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UNISALESIANO Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium Curso de Direito Éderson Cristiano Aragão dos Santos DIREITO PENAL DO INIMIGO evolução ou retrocesso? LINS SP 2015

UNISALESIANO Centro Universitário Católico Salesiano ... · 4 PRINCIPIOS LIMITADORES DO PODER PUNITIVO ESTATAL ... infrações nas quais têm-se ... sendo incorporado em várias

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UNISALESIANO Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium

Curso de Direito

Éderson Cristiano Aragão dos Santos

DIREITO PENAL DO INIMIGO

evolução ou retrocesso?

LINS – SP 2015

ÉDERSON CRISTIANO ARAGÃO DOS SANTOS

DIREITO PENAL DO INIMIGO – EVOLUÇÃO OU RETROCESSO?

Monografia apresentada à Banca Examinadora do Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium, como requisito parcial para a Obtenção do Título de Bacharel em Direito sob orientação do Professor Me. Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira

LINS – SP 2015

Santos, Éderson Cristiano Aragão dos Direito penal do inimigo: evolução ou retrocesso? / Éderson Cristiano Aragão dos Santos. – – Lins, 2015. 81p. il. 31cm.

Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico

Salesiano Auxilium – UNISALESIANO, Lins-SP, para graduação em Direito, 2015.

Orientador: Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira;

1. Direito Penal. 2. Direitos Humanos. 3. Direito Penal do Inimigo. I Título.

CDU 34

S234d

ÉDERSON CRISTIANO ARAGÃO DOS SANTOS

DIREITO PENAL DO INIMIGO – EVOLUÇÃO OU RETROCESSO?

Monografia apresentada à Banca Examinadora do Centro Universitário Católico

Salesiano Auxilium, para obtenção do título de Bacharel em Direito.

Data de aprovação: ___/___/____

MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA:

Prof. Orientador: Me. Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira Titulação: Mestre em Direito pela Instituição Toledo de Ensino de Bauru/SP

Assinatura: _________________________________

Prof. Me. Osvaldo Moura Júnior Titulação:_______________________________________________________

_______________________________________________________________

Assinatura: _________________________________

Prof. Me. Raphael Hernandes Parra Filho Titulação:_______________________________________________________

_______________________________________________________________

Assinatura: _________________________________

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a Deus, por ter me capacitado e mesmo com

minhas falhas foi fiel, por amor de seu filho Jesus Cristo e pela Sua infinita

misericórdia, dando-me oportunidade de ser paciente, perseverante e

especialmente por ter acreditado em mim (por intermédio de minha família),

dando-me confiança e coragem para enfrentar as dificuldades e força para

alcançar o alvo e que Deus jamais me deixe esquecer um dos grandes

objetivos de ter escolhido fazer outra faculdade, que é o de poder ajudar o

próximo com o meu conhecimento adquirido e que tudo seja para Tua Honra e

Glória.

“Uma visão sem ação não passa de um sonho.

Ação sem visão é só um passatempo.

Mas uma visão com ação pode mudar o mundo”.

Joel Barker

AGRADECIMENTOS

Agradeço a DEUS por tudo o que Ele tem feito, fez e o irá fazer por mim. Pelo

Teu amor que me capacita e habilita para todo trabalho... “Para aprender a

sabedoria e o ensino; para entender as palavras de inteligência; para obter o

ensino do bom proceder, a justiça, o juízo; para dar aos simples prudência e

aos jovens, conhecimento e bom siso; ouça o sábio e cresça em prudência; e o

instruído adquira habilidade... Porque o Senhor da a sabedoria e da sua boca

vem à inteligência e o entendimento”. (Provérbios 1: 1-5; 2:6)

Agradeço também a toda a FAMÍLIA (em especial a minha Esposa, filho

e meu pai) e AMIGOS, sou realmente grato pela paciência extraordinária e pela

bondade demonstrada mais nessa etapa da minha vida.

Desejo também agradecer aos MESTRES e ORIENTADORES, em

especial ao professor Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira, com participação

fundamental nos resultados obtidos.

Agradeço a todos que direta ou indiretamente me apoiou e

contribuiu para o desenvolvimento deste trabalho.

“Se me perguntares o segredo do sucesso, não sabereis responder, porém o

segredo do fracasso é achar que posso agradar todo mundo”. (John Kennedy)

“Sonhos determinam o que você quer. Ação determina o que você conquista”.

(Aldo Novak)

“Quem não compreende um olhar tampouco compreenderá uma longa

explicação” (Mário Quintana)

“Tudo posso naquele que me fortalece”. (Filipenses 4:13)

DEUS os abençoe ricamente!

RESUMO

A presente pesquisa busca investigar o instituto denominado “Direito Penal do Inimigo”. Para isso, serve-se o presente estudo da análise inicial a respeito do Direito Penal e sua aplicação no mundo fático e de direito e, também, algumas considerações importantes acerca dos Direitos Humanos. Aborda questões estudadas a respeito da apenação de condutas humanas em sociedade, para que com isso se possa chegar a um fio condutor da teoria proposta por Gunther Jakobs, a respeito do Direito Penal do Inimigo. Segundo essa teoria o inimigo é o cometedor de crime não apenas contra um cidadão comum, no dia-a-dia da vida em sociedade, mas aquele que o comete contra o Estado. Para tanto, analisam-se princípios norteadores do Direito Penal e aspectos históricos do Direito Penal, assim como as garantias e direitos fundamentais do cidadão previstos na Constituição Federal.

Palavras Chave: Direito Penal, Direitos Humanos, Direito Penal do Inimigo.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................... 8

CAPÍTULO I – EVOLUÇÃO, FUNDAMENTOS E PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL .............................................................................................................. 11

1 BREVE EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL ................................................... 11

1.1 Fases da vingança penal ............................................................................ 11

1.2 Período humanitário – os reformadores ...................................................... 14

2 ASPECTOS HISTÓRICOS DO DIREITO PENAL NO BRASIL ...................... 15

2.1 Reformas contemporâneas ......................................................................... 18

3 FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL ......................................................... 19

3.1 Considerações introdutórias ....................................................................... 19

3.2 Correntes do pensamento positivista .......................................................... 20

3.2.1 Escola clássica ........................................................................................ 21

3.2.2 Escola positiva ......................................................................................... 22

3.2.3 Escolas mistas e tendências contemporâneas ........................................ 24

3.2.4 Escola técnico-jurídica ............................................................................. 25

3.2.5 Crise do pensamento positivista .............................................................. 26

4 PRINCIPIOS LIMITADORES DO PODER PUNITIVO ESTATAL .................. 26

4.1 Considerações introdutórias ....................................................................... 26

4.2 Princípio da legalidade ................................................................................ 27

4.3 Princípio da intervenção mínima ................................................................. 28

4.4 Princípio de culpabilidade ........................................................................... 28

4.5 Princípio da proporcionalidade .................................................................... 30

4.6 Princípio da presunção da inocência .......................................................... 31

CAPÍTULO II – DIREITOS HUMANOS ............................................................. 34

1 CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS ......................................................... 34

1.1 Antecedentes históricos da proteção aos direitos humanos ....................... 36

2 FUNDAMENTO DOS DIREITOS HUMANOS ................................................ 41

3 DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS...................................................... 42

3.1 Direitos humanos e direitos fundamentais .................................................. 44

3.2 Direitos fundamentais e suas dimensões ................................................... 46

3.2.1 Direitos fundamentais de primeira dimensão ........................................... 47

3.2.2 Direitos fundamentais de segunda dimensão .......................................... 48

3.2.3 Direitos fundamentais de terceira dimensão ............................................ 49

4 DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS ........................... 51

CAPÍTULO III - DIREITO PENAL DO INIMIGO ................................................ 53

1 CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS ......................................................... 53

1.1 Alguns fundamentos filosóficos ................................................................... 55

1.2 A expansão penal – Direito Penal simbólico e punitivismo ......................... 55

1.3 Garantismo penal versus Direito Penal do Inimigo ..................................... 59

2 DIREITO PENAL DO CIDADÃO X DIREITO PENAL DO INIMIGO ............... 61

3 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO DIREITO PENAL DO INIMIGO ........ 63

3.2 A punição de atos preparatórios e os tipos de mera conduta ..................... 65

3.3 Os tipos de perigo abstrato ......................................................................... 66

3.4 Previsão de penas abstratas mais altas ..................................................... 66

3.5 A relativização ou exclusão das garantias penais e processuais ................ 67

4 A DOUTRINA QUE DEFENDE E CRITICA O DIREITO PENAL DO

INIMIGO ............................................................................................................ 68

5 ANÁLISE HISTÓRICA DO DIREITO PENAL DO INIMIGO NO BRASIL ....... 71

6 APLICAÇÕES PRÁTICAS DO DIREITO PENAL DO INIMIGO NO BRASIL . 72

6.1 Regime disciplinar diferenciado .................................................................. 72

6.2 Lei dos Crimes Hediondos .......................................................................... 75

6.3 Lei de drogas .............................................................................................. 77

6.4 Lei do abate de aeronaves.......................................................................... 79

6.5 Lei do Crime Organizado ............................................................................ 80

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 82

REFERÊNCIAS ................................................................................................ 85

INTRODUÇÃO

Sem dúvida alguma a questão da existência do direito na sociedade,

como forma de controle organizado do povo, é uma condição sem a qual não

haveria possibilidade de convivência de forma harmônica. Esse controle

jurídico está e sempre esteve intrinsecamente ligado à questão dos princípios

morais e éticos e também relacionado às propriedades e bens materiais em

geral. E ao bem maior que é a vida.

A questão da criminalização de atos considerados faltosos pela

sociedade é uma das formas de combater os desvios, dos mais variados feitos,

como o roubo, o assassinato, o furto, dentre outros.

Nesse sentido, as condutas humanas que geram repulsa social são

sancionadas de diversas formas, por meio da imposição de penas pecuniárias,

restrições de direitos, obrigações de fazer, restrições à liberdade, dentre outras.

O Direito Penal, por ser regido, também, pelo princípio da intervenção mínima,

tutela apenas uma parte das condutas ocorridas no mundo dos fatos. Somente

as condutas humanas que sejam mais reprováveis e as que geram maior

repulsa social deveriam ser criminalizadas.

O Direito Penal é medida extrema de manutenção da ordem e de

pacificação social, sendo reflexo da moral de um povo.

O Direito Penal foi se expandido, e novos delitos foram surgindo. Com o

passar do tempo as penas também se tornaram, aparentemente, mais leves,

aparecendo alternativas que não a restrição da liberdade. Surgiram duas

situações: de um lado, admitir as penas não privativas de liberdade para as

infrações nas quais têm-se flexibilizado os pressupostos de atribuição de

responsabilidade e, de outro lado, exigir onde se impõem penas de prisão, e

especialmente, penas de larga duração, que se mantenha todo o rigor dos

pressupostos clássicos de imputação de responsabilidade.

Com a evolução da sociedade, as formas e meios de se praticar os

delitos também evoluíram e vivemos a era das organizações criminosas.

Sendo assim, aumenta-se o sentimento de insegurança social, exigindo-

se do Direito Penal uma maior intervenção.

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Com o aumento do crime organizado, encurralando os cidadãos de bem,

em suas próprias residências, e ainda, imersos em uma crise de valores,

impedindo-o de encontrar o quê e a quem seguir, o Direito Penal do Inimigo

ganha força, sendo incorporado em várias legislações com o fim de punir

determinados tipos de criminosos no intuito de diminuir a prática desses delitos.

Dessa forma, o estudo que ora se apresenta tem o condão de analisar

do ponto de vista jurídico doutrinário as concepções acerca do instituto do

Direito Penal do Inimigo, o qual deve ser amparado pela Constituição Federal,

respeitados os ditames legais acerca da dignidade da pessoa humana.

O Direito Penal do Inimigo é uma manifestação moderna do Direito

Penal do Autor, que nada mais é que ser julgado pelo que ele é e não pelo o

que ele fez. Diferente do Direito Penal brasileiro que pune alguém em vista do

fato praticado, ele condena a simples manifestação de pensamento ou

cogitação do crime, ou seja, pune alguém em função de quem ele é.

Direito Penal do Inimigo é uma teoria, que vem se disseminando pelo

mundo e conquistando adeptos, embora tenha surgido na Alemanha. É

defendida por Gunther Jakobs desde 1985 e ganhou adeptos na Europa, em

especial na Espanha e Portugal, além da América do Sul.

Jakobs defende nesta teoria a necessidade de separar os delinquentes

em duas categorias ou grupos: a dos que ainda podem se recuperar e a dos

que se tornaram inimigos do Estado.

O Direito Penal do Inimigo é visto por muitos como uma ótima resposta

para crimes graves, de extremo perigo que envolve grande número de

pessoas, principalmente por quem já esteve sob ameaças de um criminoso no

nível de Inimigo do Estado. Porém, outros muitos, acreditam que por mais que

sofra com a violência, a sociedade não está preparada para julgar com a

precisão necessária para reprimir de forma tão severa pessoas que, apesar de

perigosas, possuem seus direitos fundamentais assegurados como qualquer

outra.

Devido à relevância das questões penais, foi escolhido este tema para o

desenvolvimento da pesquisa, cujo objetivo principal é analisar como a

aplicabilidade do Direito Penal do Inimigo pode combater a criminalidade e as

possíveis divergências com os Direitos Humanos, dando ênfase às possíveis

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vantagens e desvantagens da aplicabilidade do Direito Penal do Inimigo no

Brasil e o possível conflito com os direitos e garantias fundamentais.

Diante dos levantamentos desenvolvidos, surgiram as seguintes

questões: O Direito Penal do Inimigo é evolução ou retrocesso frente os

Direitos Humanos? Em um Estado Democrático de Direito existe a

aplicabilidade do Direito Penal do Inimigo?

Para comprovação desse pressuposto, foi desenvolvido o método de

pesquisa por revisão bibliográfica da literatura referente a este tema,

acompanhando as legislações vigentes.

Este trabalho está dividido em três capítulos: o capitulo I trata da

evolução, fundamentos e princípios do Direito Penal; o capitulo II trata dos

Direitos Humanos e o capitulo III trata do Direito Penal do Inimigo.

Por fim, serão apresentadas as considerações finais.

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CAPÍTULO I – EVOLUÇÃO, FUNDAMENTOS E PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL

1 BREVE EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL

A história da humanidade está vinculada ao Direito Penal, pois desde o

princípio o crime vem acontecendo. Era necessário um ordenamento coercitivo

que garantisse a paz e a tranquilidade para a convivência harmoniosa nas

sociedades, ou seja, a história do Direito Penal surgiu com o próprio homem,

mesmo sem uma sistematização de princípios penais nos tempos primitivos.

A história do Direito Penal abrange a análise do direito repressivo de

outros períodos da civilização. No entendimento de Bitencourt:

É inquestionável a importância dos estudos da história do Direito Penal, permitindo e facilitando um melhor conhecimento do Direito vigente. [...] a conotação que o Direito Penal assume, em determinado momento, somente será bem entendida quando tiver como referência seus antecedentes históricos (2012, p.60).

1.1 Fases da vingança penal

A vingança penal se divide em fases, no entanto, com caráter didático;

não é possível delimitar com exatidão a partir de que momento cada uma das

fases passou a vigorar. Nas palavras de Bitencourt, “não se trata de uma

progressão sistemática, com princípios, períodos e épocas caracterizadores de

cada um de seus estágios” (2012, p.60).

Tem-se adotado tríplice divisão, qual seja: vingança privada, vingança

divina e vingança pública que, “todas elas sempre profundamente marcadas

por forte sentimento religioso/ espiritual” (BITENCOURT, 2012, p.60).

No mesmo sentido, Mirabete e Fabrini (2010, p.15) lecionam:

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Várias foram as fases de evolução da vingança penal, etapas essas que não se sucederam sistematicamente, com épocas de transição e adoção de princípios diversos, normalmente envolvidos em sentido religioso. Para facilitar a exposição, pode-se aceitar a divisão estabelecida por Noronha, que distingue as fases da vingança privada, vingança divina e vingança pública.

Na fase da vingança divina, os grupos sociais eram envolvidos em

ambientes mágico e religioso, assolados por pestes, secas e, ainda, desastres

naturais, que para eles, eram como castigos das forças divinas, e para

minimizarem a ira dos deuses, criaram proibições que, quando não cumpridas,

acarretavam castigo.

Desta forma, nas sociedades primitivas a fúria da natureza significava

manifestações divinas revoltadas com a prática de delitos e que exigiam

reparação.

Era o Direito Penal regrado pelos sacerdotes com fundamento

teocrático; o Direito se confundia com a religião. O crime era visto como um

pecado, atingindo um deus. A pena era um castigo divino para a purificação e

salvação da alma infratora. As penas eram cruéis e severas.

Em conformidade com os ensinamentos de Mirabete e Fabrini, acerca

da fase da vingança divina:

deve-se à influência decisiva da religião na vida dos povos antigos. O Direito Penal impregnou-se de sentido místico desde seus primórdios, já que se devia reprimir o crime como satisfação aos deuses pela ofensa praticada no grupo social. O castigo, ou oferenda, por delegação divina era aplicado pelos sacerdotes que infligiam penas severas, cruéis de desumanas, visando especialmente à intimidação (2010, p.16).

As legislações típicas dessa fase são o Código de Manu e o Código de

Hamurábi, que foram adotados na Babilônia, no Egito (Cinco Livros), na China

(Livros das Cinco Penas), na Pérsia (Avesta) e os Hebreus (Pentateuco).

Para conter a ira dos deuses, criaram-se proibições (religiosas, sociais e

políticas) conhecidas por „tabus‟, que, não obedecidas, acarretavam castigos,

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que invariavelmente envolviam a própria vida do transgressor ou oferecimento

de objetos valiosos ao respectivo deus.

Em suma, a pena, em seus primórdios, representava simplesmente a

reação sofrida pela coletividade, totalmente desproporcional, sem se preocupar

com algum conteúdo de justiça.

A vingança privada foi uma evolução da vingança divina, “que poderia

envolver desde o indivíduo isoladamente até o seu grupo social, com

sangrentas batalhas, causando, muitas vezes a eliminação de grupos”

(BITENCOURT, 2012, p. 61).

Quando ocorria um crime a reação a ele era imediata, pela própria

vítima, seus familiares ou sua tribo. Normalmente essa reação não era

proporcional à agressão. Quando o transgressor era membro da tribo, este

poderia ser banido e ficar à disposição de outras tribos, que poderiam até

matá-lo. No entanto, quando a violação era praticada por elemento que não

pertencia à tribo ocorria à chamada “vingança de sangue”, que era

“considerada como obrigação religiosa e sagrada, [...]” (MIRABETE; FABRINI

2010, p. 16).

Como as lutas entre famílias e tribos eram acirradas, acarretou o

enfraquecimento das mesmas, com isso, surgiu a “Lei de Talião”, como regras

para evitar a extinção delas, “determinando a reação proporcional ao mal

praticado: olho por olho, dente por dente” (BITENCOURT, 2012, p. 61).

Esse foi o maior exemplo de busca de um tratamento equilibrado entre

infrator e vítima, de certa forma, uma tentativa de humanizar a sanção criminal.

