídio na mesma legislatura não foi adotada relativamente aos Deputados Estaduais e, aliás, também não no que concerne ao subsídio dos Deputados Federais e Senadores, conforme se colhe do disposto no art. 49, VII, artigo esse que cuida do estabelecimento das competências exclusivas do Congresso Nacional. A Constituição Federal tratou diferentemente a questão da fixação do subsídio dos Senadores, Deputados Federal e Deputados Estaduais e daquela dos Vereadores. Pode-se criticá-la por isso, mas não há deixar de aplicá-la a pretexto de que deveria ter estabelecido regra única, ou seja, de que a fixação do subsídio de qualquer integrante das Casas Legislativas do País deveria seguir a chamada ‘regra da legislatura’.

Da forma como posto no § 2º da Lei em questão, se lei de iniciativa da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo fixa um subsídio mais elevado para o Deputado Estadual na mesma legislatura, o subsídio do Vereador à Câmara Municipal de Mogi Guaçu será automaticamente reajustado, para manter a equivalência de 50% do subsídio do Deputado Estadual. Em suma, estaria havendo fixação de um novo subsídio na mesma legislatura. E descabe argumentar que esse percentual se manteria invariável, porque o que estaria havendo é um aumento real do subsídio dos Vereadores à Câmara Municipal de Mogi Guaçu na mesma legislatura. Tal norma, por conseguinte, como assinalado pelo douto Procurador-Geral de Justiça, ‘deve ser tida por inconstitucional, em face tanto da Constituição Federal como da Constituição do Estado, visto que, da forma como editada, a lei municipal permite a modificação do subsídio dos vereadores dentro da própria legislatura, o que não é permitido.’.

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Em conclusão, inconstitucionalidade existe na Lei n° 4.120/2004, de caráter formal, pois não foi respeitada a autonomia do Poder Legislativo local de fixar, por resolução, o subsídio dos Vereadores. Violação exist iu, pois, do processo legislativo regulamentado na Constituição Federal que, como de jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, é cogente para Estados e Municípios, restando contrariado, pois, o art. 144 da Constituição do Estado de São Paulo, e, porque não dizer, de uma certa forma, também o art. 5º e § 1º dessa mesma Lei Fundamental do Estado. Inconstitucionalidade material há, no que respeita ao § 2º da Lei, por ofensa também ao art. 144 da Carta Estadual, na medida em que, não observando a ‘regra da legislatura’ disposta na Constituição Federal, a Lei em apreço deixou de atender um princípio imposit ivo de organização municipal referido naquele versículo da Constituição Paulista.

Declaro, em conseqüência, inconstitucional a Lei n° 4.120/2004, do Município de Mogi Guaçu, lembrando que esta decisão já tem o condão de suspender a execução do mencionado diploma, não havendo, portanto, necessidade de comunicação aos Poderes locais para esse fim”.

6. A solução adotada nesse ven. acórdão não pode estender-se simpliciter à Lei de Mogi Guaçu nº 3.784, de 21 de junho de 2000, porque, para logo, esta não padece da mácula formal que vulnerou a Lei guaçuana nº 4.120.

É que, ao editar-se a Lei nº 3.784, vigorava o texto do inc. VI, art. 29 da Constituição Federal de 1988, com a redação que lhe dera a Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998, admitindo-se o “subsídio dos Vereadores fixado por lei de iniciativa da Câmara Municipal , na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Estaduais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º, 57, § 7º, 150, I I, 153, I II, e 153, § 2º, I” (o destaque não é do original).

Apenas a partir de 1º de janeiro de 2001 teve início a eficácia da Emenda constitucional nº 25, de 14

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de fevereiro de 2000 (cfr. art. 3º), que deu este novo enunciado ao inc. VI, art. 29, CF/88:

“o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos: (…)”.

Ao par da adoção da “reserva de legislatura”, a Ec nº 25/2000 assentou —em palavras do Des. Walter Guilherme na referida ADI 116.541— que “a matéria não se enquadra no princípio da reserva legal, pois, havendo determinação constitucional de que a fixação do subsídio cabe à Câmara, esta o fará por resolução, espécie normativa integrante do processo legislativo, prevista no art. 59, VII, da Constituição Federal, descabendo delegação” .

Esse dispositivo textualizado pela Ec nº 25/2000 não teve, contudo, eficácia retroativa para incompatibilizar ex tunc lei editada segundo o padrão constitucional de seu tempo.

7. Além disso, no art. 1º da Lei local nº 3.784/2000 não se encontra texto expresso de reajustamento dos subsídios.

É certo que, de fato, se aplicou essa norma como se nela implicitada a previsão de reajuste do subsídio, mas, não por isso, se deve estender a ela a solução adotada pela Corte na ADI 116.541:

• primeiro, porque a reserva de legislatura emergiu de modo póstero à edição dessa Lei nº 3.784;

• segundo, porque seu art. 1º comportava interpretação conforme ao texto do inc. V, art. 29, CF/88, com a redação da Ec nº 25/2000.

