10
UM ESTUDO SOBRE PROBLEMAS DA JUVENTUDE CONTEMPORANEA EM ESCOLAS DE FORTALEZA LEONEL e. PINTO Mestre em Psicologia pela pue do Rio de Janeiro, Doutor em Pedagogia e Livre-Do- cente em Psicologia Educacional pela PUC do Rio Grande do Sul; Psicólogo Profissio- nal e Professor-Adjunto dos Cursos de Gra- duação e Pós-Graduação do Departamento de Educação da Universidade Federal do Ceará. Pediu-me o Centro Social Urbano Presidente Médici que participasse do Seminário sobre problemas da juventude, com vistas à preparação do Encontro de Jovens em Fortaleza, (1978). Não se me afigurou justo, nem possível tratar destes problemas, sem ouvir os próprios adolescentes e jovens. Fa- zia-se necessário um levantamento da problemática, no curta período disponível de vinte dias. Este levantamento foi feito entre 300 jovens de ambos os sexos, em 12 escolas de Comu- nidade, com estudantes provenientes de três classes sócio- -econômicas: alta, média e baixa. O trabalho foi possível tão rápido assim, graças, em pri- meiro lugar, ao dinamismo do prof. João Nogueira Mota, que a todos persuadiu mais por atos do que por palavras; em se- gundo lugar, graças à decisão dos professores, assistentes so- ciais e orientadores, que se prontificaram para aplicar nos colégios a lista de problemas; e graças ainda e naturalmente REV. EDUC. EM DEBATE - FORT .. V. 3 - N.O 3- P.~G. 73-90 1979 73

UM ESTUDO SOBRE PROBLEMAS DA JUVENTUDE … · 76 RI,Y. EDUC. EM DEIlATE ... ANALISEDASAREASDO QUESTIONARIO ... 92% aos 14/15 anos ... 82% aos 17/18 ... ". Não é, pois,

  • Upload
    dinhtu

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

UM ESTUDO SOBRE PROBLEMAS DAJUVENTUDE CONTEMPORANEA

EM ESCOLAS DE FORTALEZA

LEONEL e. PINTO

Mestre em Psicologia pela pue do Rio deJaneiro, Doutor em Pedagogia e Livre-Do-cente em Psicologia Educacional pela PUCdo Rio Grande do Sul; Psicólogo Profissio-nal e Professor-Adjunto dos Cursos de Gra-duação e Pós-Graduação do Departamentode Educação da Universidade Federal doCeará.

Pediu-me o Centro Social Urbano Presidente Médici queparticipasse do Seminário sobre problemas da juventude,com vistas à preparação do Encontro de Jovens em Fortaleza,(1978). Não se me afigurou justo, nem possível tratar destesproblemas, sem ouvir os próprios adolescentes e jovens. Fa-zia-se necessário um levantamento da problemática, no curtaperíodo disponível de vinte dias. Este levantamento foi feitoentre 300 jovens de ambos os sexos, em 12 escolas de Comu-nidade, com estudantes provenientes de três classes sócio--econômicas: alta, média e baixa.

O trabalho foi possível tão rápido assim, graças, em pri-meiro lugar, ao dinamismo do prof. João Nogueira Mota, quea todos persuadiu mais por atos do que por palavras; em se-gundo lugar, graças à decisão dos professores, assistentes so-ciais e orientadores, que se prontificaram para aplicar noscolégios a lista de problemas; e graças ainda e naturalmente

REV. EDUC. EM DEBATE - FORT .. V. 3 - N.O 3 - P.~G. 73-90 1979 73

à Associação de Jovens do Centro Social Urbano PresidenteMédici, que adquiriu o material para este estudo., Uma outra fonte de inspiração para o que dizemos aquie o trabalho de pesquisa desenvolvido pela Drê. Isabel Adra-dos, com 450 jovens da Guanabara. (Cf. Isabel AdradosRorschach. na Adolescência Normal e Patológica, Rio, vozes:1975, 1976).

o que se vai dizer, portanto, da problemática dos jovens,vale mais para o 1.0 Grau do que para o 2.°; e, no 1.0, valemais para as moças do que para os rapazes. Todavia, a va-riedade da amostra permite alguma segurança na generali-zação dos resultados.

2. O QUESTIONARIO1. O LEVANTAMENTO DOS PROBLEMAS

Os problemas pessoais originam-se (1) das necessidadese conflitos interiores, que o próprio crescimento impõe, (2)

d?s deveres e das pressões socialmente determinadas. Não éprovável que tal problemática seja muito estável através dotempo, máxime numa época em que muitos dos velhos va-lores estão sendo postos em cheque, como por exemplo, noconcernente ao sexo, à família, à religião e ao dinheiro.

