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Ulcera 2003

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Projeto DiretrizesAssociação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina

O Projeto Diretrizes, iniciativa conjunta da Associação Médica Brasileira e Conselho Federalde Medicina, tem por objetivo conciliar informações da área médica a fim de padronizar

condutas que auxiliem o raciocínio e a tomada de decisão do médico. As informações contidasneste projeto devem ser submetidas à avaliação e à crítica do médico, responsável pela conduta

a ser seguida, frente à realidade e ao estado clínico de cada paciente.

Úlcera Péptica

Elaboração Final: 31 de janeiro de 2003

Participantes: Coelho LGV

Autoria: Federação Brasileira de Gastroenterologia

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DESCRIÇÃO DO MÉTODO DE COLETA DE EVIDÊNCIAS:Revisão da literatura e consensos.

GRAU DE RECOMENDAÇÃO E FORÇA DE EVIDÊNCIA:A: Estudos experimentais e observacionais de melhor consistência.B: Estudos experimentais e observacionais de menor consistência.C: Relatos de casos (estudos não controlados).D: Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em consensos,estudos fisiológicos ou modelos animais.

OBJETIVOS:Orientar o diagnóstico e tratamento de pacientes com úlcera péptica.

CONFLITO DE INTERESSE:Nenhum conflito de interesse declarado.

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INTRODUÇÃO

A úlcera péptica era, até recentemente, considerada uma doençade etiologia desconhecida, de evolução em geral crônica, comsurtos de ativação e períodos de acalmia, resultantes de perdacircunscrita de tecido em regiões do trato digestivo capazes deentrar em contato com a secreção cloridropéptica do estômago. Édiferenciada das erosões pelo fato destas não atingirem a submucosae, portanto, não deixarem cicatriz ao se curarem.

A identificação e isolamento do Helicobacter pylori (HP) pro-porcionou um enorme desenvolvimento em nossos conhecimen-tos acerca da úlcera péptica1(C). A infecção gástrica pelo HP éhoje responsável por mais de 95% dos casos de úlcera duodenal e80% dos portadores de úlcera gástrica2(D). O uso deantiinflamatórios constitui a segunda causa, especialmente napopulação mais idosa e, mais raramente, outras etiologias podemestar associadas como gastrinoma (Síndrome de Zollinger-Ellisson)e forma duodenal de doença de Crohn (Tabela 1)3(D).

HP E ÚLCERA DUODENAL

Os mecanismos pelos quais um microrganismo que sobreviveapenas em contato com epitélio gástrico lesa com mais freqüênciao duodeno que o próprio estômago têm sido progressivamente

Tabela1

Causas de úlcera péptica3(D)Causas comunsInfecção por HPUso de AINEsCausas rarasSíndrome de Zollinger-EllisonHiperpatiroidismoDoenças granulomatosas (doença de Crohn, sarcoidose)Neoplasias (carcinoma, linfoma, leiomioma, leiomiosarcoma)Infecções (tuberculose, sífilis, herpes simples, citomegalovírus)Tecido pancreático ectópico

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aclarados. A infecção do antro gástrico pelo H.pylori induz uma hipersecreção ácida através dainibição das células produtoras de somatostatinae conseqüente aumento da liberação de gastrinapelas células G do antro gástrico. Como conse-qüência desta maior oferta de ácido ao duodeno,haverá o desenvolvimento (ou ampliação sepreexistentes) de áreas de metaplasia gástrica noduodeno, as quais, então, poderão ser coloniza-das pelo HP levando à duodenite e, eventual-mente, úlcera duodenal4(B). Fatores genéticose ambientais, além daqueles relacionados àvirulência do microrganismo, poderão afetar afisiologia gástrica e o desfecho da doença.

HP E ÚLCERA GÁSTRICA

Também aqui a identificação do HP tempermitido um grande avanço na compreensãodos mecanismos fisiopatológicos envolvidos.Considera-se HP responsável por 70% a 80%das ulcerações gástricas. Esta menor prevalênciada bactéria na úlcera gástrica em relação àduodenal está relacionada à maior freqüênciade úlceras associadas ao uso de antiinflamatóriosnão-esteróides (AINEs)5(D).

As úlceras gástricas tendem a ocorrer emmucosa não secretora de ácido ou próximas àjunção com a mucosa não secretora. Mesmoquando ocorrem na região alta da pequena cur-vatura, elas incidem em mucosa não secretora.Nesta circunstância, a pangastrite induzida peloHP é a responsável pelas alterações metaplásicasque transformam a mucosa secretora em nãosecretora6(D).