Com o passar do tempo, a “Lei de Talião” evoluiu e surgiu a

possibilidade de o agressor satisfazer a ofensa com indenização em moeda ou

animais e utensílios, chamada de composição, como um “sistema através do

qual o infrator comprava a sua liberdade, livrando-se do castigo”

(BITENCOURT, 2012, p. 61).

Em outras palavras, a composição se tornou forma alternativa de sanção

quando a morte do transgressor era desaconselhável, pois a reparação do

dano causado pelo delito era mais interessante ao ofendido e ao ofensor.

A composição constitui um dos antecedentes da moderna reparação do

Direito Civil e das penas pecuniárias do Direito Penal.

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Com a melhor organização social, o Estado assumiu o poder-dever de

manter a ordem e a segurança social, surgindo a vingança pública, que no

início, manteve correlação entre poder divino e poder político.

O período foi marcado pelas penas cruéis, cujo objetivo era a segurança

do príncipe ou soberano. Ainda, sob influência religiosa, o Estado justificava a

proteção e segurança do monarca, pois este governava em nome do deus. Na

Grécia, por exemplo, governava-se em nome de Zeus, sendo o monarca seu

intérprete e mandatário. Posteriormente, o caráter religioso foi sendo

abandonado, mudando a responsabilidade, que antes era de todo o grupo,

passou a ser individual, ou seja, do autor do fato, com contribuição na

humanização dos costumes penais. As penas passaram a ter o intuito de

intimidar para que os crimes fossem prevenidos e reprimidos.

Essa concepção, do caráter religioso foi superada com a contribuição de

Aristóteles, antecipando a necessidade do livre-arbítrio, como embrião da idéia

de culpabilidade, primeiramente no campo filosófico para depois ser conduzido

para o jurídico; e Platão com as leis para antecipar “a finalidade da pena como

meio de defesa social, que deveria intimidar pelo rigorismo, advertindo os

indivíduos para não delinquir” (BITENCOURT, 2012, p. 61).

Os processos eram sigilosos. O réu não sabia qual era a acusação feita

contra ele. O entendimento era de que o acusado não precisava de defesa

caso fosse inocente e, se fosse culpado, não teria esse direito.

Finalmente, “em nenhuma dessas fases de vingança houve a liberação

total do caráter místico ou religioso da sanção penal, tampouco se conheceu a

responsabilidade penal individual, que somente a partir das conquistas do

Iluminismo passou a integrar os mandamentos mais caros do Direito Penal”

(BITENCOURT, 2012, p. 62).

1.2 Período humanitário – os reformadores

Em meados do século XVIII, na Europa, as leis vigentes tinham

características excessivamente cruéis, com torturas e pena de morte. Com

isso, alguns pensadores se reuniram em torno de idéias com fundamento na

razão e humanidade. Na segunda metade do século XVIII os filósofos, juristas

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e moralistas começavam a combater abertamente essas concepções, com

objetivo de defender as liberdades do indivíduo e os princípios da dignidade do

homem.

As correntes iluministas e humanitárias representadas por Voltaire,

Montesquieu e Rousseau, fizeram uma severa crítica aos excessos imperantes

na legislação penal, pois buscavam a defesa da liberdade, igualdade e justiça.

A pena deve ser proporcional ao crime, levando em consideração seu grau de

maldade e, principalmente, produzir eficácia sobre os homens e, ao mesmo

tempo, ser menos cruel para eles.

“Esse movimento de idéias, definido como Iluminismo, atingiu seu

apogeu na Revolução Francesa, com considerável influência em uma série de

pessoas com um sentimento comum: a reforma do sistema punitivo”

(BITENCOURT, 2012, p. 68).

O Iluminismo foi uma concepção filosófica, caracterizada pela ampliação

do domínio da razão a todas as áreas do conhecimento humano.

Ainda nas palavras de Bitencourt: “O Iluminismo representou uma

tomada de posição cultural e espiritual de parte significativa da sociedade da

época, que tinha como objetivo a difusão do uso da razão na orientação do

progresso da vida em todos os seus aspectos” (2012, p. 68).

No campo político criminal, fizeram parte desse movimento, dentre

outros, Cesare de Beccaria, John Howard e Jeremias Bentham.

2 ASPECTOS HISTÓRICOS DO DIREITO PENAL NO BRASIL

Nos primórdios da civilização brasileira, adotava-se a vingança privada,

como visto anteriormente, sem nenhum padrão quanto às reações penais. No

entanto, as formas punitivas existentes predominantes eram as sanções

corporais, porém, sem tortura, ou seja, “havia apenas regras consuetudinárias

(tabus), comuns ao mínimo convívio social, transmitidas verbalmente e quase

sempre dominadas pelo misticismo” (BITENCOURT, 2012, p. 73).

16

De maneira didática a história do Direito Penal brasileiro pode ser

dividida em três grandes fases: o Período Colonial; o Código Criminal do

Império e; o Período Republicano.

No período colonial, com o descobrimento do Brasil, em 1500, passou a

vigorar o Direito Português, com as Ordenações Afonsinas, consideradas como

primeiro código europeu completo, que traziam características do Direito

Canônico e Romano e foi dividido em cinco livros.

Em 1521, as Ordenações Afonsinas foram substituídas pelas

Ordenações Manuelinas, no entanto, não chegaram a ser eficazes, visto que,

existiam muitas leis e decretos reais para solucionar os conflitos da nova

colônia e, também, eram conferidos poderes juntamente com as cartas de

doação, onde cada donatário tinha um critério próprio ao Direito a ser aplicado,

como consequência, o regime jurídico do Brasil Colônia era catastrófico. Este

código foi uma tentativa de modernizar as Ordenações Afonsinas.

Em 1603, entraram em vigor as Ordenações Filipinas que foram criadas

por um espanhol, Dom Felipe II da Espanha, que herdara o trono Português de

seu primo, Rei Dom Sebastião, devido ao seu falecimento e como não tinha

filhos.

As Ordenações Filipinas vigoraram até 1816, no governo de Dom João

IV quando a coroa voltou a ser de Portugal. Em seguida, Dom João IV criou a

figura do Governador Geral para administrar as capitanias que,

consequentemente, extinguiram as capitanias hereditárias.

Nesse período não se adotava o princípio da legalidade. O julgador

escolhia a sanção a ser aplicada, muita das vezes de forma cruel e,

principalmente a pena capital.

No mesmo entendimento, Bitencourt relata que a legislação penal da

época “orientava-se no sentido de uma ampla e generalizada criminalização,

com severas punições. Além do predomínio da pena de morte, utilizava outras

sanções cruéis, como açoite, amputação de membros, [...] etc.” (2012, p. 74).

A lei penal aplicável no Brasil nesse período estava nos 143 títulos do

Livro V das Ordenações Filipinas.

Com base na justiça e equidade a Constituição de 1824 determinou a

criação do denominado de Código Criminal do Império. Bernardo Pereira de

Vasconcelos e José Clemente Pereira apresentaram, em 1827, seus projetos

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para o Código Criminal, ambos de excelente qualidade. No entanto, o escolhido

foi o de Bernardo, por abarcar amplamente as necessidades mais importantes

da época.

Em 1830, o imperador D. Pedro I sancionou o Código Criminal que foi o

primeiro código autônomo da América Latina.

É importante destacar que o Código Criminal do Império “surgiu como

um dos mais bem elaborados, influenciando grandemente o Código Penal

espanhol de 1848 e o Código Penal português de 1852, por sua clareza,

precisão, concisão e apuro técnico” (BITENCOURT, 2012, p. 74).

Observou-se um grande avanço quanto à humanização das penas.

Destacam-se alguns incisos do artigo 179 da Constituição de 1824 que

orientaram a criação do Código Criminal do Império.

Art. 179 ... XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, o recompensará em proporção dos merecimentos de cada um. XIX. Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais penas cruéis. XX. Nenhuma pena passará da pessoa do delinquente. Por tanto não haverá em caso algum confiscação de bens, nem a infâmia do réu se transmitirá aos parentes em qualquer grau que seja. XXI. As Cadeias serão seguras, limpas, o bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos réus conforme suas circunstancias, e natureza dos seus crimes.

Com isso, verificou substancial mudança no foco, pois ao tempo das

ordenações os cidadãos eram atemorizados e com a edição do Código

Criminal do Império ocorreu o inicio de uma busca para humanização do Direito

Penal.

Com a chegada da República no Brasil, período republicano, foi

necessário elaborar um novo projeto do Código Penal. Porém, como foi feito de

maneira apressada, foi considerado o pior Código Penal da história do Brasil.

Perderam-se importantes avanços conquistados com o Código Criminal do

Império e, para tentar corrigir “os equívocos e deficiências do Código

Republicano acabaram transformando-o em verdadeira colcha de retalhos, [...]

18

que se concentraram na conhecida Consolidação das leis Penais de Vicente

Piragibe, promulgada em 1932” (BITENCOURT, 2012, p. 75).

Neste período (1890 – 1932), surgiram muitos projetos que pretendiam

substitui-los, no entanto, não tiveram êxito. Somente em 1937, durante o

Estado Novo, Alcântara Machado apresentou um projeto de código criminal

brasileiro que foi sancionado por decreto de 1940, como Código Penal, que

passou a vigorar desde 1942 até os dias atuais, porém, com algumas reformas.

2.1 Reformas contemporâneas

Várias formas as leis que modificaram o Código Penal vigente;

destacando-se a Lei n. 6.416, de 24 de maio de 1977, que atualizou as

sanções penais, e a Lei n. 7.209 de 11 de julho de 1984, que estabeleceu nova

parte geral.

Anteriormente a essas reformas, Nélson Hungria criou um projeto, em

1963, que pretendia substituir o Código Penal, que foi revisado e promulgado

pelo Decreto-lei n. 1.004, de 21 de outubro de 1969, retificado pela Lei n.

6.016/73. Conhecido como Código Penal de 1969, teve sua vigência adiada

várias vezes, tornando-se a mais longa vacatio legis conhecida. Foi revogado

pela Lei n. 6.578/78.

A Lei n. 7.209/1984 reformulou toda a Parte Geral do Código Penal de

1940 e quanto a estrutura, foi dividida em partes: Parte geral e Parte Especial.

A parte geral é subdivida em oito títulos e estabelece as regras gerais sobre

crimes, pena, extinção da punibilidade, ação penal aplicação da lei penal etc. A

parte especial é subdividida em onze títulos e descreve as condutas criminosas

e comina a elas sua espécie de pena.

Outro aspecto importante da reforma de 1984 foi a humanização das

penas e adoção de penas alternativas à prisão (introduziu novamente o

sistema dias-multa). Portanto, com todo esse avanço, por falta de vontade da

classe politica do país, resultados não são perceptíveis, pois faltam

investimentos em infraestrutura do sistema penitenciário tornando “inviável a

utilização da melhor politica criminal – penas alternativas -, de há muito

consagrada nos países europeus” (BITENCOURT, 2012, p. 75).

19

Tem uma das melhores alternativas quanto à pena privativa de

liberdade, no entanto, a falta de estrutura do sistema não oferece condições

para que sejam eficazes e eficientes.

Diante disso, aumenta-se a violência e, consequentemente, a sociedade

exige uma maior intervenção do Direito. O Direito Penal deixa de ser a ultima

ratio, mas sofre maximização. Como exemplo o que ocorreu no Brasil durante

alguns anos da década de 90, onde a experiência vivida foi:

[...] pautada por uma política criminal do terror, característica do Direito Penal simbólico, patrocinada pelo liberal Congresso Nacional, sob o império da democrática Constituição de 1988, com a criação de crimes hediondos (Lei n. 8.072/90), criminalidade organizada (Lei n. 9.034/95) [...] (BITENCOURT, 2012, p. 75).

Essa tendência foi reduzida somente com a Lei dos Juizados Especiais

Criminais (Lei n. 9.099/95), que recepcionou a transação penal e criou a

suspensão condicional do processo.

3 FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL

3.1 Considerações introdutórias

Além da História do Direito Penal, também é muito importante o

processo de desenvolvimento de atribuições e princípios para aplicação e

interpretação das normas penais, ou seja, da criação da dogmática jurídico-

penal.

Nesse sentido, a dogmática jurídico-penal tem uma importante função no

Estado de Direito, a de garantir os direitos fundamentais do indivíduo impondo

controle e limites ao poder do Estado.

Devido às mudanças politicas, sociais, culturais e econômicas das

sociedades não houve evolução linear dos princípios e normas penais.

20

3.2 Correntes do pensamento positivista

No campo da filosofia, o positivismo é uma corrente que se propõe a

experimentos reais para comprovar uma teoria e deixar de lado as

especulações metafisicas ou teológicas. Inicialmente, se utilizou do método

científico indutivo como verdadeira fonte do saber humano.

No século XIX apareceram diversas correntes de pensamento

estruturadas de forma sistemática, conforme determinados princípios

fundamentais.

A principal característica desse período é a rejeição do caráter científico

das valorações jurídicas do delito e a substituição destas pelo método da

sociologia, da antropologia, biologia, dentre outros, sendo possível, dessa

forma, o desenvolvimento da Criminologia como ciência autônoma dedicada ao

estudo do delito. No entanto, essa visão criminológica do estudo do delito não

foi compartilhada por todos os penalistas dessa época. Com isso, surgiu o

positivismo jurídico, para reagir a esse caráter científico (positivismo científico),

que reivindicou para si o estudo do delito realizado por perspectiva

exclusivamente jurídica.

O positivismo, enquanto cientificismo [convicção] convenceu-se de que a certeza que dominava as ciências físico-experimentais – método positivo – absorveria e resolveria todas as questões que a sociedade apresentasse ordenadamente (BITENCOURT, 2012, p. 81).

Sendo assim, a missão da nascente dogmática penal seria formada na

interpretação e sistematização do Direito positivo através do método indutivo,

que nas palavras de Silva Sánchez, “trata-se de deduzir da lei a solução

aplicável ao caso mediante a „construção jurídica‟, isto é, através da abstração

progressiva dos conceitos específicos aos mais gerais” (apud BITENCOURT,

2012, p. 81).

Essas diferentes correntes denominam-se Escolas Penais, que

abrangeram várias concepções para a explicação do delito e justificação da

pena.

21

3.2.1 Escola clássica

Bitencourt leciona que não houve uma Escola Clássica com um corpo de

doutrina comum, relacionado ao direito de punir e aos problemas expostos pelo

fenômeno delitivo. Consequentemente, foi difícil para os juristas dessa

corrente, apresentar conteúdo homogêneo, relacionado ao direito de punir e

aos problemas fundamentais apresentados pelo crime e pela sanção penal.

“Na verdade, a denominação Escola Clássica não surgiu [..] da identidade de

uma linha de pensamento comum entre os adeptos do positivismo jurídico,

mas, foi dada, com conotação pejorativa [...]” (2012, p. 82).

Nasceu com as idéias fundamentais do Iluminismo, com contribuição de

vários autores que foi denominado de Escola Clássica, pelos juristas que

negaram o positivismo científico, mas hoje serve para reunir os doutrinadores

dessa época.

Os dois maiores expoentes desta escola foram Beccaria, que foi o

precursor do Direito Penal liberal; e Carrara, como criador da dogmática penal.

As idéias iniciais formuladas por Beccaria marcaram o início do Direito

Penal moderno, da Escola Clássica de Criminologia, e ainda, da Escola

Clássica de Direito Penal.

As diretrizes na obra de Beccaria, Dos Delitos e das Penas (1764),

“serviram de fundamento básico para a nova doutrina, que representou a

humanização das Ciências Penais”; que defendeu o indivíduo contra o arbítrio

do Estado (BITENCOURT, 2012, p. 82).

De acordo com Bitencourt, a Escola Clássica teve duas teorias, com

fundamentos diferentes:

[...] de um lado, o jusnaturalismo, de Grócio, com sua idéia de um Direito natural, superior e resultante da própria natureza humana, imutável e eterno; de outro lado, o contratualismo, de Rosseau, sistematizado por Fichte, e sua concepção de que o Estado, e por extensão a ordem jurídica, resulta de um grande e livre acordo entre os homens, que cedem parte dos seus direitos no interesse da ordem e segurança comuns (2012, p. 82).

22

Dessa forma, as duas teorias eram opostas, no entanto, se

harmonizavam no principal: proteção e restauração da dignidade humana e o

direito do cidadão perante o Estado, que foi a inspiração do surgimento da

Escola Clássica.

De acordo com Horta (2005), a Escola Clássica se distingue, também,

através de dois grandes períodos: a) teórico-filosófico, com um sistema

baseado na legalidade, onde o Estado puniria os delinquentes, mas também,

se submeteria às limitações da lei; b) ético-jurídico, induzido por duas forças, a

física (movimento corporal que produzirá o resultado) e a moral (vontade de

praticar um delito).

Nas palavras de Mirabete e Fabbrini (2010, p.20):

Para a Escola Clássica, o método que deve ser utilizado no Direito Penal é o dedutivo ou lógico-abstrato (já que se trata de uma ciência jurídica), e não experimental, próprio das ciências naturais. Quanto à pena, é tida como tutela jurídica, ou seja, como proteção aos bens jurídicos tutelados penalmente. A sanção não pode ser arbitrária; regula-se pelo dano sofrido, inclusive, e, embora, retributiva, tem também finalidade de defesa social.

Sendo assim, foram os juristas clássicos que começaram a idealizar a

formação do exame que analisa o crime, diferenciando seus vários

componentes.

Esse processo foi o ponto de partida para a construção doutrinária da

Teoria Geral do Delito, com destaque para a vontade culpável. Eles, os autores

clássicos, limitavam o Direito Penal entre os extremos de culpabilidade e pena

retributiva (BITENCOURT, 2012).

3.2.2 Escola positiva

A Escola Positiva teve como precursor Augusto Comte. As ciências

sociais contraíram posição como a biologia e a sociologia. O crime passou a

23

ser pesquisado sob o ângulo da sociologia, e também, o criminoso através das

investigações biopsicológicas (HORTA, 2005).

A Escola Positiva surgiu em uma época onde o pensamento positivista

no campo da Filosofia, pelas teorias evolucionistas de Darwin e Lamarck e das

idéias de John Stuart Mill e Spencer, eram predominantes.

No mesmo sentido, Bitencourt (2012, p. 86) diz que: “A Escola Positiva

surgiu no contexto de um acelerado desenvolvimento das ciências sociais”,

com isso determinou uma nova orientação nos estudos criminológicos.

Ainda, ao contrário da Escola Clássica, a Escola Positiva, priorizou os

interesses sociais em relação aos individuais. De modo que, a ressocialização

do delinquente passa a um segundo plano.

O fundamento do direito de punir assume uma posição secundária, e o problema da responsabilidade perde importância, sendo indiferente a liberdade de ação e de decisão no cometimento do fato punível. Admitindo o delito e o delinquente como patologias sociais, dispensava a necessidade de a responsabilidade penal fundar-se em conceitos morais. Bitencourt (2012, p. 86)

Na Escola Positiva se identificam três fases e predomina um

determinado aspecto distinto entre elas, sendo:

a) fase antropológica: representada por Cesare Lombroso, como

fundador da Escola Positiva Biológica, parte da idéia básica da existência de

um criminoso nato. Ao longo dos seus estudos foi ampliando sucessivamente a

sua teoria de criminoso;

b) fase sociológica, que teve como expoente máximo Enrico Ferri, que

sustentou a teoria de que o livre-arbítrio não existe, considerando que a pena

não se determina pela capacidade de autonomia da pessoa, mas pelo fato de

ser um membro da sociedade, ou seja, “passava-se da responsabilidade moral

para a responsabilidade social” (BITENCOURT, 2012, p. 88);

c) fase jurídica: teve como expoente Rafael Garofalo, que conseguiu

sistematizar a Escola Positiva, estabelecendo alguns princípios básicos, dentre

eles: “a) a periculosidade como fundamento da responsabilidade do

delinquente; b) a prevenção especial como fim da pena [...]; c) fundamentou o

24

direito de punir sobre a teoria da Defesa Social [...]; d) formulou uma definição

sociológica do crime natural” (BITENCOURT, 2012, p. 88).

