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Uma Análise de Efésios, Filipenses, Colossenses e Filemom (Russell P. Shedd e Dewey M. Mulholland)

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Epístolas da prisão

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  • R U S S E L L P. S H E D D & D E W E Y M . M U L H O L L A N D

    UMA A N A LIS E DE

    E FE S IO S , FILIP EN S ES

    C O LO S S EN S ES E

    FILEM OM

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Shedd, Russell P.Epstolas da priso : uma anlise de Efsios,

    Filipenses, Colossenses e Filemom / Russell P. Shedd & Dewey M. Mulholland. So Paulo : Vida Nova, 2005.

    Ttulo original de Filemom: PauPs ever relevant letter to Philemom / traduo Hans Udo Fuchs.

    Bibliografia.ISBN 978-85-275-0329-7

    1. Bblia. N.T. Colossenses - Comentrios 2. Bblia._ N.T. Efsios - Comentrios 3. Bblia. N.T. Filemom -

    Comentrios 4. Bblia. N.T. Filipenses - Comentrios 5. Bblia. N.T. Epstolas de Paulo - Comentrios I. Mulholland, Dewey M.. II. Ttulo. III. Ttulo : Uma anlise de Efsios, Filipenses, Colossenses e Filemom.

    05-0900 CDD-227.07

    ndices para catlogo sistemtico:1. Epstolas de Paulo : Comentrios 227.07

    2. Paulo : Epstolas : Comentrios 227.07

  • epstolas sla

  • Epstola de Paulo aos Efsios (reedio de To Grande Salvao)

    Copyright 2005 Edies Vida NovaEpstola de Paulo aos Filipenses (reedio de Alegrai-vos no Senhor)

    Copyright 2005 Edies Vida Nova Epstola de Paulo aos Colossenses (reedio de Andai Nele)

    Copyright 2005 Edies Vida Nova

    A Epstola, Sempre Relevante, de Paulo a Filemom

    Copyright 2005 Dewey M. Mulholland Traduzido do original Paul s EverRelevant Epistle to Philemon Traduo de Hans Udo Fuchs

    Ia. edio: 2005Reimpresses: 2006, 2007, 2009, 2012

    Publicado com a devida autorizao e com direitos reservados para Sociedade Religiosa E dies V ida N ova,Caixa Postal 21266, So Paulo, SP, 04602-970 www.vidanova.com.br | [email protected]

    Proibida a reproduo por quaisquermeios (mecnicos, eletrnicos, xerogrficos,fotogrficos, gravao, estocagem em banco dedados, etc.), a no ser em citaes breves, com indicao de fonte.

    Impresso no Brasil / Printed in Brazil

    ISBN 978-85-275-0329-7

    Coordenao editorial

    Robinson Malkomes

    Capa

    Julio Carvalho

    Coordenao de produo

    Roger Luiz Malkomes

    D iagramao

    Srgio Siqueira Moura

  • oou

    Contedo

    Prefcio dos Ed itores.............................................................................................. 7

    Epstola de Paulo aos Efsios----------------------------------------------- 9

    Introduo................................................................................. 11Razes para louvar a Deus (1.1-14)..................................... 13Um modelo inspirado de intercesso (1.15-23)................. 21To grande salvao (2.1-22)................................................ 30O grande mistrio da salvao (3.1-13).............................. 40A segunda orao na epstola................................................ 46O discipulado de Cristo - primeira parte (4.1-16)........... 51O discipulado de Cristo - segunda parte (4.17-5.21)...... 54O discipulado no lar, no trabalho e

    no exrcito de Deus (5.22-6.24)....................................... 64

    Epstola de Paulo aos Filipenses..................................................................... 7 7Introduo.................................................................................. 79As bases da nossa segurana (1.1-8).................................... 85Uma orao-modelo (1.9-11)................................................. 94A filosofia de vida do cristo (1.12-26).................................105Os cidados do cu em comunidade (1.27-2.4)..................118O centro da histria (2.5-11 ) ................................................. 129Desenvolvendo a salvao (2.12-18)....................................141

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  • Homens de Deus (2.19-30)...................................................... 152Perdendo para ganhar (3.1-8)..................................................160A ambio de Paulo (3.9-16)...................................................171O corpo (3.17-21 ) ......................................................................179O contentamento (4.1-7 ) ......................................................... 188O Deus da paz ser convosco (4.8-13)................................ 197A necessidade e o suprimento (4.14-23)............................. 207

    Epstola de Paulo aos Colossenses............................................................. 2 1 7Introduo...................................................................................219Autor, destinatrios e saudao inicial (1.1, 2 ) .................223A f, o amor e o evangelho (1.3-8)........................................225Intercesso em estilo apostlico (1.9-12)............................... 228Jesus Cristo, Senhor de toda a criao (1.13-23)............... 232O senhorio de Cristo no ministrio de Paulo (1.24-2.5)... 241Em Cristo, o Senhor (2.6-15)..................................................249Conseqncias de estar em Cristo, o Senhor (2.16-3.4)... 256O senhorio de Cristo na vida prtica (3.5-17).................... 262O senhorio de Cristo no lar e no servio (3.18-4.6)............ 274Vidas sob o senhorio de Cristo (4.7-18)................................281

    A Epstola, sempre relevante, de Paulo a Filem om........................ 287Introduo...................................................................................289A - Saudao inicial (v. 1 -3)...................................................293B - Filemom, sua f e seu amor tm

    animado o povo de Deus (v. 4-7).....................................295C - Quem ama de verdade renuncia

    aos seus direitos (v. 8-14)................................................ 299D - Filemom, ame sem restries: receba

    seu escravo como irmo amado (v. 15-17)........... 305C - Quem ama de verdade assume

    as dvidas do irmo (v. 18-19)......................................... 307B - Filemom, me traga nimo: faa at

    mais do que peo (v. 20-22)............................................ 309A - Saudao final (v. 23-25)................ 311Apndice...................................................................................... 313Bibliografia.................................................................................319

    E P S T O L A S DA P R I S O

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  • Prefcio dos Editores

    com grande desejo de prestar mais um servio relevante igreja do Brasil que Edies Vida Nova apresenta Epstolas da priso, uma exposio das quatro epstolas cujas composies so tradicionalmente associadas ao perodo em que Paulo esteve preso em Roma, no incio da dcada de 60, a saber, Efsios, Filipenses, Colossenses e Filemom.

    A relevncia dessa publicao sublinhada, em primeiro lugar, pelo fato de seus autores terem um estreito vnculo com o Brasil e com a igreja brasileira. A vivncia deles em solo verde-e- amarelo deu-lhes a capacidade de se dirigir de modo espontneo e corrente ao leitor de lngua portuguesa. Isso se torna facilmente verificvel pelo estilo familiar ao brasileiro e pela criao de um ambiente textual que fala no apenas mente, mas tambm ao corao.

    Em segundo lugar, a relevncia fica acentuada igualmente pela capacidade que os autores esbanjam de colocar o texto bblico dentro do mundo que nos cerca hoje, com suas caractersticas singu

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    lares, desafios e necessidades. Ao assim fazer, eles enaltecem o celebrado e decantado valor perene do texto sagrado, que, alm de perene, tambm se revela peremptrio, decisivo e digno de crdito.

    Alm de relevante, Epstolas da priso tambm se apresenta como fonte de inspirao. Paulo, o maior e mais prolfico autor do Novo Testamento, escreve numa poca da vida em que sua maturidade de pensamento e seu corao pastoral haviam atingido os mais altos nveis de expresso vivencial e epistolar. O fato de estar preso no fim da carreira podera gerar um gosto de derrota e de tristeza no grande apstolo. Todavia, o que se v nessas quatro epstolas a sublime expresso de alegria, vitria e gratido manifestadas por algum que havia chegado ao clmax da carreira, tendo combatido o bom combate sem perder a f.

    nosso desejo como editores que a relevncia e a inspirao veiculadas por Epstolas da priso sejam mais um motivo para o fortalecimento da igreja no Brasil em sua busca de maturidade e de perfeio na luta pela f evanglica que nos une e motiva.

    So Paulo, fevereiro de 2005

  • Introduo

    Efsios, epstola que me desafiou j h muitos anos e que, depois de muito estudo, continua me desafiando! a epstola que foi reconhecida por uma autoridade como a rainha das epstolas de Paulo. Efsios o mais sublime de todos os livros ou epstolas na literatura humana.

    O apstolo aos gentios encontrava-se preso em Roma, mas tinha liberdade para ensinar. E, talvez mais im portante ainda, podia meditar e colocar no papel suas meditaes (segundo At 28.30, 31). Durante o perodo de dois anos de recluso, o apstolo escreveu as importantssimas epstolas aos colossenses, aos efsios, a Filemom e, possivelmente, aos filipenses.

    A Epstola aos Efsios foi escrita provavelmente em 61 A.D., trinta anos, mais ou menos, depois da sua converso. Foi depois de alguns anos num deserto perto de Damasco, de muitos anos de servio na obra missionria, de muitas lutas (at fsicas); foi depois de ter sido apedrejado, de ter estado muitas vezes sem comida e sem seus companheiros, tendo este homem passado a viver cada vez mais na presena de Cristo. Esta epstola como se fosse o auge, uma descrio inspirada dessa vivncia com Cristo; ao mesmo tempo, uma abertura para a inspirao do Esprito, para todos ns. Dentre as epstolas de Paulo, somente esta, com base na crtica

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    textual, parece ter sido escrita para vrias igrejas e no apenas para uma. Nesse aspecto ela semelhante ao livro de Apocalipse, que foi dirigido a Efeso e a mais seis igrejas da sia.

    A grande ameaa levantada pelos judaizantes, que Paulo combatera em Glatas, Romanos e em parte de lCorntios, j no era mais problema. O gnosticismo incipiente comea, com o seu dualismo total e profundo, a ameaar a igreja crist. Em Colos- senses, Paulo trata especialmente dessa doutrina alheia verdade. Assim, escreve Robinson, ele ficou livre para dedicar-se a uma suprema exposio, no controvertida, positiva, fundamental, da grande doutrina da sua vida, isto , da humanidade de Cristo, da humanidade em Cristo e do propsito de Deus para o mundo, atravs da igreja.

  • Interpretao

    Razes para louvar a Deus ( 1 .1 - 1 4 )

    'Paulo, apstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus, aos santos que vivem em Efeso e fiis em Cristo Jesus, 2graa a vs outros e paz da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo. 3Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abenoado com toda sorte de bno espiritual nas regies celestiais em Cristo, 4assim como nos escolheu nele antes da fundao do mundo, para sermos santos e irrepreensveis perante ele; e em amor 5nos predestinou para ele, para a adoo de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplcito de sua vontade, 6para louvor da glria de sua graa, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado, 7no qual temos a redeno, pelo seu sangue, a remisso dos pecados, segundo a riqueza da sua graa, 8que Deus derramou abundantemente sobre ns em toda a sabe

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    doria e prudncia, 9desvendando-nos o mistrio da sua vontade, segundo o seu beneplcito que propusera em Cristo, 10de fazer convergir nele, na dispensao da plenitude dos tempos, todas as coisas, tanto as do cu, como as da terra; "nele, digo, no qual fomos tambm feitos herana, predestinados segundo o propsito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade, 12a fim de sermos para louvor da sua glria, ns, os que de antemo esperamos em Cristo; 13em quem tambm vs, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvao, tendo nele tambm crido, fostes selados com o Santo Esprito da promessa; 14o qual o penhor da nossa herana, at ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glria.