De conseguinte, a indevida recepção de reajustamento de subsídios durante a 13ª Legislatura de Mogi Guaçu corresponde a uma situação de fato , que não deriva de eventual inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 3.784.

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Até porque, ao lado de uma leitura constitucional de seu texto ( interpretação conforme), se incompatibilidade normativa se reconhecesse, ela acarretaria apenas a revogação do art. 1º da Lei nº 3.784 pela norma posterior da Ec nº 25/2000. Os atos normativos então existentes que se revelassem incompatíveis com a Ec nº 25/2000 revogaram-se , no todo ou em parte, por efeito dessa sobrevinda incompatibilidade —que se designa, algumas vezes e de modo impróprio, “inconstitucionalidade superveniente” . É que, segundo o predominante entendimento do egrégio Supremo Tribunal Federal (cfr., em discussão paradigmática, ADI 2–Pleno –Ministro Paulo Brossard ; ADI 438–Pleno –Ministro Sepúlveda Pertence), as normas constitucionais dotam-se de eficácia derrogatória sobre normas de mesma ou inferior hierarquia.

8. Além desse art. 1º da Lei nº 3.784 de Mogi Guaçu, a petição inicial da presente demanda hostil izou a validez das normas de seus arts. 3º e 6º (fls. 10 e 11).

Esse referido art. 6º assinou o subsídio do Presidente da Câmara em 75% do subsídio do Deputado Estadual de São Paulo, e essa proporção veio a enfrentar-se com a norma da alínea d, inc. V, art. 29, CF/88, incluída pela Ec nº 25/2000: “em Municípios de cem mil e um a trezentos mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a cinqüenta por cento do subsídio dos Deputados Estaduais”.

Ainda uma vez, o caso não é de inconstitucionalidade, mas de revogação do art. 6º da Lei guaçuana diante de com ele incompatível nova norma de porte constitucional.

9. Remanesce o exame do art. 3º da Lei local nº 3.784 que assim dispõe:

“É devido ao Vereador e ao Presidente da Câmara parcela indenizatória no valor de seu subsídio, a ser pago:I- 50% (cinqüenta por cento) no início de cada Sessão Legislativa;

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I I - 50% (cinqüenta por cento) no final de cada Sessão Legislativa, após comparecimento a, no mínimo, 2/3 (dois terços) das Sessões Ordinárias”.

Em mera confrontação textual, é de logo avistável a incompatibil idade desse enunciado com o disposto no § 4º, art. 39, CF/88, observada a redação que lhe deu a Emenda constitucional nº 19/1998:

“O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI”.

Por mais controverso o nome “parcela única” (: que induz a idéia de uma unidade, indecomponível, de um todo “sem partes”, sem parcela alguma), certo é que o subsídio, no modelo constitucional em vigor, não pode agregar acréscimos pecuniários, salvo, no limite, alguns poucos adicionais (: assim, férias e de trabalho noturno), salário-família, o décimo-terceiro salário, e verbas de caráter efetivamente indenizatório (p.ex., diárias e adjutórios de transporte).

Não basta, entretanto, para definir a natureza indenizatória desses acréscimos ao subsídio o fato de assim se escrever na lei. Vem a calhar o paradigmático trecho inicial do voto do Ministro Luiz Gallotti do egrégio Supremo Tribunal Federal, no RE 71.758:

“Como sustentei muitas vezes, ainda no Rio, se a lei pudesse chamar de compra o que não é compra, de importação o que não é importação, de exportação o que não é exportação, de renda o que não é renda, ruiria todo o sistema tributário inscrito na Constituição.

Ainda há poucos dias, numa carta ao eminente Ministro Prado Kelly, a propósito de um discurso seu sobre Milton Campos, eu lembrava a frase de Napoleão:

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‘Tenho um amo implacável, que é a natureza das coisas’.

Milton Campos também era fiel a esse pensamento”.

Nesse plano, a r. sentença de origem bem reconheceu que o art. 3º da Lei local nº 3.784 se refere a verbas de caráter remuneratório, pois nesse dispositivo não se diz “o que se indeniza nem o que motiva essa indenização” (fl. 309, in medio). 10. Põe-se neste passo uma questão, contudo: era caso de declarar-se incidentalmente a inconstitucionalidade desse art. 3º da Lei nº 3.784?

Parece-me que não cabia essa declaração incidental . A versada Lei nº 3.784 tem caráter de lei temporária , e sua eficácia já se exaurira em 31 de dezembro de 2004 , proferida a r. sentença de primeiro grau aos 8 de novembro de 2005 (fl. 313).