Mirabete e Fabrini resumem os princípios básicos da Escola Positiva da

seguinte forma:

1. O crime é fenômeno natural e social, sujeito às influências do meio e de múltiplos fatores, exigindo o estudo pelo método experimental. 2. A responsabilidade penal é responsabilidade social, por viver o criminoso em sociedade, e tem por base a sua periculosidade. 3. A pena é medida de defesa social, visando à recuperação do criminoso ou à sua neutralização. 4. O criminoso é sempre, psicologicamente, um anormal, de forma temporária ou permanente (2012, p. 22).

3.2.3 Escolas mistas e tendências contemporâneas

“A Escola Clássica e a Escola Positiva foram as duas únicas escolas que

possuíam posições extremas e filosoficamente bem definidas. Posteriormente,

surgiram outras correntes que procuravam uma conciliação dos postulados das

duas predecessoras” (BITENCOURT, 2012, p. 89).

As escolas mistas surgiram com a busca de harmonização dos

princípios da Escola Clássica e dos aspectos técnicos-jurídicos da Escola

Positiva, como a Terceira Escola (Alimena, Carnevale, Impalomeni) e a Escola

Moderna Alemã.

Foi a Escola Moderna Alemã que influenciou e colocou em pratica essa

harmonização, como a elaboração de leis, criando-se o instituto das medidas

de segurança, o livramento condicional, o sursis etc.

Essas novas correntes representou um avanço aos estudos das ciências

penais, mantendo prudência, como recomenda a boa doutrina e o início de

novas idéias.

Hoje, os penalistas começam a se preocupar com a pessoa do

condenado, tendo uma perspectiva mais humana, formando, assim, a doutrina

da Nova Defesa Social. Onde, “[...] a sociedade é defendida à medida que se

proporciona a adaptação do condenado ao convívio social” (MIRABETE;

FABRINI, 2010, p. 22).

25

3.2.4 Escola técnico-jurídica

Os positivistas pretendiam utilizar no Direito Penal o método positivo das ciências naturais, isto é, realizar os estudos jurídicos-penais através da observação e verificação da realidade, além de sustentarem que a pessoa do delinquente deveria ser posta no centro da ciência pena, pois, [...], o juiz julga o réu e não o crime (BITENCOURT, 2012, p. 92).

Os positivistas misturavam os campos do Direito Penal, da Política

Criminal e da Criminologia. Na verdade, tinha muita preocupação com os

aspectos antropológicos e sociológicos do crime, em prejuízo do jurídico.

Ainda, segundo Bitencourt (2012), para reagir a essa mistura

metodológico criado pela Escola Positiva, surgiu o chamado tecnicismo

jurídico-penal.

Para Horta (2005), o principal objetivo dessa escola é desenvolver a

idéia que a ciência penal é independente, com objeto e métodos próprios, não

se misturando com outras ciências, como a antropologia, sociologia, filosofia,

estatística e outras. Seu primeiro expoente é Arturo Rocco, que propôs uma

reorganização onde o estudo do Direito Criminal se reduziria apenas ao Direito

Positivo vigente.

Bitencourt (2012) ensina que essa orientação se caracteriza mais como

uma renovação metodológica do que propriamente uma escola, que procurou

restaurar o critério jurídico da ciência do Direito Penal, apontando o verdadeiro

objeto do Direito Penal, que seria o crime, como fenômeno jurídico.

As principais características dessa Escola, conforme Bitencourt leciona,

são:

a) o delito é pura relação jurídica, de conteúdo individual e social; b) a pena constitui uma reação e uma consequência do crime (tutela jurídica), com função preventiva geral e especial, aplicável aos imputáveis; c) a medida de segurança – preventiva – deve ser aplicável aos inimputáveis; d) responsabilidade moral (vontade livre); e método técnico-jurídico; e f) recusa o emprego da filosofia no campo penal (2012, p. 92).

26

3.2.5 Crise do pensamento positivista

Após essa breve explanação das diferentes correntes do positivismo,

constata-se os motivos de sua decadência. Visto que, o positivismo objetivou

aplicar ao Direito os mesmos métodos de observação e investigação utilizados

nas disciplinas experimentais (física, biologia, antropologia etc.).

Com isso se verificou que era uma metodologia, de certa forma, de difícil

aplicação à norma jurídica. Consequentemente, propuseram que “a

consideração do delito fosse substituída por uma sociologia ou antropologia do

delinquente” e, com isso, surgiu a Criminologia, como forma independente da

dogmática jurídica (BITENCOURT, 2012, 94).

Com efeito, ocorreu uma grande polêmica em torno dessas duas

vertentes. No caso, a criminologia era voltada para explicar o delito como

fenômeno social, biológico e psicológico, porém, não resolveria questões

jurídicas, onde a dogmática jurídica resolveria, pois teria como objetivo

somente o direito positivo, no entanto, não era capaz de compreender o delito

como realidade social

Desta forma, atualmente, entende-se que Ciência do Direito Penal

abrange as duas vertentes, onde “os conhecimentos produzidos por esses

ramos se inter-relacionam na configuração da Política Criminal mais adequada

para a persecução de crimes” (BITENCOURT, 2012, 94).

4 PRINCIPIOS LIMITADORES DO PODER PUNITIVO ESTATAL

4.1 Considerações introdutórias

Os princípios formam a base do sistema, como normas estruturantes

que explicitam valores necessários para a convivência social do Estado de

Direito, diante disso, são o fundamento de validade de várias outras normas do

sistema.

Com a evolução do Direito Penal, principalmente, com idéias de

igualdade e liberdade, deu a este, caráter formal menos cruel do que no

27

período primitivo, onde impôs limites ao Estado à intervenção relacionada às

liberdades individuais. Dessa forma, “muitos desses princípios limitadores

passaram a integrar os Códigos Penais dos países democráticos e, afinal,

receberam assento constitucional, como garantia máxima de respeito aos

direitos fundamentais do cidadão”. (BITENCOURT, 2012, p. 40).

Esses princípios limitadores, também, são conhecidos como princípios

reguladores do controle penal; princípios constitucionais fundamentais de

garantia do cidadão; ou princípios fundamentais de Direito Penal de um Estado

Social e Democrático de Direito.

Na sequência, serão destacados alguns princípios limitadores.

4.2 Princípio da legalidade

O princípio da legalidade pode ser dividido em três vertentes: a primeira,

mais conhecida como reserva legal, que somente a lei pode definir um tipo

penal; outra diz que a lei deve ser clara em especificar todos os elementos do

crime e; por última, está na anterioridade da lei penal, pois a lei deve ser

anterior à conduta que tipifica um fato criminoso, como manifestação da

segurança jurídica.

É importante destacar umas das vertentes, qual seja, a taxatividade

“informa que a norma penal incriminadora deve conter todos os elementos da

figura típica, de forma inequívoca, prescrevendo todos os requisitos da conduta

humana que enseja o crime, de modo a torná-la inconfundível” (ANTUNES,

2013, p. 29).

Diante disso, para que o princípio da legalidade seja colocado em

prática, o legislador deve evitar expressões vagas, equívocas ou ambíguas.

Nesse sentido, Claus Roxin afirma que:

uma lei indeterminada ou imprecisa e, por isso mesmo, pouco clara não pode proteger o cidadão da arbitrariedade, porque não implica uma autolimitação do ius puniendi estatal, ao qual se possa recorrer [e também] permite ao juiz realizar a interpretação que quiser, invadindo, dessa forma, a esfera do legislativo (apud BITENCOURT, 2012, p. 42).

28

A doutrina não é uníssona quanto à origem deste principio, onde uns

apontam como idéias do Iluminismo, outros se referem à Carta Magna Inglesa

de 1215, e outros, ainda, como do direito romano.

No entanto, é unânime, como conhecemos atualmente, de forma mais

técnica para o Direito Penal a partir da obra de Marques de Beccaria, com a

obra “Dos Delitos e das Penas” e o jurista alemão Ludwig Anselm Von

Feuerbach em 1813 criou a fórmula utilizada na América Latina conhecida

como nullum crimen e nulla poena, sine previa lege.

Bitencourt sintetiza o principio da legalidade da seguinte forma: “nenhum

fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada

sem que antes da ocorrência desse fato exista uma lei definindo-o como crime

e cominando-lhe a sanção correspondente” (2012, p. 41).

4.3 Princípio da intervenção mínima

O princípio da intervenção mínima é, também, chamado de ultima ratio e

recomenda que o Direito Penal deve atuar somente quando os outros ramos do

Direito não conseguiram resolver os conflitos existentes, e principalmente, na

proteção de bens jurídicos importantes para a sociedade, por exemplo, os

direitos e garantias fundamentais, ou seja, “quando os demais ramos do Direito

revelaram-se incapazes de dar a tutela devida a bens relevantes na vida do

individuo e da própria sociedade” (BITENCOURT, 2012, p.44).

Tem como fundamento histórico na Declaração Francesa dos Direitos do

Homem e do Cidadão de 1789, onde o artigo 8º prescreve que a lei deve

estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias para a reprimenda do

delito (ANTUNES, 2013).

4.4 Princípio de culpabilidade

Historicamente, a responsabilidade pelo crime sempre foi objetiva, isto é,

pela simples produção do resultado. No entanto, pelo princípio da culpabilidade

essa concepção foi mudando, onde começou a alegar a responsabilidade

subjetiva no Direito Penal.

29

Dessa forma, foi com o princípio da culpabilidade que ocorreu a

mudança desse paradigma, onde analisa a ocorrência ou não de um juízo de

reprovação, ou seja, analisa os elementos subjetivos do crime, a intenção do

agente.

No mesmo sentido, Flávio Augusto Antunes relata que:

Na culpabilidade se investiga a conduta do agente, se ela é dolosa ou culposa, pois se trata na verdade de se descobrir se o agente teve a intenção deliberada de cometer o crime, de forma livre e consciente, ou se agiu de forma imprudente ou negligente, ou mesmo com imperícia (ANTUNES, 2013, p. 29).

Com isso, a culpabilidade não afeta somente o delinquente, mas sim,

toda sociedade. Dessa forma, a culpabilidade não tem uma concepção

individualizada, afetando somente o individuo, autor do delito, mas sim,

relacionada aos demais membros da sociedade. Assim como prescreve Muñoz

Conde:

não é uma qualidade da ação, mas uma característica que se lhe atribui, para poder ser imputada a alguém como seu autor e fazê-lo responder por ela. Assim, em última instância, será a correlação de forças sociais existentes em um determinado momento que irá determinar os limites do culpável e do não culpável, da liberdade e da não liberdade (apud BITENCOURT, 2012, p. 51).

Dessa forma, observa-se que no Direito Penal aplica-se um triplo sentido

ao conceito de culpabilidade: num primeiro sentido, como fundamento da pena,

que significa atribuir um juízo de valor, responsabilizando o delinquente pela

prática de um fato típico e antijurídico e, como consequência a aplicação da

pena. Tendo como requisitos a capacidade de culpabilidade, consciência da

ilicitude e exigibilidade da conduta, “que constituem os elementos positivos

específicos do conceito dogmático de culpabilidade, e que deverão ser

necessariamente valorados para, dependendo do caso, afirmar ou negar a

culpabilidade pela pratica do delito” (BITENCOURT, 2012, p.52).

30

Em outro sentido, a culpabilidade como elemento da determinação ou

medição da pena, funciona como um limite da pena, de acordo com a

gravidade do delito, devendo ser proporcional a gravidade deste, em

consonância com critérios de politica criminal e com a finalidade da pena. E por

último sentido, a culpabilidade como conceito contrário à responsabilidade

objetiva, por essa concepção não é permitido responsabilizar o agente de

maneira objetiva, sendo necessário que este tenha agido, ao menos, com dolo

ou culpa.

Importante salientar que, com isso, derivam importantes consequências

materiais:

a) inadmissibilidade da responsabilidade objetiva pelo simples resultado; b) somente cabe atribuir responsabilidade penal pela prática de um fato típico e antijurídico, sobre o qual recai o juízo de culpabilidade, de modo que a responsabilidade é pelo fato e não pelo autor; c) a culpabilidade é a medida da pena (BITENCOURT, 2012, p.52).

Dessa forma, não resta menor dúvida que o princípio de culpabilidade

representa uma norma garantista inserido no processo de valoração de

responsabilidade penal.

No entanto, esta concepção de culpabilidade vem sendo fragmentada

pelas teorias funcionalistas e sua progressiva radicalização, iniciada por Roxin

e atualmente, se tornando mais evidente através do pensamento de Jakobs. O

assunto será tratado, mais especificamente, no capitulo posterior.

A culpabilidade tem previsão na Constituição Federal de 1988, no artigo

5º, LVII, como uma norma garantista que prevê “ninguém será considerado

culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.

Esse princípio, também, é conhecido como presunção de inocência ou

não culpabilidade, com fundamento na dignidade da pessoa humana, que

exige a responsabilidade subjetiva da pessoa, responsabilizando-a pelo delito

somente no final do processo.

4.5 Princípio da proporcionalidade

31

É considerado um dos mais importantes princípios. Consiste no dever do

Estado em dar a devida proteção para o individuo e também garantir que este,

em suas intervenções, não cometa abusos.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, exigia a

observação da proporcionalidade entre a gravidade do crime praticado e a

sanção que será aplicada. Na Constituição Federal brasileira, que apesar de

não estar explicitamente prevista, no entanto, está prevista de forma implícita

em vários dispositivos, tais como: “exigência da individualização da pena (art.

5º, XLVI), proibição de determinadas modalidades de sanções penais (art. 5º,

XLVII), admissão de maior rigor para infrações mais graves (art. 5º, XLII, XLIII e

XLIV)” (BITENCOURT, 2012, p.53).

Com isso, a proporcionalidade é utilizada através da idéia retirada do

“Estado Democrático de Direito”, que busca a justiça e a segurança para a

sociedade. Desta forma, a proporcionalidade não é uma simples interpretação

das normas, mas também “[...] garantia legitimadora/ limitadora de todo o

ordenamento jurídico infraconstitucional” (BITENCOURT, 2012, p.54).

A respeito da violação ou não do princípio da proporcionalidade analisa-

se a necessidade e adequação da atitude legislativa a ser tomada, ou seja, em

uma relação “custo-benefício” para o cidadão e o ordenamento jurídico.

4.6 Princípio da presunção da inocência

É necessário a apresentação do princípio da presunção de inocência

pois remete especificamente às necessidades básicas dos direitos humanos.

Assim como determinado na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,

onde a presunção de inocência atua dentro do processo, exigindo a prova de

culpabilidade pela acusação, ou seja, todos os homens são inocentes até que

se tenha comprovada a sua culpa, dessa forma, não incumbe ao acusado fazer

provas de sua inocência.

Dessa forma, inteligência das declarações a respeito da dignidade e

liberdade do ser humano, é no sentido de que não se pode culpar ninguém

sem antes ter sido julgado em sentença condenatória irrecorrível. Haverá

sempre a presunção de inocência, e não o contrário pela culpabilidade.

32

Adotado em todos os países democráticos. Dessa feita é que ensinam Távora

e Alencar (2009, p.44):

Antes deste marco, somos presumivelmente inocentes, cabendo à acusação o ônus probatório desta demonstração, além do que o cerceamento cautelar da liberdade só pode ocorrer em situações excepcionais e de estrita necessidade. Neste diapasão, a regra é a liberdade e o encarceramento, antes de transitar em julgado a sentença condenatória, deve figurar como medida de estrita exceção.

Entende-se com isso que o estado de inocência é sempre a regra e a

culpabilidade é a exceção, não podendo ninguém ser culpado ou pré-julgado

antes de ter sido julgado.

Nesse sentido a Constituição Federal de 1988 determina no seu artigo

5º.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

Ainda, segundo Mirabete:

[...] existe até uma presunção de culpabilidade ou de responsabilidade quando se instaura a ação penal, que é um ataque à inocência do acusado e, se não a destrói, a põe em incerteza até a prolação da sentença definitiva. Não se impede, assim, que de maneira mais ou menos intensa, seja reforçada a presunção de culpabilidade com os elementos probatórios colhidos nos autos de modo a justificar medidas coercitivas contra o acusado. Dessa forma, ao contrário do que já tem se afirmado, não foram revogados pela norma constitucional citada os dispositivos legais que permitem a prisão provisória, decorrentes de flagrante, pronúncia, sentença condenatória recorrível e decreto de custódia preventiva, ou outros atos coercitivos (busca e apreensão, sequestro, exame de insanidade mental etc.) (2005, p.45).

Dessa feita, como observado, a presunção de inocência se traduz em

norma de comportamento do Estado frente ao indivíduo, para que não seja

33

antecipada qualquer medida punitiva ou que lhe importe reconhecimento de

culpabilidade antes da sentença final condenatória, conforme artigo 5º, VLII da

Constituição Federal segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o

trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

De outro modo, embora garantia individual, não é principio absoluto,

sendo balanceado com outros princípios igualmente relevantes para o sistema,

como os que tratam do direito de propriedade, da segurança pública, da ordem

econômica justa, dentre outros. Dentro dessa relativização, onde comporta

minimizar frente a outras normas constitucionais, objetivando o combate ao

crime organizado, dessa forma, considera-se como razoável o reconhecimento

do Direito Penal do Inimigo.

Por esse sistema penal, busca-se prevenir que o criminoso em potencial pratique o crime, adiantando-se a política criminal de repressão para os atos preparatórios. Por prever normas mais duras e de certa forma, em algumas passagens, rompendo-se com o sistema tradicional da presunção de inocência, mitigando-a, como ocorre nas situações de crimes envolvendo, por exemplo, organizações criminosas, tráfico de drogas e armas, há nesse aparente conflito a necessidade de se harmonizarem referidos sistemas, para que um não se sobreponha ao outro (ANTUNES, 2012, p. 115).

34

CAPÍTULO II – DIREITOS HUMANOS

1 CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

Quando se fala em direitos humanos é comum deparar com as

expressões “direitos fundamentais”, “direitos humanos” e “direitos do homem”.

Está certo dizer que os direitos humanos são os direitos fundamentais, só que

no modo mais frequente de classificação quando se fala em direitos

fundamentais dá-se ênfase na previsão desses direitos na ordem jurídica

nacional, ou seja, os direitos previstos na constituição e nas leis que integram a

ordem jurídica do Estado. Dessa forma, direitos fundamentais são direitos

previstos numa ordem nacional, já os direitos humanos, quando esse conceito

é pensado em sentido estrito, dizem respeito à ordem internacional. Quando

fala-se em direito do homem, essa terminologia é utilizada com maior

frequência para se referir a introspectiva jusnaturalista, qual seja, é o direito

natural, é uma concepção onde os direitos humanos fazem parte da natureza

humana, ou seja, são o direitos que nascem, inerentes, em outras palavras,

não precisam estar previstos nem na ordem nacional, nem da ordem

internacional para existir e, existem como características da condição humana,

nascemos com esses diretos.