As evidências do papel do HP na úlcerapéptica provêm dos ensaios terapêuticos quedemonstram que a erradicação do microrganis-mo se acompanha de cura do processo ulceroso

gástrico ou duodenal na imensa maioria dospacientes, e a recidiva da diátese ulcerosa sóocorre na presença de falha na erradicação ourecidiva do processo infeccioso7(B) 8,9(D).

QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO

Em relação à sintomatologia da úlcerapéptica, o conceito tradicional do padrão do-loroso baseia-se na assertiva de que a acidezgástrica produz dor e sua neutralização a ali-via. É por todos conhecida a dor epigástrica,tipo queimação, com ritmicidade, ou seja, comhorário certo para seu aparecimento, guardan-do íntima relação com o ritmo alimentar, ocor-rendo 2 a 3 horas após a alimentação ou ànoite, e cedendo com o uso de alimentos oualcalinos. Um fator discriminante importanteé a ocorrência de dor noturna, acordando opaciente à noite, entre meia-noite e 3 horas damanhã. Tal sintoma aparece em aproximada-mente 2/3 dos ulcerosos duodenais, mas é tam-bém encontrado em pacientes dispépticos fun-cionais. Importante salientar ainda o caráterperiódico da dor epigástrica, durando vários diasou semanas, desaparecendo a seguir por sema-nas ou meses, para reaparecer meses ou anosdepois, com as mesmas características anterio-res. A sensibilidade e a especificidade dos sin-tomas clínicos para o diagnóstico de úlcerapéptica variam de país para país10(D).

Importante salientar que 30% a 40% dospacientes portadores de úlcera péptica têm fa-miliares de primeiro grau acometidos peladoença. Quando não tratada, as complicaçõespodem ocorrer em até 30% dos pacientes e in-cluem a hemorragia digestiva alta (20%) mani-festada por melena, hematêmese ou por perdade sangue oculto nas fezes, a perfuração (6%) e

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a obstrução piloro-duodenal (4%). Curiosamen-te, em 10% dos ulcerosos a hemorragia é a pri-meira manifestação da doença e em um terçodos pacientes com úlcera perfurada o episódioperfurativo constituiu o primeiro sintoma dadoença11(D).

A confirmação diagnóstica é realizada atra-vés da endoscopia digestiva alta que, além demais sensível que a radiologia, permite a reali-zação de biópsias12(D). Os testes de secreçãogástrica, dosagem de gastrina sérica e eco-endoscopia são utilizados apenas em situaçõesespeciais ou em ambiente de investigação clíni-ca. Paralelo ao diagnóstico da cratera ulcerosa,impõe-se a pesquisa da presença do HP, que podeser efetuada durante o procedimentoendoscópico, por pesquisa histológica ou peloteste da urease, ou por meios não invasivos comoo teste respiratório com uréia marcada comcarbono 13 ou 14, determinação de antígenosfecais e por testes sorológicos com a pesquisa deanticorpos anti-HP13(D).

TRATAMENTO

Sendo a maioria das úlceras secundárias àinfecção pelo HP, a abordagem terapêutica nes-ta eventualidade consiste, fundamentalmente,na erradicação do microrganismo. Ao se pro-mover a erradicação do microrganismo, rapida-mente se obtém a melhora da sintomatologiadolorosa, a cicatrização da cratera ulcerosa, aprevenção das recidivas e das complicações14(D).

A estratégia hoje utilizada consiste na utili-zação de um anti-secretor, usualmente uminibidor de bomba protônica ou citrato deranitidina bismuto (RBC), associado a doisantibacterianos por um período de 7 a 10 dias,sendo que a tendência atual é tratar inicialmente

durante apenas sete dias15,16(D)17(A). Estudostêm comprovado que, habitualmente, não énecessário prolongamento do uso de anti-secretores após o final do tratamento paraerradicação18(A). Constituem exceções a estarecomendação o tratamento antibacteriano logoapós episódio de hemorragia digestiva ou cirur-gia para úlcera perfurada, condições de poten-cial gravidade, no qual se recomenda o uso deanti-secretores por quatro a oito semanas de-pois do tratamento de erradicação visando aobtenção de cicatrização, mesmo em situaçõesem que o microrganismo possa não ter sidoerradicado15(D). A Tabela 2 exibe as opçõesterapêuticas mais eficazes entre nós.