Assinale-se que a declaração de inconstitucionalidade da Lei de Mogi Guaçu nº 4.120/2004 não teve efeito repristinatório da Lei nº 3.784, por dois motivos:

• primeiro, o de que o prazo de eficácia normativa da Lei nº 3.784 já se superara por decurso, inibindo que eventual efeito repristinatório com o julgamento da ADI 116.541-TJSP pudesse reavivar lei por si só com eficácia exaurida;

• segundo, o de que a Lei guaçuana nº 4.120 não era, de toda a sorte, norma revogatória da Lei nº 3.784, senão que norma apenas temporalmente sucessiva, não menos ditada com prazo eficacial determinado.

11. Se assim, porém, não se entender, e, diversamente, se queira reconhecer viável a declaração incidental de inconstitucionalidade de lei de eficácia consumida ou de lei revogada, cabe salientar a circunstância que as leis temporárias exauridas repulsam o processo objetivo de controle de constitucionalidade, assim fez ver r. decisão

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monocrática do Ministro Gilmar Mendes , do egrégio Supremo Tribunal Federal:

“…resta prejudicada a presente ação direta de inconstitucionalidade, por perda superveniente de objeto, conforme o entendimento firmado por esta Corte no julgamento da ADI n° 709/PR, Rel. Min. Paulo Brossard (DJ 7.10.1992), e já consolidado na jurisprudência do Tribunal (ADI 1.889/AM, Rel. Min. Eros Grau, DJ 3.10.2005; ADI n° 387/RO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 9.9.2005; ADI n° 3.513/PA, Rel. Min. El len Gracie, DJ 22.8.2005; ADI n° 2.436/PE, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 26.8.2005; ADI n° 380/RO, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 4.3.2005). Quanto aos art igos 1º e 4º da Lei nº 7.843, de 18.10.89, e em relação ao art. 75 da Lei nº 7.799, de 10.7.89, é preciso ressaltar que também fizeram parte do objeto da já extinta ADI n° 156/DF. Na ocasião, o então Min. Rel. Néri da Silveira julgou prejudicada a ação por perda de objeto, entendendo que tais dispositivos normativos possuíam eficácia temporária já exaurida, desta forma: ‘(.. .) tratando-se, à evidência, de leis temporárias, cuja eficácia normativa de há muito se exauriu, impõe-se a prejudicial idade da presente ação, conforme iterativa jurisprudência da Corte (Adin nº 448-1 Relator Ministro Octávio Gallotti; Adin nº 1.355-6, Relator Ministro I lmar Galvão; Adin 1.407-2, Relator Ministro Sepúlveda Pertence; Adin nº 540-5, Relator Ministro Maurício Corrêa, dentre outros). Do exposto, julgo prejudicada a presente ação direta de inconstitucionalidade por perda de objeto (art. 21, inciso IX, RISTF). Arquive-se.’ Assim, diante da revogação da Circular BCB n° 1.518, de 3.8.89, e constatado o caráter temporário dos artigos 1º e 4º da Lei nº 7.843, de 18.10.89, e do art. 75 da Lei nº 7.799, de 10.7.89, cuja eficácia já está exaurida, julgo prejudicada a presente ação direta de inconstitucionalidade, por perda superveniente de objeto” (ADI 133).

De maneira análoga, quanto à declaração incidental de inconstitucionalidade das leis temporárias exauridas, não se exige reserva de plenário , porque desaparecem, com o esgotamento da eficácia normativa da lei, as razões de segurança jurídica que alicerçam

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a cláusula de reserva. Já não se trata, neste quadro, de negar aplicação a lei vigente .

12. A regra do art. 3º da Lei guaçuana nº 3.784 conflita com o § 4º, art. 39, CF/88, conforme se infere dos motivos determinantes adotados pelo egrégio Supremo Tribunal Federal, inter plures , nas ADI’s-MC’s 2.648 (Ministro Ricardo Lewandowski) e 3.771 (Ministro Carlos Ayres Britto) e na AO 584 (Ministro Maurício Corrêa).

13. Cabe acrescentar que, ainda à margem da eficácia vinculante da declaração de inconstitucionalidade, pode reconhecer-se o efeito de transcendência dos julgados plenários correspondentes, prestigiando —sem quebra da segurança jurídica— a autoridade dos Tribunais em matéria constitucional, evadindo o sentido contra-econômico de processos constitucionais com questões e fundamentos repetitivos.

Nessa direção, embora o tema se ponha, no exemplo seguinte, sob o ângulo da eficácia vinculante dos julgados do egrégio Supremo Tribunal Federal e a força da norma do § 2º, art. 102, Constituição Federal de 1988, calha reproduzir parte de voto proferido pelo Ministro Gilmar Mendes na Rcl 2.263-STF:

“Assinale-se que a aplicação dos fundamentos determinantes de um leading case em hipóteses semelhantes tem-se verificado, entre nós, até mesmo no controle de constitucionalidade das leis municipais.