Na efervescência dos estudos evolucionários do século XVIII, revolução

francesa, revolução americana, prevalecia à convicção de uma visão de mundo

jusnaturalista, que alicerçava uma ação de direitos da pessoa humana, a partir

do entendimento de que esses direitos faziam parte da nossa natureza e não

das ordens jurídicas que posteriormente poderiam ser constituídas. A evolução

do direito internacional dos direitos humanos vai caminhar para o

desenvolvimento de uma visão jurídica que vai influenciar, também, na ordem

jurídica nacional, denominada de positivismo. Posteriormente, surge o pós-

positivismo, momento atual, levando em consideração a importância do

positivismo, porém, não é mais determinante a existência ou não do direito.

35

Ao longo da história, os direitos humanos experimentaram importantes

transformações em relação a sua consagração, titularidade e extensão. Os

direitos humanos nasceram como teorias filosóficas, idéias segundo as quais, a

liberdade e a igualdade dos homens não são um fato, mas um ideal a ser

perseguido, um desejo. Naquela época, os direitos eram universais, mas não

eram eficazes, na medida em que ficavam na esfera das propostas. Em

seguida, passaram os mesmos para o terreno das leis. Isso se deu com as

Declarações de Direitos dos Estados Norte-americanos e da Revolução

Francesa. Nessa fase, os direitos humanos deixaram de ser a expressão de

uma nobre exigência e passaram a integrar um ordenamento jurídico

específico. Viraram lei. Deixaram de ser um direito pensado e foram sendo

realizados. Porém, exigíveis apenas para os países que os reconheceram

expressamente.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, é a última etapa

evolutiva dos direitos humanos no tocante a sua afirmação. Com ela, se deu,

ao mesmo tempo, a consagração de forma universal e normativa. Hoje

podemos dizer que os direitos humanos foram globalizados. A consequência

prática desta alegação é que a própria autoridade soberana dos Estados

nacionais resulta relativizada e flexibilizada em favor da universalização dos

direitos humanos. A Constituição atual do Brasil acolhe expressamente esta

concepção. Isso implica, basicamente, duas consequências: primeira, que para

proteger direitos humanos violados são admitidas intervenções no plano

nacional e a responsabilização internacional do país atingido; segunda, que a

pessoa individualmente considerada adquire a condição de sujeito de direito na

esfera internacional.

Além dos impactos provocados na ordem jurídica dos países, a

Declaração Universal proporcionou também a consagração de um

entendimento mais avançado de direitos humanos. Esses, passaram a ser

concebidos como universais e indivisíveis.

Universais porque não mais aplicáveis a pessoas de um ou outro

Estado, mas atribuídos à todos os homens, indistintamente e sem a exigência

de qualquer outro requisito. Indivisíveis porque a garantia de uns é a condição

para o respeito de outros e vice-versa. A Constituição de 1988, como

salientado, cristalizou o respeito aos direitos humanos como paradigma

36

propugnado para a ordem internacional. Além disso, no mesmo título dos

Direitos e Garantias Fundamentais, consagrou amplamente os direitos sociais

que serão apresentados nos capítulos seguintes deste trabalho.

1.1 Antecedentes históricos da proteção aos direitos humanos

A proteção dos direitos humanos que vigora atualmente, com sistema

internacional, como as cortes constitucionais em diferentes países, decidindo

os casos após apreciação das diferentes instancia, com os tratados

internacionais, com os sistemas regionais e o sistema global. É resultado de

uma longa trajetória da humanidade “e é produto de diversas origens, que

podem ser localizadas em diferentes civilizações e que se apoiam nos mais

variados fundamentos” (PORTELA, 2015, p. 807).

O ser humano, historicamente, tem construído uma maneira jurídica de

se proteger. Desde a antiguidade isso já existia, desde antes de Cristo já teve

alguns instrumentos, o mais citado é o código de Hamurabi, pois estabeleceu

algumas normas de reconhecimento da propriedade, da vida, coisa desse tipo.

Depois a doutrina judaico-cristã de uma maneira geral. Primeiro na doutrina

judaica com algumas diretrizes de respeito ao outro, como o proposito de “não

matarás”, toda essa perspectiva de respeito a propriedade, “não roubarás”,

todo esse valor ético de reconhecimento de direitos das pessoas como normas

a serem seguidas.

[...] parte importante dos povos da Antiguidade já definia normas relativas à proteção de valores vistos como essenciais para a vida humana. O Código de Hamurabi (1690 a. C), por exemplo, consagrava a todos os indivíduos direitos como a vida, a propriedade e a honra. O povo judeu, referencia importante para a formação do mundo ocidental, definia nos Dez Mandamentos normas relativas a proteção da vida (“Não matarás”), ao direito de propriedade (“Não roubarás”), à proteção da família (“Não cometerás adultério”) e da honra (“Não darás falso testemunho”) (PORTELA, 2015, p. 807).

37

O cristianismo teve papel fundamental por deixar de pensar isso restrito

a uma comunidade e pensar universalmente, para toda a humanidade. No

discurso cristão não se caracteriza como discurso especifico de um povo ou

seja qual for, é um discurso universal. Essa premissa cristã, vai influenciar

muito a evolução histórica dos direitos humanos. A ideia de reconhecimento do

outro, universalmente, independentemente da cultura daquele sujeito. Outro

traço marcante, influenciado pelo cristianismo, é a preocupação com os grupos

minoritários. A intenção de Jesus era informar o dever universal de

solidariedade com aqueles que eram excluídos, a prostituta, o cobrador de

imposto e assim sucessivamente. Essa é uma tendência que será,

posteriormente, incorporada no direito internacional dos direitos humanos em

que tem as proteções especificas das minorias.

Por conseguinte, o primeiro marco, pelo qual, os direitos humanos são

pensados hoje, no que diz respeito a relação do individuo com o Estado, é a

Magna Carta de 1215, outorgada pelo Rei João Sem Terra da Inglaterra.

Caracterizou-se como uma primeira tentativa de ruptura com o absolutismo ou

mitigação das intervenções excessivas que o Estado fazia naquela época, ou

seja, a Magna Carta “limitava os poderes do monarca inglês frente aos

membros da nobreza que, em contrapartida, adquiriam certos direitos, como a

liberdade de locomoção, o livre acesso à justiça e certa proteção na área

tributária” (PORTELA, 2015, p. 807).

Dessa forma, a Magna Carta estabelece alguns limites de tributação de

mercadorias e o direito de só ser condenado depois de ser submetido a juízo,

ou seja, são limites iniciais, que começam a demonstrar a necessidade de que

o Estado não tem poder absoluto. Tem uma importância histórica por ser um

dos primeiros documentos a estabelecer limites ao arbítrio do Estado. Não

existe direitos humanos sem limites ao poder do Estado.

A perspectiva universal se consolidou no Iluminismo. O iluminismo é um

momento histórico em que o ser humano se reconhece como ser racional

universalmente, independentemente da cultura. E que esse ser racional, deve

ser protegido. Além disso, corresponde a um contexto histórico em que o ser

humano acredita na sua razão. Tem convicção de que a racionalidade será

instrumento da sua realização digna, da sua possibilidade de que vai se tornar

quem quiser ser. A partir dessa convicção, na racionalidade, o ser humano se

38

percebe e passa a entender como apto a definir as normas jurídicas da sua

proteção, que sejam, também, universais. Então, a partir daí, o Iluminismo

desencadeia contexto em que o ser humano se vê capaz de pensar as normas

que vão nortear a sua vida em sociedade.

Na época em que prevalecia o Absolutismo, o Iluminismo, [...], veio a enfatizar a necessidade de valorização da pessoa diante de poderes pretensamente ilimitados. O ideário iluminista marcou inicialmente a Independência Americana, em 1776, e alguns dos principais documentos relacionados a esse fato histórico, como a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virginia (Declaração de Virgínia), de 1775, e a COnsitituição dos EUA, de 1787 (PORTELA, 2015, p. 808).

Na Revolução Francesa, também marcada pela ideia iluminista,

começou a ter essa noção de universalidade muito consolidada na maneira de

organizar juridicamente a sociedade como fonte irradiadora dessas normas

jurídicas de proteção que consagrou inúmeros direitos da pessoa em

documentos como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de

1789, e as Constituições de 1791 e de 1793, “que reconheceram

expressamente a liberdade e a igualdade inerentes ao ser humano, bem como

a necessidade de limitar dos poderes estatais, de modo a que estes não

interferissem na esfera de liberdade dos indivíduos” (PORTELA, 2015, p. 808).

A revolução francesa que é caracterizada pela defesa de três valores

fundamentais: liberdade, igualdade e fraternidade.

Nesse panorama, verifica que a luta pelos direitos humanos, ainda, se

mantinha estritamente a cada Estado, particularmente. Com a evolução da luta

pelos direitos humanos desses Estados, destacam-se três precedentes

históricos da internacionalização de proteção da pessoa humana: o Direito

Humanitário; a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho.

O direito humanitário é um ramo especifico do internacional dos direitos

humanos, ou seja, trata da proteção jurídica da pessoa humana, em um

contexto especifico, em conflitos bélicos, possível a menção, aos direitos de

proteção da pessoa humana no contexto de conflitos bélicos internacionais.

Essa noção é importante entender no modo pelo qual o direito humanitário se

configurou como um precedente histórico da internacionalização dos direitos

39

humanos. No inicio do século XX, na Europa, teve a I Guerra Mundial, que

determinou uma série de situações drásticas de violência e sofrimento

envolvendo muitas pessoas. Os países que estavam envolvidos nesse conflito

bélico, começavam a perceber a necessidade de estabelecer alguns limites no

que diz respeito a situações de guerra e chegaram a alguns acordos em

relação a isso, no sentido, por exemplo, de que no conflito marítimo o naufrago

deve ser resgatado, um prisioneiro desarmado não deve ser executado, no

sentido de que certas áreas em que se estejam tendo atendimento medico não

devem ser atacados. Dessa forma, temos a emergência da Cruz Vermelha, que

surge com as chamadas Convenções de Genebra, que há um

comprometimento do Estado de respeitar a atuação daquela e apoiar e certos

limites no que diz respeito a integração bélica, para não admitir certas

desumanidades, se é que se pode falar isso, num contexto de guerra.

A Liga das nações se caracteriza com um esforço mais ambicioso,

sendo um antecedente fracassado da ONU, no entanto, teve importância por

ser a primeira organização internacional envolvendo Estados no objetivo

comum de preservar a paz. Fracassada porque se o objetivo era a preservação

da paz, não foi o que ocorreu, pois houve a II Guerra Mundial.

Organização Internacional do Trabalho (OIT), como próposito maior de

fomentar na ordem internacional não só com direito ao trabalho, mas em

especial no direito as condições dignas de trabalho. E acaba sendo uma

preocupação de condições dignas de trabalho e de vida, porque as condições

do trabalho repercutem nas demais condições sociais. E a OIT

progressivamente assume um papel importante na ordem internacional, na

promoção dos direitos sociais, em especial na promoção dos direitos

trabalhistas. A internacionalização, propriamente dita, se deu como resposta a

II Guerra Mundial, na verdade, foi após esta, que gerou a internacionalização

dos direitos humanos.

Nesse contexto, se configurou o repudio internacional as atrocidades do

holocausto, como barbárie em nome da lei (possiblidade de em um

determinado contexto jurídico-politico que tenha leis que admitam praticas

evidentemente imorais) como o massacre de uma raça. Quando a sociedade

internacional percebe essa possiblidade de uma lei que fomenta a barbárie, de

uma lei que admite a imoralidade completa, o pós II Guerra, a resposta da

40

sociedade internacional a essa evidencia, exige a reaproximação entre direito e

moral, ou seja, a injustiça extrema não é direito, a norma jurídica,

necessariamente, deve estar vinculada aos valores que realizam ou os valores

morais com força normativa. Essa reaproximação, entre moral e direito, vai

desencadear um reconhecimento de que o direito, enquanto fenômeno jurídico

e social, não é um fim em si mesmo, ele só se justifica se estiver a serviço de

outra coisa. O direito não é uma finalidade para a sociedade, ele é um meio

para que a sociedade realize algo. Dessa forma, vão procurar por algo que seja

um fim em si mesmo, para ser alicerce do direito, algo que não possa ser

instrumentalizado. O entendimento de Kant que passa a alicerçar o direito é de

que o ser humano é um fim em si mesmo, e o direito só se justifica se a serviço

da dignidade da pessoa humana. É a partir desse movimento, de negação de

um direito de que se justifica a partir de si mesmo, a negação de que a validade

da norma jurídica se dá na relação que as normas estabelecem entre si, que o

direito se transforma radicalmente pra se colocar a serviço da dignidade da

pessoa humana.

Após a II Guerra Mundial, os direitos humanos adquirem o caráter de prioridade da sociedade internacional, mormente a partir da criação da ONU (1945) e da proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), que reitera o reconhecimento de que todos os seres humanos, sem distinção de qualquer espécie, são essencialmente livres e iguais. (PORTELA, 2015, p. 809).

É nesse contexto, de transformações radicais da organização do mundo,

que a II Guerra Mundial, ainda é um trauma não superado, e as consequências

desse trauma são tamanhas que a sociedade internacional rompe com o

paradigma vigente e estabelece uma nova maneira de interpretar o direito,

exige que tudo esteja a serviço da dignidade da pessoa humana, por que só o

ser humano é um fim em si mesmo, com isso, encontra consenso jurídico e

politico para criação de uma organização que articule os diferentes interesses

das sociedades internacional com o objetivo comum em torno da promoção da

paz e dos direitos humanos, a criação da Organização das Nações Unidas

(ONU) em 1945. A criação da ONU é uma ruptura paradigmática que

estabeleceu, então, condições para que sua assembleia geral, aprovasse a

41

Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) em 1948. Com a DUDH

tem-se efetivamente a internacionalização dos direitos humanos. Dessa forma,

inaugurou, segundo a doutrina majoritária, a proteção jurídica incondicional da

pessoa humana, sendo consequência direta da resposta da sociedade

internacional no pós II Guerra Mundial.

2 FUNDAMENTO DOS DIREITOS HUMANOS

As principais teorias que fundamentam os direitos humanos são a

jusnaturalista, a positivista e a moralista. A jusnaturalista fundamentam tais

direitos como uma ordem superior, universal, imutável e inderrogável. A

positivista alicerça tais direitos quando estejam expressamente previstos na

norma positiva. A moralista fundamenta os direitos humanos “na convicção

social acerca da necessidade da proteção de determinado valor” (PORTELA,

2015, p. 802).

Ao que se refere aos diretos humanos, muitas divergências existentes

na seara jurídica e social ainda colidem. Tome-se como forma de sintetizar o

trabalho, a menção mais simplista de direitos humanos que ensina Marum

(2005, p.87), dizendo que estes são “[...] direitos que não dependem da

nacionalização do sujeito, nem da sua raça, da sua condição econômica e

social ou de quaisquer outras circunstâncias, sendo inerentes à sua própria de

ser humano”.

De outra forma, todos os seres humanos são portadores desse direito,

independentemente de suas condições qualquer que sejam as circunstancias.

Pois esses direitos foram conquistados em muitos casos a força num processo

histórico longo, pelo qual a humanidade passou e se submeteu a condições

extremas.

Dessa forma, tem-se como uma das iniciais desses direitos, a carta

fundadora das Nações Unidas, prolatada em 1945 em San Francisco, Estados

Unidos da América, onde constava a maior novidade e avanço no tocante aos

direitos humanos. O que para a época era muito inovador.

Assim constava da carta em seu preambulo, o seguinte:

42

Nós, os povos das Nações Unidas, resolvidos a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimento indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, assim como das nações grandes e pequenas [...] (ALMEIDA; PERRONEMOISÉS, 2002, p.13).

Então, o fundamento dos direitos humanos, está na dignidade da pessoa

humana. A importância que a pessoa humana alcançou no direito

contemporâneo enquanto fundamento dos direitos humanos e de todo o direito

e de toda a possibilidade do estado exercer coerção, ou seja, só se restringe

liberdade humana em nome da liberdade humana. Dignidade da pessoa

humana pode ser interpretada como liberdade, quanto realidade, marcada por

aspectos públicos e privados, pelo desafio de construir e seguir normas

próprias, então, um povo se realiza com dignidade quando ele pensa as suas

normas e vive de acordo com elas, uma pessoa do mesmo jeito.

Na atualidade, encontra-se também difundida a visão de que os direitos humanos se fundam no reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da espécie humana, entendidos como iguais em sua essência, não obstante qualquer peculiaridade física, mental ou intelectual ou qualquer outro aspecto de sua existência (PORTELA, 2015, p. 802).

Com isso, a defesa dos direitos humanos, ganhou força e partiu-se para

uma era de positivação de direitos, como se verá no item a arguir com a

Declaração Universal dos Direitos Humanos.

3 DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS

Os direitos humanos fundamentais, em sua concepção atualmente

conhecida, surgiram como produto da união de varias fontes, desde tradições

43

primitivas nas diversas civilizações, até a junção dos pensamentos

jusfilosóficos, das ideias surgidas com o cristianismo e com o direito natural.

Não é possível existirem direitos fundamentais sem que exista certo grau de

liberdade em um país. Apegando-se nessa explicação é que Schäfer

(2005,p.14) afirma que o Estado ao estar em um nível avançado de evolução

deve criar órgãos de controle e gestão que possam vincular o poder executivo

ao jurídico.

Assim, conhecida classificação doutrinária dos direitos fundamentais utiliza a evolução histórica enquanto elemento essencial à própria caracterização e individualização dos direitos fundamentais, considerando a progressiva afirmação da respectiva juridicidade [...]. Esta espécie de direito é obra da civilização jurídica e pressupõe a existência de uma forma política – o Estado – que „ordene a sociedade e assegure as suas condições de validade e de exercício, consoante as exigências dos tempos‟, partindo-se do modelo inicial (consenso sobre a limitação do poder) até o modelo atual (pluralismo democrático com efetiva interligação responsável entre Estado e cidadão) (SCHÄFER, 2005, p.14).

Há entendimentos de que os direitos fundamentais estão alicerçados em

três dimensões de forma a classificá-los. Nesse sentido é que Ingo W. Sarlet

(2003) menciona a existência dessas três dimensões existentes no direito

fundamental como forma de positivá-lo.

Para o autor os direitos de primeira dimensão são os relacionados à

liberdade e participação política livre da sociedade. Já como direitos de

segunda geração existem os direitos econômicos e direitos sociais e culturais.

Enquanto que os de terceira dimensão seriam os direitos de solidariedade e

fraternidade.

Nesse sentido, pode-se afirmar a existência das três dimensões dos

direitos fundamentais, confirmada também por Schäfer (2005), ao dizer os

direitos de primeira, segunda e terceira dimensões. Afirma ainda que existem

três elementos essenciais para a validade de existência dessas dimensões,

sendo a primeira a relação do Estado como os cidadãos. Em segundo lugar,

deve haver uma concepção política do Estado e ainda deve haver direitos no

Estado, ou seja, direitos de cunho coletivos e difusos além de individuais.