É possível que, dentro de seis meses, certos problemas,sublinhados hoje pelos jovens, sejam atenuados e caiam forado quadro que vamos apresentar; e que outros problemas en-trem em cena. Algumas áreas deverão revelar maior estabi-lidade do que outras. Mas, de um modo geral, a problemáticapessoal não se resolve tão facilmente, se acreditarmos no quediz ISABEL ADRADOS, que "aos 18 anos 50o/c dos jovensainda são imaturos afetivamente". E, o certo é que, sem pes-quisa, não é possível falar adequadamente, ou com objetivi-dade, neste assunto.

O levantamento realizado é pequeno, talvez um ou doispor cento apenas do universo das escolas de Fortaleza; masdeixa-nos algumas idéias. A amostra abrangeu 300 jovens aotodo, de ambos os sexos, das séries escolares 6.a, 7.a, 8.a do1.0 Grau; e da l.a série do 2.0 Grau. Foram aplicados 384questíonáríos: todavia, 22% foram retirados, por erro téc-nic~, ou deficiência na compreensão das instruções. A apli-caçao cobriu escolas das classes de renda econômica altamédia e baixa (A,M,B). '

, O menor número, na classe média, deveu-se precisamen-te à triagem que teve de ser operada. '

O Questionário respeitante aos problemas dos jovens éum instrumento publicado pelo Centro Editor de PsicologiaAplicada (CEPA). Trata-se da LISTA DE PROBLEMAS deMooney, listagem esta traduzida e adaptada, no Brasil, porTh. Frantz e G. Baquero. Constitui-se de 330 problemas, queos jovens deviam ler, sublinhando aqueles que lhes causavampreocupação, no momento e, em seguida, assinalando os pro-blemas de maior gravidade.

Os problemas concernemall áreas distintas. Vamosapresentá-los na ordem em que os Autores os listaram. Acaracterização de cada área é feita pela natureza dos proble-mas pesquisados, e vamos vê-Ia a seguir.

AREA 1 - SDF: SAÚDE E DESENVOLVIMENTO FíSI-CO. Problemas de ordem médica, desdedores de dente, olhos, ouvidos, nariz egarganta, a problemas de peso e altura,apetite e aparência física.

ARE A 2 - CVE: CONDIÇÕES DE VIDA E EMPREGO.Versa os problemas da posse e utilizaçãodo dinheiro, necessidade e poupança;comparação social, autonomia econômi-ca e liberdade; cômodos em casa paraestudo e para a solidão indispensável aoindivíduo; problemas de pais fora e deparentes dentro de casa; necessidade deestudar e lutar pela sobrevívên ia.

AREA 3 - ASR: ATIVIDADES SOCIAIS E RECREATI-VAS. Dificuldades m faz r aro! os, em

74,

REV. EDUC. EM DEIlATE - FORT., V. 3 - .°3 - P-\c. 73-90 1979 REV. EDUC. EM DEBATI' - FORT., V. 3 - N." 3 I'A(,. 7190 197t) 75

sair e conversar: problemas de gastos ede habilidades sociais (como dançar, to-car, jogar); deficiência de tempo livrepara diversões, ou liberdade para sair ànoite; falta de gosto social para vida emgrupo pela vergonha de sua condição.

AREA 4-NSM: NAMORO, SEXO, MATRIMôNIO. En-volve problemas de atração heterossexual;aparência pessoal e auto-imagem; con-trole dos encontros amorosos; desilusõesafetivas, ambigüidade na atração sexual,preocupação com a família futura, pro-blemas de sexo carência de informaçãoou formação sobr a vida sexual.

AREA 5 - RSP: RELAÇÕES SOCIAIS-PSICOLóGICAS.Esta área inclui probl mas de suscetíbilí-dade e r jeição no grupo; preocupaçõescom o desejo d causar boa impressão,desejo de autonomia, tendência à suges-tibilidade e lid rança; sentimentos de in-ferioridade inadequação, receio de per-manecer infantil; necessidade de confi-dência, receio e aspiração para aberturaao outro.

AREA 6 - RPP: RELAÇÕES PESSOAIS-PSICOLóGICAS.Caracteriza-se esta área pelo medo dodesconhecido (perder a cabeça), oscila-ções do humor; devaneio, preguiça, es-quecimento, perfeccíonísmo e medo deerrar, desejo e dúvida para levar tudo asério; sensação de desajeitamento; reaçãoàs frustrações com desejo de não ter nas-cido, ou de desaparecer, ou sentimento deenlouquecer, preocupações com os proble-mas de emotividade, insegurança, sonhose pensamentos "maus" ou irracionais.