Em um levantamento precário, pude constatar que muitos juízes desta Corte têm, constantemente, aplicado em caso de declaração de inconstitucionalidade o precedente fixado a situações idênticas reproduzidas em leis de outros municípios.

Tendo em vista o disposto no caput e § 1º-A do artigo 157 do Código de Processo Civi l , que reza sobre a possibi lidade de o relator julgar monocraticamente recurso interposto contra decisão que esteja em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, os membros desta Corte

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vêm aplicando tese fixada em precedentes onde se discutiu a inconstitucionalidade de lei, em sede de controle difuso, emanada por ente federativo diverso daquele prolator da lei objeto do recurso extraordinário sob exame.

Nesse sentido, Maurício Corrêa, ao julgar o RE 228.884/SP, DJ 16.06.99, no qual se discutia a i legitimidade do IPTU progressivo cobrado pelo Município de São José do Rio Preto, no Estado de São Paulo, valeu-se de fundamento fixado pelo Plenário deste Tribunal em precedente oriundo do Estado de Minas Gerais, no sentido da inconstitucionalidade de lei do Município de Belo Horizonte, que instituiu al íquota progressiva no IPTU.

Também Nelson Jobim, no exame da mesma matéria (progressividade do IPTU) em recurso extraordinário interposto contra lei do Município de São Bernardo do Campo, aplicou tese fixada em julgamentos que apreciaram a inconstitucionalidade de lei do Município de São Paulo (RE 221.795, DJ 16.11.00).

El len Gracie util izou-se de precedente oriundo do Município de Niterói, Estado do Rio de Janeiro, para dar provimento a recurso extraordinário no qual se discutia a ilegitimidade de taxa de iluminação pública instituída pelo Município de Cabo Verde, no Estado de Minas Gerais (RE 364.160, DJ 07.02.03).

Carlos Velloso aplicou jurisprudência de recurso proveniente do Estado de São Paulo para fundamentar sua decisão no AI 423.352, DJ 15.04.03, onde se discutia a inconstitucionalidade de taxa de coleta e l impeza pública do Município do Rio de Janeiro, convertendo-o em recurso extraordinário (art. 544, §§ 3º e 4º, do CPC) e dando-lhe provimento.

Sepúlveda Pertence lançou mão de precedentes originários do Estado de São Paulo para dar provimento ao RE 345.048, DJ 08.04.03, no qual argüia a inconstitucionalidade de taxa de l impeza pública do Município de Belo Horizonte.

Celso de Mello, ao apreciar matéria relativa à progressividade do IPTU do Município de Belo

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Horizonte, conheceu e deu provimento a recurso extraordinário tendo em conta diversos precedentes oriundos do Estado de São Paulo (RE 384.521, DE 30.05.03)”.

14. Ainda uma vez realçando-se a circunstância de que se traz à colação caso relativo à eficácia vinculante de julgados do egrégio Supremo Tribunal Federal, recolhe-se de r. decisão monocrática prolatada pelo Ministro Cezar Peluso , na Rcl 3.291-STF:

“Posto que o efeito vinculante da decisão de ação direta de Inconstitucionalidade não se l imite à parte dispositiva, mas se estenda também aos chamados ‘fundamentos determinantes ’ , segundo o que se convencionou chamar de efeito transcendente dos fundamentos determinantes de decisão com efeito vinculante (cf. Rcl nº 2363-0 , Rel. Min. GILMAR MENDES ; Rcl nº 1987 , Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA), forçoso reconhecer, conforme sobrelevou o Min. CELSO DE MELLO no precedente invocado na inicial, que tal extensão tem por escopo resguardar a interpretação dada por esta Corte às normas constitucionais , verbis :

‘Essa visão do fenômeno  da transcendência parece refletir a preocupação que a doutrina vem externando a propósito dessa específica questão, consistente  no reconhecimento de que a eficácia vinculante não só concerne à parte dispositiva, mas refere-se , também, aos próprios fundamentos determinantes do julgado que o Supremo Tribunal Federal venha a  proferir em sede de controle abstrato, especialmente quando consubstanciar declaração de inconstitucionalidade, como resulta claro do magistério de IVES GANDRA DA SILVA MARTINS/GILMAR FERREIRA MENDES (‘O Controle Concentrado de Constitucionalidade ’ , p. 338/345, itens ns. 7.3.6.1 a 7.3.6.3, 2001, Saraiva) e de ALEXANDRE DE MORAES (‘Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional ’ , p. 2.405/2.406, item n. 27.5, 2ª ed., 2003,Atlas).