44

Segundo o entendimento de Sarlet (2003), os direitos de primeira

dimensão foram dominantes em meados do século dezenove, e diziam respeito

aos direitos de liberdade civis e também políticos, que ainda era crescente à

época.

Os direitos e liberdades individuais não tinham espaço garantido, pois a

monarquia imperava, e o surgimento desses direitos fundamentais, aliados ao

nascimento de um direito público, que visa a garantia de direitos coletivos, é

marcadamente a evolução da sociedade ocidental moderna constitucionalista.

Em se tratando dos direitos de segunda geração, está-se diante de

direitos, cuja pretensão e objetivos é a criação de garantias coletivas, e justiça

social, trazendo à tona os princípios de direito como os da igualdade e da

dignidade humana (BONAVIDES, 2002).

Os direitos de cunho sociais, almejados pelos povos de muitas nações

ao longo da história, são hoje uma realidade viva, no entanto, muito há o que

se fazer nesse sentido. As pessoas ao buscarem os direitos de terceira

geração esperavam ver cumpridas em suas vidas os anseios altruístas de bem

estar, vida sem misérias, e realmente de direitos políticos, sociais e culturais a

todos. Acontece que não foi isso que aconteceu, pois ao longo da história a

ganancia pelo capitalismo desenfreada, fez com que países inteiros se

dobrassem ao consumismo exacerbado.

Fazendo com que se esgotassem fontes naturais e também aumentasse

a desigualdade entre ricos e pobres, alargando ainda mais as distancias entre

as nações e povos e pessoas de um mesmo país.

3.1 Direitos humanos e direitos fundamentais

É recomendável breve explanação das diferenças entre os direitos

humanos e os fundamentais. Alguns doutrinadores compreendem os dois

temas como sinônimos, no entanto, a corrente majoritária entende que há

diferenças entre os institutos, as quais será explicitadas no decorrer do

presente capítulo.

45

Doutrinadores da corrente de defesa jusnaturalista, afirmam que os

direitos humanos derivam em sua essência da própria qualidade da pessoa

humana. Todavia, pode-se afirmar que esse entendimento restrinja o seu

significado, uma vez que acaba excluindo alguns direitos concernentes à

evolução do ser humano, como a social, política etc. Pela qual passou a

história humana.

Dessa forma, ao se conceituar “direitos humanos”, percebe-se que não

tem origem espontânea, mas sim, estabeleceu-se ao longo de muitos anos de

história humana. Foram necessários diversos acontecimentos e modificações

na vida social e política da sociedade. Assim, os atuais reconhecimentos

dispensados aos direitos humanos de que se tem notícia, demandam de uma

história de muitos massacres e tragédias, assim como lutas de muitos em

defesa dos seus direitos e de suas famílias.

De sorte que os direitos fundamentais não são criados ao acaso, esses

solidificam por meio da positivação do direito humano, ou seja, seria preciso

haver legislações protegendo certos direitos dos seres humanos para que

pudesse haver a criação e proteção dos direitos fundamentais.

Notadamente nos dias atuais, o termo a que se refere aos direitos

humanos está sendo muito utilizado para representar a série de direitos a que

os seres humanos estão submetidos internacionalmente, de outro modo o

termo direitos fundamentais é utilizado em questões locais, instalado em

ordenamentos jurídicos nacionais insculpidos nas suas constituições.

Dessa maneira é possível dizer que os direitos humanos evoluíram

muito no seu intento de buscar a proteção do ser humano em tese de

amplitude internacional e não ficam para trás os fundamentais que estão

insculpidos em diversos ordenamentos jurídicos positivos de diversos países.

No entendimento de Ingo Wolfgang Sarlet, direitos fundamentais são:

[...] o termo direitos fundamentais se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão direitos humanos guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte

46

que revelam um inequívoca caráter supranacional ( 2005, p.45).

Dessa feita, poder-se-ia utilizar-se da expressão direitos humanos, no

sentido de mencionar o nascimento desses direitos ou ainda quando

começaram a ser reconhecidos. Já para mencionar o surgimento dos direitos

fundamentais é quando estes surgiram na positivação dos direitos.

3.2 Direitos fundamentais e suas dimensões

Observando um pouco mais a fundo o instituto dos direitos humanos, os

estudos levam a entender que houve um lento e progressivo processo de

afirmação desses direitos na história humana, esse processo de entrada dos

direitos no mundo do direito positivo se deu de forma gradativa.

Percebe-se com o decorrer da análise do instituto dos direitos

fundamentais, que este variam muito de acordo com o Estado onde estão

sendo positivados. Ainda, que esses direitos, não são os mesmos em todos os

tempos históricos, uma vez que houve gradativa e progressiva evolução

desses direitos.

Dessa feita, é possível entender que os direitos fundamentais seriam

uma forma de herdeiros dos direitos humanos, desenvolvidos durante muitos

anos no decorrer da história humana.

Os direitos fundamentais no Brasil, passaram por diversas modificações

ao longo da história recente nacional e ultrapassou barreiras como as diversas

Constituições Federais, inclusive rompendo algumas barreiras especificas

como a ditadura militar, momento em que houve grande repressão desses

direitos.

Com isso, a evolução desses direitos não diz respeito apenas a seu

conteúdo, mas também à sua titularidade, fazendo com que seja eficaz e

efetivo no ordenamento jurídico.

Assim sendo todos os acontecimentos nessa seara tiveram como efeito

as denominações concedidas pelos doutrinadores, que assim, determinaram a

47

chamar esses direitos fundamentais como sendo de três gerações, os quais

serão tratados nos próximos tópicos.

3.2.1 Direitos fundamentais de primeira dimensão

Ao longo da história é possível notar que o poder econômico e social

sempre estiveram nas mãos de poucas pessoas, da monarquia. Ao longo dos

anos a nova classe social chamada de burguesia, que detinha poder

econômico mas não poder social, sentiu-se irrelevante diante do poder Estatal,

que os privava das facilidades concedidas ao Clero.

Não contentes com os acontecimentos a classe burguesa da época

tentava mostrar-se por meio de ideais inovadores considerados iluministas,

principalmente ao que se referia à liberdade das pessoas e também ao que diz

respeito às propriedades, limitando dessa forma de certo modo o poder do

Estado diante da vida privada, essa intervenção burguesa no cotidiano estatal,

claramente interrompeu as metas tanto econômicas quanto políticas do Estado.

Nesse momento da história iniciaram-se discussões acerca dos ditos

direitos de cunho próprio de cada indivíduo, tomando bases de grande

expressão no que diz respeito primordialmente os direitos que dizem respeito à

liberdade e a vida assim como à igualdade e propriedade nos ditames da lei.

Com isso, surgiram não só liberdades de cunho civil como por exemplo a

liberdade de imprensa, mas também as liberdades tratadas como de cunho

políticas, que seriam, por exemplo, o direito ao voto universal.

Dessa forma, é razoável entender-se haver a existência de uma sinuosa

separação entre sociedade e Estado. Assim, em resumo, é possível dizer que

os chamados direitos fundamentais de primeira dimensão vieram à tona para

limitar o Estado em suas auspiciosas autuações de contra à sociedade.

Lembo, afirma ao dizer:

São os direitos elaborados (visualizados) pelo pensamento liberal e procuram obstar a ação do Estado contra as pessoas. Essa geração de direitos busca preservar a vida, a integridade

48

física, a liberdade, a dignidade, a intimidade e a inviolabilidade do domicilio (2007, p. 15).

No mesmo sentido, esses direitos surgem para contrapor aos mandos e

desmandos do Estado que agia unilateralmente sem consulta ao povo, esses

direitos serviriam como direito à defesa em demasiada atuação estatal que

estivesse em desacordo com os preceitos humanos e legais.

Com isso, esses direitos poderiam ser traduzidos, em termos atuais

perante a Constituição Federal, como sendo os direitos à vida, liberdade e

igualdade esculpidos no artigo 5º. No mais, direitos tidos como nascidos por

meio desses direitos fundamentais, por exemplo os direitos de manifestar-se

livremente contidos em nossa Constituição Federal, como por exemplo os

contidos no artigo 5 inciso IV, ainda os direitos de associar-se contido no

mesmo artigo inciso, XVII e também os direitos ao voto contido no artigo 14 da

Carta Magna.

Diante desse entendimento, percebe-se que a independência de forma

negativa perante ao Estado é que caracteriza esses direitos de primeira

dimensão. Sim, porque a forma positiva é a forma legal de estatização, e esses

direitos vieram em contraponto ao direito positivo até então correto emanado

do Estado, no intuito de criar uma saída democrática para os problemas de

falta de liberdade.

Com o passar dos tempos esse modelo de direitos fundamentais de

primeira dimensão, já não se mostrava tão efetivo surgindo daí os direitos

fundamentais de segunda dimensão.

3.2.2 Direitos fundamentais de segunda dimensão

É de conhecimento histórico que em meados do século XVIII os direitos

fundamentais de primeira dimensão se apresentaram fortemente frente ao

poder estatal. De forma a defender os direitos políticos e civis. Ao chegar o

momento do impacto da industrialização e com ocorrência de diversos tipos de

problemas sociais graves, não mais bastava a conquista de outrora dos direitos

49

de primeira dimensão. Buscava-se então uma forte intervenção da sociedade

em prol da justiça social.

Já em meados do século XX, surge então uma nova estrutura de ordem

social que baseava-se em direitos de liberdade social e não apenas em bases

individualistas ocorridas na dimensão anterior. O que no entendimento de

Sarlet (2010) deveria incluir-se nesses as liberdades sociais.

Com a firmação de direitos sociais e a busca pela sua positivação, assim

como direitos a cultura e ao poder econômico no século XX, instaura-se então,

a fase tida como do bem-estar social, nova para a época. A partir de então o

Estado teria o dever de satisfazer de alguma forma por meio de políticas

públicas, melhorias esperadas pela sociedade (BONAVIDES, 2004).

Passe-se a partir de então, a exigir do Estado uma atuação mais forte

junto à sociedade de modo que garanta haver a intervenção do Estado na vida

privada, dessa forma a demonstrar o seu positivismo.

Mesmo diante de um cunho “positivo” ao invés do “negativo” obtido por

meio dos direitos fundamentais de primeira dimensão, vale lembrar, assim

como os conhecidos direitos de primeira geração, fundamentais, não é

diferente com os sociais que buscam atingir ao indivíduo.

Em nossa Carta Magna de 1988 aplicou-se em um capitulo exclusivo o

assentamento dos direitos tidos como sociais, assim no artigo sexto da CF

estão denominados os direitos como saúde e moradia.

Dessa maneira, o direito essencial à saúde e educação, por exemplo,

estão presentes já não é de hoje em nossa sociedade, existindo esses direitos

e necessitando da prestação positiva Estatal desde o século vinte.

3.2.3 Direitos fundamentais de terceira dimensão

Tendo em vista os feitos e acontecimentos havidos após a Revolução

Francesa que pregava como liberdades humanas a igualdade e fraternidade, é

sabido que neste momento de estudo dos direitos fundamentais em sua

terceira dimensão há enorme ocorrência de sentimento de irmandade o que

satisfaz o ser humano enquanto único individuo que busca seu lugar ao mundo

e alimenta seu ego como titular de direitos. Sente-se assim útil à sociedade e

50

busca nesse momento a defesa de direitos do todo e não mais de seu cunho

individual, neste momento há uma busca pela defesa dos direitos do povo

enquanto tido como nação.

É em suma uma maneira de estreitar as relações e minimizar a distância

entre as pessoas não havendo de certo modo barreiras físicas ou econômicas.

Nada mais é do que um modo de enxergar as dificuldades entre países em

desenvolvimento e os desenvolvidos.

Assim é que se podem mencionar como exemplos, os direitos advindos

dessa terceira dimensão de direitos fundamentais, como por exemplo, os

direitos que temos ao desenvolvimento sustentável financeiro, ambiental e

humano, obviamente não fica de fora o direito à paz entre as nações e povos

dos mais diversos e longínquos, também o direito de defesa ao patrimônio

histórico da humanidade e de propriedade privada, pois todos podem adquirir

seu patrimônio e tê-lo protegido pelo direito positivo para que ninguém possa

interferir. Há também o direito de expressão, comunicação de diversos modos,

direito a falar e criticar em um modo democrático.

Diante do exposto é que ensina sobre isso a doutrina de Sarlet que,

segundo preleciona Ingo Wolfgang Sarlet, quanto a positivação desses direitos:

a maior parte desses direitos fundamentais da terceira dimensão ainda não encontraram seu reconhecimento na seara do direito constitucional, estando, por outro lado, em fase de consagração no âmbito do direito internacional, do que dá conta de um grande número de tratados e outros documentos transnacionais nesta seara” (2007, p. 117).

Apressadamente, pode-se dizer que essa fase dos direitos fundamentais

busca nada mais, senão o desenvolvimento enfrentando-se qualquer barreira

para sua real efetivação. “Pode-se afirmar que essa geração reconhece seus

direitos fundados no princípio da solidariedade” (BONAVIDES, 2005, p. 561).

51

4 DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

Como se sabe a história da humanidade foi marcada por absurdos

humanitários. Onde imperava o poder e o reinado. Não havia lugar para

manifestações nem para liberdade de expressão, assim como não havia lugar

para que se falasse em direitos humanos. Uma das poucas coisas que vigiam

na antiguidade era o direito a propriedade e mesmo assim era muito relativo. A

partir de revoluções de burgueses contra o poder imperativo do Estado, houve

um abrandamento por parte do Estado permitindo a entrada de mais

manifestações acerca dos direitos humanos. Mas o momento mais correto que

se pode afirmar ter havido a entrada dos direitos humanos com fidelidade é a

partir do século vinte. Mais especificamente com a criação da Organização das

Nações Unidas.

A Declaração é o ponto de partida da construção do atual sistema internacional de proteção aos direitos humanos. Nesse sentido, suas normas são percebidas como o parâmetro mínimo de proteção da dignidade humana, a ser observado por todos os povos do mundo e efetivado por indivíduos e entidades publicas e privadas, internacionais e nacionais (PORTELA, 2015, p. 837).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos considera todos os

direitos humanos em sua unidade, pois os direitos humanos econômicos,

sociais e culturais não são de maneira alguma de segunda classe. Mais do que

isso, o direito à educação ou à alimentação é considerado um pré-requisito

para a percepção dos direitos políticos. A declaração formalmente reconheceu

esses dois tipos de direitos, onde os civis e políticos estão mais atrelados, as

liberdades individuais e os econômicos, sociais e culturais, estão mais

atrelados ao ideal de igualdade social, a Declaração Universal dos Direitos

Humanos firmou uma concepção de direitos humanos que entende que não dá

para priorizar um desse tipos de direitos. Por conseguinte, não se podem

separar dos direitos humanos, ou seja, não tem como realizar a liberdade dos

indivíduos em um contexto que não prioriza a igualdade social e não tem como

ter igualdade social se esses indivíduos não forem livres. Essa é uma

empreitada que se faz em reciprocidade.

52

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada por

unanimidade e sem qualquer reserva ou questionamento. Consolida a

afirmação de uma ética universal, consagra um consenso sobre valores de

cunho universal a serem seguidos pelos Estados. Essa declaração não possui

reserva, ou seja, ela foi aprovada por unanimidade e sem reserva. Consagra

um consenso sobre valores, é importante essa carga valorativa da declaração

universal, ela é um conjunto de normas que expressa valores e é justamente

nesse sentido que ela é um dos instrumentos de ruptura com o positivismo de

reaproximação entre o direito e moral.

A declaração exalta, principalmente, a dignidade da pessoa humana

como preceito básico para todas as comunidades internacionais.

A Declaração é baseada em princípios que orientam a aplicação do Direito Internacional dos Direitos Humanos como um todo, como o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis como o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo; o fato de que o desrespeito pelos direitos do homem resultou em atos bárbaros; o entendimento de que a proteção da liberdade e do bem-estar do ser humano adquiram o caráter de prioridade na ordem internacional; e o compromisso dos Estados e das Nações Unidas em promover a aplicação dos direitos humanos (PORTELA, 2015, p. 837).

Essa declaração, estabelece como já dito, uma série de questões a

serem cumpridas pela sociedade, isso porque não é apenas o poder público o

detentor desse desenvolvimento de políticas relacionadas ao ser humano, mas

todos estão ou devem estar engajados nesse sentido.

As disposições da carta de direitos humanos, foram introduzidas no

Brasil por meio da Constituição Federal de 1988 ao inserir direitos

fundamentais como inalienáveis e vedados a qualquer intervenção estatal,

justamente na parte de direitos e garantias fundamentais do ser humano.

53

CAPÍTULO III - DIREITO PENAL DO INIMIGO

1 CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

Todo direito se encontra vinculado à autorização para o emprego da

coação, onde esta é mais intensa no Direito Penal. Consequentemente,

argumenta-se que qualquer pena é dirigida a um inimigo. Sendo assim, as

relações entre as pessoas é mediante um contrato, que se entende que a

pratica do delito infringe este, de maneira que o delinquente não participa dos

seus benefícios, estando fora da relação jurídica como o cidadão comum.

Afirma Rosseau “que qualquer malfeitor que ataque o direito social deixa de ser

membro do Estado, posto que se encontra em guerra com este, como

demonstra a pena pronunciada contra o malfeitor” (apud JAKOBS; MELIÁ,

2005, p. 25, 26).

A discussão a respeito do Direito Penal alemão no ano 1985, levou

Günther Jakobs a notar e criticar o desenvolvimento de um “Direito Penal

parcial que se instalava no ordenamento e que assim se denominou como

Direito Penal do Inimigo” (MORAES, 2011.p.190).

O Direito Penal do Inimigo começou a ser defendido, com esta

denominação, por Gunther Jakobs, renomado doutrinador alemão em meados

de 1985, porém, sua tese não obteve grande destaque, mas se iniciava a

discussão do tema.

Na Conferência do Milênio em Berlim no ano de 1999, com muito mais

publicidade, Jakobs transformou suas anteriores críticas em defesa, trazendo

então para todos, o conceito definitivo de Direito Penal do Inimigo. Desse

modo, o que se notou foi que, em um primeiro momento, em 1985, a crítica se

sustentava por ser a aplicação do Direito Penal do Inimigo mais amplo para o

sistema jurídico Penal, e já em 1999 se destacou por ser, segundo Jakobs, a

aplicação somente para reprimir e combater delitos de grande risco.

54

Com os constantes atentados terroristas, especialmente nos Estados

Unidos, é que se acirrou o verdadeiro debate em relação ao tema.

Jakobs defende nesta teoria a necessidade de separar os delinquentes

em duas categorias, quais sejam: a dos que ainda podem se recuperar e a dos

que se tornaram inimigos do Estado. Em seus estudos, fez questão em separar

o que ele denominou de inimigos dos cidadãos, chegando até mesmo a dizer

que eles se quer poderiam ser considerados como pessoa. Defendeu que o

Direito Penal do cidadão não poderia se misturar com o do inimigo, porém, a

ocorrência dos dois no mesmo ordenamento pode ser legítima .