AREA 7 - MOR: MORALE RELIGIAO.Peculiares são aquias dúvidas, problemas de ceticismo e to-

76 RI,Y. EDUC. EM DEIlATE - FORT., V. 3 - N.O 3 - PÃG. 73-90 1979

mada de valores, sentimentos místicos easpectos das religiões concretas ou histó-ricas; confusão entre o bem e o mal, ocerto e o errado; sentimentos de culpa eproblemas de poder real, injustiças, cho-que entre as teorias propaladas e a prá-tica adulta no cotidiano.

AREA 8 - LAF: LAR E FAMíLIA. Esta é a área da durarealidade familiar; doenças na família,perfeição e vícios domésticos; dificulda-des em ser criança (gostar dos pais comoeles querem) e ser adulto (ir seu cami-nho e perder os privilégios paternos, o di-reito de primogenitura) desavenças e se-paração de familiares; a morte de alguémquerido e não ter ninguém para amar; afraternidade tumultuada, o lar e a rua.

AREA 9 - FVE: FUTURO VOCACIONALE EDUCACIO-NAL: Problemas de aptidão e carreira,dificuldades nos estudos, perda de tempona escola, em face de outras necessidadespara ganhar a vida; os problemas de tra-balhar - ganhar - ser independente ea precisão de estudar - não ganhar -ser dependente; ir ou não ir para a Uni-versidade, planos e opiniões dos outros.

AREA 10 - ATE: AJUSTAMENTOA ESCOLAE AO TRA-BALHO ESCOLAR.Sensação de estar ncurso errado; dificuldades com matéria;desinteresse pelos livros e pelo blá-bl -bIacadêmico; retraimento em em ttr pl-niões e escolher; atraso fac à. turfalta de habilidades básicas dI. turr .cálculo, com as cons q nt nota 1 tl-xas nas provas.

AREA 11 - PCE: PRATICAS DE CUn.""~\..J"""'"Abrange problem li , (JII ,.

inexistent s ou cstud. I' () qu n io ~ . a:

REY. DUC. FM DFIlATI' - rOWI" .• V .• 1 • N." .1 I' II 71·( () 1')7') 77

OBSERVAÇAO:

problemas de metodologia na sala de aulade falta de material ou de ajuda dos pro-fessores; disciplina rigorosa nas relaçõesaluno-professor (o aluno nunca tem ra-zão); .incompetência dos professores, máorganização das atividades e problemasde avaliação da aprendizagem.O Questionário não inclui o problemadas drogas e nem tampouco o da inquie-tação política.

3. ANALISEDAS AREAS DO QUESTIONARIO

Est~s onze áreas podem s r reagrupadas, na minhaperspectiva e para efeito de melhor compreensão dos resul-tados, em quatro CONJUNTOS:

C-IC-lI

: Problemas de SAÚDE: compre ndendo a área SDF.Problemas de ESTUDO E EMPREGO: áreas CVEFVE, ATE, PCE. 'Problemas PSICOLÓGICOS (consigo mesmo e os ou-tros): RPP, AS~ RSP.Problemas SÓCIO-FAMILIARES: LAF, NSM, MOR.

C-lII

C-IV

. Pr~bl~~as .Psicológicos (conjunto llI) é o conjunto demaior íncídência da problemática, tanto para a classe altaq.uan~opara a média ou baixa. Basta conferir aqui a caracte-r~zaçao de cada uma das três ordens de problemas que cons-tituem este conjunto (RPP, ASR, RSP) , para entender a ade-quação e o peso destes problemas com os jovens. Até certoP?nto é "natural" que seja assim. A psicologia do desenvol-vímento ~os ens~na que a criança, ainda como bebê, começapor reagir (sornr) em primeiro, ao rosto humano, para so-~ente depois rea~ir sorrindo aos "objetos" e às coisas. QuerdIz:r que a relação humana determinará a qualidade da re-laçao para os objetos, quer sejam coisas, fenômenos ou gente.

718 REV. EDUC. EM DEBATE - FORT., V. 3 - N.O 3 - PÁG. 73-90 1979

Ninguém compreende os outros, se não compreender asi mesmo; mas, compreender a si mesmo, sem interação comos outros, sem atividades ou sem liberdade para tomar expe-riências sociais-recreativas, como é possível?

, Recrear-se é tomar experiência sem conseqüências gra-ves ou decisivas. A falta de liberdade para isto vai deixartodo jovem medroso e incapaz de responsabilidade.

Minhas investigações sobre agradabilidade revelam queas pessoas 'de baixo índice de agrado desejavam, quando jo-vens, fazer grupos de camaradagem, mas não fizeram tantoquanto as pessoas de bom índice de grado.