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Na realidade , essa preocupação, realçada pelo magistério doutrinário, tem em perspectiva um dado de insuperável relevo político-jurídico, consistente na necessidade de preservar-se, em sua integralidade, a força normativa da Constituição , que resulta da indiscutível supremacia, formal e material, de que se revestem as normas constitucionais, cuja integridade, eficácia e aplicabilidade, por isso mesmo, hão de ser valorizadas , em face de sua precedência, autoridade e grau hierárquico, como enfatiza o magistério doutrinário (ALEXANDRE DE MORAES, ‘Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional ’ , p. 109, item n. 2.8, 2ª ed., 2003, Atlas; OSWALDO LUIZ PALU, ‘Controle de Constitucionalidade ’ , p. 50/57, 1999, RT; RITINHA ALZIRA STEVENSON, TERCIO SAMPAIO FERRAZ JR. e MARIA HELENA DINIZ, ‘Constituição de 1988: Legitimidade, Vigência e Eficácia e Supremacia ’ , p. 98/104, 1989, Atlas; ANDRÉ RAMOS TAVARES, ‘Tribunal e Jurisdição Constitucional ’ , p. 8/11, item n. 2, 1998, Celso Bastos Editor; CLÈMERSON MERLIN CLÈVE, ‘A Fiscalização Abstrata de Constitucionalidade no Direito Brasileiro ’ , p. 215/218, item n. 3, 1995, RT, v.g.).

Cabe destacar , neste ponto, tendo presente o contexto em questão, que assume papel de fundamental importância a interpretação constitucional derivada das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função institucional, de ‘guarda da Constituição ’ (CF , art. 102, ‘caput ’), confere-lhe o monopólio da última palavra em tema de exegese das normas posit ivadas no texto da Lei Fundamental, como tem sido assinalado , com particular ênfase, pela jurisprudência desta Corte Suprema:

‘(.. .) A interpretação do texto constitucional pelo STF deve ser acompanhada pelos demais Tribunais. (. . .) A não-observância da decisão desta Corte debilita a força normativa da Constituição. (. . .).’ (RE 203.498-AgR/DF , Rel. Min. GILMAR MENDES - grifei)’ (Rcl nº 2.986-MC)”

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15. Noutro julgado da Suprema Corte federal, decidiu o Ministro Cezar Peluso :

“Afirme-se, antes de mais, a adequação da via eleita pelo reclamante para a pretensão deduzida. Conforme vêm se pronunciando a Corte em reiteradas oportunidades, os fundamentos ou motivos determinantes de decisão proferida no âmbito do controle concentrado e abstrato de constitucionalidade, seja em sede l iminar, seja em pronunciamento definitivo, são dotados de eficácia vinculante transcendente (art. 102, § 2º, da CF; art. 28, § único, da Lei nº 9.868, de 10.11.1999), apta a ensejar, quando violado o entendimento lá firmado por outro órgão do Poder Judiciário ou pela Administração Pública, a propositura de reclamação ao Supremo Tribunal Federal (art. 102, inc. I, “ l”, da CF), a fim de se fazer prevalecer a posição por este adotada (RCL nº 2.363 , Rel. Min. GILMAR MENDES , DJ de 01.04.2005; RCL nº 2.143-AgR , Rel. Min. CELSO DE MELLO , DJ de 06.06.2003; RCL nº 1.987 , Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA , DJ de 21.05.2004; RCL nº 1.722 , Rel. Min. CELSO DE MELLO , DJ de 13.05.2005; RCL nº 3.625-MC , Rel. Min. CELSO DE MELLO , DJ de 08.11.2005; RCL nº 3.291 , Rel. Min. CEZAR PELUSO , DJ de 31.05.2005; RCL nº 2.986-MC , Rel. Min. CELSO DE MELLO , DJ de 18.03.2005; RCL nº 2.291-MC , Rel. Min. GILMAR MENDES , DJ de 01.04.2003)” (Rcl 4.692).

16. Lê-se ainda em r. decisão proferida no egrégio Supremo Tribunal Federal pelo Ministro Celso de Mello :

“Na realidade , o caso versado nos presentes autos configuraria hipótese de  violação ao conteúdo essencial dos acórdãos proferidos nas aludidas ações diretas de inconstitucionalidade, pois o caráter vinculante de que se reveste qualquer julgamento desta Corte, em sede de fiscalização normativa abstrata, decorre não apenas do que se contém em sua parte disposit iva, mas alcança , também, em razão da transcendência de seus efeitos, os próprios  fundamentos determinantes das decisões emanadas do Supremo Tribunal Federal no âmbito

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dos processos de controle concentrado de constitucionalidade.