Para sustentar sua tese, Jakobs distingue o que seria o Direito Penal do

Inimigo do Direito Penal do cidadão, onde o último seria um Direito Penal

garantista com aplicação de princípios fundamentais, o que não seria

observado no primeiro, de forma que os que forem tratados como inimigos não

teriam a submissão do mesmo Direito Penal garantista, mas sim de um com

mais rigor. Em 2003, Jakobs publica o trabalho denominado de “Derecho Penal

Del Cuidadano y Derecho Penal Del Enemigo” deixando evidente seu

posicionamento que era da aplicação do Direito Penal do Inimigo somente em

casos excepcionais, para a aplicação da teoria em casos relacionados ao

terrorismo levando em conta os ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova

York.

Atualmente o Direito Penal do Inimigo pode ser considerado como a

terceira velocidade do Direito Penal, de forma que segundo Silva Sánchez o

Direito Penal sofre um processo de expansão, onde podem-se notar três

velocidades.

A primeira se sustenta como sendo aquela considerada como tradicional

onde se visa à proteção das pessoas e tem como principal característica a

pena privativa de liberdade; já a segunda não há mais a aplicação das penas

privativas de liberdades por serem substituídas pelas restritivas de Direito e a

multa; e por último a terceira velocidade que seria uma junção das duas

anteriores, de forma que esta visa à privação de liberdade com restrições de

algumas garantias.

Jakobs se baseou em grandes filósofos como Jean Jacques Rousseau,

Thomas Hobbes, Johann Gottlieb Fichte e Emmanuel Kant para amadurecer e

validar sua teoria.

55

1.1 Alguns fundamentos filosóficos

A Teoria do Direito Penal do Inimigo têm fundamento filosófico em

Rousseau, onde considera-se inimigo aquele que infringir o contrato social,

deixando de ser membro do Estado e entra em guerra com ele, devendo

morrer como inimigo; em Fichte, que sustenta que quem abandona o contrato

do cidadão, perde todos os direitos concedidos por esse; em Hobbes, que

defende que nos casos de alta traição contra o Estado, deve o indivíduo ser

julgado como inimigo; e em Kant, segundo o qual aquele que ameaça

constantemente a sociedade e o Estado, e não aceita o “estado comunitário-

legal”, deve ser tratado como inimigo.

Para Rosseau e Fichte, todo delinquente é, de per si, um inimigo; para Hobbes, ao menos o réu de alta traição assim o é. Kant, quem fez uso do modelo contratual como idéia reguladora na fundamentação e na limitação do poder do Estado, situa o problema na passagem do estado de natureza (fictício) ao estado estatal (JAKOBS; MELIÁ, 2005, p. 28).

Por essa concepção, há uma separação radical entre o cidadão e o

inimigo que é extremamente abstrata, ou seja, de difícil mensuração. No

entanto, inicialmente, o ordenamento jurídico deve manter o criminoso dentro

do Direito, por duas razões: o delinquente pode se ressocializar, com isso

manter seu status de cidadão. Por outra razão, o delinquente tem o dever de

reparar o dano causado, onde não seria possível se fosse tratado como

inimigo, retirando-o do convívio social.

Hobbes e Kant conhecem um Direito Penal do cidadão, contra pessoas

que não delinquem de maneira reiterada por princípio e um Direito Penal do

Inimigo contra quem delinque por princípio.

1.2 A expansão penal – Direito Penal simbólico e punitivismo

Este termo é utilizado por Silva Sánchez que resume as principais

características da política criminal praticada na atualidade. Essa expansão se

compreende pela maximização da tutela penal, com um aumento considerável

56

dos tipos penais. Dessa forma, o Direito Penal do Inimigo é uma espécie. Neste

sentido Meliá leciona que, com efeito:

[...] pode ser adequado que o fenômeno mais destacado na evolução atual das legislações penais do mundo ocidental está no surgimento de múltiplas figuras novas, inclusive, às vezes, do surgimento de setores inteiros de regulação, acompanhada de uma atividade de reforma de tipos penais já existentes, realizada a um ritmo muito superior ao de épocas anteriores. (JAKOBS; MELIÁ, 2005, p. 56).

As atuais tendências expansionistas do Direito Penal são por meio de

politicas criminais simbólicas e punitivistas, sob a perspectiva da sociedade de

riscos em que se vive.

Nesse sentido, Moraes (2011, p. 331):

A sociedade moderna é caracterizada pelo individualismo de massas, pela mudança do sistema de organização e de comunicação, assim como pela globalização, traços preponderantemente responsáveis pela formatação da “sociedade de riscos”, onde a sensação de insegurança coletiva convive com novos bens jurídicos alçados à tutela do Direito (como os interesses difusos), desencadeando a descodificação do Direito, a hipertrofia e irracionalidade legislativa.

A consequência principal desses riscos é o aumento da insegurança da

população. Portanto, exige-se do Estado respostas frente aos perigos pelos

quais os cidadãos estão expostos constantemente. Dessa forma, diante das

cobranças da sociedade, potencializados pela mídia de massa com espetáculo

criminalístico e a “reação populista dos políticos traduz-se em politicas

criminais punitivistas e puramente simbólicas”, como respostas ao clamor

popular, sem efetividade solucionadora dos problemas da criminalidade.

(FERREIRA, 2014, p. 166).

Com isso, essa expansão punitiva é uma reunião entre os interesses da

classe jurídica, politica e da mídia, como a única solução possível para o

57

aumento da criminalidade e, ainda, como a solução para as complexas

relações da sociedade. Conforme ensina Andrade (2003, p. 26), in verbis:

A expansão punitiva – maximização do espaço da pena – é apresentada em espetacular orquestração jurídica, politica e midiática, com o mesmo absolutismo com que a globalização neoliberal se apresenta, a saber, como caminho único, seja como pretensa solução para o combate à maximização da criminalidade e obtenção de segurança; seja como solução para uma infinidade de problemas complexos e heterogêneos entre si [...] de tal modo que se pode propriamente falar de um fundamentalismo punitivo, por analogia a outros de nosso tempo como religioso, o econômico e politico.

Para Meliá (JAKOBS; MELIÁ, 2003), a expansão do Direito Penal se

resume em dois fenômenos, quais sejam: “Direito Penal simbólico” e o

“ressurgir do punitivismo”.

É importante destacar que, atualmente, tem-se a idéia de que para ser

feito justiça, tem que existir um sistema penal, com um resultado concreto e

mensurável.

Apesar do termo “simbólico”, não deve-se confundir com os fenômenos

de neocriminalização que os críticos, afirmam que possuem efeitos,

simplesmente, simbólicos, onde não há punição. Neste sentido, “quem

relaciona o ordenamento penal com elementos simbólicos pode criar a suspeita

de que não considera a dureza muito real e nada simbólica das vivências de

quem se vê submetido à persecução penal, detido, processado, acusado,

condenado, encarcerado” (JAKOBS; MELIÁ, 2005, p. 58).

Com isso, se verifica que os fenômenos de caráter simbólico tem uma

estreita relação com o Direito Penal. Desta forma, Meliá discorre que “é

incorreto o discurso do Direito Penal simbólico como fenômeno estranho ao

Direito Penal” (JAKOBS; MELIÁ, 2005, p. 58).

Quando o conceito de Direito Penal simbólico é utilizado para fazer uma

crítica, diz respeito a determinados agentes políticos que visam dar uma

impressão tranquilizadora a sociedade, ou seja, criação de normas claramente

destinadas a não serem aplicadas.

58

Fica claro que esses dois fenômenos, Direito Penal simbólico e

punitivismo, não estão sujeitos de ser separados nitidamente, pois estão

intrinsecamente ligados. Pois, conforme Meliá leciona:

Assim, por exemplo, quando se introduz uma legislação radicalmente punitivista em matéria de drogas, isso tem uma imediata incidência nas estatísticas da persecução criminal (isto é, não se trata de normas meramente simbólicas, de acordo com o entendimento habitual) e, apesar disso, é evidente que um elemento essencial da motivação do legislador, na hora de aprovar essa legislação, está nos efeitos «simbólicos», obtidos mediante sua mera promulgação. E ao contrário, também parece que, normas que em princípios poderiam ser catalogadas de «meramente simbólicas», possam ensejar um processo penal «real» (JAKOBS; MELIÁ, 2005, p. 64).

Em outros termos, o Direito Penal simbólico é aquele que tem reputação

de ser excessivamente rigoroso e por esse motivo acaba sendo ineficaz na

prática, por trazer meros símbolos de rigor excessivo que, efetivamente, caem

no vazio, diante de sua não aplicação efetiva, justamente pelo fato de ser tão

rigoroso. Essas leis de cunho simbólico trazem uma forte carga moral e

emocional que acaba por revelar a intenção latente das Instituições de modo

que, com a ajuda do sensacionalismo midiático, em manipular a opinião

pública, ou seja, implantar perante a sociedade uma falsa idéia de segurança.

Esta é a origem da legislação penal de exceção, onde se fere se

flexibilizam os direitos e garantias fundamentais, justificada pelo olhar do senso

comum, devido à atuação das organizações criminosas, objetivando a proteção

da sociedade. Legislação penal de exceção em virtude da existência de uma

reivindicação da opinião publica frente ao caso concreto, sem realmente buscar

a solução para o problema, ou seja, meramente simbólica (FERREIRA, 2014).

Destaca-se, também, com efeito, no senso comum, a dicotomia entre os

homens de bem, que vivem de acordo com os valores aprendidos e os homens

maus, que não vivem de acordo com os ditames impostos e em crescente

expansão. Essa distinção remete desde a história primitiva da civilização, que é

representada pelo maniqueísmo. Com isso a função primordial do sistema

penal seria o controle das condutas do homem mau, ou seja, a criminalidade

59

visando garantir a proteção do homem bom. Nesse sentido, Andrade (2003, p.

20), leciona:

Existe uma representação simbólica profunda, que acompanha a historia da civilização e do controle social, e que subjaz a estruturas e organizações culturais do nosso tempo (como belicismo, capitalismo, patriarcalismo, racismo) e através delas se materializa, potencializando, com seu tecido bélico, especificas bipolaridades: esta representação é o maniqueísmo, uma visão de mundo e de sociedade dividida entre o bem e o mal, [..].

A explicação desse senso comum se fundamenta no livre-arbítrio ou na

liberdade de vontade. Dessa forma, tudo se origina no sujeito, pela qual, se sua

bondade ou maldade são determinantes de sua conduta. Com isso, as

instituições, as estruturas e a sociedade em geral se isentam de culpa. Como

consequência os sujeitos rotulados como criminosos podem ser duplamente

culpados: seja por dificultarem a construção de sua própria cidadania, onde se

deduz que poderia escolher o bem, pelo seu livre-arbítrio; ou dificultando o

exercício pleno da liberdade alheia. Então, “[...] quanto mais se anuncia o

aumento e o alarma [brado] da criminalidade, mais se anuncia o aumento da

culpabilização punitiva: o mercado da culpa e da responsabilidade individual e,

portanto, do Direito e do sistema penal [...] é inesgotável”, onde uma sociedade

construída dessa forma, com essa divisão, entre o bem e o mau, “será

perpetuamente seletiva, tão inalcançável para o mundo do mal quanto de

questionável conteúdo para o acessível do mundo bem” (ANDRADE, 2003, p.

21).

Dessa forma, da união do punitivismo, como idéia de expansão da pena

como único instrumento de controle da criminalidade e a combinação com o

Direito Penal simbólico, por meio da tipificação penal como mecanismo de

criação de identidade social surge o Direito Penal do Inimigo (JAKOBS; MELIÁ,

2005).

1.3 Garantismo penal versus Direito Penal do Inimigo

60

A doutrina do garantismo penal foi iniciada pela escola clássica com um

forte pensamento penal liberal e é utilizada até os dias atuais, onde, dessa

forma, um dos grandes expoentes é o juris-filósofo italiano Luigi Ferrajoli, que

apresenta um modelo de aplicação da lei penal adjetiva, objetivando a

ampliação da liberdade do homem em razão do aumento da restrição do poder

estatal. É uma solução para a histórica divergência entre liberdade do homem e

poder estatal. Meio termo entre diminuir o poder punitivo do Estado e aumentar

a liberdade do cidadão, como resposta ao exagerado poder punitivo conferido

ao Estado, ou seja, equilibrio entre o abolicionismo penal (defesa da liberdade

selvagem do homem por meio da restrição do poder estatal) e o Estado Liberal

(que age com excesso no direito de punir).

Nesse sentido, Zaffaroni diz:

O Direito Penal de garantias é inerente ao Estado de direito porque as garantias processuais penais e as garantias penais não são mais do que o resultado da experiência de contenção acumulada secularmente e constituem a essência da capsula que encerra o Estado de policia, ou seja, são o próprio Estado de direito (2014, p. 173).

No pensamento de Ferrajoli, o garantismo penal, inicialmente, se

apresenta “como doutrina filosófica-política utilitarista de justificação do ramo

jurídico-penal a partir de um ponto axiológico externo, consistente na tutela dos

direitos fundamentais de todos [..]”, ou seja, garantismo penal é o instrumento

aceitável na luta para redução da violência na sociedade. Em consequência,

também, aplica-se “como uma teoria jurídico-normativa das garantias penais e

processuais, fundando um modelo de Direito Penal mínimo, voltado para a

tutela dos direitos fundamentais” (FERREIRA, 2014, p. 157).

A teoria normativa do garantismo penal consiste, em sua essência, em

um esquema facilitador de identificação do desvio penal na busca de garantir o

máximo grau de limitação do poder punitivo e de tutela da pessoa contra

abusos desse poder. Basicamente, esse esquema, é formado por dois

elementos: um relacionado ao tipo penal positivado e o outro relativo ao

processo penal, buscando a comprovação do delito praticado, os quais

“correspondem a singulares conjuntos de garantias penais – as garantias

61

processuais e as garantias processuais – do sistema punitivo que

fundamentam”, dessa forma, preservam-se ao máximo a liberdade individual e

os direitos fundamentais, principalmente contra abusos na persecução penal

(FERREIRA, 2014, p. 158).

Diametralmente oposto, não é o ocorre com o Direito Penal do Inimigo

que segundo Jakobs (JAKOBS; MELIÁ, 2005), se caracteriza por três

elementos: amplo adiantamento da punibilidade; penas previstas são

desproporcionalmente altas e; determinadas garantias processuais são

relativizadas ou suprimidas, que serão estudadas mais a frente.

Muñoz Conde designa Direito Penal do Inimigo como Direito Penal

bélico, principalmente após o 11 de setembro de 2011, considera que:

originou um “incremento da violência e de luta contra o terrorismo” de tal modo que “está a modificar a imagem de Direito Penal de Estado de Direito, como um Direito respeitoso das garantias e dos direitos fundamentais do cidadão, transformando-a em uma imagem de um Direito Penal bélico, [...] em que as garantias praticamente desaparecem para converter-se exclusivamente em um instrumento que procura toda a segurança cognitiva, por cima de qualquer outro valor ou direito fundamental” (apud VALENTE, 2010, p. 21).

2 DIREITO PENAL DO CIDADÃO X DIREITO PENAL DO INIMIGO

Ao definir o que seria um e o que seria outro Jakobs utilizou das teorias

de Rosseau, Fichte, Hobbes e Kant. Para os filósofos Rosseau e Fichte ,

basicamente, todos aqueles que delinquirem não poderiam ser tratados como

cidadãos, porém Jakobs, absteve dessa definição por dois motivos por ele

elencados, sendo o primeiro a ressocialização do delinquente, e para isso se

torna necessário manter o status de pessoa; e o outro seria o de reparação.

Já para Hobbes e Kant, somente poderão ser tratados como Inimigos

aqueles que, por sua vontade, trair o contrato social (Hobbes) ou não se

sujeitar a constituição cidadã (Kant). Jakobs se aproximou mais da definição de

Kant em sua definição, pois para ele o Inimigo não estaria totalmente excluído

62

de todos os Direitos, caso que acontece na concepção de Hobbes em relação

aos grandes traidores. Assim Jakobs utilizaria como base jus filosófica as

teorias de Hobbes e Kant, tendo em vista que de Hobbes ele tem o conceito de

que o Inimigo é aquele que trai a constituição do estado, e a de Kant extraiu

que o Inimigo é aquele que fere a manutenção da ordem social.

Jakobs, assim como Hobbes e Kant, defende a existência de duas

tendências opostas do Direito Penal, que embora estejam no mesmo plano

jurídico, se contrapõem: Direito Penal do Cidadão e Direito Penal do Inimigo.

Ao primeiro, com a tarefa de garantir a vigência da norma como expressão de

uma determinada sociedade, enquanto que ao segundo cumpre a missão de

eliminar perigos.

Desse modo, só é considerada pessoa (Direito Penal do Cidadão)

aquele que oferece “uma garantia cognitiva suficiente e um comportamento

pessoal, tendo como consequência a idéia de que toda normatividade

necessita de uma cimentação cognitiva para poder ser real ” (JAKOBS; MELIÁ,

2005, p. 45).

Distintamente, tem-se como inimigo aquela pessoa que não oferece

garantias cognitivas de que irá ser fiel a norma, com isso, por não aceitarem as

regras do Estado de Direito, não podem gozar dos benefícios que ele oferece

aos cidadãos legítimos. Sendo assim, não faz jus ao procedimento penal legal,

e sim a um procedimento de guerra.

Tem-se como exemplo de inimigos: criminosos econômicos, terroristas,

delinquentes organizados, autores de delitos sexuais, entre outros.

Para Jakobs “não se trata de contrapor duas esferas isoladas do Direito

Penal, mas de descrever dois pólos de um só contexto jurídico-penal”

(JAKOBS; MELIÁ, 2005, p. 21).

Em outras palavras, o Direito Penal do Inimigo visa à separação do

cidadão de bem e do inimigo, onde àquele é disponibilizado o Direito Penal do

cidadão, que é determinado através de um instrumento de controle social, por

meios de penas restritivas de direitos, dando a ele o direito de reintegração. O

segundo, já é tratado como inimigo, pois, não consegue se adequar à vida em

sociedade, configurando-se como transgressor contumaz da norma, cabendo-

lhe a coação como a única forma de combate ao seu comportamento

inadequado, e ainda, devido a sua periculosidade.

63

Dessa forma, Moraes (2011, p. 167) define:

Criminosos econômicos, terroristas, delinquentes organizados, autores de delitos sexuais e de outras infrações penais perigosas são os indivíduos potencialmente tratados como „Inimigos‟, aqueles que se afastam de modo permanente do Direito e não oferecem garantias cognitivas de que vão continuar fies à norma.

Portanto, para Jakobs, todos aqueles que não se submeterem a um

estado de cidadania não podem participar dos benefícios do conceito de

pessoa, sendo a eles aplicados o mesmo Direito Penal e processual Penal,

mas sim, com o próprio define, um Direito de guerra.

Por fim, Jakobs muito bem sintetiza essas duas tendências se utilizando

da função da pena onde “no Direito Penal do cidadão é a contradição, e no

Direito Penal do Inimigo é a eliminação de um perigo” (JAKOBS; MELIÁ, 2005,

p. 49).

3 PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DO DIREITO PENAL DO INIMIGO

O Direito Penal do Inimigo se caracteriza, principalmente pelo seu

modelo de politica criminal, onde Jakobs o caracteriza da seguinte forma: a)

ampla antecipação de punibilidade; b) falta de diminuição da pena proporcional

ao referido adiantamento; c) mudança da legislação penal para uma legislação

para confrontar à delinquência (MORAES, 2011.p.88).