Segundo r. Adrados (op. cito capo I) "os adolescentes ca-racterizam-se, na cultura atual, pela espontaneidade das suasrelações e pela flexibilidade dos seus mecanismos de adapta-ção ... De 450 jovens pesquisados, 55,61% têm atitude extro-versiva. .. "Isto significa que os jovens insistem na procurade relações de camaradagem, de companheirismo, amizadee atuação social". Todavia, segundo a mesma Autora, "82!f,-apresentam traços autopunitivos e sentimentos de inferiori-dade ... " isto na adolescência, quando o jovem devia estarconfiante na sua força e no seu poder de enfrentar o ambien-te. Mas, continua Adrados, "nos adolescentes o predomínioda instabilidade é muito intenso: 92% aos 14/15 anos ...82% aos 17/18 ... ".

Não é, pois, de admirar que nossos jovens de Fortalezanos revelem que suas maiores preocupações incidem, precisa-mente, no Conjunto "Problemas Psicológicos" ou problemaspessoais consigo mesmo e os outros, onde as três áreas com-ponentes têm um peso quase igual". Há suspeita de que osadolescentes se auto-obrigam a um relacionamento com oambiente muito intenso para o qual não se encontram pr pa-rados emocionalmente". (Adrados, op, cit., p. 44)

O que se pode fazer? Penso que somente o treinam ntodos professores numa metodologia mais humana pod ria au-xiliar a juventude, nesta problemática pessoal Int rp oal.

Problemas de Estudo e Emprego (Conjunto lI) o s -gundo de maior incidência de problemas, na ár a ATE,CVE, FVE e PCE, pela ordem de gravidad . R veja-se a ca-

REV. Eouc. EM DEBATI' - FOR'I" V. 3 - N," 3 I'ÁI,. 73-90 1979 79

racterização da área ATE, atrás descrita, pois o ajustamentoà escola é peso máximo, consideradas as onze áreas de pro-blemas nas três classes sociais.

Segue-se em problemática a área CVE e FVE, peculiar-mente no que concerne às classes de renda baixa e média.Condições de vida e emprego e futuro vocacíonal perturbam,no dia-a-dia das escolas, uma-grande porção de estudantes(não os de classe de alta renda, é óbvio). Talvez devêssemospesquisar mais esta realidade e ir oferecendo currículos ade-quados para fazer face a esta fonte de tensão na juventude.Seria melhor do que promover campanhas contra os tóxicose coisas que tais.

Problemas Sócio-Familiares (Conjunto IV), é o terceiroem ordem decrescente da problemática. As áreas LAF, NSMe MOR apresentam todas uma característica idêntica: ac~asse de alta renda sobrexcede as demais. Talvez daqui sepossa tirar alguma explicação para o fato de que os educa-dores costumam valorizar tanto este conjunto de problemas!Os jovens 'não parecem valorízá-los tanto, pelo menos, faceaos problemas oriundos de outras áreas. Sobre problemas desexo, diz Isabel Adrados (op. cit., p. 38) " ... nossos adoles-centes, em que pese a naturalidade e liberdade com que secolocam em face do sexo, ou talvez justamente por isso mes-mo, revelam um controle acentuado sobre as necessidades decontacto 'sexual; mais do que a sensualidade grosseira, pa-recem ter o dom do savoir-faire ... " ou esperta habilidade,(na rrlinha tradução). . .

Mas hoje mais do que nunca (é o caso de repetir o cha-vão) se Podem fazer interrogações, nesta virada da cultura,quando se noticia pelos jornais e televisões a possibilidade decasar homem com homem e mulher com mulher t v) , ou apossibilidade' de construir famílias coletivizadas onde os fi-lhos não precisem ficar com os pais e onde estes são substituí-veis da noite para o dia (?), ou ainda a possibilidade' de ma-tar Deus para que o homem se eternízé (?) ...

Não resisto a transcrever aqui Ó que, em 1976,' escreveuCelma, minha aluna professoranda do Departamento deEducação da UFC: '

80 REV. EDUC. EM DEn 'li' - FOIn .. V. 3 N." 3

"A liberdade do ser humano não devia ser somenteem termos de independência econômica ou finan-ceira. O indivíduo devia poder ser livre junto a seuspais, irmãos, mesmo sem ainda ganhar dinheiropara se manter, É. Parece que as obrigações fami-liares acabaram, ou melhor, estão deturpadas. En-tão não é lindo pôr alguém no mundo, ajudá-lo emsua própria evolução, custeando-lhe todas as des-pesas e investimentos? Mas nunca se deve esquecerque ... a criança é um indivíduo, um ser humano,é gente .,. que vai precisar muito dos pais, mas elatambém vai precisar muito só dela mesma, .. Todaesta "manutenção" que estão me dando, eu dareialgum dia a alguém. Não vou ficar com saldo ne-nhum, podem ficar descansados. Mas eu não queronunca tirar a liberdade própria dos meus filhos ...que o fato deles dependerem de mim não seja acausa deles não se sentirem livres".