O controle de cura da infecção deve ser rea-lizado no mínimo um mês após o final do trata-mento (preferencialmente dois a três meses). Oteste respiratório com uréia marcada com car-bono 13 ou 14 constitui o método não invasivoideal para realizar o controle da erradicação. Éaltamente sensível e específico e de customoderado19(A). Deve-se evitar o exame em pa-cientes em uso de anti-secretores, especialmen-te os inibidores de bomba protônica ou anti-microbianos na semana precedente ao exame,para se evitar a possibilidade de falso-negativos.A sorologia não é um método útil no controlede erradicação do HP. Nos pacientes portado-res de úlcera gástrica, persiste imprescindível arealização de endoscopia digestiva de controleda lesão ulcerosa e coleta de material para estu-do histológico confirmando a benignidade dalesão e a situação do HP.

A possibilidade de reinfecção após um tra-tamento bem sucedido é possível, porém poucofreqüente, sendo estimada em 2% a 3% ao anoem estudos de acompanhamento a longo prazorealizados entre nós20(B). Em caso de falha

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terapêutica, utiliza-se anti-secretores em dosepadrão duas vezes ao dia + subsalicilato ousubcitrato de bismuto 120 mg quatro vezes aodia + metronidazol 500 mg três vezes ao dia +tetraciclina 500 mg quatro vezes ao dia, porum período mínimo de sete dias15(D). Falhassubseqüentes devem ser abordadas caso a caso,preferencialmente pelo especialista16(D).

ÚLCERA PÉPTICA ASSOCIADA AANTIINFLAMATÓRIOS NÃO-ESTERÓIDES

(AINES)

AINEs são hoje considerados como umacausa estabelecida de úlcera péptica, podendoocorrer após administração oral ou sistêmica das

drogas e com praticamente todos os anti-inflamatórios23(B). Acredita-se que AINEspromovem lesão gastroduodenal por dois meca-nismos independentes, ou seja, diretamente porefeito tóxico direto, em nível epitelial, sobre osmecanismos de defesa da mucosa gastro-duodenal, resultando em aumento dapermeabilidade celular, inibição do transporteiônico e da fosforilação oxidativa, e, sistemi-camente, enfraquecendo os mecanismos de de-fesa através da inibição da cicloxigenase, enzima-chave na síntese das prostaglandinas24(D). Destaforma, AINEs causam uma redução significa-tiva nos teores de prostaglandinas das mucosas.Sabe-se que as prostaglandinas E e A protegema mucosa gástrica através de seus efeitos

Tabela 2

Opções terapêuticas na erradicação do HP1) Inibidor de bomba protônica (omeprazol 20 mg ou lansoprazol 30 mg ou pantoprazol 40 mg ou

rabeprazol 20 mg ou esomeprazol 20 mg) ou RBC + Claritromicina 500 mg + Amoxicilina 1.000mg, duas vezes por dia por sete ou dez dias

Constitui um dos regimes mais empregados de todo o mundo, com índices de erradicação próximos a90%15,16(D)17(A). Bem tolerado, com poucos efeitos adversos, apresenta como inconveniente seu custoainda elevado para a população brasileira.2) Inibidor de bomba protônica (omeprazol 20 mg ou lansoprazol 30 mg ou pantoprazol 40 mg ou

rabeprazol 20 mg ou esomeprazol 40 mg) uma vez ao dia durante sete dias + Furazolidona200 mg três vezes ao dia + Azitromicina 500 mg uma vez ao dia, durante os três primeiros dias.Índices de erradicação próximos a 80% têm sido alcançados21(B). Bem tolerado, embora apresenteefeitos adversos, especialmente náuseas em aproximadamente 30% dos pacientes. Tem custorazoável e implica em menor quantidade de comprimidos ao dia, com a azitromicina sendo ingeridaà noite com o estômago vazio. Pelo efeito disulfiram-like da furazolidona, deve-se evitar o uso debebidas alcoólicas 24h antes, durante e 48h após o tratamento.

3) Inibidor de bomba protônica (omeprazol 20 mg ou lansoprazol 30 mg ou pantoprazol 40 mg ourabeprazol 20 mg ou esomeprazol 40 mg) uma vez ao dia durante sete dias + Furazolidona

200 mg duas vezes ao dia + claritromicina 500 mg duas vezes ao dia, durante sete dias.Estudos têm demonstrado índices de erradicação próximos a 90% com este regime22(B).