No mesmo sentido, também, do pensamento de Jakobs, Meliá sintetiza

as características em três elementos básicos, da seguinte forma:

em primeiro lugar, constata-se um amplo adiantamento da punibilidade, isto é, que neste âmbito, a perspectiva do ordenamento jurídico-penal é prospectiva [...]. Em segundo lugar, as penas previstas são desproporcionalmente altas: especialmente, a antecipação da barreira de punição não é considerada para reduzir, correspondentemente, a pena cominada. Em terceiro lugar, determinadas garantias

64

processuais são relativizadas ou inclusive suprimidas. (JAKOBS; MELIÁ, 2005.p. 55)

Dessa forma, no ordenamento jurídico atual, de acordo com Moraes

(2011) é fácil identificar essas características, que se destaca: a antecipação

da tutela penal, a desproporcionalidade das penas e a relativização das

garantias penais e processuais.

3.1 A antecipação da tutela penal – adiantamento da punibilidade

A tutela penal antecipada ocorre em relação à tentativa e aos crimes de

perigo (concreto e abstrato), onde o Estado intervém no exato momento

antecedente à lesão, porém, somente quando se puder estabelecer relação de

proporcionalidade entre a aplicação da pena (lesão do direito à liberdade do

sujeito ativo do crime) e o perigo (probabilidade de lesão do bem jurídico

tutelado pela norma penal causado pela conduta incriminada).

Nas palavras de Roberto Lyra “a lei regulará a intervenção pré-delitual

com minúcia e prudência” (apud MORAES, 2011, p. 199).

A antecipação da tutela penal se caracteriza pela ampliação da

intervenção penal do Estado, devido, sua falta de planejamento do sistema

punitivo. Subdivide-se em: punição de atos preparatórios; os tipos de mera

conduta e os tipos de perigo abstrato (MORAES, 2011).

A idéia é afastar o Inimigo do bem jurídico tutelado, é combater o perigo,

assim se trata não da punição em si da conduta, mas sim, o afastamento do

delinquente para assegurar que não seja se quer começada a execução do ato,

ou ainda para assegurar a persecução penal, de forma que caso haja indícios

de início de execução e este não provado poderá o agente ser punido somente

pelos seus atos preparatórios.

É possível também citar a criminalização de condutas que favorecem

uma organização criminosa e alimentam sua subsistência e conservação.

Destaca-se neste tópico, que com o adiantamento da punibilidade o que se

quer é a punição dos atos preparatórios e dos delitos de mera conduta.

65

3.2 A punição de atos preparatórios e os tipos de mera conduta

Tratando-se do adiantamento da punibilidade, há bastante divergência e

polêmica doutrinária. A punição de mera conduta é de ordem preventiva, onde

nas palavras de Manoel Pedro Pimentel: “A idoneidade dessa conduta basta

para torná-la objeto de reprovação, por parte do legislador, em face da

presunção de dano ou de perigo, sendo indiferente que chegue ou não a

produzir qualquer resultado” (apud MORAES, 2011, p. 199).

Para Bianchini destaca-se a importância da antecipação de tutela penal

utilizando a criminalização de atos preparatórios, que “só se justifica quando se

estiver diante de bens de categoria muito elevada e, ainda assim, desde que a

descrição realizada na conduta típica seja inequívoca”, que, segundo o mesmo

autor, objetiva prevenir ações certamente “lesivas ou perigosas, mediante a

punição dos atos idôneos para comissão de outros crimes“ (apud MORAES,

2011, p.201).

Dessa forma, Greco (2011) define atos preparatórios como a seleção de

meios aptos a chegar ao resultado por ele pretendido e delitos de mera

conduta como sendo o simples comportamento previsto no tipo não sendo

exigido qualquer resultado.

Logo se deduz que a punição dos atos preparatórios e a tipificação dos

delitos de mera conduta são de ordem preventiva. Ao analisar o ordenamento

brasileiro é ampla a existência de tipos que punem apenas atos preparatórios,

como nos casos de quadrilha ou bando, associação para o tráfico, a posse de

instrumentos destinados usualmente à prática de furto, dentre outros exemplos.

Em outros termos, os tipos de mera conduta tipificam a simples ação ou

omissão para a consumação do crime.

Tem-se como exemplos de infrações de mera conduta na legislação

brasileira: abandono de função pública, ato obsceno, crimes falimentares,

desobediência, violação de domicilio, etc.. No caso de punição de atos

preparatórios destaca-se o artigo 291 do Código Penal, com tipificação de

apetrechos para falsificação de moeda; e a posse de objeto que possa servir à

prática de crime patrimonial (art. 25 da Lei das Contravenções).

66

3.3 Os tipos de perigo abstrato

Entende-se que o perigo abstrato é aquele presumido, que nas palavras

de Bitencourt (2012, p. 238), “o perigo não precisaria ser provado, pois seria

suficiente a simples prática da ação que se pressupõe perigosa”.

Defende-se a tipificação penal de crimes de perigo abstrato,

principalmente, pelos avanços da modernidade, que no entendimento de

Gomes e Bianhini “para que todo o planeta não corra riscos (ou não espere que

aconteçam catástrofes anunciadas), inclusive os inerentes ao processo de

globalização, o correto seria valer-se intensamente do Direito Penal (com toda

sua carga simbólica)” (apud MORAES, 2011, p. 203).

3.4 Previsão de penas abstratas mais altas

Segundo Gracia Martí (2007) é possível conceituar esta característica

como a desproporcionalidade da pena. Havendo a punição dos atos

preparatórios com o mesmo rigor de que se o fato fosse consumado, o que no

sistema brasileiro só há punição se não houver ao menos o começo de

execução (forma tentada). Para a teoria, a punição poderia ocorrer desde os

atos preparatórios, a qual seria punida da mesma forma, sem nenhuma

redução de pena, se o fato tivesse se consumado.

Com a não preocupação de Jakobs com a culpabilidade do indivíduo, se

percebe que se busca então a punição com base em um Direito Penal do autor

e não o do fato, como é o tradicional Direito Penal. Com o advento da Lei dos

Crimes Hediondos passa a ser um exemplo da aplicação do Direito Penal do

Inimigo, de forma que, o aumento de punição para alguns crimes, é

exatamente o que Jakobs quer com sua Teoria.

Como exemplo de penas abstratas mais altas têm-se o crime de evasão

mediante violência (art. 352 do Código Penal), em que a pena é a mesma para

evadir-se ou tentar evadir-se mediante violência.

67

3.5 A relativização ou exclusão das garantias penais e processuais

A relativização de garantias penais e processuais vem se fortalecendo,

objetivando o enfretamento por exemplo do crime organizado e, ainda, ajudar o

Estado em sua avaliação quanto às políticas criminais. Dessa maneira tem-se

que as características do Direito Penal do Inimigo como por exemplo o inimigo

não pode ser punido com pena, mas sim, com medida de segurança e ainda

que não deve ser punido de acordo com sua culpabilidade, senão consoante

sua periculosidade, ou as medidas contra o inimigo não olham prioritariamente

o passado (o que ele fez), mas sim, o futuro (o que ele representa de perigo

futuro), ou ainda não é um Direito Penal retrospectivo, mas sim, prospectivo.

Sendo ainda imperioso afirmar que o inimigo não é um sujeito de direito, sim,

objeto de coação e que o cidadão, mesmo depois de delinquir, continua com o

“status” de pessoa, conquanto que o inimigo perde esse “status” (importante só

sua periculosidade).

Esta é a característica em que surgem mais críticas, isso por se tratar de

um assunto mais delicado no mundo penal, tanto que ao analisar a

Constituição Federal de 1988 é vasto o número de garantias elencadas, como

o princípio da legalidade, a Presunção de Inocência, Devido Processo Legal,

dentre outros que na concepção de Jakobs sofre uma diminuição em sua

aplicação aos Inimigos (GRACIA MARTÍ, 2007).

Segundo Meliá (2009) é possível apresentar como crítica, no sentido de

que, com o Direito processual do Inimigo não se quer provar a ocorrência da

conduta delituosa, mas sim que tal indivíduo é um inimigo da sociedade, não se

tornando assim efetiva como o Direito Penal clássico.

O jurista espanhol Juan Damian Moreno afirma que já exista na

Espanha um processo que poderia ser denominado como Direito Processual

Penal do Inimigo, que possui como características a existência de uma fase

preliminar com a interferência de órgãos investigadores especiais a

possibilidade de recorrer a meios de investigação muito mais incisivos, como

agente encoberto, entre outros e a existência de um regime muito mais flexível

no que se refere a facilitar decisões como prisão preventiva,

incomunicabilidade do acusado (apud Moraes, 2011, p. 143).

68

Ao analisar algumas leis esparsas no Brasil, pode se notar a existência

desse processo Penal do Inimigo apontado pelo espanhol, tendo como

exemplo a Lei nº 9034/95 a qual trata sobre o crime organizado o qual em seu

artigo 2º permite à ação controlada (flagrante prorrogado), a interceptação

telefônica e a infiltração para o fim de investigação, também como, em seu

artigo 3º, a não concessão da liberdade provisória aos que tenha efetiva

participação na organização criminosa, dentre outras peculiaridades (GOMES,

2014).

4 A DOUTRINA QUE DEFENDE E CRITICA O DIREITO PENAL DO INIMIGO

A aplicação de um Direito Penal do Inimigo tem sido justificada como medida

necessária para o combate a certos tipos de crimes, que por sua gravidade,

propagou-se a certeza de que não encontram respostas eficazes na repressão

por medidas normais.

Quem defende o Direito Penal do Inimigo é o próprio criador Gunther

Jakobs, como acima ficou relatado, declarando que deve haver três pilares;

antecipação da punição do inimigo; desproporcionalidade das penas e

relativização e/ou supressão de certas garantias processuais; criação de leis

severas direcionadas à clientela (terroristas, delinquentes organizados,

traficantes, criminosos econômicos, dentre outros) dessa específica engenharia

de controle social (JAKOBS; MELIÁ, 2005).

Segundo Jakobs relata deve existir dois tipos de direito: o primeiro

voltado ao cidadão e o segundo voltado para o inimigo.

O primeiro continuaria a ter o “status” de cidadão e, uma vez que

cometesse um delito, teria o direito ao julgamento dentro do ordenamento

jurídico estabelecido e a voltar a ajustar-se à sociedade, com isso, dá-se

oportunidade de restabelecer a validade dessa norma de maneira coercitiva.

Nessa hipótese, o Estado não observa o sujeito como inimigo, mas sim apenas

como autor de um delito habitual, ainda que cometendo um ato ilícito perante a

sociedade sustenta seu papel de cidadão dentro do Direito.

69

Já o segundo seriam chamados de inimigos do Estado e seriam

adversários, representantes do mal, cabendo a estes um tratamento rígido e

diferenciado, ou seja, são autores de atos ilícitos, como delitos sexuais, ou pela

ocupação profissional, assim como criminalidade econômica, tráfico de drogas,

bem como a participação de uma organização criminosa, como por exemplo,

terrorismo. Neste caso, o sujeito se separou do direito, não produzindo uma

garantia cognitiva primordial para que ocorra o tratamento como se fosse um

cidadão comum, e desta forma deve ser tratado como inimigo, assim sendo,

perderia o direito às garantias legais, não sendo capazes de adaptar-se às

regras da sociedade, ficando sob a tutela do Estado, ou seja, perder-se-ia o

status de cidadão.

Zaffaroni não admite essa distinção, entre cidadão e inimigo, visto que,

“é intolerável a categoria jurídica de inimigo ou estranho no direito ordinário

(penal ou qualquer outro ramo) de um Estado constitucional de direito”. Nesse

mesmo sentido, para o mesmo autor, o inimigo “só é compatível com um modo

de Estado absoluto”. Só se admite em caso de guerra e, mesmo assim, não é

tido como inimigo, pois, deve ser respeitado as limitações impostas pelo direito

internacional dos direitos humanos (ZAFFARONI, 2014, p.12).

O Estado absolutista, para exercer seu poder punitivo, inventa uma necessidade justificadora quando ela existe e a nega quando existe. Nessa última pressuposição, a particular e nebulosa defesa da sociedade é mais importante do qua as vidas das pessoas que fazem parte dela (ZAFFARONI, 2014, p.85).

Para Jakobs, tudo se reduz na consideração de pessoa ou não pessoa,

de forma que para ele o inimigo não é uma pessoa, visto que o indivíduo não

se manteve num Estado Democrático de Direito, não podendo participar dos

benefícios dado ao conceito de pessoa. Uma questão ainda a ser considerada,

seria a diferença entre pessoa e indivíduo. O primeiro diz respeito à ordem, são

inteligentes, conduzindo-se pelas suas realizações e insatisfações, interesses e

etc. Já o indivíduo se encontra envolvido com a sociedade, tendo direitos e

obrigações como também proporcionando o mantimento da ordem.

70

É aplicado o devido processo legal a todo o sujeito que cometer um ato

ilícito, que em decorrência deste será dada uma sanção. Para o Estado, ao

inimigo não será aplicada à pena e sim uma medida de segurança - esta tem o

fim de combater o perigo.

Para caracterizar o inimigo, analisa-se a periculosidade deste, fazendo

uma comparação ao cidadão, analisa – se o ato ilícito, e verifica-se se o autor

do delito ainda possui condições de oferecer as garantias de um cidadão

comum, agindo com lealdade à norma jurídica. Já para o inimigo não se

oferece esta garantia, devendo ser condenado por sua periculosidade e não

conforme sua culpabilidade. Por fim o autor sustenta a idéia da separação do

Direito Penal do cidadão e o Direito Penal do Inimigo, o qual visa a resguardar

a legitimidade do Estado de Direito voltado ao cidadão. Sustenta, ainda, que o

Estado tem o direito de buscar a segurança diante dos inimigos, bem como os

cidadãos têm também o direito de exigir do Estado à referida segurança.

Para os defensores, seria irracional ao operador jurídico punir o

criminoso comum (cidadão) da mesma maneira que o inimigo, pois tratam-se

de sujeitos de natureza distinta. Enquanto o Cidadão, apesar de ter cometido

um crime, se mantem fiel ao Direito, o Inimigo afastou-se tanto da norma, que

não oferece garantias que voltará a comporta-se de acordo com o Direito.

A aplicação do Direito Penal do Inimigo seria destinada ao Inimigo,

sendo retirado dele os Direitos inerentes ao devido processo legal, mantendo-

se, de outra forma, as garantias jurídicas ao criminoso normal.

Com isso, introduz-se uma contradição permanente entre a doutrina que

admite e legitima e a doutrina que critica a aplicação do Direito Penal do

Inimigo e os princípios constitucionais do Estado de direito, no entanto, é claro

que aquele é incompatível com o Estado Democrático de Direito, bem como

defende ações contrárias aos Direitos Humanos. Dessa forma, trata-se de

Direito de exceção, que retira do sujeito garantias jurídicas já sedimentadas

nos ordenamentos jurídicos ocidentais.

Nesse sentido, por se tratar de sistema investigativo e repressivo que

sacrifica Direitos Fundamentais, sua existência é incompatível com a

Constituição Federal brasileira, devendo ser repelida qualquer ação ou ato

normativo que compartilhe do núcleo do Direito Penal do Inimigo.

71

5 ANÁLISE HISTÓRICA DO DIREITO PENAL DO INIMIGO NO BRASIL

Há muitos anos não existia nenhuma lei que regulamentasse as relações

sociais, em que cada um agia conforme suas vontades e entendimentos.

Quando se processou a colonização, surge através dos indígenas a idéia de

Direito Penal que estava ligada ao direito costumeiro. Através disso começa-se

por considerar que é com as leis e os costumes da colonização do Brasil, que

se inicia a sua história jurídica.

No período colonial, o crime não era punido com penas, mas sim era

confundido com pecados e com ofensa moral, em que eram punidas

severamente as pessoas que benziam, os feiticeiros, ateus e toda a população

daquele período.

Com a proclamação da independência foi sancionado o Código Criminal

do Império em 1830. Em 1° de Janeiro de 1942 entrou em vigor Código Penal

que é a legislação fundamental e em consequência disso surge o Direito Penal

brasileiro. Recentemente, ressalta-se o atentado terrorista ocorrido em 11 de

setembro de 2001, após o acontecido adveio uma medida como solução, um

novo Direito Penal, que seria o Direito Penal do Inimigo. Dessa forma,

podemos dizer que todos aqueles que desobedecessem a uma norma do

Estado, ou colocassem em risco a ordem e norma jurídica, como, por exemplo,

práticas terroristas seriam aplicadas normas penais, removendo os direitos

fundamentais.

Assim, o inimigo do Estado deveria ser condenado rapidamente, sem

qualquer contraditório, ampla defesa, devido processo legal, ou qualquer outro

preceito, ou seja, o preceito constitucional que reza o artigo 5º, inciso LV, da

Constituição Federal, seria retirado para aqueles que colocassem em risco à

norma jurídica e ou à ordem estatal.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

72

Essa corrente é liderada pelo alemão Gunther Jakobs, o qual afirma que

os inimigos não merecem quaisquer garantias fundamentais, visto que, não são

seres humanos, e assim, não são regidos pela Constituição. Ressaltando: o

Direto Penal do inimigo vem do Direito Penal do Terror, ocorrido na Idade

Média que é aquele composto por tribunais que julgavam aqueles que eram

considerados uma ameaça à sociedade. Os condenados eram presos e

submetidos há um processo inquisitivo, nem ao menos tendo o direito de saber

quem os denunciava (JAKOBS; MELIÁ).

E mais recentemente como Direito Penal do autor, vivido na II Guerra

Mundial em que milhares de pessoas, nessa época, foram torturadas,

queimadas vivas por acusações que, em sua maioria, eram injustas e sem

qualquer comprovação probatória. Atualmente, pode-se destacar que em 2003,

entrou em vigor a Lei nº 10.792, sendo uma forma de infiltração do instituto do

Direito Penal do Inimigo, o chamado regime disciplinar diferenciado que nada

mais é do que o instituto caracterizador, visto que, primeiramente se alterou a

forma de interrogatório, para posteriormente tratarem do inimigo.

6 APLICAÇÕES PRÁTICAS DO DIREITO PENAL DO INIMIGO NO BRASIL

6.1 Regime disciplinar diferenciado

Há muito tempo o sistema penitenciário brasileiro demonstrava sinais de

que não supria mais as necessidades e requisitos reclamados pela Lei de

Execução Criminal. Presídios superlotados, sem funcionários suficientes e

preparados, além de mal remunerados, a falta de infraestrutura colaboram para

o surgimento das organizações criminosas e do crescimento de seu poder

dentro dos presídios. Portanto, a falência do sistema penitenciário brasileiro era

claramente percebido a toda sociedade brasileira, assim como a existência das

organizações criminosas, e seu poder frente o Estado, imagem esta veiculada

exaustivamente nos meios de comunicação.

Diante disso, foi criado o Regime Disciplinar Diferenciado, através da

Resolução nº26, de 04/05/2001, da Secretaria de Administração Penitenciário

do Estado de São Paulo apenas, pelo então secretário Nagashi Furukawa.

73

Motivado pela organização de facções criminosas, atuantes em presídios,

principalmente nos Estados de São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ).