    0 autor: Paulo, apstolo em CristoPaulo era judeu, e por isso dedicava a sua vida a preservar uma doutrina, a doutrina da unidade de Deus, de ser ele supremo sobre todas as coisas. Essa doutrina fora ameaada pelo surgimento de uma seita crist, que seguia o Nazareno chamado Jesus Cristo. Paulo, sentindo-se muito ameaado em sua prpria pessoa, como tambm vendo o judasmo to ameaado, achou vlido servir quela doutrina at morte. E, com essa finalidade, dirigia-se a Damasco a fim de destruir a seita que se espalhava to rapidamente pelas cidades do imprio romano. Mas, enquanto caminhava, uma viso transformou-lhe a vida. E naquele instante comeou a vida do novo Paulo, a vida em C risto , uma vida com pletam ente transformada pela viso do senhorio de Cristo, do Cristo crucificado, ressurreto e glorificado.

    A Epstola aos Efsios apenas uma continuao dessa viso. E o apstolo Paulo reconhecendo a misso que Cristo lhe deu, quando, naquele importante encontro, sua vida sofreu uma reviravolta. E ele comeou realmente uma caminhada para o cu.

    A palavra apstolo, que indica o reconhecimento da autoridade de Paulo, baseia-se numa palavra aramaica: shliah. Esse termo, segundo Rengstorf, sugere que o apstolo o que comissionado no apenas como missionrio, que leva uma mensagem; no apenas como embaixador, que tem sua carta selada para entregar a um rei de outro pas; mas como procurador, que substitui

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    aquele que o mandou e pode tomar iniciativas. Assim, o que ele vai falar e fazer em Cristo. Essa expresso em Cristo, que aparece muitas vezes em Efsios, uma descrio dessa autoridade que Paulo reivindica como apstolo de Jesus Cristo. H uma in teressante passagem do Talmude que diz: O shliah equivalente quele que o enviou. E por isso que Paulo escreve palavras que, para ns, so muito difceis. Em 2.20 lemos: "... edificados sobre o fundam ento dos apstolos e profetas. Isto , os apstolos e profetas so pessoas que receberam uma revelao autorizada. E essa revelao a que temos diante de ns! Creio firmemente que se deixssemos o fundamento de que a palavra de Paulo igual palavra de Cristo que a autoridade do apstolo igual autoridade de Cristo ficaramos sem segurana alguma e facilmente teramos de descambar para a prpria razo humana. Paulo, como apstolo, nos traz assim essa mensagem inspirada, com autoridade. E os seus leitores so chamados santos e fiis.

    Os destinatrios: os santos e fiis em Cristo JesusA palavra santo no significa uma pessoa que no peca. Pelo contrrio, com base em Daniel 7 e em outras passagens do Antigo Testamento, santo quer dizer pessoa separada por Deus; e no Novo Testamento, atravs do Esprito de santificao, algum separado para pertencer exclusivamente a Deus.

    Quando pecamos, negamos a nossa posio de povo santo. Mas no deixamos de ser santos ao pecarmos, porque essa posio nossa. E Paulo envia a epstola com a pressuposio de que os seus leitores so pessoas realmente convertidas e separadas para o reino de Cristo.

    A palavra fiis, que tambm descreve os leitores (e, portanto, deve descrever cada um de ns), significa aqueles que se comprometeram com Cristo, que aceitaram o convite de sair do mundo perdido para o reino do Filho do seu amor. Esse compromisso uma deciso definitiva e clara; uma mudana de posio, no geogrfica, mas mental, quanto a quem Jesus Cristo e quanto a todos os outros senhorios do mundo, inclusive o de Csar. Dando esse passo, tornam-se fiis. A palavra tambm carrega a idia de fidelidade: no apenas deram aquele passo, quando se batizaram e se identificaram com Cristo, mas continuam se identificando permanentemente.

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    0 contexto e o tem a de 1 .1 - 1 4A epstola divide-se basicamente em duas partes: os trs primeiros captulos falam principalmente de doutrina e histria, aquilo que Deus j fez e est fazendo; enquanto os captulos 4, 5 e 6 nos desafiam a fazer alguma coisa, em decorrncia do que Deus faz e j fez. Encabeando assim a primeira parte da epstola, nos versculos 114, Paulo faz um convite a uma tomada de posio quanto adorao, numa doxologia: Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo. Essa orao introduz o mais longo perodo que se conhece na literatura bblica, pois termina somente no versculo 14.

    Do versculo 15 at o fim da captulo temos uma orao apostlica; o captulo 2 desenvolve alguns temas implcitos nessa orao (depois observaremos os pedidos centrais na orao do captulo 1 e como ela se relaciona com o captulo 2). O captulo 3 apresenta a vocao apostlica de Paulo e como isso se relaciona com o tema da epstola toda, que particularmente doutrinria.

    Be ndito o Seus e Pai de nosso Senhor Jesus CristoNo versculo 3 comea a mensagem da epstola com um chamado adorao. Toda doutrina deve ser como um fundamento ou como o solo, no qual a vitalidade de adorao e culto cresce constantemente. No encontramos aqui um louvado seja o Senhor, sem parar para pensar por que ele deve ser louvado, mas toda esse primeiro trecho ou pargrafo nos d motivos para louvor. Veremos rapidamente como o apstolo Paulo sente a motivao interior para louvar o seu Deus. .

    Na primeira linha, no versculo 3, o verbo principal no existe no original, mas possvel entender qual seja esse verbo: Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, j que por trs vezes (versculos 6, 12 e 14) a finalidade de tudo o que Deus est fazendo, e far, o louvor de sua glria. O apstolo Paulo est ento nos chamando, antecipadamente, como que para tomar parte com aqueles que j esto redimidos, a exemplo de Apocalipse 4 e 5, para expressarmos j um grande coro de louvor: Bendito seja Deus! O que Deus tem feito para que o louvemos de corao? A essa pergunta se responde da seguinte forma: ele nos tem abenoado com toda sorte de bno espiritual nas regies celestiais em Cristo. Isso no fcil de entender, mas pensemos um instante:

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    ele est dizendo que no h bno espiritual que no seja em Cristo; todas as bnos so cristocntricas. Haver alguma bno que no emane de Cristo? No fim tornar-se- outra coisa, mas no uma bno; transformar-se- numa ameaa, ou talvez numa maldio.

    Outro aspecto que todas as bnos nos so concedidas no apenas por Cristo, mas em Cristo. Note-se esta frase: que nos tem abenoado. Deus, frente de todas as bnos, nos tem abenoado com toda sorte de bno espiritual em Cristo. A frase em Cristo significa um relacionamento ntimo com ele, com a intimidade de uma vida transformada, de uma vida resgatada, salva; uma vida em que Cristo realmente Senhor, aquele a quem j nos entregamos. A ele, representante da minha vida, eu me entrego, da mesma forma como fazemos ao eleger um deputado ou um presidente: ns nos colocamos debaixo do seu controle; ele pode criar leis, pode controlar nossa vida, porque estamos em ele. Portanto, a expresso em Cristo tem a idia de representao, uma representao total de nossa vida. No devemos nos esquecer tambm de que estar em Cristo quer dizer estar no Esprito e ter o Esprito Santo em ns, unindo-nos a Cristo e uns aos outros no seu corpo, a igreja.

    Mas esta outra frase, nas regies celestiais, no aparece em outras epstolas paulinas. O que ela quer dizer? Os eruditos no tm muita certeza quanto ao que Paulo queria transmitir com ela. Mas j que Cristo, no versculo 20, est sentado direita da autoridade soberana de Deus, nos lugares celestiais, parece-me que Paulo quer chamar a nossa ateno realidade de que, quando estamos em Cristo, j estamos como que retirados deste mundo, e muitos fatores que normalmente controlariam nossa atitude assumem uma nova realidade: a realidade da exaltao de Cristo. O que isso implica em nossa vida? Ainda que estejamos neste mundo, lugares celestiais outra maneira de dizer o que Paulo fala em 2Corntios 2.14: Graas, porm, a Deus, que, em Cristo, sempre nos conduz em triunfo. Cristo j conquistou a vitria sobre as foras que se opem; e, ainda que essa vitria no se veja e no se realize em nossas vidas constantemente, a possibilidade dessa vitria nossa. Isso se torna mais claro quando, pela ltima vez, Paulo usa a mesma frase em 6.12, dizendo que a nossa luta contra as foras do mal, as foras satnicas, nas regies celestiais. Somente quando estivermos em Cristo, que, sentado destra do Pai, j conquistou a vitria por ns, que seremos vitoriosos.

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    As bnos que motream o nosso louvorQuais so essas bnos? H pelo menos cinco!

    A primeira bno (v. 4): nos escolheu, nele, antes da fundao do mundo. No entendo bem o que significa a escolha de Deus. Mas sei que a Bblia fala, possivelmente em termos figurados, que Deus tem um livro, o livro da vida, onde ele escreve o nome dos que j foram salvos, esto sendo salvos e sero salvos. Naquele livro esto os nomes dos escolhidos. No se tem nenhum a in formao de como ele faz essa escolha. No se explica que implicaes essa escolha tem para mim, porque eu tambm tenho a minha escolha plena e livre. Mas quero dizer isto: que se ele no me tivesse escolhido, antes da fundao do mundo, certo que eu no estaria aqui nem seria filho de Deus. a garantia fundamental de que um dia olharei a face do meu Senhor, porque ele me escolheu. E ele deve receber toda a glria pela minha posio em Cristo. A graa de Deus comea, ento, com a afirmao da nossa eleio. No original, essa eleio para si mesmo. Ele nos elegeu para seus propsitos.

    A segunda bno (v. 5): nos predestinou para sermos adotados. A palavra p red e s tin a r significa des tin a r com antecipao, sugerindo um a espcie de seleo. Em face da impossibilidade de desejarmos receber o seu convite, de sermos santificados ou de nos tornar irrepreensveis, por causa do amor que tenho e que todos ns temos pelo pecado, Deus ento me deu as condies que me faltavam, colocando ao meu lado justamente as influncias que hum anam ente explicam essa m udana de direo na vida. No meu caso, no lar em que nasci, tambm as incontveis pessoas que viveram vidas irrepreensveis diante de mim, apresentando um modo de ser que me chamou a ateno, fazendo com que eu soubesse que o cristianismo mais do que uma ideologia, mais do que uma mera herana religiosa; uma vivncia.

    Lendo Romanos 8.29, encontramos que, na predestinao, para serm os ado tados, o in te resse d iv ino que sejam os transformados em rplicas, imagens de Jesus Cristo, ou fotografias vivas dele! Essa adoo nossa em Cristo. Cristo o Filho por natureza, ns somos filhos por adoo. O versculo 7 fala da redeno; isso significa que Deus eliminou os sinais da nossa escravido s foras satnicas, ao pecado, nossa prpria carne,

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    ao egosmo, s foras da Lei e da morte. As algemas foram rompidas, e Deus nos ofereceu, em Cristo, a liberdade de filhos, de modo que, segundo Rom anos 8.15 e G latas 4.6, como um reconhecimento pblico, o novo cristo declara Aba, Pai (palavra aramaica que significa paizinho). o novo reconhecimento da relao com Cristo. Essas bnos so bnos que D eus j derramou sobre ns e que j comearam antes da criao. So uma transferncia de posio, deste mundo para os lugares celestiais, de culpabilidade para irrepreensibilidade e de escravido para filiao.