Problemas de Saúde (Conjunto I). Os jovens pesquisa-dos queixaram-se pouco. Os da classe A e M, por motivosóbvios, Os de baixa renda não se queixaram talvez porque,com a crescente assistência médico-social, eles já não sintamdores alarmantes. Entenda-se bem isto: enquanto uma dorde dente é tratada, cuidada demoradamente pelo rico, o po-bre a elimina bochechando cachaça, ou com a extração dodente, no posto de assistência mais próximo. Por outro lado,quando alguém está todo arrebentado (é apenas uma ana-logia), uma dorzinha de dentes é café pequeno.

4. PROBLEMATICA POR SEXOS

"Os rapazes são um pouco mais estáveis, mas nã dmaneira relevante em relação às meninas" dizAdrados. E também isto pode ser visto nesta p squísa.

Os rapazes apresentam igual problemátic quças, em duas áreas; mais problemas m 4 m n

Isab 1

s m -pI bl -

p í(,. 73-90 11>79 p\(,. 711)0 1979 81REV. EDUC. EM DEBATE - FORT., V. 3 - x." 3

nu , m 5 áreas. Este é um resultado que se poderia obterpor "cara ou coroa". É talvez interessante ver as áreas emque as moças acusam maiores diferenças sobre os rapazes:ASR, LAF, NSM, FVE. Os rapazes excedem as moças em:RSP, MOR, CVE, PCE. Observe-se, no entanto que, excetuan-do o Conjunto de Saúde, os outros três conjuntos estão re-presentados em ambos os sexos, ora em uma área, ora emoutra. A problemática aumenta da classe econômica Altapara a Média e desta para a Baixa.

Isto, em ambos os sexos. O aumento, porém, é pequeno,permitindo a conclusão de que todos necessitam de ajuda,para seu desenvolvimento com gente: ricos ou pobres, rapazese moças.

5. PROBLEMAS POR IDADE E INSTRUÇÃO

O Prof. E. Peel que é um psicológo educacional da Uni-versidade de Birmingham, na Inglaterra (Cf. Forum Edu-cacional, Rev. Ano 2, N.o 2, abril/junho, 1978) afirma que"há uma notável mudança por idade, quanto à preponderân-cia do julgamento desde o circustancial até o compreensivo,durante toda a adolescência. A mudança é mais marcantedurante a "adolescência média" ". .. Há três níveis de res-posta aos problemas: nível inferior, em que a imaturidadeleva a perder-se em irrelevância, ou a negar premissas ououtras condições do problema; nível do conteúdo material,em que o indivíduo é incapaz de olhar fora das condições doproblema; e o nível superior, em que a pessoa percebe quetem de ir lém das condições materiais dos problemas, paraevocar hipóteses baseadas na sua própria experiência" ... Ediz ainda o Dr. Peel "geralmente julgamentos amadurecidos- que encerram a interação entre o atual e o possível - nãoparecem ser predominantes antes dos 13 anos e meio deidade".

Verdade é que o prof. Peel se refere à solução de proble-mas cognitivos, intelectuais, ao desenvolvimento lógico. Masu não vejo que seja diferente, para este tipo de problemas

B' RI v, EDUC. ['vi: DEOATE - FORT., V. 3 - N.O 3 - P\G. 73-90 1979

C/U stamos tratando. Apesar de que a escola tem insistido( m treinar a inteligência, apenas para resolver os problemast • .nícos, ou os problemas alheios numa profissão - e jamais,pura resolver os problemas pessoais, psicológicos, com inteli-Ir ncia - minhas pesquisas dão que o processo é o mesmom grande parte. Sendo assim, era de esperar que, confron-

t ndo a problemática dos alunos de 12 e 13 anos, com a dosd 16 e 17 (todas as outras coisas mantidas iguais) hou-v sse uma diminuição dessa problemática nos mais velhos,

ado que, nesta idade, o jovem possui um poder de ra-íocínío de qualidade superior, em termos de generalizaçãoabstração mais amplas. Isto devia ajudá-lo na solução dos

problemas, ainda mesmo quando outros problemas entremm cena.

Nesta investigação os jovens de 12 e 13 anos da 6.a e 7.'~éríes apresentam uma média de 62 problemas, ao passo ques jovens de 16 a 17 anos das mesmas séries, têm 79 proble-

mas, isto é, um acréscimo de 17, por indivíduo. Isto contradizPeel no concernente à idade? Não. É que não basta o tempodecorrido na vida de uma pessoa, é preciso que ela tenha atin-gido "idade mental". Diz Peel: "Na emergência de diferentesníveis de julgamento... existem vários fatores... que po-dem incluir idade, sexo, inteligência, personalidade, aqui si-cão e uso da linguagem, ajustamento e maturidade psicoló-gica. Por parte do ambiente (continua Peel) nós temos queconsiderar as diferenças sócio-econômicas. interesses, ativi-dades, preconceito, instrução, escolarização e educação" (op.cit., p. 120).