Essa asserção encontra fundamento em autorizado magistério doutrinário (ALEXANDRE DE MORAES, ‘Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional ’ , p. 2.372/2.373, 1ª ed., 2002, Atlas, PAULO ROBERTO LYRIO PIMENTA, ‘Limites Subjetivos e Objetivos da Coisa Julgada no Controle Abstrato de Constitucionalidade ’ , ‘ in ’ Revista Dialética de Direito Processual, p. 127/129, 2003), cabendo referir , a tal propósito, a precisa observação do eminente Ministro GILMAR FERREIRA MENDES (‘O Efeito Vinculante das Decisões do Supremo Tribunal Federal nos Processos de Controle Abstrato de Normas ’ , ‘ in ’ DCAP – Direito Administrativo Contabil idade e Administração Pública, nº 04, abril /99, p. 43, item n. 2.2.2.2, IOB):

‘Proferida a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei objeto da ação declaratória, ficam os Tribunais e órgãos do Poder Executivo obrigados a guardar-lhe plena obediência. Tal como acentuado , o caráter transcendente do efeito vinculante impõe que sejam considerados não apenas o conteúdo da parte dispositiva da decisão, mas a norma abstrata que dela se extrai, isto é , a proposição de que determinado tipo de situação, conduta ou regulação —e não apenas aquela objeto do pronunciamento jurisdicional— é constitucional ou inconstitucional e deve, por isso, ser preservado ou eliminado.’ (grifei)”(Rcl 4.387)

17. Interpelante registro doutrinário é o de “que a limitação do efeito vinculante à parte dispositiva da decisão tornaria de todo despiciendo esse instituto, uma vez que ele pouco acrescentaria aos institutos da coisa julgada e da força da lei” ( Ives Gandra da Silva Martins e Gilmar Mendes , Controle Concentrado de Constitucionalidade , ed. Saraiva, São Paulo, 2005, 2ª ed., p. 546), e, nessa trilha, relevam estas observações de Eduardo Appio :

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“Ao fixar a competência do Supremo Tribunal (CF/88, art. 102) para a guarda e proteção da Constituição, não se pode admitir que os juízes das instâncias inferiores novamente decidam a mesma e idêntica questão constitucional, inclusive com a possibi l idade de negar observância do entendimento do Supremo. Cabe às instâncias inferiores verificar se, diante do caso que agora lhes é submetido, existe simil itude suficiente de molde a ensejar a aplicação do precedente. Não havendo simil itude, deflagra-se o mecanismo do distinguishing method , ou seja, apontam-se, claramente, as razões pelas quais o precedente não é invocável, de maneira a fugir da força gravitacional do precedente.

A util ização do distinguishing , todavia, não pode evidenciar a tentativa de, pura e simplesmente, deixar de aplicar um princípio que já foi aceito para um caso símile pelo Supremo Tribunal, sob pena de ofensa ao próprio sentido da Constituição. Somente à vista de circunstâncias fáticas que permitam divisar, claramente, que a adoção do princípio fixado pelo leading case no passado significaria indevida extensão do julgado para casos nitidamente não contemplados pelo princípio, é que os juízes das instâncias inferiores (e do próprio Supremo) podem negar adesão ao precedente” (Controle Difuso de Constitucionalidade , ed. Juruá, Curitiba, 2008, p. 43-4).

A ausência de extensão do referido efeito

vinculante sobre a atividade do Poder Legislativo, gerando possível reincidência na inconstitucionalidade (cfr. Oswaldo Luiz Palau , Controle de Constitucionalidade , ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2001, 2ª ed., p. 229-30), vem ao par das vantagens econômico-processuais recolhidas na norma do p.ún., art. 481 , Código de Processo Civil :

“Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão” (texto incluído pela Lei nº 9.756, de 17 de dezembro de 1998).

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É avistável o risco de processos repetitivos sobre questões de inconstitucionalidade já apreciadas e decididas, com a deflagração contra-econômica da metódica de cisão do julgamento recursório (caput, art. 481, CPC).

O termo questão, com que se encerra a regra do p.ún., art. 481, CPC, não compreende restrit ivamente os lindes da lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pela Corte, mas abrange os fundamentos determinantes da declaração precedente.

Pode avistar-se nessa interpretação o motivo por que o art. 480 do Código de Processo Civil se refira à “inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público” , ao passo que, na seqüência, o p.ún. do art. 481, CPC, diversamente, se reporte a pronunciamento “sobre a questão” :

“Art. 480. Argüida a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público , o relator, ouvido o Ministério Público, submeterá a questão à turma ou câmara, a que tocar o conhecimento do processo.

Art. 481. Se a alegação for rejeitada, prosseguirá o julgamento; se for acolhida, será lavrado o acórdão, a fim de ser submetida a questão ao tribunal pleno.

Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão .” (Os destaques não são do texto original).

18. O perfil constitucional do efeito vinculante das declarações de inconstitucionalidade (§ 2º, art. 102, CF/88) não parece conflitar com a abrangência vinculativa dos motivos determinantes do julgado. Embora não se possam afirmar incontroversas as vantagens de sua admissão (: por muitos, Rui Medeiros, A Decisão de Inconstitucionalidade , ed. Universidade Católica, Lisboa, 1999, p. 811 et sqq., e Roger Stiefelmann Leal , O Efeito Vinculante na

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Jurisdição Constitucional , ed. Saraiva, São Paulo, 2006, p. 112-4), seu papel modelar , com reflexos para a segurança jurídica e para a economia do processo, recomenda a consideração de sua “força moral” vinculativa (André Ramos Tavares , Teoria da Justiça Constitucional , ed. Saraiva, São Paulo, 2005, p. 441), projetando uma linha interpretativa para a regra do p.ún., art. 481, CPC.