    A terceira bno (v. 7): uma bno presente; veja-se o verbo no presente: nele temos a redeno. Redeno uma realidade de vida contnua em decorrncia da nossa posio em Cristo.

    Algum tempo atrs, um jovem universitrio chegou em meu escritrio com lgrimas que lhe escorriam pela face. Eu quis saber o que se passava e ele me falou da sua escravido ao pecado. Ele no sabia onde havia uma sada para ele como crente. Conversamos e oramos. Ele saiu com novas esperanas. Um dia, no muito tempo depois, me telefonou com novas lgrimas. Mas s que desta vez o seu desespero era maior do que nunca. Ele me disse: Ca novamente e no h soluo. Percebo que realmente estou caminhando para o inferno, e no h salvao para mim. Conversamos mais sobre a palavra e as promessas de Cristo; mostrei-lhe o fato da escravido e que elimin-la uma coisa que Deus faz, s vezes, aos poucos, passo a passo. Oramos de novo e dei-lhe algumas tarefas. Depois de algumas semanas, passamos a nos encontrar e comecei a perceber seu rosto radiante, pelo menos nesta rea. Deus rompeu as algemas da escravido; nele temos a redeno! Se voc est sentindo a fora da escravido na sua vida, note essa bno, que contnua. Nele temos o preo pago por toda a escravido. Podemos nos chegar arrependidos diante dele, reconhecendo a nossa fraqueza humana, pois ele nos oferece essa bno continuamente.

    A quarta bno (v. 8): a segunda bno para o presente: segundo a riqueza da sua graa, que Deus derramoti abundantemente sobre ns em toda a sabedoria e pmdncia. Cristo abriu o seu livro de informaes. Ele nos oferece o seu plano para o futuro, o que maravilhoso em todos os sentidos. Assim, no h necessidade de ficarmos desesperados diante da maneira como o mundo parece estar se tornando cada vez mais sujeito s foras do caos. No, pelo contrrio, dizem os versculos 9 e 10: Deus j props e ele

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  • no pode ser contrariado neste seu propsito que todas as coisas um dia vo convergir em Jesus Cristo, que estar encabeando tudo. Tudo mesmo!

    No fim da orao do primeiro captulo (v. 22) vemos que, para a igreja e para ns, essa realidade j est em atuao, ao passo que o mundo pecador, as foras satnicas, a criao, tudo geme na esperana de justia (Rm 8.23), a justia final, o julgamento de Deus. Ns, que fazemos parte da sua igreja, o seu povo, aguardamos que ele seja o cabea de todas as coisas em nossa vida. Ele j foi colocado como cabea da sua igreja e est operando essa convergncia, este encabear, para que todas as coisas nele subsistam (Cl 1.17), de forma que se possa reconhecer isso agora, na igreja. .

    A quinta bno (v. 11): nele, os judeus (note-se o contraste entre o ns dos versculos 11-12 e o vs do versculo 13) Paulo e toda a linhagem judaica foram feitos herana de Deus, predestinados segundo o propsito daquele que faz todas as coisas segundo a sua vontade. Romanos 9-11 explica essa frase, mostrando como o judasmo no um aparente fracasso nos planos de Deus. O versculo 12: afim de sermos (ns) Paulo, os outros apstolos (tambm judeus convertidos), a igreja de Jerusalm e todos os judeus que sero ainda salvos (Rm 11.25-26) para louvor da sua glria. Sem dvida por causa da dureza do seu corao, costuma-se dizer que uma das coisas mais difceis de acontecer um judeu se converter, se entregar a Cristo! Mas, para a glria de Deus, a prpria nao judaica vai se converter ao seu Messias, Cristo, segundo a promessa de Deus.

    Em quem tambm vs, isto , pessoas como ns, gentios, que no temos direito nenhum em Abrao, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvao, tendo nele tambm crido, fostes selados com o Santo Esprito da promessa. Pedro teve a coragem de batizar Cornlio e outros recm-convertidos de Cesaria, mesmo sem ter, quela altura, a mente claramente aberta para o grande mistrio de Efsios. Mas teve a coragem de batizar esses novos crentes gentios por causa do Esprito Santo que os selara.

    Termino esta breve exposio do prim eiro pargrafo de Efsios com estas palavras: nosso direito de nos reconhecer como participantes da herana dada a Cristo (Jo 17.24: aqueles que Deus deu a seu Filho) deve-se unicamente participao, em nossa vida, clara e definida, do Esprito Santo. Se no h evidncia dele,

    E P S T O L A S DA P R I S O

  • E P S T O L A DE PAULO AOS E F S i O S

    da segurana e da garantia que ele traz para a vida, da evidncia do amor, do autocontrole, da benignidade, de todo o fruto do Esprito, temos de fazer esta pergunta: ser que eu, como gentio, tenho algum direito na herana oferecida a Cristo?

    Resum o: as bnos que temes para louvar a DeusConcluindo, quais so essas bnos? (1) ele nos elegeu para si mesmo; (2) ele nos predestinou, colocando todos os fatores em nossos passos desde o nosso nascimento at hoje para que fssemos transformados de escravos em filhos; (3) a bno da sua redeno contnua, que inclui a remisso e a retirada de toda a nossa culpa; (4) o reconhecimento do seu propsito, de que um dia todo o universo admitir a soberania de Cristo, o seu senhorio (v. 10); e (5) o privilgio de participarmos da sua herana.

    Um modelo inspirado de intercesso (1 .15 -2 3 )15Por isso tambm eu, tendo ouvido a f que h

    entre vs no Senhor Jesus, o amor para com todos os santos, 16no cesso de dar graas por vs, fazendo meno de vs nas minhas oraes, 17para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glria, vos conceda esprito de sabedoria e de revelao no pleno conhecimento dele, 18iluminados os olhos do vosso corao, para saberdes qual a esperana do seu chamamento, qual a riqueza da glria da sua herana nos santos, l9e qual a suprema grandeza do seu poder para com os que cremos, segundo a eficcia da fora do seu poder; 20o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos, e fazendo-o sentar sua direita nos lugares celestiais, 21acima de todo principado, e potestade, e poder, e domnio, e de todo nome que se possa referir no s no presente sculo, mas tambm no vindouro.22E ps todas as coisas debaixo dos seus ps e, para ser o cabea sobre todas as coisas, o deu igreja, 23a qual o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas.

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  • Por que Paulo orava?Paulo foi um homem de orao, e no sei como ele aprendeu a orar. Os discpulos, em Lucas 11, aps terem ouvido o Senhor orar, chegaram a ele e pediram instrues sobre como orar. Talvez Paulo tenha sido instrudo por Cristo, atravs do seu Esprito, no deserto de Damasco, onde passou vrios anos; ou, ento, nas limitaes do seu ministrio, em Tarso, durante ainda mais de dez anos, antes de entrar no trabalho ativo em Antioquia e de fazer suas viagens missionrias. Deus fez uma coisa maravilhosa com Paulo. Ele o separou para aprender dele, naquelas ocasies que duraram tanto tempo. Um seminrio sem mestres humanos! S depois disso ele iniciou o seu ministrio; e mais tarde Deus o separou, de novo, para um ministrio de orao, numa priso.

    Se as perseguies, que ocorreram durante grandes perodos da histria da igreja, voltarem a ameaar de novo o povo de Deus, acho que haver um efeito, que de fato ser um benefcio muito grande, com os presos cristos orando.

    Por que oramos to pouco? Por que os santos do passado gastavam horas, que sentiam passar como m inutos, enquanto gastamos minutos que parecem horas?

    A razo me parece, simplesmente, a falta de amor. Se o am or de Deus no derram ado, segundo Romanos 5.5, pelo Esprito, em meu corao, no tenho suficiente motivao para separar tempo da minha agenda (to cheia) para orar. Mesmo que, com aquele sentimento de obrigao, eu marque uma hora ou duas, uma manh ou uma noite, para orar, quando me ajoelho para assim fazer, encontro mil coisas que me desviam a ateno. E como o grande homem de orao da Inglaterra, George Mueller, que disse ter o problema de sua mente parecer um passarinho, que voa em todas as direes, em todas as flores, e no se concentra realmente na orao; concentra-se em planos, em mensagens, at em estudos bblicos, mas no na intercesso e na adorao.

    Paulo, l na priso de Roma, onde teve pouca oportunidade de sair para pregar s grandes multides e abrir novos trabalhos, teve tempo para se concentrar. A frase que ele usa aqui para descrever a sua vida de orao : no cesso de dar graas por vs, fazendo meno de vs nas minhas oraes (v. 16). Orar sem cessar! uma frase que descreve tanto a sua vida (Cl 1.9), como o seu ensino (lTs 5.17). Em se tratando de ns, de uma maneira geral,

    E P S T O L A S DA P R I S O

  • E P S T O L A DE PAULO AOS E F S I O S

    quando comeamos a orar, o problema logo cessar. Ao receber vrios pedidos de intercesso, oramos, mas logo desistimos.

    As igrejas da sia estavam longe do apstolo, mas ele se sentia to constrangido pelo amor de Cristo, que sua vida estava intim am ente ligada vida e aos problemas dos seus netos (no exato sentido da palavra: os que ele mesmo no ganhou, mas que foram ganhos pelos seus discpulos, seus filhos na f), sentindo-se com relao a eles um verdadeiro pai, um pai espiritual. Por isso, semelhana da me ou do pai que v os problemas e as necessidades da famlia e ora por ela, Paulo orava por causa do amor que sentia.

    O apstolo Paulo, autor de ICorntios 13, aquele que sentiu profundamente o amor, orava no apenas por obrigao^ porque muito espiritual orar bastante, mas porque amava.

    Nos versculos 15 e 16, lemos: Por isso tambm eu, tendo ouvido a f que h entre vs no Senhor Jesus, e o amor para com todos os santos, no cesso de dar graas por vs, fazendo meno de vs nas minhas oraes. Esse por isso pode se referir ao pargrafo anterior. Paulo, atravs da orao, talvez de Barnab e de outros que o amavam, e em resposta s oraes deles, foi instrudo pelo Esprito a entender essas profundas verdades que o levaram a adorar, no primeiro pargrafo desta epstola. Talvez seja por isso, por causa dessas bnos que empolgam o apstolo e o deixam extasiado, que ele agora ora por esses novos cristos, que pouco as conhecem. Por isso Paulo ora; uma orao que flui da compreenso do sentido da adorao.

    Muitas vezes chegamos a nossas reunies de orao, a nossos momentos de meditao particular, sem adorar e sem sequer ter a mente envolvida com a mente de Deus, pos nosso corao est bem fechado quanto ao esprito de orao, isto , o Esprito Santo, que quem nos promove ou nos motiva. Comeamos ento a tentar orar, mas acabamos sentindo o que os discpulos sentiram em Lucas 11. Nessas condies no estamos de fato fazendo coisa alguma, a no ser falando para ns mesmos ou lutando com o ar, em vez de estar em contato com Deus. Portanto, o por isso do v. 15 pode ser uma referncia aos versculos anteriores.