O presente estudo mostra precisamente que os jovens de16 e 18 anos apresentam um decréscimo em sua problemá-tlca, de 10 problemas por indivíduos - os que, nessa idade,J estão na 8.a Série e no 2.0 Grau. A diferença em relaçãoa de sua idade, mas de escolaridade atrasada é de 20 pontoproblemas por pessoa.

Os mais velhos de 16 e 17 anos que se mantêm na 6.a c7.( ries, esses revelam aumento, em vez de diminuição deprobl mas. É que até na Universidade há sempre alguns que

I I V l·lll1C. 1M DEOATE - FORT., V. 3 - N.o 3 - P\G. 73-90 1979 83

não conseguiram esta melhoria de julgamento, a que se re-ferem os psicólogos (Piaget, por exemplo).

Deveria isto ser tido em consideração pelos educadores,e darem mais ênfase à recuperação, reorientação, ou reenca-minhamento dos alunos mais lentos e atrasados.

6. COMPORTAMENTOEM ALGUNS ITENSESPECíFICOS

Foi estudado atentamente o comportamento das respos-tas dos jovens em alguns itens isolados e que representamos três conjuntos de maior incidência de problemas: áreapsicológica, estudo e emprego e área sócio-familiar.

"O que acontece após a morte?" (item 145 da Lista deProblemas): 43 % sublinharam esta preocupação. A meu ver,este item representa problemas pessoais, valores psicológicos,equilíbrio emocional e até motivação para viver e trabalharmuito mais do que problemas de religião. O desconhecido dámedo (mas também nos faz procurar conhecê-lo e controlá--10); o que virá para lá da morte dá medo e produz uma con-dição nervosa capaz de tolher, ou motivar a produtividade doindivíduo. Nossa cultura precisa urgentemente de rever suafilosofia de existência e suas posições teológicas com serie-dade. Fazer finca-pé numa tradição assustadora dúbia ouinterrogada. .. de pouco servirá para ajudar as geraçõesnovas.

Outra preocupação sublinhada pelos jovens foi com suasnotas escolares (itens 269, 27.4 e 231). "Não estou gostandode minhas notas; as notas não correspondem ao que sabe-mos; estou tirando notas baixas". Todos os que somos pro-fessores sabemos que há sempre uma percentagem de alunos~ue não pode~ obter notas razoáveis para passar. Mas o piore que nao ha um reencaminhamento destes problemas. Osalunos queixam-se de notas baixas (32 % ), mas se queixammais de que há injustiças, de que as notas não correspondemao que sabem (42%).

Minhas investigações, em 1976, no 1.0, 2.0 e 3.0 bimestres,com 116 alunos da 6.a Série deu que, em Português e Mate-

84 RLv. Eouc. EM DEBATE - FORT., V. 3 - N.o 3 - PÃG. 73-90 1979

mática, 87 % permaneciam do lado baixo da escala de avalia-ão, I ou R; nos Estudos Sociais e em Ciências, 48ro. No con-

junto do currículo, 68% obtiveram notas R ou I, 30% con-seguiram B e apenas 2% eram ótimos. Isto quer dizer que,em cada grupo de 3 alunos, dois são julgados "medíocres",pelos seus professores.

Eu venho apresentando, desde aquela época, uma Escalade Avaliação Natural (psicológica, moralmente condizentecom o desenvolvimento da pessoa como pessoa), para que asescolas possam ser mais humanas. Mas como é difícil a gentese entender, neste País, até em assuntos de crianças, de jo-vens adolescentes - quero dizer, em assuntos sem quais-quer conseqüências de subversão política! Ou será que aju-dar a juventude a crescer é um mau serviço prestado à Pá-tria? Temos que acabar com esta mania sádica, de julgarmeninos, na escola. Dizemos que não temos bons professores,e como aceitamos que temos bons juizes?

O que quero dizer é que, para ajudar os jovens, nestaárea de estudo, aptidão vocacional, carreira e emprego, é ur-gente alterar os métodos e a avaliação, na escola, para deixara moçada aprender sem conseqüências, testar a si mesmo ese reencaminhar para o que melhor indicarem suas aptidõespessoais. Somente assim cominharemos juntos, apoiadosnuma filosofia de desenvolvimento mútuo, integrado e ma-nifesto.

"Os professores não se interessam pelos alunos" (itens218. 220 e 271) é uma queixa de 18% de jovens (leia-se: 18jovens em cada grupo de 100). Pode parecer pouco, masobserve-se que a queixa é espontânea. Se fizéssemos uma pes-quisa dirigida para isso, os resultados seriam mais severos.Seja como for, os jovens não parecem queixar-se tanto daincompetência dos seus professores (15%); nem qu nãtenham gosto para os estudos (13%); ou que suas famíliasejam desastrosas (10%).