19. Nesse quadro, vem a talho a r. decisão monocrática da Ministra Cármen Lúcia , do egrégio Supremo Tribunal Federal, no Ag 685.025 .

Tratava-se ali de declaração de inconstitucionalidade da Lei mineira (nota bene!) nº 11.510/1994, acolhida por julgado de órgão fracionário do egrégio Tribunal de Justiça local, dispensando-se, na origem, a reserva de plenário, diante de precedentes “do Pretório Excelso, originários de casos assemelhados” . Ao decidir o recurso, a Ministra Cármen Lúcia assentou que “nos termos do art. 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil, não há afronta ao princípio da reserva de Plenário, pois já existia, à época do julgamento, pronunciamento deste Supremo Tribunal a respeito do tema” , e identificou por decisão suficiente, na espécie, o julgado do RE 291.188, em que a egrégia 1ª Turma da Corte, conduzida por voto do Ministro Sepúlveda Pertence , afastou a incidência da Lei estadual nº 6.612/1994 do Rio Grande do Norte . Reproduz-se a ementa do referido RE 291.188 :

“Direito Monetário: competência legislativa privativa da União: cr itérios de conversão em URV dos valores fixados em Cruzeiro Real: aplicação compulsória a Estados e Municípios, inclusive aos vencimentos dos respectivos servidores, que impede a incidência de diferente legislação local a respeito. 1. Em todas as Federações, o estabelecimento do sistema monetário foi sempre t ípica e exclusiva função legislativa do ordenamento central; e estabelecer o sistema monetário— escusado o óbvio— consiste primacialmente na criação e eventual alteração do padrão monetário. 2. A alteração do padrão monetário envolve necessariamente a fixação do critério de conversão para a moeda nova do valor das obrigações legais ou negociais orçadas na moeda velha; insere-

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se, pois, esse critério de conversão no âmbito material da regulação do ‘sistema monetário’, ou do Direito Monetário, o qual, de competência legislativa privativa da União (CF, art. 22, VI), se subtrai do âmbito da autonomia dos Estados e Municípios. 3. A regra que confia privativamente à União legislar sobre ‘sistema monetário’ (art. 22, VI) é norma especial e subtrai, portanto, o Direito Monetário, para esse efeito, da esfera material do Direito Econômico, que o art. 24, I, da Constituição da República inclui no campo da competência legislativa concorrente da União, do Estados e do Distr ito Federal. 4. Dado o papel reservado à URV na transição entre dois padrões monetários, o Cruzeiro Real e o Real (L. 8880/94), os critérios legais para a conversão dos valores expressos em cruzeiros reais para a URV constituiu uma fase intermediária de convivência com a moeda antiga na implantação do novo sistema monetário. 5. Compreendem-se, portanto, ditos critérios da conversão em URV no âmbito material de regulação do sistema monetário, objeto de competência legislativa privativa da União. 6. A conversão em URV dos valores fixados para a remuneração dos servidores públicos locais —segundo a lei federal institutiva do novo sistema monetário—, não representou aumento de vencimentos, não sendo oponíveis, portanto, à sua observância compulsória por Estados e Municípios, as regras dos arts. 167 e 169 da Constituição da República. 7. Correta a decisão do Tribunal local que, em conseqüência, deu aplicação aos critérios da conversão de vencimentos e proventos em URV, ditados por lei federal (L. 8880/94, art. 22) e afastou a incidência da lei estadual que os contrariou (L. est. 6612/94-RN): RE não conhecido”.

20. Decota-se ainda de r. decisão monocrática do Ministro Gilmar Mendes , na Rcl 5.470 :

“A reclamação constitucional —sua própria evolução o demonstra— não mais se destina apenas a assegurar a competência e a autoridade de decisões específicas e bem delimitadas do Supremo Tribunal Federal, mas também constitui-se como ação voltada à proteção da ordem constitucional como um todo. A tese da eficácia vinculante dos motivos determinantes

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da decisão no controle abstrato de constitucionalidade, já adotada pelo Tribunal, confirma esse papel renovado da reclamação como ação destinada a resguardar não apenas a autoridade de uma dada decisão, com seus contornos específicos (objeto e parâmetro de controle), mas a própria interpretação da Constituição levada a efeito pela Corte . Esse entendimento é reforçado quando se vislumbra a possibi lidade de declaração incidental da inconstitucionalidade de norma de teor idêntico a outra que já foi objeto de controle abstrato de constitucionalidade realizado pelo Supremo Tribunal Federal”.