    E n tretan to , h tambm uma referncia no restante do versculo 15 quanto notcia de que esses novos crentes haviam se aliado ao povo de Deus, sendo agora colocados dentro do corpo pelo Esprito. Paulo reconheceu isso por meio da f que eles tinham, que se manifestava de alguma forma, no apenas ao levantarem

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  • E P S T O L A S DA P R I S O

    as mos e aceitarem Cristo, pois, sem dvida, eles assim o fizeram, mas pela f que havia se mostrado atuante. Ele ouviu falar do testemunho desses crentes da sia, por intermdio de Epafras ou Tquico ou de qualquer outro membro da igreja de Efeso, e sentiu ento a realidade da converso deles.

    A segunda coisa que o leva a orar saber que eles so crentes pelo testemunho que o seu amor d; e novamente lembramos que impossvel separar a f e o amor, pois esse versculo nos mostra que eles so dois lados da mesma moeda. Quem se compromete com Cristo, compromete-se com os seus irmos e com o mundo perdido. A est a motivao da orao: adorao e novos crentes que precisam de edificao.

    Paulo est muito consciente de que sem orao, sem essa colaborao com o plano de Deus atravs da luta de intercesso, falta ao crente o essencial para o crescimento do corpo, a igreja.

    Paulo dirige seu pedido a Deus (v. 17), o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo. E trata-se de uma orao bblica; no de uma orao dirigida ao Esprito, nem diretamente a Jesus Cristo, mas atravs de Cristo a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glria neste trecho. Lembremo-nos de que em Joo 14 toda a viso de Deus que queremos ter, segundo o propsito divino neste mundo, a imagem de Deus formada em vidas imagem de Cristo e sua atuao em resposta orao. No entendo com profundidade o que significa ser escolhido ou predestinado, nem como as nossas peties, chegando presena de Deus, mudam, transformam! No sou da opinio de que Deus muda de idia s porque eu lhe peo que mude. No, ele j pretendia fazer o que estou pedindo, porque a minha orao real quando eu penso junto com Deus os seus pensamentos. Mas, ao mesmo tempo, Deus restringe as suas bnos de vida, de crescimento, de formao da sua imagem, se eu deixar de orar.

    Num sentido muito real, orao colaborao com Deus (lCo3.9). Dirigimos assim nossa petio a ele, que no qualquer Deus, mas o nico Deus que se revela em Jesus Cristo como o Pai da glria. Jesus Cristo (o Senhor da glria segundo Tg 2.1) aquele que nos revelar a glria de Deus, nos elevar a mente, se concentrar em nossas peties, para que essa glria se manifeste na terra.

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  • E P S T O L A DE P A U LO A O S E F S I O S

    Especialmente o evangelho de Joo ressalta que Jesus Cristo a manifestao da glria de Deus, o Pai da glria, no sentido de que Cristo, vindo como Filho encarnado, demonstra-nos neste mundo o que realmente glria. Ento, neste sentido, Deus o Pai e a fonte de toda a glria, por meio de Jesus Cristo. E para este Deus que se eleva essa petio (no v. 17), que me parece ser a nica petio.

    Talvez no seja to essencial que faamos muitos pedidos a Deus. Seria como aqueles anncios que, s vezes, por serem muitos, se perdem.

    O versculo 17 tem a seguinte petio:para que [...] vos conceda esprito. Convm mudar um pouquinho a traduo, talvez num ponto crtico: que vos conceda Esprito (com inicial maiscula) de sabedoria e de revelao no pleno conhecimento dele. Tenho convico de que, quando realmente recebi a Jesus Cristo, recebi o seu Esprito regenerador. Sou salvo por ter nascido do Esprito. Eu e todos os que so filhos de Deus somos filhos atravs da regenerao do Esprito. Mas h uma passagem, justamente em Lucas 11, em que Jesus Cristo, ao responder a esta pergunta como devemos orar? ensina a orao conhecida como Pai Nosso ou Orao Dom inical (v. 2-4); depois ele continua mostrando a necessidade de insistir com Deus, com importunao, frente s portas do cu, e nos d a segurana de que seremos atendidos (v. 9-12). Mas, quando chegamos ao v. 13, temos uma informao quase indita, pelo menos nos evangelhos, que devemos pedir o Esprito, j tendo o Esprito. Ora, se vs que sois maus sabeis dar boas ddivas aos vossos filhos, quanto mais o Pai celestial dar o Esprito Santo queles que lho pedirem? Como resolvemos esta aparente contradio: ter o Esprito e ainda receb-lo? A soluo est no seguinte sentido: o Esprito fonte de vida e, portanto, fonte da nossa orao; temos de orar segundo Judas 20 e Efsios 6.18 no Esprito, porque no h outra orao seno no Esprito. Podemos e devemos, ao mesmo tempo, pedir o Esprito no sentido de sua atuao e de sua presena real em nossa vida. Pode-se dizer o mesmo com respeito adorao (Jo 4.24).

    Pare agora um instante para lembrar quando foi a ltima vez que voc orou; talvez tenha sido hoje, espero que sim. Meu amado irmo em Cristo, voc orou mesmo? Voc sentiu que Deus

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  • E P S T O L A S DA P R I S O

    estava escutando a sua petio ou foi como naquele caso dos adoradores de Baal, relatado em IReis 18, quando se pensava que o deus deles estava viajando? Deus estava escutando? Ah, meu irmo, se o Esprito de Deus quem torna real a presena de Deus, dele que precisamos! Precisamos dele para fazer qualquer petio e para sabercomo orar. Fiquei impressionado com certas senhoras diaconisas da Alemanha, as chamadas Irm s de M aria, mas que so crentes que se dedicam orao. Impressionei-me especialmente com a afirmao que a diaconisa Basilea Schlink faz em um dos seus livros: para elas, o principal no pedir que Deus faa, mas o essencial saber o que pedir, para saber o que ele quer responder e assim cooperar com os verdadeiros propsitos de Deus. Orar no Esprito deve ser alguma coisa semelhante a isso.

    Paulo pede que esses irmos recebam o Esprito, Esprito de sabedoria e de revelao. Essas duas palavras falam de orientao, de motivao, e descrevem a nossa profunda necessidade de saber como viver o dia de hoje. Quando chegarmos ao tribunal de Deus para prestar contas, e o videoteipe da nossa vida for rodado, vendo novamente como passamos o dia de hoje e ao mesmo tempo vendo, junto daquele teipe, o que Deus queria de ns, contrastando com o que fizemos, como ser conosco? Isto deve ser aquilo que est envolvido no que a Bblia chama de prestar contas. Parece-me que a nica tristeza que nos aguarda no cu aquilo que poderiamos ter sido, se tivssemos sido orientados pelo Esprito, e o que fomos, rebelando-nos contra a vontade e o amor de Deus. Em outras palavras, o que Efsios 4.30 fala sobre o Esprito e sobre entristec- lo, como uma reao desobedincia do crente em quem ele habita. O original grego d-me a impresso de coloc-lo num cantinho: Fique l quietinho porque eu tenho os meus problemas, a minha vida para viver; fique l, porque eu realmente no preciso da sua interveno. Por trs dos problemas das nossas igrejas est a falta de orao em busca de orientao.

    As duas palavras, sabedoria e revelao (v. 17), tm os seguintes significados:

    SabedoriaNo Antigo Testamento, sabedoria significa olhar para a vida com os olhos de Deus e perceber o que ele est fazendo, para ento envolver-se nisso.

  • E P S T O L A DE PAULO AOS E F S I O S

    No livro de Provrbios, os conselhos sbios tratam de diversos assuntos: dinheiro, como gast-lo como Deus quer; casamento, planejamento da vida familiar e educao dos filhos de acordo com a vontade de Deus; e tambm como cultuar a Deus. O Antigo Testamento est cheio de frmulas, indicaes e mandamentos, e todos eles so um apanhado da sabedoria de Deus.

    Mas no Novo Testamento encontramos uma nova dimenso. Veja ICorntios 1.22-24: Porque tanto os judeus pedem sinais, como os gregos buscam sabedoria (isto : sabedoria filosfica, cientfica, tudo aquilo que funo da universidade fornecer); mas ns pregamos a Cristo crucificado, escndalo para os judeus, loucura para os gentios; mas para os que foram chamados, tanto judeus como gregos, pregamos a Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus. >

    Bem, quando chegamos a ICorntios 2.2 esta sabedoria, diz Paulo, concentrou-se na sua pregao da seguinte forma: Decidi nada saber entre vs, seno a Jesus Cristo, e este crucificado. Para mim, o problema da igreja de Corinto e de todas as nossas igrejas que nossa sabedoria, muitas vezes, no a sabedoria imersa no significado da cruz: saber realmente amar, at ao ponto de sacrificar-se. Lembre-se de que a cruz a sabedoria de Deus. E possvel fazer como muitos, que voltam as costas ao fator supremo da misso, que pregar e viver a realidade da cruz de Cristo. Como os crentes da sia podiam se deixar ser decapitados, ou queimados, como no caso de Policarpo, a no ser que tivessem essa sabedoria neotestamentria?

    RevelaoEsta outra palavra, revelao, significa uma viso de todas as coisas, no apenas deste mundo que est desaparecendo, segundo Paulo (ICo 7.31), mas uma viso dos valores tal como so traduzidos no cu. Jesus Cristo, ao falar com os seus discpulos, em Mateus 6, chama-lhes a ateno para a maneira de valorizar seu dinheiro, colocando-o no Banco Celestial. Isso requer a revelao das realidades invisveis e ningum o faz a no ser que receba uma revelao, isto , veja que vale a pena investir num mundo alm deste, atentando para aquele mistrio de Deus, que v o fim e no apenas os passos difceis de agora. A revelao que o Esprito d abre-nos a viso. Faltando essa revelao, diz Provrbios, o povo perece. O Brasil perecer, a frica perecer, o mundo perecer sem essa viso da revelao e da sabedoria.

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  • E P S T O L A S DA P R I S O

    Vejamos ento o Esprito que Paulo pede atravs de uma atuao plena e real na vida desses novos crentes de feso: que eles sejam cheios do Esprito de sabedoria e de revelao. Em outras palavras, motivados. Mas uma coisa acompanhar essa atuao do Esprito (nota-se na ltima linha do versculo 17): o pleno conhecimento dele. Chamo a sua ateno para Joo 14.9: o pleno conhecimento dele est em Cristo. Ora, este Esprito de revelao e sabedoria far (v. 18) trs coisas, mas antes iluminar os olhos do nosso corao. Voc sabia que o seu corao tem olhos? O texto diz que tem. No original, a iluminao significa o milagre do homem cego, isto , tinha olhos, mas estava cego. E essa iluminao sempre o milagre da nova criao. Em 2Corntios 4.4 lemos que o deus deste sculo cegou o entendimento dos incrdulos, para que no lhes resplandea a luz do evangelho. [...] Porque no nos pregamos a ns mesmos, mas a Cristo Jesus como Senhor e a ns mesmos como vossos servos. [...] Porque Deus que disse: Das trevas resplandecer a luz, ele mesmo resplandeceu em nossos coraes, para iluminao do conhecimento da glria de Deus na face de Cristo. Ns, que queremos servir a Cristo, precisamos deste milagre, que talvez se repita os olhos do nosso corao iluminados com essa revelao e sabedoria. Quando isso acontece, trs coisas sucedem.

    As trs cessasA primeira delas o entendimento, uma compreenso da esperana do nosso chamado, que duplo primeiro, para servirmos aqui; segundo, para fazermos herana com ele l no cu.