Estes itens revelam, outra vez, a direção dos pr bl mas,o punctum dolens, ali onde é mais urgente levar nsino eajuda:

RI V. Eo . EM DER TE - FORT., V. 3 - N.O 3 - PÁG. 73-90 1979 85

1.0) ao relacionamento pessoal, ao modo de ser e estar-no--mundo;

2.°) à ansiedade originada nas condições de vida e empregoe ajuste à escola;

3.°) à dura responsabilidade de construir uma família, deconstruir valores morais e de se responsabilizar por si,por Deus, ou pelo Universo.

7. OS EDUCADORESATUAIS T~M ALGUMAINTUIÇÃODA PROBLEMATICAJUVENIL?

Intuir e conhecer os problemas é condição para algumaação pedagógica aceitável. No Departamento de Educaçãoonde leciono, pedia a 26 professores do último ano, que fízés-sem um exercício de adivinhação dos problemas da juven-tude. Escrevi as 11 áreas no quadro, caracterizando rapida-mente cada uma, e dei a seguinte instrução:

"Classifique essas áreas por ordem de gravidade (a pri-meira será a mais grave, supondo): 1.0) que você é professorade um colégio rico, 2.°) que você é professora de um colégiopobre. Trata-se de um exercício de intuição ou adivinhação;pode fazê-lo individualmente, ou em grupo".

A comparação dos resultados, da pesquisa real e da su-posta, vem no Quadro a seguir.

Começando a análise dos dados pela coincidência havidana classe A e na classe B (não representada no quadro su-pra) verificamos que: a classificação suposta das professo-randas coincidiu com a classificação da pesquisa real (pelocritério mais um, menos um), em 5 áreas da classe A, e nãocoincidiu em 6; na classe B a coincidência deu-se apenas em2 e não coincidiu em 9 áreas das onze constitutivas da Listade Problemas. Esta comparação dos resultados entre A e Bnão é significativa. Neste caso, parece que, de pobre a genteentende menos (pois, na classe B somente duas áreas foramcoincidentes) mas, confrontando A e B, nossa adivinhaçãoé insignificante. Em se tratando, pois, de fatos ou relaçõesespecíficas, quantitativas, somente a pesquisa da realidadenos dará razoável certeza. As professorandas não acertaram

86 REV. EDUC. EM DEBATE - FORT., V. 3 - N." 3 - PÁG. 73-90 1979

<I.l P:. 00 >'O ...•,;:s Q I + s::

c:<$ cn HCf2 -- -ti ~ C'J M

....•o

c:<$ ~ I Ili<

TIc:) ....• t:- <O

-o I Iir:.ci P:. M M oo ~ I'" Itl. ..J

P:l I!) ....• ~o I Io c,bJl

I--<I.l P:l ....• ....• o'"p. E-< I Ia ~

P:l<I.l P:l O> C'J t:-o > +'O rx.. +;:s....,

ao(/J P:l 00 ....•P:l :> +o +(/J P.. M I!) C'JoU ta I I'bn ~'o I--- -- -- --õ ~ C'J M ....•.~ o: + +(/J ~tl. I-- -- -- I---.ci c, ....• ....• >o tl. I s::•.. p:: +c, H

-- I- -- I---

ro .-...., ~(/J ocn '@ o ro.ro

O p. '...-4 O'<I.l ;:s UQ)E-< cn p:: cn s:: •.•

Z ~ ~Q) .-

::> P:l C< C< '0'0..., p:: (/J (/J 'õ Q)z < <I.l <I.l s::o tl. tl. ·õ..:;o I:Q I:Q Os::

I I t::l~ ~

RI V. EI) C. I:M DLR,ITE - ORT., V. 3 - N." :1 l' \I, 7 \ '10 1 '17'1

1

+

11

vi.oo

estas variações, além do simples acaso. Isto mesmo pode servisto no Quadro 1, na faixa de coincidência, levando em con-ta apenas a intensidade.

Note-se, porém, outro aspecto da questão: a forma, adireção das variações dentro de cada área, a diferença entre aposição da classe A e B, o sentido das diferenças de uma áreapara outra, ao longo das 11 áreas de problemática. A diferen-ça "A menos B" da pesquisa real pode comparar-se com a di-ferença "A menos B" da pesquisa suposta. A direção destasdiferenças na pesquisa imaginária foi acompanhando a dire-ção das diferenças na pesquisa real, em 9 sobre 11 áreas.Só se verificaram duas inversões: uma na área SDF e,áreas. Só se verificaram duas inversões: uma na área SDF e,por sinal, uma inversão enorme; outra é uma inversão míni-ma (pelo critério mais um, menos um) na área RPP. Esteresultado é significante ao nível de 5o/r de confiança esta-tística.