Posteriormente, com a introdução da Lei nº 10.792/2003, que alterou a

Lei de Execuções Penais e introduziu o Regime Disciplinar Diferenciado em

busca de dificultar as ações organizadas e supostamente lideradas por internos

dos presídios, tais como o Comando Vermelho (CV), No Rio de Janeiro, e o

Primeiro Comando da Capital (PCC), em São Paulo.

Diante disso, faz-se à aplicação expressiva do Direito Penal do Inimigo,

visto que abrigam presos, mesmo que provisoriamente, como suspeitos de

envolvimento, como também com participação em organizações criminosas,

quadrilhas ou bandos.

Dessa forma, o artigo 52, §§ 1º e § 2º, da Lei n° 10.792/2003 expressa

os aspectos da teoria do Direito Penal do Inimigo:

Artigo 52: A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeitas o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo de sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características: § 1º O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar os presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem altos riscos para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade. § 2º Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou condenando sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilhas ou bandos (BRASIL, LEI 10.792/2003. ART. 52).

Com isso, verifica-se uma circunstância em que se pune não pelo ato

ilícito cometido, sendo a regra do ordenamento jurídico brasileiro, e sim se

inteira na punição do autor pela sua periculosidade, assim demonstra na

característica marcante do Direito Penal do Inimigo.

Pode-se fazer referência ao autor Noberto Bobbio, no qual diz

resumidamente que: “O problema atual não é mais fundamentar os direitos do

homem, é sim protegê-los, ou melhor, não se trata de um problema de cunho

filosófico, mas sim jurídico, em sentido amplo político” (apud LENZA, 2010,

p.118)

74

Nesse sentido, é possível depreender dessas idéias que não pode ser

aceitável em um Estado Democrático de Direito, preceitos contrários às normas

fundamentais, aplicados na Constituição Federal brasileira, principalmente no

que diz respeito à defesa do homem, assim sendo, o Direito Penal do Inimigo

não pode e não é resguardo na norma jurídica brasileira. O Direito Penal do

Inimigo trata de uma ofensa ao princípio da ampla defesa, no qual constitui que

não se pode constranger ninguém a produzir provas contra si mesmo, em que

sua violação pode ser considerada um retrocesso no campo dos direitos

fundamentais.

Para o professor Luiz Flavio Gomes: “Ninguém contesta que o estado

deve intervir para evitar danos para o patrimônio e vidas das pessoas, contudo,

dentro de um estado democrático de direito até mesmo o direito deve ter

limites”. Portanto, mesmo que o Direito Penal do Inimigo não encontre amparo

na Constituição Federal brasileira, verifica-se que com a nova lei em vigor o

Direito Penal do Inimigo encontra-se presente ainda que implicitamente

(GOMES, 2009)

Com o fim de inibir os crimes de maior gravidade, os legisladores

brasileiros criaram leis, que se forem analisadas na ótica de Jakobs, trazem

resquícios do Direito Penal do Inimigo. Autores como Ribeiro (2011) tratam a

Lei de crimes hediondos como principal exemplo brasileiro do movimento da

Lei e da ordem, não estando de todo errado, de forma que tal medida de

repressão se assemelha com o Direito Penal do Inimigo, podendo até se dizer

que o Direito Penal Máximo seria um gênero e o movimento da Lei e da ordem

e Direito Penal do Inimigo seriam espécies.

Porém, de outra forma é o entendimento de outros doutrinadores, que

fazem o seguinte questionamento: como lidar com esses criminosos que

tornam em risco o próprio sistema penitenciário e, consequentemente a

sociedade, visto que, de certa forma, continuam liderando a respectiva facção

criminosa de dentro do sistema penitenciário? Guilherme de Souza Nucci

responde:

[...] não há direito absoluto, [...], razão pela qual a harmonia entre direitos e garantias é fundamental. Se o preso deveria estar inserido em um regime fechado ajustado à lei, o que não é regra, mas exceção, a sociedade também tem direito à segurança publica. Por

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isso, o RDD tornou-se uma alternativa viável para conter o avanço da criminalidade incontrolada, constituindo meio adequado para o momento vivido pela sociedade brasileira. Em lugar de combater, idealmente, o regime disciplinar diferenciado, pensamos ser mais ajustado defender, por todas as formas possíveis, o fiel cumprimento às leis penais e de execução penal [...] (apud MARIONUCCI; COIMBRA, 2005, p. 5).

Nessa mesma linha de entendimento, o Regime Disciplinar Diferenciado

é um mal necessário, onde há mais de 20 anos não há planejamento a médio e

longo prazo, deixando, dessa forma, o sistema penitenciário esquecido, para

exemplificar, na década de 80, estudantes de Direito já mencionavam

organizações como a Serpente Negra, da penitenciária de São Paulo,

conforme leciona Fernando Capez:

O Poder Público quedou-se inerte. Nunca se fez nada. Tal omissão promoveu o surgimento de diversas organizações criminosas, que, aliás, proliferam justamente pela ausência de uma política para o sistema penitenciário. Surgem em decorrência da falta de presídios de segurança máxima alocados em regiões distantes e da ausência de isolamento dos grandes líderes das facções (apud MARIONUCCI; COIMBRA, 2005, p. 8).

Porém, o enfoque que deve se dar no momento é em relação à teoria de

Jakobs nas principais legislações esparsas do ordenamento jurídico penal

brasileiro, sendo a Lei de Crimes hediondos (Lei nº 8.078/90), Crime

Organizado (Lei nº 9.034/95), Lei de drogas (Lei nº 11.343/06), onde as duas

primeiras não criam novos tipos penais somente regulamenta um tratamento

diferente aos que se enquadram as definições expostas. Diferentemente da Lei

de drogas que traz tipos novos, mas também um tratamento diferenciado para

os que cometerem as condutas descritas nos tipos.

6.2 Lei dos Crimes Hediondos

O legislador, devido a consideráveis aumentos da criminalidade e falta

de punibilidade, elencou algumas condutas que possam ser consideradas

como mais ameaçadoras a sociedade.

76

Dessa forma é possível verificar na própria lei, que traz em seu primeiro

artigo o seguinte:

Art. 1º. São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: (Redação dada pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994) I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994) - latrocínio (art. 157, § 3o, in fine); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994) - extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2o); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994) - extorsão mediante sequestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ 1o, 2o e 3o); (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994) - estupro (art. 213, caput e §§ 1o e 2o); (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o, 2o, 3o e 4o); (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) - epidemia com resultado morte (art. 267, § 1o). (Inciso incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994) VII- B - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1o, § 1o-A e § 1o-B, com a redação dada pela Lei no 9.677, de 2 de julho de 1998). (Inciso incluído pela Lei nº 9.695, de 20.8.1998) Parágrafo único. Considera-se também hediondo o crime de genocídio previsto nos arts. 1o, 2o e 3o da Lei no 2.889, de 1o de outubro de 1956, tentado ou consumado. (Parágrafo incluído pela Lei nº 8.930, de 6.9.1994).

Certamente que a idéia do legislador em punir com mais rigor aqueles

que cometerem os crimes supracitados, tem influência da teoria de Jakobs,

tendo em vista que a concepção da teoria seria exatamente essa, ou seja,

aumentar a pena de delitos que aqueles que cometem são considerados como

“Inimigos”, com já dito anteriormente (LENZA, 2010)

Por mais, a lei ainda restringe garantias processuais, como a proibição

de anistia, graça e indulto, aumenta o prazo para progressão de regime e a

possibilidade do réu não poder apelar da sentença em liberdade. Destarte, se

nota totalmente presente o Direito Penal do Inimigo na Lei de Crimes

Hediondos.

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No entanto, na prática, não é isso o que acontece, pois, previsão

parecida foi revogada no Código de Processo Penal (art. 594), que dizia:

art. 594 o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime que se livre solto (Revogado pela Lei nº 11.719, de

2008).

Assim, em relação ao condenado que não seja primário e não tenha

bons antecedentes, dois ônus a ele se impõem por força de lei: a prisão

automática decorrente da sentença condenatória (salvo se se livrar solto ou

prestar fiança, sendo esta cabível) e a impossibilidade de recorrer se não for

recolhido à prisão.

Por conseguinte, com interpretação literal do artigo (594, CPP),

afrontaria a Constituição Federal em pelo menos duas oportunidades: a

presunção de inocência e a ampla defesa.

6.3 Lei de drogas

Nessa lei houve tipificação para novos fatos e colocação de um

procedimento especial para tais condutas.

Assim o art. 33 da lei diz:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. § 1o Nas mesmas penas incorre quem: I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas; II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;

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III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas. § 2o Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao uso indevido de droga: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa. § 3o Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a consumirem: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas previstas no art. 28. § 4o Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de Direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

A característica mais presente do Direito Penal do Inimigo é a

antecipação da punibilidade, de forma que, com o número de condutas

elencadas no artigo 33 podem ser classificadas algumas como de perigo

abstrato ou de mera conduta, como nos casos de expor a venda ou produzir.

Há possibilidade de associação para fim de tráfico, porém, há diferença

entre está e um fortuito concurso de pessoas para prática de tráfico, sendo

então, necessário à habitualidade para que se configure a associação.

Agora, em relação à diminuição de garantias processuais, assim como

na Lei de Crimes Hediondos, a Lei de Drogas é rica, podendo citar como

exemplo, a inafiançabilidade, a vedação de sursis, proibição à concessão de

graça, indulto e anistia, proibição de conversão em pena alternativa e o

aumento do prazo para a concessão de liberdade condicional.

Importante destacar que no caso de proibição de conversão em pena

alternativa o entendimento jurisprudencial tem mudado, conforme segue:

HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS.SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR SANÇÕES RESTRITIVASDE DIREITOS. POSSIBILIDADE, EM TESE. RESOLUÇÃO N.º 05/2012, DO SENADO FEDERAL. ORDEM DE HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC n.º 97.256/RS, Rel. Min. AYRES BRITTO, declarou, incidentalmente, a inconstitucionalidade da proibição da conversão da pena privativa

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deliberdade em restritivas de direitos, o que resultou na edição daResolução n.º 05/2012, do Senado Federal, na qual foi suspensa aexecução da parte final do art. 33, § 4.º, da Lei n.º 11.343/2006.2. Habeas corpus parcialmente concedido, nos termos explicitados no voto. (STJ - HC: 229501 RJ 2011/0310908-0, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 08/05/2012, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/05/2012).

EMENTA Habeas corpus. Tráfico de entorpecentes. Delito praticado sob a égide da Lei nº 11.343/06. Substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. Possibilidade. Aplicação do art. 44 do Código Penal. Substituição admissível. Precedente do Pleno. 1. O Tribunal Pleno desta Suprema Corte, em 1º/9/10, ao analisar o HC nº 97.256/RS, Relator o Ministro Ayres Britto, por maioria de votos, declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade dos arts. 33, § 4º, e 44, caput, da Lei nº 11.343/06, na parte em que vedavam a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em condenação pelo crime de tráfico de entorpecentes. 2. Ordem concedida. (STF - HC: 102055 MG , Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 01/02/2011, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-058 DIVULG 28-03-2011 PUBLIC 29-03-2011 EMENT VOL-02491-01 PP-00130)

Em um aspecto geral, apesar de mudanças na jurisprudência, a atual Lei

de Drogas está em certa harmonia com a teoria de Jakobs, pois ao se

comparar com sua respectiva Lei anterior de nº 6368/76, houve o aumento de

praticamente de todas as penas dos tipos previstos, além da diminuição das

garantias processuais penais (GOMES, 2009).

6.4 Lei do abate de aeronaves

A pena mais severa existente no ordenamento brasileiro está totalmente

fora do Código Penal, ou das Leis já acima mencionadas, está sim na Lei que

regulamenta o espaço aéreo brasileiro – Código Brasileiro da Aeronáutica - o

qual em seu art 303, § 2º regulamenta a hipótese de abate da aeronave caso

esta for classificada como hostil.

Sendo assim transcreve-se o art. 303, §2° da Lei 7565 de 19 de

dezembro de 1986, o qual traz a redação a seguir.

80

Art 303 § 2º Esgotados os meios coercitivos legalmente previstos, a aeronave será classificada como hostil, ficando sujeita à medida de destruição, nos casos dos incisos do caput deste artigo e após autorização do Presidente da República ou autoridade por ele delegada (Parágrafo acrescentado conforme determinado na Lei nº 9.614, de 5.3.1998, DOU 6.3.1998).

Como é de se imaginar, o abatimento de uma aeronave em pleno voo é

a decretação da pena de morte, mesmo que indiretamente, para seus

tripulantes, tendo em vista que, as chances de sobrevivência são mínimas.

Assim, pode se verificar a presença de todas as características

elencadas anteriormente, qual seja o adiantamento de punibilidade, de forma

que o abate da aeronave que for considerada como hostil e não responder a

ordem de pouso gerará pena de morte aos seus tripulantes, que a considerar

que a pena máxima imposta nas Leis penais é de 30 anos, está então

configurada o aumento desproporcional da pena e é claro que devido todas

essa circunstâncias não há nem se quer resquícios de alguma garantia penal

ou processual penal para os tripulantes.

6.5 Lei do Crime Organizado

Como exposto no artigo 1º da lei, ela visa regulamentar meios de provas

e procedimentos investigatórios para aqueles que participam de quadrilha ou

bando ou associações criminosas de qualquer tipo. Como pode se observar no

primeiro artigo da referida lei.

Esta Lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo. (Redação dada pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001).

A lei, neste caso, deixou evidências que se trata de uma espécie de

Direito Penal do autor, levando em conta que ao excepcionar os meios de

provas e procedimentos investigatórios para somente aqueles que participarem

81

de organizações criminosas, assim se nota um critério subjetivo do autor, ou

seja, o que ele é e não o que fez.

Analisando as formas previstas de produção de prova e os

procedimentos de investigação se notará que há uma mitigação em garantias

processuais.

A ação controlada, a quebra de sigilo, captação e interceptação

ambiental, a infiltração, são todas situações que em casos normais à própria

Constituição Federal de 1988 proíbe como no artigo 5º X que assegura o

Direito de inviolabilidade da intimidade e vida privada.

De tal modo que pode se perceber que o legislador, com o fim de abolir

com as organizações criminosas, relativizou até mesmo garantias

constitucionais, quando diz, relativizou, é porque ainda que se tenha autorizado

a quebra de sigilo sempre será necessária à autorização do juiz competente

(LENZA, 2010.p.118)

Nucci (2009) também sustenta que a captação e interceptação

ambiental é outra garantia que foi relativizada pela Lei 9.034/95, de forma que

se não for realizada em ambiente particular pode ser considerada lícita sem a

autorização judicial.

82

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com a pesquisa realizada, verifica-se considerável evolução

do Direito Penal, que nos primórdios, era extremamente cruel. Com a evolução

da sociedade, este, teve um grande avanço, relacionado ao processo de

humanização das penas. Visto que, passou-se pelas fases da vingança penal

e, posteriormente com ideias na razão e humanidade, iniciou um processo em

buscar a defesa do indivíduo, chegando ao que é atualmente, na dignidade da

pessoa humana, através, principalmente, da Declaração Universal dos Direitos

Humanos, como valor fundamental nos Estados Democráticos de Direito.

Dessa forma, nesses Estados, prevalece a doutrina do garantismo penal.

Para se chegar a esse entendimento, não foi de um dia para o outro, o

ser humano, historicamente, tem construído (porque essa evolução nunca

acaba) uma maneira jurídica de se proteger. Na antiguidade isso já existia,

desde antes de Cristo já teve alguns instrumentos, o mais citado é o código de

Hamurabi, pois estabeleceu algumas normas de reconhecimento da

propriedade, da vida, coisas desse tipo. Depois a doutrina judaico-cristã de

uma maneira geral, que teve papel fundamental, passando a defender os

direitos humanos universalmente, independentemente da cultura do sujeito.

Verificou-se, também, que apesar dessa evolução, as sociedades

passaram por várias situações limites, dentre elas, a I Guerra Mundial, fazendo

com que a sociedade internacional se unisse com o objetivo de buscar a paz.

No entanto, não deu certo, pois, ocorreu a II Guerra Mundial, dessa feita, gerou

a internacionalização dos direitos humanos, devido ao repudio internacional

frente às atrocidades do holocausto. Nesse contexto, a sociedade internacional

se articulou novamente e, criou a ONU e posteriormente foi aprovada a

Declaração Universal dos Direitos Humanos. Dessa forma, inaugurou a

proteção jurídica incondicional da pessoa humana.

No entanto, nas últimas décadas produziu-se uma notória transformação

regressiva no campo da chamada politica criminal ou, mais precisamente, da

politica penal, pois do debate entre politicas abolicionistas e reducionistas

passou-se, quase sem solução de continuidade, ao debate da expansão do

poder punitivo, visto que, com a evolução histórica do Direito Penal, uma das

83

maiores lutas foi reduzir o poder punitivo do Estado. Nele, o tema do inimigo da

sociedade ganhou o primeiro plano de discussão.

Com isso, introduz-se uma contradição permanente entre a doutrina

jurídico-penal que admite e legitima o Direito Penal do Inimigo e os princípios

constitucionais do Estado de Direito. Onde o Direito Penal do Inimigo só é

compatível com o Estado absoluto.

A teoria do Direito Penal do Inimigo encontra fundamento na

incorporação do punitivismo: idéia de que o aumento de pena é a solução para

conter a criminalidade, bem como no Direito Penal Simbólico, para o qual a

tipificação penal atua como mecanismo para a criação de uma identidade

social.

Em linhas gerais, tem-se que o Direito Penal do Inimigo trata-se de uma

teoria afeta a um Direito Penal excepcional, que fere princípios básicos

contidos no ordenamento jurídico de um Estado Democrático.

A aplicação de um Direito Penal do Inimigo tem sido justificada como

medida necessária para o combate a certos tipos de crimes, que por sua

gravidade, propagou-se a certeza de que não encontram respostas eficazes na

repressão por medidas normais.

Dessa forma, seria irracional ao operador jurídico punir o criminoso

comum – Cidadão – da mesma maneira que o inimigo, pois trata-se de sujeitos

de natureza distinta. Enquanto o Cidadão, apesar de ter cometido um crime, se

mantem fiel ao Direito, o Inimigo afastou-se tanto da norma, que não oferece

garantias que voltará a comporta-se de acordo com o Direito.

No que pese as acaloradas discussões sobre a aplicação do Direito

Penal do Inimigo, conclui-se que este é incompatível com o Estado

Democrático de Direito, bem como defende ações contrárias aos Direitos

Humanos. Trata-se de Direito de exceção, que retira do sujeito garantias

jurídicas já sedimentadas nos ordenamentos jurídicos ocidentais.

Em síntese, sobrevoou-se a história do poder punitivo e do Direito Penal,

uma breve explanação acerca dos Direitos Humanos e terminou-se nos

aspectos práticos da utilização do Direito Penal do Inimigo no Brasil, dessa

forma, formulou-se algumas reflexões, que se pôde concluir que o Direito Penal

do Inimigo é um retrocesso, principalmente, no que diz respeito aos direitos

humanos. No entanto, não implica encerrar o tema porque, excede em muito a

84

critica de uma proposta isolada e remete a um colossal problema politico que

acompanha todo o Direito Penal dos últimos séculos, ou seja, desde que o

Direito Penal se converteu decididamente no Direito Penal do Estado

constitucional de direito.

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