    A segunda, que estes olhos, j milagrosamente abertos pelo poder de Cristo e por sua iluminao, tenham capacidade de olhar para o sol celestial, sem serem ofuscados. Eu j tentei ver o eclipse do sol e, apesar de que no ser total, fiquei como cego por causa da incidncia dos raios solares. Mas aqui se est dizendo que com o corao pode-se ver a verdadeira glria do Senhor. Essa glria vem, ento, residir em ns. Jesus pede essa mesma bno em Joo 17.24, que os seus discpulos vejam a sua glria. Em lCorntios 3.18, vemos que essa glria transformadora e realmente santifica. A riqueza da glria (1.18): veremos a riqueza da glria de Deus, da herana que ele tem em ns? Essa herana est ainda incompleta? A glria de Cristo pode ser percebida quando se olha para Apoca

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  • lipse, onde se acham diante do seu trono, oriundos de todas as lnguas, tribos e naes, os que foram comprados por to grande preo. E como eles chegaram l? Atravs de uma motivao despertada pela viso que tiveram da riqueza da glria de Cristo.

    A terceira coisa, to essencial e importante, que vem com a iluminao dos olhos do corao , note-se bem, a suprema grandeza do seu poder para com os que cremos, segundo a eficcia da fora do seu poder; o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos, e fazendo-o sentar sua direita nos lugares celestiais (v. 19, 20). Paulo faz uso de sinnimos e de palavras no exatamente sinnimas para se referir fora, ao poder, energia efetiva necessria para quebrar uma grande barreira que todos ns temos, desde os mais velhos at os mais novos. Quando ns, j tendo recebido uma viso da glria de Cristo, sentimos nosso chamado, precisamos ainda de poder. Os discpulos, ao esperar o dia de Pentecostes, esperavam o que Cristo prometera: poder. E a petio de Paulo por aquele poder que se derramou sobre os crentes no dia de Pentecostes, pelo qual milhares de pessoas vieram a refletir a glria de Cristo, submetendo-se sua soberania. Ento a eficcia, o domnio, a palavra traduzida por fora, dunamis (At 1.8), derramou-se de tal forma que Satans e todos os seus demnios, os principados e potestades, os senhorios sobrenaturais, no puderam conter; foram esmagados naquela batalha no dia de Pentecostes.

    E P S T O L A DE P A U LO A OS E F S I OS

    itpiieaoMeu irmo, se alcanarmos sabedoria e tivermos a revelao, se sentirmos profundamente a esperana do nosso chamado, chamado de uma vida que se realiza fazendo alguma coisa que dure por toda a eternidade, dentro da misso de Cristo; se sentirmos e virmos algo de sua glria; mas se no tivermos poder, seremos de imediato derrotados.

    Esta Epstola aos Efsios uma orientao para vencermos as foras invisveis que nos cercam, j que essas foras, quando quisermos fazer alguma coisa, tentaro enganar-nos e fazer-nos tropear.

    Mas o versculo 19 mostra-nos que o mesmo Esprito de revelao e de sabedoria nos dar a vitria atravs do seu poder, se estivermos dispostos a lutar juntamente com ele contra o diabo e as hostes do mal, com a mesma atitude que Cristo lutou, ou

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  • E P S T O L A S d a p r i s o

    seja, conforme Colossenses 2.15, na cruz! No vencemos essas foras por meio do raciocnio; nem simplesmente conhecendo melhor a Bblia; nem dando, por obrigao, mais tempo orao, mas adquirindo a sabedoria de Deus, que mais sbia que a dos homens, essas foras so vencidas com Cristo, como diz o livro de Apocalipse, como o Cordeiro que parecia ter sido morto! A palavra muito forte em Apocalipse 5.6.

    Quando estamos sentados com Cristo, compartilhamos, de certa forma, da sua vitria; mas, mas ao mesmo tempo, estamos crucificados com ele, aqui neste mundo.

    Meu irmo, enquanto amarmos a nossa vida, o poder do Esprito no se demonstrar com clareza total. A orao de Paulo que o Esprito de sabedoria e de revelao seja concedido, que nos abra os olhos do corao para uma viso do mundo, para uma viso de ns mesmos e, acima de tudo, para uma viso de Cristo. Espero em Deus uma nova disposio: no amarmos tanto a nossa vida.

    To grande salvao (2 .1-2 2 )'Ele vos deu vida, estando vs mortos nos vossos

    delitos e pecados; 2nos quais andastes outrora, segundo o curso deste mundo, segundo o prncipe da potestade do ar, do esprito que agora atua nos filhos da desobedincia; 3entre os quais tambm todos ns andamos outrora, segundo as inclinaes da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos, e ramos por natureza filhos da ira, como tambm os demais. 4Mas Deus, sendo rico em misericrdia, por causa do grande amor com que nos amou; 5e estando ns mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo; pela graa sois salvos; 6juntamente com ele nos ressuscitou e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus; 7para mostrar nos sculos vindouros a suprema riqueza da sua graa, em bondade para conosco, em Cristo Jesus. 8Porque pela graa sois salvos, mediante a f, e isto no vem de vs, dom de Deus; 9no de obras, para que ningum se glorie. 10Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antem o preparou para que andssem os nelas.

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  • E P S T O L A DE PAULO AOS E F S I O S

    "Portanto, lembrai-vos de que outrora vs, gentios na carne, cham ados incircunciso por aqueles que se intitulam circuncisos, na carne, por mos humanas, "naquele tem po, estveis sem Cristo, separados da comunidade de Israel, e estranhos s alianas da promessa, no tendo esperana, e sem Deus no mundo. "M as agora em Cristo Jesus, vs, que antes estveis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo. "Porque ele a nossa paz, o qual de ambos fez um; e, tendo derrubado a parede da separao que estava no meio, a inimizade, "aboliu na sua carne a lei dos mandamentos na forma de ordenanas, para que os dois criasse em si mesmo um novo homem, fazendo a paz, 16e reconciliasse ambos em um s corpo com Deus, por intermdio da cruz, destruindo por ela a inimizade. ,7E, vindo, evange- lizou paz a vs outros que estveis longe, e paz tambm aos que estavam perto; "porque por ele, ambos temos acesso ao Pai em um Esprito. 19Assim j no sois estrangeiros e peregrinos, mas concidados dos santos, e sois famlia de Deus; 20edificados sobre o fundamento dos apstolos e profetas, sendo ele mesmo Cristo Jesus, a pedra angular; 21no qual todo edifcio, bem ajustado, creste para santurio dedicado ao Senhor, 22no qual tambm vs juntam ente estais sendo edificados para habitao de Deus no Esprito.

    O fim do cap tu lo p rim eiro diz que a igreja (e ns somos microcosmo da igreja) foi feita corpo de Cristo; e para demonstrar a sua corporalidade, Cristo foi feito cabea, isto , o controlador, o planejador (mesmo invisvel) dos acontecimentos na vida.

    Efsios 2 continua o pensam ento de Paulo iniciado no prim eiro pargrafo do captulo 1, com o louvor a Deus pelas profundas e transform adoras bnos que ele tem concedido. Efsios 2 d continuidade ainda orao do segundo pargrafo, iniciada no versculo 15, quando o apostolo pede que o Esprito venha abrir os olhos do corao dos leitores e ouvintes, para que compreendam atravs da sabedoria e da revelao divina a vocao que Deus lhes tinha dado, a riqueza da glria, da herana que ns

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  • E P S T O L A S DA P R I S O

    somos em Cristo e, finalmente, no versculo 19, a suprema grandeza do seu poder. O captulo 2 uma exposio do significado daquela frase a suprema grandeza do seu poder para conosco (1.19). Ento, com essa idia na mente, leiamos este captulo que se divide claramente em duas partes: a primeira, falando da nossa situao de onde Deus nos resgatou (2.1-10) e a segunda parte, nossa situao social, o novo povo de Deus, a igreja (2.11-22).

    Jesus Cristo, que na sua ressurreio demonstrou o poder e o amor que Deus nele exerceu, est agora sendo explicado em sua relao com a humanidade toda e principalmente em relao com os gentios pagos, que ramos ns. E por isso que a palavra vs aparece nesse trecho. Paulo est escrevendo para igrejas gentlicas, em princpio. Portanto, para descrever a grandeza do poder de Deus, que se demonstra na ressurreio de Cristo, o apstolo escolhe vrias figuras para descrever a nossa condio, antes de sermos salvos.

    O primeiro pargrafo pode ser entendido como abrangendo a condio anterior e o privilgio presente. Este pargrafo divide- se assim: os primeiros trs versculos tratam da nossa condio de pagos, perdidos no mundo; e os versculos 4 e 10, do nosso privilgio presente.

    k condio a n te rio r A primeira palavra que Paulo usa para descrever a situao do pago, do incrdulo sem Cristo, a palavra morte: mortos em delitos e pecados. Esta palavra, para descrever o pecador, primeira vista no parece ter sido bem escolhida, porque o incrdulo aparentemente no est morto: ele tem raciocnio, tem capacidade de entender, inclusive palavras da Bblia. Ele pode repetir nomes como Cristo. Ele sabe algo da histria de Jesus; aparentemente ele no est to morto, como parece pela palavra escolhida por Paulo. Mas ao entendermos a razo pela qual Paulo escolheu essa palavra, comeamos a perceber que a Bblia coloca o pecador em situao bem diferente da que talvez ns atribuiriamos a ele. Porque a idia de morte (que talvez tenha surgido da condenao de Ado e Eva, no captulo 3 de Gnesis: no dia em que comeres deste fruto, morrers) carrega em si profundas realidades sobre a situao moral e espiritual do homem sem Deus. De que forma?

    Primeiramente, a pessoa morta no pode se movimentar; ela est totalmente inerte e perde por completo aquilo que cha

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  • E P S T O L A OE PAULO AOS E F S I O S

    mamos de personalidade. H algumas poucas semanas atrs, um amigo nosso morreu num desastre de automvel: pai e filho, ambos. Quando a viva foi ver o corpo, aquele homem que havamos conhecido to bem (ele fizera parte do nosso grupo de estudo bblico) estava totalmente incapacitado de se comunicar conosco, e ns com ele. Tanto faz falar com um cadver, como falar com o cho, ou com um piano, ou com qualquer outra parte do universo no pessoal. A primeira idia de morte me parece ser esta: a incapacidade de comunicao, de movimentao, de aproximao. A incapacidade de reagir, de corresponder. Deus falando ao homem, e o homem no escutando coisa alguma, no respondendo, no reagindo, mas continuando no seu prprio caminho, como se Deus no existisse.

    Em segundo lugar, o corpo ao perder a vida comea a se decompor. A situao do homem sem Deus uma situao de decomposio, no no sentido apenas de mau cheiro, mas de que a integrao da sua pessoa, da sua personalidade, est se perdendo tanto quanto a de um cadver, que depois de alguns anos no ser nada mais que p e alguns ossos espalhados. O homem sem Deus est se decompondo. A sociedade humana se decompe, quando se separa de Deus.

    A caracterstica do homem que ele est morto em delitos e pecados. E essas duas palavras so sinnimas. O pecado pode ser descrito como o que cai fora do alvo, que no atinge o seu destino. A palavra pecado tem a idia daquele que erra o alvo, como dois homens caadores que esto procura do coelho, mas se matam um ao outro, em vez de o coelho. A inteno completamente contrariada, totalmente errada; isto o pecado.