Portanto, neste aspecto da intuição formal os educa-dores atuais (ou melhor: atualizados, jovens em algum sen-tido) têm noção válida da problemática juvenil. Não obstan-te, para uma ação pedagógica concreta, isto não dispensa oconhecim nto específico, fatual ou de conteúdo, pois somen-te este tipo de conhecimento facilita o como fazer (know-how) para ajudar nas soluções.

SUMARIOE SUGESTõES

O presente trabalho consta de um levantamento de pro-blemas pessoais, com 300 jovens de 12 colégios de Fortaleza,utilizando-se, para isso, a Lista de Problemas de Mooney.Neste relatório estão caracterizadas as onze áreas da Listaou Questionário. Tal caracterização é feita segundo a natu-reza dos problemas pesquisados em cada área. As onze áreasforam agrupadas em quatro conjuntos: Problemas Psicoló-gicos, dificuldades de Estudo e Emprego, Problemas Sociais--Familiares e Problemas de Saúde. Esta seqüência corres-ponde à incidência de problemática revelada nos resultadosdo inquérito.

88 REV. EDUC. EM DEBATE - FORT., V. 3 - .0 3 - P~G. 73-90 1979

Ressalta a nossa atenção o fato de o "ajustamento à es-cola e ao trabalho escolar" ser a área de maior incidência,com os alunos das três classes sócio-econômicas alta, médiae baixa. Os problemas pessoais psicológicos carregam, no con-junto, o maior peso. A mulher começa também a preocupar--se com o seu "futuro vocacional e educacional" a fim d ga-rantir sua autonomia e libertação. Em contrapartida, os ra-pazes, havidos antes como pouco religiosos e menos pr ocu-pados com valores morais, apresentam agora mais problemasque as moças na área de "moral e religião". Globalmente, aproblemática aumenta da classe alta para a média, e destapara a classe baixa economicamente falando. Contudo, porser pequeno esse aumento, não justifica uma orientação mui-to diferenciada. Há indícios de que a problemática não crescecom a idade somente pela passagem das primaveras, e simpela interveniência de outros fatores, como, por exemplo, osatrasos na escolaridade e o aluimento cultural dos valorese das instituições, que são fonte de segurança.

É feita ainda uma análise dos problemas relativamenteao sexo masculino e feminino, bem como relativamente àidade e ao grau de instrução de 1.0 e 2.0 Graus. Por fim, es-tuda-se o significado de alguns itens específicos e a capaci-dade de os educadores intuirem a problemática dos jovensde hoje.

Sobre a questão do que se poderia fazer pelos jovens, SU-GEREM-SEmedidas de longo ou médio e curto prazos, índís-criminadamente como seguem:

1.0 - Fazer chegar estas informações à juventude, atravésde palestras ou cursos, e franqueando a comunicaçãopara maiores esclarecimentos. Se os jovens se empe-nharem, muitas soluções podem ser encontradas.

2.° - Discutir estes resultados também com os Professoresa fim de nos irmos dando conta da problemática exis-tente e nos prontificarmos a enfrentá-Ia.

3.° - Tentar derrubar o atual sistema de avaliação acadê-mica, como inútil e prejudicial, substituindo-o poruma avaliação do tipo humanista, cujas bases já estão

REV. EDUC. EM DF8ATE - FORT., V. 3 - N.O 3 - PÁG. 73-90 1979 89

sendo, hoje em dia, cada vez mais acessíveis na lite-ratura psicopedagógica.

4.o - Urgentemente promover a reciclagem metodológicados professores do Sistema Estadual oficial e particu-lar, envolvendo nisto o Conselho Estadual deEducação ou a Secretaria e Delegacia (se tal feito forpossível), com vistas a implantar uma metodologia decunho humanizante. Também e neste ponto é possívelencontrar recursos em Fortaleza. Os Departamentosde Educação das Universidades precisam fazer e po-dem fazer projetos em convênio, para a Comunidade ...ou não estão servindo à Região?

5.0 - Por fim, uma sugestão mais próxima dos jovens é di-namizar os Serviços de Orientação Educacional(S. O .E .) a artículá-los com a Supervisão. Os relató-rios de trabalho desses profissionais devem ser divul-gados em seminários abertos.

Finalmente, é bom não esquecer que, problemática sem-pre a teremos conosco. O que cumpre é fazer com que ummaior número de pessoas no sistema educacional se tornesensível a ela, ao invés de endurecer cada vez mais em suaação pedagógica autoritária e tecnocratizada.

90 REV. EDUC. EM DEBATE - FORT., V. 3 - .0 3 - PÁG. 73-90 1-