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estimulantes sobre a produção de muco e se-creção de bicarbonato, enquanto aumentamo fluxo sangüíneo mucoso e reduzem oturnover celular. Recentemente, têm sido iden-tificados dois tipos de cicloxigenase (COX):COX-1, com funções fisiológicas estabeleci-das, ou seja, quando ativada, promove a produ-ção de prostaciclina que, liberada no endotéliovascular, tem ação antitrombogênica, enquan-to, na mucosa gástrica, induz citoproteção, eCOX-2, encontrada em macrófagos, fibro-blastos e células epiteliais e induzida em locaisde inflamação25(D). O reconhecimento destesdois tipos de cicloxigenase descortina a possi-bilidade, a ser no futuro estudada, de queinibidores específicos COX-2 reduzam a dore a inflamação sem lesar o estômago. Aprevalência da úlcera gástrica em usuárioscrônicos de AINEs tem variado de 9% a 13%e, da úlcera duodenal, entre 0% e 19%. Orisco relativo calculado de um usuário crôni-co destas drogas desenvolver úlcera gástricaou duodenal é 46 e 8 vezes, respectivamente,maior que a população normal11(D).

Os sintomas dispépticos nos usuárioscrônicos de AINEs são freqüentes, sendoimpossível identificar clinicamente aquelesportadores de ulceração. A sintomatologia émais comum nas primeiras semanas de trata-mento, declinando com o passar do tempo,independentemente do tratamento. A úlcerainduzida por AINEs produz menos sintomasque a úlcera causada por HP. De fato, 30% a40% dos pacientes com úlceras induzidas porAINEs são assintomáticos e, entre aquelesque desenvolvem hemorragia digestiva, até60% o fazem silenciosamente, em contrastecom os 25% de hemorragias assintomá-ticas observadas nos não-usuários de anti-inflamatórios11(D).

Como a maioria dos usuários de AINEs nãoapresenta complicações e se beneficia do trata-mento, torna-se necessário identificar, entre oimenso número de pacientes que utilizam taisdrogas, aqueles que são portadores de fatorespredisponentes a complicações pelo seu uso pro-longado. É improvável que algum subgrupo deusuários de AINEs esteja isento do risco de com-plicações advindas de seu emprego. Os fatoresque cursam com risco claramente aumentadode complicações são:• História prévia de úlcera péptica ou

sangramento digestivo26,27(B);• Idade superior a 60 anos, especialmente em

mulheres26(B);• Dose, duração e tipo do antiinflamatório:

quanto maior a dosagem empregada, maioro risco de complicações gastrointestinais.Existem algumas evidências sugerindo queo risco de desenvolvimento de úlcera e outrascomplicações depende também da duraçãodo tratamento, sendo o primeiro mês detratamento o período mais vulnerável paracomplicações28(A).

• Co-administração de corticosteróides eanticoagulantes: enquanto o uso combina-do de corticosteróides e AINEs está asso-ciado a um risco duas a três vezes maior decomplicações gastrointestinais, o uso deantiinflamatórios isolado reduz tal risco pelametade11(D).

TRATAMENTO DA ÚLCERA ASSOCIADA AAINES

O principal mecanismo de toxicidade dosAINEs envolve a inibição da síntese deprostaglandinas com conseqüente surgimentode erosões na mucosa gastroduodenal, as quaissão agravadas pela presença da secreção ácidado estômago. Assim, uma abordagem racional

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para a úlcera induzida por AINEs deve incluiro emprego de anti-secretores e/ou prosta-glandinas24(D).

ÚLCERA PÉPTICA ASSOCIADA AGASTRINOMA OU SÍNDROME DE

ZOLLINGER-ELLISON (SZE)

Descrita por Zollinger e Ellison, em 1955,esta síndrome é caracterizada por úlcera pépticade evolução tormentosa, hipersecreção acentua-da de ácido pelo estômago e tumor pancreáticode células não pertencentes à linhagem beta dasilhotas pancreáticas. Dividem-se em tumoresesporádicos e tumores geneticamente transmi-tidos, associados com a neoplasia endócrinamúltipla tipo1 (MEN 1). São raros, ocorrendoem caso para cada mil casos de úlcera pépticaassociada ao HP, com leve predomínio no sexomasculino, na faixa etária dos 30 aos 50 anos.A manifestação mais freqüente é a úlcera pépticaduodenal, única ou múltipla, que ocorre em 90%a 95% dos pacientes29(D). Em 20% a 25% doscasos a ulceração localiza-se mais distalmenteno duodeno. A doença do refluxo gastroesofágicoocorre em até 60% dos casos e 1/3 dos pacien-tes apresentam diarréia aquosa, que pode prece-der, por anos, o surgimento da úlcera29(D) 30(C).