    A segunda figura que Paulo usa a de uma corrente de escravos. Isso acontecia muito freqentemente no imprio romano: depois de uma guerra, para punir os povos que se rebelavam contra Roma, faziam uma corrente e algemavam, pelos pescoos ou pelas pernas, centenas de presos para lev-los s cidades do imprio como escravos. Veja a palavra andar (v. 2); normalmente no se pensa em mortos andando, mas nesta nova figura de Paulo eles andam. Porm um andar pressionado, um andar de presos. Notem-se as palavras e frases que Paulo usa com respeito a este andar: outrora, segundo o curso deste mundo. As algemas, as cadeias escravizam; isto pode-se referir cultura formada sem Deus.

    H pouco tempo li um livro sobre uma tribo de antropfagos na Indonsia, o qual narra que eles tm na sua cultura, como alvo

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  • EPSTOLAS DA PRISO

    principal de suas vidas, enganar os seus amigos, m at-los e com-los. O curso deste mundo a traio. Trata-se de alvos e am bies nos quais procuram os tira r o mximo dos nossos companheiros, para nos elevarmos e para nos dar conforto, pisando nos seus corpos, se possvel e se necessrio. Essa a cultura deste mundo formado sem Deus e contrrio a Deus. A palavra ain descreve Satans influindo em todas as reas da vida e da histria, especialm ente nas suas m etas principais (segundo o curso, no original, ain, a era deste mundo).

    Outra frase que descreve essa corrente de escravos segundo o prncipe da potestade do ar. O general conquistador, que andava na frente desta longa fila, aqui descrito como Satans, o prncipe deste mundo, que atravs da sua fora enganadora cria na mente hum ana o desejo de adorar todos os deuses, que afinal lhe so submissos, em vez de um nico Deus. E este andar segundo o esprito que agora atua essa fila. que no tem a mnima possibilidade de escapar, seguindo aquele triunfante prncipe do mundo para seu destino, o prprio inferno. Esta potestade do ar descreve a sua invisibilidade; ele invisvel, e ao mesmo tempo, descreve a incapacidade de fugirmos dele. No h nenhum mosteiro, nem igreja, no h local onde no se sinta a fora do seu domnio e da sua seduo, porque acima de tudo ele o pai da mentira e o pai da seduo (Jo 8.44).

    A terceira descrio desta fila acha-se no versculo 3, entre os quais tambm todos ns andamos outrora, segundo as inclinaes da nossa carne. E eu imagino que, na maioria, aqueles escravos, vindo das fronteiras, no andavam to felizes, mas vinham chorando, tristes, sofrendo; vinham na infinita misria. Porm no esse o caso do homem pecador sem Deus. Ele como o jovem escravizado s drogas, ou como o dependente de lcool, que, ainda que seja escravo, gosta desta escravatura, principalmente quando est se escravizando ainda mais. E com respeito descrio do versculo 3, segundo as inclinaes, sabemos que a palavra no original simplesmente os desejos da prpria pessoa. Ele um escravo satisfeito, enquanto puder se escravizar cada vez mais, fazendo a vontade (no original, as vontades) da carne e dos pensamentos.

    F inalm ente, a terceira figura que Paulo em prega para descrever a nossa condio de pecadores e culpados: ramos por natureza filhos da ira. A expresso filhos da ira um hebrasmo para descrever que no h nenhuma possibilidade de sermos outra

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  • EPSTOLA DE PAULO AOS EFSIOS

    coisa, diferente do que ramos. Uma vez filho de algum, no se pode mudar a filiao. Portanto, essa descrio de condenao completa e total. Joo 3.36 afirma isso quando diz que os que no crem no Filho j esto sob a ira de Deus. So filhos dessa ira. Por isso, quem cr no Filho tem a vida eterna; o que, todavia, se mantm rebelde contra o Filho no ver a vida, mas sobre ele permanece a ira de Deus.

    A ira de Deus um conceito teolgico profundo. Tem sido objeto de muita cogitao, pesquisa e discusso, mas tracemos apenas rap id am en te o sign ificado dessa frase na B b lia . Primeiramente, a ira de Deus a sua reao pessoal frente a qualquer pecado, qualquer rebelio contra ele. E essa ira se demonstra da seguinte maneira: .

    Atualmente (Rm 1.18 at o fim do captulo) se demonstra em trs formas: a ira de Deus se revela contra toda a iniquidade (v. 18a); primeiro: entregando o homem s suas prprias paixes, permitindo que continue no seu pecado, que se escravize cada vez mais. Que palavras impressionantes: por isso Deus entregou tais homens im undcie, pelas concupiscncias de seus prprios coraes, para desonrarem os seus corpos entre si (v. 24). Continuando: por causa disso os entregou Deusa paixes infames (v. 26); e tambm outra vez no versculo 28 e, por haverem desprezado o conhecimento de Deus, o prprio Deus os entregou a uma disposio mental reprovvel. Na carne, na mente, e na adorao. A ira de Deus permite que o homem se escravize at no haver mais esperana; mas isso ainda no tudo. A ira de Deus no apenas para esta vida, mas se estende para a vida vindoura. E essa ira futura que cria o terror no corao humano ao defrontar-se com a morte; ela se descreve em Romanos 2, como uma ira que se acumula. Cada pecado, cada idia errada, cada rebelio contra Deus acumula-se no corao impenitente. Uma espcie de vaso de ira que cada dia vai se enchendo at transbordar e entrar no julgamento eterno de Deus. H passagens que falam sobre essa ira vindoura. Contra essa ira, e para se salvar e escapar dela, que o evangelho deve ser pregado no mundo inteiro. Porque os filhos de Deus aguardam dos cus (lTs 1.10) o seu Filho, a quem ele ressuscitou dentre os mortos, Jesus, que nos livra da ira vindoura.

    A ira de Deus descrita de uma m aneira emocional e sentimental na histria do filho prdigo. O filho prdigo fugindo de casa, procurando seus prprios prazeres, e escravizando-se neles

  • EPSTOLAS DA PRISO

    fica cada vez mais decado, cada vez mais desprezado pelos outros e por si mesmo, doente, com fome, quase nu, esperando a morte terrvel junto aos porcos, sozinho, na verdadeira misria. Mas longe, em casa, est o seu pai esperando. Podemos deparar aqui com uma descrio autntica da ira de Deus. uma ira cheia e transbordante de amor, mas que no pode atravessar aquela distncia at o filho amado, a no ser que o prprio filho amado caia em si (o que a Bblia chama de arrependimento). A ira de Deus sempre afasta, entrega, permite ao filho ir cada vez mais longe da casa paterna, enquanto espera, busca e ansiosamente aguarda o filho rebelde.

    A condenao do mundo, ento, trplice: uma condenao de morte, de decomposio e de incapacidade de se movimentar na direo de Deus. uma fila de escravos, andando segundo o curso deste mundo, debaixo do terrvel e cruel mandato de Satans, e ainda uma condenao inevitvel da separao do verdadeiro lar.

    Mas S e u s ... -O homem, filho da ira, fica realmente dominado por essa ira, afastado e longe de Deus. Nesta situao totalmente desesperadora que aparecem duas palavras em 2.4: as palavras Mas Deus. Deve-se sublinhar, deve-se marcar essas palavras, porque elas so a nica esperana de todos os pecadores deste mundo! Mas Deus introduz o amor e a m isericrdia de Deus frente ao homem perdido. Rapidamente, vejamos como esse amor se manifesta em compaixo m isericordiosa, perdoadora, ativa. Ele atua de trs formas; e lembremo-nos de que essas formas descrevem o poder supremo de Deus demonstrado na ressurreio de Cristo. Porque o mesmo poder que se ops s foras da m orte, no tm ulo de Jos de Arimatia, e ressuscitou Jesus dentre aqueles mortos, a mesma fora, diz Efsios, que transformar a situao do homem morto em delitos e pecados, escravizado s foras satnicas e condenado ira eterna. Essas trs formas so expressas por trs palavras, ou trs frases, nos versculos 5 e 6:

    Primeira: Nos deu vida juntamente com Cristo; no original, co-vitalizados (vitalizados com Cristo). Se ns em nossa morte nos reconhecermos como mortos, podemos nos aliar com o corpo inerte de Jesus no tmulo de Jos para sentirmos a mesma fora que levantou Jesus para novidade de vida. A nossa morte em pecado

  • E P S T O L A DE PAULO AOS E F S I O S

    cancelada pela mesma fora que cancelou o poder que deteve Jesus na pedra daquele tm ulo que abrigou o nosso Senhor crucificado.

    A segunda frase: juntamente com ele nos ressuscitou. Isto no significa apenas aquilo que aconteceu quando Jesus chamou Lzaro do seu tmulo, para que ele sasse, envolvido naquelas roupas, e vivesse mais algum tempo. No, este poder da ressurreio uma fora que transforma, do interior para fora, todo o nosso ser. Eu sou a mesma pessoa que era antes desta fora se aplicar na minha vida, mas tambm no sou a mesma pessoa. Quando Agostinho, depois de lutas difceis para vencer as foras e paixes da sua carne, estava sendo chamado por sua amante, do outro lado da rua, depois da sua converso: Vem Agostinho! Agostinho, aqui estou; ele disse: Mas eu no estou aqui! A fora da ressurreio to transformadora, que mudou at a prpria aparncia de Jesus. Os evangelhos nos informam que os discpulos no reconheceram Jesus. Maria, muito amiga de Jesus, pensou que ele fosse o jardineiro. Os dois discpulos que iam para Emas caminhavam como se estivessem com os olhos fechados, no percebendo quem ele era. Pode ser uma figura da transformao que o poder da ressurreio opera naquele velho corpo, escravo, miservel, filho da ira.

    A terceira frase, que descreve, tambm em forma figurada, a nossa possibilidade de vencer tudo nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus, no seu trono. Desse trono emana toda a fora que conquista o pecado, a morte a fora satnica, e a ira de Deus. Este poder est todo a a nosso alcance porque Cristo venceu todas essas foras escravizadoras. Ele foi identificado com o nosso pecado, sendo que Deus o fez pecado por ns (2Co 5.21). Ele morreu, quando ns j estvamos mortos. Ele foi feito filho da ira. Em Isaas 53.6, 10, 12, ele foi identificado com os transgressores mas, por ter vencido, oferece-nos participao em sua conquista. Por isso, Paulo pde afirm ar que somos mais que vencedores; e Romanos 8 descreve em forma potica, em xtase e empolgao, a natureza da nossa conquista sobre essas foras do mal que nos condenavam (Rm 8.37-39).

    FCabe aqui uma pergunta: e essa restaurao? Que acontece com o escravo? Com o corpo inerte? Com o filho da ira? Que acontece

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  • epstolas da priso

    dentro dele? Como ele se liberta? Como ele compartilha disso? Paulo usa a palavra que j conhecemos to bem, que em todo o Novo Testamento se refere a alcanar a mo de Deus, de apelar para ele, de invocar o seu nome: a palavra f. Porque pela f que recebemos to grande graa. F. John Wesley, que talvez tenha sentido bem mais do que ns o poder do pecado em sua vida, a fora da morte no seu ser, procurou por todos os meios encontrar a sada, mesmo depois de ser missionrio na Gergia; mas no encontrava a resposta. Como posso compartilhar dessa vitria? Como posso sentir a fora da ressurreio em minha vida? Como posso ter vida juntam ente com Cristo? E ningum conseguia explicar-lhe. Ele perambulava cada vez mais desesperado, sentindo que teria de deixar o ministrio (ele j era ordenado, servia e pregava, mas no sentia essa vitria). E um dia, num pequeno recinto na rua Aldersgate, em Londres, ouviu umas palavras de introduo de Romanos, escritas por Lutero, que diziam que a f a operao de Deus em ns. E ele sentiu, naquele instante: F Deus falando em mim, Deus apelando para si mesmo, atravs de mim. E Deus levantando a minha mo para receber aquilo que ele quer me dar. E naquele instante ele caiu de joelhos e empolgou toda aquela reunio com a declarao de que, agora sim, ele entendia o que era f!