21. Ainda que a matéria peculiar de recepção dos valores monetários objeto desta demanda não se enodoe da mácula de inconstitucionalidade —ou, ainda que, em parte, isso fosse de reconhecer apenas quanto ao art. 3º da Lei guaçuana nº 3.748/2000—, o fato é que a percepção pecuniária em tela foi excessiva, cabível a reposição do excesso ao erário.

Assinalável é a circunstância de que o recebimento remuneratório em foco não atrai em seu favor os precedentes do egrégio Superior Tribunal de Justiça em matéria de benefícios previdenciários , nem aqueles cujo apoio é o de título judicial objeto de ação rescisória (cfr., a título exemplificativo, AgR no REsp 673.864 -5ª Turma -Ministro Gilson Dipp ; REsp 436.764 -6ª Turma –Ministro Hamilton Carvalhido ; AgR no REsp 601.052 -5ª Turma -Ministro Felix Fischer; AgR no REsp 698.584 -6ª Turma –Ministro Hamilton Carvalhido), admitindo-se na Corte a modulação do princípio da irrepetibilidade de alimentos , como se lê, p.ex., versando decisões judiciais, nos REsp’s 725.118 (6ª Turma –Ministro Paulo Gallotti), 988.171 (5ª Turma -Ministro Napoleão Nunes Maia Filho ) e 996.850 (5ª Turma -Ministro Arnaldo Esteves Lima ).

Tratando-se, tal o caso destes autos, de pagamento efetuado em erro pela Administração Pública, admissível a repetição, pena de enriquecimento, sem causa legal, com maltrato do erário (cfr. REsp 334.209 -STJ -5ª Turma -Ministro Gilson Dipp ; REsp 174.061 -STJ -5ª Turma -Ministro

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José Arnaldo da Fonseca ; REsp 386.619 -STJ -5ª Turma -Ministro Gilson Dipp ; RMS 17.339 -STJ -5ª Turma -Ministro José Arnaldo da Fonseca ; REsp 511.010 –STJ -5ª Turma -Ministro Gilson Dipp ; RMS 16.934 -STJ -5ª Turma -Ministro José Arnaldo da Fonseca; REsp 591.963 –STJ -1ª Turma –Ministro Teori Albino Zavascki ; REsp 415.312 -STJ -5ª Turma -Ministro José Arnaldo da Fonseca).

Cabe, no entanto, fracionar a reposição, de modo a temperar os efeitos da devolução pecuniária, tal como, de modo freqüente, se encontram em disposições legais acerca desse gênero de repetição (cfr., em escolha exemplar dentro em largo espectro, a Medida Provisória nº 2.088-35, de 27 de dezembro de 2000, alterando o art. 46 da Lei nº 8.112, de 27 de dezembro de 2000, e a Lei paulista nº 10.261, de 28 de outubro de 1968, art. 111). Nesse sentido, decidiu-se no egrégio Superior Tribunal de Justiça:

“Sendo de 10% (dez por cento) o valor máximo para desconto em folha de pagamento nos casos de indenização, que pressupõem a existência de dano ao erário por ato doloso ou culposo do servidor, não é razoável permitir maior desconto na hipótese de reposição decorrente de pagamento indevido realizado pela Administração, por força de decisão judicial.” (REsp 638.813 -5ª Turma -Ministra Laurita Vaz; cfr. ainda REsp 651.081 -6ª Turma –Ministro Hélio Quaglia Barbosa ; RMS 12.110 -5ª Turma -Ministra Laurita Vaz).

Registre-se que a partição em dez prestações do valor a devolver-se já se decidiu extensivamente em favor de não-integrantes dos quadros do serviço público, apontando-se nisso solução “razoável, teleológica e consentânea aos fins sociais” (REsp 996.850 -STJ -5ª Turma -Ministro Arnaldo Esteves Lima).

22. A r. sentença de primeiro grau infligiu aos requeridos o pagamento de juros de mora, com a taxa mensal de 1%, a contar da citação.

A disciplina desses juros, contudo, deve atrair, por isonomia , o constante do Código Civil (art. 405) e

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da Lei nº 9.494, de 10 de setembro de 1997 (art. 1º-F). Vale por dizer que se hão de contar da citação, como decidido na origem, mas com a taxa de 6% ao ano, porque seria essa a taxa imponível à Fazenda Pública se condenada a pagamentos de verbas remuneratórias, de tal se trata no caso.

POSTO ISSO , meu voto dá parcial provimento à apelação interposta por Elias Fernandes de Carvalho e Outros, para, mantida no mais a r. sentença prolatada nos autos de origem nº 1.171/2005 da 1ª Vara da Comarca de Mogi Guaçu, (a) afastar a declaração de inconstitucionalidade da Lei local nº 3.784, de 21 de junho de 2000; (b) determinar o fracionamento em dez parcelas dos valores individuais das condenações objeto; (c) reduzir a 0,5% a taxa mensal dos juros de mora infligidos.

É como voto.

Ricardo Dip−relator

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