Constituem sinais de alerta para a possibili-dade de gastrinoma a presença de úlcera únicaou múltipla distal à primeira porção do duodeno,úlceras de difícil controle clínico, úlceras HPnegativas, úlceras recorrentes pós-operatórias,úlceras associadas a diarréia ou cálculo renal, eúlceras em pacientes com história pessoal oufamiliar sugestiva de tumor de hipófise ouparatiróide. A dosagem da gastrina sérica é ométodo mais sensível e específico para a identi-ficação dos pacientes com gastrinoma. Em pes-soas normais e nos pacientes portadores de

úlcera duodenal clássica, os níveis de gastrinasérica de jejum variam entre 50 e 60 pg/ml,com um limite superior de normalidade varian-do de 100 a 150 pg/ml. No gastrinoma, os ní-veis de gastrina sérica se encontram acima de150 pg/ml, comumente em torno de 1.000 pg/ml. Valores acima de 1.000 pg/ml em pacientescom achados clínicos sugerindo doença porexcesso de secreção de ácido são praticamentediagnósticos de Zollinger-Ellison, sendo quevalores acima de 1.500 pg/ml sugerem doençajá com metástases31(D). Quando a elevação dosníveis de gastrina não é acentuada, podemosutilizar testes provocativos através da injeçãoendovenosa de secretina ou da infusão de cál-cio. Estabelecido o diagnóstico, deve-se tentarlocalizar o tumor. A ressecção cirúrgica é achance de cura da doença. A localização da lesãoprimária é freqüentemente difícil, não sendopossível em 10% a 20% dos casos. No pâncre-as, estão mais freqüentemente localizados nacabeça, mas em 2/3 das vezes são extra-pancre-áticos, sendo que a parede duodenal é o seu sítiomais comum. Os gastrinomas duodenais sãomalignos em mais da metade dos casos. Ainibição da secreção ácida pelo estômago é a basepara o tratamento clínico.

Os bloqueadores de bomba de prótons sãoos agentes preferidos para cicatrizar as úlceras econtrolar os sintomas dispépticos. A dose deomeprazol recomendada é de 60 mg por dia.Tem sido recomendado que a dose ideal seria aque mantém a secreção ácida menor que 10mEq/h, 1 hora antes de ingerir a dose subse-qüente. O omeprazol ou, certamente, qualquerinibidor de bomba de prótons é indicado comotratamento inicial da SZE nos períodos deavaliação e estabilização dos pacientes e naque-les em que o tumor não foi localizado ou nãofoi ressecado. Os pacientes com lesões

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metastáticas devem ser encaminhados a trata-mento quimioterápico. A localização e comple-ta extirpação do gastrinoma ocorre em aproxi-madamente 40% dos casos. A remoção com-pleta do tumor é usualmente seguida de retor-no da gastrina a níveis normais, redução dahipersecreção ácida pelo estômago e desapareci-mento da úlcera e diarréia, havendo desta for-ma uma expectativa de sobrevida normal. Nospacientes com SZE, nos quais não foi possívela retirada total do tumor, os medicamentosinibidores de bomba de prótons deverão seradministrados continuamente pelo resto da vida.A suspensão abrupta dos mesmos pode levar arecidivas graves de doença ulcerosa31,32(D).

ÚLCERA PÉPTICA IDIOPÁTICA

Em uma ínfima parcela de pacientesulcerosos não se consegue identificar a presen-ça de HP nem o uso de ácido acetilsalicílico ououtros antiinflamatórios. Nestas circunstân-cias, torna-se prudente ainda uma re-investiga-ção cuidadosa do emprego de antiinflamatórios.Por vezes, o próprio paciente desconhece que,entre os medicamentos por ele utilizados,incluem-se aqueles de potencial gastrotóxico.

Importante também excluir com segurança apresença de HP como agente causal do quadroulceroso, realizando, sempre que possível, suapesquisa através de mais de um método sen-sível e específico de diagnóstico.

Entre as causas raras de ulceração gástri-ca ou duodenal, estão a síndrome de Zollinger-Ellison, a doença de Crohn de localizaçãogastroduodenal, estados hipercalcêmicos,linfomas, mastocitose sistêmica e outras in-fecções por Helicobacter heilmannii, citome-galovírus ou herpes simples. Quando todasestas possibilidades etiológicas são afastadas,consideramos a úlcera como idiopática. Umestudo escocês envolvendo 435 portadores deúlcera péptica, após cuidadosa investigação,encontrou apenas seis pacientes em que umagente etiológico não foi definido33(C).

Recentemente, alguns estudos têm descritoaumento da prevalência de úlceras idiopáticas,especialmente nos EUA, Canadá e Austrá-lia, em que a prevalência da infecção por HPvem apresentando queda nas últimas décadas,porém, as explicações para este fenômenoainda são controversas34(B)35(D).

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