    As palavras que seguem neste parg rafo de Efsios descrevem de uma forma to impressionante essa realidade: no por obras nossas! No h como o cadver se levantar, como os escravos cortarem as correntes, nem como o filho da ira se afastar dessa ira; mas Deus oferece a sua salvao to grande, de graa! Ele paga o preo integral dessa salvao para ns, inundando-nos com seu amor; sua compaixo nos envolve. E a resposta do corao humano no pode ser outra, seno: Obrigado, Senhor! E esse obrigado to simples a f. Atente para estas palavras: Porque pela graa sois salvos, mediante (a atuao humana) a f; e isto no vem de vs, dom de Deus. A palavra isto no se refere f, mas refere-se salvao, m isericrdia, a tudo que est envolvido nestas palavras: Mas Deus (v. 4).

    0 privilgio presenteO que significa essa nova situao em que nos encontramos, salvos em Cristo? O versculo 10 descreve com uma palavra o nosso novo privilgio. -a palavra feitura; no original: poema (de onde vem a

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  • EPSTOLA DE PAULO AOS EFSIOS

    nossa palavra poema, em portugus), ou obra de arte. Deus fez isto por causa do seu amor por ns. Mas ele tambm tem um plano, um projeto em que est trabalhando, de forma semelhante a um artista que est pintando um quadro e reflete nele algo da sua personalidade. A palavra poema me parece ter a idia de Deus tomando pecadores gentios perdidos e colocando-os na nova criao, a sua obra de arte: criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus de antemo preparou para que andssemos nelas. As boas obras que a igreja, como feitura de Cristo, precisa produzir, so a atuao de Cristo, atravs de nossos corpos, de nossas mentes, no mundo perdido. a atuao de algum que d testemunho de Cristo como, por exemplo, a atuao do mdico, no interessado no dinheiro, mas que por verdadeiro amor a Cristo, cuida de um pobre. As boas obras so sempre algo impulsionado e motivado pelo amor de Cristo. E agora hora de abrirmos nossa mente, como nunca antes em nossa vida, s possibilidades das boas obras, para que sejamos, aqui no Brasil e nos outros pases onde brasileiros venham a servir, a mais linda descrio da obra de Deus na sua feitura em Cristo.

    A feitura de DeusNos versculos 11 e 12 Paulo descreve no mais a nossa situao moral e espiritual, mas a nossa situao social e espiritual. Um gentio sem Deus, incircunciso, sem esperana, sem possibilidade nenhuma de fazer parte da nova humanidade em Cristo, mostra a condio dos pagos sem Deus. Novamente duas palavras, no versculo 13, chamam a nossa ateno: Mas agora, que correspondem ao Mas Deus, do, versculo 4. S que, agora, refere-se aos que esto em Cristo. Os que estavam longe so aproximados pelo sangue de Cristo, e nele temos paz; os alienados agora se amam; os que no tinham cidadania agora so cidados; os que eram bastardos e ilegtimos agora se tornam verdadeiros filhos de Deus; os que eram inimigos agora so reconciliados. E uma descrio da feitura de Deus: as duas sociedades, a gentlica e a judaica, estavam totalmente rompidas pela hostilidade e com as relaes em caos, por isso odiavam uns aos outros; e quando, na experincia de Paulo, especialmente na igreja de Antioquia, se viam judeus e gentios se abraando, comendo e contando piadas espirituais juntos, vivendo uma verdadeira vida familiar, na mais profunda

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    alegria, Paulo pensa: isto que Deus tem em vista para toda a e tern idade; para que nunca mais cor, raa, cu ltura, cabelo comprido ou curto, barba ou rosto barbeado, nada, nada mais crie barreiras entre os filhos de Deus; porque em um Esprito, o Esprito de amor, o Esprito de alegria, o Esprito de bondade e perdo est sendo criada uma cidadania, uma famlia, uma igreja, um templo, uma unidade que descreve perfeitamente a integridade da prpria personalidade de Jesus Cristo. Porque a igreja local a universal, j que microcosmo da outra, no podem ser outra coisa seno um edifcio bem ajustado, que est crescendo dinamicamente. E este amor que temos uns pelos outros se estende, transborda para o mundo, porque Cristo o amou primeiro. As boas obras se estendem para ele e crescem para um santurio dedicado ao Senhor, que significa, para mim, um lugar de perfeita paz, onde meu destino e as agitaes da minha vida desaparecem completamente, e a minha alma descansa tal como numa grande catedral, onde h um perfeito silncio. Estou rodeado pelos meus irmos e amigos e, acima de tudo, sentindo a presena da cabea, que Jesus Cristo, Senhor de todas as coisas. Tal como a pirmide em que o pice determina a forma de tudo, assim tambm Cristo, a pedra angular, d igreja toda a sua forma e destino. Os apstolos e profetas, especialm ente os escritores dos livros do Novo Testamento, criaram o fundamento da igreja atravs de ensinamentos pelo Esprito Santo.

    No fim (v. 22) Deus habita no meio do seu povo Emanuel. E por isso que Deus nos salvou de to grande runa. Por isso perigoso negligenciar to grande salvao. E por isso tambm que a ira de Deus recai no apenas sobre o mundo, mas sobre a igreja de Cristo que se afasta de to grande meta. Ela deve realmente refletir a misericrdia e o amor de Deus, na sua feitura perfeita e no seu poema como obra de arte do grande Deus Criador.

    0 grande mistrio da salvao (3 .1-13 )Por esta causa eu, Paulo, o prisioneiro de Cristo

    Jesus, por amor de vs, gentios, 2se que tendes ouvido a respeito da dispensao da graa de Deus a mim confiada para vs outros; 3pois segundo uma revelao me foi dado conhecer o mistrio conforme escrevi h pouco, resumidamente, 4pelo qual, quando lerdes, podeis

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    compreender o meu discernimento no mistrio de Cristo,5o qual em outras geraes no foi dado a conhecer aos filhos dos homens, como agora foi revelado aos seus santos apstolos e profetas, no Esprito, 6a saber, que os gentios so co-herdeiros, membros do mesmo corpo e co-participantes da promessa em Cristo Jesus por meio do evangelho, 7do qual fui constitudo ministro conforme o dom da graa de Deus, a mim concedida, segundo a fora operante do seu poder. 8A mim, o menor de todos os santos, me foi dada esta graa de pregar aos gentios o evangelho das insondveis riquezas de Cristo, e 9manifestar qual seja a dispensao do mistrio, desde os sculos oculto em Deus, que criou todas as coisas, I0para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida agora dos principados e potestades nos lugares celestiais, segundo o eterno propsito que estabeleceu em Cristo Jesus nosso Senhor, 12pela qual temos ousadia e acesso com confiana, mediante a f nele. I3Portanto vos peo que no desfaleais nas minhas tribulaes por vs, pois nisso est a vossa glria.

    Por esta causaQuando encontrarmos uma frase como essa que inicia o captulo 3, Por esta causa, devemos procurar saber que causa leva Paulo a orar, porque essa frase introduz a orao do v. 14 at o fim do captulo. Antes, nos versculos 1-13, Paulo abre um parntese bem comprido. Esta causa, na mente do apstolo, encontra-se nos versculos 20 a 22 do captulo anterior: os gentios esto sendo edificados sobre o fundamento dos apstolos e profetas. E Paulo, tendo sido chamado por Jesus Cristo para ser apstolo, sente-se justamente como aquelas pedras colocadas sobre a pedra fundamental, constituindo a primeira fileira do alicerce da casa, dando assim a sua prpria forma. uma responsabilidade acima de qualquer outra dada aos homens. Cristo mesmo o nico fundamento do evangelho e da igreja; mas em cima deste fundamento, segundo ICorntios 3.10-11, esto colocados os profetas e apstolos. So aqueles que, pela inspirao de Deus e por sua direo imediata, deram forma igreja: sua doutrina, sua estrutura, seus alvos (que estamos estudando nesta epstola). Essa forma nos foi preservada

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  • E P S T O L A S DA P R I S O

    na palavra dos apstolos nas epstolas e nos evangelhos, canonizados no Novo Testamento.

    Pedras que se sustentam em sofrimentoPor esta causa eu, Paulo, sou o prisioneiro de Cristo Jesus, por amor de vs, gentios. De uma coisa devemos nos lembrar: somos chamados para ser fundamento de outras pessoas, que vo ser construdas por cima de ns. Paulo est l em baixo, mas ns estamos aqui em cima; o prdio est subindo, e assim como ns dependemos de Paulo, colocado por Deus em baixo como nosso fundamento, h outras pessoas que esto dependendo e iro depender de ns; as pedras vivas (lPe 2.4) se assentam sobre outras pedras vivas. Na minha vida tenho por fundamento principalmente os meus pais, o pastor Joseph McCall da Igreja da Bblia de W heaton e outras pessoas que logo me vm mente. So como pedras que me sustentam , por assim dizer. Portanto, sustentam os outras pessoas que esto olhando para ns e que dependem da nossa f tambm. Contudo, essa situao de sustentar outras pessoas, o privilgio do ministrio que Paulo vai agora descrever (note-se que ele usa a palavra graa, bsica e essencial, como o que lhe d o privilgio de sustentar outras pessoas) sempre produz sofrimento: eu, Paulo, sou o prisioneiro de Cristo Jesus. Se algum pensa que o ministrio no ter sofrimento, que o chamado de Cristo para uma vida sem aflio, est, j de incio, totalmente enganado. Paulo diz em Colossenses 1.24 que h um sofrimento alegre, isto , um sofrimento que d prazer sem ser masoquista: Agora me regozijo nos meus sofrimentos por vs; so crentes que esto sendo sustentados na vida, na intercesso, no ministrio de ensino do apstolo Paulo, e que preenchem o que resta das aflies de Cristo, a favor do seu corpo, que a igreja. Se voc for chamado para o ministrio de servir a outros, a diaconia do evangelho (palavra que Paulo usa no v. 7), prepare-se, desde j, pois haver sofrimento alegre em sua vida; um sofrimento agradvel. Talvez poderiamos compar-lo, em outro nvel, ao sofrimento do capitalista que gasta tudo quanto tem no bolso para ganhar trs vezes mais no ano seguinte. esse sofrimento, o de investir tudo o que a pessoa tem, esperando receber muito mais, no sentido de realizao espiritual. E por isso que Paulo chama este privilgio de graa. Graa sempre carrega essa idia fundamental, no Novo Testamento, de

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  • EPSTOLA DE PAULO AOS EFSIOS

    um favor alegre, de uma pessoa alcanando e dando para outra pessoa.

    A dispensao da graa de DeusO versculo 2 enfatiza: Se que tendes ouvido a respeito da dispensao. Dispensao tem a ver com o cuidar das riquezas da casa, ter a chave do cofre. Paulo recebera do Senhor o privilgio de distribuir as riquezas de Deus para estes crentes da sia e, sem dvida, de outras partes. Isto graa, ter sido honrado com as chaves de toda a Casa do Senhor. A exemplo de Pedro, Paulo tambm as recebeu, e ele chama isso de graa, graa que inunda o corao do apstolo com profunda alegria. Esta graa focaliza o ministrio. Se olharmos para 4.7, encontraremos repetida a mesma palavra: e a graa foi concedida a cada um, no apenas aos apstolos e profetas que formaram a primeira fileira de pedras da Casa do Senhor, mas a todas as pedras vivas que edificam essa Casa. Todos ns temos o privilgio da dispensao, o privilgio de sermos transmissores da riqueza e da glria do Senhor; e Paulo reconhece que essa graa foi, no seu caso, uma graa pioneira. Ele est frente da longa fila de santos que tm edifcado a Casa do Senhor. As outras geraes anteriores, ainda que tenham conhecido Isaas, Malaquias, Osias, Zacarias e outros profetas que, como Davi, compreenderam a mentalidade de Deus, no tiveram a revelao do seu plano para o universo. A Paulo, porm, o plano foi revelado. Em outras geraes (v. 5) no foi dado a conhecer to grande mistrio, que permaneceu em segredo no corao de Deus, mas que agora foi revelado ao apstolo Paulo. E ele, como pioneiro, com trs palavras vem agora desvendar o maravilhoso projeto que Deus tem para este mundo (v. 6).

    Co-herdeirosA primeira declarao, que os gentios (ns, antigos pagos em 2.1-10) agora so co-herdeiros com Abrao, Isaque, Jac, Gideo, Jos e todos os santos do Antigo Testamento. Estamos includos plenamente no povo de Deus, ao qual pertencem aqueles santos, que esto gozando a sua herana como heris na presena do Senhor. Somos co-herdeiros de toda a herana da cidade celestial que Abrao e Moiss procuravam, sendo que eles tambm foram chamados para fora dos seus lares para sofrer (Hebreus 11:8-27).

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  • e p s t o l a s da p r i s o

    Co-mcorporadosA segunda palavra que descreve esse mistrio a participao dentro do mesmo corpo como membros. serem co-incorporados, isto , sentirem a fora vital do corpo de Cristo que os santos do passado sentiram; mas no como agora, em que o Esprito de Deus, atravs de uma clula para outra, passou a expandir e espalhar a vitalidade de Cristo. Porm, de uma pessoa para outra foi se espalhando por todo o imprio at os confins do mundo. Co-incorporados deve ser uma palavra que Paulo criou para transmitir este relacionamento espiritual entre todas as geraes e indivduos, dentro do povo salvo por Deus.

    Co-participantesE, finalmente, a terceira frase: co-participantes dapromessa em Cristo. Significa que os gentios, que antes no tinham a Bblia nem os orculos de Deus, ficaram, assim, sem Cristo, o M ediador das promessas de Deus. Agora nos concedida de graa a Palavra de Deus e por meio dela, Cristo, a sua Promessa. E ns, que abrimos as Escrituras com toda a liberdade e assentamos nossa f nesta Palavra, somos co-participantes de Cristo, juntamente com todos os benefcios por ele concedidos, agora e eternamente.

    0 mistrio sendo reveladoEste o mistrio de Cristo, que Paulo, como missionrio pioneiro aos gentios, teve o privilgio dado por Deus de divulgar, passando a ser m inistro ou dicono (isto , segundo a idia original de diaconia: aquele que entra na cozinha e recebe os pratos j preparados e os oferece para os famintos; o garom de Deus). A diaconia descreve perfeitamente o prprio ministrio de Cristo, que tambm usou essas palavras em Marcos 10.45, dizendo que Cristo no veio para ser servido, mas para servir. Porm o que mais me impressiona, em todo este trecho, como Paulo se sentiu honrado. Veja o v. 8, onde ele avalia a sua prpria capacidade de tomar parte em to grande ministrio. Parafraseando: Olhem, eu sou o menor de todos os santos (se ele foi o menor, onde que eu me encontro?), para que, atravs dessa mordomia, no somente o mundo, mas as foras que esto acima do mundo, que so os

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  • E P S T O L A DE P A U LO AOS E F S i O S

    principados e potestades nos lugares celestiais, possam, desvendados no ministrio de Paulo, perceber as igrejas que esto surgindo. Novos convertidos sendo libertados daquela escravatura, da morte e da ira de Deus que est sobre o mundo, aparecendo em toda parte como luzes nas trevas, tornam a nova criao de Deus uma realidade. E isto deve maravilhar os prprios inimigos de Deus, j que antes eles no estavam entendendo o que Deus tinha em mente (esses principados e potestades em 6.12 so descritos como as foras, sujeitas a Satans, que se nos opem).

    9 sofrimento no corpo de CristoEsta luta entre Deus e as foras do mal se trava no cotao da igreja. Este conflito, que se centraliza na vida de cada um de ns hoje, at Cristo voltar, produz sofrimento. Por isso Paulo abre, no final do v. 13, o grande parntese de Efsios: Portanto, vos peo que no desfaleais nas minhas tribulaes por vs, pois nisso est a vossa glria.

    Paulo faz parte do corpo de Cristo que se estende de Roma at a sia. Os sofrimentos de Paulo so os sofrimentos daqueles cristos; sua priso em Roma a priso deles; tudo que acontece a Paulo est acontecendo com todo o corpo, j que uma parte no pode sofrer sozinha Pensemos um instante em nossos irmos que sofrem perseguio por causa do evangelho em pases onde o cristianismo proibido. Meus irmos, mesmo que no soubssemos o que eles esto passando hoje em termos de sofrimento, eles esto sofrendo por ns, e um dia possvel que sejamos chamados a sofrer por outros crentes, antes que Cristo volte. Porque o corpo de Cristo uma realidade nesse sentido; portanto, devemos nos dedicar intercesso por aqueles irmos. A experincia dos que visitam os crentes presos, sofrendo e sendo torturados em outros pases confirma que o que mais os anima saber que ns estamos pensando neles, sentindo os seus sofrimentos e intercedendo sempre, para que o alvio e o conforto do Esprito Santo lhes sejam sempre concedidos.

    Por esta causa, no v. 14, retoma agora a razo que Paulo menciona no v. 1: Por esta causa, me ponho de joelhos. No necessrio orar de joelhos, mas o colocar-se de joelhos um sinal de submisso. E Paulo expressou-se dessa maneira para mostrar a sua plena disposio para sofrer mais ou para ser libertado, usado pelo Esprito na intercesso, como veremos agora nos versculos 14-21.

  • E P S T O L A S DA P R I S O

    A segunda orao na epstola (3 .14 -2 1)14Por esta causa me ponho de joelhos diante do

    Pai, 15de quem toma o nome toda famlia, tanto no cu como sobre a terra, 16para que, segundo a riqueza da sua glria, vos conceda que sej ais fortalecidos com poder, mediante o seu Esprito no homem interior; 17e assim habite Cristo nos vossos coraes, pela f, estando vs arraigados e alicerados em amor, 18a fim de poderdes compreender, com todos os santos, qual a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade, 19e conhecer o amor de Cristo que excede todo o entendimento, para que sejais tomados de toda a plenitude de Deus. 20Ora, quele que poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos, ou pensamos, conforme o seu poder que opera em ns, 21a ele seja a glria, na igreja e em Cristo Jesus, por todas as geraes, para todo o sempre. Amm.

    A paternidade de DeusRecordemos, inicialmente, por que que Paulo ora, e veremos que o peso da responsabilidade. M uitas pessoas estavam sendo edificadas sobre Paulo, e ele sentia esse peso, tal como os profetas do Antigo Testamento sentiram o peso da Palavra do Senhor. Ele sentia a necessidade da orao e da intercesso por estes novos cristos. A est a causa.

    Paulo dirige sua orao ao Pai. Por que ao Pai, em vez de a Deus? Talvez porque, l na priso, Paulo estivesse pensando em si como, de certa forma, o pai espiritual daqueles crentes, atravs dos seus discpulos que evangelizaram aquela regio; ao mesmo tempo, ele est pensando: Eles so novos filhos do Pai, de Deus! E Paulo precisa dar-lhes a entender a natureza da famlia, da responsabilidade, dos costumes da famlia, da sua unidade na famlia de Deus. Ento escreve uma frase interessante de quem toma o nom e.... Isto significa que a paternidade de Deus arque- tpica, no havendo nada neste mundo que no tenha a sua origem em Deus, da seguinte forma: Quando pensamos em Deus como pedra (SI 18.2 e 42.9), a idia arquetpica original de pedra Deus como imutvel, seguro e estvel. Quando pensamos em luz, a idia

  • EPSTOLA DE PAULO AOS EFSIOS

    original de luz Deus como perfeito, em quem no h mal nem trevas; e quando falamos em relacionamento humano, pensamos em Deus como Pai, aquele de quem toda a vida emana, em quem todas as caractersticas de Pai se devem desenvolver. O conceito da imagem de Deus veio de onde? Parece-me que veio de Deus como Pai. E Paulo explica este conceito, assim rapidamente, quando diz que toda idia de paternidade se manifesta, tanto no cu como na terra, refletindo a figura original da paternidade de Deus.

    Os recursos ila oraoDe onde que Deus vai responder? Veja-se a frase do v. 16: segundo a riqueza da sua glria. A palavra glria, no original hebraico, significa riqueza (kavod), valores incontveis que no podem ser esgotados. H sempre mais! como aqueles celeiros de Jos no prim eiro ano da fome: H muito mais! Leva quanto quiser! (porm, no fim dos sete anos seria diferente). Mas aqui, segundo a riqueza inexaurvel das riquezas de Deus, nossa orao sempre que Deus abra os seus celeiros de bnos. E qual a bno que Paulo pede? Novamente encontramos um pedido bsico e fundamental. Na orao do captulo 1 Paulo pedira o Esprito de sabedoria e de revelao; em outras palavras, viso. Nesta orao, Paulo pede poder (dunamis), que Deus conceda seu infinito estoque de poder, que sejam fortalecidos com dunamis. Essa foi a palavra que Jesus usou, ao prometer poder (At 1.8), e foi uma realidade para os crentes no dia de Pentecostes, quando o Esprito caiu sobre eles e ficaram plenos (cheios) de dunamis, para poderem enfrentar toda fora do mal, de incredulidade e de conflito que possivelmente encontrariam.

    Dominados para dominarVamos nos delongar um pouco na palavra fortalecidos (v. 16). Esta palavra est no passivo. Notemos que no nos fortalecemos a ns mesmos, mas temos que ser fortalecidos. O sentido da palavra no original vem do mesmo vocbulo de onde temos a palavra democracia kratose krateus com a idia de domnio. Traduzindo talvez um pouco melhor, teramos: que sejamos dominados para poder dominar. E interessante o pedido fundamental e bsico desta orao: dominados pela fora de Deus para que possamos dominar

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  • E P S T O L A S DA P R I S O

    ou conquistar, no seu dunamis. Notemos que a fonte deste poder, tal como em Atos 1.8, sempre o Esprito. E onde que este fortalecimento ocorre? E no homem interior! Em 2Corntios 4.16, Paulo fala que o homem exterior, aquele que vemos com os olhos e que pesa tantos quilos, que precisa dormir de noite, que precisa com er para sobreviver, est desfalecendo, desaparecendo e morrendo; mas o homem interior est se renovando cada dia. Que palavras impressionantes! O hom